2005-flamengos

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Rua das Mercês, 8 9000-420 – Funchal Telef (+351291)214970 Fax (+351291)223002 Email: [email protected] [email protected] http://www.madeira-edu.pt/ceha/ VIEIRA, Alberto (2005), Os flamengos e as ilhas Portuguesas do Atlântico COMO REFERENCIAR ESTE TEXTO: VIEIRA, Alberto (2005), Os flamengos e as ilhas Portuguesas do Atlântico, F unchal, CEHA-Biblioteca Digital, disponível em: http://www.madeira-edu.pt/Portals/31/CEHA/bdigital/avieira/2005- flamengos.pdf, data da visita: / / RECOMENDAÇÕES O utilizador pode usar os livros digitais aqui apresentados como fonte das suas próprias obras, usando a norma de referência acima apresentada, assumindo as responsabilidades inerentes ao rigoroso respeito pelas normas do Direito de Autor. O utilizador obriga-se, ainda, a cumprir escrupulosamente a legislação aplicável, nomeadamente, em matéria de criminalidade informática, de direitos de propriedade intelectual e de direitos de propriedade industrial, sendo exclusivamente responsável pela infracção aos comandos aplicáveis.

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Os flamengos e as ilhas Portuguesasdo Atlântico

COMO REFERENCIAR ESTE TEXTO:

VIEIRA, Alberto (2005), Os flamengos e as ilhas Portuguesas do Atlântico, Funchal, CEHA-BibliotecaDigital, disponível em: http://www.madeira-edu.pt/Portals/31/CEHA/bdigital/avieira/2005-flamengos.pdf, data da visita: / /

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rigoroso respeito pelas normas do Direito de Autor. O utilizador obriga-se, ainda, a cumprirescrupulosamente a legislação aplicável, nomeadamente, em matéria de criminalidade informática,de direitos de propriedade intelectual e de direitos de propriedade industrial, sendo exclusivamente

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OS FLAMENGOS E AS ILHAS PORTUGUESAS DO ATLÂNTICOSéculos XV-XVII

ALBERTO VIEIRA

A expansão europeia a partir do século XV oferece à Europa um novo espaço de domínio ecomércio. Portugueses e castelhanos abriram as portas e estabeleceram as rotas de navegação ecomércio que, depois, italianos, alemães, flamengos e ingleses usufruíram. A Europa estavaentão dividida entre dois pólos de atracção, o mundo mediterrâneo e o mar do Norte. Osprincipais mercados e rotas comerciais estavam nas mãos de genoveses, venezianos, florentinos,flamengos e ingleses. Portugal foi um espaço charneira entre os dois mundos e, por isso mesmo,atraiu a classe mercantil de ambos que, paulatinamente assumiu o domínio do mercado e novasrotas comerciais geradas com os descobrimentos.Nas ilhas e de forma especial na Madeira, a presença de estrangeiros é evidente desde osprimórdios da ocupação, actuando primeiro na condição de estantes, conseguindo depois anecessária naturalização que lhes permitia a participação activa na sociedade local. Para aMadeira, o primeiro grupo, atraído pelo comércio do açúcar foi dominado pelos italianos,flamengos e franceses, seguindo-se os ingleses à procura do vinho e, finalmente, os sírios e osalemães à conquista do bordado.A presença flamenga torna-se visível a partir da década de setenta do século XV, estabelecendouma rota directa de comércio de açúcar entre a Madeira e as praças de Bruges e Antuérpia. Umadas mais evidentes contrapartidas do relacionamento comercial está ainda hoje visível napresença das diversas oficinas de pintura da Flandres, dispondo a Madeira de uma das maisimportantes e valiosas colecções de arte flamenga fora do seu espaço.O comércio com a Flandres é anterior ao processo de povoamento das ilhas, documentando-se aexistência da feitoria portuguesa desde 1417. Entretanto o casamento de Filipe o Bom com Isabelde Portugal consolidou estas relações, que tiveram no açúcar madeirense o principal suporte,alargando-se às demais ilhas e às especiarias das Índias. Foi por força destas ligações que Brugese Antuérpia consolidaram a posição de placa giratória para o trato do açúcar no mar do Norte.Lisboa foi um centro destacado de negócios onde se encontravam todos estes mercadores ourepresentantes, alargando daí a influência aos novos espaços, como as ilhas e os espaçoscontinentais. Deste modo a presença de flamengos, já fixados em Lisboa ou recém-chegados comas notícias de novas terras e produtos, é uma realidade insofismável. Eles são mercadores, mastambém actuam na condição de povoadores e descobridores. O caso dos arquipélagos daMadeira e dos Açores é exemplar.Por força da maior presença de povoadores nos Açores são ainda hoje evidentes os testemunhosna toponímia. Assim, na Terceira temos a Ribeira dos Flamengos enquanto no Faial sãomúltiplas as referências, como o Vale e a Ribeira dos Flamengos, ponta da Espalamaca e aprópria cidade da Horta que derivará do apelido do seu fundador Hurtere. Para a Madeiratemos apenas notícia da levada dos flamengos no Monte, o que prova na verdade, a menorpermanência dos flamengos na ilha. Em Cabo Verde devemos assinalar a Ribeira dos flamengos,na ilha de Santiago, que não sabemos se tem a ver com a fixação de alguma comunidade da

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Flandres no local. Aqui, no arquipélago madeirense, são maioritariamente mercadores e nãopovoadores, como sucede nos Açores.

DESCOBRIDORES E POVOADORES. A Madeira, a primeira terra no espaço atlântico amerecer uma ocupação efectiva pelos portugueses, rapidamente se transformou num centro deapoio às descobertas atlânticas. Segundo Zurara, a ilha foi desde 1445 o principal porto de escalapara as navegações ao longo da costa ocidental africana. Para a nova aristocracia que começar adespontar nos novos espaços de ocupação como a Madeira o empenho nas acções marítimas ebélicas foi ao mesmo tempo uma forma de homenagem ao monarca e infante e um passo maisna aquisição de benesses ou comendas.A partir do reconhecimento das ilhas açorianas, na década de vinte do século XV, a volta pelolargo nas expedições africanas e o avanço das expedições para Ocidente foram uma realidade. Ostestemunhos da existência de terra para além da linha do horizonte ocidental destas ilhascomeçaram a surgir com frequência nas praias açorianas e madeirenses: pedaços de madeira,cadáveres, canoas, inúmeras sementes, despertavam a natural curiosidade dos insulares,motivando a atenção dos navegadores insulares conduzindo-os à gesta descobridora dos maresocidentais.A primeira viagem conhecida foi a do madeirense Diogo de Teive e Pero Vasquez de laFrontera. Seguiram-se outros de que apenas ficou notícia dos que fizeram o pedido antecipadoda posse das terras que esperavam descobrir. As expedições para Ocidente, que precederam aprimeira viagem de Cristóvão Colombo, continuaram até finais do século XV, com activaparticipação de madeirenses e açorianos. Fala-se ainda das ligações do madeirense Diogo deTeive com o primeiro povoador da ilha Terceira, Jácome de Bruges1.Em finais do século quinze, residiam na Madeira dois irmãos com o apelido Terra Nova[NIEULAND], o que leva a associar com as terras ocidentais, havendo quem os aponte comopossíveis descobridores em data anterior à viagem de Colombo. Anrique surge em 1486 noFunchal como fiador de um alfaiate, e novamente em 1494 com o irmão, Guirarte, na qualidadede arrendatários e proprietários de canaviais, nas partes do fundo, mais propriamente na áreaentre a Ponta de Sol e Fajã da Ovelha2. Não nos parece despropositada a possibilidade, poisdesde muito cedo que os madeirenses estiveram envolvidos nas viagens para ocidente. Poroutro lado, foi com os lucros conseguidos com a cultura que os navegadores conseguiramfinanciar as expedições, pois a coroa nunca se comprometeu com este projecto, apostada queestava em definir e fazer afirmar a rota africana.

OS POVOADORES. As ilhas atlânticas assumem uma posição particular no contexto dasmigrações portuguesas do século XV. Perante os portugueses deparam-se ilhas abandonadasque, pela riqueza do solo ou posição geográfica, foram ocupadas3. Para isso foi necessárioencontrar, não só marinheiros, mas também, lavradores, disponíveis para a tarefa. A concessãode terras foi, a par dos inúmeros privilégios fiscais, um dos principais incentivos à fixação decolonos, mesmo em áreas inóspitas como Cabo Verde e S. Tomé. A avidez de terras e títulos por

1 Ernesto Gonçalves, Diogo de Teive, in Das Artes e Da História da Madeira , nº.3/4(1951).2. Cf. V. Rau, O Açúcar da Madeira nos fins do Século XV. Problemas de Produção e Comércio, Funchal, 1962, p.42 e 67: Anrique surge 1330 arrobas emterras de André Gonçalves na Serra de Agua dalto e outros dois pedaços de cana com110 arrobas, sendo um próximo da capela de João Françaonde vivia. E tinha casa, enquanto Guirarte partilha com Anrique um canavial de 380 arrobas.3 . Luís de ALBUQUERQUE, "O avanço no Atlântico. Necessidade estratégica de ocupação das ilhas atlânticas", in Portugal no Mundo, vol. I,pp.201-211.

