[1o. e 2o. CAPÍTULOS] "FAMÍLIA, PÁTRIA E TRABALHO": A constituição do Centro Operário Cívico...
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CAPÍTULO I
O MUNDO DO TRABALHO: O SURGIMENTO DA FIGURA DO OPERÁRIO
PRINCESINO, SUA TRAJETÓRIA, SUA EXPERIÊNCIA.
“Nos homens de Ponta Grossa, então é notável a tendência para tornaremse o tipo industrial. Ao par que muitos estrangeiros ou indivíduos de origem estrangeira, encontramse aqui numerosos filhos da terra que tem dado prova de extraordinária
capacidade no comércio e indústria”9 (Nestor Vitor)
1.1 "Princesa dos Campos": pelo tropeiro e pelo operário.
Final do século XIX, a região sul do Brasil começa a se destacar pela possibilidade
de uma ascendente industrialização. O caso de Ponta Grossa foi característico nesse
sentido, pois foi ao leito do entroncamento ferroviário10 que passava pela cidade que se
instalou parte considerável de suas primeiras indústrias.
Mudanças significativas proporcionaram tonalidade ao desenvolvimento da
cidade. Ponta Grossa, antes passagem dos tropeiros, se encontrava no “coração” de uma
região que sobrevivia da criação de bovinos11. Era em meio a grandes propriedades rurais
que se desenvolvia uma paisagem industrial modernizada nos trilhos do trem e nos muros
das fábricas, nascia a "Princesa dos Campos"'12.
O trajeto econômico de Ponta Grossa passou a seguir esse mito dos trilhos. E
9 O conhecido romancista Nestor Vitor elaborou tal constatação sobre o homem princesino. Essa citação que primeiramente se apresenta de forma inocente, representa que não bastava uma cidade ser urbana e industrial, possuir energia elétrica e expulsar a falsa mendicância de seu território, Ponta Grossa necessitava também possuir uma cultura do trabalho, um modelo de cidadão que além de civil era prático no trato laboreiro (SANTOS, 1996 p. 225).10 Segundo Leonel Monatirsky: “Desde a sua implantação no Brasil – há mais de um século e meio , a ferrovia contribuiu para o desenvolvimento econômico do país, foi um dos alicerces para a integração regional e nacional, auxiliou processos de urbanização e industrialização brasileiros, foi decisiva nas transformações urbanas das cidades ferroviárias e influenciou a sociedade brasileira” (MONATIRSKY, 2006, p. 3). Relevando as duas estradas de ferro que passam pelos Campos Gerais, Estrada de Ferro São Paulo/Rio Grande (fundada em 1896) e Estrada de Ferro do Paraná (fundada em 1894), Monatisky ainda identifica o período de 1892 a 1930 como uma etapa de ascensão econômica da região, "quando a economia nacional e a região sul do Paraná produzia e exportava ervamate e madeira" (op. Cit. p. 5).11 Antes da ferrovia, Ponta Grossa, conhecida como "corredor do gado", aparece no almanaque Geografia Ilustrada como “nada além de uma trilha de gado em um planalto, margeando os rios e evitando as matas e os capões... sem limites, sem terras cultivadas, sem nada que atraia o homem que ali aparece de passagem, não tem nome certo ou vida própria. É, apenas, lugar nenhum” (CIVITÁ, 1975, p. 42).12 Alguns autores rememoram essa categoria. Todavia, antes mesmo de Ponta Grossa receber tal nomenclatura, ainda enquanto freguesia de Castro, ela já apresentava interesse em desenvolver vida própria, sendo dedicada a diversas atividades econômicas. Sendo que em registrase inúmeros pedidos feitos à Câmara de Castro para desenvolver o comércio local (GONÇALVES; PINTO, 1983, p. 23). Esse espírito é responsável por construir um sentimento de autonomia por parte de Ponta Grossa perante Castro.
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juntamente com a industrialização, essa possibilidade de escoamento da produção
participou dos novos rumos do desenvolvimento da cidade. A linha não era só passagem,
segundo Maria Gonçalves e Elisabete Pinto
a construção de ferrovias serviu de estímulo para atrair migrantes nacionais e estrangeiros empregando sua força de trabalho na própria construção das mesmas e depois na comercialização de mercadorias, contribuindo para acelerar o processo de urbanização (GONÇALVES; PINTO. 1983, p. 16).
O dinamismo do transporte ferroviário contribuiu para que a sociedade ponta
grossense convivesse com um constante processo de modernização. Ao procurar
compreender o espaço urbano de Ponta Grossa, Cicilian Lowen Sahr indica a década de
1920 como de intenso crescimento da cidade. A ferrovia entrou nesse processo ao
momento que se tornou uma variável do crescimento urbano, “a estrada de ferro
acompanhava a estrutura dos espigões do relevo, e os loteamentos se implantavam na
sua margem” (SAHR, 2001, p. 22).
Ponta Grossa não pode ser identificada por eventos espontâneos, como se esses
significassem sua expansão e seu aumento populacional. Toda sustentação da economia
ervamateira e da atividade tropeira passou diretamente pelas mãos de trabalhadores
rurais e urbanos, denotando a participação da população nesse processo. Essas
diligências, ao deixarem de ser preponderantes, passaram por transições. A economia de
passagem dos tropeiros, deixava de ser um processo hegemônico, porém não pode ser
considerada passageira.
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FIGURA 01 Fotografia da Praça João Pessoa, em destaque a Estação da Estrada de Ferro de
Ponta Grossa (PREFEITURA, 1936).
FIGURA 02 Seção de Máquinas da Estrada de Ferro São PauloRio Grande (Op. Cit.)13.
13 A foto demonstra as condições de trabalho nas estradas de ferro, sendo elite operária ou não, é na face dos trabalhadores imortalizada digitalmente que percebemos parte de suas vidas. O Álbum de Ponta Grossa de 1936 é encontrado hoje como um anuário de orgulho ao trabalho para a época da qual foi publicado, exibindo o corpo dos trabalhadores como monumento do labor e do seu próprio esforço (PREFEITURA, 1936).
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A participação nesses acontecimentos por parte da população pontagrossense e
mais precisamente pelos trabalhadores princesinos, se torna o foco desse trabalho. No
caso do momento da ferrovia e da urbanização, não podemos desconsiderar a
participação do braço humano nesse processo.
Em um cenário qualificado por tais elementos que compõe essa urbe ponta
grossense devemos começar privilegiando e expondo a participação dos trabalhadores no
desenvolvimento da cidade. Os caboclos colhedores de ervamate, os imigrantes e seus
carroções, os carregadores do Mercado Municipal, os ferroviários à beira dos trilhos, os
comerciários em seus balcões... Da produção à venda, todo esse processo
desenvolvimentista passou pela mão do ser humano e mais especificamente pelas mãos
dos trabalhadores. Seja na figura do tropeiro ou do operário, a memória nos possibilita
remeter às suas participações na economia.
Ainda que o ponto de incidência da pesquisa seja delimitado por outro recorte
temporal, se torna necessário conceber o aparecimento do trabalhador princesino
partindo de sua participação na história de Ponta Grossa.
Primeiramente, devemos considerar que as condições econômicas e a
efervescência de uma sociedade urbana em desenvolvimento geraram necessidades que
não estavam somente baseadas na produção, mas também na existência de um grande
número de trabalhadores que compusessem as forças produtivas e a mãodeobra local e
que baseassem sua existência no consumo de muitos bens que, em algumas situações,
eram eles mesmos que produziam. Categorias de trabalhos eram criadas, fábricas eram
edificadas, mulheres e homens oriundos de vários lugares do Brasil e também, em grande
excedente, de outras nacionalidades, participaram dos números da população de Ponta
Grossa.
O desenvolvimento econômico, a oportunidade de escoamento da produção por
meio do tropeirismo e da ferrovia, o êxodo rural e os movimentos imigrantistas não devem
ser considerados eventos vãos, fatores desagregados, mas sim, devem ser tratados como
condições simultâneas desse processo e que podem ser representados na demografia
dos tempos e na passagem da criação e do desenvolvimento do ambiente urbano.
A colonização, que alguns situam antes desse momento, já revelava a figura do
tropeiro, do estancieiro, do ervateiro e de outras categorias ligadas à terra. Esse processo
23
pode ser observado na divisão social do trabalho, entre os possuidores dos meios de
produção e os desprovidos de tais meios (MARX; ENGELS, 2006). Além dessa
constatação, para além dessa dialética, o recorte específico procura estabelecer um
diálogo a uma abrangência mais ampla, proporcionando tonalidade às particularidades
encontradas em Ponta Grossa. Não há possibilidade de se colocarem generalizações ao
tema, nem de se proporcionar regras ao geral a partir dessas particularidades (REVEL,
1998).
Em um instante à frente, a administração de novas forças produtivas, a criação do
mundo do trabalho também se revelava no espaço das fábricas. O que esse frisar de
momentos econômicos nos revela, entretanto, é outra simultaneidade. As primeiras
indústrias foram transfiguradas no enriquecimento da ervamate, como foi o caso das
casas de ervamate fundadas no início do século XX como a Hervateira Brasil, a Casa
Hoffmann e a Firma Gelbcke e Miró se tornaram o semblante dessa economia.
A Serraria Olinda também compactua com essa imagem. Assim como a erva
mate, a extração de madeira participou tanto do processo de extrativismo quanto das
primeiras iniciativas nada tímidas da indústria regional. Essa imagem também foi
corroborada pela localização da indústria, ao lado da Viação Férrea São PauloRio
Grande. Portanto, vizinha do mito que corria nos trilhos, era uma atividade era antes
considerada rudimentar e rural – todas essas situações citadas não se colocavam
imediatas à economia industrial, mas se tornam ativas ainda no início da economia
terciária em Ponta Grossa, associando a ainda crescente “Princesa dos Campos” ainda
aos meios de produção da terra.
As próprias linhas de trem, entrelaçadas no emaranhado dos trilhos revelam um
dos maiores segmentos em número de trabalhadores da cidade de Ponta Grossa14. Sobre
os ferroviários pontagrossenses foi construída uma imagem proveniente do momento que
14 Pertencente a esse cenário, o trabalhador da ferrovia ocupa a cidade de Ponta Grossa e se assume enquanto figura participante do seu processo. Segundo Rosângela Petuba: "Neste contexto, os ferroviários pontagrossenses foram considerados tanto numericamente, quanto por sua organização o segmento mais destacado entre os trabalhadores locais, desde a primeira metade do século passado. Ao longo das décadas, a categoria protagonizou diversos momentos significativos na história da cidade" (PETUBA, 2005, p. 4). Leonel Monatirsky desenvolve a figura do operário simplesmente a partir de suas condições salariais, empregatícias e por seu poder de compra (MONATIRSKY. 2006), Petuba desmistifica essa imagem dos ferroviários enquanto membros de uma "elite operária" quando propõe o cruzamento de depoimentos orais com demais fontes. Os constantes acidentes e as constantes baixas nas viagens férreas são a constatação que não só tange o trabalho de Petuba como também revela as condições de trabalho das mulheres e dos homens da ferrovia (PETUBA, op. Cit.).
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o país vivia.
Os aspectos da industrialização local muito explicam o perfil dos operários
princesinos. A situação em que se encontravam nas suas condições de trabalho traduz
algumas prerrogativas de sua organização no movimento operário que surgia já no fim do
século XIX. A priori, a proposta não é fazer um apanhado linear da trajetória da indústria
na cidade, mas demonstrar a influência que alguns fenômenos industriais possuíram
sobre a sociedade pontagrossense. O retrospecto, na realidade, nos remete aos eventos
que significaram desde a possibilidade da existência do proletariado na cidade até o seu
cotidiano dentro e fora das fábricas15.
Entre esses acontecimentos que correlacionam a produção dos bens de produção
e seu consumo com uma possibilidade de existência do proletariado local, percebemos aí
uma cidade conhecida por atrair empresas ao leito da ferrovia. Além disso, a cidade
desde o início do seu alastramento urbano já demonstrava a incidência de vilas e bairros
operários, no caso, ocupados por imigrantes no interior desse percurso. É o caso de
Uvaranas16 e Oficinas17, bairros tradicionais que passaram a agrupar a rede urbana de
15 O crescimento urbano de Ponta Grossa revelouse na paisagem constituída de bairros e subcentros. A industrialização da cidade foi seguida de um outro fenômeno que promulgou diferenciais não só na estrutura do quadro urbano, mas também no cotidiano dos trabalhadores. Sob uma ótica mais detalhada, o estudo da urbanização interage com o comportamento que esse crescimento impulsiona um novo ritmo criado na vida dos trabalhadores fora das fábricas. Quem são? O que fazem? E para chegar a respostas a esses questionamentos, o pesquisador necessita enxergar o operário além da sua figura construída na jornada de trabalho, essas pessoas vão além disso. São mães, pais de família, moradores de várzea ou à beira de um olho d'água, capitães do time de futebol da vila onde moram, lavam pra fora, freqüentadores de botecos, membros de associações, entre outros elementos que procuram possuir para formar sua identidade. A característica de Ponta Grossa ser colonizada por subcentros distantes da localização central do município permeia uma antiga discussão que não ocorre ocasionalmente, mas já prevê toda uma forma de alojar uma classe social em um ambiente específico. Segundo Maria Auxiliadora Decca: “os industriais ou buscavam situar os operários próximos às indústrias ou, inversamente, colocaram as indústrias em locais densamente habitados pela população mais pobre em função dos preços mais baixos das habitações nos bairros de várzea ou de bairros mais altos, mas distantes, sem quaisquer melhoramentos” (DECCA, 1987, p. 18). Essa passagem revela características de uma microanálise sobre a malha urbana de Ponta Grossa onde os subcentros de Oficinas e Uvaranas se apresentam em algumas dessas condições. 16 O bairro de Uvaranas se conectava às atividades dos ferroviários por meio do Hospital 26 de Outubro que atendia os trabalhadores da ferrovia. O bairro Uvaranas colonizado por imigrantes italianos, poloneses e alemães. Cirlei Miléo e Maria Martins descrevem o bairro como ocupado por diversas chácaras antes dos primeiros loteamentos que o urbanizaram, nesses locais eram criados cavalos, bovinos, sendo que as autoras atentam para as culturas de uva. Os loteamentos nesse momento parecem contrastar com as antigas culturas do bairro. O que antes era provocava um impacto visual de parreirais, agora se tornara um local identificado pela paisagem do grande número de casas e da concentração de fábricas e operários pelo bairro (MILÉO, 1986, p. 13).17 Foi no leito da linha férrea e vizinhando as oficinas de vagões e locomotivas que se forma o bairro de Oficinas. A maioria das famílias de ferroviários se estabeleceram ali (SAHR, 2001). Nesse caso, Oficinas se destaca na primeira situação citada por Decca. Vale a pena chamar a atenção para outro fato curioso que remete a construção da urbe princesina. Claudia Monteiro, ao trabalhar os ferroviários comunistas da Rede
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Ponta Grossa conforme a cidade foi crescendo.
Um ressurgimento do comércio nessas páginas também se torna necessário, isso,
ao momento que além de diagnosticar o perfil do consumo da época, também traz
consigo um grande número de trabalhadores em seus índices.
Além de rememorar tais indicativos, se torna necessário frisar que é no setor
comerciário que temos o primeiro registro de alguma reivindicação dos trabalhadores de
Ponta Grossa. Essa ação dos comerciários foi ocasionada no segmento de “secos &
molhados”. Segundo Gonçalves e Pinto
os empregados do comércio, cujo número era bastante significativo, haviam solicitado o fechamento destes estabelecimentos aos domingos, já em 1898. Esta reivindicação se concretizará apenas mais tarde, por meio do Decreto no. 96, de 23 de abril de 1903, com exceção das farmácias, cafés, restaurantes e bilhares (GONÇALVES; PINTO, 1983, p. 67).
Essa citação contraria constatações de outros autores que consideram que o
movimento operário princesino inicia sua trajetória somente no início do século XX,
simplesmente a partir da fundação das primeiras organizações operárias da cidade.
1.2 – O estrangeiro: Imigração em Ponta Grossa no início do Século XX.
O próprio fenômeno da imigração que incidiu em Ponta Grossa nesse momento já
destacava a participação do trabalhador nas fábricas. Tal proporção foi indicada enquanto
solução desde a crise alimentícia de 1857 na província do Paraná. Foi desse movimento
imigrantista que podemos perceber um dos instantes significativos para a formação de
outro movimento: o próprio movimento operário.
Gonçalves e Pinto afirmam um aumento significativo na população ponta
grossense a partir da chegado do imigrante:
embora sempre tenham ocorrido migrações estrangeiras espontâneas e
esporádicas, o grande movimento migratório oficial só se verificou na década de
1870, sendo que entre os anos de 1877 e 1878, chegaram a Ponta Grossa cerca
ParanáSanta Catarina indica o Oficinas como um bairro investigado pela DOPS (Delegacia de Ordem Política e Social) com a intenção de repreender qualquer organização política dos operários (MONTEIRO, 2007, p. 47). Essa constatação serve de indicativo para mostrar que foi em grandes focos de concentração de operários como nos seus espaços de moradia que sua organização se tornou possível.
26
de 2381 imigrantes. Aumentando consideravelmente a população pontagrossense
(op. Cit. p. 111).
A estrutura da cidade possibilitou um novo cenário diante de si. Um momento
característico pelo empreendedorismo imigrante e pela necessidade da existência de
setores do comércio e da indústria. Nesse instante, a geração de oferta de trabalho na
cidade foi condicionante para a incidência da figura do operário na sociedade ponta
grossense.
Existe então, a importância de frisar esses índices sobre um período de
crescimento da cidade. Sobretudo, isso se torna pertinente para entender as relações de
produção a partir das transformações ocorridas dentro dela. Francisco FootHardman e
Victor Leonardi enfatizam a cidade póscolonial como delimitadora de novas relações de
produção18, onde os fenômenos surgidos nessas são protagonizados pela ascendência
das classes sociais (HARDMAN; LEONARDI, 1991). Antes deles, o historiador Edgard
Carone que assenta sua escrita em um viés mais econômico que os autores citados –
serve, no caso deste trabalho, para complementar tal constatação ao trabalhar o advento
da República Velha. Ao enfatizar a existência e a formação desses grupos, ele, ainda
assim, cede notoriedade à forma como cada qual procura modificar a sociedade à sua
maneira (CARONE, 1978)19.
Por parte desses autores, os trabalhadores aparecem relacionados
involuntariamente a tais relações de produção20. Alguns fatores são condicionantes para a
18 A origem do proletariado fabril eventos que significaram a criação de novas relações de capitaltrabalho na República Velha. Entre a abolição e a proclamação da República, onde uma massa trabalhadora substituiu outra nas relações de produção, a necessidade da imigração e do êxodo rural se tornaram presentes. Além dessas, as transformações no ambiente de produção geraram outra necessidade destinada ao abastecimento dos mercados e a necessidade do consumo (HARDMAN; LEONARDI, op. Cit.).19 Alguns agentes sociais são identificados na obra de Carone: Oligarquia, Burguesia, Classes Médias e Classes Trabalhadoras. Sendo esses protagonistas de diferentes fenômenos, antigos e recentes: Exploração dos recursos naturais, industrialização, imperialismo, coronelismo, monocultura, latifúndio, partidarização, militarismo, organizações sindicais, entre outros (CARONE, op. Cit.).20 Carone ainda identifica a formação das classes sociais de forma voluntária a sociedade capitalista, por outro lado, sua observação sobre a imigração é a de que esses elementos deixavam seus países e aqui chegavam ocupando a classe operária em segmentos que, muitos vezes, para eles era identificados como distintos de seus afazeres anteriores (CARONE, 1989). Mais precisamente, a existência de diversas colônias de imigrantes em Ponta Grossa não serve simplesmente de indicativo para considerarmos a multiplicidade étnica e cultural da região, mas também para indicar que essas diferentes nacionalidades vieram a compor o proletariado local dentro das fábricas e demais estabelecimentos. A realidade da demografia da época não pode nos indicar como se deveu exatamente essa composição. Beatriz Loner identifica esse fenômeno, ao trabalhar a mobilização dos trabalhadores riograndenses, identificando o perfil dos imigrantes que chegavam na cidade desde o fim do século XIX: “o estrangeiro nem sempre estava capacitado para as
27
existência desse proletariado urbano, FootHardman e Leonardi reconhecem na imigração
um fator importante para o proceder do rompimento com as relações escravistas e da
construção de um filamento para as novas relações livreassalariadas. O aparecimento
dessas classes sociais ocorre, não contraditoriamente, no interior das relações produtivas
– a nascente burguesia, seus investimentos e empreendedorismos são o que favorecem a
necessidade de um proletariado fabril e urbano.
O grande número de pessoas nas cidades do início do século XX apareceu como
uma situação proveniente para a circulação de idéias, isso foi um fato considerável nos
momentos de grande propulsão da industrialização e de políticas de imigração. Inúmeros
foram os partidos, associações, clubes e sindicatos fundados nesse período e proveniente
dessa circulação de idéias21.
1.3 Personalidades e Organizações: A imagem do militante.
Nessa conjuntura de crescimento urbano a cidade passou a receber as primeiras
figuras que passariam a constituir as fileiras do movimento operário, defendendo
posicionamentos políticos e compondo as organizações de classe.
Além das entidades criadas, existiam por trás delas personagens característicos
do movimento operário da época. Passaram por Ponta Grossa o internacionalmente
tarefas exigidas nas fábricas e manufaturas existentes (...), a vinda desses elementos imigrantes se traduziu, inicialmente, num complicador da situação da classe operária, porque acrescentava, ao já confuso processo de formação da classe, novos trabalhadores, com hábitos e costumes diferenciados, línguas, religiões, tradições e aspirações a separálos” (LONER, 1999, pags. 86 a 88). 21 Alexandre Tomporoski ao trabalhar a formação do ideário anarquista reconhece que toda organização dos trabalhadores era produto da difusão de idéias entre os trabalhadores: " A partir destes grupos, os militantes se organizavam e espalhavam suas idéias. Ali discutiam os problemas e disseminavam notícias de mobilizações, greves e da repressão policial em diferentes partes do Brasil e do mundo. Foram muitos os grupos de propaganda fundados por anarquistas no Brasil das primeiras décadas do século XX, porém, o mais importante, era a cooperação voluntária entre os pequenos grupos constituídos nas diferentes e mais distantes regiões" (TOMPOROSKI, 2008, p. 2).
