2008 - Criação e Manejo de Quelônios no Amazonas.

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Criao e Manejo de

QUELNIOSno Amazonas

Organizao: Paulo Cesar Machado Andrade

Criao e Manejo de Quelnios no Amazonas(Projeto Diagnstico da criao de animais silvestres no Estado do Amazonas)Organizao: Paulo Csar Machado Andrade - M.Sc. Laboratrio de Animais Silvestres - Ufam Coordenador do Projeto P-de-Pincha Dr.Lus Alberto dos S.Monjel- Ufam Snia Luzia de O.Canto, MSc. -SDS

Apoio: Programa Trpico mido/CNPq

Publicao:

Catalogao na Fonte Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renovveis C967 Criao e manejo de quelnios no Amazonas. / Paulo Csar Machado Andrade (coordenador) Manaus: Ibama, ProVrzea, 2008. 528 p. : il. color.;21 cm. Bibliografia ISBN 978-85-7300-262-1 1. Quelnios. 2. Tartaruga. 3. Manejo. 4. Criadouro. I. Andrade, Paulo Csar Machado. II. Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renovveis. III. Projeto Manejo dos Recursos Naturais da Vrzea. V. Projeto P-de-Pincha. VI. Ttulo.CDU(2.ed.)639

Criao e Manejo de Quelnios no Amazonas. Projeto Diagnstico da Criao de Animais Silvestres no Estado do Amazonas.2008. I Seminrio de Criao e Manejo de Quelnios da Amaznia Ocidental. Ed. Pa ulo Csar Machado Andrade. 2Edio. ProVrzea/FAPEAM/SDS. Manaus/AM. 528 p. Palavras-chave: Quelnios; Tartaruga; Criao ; Podocnemis

Capa: Paulo Andrade Foto da Capa: Jane Dantas - ProVrzea/Ibama Foto Orelhas: Jane Dantas, Paulo Andrade Reviso: Auristela Webster - Edies Ibama e Enrique Calaf Calaf - Edies Ibama Normatizao Bibliogrfica: Helionidia C. Oliveira

Copyright@ProVrzea 2008

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Ministrio do Meio Ambiente MMA Marina Silva Secretaria Executiva Joo Paulo Ribeiro Capobianco Departamento de Articulao de Aes da Amaznia Andr Rodolfo de Lima Programa-Piloto para a Proteo das Florestas Tropicais do Brasil Nazar Lima Soares Instituto Brasileiro do Meio ambiente e dos Recursos Naturais Renovveis Ibama Bazileu Alves Margarido Neto Diretoria de Uso Sustentvel da Biodiversidade e Florestas Antnio Carlos Hummel Coordenao Geral de Autorizao de Uso e Gesto de Fauna e Recursos Pesqueiros Jos Dias Neto Projeto Manejo dos Recursos Naturais da Vrzea Coordenador: Marcelo Bassols Raseira Gerente Executivo: Manuel da Silva Lima Gerente Componente Iniciativas Promissoras: Marcelo Derzi Equipe GTZ: Viktor U. Dohms, Wolfram Maennling Assessora de Comunicao: Jane Dantas

Equipe do ProVrzea/Ibama Alzenilson Santos Aquino, Antnia Barroso, Anselmo de Oliveira, Arlene Souza, Csar Teixeira, Cleilim Albert de Sousa, Cleucilene da Silva Nery, Flvio Bocarde, Gionete Pimentel de Miranda, Kate Anne de Souza, Maria Luiza G. de Souza, Mrio Thom de Souza, Patrcia Maria Ferreira, Raimunda Queiroz de Mello, Tatiane Patrcia Santos de Oliveira, Tatianna Silva Portes, Valdnia Melo e Willer Hermeto. ProVrzea/Ibama - Rua Ministro Joo Gonalves de Souza, s/n Distrito Industrial - 69.075-830. Manaus, AM. Tel. (92) 3613-3083 / 6246 / 6754. Fax. (092) 3237-5616. Site: www.ibama.gov.br/provarzea

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Dona lebre s queria correr o dia inteiro, porm, dona Tartaruga andando chegou primeiro! (La Fontaine)

Aos meus pais, Manuel e Regina, Por todo o incentivo, sempre! Ediana e ao Gustavo por todo amor e pacincia! Ao Rosinaldo da Costa Machado, Professor do Centro Agropecurio, UFPA e Manuelino Bentes, Seo Mocinho Lobo, pelo exemplo de vida (in memorian)

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Agradecimentos Ao Projeto Manejo dos Recursos Naturais da Vrzea ProVrzea/Ibama, pelo reconhecimento ao Programa P-de-Pincha como iniciativa promissora para as vrzeas amaznicas e por tornar real o sonho desta publicao. Ao Governo do Amazonas, que atravs da Fapeam e da Secretaria de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentvel apoiaram a realizao do I Seminrio de Criao e Manejo de Quelnios da Amaznia Ocidental, em 2004, que deu origem a este livro. Ao Programa Trpico mido, do Conselho Nacional de Desenvolvimento Cientfico e Tecnolgico/CNPq, ao Ibama-AM e Universidade Federal do Amazonas pelos recursos financeiros, humanos e logsticos empregados nesses nove anos de pesquisa, e pelo reconhecimento da importncia estratgica da fauna para a regio amaznica. Ao Centro de Conservao e Manejo de Rpteis e Anfbios (RAN) pela trajetria de luta. Ao coordenador do PTU/CNPq, Dr. Lus Alberto dos Santos Monjel, por todo o apoio, boa vontade e, fundamentalmente, otimismo, mesmo nas horas mais difceis. Ao ex-Presidente do Ibama, Hamilton Casara, incentivador dos trabalhos interinstitucionais e da pesquisa com fauna no Amazonas. Ao sr. Geraldo Lima, nosso motorista, que vem acumulando milhas de estrada e de biometria de tartaruga junto com a nossa equipe. Aos tcnicos do Ibama, acadmicos da Ufam, bolsistas e voluntrios de todas as horas trabalhadas com quelnios (Joo, Pedro, Francimara, Paulo Henrique, Francivane, Sandra, Renata, Lus, Kildare, Clvis, Anndson, Eleisson, Wander, Jonathas, Carlos, Hugo, Hellen, Clo, Midian e Vickson). Ediana e ao Gustavo, por terem conseguido suportar toda essa loucura que foi acompanhar as pesquisas e editar este livro em trs meses. Ao Stones Jnior, pela pacincia e horas de conserto dos problemticos computadores desta edio. Aos meus pais, familiares e, sobretudo, Deus!

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SumrioIntroduo........................................................................ 1 Captulo 1: Manejo comunitrio de quelnios a parceria ProVrzea/Ibama P-de-Pincha........................ 12 Captulo 2: Reviso sobre as caractersticas das principais espcies de quelnios aquticos amaznicos..................................................................... 24 Captulo 3: reas de reproduo de quelnios protegidas pelo RAN-Ibama/Amazonas e Ufam................. 55 Captulo 4: Ecologia de quelnios pelomedusdeos na Reserva Biolgica do Abufari...................................... 127 Captulo 5: Gentica molecular das populaes das espcies de quelnios do gnero Podocnemis na Amaznia: resultados preliminares................................. 174 Captulo 6: Fisiologia e bioqumica de quelnios e suas implicaes para o manejo e a criao em cativeiro......................................................................... 193 Captulo 7: Instalaes para a criao de quelnios....... 222 Captulo 8: Alimentao e nutrio de quelnios aquticos amaznicos (Podocnemis spp.)........................ 259 Captulo 9: Desenvolvimento de tartaruga-daamaznia (P.expansa) e tracaj (P. unifilis) em cativeiro, alimentados com dietas artificiais em diferentes instalaes..................................................... 287 Captulo 10: Manejo em criaes de quelnios aquticos no Amazonas: adubao, densidade de cultivo, desempenho de diferentes espcies, populaes e sexo.......................................................... 329 Captulo 11: Manejo reprodutivo, predao e sanidade....................................................................... 367 Captulo 12: Caracterizao socioeconmica e ambiental da criao de quelnios no estado do Amazonas e comercializao........................................... 408 Captulo 13: Cultivo de tartaruga-da-amaznia (P. expansa): alternativa ecolgica, tcnica e econmica ao agronegcio amaznico.............................................. 437 Captulo 14: Abate experimental da tartaruga-daamaznia (P. expansa) criada em cativeiro..................... 449 Referncias bibliogrficas........................................... 487

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Introduo

O homem da Amaznia sempre aproveitou os recursos da fauna como alimento ou fonte de subprodutos (peles, penas, leos, etc.) para a venda. A proibio da caa, em 1967, no extinguiu essa atividade, mas a reduziu drasticamente, retirando uma das fontes de renda dos ribeirinhos. Desde o sculo XVII que a regio onde hoje se situa o estado do Amazonas conhecida como o grande berrio de quelnios de gua doce. A explorao realizada pelos portugueses trazia capitania de So Jos da Barra do Rio Negro, milhes de tartarugas (Podocnemis expansa), tracajs (Podocnemis unifilis) e ias (Podocnemis sextuberculata) para serem abatidos. Em 1792, segundo relatos de Silva Coutinho apud Andrade (1988), registrase em apenas um ano o abate de 24 milhes de tartarugas na cidade da Barra do Rio Negro, a futura Manas. A primeira proibio surge em 1849, restringindo a produo de manteiga de ovos e proibindo o consumo de filhotes. Em 1855, surge a primeira Resoluo de n 54 protegendo os tabuleiros do Solimes, Amazonas, Urucurituba, Negro e outros, pois as espcies, principalmente a tartaruga, comeavam a desaparecer. Todavia, na Manaus dos idos de 1950 e 1960, era comum vender tartarugas em carrinhos de mo pelas ruas. No Mercado Adolpho Lisboa, o principal da cidade, havia uma rea com curral para armazenamento dos animais vivos que, posteriormente, eram abatidos. No Careiro, Terra Nova e outras reas prximas a Manaus, eram mantidos grandes depsitos de quelnios para abastecer a capital amazonense (Andrade, 1988)

. Antes da proibio total do comrcio e captura de quelnios, em 1967, o ento presidente Castelo Branco publicou uma portaria proibindo o comrcio de tartaruga em feiras e mercados. Essa medida criou uma situao de conflito no Amazonas, pois a comercializao de produtos de animais silvestres constava, inclusive, na pauta de cobrana de impostos da Secretaria da Fazenda. Pelo transporte em embarcao fluvial de 20 tartarugas adultas era cobrado Imposto de Circulao de Mercadoria (ICM) de Cr$80,00 (oitenta cruzeiros) equivalente, hoje, a cerca de R$15,00. Em Parintins, por onde passavam embarcaes advindas do Par, trazendo tartarugas do rio Trombetas, Tapajs e do Xingu, houve problemas entre a coletoria do estado e a Delegacia local 1. Com a Lei de Proteo Fauna, Lei N 5.197 de 1967, o comrcio de quelnios foi oficialmente proibido, todavia, o mercado clandestino vem tornando-se cada vez mais forte e organizado. Essa mesma lei j previa em seu Artigo 6, item b, a construo de criadouros destinados criao de animais silvestres para fins econmicos e industriais. Em 1969, saiu a primeira portaria tentando normatizar esse novo tipo de empreendimento, a Portaria N 1.136/1969. Em 1973, com a Portaria N 1.265P, ficava autorizada na Amaznia a implantao de criadouros da fauna. Um dos primeiros grandes projetos de criao de quelnios da Amaznia comeou, na verdade em 1964, sendo, posteriormente, acompanhado pelo extinto Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal (IBDF). Foi o do Lago do Sal, em Juruti, em que filhotes de tartaruga oriundos do rio Trombetas eram criados at atingirem 8 kg

1- Manuel Andrade, Gerente de Operaes da A. Raposo e Cia. Distribuidora de combustvel no Baixo Amazonas, no perodo de 1960 a 1975. Informao pessoal.