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parte dos filhos-segundos e da pequena aristocracia do reino contribuíram para alimentar aemigração e solucionar as dificuldades de povoamento dos novos espaços. Nos Açores o infanteD. Henrique ordenou em 1439 a Gonçalo Velho que iniciasse o povoamento das ilhas de S.Miguel e Santa Maria, fazendo aí lançar gado bravio. Mas a iniciativa não surtiu efeito pelo quedez anos mais tarde repetiu-se a mesma ordem. As cartas de doação das capitanias das ilhasesclarecem que o efectivo povoamento só teve lugar na década de sessenta ou setenta comoresultado da presença de flamengos no Faial e de madeirenses em S. Miguel. Todavia as maisocidentais - Corvo e Flores - ainda se encontravam em 1507, segundo Valentim Fernandes, porpovoar.O fenómeno de transmigração quatrocentista define, ao nível da mobilidade social, um aspectoparticular das sociedades insulares. Elas foram, primeiro, pólos de atracção e, depois, viveirosdisseminadores de gentes para a faina atlântica. No começo, a novidade aliada aos inúmerosincentivos de fixação definiram o primeiro destino, mas, depois, as escassas e limitadaspossibilidades económicas das ilhas e o fascínio pelas riquezas das índias conduziram a novosrumos. No primeiro caso a Madeira, porque foi rápida a valorização económica, galvanizou asatenções portuguesas e mediterrâneas. Só depois surgiram novos destinos insulares, como asCanárias, Açores, Cabo Verde e S. Tomé, onde os madeirenses jogaram um importante papel.Desta forma a Madeira do século XV poderá ser definida como um pólo de convergência eredistribuição do movimento migratório no mundo insular. No século XVI desvaneceu-se todo ointeresse pelas ilhas, estando todo o empenho virado no Ocidente, descoberto por CristóvãoColombo ou Pedro Alvares Cabral, e o Oriente a que Vasco da Gama chegará por via marítima.A presença estrangeira nas ilhas portuguesas é evidente desde o início do povoamento. Primeiroa curiosidade de novas terras, depois a possibilidade de uma troca comercial vantajosa. Eis osprincipais móbeis para a fixação nas ilhas. A sua permanência está documentada na Madeira apartir de meados do século XV, integrados nas segundas levas de povoadores. E mais nãoentraram porque estavam, até 1493, condicionados à concessão de carta de vizinhança. Aliás, foia Madeira a primeira ilha a despertar a atenção dos mercadores estrangeiros, que encontraramnela um bom mercado para as operações comerciais. Note-se que o rincão madeirense foi oprimeiro a merecer uma ocupação efectiva e imediata, apresentando um conjunto variado deprodutos com valor mercantil, o que despertou a cobiça dos mercadores nacionais eestrangeiros. Nos demais arquipélagos o processo foi moroso e tardou em aparecer produtoscapazes de gerarem as trocas externas. No caso das Canárias e dos Açores só foi conseguido empleno a partir de princípios do século XVI, com a oferta de novos produtos, como o açúcar, opastel e cereais. Depois no último arquipélago a afirmação como importante entreposto docomércio oceano fez convergir para aí os interesses de algumas casas comerciais empenhadas nocontrabando dos produtos de passagem.Na Madeira, ultrapassadas a partir de 1489 as barreiras à fixação de estrangeiros, a comunidade

forasteira amplia-se e ganha uma nova dimensão na sociedade e economia. A presença deagentes habilitados para a dimensão assumida pelas transacções comerciais e a injecção decapital no sector produtivo e comercial favoreceram a evolução do sistema de trocas. Nestecontexto destaca-se a comunidade italiana, que veio em busca do açúcar. A importânciaassumida pela cultura açucareira na ilha e comércio do seu produto no mercado europeu foiresultado da intervenção desta comunidade. Florentinos e genoveses foram os principaisobreiros. Os primeiros evidenciaram-se nas transacções comerciais e financeiras do açúcarmadeirense no mercado europeu. A partir de Lisboa controlam à distância, por meio de umarede de feitores, o comércio do açúcar madeirense. Para isso conseguiram da fazenda real o

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quase exclusivo do comércio do açúcar resultante dos direitos cobrados pela coroa na ilha, bemcomo o monopólio dos contingentes de exportação estabelecidos pela coroa em 1498.A penetração destes mercadores na sociedade madeirense é por demais evidente. O usufruto deprivilégios reais e o relacionamento matrimonial favoreceram a sua integração na aristocraciamadeirense. Eles são maioritariamente proprietários e mercadores de açúcar. Também osflamengos e franceses surgiram na ilha, desde finais do século XV, atraídos pelo comércio doaçúcar. Todavia são poucos os que criam raízes na sociedade madeirense - João Esmeraldo éuma rara excepção -, o único e exclusivo interesse era o comércio do açúcar.No quadro da comunidade flamenga na ilha da Madeira sobressaem João Esmeraldo e os Lem.Sobre a importância de João Esmeraldo atesta Gaspar Frutuoso: Da Tabua pouco mais de meialégua está a Lombada de João Esmeraldo, de nação genovês, que chega do mar à serra, de muitas canas deaçúcar e tão grossa fazenda, que já se aconteceu fazer João Esmeraldo vinte mil arrobas de sua lavra cadaano, e tinha como oitenta almas suas cativas entre mouros, mulatos e mulatas, negros, negras e canários.Foi esta a maior casa da ilha e tem grandes casarias de aposento, e engenho, e casas de purgar, e igreja.

E depois do falecimento de João Esmeraldo, ficou tudo a seu filho Cristóvão Esmeraldo, que o mais dotempo andava na cidade do Funchal sobre uma mula muito formosa, com oito homens detrás de si, quatrode capa e quatro mancebos em corpo, filhos de homens honrados, muito bem tratados, e trazia grandecontenda com o Capitão do Funchal sobre quem seria provedor da Alfândega de el-Rei, que é uma ricacoisa de renda de Sua Alteza e ricas casarias. Casou João Esmeraldo na ilha com Águeda de Abreu, filha deJoão Fernandes, senhor da Lombada do Arco4.João Esmeraldo dividia a actividade entre a casa de negócio no Funchal e vivenda com capela naLombada da Ponta de Sol, ambas construídas a partir de 1494, onde tinha os canaviais eengenho. Foi uma personalidade muito marcante na sociedade madeirense e mesmo junto dacoroa. De modo que com a criação do em 1501 do município da Ponta de Sol conseguiu que asua Lombada ficasse na dependência da edilidade funchalense. No Funchal, no espaço daprimitiva casa demolida em 1877, temos hoje um núcleo museológico dedicado à “Cidade doAçúcar”. Este espaço, inaugurado em 1996, pretende ser à memória viva da época áurea doaçúcar na Madeira, isto é, os séculos XV e XVI. A concretização resultou da recuperação dosvestígios da chamada casa de Colombo no Funchal, construída no século XV pelo fidalgoflamengo João de Esmeraldo. A casa de residência no Funchal foi construída a partir de 1495 e aela associa-se o convívio de Cristóvão Colombo, o navegador italiano que aportou à ilha em1476 e 1482. A passagem do navegador pelo Funchal em 1498, aquando da terceira viagem, é umtestemunho da profunda ligação à ilha. Nesta data teria privado com João Esmeraldo nesteimponente palácio.Nos Açores a situação foi diferente. Os flamengos surgem desde o começo como importantespovoadores. Foi por isso que as ilhas açorianas ficaram conhecidas como as ilhas flamengas5. Elesforam imprescindíveis para o povoamento das ilhas do Faial, Terceira, Pico e Flores6. Oprimeiro a desembarcar nos Açores terá sido Jácome de Bruges, apresentado em documento de1450 como capitão da ilha Terceira. Pouco se sabe da acção desenvolvida por este flamengo, háaté quem duvide da autenticidade do título de posse da capitania da ilha7. Mais importante foi,

4 Gaspar Frutuoso, Saudades da Terra, Ponta Delgada, 1979, p.1245 Confronte-se Jules MEES, "História da descoberta das ilhas dos Açores e da origem da sua denominação de ilhas flamengas", Revista Michaelense,fasc. 2 e 3, Ponta Delgada, 1919.6 Ferreira SERPA, Os flamengos na ilha do Faial. A família Utra(Hurtere), Lisboa, 1929; Marcelino LIMA, Famílias faialenses, Horta, 1933; M. MartimCunha da SILVEIRA, "Do contributo flamengo nos Açores", ir Boletim do Instituto Histórico da ilha Terceira, n-.21-22, Angra do Heroísmo, 1963-64.7 Ferreira SERPA, "Um documento falso atribuído ao infante D. Henrique ou a carta de doação da ilha Terceira a Jácome de Bruges", ir Revista deArqueologia e História, fasc. VII, IX.

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sem dúvida, a vinda de Josse Huerter em 1468 como capitão das ilhas do Pico e Faial.Acompanharam-no inúmeros flamengos que contribuíram para o arranque definitivo dopovoamento das ilhas do grupo central e ocidental. Martim Behaim8 refere para 1466 a presençade dois mil flamengos no Faial, enquanto Jerónimo Munzer9, vinte e oito anos depois, diz seremapenas mil e quinhentos os que residiam aqui e no Pico. A partir daí os Açores ficaramconhecidos como as ilhas flamengas, tal como o afirmava Linschoten em finais do século XVI. Aesta primeira leva de estrangeiros como povoadores sucederam-se outras com objectivosdistintos. O progresso económico do arquipélago despertara a atenção da burguesia europeia,que surge aí à procura dos seus produtos. O pastel atraiu, primeiro os flamengos e, depois osingleses. Daqui resultou a importante colónia na cidade de Ponta Delgada.