28
conhecido Gigi Damiani22, o intelectual e jornalista Teixeira Coelho23 e o comerciante local
Adolpho Paulista24, responsáveis pela difusão do anarquismo na cidade (CHAVES, 1994;
ARAUJO; CARDOSO. 1992). Damiani e Coelho seguiam o perfil dos militantes que se
valiam de vários pseudônimos, era isso que garantia sua sobrevivência já que eram,
também, produtores de jornais operários. Sua ironia aos temas religiosos e à
modernidade era materializada em palavras ameaçadoras que procuravam
incessantemente desconstruir "verdades absolutas" que eles identificavam como criadas
por outras instituições. Suas trajetórias são marcadas pela busca da emancipação da
classe trabalhadora nas linhas que compunham.
O primeiro organismo de classe organizado em Ponta Grossa foi o Círculo
Socialista “Leon Tolstói”25. Lançando o jornal Onze de Novembro, a entidade estabeleceu
sua organização pelo jornal operário – essa modalidade daria a sintonia de grande parte
das organizações que procederam esse círculo, sendo que vale identificar que dessas a
maioria só permaneceram no tempo graças à sobrevivência de seus periódicos como
registros históricos.
22 O pintor italiano Luigi “Gigi” Damiani participou da fundação de diversas associações como a Federação Operária Paranaense em 1906, foi orador do I Congresso Operário Brasileiro no mesmo ano, foi organizadorsecretário do I Congresso Operário Estadual em 1907, sendo que a partir daí publicou diversos periódicos anarquistas. Segundo Silvia Araújo e Alcina Cardoso: “militantes de outros centros também fizeram história no Paraná. É o caso de Gigi Damiani, jornalista italiano, participante da Colônia Cecília, cuja presença em Curitiba, nos primeiros anos deste século, trouxe grande contribuição ao movimento operário local. Chegou ao Brasil em 1890 e passou alguns anos no Paraná, onde aprendeu o ofício de pintor. Colaborou com o jornal Il Distrito, fundado em 1899 e impresso em língua italiana e portuguesa (...), redigiu A Voz do Dever. Em 1903, fundou a folha libertária O Despertar, importante publicação que se estendeu até 1905. Colaborou com os jornais anticlericais O Combate, publicado em 1907, em Curitiba, e O Escalpello, órgão do Centro Livre Pensador, de Ponta Grossa” (ARAÚJO; CARDOSO, 1992, p. 27). Hoje, São PauloSP possui uma rua com o seu nome.23 Teixeira Coelho, farmacêutico na cidade, participou do Círculo Socialista "Leon Toltói" e participou da redação dos jornais O Jubileu Operário de 1903 e dos jornais O Escalpello, juntamente com Gigi Damiani, e o Anticlerical. Sendo destacado por Epaminondas Holzmann como: “eminente filólogo, o maior professor do idioma pátrio que a cidade jamais pôde conhecer” (HOLZMANN, 2004, p. 261).24 Adolpho Paulista, erradicado para Ponta Grossa e conhecido como comerciante da cidade, também se destacava como anarquista nas horas vagas. Sendo “um dos sócios fundadores da Sociedade Operária Beneficente de Ponta Grossa, ele era conhecido pelo estilo revolucionário” (BUCHOLDZ, 2007, p. 48).25 Dedicado a memória dos mártires de Chicago de 1886, é lançado o jornal Onze de Novembro com o lema "Paz e Trabalho, Igualdade e União". Sendo esse, um órgão do Círculo Socialista Leon Tolstoi, tinha como redator chefe o já conhecido Teixeira Coelho – personalidade do anarquismo do início do século XX. Segundo Araújo e Cardoso: ‘’Este periódico traz o manifesto do Partido Socialista brasileiro e as representações dos Estados no II Congresso Socialista Brasileiro realizado em São Paulo, em maio. Apresenta uma lista de livros recomendados para o estudo do socialismo científico’’ (ARAÚJO; CARDOSO, op. Cit., p. 47). Estes documentos anexados ao jornal e o tema demonstram que desde a gênese do movimento dos trabalhadores pontagrossenses, esse se encontrava atado com uma rede do pensamento internacionalista dos trabalhadores e com as causas que iam desde o 1o. de Maio até a organização dos trabalhadores em sindicatos e círculos políticos.
29
O jornal O Escalpello, orgão do Centro LivrePensador se apresenta enquanto
referência para essa época como um movimento que se representava combativo pelo
menos em suas linhas ao conceber: ‘’O Centro LivrePensador, tendo de propagar o ideal
do livrepensamento, pede a todos os que são amigos da Razão, da Justiça e do Direito,
um auxílio pecuniário para publicações’’ (O Escalpello, 29 de outubro de 1908 apud Op
cit. p.72).
30
FIGURA 03 – Fotografia de Luigi “Gigi” Damiani. Disponível em:
<http://anarcoefemerides.balearweb.net/archives/20090518>. Acesso 23/06/2009
FIGURA 04: Time do Foot Operario Club Pontagrossense em 1926
FONTE: Casa da Memória Paraná
31
Em Ponta Grossa, além dos censos populacionais e as referências ao contingente
de operários nas fábricas26 nesse período, constatase o grande número e a diversificação
de organizações e entidades operárias fundadas nesse período. Chaves em sua obra se
destina a retratar o perfil do comércio e da indústria de Ponta Grossa na década de 1920,
tratando do aparecimento das organizações de trabalhadores formadas no início do
século, bem como do florescimento de um centro urbano e industrial na cidade27.
Além do já citado Centro Livre Pensador, em 1908 também era fundado o Centro
AntiClerical. Na década de 1910, foram fundadas a Sociedade Operária Beneficente
(1911) e a Sociedade Beneficente dos Operários (1913) – sendo que as duas
protagonizaram a Greve Geral de 1917 em Ponta Grossa.
A imagem do operário constituído em seu tempolivre, entretanto, não apareceu
nesse momento formada apenas pela militância. O lazer também passou a cumprir papel
importante no cotidiano dos homens e mulheres das fábricas. A fundação do Foot Ball
Clube Operário Pontagrossense refletiu o momento pósfábrica, o momento do ócio,
condicionado pelas quatro linhas e por um esporte operário em sua essência.
Uma História pode ser concebida a partir do preto e branco das fotografias de
época, mas também do uniforme alvinegro do mais tarde apelidado “Fantasma da Vila”,
isso por assombrar os times da capital paranaense.
A formação da classe operária estava estampada naquelas camisetas distribuídas
após o serviço, na lida dos trilhos. Desciam os funcionários naqueles finais de tarde das
oficinas para jogar bola.
Sua fusão com Club Atlético Ferroviário e a renomeação para Operário Ferroviário
26 Para complementar essa contatação alguns autores se tornam necessários. Segundo Maria Aparecida Cezar Gonçalves e Elisabete Alves Pinto ‘’a expansão industrial e comercial esteve (...) vinculada aos imigrantes. Estes, após experiências vivenciadas em outros locais que lhes favoreceram ultrapassar a fase de ajustamento próprio do processo, alcançaram pouco a pouco posição considerável na estrutura sócioeconômica da região’’. Esse recorte serve para exemplificar a importância não só dos imigrantes, mas também dos trabalhadores urbanos para esse momento que cidade vivia (GONÇALVES; PINTO, op. Cit.1983). Sobre o mesmo período, segundo Chaves, dezenas de empresas estabeleceramse na cidade nas duas primeiras décadas do século XX. ‘’Entre as indústrias mais antigas que se instalaram na cidade, estão aquelas que se vinculavam ao beneficiamento da ervamate e da madeira, produtos típicos da economia paranaense daquele momento, e que acabaram encontrando em Ponta Grossa um ambiente favorável para o seu beneficiamento e comercialização’’ (CHAVES, 2006). Ainda, segundo Chaves, ele indica que ‘’dos 1.632 estabelecimentos industriais existentes em todos Estado, 75 estavam fixados em Ponta Grossa, ou seja, 5,5% do total das indústrias registradas (…) Em 1934 Ponta Grossa contava com 724 casas comerciais e com 253 indústrias’’ (op. Cit., 2001).27 Niltonci Chaves em sua obra "Do Centro Commercio e Industria ao Selo Social", exalta a participação dos trabalhadores nesse processo a partir de eventos construídos com a participação popular de moradores locais e imigrantes (Op. Cit., 2006).
32
Esporte Clube, precisamente em 1933, demonstrou como a força do operário poderia ser
aplicada além do funcionamento da linha do trem, além do sindicalismo, mas também no
chute de uma bola de capotão entre os terrenos de propriedade da Rede Ferroviária,
localizada na vila Oficinas. Foi num desses locais que mais tarde se instalou o Estádio
Germano Kruger (RIBEIRO JÚNIOR, 2004).
1.4 A militância no papel: A pena de Hugo dos Reis
Segundo Epaminondas Holzmann, o nascimento da imprensa em Ponta Grossa
apareceu representado por diversos jornais de vida efêmera como foi o caso de jornais
como O Percursor, O Campos Gerais nascidos no final do século XIX , O Comércio, O
Pontagrossense (os dois de 1895), Futuro do Paraná (1899), Ponta Grossa (1903), Luz
Essênia e O Pigmeu – ambos sem ano de lançamento definido (HOLZMANN, 2001. p.
261). Registrese que Teixeira Coelho, personalidade anarquista, foi o grande apoiador da
maioria absoluta desses títulos, isso sem remeter aos também inúmeros jornais operários
e de cunho classista anteriormente mencionados e que, infelizmente, não são muito
lembrados quando o assunto é imprensa nos Campos Gerais
27 de abril de 1907: é lembrado como o dia de lançamento do primeiro número do
jornal O Progresso, que em 1913 se tornaria Diário dos Campos. Conhecido e tendo em
seu corpo editos personalidades como Hugo dos Reis28, que é até hoje recapitulado como
jornalista e por ações que o aproximaram dos trabalhadores locais – responsável inclusive
por inúmeras notas em favor da classe da qual se definia como defensor.
Apoiador da campanha civilista de Rui Barbosa29, Hugo Reis, procurou favorecer a
28 Hugo Mendes de Borja Reis nascido no Rio de Janeiro, chegou em Ponta Grossa em 1908. Reconhecido como socialista, anticlerical e espírita, é representado na obra de Epaminondas Holzmann com sua gravata borboleta e seu chapéu coco sobre seu cabelo encaracolado e seus bigodes, foi secretário do Diário dos Campos – que até 1913 era chamado de O Progresso destacado como importante redator e apoiador do movimento operário nas páginas do jornal princesino. De escrita cívica, se autoproclama como um defensor do Paraná e da cidade de Ponta Grossa – sendo que junto com o fundador do periódico Jacob Holzmann e demais apoiadores do jornal como Eliseu dos Campos Mello e João Dutra – se comprometeu em ampliar e difundir o programa do jornal na cidade, sendo que esse no início não teve apoio, demorando em ser reconhecido por toda sociedade pontagrossense (HOLZMANN, 2004). 29 Segundo Wilson Cano: "Rui Barbosa, em sua campanha civilista de 1910 (...) dando ênfase à questão das baixas condições sociais e econômicas da vida da maior parte da população trabalhadora (...) tentara catalisar esses anseios (morais, éticos, sociais e políticos)" (CANO, 1998, p. 250). Embora, essa temática de defesa dos direitos civis parece a primeira vista ter sido o motivo que favoreceu Hugo Reis a apoiar Rui Barbosa, é indicado ainda que esse último percorreu o país todo buscando apoio a sua campanha se opondo a política do "café com leite". Além de sua imagem enquanto jornalista, diplomata e político muito se
33
imagem da classe operária em muitas páginas do periódico. No final da primeira década
do século XX, Reis publicou uma nota em que o povo era o protagonista principal da
participação política em nível nacional e ligando suas ações a símbolos pátrios
Foram os vapores mínimos de uma lágrima mínimos de uma lágrima.Fora a lágrima do Presidente.A tormenta chamase Povo.Essa lágrima chamase Liberdade.Ponhamolo de pé, num bloco marmóreo, a cabeça reclinada sobre o peito,onde palpitava, pela pátria e pelos patrícios,másculo coração a dizer aos brasileiros:O direito de revolução é um direito dos povos! (O Progresso apud HOLZMANN, op. Cit.)
Diversos autores que estudaram o personagem o indicam como sujeito polêmico
para a sociedade da época. Holzmann ao considerar Hugo dos Reis um denunciador das
elites locais, inclusive descreveu um episódio onde "diversos figurões da política
dominante, e outras pessoas que desfrutavam de alto conceito na sociedade local"
juntamente com "uma dezena de conhecidos arruaceiros com passagem pela polícia"
investiram golpes contra ele e o então redatorchefe do ainda chamado O Progresso em
frente à sede do próprio jornal (op. Cit. p. 273).
Apesar de serem reconhecidos de tal forma, nenhum nome aparece citado na
obra de Holzmann, porém, esse dedica um parágrafo a outros membros da política local
que defenderam Reis e Dutra contra aquele atentado contra o que ele chamou de
atentado à "imprensa livre". Entre eles, Holzmann cita o nome do conhecido industrial e
assemelhar com o semblante de Reis num caráter de maior amplitude e de seu discurso ser sempre dirigido às classes sociais menos favorecidas.
34
político Henrique Thielen30 e do renomado político e paranista Brasil Pinheiro Machado31.
Homens ligados a um grupo político em Ponta Grossa e que possuíam influência na
cidade32.
Essa passagem do texto de Holzmann, colocandoo próximo a personalidades
políticas, marca mais uma discussão sobre o personagem Hugo dos Reis considerado
polêmico por sua postura e identificado como "socialista" nas linhas do jornal donde fora
redator e secretário.
O interessante é perceber que apesar de ser identificado com tal postura política e
por posicionarse nas páginas do jornal contra políticos locais, Hugo dos Reis possuía
30 Segundo Cirlei Francisca Carneiro e Joselfredo Cercal de Oliveira Neto: "Henrique Thielen, natural da Alemanha, após ter morado em Curitiba radicouse em Ponta Grossa como empresário sócio e, posteriormente, tornouse proprietário da Fábrica Adriática de Cervejas" (CARNEIRO; OLIVEIRA, 2004, p. 99). Alguns autores já consideraram a personalidade de Thielen por diversas características, considerando a injeção de capital por parte desse imigrante alemão na região e sua influência. "Simbolicamente, a Cervejaria Adriática, fundada em 1893 por Henrique Thielen, configurouse como o marco inicial desse processo (...). Contando com maquinarias e com técnicas trazidas por Thielen da Alemanha, a Cervejaria tornouse referência entre os industriais locais, ao mesmo tempo em que seu proprietário" (CHAVES, 2006, P. 31). Sua personalidade partiu de um modelo de produção moderno para aquela época, sendo esse desenvolvido na maior indústria da cidade. A imagem de Thielen projetada em escalas superiores a "Fábrica de Cervejas" como era chamada em sua fachada – ficou reconhecida como um dos exemplos de imigrantes pelos méritos de seu sucesso enquanto empreendedor. Chaves ainda diagnostica um elemento relevante ao crescimento da indústria, relacionando isso ao tratamento do empresário para com os empregados da fábrica: "Em 1919, Henrique Thielen transformou a Cervejaria Adriática em Sociedade Anônima, dotandoa assim de um maior poder econômico e, conseqüentemente, garantindo a expansão de suas atividades. Quando isso ocorreu, a área física ocupada pela indústria era de 3.500 metros quadrados. Cerca de 120 operários trabalhavam na Adriática, todos protegidos por seguro da Companhia Lloyd Industrial Sul Americano, uma raridade para aquela época" (op. Cit). Essa particularidade condiz não exclusivamente com uma preocupação com os operários da fábrica, mas também com um olhar visionário da indústria. Pensando que qualquer debilidade física do operário cervejeiro acarretaria num tempo contado de prejuízo para a fábrica, um auxílio a qualquer tipo de dano que condicionaria na paralisação das funções do indivíduo na fábrica se transforma, nesse caso, numa circunstância de seguro para a produção da fábrica e não simples e unicamente uma forma de proporcionar segurança ao proletariado da empresa.31 Segundo o Dicionário Histórico e Geográfico dos Campos Gerais, Brasil Pinheiro Machado: “nasceu em Ponta Grossa (PR), em 1907. Fez seus estudos iniciais na cidade natal e, posteriormente, no Liceu dos Padres Salesianos, em São Paulo. Em 1926, ingressou na Faculdade de Direito do Rio de Janeiro, concluindo o curso de Ciências Jurídicas e Sociais em 1930. Iniciouse no magistério em Ponta Grossa, como professor e diretor do então Ginásio Regente Feijó. Afastouse da profissão para exercer funções administrativas, legislativas e jurídicas. Foi Prefeito nomeado em Ponta Grossa, Deputado Estadual, Procurador Geral do Estado e Interventor do Paraná. Retomou sua carreira de magistério como Professor de História do Brasil, na Universidade Federal do Paraná, onde também exerceu o cargo de vicereitor. Na juventude, pertenceu ao movimento modernista inicial, em especial ao Grupo Antropofágico. Sua poesia data dessa época e revela bom gosto e equilíbrio, sem os exageros experimentais que caracterizaram a fase, adquirindo, em conseqüência, sempre atualidade. Não deu prosseguimento a sua atividade poética, mas desenvolveu trabalho de cunho literário na revista Joaquim. Faleceu em 1997 (UEPG, 2009). 32 Nesse caso, apesar de não ser objeto desse estudo, a pergunta que cabe é: Considerando que Hugo Reis possuía o apoio de políticos e industriais de Ponta Grossa, essa referida elite não seria simplesmente mais um grupo político que se contrapunha a ele e que o apoiava? Além do mais, Hugo Reis pode ser identificado por uma postura política que pode ser considerada por alguns referenciais como contraditória com sua linha conciliadora das classes sociais.
35
ligações bem estabelecidas com membros do empresariado. Interessante aí é perceber
que Hugo Reis apesar de ser indicado em outras leituras como um "socialista contestador
das elites locais", ele acaba aparecendo apoiado por outros membros da classe
empresarial e que pertenciam a um grupo político específico.
A figura de Reis, entretanto, não se apresenta simplesmente sobre as polêmicas
das folhas dos jornais. O evento de maior aparecimento de Reis, não só como redator do
Diário, mas também como o militante que foi durante a Greve Geral de 1917.
1.5 Entre o subversivo e o conciliatório: Ponta Grossa e a Greve Geral de 1917
A categoria “trabalho” se apresenta como um elemento importante para o
desenvolvimento da sociedade. Sempre se apresentaram pontos de negociação e conflito
entre diversos grupos interessados na divisão social do trabalho e na produção e difusão
dos bens de consumo.
Entre trabalhadores e patrões, podemos considerar as relações de capital
trabalho construídas culturalmente, mas a partir de interesses distintos. Enquanto para o
patrão a alta produtividade deve condizer com compra de mão de obra barata, para o
trabalhador a mínima produção deve ser relativa ao encarecimento de sua mão de obra. A
ambigüidade gerada é precedente e motivadora de acordos entre ambas as partes – o
que vem a gerar um "jogo" regido por um conjunto de regras próestabelecidas33.
Se esse embate se encontra no cotidiano de trabalho, pensemos então a greve. O
ano de 1917 elaborou todo um cenário de luta de classes no Brasil. Alguns pesquisadores
ainda descrevem aquele acontecimento como a materialização do conflito entre uma
classe dominante e o proletariado34. O espetáculo incitado entre trabalhadores e
33 Segundo Eric Hobsbawm: "a questão era que nem os patrões nem os trabalhadores reconheciam completamente as regras do jogo" então cabia a ambos estabelecer tais regras (HOBSBAWM, 2000, p. 403). O jogo se colocava sobre a mesa, mas essas regras eram definidas pelos dois lados da mesa culturalmente. O cultural, aliás, é encarado de forma distinta para o autor, o costume também é regulador do mercado e das relações de produção.34 Tomporoski faz uma consideração interessante sobre o trajeto de greves nesse período: "Os anos de 1917 a 1920 costumam ser identificados como o período de maior ascensão do movimento operário brasileiro, especialmente no eixo Rio de Janeiro – São Paulo. No entanto, as greves e enfrentamentos deflagrados nesses anos ocorreram concomitantemente em diferentes regiões do país e, muitas vezes, com uma relação significativa entre movimentos geograficamente afastados" (TOMPOROSKI, op. Cit.). Diversos autores já citados, complementam tal discussão ao afirmar que nesses anos se concentram um grande desenvolvimento por parte da indústria em diversos locais onde se sediavam grandes concentrações urbanas e industriais (FAUSTO, 1976; CARONE, 1978; HARDMAN; LEONARDI, 1991; CUBERO, 2004).
36
empresários foi marcado por reivindicações de melhores salários e melhores condições
de trabalho (HARDMAN; LEONARDI, op. Cit.).
Em Ponta Grossa, as manifestações foram marcadas pela organização de um
comitê de Greve. Sendo que o proletariado regional tinha como principais portavozes a
Sociedade Operária Beneficente e a Sociedade Beneficente dos Operários.
FIGURA 05 – Greve Geral de 1917 em Porto AlegreRS <Disponível em:
http://www.chekov.org/anarcho/index.php>
Participante da greve de 1917, o jornalista Hugo dos Reis, sobretudo, é conhecido
pelos autores já discutidos como personagem conciliador das classes sociais em Ponta
Grossa. Como intelectual, apoiando ambas as instâncias de organização – tanto a
fundação do Centro Commercio e Industria quanto a criação da Sociedade Operária
Beneficente, da qual fora presidente honorário inclusive durante o período da greve.
Durante esse evento, inúmeras notas são escritas no jornal Diário dos Campos
favorecendo a imagem do coronel Brasílio Ribas, descrito como “advogado e (...) paladino
dos sacratíssimos direitos da família operária”. O jornal ainda descreve o estancieiro como
recebido na reunião do operariado com "os mais estrondosos aplausos" (Diário dos
Campos, 22/07/1917).
Trazendo essa questão para Ponta Grossa, percebemos esse mesmo fenômeno se encontra na pauta de alguns pesquisadores que estudaram a época, sendo que esses consideram tal momento pela ocupação do quadro urbano da cidade pelo comércio e pela indústria (DITZEL; SAHR, 2001; CHAVES, 2001; MONATIRSKY, 2006).
