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LÍLIAN ARRUDA MARQUES E ANTONIO IBARRA O mercado de trabalho no DF de 1992 a 2004 ...................................................................11 ANTONIO DELFIM NETTO Reações retardadas... ...........................................................................................................9 ENTREVISTA ARTIGOS EDITORIAL jan/mar de 2005 Revista Editada pelo CORECON/DF - ANO VI - nº 21 - JAN/MAR DE 2005 Revista de conjuntura 3

Transcript of 21-revista

Revista Editada pelo CORECON/DF - ANO VI - nº 21 - JAN/MAR DE 2005

.......... 4

ENTREVISTA

JOÃO SICSÚ .....................................................................................................................5

ARTIGOS

ANTONIO DELFIM NETTO

Reações retardadas... ...........................................................................................................9

LÍLIAN ARRUDA MARQUES E ANTONIO IBARRA

O mercado de trabalho no DF de 1992 a 2004 ................................................................... 11

CONSTANTINO CRONEMBERGER MENDES

Desigualdades regionais e desenvolvimento .....................................................................17

GILBERTO MARINGONI

Alencar denuncia juros, privatizações, endividamento público e censura ao debate econômico ..........................................................................................................29

CECI VIEIRA JURUÁ

Perdas e danos: a lei das parcerias público-privadas .......................................................34

MANIFESTOS

Parceria Público - Privada ..................................................................................................44

“E Nada mudou” .................................................................................................................47

EDITORIAL

jan/mar de 20053Revista de conjuntura

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EDITORIAL

Diretor Responsável: Roberto Bocaccio PiscitelliConselho Editorial: Mônica Beraldo Fabrício da Silva,Roberto Bocaccio Piscitelli,Humberto Vendelino Richter,Maurício Barata de Paula Pinto,Mário Sérgio Fernandez Sallorenzo, José Roberto Novaes de Almeida e José Aroudo Mota.Jornalista Responsável: Daniela Lima - Reg. DRT/DF: 4926Redação: Daniela LimaEditoração Eletrônica: om,Loducca (Tércio Caldas) (61) 425-1090Impressão: Gráfica Plano PilotoTiragem: 3.800Periodicidade: BimestralAs matérias assinadas por colabora-dores não refletem, necessariamente, a posição das entidades. É permitida a reprodução total ou parcial dos artigos desta edição, desde que citada a fonte.

CONSELHO REGIONAL DE ECONOMIA DA 11ª REGIÃO – DF

Presidente: Mônica Beraldo Fabrício da SilvaVice-Presidente: Roberto Bocaccio PiscitelliConselheiros Efetivos: Mônica Beraldo Fabrício da Silva,Roberto Bocaccio Piscitelli,Maurício Barata de Paula Pinto,Guidborgongne Carneiro N. da Silva,José Aroudo Mota,Victor José Hohl,Paulo Luiz Figueiredo de Oliveira,Humberto Vendelino Richter eMaria Cristina de AraújoConselheiros Suplentes: Newton Ferreira da Silva Marques,Max Leno de Almeida,Evilásio da Silva Salvador,Homero Gustavo Reginaldo Lima,José Luiz Xavier,José Luiz Pagnussat,Jusçanio Umbelino de Souza eGilson Duarte dos SantosEquipe do CORECON: Iraídes Godinho de Sales, Ismar Marques Teixeira, Michele Cantuária Soares, Jamildo Cezário Gomes e Angeilton Francisco Lima Faleiro.

End.: SCS Qd. 04, Ed. Embaixador, Sala 202 CEP 70300-907 – Brasília –DFTels: (61) 225-9242 / 223-14293964-8366 / 3964-8368Fax: (61) 3964-8364E-mail: [email protected]: www.corecondf.org.brHorário de Funcionamento: das 8:00 as 18:00 horas (sem intervalo)

EXPEDIENTE

Órgão Oficial do CORECON-DF

Foi divulgado, com certa euforia, que 54,7% dos 658 acordos salariais analisados na pesquisa do DIEESE, em 2004, resultaram em aumentos acima da inflação. Outros 26,1% lograram repor a inflação, e apenas 19,1% ficaram abaixo dela. Também foi dito que se trata do melhor resultado desde 1996.

As melhores proporções foram observadas na indústria, depois, no comércio e, enfim, em serviços. É verdade, também, que tivemos 5,2% de crescimento do PIB, redução do desemprego, inflação moderada e taxas de juros menores, até a retomada das altas, em setembro.

Agora, vamos examinar o outro lado da notícia. O levantamento, obviamente, se refere às categorias mais organizadas, que podem negociar; há muita gente da indústria, do Sudeste e com data-base no 1º semestre, o que corresponde aos melhores acordos. Os resultados, portanto, não valem para a maioria, os não-organizados ou mal organizados e os informais.

Segundo ponto: o índice que serve de base para a pesquisa é o INPC, um índice de preços ao consumidor, é verdade, até 8 salários mínimos de renda, que registrou apenas 6,13% em 2004. É interessante lembrar que o IPCA, índice oficial de inflação, para famílias com renda até 40 salários mínimos, foi de 7,6%, e os IGPs foram ainda maiores. A análise do aumento da carga tributária, por exemplo, sempre é feita com base no IPCA ou no IGP-DI.

Mesmo ignorando esses fatos, entretanto, e sem considerar os acordos pífios dos últimos anos, veja-se a distribuição desses acordos por faixa de reajuste. Dos 360 que ficaram acima do INPC, 156 (mais de 43%) ficaram até 1% acima da inflação, mais 96 (quase 27%) até 2%, mais 52 (mais de 14%) até 3%. Só 1 (UM), acima de 5%. Também os que ficaram abaixo do INPC - 126 acordos - se concentraram até 3% (mais de 90%) abaixo da inflação. Em outros termos, o desvio-padrão foi muito pequeno, ficou tudo muito próximo. Mesmo num ano de tão favoráveis indicadores macroeconômicos o que se conseguiu de aumento real só deu uma pequena sensação de alívio, num País em que, a cada ano, se renova um terço da força de trabalho, o que permite uma substituição contínua das maiores pelas menores remunerações.

Para 2005, a grande maioria dos analistas espera um ano menos favorável. Há sinais de aumento do desemprego, os juros não param de subir. Os próprios técnicos responsáveis pela pesquisa admitem que o rendimento do trabalhador chegou ao mais baixo patamar dos últimos 20 anos.

Não há dúvida de que não se constrói um sólido capitalismo e uma sociedade verdadeiramente democrática e solidária praticando níveis salariais tão baixos e não reconhecendo o valor do trabalho.

E x p e d i e n t e

jan/mar de 20055Revista de conjuntura

As novas regras cambiais: mais mudanças na liberalização do dólarA revista de Conjuntura entrevista o economista

João Sicsú, que fala sobre as novas regras

cambiais formuladas pela diretoria de assuntos

internacionais do Banco Central e aprovadas pelo

Conselho Monetário Nacional - CMN

Entrevista: Daniela LimaColaboração: Roberto Bocaccio Piscitelli

Conjuntura - Na sua opinião, além de facilitar as transações cambiais e simplificar os procedimentos operacionais, as novas regras cambiais têm outras finalidades menos explícitas?

João Sicsú - O objetivo maior dessas novas normas cambiais brasileiras é consolidar o estágio atual de liberalização e apro-fundá-lo, iniciando, através de medidas, ainda que aparentemente tênues, o fim da cobertura cambial nas exportações. O fim da co-bertura cambial é uma proposta estratégica do processo de liberali-zação.

Conjuntura - Quais são as vantagens da extinção das contas CC-5? A nova sistemática é benéfica para a economia brasileira?

João Sicsú - O sentido de extinguir é, neste caso, essencialmen-te liberalizante. O CMN unificou os mercados (livre e flutuante) e, paralelamente, extinguiu as contas do tipo CC5 das instituições financeiras, permitindo que recursos sejam enviados ao exterior diretamente, sem intermediários - que eram as instituições finan-ceiras estrangeiras com contas CC5 abertas nas instituições finan-ceiras brasileiras. Argumenta-se que estas mudanças nas normas cambiais podem “legalizar” as operações de envio de recursos para o exterior. Formalmente, as operações de remessas de recursos que ocorriam através das contas CC5 das instituições financeiras eram legais; entretanto, a opinião pública tendeu a julgá-las como

ENTREVISTA

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“O alongamento do prazo para cobertura cambial começa a avançar para um

caminho perigoso, que é o próprio fim da cobertura cambial nas exportações”.

minho perigoso, que é o próprio fim da cobertura cambial nas exportações.

Conjuntura - No caso dos exportadores, a extensão do pra-zo para internalização das divisas e a dispensa do período de 20 dias para convertê-las podem ser vistas como iniciativas meritórias do ponto de vista do comércio exterior e do fortalecimento das posições cambiais do Brasil?

João Sicsú - O resultado do fim dessa cobertura cambial é que exportadores poderão não trazer os recursos para o Brasil, embora o País tenha realizado exportações. Isso é extremamen-te negativo, porque precisamos importar, pagar a dívida privada externa, pagar a dívida pública externa, precisamos que o Banco Central acumule dólares, forme reservas. Neste caso, a formação de reservas por parte do Banco Central e todas as outras ativi-dades estariam com dificuldades de realização por falta de dóla-res. Os exportadores poderão não internalizar na economia brasileira suas receitas inte-gralmente; então, o fim da co-bertura cambial é extremamente perigoso e danoso para a eco-nomia. A partir de então, os fluxos comerciais vão entrar ou deixar de entrar no País de acordo com a mesma lógica dos fluxos financeiros; logo as crises cambiais estarão potencializadas pelos próprios ganhos dos expor-

“O resultado do fim dessa

cobertura cambial é que

exportadores poderão não

trazer os recursos para o

Brasil, embora o País tenha

realizado exportações. Isso

é extremamente negativo,

porque precisamos importar,

pagar a dívida privada externa,

pagar a dívida pública externa,

precisamos que o Banco Central

acumule dólares, forme reservas”.

tadores.

Conjuntura - Com as novas medidas, o País se torna menos vulnerável diante de eventuais crises ou choques especulativos?

João Sicsú – Não, o País não se torna menos vulnerável. A entrada de dólares no País resultante do saldo comercial, que é uma variável bastante previsível e estável, torna-se um fluxo movido agora por cálculos especulativos. Exportadores terão que se especializar na atividade especulativa de cálculo do mo-mento ótimo para internalização de dólares; em momentos críti-cos, empresários poderão adiar a entrada, esperando uma maior desvalorização, ou, diante de uma valorização, poderão acen-tuar a tendência, na expectativa de que a situação poderá ser pior ainda para a internalização quan-do o prazo de 210 dias terminar. Os fluxos comerciais de entrada tendem a ficar, portanto, asse-melhados aos fluxos financeiros internacionais, com movimentos mais imprevisíveis, transfor-mado-se, então, em mais uma variável capaz de instabilizar o cenário macroeconômico. Os fluxos comerciais serão internali-zados de acordo com as mesmas variáveis que influenciam a en-trada de capitais financeiros no País: diferencial de juros internos e externos, expectativa de des-valorização cambial e risco de défault.

algo no mínimo suspeito de algu-ma forma de ilegalidade. A nova sistemática não muda nada para a economia; os recursos vão conti-nuar sendo mandados ao exterior.

Conjuntura - Em matéria de controle da circulação de divisas, há diferenças relevantes entre a situação anterior e a atual?

João Sicsú - Não, o nível de liberalização cambial da econo-mia é avançado e o processo libe-ralizante continua em curso. E as dificuldades ou facilidades para o estabelecimento de controles do movimento de capitais ainda são as mesmas. A única ques-tão é que o alongamento do prazo para cobertura cambial começa a avançar para um ca-

jan/mar de 20057Revista de conjuntura

jan/mar de 20058Revista de conjuntura

C o n v ê n i o s d e A s s i s t ê n c i a e o u t r o sC o n v ê n i o s d e A s s i s t ê n c i a e o u t r o s

M a i s i n f o r m a ç õ e s n o s i t e : w w w . c o r e c o n d f . o r g . b r

• ÓTICA PAULO SANTANA LTDA - Vantagens - 10% nas compras a vista sobre o preço de tabela. Faturamento pelo preço de tabela, com uma entrada mais dois pagamentos, em 30 e 60 dias, sem acréscimo.SCLS 104, Bloco “C”, loja 01 - Asa Sul. Fone: (61) 225-3288.

• EDITORA DA UnB - Vantagens - 15% nas compras a vista em publicações da Edito-ra UnB; 5% nas compras de publicações de terceiros (os descontos não se aplicam a produtos em promoção). Fones: (61) 226-7312 / 226-6874.SITE: www.editora.unb.br E-MAIL: [email protected]

• HOTEL QUINTA SANTA BÁRBARA - Vantagens - 20% para ocupações feitas no período de baixa temporada; 10% para ocupações feitas nos períodos de alta tem-porada, isto é, fins de semana, férias e feriados (os descontos não se aplicam às diárias de hospedagem em promoção).Situado à Rua do Bonfim, nº 1, Pirenopólis - Goiás. Fone: (62) 331-1304.

• EDITORA CONTEXTO - Vantagens – 20% de desconto para livros de Economia. Ca-dastre-se no site: www.editoracontexto.com.br - Email: [email protected]

• POUSADA CAMELOT - Vantagens - 15% de desconto nas hospedagens pelo preço de balcão a todo associado acompanhado de seus dependentes. Rodovia GO 118, Km 168, entrada da cidade de Alto Paraíso/GO. Fones: (62)446-1581(reservas) e 446-1449. SITE: www.pousadacamelot.com.br

• PLANET IDIOMAS - Vantagens – 25% de desconto sobre os preços de tabela para o associado; 10% de desconto para pagamento até o 1º dia útil do mês, além dos 25% de descontos já adquiridos. Parcelamento do material didático em até 2x sem juros. Isenção da taxa de matrícula. SCS Quadra 04 Edifício BRASAL II – Sobreloja. Fone: (61) 321-2030.

• COMISSÃO ECONÔMICA PARA A AMÉRICA LATINA E O CARIBE (CEPAL) Vantagens - As publicações encontram-se à disposição no CORECON-DF, com 30% de desconto para economistas em dia.

• INSTITUTO DE COOPERAÇÃO E ASSISTÊNCIA TÉCNICA DA ASSOCIAÇÃO DE ENSINO UNIFICADO DO DISTRITO FEDERAL – ICAT/AEUDF Vantagens – 10% de desconto nos cursos de pós-graduação. Fone: 224-2905. SITE: www.aeudf.br

• REVITARE – Centro de Estética - Vantagens – 20% de desconto para pagamento a vista nos tratamentos corporais; 10% de desconto para pagamento a vista no tratamento facial; ou, ainda, desconto de 10% para pagamento em até quatro vezes nos tratamentos corporais; avaliação corporal e facial grátis, e a primeira sessão de tratamento corporal grátis.Avenida W3 Sul, Qd. 516, Bl. “C”, Sl. 29. Fones: (61) 245-7748 / 245-6752.

• REDE DE DROGARIAS ROSÁRIO Vantagens - 8% de desconto pela tabela da Drogaria Rosário. Fone: (61) 212-1000.

• CONVÊNIO DE COOPERAÇÃO E PARCERIA CORECON-DF / CRA-DF Cooperação e parceria visando à soma de esforços e recursos, com o objetivo de promover a realização de cursos para os associados. Matrículas nas mesmas condi-ções dos associados dos respectivos Conselhos.

• ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DOS ANALISTAS DO MERCADO DE CAPITAIS Vantagens – Para os economistas registrados e em dia com suas obrigações, des-contos e/ou valores diferenciados em cursos, nas mesmas condições oferecidas aos próprios associados da entidade promotora. SRTVN 701 Lote “C” Bloco “B” Sala 523 – Edifício Centro Empresarial Norte. Fone: (61) 328-3318. SITE: www.abamec.com.br E-MAIL: [email protected]

• HOTEL MANHATTAN PLAZA Vantagens – 54% de desconto de 2ª a 6ª-feira e 62% de 6ª a 2ª-feira para os economistas de todo o Brasil registrados e em dia com suas obrigações, bastando para tal benefício apresentar sua carteira profissional.SHN Quadra 02 Bloco “A” – Setor Hoteleiro Norte/Asa Norte. Fone: (61) 319-3543 e Fax: (61) 328- 5685 (Manhattan Plaza Hotel) SITE: www.manhattan.com.br E-MAIL: [email protected]

• HOTEL ALVORADA - Vantagens – 20 % de desconto na alta temporada e 30% de desconto na baixa temporada para os economistas de todo o Brasil registrados e em dia com suas obrigações, bastando para tal benefício apresentar a carteira profissional.SHS Quadra 04 Bloco “A” – Setor Hoteleiro Sul/Asa Sul. Fone: 322-1122. SITE: www.alvoradahotel.com.br E-MAIL: [email protected]. br- OBSERVAÇÕES: O Hotel Alvorada oferece Internet gratuita e disponibiliza também uma sala para cursos, com ocupação para 50 pessoas, desde que o economista solicite com razoável antecedência, e uma sala de reunião com vídeo, caso seja preciso.

• HOTEL KUBITSCHEK PLAZA Vantagens – 54% de desconto de 2ª a 6ª-feiras e 62 % de 6ª a 2ª-feiras para os economistas de todo o Brasil registrados e em dia com suas obrigações, bastando para tal benefício apresentar sua carteira profissional. SHN Quadra 02 Bloco “E” – Setor Hoteleiro Norte/Asa Norte. Fone: (61) 319-3543 e Fax: (61) 328- 9366 (Kubitschek Plaza Hotel) SITE: www.kubitschek.com.br

E-MAIL: [email protected]

• ARACOARA HOTELVantagens – 40% de desconto de 2ª a 6ª-feiras sobre a tarifa balcão e 50% de desconto de 6ª a 2ª-feiras sobre a tarifa balcão. Essas vantagens são oferecidas aos economistas de todo Brasil registrados e em dia com suas obrigações, bastando para tal benefício apresentar sua carteira profissional.SHN Quadra 05 Bloco “C” – Setor Hoteleiro Norte/Asa Norte. Fone: (61) 424-9222. e Fax: (61) 424-9200 SITE: www.aracoara.com.br E-MAIL: [email protected]

• NUTRICARE – Nutrição Personalizada e Home CareVantagens – Para os economistas registrados e em dia com suas obrigações desconto de 20% nos seguintes serviços e benefícios: Consulta: preço nor-mal – R$ 80,00; preço para os economistas – R$ 55,00. Pacote completo para casal: preço normal – R$ 250,00; preço para os economistas – R$ 200,00. Pacote completo para casal com filhos: preço normal – R$ 300,00; preço para os economistas – R$ 240,00. Pacote para solteiro: preço normal – R$ 150,00; preço para os economistas – R$ 120,00. SGAS 910 Bloco “A” Sala 01 – Edifício Mix Park Sul. Fones: (61) 3201-4797 – 340-6442.E-MAIL: [email protected]

• HOTEL PORTO DA ILHAVantagens – Descontos: 25% de segunda a sexta, 28% sábado e domin-go, sobre o valor da diária, com apresentação da Carteira de Identidade Profissional.Rua Dom Jaime Câmara, 43 – Florianópolis/SC. Fone: (48) 322-0007SITE: http://www.portodailha.com.br

• CAMBIRELA HOTELVantagens – Desconto: 30% sobre o valor da diária de Balcão Vigente, com apresentação da Carteira de Identidade Profissional.Av. Max Schramm, 2199 – Florianópolis/ SC. Fone: (48) 281-3100

• BAÍA NORTE PALACE HOTELVantagens – Desconto: 25% sobre o valor da diária, com apresentação da Carteira de Identidade Profissional.Av. Rubens de Arruda Ramos, 220 – Florianópolis/SC. Fone: (48) 229-3144

• HOTEL CORONEL BERTASOVantagens – Desconto: 20% sobre o valor da diária, com apresentação da Carteira de Identidade Profissional.Av. Getúlio Dorneles Vargas, 52-S – Chapecó/SC. Fone: (49) 322-4444

• CORAL PLAZA HOTELVantagens – Desconto: 40% sobre o valor da diária, com apresentação da Carteira de Identidade Profissional.Rua Felipe Schmidt, 1320 – Florianópolis/SC. Fone: (49) 225.6002

• HOTEL CARLTON Vantagens – Desconto: 50% sobre as tarifas de hospedagem balcão de

2ª a 5ª-feiras e desconto de 60% sobre as tarifas de hospedagem-balcão de 6ª-feira a domingo, com a apresentação da Carteira de Identidade Profissional.

