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A Nova Rota da Seda: entre a tradição histórica e o projeto geoestratégico para o futuro Ricardo Lopes Kotz 2018 Florianópolis, 2018 A Nova Roda da Seda, denominada como Belt and Road Initiative (BRI), consiste em um plano de investimentos proposto pela China englobando 65 países, compreendendo aproximadamente 62% da população e 30% do PIB global. A BRI é a principal iniciativa de política externa do governo de Xi Jinping, resultando em uma visão estratégica para a projeção do país. Esta dissertação tem como objetivo identificar o papel da Belt and Road Initiative para a estratégia de inserção internacional da China no século XXI. As fontes escolhidas visaram conciliar as análises de teóricos ocidentais, aliadas às posições de analistas orientais acerca do tema. Orientador: Prof. Dr. Helton Ricardo Ouriques Dissertação de Mestrado Universidade Federal de Santa Catarina Programa de Pós- Graduação em Relações Internacionais http://ppgri.ufsc.br/ Campus Universitário Florianópolis- SC Universidade Federal de Santa Catarina Programa de Pós-Graduação em Relações Internacionais Dissertação apresentada ao Programa de Pós- graduação em Relações Internacionais do Centro de Ciências Sociais e Econômicas da Universidade Federal de Santa Catarina, como requisito para obtenção do Título de Mestre em Relações Internacionais Orientador: Prof. Dr. Helton Ricardo Ouriques A Nova Rota da Seda: entre a tradição histórica e o projeto geoestratégico para o futuro Ricardo Lopes Kotz

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2018

Florianópolis, 2018

A Nova Rota da Seda:

Entre a Tradição Histórica e o Projeto

Geoestratégico para o Futuro

Ricardo Lopes Kotz

A Nova Roda da Seda,

denominada como Belt

and Road Initiative

(BRI), consiste em um

plano de investimentos

proposto pela China

englobando 65 países,

compreendendo

aproximadamente 62%

da população e 30%

do PIB global. A BRI é

a principal iniciativa de

política externa do

governo de Xi Jinping,

resultando em uma

visão estratégica para

a projeção do país.

Esta dissertação tem

como objetivo

identificar o papel da

Belt and Road Initiative

para a estratégia de

inserção internacional

da China no século

XXI. As fontes

escolhidas visaram

conciliar as análises

de teóricos ocidentais,

aliadas às posições de

analistas orientais

acerca do tema.

Orientador:

Prof. Dr. Helton

Ricardo Ouriques

Dissertação de Mestrado

Universidade Federal de

Santa Catarina

Programa de Pós-

Graduação em Relações

Internacionais

http://ppgri.ufsc.br/

Campus Universitário

Florianópolis- SC

Universidade Federal de Santa Catarina

Programa de Pós-Graduação em

Relações Internacionais

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-

graduação em Relações Internacionais do

Centro de Ciências Sociais e Econômicas da

Universidade Federal de Santa Catarina, como

requisito para obtenção do Título de Mestre

em Relações Internacionais

Orientador: Prof. Dr. Helton Ricardo Ouriques

A Nova Rota da Seda:

entre a tradição histórica e o

projeto geoestratégico para o

futuro

Ricardo Lopes Kotz

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Ricardo Lopes Kotz

A NOVA ROTA DA SEDA: ENTRE A TRADIÇÃO HISTÓRICA

E O PROJETO GEOESTRATÉGICO PARA O FUTURO.

Dissertação submetida ao Programa de

Pós-Graduação em Relações

Internacionais da Universidade Federal

de Santa Catarina para a obtenção do

Grau de mestre em Relações

Internacionais. Orientador: Prof. Dr. Helton Ricardo

Ouriques

Florianópolis

2018

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Ficha de identificação da obra elaborada pelo autor, através do Programa de Geração Automática da Biblioteca Universitária da UFSC.

Lopes Kotz, Ricardo A Nova Rota da Seda : entre a tradição histórica eo projeto geoestratégico para o futuro / RicardoLopes Kotz ; orientador, Prof. Dr. Helton RicardoOuriques, 2018. 148 p.

Dissertação (mestrado) - Universidade Federal deSanta Catarina, Centro Sócio-Econômico, Programa dePós-Graduação em Relações Internacionais,Florianópolis, 2018.

Inclui referências.

1. Relações Internacionais. 2. China. 3. Rota daSeda. 4. Geopolítica. 5. Economia política. I.Ouriques, Prof. Dr. Helton Ricardo. II.Universidade Federal de Santa Catarina. Programa dePós-Graduação em Relações Internacionais. III. Título.

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Este trabalho é dedicado à minha mãe,

Nidia Elias Lopes e à memória de

meu pai, Hélvio Ornélio Kotz.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço à Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) por

ter sido o espaço de aprendizado, discussões e de acesso à pós-

graduação gratuita e de qualidade; e à Coordenação de Aperfeiçoamento

de Pessoal de Nível Superior (CAPES) pelo fomento à pesquisa.

Agradeço especialmente ao professor Helton Ricardo Ouriques pela

disposição em aceitar a minha intenção de pesquisa e pelas orientações

que foram essenciais para a realização desta dissertação.

Gostaria de agradecer a todas e todos os professores com quem

convivi na UFSC pelas experiências e pelo aprendizado. Agradeço aos

meus colegas do curso de mestrado da UFSC, os quais proveram apoio

constante durante estes dois anos. Agradeço a todas minhas professoras,

professores e colegas da Universidade Federal do Pampa (UNIPAMPA)

pela formação e convivência durante a graduação.

Agradeço, ao meu amigo Leon Diniz da Costa pelas longas

conversas, pela total disponibilidade em ouvir e aconselhar, além da

parceria em todos os momentos nos quais o peso da vida se encontrava

muito difícil, mas suas palavras me fizeram seguir em frente. Agradeço

igualmente ao meu amigo Alexandre Arns Gonzales pela parceria que

me inspirou a perseguir um curso de mestrado.

Agradeço à minha mãe, Nidia Elias Lopes pelo amor

incondicional e cumplicidade durante esta jornada, além dos meus avós

Darcy de Almeida Lopes e Adel Elias Lopes. Ao meu pai, Hélvio

Ornélio Kotz, agradeço pelos momentos que pudemos desfrutar juntos,

por todos os ensinamentos que foram definitivos para a construção da

minha personalidade e para o desenvolvimento do meu potencial

enquanto ser humano e cidadão. Por fim, agradeço ao meu pai por ter

sido o exemplo que me fez desenvolver o hábito e o amor pela leitura.

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The real crucible, the ‘Mediterranean’ in its literal

meaning – the center of the world – was not a sea

separating Europe and North Africa, but it was

right in the heart of Asia (FRANKOPAN, 2015, p.

19).

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RESUMO

A Nova Roda da Seda, denominada como Belt and Road

Initiative (BRI), consiste em um plano de investimentos proposto pela

China englobando 65 países, compreendendo aproximadamente 62% da

população e 30% do PIB global. A BRI é a principal iniciativa de

política externa do governo Xi Jinping, resultando em uma visão

estratégica para a projeção do país. Esta dissertação tem como objetivo

identificar o papel da Belt and Road Initiative para a estratégia de

inserção internacional da China no século XXI. A dimensão terrestre da

BRI, cuja delimitação geográfica corresponde à massa continental

eurasiática, consiste no objeto da presente dissertação. O trabalho

pretende contribuir para a agenda de pesquisa no Brasil auxiliando para

a compreensão acerca da estratégia internacional da China. As fontes

escolhidas visaram conciliar as análises de teóricos ocidentais, aliadas às

posições de analistas orientais acerca do tema. A pesquisa foi orientada

pela hipótese de que a Nova Rota da Seda consiste no aprofundamento

da estratégia "Going Global", iniciada pela China no ano 2000. A

bibliografia analisada confirmou a hipótese inicialmente observada.

Além disto, foi possível identificar outros possíveis papéis para a Nova

Rota da Seda, que residem no plano da geopolítica e da (geo) economia.

Pontualmente, no campo da estratégia e da geopolítica, sublinhamos

dois principais temas: 1) a importância geopolítica da região da Eurásia

para a extensão da influência chinesa; 2) manutenção da coesão

territorial do Estado chinês ao dissuadir movimentos separatistas nas

províncias a oeste do seu território. No que diz respeito às razões (geo)

econômicas, sublinhamos três principais papéis ou condicionantes para a

BRI: 1) estímulo à economia da China (fatores domésticos); 2)

exportação da sobre capacidade produtiva da indústria de construção

civil e de infraestrutura do país; 3) estímulo e uma importante parte da

estratégia "Going Global". Constatou-se, portanto, que a BRI possui um

papel importante para a consecução de objetivos domésticos e

internacionais da China. As considerações finais realizam algumas

ponderações acerca desta iniciativa, que deverá se tornar relevante para

a manutenção do ritmo de crescimento da economia chinesa no longo prazo, fator que está ligado à estabilidade política do país.

Palavras-chave: Rota da Seda; Belt and Road Initiative; China;

Eurásia.

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ABSTRACT

The New Silk Road, denominated Belt and Road Initiative (BRI),

consists of an investment plan proposed by China covering 65 countries,

comprising approximately 62% of the population and 30% of global

GDP. The BRI is the main foreign policy initiative of the Xi Jinping

government, resulting in a strategic vision for the country's international

projection. This dissertation aims to identify the role of the Belt and

Road Initiative for China's international role in the 21st century. The

terrestrial dimension of the Initiative, whose geographical delimitation

corresponds to the Eurasian continental mass, is the object of this study.

The research intends to contribute to the research agenda in Brazil,

helping to better understand China's international strategy. The selected

sources were chosen in order to combine the analyzes of Western

theoreticians with the positions of Eastern analysts on the subject. The

research was guided by the hypothesis that the New Silk Road consists

of a deepening of the "Going Global" strategy, initiated by China in the

year 2000. The bibliography analyzed confirmed the hypothesis initially

observed. In addition to that, other possible roles for the New Silk Road

have been identified, which reside in the geopolitical and (geo)

economic domains. Specifically, in the field of strategy and geopolitics,

we underline two main themes: 1) the geopolitical importance of the

Eurasian region for the extension of Chinese influence; 2) Maintaining

the territorial cohesion of the Chinese State by dissuading separatist

movements in the western provinces of its territory. With regards to the

(geo) economic aspect, we underline three main possible roles for BRI:

1) Stimulus to China's economy; 2) the export of the overcapacity of the

construction industry and of the country's infrastructure apparatus; 3) A

stimulus and an important part of the "Going Global" strategy. The Belt

and Road Initiative plays an important role in the achievement of

China's domestic and international goals. The final considerations point

to the fact that the BRI should become relevant to maintain the pace of

growth of the Chinese economy in the long term, a factor that is linked

to the political stability of the country.

Keywords: Silk Road, Belt and Road Initiative; China; Eurasia.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - A organização geopolítica do mundo segundo

Mackinder: ............................................................................................ 37 Figura 2: Mapa expandido da Rota da Seda. .............................. 80 Figura 3 Mapa da Rota da Seda com foco na China. .................. 81 Figura 4: Dinastias da China no período de 1500 a.C - 220 d.C. 83 Figura 5: Mapa da Nova Rota da Seda em suas dimensões

terrestre e marítima: .............................................................................. 91 Figura 6: Mapa dos diferentes eixos de articulação da BRI: ...... 91 Figura 7: Mapa da conectividade de infraestrutura na Eurásia: .. 98

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1: Reservas globais de gás natural 2005-2015 (trilhões de

pés cúbicos): .......................................................................................... 41 Tabela 2: Reservas globais de petróleo 2005-2015 (bilhões de

barris): ................................................................................................... 41 Tabela 3: Emissão de investimentos estrangeiros diretos da

China, em milhões de dólares, atualizados para valores atuais. ............ 74

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

AIIB - Asian Infrastructure Investment Bank

ASEAN - Associação das Nações do Sudeste Asiático

BRI - Belt and Road Initiative

BRICS - Brasil, Rússia, Índia China e África do Sul

CAPES - Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível

Superior

CDB - China Development Bank

CHINA EXIMBANK - Banco de Exportações e Importações da

China

CPEC - Corredor Econômico China-Paquistão

EUA - Estados Unidos da América

IED - Investimento estrangeiro direto.

MOFCOM - Ministério do Comércio da República Popular da

China

NDB - New Development Bank

OCDE - Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento

Econômico

OCX - Organização para a Cooperação de Xangai

OMC - Organização Mundial do Comércio

ONU - Organização das Nações Unidas

PCC - Partido Comunista da China

PIB - Produto Interno Bruto

UE - União Europeia

UEE - União Econômica Eurasiática

UNCTAD - United Nations Conference on Trade and

Development

URSS - União das Repúblicas Socialistas Soviéticas

MOFTEC - Ministério de Comércio Exterior

ZEEs - Zonas Econômicas Especiais

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ............................................................... 23

2 GEOPOLÍTICA E GEOESTRATÉGIA ....................... 29 2.1 O SIGNIFICADO GEOPOLÍTICO DA EURÁSIA ........ 34

2.2 A ESFERA DE INFLUÊNCIA DA CHINA E SUA

ATUAÇÃO GEOESTRATÉGICA NA EURÁSIA ............................... 43

2.3 A GEOECONOMIA CHINESA: OS INSTRUMENTOS

PARA CONSOLIDAÇÃO DE INFLUÊNCIA .................................... 46

3 A INSERÇÃO INTERNACIONAL DA CHINA .......... 51 3.1 O PENSAMENTO CHINÊS ACERCA DAS RELAÇÕES

INTERNACIONAIS ........................................................................... 51

3.2 - AS REFORMAS ECONÔMICAS E OS INVESTIMENTOS DA CHINA NO EXTERIOR. ............................... 64

3.2.1 A Política de Portas Abertas (1979-1989) ............. 69

3.2.2 O Período de 1990-1999 ........................................ 70

3.2.3 ............... O Período de 2000-2016: A Estratégia Going Global

....................................................................................................... 73

4 A NOVA ROTA DA SEDA: ENTRE A TRADIÇÃO

HISTÓRICA E O PROJETO GEOESTRATÉGICO PARA O

FUTURO ........................................................................................... 79 4.1 A PERSPECTIVA HISTÓRICA: A ANTIGA ROTA DA

SEDA: ....................................................................................... 80

4.2 O PROJETO GEOESTRATÉGICO: A BELT AND ROAD

INITIATIVE ....................................................................................... 90

5 .................. O PAPEL DA BELT AND ROAD INITIATIVE PARA A

PROJEÇÃO INTERNACIONAL DA CHINA NO SÉCULO XXI ...

............................................................................................................. 105 5.1 ESTRATÉGIA E GEOPOLÍTICA ................................ 106

5.1.1 Importância Geopolítica da Região da Eurásia para a

Extensão da Influência Chinesa .................................................. 106

5.1.2 Evitar Movimentos Separatistas nas Províncias

Localizadas no Oeste ................................................................... 108

5.2 (GEO) ECONOMIA .................................................... 109

5.2.1 Estímulo à Economia da China ........................... 110

5.2.2 Exportação da Sobre Capacidade Produtiva das Indústrias de Construção Civil e de Infraestrutura do País; ........ 111

5.2.3 Estímulo e uma Importante Parte da Estratégia

Going Global ............................................................................. 112

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5.3 A BELT AND ROAD INITIATIVE COMO UMA VISÃO

(GEO) ESTRATÉGICA PARA A CHINA: UM ESFORÇO DE SÍNTESE ..................................................................................... 114

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ....................................... 123

7 REFERÊNCIAS ............................................................ 129

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23

1 INTRODUÇÃO

No século XXI, a Ásia emerge como uma das regiões mais

importantes da economia mundo (ARRIGHI, 2009), compreendendo

29.7% do produto interno bruto global (WORLD BANK DATABASE,

2017). A ascensão econômica da China se destaca neste cenário. O

processo foi impulsionado pelo período de reformas e abertura

introduzido pelo governo de Deng Xiaoping (1978-1989), resultando em

um período de 30 anos onde o país alcançou uma média de crescimento

de 10% ao ano e retirou 500 milhões de pessoas da linha de pobreza

(BANCO MUNDIAL, 2013, p. 23). O acelerado desenvolvimento

econômico e o aumento da projeção internacional da China nas últimas

décadas reforçam a importância de que sejam produzidas análises

críticas em relação à estratégia chinesa.

Desde o ano 2000, a China vem aumentando a sua projeção

global, tendo lançado sua estratégia de inserção externa denominada

Going Global. Inicialmente, o país investiu na consolidação de redes de

comercialização em seu entorno regional. A estratégia foi se

aprofundando à medida que as empresas estatais da China começaram a

investir em outros países, sobretudo visando à construção de obras de

infraestrutura e o acesso a mercados que pudessem prover recursos

naturais, tais como gás natural e petróleo. Apenas recentemente, os

investimentos chineses no exterior passaram a ter um foco maior na

aquisição de companhias estrangeiras e na instalação de subsidiárias em

outros países (STATE COUNCIL OF THE REPUBLIC OF CHINA,

2015; YEH & WHARTON, 2016).

A busca da China por recursos naturais é decorrente do rápido

ritmo de reformas econômicas, do aumento de suas exportações, e de

sua crescente urbanização. As necessidades energéticas do país

aumentaram significativamente e a China vem empregando uma forma

de diplomacia exercida através do binômio representado pela ação

governamental em conjunto com os investimentos e a ação de suas

empresas estatais, de modo a obter o acesso aos recursos estratégicos

que possibilitam a manutenção do crescimento de sua economia. O país

recorre ao comércio e aos investimentos, além da ajuda para o

desenvolvimento como formas de promover a boa vontade dos países-alvo em permitir o acesso e escoamento dos recursos naturais que a

China necessita (ZWEIG e JIANHAI, 2005). Este movimento

reaproximou a China de países emergentes, também denominados como

países em desenvolvimento, situados, sobretudo em regiões ricas em

hidrocarbonetos e recursos estratégicos (KLARE, 2013).

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24

Atualmente a China avança de forma mais incisiva e sistemática

sobre novas áreas geográficas, tal como a Eurásia, região delimitada

pelo componente terrestre da Nova Rota da Seda. A importância

geopolítica e estratégica da Eurásia foi apontada por pensadores como

Mackinder (1919; 1944), Spykman (1969), Brzezinski (1997; 2016),

Frankopan (2015), entre outros.

A Nova Roda da Seda, também denominada Belt and Road Initiative (identificada sob o acrônimo "BRI") foi oficialmente

anunciada pelo mandatário chinês Xi Jinping no ano de 2013. O projeto

compreende a Silk Economic Road (componente terrestre), passando

pela Ásia Central, pelo Oriente Médio, pela Rússia e chegando até a

Europa, incluindo basicamente o território da Eurásia. A rota terrestre é

complementada pela Maritime Silk Road, uma rota marítima que ligará

os portos chineses no sudeste asiático com países da Costa Africana,

passando pelo Oceano Índico, pelo Canal de Suez e chegando até o

Mediterrâneo.

A BRI consiste em um vasto plano de integração econômica e de

infraestrutura que engloba em torno de 65 países, compreendendo

aproximadamente 62% da população global e 30% do PIB mundial

(CHIN & HE, 2016). Desde 2013, 900 projetos entraram em

negociação1, com valores que chegam ao montante de US$ 890 bilhões,

sendo que a China afirma que os investimentos na BRI poderão alcançar

o montante de aproximadamente US$ 4 trilhões (ECONOMIST, 2016).

A BRI se divide em seis corredores econômicos: 1) a Nova Ponte

Terrestre Eurasiática (que chegará até o território europeu); 2) o eixo

China-Mongólia-Rússia; 3) o eixo central China-Ásia Ocidental

(perpassando o Oriente Médio); 4) o eixo da Península China-Indochina;

5) o eixo do Corredor Econômico China-Paquistão e, finalmente, 6) o

Corredor Econômico Bangladesh-China-Índia-Mianmar. Relatórios

estratégicos elaborados pela academia chinesa apontam que o projeto

deverá se estender por um período de 30 a 40 anos (HONG, 2016).

Para fins de esclarecimento, utilizaremos na presente dissertação

os termos Belt and Road Initiative e Nova Rota da Seda como

sinônimos. Reconhecemos que atualmente, a expressão Belt and Road

1 Este número corresponde a uma estimativa advinda dos projetos

atualmente em negociação. As declarações do presidente Xi Jinping enfatizam o

caráter aberto do plano, sendo que novos países podem se integrar a OBOR em

qualquer momento (CHIN e HE, 2016). Para uma análise específica dos

projetos, além de previsões quanto aos possíveis riscos, ver The Economist (B),

2016.

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25

Initiative é termo oficial designado pelas autoridades da China em seus

pronunciamentos e discursos, sendo que a mídia e certos analistas

utilizam igualmente a expressão Nova Rota da Seda como um sinônimo.

Esta pesquisa se situa no tema da inserção internacional da China

no período de 2001-2016, sendo que o objeto desta pesquisa será a Nova

Rota da Seda, com foco em sua dimensão terrestre, pretendendo

responder à seguinte pergunta: qual o papel desempenhado pela Nova

Rota da Seda (Belt and Road Initiative) para o projeto de inserção

internacional da China no século XXI?

Para responder a esta pergunta de pesquisa, a presente dissertação

possui os seguintes objetivos: 1) Compreender o significado geopolítico

atribuído à região da Eurásia. 2) Analisar a projeção internacional da

China após o ano de 2001, através dos seus investimentos e de sua

matriz ideológica. 3) Identificar os principais elementos da Nova Rota

da Seda (Belt and Road Initiative), evidenciando os seus fundamentos

geopolíticos e geoeconômicos.

Trabalhou-se com a hipótese preliminar de que a Nova Rota da

Seda signifique uma nova fase e a expansão da estratégia Going Global. De forma simplificada, é possível dizer que a Nova Rota da Seda é

atualmente a principal visão estratégica da China acerca do seu

posicionamento na estruturação da ordem global (BEESON & LI, 2016;

ROLLAND, 2017).

O uso da terminologia escolhida é igualmente importante.

Mudou-se a nomenclatura de One Belt, One Road (OBOR) para Belt

and Road Initiative, pois a palavra Iniciativa tem um tom inclusivo.

Adicionalmente, Belt and Road Initiative é uma expressão mais

facilmente traduzível para outras línguas, ainda que a expressão One

Belt, One Road seja mais fiel a uma tradução literal do termo chinês que

designa o projeto. Escolhe-se propositalmente evitar a palavra estratégia,

de modo a não provocar a percepção de que haja razões geopolíticas

para a Iniciativa, pensando na necessidade de aceitação e construção de

legitimidade entre as partes envolvidas (XIAOYU, 2017).

A presente pesquisa pretende contribuir para a discussão

acadêmica acerca da BRI, visando conciliar a visão de teóricos

ocidentais e teóricos orientais acerca do tema. Rolland (2017, p. 192)

afirma que os teóricos ocidentais passaram a tratar de forma mais substancial o tema apenas a partir do ano de 20152:

2 Segue o trecho original: “According to the China Academic Journals

Full-text Database, in 2014 Chinese scholars published 492 articles on BRI-

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"De acordo com o Banco de Dados de Periódicos

Acadêmicos da China, em 2014, cientistas

chineses publicaram 492 artigos sobre tópicos

relacionados à BRI; um ano depois, o número

havia saltado para mais de 8.400 artigos. Os

analistas ocidentais foram mais lentos para tomar

conhecimento da iniciativa." (p. 191, tradução

nossa).

A pesquisa apresenta um caráter explicativo e interpretativo, ao

passo que procura identificar as principais características e fundamentos

para a realização da Belt and Road Initiative, de modo a apresentar uma

narrativa racional acerca deste objeto de estudo, sem necessariamente

produzir uma explicação que se vincule a uma relação de causalidade

que possa ser transposta para outros fenômenos do cenário

internacional.

Quanto aos procedimentos, ressalta-se a investigação

bibliográfica e análise documental buscando integrar a visão de teóricos

ocidentais à visão de analistas chineses sobre o tema. Utilizam-se

igualmente fontes acerca de projetos de investimentos que estejam em

fase de negociação ou de execução. Outro recurso utilizado advém dos

pronunciamentos e discursos oficiais do governo da República Popular

da China, através de suas agências de comunicação. No que se refere à

tipologia da pesquisa, apresenta um caráter híbrido ou misto, com ênfase

na produção de uma análise qualitativa, utilizando dados referentes a

fluxos de investimentos externos diretos e fluxos de comércio para

respaldar os argumentos propostos.

Pontualmente, o presente trabalho está estruturado em quatro

capítulos. O primeiro capítulo realiza a discussão acerca do significado

geopolítico atribuído à região da Eurásia. Adicionalmente, são definidos

conceitos ligados à geopolítica, à geoeconomia e à estratégia, que serão

essenciais para o desenvolvimento da dissertação. Por fim, aborda-se a

questão dos recursos energéticos provenientes da Eurásia e como isto se

relaciona com a influência e projeção da China sobre o seu entorno

regional.

O capítulo seguinte é dividido em duas seções. A primeira realiza uma discussão acerca do pensamento chinês sobre as relações

internacionais, visando identificar conceitos, temas e ideias que

related topics; one year later, the number had jumped to more than 8,400

articles. Western analysts were slower to take notice of the initiative”.

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influenciam a projeção internacional do país. A segunda seção realiza

um balanço dos fluxos de investimentos estrangeiros diretos emitidos

pela China no período imediatamente posterior à abertura e reformas

conduzidas por Deng Xiaoping.

O terceiro capítulo é dividido em duas seções. A primeira realiza

a análise histórica da antiga Rota da Seda. A segunda seção realiza um

panorama acerca da Belt and Road Initiative, apresentando suas

características gerais e os desenvolvimentos ao longo dos seis

corredores econômicos anunciados.

O quarto capítulo realiza um esforço analítico visando delinear os

fundamentos geopolíticos e geoeconômicos que permeiam a iniciativa e

demonstram o papel da mesma no projeto mais amplo de projeção

internacional da China no século XXI. As considerações finais realizam

ponderações acerca da importância da BRI para a manutenção do ritmo

de crescimento da economia chinesa no longo prazo, fator que está

ligado à estabilidade política do país.

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2 GEOPOLÍTICA E GEOESTRATÉGIA

De um modo geral, é possível afirmar que a geopolítica consiste

em um campo teórico consolidado, tendo surgido no século XIX. O

termo "geopolítica" (COHEN, 2015, p. 24) foi cunhado oficialmente por

Rudolf Kjellén (1864-1922). Definições tradicionais envolviam: "a

teoria do Estado enquanto organismo geográfico ou fenômeno

espacial"3. Posteriormente, outros definiram como "o estudo das

Relações Internacionais através de uma perspectiva geográfica"4

(COHEN, 2015, p. 15-16 - tradução nossa).

Por outro lado, Cohen (2015, p. 16, tradução nossa) define

hodiernamente a geopolítica como "a análise da interação entre, por um

lado, os ambientes geográficos e suas perspectivas e, por outro lado, os

processos políticos"5. Portanto, a geopolítica consiste no uso de recursos

naturais ou elementos geográficos para atingir objetivos políticos. Ou,

ainda, pode servir como uma lente de análise para verificar de que forma

os fatores geográficos influenciam as ações políticas. Portanto, a

geopolítica se apresenta como uma perspectiva de análise, visando

identificar os espaços geográficos onde é exercido o poder e quais

dinâmicas afetam a sua concentração ou dispersão (COHEN, 2015).

Já a geoestratégia, consiste no campo de estudo que examina as

regiões geográficas através das quais determinados Estados decidem

exercer o seu poder. A geoestratégia pode ser vista como o exercício da

política externa de um Estado sobre determinados territórios

geográficos. Mais do que isto, a geoestratégia compreende desde ações

militares, o exercício diplomático ou mesmo pressões através de fluxos

econômicos (BLOUET, 2005; GRAY, 2005).

Este conceito se baseia pelo pressuposto de que os Estados não

possuam recursos para se projetar simultaneamente e com a mesma

intensidade por toda a extensão do mundo. Mesmo no caso dos Estados

Unidos, existe a necessidade de escolher certas áreas que são de maior

interesse para concentração de seus recursos e consequentemente, para

sua projeção. A geoestratégia não foca nos processos de tomada de

3 Segue trecho original: “the theory of the state as a geographical

organism or phenomenon in space”. 4 Segue trecho original: “the study of international relations from a

spatial or geographical perspective”. 5 Segue trecho original: “the analysis of the interaction between, on the

one hand, geographical settings and perspectives and, on the other, political

processes”.

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decisão, mas analisa as ações empreendidas pelos Estados. A

geoestratégia não é necessariamente impulsionada por questões

materiais, podendo resultar da decisão de uma liderança de se projetar

em determinada região geográfica, mesmo que seja por questões

ideológicas ou pelos interesses particulares de certos grupos sociais

(BLOUET, 2005; GRAY, 2005).

A estratégia consiste em um curso de ação visando à obtenção de

um objetivo, levando em consideração a organização e o emprego dos

recursos disponíveis para tal empreendimento. Uma estratégia política

pode envolver o uso da força, quando pressionada por posições e

interesses conflitantes. No âmbito da política internacional, a estratégia

consiste no emprego do poder e dos recursos do Estado para atingir fins

que contribuam para o interesse nacional ou o bem comum de

determinada unidade política. A tática pode ser vista como a série de

ações operacionais no sentido de se tentar obter a finalidade proposta

pela estratégia. Deve-se sempre observar a necessidade de eficácia no

emprego dos recursos, visando identificar o melhor momento e as

melhores condições que possibilitem a consecução do objetivo definido

pela estratégia nacional, evitando esforços desnecessários

(CLAUSEWITZ, 2010).

Outro fator a ser levado em consideração é a fricção, ou seja, o

acúmulo de condições que aportam dificuldades táticas rumo à obtenção

do objetivo estratégico. A fricção é o que diferencia o plano ideal, o que

está no papel, da condução real. Consiste em uma multiplicidade de

fatores. Clausewitz (2010) enfatiza que embora os inúmeros percalços

envolvidos não possam ser previstos, é muito importante que haja o

reconhecimento de sua existência, aliado à força de vontade férrea e de

grande capacidade do comandante. Portanto: "A fricção, como

resolvemos chamá-la, é a força que torna difícil aquilo que é

aparentemente fácil" (CLAUSEWITZ, 2010, p. 133). A dificuldade

envolvida na tomada de decisão acerca de um rumo estratégico reside no

fato de que a estratégia atua no longo prazo e, portanto, envolve

conjecturas e muitos elementos imprevisíveis, diferentemente do plano

tático que envolve lidar com a realidade em tempo real, e, portanto,

suscita maior grau de previsibilidade (CLAUSEWITZ, 2010).

