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Rua das Mercês, 8 9000-420 – Funchal Telef (+351291)214970 Fax (+351291)223002 Email: [email protected] [email protected] http://www.madeira-edu.pt/ceha/ VIEIRA, Alberto (2005) A Freguesia de São Martinho COMO REFERENCIAR ESTE TEXTO: VIEIRA, Alberto (2005): A Freguesia de São Martinho, Funchal, CEHA-Biblioteca Digital, disponível em: http://www.madeira-edu.pt/Portals/31/CEHA/bdigital/avieira/2005-av-saomartinho.pdf, data da visita: // RECOMENDAÇÕES O utilizador pode usar os livros digitais aqui apresentados como fonte das suas próprias obras, usando a norma de referência acima apresentada, assumindo as responsabilidades inerentes ao rigoroso respeito pelas normas do Direito de Autor. O utilizador obriga-se, ainda, a cumprir escrupulosamente a legislação aplicável, nomeadamente, em matéria de criminalidade informática, de direitos de propriedade intelectual e de direitos de propriedade industrial, sendo exclusivamente responsável pela infracção aos comandos aplicáveis.

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AFreguesiadeSãoMartinho VIEIRA,Alberto(2005) VIEIRA,Alberto(2005):AFreguesiadeSãoMartinho,Funchal,CEHA-BibliotecaDigital,disponível em:http://www.madeira-edu.pt/Portals/31/CEHA/bdigital/avieira/2005-av-saomartinho.pdf,datadavisita: // RuadasMercês,8 9000-420–Funchal Telef(+351291)214970 Fax(+351291)223002 A Freguesia de S. Martinho Alberto Vieira AUTOR ©Alberto Vieira 1ª Edição Setembro de 2005 IMPRESSÃO Grafimadeira S.A. TIRAGEM ISBN Depósito Legal JUNTA DE FREGUESIA DE SÃO MARTINHO 2005 Alberto Vieira

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VIEIRA, Alberto (2005)

A Freguesia de São Martinho

COMO REFERENCIAR ESTE TEXTO:

VIEIRA, Alberto (2005): A Freguesia de São Martinho, Funchal, CEHA-Biblioteca Digital, disponívelem: http://www.madeira-edu.pt/Portals/31/CEHA/bdigital/avieira/2005-av-saomartinho.pdf, data da visita:/ /

RECOMENDAÇÕESO utilizador pode usar os livros digitais aqui apresentados como fonte das suas próprias obras,usando a norma de referência acima apresentada, assumindo as responsabilidades inerentes ao

rigoroso respeito pelas normas do Direito de Autor. O utilizador obriga-se, ainda, a cumprirescrupulosamente a legislação aplicável, nomeadamente, em matéria de criminalidade informática,de direitos de propriedade intelectual e de direitos de propriedade industrial, sendo exclusivamente

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A Freguesia de S. Martinho

Alberto Vieira

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TÍTULO

A Freguesia de S. Martinho

1ª Edição Setembro de 2005

AUTOR

©Alberto Vieira

FOTOGRAFIA

Museu de Photographia VicentesJunta de Freguesia de São MArtinhoAlberto VieiraDuarte Gomes

EDIÇÃO

Junta de Freguesia de São MartinhoCaminho de São MArtinho, 61FUNCHALTelef.291-700580Fax.: [email protected]

TIRAGEM

IMPRESSÃO Grafimadeira S.A.

Depósito Legal

ISBN

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A Freguesia de S. Martinho

JUNTA DE FREGUESIA DE SÃO MARTINHO

2005

Alberto Vieira

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INDICE GERAL

Prefácio do Presidente da Junta de Freguesia de S. Martinho .....................................10Introdução.....................................................................................................................12O Santo .........................................................................................................................16Do Lugar e do Espaço ..................................................................................................22

A Paróquia.............................................................................................................25A Freguesia ............................................................................................................26A Heráldica............................................................................................................31A Águsa .................................................................................................................46

O Homem e o Espaço ..................................................................................................53Transportes: Pontes, Caminhos e Estradas...................................................................67Aproveitamento dos Recursos.......................................................................................71A Tecnologia de Vinificação. Do lagar ao Canteiro ....................................................84A Valorização Económica do Espaço...........................................................................87As Indústrias e o Artesaanato .....................................................................................109

O Bordado ...........................................................................................................111O Turismo............................................................................................................115Serviços e Empresas ............................................................................................129

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As Gentes e o Quotidiano ...........................................................................................135Nascer, Sobreviver e Morrer ...............................................................................137Fontanários e Abastecimento de Água ao Domicílio ..........................................143A iluminação e a Electricidade............................................................................145As Escolas e o ensino ...........................................................................................149

A Habitação ................................................................................................................155Alimentação, Mercados, Vendas.................................................................................163Festa e Diversão ..........................................................................................................169A Banhos .....................................................................................................................177As Esquadras de Navegação Terrestre ........................................................................179O Folclore e a História................................................................................................181O Vestuário e a Moda.................................................................................................189Cultura e Património ..................................................................................................195Monumentos Evocativos.............................................................................................209Personalidades Ilustres.................................................................................................214

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O objectivo central deste livro é dar a conhecer a nossa freguesia, a freguesia de São Martinho.Este livro resulta assim da conjugação de uma vontade antiga e de uma necessidade cada vez mais

evidente: por um lado, é a concretização de um sonho já com alguns anos; por outro lado, é um marcoque releva os aspectos principais e as características intrínsecas de uma das freguesias mais importantes daCidade do Funchal, consequência do forte crescimento e do desenvolvimento promovidos pela Autonomiada Região Autónoma da Madeira.

Conhecer melhor a história da nossa freguesia foi, nestes termos, o motivo basilar que nos trouxe atéaqui.

Num tempo em que a memória colectiva rapidamente se esfuma devido à enorme pressão mediáti-ca e ao ritmo frenético dos dias sempre intensos que vivemos, é urgente, quanto a nós, manter vivos osaspectos mais importantes da história colectiva deste povo ilhéu que no Atlântico constrói este pequenomundo.

Só assim será possível ensinar às actuais e às futuras gerações os costumes, as tradições, as activi-dades e festividades culturais, e dar a conhecer o património arquitectónico, os marcos históricos ou osnomes dos sítios da nossa freguesia.

Todos estes elementos são elementos primordiais que explicam boa parte do que somos enquantopovo e que nos ajudam, inequivocamente, a perceber o modo como nos organizamos.

Por isso, nada melhor que este tempo e esta oportunidade para lançar mais esta pequena pedra,ainda para mais quando a Cidade do Funchal, capital da nossa Região Autónoma, está prestes a comemo-rar 500 anos de existência.

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Nos últimos anos, tempos de acelerado progresso fruto de uma Autonomia conquistada a pulso, SãoMartinho têm-se destacado também devido a um forte aumento demográfico e de infra-estruturas quetrouxeram uma vivacidade muito própria e o imprescindível desenvolvimento social, cultural, ambientale económico à nossa freguesia.

São Martinho é hoje, fruto destas circunstâncias, uma freguesia marcadamente urbana, onde pre-dominam o comércio, os serviços e a hotelaria, sectores estratégicos, não só para o Funchal como tambémpara toda a Madeira. Nada nos custa compreender que toda esta dinâmica tem acarretado mudançasimportantes no tempo e no espaço. Essas mudanças traduzem-se em novas potencialidades, em novasexpectativas e também em novas, e legítimas, exigências, ao serviço da sua população que tem sabido,sabiamente, aproveitar as oportunidades para fazer crescer, quantitativa e qualitativamente, a nossafreguesa.

Para terminar quero deixar alguns breves, mas mais do que merecidos agradecimentos: ao Prof. Dr.Alberto Vieira a sua disponibilidade e o seu inestimável contributo para a produção deste livro; ao Dr.Miguel Albuquerque, presidente da Câmara Municipal do Funchal, pela visão e determinação com quedirige os destinos da nossa cidade; aos Cimentos Madeira na pessoa do seu Presidente Dr. João ManuelSantos; aos meus colegas de Junta e aos funcionários todo o apoio dado ao longo destes anos; e a todos osresidentes desta nobre e grandiosa freguesia os meus mais sinceros cumprimentos.

O Presidente da Junta de Freguesia de São MartinhoJoão José Pimenta de Sousa

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INTRODUÇÃO

A história da Freguesia de São Martinho confunde-se com a da cidade. Por muito tempoconsiderado os arrabaldes da cidade viveu em relação às exigências da sociedade e economia funchalense.Deste modo não se torna fácil destrinçar ou separar, de acordo com a divisão administrativa do séculoXIX, uma realidade histórica de mais de cinco séculos. A História do Funchal e da periferia vizinha foimuito rica e para ser entendida deve ser encarada como um todo. Deste modo ao longo desta breveHistória de São Martinho teremos necessidade de recorrer a visões da realidade social, económica,religiosa, cultural madeirense, que ultrapassam o perímetro da freguesia.

São Martinho foi primeiro um lugar dos arredores do Funchal, que se desenvolveu graças àspotencialidades económicas do espaço, na produção de vinho, cana sacarina e produtos de auto-subsistência. Paulatinamente foi ganhando importância, por força da fixação de colonos empreendedores,proprietários de amplas terras de sesmaria, dominadas por casas solarengas. Algumas famíliasproeminentes escolheram o recato desta área periférica para fixar sua morada.

O núcleo primitivo que deu nome ao lugar alargou-se por força da definição da área jurisdicionalreligiosa e administrativa. Primeiro, a paróquia e, depois, a freguesia definiram uma realidade distinta. Onúcleo inicial foi ampliado, colando-se ao mar e às freguesias do centro da cidade. Neste sentido a Históriavalorizou o primevo núcleo associando-o ao progresso da cidade. Assim, a partir do século dezanove aafirmação do turismo fez com que a área ribeirinha assumisse uma importância fundamental. Até a

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actualidade encontra-se no seu recinto a zona privilegiada do turismo madeirense, que teve um processorápido de desenvolvimento a partir da década de setenta do século XX. Hoje alberga a principal áreahoteleira e de infra-estruturas de apoio ao mesmo. Aos hotéis associam-se espaços balneares, promenades,centros comerciais.

A autonomia, a partir de 1976, trouxe nova valorização à freguesia. A criação do bairro social daNazaré abriu um novo pólo de valorização social. Por outro lado foram surgindo diversas infra-estruturasde interesse regional, que fizeram da freguesia um pólo destacado de desenvolvimento. A instalação dosserviços do Exército e da Artilharia das Forças Armadas na região, a Cabo Tv Madeirense, CimentosMadeira a Empresa de Electricidade da Madeira, o Madeira Forum e diversas unidades de comercioestão na origem do rápido progresso. Anote-se ainda que a primeira via rápida, que definiu o rumo doprogresso rodoviário recente, começou a ser traçada aqui.

São Martinho cresceu com o processo histórico, sendo hoje uma das áreas mais expressivas doprogresso madeirense, recente e passado. Também o processo autonómico de finais do século XX teverepercussão evidente, de modo que S. Martinho de inícios do século XXI pode muito bem ser consideradaa freguesia que mais ganhou e evidencia o progresso gerado pela autonomia política. São Martinho é nãosó um reflexo e testemunho de um passado de glórias da cidade, como do progresso recente.

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Baía doFunchal,

gravura doséculo XIX,vendo-se ao

fundo S.Martinho

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O ESPAÇO E O HOMEM

S. Martinho ganhou a sua identidade própria quando os colonos aí fixados decidiram baptizar olugar. O espaço, pela proximidade da cidade do Funchal, adquiriu rapidamente importância. O perímetroactual foi conquistado por força da divisão religiosa das paróquias e, depois, com o liberalismo com acriação das freguesias. Deste modo o São Martinho de hoje é muito distinto daquele núcleo primitivo.

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O SANTO

S. Martinho é, como é óbvio, o santo patrono da paróquia e freguesia que mereceu o mesmo nome,surgindo a partir do último quartel do século XVI em relação directa com o bispo da diocese funchalenseque a criou.

A História da Igreja regista pelo menos quatro santos com o nome de Martinho; a 13 de Abrilrecorda-se S. Martinho, que foi Papa (+656), a 3 de Novembro Martinho de Lima ou de Porres (1579-1639), a 11 de Novembro S. Martinho de Tours (316-397) e, finalmente, a 5 de Dezembro S. Martinho deDume, cuja devoção teve grande impacto no Norte do país1. O facto de no povoamento da ilha se notaruma forte presença de gentes nortenhas seria natural que o orago remetesse para o último. Todavia a

1 . Em todo o país temos 24 freguesias que têm como patrono S. Martinho, celebrando o dia 11 de Novembro.

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realidade é outra. Assim, num dos livros da confraria de São Martinho de 1578 surge a figura de umganso2, um dos símbolos de São Martinho, bispo de Tours. O culto ao santo começou em França no séculoV, onde ainda hoje domina a religiosidade popular, mas expandiu-se rapidamente por toda a Europa,chegando a Portugal nos inícios da nacionalidade.

O nome de baptismo da freguesia surge em 1579 com o alvará de criação, indo ao encontro datradição do culto a este bispo, a quem os madeirenses haviam implorado a intersecção durante a peste queassolou o Funchal. A 23 de Julho de 1537 a vereação do Funchal fez um voto a S. Martinho para queprontamente desaparecesse a peste. Deste modo decidem erguer um altar na Sé com capela perpétua ondese rezaria uma missa todas as quintas-feiras. Ao mesmo tempo criou-se uma confraria com o nome do santo.Entretanto o arcebispo D. Martinho de Portugal [1533-1547] estabeleceu o dia de S. Martinho bispo- a 11de Novembro- como feriado na diocese do Funchal3. As constituições Sinodais de 1598 acabaram com asituação. Será que esta devoção funchalense a S. Martinho contribuiu para que a nova paróquia o tivessecomo patrono, ou foi apenas o recurso ao orago da capela erguida por Afonso Anes, hortelão.

Martinho nasceu em 316 na Sabária da Panónia, o que corresponde hoje a Zzmbathely na Hungria,filho de um oficial do exército romano. Aos 12 anos de idade contra a vontade familiar, tornou-se cristãoe dois anos depois baptizou-se na Gália. Entretanto havia entrado para o exército. Foi neste momento quesucedeu o célebre episódio da manta. Em 337, quando na condição de soldado romano, procedia a umaronda em Amiens foi abordado por um mendigo a tiritar de frio, a quem entregou metade da manta quehavia cortado com a sua espada. Enquanto dormia teve um sonho onde viu Jesus envolto no pedaço damanta dizer-lhe: Martinho, ainda não baptizado, deu-me este vestuário. Depois, deixou o exército epassou a levar vida solitária, sob a orientação espiritual de Hilário de Poitiers. Mais tarde foi eleito bispode Tours e fundou o Mosteiro de Marmoutier em Tour.

S. Martinho é considerado o padroeiro dos vinhateiros por, segundo a tradição, ter sido em vidaimportador de vinho no Loire. A vinculação do 11 de Novembro ao nome tem a ver certamente com oter sido enterrado no mesmo dia do ano de 397. A cultura popular anota ainda o chamado “verão de S.Martinho”. Resultante da capa entregue ao mendigo, pois segundo a lenda a chuva copiosa desapareceu

2. Aquando do anúncio da sua nomeação para Bispo de Tours escondeu-se, mas um ganso denunciou-o ao cantar junto do seu esconderijo.3. Henrique Henriques de Noronha, Memórias Seculares e Eclesiásticas para a Composição da História da Diocese do Funchal na Ilha da Madeira,

Funchal, CEHA, 1996, pp.81, 174, 183, 325-326.

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e o sol apareceu radioso.À data da festividade do S. Martinho é também o momento de exaltação e

ritualização do vinho. É a prova de fogo do vinho novo e, por isso mesmo, ficou amarcar o calendário agrícola e o ciclo de vida do vinho. É o primeiro rito deconsagração do vinho que adquire várias formas de expressão como a testemunha acultura tradicional.

S. Martinho — de parceria com S. Plácido e Santa Bebiana— é considerado opatrono dos alcoólicos. A sua festa é assim o momento de celebração do vinho e oinício de uma nova época para os aficionados. As posturas municipais estavamatentas a esta tradição, definindo desde tempos recuados a proibição de beber evender vinho novo antes desta data.

Para celebrar o momento a etnografia atesta diversos cerimoniais espontâneosque nos fazem lembrar as celebrações clássicas do vinho, isto é, as festas dionisíacase as bacanais. Na verdade, no S. Martinho, para além do rotineiro gesto de provar ovinho novo e, depois, atestar e fechar as pipas, temos manifestações rituais nãoorganizadas que assumiram algum significado em diversas localidades.

A tradição manteve-se através de irmandades ou confrarias que reuniam osapreciadores do vinho e os levavam em procissão às diversas adegas ou pelas ruas daslocalidades. Tivemos no norte do país a procissão do bêbado feita pela respectivaconfraria. Os acólitos desfilavam em perseguição de um corno, que servia par bebero vinho. A manifestação chegou à Madeira sabendo-se de uma procissão encimadapor um falso bispo. Em meados do século dezanove esta manifestação assumiu taisproporções e escândalo que o Governador foi forçado a estabelecer restrições nacidade. Hoje, de certeza, perdeu-se na memória dos mais antigos.

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DDOO LLUUGGAARR EE DDOO EESSPPAAÇÇOO

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DO LUGAR E DO ESPAÇO

A localidade de S. Martinho começou por se resumir ao entorno da capela fundada por AfonsoAnes4, natural de Freixedo em Viseu, mas com o decorrer dos tempos foi alargando o perímetro e área deinfluência até atingir a actual.

4. Afonso Anes era filho de Pedro Anes e Beatriz Anes, tendo casado em 1552 na Sé do Funchal com Maria Fernandes.

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AA FFRREEGGUUEESSIIAA EE PPAARRÓÓQQUUIIAA.. A Revolução Liberal abriu uma nova era para administraçãomunicipal, iniciada com a reforma de Mouzinho da Silveira. Assim, pela carta de lei de 25 de Abril de1835, o território foi dividido em distritos, concelhos e freguesias. Daqui resultou para a Madeira, oaparecimento de novos municípios. Desta vez, a costa norte da ilha foi de contemplada com a criação dosmunicípios de Santana e Porto Moniz.

Não obstante a designação de freguesia ser de origem eclesiástica, o certo é que hoje é maisconhecida com estrutura administrativa da sociedade civil. Foi com a carta de lei de 25 de Abril de 1835que começou a delinear-se a mudança., que se consolidou definitivamente com o código administrativode 1878, conhecido como o código de Rodrigues Sampaio. A 26 de Novembro de 1835, numareformulação sem precedentes da estrutura administrativa, foram criadas as Juntas de Paróquia, queperduraram pouco tempo, pois foram extintas em 1836. De acordo com a lei de 25 de Abril foram-lheretribuídas as funções eclesiásticas, acabando a situação com o código de 1842.

Com o Código Administrativo aprovado em 1878 ficou definitivamente estabelecido a existência deuma estrutura de poder abaixo do município, fazendo-a coincidir com a área da circunscrição religiosa,daí ficar conhecida como paróquia civil. Com a lei nº.621 de 23 de Junho de 1916 passou a designar-se defreguesia. Daqui resulta a confusão, que é comum estabelecer-se entre a freguesia como circunscriçãoreligiosa e como jurisdição religiosa.

A freguesia, tal como hoje a conhecemos, uma vez que se consolidou a designação de paróquia paraa estrutura religiosa, surge apenas com a nomenclatura actual em 1878. Perante a situação não é fácilencontrar uma data individualizada para a evocação de cada uma das freguesias, que surgiram comoresultado da reforma administrativa de 1878.

Tenha-se em conta que a actual freguesia conta desde os anos sessenta do século XX com quatroparóquias [S. Martinho, Santa Rita, Nazaré e N. Srª da Vitória). Demonstrativo de que a indicação deparóquia ou freguesia anterior à revolução liberal não pode ser ligada à situação actual.

No quadro da administração temos a salientar a criação em 1991 da Casa do Povo, que tem umpapel significativo na animação cultural da freguesia.

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Baía do Funchal, gravura do século XIX, vendo-se em fundo S. Martinho.

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A PARÓQUIA

O local está ligado aos primórdios do povoamento da ilha, pertenceu desde o início à primitivaparóquia de Santa Maria do Calhau e da Sé desde 1508. Em 1566 com a criação da paróquia de S. Pedroficou dependendo desta, para depois se autonomizar em 1579 com o alvará régio do Cardeal D. Henrique,de 3 de Março.

Em 1960 por iniciativa de D. Frei David de Sousa, procedeu-se a uma profunda reformulação dasparóquias madeirenses, surgindo assim, a partir de 1 de Janeiro de 1960, as paróquias da Nazaré e Vitória.A primeira teve sede provisória na capela de N. S. da Nazaré e hoje está assente num hodierno templo,inaugurado em 2002, enquanto a segunda teve sede provisória na capela de N. S. da Vitória, passandodepois para o novo templo da autoria do arquitecto Freitas Leal.

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A FREGUESIA

A designação de freguesia na estrutura administrativa surgiu com a reforma administrativaoitocentista. Quase sempre coincidia com as delimitações da paróquia, mas circunstancias diversasconduziram a alterações.

Hoje é delimitada a Norte pela de Santo António a Este pelas de São Pedro e Sé, a Oeste peloconcelho de Câmara de Lobos e a Sul pelo oceano Atlântico. A descrição pormenorizada dos limites éapresentada pelo Padre Eduardo Pereira5: Começa, a Norte, no cruzamento do Beco dos Ausentes com o

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5. Eduardo Pereira, Ilhas de Zargo, vol. II, 1989, p.328.

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caminho do Pilar, seguindo pelo eixo deste, pelodo caminho do Poço Barral e pelo do caminho dasVoltas até à Ribeira dos Socorridos; Sul, o mar;Leste, do Pilar e do eixo deste em direcção aocruzamento com o Beco dos Ausentes; Oeste,desde a foz da Ribeira dos Socorridos,seguindo a linha de água desta até ocruzamento com o caminho do Pinheirodas Voltas.”

Os Sítios

A freguesia de S. Martinhointegra-se no concelho do Funchal ecompreende hoje uma área de 782 ha,onde temos os sítios de Ajuda, Areeiro, Igreja, Nazaré,Pico de S. Martinho, Piornais, Quebradas, Virtudes, Amparo, CasaBranca, Lombada, Pico do Funcho, Pilar, Poço Barral, Vargem eVitória.

A forma de aparecimento e valoração destas localidades tem a ver coma existência de uma capela ou um núcleo populacional activo. Tudo istoactuava como mecanismo de atracão de novas populações e a segurança dosque já aí residiam. A localização da área urbanizada do sítio resulta com factoresdiversos, podendo derivar da proximidade de um caminho, de ser uma área que domina todo o espaço.

Por vezes isso acontece por decisão política. É o caso do sitio da Nazaré, que por força da fixação deum bairro social acabou por assumir a dimensão que hoje tem como um dos sítios populosos em toda afreguesia. Algo semelhante terá acontecido na Ajuda e Casa Branca, onde as condições especiais da orlamarítima favoreceram um investimento privado que conduziu à concentração de serviços hoteleiros e aconstrução para habitação.

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Sítio do Pico do Funcho Sítio dos Piornais Sítio da Ajuda

Sítio da Casa Branca Sítio da Lombada Sítio da Nazaré

Sítio da Vitória Sítio das Quebradas Sítio das Virtudes

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Sítio da Igreja Sítio do Pico de S. Martinho Sítio do Areeiro

Sítio do Poço Barral

Sítio do Amparo

Mapa dos Sítios

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A HERÁLDICA

O brazão de armas foi aprovado em sessão ordinária da Assembleia da freguesia a 30 de Setembrode 1999, sendo o edital publicado no Diário da República por edital de 12 de Outubro de 19996.