A existência da comunidade estrangeira, maioritariamente composta por mercadores, está emconsonância com a conjuntura peninsular e europeia, por um lado, e os atractivos de índoleeconómica que elas ofereciam, por outro. Desta forma o lançamento de culturas com elevadovalor comercial, como o pastel e o açúcar, está associado a isso. Eles surgem nas ilhas como osprincipais financiadores da referida actividade agrícola e animadores do comércio. Na Madeirae Açores a introdução e incentivos às culturas do pastel e cana-de-açúcar, encontram-se-lhestambém ligadas. Assim o pastel é apontado pela historiografia açoriana como um legado dacolónia flamenga do Faial, enquanto o açúcar madeirense é considerado resultado da presençagenovesa.Para os arquipélagos de Cabo Verde e S. Tomé a comunidade estrangeira assume menos

importância, sendo, em certa medida, delimitada pela política exclusivista definida para aí pelacoroa portuguesa. O comércio com a Flandres era assíduo a partir dos rios da Guiné, Santiago eS. Tomé, sendo dominado pela malagueta, algodão e açúcar, mas dominado em exclusivo pormercadores portugueses, nomeadamente da Vila do Conde, sendo maioritariamente de origemjudaica. Todavia, o facto de S. Tomé ter merecido uma exploração diversa com a cultura da canasacarina levou a que aí afluíssem técnicos e mercadores, ligados ao produto. Por outro lado, noentender de um piloto anónimo no século dezasseis, havia a preocupação de cativar colonos dediversas origens para o povoamento da ilha: "Habitam ali muitos comerciantes portugueses,castelhanos, franceses e genoveses e de qualquer outra nação que aqui queiram viver se aceitam todos demui boa vontade..."10. Já em cabo Verde o interesse estará fundamentalmente no sal.

AS COMUNIDADES DE ESTRANGEIROS. A existência da comunidade estrangeira,maioritariamente composta por mercadores, está em consonância com a conjuntura peninsular eeuropeia, por um lado, e os atractivos de índole económica que elas ofereciam, por outro. Destaforma o lançamento de culturas com elevado valor comercial, como o pastel e o açúcar, estáassociado a isso. Eles surgem nas ilhas como os principais financiadores da referida actividadeagrícola e animadores do comércio. Na Madeira e nos Açores a introdução e incentivos àsculturas do pastel e cana-de-açúcar, encontram-se-lhes também ligadas. Assim o pastel éapontado pela historiografia açoriana como um legado da colónia flamenga do Faial, enquanto oaçúcar madeirense é considerado resultado da presença genovesa e depois do empenho deoutras comunidades de mercadores, como a flamenga.

8 Archivo dos Açores, I, 442-443.9. O Itinerário do Dr. Jerónimo Munzer, Coimbra, 1926, 65-66.10 Viagem de Lisboa a S. Tomé, Lisboa, s.d., 51.

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A comunidade flamenga deu um contributo relevante ao povoamento e valorização económicadas ilhas. Na Madeira e nas Canárias ligados à economia açucareira, enquanto nos Açoresafirmaram-se como povoadores de algumas ilhas e principais promotores da cultura do pastel.Note-se que a presença flamenga na Madeira e Canárias é tardia, o que não prejudicou a suavinculação à cultura e comércio do açúcar. Entre eles merece especial referência os Weselers comimportantes interesses na Madeira e em La Palma. Se tivermos em conta que a presença dogrupo de forasteiros na sociedade insular resulta fundamentalmente de interesses mercantis,compreenderemos a maior incidência nas ilhas ou cidades onde a actividade foi mais relevante.Deste modo as da Madeira, Gran Canaria e Tenerife galvanizaram muito cedo o empenho econduziram a que estabelecessem uma importante rede de negócios a partir de Lisboa ouSevilha. Só assim se pode explicar a posição dominante aí assumida.Nos Açores a comunidade estrangeira divide-se entre os interesses fundiário e comercial, mas

foi sem dúvida este último, derivado da importância que aí assumiu a cultura do pastel. Esteproduto chamou à atenção dos mercadores flamengos, franceses e ingleses para os portos deAngra e Ponta Delgada. Mais tarde, a importância definida por esta área nas rotas comerciais doatlântico atraiu a cobiça dos estrangeiros como corsários ou mercadores empenhados nocontrabando. Em idêntica situação surgiram muitos dos forasteiros nas ilhas de Cabo Verde e doGolfo da Guiné, atraídos pelo rendoso comércio de escravos. Apenas as limitações impostas pelacoroa à sua permanência levou a que não estabelecessem um vínculo seguro.A actividade comercial, principal móbil da fixação dos estrangeiros, não absorveu por completoa intervenção, pois subdividem a vida quotidiana entre o comércio, o transporte, a banca, aprodução e as administrações local e central. A par disso, o interrelacionamento matrimonialcom as principais famílias reforçou a posição na sociedade madeirense. Foi a partir da mesclados primeiros povoadores europeus, oriundos de várias regimes e estratos sociais, que sedefiniu a estrutura social das ilhas.Os flamengos, a exemplo dos italianos, surgem na ilha da Madeira, desde finais do século XV,atraídos pelo rendoso comércio do açúcar. No entanto a maioria, não se fixa, mantendo umacondição errante. O interesse era única e exclusivamente a aquisição do açúcar a troco deartefactos, alheando-se da realidade produtiva e administrativa. Sucede que a comunidade italianacontrolava a quase totalidade do comércio do açúcar com as principais praças europeias sendoseguida da portuguesa e da castelhana. Os mercadores nórdicos não apresentam uma posição derelevo nestas operações. Isto demonstra, mais uma vez, que a rota e mercado flamengo semantiveram sob o controlo da nossa feitoria. Dos que tiveram actividade na praça do Funchalpodemos salientar os seguintes:

DATA Nome ObservaçãoJoão Gonçalves MelacarneJacques, Francisco e João GuilermeJoham DiazLuís GallantTheune Louf

1480 Marten Lem, filho de A. Lem Terra sesmaria em Sto António, deuorigem à Quinta do Leme

1482-1524 Francisco Dans ou Dhane mercador1483 António Lem de Bruges Fixou residência na ilha

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1484 João Esmeraldo [Jean d’Esmenaut] Fixa residência no Funchal1497-1526 João Lombardo1499 Guirarte e Henrique Terra

Nova(NIEULANT)Proprietários e arrendatários canaviais

1499 Ambrósio de Grave[Gaveo] de Artois Proprietário de canaviais.1505-1521 Janim Bicudo Mercador de açúcar1507-1591 João Dias Procurador1508-1510 António Leonardo mercador1509 Pedro Gamte Mercador de açúcar1509 Diogo de ANA[Hanaa] Mercador de açúcar1509 Martinho Mercador de açúcar1517 Luís Álvares Compra de açúcar meles e rescumas1517 Guilherme de Brum Mercador de açúcar1524-1526 Joham Twijn1537 Niculao flamengo mercador1542-1600 António dias mercador1571-1637 Francisco Rodrigues mercador1573 João Anes mercador1574 João Dareja[Are] Armeiro no Funchal1582 Manuel de Puga mercador1582-1589 Fernado de Puga mercador1583 João Escelhe mercador1584-1594 Guilherme Leinarte mercador1585-1586 João Legreyn mercador1591-1596 Jorge Carns mercador1591-1623 João Rodrigues1592-1594 Lourenço Classe mercador1593 Maximilano Mais mercador1593 Manuel Anrique Bernaldes mercador1593 Jorge Suares mercador1593 Joãorodrigues Cauces(?) mercador1593-1596 Simão Azuardo mercador1594-1596 João Copians mercador1594-1596 Bernaldo Biresten mercador1595 Rodrigo Dans mercador1595-1606 Henrique Alfradrique Casou na Sé com Isabel do Quintal Freire1620 Guilherme Dinis mercador1642 Martim Filter mercadorFONTE: Fernando Jasmins Pereira, Estudos Sobre História da Madeira, Funchal, 1991; Alberto Vieira, O Comércio Inter-Insular nos séculos XV e XVI.Madeira, Açores e Canárias, Funchal, 1986.

Temos dois momentos significativos da presença da comunidade flamenga na Ilha. Entre finais doséculo XV e o primeiro quartel do século seguinte, estamos perante um grupo significativoempenhado no comércio do açúcar, o produto do seu interesse na ilha. Poucos fixaram morada,afirmando-se na sociedade local. Apenas João Esmeraldo, Anton e Martim Lem ganharam raízes

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deixando marcas até a actualidade. Note-se que dos Nieulant, Grave e Alfradrique não ficou rasto.O segundo momento acontece nas duas últimas décadas do século XVI, momento em que acomunidade flamenga assumiu uma posição de destaque na praça madeirense.A presença da comunidade flamenga perdura na centúria seguinte. Acontece que a partir de 1608temos notícia da presença de um cônsul belga, Jos Vast Vecmy, no Funchal. Foi o primeiroconsulado na ilha mas não sabemos o que representaria em termos de importância a comunidadeflamenga na ilha, pois os dados são escassos. Isto deverá ser resultado do facto de a ilha continuara necessitar dos produtos da Flandres, nomeadamente para o abastecimento alimentar, situaçãoque ficou favorecida com a união das coroas peninsulares. Assim no decurso da centúria a ilhaimportava cereais, presunto e manteiga da Flandres, sendo referido em 1625 pela vereação que oprovimento da ilha dependia do comércio exterior, designadamente com a Flandres. Para operíodo de 1596 a 1642 temos 29 % do cereal entrado no Funchal daí oriundo11. Já para ascentúrias seguintes a presença dos flamengos parece ir em decrescendo, em favor dos ingleses quequase dominam todo o comércio com o mar do Norte. Desapareceu quase por completo o rastrodos flamengos na ilha, sendo os contactos esporádicos12.

