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Da Contextualização do Conceito de Meio Ambiente do Trabalho // 3

O PROCESSO DE FORMAÇÃO DA CONSCIÊNCIA RELIGIOSA NA “FENOMENOLOGIA DO ESPÍRITO”

DE HEGEL (1770-1831)

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4 O processo de formação da consciência religiosa...

Capa: Hegel portrait by Schlesinger 1831.jpg Domínio público:

https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/0/08/Hegel_portrait_b

y_Schlesinger_1831.jpg

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Da Contextualização do Conceito de Meio Ambiente do Trabalho // 5

Jonas Silva Faria

Jose Francisco de Assis Dias

O PROCESSO DE FORMAÇÃO DA CONSCIÊNCIA RELIGIOSA NA “FENOMENOLOGIA DO ESPÍRITO”

DE HEGEL (1770-1831)

Primeira Edição E-book

Editora Vivens O conhecimento a serviço da Vida!

Maringá – PR – 2015

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6 O processo de formação da consciência religiosa...

Copyright 2015 by Jonas Silva Faria

Jose Francisco de Assis Dias EDITORA:

Daniela Valentini CONSELHO EDITORIAL:

Dr. José Beluci Caporalini - UEM Dr. Lorella Congiunti – PUU - Roma

Dr. Reginaldo Aliçandro Bordin - PUCPR REVISÃO ORTOGRÁFICA:

Prof. Antonio Eduardo Gabriel CAPA, DIAGRAMAÇÃO E DESIGN:

Bruno Macedo da Silva Dados Internacionais de Catalogação-na-Publicação (CIP)

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http://www.vivens.com.br; e-mail: [email protected]

Faria, Jonas Silva.

F224p O processo de formação da consciência

religiosa na “fenomenologia do espírito” de

Hegel (1770-1831). / Jonas Silva Faria, José

Francisco de Assis Dias. - 1. ed. e-book -

Maringá,PR : Vivens, 2015.

108 p.

Modo de Acesso: World Wide Web:

<http://www.vivens.com.br>

ISBN 978-85-8401-049-3

1.Filosofia alemã. 2. Fenomenologia –

conhecimento. 3. Hegel, Georg Wilhelm

Friedrich 1770-1831. I.Título.

CDD 22.ed.193

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SUMÁRIO APRESENTAÇÃO.............................................................. PREFÁCIO.........................................................................

INTRODUÇÃO........................................................... I = A CERTEZA SENSÍVEL...................................... II = A PERCEPÇÃO................................................ III = O ENTENDIMENTO......................................... IV = CONSCIÊNCIA-DE-SI....................................... 4.1 Estoicismo........................................................... 4.2 Ceticismo............................................................. 4.3 Consciência Infeliz............................................. V = CERTEZA E VERDADE DA RAZÃO................... 5.1 Razão que observa............................................. 5.2 Leis lógicas e psicológicas................................... 5.3 Fisiognomia e frenologia................................... 5.4 Razão operante.................................................. 5.5 Razão que unifica................................................. 5.6 O reino animal do espírito;

a impostura e a coisa mesma.........................

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VI = O ESPÍRITO........................................................ 6.1 O espírito verdadeiro: a eticidade........................... 6.2 O espírito alienado de si mesmo: a cultura............. 6.3 O espírito certo de si mesmo: a moralidade............ VII = A RELIGIÃO....................................................... 7.1 A religião natural.................................................... 7.2 A religião da arte.................................................... 7.3 Religião revelada................................................... VIII = O SABER ABSOLUTO................................... 8.1 Recapitulando...................................................... 8.2 Rememoração...................................................... CONSIDERAÇÕES FINAIS..................................... REFEÊNCIAS...........................................................

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APRESENTAÇÃO “O processo de formação da consciência

religiosa na Fenomenologia do Espírito de Hegel (1770-1831)” dispensa apresentação, pois o seu título apresenta a intenção dos autores: elucidar o processo de formação da consciência religiosa na obra “Fenomenologia do Espírito” de Hegel.

Para atingir o seu propósito, os Autores trabalham a temática proposta em oito tópicos. No primeiro capítulo, trabalham “A Certeza Sensível”; no segundo capítulo, trabalham o problema da “Percepção”; no terceiro capítulo, trabalham “O Entendimento”.

A “Consciência-de-si” é trabalhada no quarto capítulo, em três tópicos: “Estoicismo”, “Ceticismo” e “Consciência Infeliz”.

O problema da “Certeza e verdade da razão” é trabalhado no quinto capítulo, em seis itens: “Razão que observa”, “Leis lógicas e psicológicas”, “Fisiognomia e frenologia”, “Razão operante”, “Razão que unifica” e “O reino animal do espírito, a impostura e a coisa mesma”. Este último tópico se desenrola em cinco subitens, a saber: “O conceito”, “Efetivação na obra”, “A coisa mesma”, “A razão ditando as leis” e “A razão examinando as leis”.

No sexto capítulo, os Autores trabalham “O Espírito”, em três tópicos: “O espírito verdadeiro: a eticidade”, “O espírito alienado de si mesmo: a

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cultura” e “O espírito certo de si mesmo: a moralidade”.

No sétimo capítulo, é trabalhada “A Religião, em três tópicos, a saber: “A religião natural”, “A religião da arte” e a “Religião revelada”.

No oitavo e último capítulo, os Autores concluem o estudo com “O Saber Absoluto”, em dois tópicos: “Recapitulando”, “Rememoração”.

Como última contribuição, oferecem um seleto referencial bibliográfico, como instrumento adequado a um aprofundamento do tema.

Boa leitura!

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11 O processo

PREFÁCIO

As investigações em torno do problema da

consciência sempre oportunizaram acirradas discussões no decorrer da história da filosofia, sobretudo a partir da Idade Moderna. Os debates sobre esse tema foram relacionados a diversos setores do conhecimento humano, tais como, o político, o ético, o epistemológico, o religioso e o estético. Assim, a busca por uma compreensão sobre esse fenômeno e sua natureza levou os filósofos a sistematizar inúmeras intepretações e concepções, muitas vezes, divergentes e discordantes, ou seja, a falta de consenso sobre esse assunto sempre se mostrou muito presente no contexto da filosofia. Há pensadores, como David Chalmers por exemplo, que defendem a existência de aspectos relacionados à consciência (experiência consciente) que devem ser considerados como um verdadeiro “hard problem”, isto é, como um problema difícil do ponto de vista da inteligibilidade.

Um dos pensadores do período contemporâneo que mais se inquietou com o problema da consciência e fez dele o fio condutor de todo o seu sistema filosófico foi Hegel. Em suas reflexões, as ênfases mais profundas e destacadas em relação à consciência aparecem, sobretudo, na maneira como ele explica o seu autodesenvolvimento a partir da dialética. Isso significa que, para Hegel, o movimento efetivado pela consciência para sair de si e ser apreendida como Espírito é orientado por

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etapas que ele chama de tese, antítese e síntese. Para ele, a tese (ideia) é o momento no qual a consciência encontra consigo mesma, em si e por si, na pura formalidade. Mas é próprio da consciência sair de si, alienar-se e se constituir como alteridade. Eis, portanto, a antítese (natureza). Assim como, por uma propensão natural, a consciência realiza o seu movimento de saída de si, alienando-se em direção ao seu oposto, ela também é capaz de voltar a si, com o que contemplou ao sair de si. Esse é o momento da síntese (Espírito)

O livro O processo de formação da consciência religiosa na “Fenomenologia do espírito” de Hegel (1770-1831) constitui um texto muito interessante, haja vista que os seus autores se propõem a fazer uma discussão extremamente audaciosa e, ao mesmo tempo, pertinente e relevante: demonstrar como, em sua obra, Hegel explícita as etapas percorridas pela consciência para chegar ao momento no qual ela se torna consciência religiosa. Discutir uma temática dessa natureza a partir de um filósofo da envergadura de Hegel não é uma tarefa muito fácil e simples, visto ser a complexidade uma das características marcantes do pensamento hegeliano. Por isso, acreditamos que os autores dessa obra possuem muitos méritos, dentre eles, propiciar-nos uma oportunidade para conhecermos as ideias de Hegel no que diz respeito ao fenômeno da consciência religiosa.

Prof. Dr. José Aparecido Pereira PUCPR

UNICESUMAR

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INTRODUÇÃO Para Hegel, a filosofia é a apresentação do

absoluto, e ela reconcilia o infinito ao finito. A filosofia na visão de Hegel tem que deixar de ser um amor ao saber, para tornar-se um saber efetivo.

A filosofia é uma sistematização do pensamento, onde cada parte da filosofia é um todo filosófico, um círculo que se fecha sobre si mesmo; porém nelas a ideia filosófica está numa determinidade ou num elemento particular. O círculo singular, por ser nele mesmo a totalidade, rompe assim o limite de seu elemento e funda uma esfera ulterior. Por conseguinte, o Todo se apresenta como um círculo de círculos, de que cada um é um momento necessário, de tal sorte que o sistema de seus elementos próprios constitui a idéia toda, que aparece igualmente singular.1

O objetivo deste trabalho é percorrer a

fenomenologia de Hegel, analisando a passagem de um estado para outro da consciência. No decorrer do trabalho é demonstrado como a Certeza Sensível passa para a Percepção, e está para o Entendimento, e depois para a Consciência-De-Si, que por sua vez faz a passagem para Razão que nos conduz ao Espírito, e logo passa a Religião (Que dou uma ênfase maior), que por fim passa ao Saber Absoluto.

1 Enciclopédia das Ciências Filosóficas – A Ciência da Lógica, G.W. Hegel.

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Partindo deste princípio, examinamos todo o magnífico texto de Hegel que é a fenomenologia.

Em 1807, aos 37 anos, Hegel publica a fenomenologia do espírito, por muitos considerada a obra mais genial da história da filosofia, pela originalidade de sua concepção, pela maestria incomparável no uso de sua dialética e pela elaboração de uma nova linguagem. A cultura de sua época é, então, reordenada segundo os princípios de sua própria filosofia. Trata-se, para Hegel, de percorrer o caminho de experiências da consciência, de tal maneira que o desenvolvimento da humanidade mostre o sentido do seu percurso, num saber que o funda e o justifica.

A fenomenologia do espírito é uma propedêutica enquanto mostra como o saber, passando por suas várias figuras, eleva-se do conhecimento sensível até a ciência. São etapas de sua formação em que a mais elevada contém etapas inferiores, como momentos suprassumidos. Seu percurso assimila as aquisições culturais da história, que em seu tempo foram etapas necessárias ao desenvolvimento do espírito universal. A fenomenologia pode também considerar-se como a primeira parte da ciência, que se caracteriza por estudar o Espírito no elemento do "ser-aí" imediato; enquanto as partes subsequentes da filosofia estudam o Espírito em seu retorno sobre si mesmo.

A fenomenologia do espírito é mais que uma teoria do conhecimento. É o homem integral que a filosofia estuda e descreve, e a antropologia de Hegel não é nenhum pouco intelectualista. A predominância do ponto de vista cognitivo, que se traduz pelo fato de a Fenomenologia começar por uma análise do

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conhecimento, é apenas uma contingência histórica. Segundo Hegel, contudo, tal história não é um romance, mas uma obra científica. O desenvolvimento da consciência apresenta uma necessidade em si mesmo. Seu término não é arbitrário, embora não esteja pressuposto pelo filósofo; resulta da própria natureza da consciência.

A consciência, ser-aí imediato do espírito, tem dois momentos: o do saber e o da objetividade, negativo em relação ao saber. No percurso das fases a consciência, tal oposição reaparece em cada uma delas como outras tantas figuras da consciência. A fenomenologia é a ciência dessa caminhada. A consciência limita-se a conhecer o que está em sua experiência; e o que nela está é a substância espiritual na forma de objeto.

O espírito se torna objeto por ser esse movimento de fazer-se um outro para si mesmo - um objeto para seu próprio si - e, depois, suprassumir esse outro. Experiência é, portanto, o movimento em que o imediato se exterioriza e, depois dessa exteriorização, retorna a si mesmo. O negativo - que aparece como uma falha, desigualdade entre o eu a substância (seu objeto), ou da substância consigo mesma - é na verdade a alma e o motor de todo processo. Só no seu termo está eliminada a separação entre o saber e a verdade, pois a substância então se revela como sendo essencialmente sujeito: tem a forma de si, ou seja, é sujeito.

Com efeito, para a consciência que está engajada na experiência, é sobretudo o caráter negativo de seu resultado que lhe causa surpresa. Punha inicialmente uma certa verdade que, para ela,

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tinha valor absoluto; perde essa verdade no curso de sua viagem. A consciência se confia absolutamente à "certeza sensível imediata", e depois à "coisa da percepção", à "força do entendimento"; mas descobre que aquilo que tomava como a verdade não o é; perde, portanto, sua verdade.

A negatividade não é, pois, uma forma que se opõe a todo conteúdo; é imanente ao conteúdo e permite compreender seu desenvolvimento necessário. Desde seu ponto de partida, a consciência ingênua visa ao conteúdo integral do saber em toda sua riqueza, mas não o atinge; deve experimentar sua negatividade - esta é a única a permitir ao conteúdo desenvolver-se em afirmações sucessivas, em posições particulares, ligadas umas às outras pelo movimento da negação.

O negativo em geral é isto: a não igualdade, ou a diferença, que se manifesta na consciência entre o Eu e a substância, que é seu objeto. O negativo pode ser encarado como uma falha de ambos; porém é na verdade a alma e o motor dos dois. O negativo surge primeiro como "desigualdade" entre o Eu e a substância consigo mesma. Pois o que parece correr fora, como atividade dirigida contra (a substância) é de fato sua própria operação: e quando a substância perfaz completamente a sua manifestação, então o espírito terá feito seu "ser-ai" coincidir com sua essência; quer dizer, o espírito torna-se, para si, objeto tal como é.

Achando que tal sistema da experiência conduz a verdade, mas não é ela e sim seu negativo - o falso -, alguém poderia querer logo ser apresentado à verdade, sem perder tempo com o "falso", o negativo. Eis aí o maior obstáculo para se

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penetrar na verdade: essa ideia do negativo como algo de falso; esse mal-entendido sobre a natureza do verdadeiro e do falso em filosofia.