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com, aproximadamente, 6 anos de idade, quando eram comercializados. O criatrio pertencia ao sr. Jos Maria Vieira que, segundo relatos, recebeu em um nico lote 100.000 tartaruguinhas. No Estado do Amazonas, as atividades do Projeto Quelnios da Amaznia tiveram incio em 1975 com trabalhos no rio Branco (afluente do rio Negro) e em Codajs, sendo que em 1977 foram criados oficialmente vrios tabuleiros no Purus (Axioma, Santa Luzia, Arami, e outros) e no Juru (prximo a Carauari: Deus Pai, Po, Pupunha, Manari; e em Itamarati: Walter Buri, Marimari, Iracema, etc.). Grande parte dessas reas eram tabuleiros oriundos do trabalho de conservao executado por grandes seringalistas daquela regio. O Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal (IBDF), com apoio dos proprietrios locais e da experincia das comunidades prximas, treinou pessoas e, j naquele ano, houve produo de cerca de 55.000 filhotes nas reas protegidas do Juru (RAN-AM, 2001). Em 1989, a proteo passou a ser realizada apenas nos tabuleiros do Abufari (rio Purus) e em Walter Buri (rio Juru), sendo a produo desses dois tabuleiros estimada em 108.319 filhotes de quelnios. A partir de 1995, os trabalhos de proteo passam a se concentrar na Reserva Biolgica do Abufari (onde se encontra o tabuleiro/praia de maior produo de quelnios no Amazonas), em Walter Buri e na Reserva Extrativista do Mdio Juru (maior rea produtora de quelnios do estado). A produo da praia do Abufari foi de 67.680 filhotes em 1977, subindo para 415.000 em 1994, caindo para 170.000 em 2000. Em 2003, a produo estimada de filhotes de tartaruga em Abufari foi de 260.000 animais. A Resex do Mdio Juru protege cerca de dez tabuleiros remanescentes das reas protegidas pelos antigos donos de seringais: Jacar (seringal Pupunha, comunidade Nova Esperana), Deus Pai, Manari, Ati

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(comunidade do Roque), Gumo do Faco, Bauana, Bom Jesus, Marari (comunidade do Pau-Furado), Itanga, Mandioca. A produo mdia estimada em 250.000 filhotes de tartaruga, tracaj e ia. Desde 2001, o Ibama tem trabalhado em 73 reas diferentes, em oito calhas de rio (Juru, Purus, Madeira, Negro, Uatum, Amazonas, Nhamund e Trombetas), com uma produo mdia anual de 1.500.000 filhotes de quelnios (Andrade, 2002). A venda ilegal de quelnios capturados na natureza ainda extremamente elevada no Estado do Amazonas. A tartaruga e o tracaj so as espcies mais procuradas para a criao comercial. A criao de quelnios depende da retirada de milhares de filhotes dos tabuleiros protegidos pelo Ibama. O principal fornecedor, de 1995 a 1998, era a Reserva Biolgica do Abufari, sendo que a retirada anual de filhotes carecia de qualquer critrio cientfico, com cotas arbitrariamente estabelecidas. No existiam informaes ou qualquer investigao sobre os estoques naturais. Nada se sabia sobre a abundncia e densidade, rea de vida, uso de habitats, taxas de sobrevivncia de filhotes em diferentes estgios de vida (filhotes, jovens, subadultos e matrizes). Hoje, os principais fornecedores de filhotes para os criadores do Amazonas so os tabuleiros de Walter Buri, no rio Juru, monitorado pelo Posto de Eirunep, e Sororoca e Tor, no rio Branco/RR. No Estado do Amazonas existem aproximadamente 196 projetos de criao comercial de animais silvestres, em anlise, junto ao Ibama-AM, sendo que j encontram-se registrados 78 criadouros em Manaus, 21,66%; Manacapuru, 21,66%; Itacoatiara, 21,7%; Iranduba, 4,7%; Rio Preto da Eva, 21,66%; Lbrea, 4,7%; So Gabriel da Cachoeira, 2%; e Urucar, 2% (Canto et al., 1999). Destes, 88,46% so criatrios de tartaruga. O Estado o que possui o maior nmero

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de criatrios comerciais de quelnios do pas, com uma demanda

crescente passando de 11 criadouros registrados, em 1997, para 33 criadouros em 2000, atingindo em 2001, 52 criatrios registrados. Ao final de 2003 eram 69 criadouros com cerca de 400.000 animais em cativeiro (Andrade et al., 2003). Quanto ao potencial de mercado, os quelnios so, freqentemente, encontrados nas feiras e nas embarcaes, em todo o Amazonas, tendo como principal ponto de comercializao (90%), Manaus, representando a ordem de animais mais apreendida, com 52,2%. A venda de quelnios (tartaruga e tracaj) sob encomenda representa 22% do total de animais silvestres comercializados para alimentao. Os municpios onde ocorre o maior nmero de apreenses so Manaus (59%), Tef (12%), Manacapuru (7%) e Tapau (2%). Na rea urbana de Manaus o maior nmero de apreenses incide em reas de populaes de baixa renda advindas do interior (zona leste). A tartaruga (80%), a paca (33%) tracaj (30%) so os animais silvestres de maior interesse para os restaurantes, onde os preos variam de R$ 7,57 a 18,76/kg. Nas feiras, os preos de venda ilegal da carne variam de R$ 2,00 a R$ 4,00/kg (Canto et al., 1999). O consumo de quelnios na Amaznia ainda um hbito arraigado na populao local, o que tem levado caa e comercializao ilegal de ovos e de animais adultos. A criao comercial, permitida pela Portaria N 142/92, ainda no consegue atender o mercado e seus preos, ainda so elevados. A demanda por filhotes para criao, tambm grande e o Ibama no est conseguindo atender a todos que querem criar, pois no possui um nmero suficiente de tabuleiros protegidos (Andrade et al., 2003 e 1999). O esvaziamento do meio rural e a falta de incentivos para a agricultura levaram a um quadro em que os que sobreviviam no interior passaram a trabalhar quase que exclusivamente como

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vaqueiros na pecuria, na agricultura de subsistncia ou como pescadores. Como essas atividades no geram tanta renda, a subsistncia e a captao de recursos so conseguidas pela explorao dos recursos naturais. Nesse contexto, entram a castanha, a madeira e a fauna, em sua grande maioria exploradas de maneira predatria e irracional (Smith & Pinedo, 2002). Devido caa de adultos e coleta de ovos, as populaes de quelnios vm desaparecendo. Adultos e ovos so coletados pelas comunidades locais para consumo ou venda para Manaus. Em Carauari, Juru e Parintins/AM, todavia, algumas reas foram protegidas por iniciativa dos prprios produtores rurais e por associaes comunitrias ambientalistas. Desde 1999, a Universidade Federal do Amazonas (Ufam) e o RAN/Ibama-AM, com o apoio das comunidades de Parintins, Nhamund, Barreirinha, Terra Santa, Juruti e Oriximin, das prefeituras locais, CNPq, Fapeam, Programa Universidade Solidria e ProVrzea vm realizando o manejo participativo de quelnios, tendo realizado as seguintes atividades: Seminrio Sobre Manejo Sustentvel de Tracajs (255 participantes) e reunies (21.630 participantes); Capacitao de 101 agentes ambientais; Curso e Reciclagem em Educao Ambiental para 405 professores; Construo de cercados nas reas protegidas e transferncia de ninhos; 5. Fiscalizao; Palestras nas escolas e comunidades (67.606 participantes) sobre meio ambiente e alternativas de desenvolvimento; Minicursos (tecnologia do pescado, criao caipira de galinhas, plantas medicinais, hortas comunitrias, manejo de quelnios, etc., 1.021 participantes); Treinamento de campo para 86 professores, 684 alunos e 238 comunitrios, e visita a campo com 660 participantes; Participao de 850 famlias, envolvimento direto de 3.455 pessoas, e abrangncia de 23.400 pessoas nas 83 comunidades e na sede. Nos primeiros anos, em 1999 - 2000, foram transferidos 1.847 ninhos, 38.229 ovos

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e soltos 29.476 filhotes na natureza (Andrade et al., 2001). O nmero total de filhotes devolvidos natureza de 1999 a 2007 chega a 646.459 (74,4% tracajs, Podocnemis unifilis; 7,6% tartarugas, P.expansa; 10,9% ias, P.sextuberculata; e 7,1% irapucas, P.erythrocephala) em oito anos. Atravs deste programa de conservao de recursos naturais e extenso, denominado P-dePincha, o Ibama e a Ufam conscientizaram e capacitaram essas 83 comunidades de 7 municpios do Mdio-Baixo Amazonas para o manejo racional de quelnios. Apesar de explorados de forma predatria, sem tcnicas para o extrativismo de forma sustentvel, a tartaruga (Podocnemis expansa), o tracaj (P. unifilis) e o ia (P. sextuberculata) tm ampla distribuio e potencial reprodutivo, sendo uma alternativa real de protena (qualidade e quantidade) na dieta dos habitantes da Amaznia. Contudo, para o uso desse recurso necessrio que seja desenvolvido um programa de manejo para evitar uma superexplorao (Voigt, 2003). As taxas de explorao da populao, sua sobrevivncia, recrutamento e tamanho podem ser estimados atravs do estudo de dinmica de populaes. A avaliao dos estoques (grupos discretos de animais com parmetros populacionais constantes na rea de distribuio) tem como finalidade fornecer orientaes sobre o nvel timo da explorao desses recursos aquticos renovveis (Ibama, 2003; Bataus, 1998). A criao de quelnios em cativeiros licenciados poder, de certa forma, amenizar a situao desses animais quanto presso de caa e extino. Atravs da Portaria n 142/92 do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renovveis Ibama, que normatiza a criao comercial da tartarugada-amaznia e do tracaj, em cativeiro, o Governo brasileiro pretendeu proporcionar ao consumidor de produtos da fauna, a oportunidade de conseguir o animal para consumo, de forma legal,

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contribuindo para a conservao e a preservao de ambas as

espcies e para a diminuio da caa predatria, oferecendo uma nova alternativa comercial para os produtores rurais locais (Duarte, 1998). Hoje, a venda ilegal ainda quantitativa e qualitativamente uma forma de concorrncia desleal para a queloniocultura amazonense. Entretanto, espera-se que o aumento da oferta de produtos oriundos de criadouros licenciados de animais silvestres diminua a presso de caa sobre os estoques naturais, cujo manejo natural ser um fator importante para manter a conservao das espcies de elevado valor econmico. Apesar da importncia estratgica dessa atividade, at meados da dcada de 1990, poucas pesquisas haviam sido realizadas que pudessem oferecer subsdios cientficos para tecnologias adequadas e eficientes de manejo em cativeiro. At bem pouco tempo, no se tinha idia de parmetros como taxa de crescimento, alimentao e exigncias nutricionais, densidade da criao, instalaes, entre outros, para a criao em cativeiro (Silva, 1988; Cenaqua, 1994; Ferreira, 1994). A maioria das informaes, possivelmente geradas pelo Ibama, ainda no haviam sido disponibilizadas em livros ou peridicos cientficos para o pblico. Hoje, na Amaznia brasileira, as espcies economicamente expressivas e autorizadas pelo Ibama para criao comercial so a tartaruga (Podocnemis expansa) e o tracaj (P. unifilis). Para estimular a criao desses animais em cativeiro, o antigo Centro Nacional dos Quelnios da Amaznia Cenaqua, hoje RAN (Centro de Conservao e Manejo de Rpteis e Anfbios), criou os Ncleos Experimentais de Tecnologia de Criao de Quelnios. No Amazonas, esses ncleos no foram criados e os queloniocultores

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pioneiros no tiveram assistncia tcnica adequada, baseando suas criaes no conhecimento emprico e em algumas informaes repassadas pelo Cenaqua Ibama, Amazonas (Duarte, 1998). Diante da real situao da criao em cativeiro de tartaruga e tracaj no estado do Amazonas, percebeu-se a necessidade de determinar parmetros zootcnicos para a queloniocultura e a partir desse quadro, diagnosticado, propor formas de manejo para garantir melhores desempenhos desses animais em cativeiro. A Universidade Federal do Amazonas (Ufam) e o Ibama iniciaram em 1997 o projeto Estudos de Zootecnia, Biologia e Manejo de Animais Silvestres para a Regio Amaznica e em 1998 o Diagnstico da Criao de Animais Silvestres no Estado do Amazonas, com apoio do Programa Trpico mido/CNPq. Atravs dessa parceria, um grupo de pesquisadores das duas instituies passou a desenvolver trabalhos sistematizados de manejo, nutrio, gentica, fisiologia e bioqumica, parasitologia, ecologia reprodutiva, biologia do crescimento e estudos socioeconmicos sobre os criatrios. Em visitas bimestrais aos criadores, os pesquisadores passaram a prestar assistncia tcnica repassando, simultaneamente, os resultados das pesquisas que estavam realizando. Alm dessa atividade de extenso direta, os trabalhos do grupo foram divulgados atravs da mdia, o que gerou uma procura muito grande por implantao de projetos individuais e comunitrios, cursos e material bibliogrfico. A Ufam e o Ibama conseguiram, nos ltimos nove anos, aprovar projetos na rea de criao e manejo de animais silvestres, que totalizam R$ 827.828,19 destinados pesquisa bsica e aplicada, sendo que a Ufam destinou recursos de capital e custeio