37
Essa passagem intensifica a discussão em torno do papel que Brasílio Ribas
compunha no jogo político da cidade naquele instante. Após a eleição de 1916, houve o
que foi chamado de "dualidade de prefeitos". Foram eleitos o médico e empresário
Abrahão Glasser e Brasílio Ribas para o executivo municipal, mas o governo estadual
nomeou esse último até novas eleições.
Em março de 1917, elegese Glasser – Ribas acaba participando das reuniões da
comissão de greve como "representante da Prefeitura" (Presidente da Câmara) mostrando
que tal dualidade persistiu na execução do poder municipal. Tal dualidade persiste não
apenas na ocupação dos cargos administrativos locais, mas também na construção da
imagem dos dois políticos: Adão Glasser, médico, se destaca por sua feição urbana e
Brasílio Ribas, coronel e estancieiro, se afigura numa face rural.
O primeiro registro da manifestação dos trabalhadores acontece em 21 de julho
de 1917, quando o Diário dos Campos lança nota das reivindicações dos trabalhadores
princesinos, sendo que essas também foram entregues ao então prefeito:
O que desejamos é o seguinteJornada de 8 horas. Abolição completa de multas. Impedimento de crianças menores de 14 anos no trabalho. Impedimento de moças de menos de 21 anos. Os que ganharem por dia terão a tabela mínima de 5$000 os poe horas 800 rs. Abolição dos trabalhos noturnos exceptuando se os necessários trabalhando de 6 horas. O patrão não pode dispensar os empregados sem aviso prévio de 18 dias, dando em cada dia 1 hora de folga para procurar trabalho. A responsabilidade dos patrões nos incidentes. Creação de um jardim de infância e proibição aos industriais de terem carroças para não tirar ganho dos carroceiros. A extinção das caixas beneficentes obrigatórias como as de bond e estrada de ferro. A redução dos impostos para os operários em geral. As 8 horas de trabalho do compreendidas da 7 as 11, tendo duas horas, tendo duas horas de descanço depois de 1 as 5. Redução do preço dos gêneros alimentícios. Exigir a baixa imediata da farinha de trigo e assucar. Diminuição dos preços de aluguel de casa. Pagamento dos salários 5 dias após o vencimento do mês. Exigir do governo fiscalização dos gêneros alimentícios. Abolição dos trabalhos de peça. Higiene nas fabricas. Lei de reversão dos trusts. Leis para a criação do montepio e seguro operário; contra o álcool e a prostituição. A Sociedade achase em sessão permanente.A COMISSÃO(op. Cit. 21 de julho de 1917)
Niltonci Chaves, ao falar da greve, registra os ferroviários como a categoria que
liderou o movimento grevista. O calendário de manifestações aparece como integrado ao
cotidiano de greves do país todo, considerando que o início da greve se ocasiona um dia
antes da publicação das reivindicações dos ferroviários (20 de julho de 1917) quando 148
38
operários35 paralisaram os trens da ferrovia alegando a questão salarial e o tratamento do
chefe dos operários, o encarregado Evaldo Kruger.
As edições do Diário dos Campos detalharam a greve diariamente em suas
páginas, entretanto não se registra os trabalhadores da ferrovia como oradores principais
da Sociedade Operária Beneficente36 – sendo que figuras como Hugo dos Reis, Brasílio
Ribas, Capitão Paschoalino Provesiero, Dr. Flavio Carvalho Guimarães, Tenente Alberto
Manhães Flores são registradas a todo momento nas páginas do periódico.
Complementando as ações da entidade, Chaves destaca essa como "controlada
por segmentos da elite local bem como por pessoas ligadas a doutrina espírita’’
(CHAVES, op. Cit., p. 158). O comprometimento dos diretores da Sociedade com certos
grupos políticos da época era tamanho que Chaves chega a considerar a greve como de
caráter extremamente ‘’moralista’’ e de manutenção da ordem vigente, a postura
desenvolvida pela entidade inclusive é compreendida como contraditória já que
contrapunha o Estado e os capitalistas porém afirmando a defesa à ordem e à
propriedade.
Ao falar das atas ele complementa: "Elas revelam todas as ações cotidianas do
movimento, deixando transparecer o choque ideológico entre seus líderes, a influência de
setores patronais sobre os rumos da greve e os desdobramentos das ações em todo
Paraná" (CHAVES, 2006, p. 70). Esse choque foi relevante para demonstrar que apesar
do controle social dos setores patronais, a greve possuía líderes que se contrapunham à
ordem vigente.
Essa influência dos setores patronais sobre a greve foi de tal forma presente que
o autor chega a destacar a liderança e a veiculação do movimento na mídia como
35 Apesar desses números serem apresentados especificamente para a cidade de Ponta Grossa, foi estimado que cerca de 1000 trabalhadores participaram na greve no país todo. As manifestações e paralisações atingiram as principais cidades do Brasil. O caso específico dos 148 ferroviários que paralisaram a estrada de ferro serve para reafirmar algo constatado por diversos autores, os ferroviários da São PauloRio Grande foram responsáveis por diversos estopins que representaram seu inconformismo para com as condições de trabalho daquela época. Ponta Grossa como terminal dessa linhaférrea e por possuir um número considerável de ferroviários, possuiu posição privilegiada na Greve Geral de 1917. 36 Apesar de constatar os ferroviários enquanto uma das primeiras categorias a se organizarem no Brasil a partir de grandes movimento grevistas, Claudia Monteiro em sua dissertação "Fora dos Trilhos": As experiências da militância comunista na Rede de Viação ParanáSanta Catarina (19341945) considera que "a união a outras categorias e a adesão a movimentos grevistas nacionais eram também motivo para a deflagração de greves. As duas maiores ocorridas no Paraná, no período da Primeira República, em 1917 e 1919, foram protagonizadas pelos ferroviários, mas também envolviam outras categorias, como padeiros, telefonistas, tipógrafos e operários das fábricas" (MONTEIRO, 2007, p. 36).
39
‘’paternalista’"37. É possível se produzir uma sintonia entre todos os movimentos forjados
na primeira década do século XX e os movimentos que significaram a Greve Geral de
1917 em Ponta Grossa. Os movimentos socialistas, anarquistas, anticlericais e de
diversas tendências também consideradas ‘’perniciosas’’ e ‘’subversivas’’ à sua época
parecem ter produzido a essência da reação de controle aos próprios movimentos38.
Apesar de tal controle social e no que tange o cenário de lutas sociais pela
participação na greve, o que se evidencia nos operários pontagrossenses foi que eles
foram construindo sua própria experiência enquanto parte de um movimento de massas.
Acontecimentos como esse são um indicativo que demonstra que os trabalhadores não só
criavam e desempenhavam um papel no interior da fábrica, mas também procuravam
construir sua imagem política nas ruas e perante todo o semblante da sociedade.
1.6. "A União faz a Força": a experiência do proletariado na década de 1920.
No ano final da década de 1910, estoura outra greve. Puxada pelos ferroviários
acaba tendo adesão de trabalhadores de vários setores da indústria local. Um manifesto,
divulgado no jornal Diário dos Campos, em nome da Comissão de Grevistas atentava os
trabalhadores para não se intimidarem com ameaças provindas de seus superiores ou de
iludiremse com "falsas promessas". Segundo Chaves: ‘’Esse alerta demonstra que o
movimento de 1917 serviu para dar uma certa experiência aos operários’’ (op. Cit. p. 160).
37 Quando Michelle Perrot trabalha o paternalismo na administração industrial ela diz que esse possui três traços principais que o caracterizam: ‘’1) a presença física do patrão nos locais de produção, preconizada pelos primeiros industrialistas (...) e visível no projeto de muitas fábricas de primeira geração (...). 2) As relações sociais do trabalho são concebidas conforme o modelo familiar: na linguagem da empresa familiar o patrão é o pai, e os operários os filhos, na concepção do emprego que o patrão deve assegurar aos operários, na prática cotidiana do patronato (...). 3) Os trabalhadores aceitam essa forma de integração e até a reivindicam. Eles têm a linguagem e o espírito da ‘casa’; têm orgulho em pertencer à empresa com a qual se identificam’’ (PERROT, 1988). Nesse sentido, E.P. Thompson nos mostra que o paternalismo pode ser ‘’um componente profundamente importante, não só da ideologia, mas da real mediação institucional das relações sociais’’ (THOMPSON, 1988. pág. 32).38 Adolpho Paulista, identificado como um importante personagem da militância de uma época é conhecido por também participar da Greve Geral de 1917, especialmente onde, em uma manifestação na Praça Floriano Peixoto, tentou erguer uma bandeira que lembrava a simbologia anarquista – da qual era seguidor. Contido pela polícia e inclusive por membros do movimento grevista, chegando até a ser expulso do conselho de greve com a justificativa de que aquela era uma "ação pacífica" e que "desordens" e "distúrbios" comprometeriam o "sagrado interesse do operariado pontagrossense" (BUCHOLDZ, op. Cit. p. 49). A ata da Sociedade Operária Beneficente justifica tal atitude explicitando que a ação de Adolpho Paulista transformaria "uma greve pacífica e ordeira em uma franca revolução ou movimento subversivo" (Sociedade Operária Beneficente, 20 de julho de 1917). O que também chama a atenção é que a intervenção da polícia que parecia escoltar e controlar a direção dada a manifestação.
40
Entendemos nas palavras do autor que esse alerta parecia uma tentativa de negar a
influência dos patrões no movimento grevista.
O próprio Diário dos Campos muito serviu como veículo de informação aos
operários princesinos. Foram naquelas páginas que se encenaram diversos artigos e até
debates tematizando o operário pontagrossense. Entre essas notas estavam postas
algumas linhas de J. Barbosa, um pseudônimo de algum autor de vários artigos
publicados no Diário, onde se autoproclamava "defensor dos oprimidos" e procurava
defender a classe trabalhadora das "garras da miséria".
Ainda no ano de 1920, esse autor publica uma árdua nota em que referendava
sua defesa aos operários, traçando em suas linhas um grito que para ele parecia estar
interrompido na garganta dos operários do país todo
Se bem que reconheça serem infrutíferas todas as minhas palavras nas quais procuro seja melhorada a situação da classe pobre, não deixarei de continuar a algumas linhas para satisfazer não somente aqueles que me queiram compreender como também julgo cumprir uma missão, se é que no Brasil um operário pode manifestar o seu modo de pensar (op. Cit., 25/08/1920).
A República Velha, rompida pela instabilidade econômica e social em todo país
era representada de tal forma em diversas esferas da sociedade que partilhavam de um
descontentamento. Diversos são os eventos em meio à década de 1920 que explicitam tal
situação, como foi o caso da Revolta do Forte de Copacabana (1922), a Revolução de
Isidoro (1924) e a Coluna Prestes (1926).
A organização dos movimentos sociais, dos trabalhadores em sindicatos,
associações e outros coletivos aparecem também para alguns autores como reflexo de
uma discordância com o sistema político vigente. Nicolau Sevcenko considera o período
que percorre do início da República Velha até o final da década de 1920 como um período
de intensas mudanças – caracterizadas por uma revolução científicatecnológica,
entretanto, partilha da idéia de que a adaptação de princípios republicanos estrangeiros e
de ideais que promulgavam um "governo do povo" se manifestou num estado truculento
com a própria população do Brasil (SEVCENKO, 1998).
Para Wilson Cano, essa vicissitude de ocorrências não se manifestou apenas em
segmentos econômicos da sociedade, mas também nas diversas transformações sociais
visíveis nessa época. Sem permear, porém, qualquer dicotomia entre base
41
superestrutura, o autor condiciona tais transformações em diversos indicativos da
existência social e em eventos como greves, movimentos artísticos, civis, patronais e
militares, criação de partidos políticos e organizações trabalhistas (CANO, 1998).
Em Ponta Grossa, os trabalhadores continuaram a se organizar em suas fileiras
sendo até convocados a atingir um certo nível de organização. No 1º de Maio de 1927, o
intelectual e jornalista Hugo Reis destinou sua fala aos operários: ‘’Se o operariado ponta
grossense quiser alcançar algum progresso na vida social, é mister que se una, porque
governo algum dará ouvidos a uma classe que não tem organização’’ (Revista Operária, 6
de abril de 1929 apud ARAÚJO; CARDOSO, op. Cit.).
As palavras de Hugo Reis pareciam direcionar o movimento operário em
caminhos pautados na justiça social e na igualdade entre mulheres e homens. Entre
essas trajetórias, suas palavras reforçavam a organização e a união da classe
trabalhadora em torno de suas próprias causas.
A Revista Operária, de 1929, segue essa linha na tentativa de politizar os
operários pontagrossenses. Sob o lema ‘’A União faz a força’’, o jornal convocava os
trabalhadores de Ponta Grossa a diversas reuniões, palestras, assembléias e demais
eventos promulgando a égide de que somente unidos os operários teriam suas
reivindicações atendidas (op. Cit.).
Silvia Araújo e Alcina Cardoso descrevem o jornal que possuía a direção de José
Deslandes de Souza39, Adejamiro Cardon40 assim
[possuía] fotos, o primeiro número desta revista é uma homenagem aos operários e intelectuais que trabalharam para a classe como Hugo Reis, José Cadilhe e Alberto Lopes. Anuncia e prepara a fundação do Centro Operário Pontagrossense (ARAÚJO E CARDOSO, 1992).
39 José Deslandes de Sousa, conhecido nas atas como membro e redator do Diário dos Campos na época, foi aclamado como primeiro presidente do Centro Operário Cívico e Beneficente no dia 28 de abril de 1929. Por carência de fontes, nenhum dos acervos particulares e públicos de Ponta Grossa possui as edições dos anos de 1924 a 1932. Apesar da homenagem ocasionada nas páginas da Revista Operária, as atas do Centro não demonstram qualquer ligação de Deslandes de Sousa com o jornalista paulista Hugo dos Reis. Embora seja importante diagnosticar que a herança da participação de intelectuais e jornalistas aparece mantida na trajetória do movimento de trabalhadores pontagrossenses.40 Adejamiro Cardon, aclamado como primeiro Orador do Centro, está registrado no livro de inscrições de sócios como trabalhador da Livraria Modelo, sendo que há probabilidade de nessa condição ter sido proprietário do estabelecimento. Seu nível de intelectualidade pode ser explicitado nas atas em discursos fervorosos direcionados a pátria e aos direitos do operário, sendo que também publicara artigos na Coluna Operária do Diário dos Campos.
42
A Revista serviu para anunciar uma nova etapa do movimento operário em Ponta
Grossa, essa proclamação serviu para fundamentar a fundação de uma nova entidade
que agrupasse os trabalhadores e suas trajetórias. A união era a palavrachave para a
fundação dessa entidade que prometia, sob o júbilo dos operários, a organização da
classe em torno do que eles já chamavam de Centro Operário.
43
CAPÍTULO II
“HOMENS DO TRABALHO”: A REPRESENTAÇÃO DO OPERÁRIO NAS ATAS DO
CENTRO OPERÁRIO, O DISCURSO E AS RELAÇÕES SOCIAIS.
"homens úteis à Família, à Pátria e
sociedade em que vivem"
(Professor Roberto Mongruel da Escola
Operária)41
Solenidade de inscrição dos membros do Centro Operário e aclamação de sua
primeira Diretoria, 28 de Abril de 1929: ‘’Data tão cara para o homem do trabalho
[inclusive] para os operários de Ponta Grossa, mais grata ainda, pois que o Centro de sua
classe, iria ter naquele dia sua instalação oficial’’, era assim referido o dia 1o. De Maio
pelo secretário Affonso Braune. O punho do secretário da diretoria escrevia e compunha
um discurso marcando a data de fundação do Centro Operário para uma grande festa do
dia do trabalho.
Essa citação é mais um recorte do que sobrou daqueles momentos, reuniões,
solenidades e assembléias compostas por trabalhadores e membros da sociedade civil
as atas revelam o cotidiano operário. Todas registradas e aprovadas pelos membros da
Diretoria e do Conselho Fiscal42, isso num primeiro instante pode definir o peso de
participação dos operários em um tipo de organização que carregava consigo um nome e
que produzia um discurso que era direcionado ao amparo do próprio operário.
41 Nas palavras do professor Roberto Mongruel, os operários somente seriam úteis a nação e às suas famílias por meio da educação. Seu discurso sobretudo se pautava dentro da assembléia que tratava da fundação da Escola Noturna dos Operários. Essa instituição fazia parte das atividades beneficentes do Centro e seu prédio seria doado pela Prefeitura Municipal e instituída pelo Governo do Estado. O horário noturno da Escola não interferia no horário da jornada de trabalho de grande parte dos operários pontagrossenses. (C.O.C.B. Ata 04).42 A primeira diretoria foi formado por: José Deslandes de Souza, Presidente; Francisco Vitalino Barboza, Vicepresidente; Affonso Braune, 1º. Secretário; Armando Max Vosgrau, 2º. Secretário; João Ferigotti, 1º. Tesoureiro; Alcides Fernandes, 2º. Tesoureiro; Adejamiro Cardon, 1º. Orador; Máximo Leopoldo Arruez, 2º. Orador. Sendo o conselho fiscal formado por Albino Wiecheteck, Presidente; João Perantunes, Secretário; Manoel Matheus da Costa, Annibal da Silva Assumpção, Francisco de Souza Nunes, João Schmidt Filho, Augusto Cunha, Franscisco Pavalech, Paulo Ferreita do Valle, Bernardo Holck, David Cardon e João Quadros.
44
FIGURA 06 – Fotografia digitalizada da Ata No. 12 do Centro Operário
FONTE: C.O.C.B. Atas de 1929.
45
Dentro do recorte previsto pela pesquisa se totalizam 24 atas disponíveis na Casa da
Memória Paraná. Essas atas, antes encontradas na antiga sede do Centro Operário,
passaram por um processo de higienização e catalogação. Entre o conteúdo das fontes, a
coletividade aparece provida de práticas situadas e previstas nos eventos que
proporcionaram sentido a existência de um Centro Operário.
Para além de identificar a existência desses documentos, uma análise apurada não
satisfaz e não propõe apenas entender a posição que essas atas cumpriam dentro da
entidade. Esse sim, seria um trabalho mais rápido, mais reduzido e mais fácil de fazer.
Entretanto, em um outro caso, não se torna suficiente apenas transcrever o sentido
político e social que fora disposto ao cotidiano do movimento operário, mas sim, resgatar
no registro dos autos como era constituído aquele movimento.
O intuito do trabalho, nesse caso, é ligar o texto das atas com o contexto no qual foram
produzidas. Perceber as atas como indicativos de sociabilidade, sendo essa articulada
pelos membros do Centro para influenciar as atividades coletivas da associação43. Antes
do ponto final, os questionamentos colocados e suas resoluções não destinam a pesquisa
a um meio caminho, ou seja, antes de apenas constatar a existência de fenômenos e
problemas se torna necessário e interessante demonstrar como esses foram construídos
no enredo do Centro Operário.
É preciso constatar como tais atividades influenciam no sentido político e social que foi
proporcionado ao Centro Operário de forma a não deslocarmos a pesquisa a um meio
caminho, mas sim, procurando resolver demais questionamentos antes do ponto final.
Percebendo que o Centro Operário Cívico e Beneficente (C.O.C.B) se insere num
contexto de profunda transformação na cidade Ponta Grossa e perante um conjunto de
mudanças expressas nas relações de produção em todo Brasil. O trabalho aqui proposto
procura perceber que conjuntura e condições o movimento operário criou e encontrou
dentro dessa associação. A produção e o consumo do discurso pelos próprios membros
da associação e de sua relação com a sociedade pontagrossense são indicativos para
demonstrar o jogo de relações onde o Centro se coloca. A forma como a figura do
operário é construída em seu interior se torna mais um indicativo do sentido político e
43 Segundo Norbert Elias e Eric Dunning, a sociabilidade se aplica além do trabalho. Pensemos essa atividade num espaço como um bar qualquer, onde a convergência de diversos trabalhadores é ocasionada por aquilo que eles têm em comum. Os dois pesquisadores chamam esse momento de ''tempo livre'', apresentando características de lazer e recreação (ELIAS; DUNNING. 1992).
46
social dado a esse movimento44.
No interior das atas, além das atividades recreativas e de lazer, percebemos os
chamados "assuntos políticos". Tratados de tal forma também no estatuto do Centro,
esses aparecem omitidos e até censurados pragmaticamente nos eventos da entidade.
Em torno disso, e contrapondo tais temas, as atas constroem em seu interior uma
representação da imagem do operário de forma cívica e solidária – algo que parece
reproduzir o nome da associação. Nesse sentido, o apenas constatar isso é colocar a
pesquisa em um meio caminho, indicando a existência do problema. A pesquisa delimita
se a partir do objetivo de entender como o fenômeno foi gerado.
Percebendo os diálogos no interior da fonte, nessas oportunidades, que percebemos a
evidência de uma série de personagens do Centro Operário. O discurso de cada um deles
aparece nas atas de forma desconexa em alguns momentos, todavia, descobrindo quem
são esses membros é que percebemos donde surgem seus posicionamentos. Os
assuntos políticos são fruto de conflito dentro das atas, e apesar de existir a tentativa de
reprimilos, esses não terem deixado de existir, sendo que podem significar o que aqueles
indivíduos entendiam por movimento operário.
A maioria das atas verificadas, no período estudado, trata de questões cotidianas
como assuntos financeiros e jurídicos, manutenção da sede e administração dos fundos,
agradecimentos e condecorações a membros do Centro, convocação a jogos de futebol e
demais eventos da sociedade pontagrossense, entre outros. Algo constatado por outros
autores que escreveram um pouco sobre a entidade.