Sintetizando esta abordagem, BREMMER e KEAT (2010) elencam os principais aspectos para a elaboração de uma estratégia

eficaz: 1) o reconhecimento dos recursos disponíveis; 2) o

reconhecimento tático da possibilidade do acontecimento de fatos de

baixa probabilidade, porém de alto risco e de alto impacto, 3) a inclusão

no planejamento estratégico de medidas contingenciais para as situações

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de risco; 4) o reconhecimento da perspectiva e do posicionamento de

atores contrários ao rumo estratégico que se pretende; 5) o

reconhecimento das limitações cognitivas dos tomadores de decisão, o

que se denomina comumente como viés cognitivo, portanto, deve-se

desenvolver a capacidade de ver a situação e os diferentes cursos de

ação disponíveis através da perspectiva dos outros atores envolvidos

e/ou afetados pelo processo ou ação que se pretende tomar; 6) é

importante que se compreenda o sistema de incentivos que motiva os

atores, ou seja, a perspectiva das vantagens e ganhos que orientam a

tomada de decisão das partes; e, por fim, 7) estabelecer diferentes cursos

de ação, de acordo com as probabilidades de riscos e ganhos no curto,

médio e longo prazos (BREMMER e KEAT, 2010).

Certos rumos de ação podem prover maiores ganhos, porém

podem possuir maiores custos de implementação ou maior risco de

adversidades no caso de falhas ou mesmo de um sucesso parcial. Neste

ponto, rumos de ação mais brandos ou que visem ganhos mútuos podem

ser justificáveis dependendo da situação. Nesta perspectiva, nem sempre

a posição de maximização dos ganhos absolutos e individuais deve ser

vista como o alvo mais eficiente de uma estratégia (BREMMER e

KEAT, 2010). Exemplificando, se for levado em consideração o

interesse absoluto e individual de todas as potências na formação da

agenda internacional, os conflitos de interesses serão insolúveis. Para

que haja alguma estabilidade ou equilíbrio, seja regional ou sistêmico,

deve-se observar o sistema internacional como um intricado ambiente

constituído por grandes atores, Estados menores, padrões normativos e

instituições, funcionando em uma situação de balanceamento constante

(KLIEMAN, 2015).

Uma visão teórica através das lentes da geopolítica pode prover

importantes explicações acerca das grandes tendências estruturais do

sistema internacional. Compreendemos a estrutura histórica como a

correlação de forças presentes em determinada região ou no sistema

como um todo, em determinado momento histórico, constrangendo e

influenciando a agência estatal (COX, 1986; 1993). Portanto, a inter-

relação entre as características geográficas de determinada região e os

interesses que guiam as interações políticas e econômicas entre os

Estados constitui uma das bases analíticas deste projeto. Em essência, a capacidade de agência estatal é limitada pelos

parâmetros físicos impostos pela geografia, porém não se trata de um

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fatalismo determinista, como Kaplan (2012) se preocupa em

demonstrar6:

"A geografia informa, mas não determina. A

geografia, portanto, não é sinônimo de um

determinismo. Ela age como a distribuição de

poder econômico e poder militar, constituindo um

grande constrangimento e/ou um grande

instigador na ação dos Estados" (p.30, tradução

nossa)

Esta visão se alinha com os desígnios de Mackinder que visava

aportar o conhecimento necessário para que os seres humanos pudessem

alterar as circunstâncias impostas pelo seu entorno geográfico,

superando o fatalismo determinista (MACKINDER, 1919; PETERSEN,

2011).

Assim, é possível perceber a importância da geografia e da

geopolítica para as Relações Internacionais, partindo de um ponto de

vista analítico que trabalha com a longa duração, conceito definido por

Fernand Braudel, como lentos movimentos cumulativos, apresentando

um ritmo secular e gradual de transformações que agem sobre elas

mesmas e, por sua vez, influenciando a mudança da realidade social.

Através deste arcabouço teórico e passando ao largo de análises que

habitam o ambiente do tempo curto, a história dos acontecimentos

(histoire événementielle) e as análises conjunturais, relativas a ciclos de

décadas (BRAUDEL, 1985; 1998), fica mais clara a compreensão da

importância geopolítica de um plano de investimentos que se estende

pela região da Eurásia, caso que se apresenta na Nova Rota da Seda

conforme vem sendo idealizada pela China.

As estruturas geopolíticas se formam por duas forças - uma de

diferenciação, que consiste no impulso pela separação do território em

relação a quem se considera diferente, seja no âmbito identitário,

cultural, religioso, entre outros. Por outro lado existe a força dos fatores

de integração, o que se denomina como o senso de pertencimento à

determinada territorialidade, expresso de forma simbólica ou mesmo

física, na ligação das pessoas com a dimensão local. As estruturas de

diferenciação e inclusão persistem e estão em constante interação. Esta

6 Segue o trecho original: Geography informs, rather than determines.

Geography, therefore, is not synonymous with fatalism. But it is, like the

distribution of economic and military power themselves, a major constraint

on—and instigator of—the actions of states.

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perspectiva interpreta o sistema internacional como um sistema

dinâmico, com forças de equilíbrio, de integração e diferenciação.

Forças e influências se dirigindo em sentidos opostos, com diferentes

intensidades. Forças que perpassam não apenas o âmbito estatal, mas

que podem incluir crises econômicas, escassez energética, o terrorismo,

a migração, a degradação ambiental, entre outros (COHEN, 2015).

Dentro de determinada estrutura geopolítica mais ampla, existem

os domínios geoestratégicos, que funcionam como as placas tectônicas

sobre as quais os agentes procuram atuar. Cohen (2015) distingue três

domínios geoestratégicos de maior relevância para a distribuição de

poder e recursos globais, quais sejam: o Oceano Pacífico, o Oceano

Atlântico (regiões marítimas) e a Eurásia (região terrestre ou

continental), que permite simultaneamente a articulação de um poder

terrestre e marítimo (COHEN, 2015).

Cada um destes domínios geoestratégicos se articula, por sua vez,

através de diferentes regiões. A América do Norte, a América Central e

a América do Sul consistem em regiões que podem se articular

simultaneamente como espaços de atuação no Oceano Pacífico e no

Oceano Atlântico. Entretanto, os Estados Unidos são presentemente o

único ator a possuir os recursos necessários para uma inserção

geoestratégica preponderante em dois oceanos. A Europa Marítima e o

Magrebe (banhados pela costa do Mediterrâneo) consistem em domínios

geoestratégicos que podem se articular pelo Oceano Atlântico, ao passo

que a costa da Ásia se articula de forma geoestratégica através do

Oceano Pacífico (COHEN, 2015).

Por outro lado, a Eurásia se divide em três domínios principais: a

Heartland largamente pertencente ao território da Rússia e suas

imediações; a Ásia Central e a Ásia Oriental. A Ásia Meridional tem

uma tendência histórica de articulação autônoma no espaço Eurasiático

e isto se deve em partes às potencialidades aportadas pelo Oceano

Índico. No que diz respeito à distinção entre os domínios

geoestratégicos e suas regiões geopolíticas, é possível realizar a

distinção entre estratégia e tática. Neste sentido, os domínios

geoestratégicos representam o plano mais amplo (estratégia), enquanto a

projeção de poder em suas diferentes regiões representa a tática

necessária para que se exerça maior influência em determinado cenário (COHEN, 2015). A Eurásia é essencialmente uma região geoestratégica

terrestre no que tange à Heartland e de articulação marítima através do

Oceano Pacífico na Ásia Oriental.

Aponta-se que a relevância deste arcabouço analítico se tornou

mais pronunciada no período do pós-Guerra Fria e se deve, sobretudo,

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ao aumento do poder econômico e militar de certos países contidos nos

domínios geoestratégicos acima referidos, como é ó caso da China, por

exemplo. Cohen (2015) afirma que a ação chinesa pode ser vista como

um contrapeso e mesmo um estabilizador à ação unilateral dos EUA no

âmbito sistêmico (COHEN, 2015). Outras perspectivas indicam que se

esta situação não for bem administrada poderá ocasionar o escalamento

de conflitos no âmbito dos diversos domínios geoestratégicos regionais

(KLIEMAN, 2015). Brzezinski (2016) afirma que a atuação do triângulo

formado por China, Rússia e Estados Unidos na região da Eurásia, será

o fator de maior influência para o ordenamento global nas próximas

décadas.

Neste sentido, a próxima seção realizará uma revisão

bibliográfica e analítica acerca da importância da massa continental

eurasiática, vista através das lentes da teoria geopolítica. Esta seção visa

explicitar a importância deste instrumental no que tange à compreensão

da iniciativa de construção da Nova Rota da Seda, conforme proposta

pela China.

2.1 O SIGNIFICADO GEOPOLÍTICO DA EURÁSIA

Faremos uma breve síntese da abordagem de alguns dos

fundadores da geopolítica e, quando possível, buscaremos enfatizar a

importância da Eurásia nestas correntes de pensamento: Friedrich Ratzel

(1844-1904), Alfred Thayer Mahan (1840-1914) e Halford Mackinder

(1861-1947). Estas visões devem vistas dentro do seu contexto, como

produtos de uma época de intenso nacionalismo, expansão estatal pelas

vias militares e constituição de impérios coloniais.

Ratzel conduziu um estudo comparativo dos Estados, baseado em

princípios do evolucionismo, visando prover uma base científica para o

expansionismo alemão do final do século XIX. O autor via o Estado

como uma entidade fixa cujo poder derivava dos vínculos estabelecidos

pelo seu povo com as características geográficas do espaço estatal

(COHEN, 2015).

Nesta visão, o espaço era um conceito essencial, enfatizando a

necessidade de aumento do tamanho territorial do Estado para aumentar

seu poder político e militar. Para Ratzel (1983) a localização de determinado Estado lhe provia um caráter único e a ligação dos seres

humanos com o território seria capaz de moldar a sua sociedade. Esta

análise poderia ser observada tanto através de unidades sociais menores,

como as famílias ou unidades mais amplas, como o Estado. Quanto

maiores as necessidades de habitação e de alimentação, maiores seriam

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as ligações entre os seres humanos com a terra e, consequentemente,

maior a importância do território para o Estado (RATZEL, 1983).

O autor enfatiza que o território dos Estados seria um ponto de

referência para a compreensão das mudanças históricas e sociais. Para

Ratzel (1983, p. 100), o solo oferece "…um ponto de referência fixo no

meio de mudanças incessantes das manifestações vitais". Embora Ratzel

não aborde diretamente a importância da Eurásia, a sua obra serviu

como base para a ideia de que o aumento do tamanho do Estado

concederia um repositório de recursos passíveis de ser convertidos em

poder efetivo (COHEN, 2015).

Mahan (2004) conduziu um importante estudo acerca da

influência do poder naval na história e, sobretudo no que tange à

formação da América do Norte e da Inglaterra enquanto potências de

influência global. O autor traz diversos exemplos históricos para

confirmar a sua tese acerca da importância do poder naval. A grande

mobilidade permitida pelo ambiente marítimo, e aqui o autor pensava na

recém-desenvolvida tecnologia de navios a vapor, é a primeira grande

vantagem que o distingue do poder terrestre. Adicionalmente o

transporte de mercadorias por vias marítimas teria custos menores, o que

configura outra vantagem (MAHAN, 2004).

As principais condições que afetam o poder naval das nações são:

a posição geográfica, a formação física do local (incluindo o clima e a

produção local), a extensão territorial, a população, o caráter das pessoas

(aqui o autor enfatiza o sucesso dos povos com maior inclinação para

atividades de comércio) e o caráter do governo (o que inclui as

instituições estatais). Como é possível perceber, a geografia tem um

peso considerável nas análises de Mahan (2004), visto que os três

primeiros fatores se desenvolvem em um plano de longa duração e com

forte influência dos fatores geográficos (MAHAN, 2004, p. 18-42).

Mahan (2004) reconhecia a relevância da Eurásia para a projeção

de poder global e reconhecia a Rússia como a principal potência

eurasiática. Para ele a principal fraqueza da Rússia era não dispor de

uma saída para o mar. O autor considerava o poder marítimo como

sendo fundamentalmente mais importante do que o poder terrestre. Ele

previa que um poder exterior a Eurásia, unificado entre Estados Unidos,

Inglaterra, Alemanha e Japão, poderia circundar e se unir contra a Rússia e China, as principais potências do espaço eurasiático. A visão

do autor sobre a importância da Eurásia parte de pontos comuns com

Mackinder (2004), mas chega a conclusões estratégicas diametralmente

opostas, no que diz respeito à primazia do poder naval em relação ao

poder terrestre (MAHAN, 2004).

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A região da Eurásia destaca-se pela riqueza e abundância de

recursos naturais e energéticos, além da importância logística e

geoestratégica. A Heartland, inicialmente denominada por Mackinder

(2004) como zona pivô, consiste na área central da Eurásia. De forma

aproximada, é possível afirmar que a Heartland se estende desde a

Europa Oriental até os limites da Ásia Oriental. De norte a sul seus

limites compreendem desde a linha do Círculo Ártico até os desertos e

montanhas da Ásia Meridional. A Eurásia possui massas aquáticas de

importância estratégica e comercial, tais como o Mar Báltico, o Mar

Negro, o Mar Cáspio e o Golfo Pérsico. O território da Heartland torna-

se quase que inteiramente coberto pela neve e gelo em sua parte norte,

sendo protegido por desertos e montanhas em sua parte austral e

oriental, sendo igualmente quase inacessível ao poder naval, exceto pela

região do mar Báltico e do Mar Negro. Os diversos estreitos

compreendidos na Heartland podem ser protegidos através do poder

terrestre (PETERSEN, 2011).

A visão de Mackinder enfatiza a importância estratégica da

Eurásia, e mais especificamente da sua região central, denominada como

Heartland ou Zona Pivô, argumentando que a potência que seja capaz

de exercer influência sobre este território, teria a maior capacidade de

projeção de poder a nível global. O exercício de poder terrestre sobre a

Eurásia tem um potencial de produzir um repositório de recursos e bens

que, se associado a um poder marítimo, acarretará possibilidades de

alteração da balança de poder do sistema internacional. Isto permitiria

desenvolver meios para tentar controlar as regiões que possuem áreas

costeiras em seus territórios, produzindo um poder anfíbio, capaz de

enfrentar o poder marítimo das potências insulares: nos primórdios a

Grã-Bretanha e posteriormente os EUA (PETERSEN, 2011).

De acordo com esta visão, a potência que conseguisse dominar a

Heartland, teria capacidade de dominar a World-Island, que se define

como a região que engloba a Europa, a Ásia e a África, obtendo

consequentemente uma supremacia de recursos que poderiam ser

convertidos em poder efetivo (MACKINDER, 2004).

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Figura 1 - A organização geopolítica do mundo segundo

Mackinder:

Fonte: Mackinder (2004, p. 312).

Mackinder (2004) tratava de poder definido em termos duros,

através de contingente populacional, recursos militares e a eficiência do

uso do poder militar. Entretanto, para os propósitos desta pesquisa,

utilizaremos o conceito de poder que deriva de bases weberianas, como

sendo a capacidade de maximização da própria vontade,

independentemente da vontade de terceiros. Ou seja, a capacidade de

influenciar outros atores sociais de modo a atingir objetivos particulares,

resultando muitas vezes em um curso de ação que não seria tomado

originalmente pelos atores terceiros se não houvesse o exercício desta

influência. Portanto, o conflito de vontades leva ao exercício do poder

(GUZZINI, 2007). Xuetong (2014) faz uma diferenciação similar entre

o poder e a força de uma nação. O poder seria a capacidade de exercer

influência nas ações de outros Estados, enquanto que a força equivale às

capacidades materiais brutas do Estado em questão.

Elaborações teóricas posteriores complementam e expandem a

visão acerca da importância estratégica da Eurásia e da região que

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compreende as zonas contíguas a Heartland, o que se denominará de

Rimland. Enquanto Mackinder afirmava7:

"Aquele que controla a Europa do Leste obterá o

controle sobre a Heartland; aquele que controla a

Heartland comandará a World-Island; e aquele

que comanda a World-Island comandará o

mundo" (Mackinder, 1919, p. 150, tradução

nossa).

Por outro lado, Spykman (1969) coloca maior ênfase na disputa

pelo território da Rimland, região que inclui a Ásia Menor, grande parte

do Oriente Médio e o Sudeste Asiático (compreendendo a China e a

península coreana), que conferiria a supremacia estratégica capaz de

garantir a maior projeção de poder a nível internacional. A Rimland

corresponde à região identificada como crescente marginal inferior no

mapa acerca da organização geopolítica do mundo segundo Mackinder,

que está localizado na página anterior.

Nesta região estão compreendidos diversos Estados anfíbios,

situando-se entre a zona de poder terrestre da Eurásia e a influência

marítima. Nesta perspectiva, aquele que dominasse a Rimland possuiria

os recursos para a dominação da Eurásia (SPYKMAN, 1969). Durante a

Guerra Fria, a União Soviética controlou quase que inteiramente a zona

denominada por Mackinder como a Heartland e a zona da Rimland

continuou sendo razão de inúmeras disputas, disto decorre que as teorias

de Spykman apresentam grande relevância para a análise do cenário

internacional no pós-Guerra Fria (KAPLAN, 2012).

Deste arcabouço origina-se a doutrina da contenção de George

Kennan, que possui antecedentes históricos em Mackinder e Spykman.

Nesta visão, a defesa da Europa Ocidental, de Israel, do Irã, do

Afeganistão e do Vietnã durante o período da Guerra Fria correspondem

as tentativas por parte das potências Ocidentais de impedir que a URSS

assimilasse a região do Rimland ao bloco soviético. De maneira mais

ampla, Kennan procurava evitar que uma única potência fosse capaz de

concentrar os recursos provenientes da Eurásia, podendo converter este

imenso potencial bélico e industrial em poder efetivo. Portanto,

considerando a contemporaneidade de sua obra, a condução da

7 Segue trecho original: “Who rules East Europe commands the

Heartland; who rules the Heartland commands the World-Island; who rules the

World-Island commands the world”.

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estratégia do bloco capitalista visava realizar a contenção da expansão

soviética sobre a Rimland (PETERSEN, 2011).

No que tange ao exercício de poder na Eurásia, Brzezinski (1997)

define três frentes estratégicas basilares que consolidam o domínio sobre

este território, quais sejam: a primeira frente é o território localizado a

extremo oeste da Eurásia, precisamente na divisão entre a Europa

Oriental e a Europa Ocidental; a segunda frente basilar consiste no

extremo leste da Eurásia, sendo essencialmente a região da Ásia

Oriental e a terceira frente estratégica corresponde ao sudoeste da

Eurásia, partindo dos limites entre o território Indiano e Chinês, se

estendendo pela Ásia Central e Meridional e chegando até o Irã

(BRZEZINSKI, 1997, p. 51-61).

Cada frente estratégica possui Estados pinos, que devido aos seus

recursos naturais, sua influência política, ou mesmo a sua posição

geoestratégica, consistem nos Estados chave para que determinada

potência consiga exercer sua influência naquela frente. Os Estados pinos

possuem concomitantemente certo grau de vulnerabilidade,

normalmente de cunho militar ou mesmo econômica, que os tornam

mais suscetíveis de serem atraídos pela força gravitacional emanada pela

influência de potências maiores (BRZEZINSKI, 1997). Abordaremos as

três frentes estratégicas basilares, que constituem uma parte importante

dos corredores de articulação econômica que a China pretende avançar

através da Nova Rota da Seda.

Na primeira frente estratégica basilar os Estados pinos são a

Turquia, a Grécia e a Polônia. A Turquia simboliza a união entre o

território da Europa e da Ásia, além de ter originado uma matriz

civilizacional através da constituição e expansão de um império que

perdurou séculos. A Grécia é importante devido ao seu acesso ao mar

Mediterrâneo, que possibilita igualmente um ponto estratégico para a

articulação com as regiões do Magrebe e do Norte da África como um

todo. A Polônia é muito importante historicamente, devido à

possibilidade de projeção terrestre para a Europa em sua totalidade. O

território da Polônia foi alvo de intensas disputas entre Rússia e

Alemanha. De uma forma mais ampla, a primeira frente estratégica é

igualmente importante devido à possibilidade de articulação através do

Oceano Atlântico, partindo da Europa (BRZEZINSKI, 1997). A segunda frente estratégica basilar consiste na Ásia Oriental,

cujos Estados pino são o Vietnã, a península da Coreia (dividida

politicamente no ano de 1945) e o Japão. Esta é uma região de

predominantemente marítima, com acesso para o Oceano Pacífico. O

Vietnã e a península da Coréia possibilitam dois pontos estratégicos

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40

para a articulação com as outras nações do Pacífico, além do fato de que

estes países circundam o território da China. O Japão é um ator

importante para a economia global, não obstante, o país não possui um

poder militar significativo, evidenciando certo grau de vulnerabilidade

resultante de sua relação política com os Estados Unidos, oriunda do

expansionismo japonês da primeira metade do século XX e de sua

derrota na Segunda Guerra Mundial (BRZEZINSKI, 1997). No século

XXI, a Ásia Oriental emerge como uma das regiões mais importantes da

economia mundo (ARRIGHI, 2009).

Na terceira frente, os Estados pinos são o Irã, o Paquistão e o

Afeganistão. O Irã é um país rico em petróleo, originado do Império

Persa, controla metade das margens do Golfo Pérsico, tem acesso ao

Mar Cáspio e está sujeito a instabilidade política. A cooperação

econômica e militar com o Paquistão pode servir como forma de

balanceamento em relação à Índia, tentando impedir a preponderância

geoestratégica deste país na Ásia Meridional. Além disso, o Paquistão é

um país de grande população e que possui armamento nuclear. O

Afeganistão é um país extremamente instável seja no aspecto político,

seja no aspecto econômico e sua importância para esta análise reside no

fato de que a influência sobre o Afeganistão pode facilitar o acesso tanto

ao Irã, quanto ao Paquistão (BRZEZINSKI, 1997, p. 61-71).

Além disto, o Afeganistão, o Paquistão e o Mianmar são vistos

como sendo condutores para o acesso da China aos recursos naturais da

Ásia Central, tais como cobre, ferro, gás natural, ouro, urânio, entre

outros (KAPLAN, 2012). Um vínculo com Paquistão tem o potencial de

conceder acesso ao Oceano Índico, zona que não se encontra nos limites

geográficos imediatos da China.

No que diz respeito aos recursos energéticos disponíveis na

Eurásia, cabe apresentar os dados acerca das reservas globais de

hidrocarbonetos (gás natural e petróleo):

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41

Tabela 1: Reservas globais de gás natural 2005-2015 (trilhões de

pés cúbicos):

Regiões 2005 2007 2009 2011 2013 2015

Eurásia 1.952.6 2.014.8 1.993.8 2.164.8 2.177.8 2000.5

Europa 194.0 180.3 169.1 153.8 145.5 184.4

Oriente

Médio

2.522.1 2.566.0 2.591.6 2.686.4 2.823.2 2826.5

Ásia e

Pacífico

386.4 419.6 430.5 537.6 521.8 552.6

América

do Norte

264.0 283.6 315.7 378.5 393.4 450.3

América

Central

e do Sul

250.5 240.7 266.5 268.5 268.9 268.1

África 477.0 485.8 495.1 518.5 514.8 496.7

Total

(Mundo)

6.046.6 6.190.9 6.262.4 6.708.2 6.845.2 6.879.1

Fonte: Lins (2016, p. 49), complementada com dados de BP

Global Energy report (2016).

Tabela 2: Reservas globais de petróleo 2005-2015 (bilhões de

barris):

Regiões 2005 2007 2009 2011 2013 2015

Eurásia 77.8 98.9 98.9 98.9 118.9 141.1

Europa 17.6 15.8 13.7 12.1 12.0 14.2

Oriente

Médio

729.3 739.2 746.0 725.9 802.2 803.5

Ásia e

Pacífico

36.3 33.4 34.0 40.2 45.4 42.6

América

do Norte

215.9 213.9 209.1 210.8 216.8 238.0

América

Central

e do Sul

100.6 102.8 122.7 237.1 325.9 329.2

África 100.8 114.1 117.1 123.6 127.7 129.1

Total

(Mundo)

1.278.4 1.318.0 1.341.4 1.475.7 1.648.9 1.697.6

Fonte: Lins (2016, p. 48), complementada com dados de BP

Global Energy report (2016).

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42

Como é possível observar, a Eurásia possui relevantes reservas de

hidrocarbonetos, correspondendo a cerca de 30% do total mundial de

gás natural e 8.5% do total global de petróleo. Estes aspectos

evidenciam a importância da visão analítica de Mackinder (2004), que

compreendeu a relevância deste território mesmo não dispondo dos

meios necessários para auferir precisamente fatores como os que estão

representados nas tabelas acima. Além disto, uma rede eficiente de

infraestrutura e a projeção de influência sobre a Eurásia facilita o acesso

aos recursos naturais provenientes do Oriente Médio, compreendido na

análise de Mackinder (2004) como parte do crescente marginal interior.

O Oriente Médio, por sua vez, representa 41% das reservas mundiais de

gás natural e 47% das reservas mundiais de petróleo.

Mackinder (2004) afirmava que a dominação da Eurásia não

havia sido possível devido ao fato de que anteriormente, os povos desta

região dispunham apenas de cavalos para realizar sua locomoção em um

vasto território. Na conjuntura contemporânea de sua obra (1904), o

autor afirmava que a dominação da Eurásia seria possível devido aos

avanços tecnológicos e ao advento das ferrovias (MACKINDER, 1919;

2004).

Esta afirmação cria um vínculo com um dos principais eixos de

construção de infraestrutura promovidos pela China na Nova Rota da

Seda, que é justamente a construção de ferrovias de alta velocidade

(CHAN, 2016; KHANNA, 2016). A construção de grandes projetos de

infraestrutura que necessitam do uso intenso de mão de obra pode ser

vista como uma tradição política oriental, herdada das grandes obras

hidráulicas da China Imperial (FAIRBANK & MERLE, 2006).

A China possui 121.000 quilômetros de ferrovias, constituindo

60% do total global e possui o objetivo de estender a sua rede de

ferrovias de alta velocidade para um total de 30.000 quilômetros,

incluindo os países situados em seu espaço regional imediato (STATE

COUNCIL OF THE REPUBLIC OF CHINA, 2016). A partir da

província de Xinjiang, a China está construindo uma intensa rede de

ferrovias e oleodutos, gasodutos conectando ao Afeganistão, Paquistão,

Quirquistão, Tadjiquistão, de modo a consolidar sua esfera de influência

regional (KAPLAN, 2012).

Ao final do seu artigo seminal e em obras posteriores, Mackinder (1919) cita a possibilidade de a China exercer influência preponderante

sobre a Heartland, na ocasião deste país ser capaz de conquistar partes

da zona de influência da Rússia. Conforme afirma o autor, a eventual

dominação chinesa sobre a Heartland teria mais potencialidades do que

no caso russo, devido ao fato de que a China possui amplo acesso ao

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Oceano Pacífico, refletindo um problema histórico da Rússia, cujo

acesso aos mares se localiza no Oceano Ártico, o que inviabiliza a sua

articulação simultânea como uma potência terrestre e marítima

(MACKINDER, 1943; 2004).

Devemos ressaltar que para o escopo desta análise, não

trataremos de fatores como a dominação territorial propriamente dita.

Usaremos, por outro lado, o conceito de esfera de influência regional,

que não implica em dominação política ou econômica, mas sinaliza um

equilíbrio de forças no qual os Estados pertencentes à determinada

região concedem deferências aos interesses da potência dominante, no

que diz respeito à formulação de suas próprias políticas públicas

(BRZEZINSKI, 1997, p. 164).

A partir deste arcabouço, a próxima seção abordará o processo

histórico e a atuação geoestratégica rumo à construção da esfera de

influência da China. Estes fatores estão diretamente ligados à percepção

que o país possui do seu próprio lugar na constituição do sistema

internacional, fato importante para que se compreenda o objetivo

principal deste trabalho que consiste em delinear a fundamentação da

Belt and Road Initiative dentro do processo de projeção internacional da

China no século XXI.

2.2 A ESFERA DE INFLUÊNCIA DA CHINA E SUA

ATUAÇÃO GEOESTRATÉGICA NA EURÁSIA

Para compreender o estabelecimento da esfera de influência da

China, abordaremos brevemente o processo histórico de formação do

Estado chinês. A formação do Estado chinês em suas dimensões

contemporâneas é um exemplo da interação entre os fatores geopolíticos

que atuam na longa duração dos processos históricos e a ação humana

que influencia os rumos da realidade política e social. Parte importante

dos recursos duros da China advém de sua população e das dimensões

do seu território, que foi inicialmente formado como uma civilização ao

longo de grandes rios, o Rio Amarelo, o Rio Wei, o Rio Han e o Rio

Yangtzé. Estes rios nascem no Tibete, surgindo no oeste do território

chinês e direcionando suas águas para as terras agricultáveis mais próximas do Oceano Pacífico, ao centro e ao sul do país.

Historicamente, as ameaças à unidade chinesa vieram dos povos

nômades provenientes das estepes da Ásia Central, localizados no norte

e noroeste do seu território, em uma linha semicircular anti-horária

partindo da região da Manchúria até o Tibete (KAPLAN, 2012).

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44

Argumenta-se que o senso de unidade e identidade da China

enquanto civilização é resultado de uma estrutura de socialização e

diferenciação entre os povos localizados nas planícies chinesas de

agricultura irrigável (centro civilizacional) e os povos nômades da Ásia

Central, que constituíam a periferia do antigo sistema imperial chinês

(FAIRBANK & GOLDMAN, 2006). Este processo de contato e

assimilação entre estruturas de centro e periferia viria a constituir uma

organização política manifesta através de vínculos tributários,

suscitando relações de influência e subordinação, à medida que

avançava a centralização e formação do aparato político-administrativo

da China Antiga, cuja influência veio a se estender através de zonas

concêntricas ao redor do Império Chinês (FOSSAERT, 2011).

O Estado chinês possui territórios desérticos no oeste e terras de

solo fértil no centro-sul, no Leste e na região nordeste, demonstrando

um processo histórico de longa duração que formou as bases geográficas

do poder chinês. Um dos exemplos mencionados acerca da ação humana

nesse processo é a construção do Grande Canal que liga os Rios

Amarelo e Yangtzé, ocorrida no período entre os anos de 605 e 611

d.C., que foi importante para ligar a região norte, notadamente sujeita a

períodos de escassez de alimentos e fome; à região sul, que podia prover

excedentes produtivos agrícolas (sobretudo o arroz) de modo a

possibilitar a formação de um Estado chinês com maior dimensão

territorial (KAPLAN, 2012, p. 117-119).