DDEESSCCRRIIÇÇÃÃOO HHEERRÁÁLLDDIICCAA

ARMAS - Escudo de púrpura, monte de ouro entre dois pés de cana de açúcar de prata, arrancadosdo mesmo e movente de um pé de ondado de prata e verde; em chefe, ganso de prata, animado, bicadoe sancado de vermelho. Coroa mural de prata de três torres. Listel branco com a legenda a negro: “ S.MARTINHO - FUNCHAL “.

BANDEIRA - De branco, cordões e borlas de prata e púrpura. Haste e lança de ouro.

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6. O projecto foi concebido por Gastão Jardim, Helena Sousa e Jorge Valdemar Guerra.

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A família Visconde de Carvalhal em piquenique. Pintura a óleo 1865. Quinta das Cruzes Museu. Ao fundo, a freguesia de S. Martinho.

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O MEIO NATURAL

No perímetro da freguesia temos várias elevações conhecidas como picos. Temos assim o Pico daCruz, do Funcho, da Arruda, da Igreja, e da Lombada. É de notar que na toponímia da freguesiasubsistem vestígios dos motivos que estiveram na origem do nome do Funchal, o que evidencia que ofuncho(Foeniculum Vulgare) existia aí em abundância. Noutros o apelo à natureza continua a vingar. Aabundância de Arruda(Ruta Chalepensis) vai dar origem ao pico com o mesmo nome. Já na designaçãodos sítios vamos encontrar outra planta, o piorno(Genista Maderensis e G. Virgata) a dar nome aosPiornais e a uma levada.

De entre estas elevações se destaca o Pico da Cruz. O local assume um papel fundamental nasociedade madeirense. Primeiro foi posto semafórico, depois se instalaram aí antenas de comunicações,que ainda persistem. Foi também conhecido como Pico do Telégrafo. As encostas que, nos últimos anos,têm sido ocupadas com habitações, começaram por ter alguma utilidade, surgindo a leste em meados doséculo XIX um campo de jogos e corridas do Excelsior Club da Madeira e, na vertente norte, umacarreira de tiro.

Uma das principais utilidades deste sistema de postos fronteiriços foi no aviso da presença decorsários, prontos a assaltar barcos e povoações. Desde o início da ocupação da ilha que os seus habitantesestiveram expostos ao livre arbítrio de piratas e corsários. Eles frequentavam com assiduidade o mar

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Pico da Lombada Pico do Funcho

Pico da Arruda Pico da Cruz

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Pico da Igreja

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madeirense e apresentavam-se como uma permanente ameaça para as populações costeiras. Ficaramcélebres os assaltos dos franceses em 1566 ao Funchal e dos argelinos em 1616 ao Porto Santo. Perante estapermanente ameaça foi necessário estabelecer medidas de vigilância e protecção. No primeiro casodestacam-se as vigias colocadas em locais estratégicos ao longo da vertente sul da Madeira, ondepermaneciam turnos de guarda. A presença de um navio estranho, indiciador de um pirata ou corsário, erade imediato avisado aos comandantes das ordenanças que de imediato reuniam as hostes por meio de umsinal sonoro: o repicar dos sinos da igreja ou o toque do tambor. Todavia as demais populações costeirasprecisavam também de ser avisados de modo a poderem preparar a defesa. Para isso definiu-se em toda ailha um sistema de comunicação por sinais luminosos (os fachos), que circulavam ao longo da orla costeira,por intermédio das elevações que propiciavam este contacto. A rede terminava no Pico da Cruz, em S.Martinho, que foi conhecido como o Pico Telégrafo. Daí resultou a designação de Pico do Facho àselevações onde se faziam os sinais luminosos. Com este nome surgem-nos dois picos no Porto Santo e naMadeira (em Machico). A forma de organização desta comunicação por sinais ópticos é-nos apresentadaem 1805 pelo governador D. Diogo Pereira Forjaz Coutinho num regimento que estabeleceu para tal fim.

A freguesia apresenta uma importante área de costa entre o Ribeiro Seco e a Ribeira dos Socorridos,donde podemos salientar vários acidentes geográficos e os ilhéus do Gorgulho e da Praia, as Pontas daCruz e Gorda e a Praia Formosa. A designação toponímica de alguns acidentes costeiros remonta aotempo de João Gonçalves Zarco, aquando da primeira viagem de reconhecimento. Recorda GasparFrutuoso que após a pernoita na baía do Funchal os navegadores avançaram até uma ponta, que ficoucom o nome de Ponta da Cruz, por o capitão ter ordenado que pusessem nela uma cruz. Daí avistaram“uma formosa praia que, pela formusura e assento dela, lhe pôs o nome a Praia Formosa”.7 Finalmentetemos a Ribeira dos Socorridos, cujo nome resulta de um episódio sucedido com uns mancebos queacompanhavam Zarco. Conta-se que os mesmos pretendiam passar a ribeira a pé mas a força da suacorrenteza os levava ao mar, sendo prontamente “os mancebos acorridos e livres de perigo da água… edaqui ficou o nome à ribeira, que hoje, este dia, se chama Ribeira doa Acorridos, que peor pareceuáqueles mancebos de perto do que lhe pareceu primeiro de longe.”

As possibilidades de acesso ao mar transformaram a orla costeira da freguesia numa estância balnear

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7. Gaspar Frutuoso, Livro Segundo das Saudades da Terra, Funchal, 1978, p.48.

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Praia Formosa

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por excelência, mas também de serviço de acesso ao mar através de cais, como foi o caso do Reids, Pires,Wilson e Cory. Deste modo podemos encontrar nesta área uma aposta diferenciada em complexosbalneares: Lido, Ponta Gorda, Praia Formosa, Poças do Governador, Areeiro, Nova e Namorados

Recorde-se, a propósito, que o mar é hoje incontestavelmente um recurso importante. A presença écada vez mais evidente no quotidiano, como via de comunicação, espaço de lazer e recurso económico.Se nos reportarmos ao passado mais evidente se torna a presença para espaços como as ilhas. Até aoadvento dos meios aéreos o mar foi para os ilhéus aquilo que os aproximava ou afastava de outras ilhas eespaços continentais. O mar foi e continua a ser a via fundamental de comunicação. Daí advém que estápreso à vista do ilhéu e é uma presença permanente no quotidiano. A ausência gera saudade. O ilhéu pormuito tempo teve no mar o cordão umbilical. Perante isto o ilhéu olha o mar com um misto de devoçãoe medo.

Um dos principais temores tinha a ver com a presença quase assídua de piratas e corsários queobrigavam a redobrados cuidados de defesa da costa com a construção de fortificações e oestabelecimento de um serviço de vigias. Na costa que domina a freguesia de S. Martinho encontramosdiversas áreas vulneráveis que tiveram que ser resguardadas. Todavia tardou muito tempo até que se tivesseem atenção este cuidado. Foi necessária a vivência do assalto francês à cidade do Funchal em 1566, cujodesembarque aconteceu na Praia Formosa, para que se tivesse em conta isso. Ao longo da costa temos trêsáreas bastante vulneráveis que careceram de defesas: as praias do Gorgulho, Formosa e a Ribeira dosSocorridos.

Em toda a costa destaca-se, desde os primórdios da ocupação da ilha, a chamada Praia Formosa. Onome não engana. Era uma ampla praia que de imediato despertou a atenção dos povoadores, merecendoo nome, segundo Gaspar Frutuoso, “pela formosa e asento dela” e “por não haver outra semelhante emtoda a ilha”8. Recorde-se que foi aqui que desembarcaram os corsários franceses quando em 3 de Outubrode 1566 se lançaram ao assalto da cidade, o que evidencia ter sido uma área vulnerável pouco cuidada emtermos de defesa9: E, como as naus passassem abaixo já dos ilhéus neste tempo e fossem de terra,suspeitando os da ilha o que podia ser, se foram, gente de cavalo e de pé, direitos à Praia Formosa, ondeviram perto da terra ancorar as naus, e, como já os soldados vinham em as lanchas às ilhargas das naus,

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8. Livro Segundo das Saudades da Terra, Ponta Delgada, 1979, pp.48, 109,117.9. Ibidem, 339, 353, 364.

Levantamento das Fortificações doséculo XIX. Planta: reduto da PraiaFormosa, Forte do Gorgulho, Forte

do Alorável.

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logo vieram a saltar em terra em o areal da Praia Formosa. Saídos os soldados, os capitães lhe deramordem que fossem saindo um ruim passo que tinham de subir; ali, subidos poucos e poucos, começaramde subir por uma das ladeiras daquele vale, que ali se faz; o Capitão-geral, vendo das naus ir gente decavalo e de pé, ali, sobre aquele vale, acabou mui depressa de lançar em terra o resto que ficava; os daterra não faziam mais que chegar ao cabo do vale e, como vissem os soldados franceses armados, setornavam a recollher para trás, dando recado uns aos outros.”10

10. Ibidem, p.339.

Levantamento dasFortificações do séculoXIX. Planta: forte doAlorável, Forte daEngenhoca; forte doGorgulho, vendo-se ocais Wilson.

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Levantamentodas Fortificações

do século XIX.Planta: Forte do

Gorgulho

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A Praia Formosa ficou para a História como o local de desembarque dos franceses em 1566. Porforça disso foi determinado pelo regimento de fortificação de 1572 a construção de uma muralhafortificada, que em finais do século XVIII foi alvo de melhoramentos, mas em princípios do século XIXapresentava-se da forma que descreve Paulo Dias Almeida11: Precisa de necessidade ser fortificada, por sero melhor ponto de desembarque para atacar a cidade, sem correrem o risco os navios…

A Praia Formosa serviu também de Lazareto. Assim, a partir de 1816 a inexistência destasinstalações no Funchal obrigou o Governador a estabelecer a quarentena, dos navios oriundos de portosinfestados, defronte da mesma praia e dos indivíduos numa casa conhecida como Engenhoca, certamenteo forte da Engenhoca.

Contornando a costa em direcção a Câmara de Lobos, a primeira fortificação que se encontravaera o Forte do Alorável, nas proximidades da Quinta Calaça. Mais à frente estava o Forte do Gorgulho,que defendia a praia com o mesmo nome. Ainda restam alguns vestígios que foram restaurados pelaCâmara. Segue-se depois o Forte da Ponta da Cruz, Areeiro e, mais adiante as defesas da Praia Formosa,constituídas pelo Forte da Engenhoca, do lado esquerdo, e o reduto ou bateria. Depois só na foz daRibeira dos Socorridos voltamos a encontrar novas fortificações a defender a praia. São duas construçõesde ambos os lados da ribeira. Do lado direito tínhamos o reduto do Pastel, enquanto na margem esquerdaficava o Forte de Nossa Senhora da Vitória, a mais antiga fortificação da freguesia construída em 1609.

Em momento algum este conjunto de fortificações se apresentou eficaz na defesa da costa. Era apenasuma forma disfarçada de dar a entender aos intrusos que havia uma defesa. No decurso do século XIX osrelatórios da Engenharia Militar assinalam precisamente isso, o que levou a que a quase totalidade fossevendido a famílias inglesas: Hinton e Blandy. Paulo Dias de Almeida12 assinala apenas o Forte do Gorgulhoe para a Praia Formosa refere a colocação de algumas peças de artilharia em 1818. Outros relatórios foramrevelando a inutilidade destas fortificações, o que levou o Estado a proceder à sua venda a particulares.

O sal de consumo corrente foi sempre de importação, mas a presença do mar levou a que se tentasseencontrar formas de abastecimento local. Assinala-se também uma experiência de extracção de sal naPraia Formosa, a partir do contrato exclusivo concedido em 1792 a Thomas Watts para a Fábrica dePescarias e Salinas. Embora não tivesse alcançado sucesso temos outra iniciativa da mesma índole na

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11. Rui Carita, Paulo Dias de Almeida e a Descrição da Ilha da Madeira, Funchal, 1982, p.9512. Cf. Rui Carita, Paulo Dias de Almeida e a Descrição da Ilha da Madeira, Funchal, 1982, p.95

Levantamento dasFortificações do séculoXIX. Planta: forte daPonta da Cruz, forte doGorgulho, forte da Ribeirados Socorridos.

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PraiaFormosa

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Ponta da Cruz em finais do século XIX.A pesca, ao contrário do que hoje acontece não era a actividade exclusiva de

alguns núcleos do sul, pois se alargava a toda a ilha. A afirmação levou à criação denúcleos piscatórios que se destacaram ao longo dos tempos, com maior evidência navertente sul. O desenvolvimento de algumas indústrias levou à valorização. A conservade peixes torna-se numa realidade nos primeiros anos do século XX, aparecendodiversas fábricas. Uma delas situava-se na Ponta da Cruz e foi fundada em 1909 porJoão A. Júdice Fialho (1909) para a conserva de atum em azeite. Depois tivemos em1928 a transferência do Paul do Mar para a Praia Formosa da fábrica de AntónioRodrigues Brás.

A partir daqui o pescado da ilha passou a ter dois destinos, o consumo público ea indústria de conservas, o que veio permitir um aumento das capturas. Até então oúnico destino era o consumo público sob a forma de fresco ou salgado. Tenha-se emconta o interesse nas salinas em Câmara de Lobos e Praia Formosa de que existemtestemunhos desde o século XVIII, sem nunca adquirirem grande dimensão e interesse.

A ponta da Cruz terá sido baptizada por João Gonçalves Zarco, no processo de reconhecimento dailha, por ter aí colocado uma cruz. Todavia, o Padre Eduardo Pereira anota outra origem, dizendo que selevanta “como pedestal duma cruz de ferro que a encima a recordar os naufrágios antigos de barcoscosteiros ali ocorridos e as numerosas mortes desses sinistros.”13 Aí tivemos um pequeno reduto e em 1912instalou-se uma fábrica de conservas de peixe para exportação. Também no ilhéu do Gorgulho instalou-se um pequeno forte, mas o mais importante do espaço foi a valorização balnear com a construção dapiscina, pela câmara municipal, em 1932. Hoje, toda a área até à Praia Formosa adquiriu importânciapela construção hoteleira, tornando-se na área balnear por excelência da cidade.

A valorização da área balnear era já uma realidade em princípios do século XX, tendo-se fundadoo Clube Naval do Funchal, que teve grande impulso passados sete anos por iniciativa do Visconde daRibeira Brava.

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13. Eduardo Pereira, Ilhas de Zargo, vol.I, 1989, 125.

Pescadores. Gravura do século XIX

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Recorde-se ainda que esta área foi servida por diversos cais de apoio à navegação costeira, aosdepósitos de carvão e estaleiros de companhias inglesas. Tivemos assim os cais Reid, Pires, Wilson e Cory.Destes o mais conhecido foi o Reid, que durante muito tempo serviu para o embarque e desembarque dosturistas do Hotel Reids.

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A importância do carvão no desenvolvimento da máquina a vapor e a afirmação do Funchal comoentreposto necessário ao abastecimento das embarcações e funcionamento dos engenhos de açúcar,obrigaram à montagem de infra-estruturas de apoio. Surgiram assim os depósitos de carvão, de que omais conhecido veio dar nome ao actual cais do carvão, que era propriedade da companhia Wilson & CoLtda, onde a Câmara em 2004 instalou o Aquário e os serviços da Estação de Biologia Marinha.

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Cais do Carvão

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A ÁGUA

A freguesia de S. Martinho pelo facto de ser delimitada por duas correntes de água (Ribeira dosSocorridos e Ribeiro Seco) apresenta boas condições ao desenvolvimento do sistema de regadio atravésdas levadas. A Ribeira dos Socorridos irá servir desde o século XVI de madre de todas as levadas.

As condições geo-climáticas da ilha fizeram que a agricultura fosse de regadio e tornaram todo otrabalho agrícola e industrial extremamente penoso. A solicitação de mão-de-obra foi maior que emqualquer outro sítio. Antes de lançar as culturas à terra os primeiros habitantes tiveram de abrir clareirase traçar os poios, encosta acima. Depois, foi a dificuldade no traçar das levadas. Tudo isto foi trabalhoduro só possível com uma forte presença de escravos.

Nos séculos XV a XVII a água corria nas ribeiras, em abundância na vertente norte. No sul oscaudais eram, na época estival, quase todos desviados para as levadas. A maior concentração populacionale aposta agrícola assim o definiram. Ao homem estava atribuída a dura tarefa de desviar a água do curso

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lavadeira. Gravura do século XIX

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das ribeiras fazendo com que movessem engenhos, moinhos e irrigar os canaviais e demais culturas. Paraisso, traçaram km de canais para a condução, que ficaram conhecidos, na ilha, como levadas. O sistemapermitiu um maior aproveitamento dos socalcos e o alívio do homem em algumas tarefas, como sejam, omoer do grão e da cana e o serrar das madeiras. Moinhos, engenhos e serras convivem pacificamente,usufruindo, da água que corre na mesma levada. A orografia da ilha, ao mesmo tempo, que dificultava acondução da água favorecia o aproveitamento, pela força motriz atribuída pelos declives acentuados.

Aguas e nascentes surgem nos primeiros documentos emanados para a ilha, como domínio público.Todavia, a água foi um problema ao longo da História da ilha, pois desde o começo surgiramaçambarcadores a reivindicar para si a posse exclusiva. Nas áreas de maior concentração populacional ede intensivo aproveitamento do solo, como foi o caso do Funchal, a água das ribeiras não foi suficientepara suprir as solicitações dos vizinhos.

Com D. João II foram definidos os direitos sobre a água, que perduraram até ao século XIX. Apartir daqui a água é propriedade pública, sendo o usufruto para os que possuíssem terras e delanecessitassem. Todavia, desde finais do século quinze, a água passou a ser negociada a exemplo do quesucedia com a terra. É com o regimento de D. Sebastião em 1562 que se procede a uma alteração nosistema primitivo. As águas podem ser vendidas ou arrendadas, o que permitiu aumentar o fosso entre apropriedade da terra e da água.

O documento de 1493 determina de forma evidente a importância assumida pelas levadas nosistema de distribuição de águas. As levadas podem ser públicas ou privadas. As últimas eram de iniciativaparticular precisando de uma autorização.

Outro problema, não menos importante, foi o da partição da água. Desde o início que a coroarecomendara todo o cuidado nisso, ficando com tal encargo o almoxarife, auxiliado por dois homenseleitos para este fim. A manutenção foi outra preocupação a que o capitão deveria tomar conta, conformeordem de D. Catarina de 1562. Mais se recomendava que aqueles que não tivessem necessidade das águasque dispunham não as podiam arrendar a ninguém a não ser para se regar os canaviais. Apenas, os quehaviam tirado levadas próprias podiam dar ou vender as águas. A coroa apoiou a reparação das levadasda Ribeira dos Socorridos, dos Piornais e Castelejo com o intuito de incrementar de novo a cultura doscanaviais, que tinham preferência na nova redistribuição das águas.

A levada dos Piornais, da iniciativa de João Dória Velosa, foi traçada a 230 metros de altitude, na

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Lavadouro das Quebradas

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Fajã do Poio, margem esquerda da Ribeira dos Socorridos, e prolonga-se até ao espaço urbano, bifurcando-se na zona dos Barreiros. Esta, a exemplo de muitas outras levadas assumiu diversas funções para além dacondução da água para o regadio das terras baixas da zona que servia. A água não se limitava ao uso doregadio, pois foi também servia para mover moinhos de cereais e uso doméstico até ao desenvolvimento dosistema de canalização de água ao domicílio. Acresce ainda a função de apoio as lavadeiras, pois tinhalavadouros nas Quebradas, Areeiro, Piornais, Casa Branca, Ajuda, Barreiros e Ilhéus, que noutros tempostinham aqui o seu ganha-pão a lavar as roupas da localidade e da cidade. O percurso era um dos meiospedonais mais usados para a circulação de pessoas e mercadorias. Em 1898 foi feito um acordo entre estalevada e a nova de Câmara de Lobos, no sentido da repartição da água da Ribeira dos Socorridos.Na listados heréus constavam personalidades de relevo na vida política local e nacional.

Na Ribeira dos Socorridos temos outras levadas de iniciativa particular: a do engenho de Luís deNoronha que lhe custou 20 000 cruzados14; a de António Correia para as terras da Torrinha15. GasparFrutuoso descreve uma das levadas:

“Perto da Fonte, onde nasce a agoa desta ribeira dos Acorridos, se tirou a levada dellapara moer o engenho de Luiz de Noronha; e dizem que do logar donde a começaram atirar até donde se começão a regar os canaviaes ha bem quatro legoas por se tirar de tãogrande fundura da ribeira em voltas que para chegar acima à superfície da terra e começara caminhar atravessando lombos, fazendas e grandes rochedos por cima pela serra poronde vai esta levada, tem de alto mais de seicentas braças; da qual altura, que he muitoíngreme, se tira a agoa em calle de páo em voltas até se pôr na terra feita, e sem falta custouchegar pola em tal logar passante de vinte mil cruzados, fora o muito mais que fez de custolevala dali quatro legoas, alem de muitas mortes de homens que trabalhavam nella emcestos amarrados com cordas penduradas pela rocha, como quem apanha urzela; porquehe tão alcantilada e íngreme a rocha em muitas partes que não se faziam nem se podiamfazer d’outra maneira estancias para assentar as calles sem passar por estes perigos. Tem

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14. Em 12 de Junho de 1515 é referenciada a levada de Manuel de Noronha na Ribeira dos Socorridos, ARM, RGCMF, t.I, f l.348-349, in AHM, vol. XIX,p. 20.

15. 13 de Janeiro de 1493, AHM, XVI, n1 266, p. 277.

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duzentos e oitenta lanços por onde vai esta agoa que postos enfiados hum diante do outroterão hum quarto de legoa de comprido; são de taboado de til, pella mayor parte tem cadataboa vinte palmos de comprido e dous de largo; e depois de assentadas estas calles narocha, fazem o caminho por dentro dellas os levadeiros que continuamente tem cuidado deas remendar e concertar, alimpadas também da sugidade e pedras que acontece cahirnellas, e fazer outras cousas necessarias a levada, pelo que tem grossos soldos, por teremofficio de tão grande trabalho e tanto perigo.

Nesta rocha está huma furna grande que serve de casa para os levadeiros, e paraguardar nela munições necessárias de enchadas, alviões, barras, picões, marrões e outrasferramentas; e nella se metem cada anno dez e doze pipas de vinho para os que trabalhãona levada e outras pessoas que a vão ajudar a reformar, quando quebrão alguns lanços decalles; e he cousa monstruosa a quem vê isto com seus olhos a estranha e aventureirainvenção que se teve para se tirar dali esta agua”16.

O plano de construção de levadas da ilha não ficou concluído no século XVII, pois foi apenasadiado pela afirmação da vinha, uma cultura de sequeiro, e, por isso mesmo, quando a cana retornou àilha, no século XIX, de novo se pôs a questão das levadas para irrigar os canaviais e mover os engenhos.A água adquire de novo uma dimensão económica importante, levando as autoridades a intervir nosentido da regulamentação e distribuição do uso da água e do traçar de novas levadas de forma a alargara área de regadio e, por consequência, dos canaviais. É de salientar que o regime jurídico das águas,estabelecido em 1493 por D. João II, perdurou até 1867, altura em que foi aprovado um novo CódigoCivil. A partir de então água e terra são duas realidades distintas, vindo a agravar a situação fundiária,por ser favorável à especulação, realidade que foi atacada por leis de 1914 e 1931. Seis anos após o governoavançou com uma política específica da água que chegou à Madeira em 1939. A criação da Comissão

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16. Ob. cit., pp.120-121.17. Manuel R. Amaro da COSTA, “O aproveitamento da água na ilha da Madeira”, in Das artes e da História da Madeira, nº.4/5, 11, 1950-1952;

Aproveitamentos hidraulicos da ilha da Madeira 1944-1969, Funchal, 1969. Em 1949 Orlando RIBEIRO (A ilha da Madeira até meados do século XX.Estudo geográfico, Lisboa, 1985) refere que existia na ilha duzentas levadas com cerca de mil km de comprimento. Foi após essa data que se fizeramsentir os resultados do plano de aproveitamentos hidráulicos, que fez aumentar a extensão das levadas em mais de trezentos Km e a área irrigada em13900 Ha.