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de mais de R$ 61.533,10 como contrapartida para o projeto Diagnstico.../PTU e para projetos PIBIC, e de R$ 65.000,00 para o Projeto de Extenso P-de-Pincha, alm da concesso de bolsas institucionais de iniciao cientfica e de extenso, totalizando R$ 58.560,00. As principais unidades de pesquisa com criao de animais silvestres so a Fazenda Experimental da Universidade, com criatrios comerciais de quelnios e capivaras, e cientficos, de caititus, queixadas, pacas, cutias e jabutis, e o Centro Experimental de Criao de Animais Nativos de Interesse Econmico (Cecan), do Ibama-AM. Alm desses, completam as unidades de pesquisa os laboratrios de criao de animais silvestres, de zoologia, de parasitologia e de gentica. O campus avanado de Parintins a base logstica para os trabalhos com manejo participativo de quelnios, por comunidades no Baixo Amazonas e oeste do Par. Essas informaes demonstraram a importncia estratgica que a Universidade Federal do Amazonas e a Diviso de Fauna do Ibama-AM conferiram pesquisa com criao e manejo de animais silvestres, sendo que, graas aos resultados alcanados, pode-se dizer que, hoje o Amazonas possui um pacote tecnolgico mnimo para servir de referncia aos criadores de quelnios, capivaras, pacas e cutias no estado (densidade de cultivo; tipo de instalao; alimentos preferidos; comportamento; desempenho de diferentes populaes; aspectos de nutrio; avaliao socioeconmica das criaes; ndices zootcnicos; principais parasitas, local e poca de abate). Alm da pesquisa aplicada, o projeto gerou inmeras informaes sobre a variabilidade gentica e citogentica de animais silvestres, parmetros fisiolgicos dos animais pesquisados e sobre a ecologia reprodutiva e predao de quelnios. O trabalho junto aos criadores permitiu o repasse imediato dos resultados da pesquisa e uma conseqente melhoria nas tcnicas de criao.

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Os resultados foram amplamente divulgados na mdia e em congressos locais, nacionais e internacionais, atravs de peridicos, flderes e, finalmente, em cartilhas.

Este livro serviu de base de discusses durante o I Seminrio de criao e manejo de quelnios da Amaznia ocidental, realizado em Manaus, em 2004, pela Ufam, Ibama e Secretaria Estadual de Desenvolvimento Sustentvel (SDS). Com o apoio do ProVrzea/Ibama, a edio deste trabalho tem por objetivo servir de material didtico e de consulta para produtores, tcnicos do setor primrio e estudantes de graduao, ou cursos tcnicos, que desejam obter informaes compiladas sobre as tcnicas de criao e manejo desse importante recurso faunstico das reas de vrzea, que so os quelnios, resultado dos estudos realizados com os queloniocultores do Amazonas, nos ltimos dez anos.

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Captulo 1 Manejo comunitrio de quelnios A parceria ProVrzea/Ibama P-de-PinchaMarcelo Derzi Vidal1 Tiago Viana da Costa2

A vrzeaA vrzea um dos ecossistemas mais ricos da bacia amaznica em termos de produtividade biolgica, biodiversidade e recursos naturais. Meio de vida para mais de 1,5 milho de ribeirinhos, a vrzea ocupa 300 mil km2, ao longo da calha dos rios Amazonas/Solimes e seus principais tributrios, tamanho equivalente a 6% da superfcie da Amaznia Legal (Santos, 2004). Seus rios e lagos, bem como outros corpos de gua da Amaznia, abrigam 25% das espcies de peixes de gua doce do mundo e outro nmero expressivo de anfbios, rpteis, aves e mamferos que interagem em um complexo e exuberante, porm frgil, ecossistema. Apesar de sua capacidade produtiva e resilincia natural, o atual modelo humano de utilizao dos recursos naturais est levando degradao progressiva de suas reas. Entre as principais causas desse processo podemos destacar (a) a gesto ineficiente; (b) a falta de polticas especficas para promover o desenvolvimento sustentvel em seu ambiente crdito, desenvolvimento tecnolgico, infra-estrutura e regularizao fundiria; (c) a escassez de sistemas

1- Gerente do Componente Iniciativas Promissoras do ProVrzea/Ibama [email protected] [email protected] 2 - Tcnico do Componente Iniciativas Promissoras do ProVrzea/Ibama [email protected]

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efetivos de manejo dos recursos naturais; (d) a deficincia do sistema de monitoramento e controle; e (e) a falta de uma estratgia de conservao especfica para o ecossistema de vrzea (Santos, 2005). O ProVrzea/Ibama Visando atenuar a progressiva degradao nessa regio, considerada uma das mais vulnerveis da Amaznia, o Projeto Manejo dos Recursos Naturais da Vrzea (Ibama, 2002) surgiu para fomentar a conservao e o desenvolvimento sustentvel da vrzea, incentivando a participao das populaes tradicionais que nela habitam. Vinculado ao Programa-Piloto para Proteo das Florestas Tropicais do Brasil PPG-7 e executado pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renovveis Ibama, o projeto tem como objetivo estabelecer as bases tcnica, cientfica e poltica para a conservao e o manejo sustentvel dos recursos naturais das vrzeas da regio central da bacia amaznica. Uma das aes para o alcance de seu objetivo o apoio a projetos que desenvolvam sistemas inovadores de manejo dos recursos naturais, que sejam sustentveis dos pontos de vista social, econmico e ambiental, e que possam ser multiplicveis no somente em outras reas da vrzea amaznica, mas tambm em outras regies do pas. No perodo de 2002 a 2006, o ProVrzea/Ibama, por meio do Componente Iniciativas Promissoras, investiu um montante de R$ 8.451.456,57 em 25 projetos nas seguintes linhas temticas: (a) manejo dos recursos florestais; (b) manejo dos recursos pesqueiros; (c) agropecuria; e (d) fortalecimento institucional. Desse total de recursos, uma expressiva parcela foi destinada a atividades de capacitao, monitoramento e manejo de recursos, e escoamento e comercializao da produo. Ao todo, 115.486 pessoas foram atingidas diretamente nos 38 municpios dos estados do Amazonas e Par, por meio dos projetos (Figura 1).

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Figura 1. Municpios abrangidos pelos projetos apoiados pelo Componente Iniciativas Promissoras do ProVrzea/Ibama.

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O Projeto P-de-Pincha O Projeto P-de-Pincha surgiu em 1999 dentro da Universidade Federal do Amazonas Ufam, a partir da demanda de alguns comunitrios do municpio de Terra Santa, no Par, que solicitaram apoio para a realizao de atividades que levassem ao uso racional da fauna, com nfase em quelnios, recurso outrora abundante na regio mas que, devido ao uso desregrado e predatrio, havia se tornado escasso. Para iniciar as aes do projeto, os tcnicos e professores da Ufam firmaram parcerias com o Ibama, as prefeituras e os comunitrios. Atualmente, o Projeto P- de-Pincha desenvolvido por uma equipe multidisciplinar que integra professores, tcnicos, estagirios e voluntrios de diversas instituies e comunidades. Suas aes so executadas em 76 localidades nos municpios de Parintins, Barreirinha e Nhamund, no estado do Amazonas, e Terra Santa, Oriximin, Faro e Juruti, no estado do Par. Entre os objetivos do projeto, alm da preservao de tracajs (Podocnemis unifilis), pitis (P. sextuberculata), tartarugas (P. expansa) e irapucas (P. erythrocephala), pelos prprios comunitrios, esto presentes as possibilidades de utilizao do recurso para subsistncia, a criao em cativeiro e a comercializao de filhotes para criatrios autorizados. Soma-se a isso todo um programa de educao ambiental com palestras, capacitao de professores e alunos, formao de agentes ambientais voluntrios, atividades de incentivo ao ecoturismo e organizao das comunidades em associaes e cooperativas. A parceria No ano de 2003, a Ufam, por meio da Fundao Rio Solimes Unisol, apresentou a proposta do Projeto P-de-Pincha no processo seletivo de apoio a projetos de manejo dos recursos naturais do ProVrzea/Ibama.

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Em agosto de 2004, aps uma seleo que contou com mais de 27 propostas, o ProVrzea/Ibama iniciou o apoio s atividades do projeto Manejo Sustentvel de Quelnios (Podocnemis sp.) por comunidades do Mdio e Baixo Amazonas Projeto P-de-Pincha. O custo total do projeto de R$ 482.921,00. Sendo R$ 338.130,00 de recursos oriundos do ProVrzea/Ibama e R$ 144.791 fazem parte da contrapartida da Ufam.

Aspectos ambientais A estratgia de preservao adotada pelo P-de-Pincha baseada em diversas fases e atores que, sendo complementares, resultam em aes significativas. Inicialmente, Agentes Ambientais Voluntrios AAVs credenciados pelo Ibama e comunitrios realizam, anualmente, no perodo de desova a fiscalizao das praias utilizadas para a nidificao dos quelnios. O segundo passo a identificao e transferncia dos ninhos das praias naturais para as artificiais, tambm denominadas berrios, seguido do acompanhamento do nascimento dos filhotes e da obteno de dados biomtricos (Fig. 2). Finalmente, aps trs meses de nascidos, ocorre a soltura dos filhotes nas praias originalmente utilizadas para desova e a distribuio de aproximadamente 20% do nmero de nascidos para criadores credenciados, sejam eles com fins comerciais ou de subsistncia. No perodo de 2004 a 2006, as aes do P-de- Pincha resultaram em uma elevao do nmero de filhotes devolvidos natureza, que representaram um aporte de 192 mil e 195 novos indivduos ao ambiente natural. Quando comparamos o nmero de ninhos, o nmero de ovos e o nmero de filhotes devolvidos natureza (Fig. 3), podemos inferir que a permanncia dos filhotes nos berrios, por cerca de trs meses aps o nascimento, tem permitido maiores chances de sobrevivncia quando devolvidos ao ambiente natural.

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A

B

CFigura 2. (A) Ninho de quelnio em praia natural; (B) Ninhos de quelnios em praias artificiais; (C) Biometria de filhotes.

Devido s aes desenvolvidas pelo projeto, provvel que o nmero de filhotes produzidos pelo P-de- Pincha seja superior em relao ao que poderia ser produzido em ambiente natural. Isso ainda reforado, segundo os comunitrios, pela maior quantidade de indivduos adultos que vem sendo observada nas reas manejadas, o que h muito tempo no acontecia. Entretanto, analisando por espcie manejada, pode-se verificar um grande aumento no nmero de ninhos e ovos de irapucas, ao contrrio das demais espcies de quelnios trabalhadas pelo projeto que, praticamente, mantiveram-se constantes ao longo de trs anos (Tab. 1). Esses valores podem estar relacionados grande presso antrpica sobre espcies culturalmente utilizadas para consumo

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e que apresentam um valor comercial elevado, tais como a tartaruga e o tracaj.

90.000 80.000 70.000 60.000 50.000 40.000 30.000 20.000 10.000 0 2004 N Ninhos 2005 N de Ovos 2006 Soltura

Figura 3. Grfico comparativo entre o nmero de ninhos, nmero de ovos e soltura no perodo de 2004 a 2006.

Tabela 1. Acompanhamento das desovas de quelnios no perodo de 2004 a 2006.