A esfera de influência chinesa possuía um componente

geográfico e outro cultural. Ao passo que configurava um sistema de

valores dominante nas relações da Ásia Oriental até o século XIX. Os

Estados tributários recebiam benefícios comerciais ao aceitar a cultura

chinesa. Entretanto, não havia a ideia messiânica de espalhar os valores

do Império. A China atuava mais como um centro de atração

gravitacional devido ao seu poder econômico e aos seus valores

culturais (KISSINGER, 2011).

Sobre o processo de formação do Estado chinês e sua zona de

influência, cabe mencionar que em um período tão recente quanto o ano

de 1840, o território da China e sua zona de influência se estendiam até

o estreito de Malacca (localizado entre a Malásia e a Indonésia),

incluindo partes do que hoje se denomina como Bangladesh, partes do Nepal, do Mianmar, do Vietnã (na época a Indochina) e do atual

Cazaquistão, todo o território da Mongólia, a ilha de Taiwan, e,

igualmente os territórios tributários da Coréia, das ilhas Sacalinas, além

de territórios no extremo oriente da Rússia. Estes territórios ou

pertenciam inteiramente a China ou pagavam tributos ao Império chinês

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45

(BRZEZINSKI, 1997, p. 164; KAPLAN, 2012, p. 120). Em seu apogeu,

a esfera de influência do império chinês se estendia por um território

maior do que o continente europeu (KISSINGER, 2011).

A partir desta perspectiva, a reação chinesa frente ao século das

humilhações, período que se estende dede 1839 até a Revolução

Comunista de 1949, justifica o planejamento estratégico e as ações do

país no cenário contemporâneo. O Sonho Chinês, conceito criado pelo

atual mandatário Xi Jinping consiste justamente no rejuvenescimento da

nação chinesa, por meio da continuidade do processo de

desenvolvimento e ascensão pacífica do país, concomitantemente com a

maior projeção internacional e melhores condições de vida para sua

população (JINPING, 2015).

Trata-se de uma antiga potência reocupando a posição histórica

que ela vê como natural para si dentro do mundo contemporâneo, e

fazendo isto não através da coerção, mas através do comércio e mais

recentemente dos investimentos feitos realizados com o capital

acumulado (ARRIGHI, 2009), constituindo sua esfera de influência.

Ressalte-se que Kissinger (2011) trata o período do século das

humilhações como uma prova da maestria da diplomacia chinesa, pelo

fato de que o país conseguiu manter significativa parte de sua

integridade territorial continental apesar das assimetrias de poder em

relação às potências dominantes da época. Adicionalmente, a China não

foi dissuadida de sua cultura milenar. Pela lógica da balança de poder, o

autor afirma que a china deveria ter perdido significativa parte dos

territórios de sua massa continental (KISSINGER, 2011).

A vasta massa territorial da China auxiliou no processo de

formação do pensamento de autossuficiência e isolamento em relação ao

espaço externo que o país adotou no período de seu fechamento, entre os

séculos XIV e XV, tendo influência sobre sua cultura, religião e mesmo

no estabelecimento do sistema burocrático da nação. Por mais de três

milênios na história da civilização chinesa, a sua orientação geopolítica

fora predominantemente continental, na busca por defesa e no

estabelecimento de vínculos tributários em relação aos povos da Ásia

Central (Hunos, Mongóis, Manchus, entre outros). Este é um percurso

civilizacional marcado pelas invasões a norte e a oeste em oposição à

identidade do Império Chinês. Adicionalmente, por quase metade do século XX a China focou sua atenção geopolítica no espaço da

Heartland eurasiática (COHEN, 2015).

Não obstante, cabe ressaltar que influência do Oceano Pacífico

também esteve presente no processo de formação do Estado chinês. Os

territórios de Guangzhou (Cantão) e o Delta do Rio das Pérolas tiveram

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46

uma importância neste sentido, sendo que Cantão foi instrumental no

estabelecimento de rotas comerciais com o império Hindu e com os

povos árabes, durante o período de florescimento das antigas Rotas da

Seda. Além do estabelecimento do comércio com outros países do

Sudeste Asiático (KAPLAN, 2012).

Posteriormente, o Oceano Pacífico reemerge de forma

significativa como espaço de influência da China durante o processo de

abertura e liberalização comercial iniciado por Deng Xiaoping

(COHEN, 2015). A Belt and Road Initiative parece consolidar estas

frentes de atuação: o aspecto continental através da Ásia Central, da

Ásia Austral e da Europa e o aspecto marítimo buscando uma projeção

simultânea sobre os Oceanos Pacífico e Índico.

A consolidação da influência chinesa no século XXI ocorre a

partir da sua projeção regional. Os principais instrumentos utilizados

pelo país neste processo decorrem de suas finanças e do exercício de

políticas geoeconômicas (BLACKWILL e HARRIS, 2016), conceito

que será abordado na próxima seção e que é importante para que se

compreenda a atuação do país através do projeto da Nova Rota da Seda.

2.3 A GEOECONOMIA CHINESA: OS INSTRUMENTOS

PARA CONSOLIDAÇÃO DE INFLUÊNCIA

No cenário internacional, as trocas sutis, exercidas através do

poder econômico ganham grande relevância, aliadas à visão geopolítica

e estratégica relacionadas ao exercício do poder estabelecido nos

diversos tabuleiros regionais. As visões são complementares e

atualmente, não devemos olhar os acontecimentos no cenário

internacional unicamente através das lentes da geopolítica, do poder

militar ou do poderio econômico (KAPLAN, 2012).

Nesta mesma ordem de ideias, os estudos estratégicos empregam

o conceito definido como geoeconomia, para evidenciar a relação entre

fatores geográficos e o emprego de políticas econômicas. Este conceito

evidencia o uso de recursos econômicos para atingir fins geopolíticos,

ou metas correspondentes ao interesse nacional. Este é um importante

conceito para compreender a atuação da China (HONG, 2016). Em

outras palavras, a geoeconomia pode ser vista como a continuação da geopolítica por outros meios. Fazemos nesta formulação uma clara

alusão ao conceito desenvolvido por Clausewitz8.

8 “A Guerra nada mais é do que a continuação da política por outros

meios” (CLAUSEWITZ, 2010, p. 70).

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47

Exemplos do emprego de políticas com efeito geoeconômico

incluem: 1) a compra de títulos de dívida nacional de outras nações; 2)

decisões de mudança nos parceiros comerciais, sobretudo no caso da

compra e venda de recursos estratégicos; 3) a decisão de alocação de

investimento estrangeiro direto ou de capital de curto prazo, podendo

desestabilizar economias nacionais de menor porte, ou mesmo contribuir

para o desenvolvimento econômico de outras; 4) a importância de

determinada nação para o sistema financeiro global, que pode ser

utilizada como elemento de barganha geoeconômica; 5) o uso do

tamanho do mercado doméstico como fator de negociação, por exemplo,

quando as empresas chinesas exigem a transferência de tecnologia ou o

estabelecimento de joint ventures com empresas nacionais, para as

empresas estrangeiras que queiram se estabelecer em seu território e

explorar o seu mercado; 6) o estabelecimento de embargos comerciais;

7) o uso estratégico de métodos para o cálculo de estatísticas oficiais,

visando projetar a expectativa de crescimento e a imagem de

estabilidade do país (BLACKWILL; HARRIS, 2016).

As pressões geoeconômicas são mais sutis do que o poder militar

propriamente dito. No entanto, mesmo a influência geoeconômica pode

gerar desconfiança e encontrar limites, como é possível observar no caso

da remilitarização do Japão e na reaproximação dos países do sudeste

asiático e da ASEAN em relação aos Estados Unidos, no que diz

respeito a questões comerciais. Estes fatos podem ser parcialmente

vistos como reações ao alcance econômico da China, que se tornou o

principal parceiro comercial de praticamente todas as nações da ASEAN

na última década. A geoeconomia pode ser considerada um recurso

menor da geopolítica e é utilizada de forma mais frequente e mais

eficiente pelos grandes atores do sistema internacional, que possuem os

recursos necessários para isto (BLACKWILL; HARRIS, 2016).

A estratégia geoeconômica da China inclui a compra de empresas

estrangeiras, adquirindo consequentemente a sua tecnologia, além de

setores de pesquisa e desenvolvimento; como se observa de forma mais

significativa na Europa. Os investimentos chineses destinados à

facilitação do acesso e escoamento aos recursos naturais de várias

regiões tais como a Eurásia, a África e a América Latina, são outro

exemplo de exercício da geoeconomia chinesa. Incluindo igualmente a concessão de empréstimos aos mais variados Estados, como uma forma

de promoção de boa vontade e da cooperação. A China vem

consolidando uma robusta ferramenta diplomática para exercer

influência e atingir seus objetivos estratégicos (BLACKWILL;

HARRIS, 2016).

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O espaço da Eurásia é vasto, sendo composto por países de

múltiplas culturas e diferentes percursos históricos. Sua importância

estratégica vem sendo enfatizada, ao passo que ocorre o aumento da

integração e interdependência na região. A atuação de novas potências

vai se integrando ao espaço historicamente ocupado pela Rússia, pelos

Estados Unidos e pela Europa. Atualmente, os principais atores nesta

região são os Estados Unidos, a Rússia e a China (BRZEZINSKI, 2016).

Klieman (2015) compara a posição da China na Eurásia à magnitude do

potencial estratégico representado pela posição da Rússia.

O crescimento econômico e tecnológico tornou a China uma

potência regional com impacto geopolítico em toda a Eurásia. O país faz

fronteira com 14 Estados e possui fronteira marítima direta com outros

três (Japão, Filipinas, Coréia do Sul e Taiwan - não reconhecido pela

China como um Estado independente). A população dos seus vizinhos

gira em torno de dois bilhões de pessoas e a população da China é

atualmente de 1.4 bilhões, fazendo com que cerca de metade da

população global seja afetada pelas ações geoestratégicas deste país.

Esta preponderância influencia igualmente as regiões da Ásia

Meridional, da Ásia Central e da Heartland contígua ao território da

Rússia (COHEN, 2015). No que diz respeito ao exercício de influência

nos diversos cenários regionais, destaca-se9:

"A energia, talvez mais do que qualquer outro

fator, simboliza a geopolítica do século XXI. Sua

proeminência sinaliza uma profunda mudança

acerca da dependência tradicional do poder militar

e político. A energia é um instrumento de

competição entre os Estados tão significativo

quanto foram as armas nucleares ou os grandes

exércitos durante a Guerra Fria. Os meios para a

influência internacional hoje são mais

diversificados e sofisticados, mas muitos dos

9 Segue o trecho original: “Energy, perhaps more than any other single

factor, has come to symbolize the new geopolitics of the twenty-first century. At

one level its prominence signals a profound change from the traditional

reliance on military and political power. Yet at the same time it is no less an

instrument of competition than nuclear weapons or large armies were during

the Cold War. The means of international influence today are more diverse and

sophisticated, but many of the goals remain as “old-fashioned“ as ever:

national security, the projection of power, control over space, and the pursuit of

strategic superiority or parity”.

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objetivos continuam os bons e velhos de sempre:

segurança nacional, projeção de poder, controle

do espaço e a busca por superioridade ou

igualdade estratégica". (LO, 2008, p. 132, apud

EDER, 2014, p. 33, tradução nossa).

Na ordem internacional, a posse de recursos energéticos constitui

um fator de poder e de influência (KLARE, 2013). A projeção global

dos investimentos chineses, ou estratégia Going Global foi inicialmente

pensada como uma política visando o acesso a recursos energéticos

necessários para o desenvolvimento de sua economia nacional

(OURIQUES, 2014).

Esse é o contexto no qual se desenvolve a Nova Rota da Seda. A

Iniciativa apresenta um pensamento estratégico de longo prazo, sendo

executado através das medidas táticas e geoeconômicas, tais como

investimentos, ações diplomáticas, promoção de parcerias estratégicas

no âmbito regional, criação de instituições multilaterais, estabelecimento

de joint ventures, fluxos financeiros de ajuda para o desenvolvimento,

acordos comerciais, entre outros instrumentos. Estas ferramentas são

necessárias para a obtenção do objetivo de assegurar o maior aporte

possível de recursos naturais e energéticos que permitam a continuidade

do crescimento da economia chinesa (BLACKWILL e HARRIS, 2016;

XIAOYU, 2017).

Neste sentido, a BRI não deve ser vista apenas como uma série de

projetos de infraestrutura alinhados de acordo com determinados

princípios. A iniciativa consiste em uma ampla visão estratégica para a

integração da Eurásia, colocando a China como centro de articulação de

influência no sistema regional. A BRI é a principal visão de política

externa do governo Xi Jinping, implicando elementos de

desenvolvimento econômico e de projeção estratégica. (PLOBERGER,

2017; ROLLAND, 2017). O espaço eurasiático deverá ser influenciado

por alguma combinação do triângulo estratégico entre China, Rússia e

Estados Unidos (KLIEMAN, 2015; BRZEZINSKI, 2016).

Pontualmente, o próximo capítulo será dividido em duas seções, a

primeira aborda a importância da tradição histórica e cultural na

formação da política externa e do pensamento estratégico da China

acerca das relações internacionais. A segunda seção aborda as diferentes

fases da emissão de investimentos estrangeiros diretos do país, incluindo

a estratégia "Going Global", visando identificar as principais

macrotendências e a evolução dos seus investimentos para o mundo.

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51

3 A INSERÇÃO INTERNACIONAL DA CHINA

A China não é apenas um Estado, mas constitui uma matriz

civilizacional com mais de três mil anos de história. Embora não exista

uma escola ou teoria chinesa de Relações Internacionais (YAQING,

2010), a influência do pensamento e da cultura da China antiga pode ser

observada nas estratégias e na política externa do país.

Elementos de realpolitik, ou seja, cálculos pragmáticos baseados

em interesses se coadunam com princípios confucianos, como a

necessidade de equilíbrio, valorização da harmonia, possibilidade de

cooperação para ganhos mútuos, além do foco no aspecto moral da

política (FENG, 2015). Nesta mesma ordem de ideias, torna-se

importante que tenhamos o cuidado de combinar as narrativas de autores

chineses com a visão de teóricos ocidentais, para que seja possível

realizar uma análise objetiva do processo de inserção internacional da

China.

Neste sentido, o presente capítulo pretende sintetizar as principais

tendências estruturais que moldam a formulação da política externa

chinesa e, consequentemente, acabam por influenciar a sua inserção

internacional. Pontualmente, a primeira seção aborda a influência da

cultura e da visão chinesa acerca das Relações Internacionais,

procurando demonstrar as tendências de longa duração que influenciam

a trajetória internacional do país. A segunda seção procura realizar um

panorama acerca dos investimentos estrangeiros da China, através da

análise das diferentes fases de emissão de investimentos, incluindo a

estratégia Going Global surgida no ano 2000 e que se projeta rumo ao

século XXI.

Existe a percepção de que a Belt and Road Initiative, lançada no

mandato de Xi Jinping, constitua efetivamente uma nova e significativa

dimensão da estratégia Go Global. Por fim, os conceitos e princípios da

BRI apresentam correlações com a cultura e tradição da China antiga,

razões que justificam a escolha dos tópicos tratados no presente

capítulo.

3.1 O PENSAMENTO CHINÊS ACERCA DAS RELAÇÕES

INTERNACIONAIS

No seu contexto histórico, o Império chinês era uma potência

cultural e econômica. Entretanto, no que diz respeito ao aspecto militar,

o Império sofria ameaças reais dos povos situados em suas fronteiras

devido à mobilidade e técnicas de combate dos povos nômades da Ásia

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Central. Portanto, visando evitar conflitos, desenvolveu-se uma extensa

tradição diplomática, além da prática de concessão de benefícios

econômicos de modo a realizar a dissuasão de conflitos potenciais. O

aporte de recursos econômicos aos invasores projetava ainda a imagem

de grandeza e prestígio do Império. Adicionalmente, a China usava

ferramentas diplomáticas para fomentar a rivalidade entre as diversas

facções e clãs da Ásia Central. Quando se encontrava em períodos de

decadência o Império procurava assimilar os povos invasores em sua

cultura, através do pragmatismo decorrente do trabalho de gerações

inteiras dos seus diplomatas (KISSINGER, 2011).

No que tange ao aspecto cultural e filosófico, os princípios

confucianos enfatizam a moralidade como uma forma de se obter

liderança política. A moralidade constrói uma imagem de legitimidade

perante os vizinhos. Estes fatores poderiam mitigar os cálculos racionais

baseados na maximização dos interesses. A percepção humanística da

política chinesa para com os povos estrangeiros é um aspecto advindo

do período anterior à unificação do país sob o Império Chinês, que

ocorreu em 221 a.C. (XUETONG, 2011). Após aproximadamente um

milênio no qual se manteve um regime político dinástico, o território da

China se encontrara fragmentado em diversos feudos. Entre os anos

475-221 a.C. ocorreu uma configuração de um sistema de equilíbrio de

poder com guerras entre esta multiplicidade de unidades políticas

(KISSINGER, 2011).

Neste contexto, afirma-se que o pensamento estratégico é uma

importante tradição oriunda do período anterior à sua unificação, no

qual os chineses tinham que lidar com conflitos em várias frentes e com

constantes mudanças no equilíbrio de poder. A distribuição de poder

passou de mais de 100 unidades políticas para sete feudos, e finalmente

para um único Estado10 cujo governante era o Filho do Céu. O

imperador tinha o comando sobre a tianxia (tudo o que existe sob os

céus)11, o que acabou por constituir um império baseado em uma matriz

cultural e civilizacional que viria a estabelecer um sistema tributário

sobre o seu espaço regional imediato. A premissa de que a mudança é

10 Utiliza-se a palavra Estado como uma simplificação, de modo a

designar uma unidade político-administrativa centralizada. Isto não significa

que o aparato administrativo da China imperial possuísse as características dos

Estados nacionais europeus surgidos no contexto dos acordos de Paz de

Westfália (1648). 11 Isto simboliza a percepção da China acerca da centralidade e

superioridade da sua cultura no que diz respeito aos povos vizinhos.

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uma constante na vida política e social e que o pensamento estratégico é

o modo como se pode conduzir e lidar com estas mudanças é algo

profundamente importante na cultura da China antiga (GUNGWU &

YONGIAN, 2008).

A tradição estratégica da China favorece o pensamento de longo

prazo e a acumulação de vantagens sutis através dos anos. Isto se deve

ao fato de que o Império chinês lidava com a noção de um duradouro

sentimento de insegurança, devendo atuar simultaneamente com

inimigos localizados em diversas fronteiras geográficas. Assim, a

estratégia do Império era cercar os seus inimigos lentamente, através da

sucessiva acumulação de vantagens relativas. A tradição estratégica

chinesa, portanto, apresenta claras diferenças em relação à tradição

estratégica Ocidental, que prima por vitórias decisivas e finais, ou atos

de heroísmo (KISSINGER, 2011).

A flexibilidade estratégica do pensamento chinês visa evitar os

confrontos diretos e trabalha com fatores psicológicos, como o uso de

combates indiretos e visando o cercamento do inimigo. Elaborando

através da tradição do pensamento do estrategista Sun Tzu, Kissinger

(2011) afirma que o objetivo do Império chinês era evitar o conflito

armado, focando nos seus objetivos políticos e como eles se imiscuem

com a condução tática e estratégica. Derrotar o objetivo político do

inimigo sem precisar atacá-lo seria o êxito máximo, reduzindo a sua

posição e sua força de forma gradual. Isto era possível derrotando os

fundamentos de sua estratégia, minando os seus recursos e aliados e, por

fim, chegando ao combate direto apenas se estritamente necessário

(KISSINGER, 2011).

Ao utilizar-se da força não seria possível apenas analisar uma

situação em particular e empregar os recursos disponíveis para resolvê-

la de forma decisiva. A sutileza do pensamento chinês reside no fato de

perceber como uma determinada decisão afeta a configuração mais

ampla de suas próprias forças e dos seus inimigos. Portanto, o

posicionamento e os pontos específicos onde se devem aplicar pressões

ao inimigo são aspectos muito enfatizados em sua cultura estratégica.

Esta é fundamentalmente uma estratégia de dominação psicológica,

lidando com a moral e com os recursos do adversário. Atrair o oponente

para posições desfavoráveis enquanto aumenta as suas próprias forças e recursos, fintar mais capacidades materiais do que se tem, ou dissimular

posições, constituíam instrumentos táticos comuns para o Império

Chinês (KISSINGER, 2011).

Por outro lado, Xuetong (2011) afirma a importância da

autoridade humanística para explicar o período de liderança da China

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sob o seu entorno regional. A liderança humanística se consolida em

uma estrutura de governança e de relação com outros povos que deveria

dominar não pela força, mas pela virtude moral e pela atração advinda

do florescimento da cultura (XUETONG, 2011).

Não obstante, isto não significa que os princípios confucianos de

condução política sejam totalmente pacíficos. Admite-se o uso da força

no caso de percepção de perda da unidade cultural da China, deturpação

da ordem no sistema tributário regional ou ainda no caso de autodefesa

contra ameaças externas. Em últimos casos, ações punitivas motivadas

pela defesa da cultura chinesa admitem o uso da força. Portanto, a

liderança através de princípios confucianos se baseia na "exortação

moral e inspiração pelo caminho de exemplos virtuosos" (FENG, 2015,

p. 205, tradução nossa).

O papel da liderança é importantíssimo no pensamento clássico

da China, visto que a hegemonia sobre outros povos e a sua própria

unidade cultural só podem ser consolidadas através do poder político

conduzido por líderes capazes e eficientes, o que se materializa na figura

do imperador. Acima da hegemonia, que consiste na influência

preponderante de uma entidade política sobre outras unidades

fragmentadas, estaria a autoridade humanística, sem precisar recorrer ao

poder militar, estando ancorada em elevados princípios morais e

culturais (XUETONG, 2011).

Uma compreensão das influências confucianas sobre a política

externa chinesa compreende ainda o princípio de inclusivo do

desenvolvimento moral. O processo de diferenciação percebido pelas

elites chinesas em relação aos povos nômades da Ásia Central não se

dava, segundo esta percepção, apenas pelo pertencimento étnico ou

territorial à matriz civilizacional chinesa, mas sim por questões morais e

culturais. Portanto, existia a percepção de que caso os povos nômades

conseguissem ascender ao nível moral e cultural representado nos

valores da burocracia confuciana eles poderiam ser assimilados ao

sistema sinocêntrico como cidadãos chineses (FENG, 2015).

A autoridade humanística deve ser conduzida pela liderança

política que esteja moralmente embasada. Desta forma é possível

fomentar normas e padrões de comportamento no cenário internacional,

estimulando novos meios de socialização entre os Estados. Segundo esta visão, os recursos de poder e os fatores materiais (poder militar e

econômico) são importantes, mas a capacidade de efetivamente

empregá-los para exercer influência é mais relevante do que a simples

posse dos mesmos. A chave para a conversão neste processo seria a

liderança política moralmente embasada e atuando de forma

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humanística, o que implica no fornecimento de bens públicos para as

unidades menores do complexo regional asiático (XUETONG, 2014).

Prover recursos econômicos para países menos desenvolvidos,

seja na forma de auxílio para a construção de infraestrutura e/ou prover

um arcabouço de cooperação e segurança a nível regional são exemplos

de políticas que poderiam ser empreendidas pela China de modo a

consolidar uma posição de liderança humanística a nível internacional.

Argumenta-se que em matérias de cooperação, assuntos ligados ao

desenvolvimento e ao meio ambiente são mais fáceis de serem

compreendidos através do conceito de liderança humanística. Por outro

lado, em contextos que ameacem a segurança nacional, considerações de

realpolitik podem aflorar como padrões de comportamentos necessários

(XUETONG, 2014).

A tradição confuciana é uma das principais vertentes de ideias

que influenciam a ação política da China. Existem três grandes

tendências que influenciam o pensamento contemporâneo do país nas

Relações Internacionais: 1) a importância do conceito de tianxia (tudo

sob os céus); 2) a influência da Revolução Comunista sobre a projeção

internacional do país (1949); 3) o foco no desenvolvimento econômico

interno como eixo condutor de uma estratégia nacional (YANG, 2015;

ROLLAND, 2017).

O conceito de tianxia (tudo o que existe sob os céus) é advindo

da literatura chinesa antiga e fundamenta a formação do sistema

tributário sinocêntrico. Este sistema veio a configurar uma organização

do trabalho e da vida social, além de uma cultura regional que se traduz

na subordinação e deferência dos povos vizinhos. Elaborações

conceituais demonstram a tianxia como uma série de círculos

concêntricos partindo da China e compreendendo as unidades políticas

subordinadas, os vassalos tributários (FOSSAERT, 2011). O conceito se

traduz em três dimensões: geográfica, cognitiva e institucional,

explicando a visão da China acerca do seu papel na estruturação do

ordenamento regional na Ásia.

O conceito de tianxia se tornou associado à ideia de soberania da

China e do seu papel central na organização do espaço regional, sem

constituir a dominação sobre os povos que participavam do comércio e

da sua esfera de influência. Este processo era legitimado internamente pela percepção de superioridade moral e cultural da China. Ainda que

historicamente isto tenha se configurado como um sistema instável em

certos períodos, a tianxia vigorou de 221 a.C. até meados do século

XIX, quando começa o seu declínio. Neste sistema havia a percepção da

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centralidade do Império Chinês e um impulso de diferenciação em

relação aos Estados vassalos (QIN, 2010).

Devido à singular duração do sistema tianxia, existia a percepção

de permanência da centralidade do Império Chinês. Entretanto, a tianxia

não é apenas um conceito imperial, mas um sistema de valores, hábitos,

crenças e atitudes morais cultivadas ao longo de séculos. Afirma-se que

este é o resultado do processo de formação de identidade do povo

chinês, que se projeta sobre o espaço regional asiático (GUNGWU &

YONGIAN, 2008).

Qin Yaqing (2012) destaca três principais conceitos acerca da

formação do sistema identificado como tianxia: 1) a solução para os

problemas estabelecidos entre as unidades pertencentes ao sistema

deveria ter aceitação por ambas as partes, ao invés de ser baseada no

livre exercício do poder imperial; 2) as instituições de tal sistema

deveriam beneficiar os seus demais componentes, mesmo considerando

as assimetrias entre as unidades; 3) deveria haver harmonia e aceitação

entre os povos pertencentes à tianxia. A China provia a estabilidade e os

mecanismos institucionais do sistema tributário, incluindo a

responsabilidade por assegurar a paz, o comércio e um sistema

institucionalizado de governança. Os demais componentes do sistema

tinham liberdade para determinar suas próprias direções no que tange a

questões sociais, políticas e econômicas domésticas, desde que

cumprissem com os compromissos tributários e não questionassem a

cultura e os ritos do Império Chinês (QIN, 2012).

Esta estrutura cognitiva, ou simplesmente visão de mundo,

enfatiza a participação da moral e da ética nas decisões acerca da vida

política, tendo uma preocupação com os efeitos de longo prazo dos

rumos empreendidos. Além disto, fundamenta-se pela supremacia da

coletividade, acima dos interesses individuais. Isto se traduz em

Relações Internacionais como uma abordagem que parte do nível de

análise individual (moral e ético) para produzir efeitos no nível

sistêmico (QIN, 2012).

A visão tradicional da China concebe as relações entre unidades

políticas como a relação estabelecida entre indivíduos através de

processos de socialização: "Nesse sentido, uma sociedade de Estados,

como uma sociedade de indivíduos, é um conceito desenvolvido há muito tempo na mente chinesa." (QIN, 2010, p. 36, tradução nossa).

Este padrão acabou por configurar um sistema político, no

sentido de produzir uma articulação subordinada entre diferentes

comunidades políticas na qual existe uma transferência de recursos da

periferia rumo a um centro civilizacional, nomeadamente o Império

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chinês. Em contrapartida, a civilização chinesa estabelece uma série de

normas, ritos e processos de socialização que estimulam a formação de

um sistema de governança, ainda que esteja implícita a ideia da

hierarquia, com a China no topo dos processos decisórios (FAIRBANK

e MERLE, 2010; FOSSAERT, 2011).

Para que se compreenda a formação da tianxia deve-se focar nas

relações entre as unidades e os processos delas decorrentes como sendo

os aspectos ontológicos para a análise da política. O foco nos processos

aporta dinamicidade para que se possa compreender a inter-relação

mutuamente constitutiva que se estabelece entre o império e os vassalos.

Os processos correspondem às relações de socialização que se

estabelecem no âmbito das interações entre estas unidades políticas

(QIN, 2012).

Ressalta-se a importância da ideia do equilíbrio, ou o Caminho

Mutuamente Inclusivo do Meio (Zhongyang). Nesta concepção os

processos de socialização envolvem forças dialéticas que devem ser

equilibradas sem haver a destruição de qualquer uma destas forças. Para

que se chegue a uma síntese acerca do modelo político adotado é

necessário que os polos que interagem em oposição possam chegar a um

consenso através da harmonização. Ao invés de se pensar em um

modelo que pressupõe o conflito dialético entre tese e antítese, concebe-

se um modelo de construção harmoniosa da síntese. Isto evoca a

simbologia existente entre Ying e Yang. Para que se chegue à harmonia,

é necessário que se utilize da ação prática embasada por princípios

morais (QIN, 2012, p. 80-82).

A China viu o fim do período da tianxia e a imposição à entrada

no sistema Westfaliano no século XIX como uma competição com

outros impérios. A questão do nacionalismo devido ao pertencimento a

um local geográfico e o orgulho nacional desvinculado da moral

constituíam fatores de difícil compreensão para os chineses. Foi apenas

com a derrota contra o Japão em 1894-1895 que a China percebeu,

naquele contexto, que o seu poder havia deixado de ser o de um grande

império e que a ordem asiática estava se organizando em novos termos,

através de outros atores (GUNGWU & YONGIAN, 2008).

A partir do final do século XIX os diplomatas chineses tentaram

promover a inserção da China como um país poderoso e em posição de equidade no que diz respeito às outras potências do sistema westfaliano.

Entretanto, as turbulências internas na China dificultaram o processo. A

invasão do Japão sobre o território chinês e 37 anos de guerras civis

internas, que duraram de 1912-1949, impossibilitaram uma articulação

internacional favorável (KISSINGER, 2011). Apenas com a Revolução

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Comunista de 1949 o país começa a reconquistar efetivamente sua

soberania interna e considera-se o marco paradigmático do fim do

século das humilhações, que havia começado nas Guerras do Ópio

(1839-1842; 1856-1860). (GUNGWU & YONGIAN, 2008).