SHS – Quadra 05 Bloco “G” Setor Hoteleiro Sul/Asa Sul. TEL: (61) 224-8819 e FAX: (61) 226-8109 (Carlton Hotel Brasília) SITE: www.carltonhotelbrasilia.com.br

• HOTEL MAR DEL PLATA PRAIA HOTEL e VICTÓRIA PALACE HOTELVantagens – Desconto: 20% sobre o valor da tabela vigente no período de baixa temporada (15 de abril a 15 de dezembro), e desconto de 10% da tabe-la vigente no período de alta temporada (15 de dezembro a 15 de abril).Av. Madre Maria Vilac esq. Rua dos Eucaliptos, Canasvieiras – Florianópolis/SC, CEP 88.054-001Ligações Nacionais: (48) 266-1949, 9982-0499.SITE: www.mardelplata.com.br e www.vitoriapalacehotel.com.br E-MAIL: [email protected]

• PENNA FERNANDEZ, SAFE CARNEIRO & CALDAS PEREIRA ADVOGADOS ASSOCIADOSVantagens – A banca oferece descontos progressivos na assinatura do Plano Corporativo de Assistência Jurídica. Dependendo do número de processos administrados pelo escritório, o valor mensal a ser pago em honorários pro labore, por processo, pode chegar a custar R$ 65,00 para procedimentos sumários, e R$ 80,00 para procedimentos ordinários.SHIS, QL 06, conj. 05, casa 01, Lago Sul, Brasília/DF, CEP 71620-055 Mais informações: www.corecondf.org.br

• INSTITUTO MAUÁ DE PESQUISA E EDUCAÇÃOVantagens – Desconto de 20% sobre as mensalidades nos cursos de pós-graduação lato sensu.Via EPTG CA Vicente Pires, 54, salas 101/132 – Taguatinga-DFCEP 70.000-000 Fone: (61) 397-5251. Autos da Churrascaria Buffalo Bio.SITE: www.maua.com.brE-MAIL: [email protected]

jan/mar de 20059Revista de conjuntura

A R T I G O

Reações retardadas...

O Brasil cresceu 5,3% em 2004, com inflação de 7,4% e superávit em conta corrente. Foi o melhor resultado da eco-nomia nos últimos doze anos e, portanto, deve ser comemorado. Pelo andar da carruagem nestes primeiros meses de 2005, prova-velmente vamos ter uma inflação ligeiramente menor, mas dei-xando escapar a oportunidade de um crescimento mais robusto do Produto. Se tivermos sorte e se a política monetária for abençoada com um choque de lucidez, ter-minamos o ano com algo entre 4.5% e 5% de crescimento. A agricultura não vai repetir a ex-celente performance dos últimos anos devido a três fatores: clima desfavorável, por artes de El Niño - ele já começou o ano com uma seca arrasadora no sul; que-da nos preços agrícolas, iniciada no ano passado e sem sinais de recuperação no horizonte próxi-mo; cortes e atrasos no financia-mento dos implementos agrícolas da parte dos órgãos de fomento do governo em 2004, interrom-pendo o processo de melhoria da produtividade e moderniza-ção da agroindústria. A renda da agricultura vai cair este ano e os agricultores voltam a con-

viver com o velho problema do endividamento. A sorte do setor é que hoje ele pode contar com um ministério da agricultura que aumentou muito a eficiência e com um ministro atento e do ramo, o que deve amortecer a trombada .

O setor industrial mantém o crescimento, mas já sem a mes-ma motivação, devido à ressur-reição da política de juros altos e sem muita esperança de ver avançar rapidamente o processo de desoneração tributária. Esse estado de espírito já começa a se refletir nas decisões de investi-mentos, notadamente naqueles projetos voltados para a expansão de exportações. Ele atinge com mais profundidade um segmento especialmente dinâmico, as em-presas de médio e pequeno porte que apostaram no crescimento do comércio exterior e que hoje vêem seus investimentos ame-açados pelo “efeito tesoura” da taxa de câmbio valorizada e da taxa de juros, que voltou este mês ao topo das mais elevadas do mundo.

O desânimo do setor expor-tador é o problema mais grave para o crescimento da econo-mia, numa perspectiva de mé-

dio e longo prazo. O Brasil só venceu a estagnação destes últi-mos doze anos, crescendo mais de 5% em 2004, por causa da expansão das exportações, um movimento que começou lenta-mente quando se abandonou a âncora cambial em janeiro de 1999 e se acelerou com a forte desvalorização do real no período de transição da Presidência. A partir de 2002, a flutuação cam-bial, combinada com a expansão de crédito a juros decentes (em função da natureza e das garan-tias das operações), permitiu a recuperação em cheio do setor exportador brasileiro e, com ele, de nossa capacidade de cresci-mento. Os dois anos seguintes assistiram ao renascimento de um setor que fora sistematicamente desarticulado em duas décadas de políticas cambiais espasmó-dicas. Não é por acaso que este tenha sido o período de menor crescimento da economia do País e da renda dos brasileiros.

No segundo semestre de 2003 começou a ficar evidente que se abriam novas oportu-nidades de investimento pela expansão das demandas interna e externa, que garantiriam a sustentabilidade do crescimento,

Antonio Delfim Netto*

M a i s i n f o r m a ç õ e s n o s i t e : w w w . c o r e c o n d f . o r g . b r

jan/mar de 200510Revista de conjuntura

reduzindo rapidamente nossa vulnerabilidade externa.

Os resultados dessa mudan-

vel aceitar pacificamente a “pre-visão” de um aumento para 108 bilhões de dólares em 2005. É preciso dar ao Ministro Furlan a “meta” de 115 bilhões de dólares e fornecer-lhe os instrumentos e meios para atingi-la. As duas “previsões” valem a mesma coisa do ponto de vista objetivo, pois são produtos de avaliações sub-jetivas, mas o estabelecimento de uma “meta” sugere que, se per-dermos a batalha (que há de ser diária, semanal e mensal), tere-mos o conforto de tê-la perdido com honra.

Isso nos leva diretamente ao comportamento da taxa de câm-bio, que não é independente da taxa de juro real (que está acima de 13% ! ), exigida pela crença de que o Brasil não pode crescer mais do que 3,5% sem graves ris-cos inflacionários. O maior erro da autoridade monetária é não querer admitir que o real valori-zado , que inibe os investimentos no setor exportador, é sustentado pela maior taxa de juros do mun-do. As grandes corporações têm meios de se defender das proje-ções absurdas do COPOM, mas as pequenas e médias empresas ( que são as peças mais dinâmicas do mosaico exportador ) estão retardando as decisões de cres-

cimento da produção, alertadas pelo sinistro aviso do COPOM: “não invistam, porque não vai ter demanda amanhã nem no merca-do interno (que não pode crescer além de 3,5%) nem para expor-tar ( com o câmbio algemado à maior taxa de juros do mundo) ...”

A economia brasileira tem sido vítima de reações retardadas de seus estadistas e economistas, quando se trata de convencê-los de que o crescimento não se sus-tenta sem uma contínua e robusta expansão do comércio exterior . Se tivéssemos estudado um pou-co mais a história dos povos (dos fenícios à “moderna” China ) , não teríamos penalizado nossas exportações valorizando o câm-bio tantas vezes e por tanto tem-po. Há vinte e cinco anos crescí-amos a taxas iguais às do Japão e mais do que a China e a Coréia ; exportávamos tanto quanto a

China e mais do que a Coréia . Seus economistas vinham visi-tar-nos para conferir a taxa de 15%, até 20% de crescimento anual das exportações. Nas duas últimas décadas do século, con-gelamos o câmbio meia dúzia de vezes: as exportações murcharam e a economia entrou em estag-nação . Hoje, a China (que não permite a valorização cambial) exporta cinco vezes mais do que o Brasil, e sua taxa de crescimen-to do PIB é o dobro, e a pequena Coréia vende três vezes mais do que nós e sustenta taxas robustas de crescimento.

Em 2004 começamos a re-agir, mas receio que estejamos novamente diante da síndrome da reação retardada...

ça estão registrados no quadro abaixo:

A questão mais importante é saber como dar continuidade ao esforço exportador. Não é possí-

Fonte: IBGE, Banco Central

2001 2002 2003 20041.Crescimento do PIB(%) 1,3 1,9 0,5 5,32. Taxa de inflação (%) 7,7 12,5 9,3 7,43. Exportação (bi US$) 58,2 60,4 73,1 96,54. Saldo em c/corrente/PIB -4,5 -1,7 0,8 1,6

* Antonio Delfim NettoDeputado Federal (PP/SP)

jan/mar de 200511Revista de conjuntura

A R T I G O

O mercado de trabalho no DF de 1992 a 2004

Lílian Arruda Marques*Antonio Ibarra**

A Pesquisa de Emprego e Desemprego - PED, implantada no Distrito Federal em dezembro de 1991 e divulgada a partir de fevereiro de 1992, tem por ob-jetivo conhecer e acompanhar a situação do mercado de trabalho regional. A pesquisa utiliza me-todologia criada e desenvolvida pelo DIEESE e Fundação SEA-DE de São Paulo e, no Distrito Federal, é realizada em convênio com a Secretaria de Trabalho do GDF.

A PED-DF utiliza metodologia já aplicada em pesquisas idênticas nas áreas metropolitanas de São Paulo (desde 1985), Porto Alegre (desde 1992), Belo Horizonte (desde 1994), Salvador (reativada em 1996) e Recife (em 1997). Em termos conceituais e metodológi-cos, a PED se diferencia de outras pesquisas dessa natureza por am-pliar o conceito de desemprego,

Comentários com base na PED/DF

tornando-o assim mais adequado à realidade de países como o Bra-sil, onde a inserção da população no mercado de trabalho é marca-da por grande heterogeneidade. Assim sendo, a PED possibilita captar, além do desemprego aber-to, formas de desemprego que são comuns e importantes no mercado de trabalho brasileiro, tais como o desemprego oculto pelo trabalho precário e pelo desalento1, permi-tindo, com isso, fazer avaliações mais fidedignas de trabalho e de vida da população.

São pesquisados cerca de 2.500 domicílios mensalmente nas 19 regiões administrativas. Todos os moradores são entrevistados, havendo um formulário específico para as pessoas de 10 anos e mais. Os dados divulgados resultam da média trimestral móvel, no intuito de garantir uma maior representati-vidade às informações levantadas e

de analisar as grandes tendências no mercado de trabalho local, ao invés de focar em acentuadas variações mensais.

Assim, a pesquisa permite que tenhamos uma visão ampla do mercado de trabalho no Dis-trito Federal, cujos dados serão apresentados a seguir, analisando as médias anuais de 1992, 2003 e 2004.

O crescimento da PEA

Ao longo desses treze anos de pesquisa, o mercado de trabalho no Distrito Federal passou por grandes transformações. A parti-cipação da mulher aumentou sig-nificativamente, principalmente das chefes de família, e, apesar do significativo incremento na ocupação, o DF apresentou um crescimento da taxa média anual de desemprego nos últimos anos.

1 A) Desemprego aberto:Đúltimos sete (7) dias;B) Desemprego Oculto pelo Trabalho Precário: pessoas que realizam de forma irregular algum trabalho remunerado (ou não - remunerado, em ajuda a negócios de parentes) e que procuraram efetivamente trabalho nos trinta (30) dias anteriores ao da entrevista ou nos últimos (12) meses;C) Desemprego Oculto pelo Desalento: Pessoas que não possuem trabalho e nem procuraram nos últimos trinta (30) dias, por desestímulo do mercado de trabalho ou por circunstâncias fortuitas, mas apresentaram procura efetiva de trabalho nos últimos doze (12) meses.

jan/mar de 200512Revista de conjuntura

Essa tendência foi revertida em 2004, o que sinaliza que, em 2005, a taxa de desemprego pode continuar recuando.

A População Economica-mente Ativa – PEA – apresen-tou uma variação positiva, em 2004, de 3,3%, e nos treze anos (1992/2004), 58,7% (Tabela 1). Anualmente, é comum que mais pessoas ingressem no mercado de trabalho principalmente devido a fatores demográficos (a popula-ção no DF e no Brasil, em geral, está envelhecendo), educacionais (muitos jovens se formam e vão para o mercado de trabalho) e pessoais (busca de novas oportu-nidades profissionais), entre ou-tros. Porém, com o baixo cresci-mento econômico verificado nos últimos anos e com a acentuada queda do rendimento familiar, várias pessoas, destacando entre elas jovens, mulheres e idosos, se viram compelidos a buscarem novas ocupações, mesmo precá-rias, pois a complementação da renda tornou-se fundamental para garantir a mínima qualidade de

vida.O principal crescimento se

deu entre as mulheres, que, de 1992 a 2004, variou de 326,8 mil para 573,3 mil, ou 75,4%, en-quanto os homens apresentaram um incremento de 45,2% nesses treze anos.

A taxa de participação glo-bal reforça esse dado, uma vez que, de todas as pessoas acima de 10 anos que compunham a população do Distrito Federal em 1992, 60% delas estavam no mercado de trabalho, sejam em-pregadas sejam desempregadas. Em 2004, a taxa de participa-ção global já havia subido para 64,5%, sendo impulsionada pelas mulheres, cuja variação foi de 17,2%, enquanto nos homens a taxa de participação se manteve estável.

A maior participação das mulheres no mercado de traba-lho pode estar ligada a vários fatores, entre eles a queda do rendimento familiar nos últimos anos. Também influi o perfil do mercado de trabalho do Distrito Federal, com pouca participação

da indústria de transformação e da construção civil, que se torna mais atrativo às mulheres, além da maior escolaridade da mão - de - obra feminina em relação a outras metrópoles. Além disso, essa abertura de mercado às mu-lheres estaria proporcionando a possibilidade de realizações de seus projetos profissionais.

Por faixa etária, a maior participação na PEA está loca-lizada entre os 25 e 55 anos. A faixa etária acima dos 55 anos, embora menor em termos numé-ricos, apresentou a maior taxa de crescimento, 67,2%, sinalizando que a queda da renda familiar também forçou esse segmento a entrar no mercado de trabalho.

A ocupação e o desemprego

O fato de mais pessoas ingres-sarem no mercado de trabalho não representa necessariamente que as mesmas conseguiram uma ocupação. Enquanto a PEA variou 58,7% em treze anos (Ta-bela 1), o contingente de pessoas ocupadas cresceu 48,3% (Tabela

Tabela 1 – Principais Indicadores do Distrito Federal

Indicadores 1992 2003 2004 Variação % 04/03 04/92População Economicamente Ativa (PEA)(em mil) 733,2 1.126,2 1.163,5 3,3 58,7

Homens 406,4 576,0 590,2 2,5 45,2Mulheres 326,8 550,2 573,3 4,2 75,4

Taxa de Participação Global (PEA/PIA)( %) 60,0 64,5 64,5 0,0 7,5Homens 71,5 72,0 71,4 -0,8 -0,1Mulheres 50,0 58,1 58,6 0,9 17,2

PEA, segundo Faixa Etária (em mil) 10 a 15 21,5 10,7 12,7 18,7 -40,916 a 24 217,1 313,9 314,5 0,2 44,925 a 55 466,4 750,5 779,6 3,9 67,256 e mais 28,2 51,1 56,7 11,0 101,1

Fonte: PED/DF (Convênio: STb/GDF, DIEESE e SEADE/SP).

jan/mar de 200513Revista de conjuntura

2) e o de desempregadas, 115,8% (Tabela 3). Ou seja, muitas pes-soas que buscaram o mercado de trabalho não encontraram ocupa-ção.

Como as mulheres tiveram um crescimento significativo no mercado de trabalho, também é significativa sua participação entre os ocupados e os desempre-gados. Entre os ocupados, en-quanto a variação da participação dos homens foi de 37,9%, entre

as mulheres atingiu 61,8%. Entre os desempregados, enquanto a variação na participação dos ho-mens foi de 91,3%, as mulheres tiveram uma variação de 139,2%. Em 2004, por exemplo, enquanto a taxa de desemprego total ficou em 20,9%, os homens apresen-taram uma taxa de 17,8% e as mulheres, 24,0%.

Interessante também observar que o mesmo movimento ocorre entre os chefes de família: tanto

entre os ocupados e desemprega-dos, o maior crescimento se dá entre as mulheres.

Quando analisamos a ocupa-ção por escolaridade, observamos que, em 2004, essa expansão foi muito semelhante entre os diferentes níveis, exceto para os analfabetos, que permaneceu estável. Porém, quando compara-mos os dados de 2004 com 1992, observamos o incremento no ní-vel ocupacional, principalmente,

Tabela 2 – Distribuição da População Ocupada no Distrito Federal: 1992,2003 e 2004

População Ocupada) (em mil) 1992 2003 2004 Variação % 04/03 04/92Ocupados 620,5 868,6 920,2 5,9 48,3

Homens 351,4 459,7 484,7 5,4 37,9Mulheres 269,1 409,0 435,5 6,5 61,8

Chefes de Família Ocupados 289,7 414,6 437,3 5,5 50,9Homens 240,5 314,7 330,0 4,9 37,2Mulheres 49,2 99,9 107,3 7,4 118,1

Ocupados, segundo Grau de Escolaridade Analfabetos 29,8 15,6 15,6 0,0 -47,7Até 1º grau completo 298,4 300,0 318,4 6,1 6,7Até 2º grau completo 173,4 334,9 353,8 5,6 104,0Superior completo e incompleto 110,5 216,4 230,6 6,6 108,7

Fonte: PED/DF (Convênio: STb/GDF, DIEESE e SEADE/SP).

Tabela 3 – Distribuição da População Desempregada no Distrito Federal: 1992,2003 e 2004

População Desempregada) (em mil) 1992 2003 2004 Variação % 04/03 04/92Desempregados 112,7 257,4 243,2 -5,5 115,8

Homens 55,1 116,3 105,4 -9,4 91,3Mulheres 57,6 141,1 137,8 -2,3 139,2

Chefes de Família Desempregados 73,3 165,7 151,6 -8,5 106,8Homens 34,1 68,0 59,6 -12,4 74,8Mulheres 39,2 97,7 92,0 -5,8 134,7

Desempregados, segundo Grau de Escolaridade Analfabetos 5,4 (1) (1) (1) (1)Até 1º grau completo 71,3 114,5 103,6 -9,5 45,4Até 2º grau completo 29,3 114,3 110,9 -3,0 279,5Superior completo e incompleto 6,7 24,1 24,7 2,5 268,7

Fonte: PED/DF (Convênio: STb/GDF, DIEESE e SEADE/SP).(1) Sem consistência estatística.

jan/mar de 200514Revista de conjuntura

entre os de maior escolaridade. Essa exigência tornou-se comum mesmo para funções onde não é necessária muita qualificação; mas, com o processo de reestru-turação produtiva, a introdução de novas tecnologias e novas formas de gestão, a qualificação tornou-se uma questão decisiva principalmente para as ocupações melhor remuneradas.