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Administrativa dos Aproveitamentos Hidráulicos da Madeira (1943) foi o ponto de partida para amudança na política da água e áreas de regadio na ilha17.

As levadas são ainda hoje uma constante na paisagem madeirense, transformando-se em locaisaprazíveis para os passeios a pé18. Desde muito cedo, estas construções despertaram a atenção dosvisitantes, que não se cansam em louvar o trabalho hercúleo do madeirense na construção19.

LLeevvaaddaass SS.. MMaarrttiinnhhoo

A utilização da força motriz da água está patente no número de moinhos para moer grão, que em1862 eram dez. Acresce ainda o número de moleiros, que deve ser indicativo do número de moagens:

Ribeira dos Socorridos 5Quebradas 1Ribeiro Seco 5Azinhaga 1Igreja 5Pico S. Martinho 2Laranjal 1Salão 1Total 19

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18. Confronte-se Raimundo QUINTAL, “Veredas e Levadas”, in Diário de Notícias, Funchal, 5, 19 de Março, 14 e 28 de Maio, 23 de Julho, 1 e 29 deOutubro, 12 de Novembro, 24 de Dezembro de 1989, 4 de Fevereiro, 18 de Março e 10 de Junho de 1990.

19. Tenha-se em atenção os seguintes testemunhos: Isabella de FRANÇA, Jornal de uma visita à Madeira e a Portugal 1853-1854, Funchal, 1970, pp.107-108; José Maria Ferreira de CASTRO, Eternidade, Lisboa, s.d., cap. XI.

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O HOMEM E O ESPAÇO

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Camponeses. Gravura do século XIX

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O HOMEM E O ESPAÇO

O espaço densamente arborizado da ilha foi dando lugar a uma nova realidade, onde medravamculturas, junto com casas de moradia e infra-estruturas de apoio. Num ápice tudo se transformou pelaacção do Homem. O fogo abriu caminho e a enxada e força braçal do homem domesticaram o solo.Paulatinamente a floresta desapareceu dando lugar ao domínio das planuras e picos que se protegem nafrente da cordilheira montanhosa da parte central da ilha.

Passados cinco séculos a paisagem, fruto de insistentes transformações, é outra. As culturasdesapareceram, ficando apenas a dominar os acidentes geográficos. O solo foi ocupado pelo casario, cujacoloração das paredes de um novo visual ao espaço quando observado do mar. A marca do homem estácada vez mais presente na paisagem. A grande transformação é recente e resulta da forma como aperiferia funchalense inchou por força do êxodo rural. O turismo gerou a necessidade de mão-de-obra efez com que o entorno da cidade fosse aumentando como espaço dormitório. O resultado disso estápresente nas freguesias limítrofes da urbe, como S. Martinho. Primeiro surgiu o casario isolado,secundado pelos bairros sociais, os blocos de apartamentos residenciais populares e de luxo.

Baia do Funchal, Gravura do século XIX

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A OCUPAÇÃO E POVOAMENTO

De acordo com as crónicas quatrocentistas e quinhentistas, o processo, que decorreu a partir de1418, foi faseado. Zurara refere quatro expedições à ilha antes que o infante ordenasse o envio dosprimeiros colonos e clérigos para o arranque da ocupação e aproveitamento económico.

Para os cronistas tudo começou no Verão de 1420. O monarca ordenou o envio de uma expediçãocomandada por João Gonçalves Zarco para dar início à ocupação da ilha. Acompanhavam-no TristãoVaz Teixeira, Bartolomeu Perestrelo, alguns homiziados que “queriam buscar vida e ventura forammuitos, os mais deles do Algarve”, segundo afirmam Jerónimo Dias Leite e Gaspar Frutuoso. Com adistribuição das terras pelos três povoadores, as ilhas do Porto Santo e Madeira ficaram divididas em trêscapitanias. O Porto Santo por ser ilha pequena ficou entregue na totalidade a Bartolomeu Perestrelo,enquanto a Madeira foi separada em duas por uma separação em linha diagonal entre a Ponta da Oliveirae a do Tristão. A vertente meridional, dominada pelo Funchal ficou quase toda em poder de JoãoGonçalves Zarco, enquanto a restante área dominada pela costa norte ficou para Tristão Vaz.

A primeira missão dos capitães foi proceder à divisão de terras, como testemunha FranciscoAlcoforado, ao referir que João Gonçalves Zarco, após a segunda viagem, se empenhou em tal tarefa.Uma das prerrogativas desta função era a possibilidade de reservar para si e familiares algumas dassesmarias.

De entre o grupo de povoadores merecem referência aos trinta e seis homens da casa do mesmo

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Representação do descobrimento da ilha

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EstradaMonumental,

junto da Quinta da Ajuda.

PerestrellosPhotographos,

Museu deFotografia

Vicentes.

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infante, na sua maioria escudeiros ou criados, que adquiriram uma posição relevante na estruturaadministrativa e fundiária. Eles pertenciam ao numeroso grupo de filhos-segundos do reino ou à pequenaaristocracia, todos à procura de títulos e bens fundiários. Isto poderá estar na origem da atitude de JoãoGonçalves Zarco ao solicitar ao rei quatro varões de qualidade para casarem com as suas filhas. O reiacedeu com o envio de Garcia Homem de Sousa, Diogo Afonso de Aguiar e Martim Mendes deVasconcelos. O primeiro fixou-se em Santo Amaro, onde teve terras e construiu casa com torre acasteladade que ainda hoje persistem vestígios. O segundo teve possivelmente assentamento no que se diz hojeLombo dos Aguiares e o último nas margens da Ribeira dos Socorridos. A presença destas personalidadese o vínculo familiar com a família do capitão do Funchal, através do casamento com as suas filhas, foramimportantes para a valorização do espaço em termos agrícolas e da fixação de novos colonos.

Martim Mendes de Vasconcelos casou com Helena Gonçalves, a filha mais velha de João GonçalvesZarco, fixou-se nas margens da Ribeira dos Socorridos onde construiu aposentos, capela e engenho. Àentrada da igreja do Convento de Santa Clara é possível encontrar o seu túmulo, erradamente atribuídoa Gonçalves Zarco.

Para além destes podemos juntar outros mais, que de forma anónima deixaram as suas marcas nosolo da freguesia, sem que ficasse rastro da presença na documentação. Aos acima referenciados podemosainda associar os nomes de Martim Vaz de Cairos, Fernão e António Favila, João Calaça e João RoizNeto. O último teve sesmaria em S. Martinho mas veio a falecer no Funchal em 1531 dando o nome auma rua, que ainda hoje persiste com o seu nome.

A lista de povoadores é extensa mas poucos deixaram de forma clara o nome expresso e escrito dequalquer forma na documentação. Dos que mais se evidenciaram nos primeiros séculos podemos destacaros seguintes:

Afonso AnesAntónio AguiarBaltasar GonçalvesDiogo GonçalvesFrancisco PiresFrancisco Vaz

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João Gonçalves Zarco.Gravura do século XIX

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Gaspar MartinsJoão Dória VelosaJoão Rodrigues Neto CalaçaManuel CorreiaManuel Martins GodinhoMartim AnesMartim Mendes de VasconcelosMartim Vaz de CairosMartinho GonçalvesPedro Alvares QueirósSebastião Rodrigues o velho

O povoamento da ilha, iniciado na década de 20 a partir dos núcleos do Funchal e Machico,alastrou rapidamente a toda a costa meridional, surgindo novos núcleos vizinhos ou afastados do Funchal.O progresso do movimento demográfico foi de encontro ao nível de desenvolvimento económico da ilhae reflecte-se na estrutura institucional. A criação de novos municípios, paróquias e a reforma do sistemaadministrativo e fiscal foram resultado disso. Como corolário tivemos ao nível religioso odesmembramento das iniciais paróquias e o aparecimento de novas.

O núcleo populacional que veio a dar origem à freguesia de S. Martinho anichou-se em torno dacapela mandada construir por Afonso Anes. O relacionamento com os Aguiares, através do seu casamentona Sé em 1580 com Isabel Gonçalves filha de Diogo Gonçalves, deverá estar também na origem daimportância que acabou por assumir no local.

S. Martinho, por força de todas as circunstâncias que acompanharam o início da fixação doscolonos, assumiu uma posição importante no processo histórico inicial. Importantes áreas para aagricultura, que deram lugar a searas, vinhedos, canaviais, atraíram a atenção de muitos que chegavam àilha. Por outro lado a proximidade do Funchal favoreceu a fixação de colonos. Os núcleos populacionaisforam-se anichando em torno das diversas capelas particulares construídas pelos principais proprietários.Na área da actual freguesia de S. Martinho tivemos diversas capelas na sua maioria construídas nodecurso do século XVII, o que atesta ter sido a centúria em causa um momento florescente para a

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localidade, que se reflectiu no crescimento demográfico. Em 1579, aquando da criação da paróquia, se refere que a mesma apresentava menos de 100

habitantes. Acresce ainda que no recenseamento dos fogos de 1598 não vem referida a freguesia. Todaviaa nova situação da freguesia terá sido favorável como se poderá verificar pelo movimento ascendente debaptismos e casamentos a partir da década de oitenta.

O maior incremento populacional acontecerá a partir do século XVII de forma que em 1721Henrique Henriques de Noronha assinala para aqui a existência de 720 almas e 165 casais20. É dereferenciar nesta centúria a forte emigração para o Brasil, sob orientação das autoridades em que tivemos16 casais da freguesia, totalizando 75 indivíduos21.

Ao entramos no século XIX o movimento é ascendente. Assim, de acordo com Paulo Dias deAlmeida22, em 1821 a freguesia apresentava-se com 2018 almas em 455 fogos. Os demais dados disponíveisevidenciam que a população foi em crescendo até a actualidade. Aliás, no século XX S. Martinho surgecomo a terceira freguesia, depois de Santa António e Santa Maria Maior.

AAnnoo SS.. MMaarrttiinnhhoo1811...............17581878 ..............41281920 ..............61981923..............72001930..............94391940 ...........11.6311950...........12.6601960...........12.4451970 ...........12.4151981 ...........13.5801991 ...........19.8282001 ..........20.364

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20 . Memorias Seculares e Eclesiasticas para a Composição da Historia da Diocesi do Funchal na ilha da Madeira,… Funchal, 1996, p.22421. Maria Licínia Fernandes dos Santos, Os Madeirenses na Colonização do Brasil, Funchal, 1999, 117.22. Rui Carita, Paulo Dias de Almeida e a Descrição da Ilha da Madeira, Funchal, 1982, p.97-98

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Bairros SociaisAjuda

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Bairros SociaisNazaré

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A situação demográfica das décadas de cinquenta a setenta é fruto da forte emigração que pautoua sociedade madeirense no post-guerra. Esta sangria populacional só foi travada na década de oitenta coma autonomia politica.

Hoje, mercê da criação de novos bairros sociais, a população da freguesia quase duplicou. Naverdade a freguesia de S. Martinho foi uma das áreas preferências de fixação de bairros residenciais noquadro da política de habitação social estabelecida pelo regime autonómico a partir de 1978, tendorecebido 1908 novas habitações, no período de 1982 a 2003.

Bairro Ano criação Nº fogosAjuda I....................................1982 ......................149Ajuda II ..................................1997 ..........................5Nazaré I ..................................1983 ......................205

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Bairros SociaisQuebradas

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Bairro Ano criação Nº fogosNazaré II.................................1984 ......................236Nazaré III ...............................1985 ......................346Nazaré IV-A............................1987 ......................158Nazaré IV-B............................1988 ......................346Nazaré V.................................1989 ......................389Nazaré VI ...............................2000 ........................30Nazaré VII..............................2001 ........................22Quebradas ..............................1987 ........................13Marcado Abastecedor II ........2003 ..........................9Total...................................................................1908

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Bairros SociaisMercado Abastecedor

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Ponte do Ribeiro SecoVicentes Photographos.

Museu de Fotografia Vicentes.

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TRANSPORTES: PONTES CAMINHOS E ESTRADAS.

A rede viária era fundamental na vida das diversas localidades no sentido de que as aproximava doscentros de decisão política, abria vias para a circulação de produtos e pessoas. Desde o início dopovoamento que as autoridades apostaram no estabelecimento de uma rede viária, considerada factor deprogresso social e económico, mas a configuração geográfica da ilha e o rigor dos Invernos não ofavoreciam. Desta forma a construção e manutenção da rede viária era algo custoso que requeria aparticipação de todos.

Uma das formas de manutenção dos caminhos municipais estava no imposto de trabalho ou rodade caminho. Assim, todo o chefe de família residente ou proprietário no concelho estava sujeito ao impostoque poderia ser pago em dinheiro ou em dias de trabalho devendo declará-lo. Neste último caso eraestabelecido um rol dos ditos que depois era entregue ao apontador ou aos fiscais nomeados em cadafreguesia ou casa para o efeito. Assim, em 1872 todos os indivíduos de 18 a 60 anos estavam obrigados àcontribuição de trabalho para obras de viação municipal de dois dias por cada membro da família ou seusdomésticos. Esta obrigação poderia ser remida em dinheiro, sendo o valor da jorna de 200 réis. Os diasde trabalho eram decididos pela vereação devendo ocorrer todos os inscritos, pois caso contráriosujeitavam-se ao pagamento coercivo em dinheiro.

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Hoje a freguesia se encontra bem servida de uma rede de transportes graças ao processo autonómicode finais do século XX. Desde muito cedo a freguesia foi favorecida com a construção de diversoscaminhos que favoreceram a ligação ao litoral ou à cidade. Um dos primeiros projecto temosdocumentado é o do caminho que ligava o Ribeiro Seco ao Avista Navios, Quebradas e a Torre emCâmara de Lobos. É da iniciativa de José Maria da Fonseca e foi executado em 1815 pela Junta Agrícola.Mas sem dúvida que o mais importante foi o da Estrada Monumental. Ainda hoje restam alguns vestígiosdo primitivo caminho.

O projecto da actual estrada Monumental foi concebido em 1835 pelo então Governador Luiz daSilva Mousinho de Albuquerque em homenagem a D. Pedro IV, mas foi o conselheiro José SilvestreRibeiro quem iniciou a obra em 1848 com a construção da Ponte do Ribeiro Seco. A ponte que se ergueusob a orientação de Tibério Augusto Blanc ficou concluída em 1849, prosseguindo com lentidão as obrasda estrada até à Ribeira dos Socorridos.

No século XX a presença do automóvel, que ocorre na ilha a partir de 1904, obrigou a maiorrapidez no avanço da rede viária à volta da ilha. Na verdade, desde os anos vinte colocou-se um novodesafio aos madeirenses, adequar as antigas estradas reais à circulação da nova invenção para os ilhéus,isto é o automóvel. O primeiro automóvel fez a aparição nas ruas do Funchal em 1904 e passados três anosjá a Empreza Madeirense de Automóveis inicia a importação.

A plena afirmação do automóvel obrigou a cuidados maiores na construção de novas estradas e namanutenção das existentes. A Estrada para Câmara de Lobos foi asfaltada em 1949, enquanto tivemos oaparecimento de novas vias secundárias, algumas delas dentro da área da freguesia. Sem dúvida o saltomais significativo aconteceu em finais do século XX com o programa viário estabelecido pelo GovernoRegional da Madeira que levou à construção de vias rápidas. Tudo começou com a Estrada da Liberdadeque Ligava a Cruz de Carvalho a Santa Rita e depois a via rápida até Câmara de Lobos em 2000.

O serviço de Transportes públicos começou na freguesia com a Empresa Automobilística de SãoMartinho, que funcionou até 1996 altura em que foi integrada na Empresa Horários do Funchal. Hoje oserviço de transportes públicos está a cargo da última empresa, que detém a exploração em todo oFunchal. Apenas a empresa Rodoeste Lda, surgida em 1967 da fusão de outras três que prestava o serviçode transporte colectivo entre o Funchal, Câmara de Lobos e toda a zona oeste da ilha, serve-se da viaexpresso e do tradicional percurso pela Estrada Monumental.

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A Via Rápida, vendo-se ao fundo a Igreja de S. MartinhoPonte da Ribeira dos Socorridos

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APROVEITAMENTO DOS RECURSOS

O facto dos europeus se depararem à chegada no século XV com um solo virgem fez com que facil-mente conseguissem transformá-lo de acordo com as suas necessidades, fruindo o máximo dos recursosdisponíveis. Para que isso pudesse acontecer foi necessário recorrer a técnicas e instrumentos usados naterra de origem dos colonos ou transplantados de outras regiões. A terra fértil deu cereais, fez crescer vin-hedos e canaviais, tal como uma diversidade de culturas com valor alimentar, trazidas da Europa, oudescobertas no Novo Mundo.

TTÉÉCCNNIICCAASS EE FFOONNTTEESS DDEE EENNEERRGGIIAA.. O aproveitamento económico da ilha implicava a disponibilidadede instrumentos e técnicas capazes de fazerem com que da terra brotassem as culturas. Estes forampreciosos auxiliares do homem que se aperfeiçoam de acordo com as necessidades, a disponibilidade demateriais, o engenho e arte. A agricultura implicava um nível elevado de conhecimento tecnológicoadequado às diversas tarefas de lavrar e plantar a terra, canalizar a água e transporte das riquezas delaextraídas.

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AA ÁÁGGUUAA EE AASS IINNDDÚÚSSTTRRIIAASS.. A água, mais do que a indispensável utilização no regadio, tinha na ilha umafunção industrial relevante. O declive das encostas, sobranceiras às ribeiras, aliado à habilidade dohomem na canalização pelas levadas, conduziu à grande aposta na força motriz: moinhos ou azenhas,engenhos e serras. O progresso das indústrias, açucareira e das madeiras deve-lhe muito.

A importância dos cereais na alimentação na dieta alimentar dos madeirenses desde a ocupação dailha conduziu à valorização dos meios de transformação em farinha. No arquipélago assinalam-se quatroprocessos distintos: os moinhos de mão, atafonas, azenhas e moinhos de vento. Aqui daremos o merecidodestaque às azenhas. Até 1821 os moinhos continuam a ser um privilégio exclusivo dos capitães dodonatário. Na verdade de acordo com as cartas de doação os moinhos ficavam em poder dos capitães quecobravam sobre todos os que aí moessem os cereais a maquia, isto é um alqueire em doze. Desde o iníciodo povoamento que estão documentadas as insistentes queixas dos moradores pelo mau funcionamentodestas infra-estruturas. Em 1461 era evidente a falta e má qualidade do serviço pelo que o senhorio, oInfante D. Fernando, determinou o melhor cuidado neste serviço. Esta situação deverá ter perdurado até1821, altura em que se abriu à iniciativa particular a construção de novos moinhos. No século dezanovesurgiram algumas unidades industriais motorizadas e depois o advento e a expansão da energia eléctricaa partir dos anos quarenta conduziu à electrificação de muitas unidades. Aliás, em princípios do século éevidente uma tendência para a centralização da indústria de moagem nas unidades que souberam inovar.Em S. Martinho tivemos vários moinhos, como já referios atrás.

OOSS EENNGGEENNHHOOSS.. As técnicas de cultivo e transformação da cana atravessaram o Atlântico. Na Madeira ascondições geo-hidrográficas foram propícias à generalização dos engen-hos de água, de que os madeiren-ses foram exímios criadores. O primeiro foi paten-teado em 1452 por Diogo de Teive, o que levou algunsa apontarem este como o primeiro engenho de açúcar movido a água.

A animação sócio-económica gerada pelo açúcar foi dominada pelo engenho, mas isto nãosignificava que a existência de canaviais fosse sempre sinónimo da sua presença. No estimo da produçãoda capitania do Funchal para o ano de 1494 são referenciados apenas 14 engenhos para um total de 209usufrutuários, dispondo de 431 canaviais23. Por outro lado temos casos de alienação destes sem qualquer

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23 . V. RAU ., ob. cit.

Sistema de engenho da Companhia Five-Lille.Século XIX

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relação com os canaviais. Não existem dados exactos sobre os engenhos industriais movidos pela forçamotriz da água. A primeira informação possível surge no estimo de 149424 em que são mencionadosdezasseis. Alguns destes proprietários tinham os canaviais em S. Martinho, uma das áreas privilegiadas da

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24. Virgínia RAU e Jorge de MACEDO, O Açúcar de Madeira nos fins do século XV. Problemas de Produção e Comércio, Funchal, 1962.

Engenho.Mecanismo de

moenda: mó doséculo XVII

e sistemas do século XIX

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cultura no Funchal. As propriedades e os engenhos referenciados no estimo de 1499 não estãodevidamente localizados geograficamente mas podemos assinalar alguns nomes, como Afonso Anes e aviúva de Diogo Afonso Aguiar. Mas de certeza S. Martinho tinha umpeso significativo.

Mais tarde, em finais do século XVI, surge nova relação dos engenhos, apresentada por GasparFrutuoso25. No total, são 34 engenhos em toda a ilha, numa extensa área da vertente sul, que vai desde oPorto da Cruz à Calheta, sendo referenciados alguns para S. Martinho. Na Ribeira dos Socorridossituavam-se os de Manuel dá My e António Mendes.

Nos inícios do século XVII funcionavam poucos engenhos. O bicho da cana havia reduzidodrasticamente a produção e área de canaviais pelo que muitos haviam sido abandonados. Ademais, doabandono dos engenhos registava-se o das levadas como sucedia com a do Pico do Cardo e Castelejo emS. Martinho que há trinta anos não era tirada26. A coroa, para repor a cultura, preparou um plano derecuperação dos engenhos, com empréstimos e a isenção do pagamento do quinto. Isto aconteceu poralvará de 1 de Junho de 1649, ficando os proprietários de engenho com direito ao empréstimo de 400cruzados e o não pagamento do quarto por cinco anos a metade do valor por dez anos.27. A política deincentivo à cultura chegava até à coação dos proprietários no sentido da reparação e posta emfuncionamento dos engenhos. Foi isso que aconteceu a D. Maria da Câmara.28

Nos séculos dezassete e dezoito o número de engenhos era reduzido. Para os inícios do século XVII,

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25. Ob. cit., pp. 99-135.26 ANTT, PJRFF, Nº.396, fl.7vº, 5 de Dezembro de 1651.27. ARM, RGCMF, t. VI, fls.99vº-100; ANTT, PJRFF, nº.396, fl.6vº, 25 de Maio de 1651.28 . ANTT, PJRFF, nº.980, fls. 314vº-316, 1 de Julho de 1649; ibidem, nº.396, fls. 6-6vo, 26 de Maio de 1651; ANTT, PJRFF, nº.980, fls. 465vº-466, 27 de

Setembro de 1652

Engenho. Mecanismo demoenda sistemas do séculoXIX.

Transporte da cana no Calhau.