Portanto, o segundo aspecto a ser abordado consiste na

Revolução Chinesa de 1949 que é vista como um fator paradigmático de

mudança social. A Revolução proporcionou unidade e coesão política ao

país de modo a procurar reconstituir a sua posição no sistema

internacional. Os acontecimentos da abertura forçada dos portos em

1840 levaram a China a questionar não apenas o seu padrão econômico,

como o padrão tecnológico de sua sociedade e de suas forças militares, o

que acabou por levar à queda do regime político imperial em 1911

(KISSINGER, 2011).

As mudanças institucionais, no entanto, levaram a um período de

instabilidade e caos sistêmico no contexto político doméstico do país, ao

passo que a nação passava por um momento interno de reavaliação. O

campo político se dividiu entre dois grupos, os neo-confucianos que

visavam o reestabelecimento dos valores chineses tradicionais e um

grupo que visava às reformas no sentido de ocidentalizar a China, o que

incluía a aceitação do conceito de diplomacia e relações exteriores

advindos da tradição europeia (QIN, 2010).

A situação doméstica da China se estabilizaria apenas no ano de

1949, ainda que com descontinuidades advindas das crises e reformas

promovidas por Mao Zedong. Reforma e revolução tornam-se conceitos

importantes na tradição política chinesa, ao passo que surge o conflito

entre a adoção das ideias ocidentais e a necessidade de reconfiguração

advinda do fim do sistema tributário. Nesta conjuntura emerge a teoria

política de Mao Zedong que é uma adaptação do conceito de luta de

classes, adaptada para três frentes, prevendo a possibilidade de formar

alianças com outros Estados. A análise política de Mao via três

conceitos na condução de suas relações internacionais: "nós", "os

aliados" e "os inimigos" (QIN, 2010, p. 44, tradução nossa).

De modo a evitar um retorno ao período de instabilidade anterior,

a diplomacia de Mao Zedong enfatizou os conceitos de soberania e

igualdade. Este foi um trabalho de consolidação da atuação conjunta da

China com outras nações consideradas do Terceiro Mundo, estando naquele contexto situadas fora da influência direta dos Estados Unidos e

da URSS. Neste contexto de busca por autonomia em relação às

superpotências do período da Guerra Fria surgem os cinco princípios da

Coexistência Pacífica, buscando rumos para o desenvolvimento nacional

(GUNGWU & YONGIAN, 2008).

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Este arcabouço conceitual foi concebido no seio do movimento

terceiro-mundista, no ano de 1954, na conjuntura dos movimentos de

descolonização e da Conferência de Bandung (1955). Os princípios

foram cunhados pelos primeiros ministros da Índia e da China,

Jawaharlal Nehru e Zhou Enlai, respectivamente. Os Princípios da

Coexistência Pacífica são: 1) Respeito mútuo pela integridade territorial

e soberania; 2) Não agressão mútua; 3) Não interferência nos assuntos

internos de outros Estados; 4) Igualdade e cooperação para benefícios

mútuos e, por fim, 5) coexistência pacífica (ORGANIZAÇÃO DAS

NAÇÕES UNIDAS, 1955, p. 70). Este quadro de ideias surgiu para

guiar os processos de socialização conduzidos pelos Estados do então

movimento terceiro-mundista.

A conjuntura internacional mudou drasticamente desde a

formulação dos cinco princípios de coexistência pacífica, não obstante, a

política externa chinesa continua a evocá-los e enfatiza, sobretudo, a

questão de não intervenção nos assuntos internos de outros Estados, a

cooperação para ganhos mútuos e coexistência pacífica. Considera-se

que os cinco princípios possam ser uma contribuição da Índia e da

China para o sistema internacional, no sentido de prover uma visão

conceitual para os países em desenvolvimento (YANG, 2015).

O foco no desenvolvimento econômico emerge como a terceira

grande tendência da política chinesa, cujo ímpeto surge na Revolução

Comunista (1949), mas que viria a se consolidar com a abertura e as

reformas impulsionadas por Deng Xiaoping (mandato de 1978-1992)

durante o seu tempo à frente do comando do país. Existe a percepção de

que o desenvolvimento econômico e o espraiamento dos seus benefícios

às diversas províncias do país conduziriam à estabilidade do governo do

Partido Comunista. A gradual abertura econômica nas relações externas,

com estímulo ao comércio e aos investimentos torna-se um ponto

importante das relações internacionais da China a partir do governo de

Deng Xiaoping (KROEBER, 2016).

Deng Xiaoping cunhou o conceito de manutenção de um baixo

perfil (low profile) na atuação externa do país no período de 1990-1991

de modo a demonstrar a sua voluntariedade de contribuir para a ordem

existente e não de substituí-la. Uma postura branda e incremental em

relação ao ordenamento global visa mitigar tensões que poderiam surgir com o aumento da projeção da China na política internacional. Esta

concepção vigorou quase sem disputas por mais de 20 anos. Percebe-se

que é necessário um ambiente pacífico para que se possa completar o

processo de desenvolvimento econômico doméstico da China, que é

considerado como um objetivo de longo prazo. Portanto, a visão do low

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profile reafirma que a China não busca qualquer forma de hegemonia no

plano internacional. Esta é uma vertente baseada na acomodação e

integração da China às instituições e aos padrões de interação vigentes

no âmbito sistêmico (JIAN, 2015).

A estratégia do Pivô para a Ásia lançada pelos EUA no ano de

2012, que significava o redirecionamento do foco e dos esforços deste

país no sentido de manter sua preponderância sobre o espaço estratégico

do Oceano Pacífico, acabou sendo percebida como uma estratégia de

balanceamento, executando pressões sobre a China no que diz respeito

ao seu entorno regional (AOYAMA, 2016; YIPING, 2016).

Adicionalmente, as tensões e disputas com o Japão, as Filipinas,

o Vietnã e outros países localizados nos Mares ao Sul e ao Leste da

China exigiram o recrudescimento da postura chinesa no que diz

respeito aos seus interesses no âmbito regional. A partir do ano de 2012

com as negociações dos Tratados de Liberalização do Comércio

Transpacífico (TPP), que excluía inicialmente a participação da China,

produziram-se as percepções de que uma estratégia de baixo perfil e de

priorizar boas relações com os EUA em detrimento dos aliados

regionais seria prejudicial para os interesses do país (XUETONG,

2014).

É possível perceber o início de uma inflexão na formulação da

estratégia internacional da China a partir do ano de 2010, quando o PIB

do país superou o do Japão e surge a necessidade de um posicionamento

mais incisivo no seu entorno regional. Á partir de 2012 com o mandato

do Presidente Xi Jinping, que iniciou em 2012, emerge a aspiração de

concretizar uma postura mais propositiva no âmbito regional, sob os

motes da busca pela realização ("striving for achievement") e o

rejuvenescimento da nação chinesa, a despeito das imediatas críticas

realizadas pelos EUA em relação a esta política externa (XUETONG,

2014).

Evocando ideias do pensamento de teóricos da China antiga,

como Xunzi, argumenta-se que a construção de credibilidade é o

primeiro passo para se chegar à posição de liderança humanística,

conceito abordado anteriormente neste capítulo. A ideia de liderança

moral ou credibilidade estratégica no caso da China contemporânea

consiste principalmente na ajuda que o país se dispõe a prover para o desenvolvimento dos Estados que busquem este auxílio, sem impor

condicionalidades políticas ou ideológicas sobre o âmbito doméstico dos

receptores. Nesta perspectiva, o antigo conceito chinês de moralidade

auxilia na condução dos interesses e no incremento do poder do Estado

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no plano internacional, consolidando a sua posição de credibilidade

estratégica e consequente liderança humanística (XUETONG, 2014).

Considera-se que o poder é um dos objetivos de política externa,

ao passo que as capacidades materiais são os instrumentos passíveis de

serem utilizados para consolidar a influência e o papel de liderança no

cenário internacional. Os objetivos de política externa da China seriam a

paz e estabilidade no âmbito regional, o desenvolvimento econômico e a

formação de alianças, conceito que surge mais fortemente no mandato

de Xi Jinping (SORENSEN, 2015). Para que isto se realize, é necessário

que se cultive parcerias estratégicas, através da prática da moralidade.

Princípios como ganhos mútuos (win-win cooperation) e o

estabelecimento de uma comunidade de destino comum, são exemplos

neste sentido (JINPING, 2015).

O Rejuvenescimento da Nação, ou o Sonho Chinês, para utilizar

os conceitos de Xi Jinping, passam pelo estabelecimento de alianças no

plano regional. De forma mais ampla pretende-se tornar a China uma

sociedade moderadamente próspera até o ano de 2021, prazo

estabelecido para dobrar o PIB per capita do país, com referência ao ano

2000, e uma sociedade socialista forte e moderna até 2049, ano do

centenário da fundação da República Popular da China (SORENSEN,

2015). Para que isto ocorra, é necessário que haja o espraiamento do

processo de desenvolvimento econômico e melhoria das condições

sociais do país de forma mais equilibrada entre suas províncias

(FERDINAND, 2016). O combate à corrupção no âmbito do Partido

Comunista é outro aspecto enfatizado pelo atual mandatário.

Portanto, o rejuvenescimento da nação implica em assumir maior

responsabilidade no desenvolvimento do seu entorno regional, de modo

a consolidar credibilidade estratégica, visando posteriormente ao

estabelecimento de uma autoridade humanística advinda dos princípios

morais. Este é um objetivo de longo prazo que resulta na provisão de

bens públicos na esfera regional e global, enfatizando os aspectos de

"proximidade, credibilidade, conceder benefícios e atuar de forma

inclusiva (qin, cheng, hui, rong)" (XUETONG, 2014, p. 167, tradução

nossa).

A ideia de socialismo com características chinesas vem de Deng

Xiaoping, e inclui a apropriação de valores da cultura chinesa tradicional, em conjunto com a abertura econômica e as reestruturações

rumo ao caminho do desenvolvimento, da construção de infraestrutura e

promoção das exportações, sem rejeitar a herança do modelo político

constituído por uma burocracia comunista, advindo do período da

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revolução. Este é um modelo econômico, político e social híbrido e

verdadeiramente único (KISSINGER, 2011; YANG, 2015).

Em suma, a política externa de Xi Jinping representa uma

mudança de percepção da China em relação à sua condição relativa no

sistema internacional, seus objetivos estratégicos e a disponibilidade das

ferramentas e distribuição de capacidades necessárias para tal projeto

político. Isto representa um país que passa a se perceber como uma

grande potência, à medida que aumentam as suas capacidades militares

e econômicas (SORENSEN, 2015). O uso da palavra credibilidade é

importante devido à carga histórica que este termo possui na cultura

chinesa. Isto significa que a China se mostra crescentemente disposta a

aceitar maiores responsabilidades no plano global, incluindo o auxílio

ao desenvolvimento econômico dos países vizinhos (XUETONG, 2014).

Xi Jinping é o primeiro mandatário da China desde Mao Zedong

a ter o seu nome incluso na constituição do país. O fato ocorreu após o

término do Congresso Nacional do Partido Comunista (PCC), em

outubro de 2017. No ano de 2016, o mandatário recebeu o título de líder

central do PCC, acumulando ainda as posições de Secretário-Geral,

Presidente da República Popular da China e Chefe da Comissão Militar.

A sua doutrina política foi igualmente inclusa na constituição, sendo que

isto ocorreu no período em que Xi Jinping ocupa os principais cargos

diretivos, um fato emblemático. Normalmente, a doutrina dos líderes

chineses é adicionada apenas após eles deixarem o poder e

frequentemente após o falecimento do mandatário. A cultura chinesa

valoriza altamente os rituais e práticas construídas ao longo do tempo na

condução das relações políticas e sociais (ECONOMIST, 2017). A

inclusão do nome de Xi Jinping representa uma inflexão em alguns

desses costumes e isto é digno de nota.

A China vê a sua história como um processo cíclico entre

períodos de decadência e períodos de retorno à harmonia e

desenvolvimento. Diferentemente da noção ocidental de progresso, que

implica a questão de melhorias lineares e crescentes (KISSINGER,

2011). Neste sentido, a Belt and Road Initiative pode ser vista como um

dos instrumentos do processo de rejuvenescimento da nação, auxiliando

o país a consolidar o seu novo período de desenvolvimento e de

harmonia, para usar os termos do próprio pensamento chinês. A propagação de ideias de um regionalismo inclusivo de tendência

confuciana, expressado nos conceitos empreendidos por Xi Jinping,

como uma comunidade para o destino comum, poderia oferecer um

caminho para mitigar as tensões ligadas ao aumento da preponderância

da China no cenário global (FENG, 2015; JIAN, 2015).

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63

No seu relatório acerca do XIX Congresso do Partido Comunista

da China, ocorrido em outubro de 2017, o mandatário Xi Jinping

afirmou a necessidade de promover a Belt and Road Initiative,

enfatizando a sua expansão global e a contribuição da China para o

desenvolvimento de outras nações12:

"Nós fizemos esforços globais na busca de uma

grande diplomacia para o país, que possua

características chinesas, avançando assim a

agenda diplomática da China de forma

abrangente, multinível e multifacetada e criando

um ambiente externo favorável para o

desenvolvimento da China. Prosseguimos com a

Iniciativa Belt and Road, iniciamos o Banco

Asiático de Investimento e Infraestrutura, criamos

o Fundo da Rota da Seda e organizamos o

Primeiro Fórum para a Cooperação Internacional

na Nova Rota da Seda, o 22º Encontro dos Líderes

Econômicos da APEC, sediamos a Cúpula G20,

ocorrida em 2016 em Hangzhou , a Cúpula dos

BRICS em Xiamen e a Quarta Cúpula da

Conferência sobre Interação e Medidas de

Confiança na Ásia. A China defende o

desenvolvimento de uma comunidade com um

futuro compartilhado para a humanidade e

encorajou a evolução do sistema de governança

global. Com isso, vimos um novo aumento da

influência internacional da China, na capacidade

de inspirar e poder para moldar; e a China fez

12 Segue o trecho original: “We have made all-round efforts in the

pursuit of major country diplomacy with Chinese characteristics, thus

advancing China's diplomatic agenda in a comprehensive, multilevel,

multifaceted way and creating a favorable external environment for China's

development. We have jointly pursued the Belt and Road Initiative, initiated the

Asian Infrastructure Investment Bank, set up the Silk Road Fund, and hosted the

First Belt and Road Forum for International Cooperation, the 22nd APEC

Economic Leaders' Meeting, the G20 2016 Summit in Hangzhou, the BRICS

Summit in Xiamen, and the Fourth Summit of the Conference on Interaction and

Confidence Building Measures in Asia. China champions the development of a

community with a shared future for mankind, and has encouraged the evolution

of the global governance system. With this we have seen a further rise in

China's international influence, ability to inspire, and power to shape; and

China has made great new contributions to global peace and development.”

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64

grandes contribuições para a paz e o

desenvolvimento globais" (JINPING, 2017).

Os conceitos de comunidade com um destino comum e

cooperação para ganhos mútuos (win-win) revelam a noção implícita de

que a cooperação entre os Estados beneficia a todos os atores

envolvidos. Mais do que uma visão de soma zero, esta noção se

estabelece como a ideia de que 1+1 é maior do que dois (JINPING,

2015). Ou seja, a cooperação fomenta o desenvolvimento comum de

forma mais eficiente do que a busca por maximização de interesses

individuais.

Com base na literatura evidenciada acima, no que diz respeito ao

aspecto da cultura estratégica, das ideias ou a visão política da China,

resumimos este arcabouço em cinco pontos: 1) enfatiza a ética e os

princípios morais; 2) vê o desenvolvimento, com ênfase para a

construção de infraestrutura, como o caminho para a paz e estabilidade;

3) não interferência nos assuntos internos de outros Estados, cada

sociedade deve poder decidir acerca do seu regime político e o seu

caminho de desenvolvimento; 4) Prima pela estabilidade e a

coletividade (valores da sociedade chinesa) acima dos interesses

individuais de cada cidadão; 5) busca pela paz e enfatiza o respeito à

hierarquia, sobretudo no nível das estruturas político-sociais.

Na próxima seção abordaremos a projeção global dos

investimentos chineses, com foco na estratégia conhecida como Going Global, que se projeta rumo ao século XXI. Para isto, partimos de uma

contextualização do período de reformas e abertura econômica do país,

que ocorreu a partir do governo de Deng Xiaoping e se estende até a

conjuntura presente, abordando as diferentes fases da emissão de

investimentos da China.

3.2 AS REFORMAS ECONÔMICAS E OS INVESTIMENTOS

DA CHINA NO EXTERIOR.

A primeira fase dos fluxos de investimentos externos diretos na

China começou em meados dos anos 1980, visando, sobretudo à atração

de capitais. Apenas posteriormente se intensifica o fluxo de emissão de

investimentos, através da estratégia Going Global, lançada no ano 2000,

período no qual o governo chinês procura incentivar as empresas

nacionais a acessar novos mercados. Para este fim, o governo auxilia

com aporte diplomático em âmbito bilateral e multilateral, com a

facilitação de acesso ao crédito no ambiente doméstico, além de

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65

simplificar as normas e restrições para a expansão de suas empresas. O

governo chinês fornece ainda apoio técnico para investimentos no setor

de pesquisa e desenvolvimento no exterior. Esta estratégia se

intensificou após a crise econômica de 2008, sendo capitaneada por

grandes empresas estatais. Recentemente o perfil das empresas chinesas

que investem no exterior passou a ser composto pela atuação de

empresas privadas ou público-privadas (YEH & WHARTON, 2016).

O reconhecimento da República Popular da China como membro

oficial da ONU no ano de 1971 foi um fato que antecedeu a abertura de

sua economia, pois viabilizou maior contato do país com as estruturas

políticas do sistema internacional. Durante os anos 1970 a China

estabeleceu relações diplomáticas e acordos de cooperação com os

EUA, com alguns países da Europa e com o Japão. Em 1979 a China e

os EUA assinaram um acordo comum concedendo ambas as partes o

status de parceiro comercial, seguindo o princípio da cláusula da Nação

mais favorecida (KISSINGER, 2011).

A China é um Estado que se configura politicamente como uma

estrutura de burocracia autoritária. Diferencia-se de uma ditadura, pois

possui variação periódica dos seus líderes, além de variação do comitê

central do Partido Comunista, o Politburo. Existe igualmente uma idade

limite para o exercício de cargos políticos e não ocorre sucessão familiar

na linha de comando do país. A estrutura política da China facilita a

obtenção de coesão nacional. O consenso doméstico é importante para

que seja possível realizar um planejamento estratégico de longo prazo,

visando ao desenvolvimento e à alteração da estrutura produtiva em

consonância com as mudanças do tecido social (FANG, 2015; JULAN e

YIFEI, 2018).

Cabe ressaltar que sua economia tem como base a elaboração de

planos quinquenais, tanto no âmbito nacional, como no âmbito

provincial. Esta é uma característica oriunda do regime político

estabelecido por Mao Zedong, de inspiração soviética. Os planos

quinquenais evoluíram de simples metas de produção e alocação de

recursos para um processo constante de conversão de informações

vindas da base da sociedade (através da aplicação de questionários e

observação da realidade prática) para o nível das políticas públicas. A

China é formalmente centralizada em sua governança no nível do Estado, entretanto, as 31 províncias possuem as suas próprias metas e

planos quinquenais e apresentam certa autonomia para determinação de

suas políticas (FANG, 2015).

O processo de desenvolvimento da China é advindo da abertura e

das reformas promovidas por Deng Xiaoping, havendo aplicação de

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66

políticas públicas e de política industrial com traços similares ao do

restante do leste asiático (dentro da conjuntura do paradigma produtivo

de então): reforma agrária, foco nas exportações, uma política cambial

compatível com este objetivo, e, por fim, reinvestimento da renda do

comércio em capacidade produtiva. Não obstante, outros fatores

influenciaram o sucesso econômico da China: a capacidade de

mobilização de recursos e os altos investimentos em infraestrutura, que

aumentaram a competitividade das empresas locais e auxiliam na

atração de investimentos estrangeiros. Ou seja, o processo foi realizado

através de esforços conscientes e estratégicos, conduzidos pelo Estado

através de planos quinquenais (KROEBER, 2016).

Estes são pontos importantes para se compreender como a China

passou de um país pouco significativo para a economia global, chegando

a um status de grande relevância no cenário contemporâneo. As

reformas iniciadas no período de Deng Xiaoping culminaram no

seguinte processo13:

"No final dos anos 1970 a China representava

uma pequena parcela da produção industrial do

mundo e menos de 1% do comércio. Em 2014 a

China se tornou a maior nação industrial do

mundo e a maior nação exportadora,

representando 12% das exportações globais e 18%

das exportações industriais do mundo"

(KROEBER, 2016, p. 43, tradução nossa).

Deng Xiaoping priorizou o desenvolvimento econômico ao invés

da abertura política, como modo de manutenção do poder do Partido

Comunista. Foi realizada a reforma agrária resultando em propriedades

menores que aportam excedentes produtivos e não constituem uma

classe organizada com influência política e econômica sobre a nação. O

modelo produtivo do país enfatizava a exportação de bens

industrializados. Além disto, direcionou-se o reinvestimento dos lucros

da exportação para o aumento da capacidade produtiva e melhora na

qualificação da mão de obra. Estes movimentos promoveram a formação

de uma base industrial, o aumento na renda per capita, o aumento dos

13 Segue o trecho original: In the late 1970s China accounted for little of

the world’s industrial production and less than 1 percent of its trade. By the end

of 2014 it was the world’s leading manufacturing nation, and its biggest

exporter, accounting for 12 percent of global exports and 18 percent of

manufactured exports”.

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67

índices de urbanização e consequentemente uma maior base de consumo

e um lento, porém constante aumento da demanda agregada no país

(KROEBER, 2016).

Neste período foram empregadas baixas taxas de juros, visando

evitar a criação de uma classe rentista que capturasse os lucros advindos

do crescimento econômico. A taxa de câmbio foi mantida artificialmente

desvalorizada para tornar as exportações do país mais competitivas no

mercado global. O controle de capitais foi uma política essencial de

modo a evitar que indivíduos e empresas de maior renda investissem no

exterior, mantendo inicialmente as cadeias produtivas no âmbito

doméstico (KROEBER, 2016). Isto ocorreu concomitantemente à

descentralização da base produtiva dos países desenvolvidos, ocasionada

pelo regime de acumulação flexível pós-fordista oriundo dos países do

centro do capitalismo global (HARVEY, 1996).

A mudança de uma indústria pesada, intensiva no uso de capital,

oriunda da China comunista, para uma indústria leve, intensiva no uso

de mão de obra foi uma importante mudança que se desenvolveu a partir

das reformas de Deng Xiaoping (ARRIGHI, 2009). Isto possibilitou o

aumento gradual da complexidade econômica da China, à medida que

aumentava a qualificação da mão de obra e os lucros do comércio eram

reinvestidos em capacidade produtiva. Portanto, o foco na produção e

exportação de bens industriais gerava a renda necessária para

investimentos em infraestrutura e para a compra de bens de capital e

máquinas. Gradualmente foi realizada a reforma do sistema de preços,

de modo a promover o caminho para o estabelecimento de uma

economia de mercado, com preços variando conforme a oferta e

demanda (KROEBER, 2016).

A partir do crescimento econômico da China aumenta a sua

emissão de investimentos. O investimento estrangeiro direto (IED)

realizado por empresas chinesas se destina aos mercados em

desenvolvimento para a obtenção de recursos naturais e aos mercados

desenvolvidos visando adquirir tecnologia, sendo crescentemente

composto por fusões e aquisições. Desde o ano de 1992 a China enfatiza

a necessidade de expansão do investimento de suas empresas estatais em

outros mercados, conforme enfatizado pelo 14º Congresso do partido

Comunista. Entretanto este movimento de intensificou a partir da estratégia Going Global, sendo que o 16º Congresso do Partido

Comunista (2002) enfatiza ainda mais este aspecto (YEH e

WHARTON, 2016).

O IED se diferencia de investimentos de portfólio pelo fato de

que ele provê o controle sobre determinada empresa, ou compreende a

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68

aquisição de ações que concedam influência substancial sobre os rumos

e decisões gerenciais. A aquisição de ações que concedam 10% das

decisões de voto em uma empresa são o mínimo necessário para que

determinada transação seja considerada um IED. Adicionalmente, os

investimentos desta categoria podem se caracterizar pela formação de

joint ventures com empresas estrangeiras. Este processo consiste em

uma aliança estratégica entre duas empresas promovendo a cooperação

comercial, por vezes havendo transferência de tecnologia. Associações

deste tipo podem ser estabelecidas visando ganhos de eficiência

relacionados à escala e geralmente possuem um tempo delimitado. As

joint ventures podem ainda servir para acessar novos mercados havendo

a divisão do risco deste empreendimento, ou simplesmente promovendo

a cooperação técnica, troca de expertise e aprendizado acerca de

processos gerenciais (OCDE, 2014).

O aumento dos fluxos de comércio e finanças propiciados pelo

adensamento dos processos de globalização a partir dos anos 1980

engendrou maiores conexões entre as diversas economias nacionais. O

investimento estrangeiro direto corresponde a uma importante dimensão

deste processo. Conceitualmente, o investimento estrangeiro direto se

destina ao estabelecimento de operações de negócios em outros países.

O IED pode ser caracterizado ainda pelo estabelecimento de instalações

e filiais no exterior, ou ainda pelo processo de fusão e aquisição de

empresas sediadas em outros países (IETTO-GILLIES, 2010).

No que diz respeito à evolução quantitativa da emissão dos

investimentos chineses para o mundo, observa-se que no ano de 2005 a

China emitiu US$ 12.261 bilhões em investimentos externos diretos,

sendo que atualmente, a China é o segundo maior exportador de

investimentos estrangeiros diretos no mundo, tendo contabilizado o

montante de US$ 183 bilhões aportados em 2016, estando atrás apenas

dos Estados Unidos (UNCTAD, 2017). Esta evolução corresponde ao

aumento da inserção das empresas do país nos mais diversos mercados

nacionais.

O número de empresas chinesas realizando investimentos no

exterior passou de 2.859 no ano 2000, marco inicial da estratégia Going

Global, para mais de 16.000 empresas no ano de 2010. Adicionalmente,

a China já realizou investimentos estrangeiros diretos em 174 países (CHANGHONG e WEN, 2015, p. 8-9). Complementando os fluxos de

IED, instituições nacionais como o Banco de Desenvolvimento da China

(BDC) e o Banco de Exportações e Importações da China

(EXIMBANK) emitiram um adicional de US$ 100 bilhões no ano de

2016. A atuação dos bancos públicos do país provê empréstimos

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69

visando o financiamento de projetos de infraestrutura ou capital

destinado à compra de máquinas de origem chinesa (BROOKINGS,

2017).

Existem duas tendências no que diz respeito ao IED da China: 1)

se direciona a grandes mercados, ou seja, Estados populosos com

estruturas econômicas relativamente desenvolvidas; 2) que se direcione

a países ricos em recursos naturais e energéticos. Em relação ao seu

perfil, os investidores chineses possuem maior tolerância ao risco do que

os investidores provenientes dos países desenvolvidos do centro do

capitalismo global e não costumam ver as diferenças nos regimes

políticos como um elemento relevante para a tomada de decisão acerca

do seu direcionamento (BROOKINGS B, 2017).

Dividem-se em três fases os fluxos de emissão de investimentos

diretos da China: 1) 1979-1989, o período de início da abertura, mas que

ainda apresentava intenso controle estatal; 2) o período de 1990-1999 no

qual a China passava por uma transição na regulação econômica interna;

3) o período de 2000-2016 que correspondeu à entrada do país na OMC

e ao início da estratégia Going Global; no qual a emissão de

investimentos da China cresceu e se diversificou. Na próxima subseção

abordaremos a Política de Portas Abertas, empreendida durante o

mandato de Deng Xiaoping, que simboliza o início do processo de

abertura, recepção e emissão de investimentos da China para o mundo.

3.2.1 A Política de Portas Abertas (1979-1989)

A primeira fase dos investimentos estrangeiros diretos da china se

situa entre os anos de 1979-1989, lançada através da Política de Portas

Abertas de Deng Xiaoping. Durante a década de 1970 a economia

chinesa apresentava crescentes dificuldades na condução de sua

economia planificada, ligadas a questões tecnológicas. A recepção de

investimentos estrangeiros diretos, aliada à mobilização de recursos

domésticos foram fatores relevantes para as reformas da economia

chinesa no final da década de 1970 e na década de 1980. Em 1978 o

Conselho de Estado da China permitiu que as empresas do país

estabelecessem subsidiárias no exterior, de modo a ter maior contato

com tecnologias e sistemas econômicos externos, além de promover a imagem da China como um país que caminhava rumo à abertura

(KROEBER, 2016).

Foram estabelecidas Zonas Econômicas Especiais (ZEEs),

inicialmente na costa Leste, em Shenzhen, Zhuhai, Shantou (localizada

na província de Cantão) e em Xiamen (localizada na província de

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70

Fujian). Posteriormente outras ZEEs foram estabelecidas no território

chinês. Este consistiu no arcabouço institucional inicial que permitiu a

entrada de empresas estrangeiras visando estimular o comércio, a

recepção e a emissão de investimentos estrangeiros diretos (SHUJIE e

PAN, 2014).

No ano de 1982 foi estabelecido o Ministério de Comércio

Exterior e Cooperação Econômica (MOFTEC, na sigla em inglês),

retirando do conselho de Estado a atribuição de aprovar os

investimentos chineses realizados no exterior. O órgão teve importante

ação no sentido de padronizar os processos e práticas de emissão de

investimento estrangeiro direto do país. Neste período a maior parte das

empresas chinesas que se internacionalizaram foram empresas estatais,

visto que as médias e pequenas empresas serviam para o abastecimento

do mercado local e ainda apresentavam baixo grau de diversificação

industrial (FANG, 2015).

Visto que a demanda doméstica excedia a oferta de produtos e

que a acumulação de capital do país no período era baixa, o grau de

internacionalização de suas empresas era igualmente baixo. Os

investimentos da China no exterior foram em sua grande maioria

realizadas através do estabelecimento de entrepostos comerciais e

escritórios de representação (YEH e WHARTON, 2016).

Os setores de mineração e agricultura concentraram a maior parte

da destinação setorial dos investimentos externos da China no período

de 1979-1984. Já no quinquênio 1985-1989, os investimentos se

destinaram para as áreas de processamento e manufaturas básicas, e, em

menor escala, para os setores de comércio, finanças e turismo. Além de

destinos tradicionais tais como os EUA, Macau, Hong Kong, Europa e

Japão, a China começa, ainda que em menor escala, a investir em outros

países da Ásia e igualmente na África e na América Latina. No ano de

1979 apenas quatro empresas chinesas realizavam investimentos no

exterior, número que passou para 645 empresas emitindo investimentos

estrangeiros diretos ao final do ano de 1989 (CHANGHONG e WEN,

2015, p. 23).