Niltonci Chaves indica ainda o Centro Operário e a União Protetora dos Operários
(ambas fundadas em 1929) como possuidoras de uma tendência a “despolitização”45 e
44 Essa representação do trabalhador dentro de um coletivo, portanto, no seu universo de classe, pode ser vista como expressa também a partir de uma imagem construída no interior do discurso de uma entidade que postula reivindicar para si essa autoridade de representação. As referendam o trabalhador como representação de um discurso, indicando esse enquanto produto de uma imagem produzida na caneta que tocava os papéis dos manuscritos oficiais do Centro Operário. Se imagem é discurso, discurso é imagem, ou pelo menos é uma forma de produzir essa representação na cabeça de cada associado ali presente (BURKE, 2004). No caso do C.O.C.B, percebese a colocação do trabalhador pelo seu papel social, como um elemento necessário de força na sociedade, repercutindo esse papel a uma respectiva visão de progresso dessa. Essa perspectiva do conceito de representação pode ser distribuída para outros símbolos, como foi o caso da criação do seu logo – onde esse aparece preenchido por um globo circulado por três homens possuintes de um físico robusto remetente a força e disposição.45 Segundo Georges Balandier, podemos entender política como a ação dos seres na realidade social. A noção de status define o papel social de cada ser humano na sociedade, “define a posição pessoal de um indivíduo em relação aos outros no interior de um grupo; permite apreciar a distância social existente entre as pessoas, porque rege as hierarquias de indivíduos” (BALANDIER, 1969, p. 83). Nesse sentido, a ligação
47
que suas atas indicam uma rejeição a movimentos partidários, principalmente em relação
ao comunismo (CHAVES, 2006, p. 82).
O objetivo dessa pesquisa não é desmentir nem reafirmar isso, mas averiguar na
intimidade das atas como ambos os assuntos – cotidianos e políticos são tratados.
Nesse caso, uma metodologia é proposta.
Apesar de o conteúdo ser o objeto dessa pesquisa, corresponde também proporcionar
tonalidade a algumas informações importantes para contemplarmos as finalidades do
trabalho. O acervo do Centro Operário, além das atas e do seu estatuto, possui um Livro
de Inscrições de Sócios que registra a participação de 1148 membros na entidade assim
como o seu Livro de Mensalidades que detalha informações como endereço residencial
de uma parte considerável dos membros e onde cada um deles trabalhava (C.O.C.B.
Livro de Inscrições de Sócios; Livro de Mensalidades [1929]; Livro Caixa [1929]).
Definitivamente, a presença do Centro Operário na sociedade pontagrossense não
aparecia como algo apenas referenciado pela leitura das discussões das atas, sua
importância no seio da sociedade pontagrossense se colocava como principal entidade
de representação dos trabalhadores (C.O.C.B, Ata 24). A evidência do seu número de
participantes em contrapartida aos números da população pontagrossense46,
compromete o trabalho em considerar a importância dessa entidade naquele momento.
Perante toda uma dinâmica social, não se coloca outra hipótese do que ligar o texto das
atas ao contexto ocasionado nas relações sociais de Ponta Grossa.
Algo que contribui para essa constatação e que favorece maiores indagações sobre a
forma de sobrevivência das entidades operárias colocase na situação de que o Centro
Operário foi a única entidade operária da primeira metade do novecentos que sobreviveu
entre instituições e autonomias de indivíduos se torna definida pelo uso de símbolos por cada um deles. Segundo Pierre Bourdieu, os símbolos são definidores do constrangimento, nesse caso, o uso deles determina a ação dos indivíduos, entre uns poderem fazer e outros se sentirem impotentes nas relações de poder. “Nada a não ser esta forma de abstenção activa, a qual tem raízes na revolta contra uma dupla impotência, impotência perante a política e todas as ações puramente seriais que ela propõe, impotência perante os aparelhos políticos: o apolitismo” (BOURDIEU, 1998, p. 169). Ainda assim, a análise das atas não faz perceber a ação dos membros como meramente “despolitizadas”, mas sim, a transferência de poder de alguns indivíduos para outros. A negação do uso político aos membros da entidade se justifica no uso de um artigo do estatuto, mas isso pode ser percebido no sentido de transferir o mando político da maioria de membros para uma minoria.46 Observando o Centro Operário como possuinte de 1148 membros, essa importância se coloca como evidente e em grande proporção quando deslocamos nosso olhar também ao números da população de Ponta Grossa. O Censo de 1900 indica que a população de Ponta Grossa era 8.335. Pelo Censo de 1920, essa população atingiu a casa dos 20.171 habitantes.
48
até os dias atuais47.
2.1 Classe Operária e Cultura Operária: Uma outra História.
A trajetória dos trabalhadores pode nos representar o percurso de uma classe. Mas é
somente a partir das experiências vividas em comum que os operários se configuram
nesse coletivo de classe. Colocar isso sobre o trabalho se torna uma preocupação
estancada.
Uma história se produz dentro e fora das fábricas48. É de uma multidão colocada
involuntariamente em uma fábrica, nos seus modos de vida fora do trabalho, ou seja,
dentro e fora da jornada de trabalho percebemos a representação de uma classe. A
experiência dos trabalhadores depende de diversos fatores que se encontram tanto nas
relações de produção nas quais são inseridos, quanto na cultura que eles próprios geram
para si.
Diversos olhares são propostos. O enredo das relações sociais nos permite considerar
o operário como mais um personagem dessas relações que possui uma cultura, um
cotidiano. Se reconhecermos a existência de uma classe social, de um grupo gerado na
divisão social do trabalho, então podemos perceber o reconhecimento dessa não
simplesmente por meio de suas funções nas relações de produção mas também nas
47 Localizada na Rua Theodoro Rosas a atual sede do Centro Operário ainda abriga atividades recreativas e de lazer como bocha, truco, sinuca, churrascos e comemorações. No dia 1o. de Maio, último, o C.O.C.B completou 80 anos de existência. Desses anos todos, algumas mudanças ocorreram, algumas rupturas se ocasionaram na sua trajetória. Essa sede, onde funciona um bar, embora hoje seja a única sede do Centro, hoje está desmembrada do seu prédio original localizado no Largo Professor Colares e onde, curiosamente, hoje lá funciona uma manufatura de cortinas. O que antes era um espaço de lazer dos operários, hoje se torna o seu espaço de trabalho.48 O conceito de trabalho não só foi alimentado por apologistas da sociedade burguesia como também por seus próprios críticos. Edgar de Decca considera que esse se origina com o intuito de garantir o espaço da fábrica e legitimar a figura do capitalista. O trabalho era fonte de produtividade e a fábrica "ao mesmo tempo que confirmava a potencialidade criadora do trabalho anunciava a dimensão ilimitada da produtividade através da maquinaria". A fábrica enquanto acontecimento tecnológico não foi símbolo hegemônico por toda sociedade, Decca ainda considera que “os ecos de resistências dos homens pobres a se submeterem aos rígidos padrões do trabalho organizados são audíveis” (DECCA, 1996, p. 09) e remetem que aquilo que para a burguesia era efeito material do "tempo útil", para outros podia não passar de um motivo para explorar outra classe assalariada e despossuída. Nesse embate de discursos podemos falar de um imaginário do mundo burguês e, desde já, descartar a idéia de que, por exemplo, os setores dominados desta mesma sociedade estejam submetidos a uma enorme mentira ou a um engano universal, isto porque a presença das classes nessa sociedade se dá justamente a partir da universalização do imaginário burguês, e, nessa medida, a produção mesma das classes está intimamente ligada ao modo pelo qual essa sociedade impõe os registros do imaginário para o seu próprio reconhecimento" (op. Cit. p. 18)
49
diferenças culturais dessa classe para outras.
Segundo Karl Marx e Friederich Engels: “os indivíduos separadamente formam uma
classe apenas na medida em que levam a cabo uma batalha comum contra outra classe”
(MARX; ENGELS op. cit, p. 45).
Para além da fábrica e para além da greve, o operário também se assume na
roupagem de mães e pais de família, freqüentadores do bingo da Paróquia, figuras
carimbadas do bar mais próximo, compradores à fiado e fiéis da mercearia da esquina,
apreciadores da rádio AM que toca música popular, apostadores em rinhas de galo, entre
outros. Desconsiderar essa outra parte das suas vidas, colocálos unicamente como
peças da força do trabalho ou como componentes de uma luta social que inspira nossas
paixões, é uma tarefa que pode incoerentemente partir da caneta do intelectual. Essa
atitude involuntariamente simplifica a História.
Os trabalhadores são motores da própria História, como engrenagens de um relógio,
eles possibilitam as relações produtivas. Ainda assim, seus cotidianos não se resumem a
esse papel e nem sempre eles enxergam seu diaadia apenas como murais de
exploração. É sobre as condições de trabalho e capitaltrabalho, entre outras formas como
são colocados ou jogados na estrutura social que os trabalhadores constituem sua
cultura. Precisamos estar atentos às diversas particularidades relacionadas à
aplicabilidade da força de trabalho, mas também a outra parte das suas vidas.
Essa outra proposta colocada aqui, e reafirmada também por alguns teóricos, torna
necessário acreditar que para além do mundo do trabalho, os trabalhadores elaboram
uma cultura quando se apresentam no seu tempolivre para além do mundo da fábrica
(“timeoff”). Nesse segundo cotidiano reconhecemos atividades distintas, seja mesmo no
cunho de organização trabalhistasindical ou somente para fins de lazer.
Essa discussão interessa aqui para perceber como esse tempolivre foi administrado
pelos membros do Centro Operário Cívico e Beneficente e como isso se representa num
discurso que construiu a imagem do operário para seus associados. Nesse caso, essa
imagem construída no interior das relações sociais do Centro serve para reconhecermos
um conceito de classe em si, ou seja, constituído dentro das dependências da própria
organização operária e que determina a participação desse em sociedade.
O uso de referenciais teóricos que se aproximam dessa proposta tem sido, no caso,
50
discutidos recentemente, procurando captar experiências dos trabalhadores pela
inteligibilidade de suas práticas. Essa proposta, embora seja reafirmada por uma suposta
ressignificação não pode ser referenciada como um tipo de negação às matrizes teóricas
anteriores e muito menos como uma forma “certa” de estudo da classe trabalhadora.
Vejamos os frutos de grupos de estudos como o Grupo de Trabalho Mundos do
Trabalho49 como uma alternativa de reconhecimento do comportamento de uma luta de
classes além do domínio econômico. Sobre isso, Sandra Pesavento reconhece no ritmo
dessas inovações, uma outra ótica sobre a realidade social a partir de outros princípios “o
historiador passava a explorar, assim, os chamados silêncios de Marx, nos domínios do
político, dos ritos, das crenças do hábitos. Para surpreender essas mudanças, do
cotidiano da vida e do trabalho, era preciso encarar novas fontes” (PESAVENTO, 2003, p.
2930).
A autora ainda reconhece na escrita de E. P. Thompson a grande guinada para essas
novas percepções. Reafirmando isso, Pesavento ainda alega que "em cada contexto, era
preciso surpreender os nexos entre os diferentes traços do comportamento da classe" (op.
Cit. p. 30). Dessa forma, o próprio conceito de "classe" não se tornava único e
unissêmico.
Segundo E. P. Thompson, os trabalhadores se constituem enquanto classe ‘’a partir
das experiências vividas em comum’’ (THOMPSON, 1987, p. 10). Não é a caneta do
intelectual que define o último estágio da consciência de classe. Tal forma de reconhecer
a consciência de classe nos permite também desvendar a maneira pela qual as
experiências são tratadas pelo que essencialmente são – ou seja, culturalmente.
Proporcionando uma investigação que coloca os trabalhadores enquanto sujeitos da
história a partir do seu fazerse50.
nenhum exame das determinações objetivas e, mais do que nunca, nenhum modelo eventualmente teorizado podem levar à equação simples de uma classe com consciência de classe. A classe se delineia segundo o modo como os homens e mulheres vivem suas relações de produção e segundo a experiência de suas situações determinadas, no interior do “conjunto de suas relações sociais”, com a cultura e expectativas a eles transmitidas e com base no modo pelo qual se valeram dessas experiências em nível cultural. De tal sorte que, afinal, nenhum
49 Para mais informações sobre o Grupo de Trabalho Mundos do Trabalho acessar o site: http://www.ifch.unicamp.br/mundosdotrabalho/ (acessado em 28/09/09).50 Os trabalhadores criam e vivem a própria história e suas experiências demonstram que a consciência de classe está colocada internamente de um permanente fazerse da classe operária (THOMPSON, 1976).
51
modelo pode darnos aquilo que deveria ser a “verdadeira” formação de classe em um certo “estágio” do processo (THOMPSON, 2001, p. 277).
Colocando isso em torno do surgimento do proletariado princesino e de sua formação
enquanto classe, não podemos supervalorizar apenas sua atividade política como se essa
fosse a única forma dos trabalhadores se introduzirem na história. Devese considerar que
a cultura é considerada como ponto inerente nesse processo de formação dos
trabalhadores enquanto classe. Algumas produções cedem maiores olhares à
organização política dos trabalhadores, entretanto, é contido ao pesquisador observar os
demais espaços onde fora produzida a identidade dos trabalhadores.
Além de assumir a característica de amparador dos trabalhadores, o Centro Operário,
em seu próprio discurso, sempre se destinou como um espaço de lazer e de
administração do tempo livre51 dos trabalhadores. Nessas passagens se torna
interessante denotar a existência de distinções tênues entre os dois tempos da vida do
operário e como esses são estipulados pelos espaços onde são administrados.
Daí a importância de um sobrevôo por parte da História Social do Trabalho não
somente sobre assuntos relacionados a organizações sindicais. Aproximandose do caso
aqui estudado, essa importância também pode ser dada a outros locais onde as
experiências podem ser compartilhadas, tais como sociedades recreativas, clubes e
associações com fins esportivos52. Essas entidades também podem responder muitas
51 É nos cenários construídos pelos trabalhadores (Sindicato e Lazer) que eles próprios vão se constituir além do tempo do trabalho e além das relações produtivas. Não existe consciência de classe pronta e acabada, nem ''certa'' ou ''errada'', entretanto o uso do tempo se deve ao próprio aproveitamento que os trabalhadores proporcionam a ele. Eric Hobsbawm fala de um chamado timeoff (tempo livre) no cotidiano dos trabalhadores da Inglaterra no século XIX, onde esses determinavam sua cultura: "usemos um conhecido ponto de referência no mapa da classe trabalhadora "tradicional", a lanchonete de peixe e fritas originada provavelmente em Oldham, na década de 1860 (...). O futebol já possuía uma modesta vida subterrânea como esporte para o espectador proletário nos últimos anos da década de 1870" (HOBSBAWM, 1988, p. 281).52 O professor Uassyr Siqueira reflete sobre esse assunto da seguinte forma: "principalmente em relação à historiografia mais tradicional, acabouse por aceitar a versão elaborada pelas lideranças sindicais do início do século XX, as quais consideravam outras formas de sociabilidade, como clubes esportivos e recreativos sem caráter sindical, como secundárias em relação à “verdadeira” organização ou até mesmo como alienantes. Dessa maneira, sem qualquer questionamento sobre o papel dessas associações na articulação de identidades entre os trabalhadores, são postas em segundo plano pela historiografia – quando não completamente desconsideradas. A ausência de pesquisas sobre clubes e associações dos trabalhadores é também resultado das concepções a respeito da consciência de classe. Embora haja o reconhecimento sobre a peculiaridade organizatória dos trabalhadores, a consciência muitas vezes foi tratada em termos de movimentos reivindicatórios ou políticos ou do confronto direto com o patronato ou estado, o que acaba por excluir muitas das agremiações dos trabalhadores. Outras formas de manifestações da consciência, expressas e diferentes no cotidiano dos trabalhadores, são deixadas de lado se ignoramos os clubes e associações como espaço legítimo de organização'' (SIQUEIRA, 2002, p. 24).
52
indagações sobre o momento em que viveram.
A primeira parte desse trabalho desloca nossa leitura a movimentos constituídos
dentro de associações operárias que possuíam critérios distintos de organização. Em
virtude do estudo sobre as fontes e a documentação do Centro Operário, o recorte
proposto pelo trabalho não possibilita uma observação sobre um movimento forjado em
um cunho sindical e combativo em Ponta Grossa – ou que pelo menos deixe isso explícito
em suas atas.
A importância do trabalho, por outro lado, está em perceber as estratégias dos
personagens do Centro Operário, evidenciadas no discurso das atas e aqui colocadas
com a finalidade de entender se essas práticas cotidianas eram baseadas no total
consenso dos membros ou se deixavam transparecer tensões e conflitos entre seus
associados ao serem abordados nas reuniões registradas pelas atas.
Observando o Centro Operário como uma rede social, consideremos que nele se
materializa uma teia de relações que determinam os seus objetivos sociais enquanto
entidade. É na forma como os indivíduos se relacionam que reconhecemos suas ações. O
contato social é determinante para entendermos tais relações, é nesse domínio gerado no
coletivo que se colocam a prova um conjunto de valores, intenções, estratégias, projetos,
relações de poder, entre outros53.
São as relações de trabalho que criam esses personagens, os trabalhadores em
seus diferentes locais de trabalho. Num outro cotidiano, esses por sua vez ao se
reconhecer numa situação parecida sugerem a criação de outros espaços na sociedade,
daí nascem os espaços de organização dos trabalhadores ou de lazer. O encontro de
experiências pode colocar os trabalhadores enquanto classe, enquanto atores sociais em
um momento estratégico – seja numa manifestação, num piquete de greve ou em um jogo
de futebol.
53 Sobre redes sociais e suas redes de comunicação, o físico Fritjof Capra diz: ‘’Como as comunicações (...) produzem um sistema comum de crenças, explicações e valores – um contexto comum de significado – que é continuamente sustentado por novas comunicações’’. Nesse processo, cada membro da rede adquire a sua própria identidade, mas isso sem deixar de ser membro de outras redes. Esse, na verdade, é membro de várias redes dentro do sistema social como um todo. ‘’Na sociedade humana, as estruturas são criadas em vista de determinada intenção, de acordo, com uma forma predeterminada e constituem a corporificação de um determinado significado’’ (CAPRA, 2002, p. 9596).
53
2.2 O 1o. De Maio: A Fundação do Centro Operário Cívico e Beneficente.
A fundação do Centro Operário Cívico e Beneficente passa a significar um novo rumo
no movimento operário de Ponta Grossa, sendo que a associação não agrupava
simplesmente trabalhadores54, mas também, membros da pequenaburguesia,
intelectuais, jornalistas e comerciantes.
O Centro Operario Cívico e Beneficente que procurará por todos os meios o bem estar dos seus componentes da classe operaria local, amparandoos moral e materialmente (...) bem como de comum accordo com as suas coirmãs do Estado e do Paiz procurará também pelas conquistas das reivindicações dos Homens do trabalho fazendose representar (...) nos conclaves ondese discutem theses que possam interessar os trabalhistas locaes do Estado e da Republica (C.O.C.B, Ata 02)55.
Entre os principais associados e diretores do Centro estavam: Albino Wiecheteck,
industrial e vereador pelo Partido Integralista (1935937); José Deslandes de Souza,
membro do jornal Diário dos Campos; Adejamiro Cardon, membro da Livraria Modelo;
Joaquim Wirruez, gerente da madereira SONYRA; Eusebio Biaco, fiscal; Walfrido Pilotto,
54 Além das atas, outras fontes como o Livro de Inscrições e o Livro Caixa do Centro Operário revelam a ocupação dos trabalhadores em diferentes postos e categorias de trabalho. Entre as principais categorias se encontram os cerreiros, madeireiros, mecânicos, metalúrgicos, comerciários, ferroviários, cervejeiros, ervateiros, artesãos, entre outros. Ver ANEXO 3.1.55 O dia 1o. de Maio conhecido como Dia do Trabalhador, posicionado hoje no calendário nacional como feriado, é lembrado como a data de início da Greve de Chicago de 1886 que culminou na morte de 12 trabalhadores. Esse evento é conhecido como a Revolta de Haymarket. Martirizado por tais mortes, esse passou a ser reconhecido como Dia Internacional das Causas Laborais. Araújo e Cardoso, ao reconhecer a gênese do 1o. do Maio como um dia de luta e que a recordação desse episódio “encaminha à reflexão acerca da contribuição do operariado para a sustentação da sua força de trabalho” (ARAÚJO; CARDOSO, op. Cit, p. 110). Complementando, o 1o. de Maio, que também é marcado em 1929 pela fundação do Centro Operário, é reafirmado pelas duas pesquisadoras como evento anual em que “os operários emprestavam à data o caráter de protesto e solidariedade na luta, através da fundação de ligas e associações” (op. Cit., p. 112). No Brasil, o dia é decretado enquanto feriado nacional em 1919. Araújo e Cardoso ainda reconsideram essa data que passa do calendário operário, "o luto e a luta", para o calendário da sociedade como um todo. "A institucionalização do feriado termina enrijecendo o conteúdo das comemorações; dissocia no espaçotempo, trabalho, de lazer, atuação produtiva, de atuação política. Reserva espaços físicos determinados para manifestações isoladas: local de trabalho e local de festa, local de produção material e local de produção de idéias. O feriado oficial, portanto, afasta operários de seu meio: o local de trabalho. Com isso, a luta político ideológica perde para festividades de congraçamento nas quais o tema comemorativo – trabalho suplanta o trabalhador" (op. Cit. p. 114). Essa citação se contempla no trabalho quando percebemos o fluxo do discurso que preenche a primeira ata do Centro Operário. A sua fundação foi articulada numa data considerada importante para os operários de Ponta Grossa, "mais grata ainda ainda, pois que o Centro de sua classe, iria ter naquele dia sua instalação oficial’’ (C.O.C.B, Ata 01). Embora, esse sentimento para com um dia específico na vida dos operários aparece significado como "festa dos homens do trabalho" onde ali não partilhavam da comemoração apenas trabalhadores, mas também políticos e outros membros da sociedade civil.
54
escritor paranista e jornalista; José Silva, jornaleiro; João Ferigotti, zelador do cemitério
público; Fidelis Alves, funcionário da Prefeitura e Alberto Lopes, tenente do 13o.
Regimento de Infantaria.
Sobre o Centro Operário, Carmencita de Holleben Melo Ditzel escreveu: “a
instituição reunia um grupo heterogêneo de trabalhadores com diferente qualificação
técnica, fazendeiros, comerciantes, industriais, políticos e setores da imprensa” (DITZEL,
2004, p. 147).
Uma das infelicidades desse trabalho se encontra em não ter conseguido encontrar
o perfil trabalhador ou empresarial de todos os membros da diretoria. Entretanto, o
descobrimento dos afazeres desses membros a partir da pesquisa e averiguação de
outros documentos pode servir para ligar o texto das atas às motivações que o
produziram.
