2010.Mes.hugo Bezerra Tiburtino

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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, LETRAS E CIÊNCIAS HUMANAS DEPARTAMENTO DE FILOSOFIA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM FILOSOFIA HUGO BEZERRA TIBURTINO O Problema do Bom em Geral para Aristóteles São Paulo 2009

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UNIVERSIDADE DE SO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, LETRAS E CINCIAS HUMANAS DEPARTAMENTO DE FILOSOFIA PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM FILOSOFIA HUGO BEZERRA TIBURTINO O Problema do Bom em Geral para Aristteles So Paulo 2009 UNIVERSIDADE DE SO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, LETRAS E CINCIAS HUMANAS DEPARTAMENTO DE FILOSOFIA PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM FILOSOFIA O Problema do Bom em Geral para Aristteles Hugo Bezerra Tiburtino Dissertao apresentada ao Programa de Ps-Graduao em Filosofia do Departamento de Filosofia da Faculdade de Filosofia, Letras e Cincias Humanas da Universidade de So Paulo, para a obteno do ttulo de Mestre em Filosofia. Orientador: Prof. Dr. Marco Antonio de vila Zingano So Paulo 2009 RESUMO TIBURTINO, H. O Problema do Bom em Geral para Aristteles. 94p. Dissertao (MestradoemFilosofia)FaculdadedeFilosofia,LetraseCinciasHumanas, Universidade de So Paulo, So Paulo, 2009. Na tica Nicomaquia I 6, 1096a 23-29, encontra-se um argumento que motivo dedebateentreoscomentadores.Eledeveriaprovarqueopredicadobom multvoco e, contudo, nenhuma interpretao at hoje conseguiu chegar a essa concluso de um modo claro e contundente. Ao estud-lo vrios outros assuntos vmtona:amultivocidadedoser,geneticismoaristotlico,apossibilidadede uma metafsica, a definio de bom, a analogia, entre outros. Nosso trabalho se dedica a explicar a razo da invalidade do argumento e a incursionar nos demais temasembuscadeumacorreosatisfatria.Apropostageralquenose pea que o argumento prove que bom tenha vrias definies, mas apenas que haja vrias realidades, referncias, possveis por meio desse predicado. ABSTRACT TheargumentinNicomacheanEthicsI61096a23-29istheprincipalsubject-matterofmywork.Ithasbeenregardedasafallacysincethemodern commentary: although we would expect a prove of the equivocity of the good, this conclusionisntreached.Myaimistoexplaintheproblemandtoproposean answer; I claim that the conclusion must be understood as a multiplicity of natures rather than of definitions. I discuss severed related themes like the homonymy of being, development of Aristotles thought, possibility of metaphysics, definition of goodness and the analogy. SumrioNOTAS SOBRE O TEXTO..................................................................................... 6 PRLOGO............................................................................................................. 7 QUESTO DA MULTIVOCIDADE DO BOM.......................................................... 9 O quadro............................................................................................................. 9 O argumento..................................................................................................... 10 A proposta........................................................................................................ 14 O contexto........................................................................................................ 15 O problema....................................................................................................... 19 Interpretao meramente predicativa da exemplificao e sua crtica ............. 20 Interpretao identificadora da exemplificao e sua crtica............................. 23 Interpretao criteriolgica e sua crtica........................................................... 26 Interpretao atributiva da universalidade nica............................................... 28 Convencendo um platnico.............................................................................. 31 Homonmia e Multivocidade.............................................................................. 33 NOTAS SOBRE A MULTIVOCIDADE DO SER................................................... 38 A prova do geneticismo aristotlico.................................................................. 38 Conexo focal entre a homonmia total e a sinonmia...................................... 45 Caracterizao da conexo focal...................................................................... 47 O ser entre a sinonmia e a homonmia total .................................................... 53 O ser e a conexo focal.................................................................................... 57 Isopredicabilidade............................................................................................. 60 Uma dificuldade................................................................................................ 67 O QUE SABEMOS SOBRE O BOM UNIVERSAL ............................................... 69 Uma histria da cincia do bom........................................................................ 70 Mas ento, como dito?................................................................................ 77 Bom e analogia................................................................................................. 83 Bom e causa final ............................................................................................. 85 A possibilidade de uma cincia do bom............................................................ 86 Concluso......................................................................................................... 88 BIBLIOGRAFIA CONSULTADA........................................................................... 90 5 Deus,nicosenhor,razodetudo,nomepermitaquemedesviepelo que no teu e, se te agrada, recebe meus agradecimentos. Agradeoeternamenteaosmeuspais,AntonioeJ osina,peloamor exemplar e pela educao impagvel. Aos meus irmos Andr e Lucas e a todos meus familiares, por formarem aquilo que h de bom em mim (os erros so todos culpa minha). Quero agradecer em especial a Geane e Carlinhos, primos que no conhecia antes de vir para So Paulo; o acolhimento deles me ajudou a no me sentir to distante de minha origem. Meusprofessoresdetodasaspocas,agradeo-osdofundodeminha alma; sem eles no seria sequer feliz. Meus amigos de Recife e So Paulo me deram desde incentivo a desafios; so todos igualmente presentes na minha vida e na minha formao. Agradeo a todos.Emparticular,aArturReig,BrunoBrigattoelvaroGaldos,porserem como velhos amigos apesar de nos conhecermos por to pouco tempo. Dedico meutrabalhominhagrandeamigaAnglicaAlves:suadedicaoanossa amizade me ensinava a ser menos chato e a dar valor ao que realmente importa; falha minha se no aprendi AgradeoaosfuncionriosdaUSP,aosdabibliotecadaFFLCHes secretrias da Filosofia; a competncia de todos oferece o bsico para qualquer trabalho. Em particular, s secretrias Marie, pelo cuidado constante com todos ns, e Maria Helena, pelo cuidado comigo principalmente no incio. Agradeo a Marco Zingano pelo acolhimento, pelo apoio e pelo exemplo. A AlfosoCorrea-MottaeLuizHenriqueLopesdosSantospelascerteirase edificantes crticas na qualificao. AgradecimentosCAPES,quemeproveionoincio,eFAPESP,pelo restante da bolsa. 6 NOTAS SOBRE O TEXTO Obras de Aristteles abreviadas Ttulo (outros nomes)Abreviao Analticos Anteriores (Analticos Primeiros)An. Ant. Analticos Posteriores (Analticos Segundos)An.Post. CategoriasCat. tica Eudmia (tica de Eudemo, tica a Eudemo)EE tica Nicomaquia (tica de Nicmaco, tica a Nicmaco)EN MetafsicaMet. TpicosTp. Para evitar confuso entre uma obra de Aristteles e a cincia homnima, fizemosaseguintedistinogrfica:quandofalamosdaobradeAristteles, fizemo-locomletrainicialmaisculaeemitlico(porexemplo,tica Nicomaquia,asticas,Metafsica);quandotratamosdacincia,docorpo cientficoindependentedotextoaristotlico,usamosaletrainicialminscula (p.ex.: a metafsica, a tica). Anoserquesedigaocontrrio,todasastradueseminglsforam extradasdoTheWorksofAristotle,pordiversostradutores,dirigidaemDavid Ross no comeo do sculo XX. Essas tradues so largamente difundidas em diversas reimpresses; usamos, porm, a verso original, sem correes. J as traduesparaoportugussotodasnossas,comajudadastradues consultadas(verBibliografia);porvezes,optamosatraduoamaisliteral, mesmocomprejuzodainteligibilidadedotexto:almdanossaescassezde conhecimento em grego, fizemos isso para tornar clara dificuldade. Para citao dos comentadores, preferimos repetir o ttulo da obra (p.ex.: FINE,OnIdeas,p.8)aoinvsdadatadeedio,comocomumhoje(FINE, 1993, p.8).7 PRLOGO O aristotelismo hoje um rico quadro em que encontramos vrios tipos de literatura:longosdebates,comentrioscuidados,anliseslgicasouencontros com outras correntes apenas do uma idia da riqueza terica que o aristotelismo alcanounosculoXX.Variadaproduonoexclusividadedeumas corrente filosfica, mas sem dvida a sua a mais significativa, porque de todas asfilosofias,adeAristtelesefoi,delonge,amaisestudada,aquemais produziu comentrio, e por isso seria de se esperar que no houvesse nada de novo a dizer sobre ela; como no h tal silncio, muito pelo contrrio, cada vez se escreve mais sobre o Aristteles e nasmais diversas abordagens, isso prova a fonte inesgotvel de reflexes que o seu pensamento. Essa profuso erigiu todo um novo edifcio sobre a filosofia aristotlica. E o edifciopossuivriosapartamentos,cadaqualresidindoumbomnmerode gente: hoje se pode dividir os temas em vrios pequenos debates, de vrias reas especficas,cadaumacomumbomnmerodecomentadores.Acincia aristotlica,sepodemosfalarassim,isto,oestudodafilosofiadoEstagirita possuidiversosramos,diversosbraos,emquealeituradecertostextos obrigatria, mas relativamente independentes entre si: um comentrio sobre tica Eudmia nem sempre ajuda quem quiser se informa sobre o De Coelo. Todo esse prdioterico,omaisaltodahistria,seriaassustadorsenofosseporuma caracterstica: no h uma ortodoxia que decida o que certo ou errado de se falar sobre Aristteles. Sem dvida que muitas interpretaes tomam Aristteles deummodopobreemesmoasqueointerpretamcomvigornegligenciam aspectosimportantes.Masasdiscussesrecentesemtornodeleforamfeitas combastantesutilezaebomsenso,demodoqueumjuizintransigente,por assimdizer,desnecessrio.Porissoqualquerumpodeparticipardo aristotelismo e trazer novas teses, desde que se informe do que foi feito antes, mantenha o bom senso para no sair do tema e guarde honestidade de aceitar as limitaes de suas teorias. nesse quadro que essa dissertao se insere. umahumildemonografia,nopoderiaapresentargrandesqualidades. Tudooqueelafaztomarumdessesdebatesdoaristotelismo,umsimples problema,etentar,noresponderdefinitivamente,maslevaradiscussopara 8 frente,avaliarasposiesdocomentrioqueatrouxetonaeconsideraras consequncias.Nesse processo, passaremos por outros apartamentos para que essa visita no seja curta demais. Pela liberdade, incentivo mesmo, para lanar teses,nsdefendemosasnossas;maisdoqueresponder,elasservem(ou deveriamservir)paradeixaradificuldadepatente,oupelomenos,uma abordagemdadificuldade.Emboransacreditemosquedefatohajauma resposta, ou pelo menos uma satisfatria, ns sabemos que ela no est aqui ou nocompletamente;porissonossapretensonoterminaraquesto,mas mostrar a riqueza de somente um ramo de discusso peripattica. Da esperamos que o leitor perceba que filosofia aristotlica hoje em dia no mais uma coisa cansadaeultrapassada,masumafonterealmenteinspiradoradepensamento rigoroso e renovado. 9 QUESTO DA MULTIVOCIDADE DO BOM O quadro Desde1951,graasfinapercepodeJ oachim,oargumentoque provariaamultivocidadedobompormeiodascategoriaspassouapreocupar grandesmentesdoaristotelismo.NomescomoHardie,Kosman,Ackrille MacDonald deixaram suas idias na tentativa de responder uma, alis, prosaica questo:comosedoargumento?Comoentendersuaspremissasparaque chegue concluso? Parece uma coisa fcil, que bastaria umas anlises lgicas paraserresolvida,maspelovistono,halgodeverdadeiramente problemticoa.Tantohque,apesardecadaumdessespensadorester acolhido os pontos de vista dos anteriores, feito crticas e apresentado sua prpria teoria solucionadora, ainda assim o problema persiste e at hoje est em aberto.Naverdade,tamanhadificuldadeparafech-loestdandoaimpressodeque no existe um modo correto de entender o argumento; Shields e Santas1, ltimas palavrasnoassunto,decretaramaimpossibilidadedeencontrar-lheumaforma lgica aceitvel: pese o que pesar, Aristteles teria cometido uma falcia.

