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1 Croqui e representação tridimensional do relevo: Recursos didáticos aplicados a representação do espaço geográfico no contexto da cultura indígena inserida em ambiente urbano Letícia Giuliana Paschoal 1,2 , Bernadete Aparecida Caprioglio de Castro Oliveira 1,3 , Maria Isabel Castreglini de Freitas 1,4 1 Departamento de Planejamento Territorial e Geoprocessamento (DEPLAN) – Instituto de Geociências e Ciências Exatas - Universidade Estadual Paulista/Campus Rio Claro -. 2 Licenciada e Bacharel em Geografia, Mestranda em Geologia Regional – [email protected] . 3 Antropóloga, Profa. Dra. do DEPLAN- [email protected] . 4 Engenheira Cartógrafa, Prof. Dra. do DEPLAN – [email protected] . ABSTRACT The article aims to disseminate the results obtained in the development of Scientific Initiation entitled "Representation Space through indigenous cartography: A study in the Tekoa Pyau of in the district Jaraguá - São Paulo / SP". From the statement that the indigenous culture has a set of own knowledge, a peculiar form of spatial representation and understanding, the research sought rescue and enhance this interpretation, but before the urban context in which the village Tekoa Pyau of issues related to their demarcation are not defined, and the importance of these issues in daily life of the community, it was tested alternative methods to allow the contact group with the basics of mapping system developed by non-Indians. The preparation of drawings, sketches and three-dimensional representations of the topography in workshops with a group of young Indians, given the local leadership has shown to be

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Croqui e representação tridimensional do relevo: Recursos didáticos aplicados a

representação do espaço geográfico no contexto da cultura indígena inserida em

ambiente urbano

Letícia Giuliana Paschoal1,2, Bernadete Aparecida Caprioglio de Castro Oliveira1,3, Maria

Isabel Castreglini de Freitas1,4

1 Departamento de Planejamento Territorial e Geoprocessamento (DEPLAN) – Instituto de

Geociências e Ciências Exatas - Universidade Estadual Paulista/Campus Rio Claro -. 2

Licenciada e Bacharel em Geografia, Mestranda em Geologia Regional – [email protected]. 3

Antropóloga, Profa. Dra. do DEPLAN- [email protected]. 4 Engenheira Cartógrafa, Prof.

Dra. do DEPLAN – [email protected].

ABSTRACT

The article aims to disseminate the results obtained in the development of Scientific Initiation

entitled "Representation Space through indigenous cartography: A study in the Tekoa Pyau of

in the district Jaraguá - São Paulo / SP". From the statement that the indigenous culture has a

set of own knowledge, a peculiar form of spatial representation and understanding, the

research sought rescue and enhance this interpretation, but before the urban context in which

the village Tekoa Pyau of issues related to their demarcation are not defined, and the

importance of these issues in daily life of the community, it was tested alternative methods to

allow the contact group with the basics of mapping system developed by non-Indians. The

preparation of drawings, sketches and three-dimensional representations of the topography in

workshops with a group of young Indians, given the local leadership has shown to be

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effective in achieving this goal. The first allowed the understanding and the rescue of

indigenous representations of space and, through the construction of the model of relief, could

better explain concepts that make a topographic map, key to the generation of thematic maps

such as map of the village, and has show the exact location where the village is and the

elements that surround; argue about the situation of contact and the implications that this

question about their culture and experience.

RESUMO

O artigo tem como finalidade divulgar parte dos resultados obtidos no desenvolvimento da

Iniciação Científica intitulada “Representação espacial indígena através da cartografia: Um

estudo na aldeia Tekoa Pyau no distrito do Jaraguá – São Paulo/SP”. A partir da afirmativa de

que a cultura indígena possui um conjunto de saberes próprios, ou seja, uma forma peculiar de

entendimento e representação espacial, a pesquisa buscou resgatar e valorizar esta

interpretação; porém, diante do contexto urbano em que se insere a aldeia Tekoa Pyau, das

questões relacionadas à sua demarcação que ainda não se encontram definidas, e a

importância destas questões no cotidiano da comunidade, testou-se alternativas metodológicas

que permitissem o contato do grupo com noções básicas da cartografia sistemática

desenvolvida pelos não índios. A confecção de desenhos, croquis e representações

tridimensionais do relevo, em oficinas realizadas junto a um grupo de jovens indígenas,

indicados pela liderança local, demonstrou-se eficaz para atingir este objetivo. Os primeiros

possibilitaram o entendimento e o resgate das representações do espaço indígena e, por meio

da construção da maquete do relevo, puderam melhor elucidar conceitos que compõe um

mapa topográfico, fundamentais para a geração de mapas temáticos, como o mapa da aldeia,

bem como permitiu demonstrar com precisão o local onde a aldeia se encontra e os elementos