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mais propriamente em 1602, Pyrard de Laval refere a existência de 7 a 8 engenhos em laboração. Adocumentação informa-nos sobre a existência de alguns:

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Transporte da cana em corsano Ribeiro Seco, engenho.

Mecanismo de moenda sistemas do século XIX

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DDAATTAA PPRROOPPRRIIEETTÁÁRRIIOO LLOOCCAALL1644 Gaspar Betencourt de Sá Rª Socorridos1665 Capt. Pinto da Silva Piornais1705 Capt. António Abreu C.Lobos1744-50 João J. Betencourt de S. Machado1760 João J. Vasconcelos de Betencourt1780 D. Madalena Guiomar de Sá Vilhena

Na segunda metade do século XIX a crise do vinho obrigou a recorrer à cana como alternativa deprodução agrícola. Hoje a cultura da cana sacarina na ilha é herdeira desta fase. Sucede que, a partir de1985, com o encerramento do engenho do Hinton, a Madeira deixou de produzir açúcar e a cultura foiperdendo importância em favor da vinha e da banana.. Os engenhos de água renascem em concorrênciacom os novos movidos a vapor. Em 1851 temos apenas três engenhos em funcionamento no Funchal,sendo um em S. Martinho29. Num inventário das indústrias nacionais em 186430 referem-se sete engenhosem laboração na ilha, sendo apenas um a fabricar açúcar. Em S. Martinho João Pinto Correia possuíaum engenho e alambique. A grande aposta estava na aguardente, pelo consumo que tinha para adubaros vinhos e consumo corrente.

A tentativa do cultivo da cana sacarina na segunda metade do século XIX conduziu inevitavelmenteao aumento do número de engenhos, atingindo-se o máximo em 1906 de 57 unidades para fabrico deaguardente e açúcar. As medidas limitativas, a partir de 1939, conduziram ao encerramento da quasetotalidade das infra-estruturas, pelo que hoje restam poucos escombros. De acordo com o decreto de 1954procedeu-se à concentração de unidades industriais fora do Funchal na Sociedade de Engenhos daCalheta Ltda, Companhia de Engenhos de Machico Ltda, Companhia de Engenhos do Norte. A políticade proteccionismo e favorecimento do engenho do Torreão afastaram todos os demais da indústria,levando a maioria ao encerramento.

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29 . Madeira its Climate and Scenery, Londres 1851, p.5430 . Diário de Lisboa. Folha Official do Governo Portuguez, nº.14, 19 de Janeiro de 1864.

Engenho. Mecanismo de moenda sistemas do século XIX

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Ribeira dos Socorridos

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Na linha de fronteira do concelho e freguesia, na margem da Ribeira dos Socorridos, tivemos oengenho dos Socorridos, o único que se manteve em actividade no decurso do século XVIII,demonstrativo da persistência da cana nas proximidades. De entre os inúmeros proprietários assinala-se afigura de D. Guiomar Madalena de Sá Vilhena31. Da estrutura primitiva persiste apenas a capela32.

É no Funchal que encontramos o grupo mais importante de engenhos para fabrico de açúcar eaguardente. A maior concentração acontecia no espaço urbano, no eixo em torno da Ribeira de SantaLuzia e na freguesia de S. Martinho, a mais importante em termos de área de cultivo da cana. Depoistivemos ao Ribeiro Seco o engenho de Aloizio César de Betencourt, engenheiro químico, que ainda hojefunciona, depois de uma reforma em 194633. Na freguesia de S. Martinho assinalam-se os seguintesengenhos34:

LLOOCCAALL PPRROOPPRRIIEETTÁÁRRIIOO DDAATTAA FFUUNNDDAAÇÇÃÃOOSítio da Vitória João Carlos AguiarSitio das Quebradas Manuel PereiraSitio da Ajuda José Fernandes de AzevedoPico do Funcho Victorino Ferreira Nogueira 1856Salto do Cavalo (Estrada Monumental) Henrique de Freitas

A evolução dos engenhos entre os séculos XVI e XX indica-nos a persistência no recinto dafreguesia. No século XVIII desapareceram de toda a ilha persistindo um apenas junto à Ribeira dosSocorridos. O engenho pertencia ao morgadio instituído por Francisco Betencourt de Sá e D. Guiomardo Couto. Em 1744 o engenho estava em posse de João José Betencourt de Sá Machado, irmão de D.Guiomar de Sá, que recebeu da coroa a isenção do pagamento do quinto por cinco anos, como forma deincentivo à reparação e manutenção. Note-se que foi o único engenho a funcionar na ilha entre 1750 e1782.

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31 . Bernardete Barros, Dona Guiomar de Sá Vilhena. Uma mulher do século XVIII, Funchal, 2001.32. João Adriano Ribeiro, A Capela de Nª Sª da Vitória na Ribeira dos Socorridos, Funchal,200033. Maria João Oliveira, Arqueologia Industrial um espaço em aberto. A fábrica de mel de cana do Ribeiro Seco, In Xarabanda, 2000-2001, 35-48.34. Cf. Abel Marques Caldeira, O Funchal no primeiro quartel do século XX. 1900-1925, Funchal, 1963, 74-76.

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ENGENHOS - SÉCULOS XV- XVIII

DATA PERÍODO LOCAL PROPRIETÁRIOInformação Funcionamento

1546 Ribeira Socorridos Convento Santa Clara1573 1573-93 Ribeira dos Socorridos Guiomar da Costa

Praia Formosa Manuel da My(Damil?)Praia Formosa António MendesR0 dos Socorridos António CorreaR0 dos Socorridos Duarte Mendes

1643 Rª Socorridos Guiomar da Costa1644 Rª Socorridos Gaspar Betencourt de Sá 1665 Piornais Inácio Fernandes Pinto da Silva 1687 Mendo Brito Oliveira1744 1744-1760 João José Betencourt de Sá Machado1780 D. Madalena Guiomar de Sá Vilhena

Com o retorno dos canaviais na segunda metade do século XIX a freguesia passou a ser de novovalorizada como espaço de produção de açúcar. Retornam os canaviais e aparecem novos engenhos, quefabricam aguardente e açúcar.

ENGENHOS - SÉCULOS XIX E XX

FUNDAÇÃO LOCAL PROPRIETÁRIO1856 Pico do Funcho[S. Martinho] Victoriano Ferreira Nogueira1856 Pico do Funcho[S. Martinho] Diogo de Ornelas Frazão, João de Faria Cª(1896)1861 Pico da Cruz[S. Martinho] Joaquim Ferreira Nogueira1862 Pico do Funcho(S. Martinho) Manuel Faria & Cº1862 Quebrada[S. Martinho ] Manuel Francisco Pereira

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1867 Estrada Monumental Pedro Pires1883 Lombada[S.Martinho] Manuel Rodrigues de Jesus1887 Salto do Cavalo[S. Martinho] Pedro Cunha Pires1896 S. Martinho José Júlio Lemos

Os canaviais e engenhos persistiram por muito tempo, mas a concorrência e a política sacarinaditaram a sentença de morte, obrigando a que muitos encerrassem as portas de modo que hoje quase nadaresta. Para o observador mais atento é possível ainda descobrir alguns vestígios na freguesia.

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Antigo engenho de Pedro Pires, hoje sede da firma de vinhos Madeira Barbeitos

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VESTÍGIOS DE ENGENHOS DOS SÉCULOS XIX E XX

DATA PROPRIETÁRIO VESTÍGIOS LOCAL1867 Pedro Pires Parte das instalações FUNCHAL- Estrada

e a chaminé Monumental, actuais instalaçõesda Casa de Vinho Barbeitos

1546 Convento Santa Clara capela e anexos Ribeira dos Socorridos

AASS CCEENNTTRRAAIISS HHIIDDRROOEELLÉÉCCTTRRIICCAASS.. A orografia da ilha foi propícia à utilização da força motriz da água.Isto aconteceu desde o século XV ao nível agrícola e a partir do nosso século assumiu outra função naprodução de energia hidroeléctrica. As primeiras experiências são de iniciativa particular e acontecem nomeio rural. As pequenas centrais hidroeléctricas surgiram nos Canhas, Ponta de Sol, Porto Moniz, S.Vicente e Boaventura.

A iniciativa particular foi o incentivo para o governo avançar na década de quarenta do século XXcom um plano de aproveitamento hidroeléctrico da ilha da Madeira, nomeando para o efeito um grupode trabalho que depois se transformou em comissão para a execução do plano estabelecido. A Comissãotinha como missão proceder à electrificação do arquipélago, socorrendo-se da energia produzia pelascentrais. Em 1953 foram inauguradas as primeiras centrais hidroeléctricas na Serra de Água e Calheta eem 1962 tivemos o início dos trabalhos da Fajã da Nogueira(1971) e Ribeira da Janela.

Em 1974 criou-se a empresa de Electricidade da Madeira, regionalizada em 1979. Foi o início deuma nova fase da História da electricidade na Madeira, que conduziu a electrificação total da ilha nadécada de oitenta. Depois disto tivemos vários investimentos no sentido do reforço da capacidade defornecimento de energia com a central dos Socorridos em 1980, que permitiu a transferência dasinstalações de produção de energia.

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Ponte da Ribeirados Socorridos

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A TECNOLOGIA DA VINIFICAÇÃO - DO LAGAR AO CANTEIRO.

A cultura da vinha conduziu igualmente ao desenvolvimento de uma tecnologia adequada àvalorização sócio-económica da cultura. Várias actividades artesanais giram em torno dos lagares eadegas. Primeiro a construção do lagar estrutura imprescindível para início do processo, depois, aconstrução de pipas e o prolongado sistema de vinificação do mosto.

A presença do lagar foi, durante muito tempo, sinónimo de uma importante área de vinhas. Nemtodos os viticultores tinham meios para dispor de tal infra-estrutura e a maior parte dos caseiros se serviam

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Borracheiros e transporte das uvas,Gravuras A. Vizetelly,

1873

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do lagar do senhor. O usufruto implicava o pagamento de uma taxa, conhecida na Idade Média comolagaragem. Hoje o lagar é uma peça de museu, sendo substituído pela moderna tecnologia, mas temposhouveram em que ele era um instrumento imprescindível para o fabrico do vinho.

Feito o vinho no lagar era depois transportado às adegas pelos carreteiros em borrachos (uma pelede cabra curtida e voltada do avesso) . Muitas vezes era transportado directamente ao Funchal, por viamarítima ou terrestre ficando aí a fermentar nas grandes lojas.

O quadro, que se segue, completa a elucidação dos valores do investimento quanto ao lagar.

LAGAR E CASA-CUSTOS(1650-1782)

LAGAR LAGAR E CASAANO LOCAL PEDRA MADEIRA PEDRA MADEIRA1650 S. Martinho 80.500rs1717 S. Martinho 40001730 S. Martinho 35001739 S. Martinho 50001744 S. Martinho 40.0001745 S. Martinho 65001747 S. Martinho 50001748 S. Martinho 900011774488 Campanário 10.000FONTE: ARM, Capelas-inventário, maços: 1 a 42

Em 1862 a freguesia dispunha de nove lagares. Na verdade S. Martinho era um espaço privilegiadode cultivo da vinha da periferia do Funchal, onde existiram diversos lagares e serrados de vinhas, comoera o caso do de Cossart Gordon & Co.

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A VALORIZAÇÃO

ECONÓMICA DO ESPAÇO

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A VALORIZAÇÃO ECONÔMICA DO ESPAÇO

A proximidade da freguesia ao Funchal, associada ao facto de dispor de uma ampla área de orlamarítima condicionaram, nos últimos anos a ocupação do espaço. Assim, as áreas que durante muitotempo foram ocupadas pelas bananeiras ou vinha deram lugar a hotéis, complexos habitacionais e espaçosde lazer. Paulatinamente a freguesia foi-se transformando num espaço dormitório do Funchal, como oprovam os bairros sociais e os diversos complexos habitacionais privados. A orla marítima acabou tambémpor perder o aspecto rural e as falésias foram amansadas pela acção do homem. Aquilo que antes eramespaço de cultivo de bananeiras quase que foi totalmente ocupado pela construção de hotéis e casas dehabitação.

Hoje S. Martinho deixou de ser um espaço essencialmente rural para se afirmar como uma áreaprivilegiada de serviços onde o comércio e a hotelaria dominam. O progresso do último quartel do séculoXX conduziu a esta mudança radical na fisionomia de S. Martinho.

No espaço da freguesia é ainda possível encontrar diversas áreas onde o cultivo da terra ocupaalguns dos seus habitantes, aproveitando as planuras oferecidas pela mãe-natureza. Os que primeiroassentaram aqui morada procuravam nos produtos a sua subsistência diária, para depois apostaram emculturas geradoras de riqueza, por força da grande demanda do mercado europeu ou do novo mundo.Deste modo os cereais foram os primeiros a ser lançados à terra e, aos poucos, tivemos novas culturascomo a vinha, canaviais e bananais. Mas outros recursos valorizaram a freguesia, com a caça à perdiz.

A área da freguesia de S. Martinho dispunha de importantes espaços de exploração agrícola onde

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medraram em simultâneo as diversas culturas. Todavia a principal aposta esteve quase sempre nosprodutos de maior rentabilidade, por força da demanda do mercado externo.

A história do açúcar na Madeira confunde-se com a conjuntura de expansão europeia e dosmomentos de fulgor do arquipélago. A presença é multissecular e deixou rastros evidentes na sociedademadeirense. Dos séculos XV e XVI ficaram os imponentes monumentos, pintura e a ourivesaria que osembelezou e que hoje jaz quase toda no Museu de Arte Sacra. Do século XIX e do primeiro quartel danossa centúria perduram ainda a maioria dos engenhos da nova vaga de cultura dos canaviais. Aqui, acana diversificou-se no uso industrial, sendo geradora do álcool, aguardente e, raras vezes, o açúcar.

Na Madeira a cana sacarina, usufruindo do apoio e protecção do senhorio e coroa, conquista oespaço ocupado pelas searas, atingindo todo o solo arável da ilha em duas áreas: a vertente meridional (deMachico à Calheta), com um clima quente e abrigada dos alísios, onde os canaviais atingem 400 m dealtitude, dominado pelas plantações da capitania de Machico (Porto da Cruz e Faial até Santana), solo emque as condições mesológicas não permitem a cultura além dos 200 metros numa produção idêntica àprimeira área. A capitania do Funchal agregava no perímetro as melhores terras para a cultura da cana-de-açúcar, ocupando a quase totalidade do espaço da vertente meridional. À de Machico restava apenasuma ínfima parcela área e todo um vasto espaço acidentado impróprio para a cultura.

Na capitania do Funchal os canaviais distribuíam-se de modo irregular. Em 1494 a maior safrasituava-se nas partes de fundo, englobando as comarcas da Ribeira Brava, Ponta de Sol e Calheta com64%, enquanto o Funchal e Câmara de Lobos tinham apenas 16%. Em 1520, não obstante uma ligeiraalteração, a diferença mantém-se, pois a primeira surge com 50%, e a segunda apresenta 25%, valoridêntico ao total da capitania de Machico, com 25%. Uma análise em separado das diversas comarcas dacapitania do Funchal, na mesma data, evidencia a importância do Funchal em 33%, seguindo-se a Calhetacom 27%. As da Ribeira Brava e Ponta de Sol surgem numa posição secundária com 20% cada.

Nos séculos XVI e XVII a intervenção das autoridades resultava apenas da necessidade de garantirao açúcar da ilha uma posição dominante no mercado interno e a situação concorrencial nos mercadosnórdico e mediterrânico. A concorrência do açúcar brasileiro será, por algum tempo, o motivo dediscórdia entre os vários interesses em jogo. A incidência das medidas é pontual e resulta do incentivo quea cultura mereceu em finais do século XVI.

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medraram em simultâneo as diversas culturas. Todavia a principal aposta esteve quase sempre nosprodutos de maior rentabilidade, por força da demanda do mercado externo.

A história do açúcar na Madeira confunde-se com a conjuntura de expansão europeia e dosmomentos de fulgor do arquipélago. A presença é multissecular e deixou rastros evidentes na sociedademadeirense. Dos séculos XV e XVI ficaram os imponentes monumentos, pintura e a ourivesaria que osembelezou e que hoje jaz quase toda no Museu de Arte Sacra. Do século XIX e do primeiro quartel danossa centúria perduram ainda a maioria dos engenhos da nova vaga de cultura dos canaviais. Aqui, acana diversificou-se no uso industrial, sendo geradora do álcool, aguardente e, raras vezes, o açúcar.

Na Madeira a cana sacarina, usufruindo do apoio e protecção do senhorio e coroa, conquista oespaço ocupado pelas searas, atingindo todo o solo arável da ilha em duas áreas: a vertente meridional (deMachico à Calheta), com um clima quente e abrigada dos alísios, onde os canaviais atingem 400 m dealtitude, dominado pelas plantações da capitania de Machico (Porto da Cruz e Faial até Santana), solo emque as condições mesológicas não permitem a cultura além dos 200 metros numa produção idêntica àprimeira área. A capitania do Funchal agregava no perímetro as melhores terras para a cultura da cana-de-açúcar, ocupando a quase totalidade do espaço da vertente meridional. À de Machico restava apenasuma ínfima parcela área e todo um vasto espaço acidentado impróprio para a cultura.

Na capitania do Funchal os canaviais distribuíam-se de modo irregular. Em 1494 a maior safrasituava-se nas partes de fundo, englobando as comarcas da Ribeira Brava, Ponta de Sol e Calheta com64%, enquanto o Funchal e Câmara de Lobos tinham apenas 16%. Em 1520, não obstante uma ligeiraalteração, a diferença mantém-se, pois a primeira surge com 50%, e a segunda apresenta 25%, valoridêntico ao total da capitania de Machico, com 25%. Uma análise em separado das diversas comarcas dacapitania do Funchal, na mesma data, evidencia a importância do Funchal em 33%, seguindo-se a Calhetacom 27%. As da Ribeira Brava e Ponta de Sol surgem numa posição secundária com 20% cada.

Nos séculos XVI e XVII a intervenção das autoridades resultava apenas da necessidade de garantirao açúcar da ilha uma posição dominante no mercado interno e a situação concorrencial nos mercadosnórdico e mediterrânico. A concorrência do açúcar brasileiro será, por algum tempo, o motivo dediscórdia entre os vários interesses em jogo. A incidência das medidas é pontual e resulta do incentivo quea cultura mereceu em finais do século XVI.

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Apanha da cana em propriedadede H. Hinton, Ajuda Museu de

Fotografia Vicentes.

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A conjuntura da década de quarenta da centúria seguinte foi marcada por novo incremento dacultura, sem necessidade de recurso às medidas proteccionistas, uma vez que o mercado do Nordestebrasileiro se encontrava sob controlo holandês. Fechou-se a rota do açúcar brasileiro.

Os anos seguintes foram de promoção da cultura o que propiciou um aumento da produção,mantendo-se a mesma incidência das áreas em questão, sendo de realçar a Ribeira dos Socorridos, ondeno século dezoito se manteve em actividade um dos poucos engenhos de açúcar existentes na ilha.

DDaattaa PPrroopprriieettáárriioo AAççúúccaarrPães Peso

arrobas Arratéis libras1689 Francisco Vasconcelos e Silva Ribeira dos Socorridos 2001690 Francisco Vasconcelos e Silva Ribeira dos Socorridos 71693 Francisco Vasconcelos e Silva Ribeira dos Socorridos 5 ?

Inácio Cabral Catanho 8 68FONTE: ANTT, PJRFF, nº.525.

Por todo o século XVIII a aposta preferencial foi apenas na vinha, que retirou espaço aos canaviais.Mesmo assim tiveram continuidade, uma vez que existem dados que documentam a existência decanaviais e sabe-se que o engenho dos Socorridos se manteve em funcionamento por todo o séculoXVIII35. A coroa, de acordo com a provisão régia de 1 de Julho de 1642, pretendia promover de novo ocultivo da cana-de-açúcar por meio de incentivos à reparação dos engenhos, com a isenção do quinto porcinco anos ou a metade por dez anos.

No século dezoito a cultura é conduzida para um plano secundário, deixando de ter a realimportância que teve na economia madeirense. Por todo o século XVIII a aposta preferencial foi apenasna vinha, que retirou espaço aos canaviais. Mesmo assim tiveram continuidade, uma vez que existemdados que documentam a existência de canaviais e sabe-se que o engenho dos Socorridos se manteve em

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35. Álvaro Rodrigues de AZEVEDO (“anotações”, in Saudades da Terra, Funchal, 1873) refere a extinção em 1748, o que não é verdade, pois o engenhodos Socorridos foi alvo de beneficiações em 1755 e continuou laborando por todo o período derradeiro deste século. Cf. João Adriano RIBEIRO, A canade açúcar na Madeira séculos XVIII-XIX, Calheta, 1992.

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funcionamento por todo o século XVIII.A conjuntura económica de finais do século dezanove trouxe a cultura de regresso à Madeira, como

solução para reabilitar a economia que se encontrava profundamente debilitada com a crise do comércioe produção do vinho. A situação, que se manteve até à actualidade, não atribuiu ao produto a mesmapujança económica de outrora nas exportações. A área de cultura de cana sacarina foi-se reduzindoinexoravelmente a pequenos nichos de socalcos na vertente sul. Todavia, a partir de meados do séculoXIX a mesma foi paulatinamente conquistando terreno a Norte e a Sul.

A evolução dos canaviais, com maior incidência na vertente meridional, área tradicional de cultivo,significa um maior volume de produção que empurra o aumento do número de engenhos. Foi no períodode 1910 a 1930 que se atingiu os valores mais elevados, que aproximaram a ilha dos tempos áureos doséculo XV, apenas em termos de produção e nunca de riqueza. A partir daqui sucederam-se medidaslimitativas da expansão da área dos canaviais36, que conduziram inevitavelmente à desvalorização naeconomia rural e que em certa medida favoreceram a expansão da banana, cultura, predominantementeda vertente sul, deixando a agricultura do norte num estado de total abandono, o que abriu as portas auma desenfreada emigração.

A freguesia de S. Martinho foi dentro do concelho do Funchal uma das áreas mais destacadas parao cultivo dos canaviais, provam-no a existência de elevado número de engenhos. Para o período de 1856a 189 estão referenciados, como vimos, nove engenhos no Pico do Funcho, Pico da Cruz, Quebradas,Lombada, Estrada Monumental e Salto do Cavalo. Se a presença de engenho significa a concentração decanaviais então poderemos afirmar que o pico do Funcho era o mais importante. A Ajuda era consideradauma das melhores zonas de produção de cana do Funchal. Deste modo em 1917 José Fernandes deAzevedo, que havia comprado um engenho no Salto do Cavalo, tinha intenção de o transferir para aí.

A par disso a casa Hinton, proprietária do engenho de Pedro Pires ao Salto do Cavalo, pretendia em1917 reactiva-lo com máquinas de um outro de S. Lázaro. Também o banqueiro Henrique Figueira tinhaintenção de montar um engenho no Salto de Cavalo.

O interesse demonstrado por estes industriais é revelador, sem dúvida, da importância que a culturavinha assumindo na freguesia.

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36. As evidências destas medidas estão na área de cultivo: em 1939 a cana ocupa 6500 ha, enquanto em 1952 era de menos de um quarto, isto é 1420 ha.