1Essessoosautoresconsideradosjclssicosnaquesto:J OACHIM,Harold.The Nicomachean Ethics: A Commentary. Oxford: Clarendon Press, 1951. HARDIE. Aristotles Ethical Theory. Oxford: Clarendon Press, 1968.p. 56-8. KOSMAN, L. Predicating the Good. Phronesis, v. 2,n.8,1968.p172-4.ACKRILL,J ohn.AristotleonGoodandtheCategories.In:Islamic PhilosophyandClassicalTradition.Columbia,S.C.:UniversityofSouthCarolinePress,1972. pp.17-25. (Reimpresso em Articles on Aristotle. Vol. 2. Londres: Duckworth, 1975-9. p. 17-24 e em ACKRILL.EssaysonPlatoandAristotle.Oxford: ClarendonPress,2001).MACDONALD, Scott. Aristotle and the Homonymy of the Good. Archiv fr Geschichte der Philosophie, v. 71, p 150-174, 1989.SHIELDS,Christopher.OrderinMultiplicity:HomonymyinthePhilosophyofAristotle. Oxford: Clarendon Press, 1999. Captulo 8, tpico 8.3 e 8.4. SANTAS, Gerasimos. Goodness and Justice: Plato, Aristotle, and the Moderns. Oxford: Blackwell, 2001. Captulo 6, tpico 2. SANTAS tambmpublicouumartigo(Aristotle'sCriticismofPlato'sTheoryoftheGood:Ethicswithout Metaphysics.PhilosophicalPapers,set.1989)aoqualnotivemosacesso.Almdeles,temos timas contribuies de WOODS. EudemianEthicsBoolsI,IIandVIII. Oxford: Clarendon Press, 1982. p.70-5. URMSON, J .O. AristotlesEthics. Oxford: Blackwell, 1988. p. 23 e SANTA CRUZ, Maria Izabel. Sobre a Homonmia do Bem. Analytica. vol. 8, n 2, p. 91-113, 2004. Disponvel em: . Note-se que, embora o argumento fosse estudado desde a antiguidade, apenas no sculo XX que se tornou um problema. 10 O argumento O problema que primeira vista se afigura o de falcia. preciso retirar essapechadoargumentoetorn-loaceitvelnovamenteou,seforocaso, mostrar onde est raiz do problema e explicar por que impossvel corrigi-lo. Existemtrslugaresaolongodocorpusaristotliconosquaissetenta provar que, a partir das categorias, ao bom falta-lhe unicidade. Como a Grande ticaouMagnaMoralia,(I3,1183a9-12)aindaconsideradaumaobra inautntica,ficardelado.Foraesta,umaformulaoseencontranatica Eudmia (EE): Next, however much there are Ideas and in particular an Idea of good, they are perhaps useless with a view to a good life and to action. For the good has many senses, as numerous as those of being. For being, as we have divideditinotherworks,signifiesnowwhatathingis,nowquality,now quantity,nowtime,andagainsomeofitconsistsinpassivity,somein activity;andthegoodisfoundineachofthesemodes,insubstanceas mind and God, in quality as justice, in quantity as moderation; in time as opportunity, while as examples of it in change, we have that which teaches and that which is being taught. As then being is not one in all that we have just mentioned, so neither is good; nor is there one science either of being or of the good. (1217b25-35) AocontrriodaMagnaMoralia,estaticaperdeuodesonrosottulode inautntico aps o monumental estudo de J aeger2. Apreciaes recentes a pem numa fase intermediria de Aristteles, numa poca em que estava desiludido de qualquerpossibilidadedeumacinciadoser;apenasmaistarde,poralguma razo ainda muito debatida, ele teria retomado a f numa tal cincia e escrito a Metafsica.Isso,porm,assuntoparaoprximocaptuloeporenquantos ajudaaentenderasdiferenasqueguardacomaoutraformulao,adatica Nicomaquia (EN): Ademais, uma vez que o bom se diz de modo igual que o ser, pois bom dito no qu, por exemplo, Deus e intelecto; no qual, as virtudes; no quanto, a mediania; no quando, o oportuno; no onde, o lar e o mesmo nas demais.

2 Aristoteles: Grundlegung einer Geschichte seiner Entwicklung. Berlin: 1923. (Aristteles. Mxico: Fondo de Cultura Econmica) 11 Por isso, no um comum universal e nico: pois no seria dito em todas as categorias, mas em apenas uma.3 Essa passagem ser o principal objeto de estudo aqui, tanto por ter sido justamenteelaomotivododebate,quantoporadmitiramaioriados comentadores que ela pertence a uma fase mais madura do filsofo. Como se v, o texto apresenta dificuldades nos prprios termos: muitos deles so de conceitos pesadoseamplamentediscutidos.Almdisso,possibilidadesinterpretativasde suas frases so muitas e fazer escolhas mantendo a coeso um grande desafio. Contudo, apesar desses percalos, pelo menos a estrutura argumentativa clara. Abaixo firmaremos a forma pura do argumento, tanto de suas proposies quanto deseusraciocnios;paraisso,tiraremostodosostermosindividualizanteseos deixaremoscomoincgnitas;esseprocedimentonecessrioparapodermos identificar o ncleo do argumento, o raciocnio exato que est sendo usado. Aps desmembrar o texto, temos as seguintes proposies simples. i)X dito de igual modo que Y (isopredicabilidade) ii)X dito na categoria C (categorialidade) iii)A (exemplificao) iv)X universal (universalidade) v)X nico (unidade) No texto, iv e v esto conectados, por isso chamaremos de universalidade nica; por tambm estar negada como um todo (bom um comum no universal enico),chamaremossuanegativadenegaodauniversalidadenica.No finaldotextoaquantidadedecategorialidadessetornadecisiva:obom,como no dito em apenas uma categoria, mas em todas, no pode ser um universal nico.Batizemosdeexclusividadecategorialoserditoemapenasuma categoriaedetranscategorialidade,emtodas.Porfim,estamosconsiderando que Deus, intelecto, virtudes, mediania etc. so exemplos e por isso a proposio

3 Transliterando o original: ti d epe tagathon isachos lgetai toi nti (ka gar en toi t lgetai, hoon ho thes kai ho nos, ka en toi poioi hai areta, ka en toi posoi to mtrion, ka en toi prs ti t chresimon, ka en chrnooi kairs, ka en tpooi daita ka htera toiata), delon hoos ouk n eee koinn ti kathlou kai hn: ou gr n elget en psais tas kateegorais, all en mii mnee. No existe variao entre os manuscritos. 12 que os envolve chamada de exemplificao (iii); note-se que, tal qual no texto, elamuitolacunar:noestclarocomonemcomoqueosexemplosso relacionados. Aseguirestoospassosargumentativosprincipais.Realmenteessa ordem no apresenta dificuldades, ainda que suas proposies sejam passveis de vrias interpretaes. 1)Se exemplificao, ento categorialidade; 1.1)Se exemplificao total, ento transcategorialidade; 2)Setranscategorialidade,ontoisopredicabilidade(isto, isopredicabilidade sendo Y=ser); 3)Se universalidade nica, ento exclusividade categorial; 3.1) Como transcategorialidade, negao da exclusividade categorial, logo negao da universalidade nica. TemosaaformulaopuradoargumentoportrsdeEN1096a23-29. QualqueroutroitemquepudersubstituirXserpassveldamesmaconcluso. Vamosbatiz-lodeArgumentodaExclusividadeCategorialou,quandono estivermos com senso esttico, de Argumento Ontoisopredicativo4, se bem que o ontoisopredicativo um tipo de argumento da exclusividade categorial, pois pode haver itens que so ditos em mais de uma categoria, mas no em todas. Ora,omaisimportantedetodaessaanlisedeixarbemclaroqueo passo decisivo se encontra no 3. a que se d o arremate, antes do qual no havia como concluir a multivocidade do bom. Ainda que todas as demais partes doraciocniofossemduvidosas,aindaqueasoutrasproposiesfossem completamentehermticas,sensforpossvellanarumaboainterpretao sobreauniversalidadenicaeaexclusividadecategorial,entoserdadoum largo passo em direo resposta.

4OsnomesdadospeloscomentadoresforamArgumentopelaHomonmiaeArgumento Categorial. MACDONALDpadrinhodo primeiro (Aristotleandthe Homonymyofthe Good,p. 194);SHIELDS,dooutro(OrderinMutiplicity,p.150).SANTAS,apesardeseguirdeperto SHIELDS,preferiuoprimeiro(GoodnessandJustice,p.200).Essesnomesnoso,todavia, muitoconvenientes,poisseporumladoumnomeapenasumnome,poroutropodelevara confuses,jqueascategoriastmalgumpapelnosargumentosdaslinhasanteriores(EN 1096a17-23)eposteriores(a29-34).J ahomonmiatalveztenhaalgumarelevnciano argumento a29-34 e em b7-26. 13 Curiosamente,noentanto,oscomentadoresseconcentraramna exemplificao (iii): perplexos com esse lacunar, enigmtico at, enunciado, eles selanaramacomplet-loeesclarec-lo.Ecomoaexemplificaoest intimamenteligadacategorialidade(ver1),elesacabavamresvalandonesse tambm. Mas, acabamos de ver que o passo principal no tem a ver com um nem tantocomoutro:comefeito,3nofaladosexemploseacategorialidade exatamentenoimportantemassimaquantidadedecategorialidades:seo predicado estiver em mais de uma (ou em nenhuma!) categoria, ento no ser universal e nico. J a universalidade nica, exceto por MacDonald, nenhum dos comentadoresdeuatenoaela.Suainterpretaosemanteveintocadaao longo dos sculos, ou, no mximo, levemente diferente: ser um comum universal e nico significa ser sinnimo e no o ser, homnimo5. Veremos adiante o que sinonmiaehomonmia,maspodemosanteciparqueelasdizemrespeitoa definies (logoi): quando duas realidades referidas pela mesma palavra possuem definies iguais ento so sinnimas; quando as definies so diferentes entre si,homnimas.Porexemplo,papelsinnimoquandoditodestafolhaeda seguinte;porm,mangahomnimoquandoditodafrutaedeumaparteda camisa. Desse modo, sempre se acreditou que a concluso do argumento exigia a prova de que a bondade tem vrias definies. precisotermuitocuidadoparanocairnumerrocomumenoqual, inclusive,acarretaram-sementestreinadas6:oargumentononecessariamente querdizerquebomteradefinioemcadacategoria,comosebomfosse substncianumcaso,qualidadenooutroeassimpordiante.Pensandoassim, bom estaria nas dez categorias. Pelo contrrio, o texto s conclui que bom no universal,estandoounoemmaisdeumacategoria;comefeito,bompoderia