OS FLAMENGOS E O COMERCIO DO AÇÚCAR. Nos séculos XV e XVI a rede de negóciosfunchalense, em torno do trato do açúcar, foi criada e incentivada pelo mercador estrangeiro,alemão ou italiano, que aí aportou depois da reconfortante e vantajosa escala em Lisboa. Elecontrolou as principais sociedades intervenientes no comércio açucareiro, não obstante ter moradafixa em Lisboa, Flandres ou Génova. O domínio atinge, não só, as sociedades criadas no exteriorcom intervenção na ilha, mas também, o grupo de agentes ou feitores e procuradoressubstabelecidos no Funchal. A escolha é criteriosa: primeiro os familiares, depois os compatríciosenraizados na sociedade e só, depois, os madeirenses ou nacionais. Os procuradores e feitores, nasua condição de interlocutores dos mercadores europeus não se ligam apenas a uma sociedade,pois distribuíram a acção por um grupo numeroso de societários. Estes, por sua vez, não seprendiam apenas a uma representação, concedendo-os a um grupo variado de feitores eprocuradores.O desenvolvimento socio-económico do mundo insular articula-se de modo directo, com assolicitações de economia euro-atlântica: primeiro regiões periféricas do centro de negócioseuropeus ajustaram o seu desenvolvimento económico às necessidades do mercado europeu eàs carências alimentares europeias, depois, mercado consumidor das manufacturas de produçãocontinental em condições vantajosas de troca para o velho continente e, finalmente, intervêmcomo intermediário nas ligações entre o Novo e Velho Mundo. O investimento de capital deorigem mercantil, nacional ou estrangeiro surgiu apenas numa óptica da nova economia,afirmando-se como gerador de novas riquezas adequadas a um aproveitamento comercial.Assim, o comércio foi o denominador comum para os produtos a introduzir, sendo valorizadosaqueles activadores da nova economia de mercado. Aqui, a cana-de-açúcar e o cobiçado produtofinal, o açúcar, detêm uma posição cimeira.A Madeira foi no começo o mais importante entreposto. Os descobrimentos aliam-se aocomércio e, por isso, desde meados do século XV, manteve-se um trato assíduo com o reino,activado com as madeiras, urzela, trigo e, depois, com o açúcar e o vinho. Este movimento

11 Alberto Vieira, O Comércio de Cereais dos Açores para a Madeira no século XVII, in Os Açores e o Atlântico (séculos XIV-XVII), Angra doHeroísmo, 1984, 674. Alberto Vieira, O Município do Funchal (1550-1650)”, in Actas do I Colóquio Internacional de História da Madeira, 1986, Funchal,1989, p.1058.12 . João José Abreu de Sousa, O Movimento do Porto do Funchal e a conjuntura da Madeira de 1717 a 1810. Alguns Aspectos, Funchal, 1989.

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alargou-se às cidades nórdicas e mediterrânicas, com o aparecimento de estrangeirosinteressados no comércio do açúcar. O comércio do mercado insular, que ficou circunscrito àsilhas de Gran Canaria, Tenerife, La Palma, La Gomera e Madeira, foi o principal activador dastrocas com o mercado europeu. Na Madeira assumiu uma posição dominante na produção ecomércio entre 1450 e 1550, enquanto que nas restantes praças surge apenas em princípios doséculo XVI, tendo assumido idêntica posição na década de trinta.A Madeira foi desde o início um pólo de atracção para os mercadores forasteiros, mercê daprioridade atribuída à cultura dos canaviais no processo de ocupação. Só o impediram asordenanças limitativas de residência na ilha. Todavia, em meados do século XV a coroa facultoua entrada e fixação de italianos, flamengos, franceses e bretões, por meio de privilégios especiais,como forma de assegurar um mercado europeu para o açúcar13. A rede de negóciosfunchalense, em torno do trato do açúcar, foi criada e incentivada pelo mercador estrangeiro,alemão ou italiano, que aí aportou depois da reconfortante e vantajosa escala em Lisboa. Elecontrolou as principais sociedades intervenientes no comércio açucareiro, não obstante termorada fixa em Lisboa, Flandres ou Génova. O domínio atinge, não só, as sociedades criadas noexterior com intervenção na ilha, mas também, o grupo de agentes ou feitores e procuradoressubestabelecidos no Funchal. A escolha era criteriosa: primeiro os familiares, depois oscompatrícios enraizados na sociedade e só, depois, os madeirenses ou nacionais. As principaiscasas intervenientes no trato açucareiro madeirense podem ser definidos de acordo com onúmero de representantes, destacando-se então, Baptista Morelli, B. Marchioni, Welser, Claaes,Charles Correa, Pero de Ayala e Pero de Mimença. Os Welsers e Claaes actuaram na praça doFunchal por intermédio de agente estabelecido em Lisboa, respectivamente, Lucas Rem eErasmo Esquet, que depois subestabelecem feitores. O primeiro tinha como interlocutores noFunchal, em princípios do século XVI, João de Augusta, Bono Bronoxe, Jorge Emdorfor, JácomeHolzbuck, Leo Ravenspurger e Hans Schonid.A Madeira atraiu a partir de meados do século XV uma vaga de forasteiros, mercê da prioridadena ocupação e na exploração do açúcar. Só o impediam as ordenanças limitativas da residênciana ilha, resultante da rápida fixação e intervenção nos circuitos comerciais. A coroa facultou aentrada e a fixação de italianos, flamengos, franceses e bretões, por meio de privilégios especiais,como forma de assegurar um mercado europeu para o açúcar. Todavia a grande influência queestes estrangeiros rapidamente alcançaram, tornou-se lesiva para os mercadores nacionais epara a coroa, pelo que se proibiu “assim soltamente tratar todos”. O senhor ordenou a proibição dasua permanência na ilha como vizinhos. O problema foi levado às cortes de Coimbra, em 1472-1473, e às de Évora, em 1481, reclamando a burguesia do reino contra o monopólio dosmercadores genoveses e judeus no comércio do açúcar, propondo a exploração comercial apartir de Lisboa nas mesmas condições. A comunidade de mercadores estrangeiros na Madeirafoi dominada pelos italianos, a que se seguiam os flamengos e os franceses. Todos foramatraídos pelo tão solicitado ouro branco. Os italianos, em especial florentinos e genovenses,conseguiram, desde meados do século XV, implantar-se na Madeira como os principais agentesdo comércio do açúcar, alargando depois a sua actuação ao domínio fundiário, por meio dacompra e laços matrimoniais. O interesse dos flamengos estava única e exclusivamente naaquisição do açúcar a troco dos artefactos, alheando-se da realidade produtiva e administrativa.João Esmeraldo, António Leme e os irmãos Henrique e Guirarte Terra Nova. Martim e AntónioLeme são a excepção.

13. F. MAURO, ibidem, p. 225.

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As primeiras notícias sobre o comércio de açúcar com as cidades da Flandres são de 1468. Nestadata o açúcar madeirense já circulava na cidade de Bruges. Todavia estas primeiras remessasfaziam-se a partir de Lisboa e só a partir de 1472 temos então a importação directa. No quadrodos negócios sobre o açúcar os mercadores flamengos não conseguem atingir o mesmo patamardos genoveses e venezianos. Por outro lado a sua acção está quase só circunscrita às duasprimeiras décadas do século XVI. Aqui, as cidades estado italianas dominam com mais de 78%do açúcar transaccionado. Isto não corresponde de modo algum a uma menor importância doaçúcar neste mercado mas resulta sim do facto de o comércio estar sob o controlo da feitoriaportuguesa. Os dados das escápulas de 1499 assim o confirmam. Atente-se, ainda que noperíodo de 1513 a 1538 dezoito navios do trato do açúcar madeirense com a flandres foramapresados pelos franceses. Destes temos seis que iam desde Viana do Castelo14.