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que os circundam; argumentar sobre a situação de contato e as implicações que tal causa sobre

sua cultura e vivência. Acredita-se que os jovens participantes das oficinas possam agir como

multiplicadores do conhecimento Geográfico e Cartográfico e contribuir com a luta de sua

comunidade principalmente no que diz respeito à demarcação da área da aldeia.

Palavras-chave: Geografia; Cartografia; Cultura indígena.

INTRODUÇÃO

O presente trabalho possui seus alicerces fundamentados na Geografia Humanista, o

que faz com que se busque aporte teórico-metodológico junto às demais ciências existentes.

Conforme cita Vaz (2006, p. 69), as concepções desta vertente se baseiam em pressupostos

filosóficos da fenomenologia o que “propõem para o estudo da Geografia a análise dos

espaços humanizados enquanto regiões culturais, domínios étnicos, territoriais”, entre outros;

ou seja, “espaços diferenciados segundo as disposições subjetivas dos homens-habitantes”

(VAZ, 2006, p. 69). A (re)tomada de questões filosóficas e a ênfase dada à categoria lugar,

como foco de afetividade e relação com o meio ambiente, segundo Oliveira apud Marandola

Jr e Gratão (2003), são as grandes contribuições da Geografia Humanista. Assim, a escala de

análise se desloca do espaço considerado como um conceito abstrato ao conceito de lugar, no

âmbito da existência real e da experiência vivida, como algo concreto, único e possuidor de

uma paisagem, que é essencialmente cultural (CAPEL,1981). Desta maneira, para contemplar

a temática da análise espacial geográfica relacionada às questões indígenas, se fez necessário

buscar elementos relacionados principalmente às Ciências Cartográfica e Antropológica.

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É indiscutível que a relação histórica entre os colonizadores europeus e a população

nativa do continente americano tenha sido desde sua origem conflituosa. Assim, a Tekoa1

Pyau, como tantas outras, sofre com a marginalização e enfrenta interesses alheios aos de sua

cultura, associados ao agravante de ainda não possui sua área legalmente demarcada e de

estarem inseridos no contexto urbano da Região Metropolitana de São Paulo, mais

precisamente no sopé do Pico do Jaraguá – SP, o que faz com que o desenvolvimento

econômico e a expansão urbana que os cercam seja muito acelerado; tal situação fez com que

suas terras fossem diminuídas e com isso os espaços de caça e de coleta também se

restringissem, o que contribui para a desarticulação e fragmentação de seu espaço.

Neste sentido, de acordo com Oliveira (2001), o espaço na visão indígena não pode ser

compreendido isolando cada aldeia dentro de seu limite territorial administrativo. O modo

como a sociedade indígena interpreta e representa seu espaço difere da de outros grupos

étnicos como os compostos por brancos, negros, amarelos e pardos. Segundo Ladeira (1992),

para as comunidades indígenas, o espaço vai além das matas, rios e igarapés, pois se trata de

um território construído socialmente e gravado nas diferentes fases de vida desses grupos,

assim sua concepção de mundo dá sentido ao seu modo de vida.

Perante a situação imposta pelo contato entre a comunidade indígena e, no caso, a

sociedade regida pelo Estado brasileiro e suas leis, que causa impasses em questões

importantes, como a de demarcação de terras devido, sobretudo, pelas diferentes formas de

concepção espacial existente entre estes grupos, a cultura indígena é afetada como um todo e

suas formas de sobrevivência foram sendo modificadas, entretanto, a resistência oferecida

pela cultura indígena, através de um sistema de crenças e da tradição, possibilitou a

sobrevivência de várias aldeias mesmo diante da escassez de recursos materiais. Tanto a 1 O termo Tekoa quando traduzido do tupi para o português significa aldeia. No trabalho foi adotado o uso deste termo, empregado no sentido de territorialidade indígena. Tekoa Pyau quando traduzido para o português significa “Aldeia Nova”.

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manutenção da língua materna e de sua religião, quanto a organização indígena são elementos

fundamentais desta resistência.