3.2.2 O Período de 1990-1999

A segunda fase dos investimentos chineses corresponde ao

período de 1990-1999, quando se realizou um esforço de transição para

as regras de mercado visando maior adequação aos padrões

internacionais. A década de 1990 foi o período de aprofundamento das

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71

reformas do país e aumento da participação da China em organismos

multilaterais.

O ano de 1992 é emblemático para o processo de

internacionalização da China. A viagem de Deng Xiaoping para o sul do

país foi um momento no qual o líder realizou uma série de discursos

visando estabelecer as diretrizes para a continuidade do processo de

abertura e desenvolvimento econômico da China. Neste mesmo ano,

ocorreu o 14º Congresso Nacional do Partido Comunista, enfatizando a

necessidade de modernização e do aproveitamento das oportunidades da

economia global para o desenvolvimento. Enfatiza-se a necessidade de

aumentar a emissão de investimentos por parte das empresas chinesas

(CHANGHONG e WEN, 2015).

No plano institucional, documentos oficiais emitidos por diversas

agências do Conselho de Estado da China nesse período auxiliaram no

sentido de padronizar as normas e os procedimentos de emissão de

investimentos, enfatizando a questão de financiamento externo,

reformas na gestão financeiras das empresas estatais e administração de

reservas em moeda estrangeira. O Estado chinês entendia que era

necessário diversificar os mercados nos quais as empresas chinesas

estavam inseridas, o que implicava igualmente no aumento dos fluxos

de comércio da China com o mundo, além de um esforço diplomático no

sentido de apoiar a expansão global destas empresas (FANG, 2015).

Aumenta neste período o número de empresas chinesas

estabelecendo joint ventures no exterior, ao invés de investir na entrada

em novos mercados apenas pelo estabelecimento de entrepostos

comerciais e escritórios de representação, como fora predominantemente

o caso nos anos 1980. O 15º Congresso Nacional do Partido Comunista

de 1997 enfatizou a necessidade de melhor utilização dos recursos

domésticos da China, de modo a promover a sua projeção global,

visando ao aproveitamento das vantagens competitivas do país de modo

a aumentar os seus investimentos em áreas estratégicas para o seu

processo de desenvolvimento (SHUJIE e PAN, 2014).

Havia a percepção de que o apoio governamental era essencial

para que a China conseguisse se inserir em regiões como a África, a

América Latina, o Oriente Médio e a Ásia Central, locais nos quais as

suas empresas ainda não possuíam presença significativa. A vontade política no âmbito doméstico, a necessidade de obtenção de recursos

naturais e o planejamento do país foram fatores decisivos para

impulsionar a internacionalização da China nos anos 1990. O ano de

1990 registrou 801 empresas chinesas realizando investimentos diretos

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72

no exterior, ao passo que o ano de 1999 demonstrou o aumento deste

número para 2.616 empresas (CHANGHONG e WEN, 2015, p. 6).

No que diz respeito à diversificação das relações externas da

China, desde 1990, as suas atividades diplomáticas enfatizaram de

forma crescente a importância do multilateralismo. No entanto, esta

tendência se exacerbou a partir de 2001, quando a República Popular da

China logrou seu ingresso na OMC. De acordo com Chung-Chian

(2007), as autoridades chinesas começam a se empenhar ativamente em

organizações sub-regionais, regionais e globais e os motivos que

explicam tal mudança dizem respeito à visão chinesa de uma possível

reestruturação da ordem internacional no contexto do pós-Guerra Fria e

da emergência da multipolaridade nos anos 200014:

De acordo com as declarações oficiais da China, a

ordem mundial tem as seguintes características: o

sistema bipolar está desgastado; um sistema

multipolar está emergindo; as interações entre as

Grandes Potências são intensas; e as organizações

internacionais regionais e globais desempenham

um papel cada vez mais importante. A China vê o

desenvolvimento de um sistema multipolar como

uma contribuição para a paz, estabilidade e

prosperidade a nível global, e as organizações

internacionais podem contribuir para a

emergência de tal sistema (CHUAN-CHIAN,

2007, p. 98, tradução nossa).

Nesta conjuntura a China demonstrava a sua percepção de que os

países emergentes poderiam ocupar um papel mais importante no

ordenamento global. Adicionalmente, a China pensava que o seu próprio

processo de desenvolvimento estava atrelado ao crescimento do restante

dos países emergentes, enfatizando um pensamento focado na

coletividade, ainda que com fundamentos e razões pragmáticas

(CARLETTI, 2013).

14 Segue trecho original: “According to official Chinese statements, the

world order has the following characteristics: the bipolar system is eroding; a

multipolar system is emerging; Great Power interaction is intense; and regional

and global international organizations play na increasingly important role.

China sees the development of a multipolar system as contributing to global

peace, stability and prosperity, and international organizations can contribute

to the emergence of such a system”.

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73

No ano de 1999 a emissão de investimentos chineses já alcançava

quase 100 países, ao passo que nos anos 1980 os seus investimentos

alcançavam apenas 45 Estados e demonstravam uma grande

concentração em Hong Kong, Macau, a Europa Ocidental, os Estados

Unidos e os países da região do sudeste asiático (CHANGHONG e

WEN, 2015, p. 27). Por fim, a próxima subseção abordará a estratégia

Going Global que demarca os investimentos chineses no século XXI,

período no qual se insere a Belt and Road Initiative.

3.2.3 O Período de 2000-2016: A Estratégia Going Global

A estratégia Going Global surgiu através do 10º Plano

Quinquenal correspondente ao período 2001-2005, sendo que a sua

deliberação previa a continuidade desta estratégia nos próximos planos

quinquenais. O seu principal objetivo era a internacionalização de

empresas chinesas que fossem competitivas, de modo a propiciar o

aumento das exportações de produtos e serviços do país. A formulação

do 11º Plano Quinquenal correspondente ao período 2006-2010

menciona o aprofundamento da estratégia, enfatizando o aspecto de

promoção de relações econômicas com benefícios para ambas as partes

(win-win). O 11º Plano enfatiza ainda a necessidade de adoção e

adaptação aos princípios do ordenamento internacional e que a

promoção do desenvolvimento deve ser o norte da economia chinesa

(CENTRAL PEOPLE'S GOVERNMENT OF THE PEOPLE'S

REPUBLIC OF CHINA, 2006).

No que diz respeito ao aspecto institucional, no ano de 2004 o

MOFCOM publicou novos estudos acerca da internacionalização das

empresas chinesas e foram estabelecidos mecanismos de incentivo

fiscais específicos para aquelas que desejassem realizar investimentos

estrangeiros diretos no exterior, através da padronização da ação do

China EXIMBANK. No que diz respeito ao aspecto qualitativo, a

década de 2000-2010 registrou o amadurecimento da

internacionalização da China, ao passo que as empresas do país

aumentaram a sua capacidade gerencial e consolidaram efetivamente o

seu perfil transnacional. As estratégias de entrada em outros mercados

também evoluíram ao passo que os seus investimentos passam abarcar, além de joint ventures, as fusões e aquisições, o capital de risco, o

licenciamento de tecnologia, contratos de outsourcing e investimento

greenfield, que corresponde à instalação de novas filiais de uma empresa

partindo do zero em todos os seus processos operacionais

(CHANGHONG e WEN, 2015).

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74

A tabela a seguir demonstra a evolução quantitativa da emissão

de investimentos estrangeiros diretos da China desde o período

imediatamente posterior a sua abertura e reformas:

Tabela 3: Emissão de investimentos estrangeiros diretos da

China, em milhões de dólares, atualizados para valores atuais.

Ano Fluxo de Emissão de

IED

Estoque acumulado

de IED

1982 44 44

1983 93 137

1984 134 274

1985 629 903

1986 450 1.353

1987 645 1.998

1988 850 2.848

1989 780 3.628

1990 830 4.458

1991 913 5.371

1992 4.000 9.371

1993 4.400 13.771

1994 2.000 15.771

1995 2.000 17.771

1996 2.114 19.885

1997 2.562 22.447

1998 2.634 25.081

1999 1.774 26.855

2000 916 27.771

2001 6.885 34.656

2002 2.518 37.174

2003 2.855 40.029

2004 5.498 45.527

2005 12.261 57.788

2006 17.634 75.422

2007 26.506 101.928

2008 55.907 157.835

2009 56.529 214.364

2010 68.811 283.175

2011 74.654 357.829

2012 87.804 445.633

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75

2013 107.844 553.477

2014 123.120 676.597

2015 127.560 804.157

2016 187.100 987.257

Fonte: Elaboração do autor, com dados provenientes de UNCTAD

STAT (2017).

Verificou-se um substancial aumento no estoque de investimento

estrangeiro direto emitido pela China, que passou de US$ 27.7 bilhões

no ano 2000, correspondendo ao lançamento da estratégia Going

Global, para US$ 987.2 bilhões no ano de 2016. Adicionalmente,

Weidong e Dunford (2016, p. 331) afirmam que no ano de 2014, 68%

do estoque de IED da China se destinava para a Ásia. Os autores

demonstram igualmente que neste mesmo ano, 87% do estoque de IED

emitido pela China concentrava-se nos seguintes setores: serviços

empresariais e financeiros; mineração; atacado e varejo; manufaturas

industriais; transporte; serviços postais e de armazenamento.

No ano de 2016 o país representou 7.5% do total global no que

diz respeito à recepção de investimentos estrangeiros diretos e 12.6% do

total global de emissão de investimento estrangeiro direto (UNCTAD

STAT, 2017). A projeção global dos investimentos chineses é fruto das

reformas e da abertura de sua economia doméstica e está intimamente

ligada às elevadas taxas de crescimento do país. Entretanto, isto não

implica dizer que a deliberação da estratégia Going Global é um mero

reflexo das mudanças domésticas do país. Esta é uma estratégia advinda

de vontade política consciente, expressa através dos planos quinquenais,

simbolizando um dos eixos da estratégia rumo ao reestabelecimento da

posição da China como um dos grandes atores no sistema internacional

(SHUJIE e PAN, 2014).

As reservas internacionais do país cresceram de um valor quase

insignificante em 1979 para US$ 3.14 trilhões em 2017 (REUTERS C,

2018). Estes recursos são resultados das receitas comerciais e da

projeção global da economia chinesa. O estabelecimento e a aquisição

de centros de pesquisa e desenvolvimento no exterior é outra parte

importante de sua estratégia. A coesão nacional e institucional

consolidada pelo Partido Comunista aporta uma característica marcante do capitalismo chinês que é capaz de articular a projeção global de suas

empresas estatais, permitindo a busca por interesses estratégicos do

Estado através da ação de suas empresas e não apenas pelas vias

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76

políticas (SHUJIE e PAN, 2014, p. 1; BLACKWILL e HARRIS, 2016;

JULAN e YIFEI, 2018).

Um exemplo disto consiste nos investimentos visando o acesso a

mercados que possam suprir o aporte de recursos naturais e energéticos

que são necessários para a manutenção do ritmo de desenvolvimento da

economia chinesa no longo prazo. Isto nos remete ao conceito da

geoeconomia, abordado no primeiro capítulo do presente trabalho,

demonstrando como a China projeta sua influência nos mais diversos

tabuleiros regionais através de suas finanças (BLACKWILL e HARRIS,

2016).

As reservas internacionais acumuladas pelo país possibilitam a

intensificação do eixo Going Global, que possui características de uma

estratégia geoeconômica. Os principais fatores determinantes para a

escolha dos investimentos chineses são a possibilidade de um aporte de

recursos naturais e a aquisição de tecnologia. Conforme afirmam Shujie

e Pan (2014)15:

“A aquisição da IBM PC Business; a aquisição da

Volvo pela Geely, uma das maiores fabricantes de

carros da China, o estabelecimento de um centro

de pesquisa e desenvolvimento no Nottingham

Science Park através da Changan Auto (empresa

estatal), uma das quatro maiores fabricantes de

carros na China, demonstram que a China está

interessada na aquisição de tecnologia avançada

proveniente dos países desenvolvidos” (p. 6,

tradução nossa).

O movimento da empresa estatal ChemChina no sentido de

adquirir 94.7% das ações da empresa transnacional suíça do ramo de

biotecnologia e agricultura Syngenta, demonstra a combinação dos

fatores mencionados acima para a alocação de investimentos da China:

adquirir tecnologia aliada à possibilidade de extensão do aporte de

recursos naturais. A aquisição foi concluída em junho de 2017, com um

valor estimado de US$ 43 bilhões (XINHUA NET, 2017).

15 Segue o trecho original: “The acquisition of the IBM PC business; the

take-over of Volvo by Geely, one of the largest private auto makers in China;

and the establishment of an R&D centre in the Nottingham Science Park by

Chang An Auto, one of the four largest state-owned auto makers in China,

imply that China is interested in acquiring advanced technology in developed

countries’.

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77

Por fim, é possível afirmar que a continuidade da projeção global

da economia chinesa depende da capacidade do Partido Comunista de

estender os benefícios do desenvolvimento econômico para o conjunto

de sua população, fator que fundamenta a estabilidade do regime. A

coesão nacional acerca do capitalismo de Estado na China é um

elemento vital para a manutenção do poder do PCC, que por sua vez

suscita a continuidade de sua grande estratégia (ROLLAND, 2017).

No próximo capítulo trataremos especificamente acerca da Nova

Rota da Seda ("Belt and Road Initiative") que é fundamentada pela

visão e cultura milenar que a China possui acerca da sua própria posição

no sistema internacional. Mais do que isto, a BRI se apresenta como a

principal iniciativa de política externa do Governo Xi Jinping e

simboliza a atuação geoestratégica da China em uma região tão

relevante para a geopolítica global como a Eurásia, seja no que diz

respeito aos recursos energéticos disponíveis, seja no que diz respeito à

extensão territorial e possibilidade de projeção de poder para outros

territórios. A BRI se consolida através da atuação geoeconômica da

China, visto que a estratégia será executada através do aporte de

recursos financeiros e de investimentos.

Pontualmente, o terceiro capítulo se divide em duas seções, sendo

que a primeira trata acerca da Antiga Rota da Seda, visando

contextualizar o seu processo histórico de formação, alcance, apogeu e

declínio, compreendidos através da longa duração dos processos

históricos. A segunda seção compreende a Belt and Road Initiative,

apresentando os seus aspectos gerais e os desenvolvimentos ao longo

dos seis eixos econômicos anunciados pela China.

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79

4 A NOVA ROTA DA SEDA: ENTRE A TRADIÇÃO

HISTÓRICA E O PROJETO GEOESTRATÉGICO PARA O

FUTURO

A Belt and Road Initiative é um projeto que demonstra o

aprofundamento da inserção externa da China, sendo anunciada como

uma iniciativa que estimule a construção de um modelo de governança

global rumo à multipolaridade. A China enfatiza uma visão de ordem

internacional que respeite a soberania, as diferenças dos seus integrantes

e que seja guiada por preceitos de cooperação para o desenvolvimento e

ganhos mútuos. Esta é a principal iniciativa de política externa do

governo Xi Jinping e resulta em uma visão estratégica para a integração

da Eurásia (FERDINAND, 2016).

O presidente Xi Jinping visa promover a visão de uma ordem

global com a China liderando certos espaços, sem tentar substituir a

ordem estabelecida pelos Estados Unidos, mas procurando realizar

reformas, sempre que houver conjunturas nas quais isto pareça ser

possível. Neste sentido, a BRI tem um caráter complementar em relação

à ordem atual. Para os interesses chineses, é melhor manter a iniciativa

sob o sistema global de defesa dos EUA e a partir desta base expandir

suas oportunidades econômicas e estratégicas (JI, 2015; SARVÁRI,

SZEIDOVICZ, 2016).

A antiga Rota da Seda era um processo orgânico impulsionado

pela demanda de seda e especiarias produzidas pela China. Ou seja, a

China possuía mercadorias e produtos desejados pelas demais unidades

políticas do sistema mundial da época. Este fato levou ao

estabelecimento e à progressão de rotas comerciais, que, por sua vez,

produziram efeitos dinâmicos de disseminação de tecnologia e cultura

(LIU, 2010).

A Nova Rota da Seda tem a característica de ser um processo

conduzido pela oferta, ao passo que a China oferece crédito e

cooperação para a construção de obras de infraestrutura nos países da

Eurásia. Portanto, a BRI depende da aquiescência e da cooperação dos

demais Estados ao longo de suas rotas, o que deverá ser um desafio para

a capacidade de cooptação e de projeção de influência da China

(SARVÁRI, SZEIDOVICZ, 2016). A próxima seção apresentará a perspectiva histórica acerca da

formação, alcance, apogeu e declínio da antiga Rota da Seda, de modo a

contextualizar a referência histórica imbuída pela China no projeto da

Belt and Road Initiative.

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80

4.1 A PERSPECTIVA HISTÓRICA: A ANTIGA ROTA DA SEDA:

Antes da Europa ter sido considerada o pivô geográfico da

humanidade, o eixo eurasiático já representava uma rica fonte de

cultura, inovações e diferentes formas de organização da vida social e

econômica. Estabelecida durante a dinastia Han, no antigo Império

chinês, a Rota da Seda é o exemplo mais emblemático dos intercâmbios

materiais e ideológico-culturais que marcaram a história da Eurásia na

antiguidade. Não obstante, cabe mencionar que o notório nome desse

sistema foi atribuído pelo Barão Ferdinando von Richthofen em 1877,

designando esta rica variedade de rotas comerciais que foram

estabelecidas pelos diferentes povos da região, e que duraram

aproximadamente de 130 a.C. até 1453 d.C., momento no qual o

Império Otomano fechou as rotas comerciais terrestres que ligavam a

Europa até o extremo Oriente (FRANKOPAN, 2015).

Os mapas abaixo delineiam os diversos trajetos ao longo da Rota

da Seda:

Figura 2: Mapa expandido da Rota da Seda.

Fonte: Ancient History Encyclopedia (2017).

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81

Figura 3 Mapa da Rota da Seda com foco na China.

Fonte: Encyclopedia Britannica (2017).

Portanto, a Rota da Seda não era um eixo unificado, como a sua

nomenclatura contemporânea parece sugerir, mas consistia em um

emaranhado de rotas, caminhos e diferentes trechos de circulação entre

as sociedades da Eurásia (HANSEN, 2012). A civilização eurasiática

fora, desde o período neolítico, dividida em duas matrizes distintas. Os

povos que se dedicaram ao cultivo sedentário e ao estabelecimento de

fazendas ao sul e os povos nômades das estepes da Ásia Central, que se

dedicavam sobretudo a pecuária e atividades relacionadas. Salienta-se a

ocorrência de conflitos intermitentes entre os povos representados por

estas diferentes formas de organização social (COHEN, 2015).

Foi em torno do período de 600-400 a.C., que o costume de

domesticação de cavalos começa a se espalhar pela Eurásia e a sua

consequente utilização para a promoção de comércio e de para

atividades militares levaria ao início da Rota da Seda. Os povos

nômades da Ásia Central saqueavam os vilarejos e fazendas do que seria

atualmente a parte norte da China, em busca de alimentos e da seda, um

produto considerado de grande valor na região das estepes. A principal

razão para a demanda de seda por parte dos povos nômades consistia no

prestígio e na diferenciação social aportada por estas vestimentas em

relação ao povo em geral. O comércio de seda envolvia sobretudo as

elites dos povos nômades, e diferenciava os chefes militares em relação

ao restante da população (LIU, 2010).

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82

Após sucessivas invasões, os estados agricultores do que viria a

ser o Império Chinês começaram a se adaptar e a imitar o estilo militar

dos povos das estepes, incluindo o uso do arco e flecha. Posteriormente,

percebeu-se que era necessário igualmente que as sociedades do Rio

Amarelo e do Rio Yangtzé dominassem a criação e domesticação de

cavalos. As planícies da Ásia Central tinham condições muito melhores

para a criação de equinos e as sociedades do que viria a ser o Império

Chinês acabavam exportando grandes quantidades de seda para os povos

nômades em troca de cavalos e também com o objetivo de apaziguar os

potenciais invasores, no que veio a ser denominado como diplomacia da

seda. A diplomacia matrimonial era outra importante instituição da

época, oferecendo o casamento de princesas aos chefes nômades das

estepes como forma de dissuasão de conflitos (LIU, 2010, p. 4-7).

Esta contextualização histórica explica a construção da Grande

Muralha da China, devido à necessidade de defesa em relação às

invasões nômades. Diversas partes da muralha foram construídas em

períodos históricos diferentes e sua unificação ocorreu na dinastia Qin

(221-207 a.C.), por volta de 200 a.C. (LOURIDO, 2006). Conforme

mencionado no segundo capítulo desta dissertação, foi na dinastia Qin

que ocorreu a unificação do Império do Meio, após séculos de guerras

entre os diferentes estados chineses.

A dinastia Qin vivera um período muito conturbado, incluindo

conflitos com o exterior e revoltas internas, sendo sucedida pela dinastia

Han (206 a.C-220 d.C.). Os primeiros 60 anos da Dinastia Han foram de

consolidação de sua estabilidade interna e de exercício da diplomacia da

seda com os povos da Ásia Central, de modo a evitar conflitos externos

que pudessem ter um impacto negativo sobre a estruturação do seu

aparato econômico e social. A partir da consolidação doméstica, a China

conseguiria modificar as suas relações com os povos vizinhos (LIU,

2010). O mapa abaixo sintetiza os domínios territoriais possuídos pela

China no período anterior e após a sua unificação sob a dinastia Qin:

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83

Figura 4: Dinastias da China no período de 1500 a.C - 220 d.C.

Fonte: Ancient Chinese Dynasties (2017).

Zhang Qian é considerado como o primeiro comerciante e

explorador da Rota da Seda. Oriundo da China, o mercador viveu por

volta de 130 a.C. tendo viajado por treze anos rumo ao oeste do Império

e adentrado na Ásia Central. O comerciante trouxe relatos importantes

acerca do modo de vida e da cultura dos povos desta região, tendo

ficado surpreso com os produtos de origem indiana que encontrara em

Bactra, uma cidade de considerável desenvolvimento para a época,

localizada no atual Afeganistão. A partir disto, Zhang Qian passou a

buscar uma rota que conectasse a China à Índia, tendo em vista que o

caminho então conhecido passava pelo território dos povos nômades,

apresentando riscos de segurança para o comércio (HANSEN, 2012).

Após décadas de intermitentes períodos de paz e conflitos entre

os exércitos da dinastia Han (206 a.C-220 d.C.) e os povos nômades,

foram estabelecidas rotas comerciais rumo ao oeste. Para isto, foi

necessária a criação de diversas guarnições ao longo da Grande Muralha

da China. Lentamente novos bens foram adentrando o território,

incluindo pedras preciosas, especiarias e produtos têxteis provenientes

da Índia. Em seu ápice, a cidade de Chang'an (hoje denominada de

Xian) era o início da Rota da Seda em sua dimensão terrestre, chegando

até Constantinopla (Istambul) a quase 7000 km de distância. A cidade

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de Chang'an foi a capital da China durante diversas dinastias

(LOURIDO, 2006).

Com estes primeiros contatos, os chineses foram percebendo o

valor que a seda tinha para os povos exteriores, sendo que era um

produto comum no seu próprio território. A partir disto, o governo passa

a estimular a criação de oficinas de modo a produzir trabalhos mais

elaborados com a seda, tais como tapeçarias e vestuário de luxo com

maiores variedades de cores. Estes produtos exigiam conhecimento

técnico e mesmo aspectos de divisão do trabalho para que pudessem ser

produzidos em maior escala (LIU, 2010).

A partir da dinastia Han houve algum esforço no sentido de

regular as rotas comerciais existentes, sobretudo no território chinês.

Para isto foram criados diversos entrepostos, além do estabelecimento

de um corpo funcional que reconhecia três tipos de meios de pagamento

para o comércio regional: moedas de cobre, grãos e seda. Devido às

grandes dificuldades impostas pelo relevo e pelo clima, as viagens a

longo da Rota da Seda eram muito lentas. O território autônomo de

Xinjiang, na China, foi uma das mais ricas fontes de materiais históricos

acerca da Rota. As primeiras moedas estrangeiras evidenciando a

remuneração do comércio que foram encontradas na China datam de

530-540 d.C. e são provenientes do Império Sassânida (224-651 d.C.),

que ocupava grosso modo o território do Irã e partes do Império

Bizantino (395-1453 d.C.) (HANSEN, 2012, p. 19-21).

Em suma, as relações entre a China e a Ásia Central alternavam

entre períodos de conflito militar e de intensificação do comércio.

Lentamente a seda chinesa foi ganhando notoriedade e o seu valor

comercial foi crescendo. A Rota da Seda foi sendo constituída de forma

lenta, orgânica, não sistematizada, se estendendo através de séculos e

composta de uma variedade de rotas terrestres e marítimas que viriam a

conectar a China até o Mediterrâneo. A medida que a Rota ia se

consolidando, novas comunidades foram se estabelecendo e as

caravanas acabaram se proliferando (FRANKOPAN, 2015).

Por sua vez, o Império chinês começa uma iniciativa de

estabelecimento de guarnições militares, combinadas com plantações

agrícolas nas fronteiras do seu território, de modo a assegurar o

comércio ao longo da Rota da Seda. A criação destes oásis era realizada através do duplo papel dos seus oficiais, que compreendia atividades

militares e agrícolas. O pagamento dos seus soldos era frequentemente

realizado com a seda, que podia ser usada como meio de troca no

Império. Lentamente estes oásis foram crescendo, sendo beneficiados

pelos sistemas de irrigação que foram se desenvolvendo ao longo do

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território chinês, e tornando-se novas cidades que passaram a dar

suporte e depender economicamente do comércio das caravanas ao

longo das rotas. As cidades-estados ao longo da Rota da Seda foram se

tornando crescentemente autônomas com o passar do tempo e, por esta

razão, os períodos de instabilidade e revoltas internas do Império não

causaram o fim da Rota, conforme assinala Liu16:

"os estados oásis amadureceram tornando-se

cidades de caravanas estáveis e independentes.

Com recursos agrícolas confiáveis, eles olhavam

para caravanas visando a sua prosperidade e se

desenvolveram em belos centros urbanos. A

maioria deles permaneceram como centros de

atividades comerciais e culturais durante muitos

séculos” (Liu (2010, p. 14).

Não se pode afirmar que houvesse uma única potência que

possuísse uma relação de propriedade sobre a Rota da Seda. Não

obstante, a estabilidade do Império Chinês era essencial para a mesma,

tanto no que diz respeito ao suporte dos oásis e das estruturas que

garantissem a sua continuidade, quanto no que diz respeito à produção

da própria seda e seus produtos derivados. Entretanto, houve períodos

nos quais outras unidades políticas detiveram maior influência sobre a

Rota. Um exemplo disto consiste no período de aproximadamente

100.d.C. a 300 d.C., quando o Império Kushan, localizado no atual

território da Índia, dominara o comércio ao longo da Rota da Seda, razão

que explica a disseminação do Budismo pela China, que acabou por

ganhar grande popularidade (HANSEN, 2012).

Além das caravanas e do comércio em geral, existia grande

movimento de peregrinos e grupos religiosos através da Rota. As

representações gráficas, mapas, obras de arte foram alguns dos materiais

utilizados pelos historiadores para que se pudesse criar uma narrativa

acerca do modo de vida das civilizações da Eurásia antiga. A difusão

cultural e de informações na Rota da Seda dependia de embaixadores e

oficiais administrativos, mas sobretudo de mercadores, artistas e

peregrinos religiosos. Ao retornar de suas viagens estas pessoas

16 Segue o trecho original: “the oasis states matured into stable,

independent caravan cities. With reliable agricultural resources, they looked to

caravans for their prosperity and developed into beautiful urban centers. Most

of them remained hubs of commercial and cultural activities for many

centuries”.

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procuravam criar uma representação das experiências e diversas

sociedades que visitavam. A cultura chinesa, por exemplo, era difundida

ao longo da Rota juntamente com a sua seda e outras especiarias que

eram comercializadas (FORET e KAPLONY, 2008).

Os viajantes levavam consigo imagens transmitidas em blocos de

madeira, e igualmente a versão destas imagens em textos expressos nos

caracteres da língua chinesa. Ao retornar de suas viagens, seja através

do território que viria a ser a Índia, através das estepes da Ásia Central e

mesmo até os povos do Oriente Médio, retornavam com as versões

imagéticas e com a sua tradução na língua dos povos estrangeiros. Este

lento método de transmissão de informações pôde dar origem a alguma

forma de comunicação entre as diferentes matrizes civilizacionais de

uma forma não sistemática e que se desenvolveu ao longo de séculos

(FORET e KAPLONY, 2008).

Hansen (2012) argumenta que o comércio ocupava uma pequena

parcela das atividades econômicas desenvolvidas pelos povos da

Eurásia, sendo que a maior parte da população das diferentes

civilizações da Antiguidade estavam dedicadas à agricultura. As guerras

e diferentes conflitos civis e militares produziam refugiados que

migravam para os diferentes impérios ao longo da Rota. Estas migrações

forçadas e os refugiados ocuparam um importante papel na transmissão

de conhecimento e na difusão cultural (HANSEN, 2012).

Neste sentido, Hansen (2012) argumenta que a circulação de

pessoas, ideias, tecnologias, arte e outros elementos culturais foi o

aspecto mais relevante da Rota da Seda. Isto estaria encapsulado no

espírito da Rota da Seda enquanto sistema de intercâmbios não apenas

entre diferentes sociedades, mas igualmente entre representações

culturais, diferentes ideologias e diversas formas de organização da vida

social. Não obstante, este sistema era extremamente desigual, sendo que

as grandes cidades eram o foco dos intercâmbios. Enfatiza-se o caráter

multicultural dos fluxos de viajantes, compostos por cristãos, islâmicos,

budistas, pessoas adeptas do zoroastrismo e aqueles que praticavam a

filosofia confuciana (HANSEN, 2012).

Vaissière (2013) corrobora a análise de que os vínculos culturais

e político-diplomáticos foram muito importantes, visto que as evidências

disponíveis não permitem afirmar que a Rota da Seda, ou mais especificamente o comércio da China com a Ásia Central e em menor

grau com a Europa tenha sido um significativo motor de crescimento

econômico para estas regiões. Isto ocorreu devido aos altos custos de

transporte e os riscos inerentes às viagens da época. O baixo

desenvolvimento tecnológico e as barreiras geográficas, tais como

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87

climas áridos e relevos de difícil locomoção, não permitiam igualmente

a especialização produtiva das unidades políticas em determinados

produtos, fator que poderia concretizar uma efetiva divisão do trabalho

entre as diferentes sociedades (VAISSIÈRE, 2013), conforme

demonstrado no seguinte trecho17:

"O que importava mais era algo diferente, o

simples conhecimento da existência dos outros,

uma geografia básica do mundo que a diplomacia

e o comércio criaram, especialmente entre os

países do Oriente Médio situados entre todos os

contatos. Já na Antiguidade tardia, uma imagem

do mundo foi criada, com a ideia dos Quatro (ou

mais) reis do mundo (chinês, índio ou iraniano,

nômade das estepes e grego), provavelmente

originada da Índia, e permeando toda a Ásia

continental até o século X (VAISSIÈRE, p.206,

2013)."