1501-1510 1510-1520 Total(1510-1540)mercadores Arrobas % Arrobas % Arrobas %

Flamengos 9.649 3,26 1,726,5 1,69 11.375,5 2,25total 286.106,

596.684 497.270

Nos Açores a inexistência de uma forte rede de negócios em torno do açúcar, bem como adesvalorizarão em favor do pastel e cereais, limitaram as possibilidades de intervenção daburguesia italiana e castelhana e abriram as portas pelo que temos a intervenção de flamengos eingleses, interessados no comércio do pastel. Linschoot, em 1589, refere que o comércio do pastelera feito por franceses, ingleses e escoceses; quanto a Ponta Delgada, diz-nos que aí "vãomercadores franceses, ingleses e escoceses buscar o pastel mais do que vão … Terceira, e que lá levam maisde duzentos quintais todos os anos". Esta assídua frequência de mercadores estrangeiros nos portosde Ponta Delgada e de Angra era considerada pelos vizinhos como ruinosa, pelo que solicitaramao monarca, em 1557, medidas limitativas da sua actuação. No entanto, estas pretensões sóforam atendidas na década de 80, já sob o domínio filipino; através de uma guerra derepresálias interditou-se o mercado açoriano à sua intervenção, primeiro com a proibição devenda das suas mercadorias, depois, impedindo o exercício de qualquer actividade nas ilhas.Todavia, a proibição não surtiu o efeito desejado, uma vez que se mantiveram activos servindo-se da intervenção de outros mercadores, pelo que em 1590 e 1596 o governo espanhol reforçou arepresália.Se no caso das relações das ilhas com os reinos peninsulares os laços e imperativos de soberaniados territórios, aliados tendência monopolizadora da burguesia metropolitana, impuseram umestreitamento de contactos e de comércio com a Península, no que respeita aos mercadosnórdico e mediterrânico as ilhas afirmaram-se pelos produtos, impostos pela nova economia demercado, o açúcar e o pastel. Para além disso, as insuficiências da indústria peninsulartraduziam-se numa procura de novos mercados capazes de satisfazer o gosto, cada vez maisapurado da nova aristocracia e da nova burguesia. Se é certo que os artefactos de uso diáriopoderiam ser encontrados na península, outros há que escasseavam, havendo necessidade de osimportar de Itália, Flandres e Inglaterra.Para a nova classe dirigente a ostentação da riqueza surge como uma forma de afirmação sociale política, sendo exteriorizada por meio do uso de produtos flamengos e italianos; deste modo

14 Ana Maria Ferreira, A Madeira, o comércio e o corso francês na primeira Metade do Século XVI (1513-1538), in Actas do I Colóquio Internacional deHistoria da Madeira.1986, Funchal,1989, pp.481-497.

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os panos peninsulares são preteridos em favores dos riquíssimos tecidos de Ypres, Ruão eLondres. Na Madeira a ostentação traduz-se na compra de uma campa em Flandres ou naaquisição de valiosas pinturas flamengas que depois ornamentavam as capelas dos morgadosmais importantes da ilha. Em 1546, João Lourenço Leitão refere ter comprado o retábulo deNossa Senhora da Piedade do Mosteiro de S. Francisco em Flandres por trinta e sete mil reais. E,em 1566, aquando do assalto francês à cidade do Funchal, Frutuoso refere que o saque devaliosos móveis "porque pela maior parte, pelo trato dali, a mais e maior riqueza daquela terra eram jóiase ricas peças de móveis ricos, que mandavam fazer de Flandres e outras partes pelos constantes eforasteiros, a troca de mercadorias da terra e de suas novidades, sem estimarem nem sentirem a compra ecusto de semelhantes coisas, ainda que custosas...".Gaspar Frutuoso referindo-se a S. Miguel, dá conta que Diogo Nunes Botelho, um dosprincipais proprietários da ilha, mandava vir de Flandres, Inglaterra e Sevilha alfaias e vestidosa troco de pastel. Para a burguesia ou para a aristocracia insulares, enriquecidas com o comérciodo açúcar ou do pastel, os créditos arrecadados serviam apenas para ostentação e afirmação noacanhado meio em que viviam. As restrições impostas pelo meio geográfico impelem-nas paraessa forma de investimento do capital, pondo de parte a possível revalorização na actividade detroca.O pastel, o açúcar e o vinho atraíram os mercadores europeus que invadiram o mercado insularcom os vários artefactos e produtos alimentares. A importância do comércio com as praças daEucrásia, Bruges, Flandres e Meldeburgo torna-se bem clara, já em 1485, em face da interdiçãodesse trato e suspensão dos privilégios aos mercadores flamengos aí residentes. Esta era a formade represália mais adequada contra a guerra nestas paragens. Para os portos nórdicosexportavam quer açúcar, pastel e urzela quer algodão e escravos; em troca, a ilha recebia ospanos (Londres, Escócia, Ruão), cereais e peixe seco ou salgado. No arquipélago açoriano ocomércio europeu orientava-se fundamentalmente, para as praças nórdicas (Inglaterra, Flandres,Holanda), com uma indústria têxtil importante, uma vez que o arquipélago era um dosprincipais produtores de pastel de mercado insular no século XVI.Na segunda metade do século XVII o açúcar madeirense foi paulatinamente substituído pelobrasileiro. Neste circuito de escoamento e comércio é evidente a intervenção de madeirenses eaçorianos. A oferta de vinho ou vinagre era compensada com o acesso ao rendoso comércio doaçúcar, tabaco e pau-brasil. Mas o trajecto das rotas comerciais ampliava-se até ao trato negreiro,cobrindo um circuito de triangulação. Para isso os madeirenses criaram a sua própria rede denegócios, com compatrícios fixos em Angola e Brasil.

O comércio do açúcar destaca-se no mercado madeirense dos séculos XV e XVI como o principalanimador das trocas com o mercado europeu. Durante mais de um século a riqueza das gentesda ilha e o fornecimento de bens alimentares e artefactos dependeu do comércio do produto. Oaçúcar foi, durante mais de um século, o principal activador das trocas da Madeira com oexterior. As dificuldades sentidas com a penetração do açúcar insular no mercado europeulevaram a coroa a intervir no sentido de manter um comércio controlado, que a partir de 1469passou a ser feito sob o permanente olhar do senhorio e coroa. A situação manteve-se até 1508,altura em que a coroa aboliu o regime de contrato. A partir de uma das medidas tomadas pelacoroa (o contingentamento de 1498) para defesa do mercado do açúcar madeirense poder-se-áfazer uma ideia dos principais mercados consumidores. As praças do mar do norte dominavamo comércio, recebendo mais de metade das escápulas estabelecidas: aqui a Flandres adquire umaposição dominante, o mesmo sucedendo com os portos italianos para o espaço mediterrânico. Se

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compararmos as escápulas com o açúcar consignado às diversas praças europeias no período de1490 e 1550, verifica-se que o roteiro não estava muito aquém da realidade. As únicas diferençasrelevantes surgem nas Praças da Turquia, Franca e Itália, sendo de salientar na última umreforço acentuado de posição, que poderá resultar da actuação das cidades italianas comocentros de redistribuição no mercado levantino e francês.

DESTINO ESCÁPULAS.1498 MERCADO.1490-1550 MERCADORES.1490-1550ARROBAS % ARROBAS % ARROBAS %

FLANDRES 40.000 33 105.896,5 39 11.375,5 2Total 59.000 165.625,5 - 520.430,5

Os dados disponíveis para o comércio do açúcar na Madeira evidenciam a constância dosmercados flamengo e italiano. O reino, circunscrito aos portos de Lisboa e Viana do Castelosurge em terceiro lugar com apenas 10%. Observe-se que o porto de Viana do Castelo adquiriu,desde 1511, grande importância neste circuito e da? com Espanha e Europa nórdica. Aliás, noperíodo de 1581 a 1587 Viana é o único porto do reino mencionado nas exportações de açúcar,mantendo, todavia, uma posição inferior à de 1490-1550. Esta função redistribuidora dos portosa norte do Douro ficara, já evidenciada entre 1535 e 1550, pois das cinquenta e seis embarcaçõesentradas no porto de Antuérpia com açúcar da Madeira, dezasseis são do norte e apenas uma deLisboa. Na primeira 50% são provenientes de Vila do Conde, 31% do Porto e 19% de Viana doCastelo. Aliás, em 1505 o monarca considerava que os naturais desta região tinham muitoproveito no comércio do açúcar da ilha15. Em 1538 este trato era assegurado por um numerosogrupo de grupos de mercadores daí oriundos. Entre eles estavam Aires Dias, Baltazar Roiz,Dioguo Alvares Moutinho e Joham de Azevedo. O mesmo sucede nas trocas com o mundomediterrânico onde se contava com os entrepostos de Cádiz e Barcelona, que surgem no períodode 1493 a 1537 com os portos de apoio ao comércio com Génova, Constantinopla, Chios e águasMortas16.Os dados da exportação para o período de 1490 a 1550, testemunham esta realidade: a Flandressurge com 39% e a Itália com 52%. Todavia, é de salientar a posição dominante dos mercadoresitalianos na condução deste açúcar, uma vez que eles foram responsáveis pela saída de 78% doaçúcar. Note-se que no início foram inúmeras as dificuldades para a presença de estrangeiros.Somente a partir da década de oitenta do século XV surgiram os primeiros como vizinhos, quese comprometeram com a cultura e comércio do açúcar. Para a segunda metade do séculodezasseis escasseiam os dados sobre o comércio do açúcar madeirense. Somente entre 1581 e1587 temos nova informação. Neste período a ilha exportou 199.300 arrobas de açúcar para oestrangeiro e 4830 para o porto de Viana do Castelo.A partir de princípios do século XVI o comércio do açúcar diversifica-se. A Madeira que nacentúria de quatrocentos surgira como o único mercado de produção, debater-se-á, a partir definais desse século, com a concorrência do açúcar das Canárias, de Berbéria, de S. Tomé e, maistarde, do Brasil e das Antilhas. Esta múltipla possibilidade de escolha, por parte dos mercadorese compradores, condicionou a evolução do comércio açucareiro. Todavia, o açúcar madeirensemanteve uma situação preferencial no mercado europeu (Florença, Anvers, Ruão), sendo o mais

15.Joel SERRÃO, "Nota sobre o comércio do açúcar entre Viana do Castelo e o Funchal...", in Revista de Economia, III, 209-212; VirginiaRAU, A Exploração e o comércio de sal em Setúbal, Lisboa, 1951; A.R.M., RGCMF, T. I, fls. 301-301vº, Lisboa, 15 de Março de 1505, carta régia,publ. in A.H.M., XVII, 453-454.16. Domenico GEOFFRÉ, Documenti sulle relazioni fra Genova ed il Portogallo del 1493 al 1539, Roma, 1961, 18-20, 266-265, 268-270, 277-279,284-285, 290-292, 309-310, José Maria MADURELL MARIMÓN, art. cit., 486-487, 493-494, 497-499, 501-502, 521 -522, 564-564.