Sendo a fenomenologia um estudo das experiências da consciência, conduz sem cessar a consequências negativas. Aquilo que a consciência tomou como verdade se revela ilusório; portanto é preciso que abandone sua convicção primeira e passe a uma outra. Shelling já dissera que o idealismo transcendental começava necessariamente pela dúvida universal, uma dúvida que se estende para toda realidade objetiva:

Se para a filosofia transcendental o subjetivo é o primeiro, o único fundamento de toda a realidade, o único princípio com o auxílio do qual tudo pode ser explicado, a filosofia transcendental começa necessariamente pela dúvida universal da realidade do objetivo.

Todavia, Hegel, que parte da consciência

comum, não poderia pôr como primeira essa dúvida universal que é própria somente a reflexão filosófica. É por isso que se opõe, a uma dúvida sistemática e universal, a evolução concreta da consciência que aprende de modo progressivo a duvidar daquilo que anteriormente tomava como verdadeiro. O caminho que segue a consciência é a história pormenorizada de sua formação. O caminho da dúvida é o caminho efetivamente real que segue a consciência, seu itinerário próprio, e não aquele do filósofo que toma a resolução de duvidar.

Raciocina-se como se eles fossem essências particulares, destituídas de movimento, postas umas ao lado da outra, como moedas cunhadas. Ora, o

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falso existe tanto quanto o mal. (não é nenhum diabo, mal/sujeito.) Não pode ser representado a não ser como o negativo - o outro - da substância. Nesse caso, a substância seria o positivo.

O duplo sentido da palavra "Aufheben", constantemente utilizada por Hegel, revela-nos, no entanto, que a apercepção apenas negativa do resultado constitui somente meia verdade. É esta significação da negatividade que permite a Hegel afirmar; "o sistema completo das formas da consciência não real resultará mediante a necessidade do processo e da própria conexão das formas"2.

Com efeito, o resultado de uma experiência da consciência só é absolutamente negativo para ela; de fato a negação é sempre uma negação determinada. Ora, se é verdade que toda posição determinada é uma negação, não é menos verdade que toda negação determinada seja uma certa posição. Quando a consciência experimenta seu saber sensível e descobre que o "aqui e o agora" que acreditava suster lhe escapa, essa negação da imediatez de seu saber é um novo saber. É possível dizer também que

a apresentação da consciência não verdadeira em sua não - verdade não é somente um movimento negativo, como ela o é segundo a maneira unilateral de ver a consciência natural.3 O duplo sentido da palavra "Aufeben" é

essencial a toda fenomenologia. Isto não quer dizer

2 FE, I, p. 67. 3 FE, I, p. 67.

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que a consciência engajada na experiência não conheça, ela própria, esta positividade na negação; é somente o filósofo quem percebe a gênese de uma nova verdade na negação de um erro. Todo nada, diz Hegel, é o nada daquilo que dele resulta. Pelo contrário, o próprio ceticismo, que é uma das figuras da consciência imperfeita e que como tal se apresentará ao longo do caminho, isola a negatividade de todo conteúdo: "abstrai que esse nada é, de um modo determinado, o nada daquilo que ele resulta".4 Portanto o ceticismo é sem conteúdo; termina com a abstração do nada ou do vazio e é por isso que não pode ir mais longe.

Ambos os sentidos da palavra "Aufheben", o negativo e o positivo, reúnem-se de fato a um terceiro, o de transcender. A consciência não é uma coisa, um ser-aí determinado; está sempre para além de si mesma, supera a si mesma e ou se transcende. Ora, toda consciência comum é também consciência transcendental, toda consciência transcendental, é também, necessariamente comum; a primeira não se realiza senão também na segunda.

Isto quer dizer que a consciência comum se superara a si mesma, transcende-se e torna-se consciência transcendental. Mas o movimento de se transcender, de ir além de si, é característico da consciência. Propriamente, toda consciência é mais do que acredita ser, e isso é o que faz com que seu saber se divide. Ele é a certeza (subjetiva) e, enquanto tal, opõe-se a uma verdade (objetiva). Portanto, o saber é inquietude em si mesmo, visto que deve incessantemente superar-se; tal inquietude, que Hegel descreve em termos existenciais, é

4 FE, I, p. 67.

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inapaziguável enquanto o término não for atingido, um término que permanece necessariamente fixado pelo dado do problema.

O saber do objeto da consciência é sempre saber de um objeto; e se entende por conceito o lado subjetivo do saber, por objeto seu lado objetivo, sua verdade, então o saber é o movimento de transcender-se que vai do conceito ao objeto. Ora, o objeto é o objeto para a consciência, e o conceito é o saber de si, a consciência que o saber tem de si. Mas essa consciência é mais profunda do que acredita; é ela quem acha o objeto insuficiente, inadequado a si mesma; pode-se também dizer, e mais justamente, que o que o objeto é que deve ser idêntico ao conceito.

Para Hegel a consciência é tomada como ela se dá, e ela se dá como uma relação com o outro, o objeto, mundo ou natureza. É bem verdade que este saber do outro é um saber de si. Não é menos verdade, porém, que este saber de si seja um saber do outro, do mundo. Assim, nos diversos objetos da consciência descobrimos aquilo que ela própria é. Se quisermos conceber a consciência, perguntemos o que é o mundo para ela, o que a consciência oferece como sua verdade. Em seu objeto encontraremos ela mesma, e na história de seus objetos é sua própria história que vamos ler. Inversamente, e isto se vincula ao idealismo subjetivo, a consciência deve descobrir que tal história é a sua e que ao conceber seu objeto, concebe-se a si mesma.

Ao término da fenomenologia, o saber do saber não se oporá a nada mais: com efeito, após a própria evolução da consciência, será saber de si e saber do objeto; e como este objeto, o absoluto de Hegel, é o

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espírito em sua plena riqueza, será possível dizer que é o espírito que se sabe a si mesmo na consciência, e que a consciência se sabe como espírito. Enquanto saber de si, será, não o absoluto para além de toda reflexão, mas o absoluto que se reflete em si mesmo. Neste sentido será “Sujeito” e não apenas “Substância”.

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= I =

A CERTEZA SENSÍVEL A certeza sensível parece o mais seguro e rico

dos conhecimentos, porém, examinado de perto, sua abstração e pobreza se mostram. Aprofundando o exame, nota-se que há na certeza sensível mais que esta imediatez que ela sente. Para Hegel o objeto só é na certeza sensível. A certeza sensível está entre o eu e o objeto, independente do objeto ser isto ou aquilo. O seu ser só é possível na e com a certeza sensível; o objeto é o isto o agora. Sei desse objeto que ele é "aqui" e "agora", mas, se tento dizer isso, sou obrigado a ultrapassar esse conhecimento imediato e referir-me ao espaço e ao tempo que são "universais". Se desespero de abarcar o objeto singular na certeza sensível, e recorro ao sujeito que o conhece, volta o problema, pois se vejo uma árvore, outro vê uma casa; o eu do conhecimento é também um eu universal, e o ato de indicar o que tenho na minha experiência, também.

A questão é a seguinte: O que é que permanece nessa certeza sensível? "Tomemos o isto sob o duplo aspecto de seu ser, como o agora e como o aqui; então, a dialética que ele tem de si tomará uma forma tão inteligível quanto o próprio isto".

Com efeito, a certeza sensível não tem o direito de se elevar acima dessas noções - o isto, o aqui, o agora. Ao dizer "o agora é dia ou o isto é uma árvore",

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introduz seu saber determinações qualitativas que são opostas à imediatez que ela requer para seu objeto. Na dialética de Hegel o agora se reproduz com o aqui. "O aqui é uma árvore", mas se me volto, é uma casa. Tais diferenças são rejeitadas como opiniões tão somente: ainda não tem uma consistência que lhes será conferida pela mediação. Logo, o aqui não será nem uma árvore nem uma casa, e pode ser uma ou outra. Não é afetado pelo ser outro.

É o aqui universal, indiferente aquilo que nele se passa; do mesmo modo o isto é indiferente a tudo aquilo que ele pode ser, é o isto universal, e o aqui, aqui universal. A verdade da certeza sensível é o ser, o espaço universal, o tempo universal, mas tal ser, tal espaço, tal tempo não são aquilo que pretendiam ser, dados imediatos. São porque outra coisa não é:

portanto, aquilo que resta não é mais o que visávamos como ser, mas o ser com a determinação de ser abstração ou o puro universal. Nosso visar, segundo o qual o verdadeiro da certeza sensível não é o universal, é tudo que resta frente a esses agoras e aquis vazios e indiferentes.5 O que resta assim da certeza sensível é o ser.

Não o ser imediato que ela imaginava atingir, mas o ser mediato, universal, abstrato. Diante dele, o aí e o agora, que pareciam à essência da certeza sensível, são vazios e indiferentes. Um objeto tão abstrato. Se revela impróprio para suporte da certeza sensível; mas nem por isso ela desvanece: reflui do objeto para

5 FE, p.88.

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A certeza sensível 25

outro polo da relação, para o Eu, o 'este aqui', que possui a certeza sensível.

A certeza sensível só tem sentido do ponto de vista do sujeito que se opõe ao objeto e esquece a sí mesmo nessa oposição: ela é então abstrata porque despreza o sujeito. Não é a verdade. A certeza é subjetiva sem o saber; ela é superada quando se quer afirmá-la, porque dessa forma é introduzido o sujeito que ela gostaria de excluir.

A força da verdade se encontra agora no Eu, na imediatez do meu ver ou ouvir. Tenho certeza dos objetos porque são objetos meus, porque eu possuo um saber sobre eles. Aí é uma árvore que eu vejo: agora vejo que é dia: eu retenho a verdade quando desaparecem os aís e agoras singulares. O "agora é noite" já não significa o ser-em-si imediato da noite, mas seu ser para mim. A verdade é aquilo que experimento imediatamente enquanto eu a experimento.

No entanto, volta o problema anterior: eu vejo uma árvore, este aqui afirma isso aí; mas um outro vê uma casa, aquele-ali constata aquilo-ali. Ambas as verdades têm a mesma autenticidade, mas uma desaparece na outra. O que não desaparece é o eu enquanto universal.

Com efeito, o que nessa experiência não desaparece é o eu como universal: seu ver, nem é um ver da árvore, nem o dessa casa; mas é um ver simples que embora mediatizado pela negação dessa casa etc., se mantém simples e indiferente diante do que está em jogo: a casa a árvore. O eu é só universal, como agora, aqui, ou isto, em geral. Viso, de certo um Eu singular, mas como não posso dizer o que 'viso' no agora, no aqui, também não o

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posso no Eu. Quando digo: este aqui, este agora, ou um singular, estou dizendo todo este, todo aqui, todo agora, todo singular. Igualmente quando digo: Eu, este Eu singular, digo todo Eu em geral; cada um é o que digo: Eu este Eu singular.6 Como sucedera antes, ao dizer um agora, um

aí, ou um ser singular, diziam-se forçosamente universais; também dizendo um eu singular, diziam-se forçosamente universais; também dizendo um eu singular, estou dizendo todos os eus. Na certeza sensível posso visar um singular; o que não posso é dizê-lo.

Um último recurso para salvar a certeza sensível, ' não do lado do objeto, nem do lado do sujeito', é apostar na união dos dois no ato do conhecimento, mas o problema ressurge, porque a consciência continua oscilando entre o sujeito e o objeto. Já que a certeza sensível não quer sair de si mesma e fica nessa de 'agora que é dia', ou de 'um Eu para o qual é dia', vamos ao seu encontro pedir que nos indique este agora que afirma. Para ver que imediatez é essa.

Pois bem, quando nos mostra o agora, o agora já deixou de ser enquanto era mostrado. O agora que é resulta ser imediatamente um agora distinto daquilo que é mostrado. ' O agora, como nos foi indicado, é um que-já-foi - e essa é sua verdade; ele não tem a verdade do ser. É, porém, verdade que já foi. Mas o que foi é, de fato, nenhuma essência [ Kein Wesen / gewesen ]. Ele não é; e era do ser que se tratava.7

6 FE, p.89 7 FE, p.91.

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A certeza sensível 27

Dessa forma, o agora e o ato de indicar são constituídos de tal forma que nem um nem o outro são o simples imediato, mas sim um movimento que tem diversos momentos.

No entanto, esse primeiro refletido em si mesmo não é exatamente o mesmo que era de início, a saber, um imediato; ao contrário, é propriamente algo em si refletido ou um simples que permanece no ser-outro o que ele é: um agora, o agora como simples dia que tem em si muitos agora [ou] horas. E esse agora - uma hora - são também muitos minutos, e esse agora igualmente muitos agoras e assim por diante.8

O ato de indicar é um movimento que exprime

o que o agora é em verdade: uma pluralidade de agoras reunidos e unificados o (tempo). Indicar é, pois, fazer experiência de que o agora é um universal. Doravante não se trata de um agora ou aqui únicos e inefáveis, mas de um agora e um aqui que tem a mediação em si mesmos, os quais são coisas tendo simultaneamente em si a unidade da universalidade e da multiplicidade dos termos singulares.

Assim aquilo que experimentamos é uma certa compenetração entre o universal e o singular, uma certa unidade do diverso e da unidade; é precisamente isso que a percepção, o novo objeto da experiência, nos revelará na 'coisa dotada de múltiplas qualidades'. Agora o que se põe é a multiplicidade na unidade do ser, ou o ser que tem a negação em si mesmo; é a multiplicidade no eu, ou

8 FE, p. 91.

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ainda o eu que tem a negação em si. Tal é o segundo momento do conceito, a particularidade.

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= II =

A PERCEPÇÃO A certeza sensível não alcançava o

Verdadeiro, quando buscava no 'isso aí' o que residia no universal. A percepção fruto dessa experiência, já tem o universal como seu princípio e ponto de partida - tanto do lado do objeto quanto do sujeito. Perceber, aliás, é um movimento; e seu objeto é a confluência de todos os momentos do movimento num ponto só: no fundo, são o mesmo universal.