Já entre os desempregados também cresceu, em ritmo supe-rior ao da ocupação, o número de pessoas com maior escolaridade, sinalizando um aumento signifi-cativo na média de escolaridade da população no Distrito Federal. Apesar da queda significativa dos desempregados com até primeiro grau completo, ao longo dos treze anos a variação foi de 45,4%. Em relação a 2003, a variação negativa de 9,5% entre os desempregados com até o primeiro grau completo e a variação positiva entre os ocu-pados com o mesmo grau de esco-laridade demonstram que muitos postos foram criados numa faixa de onde se concentra um grande número de desempregados; isso é positivo, porém, com baixos salários e, muitas vezes, com relações precárias de emprego.

Nesse sentido, é importante o es-tabelecimento de políticas públi-cas na área educacional para esse público, pois, com a continuidade do crescimento econômico e novos investimentos em tecnologia, mui-tos serão excluídos do mercado de trabalho a médio ou longo prazo.

Esses dados demonstram que só o fato de a pessoa ter maior escolaridade não garante que a mesma irá conseguir uma ocupa-ção. Apesar do número de pes-soas desempregadas com nível superior completo e incompleto ser baixo, o crescimento foi mui-to significativo, 2,5% em 2004 - um ano com queda nas taxas de desemprego e saldo positivo de novas ocupações – e de 268,7% de 1992 a 2004.

Quanto aos analfabetos, é im-portante observar que a ocupação dessas pessoas vem caindo e que o número de desempregados é tão pequeno que não tem consistência estatística. Talvez dois fatores sejam importantes nesse caso: a baixa presença de analfabetos na população de Brasília e a ida para a inatividade das pessoas nessas condições exatamente pela falta de oportunidades num mercado cada dia mais exigente.

População ocupada por setor de atividade econômica

O mercado de trabalho no DF possui características bem diferen-tes de outras regiões, principal-mente pela baixa participação no PIB local da indústria de trans-formação e da construção civil, além da marcante presença da administração pública. As mais altas remunerações oriundas dos servidores públicos estimulam outros setores de atividade, prin-cipalmente aqueles relacionados aos serviços. Assim, aproxima-damente 10% dos ocupados no Distrito Federal são empregados domésticos, taxa mais alta entre as regiões metropolitanas pesqui-sadas pelo DIEESE e Fundação SEADE.

A Tabela 4 apresenta resulta-dos positivos em todos os setores para 2004, com destaque para o setor de serviços, que, além de ser o que mais emprega, também é que mais cresce ao longo dos anos. Em 2004, esse setor já em-pregava 56,17% do total de ocu-pados no Distrito Federal.

A Administração Publica (fe-deral e do DF) apresentou uma variação de 38,8% ao longo dos

Tabela 4 – Distribuição da População Ocupada no Distrito Federal, segundo Setor de Atividade Econômica: 1992,2003 e 2004

Setor de Atividade Econômica (em mil) 1992 2003 2004 Variação % 04/03 04/92Indústria de Transformação 26,6 31,5 33,3 5,7 25,2Construção Civil 34,2 30,6 32,3 5,6 -5,6Comércio 93,4 137,1 145,7 6,3 56,0Serviços 325,6 484,7 516,9 6,6 58,8Administração Pública 132,1 176,4 183,3 3,9 38,8Outros Setores 8,6 8,3 8,7 4,8 1,2Total 620,5 868,6 920,2 5,9 48,3

Fonte: PED/DF (Convênio: STb/GDF, DIEESE e SEADE/SP).

jan/mar de 200515Revista de conjuntura

treze anos, menor que a variação total dos ocupados, de 48,3%, di-minuindo assim sua participação no total dos ocupados ao longo dos anos.

O comércio, o terceiro maior setor que emprega no Distrito Federal, apresentou uma variação positiva de 56,0%, muito signifi-cativa para o período.

Rendimentos

O rendimento médio real teve uma queda significativa entre 1992 e 2004. Para o total dos ocupados, a queda do rendimen-to foi de 14,2% nesse período e 1,2% em 2004 (Tabela 5). Quan-do o dado é desagregado para as diferentes posições na ocupação, é possível observar onde a perda

do poder aquisitivo foi mais sig-nificativa: entre os assalariados do setor privado com carteira de trabalho assinada houve uma queda real de 22,1%. Para os assalariados do setor privado sem carteira de trabalho assinada houve uma queda de 7,4% em 2004, mas um crescimento real de 19,9% em treze anos de análise.

A diferença nas remunerações entre os assalariados com carteira de trabalho assinada e os sem car-teira diminuiu ao longo dos anos, principalmente em função do recuo nos rendimentos dos assa-lariados com carteira de trabalho assinada.

Em relação a 2003, o setor público apresentou um cresci-mento no rendimento médio real (4,3%), auxiliando a estabiliza-

ção da remuneração média dos assalariados, uma vez que o setor privado apresentou comporta-mento negativo (1,4%).

O Gráfico 1 apresenta a di-ferença entre as remunerações das mulheres e dos homens. Essa diferença vem caindo nos últimos treze anos, mas esse fato deve ser explicado pela queda na remune-ração dos homens e não pelo cres-cimento da renda das mulheres. O gráfico demonstra que, entre os anos extremos, houve uma relativa estabilidade nas remunerações das mulheres, enquanto as remu-nerações masculinas despencam principalmente após 1999, ano da desvalorização do Real.

Em 2004, apesar da diminui-ção na brecha entre homens e mulheres, as mulheres ainda ga-

Gráfico 1 – Rendimento Médio Real no Distrito Federal, segundo Sexo.

Fonte: PED/DF (Convênio: STb/GDF, DIEESE e SEADE/SPNota: valores em R$ a preços de dezembro de 2004.

Tabela 5 – Rendimento Médio Real da População Ocupada no Distrito Federal, segundo Posição na Ocupação: 1992,2003 e 2004(em R$)

Posição na Ocupação 1992 2003 2004 Variação % 04/03 04/92Ocupados 1.422 1.235 1.220 -1,2 -14,2Assalariados 1.654 1.388 1.398 0,7 -15,5Setor Privado 907 765 754 -1,4 -16,9Com Carteira de Trabalho Assinada 1.014 792 790 -0,3 -22,1Sem Carteira de Trabalho Assinada 498 645 597 -7,4 19,9Setor Público 2.451 2.397 2.499 4,3 2,0

Fonte: PED/DF (Convênio: STb/GDF, DIEESE e SEADE/SP).

jan/mar de 200516Revista de conjuntura

nham, em média, 70,8% do que os homens auferem.

Taxa de Desemprego Total no DF e Regiões Metropolitanas

Em convênio entre o Fundo de Amparo ao Trabalhador do Ministério do Trabalho (FAT/MTE), o DIEESE e a Fundação SEADE/SP, a pesquisa de empre-go e desemprego também abran-ge regiões metropolitanas além do Distrito Federal. Devido à diferença nas datas de implanta-ção, somente a partir de 1998 os

dados das seis localidades podem ser comparados.

O Distrito Federal apresentou, em 2004, uma queda significati-va de dois pontos percentuais na taxa de desemprego total. Essa expressiva queda só não foi maior do que a região metropolitana de Salvador, onde o recuo foi de dois e meio pontos percentuais.

Entre os anos extremos na mesma tabela, nota-se o acentu-ado crescimento (3,4 pontos per-centuais) na taxa de desemprego total da região metropolitana de Belo Horizonte. Dentre as regiões

Região Metropolitana 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004Belo Horizonte 15,9 17,9 17,8 18,3 18,1 20,0 19,3Distrito Federal 19,7 22,1 20,2 20,5 20,7 22,9 20,9São Paulo 18,2 19,3 17,6 17,6 19,0 19,9 18,7Porto Alegre 15,9 19,0 16,6 14,9 15,3 16,7 15,9Recife 21,6 22,1 20,7 21,1 20,3 23,2 23,1Salvador 24,9 27,7 26,6 27,5 27,3 28,0 25,5

Tabela 6 – Taxa de Desemprego Total, segundo Regiões Metropolitanas e o Distrito Federal: 1998-2004 (em %)

Fonte: Convênio DIEESE/SEADE, MTE/FAT e convênios regionais. PED - Pesquisa de Emprego e Desemprego.

* Lílian Arruda MarquesSupervisora Regional DIEESE/DF.

** Antonio IbarraCoordenador PED-DF pelo DIEESE.

onde mais aumentou a taxa de desemprego seguem Recife (1,5 p.p.) e Distrito Federal (1,2 p.p.). Além disso, destacamos a relativa estabilidade, entre os anos extre-mos, nas região metropolitanas de São Paulo e de Porto Alegre.

Também ressaltamos que, comparando os anos de 1999 e 2003, anos em que o crescimento da economia brasileira foi baixo, o último ano apresentou taxas de desemprego total nas regiões metropolitanas mais elevadas do que em 1999, com exceção de Porto Alegre.

jan/mar de 200517Revista de conjuntura

1. Introdução

A transformação do Brasil de uma economia primário-ex-portadora para industrial deve ser avaliada considerando a incapacidade de o País superar, até hoje, as graves desigualdades econômicas e sociais existentes. Esses desequilíbrios estão inti-mamente vinculados com dife-renças regionais, limitadoras da expansão do mercado interno e do crescimento econômico e de-senvolvimento nacional.

Celso Furtado é o autor que primeiro abordou de maneira efetiva a questão estrutural limi-tadora do desenvolvimento bra-sileiro, considerando os papéis das desigualdades regionais e do mercado interno. Sua importân-cia não se restringe ao aspecto teórico, com seu método próprio de análise, mas também em ter-mos práticos, em função de suas várias passagens por cargos no governo central.

A R T I G O

Desigualdades regionais e desenvolvimento

Constantino Cronemberger Mendes*

Uma releitura das contribuições de Celso Furtado

Obs.: este artigo é uma versão modificada dos Textos para Discussão publicados pela UnB (Dept. de Economia/nº 390) e pelo Ipea (nº1501), em co-autoria com o Prof. Joanílio Teixeira, da UnB.

Mesmo no contexto atual, as idéias de Furtado continuam válidas em certos aspectos, ao considerar o problema das desi-gualdades regionais e o papel do mercado interno como questões fundamentais ao crescimento e ao desenvolvimento econômico do País. Assim, este artigo pro-cura fazer uma releitura da obra de Furtado por meio de uma ava-liação dividida em três seções, além desta introdução e das con-clusões.

Na primeira, são consideradas suas principais contribuições teóricas e avaliados os aspectos considerados fundamentais, o mercado interno e a questão re-gional, revelando uma nova leitu-ra metodológica ao incorporar o aspecto regional como central na sua análise. Na seção seguinte, é apresentada uma síntese do perí-odo 1940-1980, em que prevale-ce o modelo de desenvolvimento de substituição de importações, e suas ligações com a abordagem

de Furtado. Na última seção, é discutida a ruptura, nos anos 1990, do modelo anterior, por meio da adoção de políticas de cunho liberal, e apresentada uma releitura dos aspectos centrais enfatizados (questão regional e mercado interno) no debate recente, mostrando suas interfa-ces com a discussão original de Furtado.

2. Contribuições teóricas de Celso Furtado

As contribuições teóricas mais significativas de Furtado co-brem o período conhecido como a “Era de Ouro”, marcado por forte crescimento econômico e transformação social no mundo. Ele interpreta as influências da readaptação sofrida pelo capi-talismo no pós-Segunda Guerra Mundial. Trata-se, porém, de uma construção teórica não usual da Economia – não apenas por sua insistência por adotar elementos multidisciplinares, como por

jan/mar de 200518Revista de conjuntura

incluir delimitações analíticas em termos de espaço (geografia) e tempo (história), noções au-sentes na ortodoxia econômica. Cabe observar, ainda, o fato de Furtado atuar como policy maker em certas ocasiões, o que serviu para readaptar sua análise teórica original, constituindo sua motiva-ção política aliada ao tratamento teórico do subdesenvolvimento.

Furtado utiliza um método analítico próprio (apesar de todas as influências que podem ser co-nectadas a ele),1 denominado de “histórico-estrutural” (Bielscho-wsky, 2000, p. 34). Porém, res-paldada pela afirmação de Pasi-netti (1993) sobre o uso do termo “mudança estrutural”, adotado por Perroux2 e incorporado na abordagem “institucional-históri-co-descritiva” dos estruturalistas

e, em particular, por Furtado, entende-se que sua abordagem compreende uma visão “histó-rico-regional-estruturalista” do subdesenvolvimento brasileiro. Na mesma direção, Mallorquin (2000) considera a preocupa-ção com a questão de espaço (geografia) e tempo (história) na sua análise estruturalista do subdesenvolvimento. Tratamento semelhante é encontrado, ainda, em Oliveira (2003), que observa a trajetória intelectual de Furtado ligada à questão regional, em especial ao Nordeste brasileiro.

Sua abordagem teórica pode ser avaliada em três etapas: a primeira, construída a partir da década 1940, analisa o subdesen-volvimento de um ponto de vista mais teórico; a segunda, dos anos 50 aos 70, considera aspectos

sócio-econômicos e políticos, influenciados por suas experiên-cias políticas; e a terceira, nos anos 80, com sua transição para a problemática do subdesenvolvi-mento no plano cultural.

O estruturalismo como sis-tema analítico, concebido ori-ginalmente por Prebisch (1949 e 1951) no período inicial da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Ce-pal), tem por base a caracteriza-ção das economias periféricas (subdesenvolvidas) em contraste com as economias centrais (desenvolvidas). Os aspectos principais (Bielschowsky, 2000) nesse contraste referem-se a: baixa diversidade produtiva; reduzida integração horizontal e vertical; insuficiente infra-estrutura; especialização em bens primários; heterogeneidade tecnológica; oferta ilimitada de mão-de-obra desqualificada; e estrutura institucional incompa-tível com a acumulação de capi-tal e progresso técnico. A partir dessa contextualização, realiza-se a análise da forma de inserção das economias subdesenvolvidas no ambiente internacional e das condições para a superação das situações adversas das econo-mias periféricas, por meio de um processo de industrialização conduzido por um planejamento estratégico, tendo o Estado como agente principal.

As principais contribuições de Furtado à abordagem estrutu-ralista são consideradas em três aspectos principais: a inclusão da dimensão histórica; a análise

“As principais contribuições de Furtado

à abordagem estruturalista são

consideradas em três aspectos principais:

a inclusão da dimensão histórica; a

análise das relações entre crescimento

e distribuição de renda; e a ênfase do

sistema cultural como característica

específica do subdesenvolvimento das

economias periféricas”.

1. Entre as principais influências estão: Keynes, Friedrich List, Marx, Mannheim, Schumpeter, Kaldor, Kalecki, Joan Robinson, Perroux, Myrdal, Nurkse, Prebisch e Gilberto Freyre.

2. Perroux (1950) defineĐ(história).

jan/mar de 200519Revista de conjuntura

das relações entre crescimento e distribuição de renda; e a ênfase do sistema cultural como carac-terística específica do subdesen-volvimento das economias peri-féricas. Considera-se aqui como mais uma contribuição teórica de Furtado o destaque dado ao aspecto regional como limitante de um projeto nacional integrado de desenvolvimento. Furtado faz sua leitura do País incorporando um fator geográfico na dimensão analítica “histórico-estrutural”. Ao inserir no debate sobre o subdesenvolvimento a questão das desigualdades (sociais e de renda), o caráter regional é con-siderado como elemento central de análise, enfatizado também do ponto de vista político, de maneira mais direta na região Nordeste.

2.1. A questão regional e o (sub)desenvolvimento

Não obstante a aceitação das contribuições teóricas mencio-nadas anteriormente, observa-se que as leituras sobre a obra de Furtado não dão a devida re-levância à questão regional no arcabouço metodológico do au-tor. Assim, procura-se destacar como aspecto diferencial na aná-lise das contribuições teóricas de Furtado a sua leitura regional na interpretação histórico-estrutura-lista da relação desenvolvimen-to/subdesenvolvimento associa-da ao caso brasileiro.

As leituras do seu livro mais conhecido (Formação Econô-mica do Brasil) não consideram a questão regional como a mais importante, tendo em vista a prevalência da leitura “histórico-estruturalista” que consolidou o seu método original de análise. O tema regional é considerado

apenas como parte das questões distributivas, ou seja, no contexto espacial das desigualdades, a ser tratado adiante.

Contudo, já na própria com-posição dos capítulos daquele livro é possível perceber o in-teresse do autor em diferenciar regionalmente a formação “his-tórico-estrutural” econômica do Brasil. Assim, pode-se encontrar um capítulo (XI) que trata da for-mação do complexo econômico nordestino e outro (XVI) sobre o Maranhão (que, ao lado do Pará, é tratado como centro autônomo no Norte, porém articulado com a região açucareira, no Nordeste, e com a economia mineira, abor-dada na terceira parte do livro). Finalmente, o capítulo XXXII trata do deslocamento do centro dinâmico para o Sudeste (com o café e, posteriormente, a indús-tria).

No que diz respeito ao com-plexo nordestino, Furtado (op. cit. p. 61) observa que as formas que assumem os dois sistemas da economia nordesti-na – o açucareiro e o criatório – no lento processo de deca-dência que se inicia na segunda metade do século XVII, consti-

tuem elementos fundamentais na formação do que no século XX viria a ser a economia bra-sileira.

Na mudança do centro dinâ-mico da economia para o Sudes-te, ele observa que(...) o desenvolvimento da pri-meira metade do século XX apresenta-se basicamente como um processo de articulação das distintas regiões do país em um sistema com um mínimo de integração. Se, por um lado, o rápido crescimento da econo-mia cafeeira entre 1880 e 1930 criou fortes discrepâncias re-gionais de níveis de renda per capita, por outro dotou o Brasil de um sólido núcleo em torno do qual as demais regiões tive-ram necessariamente de articu-lar-se (op. cit. p. 238).

Essa análise compreende, portanto, uma abordagem his-tórico-estruturalista (centro versus periferia) não apenas no contexto internacional, mas tam-bém do ponto de vista interno (regional) no caso específico do Brasil. Assim, entende-se que o autor faz uma leitura regional a fim de enfatizá-la como elemento central na evolução do processo

1. Entre as principais influências estão: Keynes, Friedrich List, Marx, Mannheim, Schumpeter, Kaldor, Kalecki, Joan Robinson, Perroux, Myrdal, Nurkse, Prebisch e Gilberto Freyre.