Espcie Tracaj Piti Tartaruga Irapuca Total

2004 N de N de ninhos ovos 2.504 55.384 830 12.791 83 5.964 70 597 3.487 74.736

2005 N de N de ninhos ovos 3.315 67.034 797 11.004 39 3.888 282 2.059 4.433 83.985

2006 N de N de ninhos ovos 2.823 61.525 537 9.030 64 6.331 755 5.838 4.179 82.724

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Aspectos sociais Um fator de sucesso do P-de-Pincha o excelente trabalho de educao ambiental desenvolvido nas instituies de ensino dos municpios abrangidos. O projeto consegue mobilizar professores, tcnicos e alunos de escolas municipais e estaduais, e os professores tm se mostrado extremamente satisfeitos com os conhecimentos adquiridos e materiais didticos utilizados. As atividades realizadas com o intuito de promover a educao ambiental foram baseadas em cursos, palestras, gincanas e apresentaes artsticas e culturais desenvolvidas pelos tcnicos e comunitrios participantes do projeto. At o momento, foram realizadas 356 atividades de educao ambiental com uma participao mdia de 4.179 pessoas por semestre e capacitando 252 professores nas diversas reas de atuao do projeto. O projeto conta ainda com uma excelente participao de crianas e adultos nas atividades de transferncia de ninhos e soltura de filhotes, sendo este ltimo um evento festivo e que congrega representantes de diferentes idades, sexo, religio, classe social e cor, e cria condies bsicas para um trabalho de conservao que apresenta retorno produtivo em mdio e longo prazo (Fig. 4). O sucesso das atividades desenvolvidas pelo P-de- Pincha tambm pode ser medido pela expectativa que tem gerado nos municpios vizinhos, onde visto como um exemplo de sucesso a ser seguido, sendo os tcnicos e monitores constantemente convidados a proferirem palestras e cursos sobre a experincia desenvolvida. Aspectos econmicos

A criao em cativeiro promovida pelo P-de- Pincha visa suprir uma demanda cultural nas reas de vrzea

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o consumo de carne e ovos de quelnios e ainda satisfazer as novas tendncias dos mercados nacional e internacional, que cada vez mais tm procurado alternativas de produo que promovam e valorizem o manejo de fauna silvestre por populaes tradicionais. Nesse aspecto, at o momento, foram implementados 26 criadouros autorizados pelo Ibama (Fig. 5), distribudos nos municpios de Barreirinha, Parintins, Terra Santa e Oriximin, e alojados 8.187 animais. No entanto, a comercializao ainda no ocorreu, pois os indivduos ainda no apresentam o tamanho de abate que requer o mercado. A experincia da criao em cativeiro promove um aporte de informaes biolgicas (taxas de crescimento, densidade de indivduos por rea, recursos alimentares, doenas, entre outros) sobre as espcies manejadas e que podem ser comparadas com experimentos em condies melhores controladas e com dados obtidos a partir de animais provenientes de reas naturais.

Figura 4. Soltura de filhotes no municpio de Terra Santa, Par.

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Figura 5. Modelo de tanque utilizado para a criao de quelnios em cativeiro.

Disseminao O projeto P-de-Pincha alcanou uma boa articulao e parceria com instituies locais (associaes, escolas, grupos de jovens, etc.), prefeituras, organizaes de ensino e pesquisa (Inpa, Ufam, ONGs), de conservao e controle (Ibama) e tem utilizado um amplo leque de instrumentos de difuso (rdio, matrias na televiso, jornais, cartilhas, etc.), o que tem feito com que as aes no somente sejam divulgadas em outras reas, mas que ocorra a replicao baseada nas experincias do projeto (Fig.6).

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Outra relevante estratgia de disseminao o intercmbio das iniciativas promissoras. O evento, realizado anualmente desde 2002 pelo ProVrzea/Ibama, promove a troca de experincias entre tcnicos, lideranas comunitrias e coordenadores dos projetos apoiados. O evento permite ainda ampliar a viso dos participantes, compartilhar avanos e dificuldades e criar laos de amizade e colaborao para a execuo dos projetos.

Figura 6. Cartilha produzida a partir das experincias do Projeto P-dePincha.

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Concluso

Quando analisamos os avanos obtidos ProVrzea/Ibama Projeto P-de-Pincha podemos iniciativa no somente promissora. Hoje a consolidada e promove um dilogo de saberes empricos, diferentes sim, porm complementares.

pela parceria concluir que a parceria est acadmicos e

Ao longo da parceria verifica-se a qualificao e o aperfeioamento dos participantes que passaram a ter um vocabulrio mais rico, melhorando sua capacidade para transmitir e adquirir informaes de forma contnua. Muitos passaram a se entender como pessoas, com uma riqueza de conhecimentos sobre seu ambiente, o que lhes ajuda a viver e conviver com os limites do ecossistema local, promovendo a busca de melhores metodologias, a replicao de atividades bem-sucedidas e, principalmente, a discusso de polticas pblicas socioambientais mais efetivas e adequadas ao cenrio amaznico.

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Captulo 2 Reviso sobre as caractersticas das principais espcies de quelnios aquticos amaznicosJoo Alfredo da Mota Duarte Francimara Sousa da Costa Paulo Cesar Machado Andrade

Os quelnios existem, aproximadamente, desde o Jurssico (250 milhes de anos) at hoje, e possuem de 211 a 335 espcies de gua doce, salgada (8) ou terrestre (34) (Garschagen, 1995). Durante o fim do Cretceo e o comeo do Paleoceno, os rpteis sofreram uma extino, quando muitas tartarugas de diversas famlias foram extintas. No Cretceo, o gnero Podocnemis existia na Amrica do Norte. Durante o Cretceo superior e o Eocnico so encontrados fsseis desse gnero na Europa e frica. Hoje, esse gnero existe em Madagascar (frica) e na Amrica do Sul, indicando ser bastante antigo (Alho, Carvalho & Pdua, 1979). Na Amaznia brasileira, os quelnios do gnero Podocnemis so a tartaruga (Podocnemis expansa), o tracaj (P. unifilis), o ia ou piti (P. sextuberculata) e a irapuca (P. erythrocephala) (Figura 1). Sendo encontrados tambm outros quelnios como cabeudo (Peltocephalus dumerilianus), jabuti (Geochelone carbonaria e o G. denticulata), matamat (Chelus fimbriatus) muu (Kinosternon

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scorpioides), aperema (Rhinoclemmys punctularia), jabuti-machado (Platemys platycephala) e lal ou cgado (Phrynops nasutus) (Molina & Rocha, 1996).

Figura 1: Filhotes de tracaj (Podocnemis unifilis), irapuca (P. erythrocephala), ia (P.sextuberculata) e tartaruga (P.expansa) (de cima para baixo, sentido antihorrio).Foto: P-de-Pincha (Oliveira, P.H.).

Tartaruga (Podocnemis expansa) No Estado do Amazonas h a ocorrncia natural da tartaruga-da-amaznia (Podocnemis expansa) que, na linguagem indgena, denominada por jurar-au, ara e, provavelmente, aiu para indivduos novos (Figura 2). Sendo conhecida por tortuga, tortue, tartarucha, turtle, schildkrote, tataroukhos, em espanhol, francs, latim, ingls, alemo e grego, respectivamente (Garschasen, 1995). encontrada na bacia Amaznica desde o leste dos Andes at a bacia do Orinoco.

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Figura 2: Tartaruga (P. expansa). Foto: RAN/Ibama-AM(Oliveira, P.H.).

A tartaruga-do-amazonas pertence ao filo Chordata, subfilo Vertebrata, classe Reptilia, subclasse Anapsida, ordem Chelonia (Testudinata), subordem Pleurodira, superfamlia Chelonioidea, famlia Podocnemidae, gnero Podocnemis e espcie P. expansa Schweigger (1812) (Cenaqua, 1992). O macho de Podocnemis expansa denomina-se comumente por capitari ou capitar, sendo, aproximadamente, duas vezes menor em tamanho corporal do que a fmea, segundo Coimbra Filho (1967) apud Nogueira Neto (1973). Sendo o maior quelnio de gua doce da Amrica do Sul, a tartaruga (P. expansa) pode chegar a medir de 75 a 107 cm de comprimento, sendo em mdia 91 22,627 cm (Lima, 1967; Molina & Rocha, 1996) por 50 a 75 cm de largura, com mdia de 62,5 17,67 cm (Lima, 1967) pesando cerca de 60 kg de peso vivo (Smith, 1979).

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Para o TCA (1997) a idade pode ser determinada a partir dos anis das placas da carapaa, sendo que uma fmea com 45,2 cm de carapaa apresentava oito anis na placa dorsal da carapaa, indicando, provavelmente, que teria oito anos de idade. Tracaj (Podocnemis unifilis) O tracaj (P. unifilis) Figuras 3 e 4 encontra-se distribudo por toda a Bacia Amaznica. As fmeas so maiores do que os machos. Possui a forma ovalada, carapaa gris escura quando molhada, com o plastro de colorao escura. Apresenta patas curtas e cobertas com pele rugosa, cabea achatada e cnica, de pequeno tamanho em relao ao corpo. Possui manchas amareladas na cabea, na parte dorsal. Os olhos, bastante juntos, so separados por um sulco. Vive, principalmente, em lagos, rios e igaraps. Supese estar maduro sexualmente aps os sete anos. Alimenta-se de frutas, sementes, razes, folhas e, ocasionalmente, de insetos, crustceos e moluscos (Reis, 1994). Procura desovar isoladamente em barrancos, em covas de, aproximadamente, 30 cm de profundidade onde coloca 35 ovos em mdia (Soini, 1995).

Figura 3: Filhotes de tracaj (Podocnemis unifilis), Piraruac/Terra SantaPA. Foto: P-de-Pincha (Andrade, P.C.M.).

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Figura 4: Fmea de tracaj (Podocnemis unifilis), Valria/Parintins-AM. Foto: P-de-Pincha (Oliveira, P.H.).

Os ninhos consistem de escavaes com uma entrada quase circular e uma cmara ligeiramente ovide (Fig. 5). A profundidade pode variar de 18 a 25 cm. O nmero de ovos por ninho varia de 9 a 40, com mdia de 28,8 9,2 ovos. O tamanho mdio dos ovos pode variar de 42,2 x 29,5 mm e peso mdio de 21,7 2,1 g. A desova ocorre principalmente noite, dependendo do local, nos meses de junho a agosto, no oeste do Amazonas; de setembro a outubro no Baixo Amazonas; e em novembro no rio Negro e afluentes. O tamanho mdio da carapaa de 40,9 1,7 mm e peso de 14,7 1,35 g (Tern et al., 1995).

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Figura 5: Ninho de tracaj (P.unifilis). Piraruac/Terra Santa-PA. Foto: P-dePincha (Andrade, P.C.M.).

O tracaj encontrado na Amaznia brasileira vivendo nos rios e lagos, dificilmente migrando aos tabuleiros de desova no perodo de estiagem. Muitas fmeas desovam duas vezes por

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temporada, com intervalos observados de 9 e 10 dias. O nmero e o tamanho dos ovos diminuem com o avano da temporada de desova. Os ovos possuem uma taxa de infertilidade de at 70% ao final da desova. As fmeas so maiores que os machos e chegam a medir cerca de 50 cm de comprimento de carapaa e pesar at 12 kg (Soini, 1995). Estudos realizados por Tern et al. (1992) sobre a reproduo de P. unifilis em praias artificiais, em Iquitos, Peru, em um perodo de cinco meses (junho a novembro), verificaram que houve apenas 27,6% de ecloso (Fig. 6) e desenvolvimento completo dos sobreviventes, fato ocorrido pela falta de fertilidade em 14,4% dos ovos e morte prematura dos embries. O pico de postura nessa regio ocorreu principalmente na segunda quinzena de julho. As covas de tracaj so identificadas pelo monte de argila e de capim umedecidos, com os quais a espcie fecha a cavidade da postura (beiju) Figura 7, no ocorrendo tal fato quando a desova em terreno no argiloso (Alho, 1986).

Figura 6: Ecloso de ovo de tracaj (P. unifilis). Foto: P-de-Pincha (Andrade, P.C.M.).

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Figura 7: Ninho e ovos de tracaj (P. unifilis) no barro. Observar ovos aderidos ao tampo do ninho. Macurican/Nhamund-AM. Foto: P-de-Pincha (Andrade, P.C.M.).