Perceber não é mais permanecer no inefável da certeza sensível, é superar esse sensível, e atingir o universal. O princípio da percepção é esse universal que vimos surgir na dialética da certeza sensível e que, doravante, é o novo objeto da consciência fenomênica.

O objeto é um universal: algo já mediado, suprassumido - a coisa com múltiplas propriedades, onde se expande a riqueza da experiência sensível, agora constituída em sua verdade, já que a percepção tem a negação, a diferença ou a multiplicidade variegada em sua essência.

A princípio julga-se que a verdade está no objeto, num universal que é uma 'coisa' com múltiplas propriedades, calcadas na experiência sensível que foi suprassumida. Vendo mais de perto o objeto tem duas faces: uma, é a multiplicidade das propriedades distintas e indiferentes entre si; a outra, é a

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universalidade simples, distinta e independente dessas propriedades, mas que lhe serve de meio: a coisidade. Nesse meio, as propriedades diversas se compenetram sem se tocar: é o 'aqui e agora' sensível suprassumido no universal. Podemos chamá-lo de também, já que por meio dele as múltiplas propriedades universais coexistem num aqui. 'Este sal que é branco, e também salgado e também cúbico' etc.

A propriedade é, entretanto, universal, mas é também determinada. Quando a tomamos como determinada, e não mais somente como universal, vemos que exclui de si outras propriedades. Este cristal de sal é branco, portanto não é preto; tem uma forma particular, portanto não tem outra forma. Somos novamente conduzidos à coisa, como sendo um uno; todavia desta vez não se trata mais de uma unidade abstrata, e sim de uma concreta. Este cristal de sal exclui outras coisas, mas encerra em si uma multidão de outras propriedades que percebemos como coexistentes.

Está plenamente constituído, assim, o objeto da percepção - o seu 'verdadeiro' - através desses três momentos: a) a universalidade indiferente e passiva: o também de múltiplas propriedades; b) a negação simples: o uno que exclui as propriedades opostas; c) síntese dos dois momentos: a coisa, ponto focal da singularidade, irradiando numa multiplicidade (de propriedades) no meio da subsistência. Assim, a universalidade sensível - unidade imediata do ser e do negativo - é propriedade quando e somente quando, a partir dela, o uno e a universalidade pura se desenvolvem e se distinguem entre si, permanecendo ao mesmo tempo enlaçados pela

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A percepção 31

universalidade sensível, constituindo assim a coisa, objeto da percepção; e a consciência se encontra determinada como percebente.

Para conciliar isso, tenta-se pensar que essa multiplicidade é por conta do sujeito: por exemplo, o sal é uno, mas é branco para meus olhos, salgado para o meu paladar, cúbico para meu tato. A diversidade seria obra minha. Examinando, porém, de novo, vejo que a propriedade pertence à coisa, porque a distingue das outras. A unidade é subjetiva, pois unifico as percepções num também que é a coisa: branca e também salgada, e também cúbica etc. Refletindo novamente, a consciência vê que a coisa e sua percepção têm as duas características de unidade e diversidade, e tenta resolver o problema com a distinção do enquanto é para os outros, é múltipla.

Vendo que a coisa tem, uma constituição complexa (múltiplas características), a consciência recorre ao "enquanto que", e distingue essas determinações múltiplas - como inessenciais - da determinação essencial que constitui a Coisa enquanto tal; sua diferença absoluta. Ela constituiria a coisa em si; separando-a das outras e mantendo-a em si mesma. Salvou-se por 'um enquanto que': a coisa é para si, essente e uno, fora da relação com o Outro. A relação - ou conexão - com o Outro eqüivale a cessar de ser-para-si.

É justamente em virtude de seu caráter absoluto que uma coisa se liga as outras, pois é só e essencialmente esse relacionar-se. A distinção 'enquanto isso, enquanto aquilo' é inoperante. Urge fazer uma nova suprassunção: a primeira já foi feita, da sensação para a percepção (universal

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condicionado); agora esse condicionamento ao ser sensível tem de ser suprassumido nas puras determinações do entendimento, que domina essas abstrações da 'sã razão' e do 'bom senso', e as 'sofisticarias' da percepção.

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= III =

O ENTENDIMENTO Nesta etapa, a consciência já deixou para trás

a certeza sensível e reuniu os pensamentos da percepção no 'universal incondicionado' que toma agora como seu objeto verdadeiro, formado por uma reflexão sobre si mesma a partir de uma relação com um outro; só que ainda não reconhece a si mesma neste objeto refletido. Nós filósofos sabemos que este objeto e a reflexão da consciência são uma coisa só: mas ela não sabe. Deixemos, pois, que ela examine a seu modo seu novo objeto.

Agora, a consciência abandona suas abstrações unilaterais e conserva a unidade e a multiplicidade, o ser para si e o ser para o outro (que a percepção opunha), descobrindo que se trata da mesma essência, em que os dois termos se suprassumem um ao outro.

A expansão das diferenças é a exteriorização da força. Os dois momentos, a força recalcada sobre si e a força exteriorizando-se, só se distinguem no pensamento, no conceito, pois no objeto a força é para si o que é para o outro. A diferença a constitui, já que todo seu ser é ser-para-outro.

O conceito de força se torna efetivo no desdobramento das duas forças - uma solicitante outra, solicitada. Uma solicita porque é solicitada e vice-versa. Ora, o problema é duplicado e não

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resolvido: a força não saiu de seu conceito e a realidade da força se reduz ao seu pensamento. A força só efetiva na sua exteriorização que coincide com a sua suprassunção: a força quando se realiza deixa de ser real.

O interior das coisas é concebido como o

negativo da força objetiva. Este interior suprassensível é o reino calmo das leis, tão calmo que chega a ser até tautológico, porém perturbado pela própria explicação tautológica, que postula um mundo invertido, oposto ao mundo contemplado. No entanto esses dois mundos são um só e o mesmo.

A verdade do jogo de forças é a lei da força, lei que não é mais mudança, mas imagem constante do fenômeno sempre instável. O mundo suprassensível passa a ser o tranquilo reino das leis, para além do mundo de mudanças como diversas, conforme a diversidade de fenômenos, mas o entendimento tende a uni-las numa lei única, como a atração universal que rege tanto a queda dos corpos quanto o movimento dos astros.

Examinando melhor vemos que esse calmo mundo das leis compreende a mudança e mesmo a mudança absoluta, por ser um movimento que é contrário de si mesmo e, ao por uma diferença, a suprassume. Já vimos isso no jogo de forças: só que aquilo que sucedia no lado de lá (do objeto) sucede no lado de cá (do sujeito): esse leva-e-traz da diferença que, apenas posta, é abolida, ocorre também nesse interior supra-sensível. Pode expressar-se assim essa lei do interior: "o homônimo se repele para fora de si mesmo, enquanto o heterônimo se atrai".

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O entendimento 35

A identificação desses dois mundos coloca a noção de infinito, pois só nele uma realidade pode ser o contrário de si mesma, e o mesmo e o outro podem ser a unidade. Pelo infinito, a lei faz com que os termos opostos passem para um para o outro e se suprassumam, pois cada termo é, em si mesmo, seu oposto e negação. O infinito (inquietude absoluta do puro auto movimento, faz com que tudo que é determinado de algum modo seja contrário dessa determinação) é a alma da dialética. A identificação dos opostos implica o conceito de infinito, e este, por sua vez, revela, com o interior dos objetos, a própria consciência de si. E assim se atinge outro patamar do movimento dialético: a consciência-de-si.

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= IV =

CONSCIÊNCIA-DE-SI O objeto da consciência agora é a própria

consciência, e em lugar da oposição que punha em marcha à dialética da consciência, entre certeza e verdade, temos aqui "a verdade de si mesmo" e chegamos a "pátria nativa da verdade". A consciência-de-si é retorno, a partir do objeto trazido pelo sujeito para nele desaparecer: Portanto é desejo. Esta seção da fenomenologia trata da “Independência e dependência da consciência de si”, desenvolve dois temas fundamentais em Hegel: o desejo é o reconhecimento, além de apresentar o célebre texto da “Dialética do senhor e do escravo”. A segunda parte, “Liberdade da consciência de si” trata do estoicismo, do cepticismo e da consciência infeliz.

O Homem é consciência de si, consciente de sua realidade e de sua dignidade humana. É nisso que difere essencialmente do animal, que não ultrapassa o nível do simples sentimento de si. O homem toma consciência de si no momento que - pela primeira vez – diz: “EU”. Compreender a origem do Eu revelado pela palavra. O ser do homem, o ser consciente de si, implica e supõe o desejo. A realidade humana só se pode constituir e manter no interior de uma realidade biológica, de uma vida animal. Mas, se o desejo animal é condição necessária da consciência-de-si, não é condição

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suficiente. Sozinho, esse desejo constitui apenas o sentimento de si.

Para que haja consciência-de-si, é preciso que o desejo se dirija a um objeto. Não – natural, algo que ultrapasse a realidade dada. Ora a única coisa que ultrapassa a realidade dada é o próprio desejo. O desejo humano deve buscar um outro desejo. Para que haja desejo humano, é preciso que haja primeiro uma pluralidade de desejos (animais). Para que o homem seja verdadeiramente humano, para que se diferencie essencial e realmente do animal, é preciso que, nele, o desejo humano supere de fato o desejo animal. O desejo do animal é um desejo de conservar a vida. Porém o homem tem que superar esse desejo de conservação, e arriscar a vida em função do desejo humano.

Assim ele se confirma como humano, ao arriscar a vida para satisfazer seu desejo humano. Ora, desejar um desejo, é pôr-se no lugar do valor desejado por esse desejo. Desejar o desejo do outro é, em última análise, desejar que o valor que eu sou ou que represento, seja o valor desejado do outro. Quero que ele reconheça meu valor, como seu valor, quero que ele me reconheça como um valor autônomo. Falar da consciência-de-si, é, pois, necessariamente falar de uma luta de morte em vista do reconhecimento.

Toda dialética sobre a luta das consciências de si opostas, sobre a dominação e servidão, supõe a concepção de ambos os termos, o outro e o si. O outro é a vida universal tal como a consciência de si a descobre enquanto diferente de si mesma. E o si, em face dessa positividade, é unidade refletida que se tornou pura negatividade. Agora o si se encontra

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Consciência de si 39

no outro, emerge como uma figura vivente particular, um outro homem para o homem. Ao pôr a vida em risco, a consciência faz a experiência de que a vida lhe é tão essencial quanto à pura consciência de si; por isso, os dois momentos, de início e imediatamente unidos se separam.

Uma das consciências de si se eleva acima da vida animal; capaz de se defrontar com a morte. A outra consciência-de-si, prefere à vida à consciência-de-si; escolheu, portanto, a escravidão: poupada pelo senhor, ela foi conservada como se conserva uma coisa. Reconhece o senhor, mas não é por ele reconhecida. Ambos os momentos, o do si e o do outro, são aqui dissociados. O si é o senhor que nega a vida em sua positividade, o outro é o escravo, ainda uma consciência; porém, não uma consciência da vida enquanto positividade. O escravo é o adversário vencido que não arriscou a vida até o fim, que não adotou o princípio dos senhores; vencer ou morrer. Ele aceitou a vida concedida pelo outro, portanto, depende do outro, mesmo porque preferiu a escravidão à morte e, por isso ao permanecer vivo, vive como escravo.

A relação entre senhor e escravo, não é um reconhecimento propriamente dito. O senhor não é o único a se considerar como senhor, o escravo também o reconhece. Mas esse reconhecimento é unilateral, porque o senhor não reconhece o escravo, sendo assim ele também não se realiza, visto ser reconhecido por alguém que ele não reconhece. Ele só é reconhecido pelos outros, porque tem um escravo, e sua vida de senhor consiste no fato de ele consumir produtos de um trabalho servil, e de viver por esse trabalho.

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O escravo reconhece desde o início o outro (o senhor), basta-lhe, pois, impor-se a ele, fazer-se reconhecer por ele, para que se estabeleça o reconhecimento mútuo e recíproco, o único que pode realizar e satisfazer plena e definitivamente o homem. Mas para que isso aconteça, o escravo deve deixar de ser escravo, ele tem de transcender-se e suprimir-se como escravo. O senhor não tem desejo, está fixado em sua dominação. Para ele só resta manter-se como senhor ou morrer. O escravo não quis ser escravo, submeteu-se a servidão para não morrer. Ele está aberto a mudança, nada é fixo nele, em seu ser ele é mudança, transcendência, transformação e educação.

O senhor força o escravo a trabalhar. Ao trabalhar o escravo torna-se senhor da natureza. Ora, ele só se tornou escravo do senhor, porque à primeira vista, era escravo da natureza, ao se identificar com ela e ao submeter-se as suas leis pela aceitação do instinto de conservação. Quando, pelo trabalho, se torna senhor da natureza, o escravo liberta-se de sua própria natureza, do instinto que o ligava a natureza e que fazia dele o escravo do senhor. Ao libertar o escravo da natureza, o trabalho também o liberta de si próprio, de sua natureza de escravo: Liberta-o do senhor. No mundo natural, dado, bruto, o escravo é escravo do senhor. No mundo técnico, transformado por seu trabalho, o escravo reina, ou, pelo menos reinará um dia, como senhor absoluto.

O homem só atinge a autonomia verdadeira, a liberdade autêntica, depois de ter passado pela sujeição, depois de haver superado a angustia da morte pelo trabalho efetuado a serviço de outrem (que, para ele, encarna essa angústia). O trabalho

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libertador é, pois necessariamente, à primeira vista, o trabalho forçado de um escravo que serve um senhor todo-poderoso, detentor de todo poder real.

Para Hegel, o encontro do "Senhor e do escravo", não é um encontro amoroso, mas uma disputa de vida ou morte. O problema estaria na religião, onde o homem torna-se escravo de seu adversário porque quer a todo custo conservar-se vivo; da mesma forma, ele se torna 'escravo' de Deus quando quer evitar a morte procurando em si como homem religioso, uma alma imortal. De outro lado, o homem chega ao dualismo religioso, pois não podendo realizar sua liberdade aqui na terra, cede ao seu senhor, e fixa sua esperança no transcendente religioso.