A análise do conteúdo das atas enquanto objetos de pesquisa é realizada a partir
do recorte de algumas palavras centrais no texto. A importância é determinada pela
freqüência que a palavra é citada no texto ou pela posição que ocupa no discurso. São
construídos quatro núcleos de sentidos: Lazer, Beneficência, Cotidiano, Política (ver
ANEXOS 3.3) – esses servem para perceber como cada palavra adentra o discurso,
criando o assunto. As palavras, tratadas em destaque, entre aspas, podem auxiliar a
compor o significado de representações56 produzidas nas atas do Centro Operário
(BARDIN, 1998).
56 Segundo Falcon: ‘’o conceito de representação pode ser entendido de duas maneiras, a primeira como ‘representação’ entendida como objetivação, figurada ou simbólica de algo ausente, a outra é que a representação é definida como ‘estar presente no lugar de outra pessoa’, substituindoa, podendo ou não ‘agir em seu nome’, essa última se incorpora como a prática política’’ (FALCON, 2000).
55
FIGURA 07 – Ata da fundação do Centro Operário.
56
FIGURA 08 Foto de Albino Wiecheteck, vereador pelo Partido Integralista 19351937
(PREFEITURA, 1936).
57
O discurso apresenta um clima de saudosismo e solidariedade aos trabalhadores do
recémfundado Centro Operário, instaurado na "defesa" da classe trabalhadora. O texto
apresenta a existência de reivindicações colocadas pelos "Homens do Trabalho", apesar
de não ser específico quanto a essas e como seriam solucionadas.
Os objetivos do Centro aparecem e a organização dos trabalhadores num primeiro
momento cede importância a sua expressão popular perante toda sociedade, o "operário"
tinha seu mérito e somente a ‘’união’’ e a ‘’colectividade’’ poderiam construir esses
merecidos votos. Considerar a existência dessas palavras e a forma como se posicionam
no texto é fundamental para perceber a forma como se articula o discurso.
Pensando o Centro Operário como um espaço onde os trabalhadores possuíam seu
tempolivre, podese notar que a sociabilidade dos sócios era em momentos direcionada e
mitificada por esses termos. Pensando essa organização operária formada por um
coletivo orientado por tais termos, se torna possível entendêlo como formador de um
conceito de classe em si, o que era/deveria ser o trabalhador, como na formação de um
autoretrato. Nesse caso, essa representação contida no texto, é o que elabora uma
imagem do operário.
Quando palavras57 como "Estado" e "Paiz" adentram o discurso se interligando com
os personagens trabalhadores no seu coletivo "Homens do Trabalho" – concluise que a
sensibilidade desses com os sentimentos de civismo seriam ocasionados perpassando as
mãos do aparelho institucional do estado.
A priori, tal constatação pode aparentemente se apresentar num campo de obviedade,
porém, o aprofundamento dessa análise58 pode proporcionar uma leitura mais fiel à
construção do sentimento cívico entre os membros da associação e mostrar que esse não
se reproduz apenas no título do Centro Operário.
Nesse momento, a fundação do C.O.C.B cede importância não somente a um jogo de
57 Para Ciro Cardoso e Ronaldo Vainfas, o léxico não é um amontoado de palavras isoladas. As palavras se alojam dentro do discurso de forma a se coordenar entre si ou se opor entre si. Nesse caso o pesquisador necessita abordar "a decifração do campo lexical inerente ao discurso, modelo esse pautado em algumas redes de relações de palavras" (CARDOSO; VAINFAS, 1997, p. 380).58 Entendese a análise de conteúdo por possuir a finalidade de analisar textos sobre uma perspectiva quantitativa, mas sem gerar uma dicotomia com a análise do discurso de forma qualitativa. No caso das atas, esse olhar deve permear além do texto, mas, também todo o contexto em que foi produzido – considerando então que o texto em si se apresenta enquanto discurso, mas é passivo de um contexto. Esse processo considera a produção, a circulação e o consumo do discurso (CARDOSO, VAINFAS, op. Cit.; BARDIN, op. Cit.).
58
relações interno entre os membros da associação , mas também à sociedade ponta
grossense como um todo. Entre esses elementos, o que chama a atenção na ata é quanto
à composição da mesa da primeira reunião. Chamado pelo presidente recémempossado
do Centro Operário, José Deslandes de Sousa, o primeiro convocado a compor mesa,
antes mesmo dos membros da diretoria, foi o prefeito de Ponta Grossa, Elizeu de Campos
Mello59, sendo esse aclamado como ‘’amigo da classe trabalhadora’’ e respondendo estar
em inteira solidariedade a ela.
Esse clima de saudosismo, colocado a partir da solidariedade do Centro se contempla
no “valor” que possui a classe operária naquela festividade. A imagem do 1o. De Maio se
esclarece pela conveniência de nenhuma discussão sobre condição salarial dos
trabalhadores ou de suas condições de trabalho ser colocada perante o Prefeito. Dessa
forma, as posteriores atas deixam algumas perguntas quanto ao que seria essa "defesa"
da classe operária.
Mas para além da insinuação daqueles "Homens do Trabalho", a primeira atividade da
mulher se transmite nas atas ainda na fundação da entidade operária. Dentre a
ritualização da cerimônia do trabalho, além de todos os valores, símbolos e sinais que se
imagina terem incorporado o palco das relações sociais, o ser feminino apenas se
apresenta referido na segunda ata do Centro Operário quando travestido de uma tal
Senhorita Rainha dos Operários e saudada pelo prefeito dizendo que "com sua presença,
tão grandemente engalava a festa dos homens do trabalho" (C.O.C.B. op. Cit.)60.
Esse evento de tal Centro Operário, significado de tal forma no calendário dos
laboriosos princesinos mostra uma reafirmação de um lazer muito próximo do mundo do
trabalho. De tal forma que o discurso dos membros da Diretoria e do Prefeito se pauta na
legitimação da força de trabalho. O orador do Centro, Adejamiro Cardon, solicitou a
palavra e em nome da entidade exclamou que "seu único objectivo era procurar o
levantamento do operariado integrandoo no seio da colectividade humana e dando o
direito e o valor a que elle faz jus, com o esteio mestre do progresso e da grandeza dos
59 Elizeu de Campos Mello conhecido como um dos fundadores e apoiadores do extinto Jornal O Progresso, que mais tarde se tornaria Diário dos Campos. Era acionista majoritário da Companhia Tipográfica Pontagrossense. Advogado e fazendeiro, se tornaria prefeito de Ponta Grossa em 1928 (CHAVES, 2001).60 A partir da leitura do Livro de Inscrições do Centro Operário, é possível perceber a participação de mulheres na associação. Se apresentam em número aproximadas 49 mulheres afiliadas, muitas delas carregando sobrenomes de sócios, o que denota a possibilidade dessas serem esposas ou possuintes de algum grau de parentesco para com esses.
59
povos" (op. Cit.). A justificativa da disposição e do empenho do trabalhador se orquestrava
nessas palavras.
Essa palavra ainda aparece em mais uma oportunidade, quando o tenente e redator
do Diário dos Campos, Affonso Lopes pediu a união dos diretores do Centro Operário e
para‘’que trabalhassem pelo engrandecimento da cidade, do estado e do Brazil, ao qual
deviam todos dedicar os maiores sacrifícios pelo seu progresso pela sua grandeza’’ (op.
Cit.). Quando o "progresso" entra em cena no discurso, não existe outra alternativa a não
ser legitimar a participação do trabalhador em sociedade. Perante o representante
máximo do governo local, aparece um movimento operário esquadrinhado e próximo das
elites locais.
Por fim, e antes de se encerrar a reunião, foi entregue pelas mãos do prefeito uma
imagem de Nossa Senhora dos Operários a um trono que se encontrava na sede
provisória do Centro Operário.
No decorrer das atas, esse esquadrinhamento da imagem e do movimento operário
aparece acariciado de outro fenômeno. A pesquisa acabou percebendo além das
atividades recreativas e de lazer, das quais a entidade se propunha a desenvolver com
seus membros, os chamados assuntos políticos61.
61 Sempre que tratados nas atas e nos estatutos sociais enquanto "assumptos politicos", esses parecem repudiados. Entre as 24 atas analisadas, esses são chamados assim apenas quatro vezes. Porém, eventos como a participação de Walfrido Pilotto num Congresso Operário – sendo que esse era jornalista , o apoio a Elbe Pospissil para a Assembléia Legislativa, a convocação para uma Conferência operária em praça pública, a doação de um terreno pelo prefeito para a construção da sede da associação, entre outros, acabam sendo tratados na pesquisa como sendo de cunho político.
60
FIGURA 09 Eliseu de Campos Mello, Prefeito de Ponta Grossa 19281930 (Fonte: Casa da Memória).
61
Tratados de tal forma também no estatuto da associação62, esses assuntos
aparecem omitidos e até censurados pragmaticamente nos eventos da entidade por
alguns de seus membros. Entretanto, as atas evidenciam que nas situações onde esses
aparecem, acabaramse gerando conflitos no interior da associação. Em torno disso, e
contrapondo tais temas, as atas constroem em seu interior uma representação da imagem
do operário de forma cívica e solidária – algo que também se reproduz no nome da
associação.
2.3 Entre a Ordem e a Política: O caso do “tellegrama”.
Entre uma reunião e outra, se percebia a intensidade das discussões em torno de
assuntos recreativos e de lazer. Ainda assim, foi possível perceber uma outra tonalidade
em casos específicos quando são citados e discutidos os chamados “assumptos políticos”
(sic!).
Em torno disso, e contrapondo tais temas, as atas constroem em seu interior uma
representação da imagem do operário de forma cívica e solidária – algo que também se
reproduz o nome da associação procurando não deixar espaço pra qualquer notoriedade
política ao movimento operário.
2a. Chamada da Assembléia de 18 de agosto de 1929: João Perantunes, vice
presidente do Conselho Fiscal, pediu a palavra. Essa só lhe foi concebida após o
presidente, José Deslandes de Souza, lhe advertir que no seio da sociedade operária não
se devia "tratar de política" (C.O.C.B Ata 10). Ao lhe ser ofertado a palavra, Perantunes
pediu uma "explicação" sobre um artigo escrito no Diário dos Campos pelo orador
Adejamiro Cardon que tratava do alistamento de operários para que esses pudessem
votar nas eleições daquele ano exercendo um dos "deveres cívicos" da sociedade.
O artigo 72 do estatuto do Centro Operário foi citado na reunião pelo presidente do
Conselho Fiscal, a fim de omitir o incentivo de Cardon ao voto dos operários. Perantunes
ainda se direcionou ao Presidente, pedindo "esclarecimentos" sobre um "tellegrama"
contendo "assumptos politicos" que poderiam comprometer o "bom nome" do C.O.C.B.
62 Segundo o Artigo 72 inciso 5o. Do Estatuto Social do Centro Operário Cívico e Beneficente de 1979: "É proibido se manifestar politicamente nas dependências do Centro Operário". Esse artigo aparece como documento mais citado nas atas, precisamente três vezes.
62
Tanto Deslandes de Souza quanto Cardon, responderam as acusações em
Assembléia. Dizendo que tais posturas partiam "em caráter particular", nada tendo o
Centro Operário a ver com isso.
3a. Chamada da Assembléia de 25 de Agosto de 1929: A discussão do telegrama se
perpetuou nessa outra chamada da Assembléia. A ata registra que a carta havia sido
endereçada ao jornal Estado de São Paulo, firmando documento de apoio do Centro
Operário e de Ponta Grossa ao candidato a Presidente da República Júlio Prestes a
carta havia sido assinada juntamente com o Prefeito. Logo consta que possivelmente, o
incentivo ao alistamento, por parte de Cardon, pode não se conceber enquanto um caso
isolado.
Em resposta, José Deslandes de Souza disse que não exerceu tal ato com "intuito de
prejudicar o Centro que com a ajuda de outros elementos de valor no seio da classe
obreira, havia fundado, se fez e concordou com o telegramma de (...) solidariedade do
governo do Estado e da cidade representada na pessoa do illustre Dr. Campos Mello"
(C.O.C.B Ata 11).
Adejamiro Cardon pede a palavra nesse momento, dizendo entender tal gesto como
uma forma de agradecimento, se referindo a Julio Prestes como "grande trabalhador" de
outras sociedades operárias63 para depois ‘’chegar a conquistas de então [na] política
nacional’’. Cardon ainda disse ter ‘’esperanças de ver os homens do trabalho se unindo ao
lado dos que nos governam elaborando as leis que nos regem’’ (op. Cit.).
O polêmico documento foi tratado por José Deslandes de Souza como motivo de sua
renúncia à presidência do Centro Operário. A assembléia deliberou contra a renúncia do
presidente. "Usando este da palavra, disse então que [mesmo assim] se considerava
demitido e pedia licença (…) para retirarse do recinto". Entretanto, ao tentar sair, Souza
foi impedido por alguns membros da diretoria e sócios, ‘’estabelecendose, então pequena
confusão na assistência’’ (Op. Cit.).
A assistência sendo recomposta, permitiu a José Deslandes de Souza voltar a ocupar
seu cargo – já se evidenciou que não era do interesse dos membros do Centro Operário
63 O caso do telegrama reflete que o Centro Operário possuía membro não só articulados com a política local, mas também a nível nacional. Entretanto, apesar de esse personagem ser apresentado como "grande trabalhador" por Adejamiro Cardon, seu retrospecto político pode ser entendido de outra forma. Júlio Prestes de Albuquerque, conhecido por vencer a eleição de 1930 e por ser impedido pela Revolução de 1930, nunca teve sua vida política em intimidade com qualquer causa puxada pelo movimento operário.
63
que esse deixasse a presidência. Essas duas atas mostram que a omissão dos tais
"assumptos politicos" era justificada a partir de argumentos que se correspondiam com o
"bom nome" da associação operária. Tais expressões são colocadas algumas vezes64,
nem sempre da mesma forma, mas possuindo a mesma conotação – demonstrando o
quanto uma atitude poderia comprometer o nome da entidade que procurava reproduzir o
ato dessa como "cívico e beneficente".
Nesse instante do texto, cabe deslocarse a um recorte dos chamados "assumptos
politicos". Entretanto, comparando quantitativamente o número de páginas que tratou
desse caso específico com qualquer outro, percebemos que logo aquilo que fora muito
omitido e censurado no Centro acabou ocupando um maior número de páginas que
qualquer outro assunto.
2.4 Trabalhadores do Paraná UNIVOS!: Uma política a portas fechadas.
A existência de um documento jurídico que barrasse os atos políticos pode parecer o
reflexo de que esses não ocorressem em torno da associação de trabalhadores. Todavia,
a existência que um artigo do estatuto e discurso das atas, onde ambos discriminam tais
assuntos políticos não significa que tais práticas não ocorriam.
Reunião Extraordinária da Diretoria, 25 de Setembro de 1929:
Usando da palavra o sr. Presidente expôs [a pauta] daquella convocação, dizia elle que estava o operariado do Paraná enfrentando na eleição de seu deputado ao Congresso do Estado tendo havido uma conversação em Curityba, (...) a apresentação do operário (...) sr. Elbe Pospissil para ser o candidato operário ao Congresso do Estado (C.O.C.B, Ata 12).
Foi numa reunião extraordinária, aparentemente breve e direta, sem a participação dos
associados, a não ser por parte dos integrantes da diretoria e do Conselho Fiscal, que
essa discussão entrou em pauta. Elbe Pospissil foi um dos articuladores da Greve dos
ferroviários em 1919 que cobrou 20% de aumento nos salários, melhores condições de
trabalho e jornada de 8 horas. Os manifestantes saíram vitoriosos, tendo todas as
reivindicações atendidas. A partir disso, a participação de Pospissil na União Operária do
64 A palavra tellegrama é citada cerca de cinco vezes, sendo que essa aparece nas atas contrapondo o "bom nome" ou "nome honroso" do Centro. Nesse caso, apesar de os termos não possuírem igual pronúncia, eles acabaram possuindo o mesmo sentido.
64
Paraná conseguiu atrair maior atenção à sua vida política (ARAÚJO; CARDOSO, 1992).
Um Congresso convocado para o dia 19 de Outubro foi convocado em Curitiba – não
há maiores informações na ata sobre tal. A chamada "conclusão" dos operários decidiria
todo apoio ao futuro candidato a deputado estadual, sendo que foi eleito para
acompanhar tal processo o literário paranista e jornalista Walfrido Pilotto65, eleito sócio
benemérito do Centro Operário.
Além disso, essa ata revela a contradição e o embate de discursos no interior do
Centro Operário. Foi num conluio fechado, sem a participação dos demais membros da
entidade que foi decidido o apoio desta ao candidato. Essa atitude deixa a entender uma
atividade política dos membros da organização operária, enquadrando um dos "deveres
cívicos" do operário a uma única alternativa de voto e mostrando a tentativa de controle
da associação sobre a decisão dos trabalhadores nas urnas eleitorais.
A ata ainda previa que todos os membros alistados recebessem uma cédula com o
nome do candidato. "Tambem pelo sr. João Shimidt Filho foi proposto que o Centro
censurasse todo o seu sócio que não votasse no candidato da classe operaria nas
eleições (...), pois que assim demonstravam falta de união e compreensão de seus
deveres civicos, para com a colectividade operaria" (op. Cit.). Segundo consta em ata,
essa proposta provocou várias discussões, mas foi aprovada pela maioria dos reunidos.
A apelação dos "deveres cívicos", mais uma vez citados, serve de justificativa para a
"censura" de tais membros. Ao fim da reunião, o presidente agradeceu a presença de
todos naquela reunião onde foram "tratados assumptos de magna importancia para a
sociedade e para a classe trabalhista do Estado". Não existe registro de qualquer citação
do artigo 72 dos estatutos sociais nessa ata, sendo que até mesmo os membros do
Conselho Fiscal, incluindo João Perantunes, não se manifestaram contrários ao apoio a
candidatura de Elbe Pospissil.
2.5 Cívico e solidário: Beneficência e lazer no Centro Operário.
Reunião Extraordinária da Diretoria, 14 de Janeiro de 1930:
65 Walfrido Pilotto, conhecido jornalista e escritor paranista possui notoriedade também por, junto da família Pilotto, vir a Ponta Grossa no início do século XX para trabalhar no escritório da Rede Ferroviária (WIKIPÉDIA, 2009; WRONISKI, 2009).
65
Tendo pedido a palavra ao sr. Joaquim Wirruez, que se estava presente, o qual (...)
explicou (...) a attitude dos operarios da Sonyra, dizendo tambem qual o motivo
que os levou a pedir (...) a sua eliminação deste Centro. O motivo principal e único
(...) foi ter um socio desta aggremiação, o sr. Affonso Braune, procurado introduzir
ideias politicas no seio o operariado da Sonyra, cujas ideias, são terminantemente
prohibidas pelos nossos estatutos (COCB Ata 18).
João Schimidt Filho pede a palavra, dizendo que ''profundamente magoado com a
attitude do sr. Braune pede que o mesmo seja eliminado desta sociedade a bem da
ordem e do progresso da mesma'' (op. Cit.). Essa ata revela mais um caso de perseguição
às atividades políticas dos operários membros da entidade. Ressaltando aquelas idéias
como ''terminantemente prohibidas'' pelos estatutos do Centro, essas nem expostas são.
Sendo que na reunião posterior aquela, a ''eliminação'' do secretário foi seguida de
''motivos já de todos conhecidos'' (COCB Ata 19). A censura a tais ''ideias politicas'' era
exercida de forma contundente, procuravam ser minimamente citadas, demonstrando o
interesse também de omissão a tais assuntos – colocando sempre tais ações como
opostas aos estatutos ou o ''bom nome'' do Centro Operário preenchido por membros que
praticavam a ''ordem'' em favor a seus ''deveres cívicos''.
Os deveres cívicos, nesse caso, apareciam materializados em ações que ocupassem
o tempolivre do trabalhador. Negar os assuntos políticos não parecia o suficiente, se
tornava necessário repreender e eliminar membros que tratassem de tais mesmo fora das
dependências do Centro Operário.
Certos documentos históricos podem contar uma História dos vencedores. No caso
das atas, a proposta vencedora discutida em reunião, o artigo do estatuto aprovado pela
maioria, é o que passa a sobreviver na linha do tempo. Entretanto, o direito ao passado
pertence a todas as classes sociais. A leitura nas entrelinhas, no discurso implícito, nos
mostra que em alguns momentos houveram processos de resistência. Momentos em que
mulheres e homens enfrentaram procuraram viver uma outra História. Ainda assim, a
caneta não estava em suas mãos.
Mais uma vez, nesse processo de construção da História o silêncio é percebido nas
fontes. É perante esse desafio que o trabalho do pesquisador se enriquece. Além da
66
definição de um método que subescreva relatos, a sensibilidade com a vida das pessoas
deve ser ainda mais intensa.
Independente da eliminação de Braune, da perseguição aos membros políticos
registrada no interior das atas, essa não é uma História da derrota da classe trabalhadora
no terreno de Ponta Grossa. Todavia, sim, é uma História do possível. Segundo
Thompson:
As classes não existem como entidades separadas que olham ao seu redor, acham
um inimigo de classe e partem para a batalha. Ao contrário, para mim, as pessoas
se vêem numa sociedade estruturada de certo modo (por meio das relações de
produção fundamentalmente), suportam a exploração (ou buscam manter poder
sobre os que exploram), identificam os nós dos interesses antagônicos, se batem
em torno desses mesmos nós e no curso de tal processo de luta descobrem a si
mesmas como uma classe, vindo pois a fazer a descoberta de sua consciência de
classe (THOMPSON, 2001, P. 274)
A reação aos movimentos combativos em Ponta Grossa foi algo presente e já discutido
aqui desde os seus princípios de organização. Mas isso em nenhum momento significou
sua derrocada ou que o freiodemão da reação acabou totalmente com a organização
dos trabalhadores na cidade. A atitude de Braune comprova isso.
Outra passagem importante que registra a relativa, e não total, importância das atas
no contexto dos trabalhadores aparece denunciada pelo próprio presidente logo após o
caso do telegrama. Antes de finalizar a reunião, o presidente José Deslandes de Souza
disse que ia nomear uma comissão para cuidar do Livro de Ouro do Centro afim de
arrecadar fundos para a construção da nova sede. Disse ainda que qualquer um que
fosse contra o Livro que se manifestasse “na sede do Centro e não na rua” (C.O.C.B. Ata
11). A letra corrida e a forma como aparece registrado no auto, demonstra uma certa
indignação de Souza, porém, além do seu sentimento a ata denuncia que alguns
associados discordavam de assuntos referentes ao Centro Operário fora de suas
dependências.