Os ovos de tracaj (Fig. 7) so de forma elipsoidal, de casca calcrea e de cor esbranquiada. Quando esto recm-postos so duros, transparentes e cobertos de um lquido ligeiramente viscoso. No segundo dia de incubao a superfcie dos ovos fica seca e comea a ficar opaca. Ao decorrer da primeira semana de encubao a casca est, na maioria dos ovos, completamente opaca e comea a suavizar-se. Tambm se nota um ligeiro inchao dos ovos que dura at o final do perodo de incubao, resultando no aumento do dimetro dos ovos (Soini et al., 1997). A determinao de sexo em P. unifilis depende da temperatura de incubao (Souza & Vogt, 1994). Os tracajs parecem ser mais rsticos do que as tartarugas, o que tem lhes conferido uma melhor adaptao ao cativeiro (Reis, 1994). Essa uma espcie que pode ser manejada em cativeiro para fins de repovoamento de reas onde est em nmero reduzido, ou para fins comerciais. Possui um grande potencial devido a algumas vantagens como: fcil adaptao s condies biticas e abiticas de cativeiro, resistncia manipulao, elevada taxa reprodutiva em

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cativeiro, fcil adaptao aos alimentos de origem animal e vegetal, rpido crescimento inicial (Acosta et al., 1995), ovos e carne de boa qualidade e boa aceitao pelos camponeses. Observaes realizadas por Tern (1993), sobre ensaios de diferentes dietas em cativeiro de tracajs jovens e adultos, identificaram um aspecto notvel em relao perturbao da gua e ao consumo dos alimentos. Efetivamente, observou-se que quando uma pessoa entrava no tanque ou jaula e ficava perto do comedouro, a gua ficava turva, fazendo com que os animais no viessem comer os alimentos disponveis. Nesses dias o consumo reduzia bastante (at 15% do total dos alimentos oferecidos). Uma situao semelhante foi observada quando o tanque era esvaziado para realizar as amostras mensais. Esse comportamento, provavelmente, se deve ao fato de que o tracaj no se encontra em lugares de guas turvas para evitar o ataque de predadores (guiamse principalmente pelo olfato e no pela viso). Atravs disso se deduz por que o tracaj, em seu meio natural, habita guas de cor escura.

Ia ou piti (Podocnemis sextuberculata)

A Podocnemis sextuberculata denominada vulgarmente de ia, piti e cambua. Smith, 1979, cita que essa espcie encontrada somente nos rios de gua barrenta como o Branco, Solimes e Amazonas (Figuras 8 e 9). Essa espcie tambm encontrada nos rios Trombetas e Tapajs, considerados de gua clara. A fmea possui manchas amarelas com dois barbelos embaixo da boca. A carapaa tem cor marrom-claro e marrom-escuro. O plastro apresenta, principalmente nos indivduos jovens, seis pontas salientes de cor cinza ou marrom. A postura mdia de 15 a 20 ovos de casca mole. O macho chamado de anori e possui tamanho menor que o da fmea, conhecida como piti ou cambua.

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Figura 8: Fmea de ia (P.sextuberculata). Xiac/Terra Santa-PA. Foto: Pde-Pincha (Andrade, P.C. M.).

O ia de menor tamanho que o tracaj. Soini (1997) sugere que essa espcie desova quase sempre em praias arenosas, geralmente prximo da gua. A desova ocorre geralmente noite. Em geral, os ovos de ia so pequenos e mais largos que os de tracaj. A casca mais clara, mais delgada e mais flexvel.

Figura 9: Ia (P. sextuberculata). Foto: RAN-AM (Andrade, P.C. M.).

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Estudos feitos por Pezzuti (1997), no rio Japur (estado do Amazonas), demonstraram que a altura do ninho tem efeito pronunciado na discriminao dos ninhos em pontos aleatrios. As fmeas desovam em locais mais altos e distantes da linha da gua. A profundidade do ninho influi significativamente sobre o perodo de incubao dos embries. A data de oviposio influi no perodo de incubao e na sobrevivncia dos mesmos. A ecloso dos ovos ocorre, geralmente, de 55 a 70 dias. As crias eclodidas permanecem dentro da cova, normalmente, num perodo de 1 a 4 semanas. Portanto, o perodo mdio de nidificao dura 69 dias. A sada dos filhotes ocorre geralmente noite, sobretudo aps a queda de uma forte chuva (Soini, 1995). Estudos feitos por Pezzuti (1998) na Reserva Biolgica do Abufari identificaram atravs de monitoramento de um nico transecto, um total de 3.135 ninhos de ia espalhados por toda a praia do Abufari, produzidos em 1998. Registrou-se a predao de 145 ninhos por jacurarus (Tupinambis nigropunctatus, lagartos grandes pertencentes famlia Teidae). Comparando a distribuio de ninhos predados e no predados, verificou-se que os primeiros so os que se encontram mais prximos vegetao. Embora no exista o padro de agregamento de ninhos, as fmeas de ia mostram-se, tambm, seletivas quanto escolha do local de nidificao, preferindo locais mais altos e distantes da gua. O monitoramento de 219 ninhos permitiu estimar uma taxa de sobrevivncia de 71,6% e razo sexual de 28,5% de machos. Os predadores de filhotes de ias identificados na Reserva Biolgica do Abufari, Amazonas, foram: Phractocephalus hemioliopterus (pirarara), Osteoglossum bicirrhosum (aruan),

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Leiarius marmoratus (jandi) e Sorubimichthys planiceps (peixelenha) (Garcia, 1999). O ia , das espcies de quelnios, a mais consumida em Manaus. Sua carne se encontra venda, de forma ilegal, nas feiras a R$ 3,59/kg (Canto et al., 1998). Anatomia e fisiologia Evaristo (1995) apud Duarte & Andrade (1998), cita que os quelnios so rpteis que possuem uma carapaa ssea que protege os rgos internos. Essa carapaa formada pela fuso das costelas, externo e vrtebras. Em geral, denomina-se casco ao conjunto das partes rgidas dorsal e peitoral. Contudo, a parte superior denomina-se carapaa, sendo achatada, mais larga na regio posterior, com colorao marrom, cinza ou verde- oliva, e a inferior plastro, sendo ambos compostos por placas ossificadas revestidas por uma camada queratinosa de forma convexa e achatada, quase horizontal, unidas por uma estrutura ssea conhecida por ponte (Alho, Carvalho & Pdua, 1979; Molina & Rocha, 1996). Na P. expansa, a carapaa (Fig. 10) composta por 37 escudos (2 cervicais seguidos de 5 escudos vertebrais com duas sries de 4 pleurais, no total de 8; no lado de fora dos pleurais e estendendo-se pelos dois lados a partir dos cervicais h 22 escudos marginais). Os escudos do plastro so divididos em pares por uma linha longitudinal. Anteriormente, h um escudo gular intercalado por dois intergulares. Seguem-se um par de humerais, peitorais, abdominais, femurais e anais, respectivamente, totalizando 13

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escudos com possibilidade de haver variaes em forma e nmero. Os ossos do casco so cobertos por escudos crneos. A diviso entre escudos adjacentes denomina-se costura, que poderia ser uma espcie de sulco (Alho, Carvalho & Pdua, 1979; Molina & Rocha, 1996).

Figura 10: Desenho esquemtico de carapaa de Podocnemis expansa.

Os quelnios apresentam um tubo digestivo completo, com digesto extracelular, sendo o estmago uma dilatao do tubo digestivo, terminando em um orifcio denominado cloaca, semelhante ao de ave, pelo qual desemboca a urina, fezes e material seminal, ocorrendo tambm a vascularizao nas paredes como brnquias cloacais (essa regio, possivelmente, realiza uma respirao cutnea mnima: sangue-parede vascular-gua). A digesto auxiliada pelo fgado e pncreas, ocorrendo parcialmente no estmago e finalizada no intestino, havendo, neste ltimo, a absoro do alimento digerido no duodeno. No intestino grosso ocorre a formao de fezes. A circulao fechada (vasos e veias),

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ramificando-se at formar uma rede de capilares dupla e incompleta. O sangue passa duas vezes pelo corao onde se mistura o venoso e o arterial, devido a uma comunicao mediana nas duas metades do ventrculo. O corao possui duas aurculas e um ventrculo, parcialmente dividido em duas pores (Evaristo, 1995). As espcies podem ser identificadas por caractersticas externas da carapaa. O comprimento da carapaa pode ser medido em linha reta, no ponto de maior amplitude entre a borda anterior e posterior, e a altura pode ser medida transversalmente no ponto de maior amplitude entre as placas marginais (Medem, 1976, apud Duarte & Andrade, 1998). As potentes patas podem ser recolhidas para dentro como medida de segurana e descanso. So duas dianteiras de cores escuras e cobertas com pele rugosa e cinco unhas largas, firmes, semicurvadas e acanaladas na parte inferior, e duas traseiras com quatro unhas e caractersticas idnticas, pois o nome genrico atribui-se aos calcanhares das patas posteriores, dotados de unhas para reptar e cavar (Lima, 1967; Nomura, 1977). As tartarugas so ectotrmicas (heliotrmicas), como os lacertlios e os crocodilianos e podem atingir um grau considerado de estabilidade da temperatura corprea por meio da regulao atravs da troca de energia trmica com o ambiente (termorregulao). A temperatura corporal de tartarugas que se aquecem ao sol mais elevada do que a temperatura da gua e do ar e pode acelerar a digesto, o crescimento e o desenvolvimento dos ovos. Alm disso, o aquecimento pela luz do sol pode auxiliar as

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tartarugas aquticas a livrarem-se de algas e sanguessugas (Pough, Heiser & McFarland, 1993). No comportamento social, as tartarugas podem empregar sinais tteis, visuais e olfativos. Na poca do acasalamento, os machos nadam procura de fmeas e a cor e o padro das patas posteriores permitem que os machos as identifiquem. Utiliza-se tambm o ferormnio para a identificao das fmeas (Pough, Heiser & McFarland, 1993). Dcio, 1995, apud Duarte & Andrade (1998), ao estudar o efeito da submergncia de longa durao sobre o balano energrtico dos diferentes tecidos e caracterizar os padres eletroforticos da enzima lactato desidrogenase (LDH) de Podocnemis expansa, bem como suas principais caractersticas funcionais em 35 indivduos (sendo 18 indivduos para o balano energrtico e 17 para os padres eletroforticos) com tamanho mdio de 9,1140,081 cm e peso mdio de 85,5742,92 g, concluiu que a tartaruga, provavelmente, usa a via glicoltica anaerbica quando submetida ao mergulho forado, elevando sua taxa de lactato no msculo e no crebro, para manter suas funes metablicas. Foi observado que aps 100 minutos de mergulho forado o nvel de glicose aumentou significativamente, (P>0,05) sugerindo que h uma mobilizao do glicognio do fgado para, provavelmente, suprir a demanda inicial do metabolismo glicoltico anaerbico nos tecidos do crebro e msculo. Isso indica que essa espcie detm mecanismo de sustentao em perodos de anoxia semelhante s tartarugas de regio temperada.

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Sexo e reproduo O sexo nas espcies aquticas do gnero Podocnemis pode ser identificado pelo tamanho, altura da carapaa, forma do plastro e fenda da placa anal (formato de U para machos e de V para fmeas adultas) (Pritchard & Trebbau, 1984) Figura 11.

Figura 11: Sexagem de jovens de tartaruga (P. expansa): macho (esquerda) e fmea (direita) Foto: RAN-AM (Andrade, P.C.M.).