4.1 Estoicismo

No pensamento (Estoicismo), o Eu (para si) se

objetiva, e o objeto se faz consciência. Mas trata-se de um pensamento que é consciência e não representação. Agora, portanto, a consciência de si é consciência de si pensante, na medida em que é capaz de vir-a-ser objeto de si mesma, sem que por isso se perca ou desapareça.

pois é isto o que o pensar significa: ser objeto para si não como Eu abstrato, mas como Eu que tem ao mesmo tempo o sentido de ser-em-si; ou seja: relacionar-se com essência objetiva de modo que

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ela tenha a significação do ser-para-si da consciência para a qual ela é.9

No pensamento, sou livre, não estou num

outro, meu objeto está em unidade indivisa comigo: “No pensar, eu sou livre; porque não estou em um outro, mas pura e simplesmente fico em mim mesmo, e o objeto, que para mim é a essência, é meu ser-para-mim, em unidade indivisa; e meu movimento em conceitos é um movimento em mim mesmo”10. O homem verdadeiramente livre se eleva acima de todas as contingências e de todas as determinações da vida.

O estoicismo se limita a afirmar a coerência do pensamento em todos os diversos conteúdos da experiência. Assim a consciência de si livre se eleva acima da confusão da vida e conserva para si tal impassibilidade sem vida que tanto se admirou no sábio estoico; mas as determinações permanecem o que são, o pensamento nelas se estende e se afirma a si mesmo; tais determinações, porém, são; e seu ser particular, elevado arbitrariamente à altura da universalidade do pensamento, se conserva em sua particularidade. O estoicismo não levou a cabo a negação das determinações de seu objeto, não chegou a dissolvê-las na simplicidade do para-si.

Essa consciência pensante, tal como se determinou, como liberdade abstrata, é portanto, somente a negação incompleta do ser-outro; apenas se retirou do ser-aí, para si mesma; e não se levou a cabo como absoluta negação do ser-aí

9 FE, p.152. 10 FE, p.152.

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Consciência de si 43

nela. De certo, o conteúdo vale para ela só como pensamento: aliás como pensamento determinado, e ao mesmo tempo como determinidade enquanto tal.11

O estoicismo é prematuro, não leva a cabo a

negação do ser-outro, mas deixa-o coexistir ao lado do pensamento. É com o ceticismo que se realiza a verdadeira negação dessas determinações, ao pretender um valor absoluto em seu caráter de determinação. 4.2 Ceticismo

O ceticismo é uma atitude emocional de

negação do mundo natural. O estoico quer ser livre em relação ao mundo, mas pede emprestado ao mundo exterior os elementos de sua moral. Percebe que sua liberdade é ilusória. Torna-se então cético ou niilista. Só o cético realiza o ideal do estoico (a liberdade abstrata do entendimento) ao negar a própria existência do mundo exterior.

O cético não supera o ponto de vista do entendimento, da consciência-de-si. Ele destrói a ação do mundo exterior, mas apenas mentalmente, não na realidade, não de modo ativo. Para Hegel o “ser verdadeiro do homem é sua ação”. Não agir significa não ser como um ente verdadeiramente humano, mas como um ser dado, natural. Para Hegel,

11 FE. p. 89

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o cético que não age, está cometendo suicídio, deixando de viver, por isso não é mais um ser humano histórico. Só o niilista que continua vivo é interessante. A negação do cético é sempre teórica e mental, logo; é o que causará o seu fracasso. 4.3 Consciência Infeliz

Até agora a consciência comete uma

incessante e extrema sucessão de erros. Ora, imitando a liberdade do senhor à maneira estoica, ora exercendo o trabalho negativo do escravo à maneira cética. Para Hegel o Deus dos Judeus, que ele chama o “primeiro imutável”, é inacessível. Por causa da ideia de transcendência, a ação do homem religioso não é uma ação verdadeira, e a sociedade religiosa (a igreja) não é um verdadeiro Estado. Sendo assim o homem não é um indivíduo livre e histórico. A ideia de transcendência tira toda eficácia da ação individual e social do homem religioso. Quando o homem reconhece isso, e espera a salvação através da graça divina, e não através de suas próprias ações, o homem reconhece e aceita a infelicidade como a própria essência de sua existência, que é tanto a fonte como consequência de sua religiosidade.

A única forma para Hegel do homem livrar-se dessa infelicidade, é abandonar a ideia do além. Deve compreender que sua realização efetiva, deve realizar-se aqui na terra. Quando o homem compreende tudo isso, ele deixa de ser o homem da

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Consciência de si 45

consciência-de-si, que resulta na consciência infeliz, e torna-se o homem da razão.

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= V =

CERTEZA E VERDADE DA RAZÃO Hegel encara a passagem da consciência

infeliz à razão como passagem da igreja da Idade Média ao Renascimento e aos tempos modernos. A consciência infeliz nos mostrou a completa alienação da consciência de si singular. Para a consciência infeliz, que não é senão o sentimento doloroso da negatividade cética, o ser-em-si era o além dela própria. Incapaz de sair de sua subjetividade sentia ao mesmo tempo sua insuficiência; ademais, seu além se apresentava a ela como um Deus que conciliaria em si a subjetividade e a objetividade, a singularidade da consciência de Si e a universalidade do em si.

A consciência de si simultaneamente universal e singular, que serve de transição à razão dos tempos modernos, é a igreja da Idade Média. Por intermédio da igreja – que constitui uma comunidade universal, que fala uma língua nem sempre compreendida pelos indivíduos, que reúne os dons particulares e forma uma vontade geral nascida da alienação das vontades singulares, o eu singular se eleva a verdadeira universalidade. Tal é a razão: a certeza que tem a consciência de ser toda a realidade, toda a verdade; a certeza de que a verdade não se encontra além, mas se apresenta de modo imediato à consciência.

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48 O processo de formação da consciência religiosa...

Anteriormente, a consciência procurava salvar-se do mundo: trabalhava o mundo ou procurava refugiar-se dele em si mesma. Sua preocupação essencial era a própria salvação, que para ela estava sempre além da presença. Agora quer encontrar-se neste mundo e nele buscar a sua própria infinitude. Hegel diz que: “Só agora – depois que perdeu o sepulcro de sua verdade e que aboliu a abolição de sua efetividade, e [quando] para ela a singularidade da consciência é em si a essência absoluta – descobre o mundo como o seu mundo efetivo.

Agora tem interesse em permanecer no mundo, como antes tinha somente no seu desvanecer; pois seu subsistir se lhe torna sua própria verdade e presença. A consciência tem a certeza de que só a si experimenta no mundo”12. O conhecimento do mundo será um conhecimento de si. Daí o interesse do homem pela exploração de sua própria terra ou pelas ciências da natureza.

Na razão unem-se a consciência e a consciência de si. A certeza é a verdade; seria o termo da experiência que a consciência faz de si mesma, pois com a razão a aparência torna-se igual à essência. “A razão é a certeza da consciência de ser toda a realidade: assim enuncia o idealismo o conceito de razão”13. A razão é a verdade da consciência –de – si, mas com as correções que Hegel introduz em Kant e Fichte.

Para que o idealismo seja verdadeiro, é preciso que o Eu seja um (em si toda realidade). Ora, na origem, é falso; só é verdadeiro ao término do processo dialético e histórico. Por enquanto o Eu, é

12 FE, pg. 173. 13 FE, pg. 173.

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Certeza e verdade da razão 49

apenas consciência de si, que está longe de ser toda realidade. Para que o idealismo seja verdadeiro, é preciso que o eu se torne toda realidade e se revele como tal: ora, ele só se torna isso no fim da história, pela ação histórica do homem (luta e trabalho).

O homem esquece o caminho que o levou a razão (Kant). “A consciência, que é tal verdade, deixou para trás esse caminho e o esqueceu, ao surgir imediatamente, como razão; ou seja, essa razão, que surge imediatamente, surge apenas como certeza daquela verdade. Assevera somente que é toda realidade, mas não conceitua sua asserção; ora, aquele caminho esquecido é o conceituar dessa asserção expressa de modo imediato. Igualmente, para quem não fez caminho, essa asserção é inconcebível quando a escuta nessa sua forma pura – pois numa forma concreta bem que faz essa asserção”14. Também Fichte: só revela o resultado e não o caminho, a totalidade do processo; só revela uma certeza subjetiva.

Por conseguinte o idealismo, que começa por tal asserção sem mostrar aquele caminho, é por isso também pura asserção que não se concebe a si mesma; nem se pode fazer concebível a outros. Enuncia uma certeza imediata, contra a qual se mantém firmes outras certezas imediatas, mas que foram perdidas naquele caminho15. O filósofo idealista, que não mostra o caminho

percorrido pelo homem até chegar o idealismo, é incompreensível. Por isso, suas afirmações só podem

14 FE, pg. 174. 15 FE, pg. 174.

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50 O processo de formação da consciência religiosa...

ser errôneas: ele não justifica sua atitude. As formulações de Kant e de Fichte são insatisfatórias e terminam caindo no empirismo que queriam evitar: um idealismo vazio não realiza o que proclama. “Mas isso [que o idealismo propõe] é inconcebível; e mais inconcebível ainda é que haja na categoria diferenças ou espécies. Essa asserção em geral, como aliás, a asserção de um número determinado de espécies de categoria, é uma nova asserção. Essa, porém implica em si mesma que não se deve mais aceita-la como asserção”16. Hegel conclui que

Esse idealismo cai em tal contradição porque afirma como verdadeiro o conceito abstrato da razão. Por isso a realidade lhe surge imediatamente como tal que não é a realidade da razão; quando a razão deveria ser toda realidade. Permanece [a razão] um buscar irrequieto, que no próprio buscar declara pura e simplesmente impossível a satisfação do encontrar.17

A realização plena de sua proposta passa por

outro e mais longo caminho.

16 FE, pg. 176. 17 FE, pg. 178.

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Certeza e verdade da razão 51

5.1 Razão que observa O homem observa o mundo real, empírico,

utilizando a sensação, a percepção, o entendimento. Estes não são os que eram no começo. Já estão penetrados pela razão. O homem se interessa pelo mundo, sabe que o mundo é racional, nele procura sua própria infinitude (que se realiza como vida: a totalidade do mundo é um organismo vivo. Mas será preciso superar a noção de vida para chegar ao espírito).

O trabalho da razão se manifesta na construção das ciências da natureza, mesmo quando seus cultores adotam uma visão empirista ou fenomenista, pois todo o discurso científico tem necessariamente de expressar-se em universais. Estas ciências partem da descrição, daí a classificação e em seguida a formulação de leis e à experimentação que revela a lei na sua pureza.

A razão-que-observa não consegue encontrar nas suas determinações um sistema racional de figuras, pois o ser vivo não é o universal concreto como o ser espiritual. Como a razão não se encontrou de forma satisfatória no estudo da natureza, passa a observar a consciência humana, esperando aí encontrar-se.

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5.2 Leis lógicas e psicológicas A razão observadora encontrou no mundo

inorgânico o conceito sob a forma de leis; mas faltava-lhe a simplicidade refletida sobre si mesma. Observando o mundo orgânico, encontrou o conceito como a vida, que é simplicidade refletida sobre si mesma. Restava apenas encontrar o conceito que tivesse o movimento do gênero: que de sua própria universalidade se desdobra em momentos singulares. Este conceito como conceito, a observação descobre agora quando se volta para a consciência de si.

A razão começa por observar as leis do pensamento; porém ao tomar como coisas o próprio movimento do espírito, não chega a entender seu objeto. Procura então observar e catalogar as outras atividades do espírito; tenta então encontrar uma correlação entre espírito e seu mundo. O que produz é uma ciência psicológica falha pela base, pois não estabelece as leis que pretende.

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Certeza e verdade da razão 53

5.3 Fisiognomia e frenologia Verificando que não há lei que exprima a

relação entre a consciência-de-si e o mundo - dada à diferença mútua dos dois lados - à observação reflui para a individualidade enquanto totalidade concreta, consciência-de-si e corpo. A fisiognomia é uma falsa ciência, que não consegue estabelecer uma correlação entre o corpo tomado como linguagem exterior e o interior do espírito; “No órgão, contudo, o interior está somente como o agir imediato, que alcança sua exterioridade no ato, o qual representa – ou não, o interior. O órgão, considerado segundo essa oposição, não garante assim a expressão que é procurada”18. Hegel cita as palavras de Lichtenberg que diz: “supondo que o fisiognomista tenha capturado uma só vez o homem, bastaria tomar uma resolução decidida para tornar-se de novo incompreensível por milênios”19. A frenologia leva mais adiante as aberrações da razão que observa a consciência-de-si; mas ao afirmar que 'o espírito é um osso revela o equívoco básico da razão observadora e possibilita sua 'conversão'.

18 FE, pg. 224. 19 FE, pg. 228.

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5.4 Razão operante A razão que antes observava coisas, passa a

considerar sua própria atividade espiritual: em primeiro lugar, como razão universal; enfim, quando a essência espiritual chega ao mesmo tempo à luz da consciência e à substancialidade, como espírito.

A consciência-de-si individual se vê reconhecida por outra no seio de um povo livre; se implementa e é feliz. Na Moralidade, está longe dessa tranquila harmonia: anseia conquistar a felicidade como produzida por uma ação, posto que não a encontra, (mais ou ainda) no seio de sua comunidade. Com efeito, a inquietude moral pode ser tomada como se o calmo reino da Eticidade tivesse sido perdido; ou então, como se ainda não tivesse sido atingido.

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Certeza e verdade da razão 55

5.5 Razão que unifica Agora a consciência chega, na sua

experiência, ao conceito que nós tínhamos dela: 'ser na certeza de si mesma toda realidade'. Compenetração da razão que observa e da razão que opera, agora é a categoria consciente de si mesma.