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caro. Talvez, devido a este favoritismo encontramos com frequência referências à escala naMadeira de embarcações que faziam o comércio com as Canárias, Berbéria e S. Tomé. Estasituação deveria, de igual modo, explicar a venda de açúcar madeirense em Tenerife, no ano de150517.O comércio açucareiro na primeira metade do século XVI era dominado na Europa do Nortepelas ilhas e litoral do Atlântico, nomeadamente, entre as primeiras, a Madeira, Tenerife, GranCanaria e La Palma. Assim, na década de 30 os navios normandos ocupados neste comérciodirigiam-se preferencialmente a esta área. Convém anotar que a maioria das embarcações querumavam a Marrocos, com escala na Madeira à ida e no regresso, o que valorizou a Madeira nocomércio com a Normandia. A situação dominante do mercado madeirense perdurou nasdécadas seguintes, não obstante a forte concorrência da ilha de S. Tomé que se firmou, entre1536 e 1550, como o principal fornecedor de açúcar à Flandres. Todavia, é patente a posiçãocimeira da ilha de São Tomé a partir de 1539. É de destacar aqui o papel da comunidade judaica,que estabelece uma rede de negócios entre estes espaços, alguns portos litorais do continenteportuguês, como Viana do Castelo e Vila do Conde, e as principais cidades da Flandres.

NAVIOS PORTUGUESES COM AÇÚCAR PAR ANTUÉRPIA 1536-155018ORIGEM AÇÚCAR CARGA MIXTA TOTALMADEIRA 28 28 56Cabo Verde 1 7 8S. Tomé 88 38 126OUTROS 1 22 23

A Madeira, que até à primeira metade do século dezasseis havia sido um dos principaismercados do açúcar do Atlântico, cede lugar a outros (Canárias, S. Tomé, Brasil e Antilhas).Deste modo as rotas desviam-se para novos mercados, colocando a ilha numa posição difícil. Oscanaviais foram abandonados na quase totalidade, fazendo perigar a manutenção da importanteindústria de conservas e doces. O porto funchalense perdeu a animação que o caracterizaranoutras épocas.O pastel aparece na economia insular em condições idênticas ao açúcar. Foi uma culturaintroduzida pelos europeus para satisfazer as carências do mercado de têxteis. Até ao séculoXVII com a introdução do anil na Europa ele foi a principal planta da tinturaria europeia, dondese extraía as cores preta e azul. A par disso a disponibilidade de outras plantas tintureiras, comoa urzela (donde se tirava um tom castanho-avermelhado) e o sangue-de-drago, levaram aoaparecimento de italianos e flamengos, interessados no comércio, que por sua vez nos legaram anova planta tintureira: o pastel. O pastel foi primeiro cultivado na Madeira, e depois nos Açorese nas Canárias. Mas só no arquipélago açoriano, nas ilhas de S. Miguel, Terceira, S. Jorge e Faial,atingiu maior dimensão económica. A toponímia regista-se a sua presença e define os espaçosdo seu cultivo. Na Madeira refere-se a cultura e comércio no século XV. Os italianos teriam sidoos principais interessados no comércio o que os levou a considerarem a Madeira como a ilha dopastel. No século XVI está documentada a sua saída para Flandres. Mas os dados documentaissão escassas as referências denunciadoras da sua presença, o que poderá resultar da

17 Acuerdos del Cabildo de Tenerife, I, p. 83. nº 447, 26 de Março de 1505.18 V. M. GODINHO, Os Descobrimentos e a Economia Mundial, Lisboa, 1983, vol. IV, pp.98-99.

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secularização na economia madeirense em favor de outros produtos, como o vinho e o açúcar,dominantes e granjeadores de elevados proventos.Foi no arquipélago açoriano que o pastel alcançou um lugar de grande relevo. A suaimportância poderá ser comparável à que assumiu o açúcar na Madeira, Canárias e S. Tomé. Foia cultura do pastel que activou as trocas com o exterior e despertou o interesse dos mercadoresitalianos, flamengos e ingleses. A sua promoção nas ilhas resultou da presença dos flamengos,mas foram os ingleses nos séculos dezasseis e dezassete que tiveram dele consumo preferencial.Eles participaram no povoamento da Terceira e do Faial. Todavia foi na ilha de S. Miguel que seproduziu a maior parte do pastel exportado dos Açores, sendo ele responsável peloaparecimento de várias fortunas, como sucedeu com Jorge Botelho e Francisco Arruda da Costa.Nos Açores, a exemplo do sucedido com o açúcar na Madeira, a coroa concedeu váriosincentivos para a promoção da cultura, que com a incessante procura por parte dos mercadosnórdicos, fizeram avançar rapidamente o seu cultivo. Em 1589 Linschoten referia que "o negóciomais frequente destas ilhas é o pastel" de que os camponeses faziam o " principal mister", sendo ocomércio "o principal proveito dos insulares19", enquanto em 1592 o governador de S. Miguelatribuía a falta de pão à domínio quase exclusivo do solo pelo cultivo do pastel20.

COMERCIO, ARTE, RELIGIOSIDADE E OSTENTAÇÂO. A cidade do Funchal desenvolveu-se de acordo com as funcionalidades económicas, sendo por isso o traçado urbanístico fruto dasépocas de esplendor em que pontuaram de forma clara dois produtos, o açúcar e o vinho, cujosreflexos se dão apenas por força dos dinheiros que trouxeram à ilha e que foram derramadospelos inúmeros beneficiados. Segundo Gaspar Frutuoso o Funchal de finais do século XVI era acidade “dos mercadores e fanqueiras, ingleses, e flamengos e outros forasteiros e homens ricos e de grossotrato….”O comércio do açúcar destaca-se no mercado madeirense dos séculos XV e XVI como o principalanimador das trocas com o mercado europeu. Durante mais de um século a riqueza das gentesda ilha e o fornecimento de bens alimentares e artefactos dependeu do comércio do produto. Omesmo sucedeu nas Canárias, a partir do século XVI. Todavia, neste período a venda e valorsofreram diversas oscilações, mercê da conjuntura do mercado consumidor e da concorrênciados mercados insulares e americanos. O dispêndio do açúcar do lavrador fazia-se de formadiversificada. As vendas directas aos mercadores, muitas vezes de antemão, associam-se ospagamentos de dívidas ou por trocas de produtos e serviços. A tendência é para a disseminaçãopelos pequenos compradores, acabando com os interesses monopolistas de algumas casascomerciais, que haviam dominado o comércio na época de apogeu.O Funchal foi, no decurso dos séculos XV e XVI, o principal centro do arquipélago. Desde os

primórdios da ocupação da ilha que o lugar como vila e desde 1508 como cidade foi o centro dedivergência e convergência dos interesses dos madeirenses. À sua volta anichou-se um vastohinterland agrícola, ligado por terra e mar. O povoado, traçado por João Gonçalves Zarco,começou por ser a sede da capitania do mesmo nome mas, a riqueza do vasto hinterlandprojectou-o para ser a primeira e única cidade e porto de ligação ao mundo. Machico perdeu abatalha da afirmação, porque os seus capitães não foram capazes de acompanhar o ritmo dosfunchalenses. O progresso e importância do Funchal foram rápido. De vila passou a cidade esede do primeiro bispado e, depois arcebispado, das terras atlânticas portuguesas. Tudo istolevou a que no terreno evoluíssem o traçado urbanístico e a construção de imponentes edifícios.

19 Ob. cit. , 152-154.20 Arquivo dos Açores , II, 130.

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As palhotas, dispostas de modo anárquico, vão dando lugar a casas assoalhadas, alinhadas aolongo de arruamentos paralelos à costa e em torno da praça que domina o templo religioso. Ocapitão, de Santa Catarina, avançou encosta acima até se fixar no alto das Cruzes, no espaçodominado pelo actual Museu da Quinta das Cruzes. Do outro lado, no Cabo do Calhau, surgiu oburgo popular, dominado pelo mar e pela rua que o ligava a ermida de Nossa Senhora daConceição de Baixo. Foi a partir daí que avançou o núcleo urbano a que mais tarde veio a darorigem à cidade. Do nicho do cabo do Calhau, passou-se a Ribeira Santa Maria (hoje de JoãoGomes) e aos poucos conquistou-se espaço aos canaviais para traçar ruas e erguer casas desobrado. O próprio duque, D. Manuel, deu o exemplo, doando em 1485 o seu chão de canaviais,conhecido como campo do Duque, para nele ser traçada uma praça, construir-se a igreja, Paçosdo Concelho, de tabeliães e Alfândega. Ligando tudo isto estava a Rua dos Mercadores, hoje daAlfândega, donde partiram novos arruamentos que deram espaço e vida ao quotidiano dosmercadores. São exemplo disso a Rua do Sabão, João Esmeraldo. Perante nós estão doispercursos: dum lado o capitão que avança pelo extremo ocidental do vale até ao alto das Cruzese depois desce até à cidade manuelina. Do outro os companheiros do navegador, a genteobreira, que mantêm o convívio com o mar, avançando ao longo da linha da água ao encontroda cidade dos mercadores e artesãos.Para muitos a Sé é o emblema da cidade do Funchal. O templo foi mandado construir por

ordem de D. Manuel, iniciando-se as obras em 1493. Construída para ser a principal paróquia davila, acabou por ser a sede do novo bispado, criado em 1514 por Leão X a pedido de D. Manuel.A sua sagração ocorreu em 18 de Outubro de1517. Note-se que este monarca demonstrou umapredilecção especial por este templo cumulando-o de ofertas: a pia baptismal, o púlpito, a cruzprocessional. Aqui misturam-se vários estilos. São evidentes os traços do manuelino, na fachada,abside, no púlpito e pia baptismal. O barroco está patente nas capelas laterais, como sucede coma do Santíssimo Sacramento. Do conjunto chama-se a atenção para o cadeiral apresenta-se comduas ordens de cadeiras, ricamente trabalhadas. Em madeira dourada sobressaem esculturascom cenas bíblicas e do quotidiano madeirense do século XVI. Borracheiros e escravos convivemcom santos e outros populares em poses consideradas pouco dignas para o local onde seencontram.A primitiva Alfândega do Funchal foi criada em 1477 no Largo do Pelourinho por ordem da