Para Danni & Alho, 1985, apud Duarte & Andrade (1998) no h dimorfismo externo em tartarugas jovens, antes da maturidade sexual. A determinao sexual pode ser feita atravs do exame dos rgos reprodutores em amostragens dissecadas de filhotes. No entanto, para Molina & Rocha (1996) h dimorfismo sexual para Podocnemis expansa, pois os jovens apresentam manchas amarelas na cabea, o macho possui a cauda comprida e a fmea tem a cauda curta. Diversos trabalhos sobre a determinao do sexo em quelnios encontraram relao entre a temperatura e a razo sexual do ninho, sendo que no caso de tartarugas, tracajs e ias, temperaturas acima de 32C , ou ninho em locais com amplitude

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trmica elevada (grande variao entre a temperatura umbral e a mxima) determinam o nascimento de mais fmeas (Bull & Vogt, 1979; Morreale et al., 1982; Vogt & Bull, 1982, 1984; Wilhoft et al., 1983; Spotila et al., 1987; Souza & Vogt, 1994). Segundo Alho & Pdua (1982) h uma sincronia entre o regime de vazante e o desencadeamento do comportamento de nidificao. necessria uma observao no perodo reprodutivo, proteo aos animais adultos em rea de desova, captura de filhotes (recm-nascidos) para cri-los em cativeiros e/ou solt-los em lagos naturais ou artificiais. P. expansa tende a entrar na fase de reproduo entre cinco e sete anos de idade, em condies naturais (Lima, 1967). Para o Ibama (1989), a tartaruga (Podocnemis expansa) apresenta a maior parte do desenvolvimento biolgico entre 5 e 10 anos de idade. A maturidade sexual acontece aos 7 anos para os machos e 11 a 15 anos para as fmeas, aproximadamente, realizando o acasalamento na gua aps a desova entre os meses de janeiro e maro. Aps seis meses faz a postura na praia de desova, denominada de tabuleiro, podendo estar acompanhada pelo capitari. O tempo de postura de P. expansa pode estar relacionado diretamente com a idade do animal ou com a variao do fenmeno de enchente e vazante do rio, no qual h uma combinao com o desenvolvimento do processo de nidificao da tartaruga, que cumpre o determinismo biolgico de retornar ao mesmo local de postura, podendo ser isolado ou em faixas marginais. (Pough, Heiser & McFarland, 1993; Alho & Pdua, 1982).

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Por ter um hbito gregrio na poca de desova, diferente do tracaj, P. unifilis (que desova isoladamente em solo ngreme margem do rio, aproveitando local menos exposto) nessa fase que a tartaruga fica mais vulnervel predao antrpica. Os mecanismos de orientao que as tartarugas utilizam para encontrar a rea de oviposio so, provavelmente, os mesmos utilizados para encontrar seu caminho entre rea de forrageio e de repouso. A familiaridade com sinais locais um mtodo eficiente de navegao para as tartarugas que podem utilizar o sol como orientador (Pough, Heiser & McFarland, 1993). Nesse processo, os animais permanecem em repouso no leito do rio durante 4,50,7 dias observando a praia de dentro d'gua, ou as fmeas realizam 5,50,7 subidas na praia de desova durante a noite, sem desovar. Depois fazem um passeio para verificar os possveis pontos de abertura da cova e formao do ninho, cuja profundidade est relacionada com o lenol fretico que tem uma variao natural de 0,630,27 m, podendo ser depositados de 50 a 136 ovos (Alho e Pdua, 1982) ou de 80 a 300 ovos (Lima, 1967; Nogueira Neto, 1973; Nomura, 1977; Pritchard, 1979; Smith, 1979). Para Espriella (1972), o nmero aceitvel para tartarugas em cativeiro est numa mdia de 80 ovos, de forma esfrica, com peso mdio de 39-43 g, que sero cobertos com areia, pela fmea, aps a desova. A oviposio pode durar de 1,5 a 4 horas, aproximadamente, sendo geralmente noite e, ocasionalmente, tarde ou de manh.

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No perodo reprodutivo de P. expansa so observados os mesmos comportamentos das tartarugas marinhas na fase de desova (Vanzolini, 1967): (1) Assoalhamento essa etapa caracteriza-se pela agregao dos animais em guas rasas, com subidas ocasionais na margem do tabuleiro (praia de desova) para exporem-se aos raios solares; (2) Subida praia para a escolha do local da cova; (3) Deambulao ou caminhada de vistoria nessa fase os animais sobem a praia e exploram o tabuleiro procura de um local de postura; (4) Escavao da cova a primeira atividade a limpeza da areia solta com o auxlio das quatro patas, girando em torno de si mesma. Quando atinge a profundidade de 30 cm a 40 cm passa a usar as patas traseiras at que seu corpo atinja uma posio de 45 a 60 em relao horizontal, fazendo uma cmara. (5) Postura nessa fase as tartarugas no mais se importam com a presena de estranhos e podem ser tocadas sem reao. O valor adaptativo da estereotipia durante a oviposio de P. expansa est relacionado ao sucesso da estratgia evolutiva dessa espcie. A evoluo da eficincia crescente da tcnica estandardizada da postura de ovos resulta numa taxa de reproduo melhor como conseqncia dos padres motores (trabalho muscular) de tal maneira a uniformizar o processo de oviposio, independente da experincia ou aprendizado. O corpo do animal move-se para frente e para trs e tambm executa uma lenta rotao para a direita e a esquerda. Quando aumenta a

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profundidade, as patas traseiras tm mais ao. Com as unhas para baixo, uma pata inserida na cmara de postura, em escavao, fazendo presso para o fundo e com uma ligeira rotao modela a forma e tamanhos exatos da cmara, com 13-18 cm de altura e dimetro de 20-25 cm. A cmara feita a uma profundidade de 50100 cm. Durante esse processo, as patas dianteiras ajudam na sustentao do animal. O ato repetido, inserindo a outra pata na abertura da cmara de postura. Assim que ela estiver pronta, com o ovipositor inserido e o corpo cobrindo a cavidade de postura, iniciase a oviposio. Cada fmea deposita um ovo a cada 10-15 segundos. Durante a postura, o pescoo da tartaruga, se mantm esticado formando junto com a cabea um ngulo igual ao do corpo em relao horizontal. H contraes peristlticas a cada 10-15 segundos seguidas de liberao de ovos e lquidos; (6) Reenchimento da cova assim que comea a escavao os animais entram num processo de ritualizao do comportamento, com grande teor de estereotipia, fazendo movimentos lentos no corpo para a direita e a esquerda, colhendo areia com as patas dianteiras e traseiras, alternadamente. Em geral, a carapaa, cabea e os olhos ficam cobertos de areia lanada durante o fechamento da cova; (7) Retorno gua quando a tartaruga deixa a cova, normalmente faz uma trilha formada de secreo mucide que escorre da cloaca ao caminhar. A cauda posiciona-se para trs, rastejando a cloaca ainda em contrao, sendo uma indicao da postura realizada (marca da cauda arrastada entre as pegadas). Soini (1997), no Peru, observou fmeas de Podocnemis expansa formando uma trilha pela liberao de secreo mucide antes e depois da desova, fazendo um sulco na areia. A caminhada para a gua lenta devido ao cansao, caminhando 3-4 m,

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alternadamente. As patas traseiras podem sangrar devido ao atrito na borda da carapaa, assim como na parte posterior da carapaa durante a escavao. Aps retornar gua, a populao adulta permanece nas cercanias da praia at o nascimento dos filhotes. Nas horas mais quentes do dia pode-se observar as cabeas dos adultos fora d'gua. Na poca prxima ecloso os adultos ficam cada vez mais difceis de serem vistos nas cercanias da praia (Vanzolini, 1967; Alho & Pdua, 1979). Os ovos de Podocnemis expansa ficam incubados de 40 a 70 dias, sendo em mdia 55 21,21 dias e apresentam uma taxa de fecundao de 85 a 98%, desde que permaneam em equilbrio a umidade e temperatura na cmara de incubao, pois a temperatura, umidade e as concentraes de oxignio e dixido de carbono podem exercer efeitos profundos sobre o desenvolvimento embrionrio das tartarugas (Alho, Carvalho & Pdua, 1979; Alho & Pdua, 1982; Santos, 1995; Ibama, 1989). A temperatura do ninho afeta a taxa de desenvolvimento embrionrio e temperaturas excessivamente altas ou baixas podem ser letais. A determinao do sexo dependente da temperatura foi demonstrada em algumas, mas no em todas as famlias de tartarugas, em duas espcies de lagartos e nos crocodilianos (Pough, Heiser & McFarland, 1993). Em estudos laboratoriais realizados por Vogt & Bull (1982) em 14 gneros e cinco famlias de tartarugas com temperatura de 25C e de 31C durante a incubao, produziu-se machos e fmeas, respectivamente. A mudana de um sexo para outro ocorre dentro de um intervalo de 3C ou 4C, dependendo da espcie.

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Nas tartarugas, o segundo tero do desenvolvimento embrionrio consiste no perodo crtico de determinao do sexo, portanto, o sexo dos embries depende da temperatura a que ficam expostos durante essas poucas semanas (Pough, Heiser & McFarland, 1993). Quando os ovos so expostos a um ciclo dirio de temperatura, o ponto mais alto do ciclo o mais crtico para a determinao sexual, com a temperatura podendo diferir entre o topo e o final do ninho (Pough, Heiser & McFarland, 1993). Entretanto, em condies midas, produzem filhotes maiores do que em condies secas, provavelmente, por que a gua necessria para o metabolismo do vitelo (reserva nutritiva do embrio at a ecloso). Quando a gua limitada, as tartarugas eclodem mais cedo e com tamanho corporal reduzido e o seu intestino contm uma quantidade de vitelo que no foi utilizado durante o desenvolvimento embrionrio (Pough, Heiser & McFarland, 1993). A profundidade da cova varia de 30 a 83 cm, com mdia de 56,5 37,476 cm, fato relacionado nebulosidade atmosfrica (Soini, 1997). O transplante de ninhadas de tartaruga, tracaj e ia para a incubao artificial dos ovos, em lugares protegidos, pode ser uma medida importante para a conservao. Para conseguir timos resultados os ovos devem ser extrados, transportados e colocados em ninhos artificiais, sem demora, mantendo sua posio original, ou seja, sem revolv-los. Exceto durante as primeiras horas depois da desova, a manipulao e a rotao dos ovos afeta, significativamente, a viabilidade deles. As condies trmicas do

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ninho tm uma marcada influncia sobre a durao do perodo de incubao e sobre a viabilidade dos ovos. Os ovos incubados em ninhos expostos sombra requerem maior tempo de incubao e tm menor porcentagem de viabilidade dos ovos em relao aos ninhos expostos ao sol (Soini, 1997). As tartarugas, por serem pecilotrmicas, apresentam amplitude trmica de 22C a 32C, e ideal entre 27C a 30C, na qual eclodem as crias medindo em torno de 50 mm de comprimento e 40 mm de largura. A atividade espontnea de alguns indivduos pe o grupo em movimento, uns rastejando sobre os outros, agindo sobre os demais (Lima, 1967; Ferreira, 1994). Todos os filhotes saem do ninho num perodo muito curto e todos, de diferentes ninhos, deixam os ninhos numa mesma noite, talvez porque seu comportamento seja estimulado. Sendo as tartarugas auto-suficientes ao nascer, as interaes entre os filhotes so essenciais para permitir que abandonem o ninho. Os sinais podem ser sonoros, tteis, visuais e/ou olfativos (Pough, Heiser & McFarland, 1993). Essa emergncia simultnea uma caracterstica importante para a reproduo. Nessa fase, os animais jovens esto propensos agresso em decorrncia do equilbrio biolgico imposto pela natureza. A ao dos animais aquticos ou aves silvestres sobre as crias chega a 80% de predao em alguns tabuleiros (Pough, Heiser & McFarland, 1993). Assim, a interferncia do manejo para diminuir essa taxa poder beneficiar os estoques de tartaruga: (1) destinando uma porcentagem das tartarugas eclodidas para criadouros seminaturais; e (2) tornando compulsrio que determinado nmero

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de animais desses criadouros, um nmero predeterminado seja restitudo natureza quando as tartarugas atingirem a condio reprodutiva, acelerando o recrutamento nas populaes naturais e maximizando a taxa de natalidade (Alho & Pdua, 1984). Na Reserva Biolgica do Abufari/Tapau AM, o Ibama desenvolve o programa de proteo s reas de desova. Atravs do Centro Nacional dos Quelnios da Amaznia Cenaqua, atualmente Centro de Conservao e Manejo de Rpteis e Afbios RAN, realizase a proteo do tabuleiro (praia de desova) assim como das matrizes e dos filhotes recm-nascidos. Sendo que estes filhotes, em sua maioria de tartaruga, logo ao abandonarem as covas ficam retidos em cercados de tela para serem apanhados, contados e transportados para a base fsica. Posteriormente, feita a soltura dos animais em local com uma incidncia, provavelmente, menor de predadores naturais aquticos (Armond & Armond, 1990, apud Duarte & Andrade, 1998). Essa atividade realizada na Venezuela com certa similaridade, como cita Ojasti (1995; 1967), assim como em outras reas de concentrao de tartaruga que servem de referncia a programas de manejo, como no rio Trombetas, entre outros (Nomura, 1977; Alho & Pdua, 1984; Pough, Heiser & McFarland, 1993; Ferreira, 1994; Soini, 1997). Segundo Nogueira Neto (1973), possvel obter a reproduo de tartaruga em cativeiro. Na prtica, tem-se a possibilidade da reproduo de quelnios em cativeiro, sem a migrao, desde que haja uma praia artificial para a desova.