5.6 O reino animal do espírito; a impostura e a coisa mesma 5.6.1 O conceito

O conceito da individualidade real em-si e

para-si. Sua natureza originária e os momentos de seu agir (fim, meio, obra), tem conteúdo idêntico: é como um círculo que se abre e fecha no vácuo. 5.6.2 Efetivação na obra

Ao efetivar-se como obra, surgem, no entanto,

oposições por todos os lados. Acentua-se a contingência da ação, que por sua vez é desmentida pela necessidade do agir em seu próprio conceito. 5.6.3 A coisa mesma

A consciência procede então a compenetração

do conceito e da obra nesta unidade do ser e do agir

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que é a coisa mesma (ou a obra verdadeira, 'pragma'), consciência da sua substância. Mas ao surgir - ainda imediata e abstrata -, a integração de seus momentos está antes pensada que efetivada. Na prática há uma alternância de momentos, dando lugar à impostura que impera no 'Reino dos animais intelectuais'. Esgotada e suprassumida essa experiência negativa, chega-se enfim à autêntica 'coisa mesma', que não é predicado, mas sujeito: Essência de todas as essências, ou essência espiritual.

5.6.4 A razão ditando as leis

Essa substância é a substância ética; e o para-

si (ou consciência) dela, é a consciência ética; a qual em sua forma imediata é a 'sã razão', ditando imediatamente leis éticas, que na verdade não passam de leis contingentes. 5.6.5 A razão examinando as leis

Desiste, pois, de fazer leis, e se contenta com

examiná-las. Tenta corrigir a contingência dos mandamentos apelando para a tautologia da Razão. Debalde: a coerência dos enunciados é indiferente à verdade dos conteúdos. Para sair dessa cisão entre querer e poder, só o mesmo à volta ao Universal, à substância ética: a passagem ao Espírito.

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= VI =

O ESPÍRITO A fenomenologia se propõe a uma dupla tarefa:

por um lado, conduzir a consciência ingênua ao saber filosófico; por outro, fazer a consciência singular sair de seu pretenso isolamento, de seu ser-para-si exclusivo, para elevá-la ao espírito. É necessário desvelar no próprio seio de seu ser-para-si sua relação ontológica com outros seres-para-si. Assim, a consciência de si singular se elevou a consciência de si universal por meio da luta pelo reconhecimento, da oposição entre senhor e escravo, da consciência infeliz, que, por fim, alienado a subjetividade, nos conduziu à razão.

Hegel começa o capítulo sobre o espírito dizendo que

a razão é espírito quando a certeza de ser toda a realidade se eleva à verdade, e [quando] é consciente de si mesma como de seu mundo e do mundo como de si mesma. O vir-a-ser do espírito, mostrou-o o movimento imediatamente anterior, no qual o objeto da consciência – a categoria pura – se elevou ao conceito da razão.20

A experiência da consciência, incluindo a

razão, chegava somente à consciência, espiritual.

20 FE, pg, 304.

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Agora, a substância consciente de si mesma é um espírito que é um mundo: mundo efetivo e objetivo, mas que perdeu toda a significação de algo estranho (como também o si perdeu o significado de um "para-si" separado desse mundo). As figuras anteriores são abstrações do espírito, analisando-se em seus momentos singulares. Assim, o espírito é consciência, quando na análise de si mesmo retém somente seu momento do em-si ou do ser. É consciência-de-si ao fixar-se somente no momento contrário, no ser-para-si. É razão, quando une o ser-em-si e o ser-para-si na categoria (identidade do ser e do pensar) - mas só é espírito em sua verdade quando se institui como razão que é, nela se efetiva e constitui seu mundo.

A razão já era a consciência de si universal, mas só em potência, não em ato. Em ato, essa razão se torna um mundo, o mundo do espírito ou da história humana. Nessa história, porém, o espírito deve saber-se a si mesmo, progredir da verdade à certeza. O espírito é uns “nós”.

O “Eu existo” de uma consciência de si só é possível por meio de um outro “Eu existo”, e é uma condição de meu próprio ser que um outro seja para mim e que eu seja para um outro. Não sou para mim mesmo senão ao me tornar objeto para um outro. Como espírito, a razão se tornou o nós, já não é a certeza subjetiva de se encontrar imediatamente no ser, ou de pôr a si mesma pela negação desse ser, mas se sabe como esse mundo, o mundo da história humana, e, inversamente, sabe esse mundo como sendo o Si.

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6.1 O espírito verdadeiro: a eticidade

Para Hegel “o espírito é a vida ética de um

povo”.21 No desenvolvimento dialético desse mundo em três tempos – o espírito imediato, o espírito estranho a si mesmo, o espírito certo de si mesmo – corresponde a três períodos da história universal – o mundo antigo (Grécia e Roma), o mundo moderno (do feudalismo à revolução Francesa) e o mundo contemporâneo (aquele de Napoleão e da Alemanha no tempo de Hegel).

O homem real é sempre um ser social, isto é, político e histórico: vive e age dentro de um Estado, e seus atos criam a história. Esse homem que vive em sociedade, através de sua ação coletiva cria o Estado e o transforma pela negação sucessiva das diferentes formas de sua realização. Essa transformação do Estado, e, portanto, do homem-cidadão, é a história universal.

O Estado já não pode ser apenas o Estado substancial da cidade antiga, tornou-se um espírito certo de si mesmo, exprime-se na ação histórica de um Napoleão, enquanto ainda um mundo burguês (oposto ao cidadão) em que cada um, ao crer trabalhar para si, trabalha para todos.

21 FE, pg, 306.

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O que caracteriza o primeiro momento do espírito, o momento da imediatez, é que, nele, o Si ainda não aparece como a potência do negativo que se opõe a ser: a consciência de si ética, a de Antígona ou de Creonte, adere imediatamente a sua ação, ao conteúdo que pretende atualizar. Hegel descreve aqui a Cidade antiga, e o declínio desta cidade será representado segundo a tragédia antiga. “A família como conceito carente-de-consciência, e ainda interior, se contrapõe à efetividade do povo, se contrapõe ao povo mesmo; como ser ético imediato se contrapõe a eticidade que forma e se sustém mediante o trabalho em prol do universal: os Penates se contrapõem ao espírito Universal”.22 A lei humana corresponde às leis explícitas da Cidade, à vida social e política de um povo; a lei divina, aos Penates, à família que é o germe e como a possibilidade do mundo.

O Estado é obra dos cidadãos; em sua necessidade abstrata, ainda não se tornou o destino deles. Portanto, a divisão da substância em lei humana e lei divina, lei manifesta e lei oculta se efetua em virtude do movimento da consciência que não capta o ser se não por contraste com um Outro, haure a figura do consciente no fundo de um elemento inconsciente. Lei humana e lei divina, Cidade dos homens e família são outros um para o outro, e, no entanto, complementares.

A lei humana exprime a operação efetiva da consciência de si, a lei divina tem, portanto, a forma da substância imediata ou da substância posta somente no elemento do ser: uma já é a operação, a

22 FE, pg, 310.

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outra é fundo sobre o qual a operação se destaca e no qual emerge.

Nenhuma das duas leis é unicamente em si e para si. A lei humana, em seu movimento vital, procede da lei divina; a lei vigente sobre a terra, da lei subterrânea; a lei consciente, da inconsciente; a mediação da imediatez: - e cada uma retorna, igualmente, ao ponto donde procede. A potência subterrânea, ao contrário, tem sobre a terra sua efetividade: mediante a consciência torna-se ser-aí e atividade.23

A família é a substância da vida ética como

pura e simples imediatez, isto é, como natureza. Aqui, a constituição (grega) democrática é a única possível: os cidadãos ainda não têm consciência do particular, nem, por conseguinte do mal; neles não está esfacelada a vontade objetiva.

Só uma constituição democrática poderia ser apropriada para esse espírito e para esse Estado. Vimos o despotismo, em magnífica proporção, como uma configuração adequada ao oriente. Não menos adequada é a forma democrática na Grécia, como determinação histórico mundial. Na verdade, a liberdade do indivíduo existe na Grécia, mas ainda não atingiu a concepção abstrata de que o sujeito pura e simplesmente depende do substancial – do Estado como tal. Na Grécia a vontade individual é livre em toda a sua vitalidade, segundo a sua particularidade e a atuação do substancial. Em Roma, veremos, ao contrário, o rude domínio sobre os indivíduos; assim como, no império germânico, uma monarquia na qual o

23 FE, pg, 317.

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indivíduo tem obrigações a cumprir, não apenas para com o monarca, mas também em relação a toda organização monárquica.24

Nos gregos reinava o hábito de viver para a

pátria. Seu fim era a pátria viva, aquela Atenas, aquela Esparta, aqueles templos e altares, aquela maneira de viver em conjunto, aqueles hábitos e costumes. Para o Grego, a Pátria era uma necessidade fora da qual ele não podia viver.

Em resumo, os momentos da essência ateniense eram a independência do indivíduo e sua formação, animada pelo espírito de beleza. Por intermédio de Péricles, foram esses eternos monumentos da escultura, cujos poucos restos assombraram o mundo posterior.25

O cidadão antigo era livre na medida em que

se confundia com a Cidade, na medida em que a vontade do Estado não era distinta de sua vontade própria. Ignorava, então, tanto o limite de sua individualidade como a coerção externa de um Estado dominador. No entanto, a Cidade – espírito imediato – se dissolveu sob a ação das guerras. Um imperialismo nivelador lhe sucedeu. O cidadão como tal desaparece, e em seu lugar surge a pessoa privada. O indivíduo se redobra em si mesmo.

Assim, Atenas deu uma demonstração de ter sido um Estado que basicamente viveu para a beleza e que tinha consciência formada sobre a seriedade dos assuntos públicos e sobre os interesses do

24 Filosofia da História, pg, 210, Hegel. Editora UNB. 25 Filosofia da História, pg, 218, Hegel. Editora UNB.

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espírito e da vida humana, ligados à valentia audaz e à atitude prática e hábil.26

6.2 O espírito alienado de si mesmo: a cultura

No Mundo ético, a consciência simples, em

unidade imediata com sua substância, não dava lugar a alienação. Esta ocorre quando a substância significa um ‘ser aí’ excludente do Si, com o qual ele só entra em unidade alienando-se e assim produzindo sua sustância.

No Estado de Direito, surgia a cisão entre o Si da pessoa e o mundo, (que se determinava como exterior e negativo). Só que a efetividade, ao mesmo tempo presente e estranha, é ainda essência elementar e contingente, ‘violência externa de elementos desencadeados, pura devastação’. E o Si, concebido como válido imediatamente em-si e para –si, (sem alienação, mas sem substância) não passa de joguete dos elementos tumultuosos. Agora no mundo da cultura, o ‘ser-aí’ da efetividade, a essência da substância vem do ‘desessenciamento’, da ‘extrusão’ da ‘alienação’ do Si; formando um mundo espiritual – compenetração do ser e da individualidade – posto que é obra sua; mas onde não se reconhece: parece-lhe algo estranho.

Ao contrário do mundo ético, que era sua própria presença e cuja unidade prevalecia sobre a dualidade das potências, aqui tudo tem um espírito

26 Filosofia da História, pg, 219, Hegel. Editora UNB.

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estranho: o Todo (e cada momento singular) repousa numa realidade alienada de si mesma, que se rompe num reino caracterizado pela efetividade da consciência de si e de seu objeto; e noutro reino, o da pura consciência, além do primeiro, e onde reside a Fé.

O mundo ético, quando retornava a si, dava no si singular, a ‘pessoa’ do direito; mas o mundo da cultura encontra em seu retorno o Si universal, a consciência que captou o conceito. É a ‘pura intelecção’ em que a ‘cultura’ se consuma na época das luzes: reduzindo tudo a conceitos, transmudando todo ser-em-si em ser-par-si, perturbando até a ordem caseira que arrumava o mundo da Fé, leva-se a cabo a alienação. Porém, quando a realidade efetiva perde toda a sua substancialidade, naufragam juntas Cultura e Fé. Surge então a Liberdade absoluta, em que o Espírito, antes alienado, retorna todo a si; e imigra da terra da cultura para a da consciência moral.

O mundo espiritual é o mundo da cultura e da alienação. O escravo só se torna o senhor do senhor e só se eleva à consciência de si verdadeira, que é ele em si mesmo, por meio desse processo da cultura ou da formação do ser-em-si. No trabalho, a consciência escrava chega a exteriorizar-se a si mesma; ao formar as coisas, forma-se a si mesma, renuncia a seu Si natural, escravo do desejo e do ser-aí-vital; por essa via, ganha seu Si verdadeiro. O mundo cristão compõe-se de pseudo-senhores que aceitaram a ideia abstrata de liberdade que tinham os escravos. Pseudo-escravos e pseudo-senhores (o que é o mesmo) são os burgueses, isto é, os cidadãos cristãos.

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O mito fundamental do cristianismo é a união do universal (Estado = Deus) com a particularidade (família = homem-animal): a encarnação de Deus, Cristo. O ideal do cristão é imitar Cristo; mas ele não pode tornar-se Cristo: esta é a contradição interna do cristianismo. (Para Hegel, é o homem que se torna Deus no fim da história, pela luta e pelo trabalho que a criam: a encarnação é a história universal; a revelação é a compreensão dessa história, por Hegel na fenomenologia). O cristão acha que pode realizar-se e revelar-se a si imediatamente, em seu foro interior, sem passar pela imediação da ação social, a ação que faz com que ele saia de si. O cristão fecha-se em si, o Estado está fora, além dele; é-lhe estranho. Quando o particular nele penetra, torna-se estranho a si próprio. O mundo exterior é estranho ao cristão; se ele quiser dar uma realidade objetiva a seu Eu, terá de fazer ato de abnegação, alienar sua personalidade.

O mundo cristão é um mundo onde o trabalho tem valor positivo. É a ideologia do escravo trabalhador que nele triunfa. Assim, para que o trabalho tenha valor, é preciso que haja o servir: trabalho e, em geral, ação a serviço do amo, do rei e, em última instância, de Deus; além disso, o trabalhado deve efetuar-se (como escravo) na atitude de angústia da morte.