Infanta D. Beatriz, como forma de controlar a arrecadação dos direitos sobre a entrada e saída demercadorias. Não sabemos onde esta funcionou no princípio, pois só teve edifício próprio apartir do século XVI, por plano de D. Manuel. Aí esteve a alfândega até 1962, altura em quemudou para modernas instalações. O edifício antigo ressuscitou das ruínas com o processoautonómico, ao ser adaptado para sede da actual Assembleia legislativa Regional da Madeira,inaugurada em 4 de Dezembro de 1987. O projecto de adaptação é da autoria do arquitectoChorão Ramalho. Nesta adaptação salvou-se o que ainda restava da época manuelina. As Salasdos Contos e do Despacho são os melhores testemunhos da época. Aí são visíveis, o tecto dealfarge, arcarias góticas com capitéis das colunas e misulas com decoração de elementos vegetaise figuras humanas, o portal armoriado da fachada norte e restos de arcarias góticas no interior.Parte substancial desta riqueza em pintura flamenga, maioritariamente do século XVI, pode ser

considerada uma dádiva do açúcar. Com este produto os madeirenses conseguiram elevadariqueza que ostentaram nas suas capelas privadas, ou em ofertas aos oragos da sua devoção. Háa salientar ainda algumas transacções directas de açúcar por estas pinturas nos grandes centrosartísticos da Flandres. Igual comportamento teve a coroa para com os madeirenses. D. Manuel

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foi um deles que cumulou alguns templos da ilha de tesouros. Está nesse caso a famosa cruzprocessional, oferecida à Sé do Funchal.Parte substancial da riqueza em pintura flamenga, maioritariamente do século XVI, pode ser

considerada uma dádiva do açúcar. Com este produto os madeirenses conseguiram elevadariqueza que ostentaram nas suas capelas privadas, ou em ofertas aos oragos da sua devoção. Háa salientar ainda algumas transacções directas de açúcar por imponentes quadros nos grandescentros artísticos da Flandres. Idêntico comportamento teve a coroa para com os madeirenses.D. Manuel foi um deles que cumulou alguns templos da ilha de tesouros. Está nesse caso afamosa cruz processional, oferecida à Sé do Funchal.O Museu está instalado no edifício construído por ordem de D. Luís de Figueiredo de Lemos(1586-1608). São coevos a arcaria que dá para a Praça do Município e a capela. A Capela anexa édedicada a S. Luís de Tolosa, onde ficou sepultado este bispo, depois trasladado para a Sé. ACapela apresenta um belo pórtico da cantaria negra. O Bispo D. José de Sousa de Castelo Branco(1698-1721) anexou-lhe o Seminário. Com o terramoto de 1748 tornou-se necessária uma novaconstrução que chegou à actualidade. A República em 1910 atribuiu-lhe novas funções, pois aífuncionou o liceu até 1942. A construção do novo liceu em 1950 levou a sua recuperação peladiocese que aí fez instalar o Museu Diocesano de Arte Sacra.

A GUERRA AOS FLAMENGOS. O período que medeia entre os finais do século XVI e aprimeira metade da centúria seguinte é o momento decisivo da História das ilhas e do Atlântico.As questões políticas sobressaem às demais e anunciam uma globalização dos problemas emque o principal palco é o Atlântico que tem como pilares as ilhas. Subjacente ao conflito está oafrontamento ao mar ibérico, construído à custa de pactos e bulas papais desde o século XV. Ooceano da segunda metade do século XVI era já um mar aberto. Os conflitos contribuíram para oreconhecimento definitivo da total abertura do oceano aos diversos intervenientes europeus.A união das coroas peninsulares não implicou a incorporação do estado português. Estamos naverdade perante a união de duas coroas e não de estados. A nova situação veio a provocarmudanças em termos da geografia política do espaço atlântico fazendo dele o palco principaldos conflitos entre as potências europeias. A situação é o prelúdio da perda da posiçãohegemónica dos reinos peninsulares nas rotas que os ligavam ao Novo Mundo Desde meadosda centúria que o direito à circulação se tornou universal ganhando esta tese um forte suportejurídico e filosófico.Na Madeira e nos Açores continuou a afirmar-se a presença britânica que teve consumaçãoplena na segunda metade do século XVII21. O mundo das ilhas manteve-se alheio ao jogo deinteresses europeus. Apenas nos espaços continentais atlântico (Africa e Brasil) e no Oriente setornava evidente o assalto dos beligerantes às possessões portuguesas, acabando por fragilizar ahegemonia e império que os portugueses havia conseguido em princípios do século XVI. Asalterações mais significativas ocorreram nas ilhas de Cabo Verde e S. Tomé e Príncipe pelosimples facto de ambos os arquipélagos funcionaram como antecâmara dos centrosabastecedores de escravos do litoral africano da Costa e Golfo da Guiné.Uma das formas usadas pelos mercadores nórdicos para se furtarem à prisão pelas autoridadesdas Canárias estava no recurso ao pavilhão de um país amigo e ao disfarce do nome,

21 Sobre os Açores veja-se: Nestor de SOUSA, “Sinais da Presença Britânica na vida Açoriana (séculos XVII-XVIII)”, in Arquipélago , nº especialRelações Açores - Grã Bretanha, P. Delgada, 1988, pp. 25-100; J. G. Reis LEITE, Os Fisher. Esboço Histórico de uma Família Açoriana, Angra doHeroísmo, s. d..

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aportuguesando-o. Isto ficou conhecido como comércio disfarçado22. Aliás, continuaram a seros campeões do contrabando que tinha por palco algumas ilhas como era o caso da Madeira23.Um dos casos paradigmáticos que revela a desigual situação dos mercadores estrangeiros entreas ilhas dos Açores e Madeira e as Canárias sucede com Bartolome Cuello, um mercador inglêspreso em Tenerife a 17 de Janeiro de 1592 e julgado em 159724. Note-se que ele mesmo assimnão conseguiu iludir a perseguição das autoridades inquisitoriais de Canárias. A confissão destemercador perante o tribunal de Las Palmas é um retrato evidente da actividade comercial dosnórdicos no período de 1586 a 1591. Aí temos a definição do que se entendia como comérciodisfarçado: "...y demais de los navios que... tiene declarado que an venido la dicha isla de San Miguel connombre de escoceses con el mesmo engaño..los dichos escoceses traen pasaportes delRey d’Escosia.... losmercaderes que por las dichas vias tratan en España tienen dellos de Francia y d’Escocia y de Flandrespara las mercadorias y las sellan con ellos....y en quanto a los flamencos de Olanda y Gelanda.... lossusodichos tratan ordinariament en Ynglaterra como vassallos de la Reyna y que traen gran cantidad deropa y de mercadorias lo quel todo llevan a España y a estas yslas y a las de San Miguel fingiendo seralemanes de Amburch y de Dunquerque en Flandres...." Esta prática não foi só apanágio deBartolome Cuello, pois que se documentam outros como Thomas Alder, Ht Web, Tomas Simon,Juan Jurdan e Paulo Bux.A união das coroas peninsulares foi, em dúvida, o princípio do fim da hegemonia ibérica no

Atlântico mas não do protagonismo das ilhas que continuaram a ser espaços intervenientes nasnovas realidades políticas e económicas que o final de século propiciou. No século XVII osmecanismos comerciais estavam em mudança, afirmando-se, cada vez mais, a tendência para oproteccionismo económico, definida pelas companhias comerciais e de legislação restritiva: osholandeses criaram em 1629 a companhia das Índias Ocidentais, os portugueses em 1649 aCompanhia Geral do Comércio para o Brasil e os ingleses em 1660 a Royal Adventuress in toAfrica e, depois, em 1672, a Royal Campany of England. A política monopolista e proteccionismodos ingleses iniciaram em 1651 com o Acto de Navegação e teve continuidade nos actosposteriores de 1661 a 1696. Em França a política do cardeal Richelieu (1624-1642) havia dado omote para a nova realidade político comercial. O mar que séculos atrás foram apenas umprivilégio dos peninsulares era agora património dos diversos empórios marítimos europeus. Adivisão política anterior deixou de ser uma realidade e deu lugar à era dos imperativoseconómicos.A presença e disputa dos holandeses rege-se por condições específicas, porque detinhaminteresses importantes na cultura açucareira americana e procuravam assegurar o domínio de S.Tomé, Santiago e demais feitorias para acesso ao mercado de escravos. A isso juntava-se oempenho na manutenção das rotas do tráfico e de destruição dos interesses açucareiros da área.O ataque em 1598 à ilha de Santiago e no ano imediato a S. Tomé surge no seguimento doassalto a Las Palmas. Se na última o saque foi o principal motivo da intervenção já em S. Tomé oobjectivo era a destruição da cultura da cana, de fabrico do açúcar e controlo da rota dosescravos.O novo século anunciou-se como um momento de ligeira acalmia nos mares. Os conflitos daspotências europeias foram paulatinamente sanados pelo que a permanente instabilidade de