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Vinhas em balseiras, gravura século XIX

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VINHOS

O vinho é uma presença indelével no devir histórico da cristandade Ocidental. Acompanhou osprimeiros cristãos nas catacumbas e expandiu-se na Europa monástica e seguiu-a na expansão nos mares.A dupla presença no acto litúrgico e alimentação traçou-lhe o caminho e protagonismo. As ilhas atlânticassão exemplo disso. Os europeus fizeram chegar as cepas a todo o lado mesmo àqueles onde a cultura teriadificuldades em se adaptar, como foi o caso de Cabo Verde. Apenas na Madeira, Açores e Canárias a famado produto se igualou à dimensão comercial que assumiu, pautando o movimento com os mercadoseuropeu e americano. Aliás, a concorrência entre os vinhos foi feroz. Primeiro foi a disputa pelo mercadoinglês e, depois, no século XVIII, pelo norte-americano, onde a Madeira teve uma posição de destaquemercê do favorecimento dos tratados e leis de navegação da coroa britânica. Nalgumas ilhas dos Açoresas condições do solo e clima retiraram-lhe importância, exceptuando-se o caso do Pico e Graciosa onde ovinho se igualou ao da Madeira e Canárias.

Em qualquer dos casos o mercado do vinho insular desenvolveu-se pela solicitação do mundocolonial. Os vinhos da Madeira tiveram desde o século XV presença assídua na mesa da aristocraciaeuropeia. O mesmo se poderá dizer do Verdelho do Pico que foi corrente nos palácios dos czares daRússia. Para os norte-americanos as ilhas atlânticas são identificadas pelo vinho. Desde o século XVIIIque são nomeadas na documentação e historiografia como as ilhas do vinho38. O epíteto demonstra opapel que o vinho lhes atribuiu no mercado americano. Em alguns dos registos alfandegários norte-americanos do século XVIII o vinho da Madeira surge juntamente com o dos Açores39, tornando-se difícilquantificar a verdadeira origem.

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38. GUIMERÁ RAVINA, Agustin, “Las Islas del Vino (Madeira, Azores y Canarias) y la America Inglesa Durante el Siglo XVIII”, in ColóquioInternacional de História da Madeira, Funchal, 1989, pp.900-934.

39. A. D. Francis, The Wine Trade, Edinburg, 1973, p.216; Ch. M.Andrews, The Colonial Period of American History, H. Haven, 1964, p.112

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Uvas da casta terrantez

O vinho Madeira foi, sem dúvida, o que mais se evidenciou no universo das ilhas. Oluzidio rubinéctar que continua a encher os cálices de cristal é, não só, a materialização dapujança económica presente, mas também, o testemunho de um passado histórico deriqueza. Prende-o à ilha uma tradição de mais de cinco séculos. Nele reflectem-se as épocasde progresso e de crise. No esquecimento de todos fica, quase sempre, a parte amarga dalabuta diária do colono no campo e adegas, o árduo trabalho das vindimas, o alarido dosborracheiros. Hoje, para recriar a ambiência, torna-se necessário olhar os restos materiaise documentos, donde é possível desbobinar o filme do quotidiano de luta que se escondepor entre a ferrugem, a traça e o pó.

O Vinho Madeira, celebrado por poetas e apreciado por monarcas, príncipes,militares, exploradores e expedicionários, perdeu paulatinamente nos últimos cem anosparte significativa do mercado, fruto da conjuntura criada, nos finais do séc. XVIII eprincípios do séc. XIX. A grande procura obrigou a utilizar todo o vinho e a acelerar oprocesso de envelhecimento. Tudo isto se passou até que sucedeu o fastio em 1814. Asdoenças acabaram com as cepas de boa qualidade, fazendo-as substituir pelo produtordirecto que se manteve lado a lado com as europeias numa promiscuidade pouco adequadaà manutenção da qualidade. O passado recente anunciou o retorno das castas tradicionaise abriu as portas a novos momentos de riqueza.

A presença da vinha na Madeira, associada aos primeiros colonos, era umainevitabilidade do mundo cristão. O ritual religioso fez do pão e do vinho os elementossubstanciais da prática e a tradição elevou-os a símbolos da essência da vida humana e deCristo. O vinho e o pão avançaram com a Cristandade e revolucionaram os hábitosalimentares. A partir do séc. VII comer pão e beber vinho ficaram como símbolos nomundo cristão do sustento humano.

Em meados do século XV, com o arranque do processo de ocupação e deaproveitamento da ilha, é dada como certa a introdução de videiras do reino e, mais tarde,das célebres cepas do Mediterrâneo. João Gonçalves Zarco, Tristão Vaz Teixeira eBartolomeu Perestrello, que receberam o domínio das capitanias do arquipélago sob adirecção do monarca e do Infante D. Henrique, procederam ao desbravamento e cultivo,

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lançando ao solo as diversas culturas trazidas do reino.O Vinho Madeira adquiriu, desde tempos recuados, fama no mundo colonial,

tornando-se a bebida preferida do militar e aventureiro na América ou Ásia. Escolhido pelaaristocracia manteve-se com lugar cativo no mercado londrino, europeu e colonial. Peranteisto o ilhéu desde o último quartel do século XVI fez mudar os canaviais por vinhedos, quevai substituindo todas as terras cultivadas, devorando a floresta a Sul e a Norte. Omadeirense embalado pela excessiva procura do vinho esqueceu-se de assegurar a autosubsistência. O vinho era a única fonte de rendimento e a moeda de troca para o alimento,indumentária e manufacturas. Estamos perante uma troca desigual para o madeirense emuito rentável para o inglês.

Já no séc. XV o vinho era um produto competitivo do trigo e açúcar, com peso naeconomia local e assumindo-se como um meio de troca no mercado externo. Os trigais ecanaviais deram lugar às latadas e balseiras e a vinha tornou-se na cultura quase exclusivado madeirense. Tudo isto projectou o vinho para o primeiro lugar na actividade económicada ilha, mantendo-se por mais de três séculos. O ilhéu, desde o último quartel do séc. XVI,apostou na cultura da vinha, tirando dela o necessário para o sustento diário e manter umavida de luxo, construção de sumptuosos palácios, igrejas e conventos.

O maior investimento do viticultor/colono estava no arranjo das terras, no plantio,enxertia e cuidados a ter com a vinha. Para S. Martinho temos a seguinte informação:

CCUUSSTTOO DDAASS VVIIDDEEIIRRAASS..11669922--11778822

DDAATTAA VVIINNHHAA VVAALLOORR UUNNIITTÁÁRRIIOO TTOOTTAALL11773399 15.400 7.70011773399 9.620 51.10011774444 26700 parreiras 119.25011774455 21320 parreiras 70.80011774488 43.600 172.000FONTE: ARM, Capelas-inventário, maços:1 a 42

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Uvas da casta Vrdelho

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A extensão de vinhedos pode ser deduzida a partir do número de milheiros de parreiras dadas ainventário. Em 1748 Antónia de Freitas, casada com João Rodrigues, tinha em S. Martinho terras debenfeitorias do capitão Francisco da Cunha com 43.600 parreiras, um dos maiores investimentos de umcolono.

O colono era ainda onerado com a obrigação de um outro conjunto de benfeitorias, imprescindíveisà laboração da faina vitivinícola. A construção de paredes, o plantio das videiras, o erguer latadas econstruir lagares estão incluídas no conjunto de obrigações que constituíam o primeiro investimento docolono. A despesa em latada é reduzida, o que deverá ser prova do uso da vinha de pé. O valor maiselevado resultava do trabalho de preparação do terreno para o plantio dos bacelos com a construção deparedes. Temos alguns dados para a frguesia de S. Martinho:

IINNVVEESSTTIIMMEENNTTOOSS DDOOSS CCOOLLOONNOOSS NNAASS VVIINNHHAASS..11669922--11778822

DDaattaa CCoolloonnoo// pprroopprriieettáárriioo VViinnhhaass LLaattaaddaass LLaaggaarr PPaarreeddeess TTOOTTAALL1730 José Gomes Jardim 75.000 3.500 61.600 14.1001739 Mariana de Freitas 51.100 7.000 5.000 116.000 179.1001744 António Figueira 119.250 3.000 40.000 35.650 197.9001745 Maria Gomes 30.000 12.000 6.500 74.500 123.0001747 Martinho de Freitas 15.000 5.000 20.0001748 Antónia Freitas 172.000 10.000 9.000 166.000 357.000FONTE: ARM, Capelas-inventário, maços: 1 a 42

Os dados quantitativos do subsídio literário evidenciam a evolução do volume do produtoarrecadado e a relação directa com o volume de produção. A partir de 1805 nota-se a assiduidade namarcação dos dados das colectas, facto que deve resultar do facto de as colectas passarem a ser feitas pormeio de contratos de arrendamento feitos em hasta pública. Em S. Martinho temos dados sobre o subsídioliterário apenas para os anos de 1829, 1831 e 1834.

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LLOOCCAALLIIDDAADDEE 11882299 11883311 11883344SSããoo MMaarrttiinnhhoo 72147 74178 113134

A Madeira viveu, entre o século XVII e princípios do XIX, embalada na opulência docomércio do vinho. Com tão avultados proventos, o madeirense deixou-se vencer pelo luxoexuberante do meio aristocrático, habituou-se à vida cortesã e copiou os hábitos ingleses.

Contra a política exclusiva imposta pelo mercantilismo inglês manifestaram-se, quer oGovernador e Capitão General J. A. Sá Pereira, com um “regimento de agricultura” para o PortoSanto, quer o Corregedor e Desembargador António Rodrigues Veloso nas instruções que deixouem 1782 na Câmara da Calheta. Mas foi tudo em vão, ninguém foi capaz de travar a “febrevitícola”, nem de convencer o viticultor a diversificar as culturas da terra. Vivia-se um momentode grande procura do vinho no mercado internacional e as colheitas eram insuficientes parasatisfazer a incessante procura. Perante tão desusada solicitação e à falta de melhor socorriam-sedos vinhos do norte da ilha e mesmo dos Açores e Canárias para saciar o sedento colonialista.

A rota do vinho começou a ser traçada no século XV, partindo da Europa ao encontro docolonialista na Ásia ou América. O comerciante inglês, que surgiu a partir do séc. XVII, soubetirar partido do produto fazendo-o chegar em quantidades volumosas às mãos dos compatriotasque o aguardavam nos quatro cantos do mundo. Vários factores fizeram com que o inglês seinstalasse na ilha e se afirmasse como um potencial negociante do vinho. Para tanto contribuíramas condições favoráveis exaradas nos tratados luso-britânicos e o favorecimento que asregulamentações britânicas do comércio colonial atribuíam à Madeira.

O movimento de exportação do vinho da Madeira nos sécs. XVIII e XIX liga-se de mododirecto com o traçado das rotas marítimas coloniais inglesas que tinham passagem obrigatória nailha. São as rotas da Inglaterra colonial que faziam do Funchal porto de refresco e de carga parao vinho no percurso para as Índias Ocidentais e Orientais, donde os navios regressavam, pelosAçores, com o recheio colonial. Também os navios portugueses da rota das Índias, ou do Brasilescalavam a ilha onde recebiam o vinho que conduziam às praças lusas. São ainda os naviosingleses que se dirigiam à Madeira com manufacturas e retornavam por Gibraltar, Lisboa, ouPorto. E, finalmente, os navios norte-americanos que traziam as farinhas para sustento diário do

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Uvas da casta Malvazia

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madeirense e regressavam carregados de vinho. Por tudo isto o vinho madeirense conquistou o mercadobritânico em África, Ásia e América afirmando-se até meados do séc. XIX como a bebida dosfuncionários e militares das colónias. Com o movimento independentista das colónias todos regressaramà terra de origem trazendo na bagagem o vinho.

O momento de apogeu da exportação do vinho Madeira situa-se entre finais do séc. XVIII eprincípios do séc. XIX, altura em que a saída atingiu a média de 20.000 pipas. Mais de 2/3 do vinhoexportado destinava-se ao mercado americano, com destaque para as Antilhas e as plantações do Sul daAmérica do Norte e N. York. A primeira metade do séc. XIX foi pautada por uma alteração no mercadoconsumidor do vinho da Madeira. Era o período de afirmação dum novo destino capaz de suprir a perdado mercado colonial. A Inglaterra e a Rússia tomaram o lugar a partir de 1831. Devemos associar aconcorrência do vinho de França, Espanha e Cabo. O fim das guerras europeias, em princípios do séc.XIX, abriu as comportas do vinho europeu os mercados asiático e americano. A saída do colonialista foiconsiderada uma perda irreparável para o vinho Madeira.

Os tratados luso-britânicos asseguraram a hegemonia da feitoria britânica no comércio do vinho daMadeira. A ocupação inglesa da ilha nos primeiros anos do século XIX não foi ocasional. Da defesa dosinteresses da feitoria passou-se ao reforço da acção, consignada no tratado de 1810, por isso os ingleses surgemnos anos imediatos com uma posição cimeira nas exportações, controlando mais de 50% do vinho exportado.

A crise oitocentista provocou a debandada geral do mercado inglês ou americano e só ficaramaqueles com interesses noutros sectores. Como corolário disso tivemos o desaparecimento das sociedadesfamiliares e o aparecimento de associações, como a Madeira Wine Association (1925) que absorveu, nosanos imediatos, mais de trinta casas. Na actualidade o comércio do vinho é assegurado por novasempresas, criadas no rescaldo da crise do comércio do vinho, sendo três (Henriques & Henriques Lda., H.M. Borges Sucessores Lda., Vinhos Justino Henriques Lda.) o elo de continuidade com o passado. Asdemais (Madeira Wine Company, Vinhos Barbeito Madeira Lda., Pereira d’Oliveira Vinhos Lda., ArturBarros & Sousa Lda. foram criadas a partir dos escombros de vetustas casas ou adegas particulares.

No quadro empresarial a freguesia assume um significado especial pelo facto de alguns empresáriosbritânicos terem aí assentado morada, os serrados de vinhas ou a sede dos armazéns. No séc. XIX, a firmaCossart Gordon & Cª Ldª tinha aí um serrado de vinhas. Hoje é a firma Barbeitos (Madeira) Ldª com osarmazéns na Estrada Monumental e Barreiros.

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Uvas da casta Boal Uvas da casta bastardo

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VINHOS BARBEITO (MADEIRA) Lda.

Mário Barbeito de Vasconcelos começou a exportar vinhos em 1946 mas só passados dois anosestabeleceu a firma nas instalações de um antigo engenho de aguardente. Uma das apostas da casa está nomercado japonês para onde exporta vinho desde 1965, aliado a Kinoshita Shoji. O vinho é uma referênciano mercado nipónico, sendo facilmente identificado pelas garrafas de formato cantil forradas a vime. NaLoja de vendas no Funchal associa-se um museu e biblioteca evocativos do navegador Cristóvão Colombo.

Tal como não se cansam de referir os promotores, o vinho da Madeira não é só um negócio - é umatradição de família e um modo de vida. Por isso, são os netos de Mário B. de Vasconcelos, falecido em1985, que persistem na teimosia.

Hoje, passados mais de quinhentos anos sobre a introdução da vinha na Madeira, estão ainda

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presentes na memória os tempos áureos de apreciação e comércio do vinho. A imagem passou rapidamenteà História. À euforia da procura sucedeu a crise dos mercados, agravada pela presença das doenças queatacaram a vinha (oídio e filoxera). A crise do sector produtivo, resultado de factores botânicos alastrou atodo o espaço vitícola apresentando efeitos semelhantes na economia e mercado do vinho. Perdeu-se aligação ancestral com as tradicionais castas europeias mas, em contrapartida, conquistaram-se novasvariedades americanas. As dificuldades conduziram à debandada dos agentes comerciais que traçaram omercado. A Madeira conseguiu paulatinamente recuperar ou conquistar novos mercados.

S. Martinho foi ao longo dos tempos uma zona privilegiada para a produção de vinhos dequalidade. Os estrangeiros, nomeadamente os ingleses mais atentos ao vinho, delimitavam as melhoresáreas de vinha. Em 1851 Edward V. Harcourt refere que os vinhos de S. Martinho estavam entre osmelhores produzidos na ilha. Idêntica opinião tem Henry Vizetelly (1884) que diz produzir-se em S.Martinho um vinho de elevada categoria. A par disso deveremos assinalar alguns vinhos que ficaramfamosos. Henri Vizetelly(1873) destaca os soleras de 1843 e 1842. A. J. Biddle(1900)refere o São MartinhoSolera de 1842, que entre as muitas características apresentava um bouquet fino. Devemos ainda anotaro São Martinho 1870, o São Martinho verdelho, São Martinho 1869-1870, e São Martinho 1873-1874.Todos estes vinhos eram cobiçados por especialistas e apreciadores do Madeira.

A bananeira é conhecida na ilha desde o século XVII mas foi só no século XX que adquiriudimensão económica na ilha. S. Martinho por dispor de uma importante frente mar adequada aagricultura, foi uma das principais áreas de cultivo, salientando-se o Gorgulho, Barreiros, Praia Formosae Ribeira dos Socorridos. A última era considerada por Vieira Natividade como a “formosíssimaplantação”40. Hoje assumem papel de destaque a Ajuda, Santa Rita e a Ribeira dos Socorridos. Aimportância que assumiu a cultura da banana na freguesia está provada através da presença de um gruposignificativo de exportadores em meados do século XX, maioritariamente do sítio da Vitória: ÁlvaroFernandes, Arnaldo & Fernandes Ldª, João Fernandes, João Soares, João de Sousa Henriques, JoséCorreia, José Fernandes Inácio, José Fernandes & Irmãos, José Fernandes Júnior e Soares Gaspar & Co.Hoje a situação é distinta estando os produtores concentrados em cooperativas, tendo a CooperativaAgrícola dos Produtores de Frutas da Madeira, sede na freguesia.

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40. ARM, Capelas, cx. 36, n1 968.

Estufa de Sol, Vinhos Barbeito Lda, Barreiros

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Sistema de engarrafamento do vinho para o Japão,Vinhos Barbeito Lda

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Mulheres fiando, gravura do século XIX

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AS INDÚSTRIAS E ARTESANATO.

A valorização económica da ilha só foi possível com a definição de uma ajustada estrutura sócio-profissional capaz de satisfazer as necessidades fundamentais da sociedade e gerir a riqueza quealimentava o comércio externo. Diversas actividades, de carácter artesanal, completam o processoeconómico madeirense, atribuindo uma mais-valia à ilha e aos que nele participavam. Muitas surgirampor necessidade dos próprios, mas outras tiveram como destino o mercado externo. É de salientar a obrade vimes e o bordado. Ambas surgiram como uma forma de gerar riqueza e um complemento importanteao trabalho rural.

O desenvolvimento destas actividades na década de quarenta do século XIX era ainda incipiente.A exposição realizada em 1849 pelo governador civil José Silvestre Ribeiro documenta este estádio e podeser considerada como o principal impulso. Sabemos qual o ponto da situação das actividades artesanaisem 1847. A grande incidência estava ainda nas actividades transformadoras de apoio aos sectoreseconómicos dominantes e das que iam ao encontro das necessidades básicas quotidianas.

O vinho dominava as exportações e os tanoeiros eram um grupo fundamental no recinto urbano.Das aduelas importadas dos Estados Unidos fazem as pipas que conduzem o vinho ao seu destino. Já aoutro nível é notória a presença dos sapateiros e carpinteiros. A preocupação de José Silvestre Ribeiro pela

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animação industrial da cidade não foi notória. Mantiveram-se os ofícios tradicionais, isto é, sapateiros,carpinteiros e marceneiros. A crise do vinho retirou importância à maioria dos tanoeiros. Na área dosserviços destacam-se os barqueiros e os boeiros, o que poderá ser indício da maior circulação de gentes eprodutos. Não deverá esquecer-se a presença do forasteiro, seja doente da tísica ou cientista. O turismoveio propiciar um conjunto de ofícios.

De acordo com o inventário de 1862 a freguesia apresentava um quadro variado de ofícioseminentemente ligados ao trabalho da terra e às necessidades do quotidiano das gentes.

Ofício NúmeroBordadeiras 160cabouqueiros 18Calceteiros 3Canteiros 5Carpinteiros 8Costureiras 15Ferreiros 1Lavradores 350Marceneiros 1Moleiros 17Parteiras 1Pedreiros 12Sapateiros 9Serradores 2serralheiros 1Surradores 3Tecedeiras 28Trabalhadores 4É conhecida ainda a tradição de fabrico de artefactos de

giesta(Genista vergata Ait.), nomeadamente cestos.

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Bordadeira. Aguarela de

Max Rommer.

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BBOORRDDAADDOO

Outras actividades permitiram a revitalização da economia da ilha nasegunda metade do séc. XIX. O bordado madeirense não é uma invençãobritânica, mas sim fruto de uma tradição portuguesa trazida para a ilha pelosprimeiros colonos e que persistiu em muitas famílias como forma devalorização do fato. Acabou por adquirir a partir de meados do século XIXuma função fundamental na economia da ilha e um suplemento familiar. Aligação do inglês surge a partir de 1854 com Miss Phelps que definiu osmecanismos adequados para a comercialização em Inglaterra.

A primeira promoção do bordado e outras actividades artesanaisaconteceu em 1850 numa exposição industrial feita no Funchal por iniciativado Governador Civil, José Silvestre Ribeiro, repetindo-se depois na ExposiçãoUniversal de Londres. Este lançamento foi importante para que o produtorapidamente entra-se no mercado pela mão dos próprios ingleses. Os

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Bordadeiras. Postal antigo

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bordados da Madeira rapidamente se transformaram numa moda das famílias inglesas.A segunda metade do século dezanove foi o momento de rápida afirmação do bordado. Os dados

estatísticos assim o confirmam. Em 1862 temos 1029 bordadeiras cujas toalhas bordadas renderam nasexportações cerca de sete contos. Aos poucos começam a surgir novos mercados. Em 1863 exportava-sejá para os Estados Unidos, enquanto na década de oitenta abriu-se o mercado alemão. Este rapidamenteadquiriu uma posição dominante. Tudo isto foi resultado das regalias aduaneiras na ilha e em Hamburgo,o principal porto de destino. Estes valores continuaram a subir sendo em 1906 trinta mil as bordadeiras edois mil profissionais nas oito casas que contribuíam com 242.342$180 réis. Já em 1912 temos 34.500bordadeiras. O novo século XX inicia-se com uma diversificação dos mercados e alteração da matéria-prima. O algodão e a cambraia cederam lugar ao linho cru e a linha dominante passou a ser a castanha.Aos tradicionais mercados juntam-se o Brasil os EUA, Canadá, França e África do Sul.

Os alemães mantiveram até 1914 uma posição dominante neste comércio, onde vinhamconquistando terreno desde 1880. Esta situação conduziu ao aumento do número de casas dedicadas aocomércio do bordado. Os alemães perdem importância em favor dos sírios. Na década de cinquenta acrise do cruzeiro levou à perda do mercado brasileiro, mas a tradição do bordado manteve-se em algumascidades brasileiras por mãos de madeirenses que para aí emigraram. O Brasil cedeu lugar à Venezuela eà Itália. Os EUA continuaram a ser um dos mais destacados mercados.

A crise da década de oitenta levou ao encerramento da maior parte das casas de bordados e estedeixou de assumir o papel que tinha na economia familiar e da ilha. Mesmo assim ainda persiste maiscomo memória emblemática e identificadora da ilha mais por força do turismo dos chamados souvenirs.

Em S. Martinho, a exemplo das demais freguesias da periferia do Funchal o bordado foi por muitotempo uma actividade importante para as mulheres. Era daí que se conseguia uma parte significativa dorendimento da casa. De acordo com informação de 1862 tínhamos na freguesia 160 bordadeiras queauferiam um salário de 50 réis.

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Pormenor de peça bordada.Documentos da Firma de

Kassab Brothers, que viveu na Ajuda.