A relativa legitimidade das cerimônias do Centro Operário e a criação de uma rede
informal que discutisse tais assuntos porta afora demonstra que as decisões tomadas
pela maioria não significam uma total aceitação e uma total hegemonia de uns sobre
67
outros. O civismo era pauta de uma reunião e era relatado com toda precaução no toque
da pena sobre o papel. Mas esse relato evidencia que, mesmo antes dessa ter secado, o
conflito se tornava pauta de uma outra cerimônia elaborava na rua e não nas formalidades
do Centro Operário.
Em contraposição à realidade, a união dos operários aparece como elemento
importante da sua integração nas atas da entidade. O termo conjugado “união” aparece
na narrativa do documento como reflexo de uma imagem, ou digamos, como uma
representação de toda confluência de experiências daquele proletariado no instante.
A reprodução desse sentimento e sua finalidade se colocam na fidelidade duma das
primeiras citações de uma das atas: “que o operariado fosse unido para assim poder
alcançar as suas finalidades e puderem com isso integrar, no seio da coletividade
humana, que toda vida necessita do braço do operariado para poder ser forte’’ (C.O.C.B.
Ata 01).
Em grande monta, perante o pretexto de sociabilidade e a fuga aos assuntos políticos,
aquela haveria de ser preenchida de outro elemento que significasse a união dentro da
entidade. Aquele braço forte que conduzia a força de trabalho na sociedade era
representado por participar do conjunto da sociedade civil.
68
FIGURA 10 Símbolo do Centro Operário66
66 O símbolo do Centro Operário também se encontra talhado em frente a sua antiga sede até hoje. A imagem reproduz três figuras masculinas segurando o globo terrestre de forma que esse rotacione. Algo que rememora uma das falas do Tenente Alberto Lopes: “o operariado era a lavoura que movimentava os povos, a força hercules que sustentam as nações e elevavaa as suas maiores conquistas; que o operariado era a reserva dos paizes” (C.O.C.B. Ata 02). “Imagens propagam valores” (BURKE, 2004, p. 96). A representação dessa imagem aparece também reproduzida de forma parecida no discurso dentro das atas.
69
O aparecimento de um lazer operário mostra mais uma diferenciação da figura do
operário perante as outras classes sociais. Essa fronteira cultural estabelecida entre os
trabalhadores e o seu pedaço67 frente a tais grupos, porém, nem sempre foi encarada
como algo saudável para a sociedade como um todo. Jacques Rancière ao detalhar o
tempolivre dos trabalhadores na Europa do século XIX expõe o movimento de uma
classe, não apenas a partir de seus sonhos, mas inclusive a partir de seus divertimentos
a degradação do carnaval felizmente dura apenas alguns dias por ano, mas em cada semana há um domingo e uma segundafeira para esses lazeres dos trabalhadores que, na “cloaca de lama chamada taberna” vêm se identificar com o trabalho da farra. E a confusão das tabernas tende a estenderse para as ruas do subúrbio trabalhador (RANCIÈRE, 1988, p. 253).
Essa visão emprestada do burguês, formatada em tablóides franceses da época,
relatava o lazer operário com certa frustração. O tempolivre de homens e mulheres que,
por estarem na companhia de prostitutas e bêbados, aparecia como princípios de
contaminação da Belle Époque francesa – em várias ocasiões, esses eram os próprios
trabalhadores, homens gastando seus salários e mulheres procurando um ganho extra,
seres que se travestiam nessas personas noturnas.
Entretanto, além da superfície desse discurso, se torna necessário perceber que
aqueles personagens mostrados naquele ambiente faziam, sim, parte de uma fração
daquela sociedade urbana e industrial. No caso, eram produzidos pelo próprio enredo de
um desenvolvimento que os incluía a lógica da fábrica, mas que, apesar de criticar sua
forma de vida subterrânea e nociva, os excluía por meio da criação de um exército
industrial reserva e os impossibilitava de outras formas de divertimento – em certo
sentido, formas de entretenimento em clubes burgueses e aristocratas.
Outra forma de destinar a cultura às massas em seu tempolivre deveria ser prevista
no seio social. Se as greves e as manifestações evidenciavam os diferentes cenários da
luta de classes, o conflito aparece relocado também na formação de lazeres vividos pela
classe trabalhadora. Na visão de algumas classes sociais e até do Estado, esses eram
considerados como impróprios e nocivos ao corpo da sociedade.
67 Para o antropólogo José Guilherme Cantor Magnani "O termo na realidade"designa aquele espaço intermediário entre o privado (a casa) e o público, onde se desenvolve uma sociabilidade básica, mais ampla que a fundada nos laços familiares, porém mais densa, significativa e estável que as relações formais e individualizadas impostas pela sociedade" (MAGNANI, 1984, p. 11).
70
Maria Auxiliadora Guzzo Decca ao trabalhar a vida dos operários fora do ambiente das
fábricas nas décadas de 1920 e 1930 em São PauloSP mostra um cotidiano influenciado
e cercado do controle social do Estado. Aqueles que antes não se demonstravam tão
preocupados com a situação social dos trabalhadores se tornaram seus principais
acolhedores. Saúde, educação, higiene eram novos elementos fundamentais, segundo
eles, para a vida do operário e a “ignorância” e a “indisciplina” desse seria fator prejudicial
para seu próprio desenvolvimento na sociedade (DECCA, 1987).
A partir de uma nova concepção de tempolivre, se tornava necessário libertar os
operários de seus ‘’vícios’’ e de sua vida ‘’improdutiva’’. Essa era a missão de tornálo
mais disciplinado e ordeiro para o outro tempo, o tempo do trabalho. Toda família era
reconhecida nesse processo, parques eram construídos, as igrejas eram abertas aos fins
de semana para o bingo e para um tipo de lazer domesticado, as práticas beneficentes –
além de favorecer o sentimento de “solidariedade” e de alívio por outras classes sociais –
também passam a fazer parte dessa conformação ao apaziguamento das classes sociais.
Ainda assim, esse combate se projetava para além de uma cultura ‘’degenerada’’,
segundo o próprio Departamento de Cultura de São Paulo: ‘’comunismo se combate com
obras sociais e não com polícia’’ (apud Op. Cit. p.80). Fica aí registrado o enredo implícito
em que era composta uma padronização do divertimento e até do comportamento dos
trabalhadores e suas famílias.
Em Ponta Grossa, passagens sobre o lazer operário representado na prática do truco,
da bocha, do francês68, das rinhas de galo e das caçadas são bem freqüentes em
diversas produções acadêmicas. Adriano Rossi ao trabalhar os conflitos em bares de
Ponta Grossa na década de 1930, identifica os botequins localizados próximos ao leito da
ferrovia como grandes palcos de embate entre ferroviários da rede federal. Ainda segundo
Rossi:
os conflitos nos mostraram que essas medidas de normatização e
homogeneização da classe trabalhadora foram acompanhadas de tensões,
68 O truco é um jogo de cartas entre 2 participantes ou mais. O jogo de bocha consiste em lançar bolas (bochas) e situálas o mais próximo de um bolim (bola menor), previamente lançado. O adversário, por sua vez, tenta situar as suas bolas mais perto ainda do bolim ou remover as bolas do oponente. O Francês é um esporte praticado em cima de uma mesa, onde é testada a força do participante. Popularmente é denominado queda de braço, muito praticado da antiguidade até hoje (Disponível em http://pt.wikipedia.org/wiki/Brasil , acesso em 03/08/2009).
71
contradições e resistências. Uma das “metas” de esquadrinhamento do
trabalhador era a demonização de tudo que destoava do “ser morigerado,
cumpridor de seus deveres, bom pai, provedor e honesto” a não representação do
papel préestabelecido na constituição da masculinidade gerava cruzadas morais
contra o abuso desses ditos “inimigos” do homem, como o álcool, as noitadas em
bórdeis, a jogatina, etc (ROSSI, 2006, p. 18).
A normatização e o esquadrinhamento apresentado por esses autores se torna
interessante aos nossos olhos. Em um momento correspondente e em parte paralelo ao
descrito por Decca, o Centro Operário Cívico e Beneficente proporcionase um auto
discurso em que a entidade se circunda de tais práticas. Já em seu nome, a beneficência
se liga ao civismo, ou seja, a sua instalação previa o atendimento aos sócios (C.O.C.B.
Ata 17), a prática de assistência à família por meio de uma pensão chamada pecúlio (Op.
Cit. Ata 05), o atendimento de um médico e de uma farmácia aos associados (Op. Cit. Ata
16) e, quem sabe principalmente, a criação de uma Escola Noturna dos Operários (Op.
Cit. Ata 04). Sobretudo, uma organização operária que previa diversas formas de
atendimento de seus associados, fazendo prevalecer o discurso da ordem e ainda
possuindo o auxílio dos governos municipal e estadual.
O futebol aparece em suas atas como uma prática de recreação. A taça operária se
torna uma disputa entre o Centro Operário e outros clubes sociais de Ponta Grossa,
Guarany Sport Club e Operário Sport Club, a fim de favorecer o caixa da entidade (Op.
Cit. Ata 14).
Toda família era reconhecida no lazer operário. Citações nas atas se referindo a essa
participação são inúmeras, demonstrando o interesse de que aquele espaço padecesse
de um convívio familiar69. E se a importância do operário para a organização familiar e a
69 Não trabalhando como mera categoria, mas tentando esmiuçar e fazer uma radiografia sobre a família operária, me permito a um olhar mais íntimo do círculo que é construído em torno das relações sociais mais próximas e criadas por laços de sangue e por uma organização econômica em torno desses laços. Do matrimônio a origem biológica da prole – que proporciona sentido ao próprio da palavra “proletariado” , a criação desses vínculos que entrelaçam o sentido social da família e permitem que toda sociedade se exprima a partir do círculo familiar. Uma família, nesse tom, possibilita uma forma de organização social e econômica como um todo. Devemos oportunizar a forma como a família cria corpo na sociedade. Segundo Maria Célia Paoli: “ Incluir a reprodução da vida operária como cultura, como política, como sociabilidade e não apenas como reposição estrita da energia física do trabalhador significou trazer, entre outras coisas, a família operária para o centro da interpretação sobre suas condições de reprodução. Nos estudos sobre a história operária brasileira, no entanto, este é um movimento que apenas se esboça. Na reconstrução histórica da formação dos trabalhadores urbanos como classe, a concepção sobre suas formas de organização familiar é, em geral, subjacente aos temas “maiores” por onde
72
importância da família para as diferentes formas de reprodução da força de trabalho forem
intencionais? Tornase perceptível a utilização de um lazer para a formação de “corpos
dóceis” para o trabalho assalariado fabril a partir desse ambiente privado da família
(PAOLI, 1992; FOUCAULT, 1977).
A extensão da família para uma associação operária – ou seja, a passagem de uma
rede social a outra , essa última responsável por engrandecer em seu discurso o valor do
trabalho, acaba moldando todo conjunto da primeira em torno das informações produzidas
no interior da segunda.
Isso pode ser percebido como um fenômeno inconsciente no interior da entidade
operária. Porém se influenciado por outras classes sociais, esse caso pode ser adaptado
à intenção de uma estratégia que produz toda uma apologia ao mundo do trabalho, que
faria o trabalhador aceitar todos os sacrifícios do seu diaadia de trabalho. Tal influência
se ocasionaria de tal forma que essa aceitação ocorreria não somente no ambiente do
lazer operário onde a família também estava presente , mas ainda em seu domínio
privado, no seu lar.
A participação da sociedade pontagrossense em torno dos eventos organizados pelo
Centro Operário aparece também retribuída nos documentos oficiais da entidade, esses
eventos são significados com outros valores. A ata de 24 de outubro de 1929 retrata o
convite de uma festa que ocorreria na associação Homens do Trabalho, “convidando o
Centro a se fazer representar na festa” que ocorreria dois dias depois. O presidente ainda
se procura conhecer esta classe sindicato, partido, fábrica, salário, níveis de vida. Subjacente, mas quase sempre presente no material com que lida o historiador,a família operária também desliza como representação: ora é tratada como um dado natural da paisagem operária, ora como um reflexo desorganizado do modelo dominante da família burguesa, ora como um estilo cultural característico e herdado de um modo de vida anterior à proletarização” (PAOLI, op. Cit.p. 01). A extensão da obra de Paoli procura ser espelhada aqui, porém, entre uma ressalva deve ser feita. Sua constatação de que no ambiente de construção dos estudos históricos “a ausência de uma tematização explícita sobre suas formas familiares de organização” (op. Cit.) se coloca um tanto contraditória já na existência de um autor clássico específico nem sequer citado em seu artigo. Ao observar desde os primitivos estágios de formação da sociedade, Friederich Engels compara diversos sistemas sociais de forma a comparar com a formação da estrutura família. Seu alto e surpreendente grau de conhecimento do assunto não se demonstra de forma alguma ausenta a divisão social do trabalho, ou seja, o processo de formação da sociedade entre as classes sociais. Portanto, a mera constatação de que existe um teor necessário da criação da idéia de família seja monogâmica, consangüínea, ou partida de qualquer outra forma de geração dinástica em torno de outros pressupostos que formam a sociedade – a propriedade privada e o estado – contribui para o entendimento da forma como nossa sociedade passa a se organizar. Com respeito a ambos os autores, deixo aqui o registro das próprias palavras do segundo citado que podem nos escapar no interior de um de seus parágrafos: “A ordem social em que vivem os homens de determinada época histórica e de determinado país está condicionada por esses dois tipos de produção: de um lado, pelo grau de desenvolvimento do trabalho e, de outro, pela família” (ENGELS, s/d).
73
denota que tal festa ocorria “afim de engrandecer a classe operária” e se referiu ainda que
os operários deveriam seguir até a sede do clube “afim de participarem da festa em honra
a nossa soberania”.
Nesse caso, o que se percebe é que essa confraternização entre as duas associações
operárias foi justificada por sentidos construídos dentro do texto e que são simbolizados e
materializados em palavras como “honra” e “soberania”.
Sobretudo, o que se torna interessante discutir é que por meio de um evento da
sociedade civil onde membros de associações operárias estariam presentes. O
“engrandecimento” da classe operária seria resgatado por meio de valores como “honra” e
“soberania”. Sendo que isso seria ocasionado perante a sociedade pontagrossense
(C.O.C.B, Ata no. 12).
Todos esses eventos, constituídos e relatados como atividades regulares do Centro
Operário se oportunizaram na titulação de “eventos cívicos”, tornando a entidade paritária
de um sentimento com a nação pautado no dever do cidadão, nesse caso o cidadão
operário, e tendo seu título reproduzido a todo instante em cada uma de suas reuniões de
forma a perpetuar seu sentido.
Todas as práticas beneficentes adquirem uma simbiose com o Estado, a partir de
figuras como o prefeito, e pelo estabelecimento de contatos com o governo do estado70.
Essa característica coloca o Centro Operário enquanto cívico, além de sua auto
proclamação, mas também no contato com o conjunto da sociedade civil e com esse
Estado. O C.O.C.B enquanto uma entidade operário no interior dos interesses da
sociedade civil “afim de ali defender os interesses da classe junto aos homens que
elaboram as leis do Estado” (Op. Cit. Ata 12).
Nessa relação, a ponte estruturada entre um lado e outro se estrutura e se coloca
como apresentada na narrativa das atas. Essa ponte se estimula acompanhada por um
tipo de sentimento com essas figuras políticas71, porém, ainda assim, também com a
70 Quando o caso do telegrama veio a tona, a ata registra na fala de José Deslandes de Souza: “o Centro que com a ajuda de outros elementos de valor no seio da classe obreira, havia fundado, se fez e concordou com o telegramma de (...) solidariedade do governo do Estado e da cidade representada na pessoa do illustre Dr. Campos Mello [não fez aquilo] com o [intuito] de tirar proveito para a sociedade que havia chegado a fundar e não com o intuito de galgar posição a custa da sociedade e debaixo de seu manto, dizendo mesmo que [sua] posição (...) [não procurou comprometer] o nome honroso dos operários dedicados e conscientes que o ajudaram a fundar e levar a frente esse Centro” (Op. Cit. Ata 11).71 Um recorte, que além de compreender a isso e além de corresponder com essa proximidade de membros com personalidades políticas, reforça o apoio do Centro Operário a campanha de Elber Pospissil
74
bandeira nacional (op. Cit. Ata 24). O patriotismo previsto nessa reação a governantes e
símbolos nacionais pode se designar em estreitas relações que, segundo a representação
das atas, se estabelecem além de mediações burocráticas. Aparentemente, o auxílio dos
governantes parece necessário e esses parecem enxergar como necessário o apoio da
classe trabalhadora.
Partindo do entendimento da ata, ou seja, do documento escrito pela própria caneta da
organização que representava os trabalhadores, esse patriotismo se produzia na
afirmação dos trabalhadores perante o “progresso e a grandeza dos povos”. Na mesma
oportunidade, existe uma citação do tenente Alberto Lopes do 13o. Regimento de
Infantaria de Ponta Grossa em que esse pede a união dos diretores do Centro Operário.
Mas, sua fala parece processar uma idéia que vai além, destinando um caminho a ser
traçado pelos próprios trabalhadores para que esses “trabalhassem pelo
engrandecimento da cidade, do estado e do Brazil, ao qual deviam todos dedicar os
maiores sacrifícios pelo seu progresso pela sua grandeza’’ (op. Cit. Ata 02).
A presença de uma figura do exército procura contribuir na construção de outra
imagem, aquela da qual tanto se trata nas atas do Centro Operário e que passou a ser
estudada nesse trabalho, sobretudo, a imagem do trabalhador. Essa representação não
coloca os sacrifícios como medidos, mas previstos na oratória de Lopes como uma
oportunidade de crescimento inclusive do país. Um patriotismo72 produzido com
sacrifícios. Esse foi o discurso produzido e apresentado na ata. O sentido que coloca os
operários perante a nação.
A pronúncia da palavra “progresso”73, citada mais de uma vez nas atas, se apresenta
como um elemento presente no discurso dessas figuras. Entretanto, qualitativamente
a Assembléia Estadual. A ata registra as palavras de João Perantunes, que em outra oportunidade havia sido opositor ao apoio político do presidente do Centro a Júlio Prestes, complementa o apoio a Pospissil pedindo a palavra e dizendo “que se curasse fileira em torno de um só candidato e que o apresentado por Curityba para representar todo operariado paranaense era muito digno pois que conheciao desde menino” (op. Cit. Ata 11).72 Antes de um conceito moral de patriotismo, deverseia colocar que o sentimento para com a pátria se produz a partir de uma ótica de participação social. Recortando uma parte do Dicionário do Pensamento Social do Século XX no verbete “cidadania” esse reflete sobre isso: “uma participação desse tipo, porém, depende de forma crucial do aumento dos direitos sociais para proporcionar um nível geral suficiente de bemestar e econômico, lazer e educação, e sem dúvida também de novas formulação do que venha a ser o 'bemcomum'” (BOTTOMORE; OUTHWAITE. 1996, p. 73).73 O objetivo desse trabalho não foi conceber um conceito de progresso, aliás, esse parece já ser produzido em si, na fala de Lopes. Mas podemos entendêlo com maior evidência por meio da análise de outros autores que estudaram o termo aplicado enquanto discurso da realidade social (SEVCENKO, 1998).
75
(BARDIN, op. Cit.) existe a finalidade de entender a forma como esse discurso se aplicava
à realidade. Ultrapassando essa construção da imagem do trabalhador, como numa pose
de fotografia, ou na própria intenção do discurso podemos entender as condições de
trabalho a partir da leitura de teóricos que trabalharam essa época e perceber que tais
sacrifícios, não frisados pelo tenente, podem se relacionar às condições de trabalho de
uma época em que esses homens e mulheres não possuíam um salário mínimo, não
eram registrados e ainda trabalhavam em locais de risco à sua saúde e integridade física.
A fábrica, o espaço de produção, que viria para exercer enorme influência sobre o
espaço urbano, pode ser denunciada hoje pelos seus métodos de organização e também
por se constituírem como “laboratórios secretos” da exploração dos trabalhadores e
elemento de acumulação de riqueza por parte do burguês, seu proprietário.
Relatos da origem do sistema fabril, muito se assemelham com o que fora relatado
também por Marx e Engels em “O Capital” (MARX; ENGELS, 1985). A ampliação da
produtividade do trabalho e o processo de maquinização da fábrica corriam de forma
paralela à desvalorização da força de trabalho humana. Segundo Hardman e Leonardi:
“Esse processo acarretava o crescimento do exército industrial reserva e a desvalorização
da força de trabalho, fazendo com que o setor têxtil, [por exemplo], apresentasse as taxas
mais baixas de salário, com relação ao vestuário” (HARDMAN; LEONARDI, 1991, P. 135).
Podemos relacionar tal lógica capitalista em Ponta Grossa com a existência de
fábricas na cidade. Quando ligase o “progresso” a tais “sacrifícios” que os trabalhadores
deveriam passar, a paisagem industrial e o discurso das atas do Centro Operário se
reservam além da defesa do sentimento patriótico, mas também na legitimação a
exploração do trabalho. Aliás, naquelas atas, parecia se constituir um discurso que
aproximasse o operário, mesmo fora de sua jornada de trabalho, de um tipo de lazer que
seguisse a lógica do trabalho – um tipo de lazer operário.
Isso nos coloca próximos do relato das atas da festa do 1o. De Maio. Antes desse ser
um dia de reivindicações trabalhistas, ele aparece como dia de festa. Uma “festa do
trabalho”, algo afirmado no texto das atas e reafirmado nas palavras do prefeito de Ponta
Grossa. Algo que coloca, de certa maneira, o lazer próximo de uma lógica de trabalho, um
fenômeno produzido não somente nessa cidade, mas desde o início do processo de
76
industrialização do estado do Paraná74.
O trabalho dignifica o homem? Não foi com essas palavras, mas constase que aquele
militar aparece numa das cerimônias da associação operária procurando uma forma de
legitimar o trabalho a partir de seu discurso. Um discurso construído no espaço de lazer
do trabalhador, não no seu local de trabalho. Entretanto, o texto referencia a legitimação
de uma lógica de trabalho no lazer do trabalhador. Logo esse, mesmo à distância da
fábrica, tem seu perfil moldado e legitimado na representação de uma sociedade.