5Na verdade, todos tomam cuidado de falar de multivocidade, que seria a expresso acordada atualmente para se referir a pollachos legomenon, mais adequada passagem. Mas eles parecem entendercomosefossehomonmia,oupelomenosumainterpretaodehomonmia(Cf. MACDONALD,op.cit.p.153-159).Onicoquequestionoudiretamentesobreosentidoda negaodauniversalidadenicafoioutroestudioso,comentandoaMetafsica:KIRWAN, Metaphysics,booksG,DandE.2ed.p.85.Retornaremosaessepontonofimdoprximo captulo. 6AlexandredeAfrodisia,noseucomentrioaumapassagemnosTpicos,concluiqueobem estarianasdezcategorias(AlexandriinTopicorum,I15,57.30),obviamentetendoaticado lado, j que nos TpicosI 15 Aristteles no lana mo de todas as dez e, mais explcito ainda, Eustrato fala que o ser seria dito de dez modos, assim como o bom (Eustrati in Eth. Nic. I 8, 11v 19). Ver nota 16. 14 estarsnumacategoriadigamos,adequalidadee,aindaassim,noser universal e nico. A proposta Nessecaptuloserofeitasduascoisas:primeiro,rastrearafontedo problema e, segundo, sugerir uma mudana de interpretao. Veremos que, ao invsdalacunarpremissa,oproblema,aquiloqueimpediaquequalquer interpretao do argumento fosse bem sucedida, est na concluso, na negao da universalidade nica. Em primeiro lugar, ela problemtica porque precisa ser efetiva contra um platnico. J usta exigncia, alis, j que todas as ocorrncias do argumentosoemcontextospolmicoscontraPlatoesubtende-sequetoda contra-argumentao deve ser aceita pelo adversrio desde suas premissas at a concluso. Mas ento, o que que o prprio predicado bom tem que o impede de serumaIdia?Oumelhor,quecaractersticaindesejadaprecisatera multivocidade para negar ao bom o status de Idia? Com certeza, no pode ser qualquer caracterstica a ponto de permitir uma idia de bom. Em segundo lugar e justamenteporisso,aconclusoproblemticaporque,querendoserefetiva contraumplatnico,considera-sequehomonmiaamelhorcrtica.Nada repugna mais um platnico do que a multiplicidade, mais ainda uma multiplicidade dedefinies.Noentanto,tentandonoserfracaaconclusoacabouficando forte demais: alcanar a homonmia mais difcil do que parece, mesmo usando ascategorias.Mas,mesmoprecisoquesetratedevriasdefiniespara conseguir a crtica Idia de Bom? No h outro modo de interpretar a negao dauniversalidadenica?Defenderemosque,aoinvsdeumavariedadede definies, a multivocidade consiste numa variedade de naturezas referidas pelo bom;cadatipodecoisapossuiumanatureza,umarealidade,prpriadaquela coisaqueatornaboa.Oargumento,ento,buscaapenasprovarquebomse refereaumavariedadederealidadeseissoprovvelporumacaracterstica predicativa do bom: seus campos de aplicao, seus sujeitos, so itens de todas as categorias. 15 O contexto Todasastrsapariesdoargumentosoemcontextospolmicosnos quais o principal alvo Plato e/ou os platnicos. Nas trs ticas o autor comea a busca pela definio do fim ltimo da vida humana, a felicidade, analisando as concepesmaisaceitaspelovulgoepelossbios.Apscrticassopinies vulgares, ele passa aos sbios, pois algum pode propor que alm desses vrios bensexisteumoutroqueexistenteporsimesmoecausadosdemais (1095a26-8); no entanto, embora pudesse ter em conta outros grandes filsofos (p. ex.: a Empdocles e Anaxgoras so atribudas teses cosmolgicas do bem emMetafsica XI 10) o autor quase que se resume a Plato. Questiona-se, e com razo, se o alvo mesmo Plato ou se o platonismo em geral, pois algumas teses nosomuitoafinssqueaparecemnosDilogos;aprpriaBondade,na Repblica (357b-c), por exemplo, no exatamente uma Idia, mas algo superior s idias. Para no acusar Aristteles de falta de entendimento ou desonestidade intelectual muitos preferem que o alvo seja o platonismo em geral, as concepes correntes na Academia, e no as presentes nos Dilogos7. Mas, mesmo que haja desarmonia com as doutrinas do prprio Plato, o Estagirita pode ter suas razes para deturpar assim, razes mais justas do que falta de entendimento: ele pode considerar,porexemplo,quedefenderumaIdiadoBomumaconsequncia lgica do pensamento de Plato. Seja como for, assume-se uma Idia de Bom e preciso estudar se ela tem alguma serventia para a felicidade humana. Vrias so as crticas, divididas em dois grandes grupos: num primeiro momento, o filsofo mostraquenodeveriahavertalIdia,poisopredicadogeraldebomnoa propicia;emseguida,elemostraque,mesmoquehouvesse,elanoteria

7 HARDIE (Aristotles Ethical Theory, p. 47s): Some of the arguments used in the chapter are used elsewhere in contexts where Plato is named or is clearly intended. The Republic teaches that the Form of the Good has a unique status. Stewart thinks that the arguments of the chapter are not relevant (entirely beside the mark) to the doctrine of the Republic, and draws the unacceptable conclusionthatAristotleisattackingnotPlatostheorybuttheformalismoftheplatonicschool [Notes on the Nicomachean Ethics of Aristotle. Oxford: 1982] (i.74). [] But the assumption that, in thischapter,AristotleaimshiscriticismatPlatoandnotthePlatonists,doesnotneedtobe supportedbyevidencethatPlatowas famousforthedoctrine abouttheGood.FortheGoodis discussed here as a Form, and Aristotle represents Plato as the author of the theory of Forms. Ainda que o texto da tica Nicomaquia fale no plural, isso apenas um efeito retrico, podendo se referir a apenas uma pessoa, Plato no caso, como em Metafsica 978a29-b8. Cf. TARN, L. Amicus Plato sed Magis Amica Veritas. In: CollectedPapers (1962-1999). Leiden, Boston, Kln: Brill, 2001. p. 8s. 16 nenhuma utilidade para a ao humana. No primeiro grupo, a concluso sempre umacaractersticacontraditriacomaprpriaIdia.Depoisdascrticasede algumasconsideraes,oautorparteparaaquiloaquehaviasepropostono incio, o conceito de felicidade, s que desta vez com uma atitude positiva. Entre o captulo 6 do livro I da tica Nicomaquia e o captulo 8 do livro I da Eudmia, ambos dedicados crtica de Plato, h srias diferenas. Por acaso, o argumentodaexclusividadepareceidntico,anoserporumdetalhe:na Eudmia negada a existncia de uma cincia do bom em franco contraste com a Metafsica (tratado este da cincia do ser). Mas isso ser motivo de discusso no prximo captulo. H tambm outras contra-argumentaes que podem ajudar-nosaentenderoargumentodaexclusividadecategorial,emparticular,na Nicomaquia,osdaslinhas1096a17-23ea29-34eutiliz-los-emosquandofor necessrio. Aquestodeoquofiisaopensamentoplatnicoapassagemno deve nos preocupar: o importante que o prprio Aristteles de fato creia que sua exposio aceitvel por um platnico honesto. Aristteles com certeza derivou muitas de sua terminologia da sua poca acadmica e no de se espantar que eleasofistiquequandosesentirconvencidodisso8.Almdomais,aanlise rigorosa dos argumentos e a definio exata so heranas do prprio Scrates e sePlatodisseralgopassveldecorreocomnovostermos,termosmais rigorosos,oEstagiritanosefurtardefaz-lo.Mesmoassim,pelomenoso

8Aquestodacorrespondnciadascrticasaristotlicasjgerougrandesembates.Amelhor expresso do problema foi dada por GAIL FINE: In assessing Aristotles criticism of Plato, we are often asked to choose between the horns of the following dilemma: either Aristotle interpreted Plato correctly, in which case the theory of forms is inconsistent; or else he misinterprets Plato, in which casePlatoisinvulnerabletohiscriticism(OnIdeas.Oxford:ClarendonPress,1993p.28). Poderamos exacerbar o dilema, substituindo a segunda alternativa por ou Aristteles interpreta mal Plato e nesse caso, ele simplesmente no entendeu a filosofia que estudou por pelo menos vinteanos.inegvelquealgunsretratos detesesplatnicas nocorrespondemsdoutrinas presentes nos Dilogos, muitas vezes, inclusive, expressando o contrrio; por exemplo, no Sobre asIdias Aristteles diz claramente que os platnicos no aceitam Idias de objetos fabricados (AlexandredeAfrodisia,ComentrioMetafsica.79.19-80.6),masnaRepblicaX(596a) exemplossodadosjustamentecomartefatos.Mascomoexplicaressasemfazerinjustiaa esses grandes filsofos diferena que se d a questo. Sobre esse tema h, alm do On Ideas, asduasobrasprincipaisdosculoXXacercadascrticasaristotlicas:ROBIN,L.LaThorie platonicienne des ides et des nombres daprs Aristote. Paris: Felix Alcan, 1908 e CHERNISS, H. F.AristotlesCriticismofPlatoandtheAcademy.Baltimore:TheJ ohnHopkinsPress,1944; reimpressoNewYork:RussellandRussell,1962.VertambmOWEN.DialecticandEristicin TreatmentoftheForms.Idem(ed.)AristotleonDialectic:TheTopics.Oxford:1968.p.103-25 (SymposiumAristotelicum) (Reimpresso em NUSSBAUM, M. (Ed.). Logic, Science and Dialectic. Ithaca (NY): Cornell University Press, 1986 p.103-25) 17 germe de algumas teses que aparecem no texto pode ser apontado em Plato: o Um de Muitos (p.ex.: Repblica596a6-7, Parmnides 132a1-4), a ntima relao entre Ser e Bom (p.ex.: Repblica 509b) e as Categorias (p.ex.: Filebo 14e209). Paraevitarmalentendidosfaremosaseguintedistino:umacoisaa concepoplatnicadebomnissoemnenhummomentoaprofundaremos nessa monografia , outra a concepo que Aristteles faz de Plato sobre esse assuntoe,paraoEstagirita,suaterminologiaeargumentaosoboaso bastante para serem aceitas pelo mestre10. bem sabido que a crtica a Plato um dos expedientes mais comuns ao longododesenvolvimentointelectualdeAristteles.Emquasetodasassuas obraspossvelencontrar,quandopouco,discussescomseumestre,mas normalmente, crticas severas. Dentre outras teses platnicas, as Idias a que delongemaissofreobjees,rendendo,inclusive,umaobradedicada especialmenteaisso,oSobreasIdias(DeIdeis,PeriIdeon).Poracaso,o originalfoiperdido,masumaboaparteficoupreservadanumcomentriode AlexandredeAfrodisia(InMet.79.3-85.12,ed.Hayduck)queumaparfrase fiel11. A estrutura da obra clara: num primeiro momento dada prova platnica de que existem Idias, em seguida vem a contra-argumentao mostrando que o argumentonotemsucessoe/oulevaamaisconclusesdoqueumplatnico estariadispostoaaceitar;nasticas,poroutrolado,v-seapenasacontra-argumentao,simplesmenteporqueaexistnciadaIdiadoBom pressuposta12.NoSobreasIdiasencontramoscincoargumentosafavordas

9 Quanto ao Um de Muitos no platonismo e no aristotelismo, ver discusso de FINE em On Ideas, p. 110-3. Quanto relao ser-bom, ver SANTAS, (GoodnessandJustice, p. 171-8). Quanto s categorias, BURNET. (The Ethics of Aristotle. Londres: Methuen, 1900. Introduction, p. xlviii-lii). 10Essamonografiasedetertosomentenoaristotelismoe,apesardasrpidascitaesdos Dilogosnessetpico,nemsequerespiaremosasdoutrinasplatnicas.Tambmnooptamos pela sada fcil mas possvel, que seria dizer que o argumento inconsistente porque Aristteles retratatesesplatnicasque,porsuavez,soinconsistentes.Noseriaaprimeiravezqueo EstagiritaacusaPlatodeargumentarerradamente(verabaixo),masissonoocasoaqui porque as teses so importantes tambm para Aristteles. 11 O Peri Ideon tinha duas partes, a primeira com os cinco argumentos e a segunda lidando com a heterodoxa teoria das Idias de Eudoxo, fora outras questes; aqui estamos nos detendo apenas naprimeiraparte.H,porm,duasediesdocomentrio,bemdiferentesentresi,arecensio vulgata e a recensio altera, sendo a primeira mais aceita e estudada. Alm do j On Ideas de GAIL FINE, que o melhor estudo sobre esta obra, h a traduo de SANTA CRUZ, MARIA ISABEL; CRESPO,MARIAINSeDICAMMILO,SILVANA.LasCrticasdeAristtelesaPlatnenel Tratado Sobre las Ideas. Buenos Aires: Eudeba.12NessepontodifcilconcordarcomVERBEKE(Lacritiquedesidesdanslthique Eudmienne.In:MORAUX,P.;HARLFINGER, D. (Ed.).UntersuchungenzurEudemischeEthik. 18 Idias,seguidosdosrespectivoscontra-argumentos,algunsdosquaisse assemelham aos contidos nas ticas; por exemplo, o da cincia e o dos por si e por outro. Apesar das semelhanas so as diferenas que mais chamam ateno: em primeiro lugar, como j notado, as ticas tratam de uma Idia em particular ao passoqueoSobreasIdiashcrticasIdiaemgerale,emsegundo,as categoriasnoaparecemnotratadodasIdias;porcausadissonosabemos, comtodasasletras,qualopontodacrticadoargumentoontoisopredicativo, qual exatamente a caracterstica que o predicado geral do bom tem que uma Idia no pode ter. O mais provvel que, de alguma forma, a multivocidade fira oprincpiodoUmdeMuitos;afinalumdosrequisitosdasIdiasqueelas possuam uma unidade a que todas as suas instncias se remontem; se a Idia for mltipla, ento as coisas que dela participam seriam as mais diferentes e a Idia no contribuiria em nada para o conhecimento delas. Isso fica mais claro ao ler o argumento, supostamente platnico, do Um de Muitos: If each of the many men is a man, and if each of the many animals is an animal, and the same applies in the other cases; and if in the case of each oftheseitisnotthatsomethingispredicatedofitselfbutthatthereis something which is predicated of all of them and which is not the same as anyofthem(oudeniautntautonon),thenthisissomebeingbesides (para) the particular beings which is separated from them and everlasting. For it is in every case (aei) predicated in the same way of all [homois katgoretai]thenumericallysuccessive(tnkatarithmon allassomenn). And what is one in addition to (epi) many, separated from them, and everlasting is an idea. Therefore there are ideas. (80.9-15. Traduo Gail Fine. Grifo e colchetes nossos) Se interpretarmos a parte grifada como um apelo unicidade, ento esse justamente o ponto de crtica aristotlica: o conceito de bom no predicado do mesmo modo. Portanto, no h como ter certeza que existe tal idia. Seria como se algum, aps comear a construir um prdio, revisse os clculos e descobrisse um erro, um clculo mal feito, de modo que s poder manter o prdio se mudar