2. Perroux (1950) defineĐ(história).

“Procura-se destacar como aspecto

diferencial na análise das contribuições

teóricas de Furtado a sua leitura regional

na interpretação histórico-estruturalista da

relação desenvolvimento/subdesenvolvimento

associada ao caso brasileiro”.

jan/mar de 200520Revista de conjuntura

de industrialização e da implanta-ção do modelo de substituição de importações no País. Segundo ele (idem, ibidem):(...) o processo de industrializa-ção começou no Brasil conco-mitantemente em quase todas as regiões (...). Entretanto, supera-da a primeira etapa de ensaios, o processo de industrialização tendeu naturalmente a concen-trar-se numa região (Sudeste). A etapa decisiva de concentração ocorreu, aparentemente, durante a primeira guerra mundial, épo-ca em que teve lugar a primeira fase de aceleração do desenvol-vimento industrial (...). Os dados de renda nacional parecem indi-car que esse processo de concen-tração se intensificou no após-II guerra mundial. A conseqüência tem sido uma disparidade cres-cente nos níveis de renda per capita entre as diversas regiões.

Dessa forma, o autor pre-nuncia (p. 240-242) que “essa disparidade de níveis de vida, que se acentua atualmente entre os principais grupos da popula-ção do País, poderá dar origem a séries tensões regionais. A solu-ção desse problema constituirá, muito provavelmente, uma das

preocupações centrais da políti-ca econômica no correr dos pró-ximos anos”.

Furtado continua prevendo que o processo de integração econômica dos próximos de-cênios, por um lado, exigirá a ruptura de formas arcaicas de aproveitamento de recursos em certas regiões e, por outro, re-quererá uma visão de conjunto do aproveitamento de recursos e fatores no País. Nesse momento, ele considera a relação entre in-tegração regional e crescimento: “É de supor que, caso progrida essa integração, a taxa média de crescimento da economia tenderá a elevar-se”.

Portanto, a visão regional se impõe como tema fundamen-tal, senão central, de análise da questão da distribuição de renda, relacionada ao problema de pro-priedade fundiária ou aos confli-tos sociais advindos do caráter inerente ao processo produtivo capitalista. A preocupação com a unidade, a integração nacional, a “visão conjunta do aprovei-tamento de recursos e fatores”, associada ao receio de conflitos regionais, comprova que a ques-tão regional constitui-se em tema

singular de avaliação e compre-ende uma das bases da confor-mação estrutural heterogênea do país. As questões de propriedade da terra e de conflitos sociais as-sumem, assim, contornos regio-nais específicos, em decorrência da evolução histórica diferencia-da das diversas regiões do País, definindo estruturas econômicas regionais distintas (elas próprias heterogêneas).

3. Contribuições políticas de Celso Furtado

Quando se observa a distri-buição das escolas de pensa-mento econômico nacionais que atuaram no debate da década de 1950, Bielschowsky (1988) mostra que a maioria absoluta compartilhava a crença no papel fundamental da ação reguladora estatal. Esse contexto de adesão sobre a importância do Estado para se alcançar o desenvolvi-mento auxilia a análise de Furta-do, embora assimilado sob uma ótica particular. As diferenças surgem no seu entendimento da evolução do capitalismo em países em condições estruturais desiguais. Enquanto nos países desenvolvidos, onde surgiu a social-democracia, a diversifica-ção das funções do Estado viria manter o crescimento e ampliar o bem-estar social via regula-ção de direitos trabalhistas, leis assistenciais etc., nos países subdesenvolvidos o aumento da ação do Estado tornava-o agente direto responsável pelo incenti-vo ao desenvolvimento.

O caráter de bem-estar so-cial não foi preponderante no Brasil porque, segundo a visão geral dominante ainda hoje, a distribuição da riqueza ocorreria

“A visão regional se impõe como tema

fundamental, senão central, de análise da

questão da distribuição de renda, relacionada

ao problema de propriedade fundiária ou aos

conflitos sociais advindos do caráter inerente ao

processo produtivo capitalista”.

jan/mar de 200521Revista de conjuntura

posteriormente à implantação do modelo de crescimento (no-ção do “crescer primeiro para repartir depois”). Assim, o papel do planejamento, do Estado e da burocracia estatal tem de ser visto dentro de projetos políticos distintos.

A polêmica entre Eugênio Gudin e Roberto Simonsen, a criação da Cepal e o debate de-senvolvimentista, no pós-Segun-da Grande Guerra, produzem um corpo teórico que fundamenta e consolida o projeto industrial no Brasil. O desenvolvimento in-dustrial passa a ser pré-requisito do desenvolvimento nacional. Os fatores provenientes desse ambiente acabam refletindo um conflito ideológico interno que se traduz numa forte disputa pelo controle do aparelho de Estado. Furtado interpreta esse fenômeno como um processo de ruptura que ocorre quando o desenvolvimento das atividades industriais colide frontalmente com a anterior inserção do país na divisão internacional do co-mércio, tendo em vista que a industrialização via substituição de importações volta sua aten-ção para o mercado interno em franco crescimento (da popula-ção e do padrão de vida).

Celso Furtado define as alter-nativas que se abrem à economia nacional como uma “internali-zação dos centros de decisão”. Esse aspecto é importante do ponto de vista da criação de sen-timento de nacionalidade, como atributo distinto de outros de-fensores do desenvolvimentismo com apoio do capital externo. A perspectiva da vinculação entre desenvolvimento econômico e desenvolvimento do conjunto da

estrutura social constitui produto da análise furtadiana. A idéia de substituição de importações e da possibilidade de aprofun-dar o processo até o estágio de implantação da indústria pesada no País combina três elementos presentes na teoria cepalina: a diversificação da estrutura pro-dutiva, o tamanho do mercado interno e a capacidade para im-portar. A novidade nessa primei-ra fase é a adoção do consumo, priorizando a renda auferida pelos trabalhadores, como cen-tro do processo de expansão sem conflitos do capitalismo.

A partir desse quadro mun-dial e nacional, surge a questão do planejamento regional, que teve a contribuição e a partici-pação diretas de Furtado quan-do ele se desligou definitiva-mente da Cepal e assumiu uma diretoria do BNDE, no período de setembro de 1958 a julho de 1959. Foi nomeado interventor no Grupo de Trabalho para o Desenvolvimento do Nordeste (GTDN), cujo estudo final, Uma política de desenvolvimento para o Nordeste, é marco da criação, em 1959, da Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (Sudene), primeiro órgão de de-senvolvimento regional do País

e considerada uma experiência original no mundo. Furtado seria o seu primeiro superintendente.

Em documento da Sudene de 1962, Ianni (op. cit. p. 161) salienta o diagnóstico de que a deficiência estrutural da eco-nomia nordestina, baseada em agricultura de subsistência, e a pressão demográfica crescente agravariam problemas sociais e políticos, comprometendo a uni-dade e a segurança internas. Con-forme Oliveira (2000, p. 109), “antecipando uma teorização que somente veio a produzir-se nos anos 1970, Furtado propôs uma reformulação da Federação nos moldes de um federalismo regio-nal cooperativo”.

Ao contrário da afirmação corrente, no sentido de que o problema do Nordeste era a seca, Furtado afirma que o problema provém da reconfiguração do desenvolvimento brasileiro e da forma como essa região está inserida na mesma. A causa (Bacelar, 2000, p. 168-169) “era a estrutura sócio-econômica e política montada há séculos na região. A explicação estava na nossa formação histórica.” Esse diagnóstico regional semelhante ao nacional, no arcabouço “his-tórico-estruturalista”, possibilita

“A perspectiva da vinculação entre

desenvolvimento econômico e

desenvolvimento do conjunto da

estrutura social constitui produto da

análise furtadiana”.

jan/mar de 200522Revista de conjuntura

um movimento teórico-político cada vez maior em direção a uma “regionalização” do modelo de substituição de importações. Na década de 1960, Furtado elabora os dois primeiros pla-nos de desenvolvimento para o Nordeste (Operação Nordeste), concebendo e implantando po-líticas de incentivos fiscais para os investimentos naquela região. Posteriormente, esse modelo foi expandido para as regiões Norte [Sudam] e Centro-Oeste [Sude-co], incentivando a descentrali-zação da indústria em expansão no País.

Sua tese, elaborada no pe-ríodo militar, segundo a qual regimes fechados conduziriam inevitavelmente ao estrangula-mento econômico, não se confir-mou. Anos mais tarde, Furtado reconsiderou suas posições, in-troduzindo o conceito de “moder-nização do subdesenvolvimento”. Porém, como já previa Furtado (1968), o crescimento apoiado no mercado interno dependia, necessariamente, da prévia dis-tribuição de renda. Por causa do anacronismo da estrutura agrária, o crescimento provocou, em muitas regiões, o aumento relati-vo da renda da terra, premiando grupos parasitários. Na ausência

de uma política consciente que preservasse à ação do Estado o seu caráter social, improvisou-se em nome do desenvolvimento uma estrutura de subsídios que muitas vezes premiou os investi-mentos supérfluos ou aqueles que vinham permitir, dada a sua ten-dência monopolística, uma maior concentração de riqueza em mãos de grupos privilegiados.

Os trabalhos posteriores à década de 1970 avaliam que o crescimento da economia brasi-leira, durante o regime militar, introduziu certos aspectos do capitalismo contemporâneo, como novos padrões de consu-mo, urbanização e surgimento de novos segmentos produtivos. Nos aspectos fundamentais, os padrões tecnológicos e a moder-nização da produção (aumento da produtividade e técnicas de capital intensivo) permaneceram defasados e sem transformações profundas, distantes dos padrões de modernidade as questões dos direitos sociais, da participação política, da função social do Es-tado e o problema da democracia.

Na década de 1980, as for-tes críticas ao modelo adotado anteriormente, bem como as condições práticas existentes no ambiente interno e externo, resul-

taram no esgotamento do modelo substitutivo de importações nos moldes então implementados. As características tecnológicas mun-diais (inovação gerencial e or-ganizacional) mudaram radical-mente a base técnica da indústria e conformaram um novo padrão de desenvolvimento. A partir da segunda metade dessa década, novos paradigmas foram coloca-dos no debate internacional sobre crescimento econômico. O Brasil desse período, porém, foi mar-cado por adoções de políticas de curto prazo em razão de tentati-vas de estabilização econômica e de ajustamento externo que aca-baram comprometendo a adoção de uma política de crescimento de longo prazo.3

No fim desse período, pode-se observar a existência de idéias que vão ao encontro do defendido por Furtado ao lon-go dos anos, tal como a tese de Barros de Castro (ver Bielscho-wsky, 2000, p. 50), que intro-duz a noção de crescimento via mercado interno de consumo de massa, produzido no efeito pós-Plano Cruzado (1996) e, poste-riormente, fortalecido no pós-Plano Real (1995). Isso mostra a compatibilidade entre o aumento real dos salários (redistribuição de renda em prol do trabalhador) e a ampliação de bens e serviços das empresas já instaladas no País, inclusive multinacionais.

4. Releitura de furtado no período recente

4.1. Década de 1990: Ruptura do modelo anterior

Muitos estudiosos consideram

“As características tecnológicas mundiais

(inovação gerencial e organizacional)

mudaram radicalmente a base técnica da

indústria e conformaram um novo padrão de

desenvolvimento”.

3. Como ressaltado por Formiga (2000, p. 249), “desde o governo Geisel, o Brasil deixou de pensar a região e a cidade”.

jan/mar de 200523Revista de conjuntura

que Furtado, nas década de 1980 e 1990, passou à categoria de clássico, como um autor necessá-rio à compreensão do desenvol-vimento brasileiro e da transição da economia mercantil para a industrial. Todavia, boa parte dos economistas consideram as re-ferências conceituais de Furtado pouco explicativas dos desafios da economia nesse novo período.

Apesar da avaliação corrente nessa direção, podem-se encon-trar análises de Furtado (1992) que contrariam essa interpre-tação, quando ele observa, no início dos anos 1990, que “a partir do momento em que o motor do crescimento deixa de ser a formação do mercado interno, para ser a integração com a economia internacional, os efeitos de sinergia gerados pela interdependência das distintas regiões do País desaparecem, enfraquecendo consideravelmen-te os vínculos de solidariedade entre elas”. Percebe-se a conver-gência das questões enfatizadas no presente trabalho quanto à limitada capacidade de superação do subdesenvolvimento nacional sem considerar a importância do mercado interno e da questão regional.

Do ponto de vista político, o ano de 1990 constituiu um marco na transição para um novo mo-delo de crescimento e desenvol-vimento para o País. A nova po-lítica industrial consubstanciada no Programa Política Industrial e de Comércio Exterior (Pice), no início do governo Collor, previa o aumento da eficiência na pro-dução, e comercialização de bens

e serviços mediante a moderniza-ção e a reestruturação da indús-tria. Observa-se a predominância de instrumentos de caráter geral, com a adoção de instrumentos seletivos apenas nos casos de capacitação tecnológica e desen-volvimento de recursos humanos.

O período 1995-2000 é mar-cado pelo sucesso na estabiliza-ção da economia, com o Plano Real adotado no fim de 1993. A política industrial, contudo, não sofreu grandes mudanças em relação àquela definida anterior-mente. O documento Nova Polí-tica Industrial: desenvolvimento e competitividade (PR, 1998) traz uma discussão das diretrizes bá-sicas e dos objetivos da política industrial vigente no primeiro mandato de Fernando Henrique Cardoso na Presidência da Repú-blica. As reformas estruturais são consideradas importantes para favorecer a influência dos meca-

nismos de mercado nas decisões de aplicação de recursos. A libe-ralização do comércio exterior, a privatização, o fim dos controles de preços, o comportamento mais liberal perante o capital estran-geiro e a criação de um ambiente macroeconômico mais estável são as principais diretrizes para o alcance de maior eficiência e competitividade.

Conforme Erber (2002, p. 645), a política industrial nos últimos anos4 incorporou uma atitude liberal chamada eufe-misticamente de uma “política de competitividade”. Prevaleceu uma visão de desenvolvimen-to em que a “tripla abertura” (abertura comercial, liberdade ao investimento direto estrangeiro e privatização) compatibilizaria estabilidade e crescimento. Ele observa que, “tendo por pano de fundo as reformas institucionais preconizadas pelo Consenso de

“A partir do momento em que o motor

do crescimento deixa de ser a formação

do mercado interno, para ser a integração

com a economia internacional, os efeitos

de sinergia gerados pela interdependência

das distintas regiões do País desaparecem,

enfraquecendo consideravelmente os

vínculos de solidariedade entre elas”.

4. O documento Brasil 1994-2002, a era do real (disponível em <http:// www.planalto.gov.br>) apresenta os fundamentos básicos da política industrial praticada nos últimos anos da década de 1990 e início do século XXI.

jan/mar de 200524Revista de conjuntura

Washington, uma Política In-dustrial não só seria dispensável como contraproducente”.

Se nos anos 1990 os temas de Furtado passam a tratar da natu-reza e dos limites da globaliza-ção, suas preocupações persistem em tocar na questão do desen-volvimento nacional. Em texto publicado pela Revista da Cepal (Furtado, 2000), Furtado observa que a via brasileira de desen-volvimento não tem que ser uma “terceira via”, mas tem que ser uma via própria, resultado de um projeto nacional derivado das especificidades do País, recupe-rando o mercado interno como o centro dinâmico da economia. A maior dificuldade do Brasil, insiste ele, consiste em reverter o processo de concentração de ren-da refletida regionalmente.

4.2. Século XXI: Novos cami-nhos do desenvolvimento?

Observados em retrospectiva, os trabalhos de Furtado produ-zidos até a década de 1970 são aqueles que provocaram maior impacto no pensamento social brasileiro e constituem o eixo da

sua abordagem teórica “históri-co-regional-estruturalista”. Ao longo do tempo, seus argumen-tos receberam adaptações, em razão das transformações ocorri-das na realidade sócio-econômi-ca nacional, mas mantêm intactas suas teses iniciais.

Nesse sentido, segundo suas avaliações recentes publicadas pela Cepal (Furtado, 2000) e pelo IBGE (IBGE, 2003), men-cionadas anteriormente, a maior dificuldade do Brasil continua sendo reverter o processo de con-centração de renda, cujas feições regionais são patentes, e colocar o mercado interno como centro dinâmico do crescimento nacio-nal, aspectos estes enfatizados no presente estudo como centrais em sua obra e ainda atuais.

Essa visão regional pode ser captada em entrevista recente, em que Furtado (2003, p. 11) observa que “o Brasil continua sendo uma constelação de regi-ões de distintos níveis de desen-volvimento, com uma grande heterogeneidade social e graves problemas sociais”. Em suma, as desigualdades econômicas e

sociais (de produto, renda, em-prego, salário, educação, saúde etc.) são, em última instância, os vários aspectos das desigual-dades regionais ainda existentes no País. Portanto, as associações entre o papel da distribuição de renda e do mercado interno e o crescimento econômico em sua abordagem analítica devem refletir não somente a heteroge-neidade social e produtiva, mas também questões geográficas, particularmente no que diz res-peito ao caso brasileiro.

Esse debate econômico res-surge no início de uma nova eta-pa política interna, com a eleição do presidente da República, em que se discute a adoção de uma política de crescimento mais pla-nejada e com efetiva participação do Estado. O programa de gover-no do Partido dos Trabalhadores (PT), que elegeu o atual presi-dente da República, traz as linhas gerais de uma nova política in-dustrial e regional para o País, as quais respaldam os argumentos aqui enfatizados e restauram os aspectos originais da análise de Furtado.

Nota-se a preocupação na construção de uma política indus-trial “distanciada de concessões de subsídios e articulada com medidas horizontais de fortale-cimento do mercado e da infra-estrutura interna”. As principais linhas da nova política sugerem que ela deve ser: planejada nacionalmente a partir das po-tencialidades regionais; seletiva e vertical; formada a partir da explicitação de metas a serem atingidas pelas empresas como contrapartida do apoio público; e baseada na transparência dos cus-tos envolvidos e do retorno que

“As associações entre o papel da distribuição

de renda e do mercado interno e o crescimento

econômico em sua abordagem analítica devem

refletir não somente a heterogeneidade social

e produtiva, mas também questões geográficas,

particularmente no que diz respeito ao caso

brasileiro”.

jan/mar de 200525Revista de conjuntura

a economia do País poderá rece-ber, entre outras. Nesse sentido, configura-se o esforço de cons-trução de um sistema nacional e inovador de competitividade que pressupõe, entre outros fatores, “combinar as políticas horizon-tais voltadas ao mercado interno com as verticais e setoriais, vol-tadas para a capacitação tecnoló-gica e as exportações”.

O papel de destaque dado ao mercado interno, como elemento dinâmico ao crescimento nacio-nal, um dos pilares do pensamen-to de Furtado, pode, então, ser visualizado ao lado da questão regional na concepção progra-mática do novo governo. As considerações anteriores tentam demonstrar que, em vez da no-ção prevalecente, de que a visão regional de Furtado restringe-se ao Nordeste, sua abordagem é ampla e sua influência pode ser atestada ainda hoje, quando se encontram na agenda política de Ministérios Setoriais preocupa-ções semelhantes, como o caso do Ministério da Integração Na-cional e seus projetos de recria-ção de entidades regionais, Su-dene (Nordeste), Sudam (Norte) e Sudeco (Centro-Oeste), ou dos programas de desenvolvimen-to regional incluídos no Plano Plurianual (PPA 2004-2007) do governo, que configuram mode-los regionais de desenvolvimento que levam em conta as especi-ficidades e as potencialidades particulares (históricas, culturais, produtivas, políticas etc.) das diversas regiões do País.