O mundo da cultura tem duas vertentes que divergem e combatem. Uma é a fé, a religião do mundo da cultura, diversa de outras formas religiosas já encontradas e da religião como é vista no final da fenomenologia. Hegel diz que: “Ela já nos apareceu em outras determinidades, a saber, como consciência infeliz – como figura do movimento, carente-de-

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substância, da consciência mesma. Também na substância ética a religião aparecia como fé no mundo subterrâneo; mas a consciência do espírito que-partiu não é propriamente fé, nem a essência é posta no elemento da pura consciência, além do efetivo; ao contrário, ela mesma tem uma presença imediata: seu elemento é a família”.27

A fé um pensar que se desloca para um além

da pura consciência – do pensamento para a representação -, criando um mundo suprassensível, que é essencialmente outro em relação à consciência-de-si. A outra vertente é a pura intelecção, assumindo uma figura histórica no iluminismo, que teve um papel fundamental ao consolidar, numa visão enciclopédica as versões intelectuais mais pertinentes e penetrantes da época. Mas declarou uma guerra total a fé, que chamava de “superstição”.

A pura inteligência sabe a fé como o oposto a ela, à razão e à verdade. Como para ela, a fé em geral é um tecido de superstições, preconceitos e erros, assim para ela a consciência se organiza em um reino de erro.28

O que Hegel estuda é, portanto, a luta entre a

fé e a intelecção. Ambos os termos se apresentam um ao outro, como um retorno do mundo da cultura: a fé é uma fuga desse mundo, a intelecção universal é seu resultado.

27 FE, PG, 365. 28 FE, PG, 374.

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Essa luta se realizou na história: no século XVI com o renascimento e com a reforma, e no século XVIII com a Aufklärung. A razão cristã é o racionalismo do século XVIII. Sua evidência é a do cogito cartesiano. A razão não tem conteúdo, por ser puramente negativa. É a fé que tem um conteúdo positivo, mas tosco e incompreensível, in-evidente: um objeto. Fé e razão são pensamentos e só criam pensamentos, seres da razão; mas o homem da fé não o sabe (ele pensa que Deus existe realmente); ao contrário, o homem da razão é consciente de si. O pensamento da fé cristã está ligado a coisa (donde a teologia). Ao contrário, o homem da razão, levando ao extremo o solipsismo, declara que o mundo é obra sua, ou melhor, obra do seu pensamento. Mas ele não compreende que é preciso agir – lutar e trabalhar – para realizar o pensamento, criar um mundo.

Tanto a fé como a pura intelecção são o resultado da alienação do espírito que procura transpor tal alienação: a fé é a superação do mundo pelo pensamento de seu além absoluto, o pensamento do ser do espírito; a intelecção é o retorno do espírito em si mesmo como ato de pensar, negação de toda alienação. 6.3 O espírito certo de si mesmo: a moralidade

Aqui Hegel analisa como um movimento que

visa unificar o si com sua substância; com sua verdade; a certeza de si com o objeto.

O mundo ético mostrava, com seu destino e sua verdade, o espírito que nele tinha partido, - o Si singular. Já aquela pessoa do direito tem sua substancia e seu conteúdo fora dela. O movimento

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do mundo da cultura e da fé suprassume essa abstração da pessoa, e por meio da completa alienação, por meio da suprema abstração a substância se torna, para o si do espírito, primeiro a vontade Universal, e finalmente a sua propriedade. Parece assim que afinal o saber se tornou aqui perfeitamente igual a sua verdade, já que essa verdade é esse saber mesmo, e desvaneceu toda a oposição dos dois lados. Na verdade, [isso se deu] não para nós ou em si, mas para a própria consciência-de-si. É que a consciência-de-si obteve o domínio sobre a oposição da consciência mesma. Essa repousa na oposição entre a certeza de si, o saber; assim como a certeza de si mesma, enquanto tal não tem mais fins próprios, assim também não está mais na determinidade, mas é puro saber.29

O mundo ético encontrava sua verdade apenas

no Si defunto; a pessoa do ‘Estado de Direito’, por abstrata, tinha sua substância fora dela; porém a alienação do ‘Mundo da Cultura’ suprassumia esta abstração e produzia como resultado, na ‘Liberdade Absoluta’, a substância que se torna patrimônio do si, qual enfim domina a oposição constitutiva da consciência, ao identificar-se com o seu Outro.

O espírito imediato – o espírito ético – conduzira-nos ao espírito separado de si mesmo, tendo seu objeto fora de si; esse espírito dilacerado, por seu turno, nos reconduziria ao espírito que se sabe a si mesmo, possuindo a si mesmo em seu objeto absoluto, o puro dever. Assim, no caráter, o espírito imediato – o espírito ético – apresentava-nos uma completa fusão do ser e de sua destinação ética.

29 FE, pg, 410.

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A feminilidade de Antígona era um dado natural que tinha sua significação espiritual. Tratava-se de uma vocação irresistível no pleno sentido do termo. Tal imediatez é reencontrada na consciência do puro dever, pois o puro dever não é algo de estranho à consciência de si, mas a sua própria essência. Entretanto, a consciência de si moral não é como Antígona e Creonte, um caráter, ou seja, uma natureza determinada e, por conseguinte, parcial; o momento da existência natural que caracterizava o espírito ético deve ser aqui transposto. A consciência de si moral, como consciência do puro dever, é consciência universal; com efeito, é essencialmente o movimento do Si que consiste em suprimir a abstração do ser-aí-imediato e se tornar consciente universal. Esta liberdade é essencialmente uma libertação; é, portanto, simultaneamente imediata e mediata.

A moral kantiana é tomada como a expressão de um momento do espírito do mundo. Insistiu-se frequentemente nas estreitas relações entre o pietismo e o kantismo. Durante seus anos de juventude, Kant sofreu a influência de Spener e do pietismo, por intermédio de sua mãe e de seu mestre, Schultz. O pietismo, sem opor-se diretamente à ortodoxia luterana, descobre a fonte da religião mais na vontade do que no entendimento. Critica todo ensino externo da teologia e propõe-se a voltar à comunidade cristã primitiva. Embora um certo misticismo não esteja completamente ausente desse movimento, trata-se sobretudo de um movimento de purificação moral. Sofrendo simultaneamente a influência do pietismo e do racionalismo, Kant devia acentuar ainda mais o moralismo da doutrina, bem

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como afastar os elementos propriamente religiosos ou místicos. Em seus escritos de juventude, Hegel – tentara escrever uma Vida de Jesus inspirando-se na obra de Kant sobre a religião nos limites simples da razão – devia descobrir, como Schleiermacher, as diferenças entre uma visão puramente moral do mundo e uma visão propriamente religiosa.

A ‘visão moral do mundo’ é constituída pelo conjunto de postulados da razão prática – aqueles que Kant enuncia no final de sua crítica -, mas amplamente interpretados e repensados por Hegel. Hegel não considera esses postulados – assim como foi feito algumas vezes – complementos do sistema kantiano que possam ser aceitos ou recusados, sem tocar na essência da filosofia crítica. Pelo contrário, tais postulados lhe parecem indispensáveis e como que exigidos pelo sistema.30

Aquela primeira experiência e esse postulado não são os únicos, mas abre-se um ciclo inteiro de postulados. É que a natureza não somente é essa modalidade exterior totalmente livre, na qual a consciência teria de realizar seu fim, como em um puro objeto. Nela mesma, a consciência é essencialmente uma consciência para qual existe esse outro Efetivo Livre; quer dizer, ela mesma é algo contingente e natural.31

A consciência moral cumpre o dever, mas vê a

Natureza indiferente quanto a proporcionar-lhe a Felicidade. A consciência moral e sua cosmovisão têm na base um paradoxo fundamental: sua maneira

30 Gênese e Estrutura da Fenomenologia do Espírito de Hegel, Jean Hyppolite. 31 FE, pg, 414.

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de constituir seu Outro. Daí decorrem os três postulados (de Kant), essa ninhada de contradições.

Portanto, a visão moral do mundo não é de fato, outra coisa que o aprimoramento dessa contradição fundamental em seus diversos aspectos; para usar uma expressão kantiana, que aqui se ajusta ao máximo, é ‘um ninho inteiro’ de contradições carentes-de-pensamento. A consciência se comporta assim nesse desenvolvimento: fixa um momento e daí passa imediatamente a outro, e suprassume o primeiro; mal porém acaba de estabelecer esse segundo, também o dissimula de novo e faz, antes, o contrário ser a essência.32

Sobre os postulados Hegel diz que;

o primeiro postulado era a harmonia da moralidade e da natureza objetiva, o fim-último do mundo; o segundo era a harmonia da moralidade e da vontade sensível, o fim-último da consciência-de-si como tal. O primeiro era, pois, a harmonia na forma do ser-em-si, o segundo na forma do ser-para-si. Mas o que une, como meio-termo, esses dois fins-últimos extremos que são pensados, é o agir efetivo mesmo. Esses fins são harmonias cujos momentos em sua diferenciação abstrata não se tornaram ainda objetos; isso acontece na efetividade, em que os dois lados surgem na [sua] consciência propriamente dita, cada um como o outro do outro. Os postulados que assim se originam, como antes só continham harmonias em si essentes separadas das harmonias em si essentes separadas das harmonias para si

32 FE, PG, 421.

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essentes, agora contém harmonias em si e para si essentes.33

O primeiro postulado era o fim último do

mundo; o segundo o da consciência-de-si. Um a harmonia, na forma do em-si; outro a harmonia na forma do para-si. Cada um destes fins é o Outro do Outro. O meio termo unindo esses extremos é a ação moral efetiva, em que surge a pluralidade de deveres; e por isso se recorre a novo postulado. Com o terceiro postulado, a visão moral se completa, mostrando que não passa de representação. Põe a unidade dos dois lados-puro dever e efetividade – como momentos, ou seja, como suprassumidos.

Põe-se como não-moral e depois suprassume sua efetividade numa essência absoluta, representada, para não contradizer a moralidade. É que esta consciência não desenvolve seu próprio conceito, o qual somente mantém unidos os momentos, capta o ser-Outro enquanto tal e seu contrário absoluto como o si mesmo.

A fenomenologia do Espírito parte de um espírito verdadeiro, ou seja, um espírito objetivo, no qual a certeza subjetiva desaparecia numa verdade objetiva; após a mediação da cultura e da alienação, chegamos a um espírito subjetivo no qual a verdade (objetiva) desaparece na certeza que dela tem um sujeito. O espírito já não é substância, mas refletiu-se inteiramente em si mesmo, tornou-se integralmente sujeito.

É isto mesmo que exprime o Si como Gewissen: espírito certo de si mesmo. Assim, Hegel retoma sua concepção do Si e da ‘coisa mesma’ para

33 FE, PG, 416.

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nos indicar a significação de todo o desenvolvimento dialético sobre o espírito tornou-se o sujeito humano criador de sua história, que já não tem o Universal fora de si, que já não se opõe ao universo, mas o traz consigo e o absorve nele. O espírito é sujeito livre. É verdade que se haverá de perguntar de que sujeito se trata. Com efeito, a questão é embaraçosa, visto que o Si, no qual se reflete o espírito substancial do início, é tanto o Si da individualidade natural quanto o Si universal.

Hegel trata agora do cidadão do Estado universal e homogêneo (napoleônico), isto é, do homem plena e definitivamente satisfeito. Na realidade, trata-se de Napoleão (que é o único a estar satisfeito em ato) e do próprio Hegel (plenamente satisfeito também ele pelo fato de ter compreendido Napoleão). Napoleão aparece como o homem da ação que revelou ao homem suas possibilidades criadoras. O espírito livre é o espírito criador que não se embaraça com o universal abstrato, para opô-lo a efetividade, mas age e possui a essência na certeza – que encontra nele mesmo – da validade de seu ato.

O que aqui se descreve é o momento da decisão criadora, e o universal é absorto no desenvolvimento desta ação, em vez de ser transcendente em relação a ele. Em outros termos, em vez de ser como no moralismo kantiano um em-si abstrato, uma transcendência inacessível, o universal tornou-se um momento da ação humana, um ser-para-outro. Como tal, não desapareceu; antes, adquiriu uma significação concreta, a do reconhecimento da ação pelas outras individualidades.

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O singular é o homem de ação cujo ato é sempre finito, a consciência ativa que, em sua liberdade, não pode deixar de descobrir em si mesma, em sua visão particular tomada como absoluta, o próprio mal. O universal é a consciência judicante que se opõe à consciência ativa e não percebe seus próprios limites, os que residem no fato de não agir e de somente julgar. Consciência judicante e consciência pecadora são duas figuras de si que, como as do Senhor e do escravo, da consciência nobre e da consciência servil, trocam seus papéis respectivamente.

No mundo ético, a linguagem exprime a verdade objetiva que a consciência de si espiritual só faz atualizar; por isso, é somente a expressão de uma ordem social impessoal: ela diz, portanto, ‘a lei ou o mandamento’ que se impõe à consciência individual. Essa primeira forma de linguagem ainda está desprovida do Si, como o exige esse mundo, e o legislador desaparece diante do enunciado do que vale em si e para si. Assim, a linguagem exprime o mandamento que dirige a conduta individual e parece emanar de uma potência superior ao Eu. Nesse primeiro mundo do espírito, há uma outra forma de linguagem: trata-se da queixa, que é uma lamentação diante da terrível necessidade. Aqui, Hegel pensa na tragédia antiga.

O que Hegel chama espírito na fenomenologia é a experiência do espírito objetivo tornando-se espírito absoluto. Tal saber de si do espírito é a própria filosofia, é a verdade que se tornou ao mesmo tempo certeza, verdade viva que se sabe a si mesma. Os títulos dos diferentes capítulos da fenomenologia do espírito propriamente dito são reveladores do

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movimento e do sentido dessa dialética: o espírito verdadeiro, o espírito tornado estranho a si mesmo (o momento geral da alienação e da oposição), o espírito certo de si mesmo. O movimento vai sempre da substância ao sujeito, do espírito, que somente é, ao saber de si do espírito; assim se afirma, uma vez mais, a tese fundamental da fenomenologia: "o Absoluto é sujeito". Tal tese, porém, só poderia receber a plenitude de seu sentido se Hegel atingisse a plenitude da consciência de sí universal, superando a consciência de si singular, capaz somente de fundar a história pela historicidade de seu ser. A razão já era a consciência de si universal, mas só em potência, não em ato. Em ato essa razão se torna um mundo, o mundo do espírito ou da história humana. Nessa história, porém, o espírito deve saber-se a si mesmo, progredir da verdade a certeza.