Berlin:WalterDeGruyter&Co,1971.p135-156.),quepretendeencontrarumacrtica propriamente tica (ou seja, cujas bases seriam a prpria viso de tica imanente de Aristteles) para explicar por que a crtica a Idia do Bem no aparece em outras obras do corpus. A nosso ver, a explicao est simplesmente no escopo de discusso: no Sobre as Idias e na Metafsica no cabe criticar uma Idia especfica, ao contrrio das ticas. 19 alguma coisa. Da mesma forma, ou a Idia de Bom no era para existir ou, se se insiste na sua existncia, sero precisos novos argumentos. O problema Mas, se por um lado o oponente no um platnico ortodoxo, mas um digamos assim platnico de veia aristotlica, pronto para aceitar conceitos e proposiespoucocondizentescomadoutrinaoficialdaAcademia,poroutro, no h por que supor que ele seja conivente, que qualquer argumento vai passar semomenorquestionamento.Umaboadosedoproblemasentidaquando levamos a srio o contexto polmico e exigimos que o argumento esteja alm de qualquer dvida. Masqualoproblemadapassagemexatamente?Oproblemade falcia,ouseja,oargumentonochegaconclusoproposta.Porm,esse problema muito mais dos comentadores do que do prprio texto. Com efeito, no quadrodadiscusso,cadacomentadorapenasmostravaasdificuldades incorridaspelainterpretaodoanteriore,ento,propunhaumanovaque,por suavez,eraafastadaesubstitudapeloposterioreassimsucessivamente. Inclusive,aquelesquedecretaramainvalidadedoargumentonotentaram mostrarissonoprpriotexto,masapenassupuseramque,comoningum conseguiu interpret-lo bem, o prprio filsofo teria cometido o erro. Ento, qual o problema do argumento, exatamente, e no dos comentadores? Parachegarmosaocernedoproblema,aquiloquenaprprialetrade Aristtelestemimpedidoqueasinterpretaesacertem,analisaremosas correntes gerais de interpretao. Mas antes precisamos entender a acusao de queeleestsofrendo.Oqueafinalumafalcia,umargumentoinvlido?Na verdade,atcontraditriofalarassim,pois,seinvlido,arigor,noseriaum argumento. Ora, existem diversos tipos de falcias, mas todas compartilham da mesmacaracterstica:aconclusopretendidanoalcanada.Umexemplo simples : Premissa Maior:Todo animal ser vivo Premissa Menor:Homem ser vivo 20 Concluso:Homem animal claro que, apesar de todas as suas premissas serem verdadeiras, no se pode dizer que a concluso se siga necessariamente, afinal, no pelo fato de o homem ter vida que devemos concluir que ele animal. Simplesmente no est correta a organizao dos termos homem, animal e vivo. O erro fica claro ao substituirmoshomemdapremissamenorporrvore,quetambmumser vivo,eassistirmosatnitosaconcluso,falsa,dequervoreanimal.Uma concluso no necessria devido a uma m organizaodas premissas, isso uma falcia. A princpio, o argumento da multivocidade do bom sofreria do mesmo mal: ou h alguma premissa faltando, ou elas esto organizadas de modo errado, ou halgumaoutrafaltaqueimpedeoargumentodeseguir.Batizaremosesse problema de Problema da coerncia do argumento da exclusividade categorial. Interpretao meramente predicativa da exemplificao e sua crtica Atravessandoasvriasinterpretaesatentolanadaspassagem talvezfiquemosmaishabilitadosaverqualarazodoproblema.tica Nicomaquia, livro I, captulo 6 (a edio Bekker o pe no captulo 4), 1096a 23-29: Further,since'good'hasasmanysensesas'being'(foritispredicated both in the category of substance, as of God and of reason, and in quality, i.e.ofthevirtues,andinquantity,i.e.ofthatwhichismoderate,andin relation, i.e. of the useful, and in time, i.e. of the right opportunity, and in place, i.e. of the right locality and the like), clearly it cannot be something universally present in all cases and single; for then it could not have been predicated in all the categories but in one only. CompartilhamdessainterpretaoRackham,Ostwalde,aoqueparece, Toms de Aquino. Mais recentemente, mesmo passadas as crticas de J oachim e 21 seusseguidores,Urmsondefendeuexatamenteessainterpretao13.Batiz-la-emos de interpretao meramente predicativa da exemplificao. Defato,lendo-serapidamente,oargumentosoatoclaroecontundente que no parece haver outro modo de interpret-lo: seria sua traduo fiel. Porm, h uma coisa explcita na parte entre parnteses: bom predicado de Deus, das virtudes etc. Deus bom Virtudes so boas Mediania boa etc. Supondo que Deus esteja na categoria de substncia, que as virtudes, na de qualidade e os demais, nas suas respectivas, e que esse todo o papel das categorias na passagem, o seguimento do raciocnio simples: uma vez que itens em categorias diferentes no possuem nada em comum entre si, ento no h um predicado que possa apontar algo de comum entre eles. Portanto, mltiplo: em cada caso, o bom tem uma definio diferente. Deus bom, virtudes so boas etc. (exemplificao)

13 ROSS (Oxford Translation, 1925. Reeditado em vrias coletneas), RACKHAM (Harvard Univ. Press,1934,LoebClassicalLibrary)eOSTWALD(LibraryofLiberalArts,1962).TOMSDE AQUINO: But the various categories do not have one common nature, for nothing is predicated of them univocally. Now good, like being with which it is convertible, is found in every category. Thus the quodquidest or substance, God, in whom there is no evil is called good; the intellect, which is always true, is called good. In quality good is predicated of virtue, which makes its possessor good; in quantity, of the mean, which is the good in every subject of measure [] It is clear, therefore, that there is not some one good that is the idea or common ratio of all goods. Otherwise good would not be found in every category but in one alone. (Commentary on Aristotles Nicomachean Ethics.TraduodeC.J .Litzinger,OP.NotreDame,Indiana:DumbOxBooks,1993.p.26). URMSON: Aristotle's arguments to this effect are obscure in detail and depend on his doctrine of categories in their formulation. Basically, what he claims is that a good substance, such as God, a goodquality,suchaswisdom,agoodquantity,andsoonthroughthecategories,areutterly disparate in their nature. Substance, quality and quantity are ultimate types of being and do not share a common character. There is no single universal being and no single universal goodness. Perhapsananalogyfromtimeandplace,twootherAristoteliancategories,mayhelp understanding. We may speak of a long time and of a long distance; but it is not clear that there is one single sort of length that can be ascribed to both a time and a distance. If we can understand a denial of this, perhaps we shall also understand why Aristotle thinks that when we call God good and the weather good we are not attributing a common characteristic to them. (Aristotles Ethics. Oxford: Blackwell, 1988. p. 23) 22 Pelo menos um item na Substncia bom, pelo menos um na Qualidade bom, etc. (categorialidade) Itens em todas as categorias so bons (transcategorialidade) Logo, bom tem vrias definies (negao da universalidade nica). Masadesconfianaqueselevanta:porque,pelossujeitosserem maximamente diferentes entre si, os predicados ditos sobre eles tero definies diferentes? Ora, mesmo que a exata coisa referida pelo predicado no seja nica, no se conclui da que o predicado tem mais de uma definio; afinal, pode haver predicados to vazios que permitam se referir a todo tipo de coisa mantendo uma mesmadefinio.Se,apontandoparaumacanetaeumabrancura,dizemos esto prximos de mim, da se segue que estar prximo diferente para um e outro?Pode-semesmoasseguraralgunstermosunvocosapesardese aplicaremacoisasdecategoriasdiferentes:visvel,apesardeseaplicara quantidades,substnciasequalidades(p.ex.:umpssaroverdevisto),no tem necessidade de vrias definies14. Enfim, por mais diferentes que sejam os sujeitos,nadaimplicaqueseuspredicadoscomunsnecessariamentetenham definies diferentes. Pelo menos, isso no se mostra evidente. Perceba-se: no estamos dizendo que essa interpretao completamente falha, apenas se pede queeladesenvolvasuaspremissas.Elasimplesmentenoconvence,nonos obriga a concluir o que espervamos. Ademais, uma coisa muito difundida a de que as categorias no possuem nada,absolutamentenada,decomumentresi;masondeissoestafirmado? Veremos adiante que essa tese no pode ser concedida sem suor.

14 De todos os comentadores, WOODS foi o nico que lanou, mais do que uma desconfiana, uma objeo, tal qual reproduzimos: It seems natural to suppose that pale cannot be applied in the same sense to both to Socrates and to the colour of his complexion; or again that the field and thedistanceacrossitcannotinthesamesensebedescribedassmall.Butifappliedquite generally, the principle [um X distribudo em todas as categorias homnimo] seems to be quite unacceptable.Thereseemslittletobesaidfortheviewthatvisibleisnotappliedinthesame sense to substances, qualities, quantities, and relations. (Eudemian Ethics. p. 72). KOSMAN tenta objetar, mas seu ponto muito fraco: porque Aristteles usou exatamente deus e intelecto como exemplo e no qualquer outra coisa? a pergunta que ele se faz (Predicating the Good, p. 172); somando a isso, SANTA CRUZ se pergunta por que a palavra por exemplo aparece apenas para substncia (Sobre a homonmia do bem, p. 99s). Os demais apenas levantam suspeitas: HARDIE, (Aristotles Ethical Theory, p. 57); ACKRILL, (Aristotle on Good and the Categories, p. 17 segundo a paginao do Articles on Aristotle); MACDONALD, (Aristotle and the Homonymy of the Good, p. 155s). A suspeita, porm, j forte o suficiente para levarmos a discusso para frente. 23 Como se pde ver, todos os questionamentos comearam na relao entre bom e os exemplos (Deus, virtudes, oportuno etc.) e isso d a impresso de que o problemaseencontraa;eisarazoporqueosdemaiscomentadoresse dedicaram a melhor explicar essa parte. Isso no quer dizer que eles no deram atenosoutraspartesdoargumento,masapenasqueconcentraramseus esforos num s ponto, em como interpretar a premissa inicial. Interpretao identificadora da exemplificao e sua crtica J oachimeHardie,notandoqueatraduodeRossprecisavadealgum detalhamentoparaficarmaisdeacordocomoespritoaristotlico, acrescentaram-lheaseguinteclusula:quebomsejaditonadefiniodecada exemplo.Ouseja,bomnoditosimplesmente,semressalvas,deDeus,das virtudes etc., mas idntico prpria definio de Deus, virtudes etc. Bom =Deus Bom =Virtudes etc. Apesardaaprovaodevriospensadores(p.ex.:Aubenque,Irwin), Gauthier e J olif foram os nicos a tentar evidenciar essa escolha na traduo15. Cham-la-emos de tese identificadora da exemplificao.