Como síntese do momento atual, considera-se a existên-cia de uma tendência ao amplo apoio a uma política industrial, uma vez que poucos acreditam

“O papel de destaque dado ao mercado interno,

como elemento dinâmico ao crescimento

nacional, um dos pilares do pensamento

de Furtado, pode, então, ser visualizado

ao lado da questão regional na concepção

programática do novo governo ”.

que mecanismos horizontais de política macroeconômica sejam suficientes. Em outras palavras, reconhece-se agora que a polí-tica industrial tem de ter forte conteúdo setorial. O avanço de posições é evidenciado por diag-nósticos da balança comercial brasileira que usam o conteúdo tecnológico das importações e exportações para identificar pro-blemas e sugerir soluções. Nesse sentido, a política industrial deveria visar, simultaneamente, ao aumento das exportações e à substituição de importações (Araújo e Teixeira, 2003). A estratégia associada a esse obje-tivo seria aumentar o conteúdo tecnológico da estrutura produ-tiva brasileira para, simultane-amente, reduzir importações e aumentar exportações. Outro ob-jetivo da política industrial seria o de redução da desigualdade, atuando na provisão de serviços sociais básicos, um dos princi-pais problemas da população de baixa renda: saneamento básico, saúde, educação, habitação e transporte público. Finalmente, a vertente regional enfatiza a instalação de pólos ou arranjos

produtivos locais.A preocupação que surge da

análise apresentada é que muito provavelmente a inserção do Brasil na economia mundial globalizada tende a ser ampla-mente diferenciada, segundo os diversos subespaços econômi-cos desse amplo e heterogêneo País. Essa diferenciação tende a alimentar a ampliação das histó-ricas e profundas desigualdades sócio-econômicas, se não forem adotadas políticas governamen-tais de reversão das desigualda-des que explorem os potenciais endógenos da diversa base regional do Brasil, que tornam atuais as idéias de Furtado sobre a importância do mercado interno e da solução dos problemas das desigualdades regionais para o desenvolvimento sustentável do País.

5. Conclusões

Ao longo dos mais de cin-qüenta anos resumidos neste estudo, tomando-se em conta as contribuições de Furtado, pode-se perceber a extrema coerência, sujeita a críticas e autocríticas,

jan/mar de 200526Revista de conjuntura

e persistência do Autor em torno dos aspectos aqui enfatizados e considerados desde a origem de sua análise: o papel do mercado interno e a questão da desigual-dade (regional) para a superação do subdesenvolvimento nacional. No período 1945-1985, em que predominou o modelo de substi-tuição de importações, a agenda política predominante não ne-cessariamente converge com as idéias defendidas por Furtado. Se no fim da década de 1950 e início da de 1960 se encontram algumas convergências em razão, particularmente, de suas próprias passagens por cargos públicos, a partir da segunda metade dos anos 1960 até meados dos anos 1980 definitivamente não podem ser vinculadas suas idéias com as políticas adotadas no País, que foram essencialmente distintas.

Ao tentar fazer algumas liga-ções entre as questões teóricas e práticas de Furtado, referentes ao mercado interno e à questão regional, no período 1946-1963, encontram-se vários exemplos: o Plano de Metas, os Plano de Desenvolvimento do Nordeste,

a Sudene (no governo Juscelino Kubitschek) e o Plano Trienal (no governo João Goulart), de forma que alguns autores che-gam a defender a idéia que este último influenciou o Plano de Ação Econômica do Governo (Paeg), no início do governo militar. Nesse novo contexto, a partir da década de 1970, pode-se dizer que as questões enfatizadas neste estudo foram relegadas ao segundo plano. Não por acaso, atesta-se o aprofunda-mento da desigualdade de renda no País ao longo do período, enquanto se mudava a ênfase da industrialização substitutiva de importação com base no mercado interno para o mercado externo. A “modernização do subdesen-volvimento” é deixada como herança do período militar, que aprofunda as contradições de um modelo de desenvolvimento concentrador, capaz de absorver avanços tecnológicos e novos padrões de consumo ao mesmo tempo em que reduz a absorção de trabalho e aprofunda as dispa-ridades (regionais) sócio-econô-micas.

Nos anos 90, a ruptura do modelo prevalecente anterior de certa forma destrói, teórica e politicamente, qualquer ligação analítica com as lições de Furta-do. A questão regional definiti-vamente passa a ter uma agenda secundária, senão inexistente, culminando com a extinção, no início dos anos 2000, dos órgãos e dos instrumentos remanescen-tes de política regional (Sudene, Sudam e incentivos fiscais). Ao mesmo tempo, persistem as po-líticas de estímulo ao comércio exterior em detrimento do merca-do interno.

Recentemente, a posse do presidente da República, de partido historicamente defensor do papel ativo do Estado na eco-nomia, recupera, pelo menos em termos de agenda programática, questões relevantes que podem ser associadas novamente aos pontos aqui levantados (merca-do interno e questão regional), como uma atualização das idéias originais de Furtado no am-biente atual de discussão sobre uma nova etapa de crescimento e desenvolvimento do País. A questão regional ressurge com os projetos de recriação (em tramitação no Congresso Na-cional) de entidades regionais (Sudene, Sudam e Sudeco) e propostas para uma política de integração nacional e desen-volvimento regional conduzida pelo Ministério da Integração Nacional (MI). Ademais, o PPA 2004-2007 contém programas que podem ser vinculados com ações regionais explícitas. Ao mesmo tempo, o momento atual resgata alguns defensores do mercado interno como fator dinâmico para uma nova etapa

“A questão regional ressurge com os projetos

de recriação (em tramitação no Congresso

Nacional) de entidades regionais (Sudene,

Sudam e Sudeco) e propostas para uma política

de integração nacional e desenvolvimento

regional conduzida pelo Ministério da

Integração Nacional (MI)”.

jan/mar de 200527Revista de conjuntura

de crescimento do País, sem necessariamente perder de vista a importância complementar do mercado externo.

Enfim, o presente trabalho demonstra que não apenas é im-portante uma releitura de Fur-tado do ponto de vista de um entendimento da evolução “his-tórico-regional-estrutural” do (sub)desenvolvimento brasileiro, como continuam sendo funda-mentalmente atuais suas idéias originais, até hoje não totalmente aplicadas, no sentido de verem

resolvidas questões por ele con-sideradas essenciais para que o Brasil supere definitivamente o estágio de subdesenvolvimento ainda prevalecente. Fica clara, portanto, a mensagem que per-passa toda a obra de Furtado: o crescimento econômico não é condição suficiente para superar o subdesenvolvimento, o que apenas seria alcançado mediante a aplicação de reformas estrutu-rais importantes, entre as quais a superação das desigualdades sócio-econômicas, que em última

instância estão refletidas em de-sigualdades regionais de renda, produto, educação, salário, saúde etc. A diminuição dessas distor-ções possibilitaria ao Brasil uma capacidade ampliada do mercado interno a fim de tornar-se fonte dinâmica de um desenvolvimento econômico sustentável, menos vulnerável às forças instabiliza-doras externas – sejam comer-ciais, tecnológicas ou financeiras.

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* Constantino Cronemberger MendesTécnico de Planejamento e Pesquisa – IPEA.

jan/mar de 200529Revista de conjuntura

São Paulo - “Nunca houve na História do Brasil maior trans-ferência de renda, oriunda da produção, o que vale dizer, do trabalho, em benefício do siste-ma financeiro, nacional e inter-nacional. Isso acontece há quase 10 anos, ininterruptamente (...) Três itens – aumento da dívida, elevação da carga tributária e privatizações – representaram recursos da ordem de 750 bi-lhões de reais. No entanto, nesse período, não se realizaram, por exemplo, nem mesmo as obras indispensáveis e inadiáveis de infra-estrutura de transporte, como a construção de novas estradas de rodagem, novas fer-rovias e hidrovias, onde o poten-cial brasileiro é imenso”.

O leitor poderia ser levado a pensar que o parágrafo acima consta do manifesto de algum par-tido de extrema-esquerda, ou que foi proferido por uma liderança popular radical. Mas se leu o títu-lo deste artigo, já sabe que o autor é bem outro. Trata-se de José Alencar Gomes da Silva, vice-presidente da República. Essas

R E S E N H A

Alencar denuncia juros, privatizações, endividamento público e censura ao debate econômico

Gilberto Maringoni*

linhas constam do prefácio de um livro recém lançado, um petardo contra a política econômica inau-gurada em 1990, no curto reinado de Collor de Mello, e vigente até hoje.

Estrago

O cartapácio chama-se Novo-desenvolvimentismo - um projeto nacional de crescimento com eqüidade social, e foi orga-nizado pelos economistas cario-cas João Sicsú, Luiz Fernando de Paula e Renaut Michel. Tem 450 páginas. Entre seus autores estão Paulo Nogueira Batista Jr., Car-los Eduardo Carvalho, Fernando Cardim de Carvalho, Leda Maria Paulani e até mesmo Luiz Carlos Bresser Pereira, que compunha a chamada “ala desenvolvimentis-ta” do primeiro governo FHC.

Nenhum deles propõe gran-des rupturas, mas adota o que se poderia chamar de um reformis-mo eficiente, como maneira de desarmar os inúmeros gargalos que impedem o desenvolvimento da economia brasileira em ritmo acelerado e prolongado. Como

toda (boa) coletânea, o livro não é uniforme, mas apresenta um pluralismo bem coordenado. É dividido em quatro partes: “Redi-recionando a macroeconomia”, “Reconquistando a soberania nacional”, “Transformando a realidade sócio-econômica” e “Reformando o sistema financei-ro”.

Estado forte

Logo na introdução, os or-ganizadores desfiam suas teses básicas:

“1) não haverá mercado for-te sem um Estado forte; 2) não haverá crescimento sustentado a taxas elevadas, sem o forta-lecimento dessas duas institui-ções (Estado e mercado) e sem a implementação de políticas macroeconômicas adequadas; 3) mercado e Estado fortes somente serão construídos por um projeto nacional de desenvolvimento que compatibilize crescimento eco-nômico sustentado com eqüidade social; e 4) não é possível atingir o objetivo da redução da desi-gualdade social sem crescimento

jan/mar de 200530Revista de conjuntura

a taxas elevadas e continuadas”.A visão da mundialização

financeira também é implacá-vel: “O projeto globalizante é um projeto de desintegração nacional e de enfraquecimento intelectual, econômico e cultural de todos os segmentos de uma sociedade. Os mercados de so-ciedades globalizadas são, por-tanto, tragados com facilidade pelos mercados internacionais”. Em seguida, arrematam: “Ne-nhum país se desenvolveu ou se mantém desenvolvido – como os Estados Unidos, a França ou a Alemanha – ou entra em rota de desenvolvimento – como alguns países asiáticos – sem um pro-jeto claro que expresse o senti-mento de nação”.

Apesar de algumas áreas do governo brasileiro – entre outras, seu setor externo – esboçarem uma trajetória mais soberana e altiva, a política econômica impede que tal projeto ganhe consistência. Paulo Nogueira Batista examina a questão das negociações da Alca sob esse prisma, lembrando que o governo FHC “parecia mais ou menos acomodado com a estrutura das

negociações da Alca tal como formulada, no essencial, pelos EUA”. Em seguida, destaca: “O governo Lula alterou o enfoque de maneira significativa. Embora ainda se diga favorável à Alca, o novo governo brasileiro resolveu, logo no início de 2003, buscar maior equilíbrio na agenda de negociação”.

Armadilha externaEm seu artigo, a professora

da USP, Leda Paulani, constata o que veio a se tornar uma ob-viedade: “Para surpresa geral, o governo Lula não só continuou, como aprofundou a política econômica ortodoxa que preva-leceu no governo F.H. Cardoso. Uma das hipóteses mais aceitas foi a de que, sem alternativa no momento inicial, ante a herança maldita e o precipício à frente, o governo Lula faria, só no come-ço, o jogo do adversário (...) A permanência do mesmo modelo não foi uma estratégia para cons-truir o espaço necessário para que o novo governo colocasse em prática seu próprio projeto (...) Ao contrário, tratou-se de uma opção deliberada e cons-

ciente de manter o Brasil enreda-do na mesma armadilha externa em que ele se encontrava”.

Por que isso acontece? Res-pondendo indiretamente, Sicsú vislumbra um dos motivos:

“O FMI e grande parte dos governos e economistas estão a serviço dos interesses das coisas financeiras. Não é à toa que, quando muitos economis-tas largam as suas funções nos governos, vão ocupar (ou são recompensados com) altos car-gos, com altíssimos salários, no mundo das finanças. (...) Esses querem manter as coisas como estão. A alternativa é a constru-ção de um projeto nacional pelo pleno emprego, temperado com o espírito de Bretton-Woods e com a ousadia da Malásia da década de 90”.

Lembrando: durante a cri-se asiática de 1997, a Malásia cometeu a suprema heresia de rasgar os manuais do FMI, que recomendavam medidas ainda mais liberalizantes, e impôs con-troles rígidos sobre a saída de capitais, como forma de evitar a sangria que pressionava por uma abrupta desvalorização de sua moeda. Apesar das ameaças, os resultados foram extremamente positivos. Dois anos depois, sua indústria cresceu 8,9%, a inflação caiu e as reservas cambiais se recompuseram rapidamente.

AlternativasPara aqueles que acusam os

críticos de não apresentarem al-ternativas, o livro é pródigo em cartografar caminhos. Fernando Cardim de Carvalho, da UFRJ, por exemplo, aborda um dos sacrossantos tabus do debate eco-nômico: “O sistema financeiro

“A visão da mundialização financeira

também é implacável: “O projeto

globalizante é um projeto de desintegração

nacional e de enfraquecimento intelectual,

econômico e cultural de todos os segmentos

de uma sociedade”.

jan/mar de 200531Revista de conjuntura

brasileiro precisa ser reformado, com vistas a aumentar sua efici-ência, medida por três objetivos: canalizar recursos para a sus-tentação do gasto privado, com particular ênfase no investimento produtivo; diminuir o custo do capital para empresas e consu-midores; e promover o acesso de grupos de renda mais baixa a serviços financeiros e a novas classes de ativos”.

O livro, entretanto, não toca num elemento essencial para a viabilização de mudanças: a luta política para tornar essas idéias força social, capaz de alterar a rota definida pelo Ministério da Fazenda e pelo Banco Central. Não é o objetivo do volume; trata-se de uma discussão nos marcos da Economia. Mas Carlos Eduardo Carvalho, da PUC-SP, alerta para os perigos da acomo-dação diante da senda atual.

“O esquema herdado do perí-odo F. H. Cardoso é apresentado como indiscutível, como cami-nho único e inquestionável. O partido de oposição, eleito para mudar a política, resolveu man-tê-la e radicalizá-la. É hora de abrir a discussão sobre os novos caminhos, antes que problemas inesperados gerem situações insustentáveis e conduzam a me-didas improvisadas, com custos concentrados em quem paga a conta há muitos anos”.

Leia na íntegra o prefácio de José Alencar.

Apontando alternativas

Este livro nos convida à refle-xão. Foi escrito por um notável grupo de economistas, reunidos por esse grande brasileiro que é o Professor-Doutor João Sicsú,

da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, juntamente com o Doutor Luiz Fernando de Paula, da Universidade Estadu-al do Rio de Janeiro – UERJ, e com o Doutor Renaut Michel, da Universidade Candido Mendes – UCAM, e aborda praticamente todos os problemas relevantes da economia brasileira contem-porânea com uma preocupação propositiva. É isso que o torna particularmente muito rico, mag-nífico mesmo, e muito útil para o momento por que passa a econo-mia política do País. Depois de mais de duas décadas de baixo crescimento econômico, todas as pessoas com alguma responsa-bilidade política estão buscando alternativas. Esses economistas fazem mais. Apontam-nas.

Não posso dizer que todas ou cada uma das alternativas suge-ridas aqui devam ser seguidas ao pé da letra. Em Política, assim como nas Ciências Sociais e, particularmente, na Economia, não há certezas absolutas. O que há de relevante neste livro é que ele questiona uma sabedoria con-vencional que tem sido reprovada no teste da realidade. Na mesma

linha, não se deixa embotar pela mediocridade do pensamento único, que prevaleceu no Bra-sil sobretudo nos oito anos do governo passado. Há aqui um esforço genuíno para escapar das armadilhas econômicas a que fomos levados. Em várias oportunidades, tenho chamado a atenção para a insustentabilidade das taxas de juros no Brasil. Te-nho falado como cidadão, como empresário e, principalmente, como político. Na realidade, é a longa experiência empresarial que me autoriza a condenar esse despropositado regime de juros que empobrece nossa economia, levando milhares de empresários à falência e milhões de trabalha-dores ao desemprego. Não é pre-ciso ser acadêmico para enxergar o que tenho dito. No entanto, os profissionais mais prestigiados no Brasil contemporâneo têm sido aqueles que aceitam e até recomendam a manutenção dessa política de juros altos, ou regime de juros, como a denomino. Os bons brasileiros que escrevem este livro têm procurado apresen-tar com rigor científico o que sus-tento embasado na experiência.

“Na realidade, é a longa experiência

empresarial que me autoriza a condenar

esse despropositado regime de juros que

empobrece nossa economia, levando

milhares de empresários à falência e

milhões de trabalhadores ao desemprego”.

jan/mar de 200532Revista de conjuntura

Daí também minha satisfação por ter sido convidado a fazer este prefácio.

Honrado pelo convite, apro-veito para, de forma sucinta, trazer uma outra preocupação que permanece presente nas reflexões de quantos se dedicam aos temas ligados à economia brasileira.

É que, paralelamente aos juros e a eles ligada, há outra questão que precisa ser tratada: a carga tributária. Por que a car-ga tributária tem crescido tanto no Brasil? Em 1995, início do governo do presidente Fernando Henrique Cardoso, ela girava em torno de 28% do PIB e foi ele-vada para 35%.

Houve, portanto, um cresci-mento de 25%, ou de sete pontos percentuais. O PIB é estimado, hoje, em um trilhão e meio de re-ais. Então, sete por cento de um trilhão e meio significam cento e cinco bilhões de reais.

Além disso, tivemos naquele período – de 1995 a 2002 – um crescimento notável da dívida pública, que girava em torno de 30% do PIB, e foi para 55%. Ou seja, um crescimento, em oito anos, de 83%, ou vinte e cinco pontos percentuais.

Vinte e cinco por cento do PIB, de um trilhão e meio, é igual a trezentos e setenta e cin-co bilhões de reais. Quando se aumenta uma dívida, pressupõe-se que tenha havido a corres-pondente entrada do dinheiro. Quando cresce a carga tributária, o pressuposto básico é o mesmo. Temos aí: trezentos e setenta e cinco bilhões que, somados aos cento e cinco bilhões, alcançam quatrocentos e oitenta bilhões de reais, em relação a somente um ano, o ano corrente, por exem-plo, comparado ao último ano anterior ao início da escalada de majoração da dívida e da carga tributária.

No mesmo período, privati-zaram-se várias empresas brasi-leiras: as siderúrgicas, o sistema nacional de telefonia, parte das companhias de eletricidade, a própria Vale do Rio Doce, que é um país. Todas essas privatiza-ções renderam aproximadamente noventa bilhões de dólares.

Esses três itens – aumento da dívida, elevação da carga tribu-tária e privatizações – represen-taram recursos da ordem de se-tecentos e cinqüenta bilhões de reais. No entanto, nesse período, não se realizaram, por exemplo,

nem mesmo as obras indispen-sáveis e inadiáveis de infra-es-trutura de transporte, como a construção de novas estradas de rodagem, novas ferrovias e hidrovias, onde o potencial bra-sileiro é imenso.