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= VII =

A RELIGIÃO Religião é sempre essência da consciência

absoluta. Nas figuras anteriores, era a consciência que se tinha dessa essência; agora é a consciência que ela tem de si. Religião era aquele suprassensível ou interior na seção "Entendimento" (ainda universal apenas, mas não espírito que se sabe como espírito). Era também a essência imutável na figura da "consciência infeliz" eram as Eumênides subterrâneas, no "mundo ético"; como também as representações celestiais no mundo da fé, e igualmente o "mais além" do Iluminismo, que afetando o mundo da moralidade com seu negativismo, não lhe permitia unir essencialidade e efetividade no seu legislador supremo.

Agora, esse movimento contraditório encontra sua verdade, pois enfim chega ao autoconsciente, à consciência que a essência absoluta tem de si mesma. Contudo, na esfera da religião, por mais elevada que seja, ainda está no elemento da representação: só no saber absoluto (na filosofia) o espírito consciente de si torna-se efetivo e objeto da consciência, sendo absorvida a dualidade que ainda persiste na religião.

A religião precede ao Saber Absoluto; ela já é a apresentação da verdade especulativa, mas num elemento particular, o da representação. Para Hegel,

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a religião não é o que fora para a Aufklärung, um teísmo abstrato, ou aquilo que era para Kant, um prolongamento da vida moral, um postulado da razão prática. Para o jovem Hegel, a religião já é um pensamento especulativo tanto como uma ética. Há um espírito do helenismo, um espírito do judaísmo, um espírito do cristianismo, e a esses diversos espíritos correspondem religiões diversas na história. A religião abstrata do Aufklärung ou a ‘religião nos simples limites da razão’ de Kant não dão conta da originalidade que se manifesta na religião, da genialidade que se exprime nessa consciência de si do espírito.

Schleiermacher que é mais um profeta que quer comunicar aos outros, seu entusiasmo espiritual, do que um filósofo que reflete sobre a religião, observa que: “é um engano buscar o infinito fora do finito".34 Reclama para a religião um lugar à parte na filosofia transcendental. Kant reduziu a religião à uma pura fé moral, negligenciou seu conteúdo especulativo e não viu que ela talvez contivesse a síntese original da metafísica (da filosofia teórica) e da moral. Schleiermacher fala que a religião e a arte são para ele como almas amigas que sentem suas afinidades.

A religião e a arte se encontram, uma ao lado da outra como duas almas amigas, cujo parentesco íntimo, ainda estes cheguem a pressenti-lo, todavia lhes é desconhecido.35

34 Sobre a Religião, F.D.E. Schleiermacher, Novo Século. 35 Sobre a Religião, F.D.E. Schleiermacher, Novo Século.

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Fala da religião como de uma música: “Os sentimentos religiosos devem, como uma música sacra acompanhar todas as ações do homem.”36

A religião transforma a simples música da vida em uma harmonia. Schleiermacher chama os sacerdotes de virtuosos, artistas da religião que comunicam aos fiéis essa intuição do Universo na qual a fé moral e o saber especulativo são ultrapassados.

O pensamento de Hegel sobre a religião, tal como aparece na Fenomenologia, está distante desses discursos proféticos. Apesar disso, também descobre na religião uma forma superior de espírito. A religião é a consciência de si do espírito, mas ainda não é o saber absoluto, pois tal conhecimento do espírito pelo espírito é um conhecimento no elemento da representação; por isso talvez a arte seja um momento de toda a religião. A religião já está presente nas figuras anteriores da consciência. Para além do fenômeno sensível, o entendimento descobriu um interior suprassensível, mas faltava a esse interior o Si da consciência.

A consciência de si, como consciência de si abstrata, nos apareceu como consciência infeliz, projetando para além de si mesma seu ideal de liberdade e aspirando reencontrar, na objetividade, aquela unidade de si subjetiva. A propósito do espírito, vimos, por fim, uma religião do mundo inferior na qual o destino era à noite aniquiladora, ao passo que o si do defunto ainda não era levado à universalidade verdadeira. Na fé do mundo da cultura ou na religião da Aufklärung, assim como naquela que é prolongada pela visão moral do mundo, a

36 Sobre a Religião, F.D.E. Schleiermacher, Novo Século.

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consciência conheceu seu próprio limite, uma certa experiência religiosa.

Acompanhamos o desenvolvimento de uma consciência individual nas três primeiras partes da Fenomenologia: consciência, consciência de si e razão. Com o espírito, objeto da experiência tornou-se um ‘mundo’ e, decerto, esse mundo era em si substância espiritual, mas ainda não era consciência de si mesmo como espírito.

O espírito que sabe o espírito é consciência de si e consciência ao mesmo tempo; representa-se a si mesmo em si mesmo, e essa representação é suscetível de se transformar na religião até que esteja perfeitamente adequada àquilo que pretende exprimir. O objeto que a consciência contempla é sempre o espírito e não mais um mundo estranho (é nesse sentido que a religião é a consciência de si do espírito), mas é ao mesmo tempo um objeto da consciência, um objeto cuja forma é imediatamente a revelação completa da essência.

A forma suprema da religião será a religião revelada, porque nesta o espírito será dado a si mesmo como ele é em sua essência, porque a encarnação efetiva de Deus, sua morte e sua ressurreição na comunidade serão o próprio ser-aí do espírito que se sabe tal como ele é. E, nesse momento, o espírito do mundo ou o espírito finito estará reconciliado com o espírito infinito; é essa reconciliação que se tornará objeto da consciência, que no ponto de partida dessa dialética, era somente objeto nosso. No final o espírito efetivo deve tornar-se idêntico ao espírito absoluto, e o espírito absoluto deve saber-se no espírito efetivo como espírito absoluto.

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A religião 81

7.1 A religião natural Na religião natural o espírito é objeto para sí

mesmo, primeiro, na forma de luminosidade; depois, na figura de plantas e animais, e nas obras do artesão. A religião natural, ou seja; religião da natureza, corresponde à consciência, o espírito aí aparece a si mesmo sob a forma do ser imediato. Aqui o espírito diviniza os objetos naturais, é aquela das plantas e dos animais (primeiras religiões da Índia); enfim, o espírito, ainda operando instintivamente, constrói pirâmides e obeliscos, é artesão antes de ser artista, mas a figura do divino começa a perder o caráter de imediatez natural que tinha em sua origem; a natureza já é superada inconscientemente, e o espírito começa a encontrar-se a si mesmo em uma obra. Sob sua forma imediata, o espírito aparece a si mesmo como a luz do Sol nascente. O espírito não é a existência dada à consciência sensível, mas esta lhe serve de símbolo, porém um símbolo que não é resultado de uma reflexão. 7.2 A religião da arte

Essa forma de religião, que corresponde no

espírito efetivo ao mundo ético, o espírito é objeto para si-mesmo na forma de consciência; passa pelas etapas da arte abstrata, da arte viva, enfim, da arte

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espiritual, em que se distinguem a epopeia a tragédia e a comédia. A religião já não é natural: o homem fala. E o deus é parecido com o homem.

A religião da arte é o saber de si do espírito ético, o mesmo que foi visto anteriormente sob o nome de espírito verdadeiro. Este espírito real já não é o espírito do despotismo oriental ou dos povoados insociáveis, ainda extraviados na vida da natureza, mas é o espírito substancial de uma cidade humana que superou a selvageria da natureza e que ainda não alcançou a abstração e a dor da subjetividade. A Cidade aparece como uma obra consciente de si, um espírito universal individualizado e concreto. Os costumes da Cidade são a obra de todos e de cada um. O povo que vive nesta substância é um povo livre. Esse feliz equilíbrio é de uma humanidade perfeita em sua finitude; é, porém, um equilíbrio instável, uma juventude do espírito do mundo.

Entre a religião da natureza e a religião cristã surge, pois, esta religião da arte que é a consciência de si do espírito como humanidade finita. A beleza da arte antiga aparece quando o espírito se eleva acima de sua realidade, quando volta de sua verdade objetiva ao puro saber de si mesmo. Então, esta arte já não é o ser ético, mas a reminiscência e a interiorização deste ser. Quando o espírito grego se torna o saber de si e se reproduz na obra de arte, esta reminiscência é o sinal de uma forma mais elevada. A evolução da religião da arte é sua passagem à subjetividade abstrata, ao puro conceito, que nesta criação artística ainda não é mais que a forma da atividade que cria.

Na obra de arte abstrata, as estátuas, nessa fase são figurações da divindade, ainda com

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reminiscências dos elementos da natureza. A obra que cria não é viva: o momento consciente de si está do lado de quem produz ou quem contempla a obra. Mas há também o hino, onde a linguagem é o elemento de figuração do deus: presença fluida que se propaga como contágio universal. O oráculo é outra linguagem do deus, que não tem a universalidade do hino. Além de singular é contingente: informa sobre dados ocasionais e irrelevantes. Já no culto, a essência divina desce do além, e a alma sobe a seu puro elemento divino.

Na obra de arte viva, o resultado do culto é a unidade imediata do humano e do divino. O homem tomou o lugar da estátua; aqui, porém, somente a corporeidade do divino é realizada; é a exterioridade sem a interioridade. Só um elemento capaz de tornar a exterioridade interior e a interioridade exterior: a linguagem, que tem um conteúdo claro e universal. São a epopeia, a tragédia e a comédia, formas superiores da arte.

A obra de arte espiritual vai retomar no elemento da linguagem todos os momentos anteriores. Agora o divino já não é realizado no mármore, mas a linguagem de um povo que soube elevar-se à universalidade, e é nela que ele obtém sua representação mais adequada. O problema é o da unidade dos dois mundos, o divino e o humano. Os deuses, enredando-se na ação, parecem homens superiores, ao passo que, elevados à Universalidade pela recolecção da recordação, os homens se tornam, por sua vez, deuses mortais.

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7.3 Religião revelada Sucedendo as anteriores, nessa forma de

religião a essência divina se torna efetivamente Si, pela Encarnação. A revelação se dá na comunidade, consciência-de-si universal, e tem três momentos: 1) A essência ou o espírito dentro de si. 2) O espírito dentro de extrusão e/ou representação; aqui, o outro do espírito é o mundo, onde o Mal luta contra o bem até a reconciliação redentora, quando da morte ressurge a vida espiritual da comunidade. 3) Retorno à consciência-de-si, quando essa comunidade produz em si o que veio-a-ser em si. O que vivencia está além da representação; mas esse conteúdo verdadeiro é sabido sob forma ainda não conceitual.

A religião da arte nos conduziu do saber do espírito como substância ao saber do espírito como sujeito. Nas religiões orientais, o Absoluto aparece como a substância em que a consciência de si desaparece enquanto tal; o homem enquanto ser finito, não é se não um acidente; sua vida é a do escravo e o ser universal não tem verdadeira relação com o saber de si que se desperta nele. Esta religião é a do temor e do tremor; Deus, (que já é um sujeito), está para além do finito, é o em si abstrato. A religião da arte, entretanto, humanizou esta essência divina; a própria consciência pôs fim a figura do divino por meio de sua própria atividade, de modo que, ao término de seu desenvolvimento, a substância se alienou completamente no Si.

A alienação da certeza de si exprime-se já na consciência infeliz. “É o destino trágico da certeza de

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si mesmo, que deve ser em si e para si”.37 Deste Si da consciência feliz não poder se encontrar tal como se busca. Ele está, portanto, para além de si, e quando crê atingir-se, descobre que se perdeu. “É a dor que se expressa na dura palavra: Deus morreu”.38 Portanto, o homem, como consciência de si, aliena então sua certeza de si, faz dela um mais além, uma essência imutável; porém, em virtude da unidade indivisível do ser para–si, esta alienação permanece consciente, de modo que é conservada nesta alienação de si e permanece o sujeito da substância. A consciência infeliz, todavia, não é senão um pressuposto histórico do cristianismo, é a dor da subjetividade que queria renunciar a si mesma e reencontrar na objetividade, aquela unidade da essência e da consciência de si que é seu conteúdo.

No saber especulativo da comunidade, o espírito já não está separado da comunidade: “cada vez que vos reunirdes em meu nome eu estarei no meio de vós”. Se então o espírito já não está separado deles, ele os habita.

Deus é assim revelado aqui como ele é: ele é aí assim como ele é em si; ele é aí espírito. Deus só é acessível no puro saber especulativo, e é somente nesse saber; e só é esse saber mesmo, porque Deus é o espírito, e esse saber é o saber da religião revelada.39

O retorno ao passado, “fazei isso em memória

de mim”, significa um retorno a uma potência mais

37 FE, PG, 504. 38 FE, PG, 504. 39 FE, PG, 511.

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elevada, porque o passado tornou-se espírito vivo na comunidade, mediatizado pela história dessa comunidade, quer dizer, por sua tradição, que não é somente uma repetição, mas uma revelação contínua.

A comunidade possui uma verdade que é ao mesmo tempo certeza. Em outros termos, a verdade não é para a comunidade um conteúdo estranho, mas ela própria é essa verdade, e tal verdade é seu saber de si. A verdade do espírito na comunidade não consiste apenas em sua substância, ou em elevar a interioridade à representação objetiva: consiste em refletir-se dentro de si, em ser sujeito:

O espírito é conteúdo de sua consciência, inicialmente na forma da substância pura; ou, é conteúdo de sua consciência pura. Esse elemento do pensar é o movimento que desce ao ser-aí ou a singularidade. O meio-termo entre eles é a união sintética, a consciência do tornar-se-Outro, ou representar como tal.40

A vida da comunidade é este movimento que

nela o espírito se efetua. O conteúdo deste espírito se revela à

comunidade em três momentos (que lembram as três pessoas da trindade): 1) Pura substância ou pensamento puro; 2) representação, meio termo ou ligação sintética; 3) momento: a consciência de si como tal.

Estes três momentos constituem o espírito, de tal forma que a reflexão do espírito dentro de si é expandir-se nestes círculos concêntricos e passar de

40 FE, PG, 514.

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um para outro. Na consciência infeliz, este conteúdo era objeto de desejo inatingível, pois não o considerava como substância sua. Na consciência crente (mundo da fé) era tomado como um conteúdo essencialmente objetivo da representação, mas separado da certeza da consciência-de-si; esta certeza assumia as formas de vaidade do saber, e de pura intelecção. Agora, a consciência da comunidade tem este conteúdo por sua substância e por certeza de seu próprio espírito.