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Valor nutricional Segundo Pdua (1981), Ibama (1989) e Cenaqua (1994) citando estudos realizados por Ferreira e Graa (1961), Leunge e Flores (1961) e Morrisson (1955), na carne da tartaruga-daamaznia, foram obtido um nvel protico de 88,03% a 94,68%. Pelos valores citados, ao comparar-se com as carnes tradicionais (frango 43,66% a 66,47%; Vaca 44,83%) percebe-se uma superioridade protica. Em anlise realizada quanto qualidade protica, em 100 g de protena, apresentou: Lisina 7,70 g; Histidina 2,21 g; Arginina 4,11 g; Treonina 3,91 g; cido glutmico 16,56 g; Glicina 5,8 g; Valina 6,25 g; Isoleucina 5,41 g; Tirosina 10,64 g e Metionina 5,32 g. Aguiar, 1996, apud Duarte & Andrade (1998), obteve em quatro anlises realizadas em carne de Podocnemis expansa: 1,10 g de lipdio/100 g; 21,17 g de protena/100 g; 94,58 Kcal de energia/100 g; 0,00 g de carboidrato/100 g; onde cita que em geral a carne de animal silvestre magra. Maus, 1976, apud Duarte & Andrade (1998), ao comparar os aspectos bromatolgicos de ovos de galinha e codorna, ambos oriundos de feiras livres de So Paulo, e tartaruga Podocnemis sp., oriundo de feiras livres de Blem PA, mostra que os ovos de tartaruga pesaram em mdia 23,67 g, onde a gema, a clara e a casca pesaram respectivamente 18,55 g; 3,74 g e 1,62 g, com um percentual mdio de 15,38% para a clara, 73,44%, correspondendo gema e 11,18% equivalente casca. O teor de lpides totais, verificado no ovo inteiro, clara e gema em ovos de tartaruga particularmente 7,92 mg/100 g; 0,08 mg/100 g e 18,26 mg/100 g; em ovos de galinha obteve-se 13,08 g/

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100 g; 0,10 g/100 g e 28,70 g /100 g; e nos de codorna foram 10,30 g/100 g; 0,08 g /100 g e 24,03 g/100 g (Maus, 1976). O teor de protena no ovo de tartaruga na poro inteira, clara e gema foi na ordem de 12,70 g /100g; 1,56 g/100 g e 20,58 g /100 g, enquanto que nos de galinha foram 9,98 g/100 g; 9,28 g /100 g e 16,19 g /100 g e nos de codorna obteve-se 9,78 g /100 g; 9,43 g /100 g e 12,07 g/100 g (Maus, 1976, apud Duarte & Andrade, 1998). A composio de cinzas no ovo de tartaruga na poro gema foi superior (1,68 g/100g) ao de galinha (1,25 g/100 g) e codorna (1,36 g/100g) (Maus, 1976, apud Duarte & Andrade, 1998). O teor mineralgico de ferro e fsforo na poro gema nos ovos de tartaruga foi superior (10,9 mg/100 g e 495 mg/100 g) ao de codorna (8,2 mg/100 g e 415 mg /100 g) e galinha (5,0 mg/100 g e 260 mg /100 g) e com um teor de clcio na gema inferior (120,19 mg/100 g) em relao ao de galinha (152,25 mg/100g) e codorna ( 168,13 mg/100 g) (Maus, 1976 apud Duarte & Andrade, 1998). O teor vitamnico de -caroteno foi baixo em ovo de tartaruga (6,06 mg/100 g) relacionado ao de galinha (30,63 mg/100 g), e vitamina A (57,83 mg/100 g), contra os de galinha (69,87 mg/100 g) e codorna (73,95 mg /100 g). Em relao ao tocoferol (total), o ovo de tartaruga estudado foi superior (2,78 mg/100 g) ao de galinha (1,94 mg/100 g) e inferior ao de codorna (3,55 mg/100 g) (Maus, 1976, apud Duarte & Andrade, 1998). O teor de colesterol na poro clara mais gema, e gema no ovo de tartaruga foi inferior (226,5 mg/100 g e 329,1 mg/100 g) aos

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de galinha (682,0 mg/100 g e 1.018 mg/100 g) e de codorna (506,4 mg/100 g e 946,9 mg/100 g) (Maus, 1976, apud Duarte & Andrade, 1998). Importncia econmica A tartaruga tem sido de grande importncia para o homem amaznico desde o perodo colonial. Santos (1995) cita que os colonizadores espanhis e portugueses relataram que os ndios durante a vazante capturavam um grande nmero de tartarugas. Segundo Smith (1979), durante o sculo XVII as tartarugas desovavam em um grande nmero de praias na rea de Itacoatiara/AM durante os meses em que o nvel da gua estava baixo. Esse fenmeno atraiu comerciantes portugueses e uma praia Real ficou estabelecida para alimentar os soldados do rio Negro, enquanto outras praias foram exploradas por serem consideradas grandes e abundantes, porm, at hoje, esses quelnios continuam fazendo parte da dieta do interiorano. Historicamente, a tartaruga, P. expansa, foi um quelnio de fcil captura para suprir a alimentao do homem amaznida atravs de carne e ovos. Sendo exportado, na poca do Brasil Colnia, em 1719, pela capitania de So Jos do Rio Negro 192 libras de manteiga de tartaruga. Ihering (1968) cita que para produzir 1 kg de manteiga so necessrios 275 ovos de P. expansa. Alho, Carvalho & Pdua (1979) citam que o preo da tartaruga em Manaus chegou a alcanar US$ 180,00, Pdua, Alho & Carvalho (1983) citam que em 1980 um exemplar de 30 kg de peso vivo chegou a custar cerca de US$ 200,00 em Belm. Wetteberg et al. (1976) determinaram o mercado potencial para espcies silvestres da fauna amaznica nos 23 restaurantes

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existentes em Manaus, de 1974 a 1975, bem como tentaram identificar mercados para as espcies em outras cidades brasileiras ou no exterior. Esses autores citam que 78,78% dos restaurantes expressaram interesse em vender carne de fauna silvestre, sendo denotado interesse pelo pblico desses restaurantes, em primeiro lugar, pela tartaruga (P. expansa) com peso mdio de 28,82 kg e um preo mdio (estimado pelos restaurantes) que os clientes pagariam por quilograma de US$ 21,81, com um lucro potencial por quilograma para os restaurantes de US$ 19,31. Espriella (1972) e Nomura (1977) citam uma grande demanda comercial em pases como os Estados Unidos e o Japo, sendo a comunidade nipnica considerada a pioneira em criao de tartarugas, desde 1866, por considerarem seu alto valor nutritivo. Eles recomendam que os criadouros sejam uma das maneiras de conservar e preservar a tartaruga ou o tracaj. Os criadouros podem tambm fornecer filhotes para exportao e ovos para extrao de leo, sendo que essa extrao parece invivel porque o valor comercial da tartaruga elevado, embora 100 g de ovos produzam cerca de 100 g de creme facial. Segundo o Cenaqua (1994), na Amaznia um boi necessita de 3-4 ha para produzir 40 kg de carne/ano. Enquanto que em 1 ha de gua pode-se criar at 4.500 tartarugas, com um mnimo de 1.800 kg/ano e um custo aproximado para cada quilo das carnes de peixe, boi e tartaruga de US$ 1,00, US$ 2,30 e US$ 6,00, respectivamente. O Cenaqua (1994) cita que em 1991 as tartarugas com peso mdio de 25 kg tiveram preo mdio de US$ 80,00. Indicando, por esses valores, que a tartaruga constitui um item acessvel classe alta.

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O Sebrae (1995) admite uma relao de 65% do peso vivo (PV) correspondente carne, e 35% PV equivalente ao peso do casco. No entanto, o Cenaqua (1994) menciona que um animal de 25 kg fornece 13 kg de carne e vsceras, ou seja, 52% do peso vivo (P.V.) em rendimento de carcaa. Para o TCA (1997), o preo por tartaruga viva no Brasil, Colmbia, Peru e Venezuela foi de US$ 97,00 a 122,00; US$ 5,00 a 61,00; US$ 8,00 a 20,00; US$ 18,00 a 47,00, respectivamente. Na Colmbia o preo por um quilo de US$ 4,80. No Peru, devido aos ovos de Podocnemis expansa serem apreciados para consumo humano, o preo por unidade chegou a US$ 0,22 (TCA, 1997). Para o TCA (1997), o preo de um exemplar adulto de Podocnemis expansa varia, dependendo do local e tamanho do animal. O preo pago nos centros urbanos amaznicos (Iquitos e Manaus) cerca do dobro do preo pago ao povo ribeirinho, e mais do triplo do que recebe o trabalhador rural. Segundo Tern et al. (1997), os quelnios foram e continuam sendo uma das principais fontes de protenas para os ndios e ribeirinhos em toda a Amaznia. Na Reserva de Desenvolvimento Sustentvel Mamirau, Brasil, onde realizou-se entrevistas com 50 famlias e observaes de campo, obteve-se o consumo de quatro espcies de tartarugas na alimentao familiar, como Podocnemis sextuberculata (68,2%), P. unifilis (27,1%), Geochelone denticulata (4,3%), Chelus fimbriatus (0,4%). Rebelo et al., 1997, apud Duarte & Andrade (1998) ao mostrarem a evoluo do consumo de animais de caa e a determinao das populaes de quelnios no Parque Nacional do

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Ja Amazonas, concluram que a mandioca (Manihot esculenta Crantz) e o peixe so a base da alimentao dos moradores. Os animais de caa (quelnios, mamferos e aves) ocupam o quinto lugar na citao. A criao domstica foi citada em apenas 0,5% das refeies. O monitoramento de longo prazo do consumo com calendrio de caa revelou que 50% dos animais caados foram quelnios aquticos (Peltocephalus dumerilianus, Podocnemis unifilis e Podocnemis erythrocephala), 38% mamferos terrestres e 17% aves. Sendo o consumo mdio de 24,3 animais/famlia/6 meses, ou 48,6 animais/famlia/ano. Canto et al. (1999), ao realizarem um levantamento preliminar da comercializao ilegal de produtos da fauna no estado do Amazonas, registram que as classes mais apreendidas so rpteis (principalmente, quelnios) com 52,2%, mamferos 30% e aves 17,8%. Nas feiras, a maior comercializao de carne para mamferos (68%), aves (19%) e quelnios (13%). Sendo os quelnios (tartaruga e tracaj), mais apreciados, a comercializao feita sob encomenda cuidadosa, representando 22% dos animais comercializados para alimentao e o preo relativo por um quilograma (peso vivo PV) da tartaruga de R$ 30,00. A carne de tartaruga-da-amaznia proveniente de criadouros legalizados pelo Ibama, no Amazonas, foi vendida inicialmente ao preo de R$ 12,00 a 18,00/kg de peso vivo em supermercados de Manaus (A Crtica, 1996), sendo pago ao produtor at R$ 13,00/kg. Hoje, os produtores esto comercializando com preos que variam de R$ 8,00 a 12,00, por quilograma de animal vivo. Segundo Andrade et al. (2003), o custo com rao de US$ 1,45 para produzir um quilo de tartaruga e em um cultivo superintensivo em tanques-rede pode-se obter renda lquida de

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3 US$246,24/m . Lima (2000), estimou, nos criadouros do Amazonas os custos fixos em R$ 0,74 e os custos variveis em R$ 2,19 para produzir um quilo de tartaruga. Considerando os atuais preos de venda do produtor, temos uma margem de lucro possvel de 104,78% a 241,30%, o que caracteriza a queloniocultura como uma atividade altamente rentvel.