E isso continua. Por quê? Continua, porque seguimos pri-sioneiros de uma estranha e inex-plicável armadilha macroeconô-mica. A verdade é que não houve nem mesmo conservação das estradas existentes. Setecentos e cinqüenta bilhões de reais. Para onde foi tanto dinheiro? Grande parte foi para o pagamento dos juros. Aliás, é bom que nos lem-bremos: um dos principais mo-tivos que nos levam ao enorme crescimento da carga tributária é o despropositado custo financeiro que pesa sobre nossa dívida, le-vando mais de um quarto de tudo o que se arrecada em nosso país.

Todos temos o direito de criti-car a elevação da carga tributária, mas não podemos esquecer que, dela, quase trinta por cento vão para cobrir o custo na rolagem da nossa dívida. Alguém pode dizer: mas a rolagem da dívida é devi-da, os juros têm que ser pagos! É claro que os juros da dívida têm que ser pagos. Só que eles têm que ser pagos em taxas pelo menos aproximadas às pratica-das pelo mercado internacional. Se analisarmos uma lista de 30 países - dados disponíveis no sítio da Global-Invest em agosto de 2004 -, inclusive o Brasil, verificamos algo surpreendente. A média geométrica da taxa de juros básica real com que esses países rolam sua dívida pública é de 0,4% ao ano. Nesse mesmo quadro, aparece o Brasil pagando 9,5% de taxa básica real de juros (prevista para os próximos 12

“Todos temos o direito de criticar a

elevação da carga tributária, mas não

podemos esquecer que, dela, quase

trinta por cento vão para cobrir o custo

na rolagem da nossa dívida”.

jan/mar de 200533Revista de conjuntura

meses). Se analisarmos apenas os países desenvolvidos, a taxa básica real é 0,1% ao ano. Na verdade, muitos deles pagam ta-xas reais negativas. E se conside-rarmos, daquela lista, apenas os países chamados de emergentes, onde está o Brasil, a taxa básica real é 1% ao ano. Não vejo, e acredito que jamais verei, qual-quer justificativa razoável para colocar o Brasil em tão adversa, imprópria, desfavorável, inade-quada e desastrosa posição.

Poderão dizer: o José Alencar não tem autoridade para falar sobre isso; ele não é economista. Todos sabem da minha origem modesta, humilde. Sabem que fui criado no interior, na roça, de família pobre, nem escola havia. Estudei como autodidata. E en-tão não sou autoridade para falar sobre isso. Mas, pela minha ex-periência de meio século de vida empresarial, não preciso ser eco-nomista para saber que, enquanto as atividades produtivas não pu-derem remunerar, com vantagem, os custos do capital, não poderá haver investimentos na escala de que o Brasil precisa e pode, dado o seu potencial. E o capital é ape-nas um dos fatores de produção; os outros fatores também preci-sam ser remunerados.

Também não é preciso estudar Economia profundamente para saber que o nosso regime de ju-ros é grandemente responsável pelo elevado risco-país: é fácil entender que os credores interna-cionais não podem praticar taxas de juros mais baixas para um país em que o seu próprio Banco Cen-

tral mantém taxas de juros dessa natureza. Se nossas autoridades monetárias enxergam problemas que, segundo elas, exigem a adoção dessas elevadas taxas de juros, não seria razoável esperar que os credores internacionais tivessem outro comportamento. Essa é uma das principais razões para o elevado risco-Brasil, que cairia, seguramente, a partir do momento em que caíssem os ju-ros a patamar civilizado.

Quando uma empresa leva sua duplicata a um banco, seja estatal ou privado, e paga, na melhor das hipóteses, trinta por cento de juros, ao ano, está correndo sério risco de fracasso, porque transfere, na operação, toda a sua renda para o banco. Nunca hou-ve na História do Brasil maior transferência de renda, oriunda da produção, o que vale dizer, do trabalho, em benefício do sistema financeiro, nacional e internacio-nal. Isso acontece há quase dez anos, ininterruptamente.

Tenho falado sobre isso em várias ocasiões, mas nem sempre sou bem compreendido. Numa dessas ocasiões, na Associação Comercial do Rio de Janeiro, observei que a Constituição de 1988 acabou com a censura, ex-ceto a censura sobre quem decide

bater nesse desastroso regime de juros. Essa continua. E tenho sido vítima dela, muitas vezes até pela distorção do que falo. Mas vou continuar na minha luta, por-que os que me conhecem sabem que não ingressei na vida pública para atender a nenhuma necessi-dade material. Ingressei movido pelo sonho de ver um Brasil próspero e menos desigual. Para realizar esse sonho, que é de to-dos os brasileiros, tenho tentado oferecer alguma contribuição oriunda da minha experiência.

Recomendo a leitura dos ensaios que formam este livro. Neles há sérias advertências que abrem oportunidades para a reflexão nacional, de que tanto estamos precisando. Os brasilei-ros preocupados com o destino do Brasil e, sobretudo, com a superação das dificuldades por que temos passado, encontrarão espaço para exercitar a inteligên-cia, na busca de alternativas que possam consultar os elevados objetivos nacionais.

Brasília, agosto de 2004

Saiba mais:Novo-Desenvolvimentismo - Um projeto nacional de crescimento com eqüidade socialEditora Manole, www.manole.com.br, Fundação Konrad Adenauer, R$ 44

* Gilberto MaringoniJornalista e historiador

jan/mar de 200534Revista de conjuntura

A R T I G O

Perdas e danos: a lei das parcerias público-privadas

Ceci Vieira Juruá*

Introdução

Foi promulgada em janeiro último a lei das parcerias públi-co-privadas (PPPs). Em linhas gerais, e guardando as devidas proporções, esta lei aparenta ser um equivalente histórico das leis garantidoras de juros sobre capitais aplicados em ferrovias, portos, engenhos e outras ativi-dades desenvolvidas no Brasil, durante o Segundo Império e a República Velha. Assim, vale relembrar agora acontecimen-tos daquele tempo e as formas pelas quais os prejuízos de uns (o povo brasileiro) foram trans-formados em lucros de outros (altas finanças internacionais e oligarquias domésticas). Mais do que um incentivo financeiro, as leis de garantias de juros se-laram uma aliança entre elites nacionais e estrangeiras, con-vertida progressivamente em

pacto de dominação colonial. Conviveram estas leis com a es-tagnação social, apesar das taxas de crescimento econômico do período, impediram uma trajetó-ria de desenvolvimento soberano e sufocaram o surgimento de lideranças empresariais autôno-mas, das quais a principal ex-pressão foi o Barão de Mauá, em meados do século XIX.

Figura proeminente do Se-gundo Império, o Barão de Mauá encerrou as atividades de importação e exportação em meados de 1840, iniciando uma carreira de empresário, indus-trial e banqueiro, diplomata e político. Brasileiro, gaúcho, ele tentou formatar uma via de de-senvolvimento capitalista, pro-movendo indústrias e moderna infra-estrutura, com tecnologias avançadas similares às dos pa-íses centrais (Inglaterra, sobre-tudo). Abominava a escravidão.

Defendeu uma política monetá-ria autônoma e independente de variações cambiais. Por opção, mas também conduzido pela re-lação de forças vigente naquela época, esteve sempre associado a capitais britânicos.

Estimulado pelas tarifas pro-tecionistas, intencionais ou não, promulgadas pelo Secretário de Estado da Fazenda, Alves Branco (Decreto n° 376, de 12-08-1844), o Barão de Mauá implantou ini-cialmente uma fundição e um estaleiro em Ponta da Areia; em seguida, criou companhias de navegação e ferroviárias, e os primeiros serviços urbanos de canalização de água e de ilumi-nação a gás. Foi derrotado pela aliança das elites agrárias com o capital financeiro e industrial britânico e faliu. (1)

Uma releitura da nossa his-tória naquela fase da “Aurora Burguesa” (Caio Prado Jr.) per-

1 Há muitas divergências, e até omissão, quanto ao papel histórico do Barão de Mauá. Assim, em “O Império do Brasil”, o nome de Mauá nem é citado na parte 6.4, que trata das “ferrovias do progresso”. Para seu biógrafo oficial, Alberto de Faria, que teve uma cadeira na Academia Brasileira de Letras, Mauá foi um homem extraordinário, um precursor, um nacionalista convicto da necessária solidariedade entre o progresso da Pátria e a riqueza do cidadão, o “maior nome da América do Sul, um dos grandes do mundo, tratando de igual para igual com as melhores firmas.” [pág 511] Para Castro Rebello, professor de direito da Bahia, Mauá era um homĐpoderosos, e que, na verdadeĐobra de Rebello sobre Mauá, Francisco de Assis Barbosa informa sobre Castro Rebello que “foi a concepção materialista da história que o fez contemporâneo dos novos tempos”!

jan/mar de 200535Revista de conjuntura

mitiria constatar que, por volta de 1850, iniciávamos o processo que André Gunder Frank de-nominou “desenvolvimento do subdesenvolvimento”. Utilizando outra expressão de sentido equi-valente, Celso Furtado chamou a atenção para o fato de que, em economias subdesenvolvidas, “o excedente em mãos da classe dirigente tende a originar for-mas de consumo suntuário ou a filtrar-se para investimentos no exterior”. Na verdade, o fausto das oligarquias brasileiras, inau-gurado pela “Aurora Burguesa”,

conviveu com a dívida pública crescente e com a subordinação dos poderes de Estado à Casa Rotschild, até a Revolução de 1930. Na tabela abaixo apre-sentamos dados orçamentários relativos aos anos inicial (1852) e final (1886) do primeiro ciclo ferroviário (2).

São números que ilustram o peso da dívida na Despesa Geral do Império (os encargos da dívi-da passaram de 24% para 34% do total, mais a garantia de juros, que absorvia 5,8% da Despesa).

Vemos também que, naqueles 35 anos, pressionada pela dívida e pelos juros ferroviários, a Des-pesa Geral aumentou 400,7%, à taxa média anual de 11%. As receitas do Governo, dependentes do comércio exterior, não acom-panharam a evolução da despesa, pois as exportações tiveram um crescimento mais lento (167,8%), com taxa média anual de 5%.

Juros (lucros) garantidos cons-tituíam, na prática, uma forma de duplicar os encargos da Nação relativamente ao capital estran-

Despesa Geral do Império, dívida e garantia de juros, e valor médio das exportações na década respectiva. Brasil, anos selecionados.

geiro. Pagávamos juros sobre em-préstimos externos que, uma vez internalizados, davam direito a um retorno mínimo garantido pelo Estado, sem risco cambial após 1873. Seus efeitos sobre as finan-ças públicas foram danosos e en-gendraram uma situação de déficit crônico, estrutural. Em 1886, dívi-da pública e garantias ferroviárias representavam mais de 40% da despesa geral do Império e anun-ciavam já a primeira bancarrota do Tesouro Nacional e a primeira

moratória da dívida externa, que ocorreriam em 1898.

Mas, a garantia de juros aos capitais aplicados em certas ati-vidades, a partir de 1852, não foi apenas um facilitador de investi-mentos estratégicos; foi também uma peça política essencial na aliança tecida entre elites agroex-portadoras e altas finanças inter-nacionais. Favoreceu sobrema-neira a construção de ferrovias, elo importante de ligação entre as zonas de produção de café e

açúcar e o litoral. No entanto, um longo tempo decorreu entre a primeira lei autorizativa de pri-vilégio de zona para concessão ferroviária, a Lei Feijó, de 1835 (privilégio acrescido da garantia de juros, em 1852), até a consi-derada “lei fatal” de 1873 (Lei n° 2.450, de 24 de setembro). A expressão “lei fatal” foi utilizada pelo Dr. Chrockatt de Sá, durante a 5ª Sessão Ordinária do Clube de Engenharia, em 5-1-1901, para sinalizar que, após 1873, a

Fonte: leis orçamentárias e Caio Prado Jr (1965).

1851-52 1886-87 Variação (Indice)Despesa Geral (contos de réis) 27.482 137.606 500,7sendo:Dívida Externa 2.847 16.759 588,7Dívida Interna 3.700 30.465 823,4Garantia de juros 7.925 Média Export. da década: em contos de réis 90.000 241.000 267,8em libras esterlinas 10.000 22.000 220

2 Segundo Ana Célia CastĐferroviário inauguradĐnavegação e seguros. Em 1886, a EF D. Pedro II (Central do Brasil) era a ferrovia mais extensa, com 1.082 km, e fora “construída por iniciativa nacional, tendo recorrido, no entanto, a um vultoso empréstimo inglês (1.200.000 libras) em 1858.” [Ana Célia Castro, pág. 51].

jan/mar de 200536Revista de conjuntura

responsabilidade do Governo Central “cresceu de 150%, sendo criada a responsabilidade do juro de 7% sobre um capital de 8,8 milhões de libras esterlinas”.

Neste momento, em que, através da Lei n° 11.079/05, são reeditadas práticas de sub-sidiar o lucro privado, como ocorreu no século XIX, não deveríamos refletir atentamente sobre aquela lição histórica? Da análise de conseqüências já verificadas, não poderíamos retirar alguns ensinamentos que nos permitam minimizar os riscos previsíveis embutidos nas PPPs? Deixando ao leitor a resposta a estas questões, que merecem um amadurecimento progressivo, passamos à análise da Lei n° 11.079/05, Lei das PPPs. Abordaremos, previa e sucintamente, as modificações introduzidas no projeto de lei pela Comissão de Constituição e Justiça do Senado Federal (CCJ/Senado).

1-Lei n° 11.079/05 e PLC 10/04: comparação sumária

A promulgação da Lei n° 11.079/05, com apenas dois vetos do Presidente da República, re-presentou uma vitória parcial dos movimentos sociais que comba-teram, ao longo do último semes-tre de 2004, o PLC n° 10/04, que a originou. Na verdade, a Comis-são de Constituição e Justiça do Senado Federal (CCJ/Senado) realizou um bom trabalho, pois o substitutivo elaborado pelo relator da Comissão, Senador Rodolpho Tourinho, permitiu expurgar do PLC 10/04 alguns de seus traços mais perversos, que haviam sido apontados pelos movimentos sociais e por vários senadores ao longo dos sucessi-vos debates e audiências públicas realizados em 2004. Ao mesmo tempo, a Comissão manteve a substância central do projeto - a introdução de novas e duradouras formas de relacionamento en-tre o Estado brasileiro e o setor privado, através das quais o Es-tado utilizará recursos públicos para garantir o lucro privado. O processo de transformação de bens públicos em mercadorias,

com a intermediação do Estado, permitirá adotar critérios de ren-tabilidade privada para definir prioridades e para configurar tec-nicamente os padrões produtivos de obtenção de tais mercadorias.

As principais modificações introduzidas pelo Senado con-sistiram, primeiramente, na proibição de utilização do regi-me de parcerias em atividades exclusivas do Estado e na fixa-ção de um teto para os gastos públicos com PPPs, conforme veremos adiante, no item 2. A utilização da arbitragem (tribu-nais privados) também sofreu restrições, pois ficou estabeleci-da a obrigatoriedade de uso da língua portuguesa e de territó-rio nacional. Por outro lado, a Comissão do Senado ratificou a competência do Tribunal de Contas na fiscalização dos re-cursos públicos empregados em PPPs. e restringiu os poderes do Órgão Gestor das Parcerias (OGP). Outra alteração im-portante consistiu na subordi-nação dos efeitos decorrentes de cláusulas contratuais às leis brasileiras em vigor, especial-mente às leis de licitações e de concessões e permissões de ser-viços públicos. De caráter tam-bém substancial, o último artigo da Lei n° 11.079/05 sujeita os parceiros privados às penalida-des do Código Penal brasileiro e às outras normas legais que visam coibir o abuso na utiliza-ção de recursos públicos.

Enfim, em linhas gerais, os pontos do PLC 10/04 rejeitados na CCJ/Senado coincidiram bastante com as críticas feitas pelos movimentos sociais. Mas esta vitória parcial dos que se

“O processo de transformação de

bens públicos em mercadorias, com

a intermediação do Estado, permitirá

adotar critérios de rentabilidade privada

para definir prioridades e para configurar

tecnicamente os padrões produtivos de

obtenção de tais mercadorias ”.

jan/mar de 200537Revista de conjuntura

opuseram à lei de parcerias, não está garantida “para todo o sempre”. O texto atual da lei das parcerias deve ser visto como provisório, pois ele repre-senta apenas o momento inicial do longo conflito anunciado.

Na versão final, ficou explíci-to o sentido restrito das parcerias autorizadas, conforme passamos a expor.

2-Parcerias são... simplesmente novas modalidades de concessão

O texto da Lei n° 11.079/05 deixa bem claro que não se trata de um sistema de parcerias entre iguais, mas sim de uma nova mo-dalidade de relacionamento Esta-do/setor privado, com direitos e obrigações distintos por parte dos contratantes. Nesta perspectiva, a nova lei pode ser considerada como um simples aditivo à antiga Lei de Concessões e Permissões de obras e de serviços públicos (Lei n° 8.987/95), pois ela autori-za o Estado a realizar duas novas formas de concessão: a conces-são patrocinada e a concessão ad-ministrativa, e é delas que a Lei de parcerias trata. Permanece a modalidade anterior, praticada até aqui, que passa ser denomi-nada de concessão comum. No texto da lei, as duas novas moda-lidades estão definidas, conforme indicamos a seguir.

Concessão administrativa Art.2º, § 2º Concessão admi-

nistrativa é o contrato de presta-ção de serviços de que a Admi-nistração Pública seja a usuária direta ou indireta, ainda que en-volva execução de obra ou forne-cimento e instalação de bens.

Em tese, e a princípio, a de-finição acima permite conceder/delegar ao setor privado a produ-ção e o fornecimento de bens e serviços públicos de uso gratui-to, o que significa uma área de abrangência bastante ampla: ma-nutenção do patrimônio histórico e cultural, serviços de educação e de saúde em estabelecimentos públicos, preservação do meio ambiente, saneamento básico, funções de pesquisa e de desen-volvimento tecnológico em labo-ratórios públicos, por exemplo, entre outras atividades. Serviços dos quais o Estado é o usuário direto, como os de Informática, também poderão ser objeto de concessão administrativa, sempre que abrangerem mais do que o simples fornecimento de mão-de-obra, tiverem valor superior a R$ 20 milhões e prazo contratual superior a cinco anos (exigências gerais de todo projeto de conces-são em parceria).

Concessão patrocinadaArt.2º, § 1º Concessão patro-

cinada é a concessão de serviços públicos ou de obras públicas

de que trata a Lei nº 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, quando envolver, adicionalmente à tarifa cobrada dos usuários, contra-prestação pecuniária do parceiro público ao parceiro privado.

Segundo a definição acima, a concessão patrocinada é aquela cuja remuneração vai decorrer de duas fontes: tarifa cobrada dos usuários dos serviços (ferro-vias, correios, por exemplo) ou de obras públicas (estradas), e um adicional tarifário pago pelo Estado a título de subsídio ao usuário. Entende-se, no caso de concessão patrocinada, que o custo dos serviços (incluída a re-muneração do capital investido) é incompatível com a renda dos usuários, incompatibilidade que deverá ser comprovada, a fim de justificar o subsídio com recursos do orçamento público.