15OprprioHARDIEresumebemsuaposioeadeJ OACHIM:Buttosaythatgoodis predicated in different categories surely cannot mean merely that it is predicated of subjects which areindifferentcategories.Aristotleseemstobemakinganunstatedassumptionaboutthe membersofthesetofsentenceswhichheadducesasevidencethatgoodispredicatedin differentcategories;theassumptionthatthecommonpredicateofthesesentences,good,has categorial multisignificance, a plurality of meanings which correspond to the categorial differences between the subjects of these sentences. () The difficulty of the notion of predication in category seems to be overlooked by the English commentators except J oachim. In his note on 1096a23 ff. (p.41) J oachim writes: []God is called good: his goodness constitutes his substance: being good as predicated of God is, therefore, a predication in the category of substance. The useful is called good:itsgoodnessmeansitscontributiontosomethingvaluedperse,i.e.beinggoodas predicated of the useful indicates a certain essential relatedness, and therefore is predicate under the category of the relative or related[]. I agree with this account of what Aristotle means by saying that the good is predicated in different categories. But the point can, perhaps be put more sharply by saying that the statements adduced by Aristotle are not simply propositions on which good is a predicated asserted of various subjects: they are definitions. The predicate expresses the essence, or part of the essence, of the subject; and it is, therefore, inevitably in the same category as the subject.(AristotlesEthicalTheory,p.57).IRWIN(NicomacheanEthics,1985):Goodnessis differentbecauseadifferentdefinitionofgoodnesshastobesuppliedforitemsindifferent 24 O seguimento dela ainda mais bvio: se bom igual a A e a B, e A diferente de B, ento, ou bom diferente de si mesmo, o que impossvel, ou, antes, a bondade de A diferente da bondade de B. Nesse caso, no preciso nem recorrer s categorias exatamente, pois mesmo dentro de uma categoria h coisas diferentes. Bom definido como Deus, Bom definido como virtudes etc. (exemplificao) Bom est na Substncia, Bom est na qualidade etc. (categorialidade) Bom tem vrias definies. (neg. da excl. cat.) Tambm possvel elaborar outras verses dessa interpretao: ao invs deidentificarobomcomosexemplos,pode-seidentific-loacaractersticas diferentespertencentesaessesexemplos.Seriacomose,porexemplo,a bondadeemDeusfosseidentificadacomseupoderdemoverouniverso, enquantoque,naquantidade,fosseidentificadacomsuaproporo;ora,entre mover o universo e proporo existe uma clara diferena. A novidade da identificadora que ela extremamente direta na prova: ao invs de inventar meios indiretos, talvez recorrendo teoria das categorias, para provar que o bom tem vrias definies, ela vai direto ao ponto e, de fato, define-o diferentemente em cada caso. E isso no nenhuma petio de princpio como alguns poderiam achar, afinal, a concluso bom homnimo. Se fosse uma petio, ento com apenas uma premissa j teramos a concluso. Mas somente com:

categories.Itfollowsthatgoodnessmustbedifferentinalltencategories;forbeingsdonot constitute a single kind (ver tambm IRWIN Homonymy in Aristotle Review of Metaphysics. n. 34, p. 539, mar. 1981,). GAUTHIER-J OLIF. (LEthique Nicomaque. 2e d. 1968. II.i.40 (apud Ackrill, Good, p. 19-20)): "En outre, le mot bien semploie en autant de sens que le mot tre; il peut en effetdsignerlessence(parexempleledieu,cest--direlintellect);laqualit(lesvertus);la quantit (la mesure); la relation (lutile); le temps (loccasion); le lieu (lhabitat); et ainsi de suite. Il en rsulte que le terme de bien ne saurait videmment tre un terme commun, universel et un; car alors il ne semploierait pas dans toutes les catgories, mais dans une seule. AUBENQUE, P. La Prudence chez Aristote. Paris : PUF, 1963. p. 100-1. En relit, il y a autant de sens du bien quil y a de catgories de ltre : ainsi, le bien signifie Dieu et lintelligence dans le categorie de lessence, la vertu dans la qualit, la juste mesure (mtrion) dans la quantit, lutile dans la relation, loccasion (kairs) dans le temps, le sjour favorable (daita) dans le lieu, lenseignant et lenseign dans les catgories de lagir et du ptir. Cette numration nous fournuit dabord, entre autres, une dtermination de la notion si fuyante de kairos : le kairos, cest le bien selon le temps, ou enconre le temps en tant que nous lenvisageons comme bon. 25 Def. Bom: divindade No se conclui da que bom homnimo. preciso, alm dela, acrescentar uma segunda premissa e ento teremos o argumento completo: Def. bom: divindade Def. bom: excelncia Logo, bom tem duas definies diferentes Logo, bom homnimo. Portanto,nohdvidasdequeainterpretaoidentificadora extremamenteeficaz.Mesmoassim,elanodeixadeapresentardificuldades quando passamos a exigir mais dela16. Em primeiro lugar, ela parece ser pouco convincenteparaqualquertipodeplatnico.Seseperguntasseaonosso interlocutor se ele aceita que bom seja definido num caso como A, noutro como no-A, a resposta mais provvel seria uma risada sarcstica, ningum seria to conivente.Mesmoassim,deixemospassar,jquenosetratadeconseguiro assentimento do adversrio, mas de ver se o argumento vale. Massevamosaceitaressascondies,podemosexigiromximodo argumento,demodoqueelesejaconvincenteemqualquersituaoe indistintamente.Afinal,anicacoisacertaqueadefiniodebomuma grandeincgnita,assimcomoacaractersticaaqueelevaiseigualar.Orase, semdecidirdeantemo,bomforidentificadocomqualquercaractersticade serestodiferentesentresie,emtodasassituaes,bomtiverdefinies

16Estranhamenteoscomentadoresgabaritadosnoproduziramumaboaobjeoteoria identificadoraealgunspassamporelacomoumtrator.Nomximo,podemosdizerqueeles atingem em cheio a teoria de HARDIE, mas sabemos que essa linha de interpretao no to restrita. ACKRILL (op. cit. p.18-20) desfere vrias suspeitas, mas elas supem que o interlocutor queira provar que bom tem de estar em cada categoria, o que j vimos que no necessrio (p 12 acima); no caso de HARDIE (ver nota anterior) pode at ser verdade, mas a crtica ackrilliana no contundentecontraquemnopensarassim.KOSMANtemumacrticaque,anossover, injusta:bomnopoderiapertencerdefiniodenadaporqueditoemvriascategorias (Predicating the Good, p. 172); no entanto, exatamente a isso a que HARDIE quer chegar: por no poder pertencer definio de nada que bom seria, caso definisse algo, sempre diferente! Vertambm MACDONALD,op.cit.p.156,nota. Maisumavez acena serepete:criam apenas suspeitas; contudo, em relao interpretao predicativa, as suspeitas so menos fortes. 26 diferentes, ento essa tese ser prontamente aceita. E como, primeira vista, as categorias nada tm de comum, tudo indica que esse o fim do problema. No entanto, como dito acima, a idia de que no h nada em comum entre ascategoriasassumidamuitosemquestionamentoportodosetemossrias razes para pensar que isso no bem verdade. Em meados do sculo XX, outro grande comentador releu a questo da homonmia do ser e elaborou uma nova interpretao que logo foi reafirmada pelo comentrio contemporneo; Owen com seufocalmeaningobservouquetodasasdefiniesdeserconteriamoitem substncia17. Assim, uma qualidade considerada ser por ser qualidade de uma substncia,quantidadeserporserquantidadedesubstncia,movimentode uma substncia e assim por diante. Veremos isso com mais detalhes no prximo captulo,masissodaimpressodequeascategoriaselasprpriascontm substncia nas suas definies (ou, se se preferir, nos seus logoi). E substncia sinnima em todos os casos, do contrrio no estariam organizados em torno de um foco mas rapsodicamente dispersos. J que no sabemos nada sobre o bom, pois sua definio, a princpio, no estdecidida,entonotemoscomosaberse,aoseidentificarcomDeus,o objetoidentificadoounoomesmodevirtudes.Afinal,bompoderiaser idnticoasubstnciaeanodifeririaemnenhumdoscasos,seriasinnimo. Comodizamos,seexigimosomximodessatese,elanocorrespondes nossas expectativas. Porm, e preciso admitir, a interpretao identificadora tem total sucesso para provar a homonmia do bom casoaceitemosqueasdefiniesdesteesto sendo identificadas a caractersticas diferentes entre os exemplos. De modo que, quem optar por essa via, ter uma formulao clara e correta do argumento, ainda que no convena os adversrios mais exigentes. Interpretao criteriolgica e sua crtica

17OWEN,GER.LogicandMetaphysicsinsomeearlierWorksofAristotle.In:DRING,I; OWEN,GER(ed.).AristotleandPlatointheMid-FourthCentury.Goeteborg:1960.p.163-90. (Reimpresso em BARNES; SCHOFIELD; SORABJ I (Ed.). Articles on Aristotle. Londres: 1979. v. 3 e em NUSSBAUM, M. (ed.). Logic, Science, and Dialectic.Ithaca 1986. p. 180-99). 27 Kosman e Ackrill lanaram dvidas sobre as interpretaes antecessoras. Curiosoquenohouvenenhumacrticafinal,queacabassedevezcomas antigasformasdelerotexto.Inclusive,umadasbelezasdessadiscusso justamenteafaltacertezaquantoaoencaminhamentodaresposta;quando menos se espera, as teorias passadas podem voltar e exigir seu grau de verdade. A sada deles bem simples: ao invs de considerar que bom predicado dosexemplos,inverte-searelaoepem-seagoraosexemplosnolugarde predicadosdobom18.Naverdade,oexemplo(divindade,virtudeetc.)seriaa razo,acaractersticaencontradanascoisas,queaov-la,acusaramos imediatamente que so boas. como se, ao analisarmos uma amostra de sangue e vendo um, dissssemos imediatamente qual a doena. Da mesma forma, por X ser uma divindade, ou uma oportunidade etc., que lhe atribumos ser bom. X bom porque X Deus X bom porque X virtude etc. Chamaremos essa leitura de criteriolgica. Desse modo, o fato de bom ter diversas razes, ou critrios, para ser aplicado s coisas j seria um argumento para provar que bom multvoco. Noprecisoirmuitolongeparafazeracrtica,bastareenviarmosa pergunta chave: essa tese prova a homonmia? O fato de algo ter diversas razes ou critrios para ser predicado prova suficiente que tem vrias definies? Pelo visto no, pois temos diversos critrios, de diferentes categorias, inclusive, para

18Parasersincero,ateoriadeACKRILLdiferebastantedadeKOSMAN,emboraaquele reconhea a influncia deste. KOSMAN defende que h modos disfarados de predicar bom, com termos que primeira vista nada teriam a ver com bom; assim, dizer que x deus (ou divino) um modo disfarado de dizer que x bom e est na categoria da substncia; x virtude quer dizer que x bom e est na categoria de qualidade e assim por diante (ver Predicating the good, p. 174). Com essa teoria, KOSMAN at poderia ser posto no filo dos identificadores, pois seria comodizerquedeusigualabomesubstncia;virtude,abomequalidadeetc.Na verdade, a tese de KOSMAN lacunar e suas implicaes ainda no foram totalmente apreciadas. ACKRILL mais explcito: But other things may be commended as good for others reasons and indeed other sorts of reason because they are of the right size or useful for some purpose. The criteria for commending different things as good are diverse and fall into different categories, and it is enough to show that good does not stand for some single common quality. (Aristotle on Good and the Categories, p. 21 da edio Articles on Aristotle). 28 respondersealgoestquente(avermelhidodeummetal,umafumaa,um borbulhar) e, contudo, o quente no parece ter vrias definies19. Almdomais,seassumirmosomesmograudeexignciaquefizemos paraainterpretaoidentificadora,desconfiaremosdeque,apesarde aparentementeosexemplosseremasrazesparasedizersealgobom,h uma mesma razo comum por trs. Portanto, a interpretao criteriolgica sofre da mesma falta de coeso que as demais. Mastodoessecaminhotortuosonoteriaacontecidosenotrouxesse algum bem. Com a interpretao atributiva chega ao fim uma jornada, aquela que apostou suas fichas na exemplificao para resolver a questo. Interpretao atributiva da universalidade nica MacDonald percebeu que, por esse caminho, Aristteles no tinha muitas chancesesuareaofoitentarentenderqualoconceitodehomonmiaque estavasendousadoatentoeproporumamodificao.Adelesimples:a homonmiaseaplicaacoisas,noasignificadosdetermos.Porm,sua preocupaonomuitojustificadaporque,paratodososcomentadores, definio, logos, tem um lado real e uma contrapartida, por assim dizer, mental, de modo que, quando se fala em significados em Aristteles sempre se leva em considerao o isomorfismo entre eles e o mundo20. No entanto, na sua inteno,