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OO TTUURRIISSMMOO

A partir da segunda metade do século dezoito a revelação da Madeira como estância para o turismoterapêutico, mercê das qualidades profiláticas do clima na cura da tuberculose, cativou a atenção de novosforasteiros. A tísica propiciou, ao longo do século dezanove, o convívio com poetas, escritores, políticos earistocratas. Não obstante, a polémica causada em torno das possibilidades de cura a ilha permaneceu pormuito tempo como local de acolhimento dos doentes e considerada a primeira e principal estância de curae convalescença do velho continente. O turismo na Madeira começou como uma forma de busca da curapara a tísica pulmonar. Este movimento contribuiu paulatinamente para que industria turística setransformasse rapidamente numa realidade, com grande peso na economia madeirense.

A presença, cada vez mais assídua, de doentes provocou a necessidade de criação de infra-estruturasde apoio: sanatórios, hospedagens e agentes, que serviam de intermediários entre forasteiros eproprietários de acolhimento. O último é o prelúdio do actual agente de viagens. O turismo, tal como hojese entende, dava os primeiros passos. Como corolário disso estabeleceram-se as primeiras infra-estruturashoteleiras e o turismo passou a ser uma actividade organizada com uma função relevante na economia dailha. E, mais uma vez, o inglês é o protagonista. Tenha-se em conta que este momento de forte afluênciade estrangeiros coincide com a época de plena afirmação da Ciência nas Academias e Universidades

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europeias. Desde finais do século XVII as expedições científicas tornaram-se comuns e o Funchal foi umporto fundamental de escala, para ingleses, franceses e alemãs. A função do Funchal, como porto de escaladas navegações oceânicas e de estância de turismo terapêutico, contribuiu para afirmar o papel da ilha noespaço atlântico e justifica a existência os inúmeros estudos científicos ou de viagem que se dedicam oufazem referência à Madeira.

O turismo caminhou lado a lado com o vinho e o aparecimento de novas actividades. A vinhapersistiu nas latadas e fez-se companheira de vimeiros, bordados e bordadeiras. A harmonia marchava afavor da ilha e tornava possível a existência de várias formas de actividade que garantiam a sobrevivência.Na década de quarenta define-se o “comércio, a navegação o turismo, os grandes propulsores dodesenvolvimento insular”. As actividades em torno da obra de vimes e bordados tiveram nos estrangeiros,principalmente ingleses os principais promotores. A primeira metade do século XX foi marcada porprofundas mudanças na economia madeirense. É para todos aqueles que a viveram um momento aesquecer. Primeiro os conflitos mundiais (1914-19 e 1939-45) e depois os problemas políticos e económicosmarcaram uma fase negra na vida do madeirense. A guerra evidenciou a fragilidade da economia eevidenciou a extrema dependência ao mercado externo.

A maioria dos visitantes, como é óbvio, pertence à aristocracia endinheirado. Bulhão Pato diz-nosque de entre os numerosos visitantes da década de cinquenta do século XIX muitos são da aristocracia dedinheiro e de sangue. Um breve olhar pelos registos e testemunhos corrobora esta evidência. A família dosHabsburgos e Austrias era frequente na ilha. A lista de aristocratas, príncipes, princesas e monarcas pareceser infinda, mas entre todos fica o registo da imperatriz Isabel, mais conhecida por Sissi, do imperadorCarlos da Áustria. Assídua foi a presença da imperatriz do México, que legou um registo apaixonado emUm Hiver à Madère (1859-1860).

Ontem como hoje a realização de uma viagem depende também da disponibilidade de infra-estruturas de apoio. Hoje fala-se em hotéis e restaurantes, ontem, eram as estalagens, os albergues e astabernas. A palavra hotel, deriva do francês hotel, mas com um significado diferente do que aquele queassumiu na actualidade. Na Idade Média existiam os Hospitalis, casas para recolha dos peregrinos edoentes. A par disso coexistiam os albergues e hospedarias, que pelo importante serviço que prestavam àsociedade, mereceram sempre a atenção dos municípios e coroa.

Até ao advento da era industrial, em que o transporte por tracção animal dominava a circulação em

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Reid’s Hotel

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terra, a albergaria ou estalagem, regra geral asseguravam ao viajante apenas cama para dormir, onecessário aprovisionamento de forragem para os animais e algum alimento. A par disso os viandantespoderiam contar com o acolhimento das igrejas, ordens religiosas e casas particulares. Ao longo doscaminhos de peregrinação, como o S. Tiago de Compostela, amontoavam-se estas infra-estruturas,sempre abertas para receber os peregrinos, propiciando-lhe o necessário descanso e alimento.

Por todo o século XVIII e primeira metade do seguinte, a frequência assídua de tísicos à procura decura e os demais que por aí passavam, encontravam fácil acolhimento nas casas particulares. O aumentodo tráfego conduziu ao aparecimento dos primeiros hotéis. William Reid, que se havia fixado na ilha, em1844, foi, conjuntamente com W. Wilkinson, primeiro, com intermediário entre os proprietários de casasou quintas e os forasteiros. Mais tarde, assumem-se como os primeiros proprietários das iniciais unidadeshoteleiras. A família Reid’s começa com The Royal Edimburgh Hotel, mas em 1850 era já detentora detrês hotéis - Santa Clara, Carmo Hotel, Reid’s New Hotels. Os filhos de W. Reid, Alfred e William, deramcontinuidade à obra do pai, tendo mesmo, em 1891, escrito um guia para a Madeira. É de salientar queo Reids Hotel é na actualidade a mais antiga unidade hoteleira madeirense e de todo o espaço atlântico,sendo por isso mesmo um marco emblemático do nosso turismo. A par disso o facto de ali se terem alojadopersonalidades ilustres, como W. Churchill, B. Shaw, G. Marconi, entre outros, leva-nos a concluir quefoi e continuará a ser umas principais salas de visita e acolhimento do arquipélago, uma referência doturismo madeirense.

A Madeira firmou-se, partir da segunda metade do século dezoito, como estância para o turismoterapêutico. A ilha foi considerada por alguns como a primeira e principal estância de cura econvalescença da Europa. No período de 1834 a 1852 a média anual de Invalid’s oscilava entre os 300 e400, na maioria ingleses. Em 1859 construiu-se o primeiro sanatório.

Certamente que a hospitalidade, que não era apenas apanágio dos ingleses, radica as origens nomedieval direito de aposentadoria. O rei, os senhores e comitiva, nas deslocações usufruíam da oferta daestância e alimentação concedida pelos moradores do lugar. A exigência deixou de ser força de lei mas atradição imortalizou-a como uma forma de bem receber. A partir do século XV só deveria ser asseguradaaos oficiais régios ou municipais, que se deslocaram em serviço. Foi na mística hospitalidade que as infra-estruturas hoteleiras deram os primeiros passos. O aparecimento assíduo de grupos esgotava a capacidadede acolhimento e tornava necessária a criação de espaços de acolhimento adequados à qualidade dos

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viandantes. A estalagem e albergue deram lugar aos primeiros hotéis.A actual fase do turismo madeirense começou a dar os primeiros passos no período post Segunda

Guerra Mundial. A guerra fez parar o movimento de turistas obrigando os hotéis a encerrar as portas. Oanúncio do fim da guerra foi o prenúncio da nova era para o turismo madeirense. Em 1952 RamonHonorato Rodrigues chamava a atenção para a promissora indústria, uma vez que está a “desenvolver-seem todo o mundo o hábito ou o prazer de viajar.” Na época a capacidade hoteleira da ilha resumia-se a453 quartos e o número de turistas era de 9131, sendo 142.135 os que transitavam pelo porto do Funchal.

O turismo madeirense foi marcado pela afirmação da época invernal. Finalmente, nos anos oitentaa aposta da Secretaria Regional do Turismo numa animação capaz de realçar alguns dos aspectos quefaziam os cartazes da ilha conduziu a que o turismo perdesse finalmente o carácter sazonal para seconsolidar com a principal actividade económica.

Na década de sessenta o turismo foi o pólo central e único do desenvolvimento da Madeira. Istocontribuiu para o rápido salto no número de camas. Em 1967 tínhamos apenas 2295 camas que subirampara 3832 em 1971, como resultado da construção de novos hotéis como o Madeira Palácio, entãochamado de Madeira Hilton (1969-1971). O salto mais significativo foi a partir de 1973, altura em que seatingiu as 8248 camas. Foi no seguimento desta situação que tivemos a construção de diversos hotéis naárea litoral de S. Martinho. Ao nível dos hotéis Apartamentos tivemos o Lido-Sol (1970),Buganvília(19971). Mimosa(1972) e os Hotéis Gisassol(1973), Duas Torres(1972), Vila Ramos(1972),Esmeralda.

A importância do turismo na economia da ilha conduziu a mudanças ao nível institucional e aomaior interesse e empenho das autoridades. O turismo era definitivamente a principal aposta doarquipélago e o motor do desenvolvimento económico.

O mais antigo hotel da ilha e do espaço atlântico situa-se nesta freguesia. O Hotel Reid, Hoje Reid’sPalace Hotel, é uma referência da hotelaria. No pico da Cruz existiu o Hotel Quisisana, que por serpropriedade de uma empresa alemã acabou encerrado com a II Guerra Mundial.

Hoje a orla marítima da freguesia de S. Martinho pode muito bem ser considerada a zona hoteleirapor excelência. Assim, para além dos diversos complexos balneares que nos últimos anos se juntaram aotradicional Lido, temos o surgimento de diversas unidades hoteleiras, que vieram se juntar aos antigosHotel Reid’s(1891). Das unidades hoteleiras surgidas a partir da década de setenta temos uma forte

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Hotel Girassol

Hotel Gorgulho

Escola de Hotelaria

Apartamentos Turísticos Paraíso Hotel Tivoli Ocean Park

Hotel Crowne Plaza

Hotel Porto MareHotel Navio Azul

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Hotel Regency Palace Hotel Pestana Miramar

Hotel Pestana Grand Hotel Monumental Lido

Hotel Pestana Village Hotel Éden Mar

Hotel Pestana Palms

Hotel Pestana Atlantic Gardens

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Hotel Ajuda Star

Hotel Buganvílea

Hotel da Ajuda

Apartamentos Turísticos Paraíso Hotel Alto Lido

Hotel Estrelícia

Hotel Madeira PalácioHotel Jardins da Ajuda

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Hotel Orca Praia Pestana Atlantic Bay

Hotel Musa da Ajuda Hotel Quinta do Sol

Hotel Vila Ramos Hotel Panorâmico

Hotel do Mar

Hotel Florasol

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Hotel Raga Hotel Sofia

Hotel Mimosa

Rede de Hotéis Dorisol

Village House

Hotel Duas TorresResidencial Monumental

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concentração entre o Ribeiro Seco e a Praia Formosa:

HHoottééiiss:: Madeira Palácio(1971), Vila Ramos(1972), Girassol[1973), Quinta do Sol(1975), Estrelícia[1975),Baía Azul(1989), D’Ajuda(1993), Orca Praia(1993), Cliff Bay(1994), Tivoli Ocean Park(1999),Crowne Plaza Resort Madeira(2000), Madeira Regency Cliff(2001), Monumental Lido(1991),Madeira Panorâmico(1997)

HHoottééiiss--aappaarrttaammeennttooss:: Casa Branca(1972), Alto Lido(1984), Belo Sol(1988), Ajuda Star(1994), PestanaBay(1995), Apart. Turísticos (1996), Turísticos Terrace Mar(1996), Jardins da Ajuda(1997),Apartamentos turísticos Vivenda Avista Navios(1998), Pestana Grand(2004), Buganvília(1971),Duas Torres(1972), Mimosa(1973), Gorgulho(1973), Raga(1975), Florasol(1985), Madeira BeachClub(1987), Éden Mar(1988), Turísticos Baia(1990), Sofia(1993), Pestana Palms(1993), VilaRosa(1995), Musa d’Ajuda(1997), Pestana Village(1997), Victória(1998), Madeira RegencyPalace(1999), Vila Marta(2000), Pestana Miramar(2000), Porto Mare(2000)

PPeennssõõeess:: Vila Vicência(1987), Vila Camacho(1988), Monte Verde(1995), Melba(1993), Monumental(1970)MMoorraaddiiaass ttuurrííssttiiccaass:: Casa do Papagaio Verde(2000), Quintinha Dália(2001), Vila Calaça(2001)EEssttaallaaggeemm:: Quinta da Casa Branca(1998), Quinta Bela Vista(1989), Quinta Perestrelo(1992).

A par disso devemos assinalar o facto de Escola Profissional de Hotelaria e Turismo ter novasinstalações na freguesia desde o ano 2000. A Escola de Hotelaria Basto Machado doi criada em 1967, masa preocupação do Estado começou em 1930 com a comissão de turismo que antecedeu a Delegação deTurismo da Madeira que começou a funcionar em 5 de Setembro de 1936. A mudança para a actualsituação ocorreu em 1978, com a regionalização do sector, o início do actual boom turístico, que levou àplena valorização da orla costeira da freguesia com o aparecimento de novas unidades hoteleiras e serviçosde apoio.

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Regimento de Guarnição nº.3

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Laboratório Regional de Engenharia Civil

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SSEERRVVIIÇÇOOSS EE EEMMPPRREESSAASS..

Na freguesia de S. Martinho podemos encontrar uma panóplia variada de serviços e empresas, quedão vida ao quotidiano da mesma. No âmbito oficial, para além da Escola Profissional de Hotelaria eTurismo, temos a assinalar o Centro de Abastecimento de Produtos Agrícolas (1989), Centro deFruticultura das Quebradas(1987), o Serviço de Protecção Civil, Laboratório Regional de EngenhariaCivil, Laboratório de Controlo de Qualidade de Água, Laboratório de Veterinária. Tudo isto éconsequência lógica do processo autonómico e expressam uma intenção no aprimoramento da qualidadena prestação dos serviços à população. No âmbito cooperativo assinalam-se as Cooperativas Agrícola doFunchal e Agrícola de Produtores de Frutas da Madeira.

A antiga Companhia Portuguesa Rádio Marconi (hoje Portugal Telecom) montou no sítio daVitória uma Estação Terrena de Satélites, propiciando aos madeirenses, a partir de 16 de Novembro de1982, as ligações directas de televisão. As instalações, parcialmente desactivadas, são visíveis quandopercorremos a via rápida para a Ribeira Brava.

As Forças Armadas Portuguesas têm também instalações na freguesia, sendo de salientar oRegimento de Guarnição nº.3, criado a 1 de Outubro de 1993 para substituir os antigos Regimento deInfantaria do Funchal, antigo BII 19, inaugurado em 30 de Outubro de 1970, e o Grupo de Artilharia deGuarnição nº.2.

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Cimentos Madeira

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O RIF (Regimento de Infantaria do Funchal) foi a herança da unidade do Batalhão de Caçadoresnº12, criada no Minho em 1811 que se estendeu ao Funchal em 1864. O regimento extinto em 1899 deulugar ao Regimento de Infantaria nº.13, que desde 1939 ficou conhecido como o Batalhão de Infantarianº.19, popularmente designado de “o dezanove”. As instalações foram, primeiro em edifícios da cidade, esó em 1970, com a construção das novas em S. Martinho, passaram a ter sede própria. A partir de 1 deJaneiro de 1977 passou a ser designado de Regimento de Infantaria do Funchal.

Ainda na freguesia de S. Martinho temos de referir a presença de diversas unidades empresarias nossectores da indústria e comércio. De entre as mais importantes destacamos a ILMA, Cabo TVMadeirense, Cimentos Madeira(1984), Aquimadeira, Recheio, Hiper-Sá e o Fórum Madeira. Naactualidade um dos mais importantes pólos de animação da freguesia é sem duvida o Fórum Madeira,inaugurado a 5 de Abril de 2005. O centro comercial veio valorizar ainda mais este espaço já de si muitoprocurado devido à grande concentração de unidades hoteleiras e espaços de lazer.

A ILMA, como sede num edifício construído entre 1963 e 1972, é o que sobra do sector cooperativoleiteiro da ilha da Madeira, que teve os seus tempos áureos na primeira metade do século XX. A criaçãode gado estabulado foi uma actividade importante da economia rural madeirense e prende-se de formadirecta com as culturas existentes. A perda de importância de algumas culturas e a diminuição da áreaagrícola conduziu à perda de influência do sector, de forma que a produção actual de leite é quase nula,vivendo a empresa de matéria-prima importada.

O quadro das empresas e serviços referidos atestam da real importância que assume a freguesia deSão Martinho no pulsar quotidiano da cidade. O facto de o centro da principal urbe ser um espaçolimitado conduziu a que as freguesias limítrofes assumissem um papel fundamental. Esta realidade torna-se cada vez mais evidente, quando se pensa no reordenamento urbanístico do espaço nobre do concelhoe na necessidade de afastar daí actividades e serviços.

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ILMA

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AS GENTES E O QUOTIDIANO

A História tem sido muito madrasta no reconhecimento do quotidiano como um dado mais dopassado. Raras vezes nos damos conta desta realidade, ficando quase tudo reduzido aos dadoseconómicos, às datas e personagens mais destacados. Resgatar o quotidiano da freguesia é uma tarefa pordemais arriscada, que mesmo assim não deve ser posta de parte. Para além dos dados mais importantesque compõem o esqueleto da história da freguesia é necessário ir ao encontro do pulsar diário das gentes,numa perspectiva histórica, e tentar encontrar alguns elos que prendem ainda o presente.

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Cemitério de S. Martinho

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NASCER, SOBREVIVER E MORRER.

O acto de morrer, por muito que esteja entregue à igreja, passou a contar com a intervenção domunicípio. A lei que determinou a criação dos cemitérios públicos e acaba com a prática dosenterramentos no subsolo do adro e igreja é de 1835. Tardou muito tempo até que todas as paróquiasfossem servidas. O Cemitério de São Martinho tornou-se no século XX no principal da cidade, Assim,como resultado do crescimento da cidade foi necessária a mudança do Cemitério das Angústias para umnovo espaço. O primitivo cemitério foi construído em 1818 para serviço da Misericórdia do Funchal,passando a partir de 1836 para a alçada camarária, de acordo com a nova lei dos enterramentos. Atransferência para o actual espaço ocorreu em 1939, durante o governo camarário de Fernão Ornelas.

Por outro lado a assistência e saúde foram outra das vertentes que pautou a intervenção da Igreja.As cidades portuárias ficaram servidas de hospitais, que davam o necessário apoio aos marinheiros edemais gentes de passagem. A par disso os problemas resultantes da fome, mendicidade e a peste levaram

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Cemitério de S. Martinho

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à criação de inúmeras instituições de beneficência, por iniciativa de particulares, que depois passaram àalçada da igreja.

A partir de 1485 com a bula de Inocêncio VIII iinn iiuunnccttuumm nnoobbiiss a estrutura assistencial ganha umanova forma. De acordo com esse espírito a coroa criou em 1498 o hospital de Lisboa maior que veio acongregar todos os menores aí existentes. O mesmo espírito foi seguido para todas as vilas do reino, porautorização papal de 23 de Outubro de 1501, expresso na carta régia de 4 de Maio de 1507. De acordocom as ordenações régias cabia aos bispos a sua superintendência. É neste contexto que surgem idênticasinstituições nas ilhas. Na Madeira tivemos, primeiro, no Funchal (1507) e, depois, em Machico, Calheta,Santa Cruz e Porto Santo o hospital da Misericórdia.

Temos notícia da abertura em 1866 de um hospital de Tuberculosos na Casa Branca, que terá sidousado para a cura de doentes oriundos da Alemanha.

Em S. Martinho o serviço de assistência na saúde começou por ser feito por um médico municipalsó ficou definido ao nível do estado em finais do século XX, com a construção em 1999 do Centro deSaúde Dr. Rui Adriano Ferreira de Freitas.

As condições sanitárias das habitações e acima de tudo dos aglomerados populacionais. Neste últimocaso a época invernosa tornava as ruas num palco de imundice, sendo constante o apelo à limpeza dasregadeiras e ao calcetamento. As melhorias significativas nas condições de vida dos munícipes são apenasvisíveis a partir da década de trinta. A cobertura de palha cede lugar ao barro e adiciona-se nasproximidades um novo compartimento, que depois passará a fazer parte dos planos da casa. O período,que decorre entre meados do século dezanove e as primeiras décadas do nosso século, foi marcado porinúmeras epidemias que alastraram a toda a ilha. Os efeitos destas chegaram a S. Martinho sendo desalientar que em 1856 com a cólera morbus do total de 2014 mortos do Funchal, 129 eram moradores nafreguesia.

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Cemitério. Campas dos Bombeiros

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Cemitério de S. Martinho

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Fontanário Estrada Monumental, Madeira Palácio Fontanário Travessa das Virtudes

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Fontanário Vitória Fontanário Arieiro

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FontanárioCaminho do Pico do Funcho

Fontanários da Freguesia

FontanárioCaminho da Lombada

FontanárioCaminho das Quebradas

FontanárioJunta de Freguesia

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FONTANÁRIOS E ABASTECIMENTO

DE ÁGUA AO DOMICÍLIO

O abastecimento de água é uma realidade de finais do século XIX. Até então o consumo fazia-se apartir das ribeiras e muitas levadas que circundavam as áreas agrícolas e tinham passagem obrigatória nosnúcleos povoados.

Se o abastecimento público através dos marcos fontanários pode ser considerado uma realidade doséculo XIX, o mesmo não sucederá com o domiciliário que data dos anos quarenta do nosso século. Atéentão o recurso era os fontanários, as levadas, ou a possibilidade, apenas para alguns, de aproveitamentodos sobejos das águas dos marcos fontanários. Este era apenas um privilégio daqueles que viviam próximodos fontanários. A construção de lavadouros municipais enquadra-se na política de salubridade doconcelho. Deste modo evitava-se o uso das levadas, que eram logradouro comum no serviço de água.

Em S. Martinho a disponibilidade de água nas levadas conduziu a que tivéssemos poucosfontanários que aparecem nas localidades de maior concentração populacional. São construídos emcantaria ou então argamassa revestida de azulejo. O mais importante situa-se nas proximidades doCemitério, sendo abastecido com agua das nascente do Poço do Barral. Foi inaugurado em 1840 emhomenagem a D. Pedro, filho de D. Maria II, daí ostentar a lápide com o seguinte: Fonte do PríncipeReal, com as inscrições Câmara Municipal do Funchal 1840 e Reformada em 1852. Já na EstradaMonumental temos outro que ostenta a data de 1870.

Hoje podemos ainda encontrar na freguesia os seguintes fontanários: Caminho da Lombada,Travessa das Virtudes, Caminho das Quebradas, Caminho Poço Barral, Estrada Monumental, CaminhoPico do Funcho, Junta de Freguesia e Vitória.

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FontanárioCaminho do Poço Barral

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EEM - Central Termoeléctrica da Vitória

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A ILUMINAÇÃO E A ELECTRICIDADE

Foi o desenvolvimento do turismo que obrigou as autoridades a avançarem com medidas depromoção de melhores condições de vida aos forasteiros que em muito beneficiaram os residentes. Noséculo dezanove o turismo era uma realidade, mas a ilha parece que não oferecia as melhores garantias aestes forasteiros. A primeira experiência isolada de iluminação com luz de candeeiros de azeite foi em1821, mas foi só em 1846 que José Silvestre Ribeiro determinou a iluminação da cidade com lampiões deazeite.