Os três momentos do saber da comunidade já estão, para nós, no elemento do conceito, ao passo que, para a comunidade, ainda estão no elemento da representação. A consciência religiosa se representa Deus antes da criação do mundo como Trindade, introduz as relações naturais entre o Pai e o Filho:

o representar da comunidade não é esse pensamento conceituante; mas tem o conteúdo sem sua necessidade, e em lugar das formas do conceito leva, para o reino da consciência pura, as relações naturais de Pai e Filho.41 O Logos (Verbo), porém, não é sem natureza

ou mundo. Logos e natureza exigem-se um ao outro. Deus sem o mundo, ou o puro pensamento sem a natureza, é o que se separa de si; isto não é se não um momento que se opõe a um ser-outro:

O elemento do puro pensar, porque é o elemento abstrato, é ele mesmo antes o Outro de sua simplicidade, e, portanto passa para o elemento particular do representar; - o elemento em que os

41 FE, PG, 516.

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momentos do conceito puro adquirem um em relação ao outro, um ser-aí-substancial, como são sujeitos, que não tem para um terceiro a indiferença recíproca do ser; mas refletidos sobre si mesmos, se separam e se contrapõem, um em relação ao outro.42

Assim Hegel expressa que:

o espírito somente eterno ou abstração ou abstrato torna-se para si um Outro, ou seja, entra no ser-aí e [entra] imediatamente no ser-aí imediato. Cria, portanto, um mundo. Esse criar é a palavra da representação para o conceito mesmo, segundo seu movimento absoluto (...).43

Assim, Deus, no elemento do puro

pensamento, é seu próprio vir a ser outro, sua negação como natureza. “No princípio Deus criou o céu e a terra”, nesse elemento, que é propriamente da representação e não mais o do pensamento, as diferenças adquirem uma existência substancial; o espírito está perdido e tornou-se exterior a si mesmo. A consciência religiosa fala de um paraíso terrestre e, em seguida, de uma desobediência: ao comer o fruto da árvore do bem e do mal, o homem perdeu sua inocência, a de quando estava perdido na criação. Porém filosoficamente, sabemos que era preciso que ele abandonasse essa consciência animal a fim de tornar-se espírito para si.

No entanto;

42 FE, PG, 517. 43 FE, PG, 517.

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o mal aparece como o primeiro ser aí da consciência adentrada em si; e porque os pensamentos do bem e do mal são pura e simplesmente opostos, e ainda não se resolveu essa oposição – essencialmente essa consciência é só mal.44

O homem, sendo o solo desta oposição, e

enquanto é para si mesmo consciência desta contradição, se toma como o mal e lança o bem para além de si. Assim Poe sua diferença e sua igualdade com Deus. Deus, contudo, se fez carne. A essência divina humilhou-se até o ser aí que lhe é estranho, mas no sacrifício e na morte do mediador ela suprimiu esse ser aí estranho e o elevou até ela. “A morte do homem divino é a negatividade abstrata”.45

Mas ela perde essa significação natural na consciência de si da comunidade:

A morte daquilo que imediatamente significa, do não ser deste singular se transfigura na universalidade do espírito, que vive em sua comunidade, e nela cada dia morre e ressuscita.46

A morte de Cristo (Logos), é a posição do

espírito da comunidade, a consciência de si universal. “A morte do mediador, apreendida pelo Si, é o suprassumir de sua objetividade ou de seu ser-para-si particular. Esse ser-para-si particular tornou-se consciência de si universal”.47

44 FE, PG, 518. 45 FE. Pg, 525. 46 FE. Pg, 526. 47 FE, PG, 526.

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O movimento que nele se realizou deve agora efetuar-se no seio da comunidade e tornar-se seu próprio movimento, em vez de ser-lhe estranho. Segundo Hegel a morte do mediador significa tanto a morte do aquém sensível, que em vão os discípulos buscaram reter, quanto à do além insondável que condenaria irremediavelmente toda a existência humana.

É nesta morte que a substância se transforma integralmente em sujeito.

A morte é o sentimento dolorido da consciência infeliz, de que Deus morreu. Esta dura expressão do simples saber de si mais íntimo, o retorno da consciência às profundezas da noite do ‘Eu = Eu’, que nada mais se distingue nem sabe fora dela. [...] Esse saber é, pois, a animação pela qual a substancia se tornou sujeito. Morreu sua abstração e carência-de-vida, e assim a substância se tornou consciência-de-si simples e universal.48

Esta comunidade já não é o Cristo como figura

singular, Mas o Paráclito (o Espírito), em que a encarnação se eterniza.

O ponto de vista da Bíblia tende a desaparecer para dar lugar a este Cristo universal que é a comunidade. “O homem divino morto ou Deus humano, é em si, a consciência de si universal”.49, e agora vem ser para si no saber de si. A comunidade religiosa, contudo, ainda não é mais que uma forma imperfeita do saber absoluto. Se bem que nela a representação volte a consciência de si, esse retorno não é para ela efetivo: ainda é representado por ela 48 FE, PG, 527. 49 FE, PG, 524.

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de maneira que a reconciliação encarnada pela consciência de si não lhe aparece como sua obra; decerto, ela é a verdade que se sabe a si mesma, mas não está consciente de que produz essa verdade. Tal produção da verdade como desenvolvimento do Si compete ao saber absoluto. A reconciliação está no coração; no entanto, a consciência está cindida e a efetividade quebrada. A reconciliação fica num mais além: o presente é o mundo imediato que ainda tem de esperar por sua transfiguração.

Como o Homem divino singular, tem um pai em-si-essente, e somente uma mãe efetiva, assim o homem divino universal – a comunidade – tem por seu pai o próprio saber, e, por sua mãe, o amor eterno que ela apenas sente, mas que não contempla em sua consciência como objeto imediato efetivo.50 Como em-si, o mundo já está reconciliado com

a essência, esta não o considera algo alienado dela; mas sim, seu igual no Amor.

50 FE, PG, 528.

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92 O processo de formação da consciência religiosa...

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= VIII =

O SABER ABSOLUTO Na religião, o espírito ainda estava preso a

forma da representação e da objetividade. O objeto da consciência vai ser ultrapassado, não apenas pelo seu retorno ao Si, mas por se revelar evanescente, e mais: uma extrusão da consciência-de-si. Essa extrusão não tem só conotação negativa, mas também positiva: suprassume tanto o Si quanto o objeto, mas nela a consciência se põe como objeto, e põe o objeto como Si; e como essa extrusão e objetividade são por sua vez suprassumidas, no retorno a si mesma se encontra no outro como tal. O movimento da consciência, para ser espiritual, tem de abranger a totalidade de seus momentos e determinações, captando cada um deles como o Si. 8.1 Recapitulando

O saber absoluto recapitula e enfeixa todos os movimentos e figuras anteriores, que na verdade são as etapas do vir-a-ser. O movimento é o da reconciliação da consciência com a consciência de si,

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94 O processo de formação da consciência religiosa...

da objetividade e do si: reconciliação que já ocorreu na religião, embora no elemento da representação.

História e Natureza. O movimento que faz brotar a força de seu saber de si é o trabalho que o espírito realiza na história efetiva. O espírito termina seu movimento em figuras. Afetadas pela diferença da consciência, seus momentos já não se apresentam como figuras da consciência - que aliás, já retornou ao si -, mas como conceitos determinados A história é o espírito que se extrusa no tempo e onde se encontra e onde se reencontra porque se perdeu. Lento desfile de imagens, contendo, cada uma a seu modo a riqueza total do espírito. Por isso, não há pressa para que o espírito possa compenetrar-se de toda a riqueza de sua substância. Adentrando em si, o espírito entrega a rememoração à figura em que teve seu ser-aí anterior, o qual suprassumido no saber renasce como nova figura no novo mundo do espírito. 8.2 Rememoração

A rememoração é a maneira de conservar os momentos anteriores, e assim o Espírito retoma sua marcha sempre de um nível mais alto. Cada espírito recebe seu o seu reino das mãos de seu predecessor, e a meta final é a revelação do que há demais profundo: o conceito absoluto. Isso se efetua suprassumindo essa profundeza na extensão, onde o eu, adentrando em si, se extrusa em substância.

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O saber absoluto é pois, a meta: o espírito que se sabe como espírito. Sua via de acesso é a rememoração dos espíritos como são neles mesmos, e como organizam seus reinos. Sua recuperação, na forma do agir livre, e na forma da contingência, é a História. Porém vista do lado de sua organização conceitual, é a ciência do saber fenomenal. Os dois lados reunidos, a História concebida, formam a rememoração e o calvário do Espírito Absoluto; a efetividade, a verdade e a certeza de seu trono.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS Examinamos, nesta monografia, a

Fenomenologia do Espírito de Hegel. Percorremos as diversas etapas da consciência humana, ou seja, o longo caminho percorrido pela experiência: esse movimento que a consciência exercita em si mesma, tanto em seu saber como em objeto, enquanto dele surge o novo objeto verdadeiro para a consciência, isso é o que se chama de experiência.

Neste processo de desenvolvimento da consciência, foi analisado a cada capítulo o progresso da consciência, sendo que; para que haja uma compreensão de cada capítulo é recomendável que se compreenda o capítulo anterior a ele. Por isso partimos de uma análise de cada capítulo para que pudéssemos entender melhor sobre o processo de desenvolvimento da consciência religiosa. Mesmo sendo ciente da dificuldade de compreender Hegel, entendemos que conforme todos os comentadores que são mencionados na bibliografia, que a única forma de o entender, é mergulhar neste grande oceano que é a Fenomenologia do Espírito (a princípio). ‘Quem uma vez adoeceu de hegelismo (...) nunca mais fica completamente curado’ (do texto Hegel e a Ordem do Tempo), isso porque ‘Um grande homem condena os humanos a explicá-lo’, (Enciclopédia – por Bernard Bourgeois). Portanto, o trabalho que aqui foi exposto, foi apenas um começo de um longo caminho que nos contagiou de

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hegelismo, e nos condenou a estudá-lo, para compreendê-lo.

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REFEÊNCIAS HEGEL, G. W. Fenomenologia do Espírito: Editora Vozes, 2003.

HYPPOLITE, JEAN. Gênese e Estrutura da Fenomenologia do Espírito: Discurso Editorial, 1999.

KOJÈVE, ALEXANDRE. Introdução à leitura de Hegel: Editora Uerj, 2002.

MENESES, PAULO. Para Ler a Fenomenologia do Espírito: Edições Loyola, 1992.

MENESES, PAULO. Hegel & A Fenomenologia do Espírito: Jorge Zahar Editor, 2003.

INWOOD, MICHAEL. Dicionário de Hegel: Jorge Zahar Editor, 1997.

Leitura Complementar

Arantes, Paulo E. Hegel; A Ordem do Tempo: Editora Hucitec & Editora Polis, 2000.

Schleiermacher, Friedrich D. F. Sobre a Religião: Novo Século, 2000.

Sófocles, Antígona, Tradução de Millôr Fernandes: Paz e Terra, 1996.

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OS AUTORES:

Prof. Jonas Silva Faria Mestre em Teologia pela PontifíciaUniversidade Católica do Paraná – PUC/ PR, Mestrando em Filosofia pela Universidade Estadual de Maringá –

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UEM, graduado em Filosofia pela Universidade Federal do Paraná –UFPR e graduado em Teologia pela Faculdade Teológica das Assembleias de Deus de Curitiba (Em processo de covalidação pela Unicesumar). É docente de pós-graduação lato sensu de Teologia pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná – PUC/ PR, é docente do magistério superior e Coordenador do curso de Teologia no Centro de Ensino Superior de Maringá – CESUMAR, servidor público estadual, docente de Filosofia pela Secretaria de Estado da Educação do Paraná– SEED/ PR. é autor do livro “Filosofia para o curso Serviço Social EAD Unicesumar” (2014)"

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Prof. Jose Francisco de Assis Dias Nasceu em Umuarama-PR; estudou Filosofia no

Instituto Filosófico N. S. da Glória, Maringá-PR (1983-

1985); e Teologia no Instituto Teológico Paulo VI,

Londrina-PR (1986-1989), obtendo a validação no

UNICESUMAR, em 2014. Obteve a Licenciatura

Plena em Filosofia na Universidade de Passo Fundo-

RS (1996). É mestre em Direito Canônico pela

Pontifícia Universidade Urbaniana, Cidade do

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Vaticano (1990-1992), com a monografia “DE

ACQUISITIONE BONORUM”: na legislação particular

da Diocese de Umuarama-PR. É mestre em Filosofia

pela mesma Pontifícia Universidade Urbaniana,

Cidade do Vaticano (2004-2006), com a dissertação

“CONSENSUS OMNIUM GENTIUM”: o problema do

fundamento dos direitos humanos no pensamento de

Norberto Bobbio (1909-2004). É doutor em Direito

Canônico também pela Pontifícia Universidade

Urbaniana, Cidade do Vaticano (2003-2005), com a

tese “DIREITOS HUMANOS: fundamentação onto-

teleológica dos direitos humanos”. É doutor em

Filosofia pela mesma Pontifícia Universidade

Urbaniana, Cidade do Vaticano, com a tese “NÃO

MATAR! o princípio ético não matar como imperativo

categórico no pensamento de Norberto Bobbio (1909-

2004)”.

Atualmente: Professor Titular da UNICESUMAR,

atuando na Graduação, Pós-graduação e Mestrado

em Direito; também atuando no Mestrado em Gestão

do Conhecimento nas Organizações, na

UNICESUMAR. Parecerista de várias revistas

filosóficas e jurídicas; e também do CONPEDI. Suas

publicações versam principalmente sobre Filosofia e

Ética e Direitos Humanos.

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Printed in Brazil Gráfica Viena

Novembro de 2015 Capa: papel Tríplex 250g Miolo: Papel Off Set 75g

Fonte: Arial Corpo: 9, 10, 11, 12