19 Essa a crtica de MACDONALD a ACKRILL (Aristotle and the Homonymy of Good, p. 158 e 159) repetida e detalhada por SHIELDS (Order in Multiplicity, p. 202s) e SANTAS (Goodness and Justice, p. 207s). Hot, for instance, might well have a single sense or meaning despite the fact that I appeal to radically diverse criteria in explaining my predicating hot of various items. I might explain my calling the vapor hot by pointing out that it is steam (a substance); I might explain my calling the molten iron hot by pointing out that it is red (a quality); I might explain may calling the liquid hot by pointing out that it is boiling (an action); and so on. (MACDONALD, p. 158s) 20 MACDONALD faz essa distino seguindo IRWIN: [] homonymy and multivocity are often the same,andneitherisintendedtoworkdifferentsensesofwords.(IRWIN,T.Homonymyin Aristotle.ReviewofMetaphysics,n34,mar.1981.p.524)[]Ahomonymousnamecanbe replaced by many definitions because its signifies many real properties, not because it has different meanings (Idem., p. 535). Ver tambm o seu: Aristotle's Concept of Signification. In: NUSSBAUM, M.; SCHOFIELD.M (ed.).LanguageandLogos. Cambridge: Cambridge University Press, 1982. p. 241-66.MACDONALDlana,nolugardeumahomonmiademltiplossignificados,uma homonmia de mltiplas naturezas: as coisas que so homnimas, no as palavras. Ainda que isso se assemelhe ao que vamos expor agora, preciso distinguir. A teoria de MACDONALD deve ser situada na identificadora: ele identifica o bom com naturezas diferentes a que dito: If the account of being Aristotle has in mind signifies a real nature rather than the meaning or sense of a word, then homonymy occurs when two things have the same name, but the name applies to each 29 MacDonald est mais do que certo: preciso entender o no universal e nico de uma maneira que torne o argumento cabvel.

Existeumaformadeentenderaconclusonoembuscadediversas definiesdobom,masjustamentedessacontrapartereal.Paraencontrar diversas definies, a melhor interpretao era a identificadora, mas ela fraqueja diante de maiores exigncias. Se, ao invs de definies diferentes, o argumento estiverapenastentandomostrarquebomseaplicaacoisasdiferentes,a naturezasdiferentes,entotalvezalcancemosnossoresultado.Issonoquer dizer que as coisas a que bom se predica so completamente diferentes entre si; obomsepredicadetodotipodecoisamesmoquehajaalgodecomumentre elas,poisemboraascoisassejamidnticasnesseounaqueleponto,issono mudaofatodequebomsepredicadelas.Podeatserqueaexatanatureza recortadaereferidapelabondadesejaigualequeadefiniodebomseja sempre a mesma, mas o bom continua sendo predicado de sujeitos diferentes e, portanto, essa bondade aqui diferente daquela bondade l. Por exemplo, ainda queumafacaeumatesouratenhamvriascaractersticasiguaisequea bondade delas sejam uma dessas caractersticas (digamos, a manuseabilidade e a eficincia do corte), ainda assim a caracterstica boa da tesoura da tesoura e a da faca, da faca; no se identificam (nesse ponto nos apartamos de MacDonald, quedefendeumateoriaemqueabondadeconsistanissoounaquilo). Chamaremosdeinterpretaoatributivadanegaodaexclusividade categorial21.

in virtue of their having different natures or properties. Two things are homonymously F, then, if and only if they both are F and the accounts of their Fness are different; that is, if the real property signified by the account is different in each. To say that good is homonymous, then, is to say that there are at least two good things, x and y, such that the account of xs goodness and the account ofysgoodnessaredifferent;thatis,adifferentrealnatureorpropertyissignifiedbythetwo accounts.Iwillcallthisthemultiple-naturesinterpretationofhomonymy.(Aristotleandthe HomonymyoftheGood,p.161)Nossainterpretaodebitriadadele,pormnotenta identificar a bondade de cada coisa natureza referida. 21 Esse nome tirado de um influente artigo de GEACH, P. Good and Evil. Analysis. v. 17, p. 30-42, 1956/7. Nesse artigo GEACH traa uma simples, porm produtiva distino: alguns conceitos, que chamou de predicativos, tm sentido quando separados (por exemplo: podemos desmembrar carro vermelho em carro e vermelho e o sentido de cada um continua o mesmo); outros, que chamoudeatributivos,notmsentidoquandoseparadosdeumsujeito(porexemplo:no podemos conceber grande em separado; apenas com um sujeito, digamos em carro grande, possvel entend-lo). Essa distino gerou debates interessantes: HARE, R.M. Geach, Good and Evil. Analysis, v. 17, p. 101-11, 1956/7. MACIVER, A.M. Good and Evil and Mr. Geach. Analysis, v. 18, p. 7-13, 1957/8. HAMPSHIRE, Stuart. Ethics: a Defense of Aristotle. In: Freedom of Mind and otheressays.Princeton: Princeton University Press, 1967. p. 64-86. WILLIAMS, Bernard. Moral: 30 Ora, esse resultado j alcanado se analisarmos o uso cotidiano de bom. Imaginemos uma parede que, como toda parede, tenha superfcie e espessura. Se dissermos a parede branca nunca caber a pergunta mas o que branco, a superfciedaparedeousuaespessura?,afinalbrancuraseaplicasemprea superfcies.Esseumcomportamentodeumpredicadonormal.Agora imaginemosumhomemquesejacarpinteiroe,comotodohomem,umagente moral.Nessecaso,sedissermoselebomcaberaperguntabomoqu? Bom carpinteiro ou boa pessoa?. Bom assim apresenta uma flutuao que no se esperaria da maioria dos universais. Isso no quer dizer que bom tenha de ter definies diferentes ao se aplicar a profisses, facas ou qualidades morais, mas algumacoisaeletemqueofazassim,talvezumaindeterminaoquantoao campo de aplicao. Perceba-se que, com essa interpretao da universalidade nica, mesmo a leitura meramente predicativa da exemplificao, que de longe a mais aceitvel porumplatnico,sesairiabem.Assim,pelofatodebomtercamposde aplicaesdiferentes,pelomenosumparacadacategoria,eleprecisariaser distinguidoacadamomento:aqueeststereferindoquandoochamasde bom?Alis,ascategoriastmpapelpreponderanteparageraraconfusoe exigir maiores explicaes. Digamos que ns tenhamos a seguinte frase: Este homem bom E aqui estamos querendo falar de suas qualidades morais. Certamente teramos confuses com ela por muito ser igualar concluso do raciocnio: Este homem carpinteiro Este carpinteiro bom Este homem bom,

uma introduo tica. Traduo de Remo Mannarim Filho. So Paulo: Martins Fontes, 2005 e PIDGEN,Charles.GeachonGood.ThePhilosophicalQuarterly,v40,n.159,p.129-54,abr. 1990. Mesmo assim, percebe-se que no estamos sendo fiis nomenclatura de GEACH; nossa questo outra um tanto diferente. 31 Poisaquiestamosnosreferindossuashabilidadesprofissionais.Arazopor que houve essa confuso que carpinteiro e homem so de categorias diferentes e isso d condies para que o primeiro seja predicado do ltimo22. As categorias, portanto, so argumento para mostrar que existem diferentes bondades para as coisas. Resumindo:acaractersticaatributivadeumpredicadoconsistenele aplicar-se propriamente a coisas diferentes e enquanto tais; assim interpretamos anegaodauniversalidadenica.Eoargumentochegaaessaconcluso predicandoobomdeitensemvriascategorias(A,substncia,boa;B, qualidade,boaetc.),poisissogeraumaduplapredicaoquepreciso distinguir (A B, logo A bom duas vezes e por vias diferentes). O imediato problema com essa resposta a mesma dvida que tnhamos quanto interpretao criteriolgica dos exemplos. De fato, se a razo for sempre a mesma para chamar algo de bom e estiver apenas escamoteada (por exemplo, Deus bom porque tem virtudes, virtudes so boas porque so teis e a utilidade, por fim, o que faz com que as coisas se tornem boas), ento, na verdade, bom ser um predicado como qualquer outro. Essa desconfiana se baseia na questo que colocamos para as teorias identificadoras: uma vez que substncia comum a tudo, ento a bondade pode ter um nico sujeito a partir do qual se manifesta e issojseriaobastanteparanotercertezadeque,peloargumento,bom mltiplo. No entanto, o fato que bom se apresenta a cada sujeito de um modo diferente,poisseguindooexemplo,numcasobompredicadodiretamentedo til, enquanto nos demais o por ser til ou por ser virtude ou por qualquer outro meio indireto. Outro problema que essa interpretao parece simples e fraca demais, ainda mais para convencer um platnico; afinal, o que isso estabelece? Convencendo um platnico If each of the many men is a man, and if each of the many animals is an animal, and the same applies in the other cases; and if in the case of each oftheseitisnotthatsomethingispredicatedofitselfbutthatthereis something which is predicated of all of them and which is not the same as

22 O exemplo do bom sapateiro e do bom homem tirado do Da Interpretao 11 20b31. 32 anyofthem(oudeniautntautonon),thenthisissomebeingbesides (para) the particular beings which is separated from them and everlasting. Foritisineverycase(aei)predicatedinthesamewayofall[homois katgoretai]thenumericallysuccessive(tnkatarithmonallassomenn) .Andwhatisoneinadditionto(epi)many,separatedfrom them,andeverlastingisanidea.Thereforethereareideas.(80.9-15. Traduo Gail Fine. Grifo e colchetes nossos) Havamosvistoque,dealgumaforma,oargumentodaexclusividade rompe com a unidade exigida a um universal, conforme o Sobre as Idias. E, de fato,quandoseinterpretaqueaunicidade,ohomoioskategoretai,sinonmia, fica fcil mostrar por que s existe uma nica idia, um nico de muitos. Afinal, se x F e y F e ambos so Fs no por si mesmos, mas por outra coisa, ento existe algo alm de x e y que os fazem ser Fs, a saber, um universal comum de mesma definio. Todavia, se F for homnimo, se a definio de F for diferente em cada caso, ento no seria um nico predicado comum, mas dois, j que uma definioimplicaumpredicado,aindaqueumpredicadonoimpliqueuma definio.Dessemodo,sehouvessepelomenosduasdefinies,entonem sequer estamos falando corretamente quando dissemos que x F e y F, cabe separar cada um (por exemplo, F e F); portanto, F no seria nico para a e b, mas mltiplo.Porcausadessafacilidade,torna-seumdesafiomexernaconclusoe interpret-la de uma maneira que prove ao platnico que bom fere a unidade dos universais. Felizmente, a unidade algo frgil demais e mesmo a teoria atributiva com o agravante das categorias consegue abal-la: digamos que x F e y F, ambos so Fs no por si mesmos. No entanto, isso no impede que se x seja F devido a um outro particular (digamos, y; por exemplo, Andr grande no por ele mesmo mas por sua honestidade; grandeza obviamente, no tem a ver com alturaaqui,masporumavirtude).Afinal,yaindaserFdevidoaoutracoisa (talvezumoutroparticular,z)eassimsucessivamente;incorreramosnuma infinidade,oquePlatoobviamentenoquer.Masopiorproblemaameaara monoplio das Idias de determinar a realidade, j que no vai haver apenas um formador dos particulares; afinal, se particulares comearem a se comportar como Idias, poderemos estudar os prprios particulares e dispensaramos as distantes Formas. E isso se d pelo simples fato de que F (que no caso, igual a bom) no est na mesma relao com todos os seus particulares. 33 Homonmia e Multivocidade Oprimeiropassoparaevitarumaquestodedefiniesnegarquea conclusotratedehomonmiae,emseguida,escolheroutrainterpretaoda concluso, algo mais alcanvel. Como o argumento no fala de homonmia, mas explicitamentedepollachoslegetai(naticaEudmiaessaexpressoaparece literalmente;naNicomaquiaelasubentendidapeloisachoslegetaitoontij que o ser pollachoslegomenon), tentador traar uma diferena entre esses dois e se apegar ao segundo. Essa distino, no entanto, se mostrar bastante difcil e se ainda continuamos esse tpico apenas para deixar o leitor informado dessedebate.HomonmiaparaAristtelesatcorrespondeaousoquedamos hoje,aocontrriodasinonmia,23emuitoclaramentedefinidanoque,por ventura, acabou sendo a abertura do corpus: Sochamadoshomnimosaqueles[itens]cujonomeonicoem comum, mas a definio da essncia [logos tes ousias] correspondente ao nome[katatounoma]diferente.Porexemplo,animalaplicadoaum homem e a uma pintura. Pois, entre eles, o nome o nico em comum e a definio correspondente ao nome, diferente. Afinal, se algum fosse dizer oqueanimalparacadaumdesses,dariaumadefinioprpriapara cada um. (Categorias 1 1a1. Traduo nossa com ajuda da de Edghill) Se Xs forem designados pela mesma configurao lingstica e definies iguais, ento sero sinnimos; se a configurao for a mesma mas as definies diferentes, ento homnimos. Uma questo que se pe : o que o X, a prpria palavra ou coisa? preciso diferenciar essa questo da sobre o realismo; quanto aessaltima,amaioriadoscomentadoresconsideraquetodotermopara Aristteles possui uma referncia real24; a questo no momento se a homonmia temcomorefernciarealapalavraouacoisadesignadapelapalavra.Ora,tal