Diante do exposto, justifica-se a investigação das concepções de espacialidade e

territorialidade entre jovens membros da comunidade indígena da TEKOA Pyau, bem como o

ensino de noções básicas da Ciência Cartográfica utilizada pela comunidade não indígena.

METODOLOGIA

A metodologia adotada para o desenvolvimento do presente trabalho, constituiu-se na

elaboração e aplicação de oficinas que envolveram temas da Ciência Geográfica e

Cartográfica, como: Percepção e Representação Ambiental; Definição, Classificação e

Finalidade de mapas segundo a escala (mapa, carta, planta e croqui); Representação

tridimensional do relevo, entre outros.

Trabalhos de campo foram necessários para a realização das oficinas; das quais

participaram cinco jovens indígenas que além de conviverem com a tradição Guarani, com

valores marcantes de sua cultura no que se refere ao idioma, crenças e modo de vida, tiveram

também algum contato com a educação formal. Tais jovens foram indicados pela liderança da

aldeia para participar das oficinas, que possuíam como objetivo promover o regate das

concepções de espacialidade da comunidade indígena Guarani M`bya da Tekoa Pyau,

expressos em forma de desenhos, croquis e relatos, bem como visou introduzir noções básicas

da Cartografia desenvolvida pelos não índios. É necessário deixar claro que se buscou

valorizar e respeitar ambas as formas de entendimento e representação espacial.

Conforme cita Simielli (1996, p. 25), a Cartografia serve para desenvolver a

“capacidade da leitura e da comunicação oral e escrita por fotos, desenhos, plantas, maquetes

e, mapas e assim permitir [...] a percepção e o domínio do espaço”. Para atingir esta

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capacidade de leitura e comunicação, a utilização de diversos tipos de mapas, fotografias

aéreas, a produção de croquis e mapas mentais, bem como a confecção de maquetes, é muito

empregada devido a sua fácil produção e assimilação servindo para representar a realidade

vivida.

Em um primeiro momento, solicitou-se que os jovens a partir de seu conhecimento

empírico da área em que se insere a aldeia Pyau elaborassem croquis, no qual deveriam

constar os elementos da paisagem que mais chamassem sua atenção. Simielli (1996, p. 35),

define croqui da seguinte forma:

[...] não é um mapa, não se destina a ser publicado, tem um valor interpretativo de expor questões, não sendo obra de um especialista em Cartografia. Não é uma acumulação de signos, mas uma escolha amadurecida dos elementos essenciais que se articulam na questão tratada. A dificuldade está em se conseguir chegar a uma representação que dê clareza de conjunto, complexidade e número de fatos legíveis. É uma arte simples de difícil expressão figurativa.

Em um momento posterior foi elaborada uma representação do relevo da região do

Jaraguá/SP, por meio a qual foi possível se obter uma representação do espaço da aldeia e de

seu entorno. Para atingir este objetivo, seguiu-se a metodologia sugerida por Simielli et al

(1992) e aplicada por pesquisadores como Gomes (2005), Lombardo (2008), entre outros,

adaptando-a sempre que necessário.

A metodologia de construção da representação tridimensional do relevo se utiliza de

uma carta topográfica do local, placas de isopor, lixa d’água e tintas a base de água. Os

procedimentos metodológicos adotados foram os seguintes:

a) Escolha do tema e aquisição do mapa base - Diante da temática de representação do

espaço da aldeia e de seu entorno, foi selecionado um trecho das cartas topográficas que

compreendem a Tekoa Pyau e sua área vizinha, onde os elementos mais notáveis se tratam do

Pico do Jaraguá, a rodovia dos Bandeirantes, alguns pontos de urbanização e de recursos

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hídricos. Das cartas, foram extraídas e digitalizadas no programa AutoCad Map, as curvas de

nível, as ruas e estradas pavimentadas, a rede de drenagem e o local em que se insere a

TEKOA Pyau.

b) Definição da escala vertical e horizontal - A escala horizontal adotada não foi a mesma da

carta base. Após a digitalização do mapa, este foi impresso em escala de visualização de

1:4.000 para permitir um grande detalhamento desta área. As curvas de nível selecionadas na

carta possuem eqüidistância de 50 metros, e as placas de isopor utilizadas possuíam 2,5 cm.