Os dois casos, de concessão administrativa e patrocinada, são aplicáveis às três esferas da Federação (União, Estados/DF e Municípios) e ao conjunto de entes (fundos, fundações, autar-quias, empresas etc.) controlados direta ou indiretamente por um

“O texto da Lei n° 11.079/05 deixa bem claro

que não se trata de um sistema de parcerias

entre iguais, mas sim de uma nova modalidade

de relacionamento Estado/setor privado, com

direitos e obrigações distintos por parte dos

contratantes”.

jan/mar de 200538Revista de conjuntura

dos entes da Federação (artigo 1º). O regime de parcerias não é admitido para o desempenho das funções estatais de regula-ção, jurisdicionais e de poder de polícia, nem para quaisquer “outras atividades exclusivas do Estado” (artigo 4º, III). A indelegabilidade das atividades típicas de Estado, introduzida na CCJ/Senado, preserva funções estratégicas do tipo Defesa Na-cional, Tributação e Relações Internacionais, atividades com-ponentes do “núcleo duro” do poder de Estado. Estas funções são a manifestação mais ime-diata da soberania de um povo e o seu exercício pressupõe uma solidariedade irrestrita entre os interesses nacionais de curto e de longo prazo.

A repartição de tarefas entre as partes contratantes de uma concessão em parceria será a se-guinte (artigos 5º, 6º e 9º): - as sociedades de propósito

específico estão incumbidas de implantar e gerir o objeto da parceria;

- a administração pública é o poder concedente incumbido de delegar, supervisionar e co-brir, total ou parcialmente, os gastos realizados pelas socie-

dades de propósito específico nos contratos de parceria. Esta repartição de tarefas

corresponde, na verdade, à des-crição feita por Atílio Borón das “contribuições à ciência do direito” típicas do momento globalizado e imperial. Para Borón, devemos destacar duas dessas “contribuições”:por um lado, uma inovação dou-trinária graças à qual, pela pri-meira vez na história, empresas e Estados se convertem em pessoas jurídicas que gozam exatamente do mesmo status legal. Os Esta-dos deixam de ser representantes da soberania popular e da nação para transformar-se em simples agentes econômicos sem nenhum tipo de prerrogativas nas cortes. ...Essa conquista jurídica é um fenomenal retrocesso que violen-ta os avanços do direito moderno nos últimos 300 anos;levando em conta a extraordi-nária preocupação do governo dos USA pelo direito universal, o AMI (Agreement on Multilateral Investments), propõe a abolição do princípio da reciprocidade en-tre as duas partes que firmam um contrato. Se o AMI tivesse sido aprovado, o que até agora não foi possível graças à tenaz oposi-

ção das organizações humanitá-rias e dos diversos tipos de mo-vimentos sociais, uma das duas partes de um contrato teria di-reitos e a outra, só obrigações... Agora se compreende as razões pelas quais as negociações que culminaram na redação do ras-cunho do AMI foram conduzi-das no mais absoluto segredo e à margem de qualquer controle democrático e popular. [Atílio Boron, pgs. 77-78]

Sendo assim, surge uma nova luz sobre as parcerias autori-zadas pela Lei n° 11.079/05: seriam elas um substitutivo às exigências feitas pelos países centrais por ocasião do debate sobre o AMI- Agreement on Multilateral Investments? Sem avançar a resposta, sugerimos que se organize logo um debate sobre tal questão.

3-Estão limitados os gastos com parcerias e o capital do Fundo Garantidor de Parcerias

A qualidade do trabalho de-senvolvido pela CCJ/Senado (nos limites das possibilidades polí-ticas delimitadas pelo empenho pessoal do Presidente da Repú-blica a favor da Lei) manifestou-se, também, na introdução de um limite de 1% da receita corrente líquida para os gastos orçamen-tários destinados aos pagamentos de parcerias. Assim:

Art. 22. A União somente poderá contratar parceria pú-blico-privada quando a soma das despesas de caráter continu-ado derivadas do conjunto das parcerias já contratadas não tiver excedido, no ano anterior, a 1% (um por cento) da receita corrente líquida do exercício, e

“Agora se compreende as razões pelas quais

as negociações que culminaram na redação do

rascunho do AMI foram conduzidas no mais

absoluto segredo e à margem de qualquer controle

democrático e popular ”.

jan/mar de 200539Revista de conjuntura

as despesas anuais dos contra-tos vigentes, nos 10 (dez) anos subseqüentes, não excedam a 1% (um por cento) da receita corrente líquida projetada para os respectivos exercícios.

Art. 28. A União não pode-rá conceder garantia e realizar transferência voluntária aos Estados, Distrito Federal e Mu-nicípios se a soma das despesas de caráter continuado derivadas do conjunto das parcerias já contratadas por esses entes tiver excedido, no ano anterior, a 1% (um por cento) da receita cor-rente líquida do exercício ou se as despesas anuais dos contratos vigentes nos 10 (dez) anos subse-qüentes excederem a 1% (um por cento) da receita corrente líquida projetada para os respectivos exercícios.

Os artigos 22 e 28 acima transcritos atenuam os efeitos negativos das parcerias sobre a crise fiscal e garantem, de certa forma, a continuidade do papel do Congresso na análise e apro-vação do orçamento fiscal. A au-sência de limites poderia colocar os congressistas perante um fato consumado, perante um projeto “imexível” de orçamento, onde a totalidade dos recursos esti-vesse comprometida com gastos compulsórios, dentre os quais as despesas com parcerias.

Nas cláusulas relativas ao Sistema de Garantias houve perdas e ganhos,

O sistema de garantias es-truturado pela Lei n° 11.079/05 inclui modalidades anteriormente previstas - vinculação de tributos e fundos especiais -, substitui o fundo fiduciário por um fundo garantidor de parcerias (FGP) e acrescenta duas novas modalida-

des: o seguro-garantia (desde que não contratado junto a segura-doras públicas!) e uma “garantia prestada por organismos interna-cionais ou instituições financeiras que não sejam controladas pelo Poder Público” (artigo 8º).

O ganho maior, para os defensores de uma sociedade democrática e soberana, foi a adoção do limite global de R$ 6 bilhões nas cotas do FGP que serão subscritas pela administra-ção pública. Por enquanto, esse é um “teto máximo para even-tuais estragos financeiros nas contas e no patrimônio público”. Devemos ter muita atenção para que esse teto seja mantido e res-peitado. Mas este é um ganho que tem custos e ônus que po-derão recair sobre as contas do Estado (contratação de avaliação dos bens e direitos transferidos ao FGP, por empresa especia-lizada!), e uma taxa de risco representada pela possibilidade de integralizar o capital do FGP com títulos da dívida pública de valor flutuante.

Art. 16. Ficam a União, suas autarquias e fundações públicas autorizadas a parti-cipar, no limite global de R$ 6.000.000.000,00 (seis bilhões de reais), em Fundo Garantidor

de Parcerias Público-Privadas - FGP, que terá por finalidade prestar garantia de pagamento de obrigações pecuniárias assu-midas pelos parceiros públicos federais em virtude das parcerias de que trata esta Lei.

§ 1º O FGP terá natureza privada e patrimônio próprio separado do patrimônio dos co-tistas, e será sujeito a direitos e obrigações próprios.

§ 2º O patrimônio do Fun-do será formado pelo aporte de bens e direitos realizado pelos cotistas, por meio da integraliza-ção de cotas e pelos rendimentos obtidos com sua administração.

§ 3º Os bens e direitos transferidos ao Fundo serão ava-liados por empresa especializa-da, que deverá apresentar laudo fundamentado, com indicação dos critérios de avaliação adota-dos e instruído com os documen-tos relativos aos bens avaliados.

§ 4º A integralização das cotas poderá ser realizada em dinheiro, títulos da dívida pú-blica, bens imóveis dominicais, bens móveis, inclusive ações de sociedade de economia mista federal excedentes ao necessário para manutenção de seu contro-le pela União, ou outros direitos com valor patrimonial.

“O ganho maior, para os defensores de

uma sociedade democrática e soberana,

foi a adoção do limite global de R$ 6

bilhões nas cotas do FGP que serão

subscritas pela administração pública”.

jan/mar de 200540Revista de conjuntura

§ 5º O FGP responderá por suas obrigações com os bens e direitos integrantes de seu patrimônio, não respondendo os cotistas por qualquer obri-gação do Fundo, salvo pela integralização das cotas que subscreverem.

§ 6º A integralização com bens a que se refere o § 4º será feita independentemente de licitação, mediante prévia avaliação e auto-rização específica do Presidente da República, por proposta do Minis-tro da Fazenda.

§ 7º O aporte de bens de uso especial ou de uso comum no FGP será condicionado a sua desafetação de forma in-dividualizada.

Art. 17. O FGP será criado, administrado, gerido e represen-tado judicial e extrajudicialmen-te por instituição financeira con-trolada, direta ou indiretamente, pela União, com observância das normas a que se refere o inciso XXII do art. 4º da Lei nº 4.595, de 31 de dezembro de 1964.

§ 1º O estatuto e o regulamen-to do FGP serão aprovados em

assembléia dos cotistas.§ 2º A representação da

União na assembléia dos cotis-tas dar-se-á na forma do inciso V do art. 10 do Decreto-Lei nº 147, de 3 de fevereiro de 1967.

§ 3º Caberá à instituição financeira deliberar sobre a gestão e alienação dos bens e direitos do FGP, zelando pela manutenção de sua rentabilidade e liquidez.

Fato curioso, e negativo, é a introdução de uma modalidade de seguro-garantia sem risco para a seguradora (privada, sem dúvida!), pois o parágrafo 2º do artigo 18 permite ao FGP “prestar contra-garantias a se-guradoras, instituições financei-ras e organismos internacionais que garantirem o cumprimento das obrigações pecuniárias dos cotistas em contratos de parceria público-privadas.”

Vemos também que institui-ções financeiras e organismos internacionais poderão oferecer garantias aos contratos de par-ceria sem correr risco algum sempre que exigirem a contra-

garantia do FGP. Estas cláusulas abrem a porta para similaridades constatadas no século XIX, pois permitem que os conglomerados transnacionais apliquem recursos garantidos por instituições finan-ceiras e organismos internacio-nais (em moeda forte, portanto), e que essas entidades se con-cedam contra-garantia junto ao FGP, em títulos da dívida públi-ca, provavelmente. Fica explícita, assim, a probabilidade de ocor-rer, no futuro, e em decorrência das concessões em parceria, uma estreita vinculação entre a dívida pública externa e interna. Es-taremos voltando ao tempo dos Rotschild?

Conclusão:Um leque de alternativas

Em toda sociedade há épo-cas propícias ao amplo debate de idéias e de projetos, e outras em que se verifica a ausência de debate e o vazio de idéias. Não cabe, aqui, especular sobre as razões desses ciclos; basta apon-tar sua ocorrência. Há poucos anos, vivenciamos em nosso País uma fase altamente produtiva em matéria de geração de idéias e de projetos (do final dos anos 70 ao início dos anos 90), sucedida por um tempo em que prevalece o pensamento único e a convicção majoritária de que não há alter-nativas às decisões econômicas tomadas pelo Governo.

A privatização/desnaciona-lização dos serviços públicos da década de 1990 foi feita em tempos de pensamento único. O projeto de parcerias público-privadas também foi apresen-tado, em 2003, como a única alternativa viável para implantar

“Há poucos anos, vivenciamos em nosso País

uma fase altamente produtiva em matéria de

geração de idéias e de projetos, sucedida por

um tempo em que prevalece o pensamento

único e a convicção majoritária de que não

há alternativas às decisões econômicas

tomadas pelo Governo ”.

jan/mar de 200541Revista de conjuntura

investimentos de infra-estrutura. Inúmeras respostas foram dadas invalidando esse argumento e demonstrando que, ao contrário, vivemos em fase de abundância de liquidez, de excesso de meios de pagamento esterilizados na dívida pública e na concentração internacional de capitais. O que aparece aos olhos da opinião pública brasileira como ausência de recursos governamentais nada mais é do que “o outro lado da moeda” das políticas fiscal e mo-netária, dependentes do capital estrangeiro, atreladas ao objetivo de oferecer uma taxa interna de juros altíssima, esta sim, única, porque está entre as maiores do mundo. Resulta também esta visão, a única propagada pela mídia, das condicionalidades im-postas ao governo brasileiro pelo Fundo Monetário Internacional e pelo Banco Mundial, agentes articuladores dos interesses das altas finanças internacionais nas décadas recentes.

Na verdade, o estudo da História demonstra que sempre existem alternativas, mas às ve-zes falta dar-lhes visibilidade. No caso das parcerias, duas al-ternativas pelo menos já foram levantadas. Uma partiu dos fundos de pensão, que declara-ram, publicamente, sua disposi-ção de financiar investimentos em infra-estrutura, se tivessem garantia de retorno pouco supe-rior a 6%, em valores reais. A outra foi feita pelo governo do Estado do Paraná, consistindo no lançamento de debêntures populares emitidas por empresas estatais, com benefícios para grandes, mas também para pe-quenos investidores.

As duas alternativas mencio-

nadas acima não envolveriam, diretamente, o setor privado. Os recursos poderiam ser captados e aplicados por estatais, ponto que foi criticado pelos defensores do pensamento único, que “juram de pés juntos” que o setor privado é mais eficiente do que o público. Este argumento é quase imbatí-vel, porque recorre a um dogma, uma afirmação doutrinária, sem análise das condições políticas e sociais que determinam, concre-tamente, o bom uso de recursos públicos. O que fazer? Uma possibilidade é recorrer, mais uma vez, à História de nosso País, à nossa História.

Em visão retrospectiva, po-demos afirmar que, no século XIX, a construção de ferrovias por meio do capital estrangeiro e do regime de garantia de ju-ros não era a única alternativa, e talvez não tenha sido a me-lhor. Quem sabe foi até a pior alternativa? Vejamos alguns pontos específicos.

Se é verdade que as ferrovias foram altamente vantajosas para as finanças inglesas e norte-americanas, para cafeicultores, senhores de engenho e usineiros, e para todos os caçadores de privilégios governamentais e de

comissões, o mesmo não se pode dizer de suas repercussões sobre as finanças públicas, como vi-mos anteriormente. É necessário também considerar as conseqü-ências negativas suportadas pelo povo nessas ocasiões em que os recursos governamentais fica-ram aprisionados por interesses oligárquicos. Repercussões ne-gativas, quando existem, mani-festam-se em rebeliões, revoltas, depredações, o que não faltou ao longo do Segundo Império e da República Velha (ver Edgard Rodrigues).

Se Mauá pode representar, como julgamos, um exemplo das dificuldades enfrentadas por empresários nacionais em so-ciedades dependentes do capital forâneo, escravidão, analfabe-tismo, fome e revoltas populares são a manifestação concreta da impossibilidade de construção de patamares mínimos de justiça social em sociedades desse tipo.

Assim, pouco depois da lei fatal de 1873, dezenas de milha-res de retirantes nordestinos no Ceará ameaçavam realizar saques e depredações em busca de comi-da! Em 1880, no Rio de Janeiro, outro movimento popular, com saques e depredações, explodiu

“É necessário também considerar as

conseqüências negativas suportadas pelo

povo nessas ocasiões em que os recursos

governamentais ficaram aprisionados por

interesses oligárquicos ”.

jan/mar de 200542Revista de conjuntura

em reação contra o “imposto de vintém”, uma taxa sobre trans-portes que viria aliviar o Tesou-ro Imperial. Houve também o Contestado, ao sul, as mortes de milhares de trabalhadores na Estrada de Ferro Noroeste do Brasil e na que ficou conhecida como a Ferrovia do Diabo, a Madeira-Mamoré. A miséria do povo convivia com a opulência de alguns. Assim, por exemplo, conta-nos Alberto de Faria que os empreiteiros ingleses contratados para construir a EF Santos/Jun-diaí, começaram a empregar seus lucros na província de São Paulo comprando uma grande fazenda por 80 mil libras esterlinas! (pág. 193.)

O privilégio de zona e “os privilégios para explorar a longo prazo as terras em redor de cada linha férrea criavam verdadeiros monopólios não só no ramo dos transportes, como também no da colonização de terras, agroindústrias como a da madeira, mineração e outras. A cidade de Porto Velho nasceu exatamente assim...” [Francis-co F. Hardman, pág. 167] O concessionário desta ferrovia, a Madeira/Mamoré, era o norte-americano Percival Farqhuar,

que construiu um verdadeiro império particular em território brasileiro. Paul Singer entende que este personagem “represen-tava uma forma de penetração imperialista que estava sendo superada.... os interesses da nova burguesia industrial em ascensão requeriam serviços chamados de infra-estrutura... baratos” [pág.387].

Voltando à questão das al-ternativas, podemos indagar se existiriam alternativas, no século XIX, ao modelo adotado para construir a infra-estrutura reque-rida pela expansão do comércio exterior. Hoje podemos dizer que sim, que havia pelo menos uma alternativa, de autoria do Barão de Mauá. E a alternativa de Mauá continha objetivos de eficiência, de minimização de custos empresariais e sociais. Seu projeto inicial contemplava o transporte inter e multimodal, ligando o porto do Rio de Janei-ro à margem esquerda do Rio das Velhas, até o São Francisco, entroncamento próximo à atual Pirapora. Serviria também às novas zonas de cafeicultura, pois Mauá formulou o projeto de prolongar até Três Rios a EF Barão de Mauá, a fim de captar

as cargas navegando pelo Paraíba do Sul. Em seguida, voltou-se para São Paulo e organizou a fer-rovia “Inglesa”, a Santos/Jundiaí, em associação com os Rotschild, cavando aí o início de sua ruína financeira.

Mauá organizou ainda as primeiras linhas de navegação fluvial, no Amazonas, evitan-do, por décadas, a penetração estrangeira naquela região. Na fundição de Ponta da Areia fabricou os primeiros tubos metálicos, máquinas da época (as moendas) e componentes necessários ao estaleiro con-tíguo. Apoiava-se nas tarifas protecionistas de Alves Branco, em auxílios governamentais representados por subvenções e por demanda garantida para seus produtos. Banqueiro, Mauá vislumbrou as vantagens de associação entre o capital ban-cário e o capital industrial. E se mais não pensou foi porque enfrentou desde cedo resis-tências poderosas e iniciativas governamentais que tolhiam os benefícios esperados de suas atividades.

Se pensarmos bem, o con-junto da estratégia do Barão de Mauá não apresenta pontos de convergência com a estratégia proposta na segunda metade dos anos 1950, um século depois de Mauá? Uma indústria de bens de capital prévia à produção de bens de consumo, a infra-es-trutura como vetor indutor do desenvolvimento econômico, a participação ativa do Estado em apoio ao empresariado nacio-nal, não eram estes pontos da agenda de um projeto nacional para o Brasil em meados do século XX?

“Em 1880, no Rio de Janeiro,

movimento popular, com saques e depredações,

explodiu em reação contra o “imposto de

vintém”, uma taxa sobre transportes que viria

aliviar o Tesouro Imperial”.

jan/mar de 200543Revista de conjuntura

Enfim, se Mauá foi a alter-nativa que a História não re-gistrou, ou registrou de forma pálida, o mesmo não poderia estar ocorrendo agora? Não estaremos desprezando alterna-tivas mais justas socialmente, mais corretas politicamente, do que as diretrizes contidas na Lei n° 11.079/05? Qual será o nosso futuro se as parcerias constituírem, efetivamente, um equivalente histórico do sistema de garantia de juros do século XIX?