Beckwith (2009) argumenta em sentido ligeiramente divergente,

afirmando que a riqueza dos povos da Eurásia era advinda do comércio

e da agricultura. O autor afirma que a Rota da Seda não era apenas uma

conexão entre o Ocidente e o Oriente, mas constituía um sistema

econômico internacional em si próprio. O autor se preocupa em

apresentar a cultura dos povos da Ásia Central através de uma

perspectiva que não os apresente como bárbaros, mas sim como um

complexo cultural, envolvendo elementos de culto ao heroísmo,

valorização da guerra e lealdade de grupos em relação à líderes

individuais (BECKWITH, 2009).

Frankopan (2015) argumenta em uma linha similar à de Beckwith

(2009) ao realizar um estudo da história mundial que não seja centrado

na perspectiva europeia. O autor reafirma a importância da Rota da Seda

enquanto sistema de intercâmbios e comércio preponderante no sistema

mundial que antecedeu o período da Idade Moderna (1453-1789), além

17 Segue o trecho original: “what mattered more is something different,

the sheer knowledge of the existence of others, a basic geography of the world

that diplomacy and trade created, especially among the Middle Eastern

countries situated in between all the contacts. As early as late Antiquity, an

image of the world was created, with the idea of the Four (or more) kings of the

world (Chinese, Indian or Iranian, Nomad and Greek), probably originating

from India, and pervading the whole Asian continent up to the 10th century”.

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de afirmar que o foco central para a análise da história global deveria ser

a Eurásia e não a Europa Ocidental e o Mediterrâneo. Salienta-se a

importância cultural e filosófica do conhecimento produzido na Eurásia,

sem necessariamente desconsiderar o conhecimento produzido na

Europa (FRANKOPAN, 2015).

Abu-Lughod (1989) afirma que a China atuava como o ponto de

conexão entre as rotas comerciais terrestres que cruzavam pelo norte da

Ásia e chegavam até a Europa e igualmente no que diz respeito ao

comércio marítimo entre o Oceano Pacífico, o Oceano Índico e o Mar

Mediterrâneo. Mais especificamente do que isto, enquanto Império

territorialmente unificado, a China fazia a ligação entre os bens

provenientes da Ásia Oriental, da Ásia Austral (passando pelo Oceano

Índico), do Oriente Médio, do Norte da África e da Europa. Perpassando

cinco grandes nodos geográficos do comércio mundial de então: a

Europa, os povos islâmicos e persas, os povos nômades das estepes (o

que inclui o Império Mongol), a civilização hindu e a civilização sínica.

Este sistema comercial teve o seu ápice no século XIII e entra em

decadência na metade do século XIV (ABU-LUGHOD, 1989).

Vaissière (2013) argumenta que a queda de Constantinopla em

1453 foi o golpe final para a Rota da Seda enquanto um sistema

comercial que conectava o Oriente ao Ocidente. Após este marco, o

comércio do Ocidente com a China se convertera predominantemente

para as vias marítimas, contextualizado pelo que se denomina na

literatura Ocidental como o período das Grandes Navegações.

Já Abu-Lughod (1989) cita quatro fatores que contribuíram para

o fim da Rota da Seda: 1) A queda de Constantinopla no ano de 1453. 2)

Divergência entre o estímulo ao comércio e os valores da burocracia

confuciana. 3) O fechamento comercial ocorrido durante a Dinastia

Ming (1368-16443). 4) A peste bubônica, ou Peste Negra que teria sido

originada na China entre 1348-1351 e se disseminou até a Europa

dizimando a maioria das grandes cidades no caminho da Rota da Seda.

A Dinastia Ming obteve a independência do país em relação ao

domínio mongol. O domínio mongol sobre a China durou de 1271-1368,

correspondendo à dinastia Yuan, estabelecida por Kublai Khan, neto de

Genghis Khan. Durante a dinastia Yuan a China se envolveu em

intensas atividades comerciais com os outros centros pertencentes à Rota da Seda (ABU-LUGHOD, 1989). Por sua vez, o ano de 1368 é

comumente referido como o ano da derrocada do Império Mongol, que

durou de 1206-1368. O sistema comercial da Rota da Seda foi

extensivamente desenvolvido e ampliado durante o Império Mongol

(BECKWITH, 2009).

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Kennedy (1988) afirma que o desenvolvimento tecnológico da

China antiga era incomparável para os padrões da época, sendo que fora

a inventora da bússola e da pólvora, por exemplo. O Império possuía

tecnologia que possibilitava o uso de papel moeda já no século XI, além

de ser capaz de produzir 125.000 toneladas de ferro por ano, destinada

para fins de agricultura e defesa militar. Neste mesmo período, a China

possuía uma população de 100-130 milhões de pessoas, sendo que toda

a Europa não possuía mais do que 50-55 milhões de habitantes. Por fim,

no ano de 1420, os registros imperiais afirmam a existência de uma

marinha contando com 1.350 navios de combate, 400 navios de

transporte de grande porte e 250 embarcações destinadas a viagens de

longa distância (KENNEDY, 1988, p. 5-6).

Durante o período da dinastia Ming ocorre o redirecionamento da

capital da China para Pequim, reorientando consequentemente o foco do

país para o norte e para o Oceano Pacífico e reduzindo a ênfase no Oeste

da China e na Ásia Central, que haviam sido pontos centrais de

articulação externa nas dinastias anteriores, o que havia contribuído

igualmente para o apogeu da Rota da Seda. O eixo econômico da China

foi historicamente orientado para a Ásia Central, tanto por vias

terrestres, quando por vias marítimas, partindo de Cantão se projetando

rumo ao Oceano Índico. Ainda que a articulação marítima da China

tenha se consolidado apenas quando houve a integração do Norte com o

Sul do país, a partir do século VII (ABU-LUGHOD, 1989).

Existem diversas explicações possíveis para o fechamento da

China em relação ao mundo. Segundo Kennedy (1988), a hipótese mais

amplamente difundida afirma que ocorrera uma bifurcação entre os

interesses dos comerciantes chineses e os valores da burocracia que

atuava no seio do Estado, divergindo nas suas ideias acerca do rumo que

o Império deveria seguir. A atividade do comércio, comprando barato e

vendendo mais caro, era considerada indigna, segundo os valores

confucianos (KENNEDY,1988).

Consequentemente, a China não conseguira, neste período,

realizar a identificação de um capitalismo comercial incipiente com o

Estado (visto nesta perspectiva como o aparato administrativo

centralizado) (ABU-LUGHOD, 1989). Outras explicações para a

derrocada da Rota da Seda enfatizam que a participação do comércio na formação da economia da China imperial vinha caindo no período de

1368-1403, sem haver um ponto de ruptura abrupta. Isto se deve ao fato

de que após o conflito doméstico que estabeleceu a Dinastia Ming, o

país estava debilitado e necessitava de foco na sua estabilização interna.

Além disso, cogita-se que havia a vontade política e motivação cultural

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de diferenciar-se da dinastia Yuan, que havia se dedicado

extensivamente ao comércio. Por fim, a Peste Negra que atingiu a China

no período de 1350-1370, cujos efeitos seriam sentidos até meados do

século XV, contribuiu para a desarticulação da Rota da Seda (ABU-

LUGHOD, 1989).

Durante o século XV existe um breve período de ressurgimento

da marinha chinesa e do seu uso para demonstrações de poder,

sobretudo no Oceano Índico. A derrocada final da marinha chinesa

parece ser uma consequência da crise que acometeu o Império por volta

da metade do século XV, devido à má governança, corrupção e gastos

excessivos do aparato administrativo em relação à sua arrecadação.

Entretanto, a crise da China possui ligação com o contexto sistêmico e

não depende exclusivamente dos fatores endógenos supracitados. A

retração do comércio se deve igualmente à Peste Negra e às dificuldades

econômicas em outros centros da Eurásia (o que inclui a derrocada do

Império Mongol) e, por fim, a mudança da orientação do sistema

mundial para o Atlântico. A posição militar colonizadora da Europa e o

período das Grandes Navegações viriam a desferir o golpe final ao

sistema comercial da Rota da Seda (ABU-LUGHOD, 1989). Após o fim

da Rota da Seda, a Eurásia viveu uma depressão econômica prolongada

e severa, que duraria décadas (BECKWITH, 2009).

A partir desta contextualização histórica, apresentaremos na

próxima seção a Nova Rota da Seda, ou Belt and Road Initiative,

compreendida através dos seus aspectos gerais e dos desenvolvimentos

ao longo dos seus seis eixos econômicos.

4.2 O PROJETO GEOESTRATÉGICO: A BELT AND ROAD

INITIATIVE

A Belt and Road Initiative tem como objetivos o aumento da

conectividade do espaço eurasiático, a alocação eficiente de recursos e a

coordenação de políticas econômicas, de modo a promover uma

arquitetura regional de cooperação que seja aberta, inclusiva e que

estimule o desenvolvimento conjunto dos países envolvidos no

processo. Estes objetivos serão alcançados através da construção de

capacidades, da cooperação financeira, da liberalização do comércio e de investimentos (STATE COUNCIL OF THE REPUBLIC OF CHINA,

2015).

Para isto, a iniciativa possui cinco principais eixos de atuação: 1)

comunicação; 2) conectividade (infraestrutura de transporte); 3)

aumento dos fluxos monetários; 4) facilitação do comércio e 5)

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migração, visando à criação de uma área de cooperação que se estende

desde o Pacífico Oeste indo até o mar Báltico (SARVÁRI &

SZEIDOVICZ, 2016). Os mapas abaixo sintetizam o eixo terrestre e o

eixo marítimo previstos no arcabouço da Nova Rota da Seda, além de

delinear os corredores econômicos previstos pela Iniciativa:

Figura 5: Mapa da Nova Rota da Seda em suas dimensões

terrestre e marítima:

Fonte: The Economist (2016).

Figura 6: Mapa dos diferentes eixos de articulação da BRI:

Fonte: The Diplomat (2015)

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Os pronunciamentos do Governo chinês enfatizam a criação de

um espaço de circulação de bens, ideias, pessoas e investimentos que

seja aberto e multicultural, com um tom que lembra ligeiramente o

liberalismo econômico. Um exemplo disto pode ser visto nas

informações trazidas pelo think tank chinês Center for China and Globalization (2017), demonstrando a visão de analistas chineses sobre

o tema18:

"Wang Huiyao, presidente do Centro

Independente para a China e a Globalização, diz

que este é o novo motor da globalização [BRI].

Shen Digli, do Instituto de Estudos Internacionais

da Universidade Fudan de Xangai, enfatiza a BRI

como uma iniciativa de interconectividade em

escala global. Wang Yiwei, do Centro de Estudos

Europeus da Universidade Renmin, está

convencido de que a BRI pode ser tão importante

quanto a criação da União Europeia. E Shin

Yinhong, do Centro de Estudos Americanos da

Universidade Renmin, ressalta,

fundamentalmente, que a OBOR / BRI não

funcionaria se fosse meramente uma aposta

geopolítica." (CENTER FOR CHINA AND

GLOBALIZATION 2017).

Salienta-se que durante a maior parte de sua história, a China se

orientou como uma nação e potência primariamente continental e

terrestre (KAPLAN, 2012). A BRI é dividida em seis corredores

econômicos, nomeadamente: 1) a Nova Ponte Terrestre Eurasiática (que

chegará até o território europeu); 2) o eixo China-Mongólia-Rússia; 3) o

eixo China-Ásia Ocidental (perpassando o Oriente Médio); 4) o eixo da

Península China-Indochina; 5) o eixo do Corredor Econômico China-

18 Segue o trecho original: “Wang Huiyao, president of the independent

Center for China and Globalization, says this [BRI] is the new engine of

globalization. Shen Digli, from the Institute of International Studies at

Shanghai’s Fudan University, stresses the BRI as an inter-connectivity initiative

on a global scale. Wang Yiwei, from the Center of European Studies at Renmin

University, is convinced this could be as important as the creation of the

European Union. And Shin Yinhong, from the Center of American Studies at

Renmin University, points out, crucially, that OBOR/BRI would not work if it

were merely a geopolitical gamble”.

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Paquistão e, finalmente, 6) o Corredor Econômico Bangladesh-China-

Índia e Mianmar.

Os corredores econômicos, assim como a Maritime Silk Road

(componente marítimo) e o Silk Road Economic Belt (componente

terrestre) estão inclusos oficialmente no 13º Plano Quinquenal da China,

que prevê metas e direções para a economia do país correspondendo ao

período de 2016-2020 (NATIONAL DEVELOPMENT COMMISSION

OF THE PEOPLE'S REPUBLIC OF CHINA, 2016, p. 147-148).

A Ponte Terrestre Eurasiática consiste em uma integração de

diversos projetos que já estão em curso desde os anos 1990, sendo fruto

da conexão entre a China e os países que foram pertencentes à União

das Repúblicas Socialistas Soviéticas na Ásia Central e na Europa do

Leste (SUMMERS, 2016). Novas linhas ferroviárias foram abertas neste

eixo, chegando até a Europa. No ano de 2015, ocorreram 815 viagens

ferroviárias entre China e Europa, a maioria delas sendo destinadas para

fins de comércio. A BRI vem apresentando uma recepção favorável nos

países da Europa Oriental, sendo que a Hungria, a Polônia, a Sérvia, a

República Tcheca, a Bulgária e a Eslováquia assinaram acordos e

memorandos de entendimento para integrar e promover a iniciativa

(ROLLAND, 2017, p. 74).

A Polônia é um país a ser destacado neste eixo, visto que é o

maior parceiro comercial da China na Europa do Leste, o único país

membro na região que faz parte do Banco Asiático de Infraestrutura e

Investimento (AIIB) e já possui duas conexões ferroviárias com a China

desde o ano de 2013. Adicionalmente, a Polônia é considerada por

Brzezinski (1997), conforme foi abordado no primeiro capítulo da

presente pesquisa, como um Estado central para o exercício

geoestratégico de influência sobre o território europeu.

Os investimentos da China na região dos Bálcãs vêm crescendo,

sobretudo após o lançamento da Iniciativa 16+1, que consiste em uma

plataforma de cooperação regional. Lançada no ano de 2012, a iniciativa

pode ser vista como um meio de inserção da China na Europa, visto que

11 dos seus membros fazem parte da União Europeia. Os membros da

Iniciativa 16+1 são: Albânia, Bósnia Herzegovina, Croácia, Macedônia,

Montenegro, Sérvia, Eslovênia, Bulgária, Romênia, República Checa,

Hungria, Polônia, Eslováquia, Estônia, Lituânia e Letônia. Antes do ano de 1989 estes Estados possuíam regimes políticos de cunho socialista,

ligados a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS) (CHINA-

CENTRAL EASTERN EUROPEAN BUSINESS COUNCIL, 2017).

Os principais pontos desta Iniciativa em matéria de cooperação

são: comércio; infraestrutura e transporte; desenvolvimento sustentável;

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cooperação financeira entre governos subnacionais e cooperação

cultural. A China investiu inicialmente US$ 10 bilhões na Iniciativa

16+1, através do Banco Nacional de Exportações e Importações

(EXIMBANK, na sigla em inglês). Este é um espaço geoestratégico

central para as rotas terrestres que conectam a Ásia à Europa, sendo que

o fim da Guerra Fria e a derrocada da zona de influência soviética

possibilitaram a inserção da China como um ator relevante nos Bálcãs

(BALKAN ANALYSIS, 2017).

A Iniciativa 16+1 pode ser considerada como um espaço de

diálogo de modo a promover a Nova Ponte Terrestre Eurasiática. Outro

importante elemento a ser mencionado consiste na localização dos

países situados ao longo da costa do Mar Negro. Considera-se que esta

cooperação possa sedimentar interesses geoestratégicos, ao passo que o

acesso ao Mar Negro permite a projeção de poder simultânea sobre o

Oriente Médio e sobre a Europa (CSIS, 2017).

No que tange à União Europeia, foi acordada a criação de um

grupo de trabalho conjunto e uma plataforma de cooperação para

promover a BRI no continente. A China anunciou um investimento

inicial de US$ 315 bilhões em infraestrutura de transporte e

conectividade, além de estímulo à economia digital, visando construir

um espaço integrado que promova a cooperação para ganhos mútuos e

visando aproximar a China de instituições como a Comissão Europeia, o

Banco Europeu de Investimento e o Banco Europeu para a Reconstrução

e o Desenvolvimento (ROLLAND, 2017, p. 75-76).

Neste eixo, salienta-se a importância da ferrovia que conecta a

China a Londres, na Inglaterra, estendendo-se por 12.000 quilômetros e

levando 18 dias para completar o trajeto. A ferrovia conecta Yiwu, na

província de Zhejiang (China) a 15 cidades europeias. O trem passa por

Zhengzhou, antiga cidade chinesa nas margens do Rio Amarelo, que é

um hub de conectividade em relação ao resto do território do país, tendo

rápida conexão com Pequim, Xian e Hong Kong. Posteriormente o trem

passa pelo cinturão industrial da China, chegando até a região de

Xinjiang, no oeste do país, que é um ponto histórico de conexão com a

antiga Rota da Seda (SOUTH CHINA MORNING POST, 2017).

A ferrovia se conecta com a Rússia passando pelos Montes Urais,

que simbolizam a ligação entre a Europa e o a Ásia, chegando a Ecaterimburgo, quarta maior cidade do país, prosseguindo para a antiga

cidade, de Kazan e chegando até Moscou. Segue depois para Minsk na

Bielorússia e para Varsóvia na Polônia, após isto o trem prossegue para

a Alemanha (maior parceira comercial da China na Europa) e, por fim, o

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trem passa pelo Eurotúnel e chega até Londres (SOUTH CHINA

MORNING POST, 2017).

O corredor econômico China-Mongólia-Rússia, surgiu no âmbito

da Organização para Cooperação de Xangai, ao passo que os chefes de

Estado dos três países vinham realizando consultas e negociações

visando coordenar os seus planos geoestratégicos para a Eurásia.

Nomeadamente, a BRI é o projeto proveniente da China, a União

Econômica Eurasiática capitaneada pela Rússia e a Rota das Estepes,

iniciativa da Mongólia. Foi assinado um memorando de entendimento

no ano de 2014, além de um tratado de cooperação trilateral no ano de

2016, identificando 32 projetos nas áreas de transporte, energia, turismo,

alimentos, redução de barreiras ao comércio, agricultura, segurança

alimentar, cooperação técnico-científica, entre outros (ROLLAND,

2017, p. 78; UBPOST, 2016).

A estabilização dos países da Ásia Central e a construção de

infraestrutura na região são fatores positivos para a Rússia, visto que a

promoção da conectividade e da infraestrutura poderá dinamizar as

atividades econômicas da região como um todo. Tensões entre estes

atores poderiam surgir se a BRI se consolide de forma mais incisiva nos

domínios de defesa e segurança, questões que motivaram a criação da

União Econômica Eurasiática por parte da Rússia (KACZMARSKI,

2017).

Os Estados membros da UEE são Rússia, Armênia, Bielorrússia,

Cazaquistão e Quirquistão. A negociação dos primeiros tratados do

bloco começou ainda na década de 1990, entretanto, a consolidação da

área como uma união aduaneira ocorreu apenas no ano de 2010. A UEE

caminha para se estabelecer como um mercado único com livre

circulação de pessoas, serviços, capitais e mercadorias. Algumas de suas

instituições foram moldadas a partir do modelo da União Europeia, com

especial foco na construção de infraestrutura. (EURASIAN

ECONOMIC UNION, 2017).

A China concluiu em outubro (2017) um Acordo de Livre

Comércio com a União Econômica Eurasiática (UEE), após mais de um

ano de negociações distribuídas em cinco rodadas, três reuniões de

trabalho e dois encontros ministeriais. Os temas acordados incluem

harmonização de procedimentos aduaneiros; redução de barreiras não tarifárias e facilitação do comércio; cooperação entre órgãos

governamentais; e tópicos como comércio digital e de bens eletrônicos

(MINISTRY OF COMMERCE OF THE PEOPLE'S REPUBLIC OF

CHINA, 2017). Isto demonstra a vontade política de promover a

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cooperação entre a Belt and Road Initiative e a União Econômica

Eurasiática.

Adicionalmente, a visão chinesa enfatiza a questão de uma

integração eurasiática de caráter aberto e inclusivo, reforçando a sua

projeção internacional. A visão da Rússia tem um enfoque histórico,

como uma forma de organizar o espaço geográfico da antiga União das

Repúblicas Socialistas Soviéticas. A abordagem russa enfatiza o

processo de construção de normas e de tratados no âmbito da UEE.

Portanto, embora possuam elementos de complementaridade, a UEE e a

BRI constituem projetos fundamentalmente diferentes para a integração

no âmbito da Eurásia, que são perpassados pelas diferentes culturas

políticas, sociais e estratégicas que permeiam a sociedade e a história de

Rússia e China (KACZMARSKI, 2017).

O Corredor Econômico China-Ásia Ocidental é derivado de um

conjunto de iniciativas que já estavam sendo avançadas pela China

desde o final dos anos 1990. A China pretende investir em projetos de

infraestrutura de transporte e energia (oleodutos e gasodutos para o

transporte de hidrocarbonetos) nos países que compõem a Ásia Central

(Cazaquistão, Quirquistão, Tadjiquistão, Uzbequistão e Turcomenistão)

(SUMMERS, 2016). Xi Jinping realizou uma série de visitas à região no

ano de 2013, prometendo empréstimos da ordem de US$ 30 bilhões para

o Cazaquistão, US$ 15 bilhões para o Uzbequistão e US$ 16 bilhões

para o Tadjiquistão (OSW CENTRE FOR EASTERN STUDIES, 2013).

Neste eixo, podemos mencionar as quatro linhas de transporte de

gás natural da Ásia Central, que são necessárias para abastecer a

demanda energética da China. O país utilizou-se de uma infraestrutura

construída pela União Soviética entre os anos de 1960 e 1988, ligando a

Rússia ao Turcomenistão e que passava pelos territórios do Uzbequistão

e do Cazaquistão (KACZMARSKI, 2017).

Desde um acordo realizado no ano de 2006, o Turcomenistão

concordou em vender gás natural para a China e as obras de extensão e

modernização começaram. A primeira linha de gasodutos foi completa

em 2009, o segundo gasoduto foi completo em 2010 e o terceiro se

tornou operacional no ano de 2014. Atualmente se encontra em

construção o quarto gasoduto, conectando Beyneu uma cidade

localizada na costa leste do Mar Cáspio, até Xinjiang, na China. A quarta linha aportará um adicional de 15 milhões de metros cúbicos de

gás natural anuais, sendo que o país já importa 55 bilhões de metros

cúbicos apenas do Turcomenistão (SOUT CHINA MORNING POST B,

2017).

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Através deste corredor econômico é realizada a conexão da China

com o Oriente Médio, sendo que o Irã é um país estrategicamente

relevante para a conexão das Novas Rotas da Seda. Adicionalmente,

Brzezinski (2016) define este país como um dos Estados centrais para a

projeção de influência sobre a Heartland e a Rimland erurasiáticas,

conforme abordado no primeiro capítulo da presente dissertação.

No dia 8 de setembro do ano de 2016, foi realizado em Pequim o

primeiro seminário de oportunidades econômicas entre China e Irã, no

contexto da Nova Rota da Seda. O país possui cerca de 80 milhões de

habitantes, tendo igualmente uma importante localização - próximo do

Golfo Pérsico e do Mar Cáspio, além de ser o quarto maior país detentor

de reservas de petróleo e gás natural no mundo. (CHINA DAILY C,

2016).

No dia 23 de janeiro de 2016, foi oficializada a parceria

estratégica entre China e Irã, na visita de Estado do presidente Xi

Jinping à Teerã. Foram assinados 17 acordos estratégicos envolvendo

setores como infraestrutura de portos e rodovias, energia e cooperação

nuclear, além de comércio. Nesta ocasião, os Chefes de Estado

acordaram um plano para aumentar os fluxos comerciais entre os países,

no montante de US$ 600 bilhões, nos próximos 10 anos.

Adicionalmente, nesta ocasião o Irã anunciou o seu apoio oficial à BRI.

(REUTERS b, 2016).

O maior projeto bilateral em curso entre estes países até o

momento consiste em uma ferrovia de alta velocidade que sai da

província de Xinjiang no oeste da China até a capital do Irã,

perpassando 3200 quilômetros através da Ásia Central, passando pelo

Quirquistão, Turcomenistão, Cazaquistão e Uzbequistão (FINANCIAL

TRIBUNE, 2017). A imagem a seguir apresenta de forma sucinta as

linhas de infraestrutura que conectam a China aos seus vizinhos:

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Figura 7: Mapa da conectividade de infraestrutura na Eurásia:

Fonte: KHANNA (2016), p. 277

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Nas linhas de cor azul claro encontram-se os canais referentes à

irrigação e transporte de água. As linhas de cor azul mais escuro

demonstram os rios que recortam a região. As linhas em preto

representam os oleodutos da região, utilizados para o transporte de

petróleo. Por sua vez, as linhas em verde claro demonstram os

gasodutos, que sã utilizados para o transporte de gás natural. As linhas

alaranjadas designam as ferrovias, sendo que as linhas em cinza

demonstram as fronteiras entre os países locais. As linhas na cor

marrom designam as rodovias, e, por fim, as flechas na cor púrpura

designam os corredores de transporte marítimo.

A China se manteve como o maior parceiro comercial do Irã pelo

sétimo ano consecutivo, sendo que, em 2015, os países tiveram um

volume de comércio de US$ 1,421 bilhão. O investimento e aumento da

conectividade entre China e Irã poderá constituir um pivô para a

inserção da China em outros países do Oriente Médio. A maior

participação chinesa no Oriente Médio incluiu visitas de Estado ao Egito

e à Arábia Saudita em 2016 (CHINA DAILY C, 2016).

A estabilidade política e o desenvolvimento econômico do

Oriente Médio são elementos importantes para a estratégia de projeção

continental chinesa para o oeste, conforme o relatório oficial de políticas

para os Estados Árabes (CHINA ARAB POLICY PAPER, 2016). Por

fim, a China forneceu uma linha de crédito de US$ 10 bilhões ao Irã,

destinada a projetos de infraestrutura nas áreas de energia, transporte,

gestão de recursos hídricos, entre outros. O Irã vem crescendo como um

parceiro estratégico para os investimentos chineses. As linhas de crédito

são denominadas em Yuan (Renminbi), visando contribuir para o

processo de internacionalização da moeda chinesa (EURASIA

REVIEW, 2017).

O Corredor Econômico da Península China-Indochina tem

apresentado pouco progresso. A península é composta por Camboja,

Laos, Myanmar, Tailândia e Vietnã. Devido à instabilidade política no

Myanmar e às discordâncias com a Tailândia no que tange a questões

territoriais e de soberania no Mar do Sul da China, não avançaram os

projetos de infraestrutura nestes países. Neste eixo, a China tem

redirecionado seu foco e esforço diplomático para o Laos e para a

Tailândia (CSIS, 2015). O Corredor Econômico China-Paquistão (CPEC) é o eixo mais

desenvolvido nos investimentos da BRI, sendo que foram acordados 176

projetos de construção em diversas áreas, tais como usinas de energia,

ferrovias, gasodutos, oleodutos e redes de cabos de fibra ótica. O caso

do Paquistão é particularmente emblemático desta situação, o país

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possui rivalidades históricas com a Índia acerca do controle do território

da Caxemira. Neste eixo, a China destinou US$ 46 bilhões para o

Paquistão, valor que corresponde a cerca de 20% do PIB do país

(CHAN, 2016, p. 17-19).

O corredor econômico ligará a província de Xinjiang na China até

o Porto de Gwadar no Paquistão, constituindo uma rede de rodovias e

ferrovias em um trajeto de 3000 quilômetros e contando com a

construção de usinas energéticas ao longo do caminho. A conclusão do

eixo econômico está prevista para o ano de 2030 e o mesmo encurtará

em 12.000 quilômetros o trajeto de acesso da China em relação ao

petróleo e gás natural proveniente do Oriente Médio

(BHATTACHARJEE, 2015, p. 1-4).

Está igualmente prevista a construção de uma rede de cabos de

fibra óptica conectando os dois países em um projeto equivalente a US$

44 milhões, demonstrando a variedade dos setores de investimentos

envolvidos na Nova Rota da Seda. As obras serão construídas por

empresas chinesas e com capital proveniente de bancos chineses,

contendo, no entanto, uma média de conteúdo nacional proveniente do

Paquistão de 50% para as obras envolvendo ferrovias e para Porto de

Gwadar. Ressalta-se o uso de conteúdo nacional paquistanês estimado

em 80% no caso das rodovias e a ausência de conteúdo nacional no caso

das obras ligadas ao setor de fibra óptica. Estudos recentes estimam que

os investimentos no corredor econômico poderão elevar o PIB do

Paquistão em 1.5% nos próximos três anos. (RAMAY, 2016, p. 5-9).

O estreitamento das relações com o Paquistão pode conceder uma

rota de acesso para que as províncias situadas no oeste da China se

conectem ao Oceano Índico. Este movimento é importante de um ponto

de vista estratégico e no médio prazo pode constituir vantagens

comerciais. Isto reduziria a dependência estratégica da China em relação

ao estreito de Malacca, localizado no Oceano Pacífico, no que diz

respeito ao escoamento de produtos e como linha de acesso de recursos

naturais para a China. Adicionalmente, as relações com o Paquistão

podem facilitar o acesso da China aos recursos energéticos provenientes

do Oriente Médio e da África, além de constituir um importante aspecto

de conexão no âmbito da Nova Rota da Seda, realizando a ligação entre

os seus componentes marítimos e terrestres. (COOLEY, 2016; KHANNA, 2016).