23 Segundo o dicionrio Aurlio, homnimo (...): 1. Que ou aquele que tem o mesmo nome. 2. E. Ling.Diz-sede,oupalavraquesepronunciadamesmaformaqueoutra,mascujosentidoe escritasodiferentes(oshomfonoslao=laada,lasso=cansado),ouquesepronunciae escreve do mesmo modo, mas cujo significado diverso (os homgrafos falcia =qualidade de falaz,efalcia= falatrio)(...).Noentanto,sunonumosparaAristtelestemumsignificado bastante diferente do nosso sinnimo, pois ns o aplicamos a duas palavras diferentes mas com mesmosignificado(porexemplo,coecachorro),aopassoqueAristtelesexigiriaqueas palavrasfossemiguais.Porm,mesmoemAristteleshumusosemelhanteaomoderno,ver bibliografia da nota 25. 24 Cf. nota 20 acima 34 problema j rendeu grandes debates no aristotelismo desde a antiguidade mas, paratodososefeitos,amaioriadoscomentadoresconcordamquehomonmia paraAristtelessopropriedadesprimeiramentedascoisase,apenaspor derivao, das palavras25. Sem dvida que estranho pensar que essa fruta, uma manga, possua a propriedade homnima ou mesmo que a essncia real da fruta mangasejahomnima.Masissoficamaispalatvelsepercebermosque homonmia uma relao e que sempre preciso levar em conta a palavra que faz o recorte e os outros casos em que tal palavra aparece. Novamante, as outras coisas que recebem a palavra precisam sempre ser levadas em conta para determinar se homnimas ou sinnimas. Afinal, um par de Xs pode acabar sendo, ao mesmo tempo, sinnimos e homnimos dependendo doslogoidaspalavras-essncias.Porexemplo,umhomemeumleoso sinonimamenteanimais,mashomonimamentereis;ambospossuema caractersticadeseremseresvivossemoventes,queadefiniodeanimal, mas um homem rei por ter sido entronado, ao passo que a realeza do leo apenasumametforaparasuaimponncia26.Sapspercebermosqueas realidades referidas possuem definies diferentes que podemos afirmar que tal palavrahomnima.Assim,ficaclaroquetodasasaplicaesdapalavra-essncia so importantes para determinar se sinnimo ou homnimo. Por outro lado, o pollachoslegomenonno definido em nenhuma parte dasobrasrestantesdeAristteles.Equvocooumultvocosoostermos acordados entre os comentadores atuais para designar a expresso pollachos ou

25Considerou-sequeessaeraaexplicaoporqueAristtelesnoteriacompletadooquadro comtodasaspossibilidades,afinalpoderiamuitobemhaverXscomnomesdiferentese definiesiguais(ocostumeiroexemplodacapaemantodeAristteles)ecomnomes diferentes e definies diferentes (heternimos). Espeusipo, o sucessor de Plato na Academia, quesegundoatradioconsideravaquehomonmiaesinonmiaerapropriedadedaspalavras, teriafeitooquadrocomtodasasdemaispossibilidades.BARNES.HomonymyinAristotleand Speusippus. TheClassicalQuartely, v 21, n 1, p. 65-80, maio 1971 e TARN. Speusippus and Aristotle on Homonymy and Synonymy. Hermes. v. 106, p. 73-99, 1978. Cf. ZINGANO, M. Aspsio e o Problema da Homonmia. Analytica. v.6, n.1, p.93-131, 2001/2. (Reimpresso em idem. Estudos deticaAntiga.SoPaulo:DiscursoEditorial,2007.p.549-97)Sobreesseassunto,omais recentetrabalhodeflegodeALFONSOMOTTA(Deschosesditesdeplusieursfaons: TopiquesI,15,homonymieetdialectique.2vol.Tese(DoutoradoemFilosofia)Universidade Paris X-Nanterre, Paris, jan. 2001. 26 SHIELDS: [] I do not thereby suggest that two homonymous things cannot be synonymous as well. Rather, two things can be both synonymous and homonymous only in so far as they fall under sortals which are not co-extensive. Thus, decoys used in dock hunting and the ducks themselves may be homonymously ducks, but synonymously targets or synonymously magnitudes. (Orderin Multiplicity, p. 11, nota) 35 pleonachos legomenon e unvoco, monachos ou haplos legonemon27. claro que h diferena entre homnimo e equvoco, j que pelo menos uma vez eles so claramentedistinguidos(Tp.II3110b16-25)28,aparentementeporque homonmia diz respeito a palavras (homo-onoma, mesmo nome), ao passo que podehaverfrasesoulocuesequvocas.Ahiptesedequelocuesso equvocas porque uma ou mais palavras dentro delas so homnimas no retira o fato de que equivocidade usada mais largamente que a homonmia. Isso gerou debatestambmdesdeaantiguidade:PorfrioeprincipalmenteSimplcio, observando nas Categorias que a qualidade dita de vrios modos, sem deixar de ser qualidade, acabaram considerando que equivocidade no trata exatamente dedefiniesmasdealgoditodevriascoisas.Decertomodo,Hintikka ressuscitar essa idia ao equivaler equivocidade com variedade de campos de aplicao29; isso quer dizer, a grosso modo, que quando X predicado de a e b e estes so tomados como diferentes, ento X multvoco. Aparecem vrias dificuldades para se fazer essa ciso, porm pelo menos uma passagem d alguma margem para isso: But of an accidental term, e.g. the musical or the white, since it has two meanings [ditton semainei], it is not true to say that it itself is identical with

27 Em ingls se usa vez por outra ambiguity, assim como em francs (ambigut) para pollachos legomenon. Haplos largamente usado ao longo do corpus, nem sempre servindo de oposto a pollachos.HumusodivergentedemonachoslegomenonemMet.IV8,1012a29s:depois dessasexplicaes,ficaclaroque,sejaindividualmente(monachoslegomenon),sejacomoum todo, impossvel... , o que mostra que essa terminologia de Aristteles um tanto flutuante. 28ContraMotta(Deschosesditesdeplusieursfaons.p.80,nota).Oprofessorafirmaque homnimo e equvoco so no s co-extensivos mas idnticos de sentido. Ele reconhece que no possvelprovarasegundaafirmao,masapresentaumaprovaparamostrarquetodo homnimoequvocoetodoequvoco,homnimo.Suaprova,sefuncionar,deveserrestrita apenasTpicosI15,comoelemesmodiz;porissotambmelenoabrangeaspassagens polmicas. 29HINTIKKA,J .Aristotleandtheambiguityofambiguity.Inquiry,v.2,n.1,p.137-51,1959e Aristotlesdifferentpossibilities.Inquiry,vol.3,n.1,p.18-38,jan.1960.HINTIKKAnod indicaes de como determinar campos de aplicaes. Cf. OWEN. Logic and Metaphysics in some earlierworksofAristotle(op.cit.)eAristotleon the SnaresofOntology.In:BAMBROUGH(ed.). NewEssaysonPlatoandAristotle.Londres:RoutledgeandKeganPaul,1965.p.69-75. (=NUSSBAUM,M.Logic,ScienceandDialectic,p.259-78).HINTIKKA,J .DifferentKindsof Equivocation in Aristotle. Journal of the History of Philosophy. v. 9, n. 3, p. 368-72, jul. 1971. Em Logic and Metaphysics, OWEN havia defendido que If a word is pollachs legomenon then it isacaseofhomonymy,requiringdifferentdefinitionsindifferentuses(Top.106a1-8):theonly pollachslegomenonwhicharenotcasesofhomonymyarenotwordsbutambiguousphrases (110b16-11a7).(p.182daediodeNUSSBAUM,nota).Maisumaveznosremetemosa ZINGANO(Aspsioeoproblemadahomonmia,jcitado)quemostramuitoclaramentecomo equivocidade e homonmia se relacionaram ao longo dos comentrios.36 its essence; for both that to which the accidental quality belongs, and the accidentalquality,arewhite,sothatinasensetheaccidentandits essencearethesame,andinasensetheyarenot;fortheessenceof white is not the same as the man or the white man, but it is the same as the attribute white. (Metafsica VII 6 1031b22-27) V-sequebranco,apesardeserumpredicadonormal,considerado ditton semainein, o que, com alguma boa vontade, pode ser aproximado do ditts legesthai,umtipodepollachoslegesthai.Oresultadopossveldessahistria que branco seja considerado sinnimo (porque tem uma nica essncia), porm equvoco(porquepodeserpredicadooraessencialoraacidentalmente).No fcil escapar dos problemas textuais em outras passagens, mas outros, alm de Hintikka,tambmtentaramisso30.Dessemodo,algoequvoco,pollachos legomenon, se em dois contextos apresenta tamanhas confuses que preciso distinguir ambos. Contudo, por mais promissora que seja a estratgia de separar equvoco e homnimo, esbarra-se, no nosso caso especfico, com uma passagem na qual o argumentodaexclusividadecategorialpareceestarnasuaformapurae,alis, usando o bom como exemplo: Tambm[preciso]verosgnerosdascategoriascorrespondentesao nome[tagentnkatatounomakateegorion],sesoosmesmospara todos[oscasos].Poissenoforemosmesmos,claroqueotermo homnimo, por exemplo, o bom nas comidas, por um lado, [] o produtivo de prazer; na medicina, o produtivo de sade. Na alma a qualidade, por exemplo,temperana,coragemoujustiaedomesmomodoparao homem. Algumas vezes, o quando, por exemplo o bom no oportuno, pois o bom dito no [momento] oportuno. E tambm a mediania boa. Portanto, o bom homnimo. (Tpicos I 15, 107a3-13) V-sequebomclaramenteconsideradohomnimo,oqueaprincpio negaria nossa linha de argumentao, pois mesmo que equivocidade fosse mais largaqueahomonmia,obomdeveserconsideradohomnimo independentemente. Existe, claro, a assuno de que os Tpicos fazem parte