Uma sociedade que ao não medir tais sacrifícios, não coloca no discurso o suor no
rosto do trabalhador, as suas mãos cobertas de graxa, nem mesmo o seu cansaço... O
trabalho se torna algo dignificante e que omite esse outro lado.
A imagem dos operários aparece no interior das atas do Centro Operário. Isso ocorre
como na pose desses trabalhadores para uma fotografia na porta da fábrica – nos
rememorando algum tipo de foto do álbum da cidade de 1936. Aquele formato de
representação não possuía o interesse de considerar qualquer defeito no corpo do
trabalhador. Não considerava nem o suor, a graxa, o cansaço. Não há momento para isso
nas atas.
No caso dos trabalhadores representados no discurso de sua principal entidade, a
representação do ser laborioso, que expurgava também qualquer representação do “homo
politicus” daquela cena, repreende também os calos nas mãos dessas mulheres e
homens.
Pensemos a sociedade como um corpo. Se os trabalhadores são parte desse corpo
físico da sociedade, ocupando o papel dos braços que estimulam a força de trabalho, não
existe motivo para o incentivo de qualquer conflito ou violência nesse corpo. Um membro
político dentro desse corpo estaria em discordância com o restante dos membros.
74 Esse fenômeno de procura de autoafirmação da identidade do paranaense como um povo trabalhador passa a existir a partir do incentivo do movimento paranista em construir o “ser paranaense”. Essa proposta se coloca numa tentativa de manifestação do desejo de algumas elites. Segundo Andrea Giménez: “Com a representação do 'paranista', buscavase criar uma identidade universalizante para esse paranaense multifacetado culturalmente, impondo a crença no Paraná e construindo um código de comportamento relacionado à construção do desenvolvimento do Estado. Construíase um modelo de paranaense a partir da identidade “paranista”: “trabalhador”, “empreendedor”, “ordeiro”, orgulhoso de seu estado, que, não sendo nativo, se integrava nos “usos e costumes e nas tradições da gente paranaense”. Percebese que se buscava estabelecer um instrumento discursivo de manutenção e de legitimação do status simbólico das elites tradicionais do Estado, assim como de suas relações de poder” (GIMÉNEZ, 2008, P. 4). Além disso, essa autoafirmação se concretizaria em outra oportunidades, inclusive na gestão do governador Paulo Pimentel, de 1965 a 1970, quando seu governo de cunho desenvolvimentista tinha como lema: “Paraná – Aqui se trabalha”.
77
Um trabalhador convencido de sua força e de uma missão a ele colocada – sendo
essa pautada no progresso e no desenvolvimento – estaria facilmente domesticado a
contribuir com a mãodeobra.
Como produtor de um discurso próprio, o operário político não poderia ser considerado
produtor de tal conveniência ao corpo social. Estaria em desacordo com o restante desse
corpo. Esse não se locomoveria, seria como uma máquina com um defeito, não se
tornaria eficiente ao momento que a mãodeobra e os usos dela não seriam legitimados e
que um de seus membros não estaria convencido de suas funções.
Portanto, o desvencilhamento da imagem de um movimento operário político e o
sentido positivo que acaba sendo colocado à situação de um membro do corpo social
acaba, na realidade, proporcionando esse sintoma de conveniência a toda sociedade.
Isso aparece citado até mesmo no sentido físico (“braço forte”) numa das atas (C.O.C.B.
Ata 01). Registrase, o enquadramento75 da imagem do operário forte e interessado
apenas em construir o progresso da nação mesmo perante seus sacrifícios.
Essa conveniência resulta no mantenimento de ordens vigentes, dos mesmos grupos
no poder político e dos interesses sendo concentrados nas mãos desses mesmos grupos.
A participação de gerentes de fábrica, intelectuais, empresários e políticos e outros
membros da sociedade civil, aparece como um fator que procura sugerir o consenso entre
as classes sociais na produção do discurso das atas – deixando transparecer a prática
dessa conveniência.
‘’Assim definida, a coletividade é um lugar social que induz um comportamento
prático mediante o qual o usuário se ajusta ao processo geral do reconhecimento,
concedendo uma parte de si mesmo à jurisdição do outro’’76 (MAYOL, 1996, p. 27).
Nesse sentido, a conveniência aqui citada é percebida em práticas consensuais,
75 Um fato que não pode indicar com veracidade, mas que podemos indicar com suspeita pode ser um certo elitismo na produção das atas do Centro Operário. Tal constatação se proporciona na possibilidade de a maioria dos trabalhadores naquelas reuniões serem analfabetos, fenômeno esse nem sempre constatado na maioria dos trabalhos sobre organização operária. Nesse caso, os membros do Centro Operário que escreviam as atas, no caso, Affonso Braune e Max Vosgrau, pela intensidade do discurso ali apresentado podem inclusive terem sido intelectuais.76 Ainda segundo Mayol, os indivíduos: “se encarregam de promulgar as 'regras' do uso social, enquanto o social é o espaço do outro, o ponto médio da posição da pessoa enquanto ser público. A conveniência é o gerenciamento simbólico da face pública de cada um de nós desde que nos achamos na rua. A conveniência é simultaneamente o modo pelo qual se é percebido e o meio obrigatório de se permanecer submisso a ela: no fundo ela exige que se evite toda dissonância no jogo de comportamentos, e toda ruptura qualitativa na percepção do meio social” (Op. Cit. p. 47).
78
sendo essas sim, colocadas aos olhares e à jurisdição do outro. Em um espaço onde era
previsto que a política geraria polêmica, se torna passivo de entender como as práticas
recreativas e beneficentes se enquadrariam no interior do cotidiano operário pela
influência da participação dos patrões nesse. No diaadia regido por olhares do outro,
não se tornava interessante qualquer tipo de excentricidade, mesmo que política.
2.6 Considerações Finais sobre a pesquisa – O outro 1o. De Maio, Aniversário do
Centro Operário Cívico e Beneficente.
Procurei nesse trabalho analisar a experiência dos trabalhadores princesinos a partir
de sua principal entidade durante a sua primeira gestão, o Centro Operário Cívico e
Beneficente entre 1929 e 1930. Além do discurso de censura a assuntos políticos ser
justificado em estatutos e outros documentos, pude perceber a incidência de divergências
e conflitos em torno das pautas abordadas pelos membros da entidade.
Analisando a freqüência de palavras e como elas se posicionam no texto, uma análise
quantitativa e qualitativa irrompeu a mesa do pesquisador. A exemplo disso, diversos
comparativos foram feitos ao modelo como aquele discurso se adaptava à composição
das atas. Um dos casos foi bem específico e exigiu de minha observação.
A ata da reunião que tratou de uma disputa de futebol chamada Taça Operaria possui
apenas 3 páginas (C.O.C.B. Ata 13), enquanto a discussão do telegrama que percorreu
duas assembléias possui cerca de 19 páginas. Do conflito, surgiram as principais
discussões no interior do Centro Operário, mesmo com essas sendo omitidas, enquanto
os assuntos cotidianos da entidade aparecem tratados consensualmente77.
Uma diversidade de posturas se colocou entre as práticas previstas pelo Centro
Operário e ações consideradas nocivas aos interesses da classe operária, a sua união e a
ordem com que deveriam ser conduzidos os trabalhos assistenciais.
A História cedeu ao encontro de métodos aplicados principalmente por intelectuais de
outras áreas. Além de romper as fronteiras disciplinares da produção científica, uma
literatura aqui poderá produzir representações da memória e até reescrever parte da
77 No mais, a análise da freqüência de palavras e o uso delas para entender o discurso podem ser percebidas nos anexos. Nessa parte da pesquisa acabei desvendando a monografia por achar interessante que demais pesquisadores percebam a forma como a Análise de Conteúdo pode ser usada por historiadores e demais cientistas.
79
História Regional – antes de uma ambição em seus objetivos, esse projeto, ao se deparar
com tais fenômenos, parece ter se transformado em uma mera oportunidade.
Mas antes de mais nada, registro aqui que minha intenção foi escrever uma História a
partir da voz dos próprios trabalhadores. Todavia, nos bares, nos trilhos, nos asilos,
nenhum dos meus personagens foi encontrado vivo para relatar o que viu e viveu. Meu
posicionamento portanto foi extrair do documento as informações que ele dispunha, a
fidelidade a um papel escrito significou a fidelidade a essa História.
A construção e a representação da imagem de um operário cívico e beneficente,
proliferando o subtítulo da entidade. Essa atitude, fazendo jus aos interesses de alguns
associados se referiu a uma alternativa de ação ao homo politicus. Ainda assim, as atas
contradizem essa construção de imagem de forma homogênea. No caso, reproduzem 31
discussões políticas enquanto em outras oportunidade reproduzem 33 discussões de
assuntos cotidianos (ANEXO 3.3). Se esse esquadrinhamento do operário se tornava
presente no discurso, por outro lado, as discussões políticas apareciam como uma
tentativa de remodelar essa imagem construída. Ou seja, o discurso que impregnou e que
se materializou na tinta das atas foi recebido com um processo de resistência – o caso de
Affonso Braune registra esse processo mesmo dentro do ambiente da fábrica.
A cada linha do texto não se apresentou nenhuma resposta determinante a História.
Colocase aqui uma modalidade de finalização da pesquisa. Onde apresento minhas
considerações finais, procuro concluir o trabalho, e também relatar a ata que reafirma
todos os fenômenos percebidos no decorrer do primeiro ano do Centro Operário.
Sessão Solenne, Primeiro Aniversário do Centro Operário Cívico e Beneficente e
eleição da sua Segunda Diretoria, 01o. De Maio de 1930: Seguindo os indicativos que as
fontes disponibilizam, algumas conclusões podem ser tomadas, todavia, o trabalho possui
por finalidade colocar aqui uma série de questionamentos encima do objeto. Todos esses
questionamentos, resultantes do esforço que a pesquisa delimitou, foram parcialmente
aqui apresentados apareceram para mim recolados a partir da análise da Ata No. 24 da
associação – designada a relatar a Sessão Solene do 1o. Aniversário do Centro Operário
Cívico e Beneficente e a posse da sua 2a. Diretoria78.
Com tal tonalidade, a última tarefa da primeira diretoria daqueles “Homens do
78 O texto integral dessa ata encontrase no ANEXO 3.5.
80
Trabalho”, ou seja, o descerramento de sua gestão e a transferência dos poderes da
associação operária a segunda diretoria, é usado nas linhas dessa monografia para
sintetizar os fenômenos ocorridos dentro da entidade.
A construção do discurso no interior do texto dessa ata não transige em relação ao
teor das outras. Sua delimitação também foi específica ao simular a realidade à sua
maneria, refletindo a representação do operário a partir dos olhos de quem os observou.
O punho do secretário, nesse sentido, argumentava o reflexo que a associação possuía
sobre o ser operário, ou pelo menos parte dela, possuía.
Seguiselhe com a palavra o Sr. Walfrido R. De Almeida Presidente recem empossado que agradecendo a indicação do seu nome verbejou a necessidade incondicional do apoio de todos os componentes do Centro, para assim, unidos e fortes, chegarmos ao alvo que tanto almejamos (C.O.C.B, Ata No. 24).
Esse recorte descreve a fala do recém empossado presidente e reafirma a
necessidade de união e força dos operários. Algo, aliás, reafirmado em uma parte
considerável das solenidades do Centro Operário. O que se torna importante é perceber o
caráter que a repetição produz ao conjunto do discurso da entidade em um ano.
União e força, “a União faz a força” rememora o lema da Revista Operária, publicação
operária que procurava demonstrar a necessidade de organização dos trabalhadores. A
fundação de uma nova entidade que representasse a voz dos trabalhadores se
apresentava como uma necessidade nas palavras dos intelectuais que produziram aquela
publicação. Um discurso quando aparece afirmando uma necessidade, se instaura em
oportunidades onde tal necessidade não se aplicava à prática social da entidade que o
representa.
Permitome a repetir em mais uma oportunidade as palavras do jornalista Hugo dos
Reis, modeladas na Revista publicada pelos mesmos fundadores do Centro: “Se o
operariado pontagrossense quiser alcançar algum progresso na vida social, é mister que
se uma, porque governo algum dará ouvidos a uma classe que não tem organização’’
(Revista Operária, op. Cit.).
Então os pressupostos dessa reafirmação nos permitem, 80 anos depois, um
questionamento. A repetição da necessidade de união não indicaria os operários ainda
não estavam unidos e organizados em torno de suas reivindicações? Isso negaria a
81
afirmação de outros membros que pronunciavam em reuniões e assembléias da
associação operária que o operariado pontagrossense era unido.
Sobretudo, a leitura do produto final da pesquisa deve ser passiva do entendimento da
minha subjetividade sobre o objeto e da compreensão da metodologia proposta adaptada
aos usos do trabalho. O meu encontro com tais ferramentas produziu o produto aqui
apresentado. Portanto, após o caso do telegrama, após a perseguição de membros
politizados, um outro caso chama a atenção nessa ata.
Disponhome ainda a apresentar mais uma ocorrência que desmistifica tal união, pelo
menos total, daquele conjunto de operários. Demonstrando que em torno de alguns
eventos, nem todos estavam dispostos a participar
O presidente leu o relatorio referente ao anno da sua gestão e bem assim um pequeno relatorio a thesouraria; chamou os novos directores eleitos foram formando posse com excepção do Sr. João Ferigotti eleito presidente honorário que resignou no momento de empossarse. Dada a palavra ao Sr. Adejamiro Cardon orador official da Directoria que deixava o mandato, essê referiuse sobre o progresso da Sociedade e desculpouse para com a assistencia e renuncia do Sr. João Ferigotti do cargo para o qual fôra eleito (op. Cit.).
Percebese que o motivo não fora especificado nem relatado. Entretanto, anos após
esse caso, João Ferigotti também aparece em outro evento procedente a esse onde foi
expulso do Centro e logo após preso. Algo já relatado por demais pesquisadores e que
mostra o rechaçamento da tradição política pelo Centro Operário:
Um exemplo disso ocorreu em julho de 1932, quando alguns pontagrossenses
foram presos e mandados a Curitiba, acusados de subversão. Entre os presos
estavam o professor Erasmo Pilotto, o barbeiro Oscar Lima e João Ferigotti (…).
Logo após a prisão, o Diário dos Campos saiu em defesa do Centro, escrevendo
um artigo denominado “O Centro Operário Cívico e Beneficente está dentro da lei,
da ordem e do bom senso”, no qual ressaltava que a atuação do Centro estava
exclusivamente voltada para as ações assistencialistas (CHAVES, 2006, p. 82).
Não cabe aqui colocar convicções próprias e afirmar com veemência o que foi que
realmente aconteceu em 1929, mas a ausência de João Ferigotti79, eleito presidente
79 Segundo o Dicionário Histórico e Geográfico dos Campos Gerais, Fergotti “nasceu em Castro no dia 20 de março de 1888, filho de Nicolau Ferigotti e Augusta Müller Ferigotti. Quando da construção da Catedral princesina, sua família transferiuse para Ponta Grossa, pois seu pai foi o arquiteto responsável pela mesma
82
honorário do Centro Operário, pode ter motivos muito próximos dos apresentados acima
pelo próprio jornal Diário dos Campos – ou seja, pensando em possibilidade, um dos
principais fundadores da entidade poderia não estar totalmente de acordo com tais
eventos ou com as finalidades assistenciais proporcionadas a ela. O jornal ainda afirmava
que uma parcela reduzida de sócios possuía crenças políticas, mas que isso não era
motivo para atacar o Centro Operário.
A entidade preparou uma cerimônia cercada de diversos convidados que
ocupavam a mesa principal da recémfundada sede do Centro Operário – localizada no
Largo Professor Colares. Logo após passeata pela cidade, os membros da entidade foram
recebidos ao som da Banda Lyra dos Campos e perante a bandeira nacional flamulando
logo após ser hasteada no mastro da sede.
O impacto daquele momento parece tentar ser descrito pela ata em questão. A
solenidade foi aberta por Leonor Braga, Rainha dos Operários. De seu pronunciamento
nada foi relatado nas atas, provavelmente o secretário não observou importância na sua
fala – ao contrário do que aparece perante os demais oradores da cerimônia, sendo que
esses eram homens.
Perante 143 presentes na cerimônia “de todas as classes sociaes” e perante
ocupantes de lugares distintos como “S. M. Anna Varigt Rainha do Commercio, Sta. Lucia
Dechandt, O Sr. Capitão representante do 13o. R. De Infantaria, O Sr. Alberto Lopes, (…)
e outras pessoas fradas”, discursaram Adejamiro Cardon; Walfrido R. De Almeida,
presidente recémeleito; Manoel de Oliveira, eleito ao Conselho Fiscal; José Deslandes de
Souza, presidente que entregava o cargo após ganhar apenas 10 votos favoráveis à sua
reeleição contra 121 de Almeida (C.O.C.B, Ata 22); e representantes de demais
associações.
Sua última ação como presidente apenas foi descrita como um “longo discurso”,
isso após receber sua fotografia publicada na sede do Centro. Enquanto que a fala de
Oliveira se pautou na defesa daquele “programma social” até ali desenvolvido, ou seja,
aparentemente, colocando as atividades do Centro Operário em torno dos espectadores
nossa cidade foi fundador e presidentehonorário do Centro Operário cívico Beneficente e sóciofundador da Sociedade Beneficente Germânia, hoje Clube Princesa dos Campos. Além disso contribuiu enormemente com Jacob Holzmann quando da Fundação do Jornal "O Progresso". Também era músico e foi um dos componentes da Banda Lyra dos Campos. Após a morte de seu pai primeiro administrador de Cemitério São José substituiuo nesta função até a sua própria morte” (UEPG, 2009).
83
daquele momento – no caso, além dos próprios operários, suas famílias que receberiam
as finalidades da assistência da entidade.
A reprodução desse discurso além de significar a função social do Centro Operário,
colocava o operário em torno da beneficência e dos desfrutes do seu lazer. Nenhuma
atitude daqueles homens e mulheres fora discriminada nas atas, a não ser suas ações
políticas. A imagem construída daquele ser operário estava desde a fachada do Centro
até suas finalidades, seja ele cívico e beneficente.
A bandeira que flamulava naquele prédio poderia simbolizar algo além do sentimento.
Arriscase pronunciar aquele como um símbolo de poder reproduzido nas insígnias dos
militares presentes no evento da entidade operária. O apaziguamento ali de nada
lembrava algo parecido com o conflito das ruas, localizado nas greves, entre o movimento
operário e o exército – recordando que Ferigotti não se dignou a presenciar aquele
evento.
FIGURA 11 Sede do Centro Operário Cívico e Beneficente (PREFEITURA, 1936).
Aquele 1o. De Maio não era o dia do trabalhador politizado como em outros
momentos. Aquele 1o. De Maio reafirmava a salvação dos operários pelo discurso
assistencialista, pela imposição do patriotismo, por um outro papel da mulher, pela
procura do respeito perante as outras entidades operárias e clubes locais.
84
Uma modalidade de organização operária ali se apresentava, colocava os
trabalhadores em concordância a um papel social determinado. Sendo que em algumas
cerimônias estavam presentes os representantes do poder instituído política e
economicamente.
Os sintomas de desunião em torno de assuntos políticos parecem ter produzido a
fisionomia de uma classe desorganizada politicamente. Mesmo que a organização, nem
sempre tenha de ser a finalidade da classe operária isso deve ser diagnosticado aqui. Nas
relações de poder, isso não só pôde desfavorecer as reivindicações políticas de uma
classe, como pode favorecer os interesses de outras classes. E como indicado, membros
dessas outras classes estavam presentes na fundação do Centro Operário como também
em solenidades de alcance social e não apenas classista.
A união dos trabalhadores, aliás, se apresentava no discurso muito mais direcionada a
práticas como o futebol do que em eventos que entornavam a política. Foi dessa forma
que as atas descreveram os trabalhadores, seu relacionamento numa entidade, eles se
viam como classe, em seus valores construíam uma concepção de “verdade” moral.
Essa diferenciação ainda permitia patrões e operários conviverem no mesmo ambiente
e decidirem o que seria a classe operária. Joaquim Wirruez, mesmo sendo gerente da
madereira e exportadora Sonyra, convivia no Centro Operário aceitando essas práticas.
Inclusive aparece como ocupante do cargo de portavoz dos funcionários da empresa que
parcialmente possuía mais membros na associação (ver ANEXO 3.1.).
Fica perceptível a participação de uma ascendente classe pequenoburguesa e de
membros do poder político instituído nessa entidade. Política, aliás, somente não
permitida aos trabalhadores. Esses se organizavam para apoiar a candidatura de um
semelhante ao cargo deputado somente a “portas fechadas”. A negação do operário
político serviu também para entender as suas finalidades assistenciais e mutuais. Obras
sociais naquele contexto político significavam uma forma de barrar o avanço do
comunismo enquanto política.
85
FIGURA 12 – Palanque montado na chegada de Vargas a Ponta Grossa (1930).
FONTE: Casa da Memória Paraná
FIGURA 13 – A população pontagrossense no momento do discurso de Vargas (1930).
FONTE – Casa da Memória Paraná
86
Um fenômeno parecido em outras entidades operárias pelo Brasil já foi muito
apresentado por diversos pesquisadores e não vem ao caso retornar essa discussão aos
leitores nesse momento. O silêncio aos membros políticos do corpo operário, da classe
operária princesina no interior do Centro Operário, como um todo, significou algo além de
uma mera despolitização – e nem acredito que esse termo se aplique a realidade , mas
uma busca de apoio aos símbolos nacionais, aos círculos familiares e ao exercício da
mãodeobra.
A aceitação daquele homem, do mito, trajado de militar, abraçado ao verde e amarelo
da bandeira nacional, respaldado por toda simbologia de um país. Fora ele apoiado por
Ponta Grossa em sua travessia sobre o desenvolvimentismo dos trilhos... A vitória de
Getúlio Vargas foi anunciada no instante em que ele aqui se encontrava. A Capital Cívica
do Paraná, proclamada pelo próprio Vargas devido a sua vitória na Revolução de 193080.
Isso não são novas aqui contadas para apenas distrair ou espantar o público.