O Paquistão enfrenta um problema de falta de suprimento de

energia e os projetos do CPEC auxiliarão neste sentido. Já existe um

projeto aprovado no âmbito do AIIB para a expansão da usina

hidrelétrica de Tarbela no Paquistão, visando acrescentar a capacidade

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101

de geração de 2.820 Megawatts, o que consiste em um aumento de mais

de 60% na capacidade de geração de energia atual da usina (BANCO

ASIÁTICO DE INFRAESTRUTURA E INVESTIMENTOS, 2017). O

projeto enfatiza sua importância, sobretudo no período do verão, que

consiste na época de maior escassez no país. Além deste projeto, já estão

previstas a construção de seis usinas de geração de energia através de

fontes renováveis no Paquistão, sendo uma usina de energia solar, duas

usinas hidrelétricas e três usinas eólicas. A soma destes projetos possui

uma previsão de geração de 2.790 Megawatts de energia. Estes projetos

serão financiados inteiramente pelo China Development Bank e pelo

China EXIMBANK (BATTACHARJEE, 2015).

A Índia possui a percepção de liderança na Ásia Meridional,

região que inclui o Paquistão, o Nepal, o Butão, Bangladesh, o Sri

Lanka, as Maldivas e o Afeganistão. A Índia considera em sua visão

estratégica que o Oceano Índico constitui parte importante do seu espaço

vital de inserção externa, cujos limites definem-se este território a partir

do Golfo de Hormuz, na Ásia Ocidental, indo até o estreito de Malacca

no Leste Asiático (BAVA, 2007, p.05; KHANNA, 2016, p. 164-166).

Pelo estreito de Malacca passam anualmente mercadorias que

representam um valor de comércio de US$ 5 trilhões (AL JAZEERA,

2016).

Inicialmente a Índia se posicionou de forma evasiva em relação

ao apoio à BRI. Entretanto, em maio de 2017 o país se absteve de

participar no Fórum da Nova Rota da Seda, evento organizado em

Pequim, indicando as suas reservas quanto à participação na Iniciativa,

devido aos conflitos territoriais que possui com o Paquistão na região da

Caxemira (MINISTRY OF EXTERNAL AFFAIRS OF INDIA, 2017).

China e a Índia possuem o status de parceria estratégica em certas

iniciativas, como os BRICS e nos temas ligados a cooperação sul-sul e

as mudanças climáticas. No entanto, no que tange ao equilíbrio de poder

e zona de influência na Eurásia, existe certa tendência de balanceamento

entre estes atores. A busca da China por alimentos e recursos naturais na

Eurásia fere desígnios de segurança alimentar e energética da Índia e

vice-versa (CHAN, 2016).

A China e a Índia constituem matrizes civilizacionais cuja

história, tradições culturais e intelectuais são milenares. Além disto, estes países concentram cerca de um terço da população mundial e

possuem 3.200 quilômetros de fronteira entre si. Ambas são potências

detentoras de poder nuclear, incluindo arsenal bélico (FIORI, 2007). O

panorama das relações destes países no que diz respeito as regiões da

Ásia Central e Meridional é complexo. Os mesmos disputam influência

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102

e locais de investimento na Eurásia, visando princípios de segurança

energética e acesso a recursos que permitam a manutenção dos seus

respectivos processos de ascensão econômica (BAVA, 2007). O

complexo panorama deste movimento aponta para o fato de que a BRI

poderia levar a escalada de tensões regionais.

Uma síntese das abordagens e respostas da imprensa indiana em

relação à iniciativa da Nova Rota da Seda enfatizam o argumento de que

o Corredor Econômico China-Paquistão e a BRI de um modo geral

desafiam a influência geoestratégica da Índia em espaços que o país

considera como tradicionais para sua própria projeção. A construção do

Porto de Gwadar, no Paquistão; e de portos no Mianmar e no Sri Lanka,

representam a perspectiva de uma presença chinesa permanente no

Oceano Índico (PITLO & KARAMBELKAR, 2015). Este ponto reforça

o argumento de que a projeção global de poder da China envolve a

extensão de sua influência para outro oceano, não se limitando apenas a

zona do Oceano Pacífico (COOLEY, 2016; UBEROI, 2016).

Contrapontos são por vezes abordados por órgãos da imprensa

indiana, residindo em um tom de conciliação, afirmando que não

existem apenas interesses geopolíticos envolvidos na Nova Rota da

Seda. Argumenta-se igualmente que a maior conectividade e

disponibilidade de infraestrutura em âmbito regional poderiam vir a

beneficiar economicamente a Índia no futuro. Estes artigos enfatizam a

necessidade de não apenas cooperar com certos projetos da BRI, mas

manter o bom estado das relações de cooperação da Índia com os

Estados Unidos e com o Japão, como formas de aquisição de poder de

barganha em relação à China (PITLO & KARAMBELKAR, 2015).

O último eixo abordado, o Corredor Econômico Bangladesh-

China-Índia-Myamar (BCIM), apresentou pouco desenvolvimento,

devido ao posicionamento da Índia em relação à BRI. Os quatro países

que fazem parte deste eixo se encontraram em Kunming, na província de

Yunam, na China, visando encontrar potencialidades comuns, no ano de

2013. Uma visita de Estado realizada por Xi Jinping em Bangladesh no

ano de 2016 resultou em 27 acordos de cooperação para construção de

infraestrutura em transporte, energia e telecomunicação, totalizando o

montante de US$ 13.6 bilhões. O memorando de entendimento assinado

nesta ocasião formalizou a entrada de Bangladesh na BRI (REUTERS b, 2016; DHAKA TRIBUNE, 2017).

Destaca-se que a BRI não segue o padrão ocidental de

estabelecimento de tratados multilaterais entre todos os países membros

da iniciativa. O modelo chinês enfatiza as relações econômicas. Por esta

razão, o plano é conduzido projeto por projeto e possui um caráter

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103

essencialmente bilateral, que acabará por produzir impactos na esfera

regional (CLARKE, 2016). A China procura incentivar suas empresas

nacionais a acessar novos mercados, auxiliando com apoio diplomático,

com a facilitação de acesso ao crédito no ambiente doméstico, além de

simplificar as normas para sua expansão internacional. O governo

fornece ainda apoio técnico para investimentos no setor de pesquisa e

desenvolvimento no exterior (YEH & WHARTON, 2016).

Conforme já mencionado anteriormente, a construção de

ferrovias de alta velocidade é um importante elemento da BRI e a China

já possui experiência neste setor, tendo construído internamente 16.000

km de ferrovias de alta velocidade que passam pelos mais variados

relevos e climas (JI, 2015 p. 506). No período de 1997-2007 ocorreu

uma grande expansão das ferrovias e rodovias provinciais e inter-

regionais, concretizando uma rede de 650.000 quilômetros de ferrovias e

150.000 quilômetros de rodovias no âmbito doméstico. (ROLLAND,

2017, p. 30-31). A visão do Estado chinês enfatiza a importância da

infraestrutura e da conectividade entre as suas diferentes cidades como

um fator importante para a competitividade industrial (KROEBER,

2016).

O volume de comércio da China com os países que integram a

BRI cresceu em uma média anual de 19% na última década, sendo que

no ano de 2013, os aproximadamente 64 países da BRI representaram

25% do volume total de comércio do país (em um valor de US$ 1.04

trilhões). Adicionalmente, os países ao longo da Rota da Seda já

representaram no ano de 2015, cerca de 20% dos Investimentos Diretos

Externos da China. Estima-se que os países situados ao longo da Nova

Rota da Seda tenham uma necessidade de US$ 8 trilhões de

investimentos em infraestrutura para o período de 2010-2020 (JI, 2015,

p. 504-505).

Xi Jinping (2017, p. 555) afirma que o comércio entre a China e

os países que compõem a Belt and Road excedeu o montante de US$ 3

trilhões no período entre 2014-2016. O mandatário afirma ainda que a

China estabeleceu 56 zonas econômicas de cooperação e comércio

preferencial em mais de 20 países neste mesmo período (JINPING,

2017, p. 556). Devemos mencionar que a BRI foi inclusa oficialmente

na constituição do Partido Comunista da China (PCC) após o XIX Congresso Nacional do PCC, que ocorreu em outubro de 2017. Este

pode ser considerado um fato paradigmático que demonstra o

compromisso do país em dedicar-se à Iniciativa. Segue o trecho da

constituição do PCC que menciona na BRI na seção correspondente à

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104

doutrina política de Xi Jinping19: "seguindo o princípio de alcançar o

crescimento compartilhado através da discussão e da colaboração e

buscando a Iniciativa Belt and Road" (BELT AND ROAD PORTAL,

2017).

Por fim, a BRI pode ser vista como uma visão estratégica de

longo prazo para a inserção internacional da China e visando consolidar

a posição deste ator no processo de aprofundamento da integração no

espaço Euro-asiático. A partir desta contextualização e das noções gerais

acerca do formato proposto para a iniciativa partimos para o esforço

analítico de exposição dos condicionantes e dos aspectos geopolíticos e

(geo) econômicos que motivam este projeto, de modo a responder a

seguinte pergunta: qual o papel da BRI para o projeto mais amplo de

inserção internacional da China no século XXI?

19 Segue o trecho original: Following the principle of achieving shared

growth through discussion and collaboration, and pursuing the Belt and Road

Initiative.

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105

5 O PAPEL DA BELT AND ROAD INITIATIVE PARA A

PROJEÇÃO INTERNACIONAL DA CHINA NO SÉCULO XXI

A BRI consiste em um projeto delineado pelo alto escalão dos

formuladores de política externa da China e envolve a mobilização de

recursos políticos, diplomáticos, intelectuais e financeiros, dirigidos

rumo ao esforço de consolidar interesses domésticos e internacionais do

país. Portanto, o projeto não compreende apenas a construção de

infraestrutura, visto que existem razões estratégicas e econômicas para a

sua elaboração (ROLLAND, 2017).

Segundo a literatura analisada, é possível sintetizar os

condicionantes pelos quais a China vem empregando amplos recursos

para a consolidação da BRI em duas principais áreas: as razões e os

interesses de fundamentação estratégica e geopolítica; e as razões e

interesses de fundamentação (geo) econômica. No campo da estratégia e

da geopolítica, sublinhamos dois principais temas: 1) a importância

geopolítica da região da Eurásia para a extensão da influência chinesa;

2) a manutenção da coesão territorial do Estado ao impedir movimentos

separatistas nas províncias localizadas no Oeste do seu território. No que

diz respeito às razões (geo) econômicas, sublinhamos três principais

temas: 1) estímulo à economia da China (fatores domésticos); 2) a

exportação da sobre capacidade produtiva da indústria de construção

civil e de infraestrutura do país; 3) um estímulo e uma importante parte

da estratégia "Going Global".

Cabe ainda mencionar, que conforme menciona Hong (2016, p. 2,

tradução nossa) existe forte complementaridade entre a geoeconomia e a

geopolítica20:

"Em essência, a geopolítica estuda a influência

dos aspectos militares, políticos, humanos e outros

elementos de poder duro sobre a política de um

20 Segue o trecho original: “In essence, geopolitics studies the influence

of such aspects as military, political, human resources and other hard power

elements on the policy of a state, particularly its foreign policy. Meanwhile geo-

economics focuses more on economic space, covering transportation

connectivity, networks, commerce, trade, investment, and financial and

economic strengths. Geo-economics concerns a nation’s pursuit of strong

economic performance and sustainable economic competitiveness. However,

geopolitics and geoeconomics are two sides of the same coin, the political

dimension of geoeconomics being strongly intertwined with the competitive

economic dimension of geopolitics.”

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106

Estado, em particular, no que tange à sua política

externa. Enquanto isso, a geoeconomia concentra-

se mais no espaço econômico, abrangendo

conectividade de transporte, redes, comércio,

investimento, enfatizando potencialidades

financeiras e econômicas. A geoeconomia diz

respeito à busca de um país por forte desempenho

econômico e competitividade econômica

sustentável. No entanto, a geopolítica e a

geoeconomia são dois lados da mesma moeda,

sendo a dimensão política da geoeconomia

fortemente interligada com a dimensão econômica

competitiva da geopolítica."

A próxima subseção trata da dimensão estratégica e geopolítica

acerca do papel desempenhando pela Belt and Road Initiative para a

projeção internacional da China.

5.1 ESTRATÉGIA E GEOPOLÍTICA

5.1.1 Importância Geopolítica da Região da Eurásia para a

Extensão da Influência Chinesa

A China procura o acesso a hidrocarbonetos que são importantes

para a formação da base de poder e recursos de uma potência. A

competição por recursos energéticos é um fator relevante para a

geopolítica, visto que pode auxiliar na sobrevivência e na busca pela

maximização do poder estatal. A energia, por sua vez, é um fator crucial

na distribuição de poder na arena global, pois influencia a capacidade de

produção de riquezas, investimento em forças armadas e

desenvolvimento de capacidade industrial. Estes fatores contribuem para

a formação de uma base de recursos que poderá ser considerada como

fatores brutos de poder que podem ser convertidos posteriormente em

influência na arena internacional, a depender das estratégias e ações

empreendidas pelos respectivos Estados (STEEVES e OURIQUES,

2016).

A geopolítica da energia é um fator importante para explicar o

papel da BRI na estratégia de projeção internacional da China no século XXI. A massa de recursos energéticos disponível na Eurásia, conforme

os dados apresentados no primeiro capítulo da presente dissertação, que

corresponde a 30% do total mundial de gás natural e 8.5% do total

global de petróleo, reforçam esta tendência.

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107

Conforme mencionado anteriormente, a BRI representa a visão

chinesa para a integração eurasiática e compreende a expansão da esfera

de influência do país sobre esta região. Rolland (2017), assim como

Pautasso e Ungaretti (2017) afirmam que este processo poderia

significar o ressurgimento de uma nova ordem sinocêntrica, similar ao

conceito de tianxia (all under heaven) abordado na primeira seção do

segundo capítulo da presente dissertação.

A BRI passa pela construção das ideias de uma comunidade com

um destino comum e o espírito da Rota da Seda (STATE COUCIL OF

THE REPUBLIC OF CHINA, 2015), que poderiam ser considerados

como exemplos da liderança humanística e dos princípios morais que a

China pretende avançar através da BRI, assegurando o seu papel de

protagonismo no cenário regional. Portanto, a ordem regional proposta

pela China através da iniciativa consiste em um espaço não apenas

econômico, mas que compreende a dimensão cultural.

As ideias de comunidade com um destino comum e o espírito da

Rota da Seda fazem referência à dimensão histórica da Rota da Seda,

como um espaço de circulação transcontinental de bens, finanças,

pessoas e culturas. Neste sentido, apresenta-se este arcabouço ideológico

como um fator capaz de prover estímulos à paz, prosperidade e

comércio. O espírito da Rota da Seda, portanto, inclui a tolerância com a

soberania dos países vizinhos, buscando harmonia e cooperação

(STATE COUNCIL OF THE REPUBLIC OF CHINA, 2015). A

iniciativa começa com os vizinhos imediatos, e deverá crescer, à medida

que outros países decidam aceitar os investimentos da Nova Rota da

Seda.

O discurso da política externa chinesa enfatiza o aspecto dos

ganhos mútuos (win-win), ainda que a distribuição desses ganhos possa

ocorrer de forma assimétrica. Os Estados vizinhos que pretendam

receber as oportunidades econômicas oferecidas no arcabouço da BRI

estariam tacitamente aquiescendo a um não confrontamento em relação

aos interesses econômicos e estratégicos avançados pela China, como

condicionantes para se obter acesso aos recursos da BRI (CHAN, 2016).

Por sua vez, o adensamento das relações da China com os países

da Eurásia poderia servir para obter acesso a recursos naturais que são

importantes para a manutenção do crescimento de sua economia. Adicionalmente, a projeção da China através dos diferentes eixos

econômicos planejados tem a potencialidade de posicionar o país de

forma mais favorável em um espaço relevante para a geopolítica global,

como é o caso da Eurásia (AOYAMA, 2016; PLOBERGER, 2017).

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5.1.2 Evitar Movimentos Separatistas nas Províncias

Localizadas no Oeste

A política externa da China para a Ásia Central está ligada aos

desígnios separatistas das regiões autônomas localizadas no Oeste do

seu território, Xinjiang e o Tibete. Em Xinjiang, a população é

etnicamente mais próxima dos povos provenientes das estepes da Ásia

Central do que da etnia Han que prevalece no leste da China. O país

vem buscando aumentar de forma pragmática as suas conexões

econômicas com suas províncias do oeste através da política

governamental definida como a Marcha para o Oeste, lançada através do

13º Plano Econômico Quinquenal (2016-2020). Paralelamente a isto, o

país posicionou contingentes militares de modo a assegurar sua

integridade territorial nestes locais (KAI, 2016; SUMMERS, 2016).

Conjuntamente, Xinjiang e o Tibete constituem quase 1/3 do

território chinês. Ressalte-se que o Tibete possui um líder, o Dalai

Lama, que realiza uma estratégia de resistência pacífica em relação à

China. Já a região autônoma de Xinjiang possui movimentos

separatistas de cunho mais agressivo e que não possuem uma clara

liderança central. No ano de 2009 a China lançou uma política nacional

indicando que não aceitaria a intervenção de outros Estados no sentido

de auxiliar os movimentos separatistas do Tibete e de Xinjiang, visando

conservar sua integridade territorial (KAI, 2016).

A liderança chinesa parte da percepção de que a redução das

desigualdades de renda entre a costa da China e o restante do país

contribuiria para a estabilidade social. Atualmente, as províncias a oeste

do território chinês possuem uma renda per capita que corresponde a 30-

50% do que é verificado nas províncias localizadas na costa leste.

Entretanto, é devido mencionar que as causas dos movimentos

separatistas são mais complexas e incluem: restrições a práticas

religiosas, a percepção de baixa representatividade política, distribuição

desigual das oportunidades econômicas e benefícios desiguais entre os

imigrantes Han e as populações locais. Não obstante, a liderança chinesa

espera que o desenvolvimento e a redução da pobreza possam dissuadir

a radicalização destes movimentos (FERDINAND, 2016).

No âmbito externo, a China possui a percepção de que o desenvolvimento econômico da Ásia Central diminuiria a necessidade

da presença russa e norte-americana como estabilizadores regionais.

Paralelamente a isto, a China se projeta de forma gradual como um

aliado regional dos países da Ásia Central A estabilidade política destes

países é vista como um fator importante para que não ocorram efeitos de

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contágio sobre as regiões autônomas no oeste da China. Por sua vez, vê-

se o estímulo ao desenvolvimento econômico dos vizinhos através da

construção de infraestrutura como um dos condutores deste processo, ao

passo que evitaria o aumento de tensões sociais (KOZLOWSKI, 2016).

No curto e médio prazo, a China possui a percepção de que o

envolvimento nos assuntos de segurança na Ásia Central poderia elevar

a possibilidade de aumento de tensões com a Rússia ou com os EUA,

uma das razões pelas quais o país optou por não utilizar fortemente a

cooperação militar com aos países desta região. No pós-Guerra Fria a

China não procurou limitar a influência dos EUA e da Rússia na Ásia

Central, pois percebia que as elites dos países locais possuíam vínculos

com a presença política da Rússia e, visando evitar potenciais conflitos

de posição com os EUA. A China objetivava apenas que a presença dos

EUA e da Rússia não limitassem a projeção da sua própria influência

(KOZLOWSKI, 2016).

Segundo perspectiva chinesa, os dois principais motes da BRI, a

promoção de conectividade e o espraiamento do desenvolvimento,

diminuiriam as três forças negativas atuando no oeste do país: o

terrorismo, o separatismo e o extremismo étnico (ROLLAND, 2017, p.

111; p. 132-134). Esta visão é pautada pela ideia de que o

desenvolvimento aporta segurança e estabilidade, sendo que a segurança

é uma pré-condição para que se busque o desenvolvimento, portanto,

estes elementos se retroalimentam em uma síntese harmoniosa (YANG,

2015).

Adicionalmente, espera-se que os investimentos da BRI abram

mercados e que os países da Eurásia passem crescentemente a consumir

produtos chineses (KHANNA, 2016; BLANCHARD e FLINT, 2017). A

próxima subseção abordará os principais elementos (geo) econômicos

que evidenciam o papel da BRI na estratégia de projeção internacional

da China.

5.2 (GEO) ECONOMIA

Sublinha-se que os investimentos da BRI poderão ser usados

como uma forma de aproveitamento das reservas internacionais

acumuladas pelo país, que se encontram no montante de US$ 3.14 trilhões (REUTERS C, 2018), em benefício de seus objetivos

estratégicos (BLACKWILL e HARRIS, 2016). As próximas subseções

abordarão os condicionantes geoeconômicos envolvidos na Belt and Road Initiative.

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110

5.2.1 Estímulo à Economia da China

As taxas de crescimento do PIB chinês não retornaram aos níveis

apresentados no período anterior à crise internacional de 2008. No ano

de 2007 a economia do país cresceu 14% e esta média caiu para menos

de 8% a partir de 2012. Suas taxas de crescimento apresentaram um

aumento no ano de 2010, chegando a 10.6%, devido a um pacote de

estímulo econômico de US$ 586 bilhões financiado através do aumento

de gastos do governo. No ano de 2015 o PIB do país cresceu a uma

média de 6.9%, tendo caído para uma média de 6.7% em 2016

(ROLLAND, 2017, p. 95-98).

Estas taxas continuam elevadas, porém, demonstram que a China

está enfrentando o desafio de reforma do seu modelo econômico,

buscando se basear mais fortemente no consumo doméstico, na

produção de inovação e em um posicionamento internacional mais

assertivo, conforme consta no 13º Plano Econômico Quinquenal,

vigente para o período de 2016-2020 (NATIONAL DEVELOPMENT

COMMISSION OF THE PEOPLE'S REPUBLIC OF CHINA, 2016).

Neste sentido, a BRI é uma das importantes respostas do mandato de Xi

Jinping para esta conjuntura de transição doméstica e internacional

(BLANCHARD e FLINT, 2017).

Espera-se que o aumento da conectividade com os países

vizinhos ajude a promover a integração econômica regional. Segundo a

visão chinesa, este movimento parte da construção de infraestrutura

como um caminho para o desenvolvimento (YANG, 2015). Neste

sentido, espera-se que a BRI possa promover, no médio e longo prazo, o

adensamento do comércio regional, estimulando a demanda por

produtos chineses. Além do aspecto duro da integração, que possui o seu

exemplo mais emblemático na questão de infraestrutura, existe o

estímulo aos fatores brandos que também contribuem para este

processo, tais como acordos de livre comércio e cooperação econômica,

estímulo aos fluxos de pessoas e investimentos (WEN e JIJING, 2016;

WEIDONG e DUNFORD, 2016).

Para Summers (2016); Weidong e Dunford (2016); Blanchard e

Flint (2017) e Zhang (2017) a BRI representa uma estratégia de

expansão espacial, ou seja, a China procura aumentar o alcance geográfico da sua economia, consolidando uma consequente expansão

produtiva e comercial. O adensamento das redes de conhecimento,

tecnologia, comércio, capital e finanças seria o movimento central para

aportar dinamismo a este processo. Portanto, a BRI representa um dos

eixos de atuação da China, que vem adquirindo os meios necessários

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111

para a sua expansão material sobre novas regiões geográficas, visando

superar contradições econômicas internas, engendrando novos processos

de acumulação de capital que poderiam dinamizar a sua economia, além

de contribuir para o desenvolvimento dos países vizinhos.

Exemplos de ações neste sentido incluem a construção de um hub

logístico no Djibouti (África), a compra o porto de Piraeus na Grécia, a

aquisição dos direitos de gestão do porto de Gwadar no Paquistão

(visando obter acesso ao Oceano Índico), além da construção de ilhas

artificiais no Mar do Sul. Adicionalmente, a China vem adquirindo

direitos de mineração, extração de petróleo e gás na Ásia Central, na

África e na América Latina. Por fim, a China vem realizando transações

de compra ou aluguel de terras para produção agrícola na América

Latina, na Rússia e na Ásia Central (ZHANG, 2017).

5.2.2 Exportação da Sobre Capacidade Produtiva das

Indústrias de Construção Civil e de Infraestrutura do País;

Conforme estabelecido na subseção anterior, existem dificuldades

para a manutenção do ritmo de crescimento da economia chinesa. Deste

pensamento emerge a consciência política da necessidade de reformas e

ênfase no mercado doméstico como propulsor deste processo. A sobre

capacidade produtiva da China pode ser explicada pela crescente

necessidade de investimento que é empregada para que se consiga

produzir unidades adicionais na indústria. Ou seja, o país se encontra em

um ciclo no qual são necessárias altas taxas de investimento para que se

continue promovendo o seu processo de crescimento econômico pela via

industrial (TEYKDAL, 2017; ZHANG, 2017).

Devido a estas razões, emerge a necessidade de aumento da taxa

de produtividade do país, de modo a reduzir a crescente necessidade de

capital. O problema da sobre capacidade produtiva aparece em

documentos oficiais do governo chinês desde o ano de 2003. Sendo

mais pronunciado nos seguintes setores industriais: aço, cimento, vidro,

alumínio eletrolítico, carvão, construção de navios, energia solar,

energia eólica e o setor de petroquímicos (ZHANG, 2017, p. 8-9;

YIPING, p. 5-6).

As indústrias pesadas empregam um número elevado de trabalhadores e a redução do tamanho das empresas estatais poderia

causar o aumento da taxa de desemprego o que por sua vez pode

estimular de tensões sociais que prejudiquem a estabilidade do regime

político do Partido Comunista. Por esta razão, uma simples reforma das

empresas estatais pertencentes aos setores supracitados não seria

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suficiente para resolver esta questão. Neste sentido, a BRI pode prover

mais tempo para que o governo central realize reformas econômicas no

âmbito doméstico, ao passo que o país consiga exportar parte de sua

sobre capacidade produtiva, através da sua utilização para a construção

de obras de infraestrutura em outros Estados (ROLLAND, 2017).

Por fim, aponta-se o desafio de redução do grau de

endividamento do Estado chinês, que se encontra em um patamar de

257% do PIB no ano de 2017 (THE NATIONAL INTEREST, 2017). A

redução da dívida nacional é um dos objetivos do 13º Plano Quinquenal

e deverá ser importante para a estabilidade da BRI. Devemos mencionar

que no ano de 2015, a dívida nacional do país se encontrava no patamar

de 282% do PIB (MCKINSEY INSTITUTE, 2015, p. 4).

A visão chinesa parece dialogar com a perspectiva de uma

correlação positiva entre o investimento em infraestrutura, o aumento da

renda e a elevação da demanda agregada, conforme apontam Caldéron e

Servén (2005). Adicionalmente, a promoção da conectividade entre os

Estados é outro fator com potencial dinamizador para as atividades

econômicas (KHANNA, 2016).

5.2.3 Estímulo e uma Importante Parte da Estratégia Going

Global

A BRI pode ser vista como uma continuação e uma importante

parte da estratégia Going Global, abordada na segunda seção do

segundo capítulo da presente pesquisa, visando estimular a

competitividade e inserção internacional das empresas chinesas. Por sua

vez, a própria estratégia Going Global é advinda da continuidade das

reformas e da abertura econômica empreendidas por Deng Xiaoping,

conforme abordamos igualmente no segundo capítulo desta dissertação.

É possível afirmar que existam, até o presente momento, três

grandes passos na estratégia de inserção internacional da China: 1)

1979-1989, o período de início da abertura, mas que ainda apresentava

intenso controle estatal; 2) o período de 1990-1999 no qual a China

passava por uma transição na regulação econômica interna e no qual o

país busca se inserir em organismos multilaterais. 3) o período de 2000-

2016 que corresponde à entrada do país na OMC, o fortalecimento da participação em organismos multilaterais e o início da estratégia Going

Global; no qual se verificou um aumento da emissão de investimentos

da China (SHUJIE e PAN, 2014; CHANGHONG e WEN, 2015). Neste

terceiro ponto se insere a BRI como um estímulo para a trajetória dos

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investimentos chineses, visando expandir a zona de influência da China

no espaço da Eurásia (SUMMERS, 2018; JULAN e YIFEI, 2018).

Mesmo com o aumento da internacionalização das empresas

privadas e das parcerias público-privadas da China, as suas empresas

estatais permanecem como os principais atores da estratégia Going Global. Estas empresas empregam muitas pessoas, fortalecendo a

coesão social além de serem utilizadas como um dos instrumentos de

poder do Estado chinês (YEH e WHARTON, 2016). As empresas

estatais podem ser utilizadas para ampliar a base tecnológica da

produção chinesa servindo como instrumentos geoeconômicos com

vistas à projeção de influência nos mais variados mercados nacionais,

atuando de acordo com o planejamento e estratégia do Governo Central

(BLACKWILL e HARRIS, 2016).

A diplomacia das ferrovias de alta velocidade é um dos exemplos

da sinergia entre os interesses do governo, de suas empresas estatais e

que se mescla com a Nova Rota da Seda, promovendo a visão de que a

expansão das ferrovias para o oeste do país e rumo ao seu entorno

regional possam promover maior conectividade e adensamento dos

vínculos econômicos. Espera-se ainda que a BRI leve as empresas de

energia elétrica, de telecomunicação e de tecnologia de informação da

China para uma nova dimensão no mercado regional (CHAN, 2016).

Os investimentos da China nos países que compõem a iniciativa

subiram em 38.6% ao final do ano de 2015, se comparado a 2014

(CHINA DAILY, 2016). Sendo que nos primeiros seis meses de 2017,

os investimentos da China nestes países totalizaram US$ 78.09 bilhões,

uma alta de 32.6% em relação ao ano de 2016 (EMBAIXADA DA

CHINA, 2017).

O aporte de capital da BRI poderá fomentar a internacionalização

de empresas chinesas em novos mercados, sobretudo nas áreas de

construção civil e energia, o que é compatível com o objetivo de

exportação da sobre capacidade produtiva do país. Neste ponto, o

estímulo à estratégia Going Global se coaduna com o objetivo de

internacionalização do Yuan, visto que o capital chinês será aportado

muitas vezes na sua própria moeda no âmbito regional (HUIYAO e LU,

2016, p. 58; p. 174-178; TEYKDAL, 2017).

O Estado chinês planeja os rumos de sua economia de forma gradual, pragmática e pautado por estratégias de longo prazo. Isto

representa efetivamente uma simbiose entre política externa, política de

desenvolvimento e busca por melhor posicionamento na disputa

geopolítica por recursos energéticos. A estratégia Going Global se

insere neste contexto, estimulando as empresas estatais de petróleo a se

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internacionalizar, exemplos emblemáticos incluem a Sinopec, CNOOC

e a Petrochina (OURIQUES, 2014). Sintetizando esta narrativa,

Ouriques (2014) expressa:

"O progresso e o crescimento constantes levaram

a China a ocupar a posição de centro gravitacional

do desenvolvimento regional asiático e exercer

influência direta nas cadeias de produção e nos

fluxos comerciais globais" (p. 22).