30 KUNG relatando uma idia de DEVEREUX: There [Categorias VII] Aristotle says white is only accidentally large whereas large is said per se of surface. Now large is said in different ways, i.e. it is pollachs legomenon, insofar as it is applied to some things per se and to others per accidens, according to Aristotle, but this does not show that large has different senses in these applications. Indeeditseemsitmusthavethesamesense.AristotleonBeingisSaidinManyWays.In: GERSON, L. Aristotle: critical assessments. Londres e Nova Iorque: Routledge, 1999. p.190. 37 de uma fase muito juvenil de Aristteles e que, posteriormente, ele precisar seus termos (essa a sada de Hintikka, por exemplo, Aristotle and the Ambiguity of Ambiguity, p. 148-50). Para ns, porm, basta que a passagem dos Tpicos no sejaexatamenteoargumentodaexclusividadecategorialdasticas.Ora,a passagemest,senodefinindoobom,aomenospondo-oemdiferentes categorias31, o que prprio de uma leitura identificadora. Nesse caso, Aristteles temtodaarazoaoconsiderarhomnimoobom.Noentanto,comoessa interpretao sofre dificuldades, tentaremos pensar o argumento da exclusividade das ticas por outro vis. Dessemodo,seentendermosquehdoistiposdeargumentoda exclusividade podemos manter algum grau de diferenciao. Nos Tpicos o bom seria francamente posto em diferentes categorias e isso uma prova tanto de que homnimo,quantoequvoco.Nasticas,oupelomenosnaNicomaquia,a prova apenas de que multvoco. Para esse tipo de prova bastaria mostrar que o predicado gera alguma confuso. Porfim,apesardetermosconcentradoesforosparadarumlugarde destaque equivocidade, mesmo que fique provado posteriormente que ela no tem nenhuma diferena com a homonmia, nada se disse sobre o protagonista da discusso: a concluso, a negao da universalidade nica, o no um comum universal e nico. Todo esse debate serve apenas para j ir clarificando o que estemjogoquandoformosestudaranegaodauniversalidade,nofinaldo prximo captulo.

31 Essa pequena ressalva para evitar uma apressada identificao entre definir numa categoria e pr numa categoria. Com efeito, categorizar talvez no deva ser colocado no mesmo diapaso do generalizar ou especificar. Cf. RIJ K, L.M. de. Categorization as a Key Notion in Ancient and Medieval Semantics. Vivarium, v. 26, n. 1, pp.1-18, 1988. 38 NOTAS SOBRE A MULTIVOCIDADE DO SER Essecaptuloumintermdio.Aquipassaremosporvriosdebatesj clssicos mas pouco relacionados com o que vimos anteriormente. Por exemplo, o geneticismo, isto , a chave interpretativa de que Aristteles teria evoludo suas teses ao longo da vida e que isso seria provvel pelos textos algo que no lida diretamentecomavalidadedoargumentoontoisopredicativoeporissovai parecermeiodeslocado.Noentanto,aimpressodequeessecaptuloest fugindodotemaserdesfeitanoprximo,noqualestudaremosaunidade multvoca do bom e aproveitaremos os resultados aqui alcanados. Tudo neste captulo gira em torno da multivocidade do ser, como ela ocorre e quais as conseqncias. Sabemos que o ser cumpre um papel importantssimo no argumento estudado justamente por abri-lo: o bom dito de igual modo que o ser. Para entender o que isso significa e como esclarece a multivocidade do bom, preciso estudar o ser e delinear melhor suas caractersticas; tal o objetivo do captulo. A prova do geneticismo aristotlico (I)Pois, o bom dito de muitos modos, alis, de iguais modos que o ser. Pois o ser, como em outras [obras] foi distinguido, significa o que , o qual, o quanto, o onde e alm destes o ser movido e o mover. Tambm obomestemcadaumadessescasos:nasubstncia,ointelectoe Deus; no qual, o justo; no quanto, a mediania; no quando, o oportuno e o ensino e o ensinado quanto ao movimento. Como ento o ser no algonicoconformeacima,damesmaformanoobomenoh uma cincia nica nem do ser nem do bom. (EE I 8, 1217b25-35) (II)Existeumacinciaquecontemplaoserenquantosereas propriedade por si dele. () (Met. IV 1, 1003a21) O ser dito de muitos modos, mas para uno e uma nica natureza [to ondelegetaipollachosallaproshenkaimiantinanphusin];no 39 homonimamentemasdomesmomodoquetodoosaudvelpara sade. Seja por conservar, por produzir, por ser indcio de sade, seja porque conservativa dela. E do mesmo modo que o medicinal para a medicina. Pois, um por ter medicina dito medicinal, assim como um por predisposto a ela por natureza e outro por ser obra da medicina. E deiguaismodostambmpoderemosdizeroutrascoisasditas semelhantes a estes. (2, 1003a33-b4) Deste modo, o ser dito de muitos modos, mas para um nico princpio [to on legetai pollachos men allhapan pros mian archeen], pois alguns, porquesubstncias,soditosseres;outrosporquepaixoda substncia; outros, porque em direo substncia; ou corrupes, ou privaes,ouqualidade,ouprodues,geraesdasubstncia,ou ditosemrelaoasubstnciaou,entreesses,negaesdeuma substncia:porissofalamqueono-serno-ser.Porconseguinte, comoexisteumacincianicadetodosossaudveis,omesmose aplica aos demais. Pois no apenas existe cincia nica contemplativa daquelesditosdeuno[tonkathhenlegomenon],mastambmdos ditosparaumanicanatureza[prosmianlegomenoonphusin](...) (1003b5-14) difcilnoserendercontradioqueessasduaspassagens apresentamentresi,emparticularasfrasesgrifadas.Ambasaspassagens relacionamoserscategoriase,noentanto,possuemresultadosopostos:se numa a metafsica, ontologia32, enfim a cincia do ser negada sumariamente, noutra sua existncia anunciada e abre caminho para um longo tratado. Mas, afinal, existe ou no metafsica? possvel uma cincia do ser ou no? Antes de noslanarmosaessaquesto,devemosconfirmarseasfrasessodefato contraditrias.

32Aquiusaremosindistintamenteostermosontologiaemetafsica,muitoemboraAristteles nuncaostenhaempregado,paranosreferirquiloqueelechamavadefilosofiaprimeiraou mesmo sabedoria (sophia). 40 Uma tentativa natural de harmoniz-las ater-se s singularidades de cada texto e alegar que cumprem um papel crucial. Podemos nos apegar ao nica ou aoenquantoouaqualqueroutracoisadesingularacadapassagemedizer que, aprofundando-nos nelas, descobriremos que (I) e (II) so no fim das contas compatveis33. Sadas desse tipo, no entanto, so meramente artificiais: ningum diria que a cincia nica sobre animal, por exemplo, diferente da cincia que contemplaoanimalenquantoanimal;aindaqueasdescriesnosejam idnticas,ningumduvidariadequeestamosfalandodamesmacoisa.E, sinceramente,diferenastopequenasnotmimportncianenhumaquando levamos em considerao as grandes conseqncias dessas duas proposies. Outra tentativa de harmonia apelar para os contextos e no levar to ao p da letra. Talvez haja algum indcio naEudmia que faria Aristteles tomar a liberdadedenegaraontologiasem,verdadeiramente,neg-la(pois,ningum duvidariadaseriedadedaMetafsica,umavezquetodoumtratadofoiescrito baseando-se nessa frase). No entanto, observando outra parte do captulo 8 do primeirolivrodaticaEudmia,Aristtelesdefendeidiasaindamaisradicais contraametafsica:eledizqueessasquestessovaziasequealgica,ou seja, o estudo dos discursos deve cuidar de assuntos como as Idias: Thediscussion,however,ofthisviewbelongsnecessarilytoanother inquiryandoneforthemostpartmorelogical,forargumentsthatareat once destructive and general belong to no other science but logic. But if we

33 Aparentemente esse o caminho de SHIELDS: These questions have a false presupposition. For they presuppose that Aristotle did change his mind about the possibility of a science of being. () What is noteworthy, however, is Owens quoting Aristotle as introducing a general science of beinginMetaphysicsiv.1.Aristotledoesnotintroducesuchascience;rather,heannouncesa science of beingquabeing, where this is not clearly the science whose existence he had earlier denied.Forthequalocutiondelimitsthescopeoftheinquiryinawayfullycompatiblewith AristotlesearlierdenialofascienceofbeingOrderinMultiplicity,p.223s.Masoprprio SHIELDS ir se render incompatibilidade, ver nota 40. ALLAN tambm no aceita a dificuldade e porduasrazes:(...)first,E.E.seemstometopresupposeinseveraldetailsthedeveloped metaphysicaldoctrineofAristotle,andthereforepresumablythelaterviewofmetaphysicsas generalontology;tosettlethisissue,acomprehensivesurveyoftherelationbetweenE.E.and Metaph. would have to be undertaken. Secondly, my impression of the text does not agree with Prof. Owens in this respect. He seems to me to sharpen unnecessarily the antithesis between the Ethics on the one hand, and Metaph. G on the other () I do not think there is an inference of this kind. In E.E. Aristotle only states in succession the fact that good and being have many senses, and that there does not in fact exist a single science of either. He does not tie his own hands by asserting roundly that this science could not come into existence. (Aristotles Criticism of Platonic Doctrine concerning Goodness and the Good. Proceeding of Aristotelian Society, vol. 64, 1963-4, p.286)CuriosoqueasduasimpressesdeALLANnoseajudam:seaindanoexistiaa ontologia, ento Aristteles no podia usar o instrumental dela na Eudmia. 41 mustspeakbrieflyaboutthesematters,wesayfirstthatitistospeak abstractlyandidlytoassertthatthereisanIdeawhetherofgoodorof anythingwhateverthishasbeenconsideredinmanywaysbothinour popular and in our philosophic discussions. (EE I 8, 1217b16-23) Noextremooposto,nocaptulo6doprimeirolivrodaticaNicomaquia no s no encontramos qualquer indcio da lgica, nem uma negao explcita dascinciasdobomedoser,comovemosumatentativasincera,embora sumria, de situar o estudo do bom em uma filosofia. But what then do we mean by the good? It is surely not like the things that onlychancetohavethesamename.Aregoodsone,then,bybeing derived from one good or by all contributing to one good, or are they rather one by analogy? Certainly as sight is in the body, so is reason in the soul, andsooninothercases.Butperhapsthesesubjectshadbetterbe dismissed for the present; for perfect precision about them would be more appropriatetoanotherbranchofphilosophy.Andsimilarlywithregardto the Idea (...) (EN I 6, 1096b26-33) Dessemodo,assuntoscomoobome,porextenso,osernoseriam relegados a meros estudos lgicos mas a uma cincia efetiva. No basta apontar queonossointerlocutorestbrincandocomaspalavras,hdefatoum conhecimento que cuida desses assuntos e encontra neles alguma verdade. V-se, portanto, que a tica Nicomaquia est em conformidade com a Metafsica ou pelo menos no a est negando, como o faz claramente a Eudmia. Pode-se,porfim,tentarharmonizar(I)e(II)dasmaisdiversasformas, pode-semesmoficarnadvida,masofatoqueatualmentemaisevidncias apontam para a contradio e se no h argumentos fortes o bastante em sentido contrrio, preciso aceit-la e explicar por que ela h. AexplicaotradicionaljogaraticaEudmianomundodasobras inautnticas(dificilmentealgumconsiderariaqueaMetafsica,oumesmoseu livro IV, sofre de inautenticidade). Grandes pensadores do sculo XX acreditavam nisso34.Oquadro,ento,seriaoseguinte:hcontradioentreambasas

34CHERNISSdestacou-seporterusadojustamenteacontradioacimaparaprovara inautenticidade da tica Eudmia. (Aristotles Criticism of Plato and the Academy. Baltimore: 1944. p. 327, n. 143 apud ZINGANO. Disperso Categorial e Metafsica em Aristteles. Discurso, v. 33, 2003.p.16.Disponvelem:(idem.EstudosdeticaAntiga.SoPaulo: DiscursoEditorial:2007.p.531.)Lembrarquepormuitotempoessaticafoiconsiderada inautntica. 42 passagens, mas isso se d simplesmente