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Captulo 3: reas de reproduo de quelnios protegidas pelo RANIbama/Amazonas e UfamPaulo Cesar Machado Andrade Joo Alfredo da Mota Duarte Paulo Henrique Guimares de Oliveira Pedro Macedo da Costa Agenor Vicente Anndson Brelaz Carlos Dias de Almeida Jnior Wander Rodrigues Jonathas Nascimento Hellen Christina Medeiros Luiz Mendona Neto Sandra Helena Azevedo Jos Ribamar da Silva Pinto Quando chega o vero na Amaznia, a vazante se inicia e com ela surgem milhares de praias ao longo dos rios. Sejam praias de areia bem branquinha em rios de guas negras e claras, ou praias amareladas em rios de guas barrentas, todas se transformam em verdadeiros depositrios de vida com o perodo reprodutivo de quelnios (tartarugas, tracajs, ias, irapucas) e aves (gaivotas, corta-guas, quero-queros, etc.). A gerncia do Ibama no estado do Amazonas, atravs do Centro de Conservao e Manejo de Rpteis e Anfbios (RAN) tem desenvolvido uma srie de atividades que visam a conservao dos quelnios na regio. Esse trabalho envolve parceria com a Universidade Federal do Amazonas (Ufam), comunidades e prefeituras dos municpios. Em um primeiro momento, as comunidades so visitadas e

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realizadas reunies em que cada comunidade decide como poder se envolver no trabalho, que praias devero ser protegidas e quais pessoas formaro as equipes de campo. Depois, atravs dos tcnicos do RAN e da Universidade, so treinados agentes de praia que atuaro no controle, monitoramento e fiscalizao de cada praia de desova de quelnios, os chamados tabuleiros. O Projeto Quelnios ampliou, desde 2001, sua atuao para os municpios amazonenses de Parintins, Juru, Manicor, Lbrea, Borba, Tapau, Eirunep, Carauri, Barreirinha, Nhamund, Canutama, Barcelos, Novo Airo, Itamarati e So Sebastio do Uatum, atingindo 407.504 habitantes que constituem as populaes desses municpios. Atingimos, ainda, em parceria com a Ufam, atravs do projeto de extenso de manejo sustentvel de tracajs, o Projeto P-de-Pincha, trs municpios limtrofes no Estado do Par, Terra Santa (16.500 habitantes), Oriximin (60.000 habitantes) e Juruti (20.000 habitantes). Em cada municpio temos diretamente envolvidos com os trabalhos de campo e os treinamentos as comunidades e os professores da rede pblica de ensino: 1) Em Parintins so 15 comunidades com cerca de 490 famlias e 62 professores em treinamento e 26 agentes ambientais voluntrios; 2) Em Barreirinha, 12 comunidades com 160 famlias, 35 professores e 1 agente ambiental; 3) Em Nhamund, so 10 localidades com 63 famlias; 4) Em Eirunep e Itamarati, nas praias de Walter Buri, cerca de 30 famlias; 5) Em Carauari, na Resex do Mdio Juru, em 10 tabuleiros, 200 famlias; 6) No Juru, nos tabuleiros de Joanico, Renascena, Antonina, Vai-quem-quer e Botafogo, 100 famlias; 7) Em Manicor, na praia do Nazar, envolvendo 30 famlias que trabalham no local; 8) Em Lbrea, nas comunidades do Buraco, Luzitnia, Jurucu, Bananal, Santa Cndida, Novo Brasil, Porongaba e Realeza, 370 habitantes; 9) Em Borba, no rio Matupiri, cerca de 100 habitantes; 10) Em Tapau, na Rebio Abufari e nas

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comunidades da praia da Enseada, Piranhas e Curuzu, aproximadamente 80 famlias; 11) Em Canutama, nas reservas do Jamandu, Axioma e Seringal Nazar, participao de cerca de 40 famlias; 12) Em Nova Airo, na praia da Velha, em frente ao Parque do Ja, cerca de 8 famlias; 13) Em Barcelos, na praia da Dulumina, Ponta da Terra e campina do Careca; 14) Em So Sebastio do Uatum, no tabuleiro do Abacate, no Jarauac e no Livramento, atingindo cerca de 50 famlias; 14) Em Terra Santa (10 comunidades), Oriximin (9 comunidades) e Juruti (19 comunidades) no Par, cerca de 850 famlias e 7.500 habitantes, sendo que l j existem 78 professores treinados, 101 agentes ambientais voluntrios e 45 professores em treinamento. Em todas essas reas est sendo feita a proteo das matrizes de tartarugas, ias e tracajs, durante a desova, sendo feito o acompanhamento da postura at a ecloso, quando desenvolvido o trabalho de proteo e manejo dos filhotes. A fiscalizao pelo Ibama e pelos comunitrios bastante rgida nesses locais. Acompanhando esses trabalhos de monitoramento e controle, desenvolvida uma estratgia de conscientizao atravs da educao ambiental e da discusso sobre alternativas de desenvolvimento. Nesse aspecto, a parceria com a Universidade tem permitido ao Ibama levar cursos e projetos de desenvolvimento para algumas comunidades como: criao caipira de galinhas, beneficiamento de pescado, utilizao de plantas medicinais, piscicultura, criao de animais silvestres e ecoturismo. O apoio das prefeituras tem sido fundamental para a realizao dessas atividades, que passam a se consolidar em cada municpio como estratgias de conservao e possvel gerao de renda no futuro, atravs da criao e manejo de quelnios e do

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ecoturismo, entre outras. Coroando os trabalhos de campo em 2001, nasceram e foram soltos 1.077.768 de filhotes provenientes do monitoramento de 3.886 covas de tartaruga, 7.263 covas de tracaj, 42.606 covas de ias e 4.671 covas de irapuca. O trabalho visa aumentar o nmero de praias de desova de quelnios protegidas, ampliar o nmero mdio anual de filhotes soltos na natureza (Tabela 1), garantindo a proteo de populaes de quelnios de diferentes calhas de rios e diferentes ecossistemas (Figura 1), permitindo que o trabalho de conservao se baseie no somente em produo de filhotes, mas, tambm, na variabilidade gentica das espcies. E, alm disso, consolidar novos tabuleiros para o fornecimento de filhotes para criadouros (Conservao ex situ). O RAN do Estado do Amazonas, com apoio da Gerncia Executiva e da Ufam, ampliou seu espectro de ao e reas protegidas, atingindo, praticamente, todos os ambientes aquticos do Amazonas, mesmo com toda a sua dimenso territorial.

reas de Conservao de Quelnios pelo RAN-Amazonas100 80 60 40 20 087 59 18 63

Rios Localidades10 16

n

2

12

3

10

11

19

Municpios

2000

2001

2002

2003

Figura 1: Ampliao das reas de conservao de quelnios no Amazonas entre 2000 e 2003.

A Figura 1 apresenta os dados da ampliao das reas

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reprodutivas de quelnios protegidas pelo RAN- AM, em 2000-2003. Esse avano significativo s foi possvel graas ao volume de recursos destinados pelo RAN, em 2001, e pelas diversas parcerias com a Ufam, prefeituras e a participao em editais de financiamento de projetos cientficos e de extenso. O nmero de tcnicos tambm foi ampliado (de dois para sete), graas fuso do RAN com o Ncleo de Fauna Silvestre, em uma nica Diviso de Fauna, no Ibama-AM. O RAN-AM vem trabalhando com o monitoramento e a conservao de populaes de quelnios nas seguintes reas: Rio Purus 1) 2) 3) 4) 5) Tabuleiro do Abufari na Rebio Abufari, em Tapau; Tabuleiros de Piranhas e Enseada, em Tapau; Tabuleiro do Curuzu e Vista Alegre, em Tapau; Reserva do Jamandu, em Canutama; Tabuleiro do Nazar e Axioma, municpio de Canutama. Rio Uatum 1) Tabuleiro do Abacate /Balbina; 2) Tabuleiros do rio Jarauac/comunidade do Livramento, Balbina; 3) Rebio Uatum e rio Pitinga: Ilha do Limo, do Bacaba, Sororoca, Arapari, do Aa, do Papagaio. Rio Juru 1) Resex do Mdio Juru/Carauari: 10 tabuleiros (Gumo do Faco, Nova Esperana/Jacar, Roque/Ati, Bauana, Deus Pai, Bom Jesus, Manari, Monte Carmelo/Pau Furado, Itanga, Mandioca) 2) Tabuleiro do Joanico e Renascena/Juru; 3) Tabuleiro de Botafogo, Antonina e Vai-quem-quer/Juru;

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4) Tabuleiro de Walter Buri/Itamarati-Eirunep; 5) Tabuleiros de So Francisco, Dois Irmos, do Gado/Itamarati; Rio Madeira 1)Praia do Nazar/Manicor; 2)Rio Matupiri/Borba: diversos tabuleiros; Rios Solimes-Japur 1) Tef RDS Mamirau: Pirapucu, Praia do Meio, Horizonte, Ing; 2) Coari: Ilha do Geral; Rio Negro 1) Praia da Velha/Parna Ja, Novo Airo; 2) Praia do Cabuano/Parna Ja/Novo Airo; 3) Praia Dulumina/Barcelos. reas do Programa P-de-Pincha: Mdio-Baixo Amazonas a) Rio Amazonas: Ilha de Vila Nova/Parintins. b) Municpios do Amazonas: 1) Barreirinha: Pira, Granja Ceres, Ipiranga, Tucumunduba, So Francisco, So Pedro, Proteo Divina, Lrios do Vale, Matupiri, Aria, Coat, Ponta Alegre e Pindobal; 2) Parintins: Anhinga, Parananema, Macurani, Valria, Murituba, Laguinho, Maximo, Ze-Au, Badajs, Terra-Preta, Tracaj, So Pancrcio, Parintinzinho e Santa Lourdes do Mamuru; 3) Nhamund: Fazenda Duas Bocas, Praia Boa Esperana, Boiador, Galilia, Espelho da Lua, Apua, Sr. Santos, Castanhal, Marcolino, So Francisco e Vista Alegre.

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c) Municpios do oeste do Par: 4) Terra Santa: Lago do Piraruac (Aliana, Desengano, Itaubal, Camaiateua), Lago Xiac, Igarap dos Currais (Pintado, Tucunar e Pirarucu), Igarap do Nhamund (Conceio Casa Grande), Igarap do Jamary (Alem e Chued) e Lago do Abaucu (Capote e Jauaruna). 5) Oriximin: Regio do Jarauac, Acapu, Samama, Lago do Sapucu (Ascenso, Casinha, Barreto), Maria Pixi, Acapuzinho, Cachoeiry; 6) Juruti: Maravilha, Santa Madalena, Aa, Z Maria, Caapiranga, Surval, Uxituba, Prudente, Capelinha, Pompom, Ingrassa, Capito e Vila Muirapinima. Na Figura 2 e na Tabela 1, observamos que, mesmo com todos os recursos que o RAN-Cenaqua/NUC aplicava na Rebio Abufari, em 2001-2002, ela perde o status de maior produtora de quelnios do Amazonas para reas com trabalhos comunitrios em tabuleiros pequenos e prximos, como o caso das Resex do Mdio e Baixo Juru, sendo que as reas com manejo comunitrio/participativo de quelnios passaram a responder pela maior parte da produo do Amazonas (60,01% = 646.848 filhotes) em relao s reas de proteo estrita do Governo (39,98% = 430.920 filhotes). Esse envolvimento e conscientizao comunitria permitiram reduzir o custo mdio por filhote protegido de R$ 0,370,78/unidade para R$ 0,08/unidade. Todavia, o grande corte nas verbas governamentais, destinadas ao trabalho com quelnios, a partir de 2003, levou ao abandono de algumas reas de reproduo monitoradas em 2001 e 2002, registrando uma queda de 15,49% na produo de filhotes. Em reas de grande produo, como Abufari e

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Walter Buri, com um trabalho de muitos anos de proteo, as populaes de quelnios parecem ter atingido certo equilbrio e estabilidade, no havendo grandes variaes. Contudo, em outras reas, onde o trabalho havia iniciado h poucos anos, o impacto foi muito mais significativo. A situao foi mais grave ainda nas grandes reas produtivas onde o governo trabalhava em parceria com as comunidades. A reduo da presena e, em muitos casos, a completa ausncia de tcnicos do Governo e de recursos, amparando os ribeirinhos, levou desnimo ao trabalho comunitrio que, com a falta de incentivos, registrou uma queda de 646.848 filhotes, em 2001, para 343.679 em 2005, ou seja, 46,86%. Apenas em reas de manejo comunitrio, onde o governo se