Neste sentido, a BRI representa um incremento à estratégia Going

Global, articulando concomitantemente a economia doméstica e a

política externa do país. A estratégia foi conduzida pelo Estado em

direta ligação com diferentes setores e representantes do capital chinês

(AOYAMA, 2016; SUMMERS, 2016; ZHANG, 2017).

Adicionalmente, esta articulação possui ligação com o conceito de

geoeconomia, que faz referência ao uso de recursos econômicos de

modo a atingir objetivos relativos ao interesse nacional.

5.3 A BELT AND ROAD INITIATIVE COMO UMA VISÃO

(GEO) ESTRATÉGICA PARA A CHINA: UM ESFORÇO DE

SÍNTESE

Com o fim da Guerra Fria e o incidente do Massacre da Praça da

Paz Celestial (Tiannamen) em 1989, a estabilidade do regime do PCC se

tornou uma prioridade da política nacional. O aprofundamento da

reforma e abertura promovidas por Deng Xiaoping (mandato ocorrido

entre 1978-1992) visava manter a continuidade do ritmo de

desenvolvimento da economia nacional. As altas taxas crescimento e as

melhorias econômicas permitem o controle do desemprego e a

preservação da coesão social da China (KROEBER, 2016).

O sucessor de Deng Xiaoping, Jiang Zemin (mandato que ocorreu

entre 1992-2002) buscou aprofundar a participação da china em

matérias de cooperação, participação em organismos multilaterais e

buscando maior protagonismo no contexto da política regional na Ásia.

O objetivo era assegurar a ascensão pacífica da China, sem maiores

oposições externas, podendo focar no seu processo de desenvolvimento

doméstico (ZHENG e TOK, 2007).

O Governo de Hu Jintao (2002-2012) atua em continuidade com

o anterior, enfatizando a política do desenvolvimento pacífico,

percebendo que a China precisava mitigar as possíveis tensões e

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oposições externas para poder focar no seu processo de reformas

domésticas (ZHENG e TOK, 2007). O mandato de Hu Jintao foi um

período no qual a China adotou uma postura externa conciliadora,

enfatizando: "existência de um mundo harmônico que viabilizasse a

coexistência de diversas civilizações" (Wen Jiabao, apud Rolland, 2017,

p. 77, tradução nossa).

A política externa de Xi Jinping apresenta elementos de

continuidade em relação ao seu antecessor, com uma diferença

fundamental: a China está saindo da estratégia de low profile, que era

uma continuidade desde Deng Xiaoping (1978-1991), para uma postura

mais assertiva e propositiva. O ano de 2013 parece ter sido o ano

fundamental desta mudança, através da busca por realização (striving for

achievement) (XUETONG, 2014).

A consolidação de boas relações com os países situados no seu

entorno estratégico, nomeadamente a Ásia Central, a Ásia Meridional e

a Ásia Oriental, são essenciais para o processo de ascensão da China

enquanto potência. A ênfase no aspecto regional pode ser vista

parcialmente como um reflexo acerca da preocupação com a presença

dos EUA na Ásia, sobretudo no Oceano Pacífico. Como resposta, uma

das ações desenvolvidas pela China consiste no esforço de projeção para

o Oeste (KAI, 2016).

As dimensões marítimas e terrestres da BRI não possuem

diferenciação explícita neste sentido, elas se retroalimentam e visam

aumentar a influência da China nos espaços geoestratégicos do Oceano

Pacifico e da Eurásia continental. A decisão dos EUA em 2011, no

mandato de Barack Obama (2009-2016), de redirecionar sua atenção

sistemática para as regiões da Ásia e do Pacifico, suscitaram na China

um intenso debate acerca do seu próprio posicionamento na estruturação

do ordenamento regional. Assim, a China idealiza um pivô para o oeste,

em resposta ao o pivô para a Ásia anunciado pelos EUA (AOYAMA,

2016; LOBELL, 2016)

A China procura se inserir na Eurásia continental, em resposta à

influência dos EUA na Ásia e no Pacifico e visando se posicionar de

forma mais favorável, ao passo que aumenta o seu peso econômico e

militar no sistema internacional. Isto ocorre através do estabelecimento

de hubs comerciais, através dos investimentos em infraestrutura e de esforços político-diplomáticos no sentido de formar maiores vínculos

com os países da Eurásia (ROLLAND, 2017). Portanto, a BRI vem da

necessidade secular de integração da China com o espaço euro-asiático.

Esta é uma potencialidade econômica e geopolítica que remonta aos

tempos do Império Chinês e da antiga Rota da Seda.

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O discurso chinês visa enunciar uma mudança no pensamento

estratégico tradicional de competição geopolítica para cooperação

geopolítica, através do aporte de recursos para o desenvolvimento,

consolidando os seus interesses nacionais através de fluxos econômicos,

o que corresponde ao exercício dos instrumentos da geoeconomia

(BLACKWILL e HARRIS, 2016). Eventualmente a BRI poderá se

consolidar junto à Europa e ao Oriente Médio e isto representaria

efetivamente a extensão da zona de influência do país, ao passo que

aumenta a força gravitacional que atrai as economias destas regiões em

direção ao dinamismo da China (ROLLAND, 2017, p. 119-120).

A BRI apresenta uma direção de longo prazo para a ação

geoestratégica da China, devendo se estender pelos próximos 30-40

anos (HONG, 2016), sendo um dos eixos que podem contribuir para a

ascensão da china como uma potência com suas próprias características

(XIAOYU, 2017).

A medida que se consolidem laços mais densos com as

economias da Eurásia, se tornará mais difícil para que estes países se

oponham aos interesses da China. A ideia é que se compreenda que o

desígnio de obter o desenvolvimento econômico comum através da

cooperação para ganhos mútuos (win-win) seria a questão mais

importante para a integração eurasiática. A construção de infraestrutura

visando contribuir para o aumento da conectividade, além de suprir as

necessidades energéticas e logísticas dos países vizinhos são a

contribuição que a China aporta no âmbito regional, através de sua

própria experiência econômica interna (KHANNA, 2016; WEIDONG e

DUNFORD, 2016; XIAIOYU, 2017). A partir disto, se formaria um

espaço de maior integração, circulação de bens, pessoas, ideias e,

segundo a visão chinesa (STATE COUNCIL OF THE REPUBLIC OF

CHINA, 2015), estes fatores poderiam consolidar até mesmo a paz no

complexo Euro-asiático.

Consequentemente, a Nova Rota da Seda pode ser vista como um

projeto pacífico, porém pragmático de aumento da zona de influência da

China em uma região de grande relevância geopolítica e econômica,

como é o caso da Eurásia (PLOBERGER, 2017). A BRI é baseada em

princípios de ganhos mútuos e pretende aumentar a contribuição da

China em relação ao bem público global. A ascensão de uma nova potência não depende exclusivamente

do poder militar ou econômico, mas é influenciada pelos interesses e

pelo modo como o poder é exercido, constituindo fundamentalmente um

processo de barganhas e negociações. Neste caso, o conceito de potência

em ascensão ou potência emergente é definido como um ator que

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precisa ser consultado para que haja mudança no status quo, mas que

ainda não é capaz de determinar unilateralmente a sua própria agenda

política para o âmbito sistêmico (NARLIKAR, 2013).

A BRI dependerá da aceitação pelos demais Estados participantes

de que os preceitos pretendidos pela China atendem aos seus interesses.

A abundância de recursos materiais não garante o exercício de

influência ao longo da iniciativa. Assim, para ser bem-sucedida, deve

haver uma noção geral de que os princípios promovidos pela China

beneficiam os demais Estados componentes do complexo regional (JI,

2015).

A institucionalização e legitimidade promovidas por determinada

potência em ascensão, mesmo que em âmbito regional e em seu

contexto histórico particular, constitui uma forma de tentar estabilizar e

perpetuar, de certa maneira, as condições pelas quais o ordenamento se

orienta (COX, 1986). Neste sentido, a China deverá empregar recursos

materiais aliados ao esforço político-diplomático para consolidar a BRI

(BLACKWILL e HARRIS, 2016).

O esforço geoeconômico envolvido na consolidação da BRI

remete ao conceito de esfera de influência regional, abordado no

primeiro capítulo da presente pesquisa, que não implica em dominação

política ou econômica, mas sinaliza um equilíbrio de forças no qual os

Estados pertencentes à determinada região concedem deferências aos

interesses da potência dominante, no que diz respeito à formulação de

suas próprias políticas públicas (BRZEZINSKI, 1997, p. 164).

Portanto, a resposta dos países membros acerca da BRI será um

importante condicionante para o sucesso da mesma. Os princípios

servirão como base importante para que a BRI consiga efetivamente

consolidar sua legitimidade perante os países integrantes (JI, 2015).

Entre os princípios delineados pela diplomacia chinesa, destaca-se a

possibilidade de ganhos mútuos (win-win); o aumento da conectividade

entre as nações; o crescimento dos fluxos de comércio e de

investimentos que, por sua vez, levariam maior desenvolvimento aos

países envolvidos (STATE COUNCIL OF THE REPUBLIC OF

CHINA, 2016).

A cooperação não indica a total ausência de conflitos de

interesses, mas indica que os Estados tiveram algum grau de sucesso em evitar conflitos reais ou potenciais. Nesta mesma linha de ideias, o

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Keohane (1984) define a cooperação21: "Um processo através do qual as

políticas seguidas pelos governos são consideradas por seus parceiros

como facilitadores para a realização de seus próprios objetivos, como

resultado da coordenação de políticas." (KEOHANE, 1984, p. 63).

Adicionalmente, as organizações internacionais constituem

espaços de socialização onde os diferentes Estados podem interagir de

modo a aumentar o grau de previsibilidade acerca dos comportamentos

alheios. Mesmo que no curto prazo possa haver mais benefícios no

pertencimento a uma organização para alguns dos seus membros, existe

a expectativa de que no longo prazo os ganhos agregados pela ação da

instituição sejam relativamente equivalentes e, portanto, benéficos para

todas as partes envolvidas (BARNETT e FINNEMORE, 2004).

Alternativamente, os teóricos de cunho realista enfatizam de que

devido à anarquia presente no sistema internacional, os Estados estão

sujeitos ao conflito e à competição. Neste sentido, sua visão afirma que

a cooperação tende a não ser bem-sucedida mesmo nos casos em que

haja interesses comuns, isto ocorre devido a três principais razões: 1)

preocupações relativas à sua sobrevivência (segurança do Estado); 2)

devido à incerteza em relação às ações de outros atores; 3) os Estados

possuem preocupações posicionais, ou seja, mesmo que a cooperação

gere ganhos para ambas as partes, a assimetria dos ganhos pode

desestimular a cooperação (GRIECO; POWELL e SNIDAL, 1993).

Portanto, os realistas enfatizam que a preocupação com os ganhos

relativos é um dos principais obstáculos para a cooperação. Longe de

afirmar que a mesma seja impossível, este prisma analítico afirma que a

cooperação é difícil de ser atingida. Não obstante, existem estudos no

sentido de demonstrar a ligação entre a hegemonia e a cooperação

econômica, assim como verificar a ligação entre alianças militares e a

cooperação econômica, ou ainda os efeitos de transições sistêmicas

sobre a cooperação (GRIECO; POWELL e SNIDAL, 1993;

GILPIN,1999). A visão destes autores demonstra que poderá haver

tensões com outras potências ao longo da Nova Rota da Seda, no que

diz respeito à preocupações com os ganhos relativos de outros atores.

Adicionalmente, a percepção das condições domésticas pode

auxiliar a compreender a possibilidade de cooperação internacional. Um

exemplo disto consiste na análise das estruturas de incentivo às quais estão sujeitos os grupos de interesse e os tomadores de decisão. Outros

21 Segue trecho original: “A process through which policies actually

followed by governments come to be regarded by their partners as facilitating

the realization of their own objectives, as a result of policy coordination.”

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importantes elementos são a capacidade de ratificação de determinado

compromisso ou rumo político nos ordenamentos jurídicos internos.

Adicionalmente, sabe analisar qual seria o impacto produzido sobre a

opinião pública dos Estados envolvidos se fosse consolidada a

cooperação (PUTNAM, 2010).

Outros elementos domésticos podem influenciar a tomada de

decisão sobre cooperar ou não, quais sejam: o contexto e o

comportamento de diferentes elites nacionais; a relação e a dinâmica dos

partidos políticos envolvidos no poder público de um Estado; a estrutura

institucional e o grau de divisão ou concentração do poder político

(MILNER, 1992), ou, ainda, as diferentes classes e forças sociais (COX,

1986).

Neste sentido, o capital aportado pela BRI pode ajudar na

consolidação e estabilidade dos diferentes regimes políticos pertencentes

aos Estados participantes da iniciativa (COOLEY, 2016). Outro

exemplo da influência de fatores domésticos sobre a cooperação em

relação consiste no fato de que o capital destinado à BRI poderá auxiliar

os Estados que possuam vulnerabilidades estruturais no que diz respeito

à produção de energia (caso do Paquistão). O capital da BRI poderá

auxiliar igualmente os Estados que possuem dificuldades de integração

política e econômica ao sistema internacional, como é o caso do Irã

(ROLLAND, 2017).

A liderança da China está ciente de que haverá dificuldades na

execução e implementação da BRI. Uma estratégia de tamanho porte e

com uma duração tão longa (prevista para 2050) não poderia transcorrer

sem que houvesse certo grau de fricção, resistência e mesmo falhas em

determinados projetos e/ou eixos econômicos. Um dos pontos mais

enfatizados recaem sob o risco de que a BRI ultrapasse a capacidade de

investimento da China, se o país tentar consolidar simultaneamente

vários dos corredores econômicos propostos. Outro fator comumente

apontado é o de que as construções sejam realizadas de forma muito

rápida, visando apresentar resultados, de modo a propiciar danos

ambientais e\ou problemas trabalhistas e ligados a direitos humanos nos

locais das obras (PRICE WATERHOUSE AND COOPERS, 2017).

Uma questão evidente acerca dos riscos na execução da Iniciativa

diz respeito à grande diversidade étnica, social, política, cultural e mesmo econômica entre os países que fazem parte desta imensa

macrorregião (COOLEY, 2016). Nesta mesma linha de ideias, existe o

risco relacionado ao montante de capital necessário para sua

consolidação. Neste sentido, a China enfrentará o desafio de analisar a

rentabilidade dos projetos envolvidos na BRI, além de promover a

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Iniciativa buscando igualmente investidores privados ao redor do

mundo. Existe o risco de que a BRI possa exacerbar os problemas

domésticos ligados ao grau de endividamento do Estado chinês (PWC,

2017).

A China estabeleceu instituições de cunho multilateral que

poderiam auxiliar na projeção política e na execução da BRI

(WEIDONG e DUNFORD, 2016). Recentemente foram estabelecidos o

Banco Asiático de Infraestrutura e Investimentos (AIIB) com capital

autorizado de US$ 100 bilhões e o Fundo da Rota da Seda com capital

autorizado de US$ 40 bilhões. A título de comparação, o Banco Mundial

possui um capital autorizado de cerca de US$ 260 bilhões. Sustenta-se

que a ação destas instituições multilaterais possa vir a ser um ponto

importante para viabilizar uma maior aceitação da Nova Rota da Seda

(SARVÁRI & SZEIDOVICZ, 2016).

O AIIB contou com 57 membros no ato de sua criação, incluindo

37 países da região da Ásia e do Pacífico, o que pode ser visto como

uma forma de aquiescência em relação aos desígnios chineses sobre a

necessidade de construção de infraestrutura a nível regional (CHAN,

2016, p. 8-9). Adicionalmente, o China Development Bank pretende

destinar US$ 890 bilhões para os países ao longo do componente

terrestre da Nova Rota da Seda (FERDINAND, 2016, p. 950).

No que diz respeito à relevância da atuação dos bancos

multilaterais na construção de infraestrutura, aponta-se que os

investimentos globais neste setor alcançam o montante aproximado de

US$ 2,5 trilhões anualmente, sendo que seriam necessários US$ 3,3

trilhões anuais para que o atual ritmo de crescimento da economia

global seja mantido (MCKINSEY INSTITUTE, 2016). Devemos

mencionar que a Ásia tem grande necessidade de investimentos em

infraestrutura, estimada no montante de US$ 1.7 trilhão anuais em

investimentos até o ano de 2030, visando conter a ameaça do

aquecimento global e manter a trajetória de desenvolvimento da região

(ASIAN DEVELOPMENT BANK, 2017).

O Novo Banco de Desenvolvimento (NBD), conhecido como

Banco dos BRICS também deverá atuar como um catalisador para os

projetos da BRI. Fundado em 2014 e lançado oficialmente no ano

seguinte, a instituição possui capital autorizado de US$ 100 bilhões, podendo realizar empréstimos anuais de até US$ 34 bilhões e tendo

como objetivo estimular o desenvolvimento de países emergentes. A

contribuição financeira e o poder de voto de cada país membro são

divididos de forma igualitária. A sede do Banco está localizada em

Shangai, na China. No momento, o único escritório adicional está

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localizado em Johanesburgo, na África do Sul (NEW DEVELOPMENT

BANK, 2017).

O NBD lançou recentemente a sua estratégia para o período de

2017-2021. A construção de infraestrutura para o desenvolvimento

sustentável consiste no principal eixo de execução, recebendo dois

terços dos fundos disponíveis. O plano estratégico envolve cinco áreas

temáticas: 1) energia limpa; 2) irrigação, gestão e sanitização da água; 3)

transporte e logística; 4) desenvolvimento urbano sustentável e 5)

cooperação e integração entre os seus integrantes. A instituição

pretender abrir gradualmente a sua estrutura para a participação de

novos membros, visando uma maior diversidade geográfica e cultural

(NEW DEVELOPMENT BANK, 2017).

Em suma, evocando conceitos e ideias relativas à cultura chinesa,

a criação da comunidade de um destino comum se refere a um projeto

inclusivo para a Eurásia, com a China atuando como um ponto central

de articulação geoeconômica, provendo bens públicos para os países

vizinhos. Isto ocorre através da noção de promoção do desenvolvimento

pela via da construção de infraestrutura e adensamento do comércio,

visando propiciar ganhos mútuos para todas as partes envolvidas.

Arrighi (2009) pensa que as características milenares da cultura

chinesa poderão propiciar que o país represente uma mudança na

natureza do capitalismo global a partir de um novo ciclo de acumulação

que promova menor exploração da sociedade, produzindo um modelo

socioeconômico que preze pela estabilidade social e contrário a

acumulação excessiva de capital nas mãos de poucos. Além disso, a

função de proteção social do Estado seria uma herança confuciana. Este

seria um modelo de desenvolvimento mais equilibrado e que encontra

similaridades ao que fora proposto originalmente por Adam Smith, no

qual o Estado participa do direcionamento da economia nacional

(ARRIGHI, 2009).

Comparações usuais na mídia ocidental, afirmam que a BRI seria

o Plano Marshall chinês, fazendo alusão ao auxílio que os EUA

ofereceram à Europa Ocidental para a sua reconstrução no pós-Segunda

Guerra Mundial (1939-1945). Entretanto, existe uma diferença na escala

dos investimentos: em valores atualizados o Plano Marshall

representaria cerca de US$ 130 bilhões. Apenas no Corredor Econômico China-Paquistão, já foram investidos mais de US$ 40 bilhões, sendo que

a BRI se projeta com a possibilidade de US$ 4 trilhões nas próximas

décadas (STRATEGY&BUSINESS, 2018).

Além disso, a Nova Rota da Seda é mais ampla do que o Plano

Marshall, visto que deverá se estender por décadas e compreende

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igualmente uma dimensão cultural e ideológica (KHANNA, 2016),

através da promoção do Espírito da Rota da Seda (STATE COUNCIL

OF THE REPUBLIC OF CHINA, 2015).

Tal visão possui ligação com o conceito de Tianxia, abordado no

segundo capítulo da presente dissertação, além de se referir à

centralidade do Império chinês na articulação das rotas de comércio na

Eurásia durante o período pré-moderno (antes do ano de 1453, ponto de

desarticulação da Rota da Seda). A Tianxia, ou sistema sinocêntrico,

possuía fundamentos materiais, através da força econômica e militar,

mas se articulava com os vizinhos através de rituais e valores que

consolidaram redes de comércio e interação, colocando a China no

centro do sistema político-econômico asiático.

Este ordenamento era fundamentado igualmente através de

princípios ideológicos e pela liderança política da China, que se

propagava devido ao prestígio do Império chinês, a resiliência de sua

cultura e a sua habilidade diplomática. A China foi efetivamente o

provedor da segurança e do comércio no seio do sistema da tianxia, que

persistiu, ainda que com períodos de declínio relativo, até meados do

século XIX (QIN, 2012). No período contemporâneo, a BRI consiste em

uma contribuição concreta da China para o bem público global, na

forma de cooperação para o desenvolvimento.

Por fim, é possível que a Belt and Road Initiative represente um

esforço consciente no sentido de impulsionar o espaço econômico da

Rota da Seda de modo a posicionar a China como um centro de

articulação do sistema regional euroasiático, através da sua própria visão

e da consecução da liderança humanística, evocando o termo presente

no pensamento chinês tradicional.

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6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A geopolítica e a economia costumam andar lado a lado,

materializando-se na expansão militar que acompanha a expansão

econômica, um caminho traçado por todas as potências surgidas no

sistema Westfaliano (FIORI, 2008). Neste sentido, a presente

dissertação se propôs a discutir o papel da Nova Rota da Seda no projeto

mais amplo de inserção internacional da China no século XXI e, mais

especificamente, no que tange à sua projeção sobre a Eurásia.

No primeiro capítulo discutimos as diferentes teorias e conceitos

acerca da geopolítica e focando mais especificamente nos autores que

tratam acerca da importância da Eurásia para a projeção de poder no

cenário global. Foram discutidos os movimentos de expansão e retração

da esfera de influência da China no que diz respeito ao seu entorno

regional. Foi igualmente abordada a noção de geoeconomia, um

importante conceito para que se compreenda a atuação do binômio

formado pelo Estado chinês e suas empresas, que se projetam

crescentemente sobre o sistema internacional no século XXI.

No segundo capítulo foi discutida a projeção internacional da

China, partindo dos seus elementos ideológicos, culturais e de sua visão

de mundo acerca das relações internacionais. A segunda seção discutiu a

progressão da emissão de investimentos estrangeiros diretos da China

para o mundo, contextualizando este movimento através das reformas

econômicas domésticas que o país apresentou a partir de sua abertura

em 1978 e progredindo de forma linear através do tempo, chegando até

o século XXI. Mais especificamente, delineamos três fases acerca de sua

projeção internacional: 1) 1979-1989, o período de reformas e início da

abertura; 2) o período de 1990-1999 no qual a China passava por uma

transição na regulação econômica interna e no qual o país busca se

inserir em organismos multilaterais; 3) o período de 2000-2016 que

correspondeu à entrada do país na OMC, o fortalecimento da

participação em organismos multilaterais e o início da estratégia Going

Global; no qual se verificou um substancial aumento da emissão de

investimentos da China.

No terceiro capítulo realizou-se a discussão acerca da antiga Rota

da Seda, apresentando seus elementos gerais, características, o período de apogeu e as razões para o seu declínio. Após a contextualização

histórica, foi apresentada a Nova Rota da Seda (Belt and Road Initiative)

através dos seus principais desenvolvimentos e dos investimentos

consolidados nos seis eixos econômicos oficialmente delineados pela

China.

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124

Por fim, no quarto capítulo foi realizada a discussão acerca do

papel da BRI para o tema mais amplo da projeção internacional da

China no século XXI. A pesquisa foi orientada pela hipótese de que a

Nova Rota da Seda consiste no aprofundamento da estratégia "Going

Global", iniciada pela China no ano 2000. A bibliografia analisada

confirmou a hipótese inicialmente observada. Além disto, foi possível

identificar outros possíveis papéis para a Nova Rota da Seda, que

residem no plano da geopolítica e da (geo) economia. Pontualmente, no

campo da estratégia e da geopolítica, sublinhamos dois principais temas:

1) a importância geopolítica da região da Eurásia para a extensão da

influência chinesa; 2) Manutenção da coesão territorial do Estado chinês

ao dissuadir movimentos separatistas nas províncias a oeste do seu

território. No que diz respeito às razões (geo) econômicas, sublinhamos

três principais papéis ou condicionantes para a BRI: 1) Estímulo à

economia da China; 2) a exportação da sobre capacidade produtiva da

indústria de construção civil e de infraestrutura do país; 3) Um estímulo

e uma importante parte da estratégia "Going Global". Constatou-se,

portanto, que a BRI possui um papel importante para a consecução de

objetivos domésticos e internacionais da China.

A Belt and Road Initiative não é apenas um plano para

construção de infraestrutura, mas consiste em uma ampla visão para o

futuro da integração da Eurásia. Esta visão estratégica compreende

elementos geoeconômicos e fundamenta-se em fatores geopolíticos, tal

como a massa de recursos energéticos disponível na Eurásia. A

capacidade de avançar com os valores e os ideais que envolvem a

iniciativa será essencial para a sua consolidação perante os países

membros.

No que diz respeito ao aspecto internacional, segundo a literatura

analisada, a BRI representa uma visão estratégica de longo prazo para

ascensão da China ao status de grande potência. A visão de alguns dos

autores analisados afirmam que este processo poderia significar o

ressurgimento da proeminência chinesa no espaço regional da Eurásia.

A BRI é fruto da confluência de objetivos domésticos e

internacionais. A iniciativa deverá auxiliar na continuidade do

desenvolvimento econômico da China, o que é importante para a

estabilidade política do regime do Partido Comunista. Espera-se que a BRI promova o espraiamento do desenvolvimento econômico para as

províncias localizadas a oeste da China, o que contribuiria para a sua

integridade territorial, visando evitar a separação de territórios

autônomos como Xinjiang e o Tibete.

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125

A BRI é um conceito guarda-chuva, que pode incluir uma ampla

gama de relações projetadas pela China a nível global. A iniciativa não

se fundamenta pelo modelo de institucionalização multilateral

característico dos processos de integração conduzidos no Ocidente. A

BRI será consolidada através de relações bilaterais, que, por sua vez,

produzirão efeitos na esfera regional. A representação da BRI na

academia e através da percepção dos autores chineses enfatiza os

fundamentos econômicos da iniciativa. Sendo que os teóricos Ocidentais

tendem a apresentar o aspecto geopolítico de forma mais relevante.

A BRI se consolida através de fluxos econômicos, pelo que se

denomina de geoeconomia: o exercício de políticas econômicas visando

metas relativas ao interesse nacional, ou o uso de ferramentas

econômicas visando à obtenção de objetivos geopolíticos. Neste sentido,

a geoeconomia é uma forma de tentar manter o processo de ascensão

pacífica enquanto a China projeta a sua influência. Ainda que a BRI seja

uma manifestação da política externa de striving for achievement

(XUETONG, 2014), referente a uma posição internacional mais

assertiva da China, o elemento pacífico está presente, sobretudo na ideia

de promoção de valores e de um regionalismo aberto para a integração e

conectividade da Eurásia.

O resultado da BRI deverá depender da capacidade da China de

promover a legitimidade e aceitação da iniciativa junto aos países

membros, além de manter o ritmo dos investimentos. Devido às

preocupações com os ganhos relativos de outros atores, ou devido ao

receio com a inserção da China em esferas de influência

tradicionalmente ocupadas por outras potências, é possível que a BRI

encontre oposições. Isto se materializa como o risco de competição

geoestratégica com outras potências pelo exercício de influência

regional. A China capitaneou a criação de instituições internacionais

como o Banco Asiático de Infraestrutura e Investimentos e o Fundo da

Rota da Seda, que poderiam auxiliar mitigar estes riscos, além de

projetar a criação de valores comuns.

A BRI é um elemento muito relevantes para a estratégia China e

que possui o potencial de alterar o panorama do comércio, dos

investimentos e da distribuição de poder e influência sobre a Eurásia nas

próximas décadas. Portanto, a Nova Rota da Seda possibilitaria um aumento da zona de influência da China e a redução de sua dependência

estratégica no que tange à região do Mar do Sul para o escoamento de

recursos naturais e produtos com destino ao comércio global. A conexão

terrestre com a Europa e a articulação com a Ásia Central e com o

Oriente Médio, regiões ricas em recursos energéticos, poderão contribuir

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para o aumento da influência chinesa. Por sua vez, a articulação da

China com o Paquistão permitiria o acesso ao Oceano Índico, um

importante desenvolvimento geoestratégico.

Devemos ressaltar que, apesar de toda a discussão geopolítica,

não se pode esquecer que a BRI está baseada na cooperação para ganhos

mútuos (win-win) e no aumento do comércio. A ênfase da narrativa da

China para a criação de uma Nova Rota da Seda reside na ideia de um

espaço de diálogo, comércio, investimentos migração e intercâmbio de

culturas parece evocar genuinamente alguma correspondência com a

antiga Rota da Seda, desenvolvendo uma narrativa que enfatiza a

possibilidade integração entre os Estados e o estímulo ao

aprofundamento da globalização.

Não podemos realizar nenhuma afirmação categórica acerca do

modelo de integração que será efetivamente produzido pela BRI, visto

que a iniciativa se encontra em fase de planejamento e início de sua

execução. Esta pesquisa pretendeu situar a Nova Rota da Seda no amplo

processo de aumento da inserção internacional da China no século XXI.

Ao aportar uma visão global sobre o tema proposto, o presente trabalho

certamente possui limitações acerca de diversos detalhes que possam ser

abordados através da iniciativa. Permanecem questões a serem avaliadas

por pesquisas futuras: quais serão os impactos da BRI para cada um dos

cenários geoestratégicos que compõem a Eurásia?

Outra questão a ser abordada reside em focar nas relações de

comércio estabelecidas pela China com os Estados da Eurásia. Outro

rumo de pesquisa consiste nos possíveis impactos dos investimentos

chineses para a consolidação de cadeias produtivas regionais. Outras

pesquisas poderiam propor como objeto a Rota da Seda Marítima, de

modo a complementar o prisma analítico apresentado pela presente

dissertação.

Outro rumo de pesquisa consiste na realização de uma análise

acerca das ações dos Bancos Multilaterais envolvidos na BRI, no que

diz respeito ao financiamento de infraestrutura. Novas pesquisas

poderão abordar ainda as implicações dos corredores econômicos

compreendidos pela Nova Rota da Seda para as relações entre os

grandes atores que influenciam cada fragmento geoestratégico do grande

tabuleiro regional representado pela Eurásia. Neste sentido, a Nova Rota da Seda deve ser compreendida

simultaneamente como um plano econômico, com fundamentação em

interesses geopolíticos. A emergência chinesa deverá continuar de forma

pacífica, a depender da resposta de outros grandes atores, tais como a

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127

Rússia, o Japão, a Índia e os Estados Unidos da América, em relação aos

movimentos da China.

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