Bibliografia de referência

Alberto de Faria. Mauá, Irineo Evangelista de Souza, Barão e Visconde de Mauá. Companhia Editora Nacional, São Paulo/1933 (2ª edição).

Ana Célia Castro. As empresas estrangeiras no Brasil, 1860-1913. Zahar Editores, Rio de Janeiro/1978.

André Gunder Frank. Capitalisme et sous-développement en Amérique Latine. François Maspero, Paris/1968.

Atílio Boron. Império, Imperialismo. Editora Clacso, Buenos Aires/2002

Bruno Théret Regimes Economiques de l’Ordre Politique. Presses Universitaires de France/1992.

Caio Prado Jr. História Econômica do Brasil. Editora Brasiliense, São Paulo/1965 (9ª edição)

Ceci Juruá.. PPPs, parcerias público-privadas. Mimeo (texto de análise de conjuntura

Econômica fev-março de 2004, LPP/UERJ)

“ “ Traços estruturantes do projeto de lei sobre parcerias público-privadas. Mimeo (palestra realizada no Insti-tuto de Economia/Unicamp em setembro de 2004)

Celso Furtado. Dialética do Desenvolvimento. Editora. Fundo de Cultura, Rio de Janeiro/1964

Edgar Rodrigues. Trabalho e conflito. Editora Arte Moderna, Rio de Janeiro.

Edgardo de Castro Rebello. Mauá e outros estudos. L. São José, Rio de Janeiro/1975

Eric Hobsbauwn. A Era do Capital. Editora Paz e Terra, Rio de Janeiro/1977.

“ “ . A Era dos Impérios. Editora Paz e Terra, Rio de Janeiro/1992 (3ª edição)

Francisco F. Hardman. Trem-fantasma. A ferrovia Madeira-Mamoré e a modernidade na selva. Companhia das Le-tras, São Paulo/2005 (2ª edição)

Odilon Nogueira de Matos. Café e ferrovias. Editora Pontes, São Paulo/1990 (4ª edição)

Paul Singer. “O Brasil no contexto do capitalismo internacional, 1889-1930.” Volume . 8 da História Geral da Civili-zação Brasileira (dir. de Boris Fausto).BCD União de Editoras S.A, Rio de Janeiro/1997 (6ª edição)

* Ceci Vieira Juruá*Economista e pesquisadora

jan/mar de 200544Revista de conjuntura

MANIFESTO - COFECON

Parceria Público – Privada

mínimo de 30%, que a experi-ência dos países asiáticos revela indispensável às taxas aceleradas de crescimento. A solução correta não é, assim, desviar recursos do setor privado, onde também as disponibilidades para investimen-to são escassas. O correto é ado-tar providências necessárias para que a poupança nacional volte aos níveis requeridos pelo bom andamento da economia.

E a forma de obter esse re-sultado se acha claramente ex-pressa na literatura recente sobre o desenvolvimento econômico, inspirada na experiência dos bem sucedidos países asiáticos. Mostra ela que, uma vez adotada estratégia correta de desenvol-vimento, as poupanças crescem espontaneamente. Naqueles países, não foi a elevação de pou-panças que determinou o incre-

mento acelerado do PIB, mas estratégia correta de desenvolvimento, que resultou em maiores pou-panças. No Brasil, se as poupanças se revelaram insuficientes nas últimas duas décadas e meia, foi porque persistíamos em estratégia errada de de-senvolvimento. Ou seja, a verdadeira solução para corrigir as graves defici-ências da infra-estrutura nacional consiste não em medidas pontuais, mas em nova política macroe-conômica, que recoloque o País na trilha do cresci-mento acelerado.

A alegação de que tal é solução de longo prazo e os problemas de infra-estrutura do País exigem medidas de ca-ráter imediato também não pode ser aceita. Se

Pelo Conselho Federal de Economia (COFECON)

O debate em torno das parce-rias público - privadas passou a ocupar, recentemente, o centro dos debates sobre a política eco-nômica nacional. E isso represen-ta grave distorção.

O Poder Público no Brasil chegou a poupar, no passado, o equivalente a 4% do PIB, regis-trando hoje taxa negativa de pou-pança. O resultado foi a rápida deterioração da infra-estrutura econômica do País, de responsabilidade fundamentalmente governamental. Com as PPPs, recorre-se à poupança privada para compensar a insufici-ência da poupança pú-blica.E com o objetivo de atrair o investidor particular para o setor de infra-estrutura, o Governo garante lu-cros, assumido a tota-lidade, ou a parte mais substancial, dos riscos do empreendimento.

Constitui uma fal-sa solução, porque a poupança privada é igualmente insuficien-te. As poupanças totais do País, que atingiram 25% do PIB no passa-do, acham-se hoje bem abaixo dessa percenta-gem e muito longe do

“O Poder Público no Brasil

chegou a poupar, no passado,

o equivalente a 4% do

PIB, registrando hoje taxa

negativa de poupança.

O resultado foi a rápida

deterioração da infra-

estrutura econômica do

País, de responsabilidade

fundamentalmente

governamental”.

jan/mar de 200545Revista de conjuntura

bem que nova estratégia de de-senvolvimento constitua requisito fundamental, ela pode e deve ser acompanhada de medidas com efeitos de curto prazo. Entre estas está a redução da elevadíssima taxa de juros vigente no País, no-toriamente uma das causas básicas da debilidade financeira das três esferas de Governo, medida essa dentro da capacidade do Banco Central, desde que se disponha a adotar, caso se revele necessário, ações de emergência, como a cen-tralização do câmbio, controle das entradas e saídas de capital, e me-tas mais elevadas de inflação.

Em vez da adoção de me-didas corretas para eliminar as deficiências de infra-estrutura, o recurso às PPPs vem-se ge-neralizando no País. Estados como São Paulo, Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Goiás se antecipam à legislação federal, anunciando a adoção de medidas destinadas a viabilizar, desde logo, a adoção das PPPs. A par disso, propostas se multiplicam no sentido de ampliar o campo de aplicação do instrumento e a aumentar sua atratividade para o investidor privado. Ou seja, as PPPs começam a se transformar numa espécie de panacéia uni-versal para os males econômicos do País.

Ora, essa generalização pode implicar em graves conseqüên-cias de prazos médio e longo. Antes de mais nada, tende a consolidar a idéia de que investi-mentos em infra-estrutura repre-sentam aspecto fundamental das políticas de desenvolvimento,

quando tal papel cabe aos inves-timentos diretamente produtivos. Estes se verão, inclusive, difi-cultados pelo desvio de margem substancial de poupanças para a infra-estrutura. A experiência concreta mostra, outrossim, que, a prazos longo e médio, as PPPs determinam pesados ônus sobre as finanças públicas. Problema desse tipo foi o observado na experiência brasileira no século XIX, quando o Governo garantiu níveis mínimos de lucratividade a investimentos de infra-estrutura. As responsabilidades financeiras resultantes revelaram-se de tal monta que ele se viu obrigado a assumir empreendimentos ini-cialmente concedidos à iniciativa privada. Dificuldades do mesmo tipo foram registradas na Ingla-terra.

A par disso, a garantia de lucros, ou o fato de o Governo assumir riscos, patrocina a ine-ficiência. O objetivo básico de se obter o máximo de resultados com o mínimo de investimentos desaparece, dado que, quanto maiores os investimentos, mais elevados os lucros. Finalmen-te, a generalização das PPPs constitui o primeiro passo para o que se poderia chamar de um

capitalismo sem riscos, contra o qual existem duas importantes objeções. Em primeiro lugar, a aceitação do risco se acha na essência do sistema capitalista. É exatamente esta que garante a procura da eficiência operacio-nal. Em sentido contrário, falta dela é freqüentemente apontada como uma das causas do colapso da experiência socialista. Em segundo lugar, à medida que se multipliquem as oportunidades de investimento sem riscos em infra-estrutura, as aplicações em atividades diretamente produti-vas serão desencorajadas, fato de extrema gravidade, porque justamente destas depende o sucesso das políticas de desen-volvimento.

Nesse contexto torna-se im-portante definir a posição do BN-DES. O papel dessa instituição financeira, de grande importância no desenvolvimento do País, é financiar investimentos em ativi-dades diretamente produtivas, o que exclui qualquer apoio seu ao programa PPPs, orientado funda-mentalmente para a infra-estrutu-ra econômica.

É, em suma, fundamental evi-tar erro desse tipo, cometido no passado, quando o Banco desviou

“As PPPs podem e devem ser aceitas,

mas fundamentalmente enquanto

medida de emergência e, portanto, de

uso estritamente limitado”.

jan/mar de 200546Revista de conjuntura

fundos importantes para apoiar o programa de privatização.

Isso não significa que se deva condenar, de forma liminar e ra-dical, as PPPs. No contexto das graves dificuldades de infra-es-trutura que vitimam o País, resul-tantes de 25 anos de semi-estag-nação, isso seria pouco realista.

As PPPs podem e devem ser aceitas, mas fundamentalmente enquanto medida de emergência e, portanto, de uso estritamente limitado. Sistema de controle destinado a garantir que sejam usadas apenas em situações crí-ticas ou de alta prioridade se faz, assim, necessário. As iniciativas

www.corecondf.org.br

estaduais com relação as PPPs devem ser coibidas. A utilização do instrumento deve, finalmente, ser limitada no tempo ou, espe-cificamente, ao período em que medidas do tipo acima referido, destinadas a garantir a retomada do desenvolvimento, não tenham produzido resultados.

jan/mar de 200547Revista de conjuntura

Em junho de 2003, um grupo de mais de 300 economistas bra-sileiros divulgou um manifesto, no qual advertia para o agrava-mento da crise social em face do aprofundamento, pelo Governo Lula, da política macroeconômi-ca herdada do governo anterior. Apontamos como alternativa, fruto de um consenso mínimo, um programa de sete pontos, que configurava um compromisso com a adoção de uma política de promoção do pleno emprego, num contexto de retomada do desenvolvimento e de realização da democracia social.

Passado mais de um ano, um grupo inicial de cerca de trinta economistas, signatários ou aderentes àquele manifesto, reuniu-se novamente, para fazer uma avaliação da conjuntura econômica à vista de nossas proposições anteriores e das perspectivas que se apresentam à sociedade brasileira. Nossa conclusão, enriquecida por su-gestões de outros economistas que assinam o presente docu-mento, é que a situação social se agravou de uma forma ine-quívoca, e que o ligeiro suspiro de crescimento que se verificou em 2004 não muda o caráter

MANIFESTO DOS ECONOMISTAS

“E Nada mudou”Por uma política econômica voltada para um projeto nacional de

desenvolvimento, com prioridade para a geração de empregos e a

redução das desigualdades sociais.

excludente e pauperizador da política econômica. Ou seja, continuamos no rumo errado; mas há alternativa.

A adoção pelo Governo Lula da mesma política econômica adotada no segundo mandato do Governo FHC – e com o objetivo de manter o modelo de economia inaugurado por Collor - demons-tra que o desejo de mudança, expresso claramente pelo povo, nas eleições de 2002, foi usurpa-do pelo mesmo poder econômi-co, que quer manter a todo custo seus privilégios.

É nossa convicção que, a des-peito do aprofundamento da crise social, não há sinais de reversão da atual política econômica; ao contrário, o governo tem reafirma-do que não quer mudar. Portanto, é nosso dever de cidadania insistir na denúncia de que esta política econômica não atende aos inte-resses da maioria e que aumen-tará cada vez mais os problemas sociais. A suposta estabilização macroeconômica, apoiada em políticas monetária e fiscal res-tritivas, ocorre em detrimento da estabilidade social. As taxas de desemprego e de subemprego nas principais regiões metropolitanas se elevam a um quarto da popula-

ção ativa, o que configura, de lon-ge, a maior crise social de nossa História, levando a uma escalada da marginalização social, da cri-minalidade e da insegurança.

O surto do modesto cresci-mento econômico deste ano não deve iludir ninguém:1 - a base de comparação utilizada

é com o ano de 2003, quando houve queda do produto;

2 - o crescimento observado con-centra-se nas áreas de expor-tação e de bens de consumo duráveis, enquanto os setores produtores de bens não - du-ráveis, onde se concentra o consumo das massas, apre-senta um comportamento distinto, com alguns de seus segmentos estagnados ou mesmo em queda;

3 - o crescimento apurado efetivamente é ainda muito baixo para ter qualquer efei-to relevante sobre a geração de emprego;

4 - a renda do trabalho cai pelo quinto ano consecutivo;

5 - esse crescimento não reduz a vulnerabilidade externa do País, que, ao contrário, tende a agravar-se diante do elevado nível de endi-

jan/mar de 200548Revista de conjuntura

vidamento externo, baixas reservas internacionais, crescente desnacionalização (inclusive da infra-estrutu-ra) e regressão do sistema nacional de inovações.

A política econômica do governo coloca a sociedade bra-sileira em uma armadilha, de tal forma que qualquer ameaça ou chantagem, externa ou interna, é enfrentada com medidas mo-netárias e fiscais restritivas que agravam a crise social. Além de travar a economia, o superávit primário – elevado para 4,5% do PIB – e os juros básicos de agiotagem – elevados novamente para, agora, 19,75% a.a. – são uma verdadeira máquina de transferência de renda de pobres para ricos, na medida em que implicam a tributação indireta dos pobres, e o aumento da tribu-tação direta da classe média, para o pagamento dos juros da dívida pública aos ricos.

A sociedade brasileira deve ser conscientizada de que a atual política econômica não é capaz de nos tirar desta crise e, na verdade, tende a agravá-la,

recorrentemente. E a sociedade brasileira deve ser igualmente conscientizada de que há alter-nativa. É com esse duplo propó-sito que estamos divulgando este novo manifesto.

Os eixos estruturantes da reto-mada de um projeto nacional de desenvolvimento são a redução da vulnerabilidade externa e a promoção do pleno emprego. Nesse sentido, propõem-se as seguintes medidas imediatas:1 - reduzir drasticamente a atual

taxa de juros básica (Selic), que serve para remunerar os títulos públicos. Portanto, a taxa de juros passa a ser focada no ajuste das contas públicas;

2 - desvincular a taxa de redes-conto (que remunera os em-préstimos do Banco Central aos bancos) da taxa Selic, liberando o BC para a utiliza-ção ativa das taxas de redes-conto, depósitos compulsó-rios e cobrança de IOF como formas de regulação seletiva do crédito;

3 - estabelecer mecanismos de controle no fluxo de entrada

e saída de capitais externos do País, controlando a conta de capitais, com o objetivo de impedir a evasão externa de divisas, em face da queda da taxa de juros;

4 - interromper a captação de recursos externos pelo se-tor público, recompor de forma contínua as reservas internacionais do País e estabelecer critérios para o processo de endividamento externo privado;

5 - promover a redução do “spre-ad” e dos custos dos serviços dos bancos privados, por meio da rivalidade agressiva derivada da oferta de crédito e de serviços financeiros pe-los bancos públicos;

6 - realizar uma reforma fiscal que priorize os investimentos na economia interna e nos programas sociais, e inclua um sistema progressivo de tributação, capaz de acelerar a distribuição da renda e, em conseqüência, o crescimento sustentado da economia e das oportunidades de trabalho;

7 - realizar uma auditoria finan-ceira e social da dívida exter-na, para dar transparência e justiça ao processo de endivi-damento, e para tornar efeti-vo o controle democrático;

8 - administrar a política cambial de maneira favorável às ex-portações e à substituição das importações, e compatível com o equilíbrio dos fluxos de capitais externos;

9 - reverter o processo de des-nacionalização dos setores de produtos não comerciali-záveis internacionalmente,

“A política econômica do governo coloca

a sociedade brasileira em uma armadilha,

de tal forma que qualquer ameaça ou

chantagem, externa ou interna, é enfrentada

com medidas monetárias e fiscais restritivas

que agravam a crise social”.

jan/mar de 200549Revista de conjuntura

uma campanha pela regulamen-tação do direito ao exercício do plebiscito pelo povo, de onde todo poder emana.

Queremos que cada cidadão brasileiro tenha a perspectiva de encontrar trabalho remunerado, acesso democrático a todos os níveis de escolarização e com a devida proteção à saúde. É um direito básico, republicano, de cidadania. Não nos conformamos com o fato de que, para milhares de jovens em nossas periferias metropolitanas, a perspectiva mais atraente de sobrevivência seja o aliciamento pelo tráfico de drogas. Não aceitamos que o pro-blema da segurança em nossas cidades seja insolúvel. Não acei-tamos a permanente transferência de renda para o setor financeiro e para os rentistas. Não queremos mais que os rumos do País sejam determinados por uma conjuntura internacional volátil, seja no sis-tema financeiro, seja no sistema mundial de comércio. Estamos convencidos de que, por meio de uma nova economia, será possí-vel estruturar uma nova ordem social e estabelecer uma trajetó-ria de desenvolvimento.

A política econômica atual é coerente com a manutenção dos privilégios da camada mais rica

da população, dos setores finan-ceiros e daqueles voltados para a exportação. A nossa proposta de política econômica é diferen-te. Ela se insere em um Projeto Nacional de Desenvolvimento voltado para a garantia dos inte-resses dos que dependem do seu trabalho, da imensa maioria do povo brasileiro.

O povo brasileiro, mais de uma vez, deu demonstrações, em nossa História política, de sua capacidade de mobilização e de luta por mudanças, para atender os interesses nacionais, democrá-ticos e populares. Esperamos que o povo se conscientize da neces-sidade de se mobilizar, mais uma vez, para lutar contra as políticas neoliberais e pela construção de uma ordem social mais justa.

A política é o instrumento adequado para a transformação econômica e social. E é funda-mental para o progresso demo-crático que haja ampla circula-ção de idéias e que a imprensa cumpra o seu papel de informar, sem cair na tentação totalitária do pensamento único. De nossa parte, continuaremos a exercer o nosso dever de criticar e de pro-por alternativas.

“Queremos que cada cidadão brasileiro

tenha a perspectiva de encontrar trabalho

remunerado, acesso democrático a todos

os níveis de escolarização e com a devida

proteção à saúde”.

de modo a reduzir a rigidez das contas externas do País (o que implica cancelar o programa parcerias público - privadas);

10 - utilizar os recursos, ora este-rilizados no superávit primá-rio, em programas de dispên-dio público voltados para a expansão e melhoria dos ser-viços públicos básicos, como educação, saúde, habitação popular, assim como para in-vestimentos de infra-estrutura e apoio decisivo à agricultura familiar, reforma agrária e economia solidária.

Este é um programa que busca ir às raízes de nossa crise para encontrar os elementos de sua superação. Na verdade, não estamos propondo, com este pro-grama, nada de extraordinário no campo político. Com a mudança das políticas fiscal e monetária pretende-se aumentar, de forma sustentada, o investimento e a geração de emprego. A lógica de nossas propostas se baseia na defesa da prioridade em políticas que representem a distribuição de renda e riqueza, e soluções democráticas para os graves pro-blemas que a imensa maioria de nosso povo enfrenta.

Do ponto de vista político, é importantíssimo que o povo brasileiro tenha assegurados os direitos garantidos pela Consti-tuição, de decidir por plebiscito e/ou consulta popular todos os temas que afetam toda sociedade, como os acordos internacionais da ALCA, OMC, Mercosul-UEE, transgênicos, entre outros. Por isso, somamo-nos à iniciativa da OAB, CNBB e MST, de iniciar

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