A luz eléctrica chegou cedo à ilha pelas mãos dos britânicos. De novo a câmara adjudicou em 1881a iluminação da cidade a gás que acabou por ser anulado e entregue em 1884 ao engenheiro EduardoAugusto Kopke, deixando em aberto a possibilidade de uso da energia eléctrica. Mas este plano não foipor diante e em 1895 estabeleceu-se outro contrato para electrificação da cidade, que teve efeitos práticosem 1897 com as primeiras lâmpadas a serem acesas a 19 de Junho. A exploração desde este ano foitransferida para a posse da empresa The Madeira Electric Lighting Company Ltd, que ficou conhecidacomo a Casa da Luz. O serviço de iluminação e fornecimento de energia alargou-se rapidamenteatingindo as freguesias suburbanas.

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As primeiras décadas do século vinte foram de crescimento para a empresa, que em 1909 foiintegrada na General Electric Company Limited, atingindo em 1938 o máximo da sua capacidade deprodução de energia eléctrica. Todavia, a conjuntura de guerra e algumas dificuldades de implantação nomercado doméstico levou os seus promotores a denunciar a concessão em 1944, um ano antes doterminus. Perante esta situação a câmara chamou a si esta responsabilidade, criando em 1949 os serviçosmunicipalizados de Electricidade, que foi de vida efémera, uma vez que a Comissão Administrativa dosAproveitamentos Hidráulicos da Madeira, criada em 1943, recebeu em 1952 o encargo de produção,transporte e distribuição de electricidade em todo o arquipélago, integrando assim os serviços municipais.Um dos principais encargos foi o alargamento do serviço às freguesias rurais, alcançado em 1962. Aconstrução de centrais hidroeléctricas foi a estratégia principal da Comissão que surtiu efeito face àdisponibilidade de água e aos problemas decorrentes da crise energética de 1971, o que veio a permitir aelectrificação das freguesias rurais.

Em S. Martinho a luz eléctrica começou a chegar às diversas localidades já em finais do século XIX,com a electrificação do sítio da Nazaré. Todavia só podemos falar de um plano completo de electrificaçãocompleta da freguesia a partir da década de 50 do século XX com a Comissão dos AproveitamentosHidráulicos da Madeira, concluindo-se o processo já no último quartel do século.

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EEMCentral dos Socorridos

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Escola Básica do 1º Ciclo da Ajuda

Escola Básica do 1º Ciclo da Igreja eantiga Escola Primária

da Ajuda

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AS ESCOLAS E O ENSINO

Até à reforma pombalina o ensino manteve-se sob a alçada da igreja, exercendo aqui a Companhiade Jesus uma acção relevante. Deste modo onde estavam os jesuítas poderíamos contar com a presençade escolas organizadas e por um elevado grau de alfabetização de certos grupos. Também isso contribuiupara a criação de um adequado ambiente cultural, propiciador do aparecimento de importantes vultosdas letras. O colégio dos jesuítas a partir de 1570 permitiu a continuidade dos estudos que haviam dadoos primeiros passos nas escolas de paróquia e também abriram a possibilidade de cursarem nasuniversidades do reino e estrangeiras.

A ausência da estrutura universitária na ilha não foi um drama para a cultura madeirense, tão poucosinónimo da não prossecução dos estudos universitários para muitos madeirenses, ou da falta de espíritocientífico, que pontuou, ontem como hoje, através das tertúlias culturais e científicas. Aliás, muitosmadeirenses singraram na vida universitária do país e estrangeiro e deixaram obra científica renomeada.As condições de prosperidade de muitas famílias madeirenses nos séculos XVI e XVII fizeram com quejovens seguissem se formassem em Cânones, Leis, Medicina e Teologia. Por isso podemos dizer, que auniversidade esteve ausente da ilha, mas o espírito universitário foi muito forte no apelo às novas geraçõespara a continuação dos estudos no reino ou fora dele.

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Escola Básica do 1º Ciclo das Quebradas

Escola Básica do 1º Ciclo da Nazaré Escola da Nazaré

Escola Básica do 1º Ciclo do Areeiro

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A elevada frequência universitária madeirense e o mérito evidenciado, por alguns, relevam aimportância que assumia na ilha o ensino, através das escolas paroquiais ou episcopais. Situação, aliás,corroborada pelo número de indivíduos que, no decurso do século dezasseis, receberam ordens sacras. Acriação da Diocese do Funchal (1514), por um lado, e as decisões do concílio de Trento propiciaram esteavanço no ensino.

Em S. Martinho tivemos no passado alguns que cursaram a universidade e se evidenciaram nasdiversas especialidades. De entre os muitos que os anais da História registam podemos salientar o caso deD. Martinho de Aguiar.

Até 1759, data em que o Marquês de Pombal estabeleceu a extinção dos colégios dos jesuítas e aexpulsão de Portugal, todo o ensino esteve nas suas mãos. É neste momento que se inicia um movimentode renovação dos estudos, de acordo com o que preconizava o movimento iluminista, que se lançou umduro golpe na pedagogia jesuítica. “O Verdadeiro Método de Estudar” (1749) de Luís Verney foi o motepara isso. O Marquês de Pombal para acorrer às despesas das suas reformas pedagógicas lançou em 10 deNovembro de 1772 um novo imposto - o subsídio literário. Era com o dinheiro deste imposto, lançadosobre o vinho, que a coroa custeava as despesas com o relançamento da nova rede do ensino. Um dosfactos mais salientes foi a criação em 1760 da Escola de Geometria e Trigonometria, que funcionou nasdependências do Colégio dos Jesuítas, estando a cargo do sargento-mor Francisco d’Alincourt e o seuajudante Faustino Salustiano da Costa. Esta escola funcionou em moldes semelhantes à Academia Militarde Lisboa. Em 1801 ela foi retomada como aula de Geometria para os militares. Ainda ao nível do ensinoprimário a reforma pombalina permitiu a criação de escolas nas sedes dos concelhos.

A revolução liberal propiciou nova aposta no ensino público como forma de regeneração dasociedade. A partir da década de trinta foi a criação de novas escolas, que em 1848 eram de 33. Areorganização do ensino conduziu ao aparecimento do ensino liceal em 17 de Novembro de 1836 e dasescolas de ensino agrícola e industrial desde 1852. No Funchal o Liceu foi instalado em 12 de Setembrode 1937, ano em que surgiu a Escola Médico Cirúrgica com o intuito de formar médicos e parteiras. Estafoi a primeira estrutura de ensino superior na região e perdurou até 1910, sendo vencida pela República.

De entre os médicos oriundos ou com ligação a S. Martinho podemos referir Paulo PerestreloAragão[1872-1916], filho do morgado António Caetano Aragão, que era natural de S. Martinho, AntónioAlfredo da Silva Barreto[1845-1918] que exerceu medicina na freguesia e tem uma rua com o seunome[rua do Dr. Barreto], Frederico Betti, João Maria Betti, Vicente Gabriel de Freitas[1882-1936],

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Joaquim Gregório Gonçalves[1874-1927], Alfredo Justino Rodrigues[1872-1940].O ensino foi também um dos sectores privilegiados de intervenção do município, mas mesmo assim

não foi capaz de atender com a importância desejada. O principal problema prende-se desde o início coma falta de edifícios escolares. Deste modo havia necessidade de recorrer a edifícios de habitação semquaisquer condições para esta função e situados, a maior parte das vezes, em locais pouco adequados.Acresce ainda que a separação das crianças por sexo e a proibição da mistura no recinto da escolaaumentar as dificuldades de escola das instalações mais adequadas. As instalações, conservação e mobília,o pagamento do salário dos professores e casa eram da competência da Câmara. Apenas num lapso detempo esta responsabilidade ficou endossada às Juntas de Paróquia, de acordo com portaria de 6 deDezembro de 1880. Nova lei fez retornar tal responsabilidade às Câmaras.

A criação de novas escolas e as reformas do ensino não foi insuficiente para banir o analfabetismodo arquipélago que se manteve até finais do século XX sempre elevado. Assim, entre finais do século XIXe princípios do século XX o grupo de madeirenses que não sabia ler nem escrever representava mais deoitenta por cento da população e só a partir dos anos sessenta foi inferior aos cinquenta por cento. Deentre as reformas do ensino merece destaque a de 1895, por ser de iniciativa do madeirense Jaime Moniz(1837-1917). O combate em favor do ensino e de propostas reformadoras do mesmo conduziram a que oliceu do Funchal merecesse o seu nome a partir de 1919. Todavia a dignificação da instituição de ensinosó será possível a partir de 1933 com o projecto de um novo liceu, que só foi inaugurado em 1946. Omesmo sucederá com a Escola Industrial, criada em 1889, mas que só teve instalações próprias em 1958.A partir da década de setenta a reforma do ensino vai permitir uma maior abertura à frequência dosdiversos graus de ensino a todos os estratos sociais, acabando por dar um golpe evidente no analfabetismo.

Na freguesia de S. Martinho a primeira escola municipal, para o sexo masculino, foi criada em 1841e só em 1846 tivemos a primeira escola feminina. Em 1940 são referenciadas escolas na Ajuda, RibeiroSeco, Vitória, Várzea, Areeiro, amparo, Pico do Funcho e Lombada. Hoje a freguesia está servida deescolas dos diversos níveis de ensino. Começa-se com os Jardins de infância e creches: O Carrocel, OGirassol, Primaveras, João de Deus. Junta-se as Escolas do primeiro ciclo na Nazaré, Ajuda, Igreja,Areeiro e Quebradas. E conclui-se com a Escola João Gonçalves Zarco nos Barreiros que contempla o 2º,3º ciclos e secundária.

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Escola Básica e Secundária João Gonçalvez Zarco

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A HABITAÇÃO

A habitação tornou-se hoje numa aposta preferencial do conforto humano. Mas nem sempre foiassim por falta dos meios e condições para tal. Numa ilha como a Madeira, onde os recursos são escassose desde o início repartidos de uma forma desigual, é evidente a dicotomia entre pobres e ricos, que temmaterialização no habitat através das furnas e quintas. O reaproveitamento das concavidades naturais darocha, o cavar a própria habitação, a choupana contrastam com a imponência e luxo das quintas servidasde casa do senhor, dos criados e espaços de diversão como a casa de prazeres. Esta dicotomia está patentena visão da ilha que nos dão os estrangeiros a partir do século XVIII.

O progresso económico e a disponibilidade dos materiais vão melhorando aos poucos a qualidadedo espaço habitado. O Funchal do século quinze, a vila modesta que ganhou forma na zona de SantaMaria do Calhau, era constituída de casas térreas, maioritariamente de madeira e cobertas de colmo.

De entre a nomenclatura mais usual da habitação madeirense podemos distinguir a furna, achoupana ou palheiro e a casa. O reaproveitamento das furnas, não apenas como habitação, mas tambémcomo armazém e palheiro do gado não é novidade. É a sobrevivência de uma tradição primitiva cujatécnica chegou à ilha por mão dos colonos sejam eles portugueses ou das Canárias. Para os primeirospovoadores que chegaram à ilha este deverá ter sido o primeiro recurso. Mais a importante oferta de

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Casa à Estrada Monumental

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Casa antiga

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madeiras permitiu depois progredir para as casas de madeira de sobrado. Segundo os cronistas da épocaas madeiras da ilha revolucionaram a construção de casas em Lisboa, permitindo o avanço das desobrado.

A primeira casa construída por Zargo no Funchal, de acordo com Gaspar Frutuoso ao alto de SantaCatarina onde a sua mulher construiu uma igreja, foi deste tipo. Depois avançou ao longo da Ribeira efez construir no Pico Frias, próximo da capela de S. Pedro e S, Paulo, aquela que foi a primeira habitaçãode pedra erguida na ilha. E finalmente assentou morada, no actual espaço da Quinta das Cruzes. Estasim já uma habitação sobrada e com excepcionais condições de comodidade. É este o processo quecomanda a evolução da habitação na ilha. Enquanto uns permanecem a viver em choças ou furnas outroshá que conseguem meios para progredir.

As casas de madeira, que depois avançam para a pedra, cobertas de colmo são quase sempre térrease de um único compartimento, sendo as divisões feitas em cana vieira ou esteiras de palha. A coberturade colmo persistiu no meio rural até a actualidade, sendo de diferenciar dois tipos: o da chamada casa deSantana que mantém toda a estrutura de madeira e o de alvenaria e sobrado. À casa rural associa sempreuma segunda construção, normalmente furna, para a cozinha, de modo a precaver contra incêndios, e osanexos para o parco e gado bovino, isto é o palheiro e chiqueiro. A partir de finais do século dezanove évisível o progresso da habitação rural, fruto dos proventos do retorno da emigração. Assim, as casas sãode alvenaria e telha e passam a ter várias divisões. A cozinha é integrada na casa, enriquecida com umforno e uma altaneira chaminé. As habitações eram terra batida, apresentando as paredes em madeira oupedra solta e a cobertura de colmo. Era servida de uma abertura baixa que servia ao mesmo tempo dejanela e porta. No interior escuro, de apenas um compartimento, podia-se ver uma ou duas camas, umamesa, uma arca e algum banco corrido e banquinhos. Próximo estava uma minúscula cozinha e à voltacirculavam livremente galinhas, porcos, pombos e o cão.

Na cidade a evolução da casa é muito mais rápida e procura corresponder às exigências dos seusocupantes. Ao lado das casas térreas começam a surgir as de sobrado, de um ou mais pisos. Nosarruamentos dedicados aos diversos ofícios o rés-do-chão era dedicado para loja, tenda e oficina, sendo opiso habitado pelo mestre e o sótão pelos oficiais e aprendizes. O mesmo sucedia com os mercadores deaçúcar ou de vinho que tinham o piso térreo dedicado à loja ou armazém e o sobrado para habitação.

A quinta madeirense é um espaço único onde se juntam o luxo e opulência dos aposentos, com ogarrido e deslumbre das flores e árvores exóticas e as terras de lavoura comas latadas onde repousam as

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Casa antiga

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videiras. Desde o século XVI que se sabe da sua existência na meia-encosta sobranceira ao Funchal, sendolocais de veraneio para as principais famílias que vivem na cidade. Foram os principais locais deacolhimento dos doentes da tísica no século XVIII, ficando o registo do seu ambiente e riqueza nasdescrições que estes nos legaram.

S. Martinho, por se situar na periferia do Funchal, dominando uma extensa zona de costa,apresenta várias quintas. Algumas delas estavam bem situados em termos da visualização do Funchal elitoral. Daí o nome que ostentam, como Bela Vista ou Avista Navios. Hoje, as que resistiram à destruição,foram maioritariamente adaptadas a unidades hoteleiras, seguindo a tradição dos séculos XVIII e XIXem que foram locais de acolhimento de viajantes e inúmeros doentes da tísica pulmonar, que buscavamos ares da ilha na busca de uma solução de cura. Por força disso acolheram aristocratas, políticos,cientistas e escritores.

De entre as muitas quintas podemos ficar com as mais conhecidas, que são Quinta do Esmeraldo,Avista Navios, Pilar, Casa Branca, Virtudes, Calaça, Bela Vista, Magnólia, Perestrelo, Santa Rita. Naultima esteve, desde 8 de Agosto de 1931, o British Country Club e desde 1980 passou para a posse daregião, abrindo-se ao público a 1 de Maio de 1981. Aí estão sedeados os Serviços de Protecção Civil daMadeira. A Calaça, mandada construir por Henry Veitch, um dos mais destacados mercadores britânicosdo século XIX, que foi cônsul de Inglaterra, é hoje a sede do Clube Naval do Funchal. Aqui estevehospedado um príncipe polaco. A Esmeraldo, tem a particularidade de ter sido a residência e local defalecimento a 21 de Janeiro de 1950 de João Reis Gomes (1869-1950), ilustre literato madeirense. Emposse da Condessa de Ribeiro Real foi doado ao Asilo de Mendicidade do Funchal. A Avista Navios aosítio da Nazaré deverá ser do século XVIII, pois ostenta no frontão da entrada a data de 1760. Em 1995foi declarado como bem do património cultural edificado da RAM e classificado de valor Cultural.

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Casa antiga

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Quinta do Esmeraldo

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Quinta da Bela Vista Quinta Vista Alegre

Quinta do Avista Navios Quinta do Pilar

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ALIMENTAÇÃO, MERCADOS, VENDAS...

O pão, elemento fundamental da dieta, apresentava-se sob a forma de confecção caseira ou porpadeiras de profissão. Em muitas das casas o forno assume um lugar de prestígio social. E ainda hojepodemos ver vestígios destes no Bairro de Santa Maria e Corpo Santo. Noutros casos havia os fornospúblicos, servidos por forneiros que cobrava uma percentagem por cada alqueire de pão cozido. Já noprimeiro quartel do século XX a cidade estava servida de um conjunto variado de padarias quedispunham de pão fresco pela manhã e tarde, permitindo comer-se o pão fresco a todas as refeições. Coma farinha dos cereais fabricava-se, para além do pão, o cuscuz, uma espécie de massa granulada, quedepois é cozida e acompanha a carne, o bolo do caco, as mal-assadas, isto é, massa de farinha com ovoscozidos no azeite, o frangolho, uma papa de farinha de trigo estraçoado e o gófio. Temos ainda aescarpiada, uma massa de farinha de milho cozida em pedra de barro, que se consumia no século XVIIIno convento da Encarnação e que hoje persiste no Porto Santo.

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Quinta Perestrelo

Quinta de Santa Rita

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Quinta Magnólia

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A venda dos produtos necessários à subsistência das populações fazia-se em mercados e feiras que serealizavam diariamente ou uma vez por semana em espaços determinados, onde se vendia fruta, peixe eoutros mais produtos. Na cidade o mercado desde o século XV é um espaço de permanente intervençãodo município no sentido de facilitar a livre concorrência, salvaguardar a qualidade dos produtos à vendae o seu justo valor. No século dezanove testemunham-se três mercados na cidade. O primeiro de D. Pedro,também conhecido como da feira velha, situava-se entre o Largo dos Lavradores e o Largo do Poço, maispropriamente nas traseiras da actual alfândega. Era o mercado de venda de legumes, hortaliças, frutos eoutros géneros alimentícios. Foi o principal mercado da cidade até que em 1 de Dezembro de 1940 abriuao público o actual mercado dos lavradores. A este juntam-se os da União, no actual Largo da Feira e ode São João, no sítio onde hoje está implantado o Teatro Municipal. A venda dos produtos fazia-se e faz-se em barracas arrematadas à câmara pelos chamados barraqueiros.

O mercado apresentava por norma os produtos da terra, enquanto a venda dava preferência aos defora. A oferta dos produtos completava-se com os vendedores ambulantes ao domicílio. Estes últimosvendiam líquidos, como azeite, vinagre e leite, hortaliças, aves, lenha e carvão. A figura do leiteiro queainda hoje sobrevive define também uma forma de venda de leite fresco ao domicílio. Ademais osinteressados podiam ainda encontrar na cidade vacarias onde se servia o leite fresco, ordenhado nomomento. Era assim na vacaria Burnay no Largo da Sé e da vacaria Sousa na Rua de João Tavira. A ilhaapresentava em 1928 cento e setenta mil vacas de ordenham que produziam vinte milhões de litros. OFunchal consumia anualmente um milhão e quinhentos mil litros de leite, o que equivale a cerca de quatromil litros diários. O restante leite era usado no fabrico de manteiga e queijo. Em 1928 a produção demanteiga orçava as mil toneladas, sendo exportado mais de três quartos. Esta situação é demonstrativa dorápido incremento que teve a actividade na região uma vez que em 1880 a exportação foi de apenas centoe vinte e nove kilogramas.

No campo da alimentação a freguesia pouco se diferencia das demais, sendo insistente a presençados produtos que identificam a culinária madeirense nas diversas épocas. Mesmo assim podemosidentificar alguns pratos que podem definir o cardápio da freguesia: carne de vinho e alhos, bacalhau deS. João, lombo de porco e carne assada na panela ou no forno.

O abastecimento local fazia-se a partir das mercearias e tabernas. Aí vendia-se, em simultâneo,bebidas, nomeadamente o vinho da produção local, géneros alimentícios e artefactos locais ou deimportação. A abertura de um estabelecimento obrigava ao requerimento da licença que só poderia

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Forum Madeira

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ocorrer da necessária autorização camarária depois do pagamento de uma taxa. Ao infractor eraatribuída uma pesada multa. Acrescem ainda outros requisitos que foram regulamentados ao longo dotempo. Assim, em 1931 a sua localização deveria estar a mais de 500 metros de distância das escolas. Eantes havia-se estabelecido padrões de higiene e sanidade no funcionamento. De acordo com regulamentode 1946 todos os estabelecimentos comerciais foram obrigados, num prazo de noventa dias, a ter águacanalizada e pia, caso se situassem a mais de 100 metros da canalização pública a obrigação revestia-se napresença de um reservatório de barro com capacidade para 50 litros. Por outro lado os génerosalimentícios deveriam ser guardados em prateleiras envidraçadas ou caixas fechadas. Depois foi aproibição a partir do dia 1 de Junho de vender no mesmo compartimento os géneros alimentícios, tintas,óleos, guanos, sulfato de cobre e substâncias tóxicas ou nocivas à saúde.

Em todos os tempos existiram os espaços abertos ou fechados de venda pública dos produtos. Ocorrer dos anos apenas fez mudar os locais ou a designação, bem como aperfeiçoou os hábitos deconsumo. A par disso é de salientar na cidade e localidades circunvizinhas outro tipo de venda ambulanteque contemplava, não só o leite, como também,.o azeite, petróleo, hortaliças, aves, cebolas, mel, sorvetese outros gelados, carvão vegetal. A década de sessenta demarca um momento importante da evolução dasestruturas de apoio à venda dos produtos alimentares. As vendas perderam actualidade dando lugar anovas formas de apresentação e venda com os supermercados. Eles são o princípio da transição para asactuais grandes superfícies, que se iniciou em 1963 com o supermercado BACH.

Em S. Martinho tivemos diversas vendas, sendo poucas que ainda persistem no tempo, por força doaparecimento das grandes superfícies, que têm nesta freguesia diversas unidades. Primeiro tivemos osupermercado Lido-Sol, que depois se associou ao Grupo Pingo Doce, que hoje detém um hipermercadono Madeira Forum. Ainda na Nazaré temos o hipermercado Super-Sá.

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FESTA E DIVERSÃO

Para o madeirense o momento festivo mais importante e de maior significado e sem duvida oNATAL, que se demarca como o ponto de chegada e partida do calendário litúrgico. A prova esta patentena afirmação deste momento: o NATAL madeirense é a FESTA. Em lugar secundário surgem asfestividades ao longo do ano com particular incidência na época estival. A maioria tem lugar nos mesesde Junho a Setembro. Temos notícias da vivência do Natal na Freguesia para o ano de 1947: Na tarde denatal, dezenas ou centenas de pessoas dividiam-se em passeio pelo Pico dos Barcelos, da Cruz e doFuncho.

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Lá aparecem as inocentes diversões e os cantores tradicionais, ao mesmo tempo que se dão oscumprimentos de boas festas. Aos conhecidos e amigos.

Da primeira oitava até ao dia de reis- são ranchos e grupos de famílias, de crianças- que passampelos caminhos em visita aos parentes mais ou menos próximos.

Do dia de reis em diante, as festas deixam de ter aquele carácter intimo, particular da família, paraentão estender-se a estranhos sobretudo os habituais e habilidosos, para as cantadas de reis.1

Os arraiais madeirenses são a componente mais evidente das festas e romarias. De todos, os queadquirem maior brilhantismo, são os que têm lugar nas romarias tradicionais. A devoção popularizou-seao longo dos últimos cinco séculos, de modo que estas romarias são momentos de grande movimentaçãodas gentes. Primeiro a pé, pelos caminhos íngremes que ligavam a ilha de Norte a Sul. Os meses de Julho,Agosto e Setembro são os de maior devoção e festividades. O clima, as tarefas agrícolas (apanha doscereais, a vindima) favoreciam a movimentação das gentes, mesmo quando a orografia da ilha osatraiçoava. A pé ou a cavalo todos se deslocavam para o Monte ou Ponta Delgada.