22 Alberto VIEIRA, O Comércio Disfarçado mas ilhas do Atlântico Oriental. O Processo de Bartolome Cuello na Inquisição de Las Palmas (1591-98), in Anita NOVINSKI (ed.), Inquisição Ensaios sobre Mentalidade, Bruxarias e Arte , S. Paulo, 1992, pp.161-169.23 Cf. Joel SERRÃO, Temas Históricos Madeirenses, Funchal, 1992, pp129-140.24 Cf. W. de Gray BIRCH, Catalogue of the Collection of Original Manuscripts formerly belonging to the Holy Office of the Inquisition in theCanary Islands, vol. III, Londres, 1903, pp. 1026-1054; L. ALBERTI e A. B. Wallis CHAPMAN, English Merchants and the Spanish Inquisition inthe Canaries, Londres, 1912, pp. 127-152.

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finais da centúria pertenciam já à História. Assinadas as pazes com a Inglaterra a 18 de Agostode 1604 as populações insulares respiraram de alívio, pois os corsários ingleses deixaram de osincomodar. Com os holandeses as tréguas foram curtas, pois duraram de 1609 a 1621,reacendendo-se as hostilidades que conduziram a nova situação de instabilidade.Facto significativo da adesão insular aos objectivos da monarquia restaurada foi a participaçãonas campanhas de recuperação de alguns espaços do Novo Mundo ocupados pelos holandeses,no Brasil e Luanda, e para a guerra peninsular. No Brasil releva-se a iniciativa de João FernandesVieira, que segundo o mesmo declarava em testamento “guiou a causa das felicidades de que

está gozando Portugal” ao expulsar os holandeses de Pernambuco em 1654.78

Se o período filipino representou o avolumar dos inimigos dos interesses coloniais dosportugueses, já o Portugal Restaurado vai buscar o apoio entre os rivais de Castela. Deste modofranceses, holandeses e ingleses firmaram-se num primeiro momento como os nosso principaisaliados, usufruindo com isso alguns favores que favoreciam o expansionismo. A 1 de Junho de1641 foi assinado o tratado com a França e desde 21de Janeiro deste ano que os holandesesusufruíam de liberdade comercial nas praças do reino que ficou esclarecida no tratado detréguas de 12 de Junho de 1641. Neste tratado assinado em Haia ficaram estabelecidas as tréguasentre Portugal e os Estados Gerais das Províncias Unidas por um período de 10 anos. Mais tardecom o tratado assinado a 20 de Outubro de 1648 pôs-se termo às hostilidades sobre a posse doBrasil. O restabelecimento das relações com a Inglaterra só aconteceu em 29 de Janeiro de 1642,certamente atraídos pelo bom relacionamento com a Espanha.

O BRASIL HOLANDÊS E OS MADEIRENSES. Mais tarde no século XVII tivemos de novoum movimento migratório significativo, desta vez provocado pela necessidade de defesa doterritório brasileiro face à ameaça de invasores e ocupantes. De novo o madeirense volta assumirum papel de destaque. Os descendentes daqueles que haviam estão nos começos da formaçãoda sociedade brasileira regressam para assegurar a continuidade da tarefa e a soberaniaportuguesa. A libertação do Maranhão em 1642 foi obra de António Teixeira Mello, enquantoem Pernambuco a resistência ao holandês foi organizada desde 1645 por João FernandesVieira25. Ainda, a defesa da soberania lusíada foi conseguida também com o envio decompanhias de soldados desde a ilha. Assim temos: em 1631 de João de Freitas da Silva, 1632 deFrancisco de Bettencourt e Sá, em 1646 de Francisco Figueiroa26, em 1658 de D. Jorge Henriquescom 600 homens 27 . A situação manteve-se. Em 1696 temos o envio de 100 soldados para oestado do Maranhão28. Já em 1734 a nova leva teve como destino Santos29 . Em 1774 foram 200soldados da Madeira na companhia de 1000 homens enviada ao Rio de Janeiro30. Para SantaCatarina temos ainda notícia do envio de militares nos séculos XVII e XVIII, em época anteriorao período de colonização insular31.Francisco de Figueiroa está desde 1628 ligado a diversas campanhas em Pernambuco, mas em1646 encontrava-se na Madeira quando recebeu do rei a carta de patente de mestre de campo

25 Cf. Texto de Leonardo Dantas neste Volume. José António Gonsalves de Mello, João Fernandes Vieira Mestre de Campo do Terço de Infantaria dePernambuco, 2 vols, Recife 1956, reedição em 2000 pelo CEHA/CNCDP26 . Cf. Texto de José António Gonsalves de Mello, Francisco de Figueiroa. Mestre de Campo do Terço das Ilhas em Pernambuco, Recife, 1954, publicadoneste volume.27 ANTT, PJRFF[Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Provedoria e Junta da Real Fazenda do Funchal], Registo Geral da Fazenda e Contos, nº.965ª, fls.267vº-268vº, 278-278vº, 4 e 9 de Dezembro de 1658 e 1 de Agosto de 1664; ibidem, nº396, fls.23vº-24, 6 de Abril de 1659.28 ANTT, PJRFF, Registo Geral da Fazenda e Contos, nº.nº.398, fls.5vº-7vº, 18 de Março de 169629 ANTT, PJRFF, Registo Geral da Fazenda e Contos, nº. 398, fls. 2-5vº, 3 de Dezembro de 1734 e 16 de Janeiro de 1735.30 ANTT, PJRFF, Registo Geral da Fazenda e Contos, nº.976, fls266vº-267, 20 de Junho de 1774.31 Maria Licínia Fernandes dos Santos, Os Madeirenses na Colonização do Brasil, Funchal, 1999, pp.76-77.

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para chefiar um terço de infantaria das ilhas com 500 homens, sendo metade da Madeira e aoutra metade das ilhas de Pico, S. Miguel, Faial e Graciosa32. O terço de Francisco de Figueiroa éconstituído por 4 companhias, sendo uma comandada pelo capitão Manoel de Azevedo, quehavia servido já no Rio de Janeiro, Baia e Pernambuco33. Manoel Homem d’El-rei era o capelão,nomeado pelo próprio mestre de campo34, enquanto António Faria era o ajudante35. A despesadeste serviço é coberta pela Provedoria da Fazenda no Funchal, com o dinheiro reservado para afortificação da ilha36.A Madeira, através das principais famílias, esteve envolvida no processo de formação e defesada sociedade brasileira. Madeirenses de diversas idades e origens sociais, sulcaram o Atlânticopara lançar a cultura da cana-de-açúcar, construir os primeiros engenhos, estabelecer os alicercesdas instituições régias e locais e defender a soberania portuguesa face ao afrontamento ouusurpação de franceses, holandeses e castelhanos.

No quadro da presença flamenga nas ilhas temos a assinalar que esta aconteceu com maiorevidência nos arquipélagos da Madeira e dos Açores, por motivos e em situações distintas. EmCabo Verde e S. Tomé e Príncipe, não obstante a existência de contactos comerciais directos coma Flandres, a presença flamenga é quase nula, prova de que o comércio0 estava na mão dosportugueses, nomeadamente os judeus. Para o arquipélago madeirense todo o interesse estevevirado para o comércio do açúcar pelo que são na maioria mercadores que aparecem,maioritariamente na condição de estantes. São raros os casos de flamengos que fixam morada nailha. Aliás, o mais célebre é apontado por Gaspar Frutuoso como sendo genovês. Já nos Açores asituação foi totalmente distinta. Estamos perante uma significativa presença de povoadores, comum contributo de relevo para o povoamento das ilhas, que abriram as rotas ao comércio com asua terra de origem, por força do pastel. Se quisermos apontar um epíteto de ilhas flamengasapenas o podemos fazer quanto à Madeira e aos açores, onde esta influência é ainda visível emalguns testemunhos.

32 ANTT, PJRFF, Registo Geral da Fazenda e Contos, nº.980, fl.103-105, 17 de Fevereiro, Ibidem, nº.965ª, fls. 14vº-15, 22, 27 de Abril e 11 de Maio de1646; ARM, RGCMF, T. VI, fls. 66, 77vº-78, 27 de Abril e 8 de Maio.33 ANTT, PJRFF, Registo Geral da Fazenda e Contos, nº.980, fls.105vº-106, 17 de Fevereiro de 1646.34 ANTT, PJRFF, Registo Geral da Fazenda e Contos, nº. 980, fl.107vº, 15 de Junho de 1646; ibidem, nº980, fls.148-148vº, carta de patente de capelão de26 de Setembro de 1646.35 ANTT, PJRFF, Registo Geral da Fazenda e Contos, nº.980, fls.106vº. 26 de Junho de 1646.36 ANTT, PJRFF, Registo Geral da Fazenda e Contos, nº.965, fls. 14-14vº, 11 de Maio de 1646.