Somente posso demonstrar que esse espetáculo poderia estar sendo preparado. O
Centro Operário Cívico e Beneficente mostrou em suas atas e em seu nome que a
ambição e busca de parte da cidade por esse título de civismo não era nenhuma novidade
em 03 de Outubro de 1930. Até os dias atuais existe um busto de Vargas nas
dependências da sua atual sede.
Esse corpo, uma classe representada no papel, parecia elaborado para outros
acontecimentos procedentes que por delimitação do recorte temporal não puderam ser
objeto dessa pesquisa. Não coloco isso como uma falha, demais questionamentos podem
ser colocados, o Centro Operário pode ser objeto de demais pesquisas daqui para frente,
por demais pesquisadores.
A esperança é de que a minha conclusão no curso de História contribua para a
produção do conhecimento e, sobretudo, para a sociedade que pode me manter nessa
instituição chamada Universidade. Entretanto, essa só pode se tornar realidade com o
empenho das gerações futuras de historiadores que eu vejo por esses corredores.
80 Hardman e Leonardi consideram que ‘’temse aberto a brecha para a aceitação da análise que alçou o governo Vargas como ‘progressista’, o direito trabalhista como ascensão vinda de cima e os sindicatos construídos pelo Estado burguês como organismos do movimento operário’’ (HARDMAN; LEONARDI. Op. Cit. P. 172).
87
3. ANEXOS
3.1 Plataforma: Trabalhadores por suas devidas categorias de trabalho e suas
ocupações.
[continua]
Livro de MensalidadesTrabalhadores – Categoria Qtde.AutônomosCaroceiro 1Encanador 1Enxadeiro 1Jardineiro 1
Artesanato/CarpintariaMarmorista 1
Bebidas, Gasosas e CervejasCervejaria Adri ática 13
Beneficiamento de Carne, A çouguesAçougue Fanuchi 2Cortume Hatchbach 2Fábrica de Banha 1Frigor ífico 9Matadouro 1Sellaria Enidia 2
Beneficiamento de Erva MateEngenho de Erva 1Ervateira 5
Com ércioCasa Alberto Ansbach 1Casa B. Alves 1C. F. Faintink 5Casa Inthon 4Casa Irm ãos Ditzel 13Casa Jacob 1Casa J. Bach Cia. 1Casa Justus 1Casa Osternak 3Casa Pontagrossense 1Casa Progresso 2Casa Roni 1Livraria Modelo 5
Costura, Ind ústria T êxtilMalharia 1Singer 3
Defesa Militar, Ex ércitoTenente 1
Entretenimento e LazerBar 1Cine Teatro Éden 2
Explosivos e Fogos de Artif ícioFábrica de Fogos 8
FerroviaArmaz ém 4Bilheteria 1Estrada 15Hospital 3Telegrapho 1
88
3.1 Plataforma: Trabalhadores por suas devidas categorias de trabalho e suas
ocupações.
[continuando]
*Entre os 1148 trabalhadores registrados no Centro Operário, apenas 336 colocaram suas devidas
funções.
Funer áriaFuner ária 3
HotelariaHotel Martins 1
ImprensaDi ário dos Campos 1Gazeta do Povo 1Tipographia Modello 1
Lavanderia e TinturariaTinturaria 3
Madeireiras, SerrariasCarpintaria Bodenbach 1Madeireira Exportadora Sonyra 56Off. Marcenaria Plonka 7Serraria Cruzeiro 23Serraria Lurdes 7Serraria Ollinda 17
Mec ânicas e Revendedoras de Autom óveisAg ência FORD 10Officina Chevrolet 14Officina Mechanica 2
Moinhos e Beneficiamento de FarinhaF. Farinha 11Moinho S. Jo ão 2
Oficinas e Metal úrgicasFerraria Pedro Souza 1Fundi ção Perli 2Funilaria S. Mattos 1Off. Cunha 3Off. Jo ão Holzman 1Off. Pontagrossense 4Off. Z é Miara 1
OlariasOlaria Moro 2
Poder Judici árioFórum 3
PrefeituraEscrit ório 3Fiscal 1Trafego 1
Usina, Fia ção, EletricidadeCia. Prada 5Uzina Pitangui 3
Zona RuralCol. Moema 1Fazenda Modelo 3
Outras/Categoria n ão identificadaA. Nacional 1Carvalho Oliveira 1Fca. Antunes 1Fca. Christ Justus 1Fab. Cometa 1Fab. Chuchene 1Fab. Lili 1F. Royal 2F. S. Jos é 4F. Princeza 3Fab. Ribas 4Irm ãos Barretos 1
Total90 336*
89
3.2 Gráfico: Trabalhadores por suas devidas categorias de trabalho e suas
ocupações.
Trabalhadores – Categoria
Enxadeiro
Marmorista
Fábrica de Banha
C. F. Faintink
Casa J. Bach Cia.
Casa Progresso
Costura, Indústria Têxtil
Defesa Militar, Exército
Bar
Fábrica de Fogos
Bilheteria
Hotelaria
Diário dos Campos
Lavanderia e Tinturaria
Carpintaria Bodenbach
Serraria Lurdes
Agência FORD
Moinhos e Beneficiamento de Farinha
Oficinas e Metalúrgicas
Off. Cunha
Poder Judiciário
Escritório
Usina, Fiação, Eletricidade
Zona Rural
Outras/Categoria não identificada
Fca. Christ Justus
F. Royal
Irmãos Barretos
0 10 20 30 40 50 60
Trabalhadores
Est
abel
ecim
ento
90
3.3 TABELAS: Plataformas usadas para Análise de Conteúdo.
3.3.1 Núcleo de Sentido: Política.
3.3.2 Núcleo de Sentido: Beneficência
Núc l e o d e S e n t i d oA t a D a t a S e s são Pág i n a s P a l a v r a 1 P a l a v r a 2 P a l a v r a 3P a l a v r a 4A u t o rB E N E F I CÊN C I A N o . 0 2 0 1 o . D e M a i o d e 1 9 2 9S o l e n e – F u n d aç ão 4 ' b e m e s t a r ' ' ' c l a s s e o p e r a r i a l o c a l ' '' m o r a l ' ' 'm a t e r i a l m e n t eA f f o n s o B r a u n e – 1 o . S e c r e tár i o
N o . 0 4 1 6 d e J u n h o d e 1 9 2 9A s s e m b léi a 2 ' E s c o l a O p e rár i a ' ' ' v a n t a g e n s ' ' P r o f e s s o r R o b e r t o M o n g r u e lN o . 0 5 2 3 d e J u n h o d e 1 9 2 9A s s e m b léi a – 3 a . C h a m a d a4 ' ' p e c u l i o ' ' ' sóc i o s m u t u a i s ' 'N o . 0 9 1 2 d e A g o s t o d e 1 9 2 9A s s e m b léi a 1 ' E s c o l a ' ' ' i n a u g u r aç ão ' ' J o sé D e s l a n d e s d e S o u z a – P r e s i d e n t eN o . 1 3 2 4 d e N o v e m b r o d e 1 9 2 9E x t r a o r d i nár i a 2 ' ' b e n i f i c e n c i a ' ' 1 9 3 0 Máx i m o L e o p o l d o A r r u e z – 2 o . O r a d o r
' ' C o m i s são d e B e n e f i c e n c i a ' 'N o . 1 6 2 0 d e D e z e m b r o d e 1 9 2 9R e u n ião 2 ' méd i c o ' ' ' ' p h a r m a c i a ' ' J o sé D e s l a n d e s d e S o u z a – P r e s i d e n t eN o . 1 7 0 1 o . D e J a n e i r o d e 1 9 2 9S o l e n e – A s s e m b léi a 3 ' ' b e n i f i c e n c i a ' ' ' ' i n s t a l l a d a ' ' ' u n i d o ' ' ' f o r t e ' ' J o sé D e s l a n d e s d e S o u z a – P r e s i d e n t e
' E s c o l a ' ' A d e j a m i r o C a r d o n – 1 o . O r a d o rN o . 2 0 2 1 d e f e v e r e i r o d e 1 9 2 9E x t r a o r d i nár i a 2 ' ' P o l i c l i n i c a ' ' A n t o n i o B a c i t a – D i r e t o r d a P o l i c l i n i c a P o n t a g r o s s e n s e
' a u m e n t o ' ' ' n o b r e f a c u l t a t i v o ' 'J o sé D e s l a n d e s d e S o u z a – P r e s i d e n t e' D r . C a r l o s R i b e i r o d e M a c e d o
Núcleo de Sentido Ata Data Sessão Páginas Palavra 1 Palavra 2 Palavra 3 Palavra 4 AutorPOLÍTICA No. 02 01o. De Maio de 1929 Solene – Fundação 4 ''comum accordo'' 'Estado'' ''Paiz'' Affonso Braune – 1o. Secretário
'Prefeito''No. 05 23 de Junho de 1929 Assembléia – 3a. Chamada 4 'alistamento'' 'deveres cívicos'' 'eleições'' 'Artigo 72'' Adejamiro Cardon – 1o. Orador
No, 10 18 de Agosto de 1929 Assembléia – 2a. Chamada 4 ''Walfrido Pilotto'' ''academico'' ''socio benemerito'' 'relevantes serviços''
'maioria'' 'política'' 'explicação'' ''Colluna Operaria'' João Perantunes – Vicepresidente do Conselho Fiscal'telegrama'' ''assumptos politicos'' 'bom nome'' João Perantunes – Vicepresidente do Conselho Fiscal
No. 11 25 de Agosto de 1929 Assembléia – 3a. Chamada 15 'telegrama'' ''Julio Prestes'' 'candidatura'''telegrama'' 'classe obreira'' ''Elizeu Campos Mello'' 'nome honroso'' José Deslandes de Souza – Presidentetelegrama'' ''Julio Prestes'' 'Presidente'' 'grande trabalhador'' Adejamiro Cardon – 1o. Oradortelegrama'' 'renúncia'' José Deslandes de Souza – Presidentechave do ouro' sede' 'Prefeitura''
No. 11 (?) 25 de Setembro de 1929 Extraordinária 5 'deputado'' 'Congresso'' 'operário batalhador'' ''Elbe Pospissil'' José Deslandes de Souza – Presidente''Walfrido Pilotto'' 'sócio benemérito'' 'conclusão'' 'agradecimento'''votação'' 'censura'' 'união'' 'deveres cívicos'' João Shmidt Filho
No. 12 24 de Outubro de 1929 Extraordinária 3 votação'' 'cédulas'' 'interesses de classe'' ''Elbe Pospissil'' José Deslandes de Souza – Presidente'ofício'' ''Affonso Camargo'' José Deslandes de Souza – Presidente
No. 15 05 de Dezembro de 1929 Reunião 1 ''Walfrido Pilotto'' 'delegado especial'' 'tese'' Máximo Leopoldo Arruez – 2o. OradorNo. 16 20 de Dezembro de 1929 Reunião 2 'agradecimento'' Major Bernardo'' 'Augusto Cunha'' João Ferigotti – 1o. TesoureiroNo. 17 01o. De Janeiro de 1939 Solene 3 Prefeito'' Rainha dos Operários'' ''Elizeu Campos Mello'' 'famílias''
'sociedades congêneres'' 'solidariedade'' 'prosperidade''No. 18 14 de Janeiro de 1930 Extraordinária 'eliminação'' ''Affonso Braune'' ''ideias politicas'' Artigo 72'' Joaquim Wirruez – Gerente da SonyraNo. 19 21 de Janeiro de 1930 Extraordinária 2 ''Walfrido Pilotto'' delegado'' 'convenção''
eliminação'' ''Affonso Braune'' motivos conhecido'' Artigo 72''No. 22 06 de Abril de 1930 Assembléia 7 'desacato'' 'José Deslandes de Souza'' ''Adejamiro Cardon'' 'confusão'' João Shmidt FilhoNo. 23 11 de Abril de 1930 Reunião 4 ''conferencista operario'' 'Juvenal Santos'' 'Conferência'' 'patrocínio''No. 24 01o. De Maio de 1930 Solene – Aniversário 3 'posse'' 'Rainha dos Operários'' ''Rainha do Commercio'' 13o. R. De Infantaria''
resignação' renúncia'' João Ferigotti' Presidente Honorário'' Adejamiro Cardon – 1o. Oradoroperários'' 'unidos e fortes'' ''programma social'''Sociedades operárias'' 'saudações de estilo''
91
3.3.3 Núcleo de Sentido: Lazer
3.3.4 Tabela 4. Núcleo de Sentido: Manutenção/Cotidiano
Núc l e o d e S e n t i d o A t a D a t a S e s são Pág i n a s P a l a v r a 1 P a l a v r a 2 P a l a v r a 3 P a l a v r a 4 A u t o rL A Z E R N o . 0 2 1 o . d e M a i o d e 1 9 2 9S o l e n e – F u n d aç ão 4 'f e s t a '' 'h o m e n s d o t r a b a lh o '''1 o . D e M a i o ' ' E l i z e u d e C a m p o s M e l l o – P r e f e i t o
N o . 0 3 0 2 d e J u n h o d e 1 9 2 9A s s e m b léi a 2 'd o aç ão '' '5 0 v o l u m e s ''N o . 1 2 2 4 d e O u t u b r o d e 1 9 2 9E x t r a o r d i nár i a 3 'A s s o c i aç ão H o m e n s d o T r a b a l h o ' ''h o n r a '' 's o b e r a n ia '' J o sé D e s l a n d e s d e S o u z a P r e s i d e n t eN o . 1 3 2 4 d e N o v e m b r o d e 1 9 2 9E x t r a o r d i nár i a 2 'T aça O p e r a r i a ' ' '' f u t e b o l l ' ' ' 'c l u b e s s o c i a e s '''c a i x a d o C e n t r o ''J o sé D e s l a n d e s d e S o u z a – P r e s i d e n t e
's e s são cív i c a ' ' J o sé D e s l a n d e s d e S o u z a – P r e s i d e n t eN o . 1 6 2 0 d e D e z e m b r o d e 1 9 2 9R e u n ião 2 'T aça O p e r a r i a ' ' 'n o m e aç ão '' J o sé D e s l a n d e s d e S o u z a – P r e s i d e n t eN o . 1 7 0 1 o . D e J a n e i r o d e 1 9 3 0S o l e n e – A s s e m b léi a 3 'f a míl i a s ' 'N o . 1 9 2 1 d e J a n e i r o d e 1 9 3 0E x t r a o r d i nár i a 2 'l i v r o s ''
N o . 2 3 1 1 d e A b r i l d e 1 9 3 0R e u n ião 4 'f e s t e j o s c o m m e m o r a t i v o s '''D i a d o T r a b a l h o '''1 o . D e M a i o ' ' J oão F e r i g o t t i – 1 o . T e s o u r e i r o
N o . 2 4 0 1 o . D e M a io d e 1 9 3 0S o l e n e – A n i v e r sár i o 3 a n i v e r sár i o ' 'p o s s e '' '1 o . d e M a i o ''
Núcleo de S entido Ata Data Sessão Páginas Palavra 1 Palavra 2 Palavra 3 P alavra 4 AutorMA NUTENÇÃO (s em núm ero) 12 de M aio de 1929 Reunião Com issão do E s tatuto 2 'E s tatuto ''
No. 05 23 de Junho de 1929 Assembléia 4 'E s tatuto '' 'aprovação''condições financeiras '' 'óptimas '' João Ferigotti – 1o. Tesoureiro
No. 06 04 de Julho de 1929 Reunião 1 ''c omissão de sindicanc ia''No. 07 21 de Julho de 1929 Ex traordinária 2 'S ecretário'' 'Substituição''No. 08 24 de Julho de 1929 Reunião 2 ''illum inação'' 'Clube Paranaens e''No. 11 25 de Agosto de 1929Assembléia 3a. Convoc ação 15'S ubs tituição'' 'Conselho F iscal'' 'bom nom e'' José Des landes de Souza – P residente
'desres peito '' 'lei social'' 'es tatuto'' 'm archa v itoriosa''José Des landes de Souza – P residenteLivro de Ouro'' José Des landes de Souza – P residente
No. 11 (12) 25 de Setembro de 1929Ex traordinária 5 'm embros faltando'' A lbino Wiechetec k – Pres idente do Conselho Fiscal''E s tatutos soc iaes'' 'cópias'' 'Com is são de Rev isão'' José Des landes de Souza – P residente'reuniões '' Clube Paranaense''
No. 13 24 de Novem bro de 1929Ex traordinária 2 'bom andamento'' João Ferigotti – 1o. Tesoureiro'S ubs tituição'' João Ferigotti – 1o. Tesoureiro
No. 14 28 de Novem bro de 1929Ex traordinária 4 Subs tituição'' A lbino Wiechetec k – Pres idente do Conselho Fiscal''Ford'' 'rifa '' José Des landes de Souza – P residente'm ensalidades '' 'ofíc io'' Máx im o Leopoldo A rruez – 2o. OradorSubs tituição''
No. 15 05 de Dezem bro de 1929Reunião 1 'Conselho Fiscal'' A lbino Wiechetec k – Pres idente do Conselho Fiscalm ensalidades'' 'talões de cobrança'' João Ferigotti – 1o. Tesoureiro
No. 16 20 de Dezem bro de 1929Reunião 2 'Regulam ento interno''''photografia'' 'pres idente'' Adejam iro Cardon – 1o. O rador
No. 17 01o. De Janeiro de 1930Solene – A ssembléia 3 'condições f inanceiras'' 'chave de ouro'' João Ferigotti – 1o. Tesoureirom ensalidades'' 'sus pensão da beneficência'' José Des landes de Souza – P residente
No. 18 14 de Janeiro de 1930Ex traordinária 'm ensalidades '' ''Sonyra'' Joaquim Wirruez – Gerenta da S erraria SonyraNo. 19 21 de Janeiro de 1930Ex traordinária 2 'propos ta'' Joaquim Wirruez – Gerenta da S erraria Sonyra
'elim inação'' João Shmidt Filho e Dário CardonNo. 21 16 de M arço de 1930 Assembléia Extraordinária 1 'es tatuto'' ''nov a directoria'' 'eleições '' José Des landes de Souza – P residenteNo. 22 06 de Abril de 1930 Assembléia 7 'es tatuto'' 'ordem '' 'votaç ão'' 'tesouraria''No. 23 11 de Abril de 1930 Reunião 4 'pagam ento'' 'médico'' ''S am uel S tark '
'gesto elogios o'' 'donativo'' ''S am uel S tark ' ''bella acção'' Sam uel S tarkNo. 24 01o. De Maio de 1930Solene – A niversário 3 'posse'' ''nov a directoria'' 'relatorio'' tesouraria '' José Des landes de Souza – P residente
92
3.4 Fotografias
FIGURA 14 – Capa do Livro de Inscrição de Sócios
FIGURA 15 – Relação de associados no Livro de Mensalidades
93
FIGURA 16 – Assinatura do presidente José Deslandes de Sousa no carimbo do C.O.C.B
FIGURA 17 – Antiga sede do Centro Operário
94
FIGURA 18 – Símbolo do Centro Operário Cívico e Beneficente talhado em pedra
95
3.5 Texto Integral da Ata de posse da 2a. Diretoria
Ata no. 24Sessão Solene d 1o. Aniversário do Centro Operário Cívico e Beneficente e da posse da sua 2a. Diretoria
.1o. De Maio de 1930
''Às 9 horas da noite após grande passeata desta Sociedade, fechada pela Banda musical Lyra dos Campos onde imperava o Estandarte Brasileiro, deu entrada na Sede a Directoria acompanhada de grande multidão de pessoas de todas as classes sociaes. O recinto que estava (…) ornamentado e [illuminado], já se achava compacto de socios sociaes, e cavalheiros, senhoras e senhoritas estranhos ao Centro, embora o livro presencias accuse sãosomente o registro de 143 comparecimentos.
Logo a Directoria formou os seus lugares na meza que para este acto foi collocada no palco, tomando tambem lugares distintos S. M. Leonor Braga Rainha dos Operários, S. M. Anna Varigt Rainha do Commercio, Sta. Lucia Dechandt, O Sr. Capitão representante do 13o. R. De Infantaria, O Sr. Alberto Lopes, os representantes de diversas associações e outras pessoas fradas.
Abriu a Sessão Solenne a Sta. Leonor Braga Rainha dos Operarios.O presidente leu o relatorio referente ao anno da sua gestão e bem assim um pequeno relatorio a
thesouraria; chamou os novos directores eleitos foram formando posse com excepção do Sr. João Ferigotti eleito presidente honorário que resignou no momento de empossarse.
Dada a palavra ao Sr. Adejamiro Cardon orador official da Directoria que deixava o mandato, essê referiuse sobre o progresso da Sociedade e desculpouse para com a assistencia e renuncia do Sr. João Ferigotti do cargo para o qual fôra eleito.
Seguiselhe com a palavra o Sr. Walfrido R. De Almeida Presidente recem empossado que agradecendo a indicação do seu nome verbejou a necessidade incondicional do apoio de todos os componentes do Centro, para assim, unidos e fortes, chegarmos ao alvo que tanto almejamos.
Depois deste, fallou o Sr. Manoel de Oliveira que discorreu com entusiasmo bellas palavras acerca do nosso programma social; agradeceu à Directoria que deixava o mandato e na mesma ocasião inaugurou officialmente a photografia do Sr. José Deslandes de Souza exPresidente.
O Sr. José D. De Souza tomando a palavra em longo discurso agradeceu a gentileza dos diversos consocios que lhe offereceram aquella photografia.
Fallaram mais como representantes das diversas Sociedades convidadas para este acto de posse Solenne os seguintes senhores: Vicente Tavares pelo Club Democrata e pelo Olinda S. Club – José pelo Club Operario do Imbituva – Carlos Alvaro pela Soc. Economica Operaria. Em seguida o Sr. Presidente inaugurou a palavra para quem quisesse fazer uso. Como ninguem mais se manifestasse, e nada mais houvesse a se tratar, após as saudações de estilo entre os directores, o Sr. Presidente encerrou a Sessão as 10 horas da noite do que para constar eu João Perantunes lavrei a presente Acta, que depois de lida discutida e approvada, será assignada pelo Sr. Presidente e por mim Secretario que a escrevi.
Recinto da Sede Social em Ponta Grossa no dia 1o. De Maio de 1930.Presidente 1o. Secretario
96
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