Para apoio de romeiros abriram-se caminhos, construíram-se casas de romeiros junto dos templosde devoção. Algumas das construções, geminadas com as igrejas, são, ainda hoje, visíveis. A par disso,havia, entre todos, um espírito de solidariedade para com estes. Os moradores acolhiam -nos dando-lhes,por vezes, guarida. Depois, com o avanço da rede de estradas a partir da década de quarenta, estes deramlugar os excursionistas. As filas intermináveis de “Horários” e “abelhinhas”. A abertura de estradasfacilitou o contacto e acabou com o isolamento, mas, em contrapartida, veio retirar o bucolismo dosromeiros, que calcorreavam a ilha de norte a sul à busca do santo de sua devoção para retribuir a graçaconcedida. Não mais se ouviu ecoar as cantorias dos romeiros. O rajão, o machete e as castanholasemudecerem e nas serras da Encumeada e do Paúl da Serra apenas se ouvirá o murmúrio do vento. Atradição ainda testemunha a vivência dos romeiros.

O folguedo ou arraial, no espaço vizinho da igreja/capela do orago é efémero. Dura quarenta e oitohoras. Mas, para que isso aconteça há todo um trabalho engenhoso e arte na criação das flores ou dos tapetespara a procissão. Os enfeites, de alegra-campo e loureiro, contrastam com o garrido das flores e o vermelhoda Cruz da Ordem de Cristo que flutua nas bandeiras. O progresso trouxe mais luz e o feérico da cor,fazendo-os prolongar pela noite fora. A luz eléctrica, a partir da década de quarenta, veio revolucionar oarraial. Aqui, para além da oferta de um variado conjunto de barracas de comes e bebes, onde pontua aespetada, temos a feira para venda dos produtos da terra ou de fora. É o momento de encontro, devoção e

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Matança do Porco em S. Martinho

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partilha da riqueza arrancada à terra. A festa do orago era um momento importante na vida das gentes dalocalidade. Ao divertimento e devoção juntam-se os contratos, negócios e aventuras. Afinal, o arraial era ummomento único em que todos se encontravam irmanados pela devoção ao santo padroeiro.

O calendário das festas e estabelecido de acordo com o ano 1itúrgico e agrícola, sendo no primeiroque esta realidade tem a sua máxima expressão: enquanto estas celebram os principais momentos da vidada igreja e dos santos, as segundas demarcam o período das colheitas de um determinado produto, quecativava a vira das gentes da ilha ou da localidade em que têm lugar. As últimas são de criação recente,tendo algumas surgido nas duas últimas décadas da cereja, das vindimas, ao pêro e da maça, enquanto asprimeiras remontam aos primórdios da ocupação da zona. Os iniciais povoadores da Madeira,maioritariamente do norte de Portugal, trouxeram impregnado no corpo as tradições religiosas efestividades do calendário litúrgico.

Em S. Martinho a festividade mais importante tem lugar em pleno Inverno, em honra do santopatrono da freguesia, o S. Martinho. A 11 de Novembro ao preceito tradicional da visita às adegas paraprovar o vinho temos a festa em honra do santo na igreja sede da paróquia. Por outro lado esta igreja éainda palco de outras festividades ao longo do ano. Em 24 de Junho celebra-se o S. João e no terceirodomingo do mesmo mês temos a festa do Santíssimo Sacramento. Temos ainda a referir as festas em honrade Nossa Senhora da Nazaré, a 1 de Janeiro, e a de Santa Rita no último Domingo de Maio, nas paróquiasdo mesmo nome.

Ainda na freguesia de S. Martinho podemos assinalar as festividades organizadas pela Junta deFreguesia, que se prolongam por todo o ano de acordo com o calendário das festas. Em Fevereiro o cortejode Carnaval, com a participação das escolas. Em Junho o dia Mundial da Criança com a realização deJogos Tradicionais Inter-Escolas. Nos meses de Verão (Julho a Setembro) acontecem todos os sábados“noites de Verão no Largo de S. Martinho, com música tradicional madeirense. Entretanto em Agostotemos o Festival de Folclore de São Martinho, em Novembro o circuito de atletismo e em Dezembro a“função do porco”.

No passado o porco assumia papel fundamental na dieta familiar e em torno dele existia um ritualligado às festas natalícias. Não havia casa onde pelo S. João e Natal não acontecesse a célebre matançado porco. Com ele conseguia-se a carne salgada, os enchidos e a banha que tornavam mais rica a dietaalimentar. Era o principal tempero da alimentação do meio rural.

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Praia Formosa

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A BANHOS

As interdições estabelecidas pela Igreja à exposição higiene do corpo vieram juntar-se as posturascamarárias proibitivas dos banhos na praia e ribeiras do Funchal, Machico Porto Santo; de acordo com apostura da Câmara do Funchal de 26 de Julho de 1839 estava proibido aos funchalenses o banho de marnus» só se permitindo em calças ou camisa, “até abaixo do joelho” os infractores sujeitavam-se a uma pesadacoima de mil réis. Hoje, ao invés, tornou-se moda o topless e as praias de nudismo. Diz-se que os primeirosque se banharam nas águas límpidas da ilha foram João Gonçalves Zarco e seus companheiros quando em1420 se refugiaram nas águas refrescantes do mar para fugir ao calor infernal do incêndio que se ateou nafloresta da ilha; segundo Cadamosto estiveram no mar “mergulhados até à garganta dois dias e duas noites,sem comer nem beber, pois que de outra maneira teriam morrido”. Mas este banho foi a preceito com todasas vestes que traziam no corpo. Já em 1850 se referia nos anais do município da ilha do Porto Santo que assuas praias eram propicias aos banhos de mar mas que não atraiam forasteiros por falta de conduções e osnaturais estavam limitados pelas posturas. Na realidade a revelação como uma estância balnear é do nossoséculo. Estranhamente vimos num texto de Giulio Landi de cerca de 1530, que os naturais do norte da ilhada Madeira tinham por hábito “ir à praia”; não sabemos se com isso entendia o autor o ir-se a banhos ou aum mero passeio para desfrutar da aragem marinha e contemplar o imenso mar.

S. Martinho é o espaço mais importante da estância balnear madeirense, associada aos forasteirosou aos locais. No passado tivemos vários projectos de valorização da orla marítima, surgindo em 1921 umplano de ideias para a Praia Formosa que a pretendia transformar numa praia de banhos e diversões.Primeiro surgiram as piscinas do Lido, um marco do Verão madeirense até a actualidade. Em 1932tivemos o projecto de uma piscina pública “para banhos e exercícios de natação” na zona do Gorgulho.

A construção hoteleira das últimas décadas do século XX incidiu nesta área que se transformounuma zona privilegiada da cidade, que em 1982 viu melhorado o complexo balnear do Lido e em 1993 aabertura do passeio público marítimo. A área ganhou maior dimensão em época recente mercê da politicamunicipal de valorização da orla marítima com diversos espaços balneares e uma promenade. A tudo istojuntam-se clubes privados, como o Clube Naval do Funchal e o Club de Turismo.

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Praia dos Namorados Praia do Arieiro Praia Formosa

Praia do Lido

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Praia dos Namorados

Piscinas da Ponta Gorda

Promenadedo Lido

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Esquadras de navegação terrestre

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AS ESQUADRAS DE NAVEGAÇÃO TERRESTRE

A segunda metade do século XIX é definida por uma conjuntura difícil para as diversas classessócio-profissionais, mas é também o momento de despoletar de uma consciência delas para oassociativismo, ou a busca de soluções que propiciassem a assistência e protecção aos trabalhadores nosacidentes, doença e velhice. A tudo isto acresce o filantropismo social de ajuda aos mendigos, crianças eviúvas. Deste modo a partir de meados da centúria o mutualismo, o cooperativismo e o associativismosócio-profissional foram a solução capaz de minorar as dificuldades com que se debatia a população.

Às associações de classe juntaram-se as filantrópicas e de diversão. Na segunda metade segeneralizou a criação de clubes destinados ao recreio e distracção dos sócios. Estas associações eram umaforma de quebrar a monotonia do quotidiano e enquadram-se no espírito de associativismo que marcoua centúria. Estes clubes primavam pela realização e bailes e “soirées” que contavam com a participaçãode residentes e forasteiros. Aliás, era tradição destes clubes receber nas suas instalações as personalidadesilustres que passavam pela ilha.

Esquadra Submarina de Navegação Terrestre em manobras na freguesia de S. Martinho Praças da ESNT, 1909

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Não faltava ao madeirense imaginação para encontrar formas de diversão e de passar o tempo.Deste modo na década de oitenta do século XIX afirmaram-se as chamadas esquadras de navegaçãoterrestre, mas o seu espírito é muito anterior, pois desde a década de quarenta da centúria que se sucedemeste tipo de confrontos lúdicos tendo como base o confronto entre miguelistas e pedristas. Nestas não sãoestruturas militares mais sim de boémios que se juntavam sob a capa do ritual da marinha. Nas quintassobranceiras ou não ao mar ergueram-se os mastros engalanados com bandeirinhas e uma peça de fogo.Ficaram célebres as quatro esquadras: Esquadra Torpedeira, Esquadra Submarina, Esquadra Couraçada,Esquadra Independente. O espírito era levado a sério aparecendo os associados em actos públicosfardados a rigor. As actividades resumiam-se a alguns desfiles dominicais e nos dias feriados, passeios a péou ao longo da costa e acima de tudo aos assaltos combinados às adegas para o tão esperado repasto. Oespírito da marinharia portuguesa em terra era assumido na sua plenitude e conduziu a alguns equívocosem 1901 com a visita do rei D. Carlos.

A partir de 1914 as dificuldades sentidas com a guerra conduziram ao refrear da iniciativa dasesquadras. A guerra conduzirá ao apagamento das “eessqquuaaddrraass ssuubbmmaarriinnaass ddee nnaavveeggaaççããoo tteerrrreessttrree”.Acabou o aparato de rua e o movimento em torno dos mastros e miradouros transferiu-se para espaçosrecatados. As associações de boémios assumem este carácter interior, por vezes fechado e elitista. A grandeaposta ficou para a mesa e jogos da fortuna e azar que ajudavam a passar os fins de tarde e noite. A NNaauusseemm RRuummoo, cuja data de aparição não está devidamente revelada, ganhou dimensão a partir da décadade trinta do século XX retomando este espírito das eessqquuaaddrraass ssuubbmmaarriinnaass ddee nnaavveeggaaççããoo tteerrrreessttrree, agoratransferido para dentro de portas e tendo como palco a mesa e o bacalhau com o inseparável amigo.

As ditas esquadras surgem em finais da centúria oitocentista com carácter boémio, mas nos últimosanos aprimoram a sua presença como força armada à imagem da marinha. A primeira destas esquadrasfoi fundada por Eduardo Sarsfield e tinha sede na residência do mesmo na Casa Branca.

Oficiais da ESNT

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O FOLCLORE E A HISTÓRIA

De acordo com Carlos Santos as cantigas e bailados “São como que a presença do passado, atrásda qual é possível ver em espírito o panorama comovente da terra virgem; é ouvir ainda as enxadas moirase algarvias a rasgar-lhe a carne até aí pura de contactos humanos; é assistir ao poético ressurgimento das

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vilas e aldeias como fogachos da vida, de cor e de movimento; é passar ao convívio dos nossos avôs nasduras azafamas de dar vida a coisas mortas, com todo o seu sabor medieval; é sentir com eles a sensaçãodo desconhecido. É nosso dever defendê-los e honrá-los não consentindo nem arremedos de investigandonem que esfarrapem o que ainda possa meter de ancestral e muito menos os amortalhem comexcrescências, detestáveis e falsas; é nosso dever fazer reintegrar os camponeses no que é verdadeiramenteseu, tradicional e histórico e despertar-lhes o já muito abalado entusiasmo pelas suas cantigas e bailados”.

Tal como afirma Eduardo Clemente Nunes (1948-49), o Folclore nasce de forma espontânea “daalma popular, cria-se por influência da natureza física e psicológica do meio ambiente, traduz a origem e

índole atávica das populações, repercute-se nasensibilidade colectiva e tem força decontinuidade por força da tradição”.

Durante muito tempo as danças ecantares só eram audíveis e visíveis no seuquadro natural, isto é, nos arraiais e diversosmomentos do labor agrícola. Todavia, noséculo dezanove foi sentida a necessidadesimultânea de estudo e recriação comoespectáculo. A primeira vez que isto aconteceufoi na primeira feira organizada peloGovernador Civil, José Silvestre Ribeiro, naPraça Académica em 1850, onde um grupo decamponeses com trajes antigos dançaram obaila a la moda. Esta manifestação, que portradição se oferecia na procissão do Corpo deDeus, com grupos de S. Martinho, perduroupor cerca de dez anos com estas tãocaracterísticas danças. A mesma dança foi denovo recreada em 1898 por um grupo decrianças. A partir de então em muitos dosbailes e espectáculos estava presente e ficou

Grupo Folclórico e Recreativo de S. Martinho

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conhecido com o baile dos vilões.Paulatinamente a cultura popular vinhaadquirindo uma dimensão importante nolazer dos funchalenses. Em 1901 el-rei D.Carlos foi saudado com um arraial madeirensee em 1920 os festejos do quinto centenário dodescobrimento da Madeira as danças a lamoda e o bailinho das camacheiras. A partirda década de trinta manteve-se esta forteparticipação do folclore nos actos maisimportantes de acolhimento de visitantes edesde 1936 nas festas da cidade e das vindimas(1938), com grupos das diversas freguesiasrurais.

A primeira presença do baile dascamacheiras nos festejos urbanos data de 1929,mas só dez anos após surge identificado comoo Rancho Folclórico da Camacha e apenas em1949 surge o Grupo Folclórico da Casa doPovo da Camacha. Os cinquenta e sessentaforam demarcados pela criação de diversosgrupos folclóricos e na década de oitenta osServiços de Extensão Rural imprimiram uma nova dinâmica das Casas do Povo, com a aposta nodesenvolvimento sócio-cultural das populações rurais, esteve na origem e criação de grupos folclóricos emquase todas as freguesias da ilha. Por outro lado a partir 1985 deu-se início ao Festival Regional de folclore,a que em 1989 se associou as 24 Horas a Bailar.

O povo de S. Martinho integra-se neste espírito lúdico do trabalho e lazer, persistindo algumastradições, como danças e cantares, de que os agrupamentos folclóricos são o principal testemunho esavaguarda.

Hoje em S. Martinho temos os grupos folclóricos de Santa Rita e de São Martinho.

Grupo Folclóricode Santa Rita

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Grupo Desportivo Alma Lusa Centro de Ténis da Madeira

Clube Amigos do Basket Clube Naval do Funchal

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DESPORTO

A freguesia tem tradição na prática desportiva e o nome figura em letras douradas por força de oprimeiro estádio de Futebol da região estar aí sedeado. Sabe-se que desde tempos recuados nas vertentesdo Pico da Cruz existiu uma carreira para a corrida de cavalos. Depois tivemos aí a criação da primeiraagremiação desportiva. O Excelsior Madeira Cricket Club, que tinha no sitio do Engenho Velho, desde1894, um espaço para a pratica de várias modalidades desportivas. Aí praticava-se entre outras modali-dades o Hoquéi de Campo. Há ainda referência à intenção da Junta Agrícola da Madeira de construir umcampo de Golfe em S. Martinho, como uma iniciativa do Visconde da Ribeira Brava para promover oturismo madeirense. Entretanto, em 1932 a Câmara estabeleceu na zona do Gorgulho uma piscina 2courts de deck-Tenis.

Grupo Desportivo Barreirense

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A prática do Desporto está devidamente acautelada na Freguesia. Aqui temos diversas associaçõesdesportivas, como uma ampla oferta de instalações desportivas. Acontece mesmo que foi nos Barreirosonde durante muito tempo se praticou o Futebol de alta competição. O Estádio dos Barreiros foi construí-do na década de cinquenta para ser o principal espaço dos eventos desportivos do arquipélago. A inaugu-ração aconteceu a 5 de Maio de 1957, A electrificação do campo em 1967. Começou por ser um projec-to do Clube Desportivo Nacional, aberto à prática da modalidade em 1927. A sua degradação levou aJunta Geral a intervir em 1938. Todavia coube à câmara, em 1947, a proceder aos estudos para um novoestádio, que começou a construir-se no local em 1953.

Para além desta infra-estrutura temos outros espaços para a prática do desporto, como os campospolivalentes do Bairro da Nazaré, o complexo Desportivo de São Martinho e o Complexo Desportivo doClube Naval do Funchal na Nazaré. De entre as associações desportivas temos: Clube Desportivo “OBarreirense”, Grupo Desportivo “Alma Lusa”, Centro de Ténis da Madeira, Centro de Atletismo daMadeira, Clube Amigos do Basquet, Associação de Voleibol da Madeira, Associação Cultural, Desportivae Recreativa de São Martinho, Clube Pés Livres-Associação de Montanhismo. Antes destes tivemos diver-sos clubes locais nos Piornais, Nazareth, Barreirense.

O Barreirense foi fundado a 25 de Setembro de 1925 por António e Luís Jasmins, António Carlosde Sousa, Joaquim Ramos. Era o clube do sítio onde existia à época o campo de futebol, que rivalizavacom o de Almirante Reis, do Marítimo. A construção do Estádio dos Barreiros pelo Clube DesportivoNacional foi quem deu a iniciativa de criação do novo clube, 1ue desde 1934 está inscrito na Associaçãode Futebol do Funchal. A sede à rua do Dr. Pita foi inaugurada na década de quarenta pelo então presi-dente da câmara, o Dr. Fernão de Ornelas.

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Estádio dos Barreiros

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O Vestuário e a Moda.

Desde Adão e Eva que o homem sentiu a necessidade de cobriro corpo. Esta necessidade levou o homem a procurar todos os meios,produtos e técnicas para conseguir os tecidos e as cores mais ajustadasao seu gosto. Paulatinamente aquilo que havia surgido como umanecessidade torna-se numa exigência de fausto e luxo. Isto conduz-nosao aparecimento dos acessórios e da moda.

As culturas da cana-de-açúcar e da vinha permitiram à ilha umaligação com o mundo europeu e centros produtores de tecidos:Inglaterra, Flandres e as cidades italianas. Aliás às ilhas está ligadauma fase importante na evolução da indústria têxtil europeia, com aexpansão da área de cultivo do pastel e apanha da urzela, plantas comgrande importância na tinturaria. A Madeira ficou conhecida pelosgenoveses, no século XV, como a ilha do pastel. Note-se, ainda, que ocomércio do vinho em mãos dos ingleses definiu uma política peculiar:os adiantamentos. O mercador inglês adiantava ao lavrador osalimentos, artefactos e tecidos a troco do vinho, na altura da vindima.Aliás, fala-se de assíduas trocas, entre os madeirenses e os marinheirosingleses, de passagem, ou os soldados do presídio de 1801, de peças devestuário por vinho. Este era escasso, sendo poucas as oportuniades

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para as classes populares arrumarem o seu enxoval.Na Madeira a indumentária dos primeiros colonos confunde-se com os locais de origem destes. Mas

aos poucos o panorama começa a mudar de acordo com as posses de cada um das disponibilidades dematérias-primas e corantes e, acima de tudo, das ligações aos mercados de panos e tecidos da Europa. Oluxo é sinónimo de importação de tecidos e de agravamento da situação económica com a saída denumerário pelo que se sucederam inúmeras pragmáticas a combater o luxo. No Porto Santo o luxo foiconsiderado no século XVIII como a principal causa de empobrecimento da população pelo que oCapitão e Governador-Geral, João António de Sá Pereira decidiu proibir o envio de panos finos, sedas ejóias. Medidas semelhantes foram estabelecidas em 1780 nas posturas de Machico que militam mais pelanecessidade de demarcar as classes sociais. Deste modo o vestuário e os adornos são uma forma dediferenciação social.

O vestuário do homem integrava as bragas, a camisa, gibão, sainho, calças, pelote, saio, jaqueta,roupeta ferragoulo, tabardo, capa. A isto juntava-se o calçado de sapatos em bico e botas de couro. Paracobrir a cabeça temos as carapuças. A mulher usa como roupa interior a camisa e fraldilha e um vestidoque cobria todo o corpo. O calçado era semelhante ao do homem, apenas na cabeça acontecia umespecial cuidado que as diferenciava. As crianças, de famílias pobres parecem esquecidas quanto àindumentária. As crianças andavam totalmente nuas e os outros vestiam-se de apenas uma camisa brancatodo esburacada.

O enxoval de uma casa era por norma muito modesto reduzindo-se a poucas peças de vestir, deabafo e dormir. Esta situação resultava do preço dos tecidos e dos parcos meios das famílias pobres.Perante isto restava-lhe pouco que vestir e a moda era palavra vã. A indumentária resumia-se ao fato deir à missa e ao de trabalho. O segundo vestia-se até se romper e mesmo assim era remendado. Deste modoprocurava-se disfarçar os remendos com casacos(as) compridos(as). A estas peças juntavam-se a carapuça,considerada de origem africana, e raras vezes os sapatos. Os adornos não faziam parte deste enxoval.Todavia na casa das famílias mais destacadas a situação era distinta. As festas, os saraus dançantes, ospiqueniques eram momentos de exibição da moda, seguindo os modelos franceses e ingleses com tecidosimportados. A isto juntava-se a riqueza dos adornos diversos. Este contraste é bastante evidente para osforasteiros.

A partir do século dezoito temos informações muito claras sobre a indumentária da cidade e do meiorural. As descrições e gravuras dos visitantes estrangeiros são um testemunho precioso desta realidade.

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Assim o traje do vilão era baseado numa jaqueta sem mangas que cobria uma camisa de estopa grosseira,calções de linho apertados a partir do joelho, a que se juntava na cabeça uma carapuça e botas de canodobrado. Esta descrição condiz com o testemunho de J. Foster(1772) e inúmeras das gravuras conhecidas.Já no meio urbano o povo vestia-se à imitação da burguesia e nobreza, sendo a distinção na qualidade dostecidos e presença de adornos.

O século XIX inicia uma revolução no modo de vestir, optando-se pela simplicidade e aspectoprático da indumentária. Foi o início da caminhada para a uniformização do vestuário. Ao mesmo tempoimpõe-se a moda vinda de França que apenas conquista adeptos entre as classes abastadas, uma vez queo traje popular continua a manter as mesmas cores e formas. Assim, o homem veste camisa branca delinho ou estopa, calções e colete, carapuça e bota chã. Os calções e colete podem ainda ser de coresdistintas mas a tendência é para o branco. A indumentária da mulher consistia de camisa, saia listada,corpete, capa, carapuça e bota chã.

Alguns testemunhos dos autores nacionais e estrangeiros atestam que o vestuário não era uniforme.A ideia de “farda” parece ser recente. Vestia-se de acordo com as disponibilidades das lojas de fazendasque procuravam adequar-se às modas trazidas pelos ingleses. Por outro lado estas descrições são fruto deuma mera observação dos sítios visitados, não uma visão global de toda a ilha. Apenas três destes textosmostram esta evidência.

Em S. Martinho está documentada a existência de indústrias caseiras que supriam as necessidadesde vestuário. Assim em 1862 temos inventariados 28 teares de lã e linho a que correspondem igual númerode tecedeiras. Depois, temos ainda 15 costureiras. Por outro lado, devemos salientar que a indumentáriaassume padrões usuais de cada época.

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