Assim o exagero vertical é de 1:2.000. Este cálculo foi obtido por meio da seguinte operação:

50 m / 2,5 cm = 20 m = 2.000 cm

c) Desenho das curvas de nível - Sobre o mapa base, sobrepõem-se o papel vegetal, fixando-o

com durex em suas extremidades para realizar a cópia de cada cota de curva de nível em uma

folha de papel vegetal separada, formando uma coleção de mapas (Figura 1). Conforme

sugere Simielli et al (1992, p. 11) “O contorno da área da maquete ou a curva de zero metro

deve ser traçado em todas as folhas, para facilitar posteriormente a montagem das curvas e

ter-se sempre uma referência”. Desta forma, como a menor altitude representada foi a de 700

metros, utilizou-se uma placa de isopor com o contorno da área da maquete, definida pela

dimensão da carta na escala 1:4.000 para ser a base da maquete, já que esta cota ocupava toda

a extensão da placa.

d) Transposição das curvas de nível para as placas do isopor - Para realizar esta etapa,

sobrepõem-se o carbono à placa de isopor e, posteriormente, o papel vegetal com os

contornos da curva de nível; Simielli et al (1992) e Gomes (2005) sugerem que com o auxilio

de um alfinete se perfure todo o contorno, demarcando a curva na placa de isopor. Porém este

processo exige muito tempo por parte de quem está transpondo a as curvas de nível; com a

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finalidade de otimizar este processo e tornar o trabalho mais dinâmico proponho a utilização

de uma carretilha no lugar de alfinetes (figura 2).

e) Recorte das placas de isopor - Na ausência de um equipamento específico para cortar

isopor, utilizou-se um material alternativo, o estilete, que após ter sua parte metálica aquecida

corta com facilidade o isopor (Figura 3).

f) Colagem das placas de isopor - Após o corte de todas as placas de isopor, representando

cada placa uma curva de nível e sua eqüidistância, utilizando-se de uma cola própria para

isopor, une-se uma placa sobre a outra. A colagem deve se iniciar das menores altitudes para

as maiores (Figura 4).

g) Lixar a estrutura da maquete em relevo - Com a finalidade de proporcionar idéia de

continuidade do relevo, utilizou-se uma lixa d’água para amenizar os intervalos existentes

entre os degraus das placas de isopor (Figura 5). Esta etapa de uniformização do relevo

também poderia ser realizada, utilizando gesso diluído em água ou massa corrida para

preencher tais intervalos, atenuando o intervalo entre a borda do degrau inferior e superior,

conforme sugere Simielli et al. (1992).

h) Pintar a maquete - A pintura da maquete com tintas à base d’água pode ser realizada de

acordo com a finalidade a que se destina o uso desta. Diante do objetivo de localização da

Tekoa Pyau e dos fenômenos que a cercam se optou por explorar os elementos planimétricos

a circundam. Desta forma, com base no conhecimento empírico da área e de consultas ao

mapa base, representaram-se tais feições (Figura 6).

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Figura 1 – Extração das curvas de nível realizada por jovem indígena. Figura 2 – Carretilha; instrumento utilizado para auxiliar na transposição das curvas de nível para as placas de isopor. Figura 3 - Corte das curvas de nível nas placas de isopor. Figura 4 - Localização da placa a ser colada com base na curva de nível extraída do mapa base. Figura 5 – Maquete do relevo da Tekoa Pyau e seu entorno sendo lixada Figura 6 – Pintura da maquete do relevo da Tekoa Pyau e seu entorno. Fonte: Paschoal, L. G., 2008.

RESULTADO E DISCUSSÃO

No decorrer da aplicação das oficinas, resultados interessantes surgiram. A seguir é

possível observar alguns croquis elaborados pelos jovens indígenas e que ilustram a

localização da comunidade da aldeia Tekoa Pyau no município de São Paulo.

Figura 7 - Croqui da Tekoa Pyau realizado por jovem indígena. Fonte: SOARES, N., 2007.

Figura 8 – Croqui da Tekoa Pyau realizado por jovem indígena. Fonte: FERNANDES, L. K. M., 2007.

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Figura 9 – Croqui da Tekoa Pyau realizado por jovem indígena. Fonte: GABRIEL, N., 2007.

Figura 10 - Croqui da Tekoa Pyau realizado por jovem indígena. Fonte: SOARES, O. Y. G., 2007.

É importante frisar o fato de que os jovens indígenas não entraram em contato com

mapas, fotografias aéreas ou imagens de satélite antes de elaborar os croquis expostos,

fazendo-os apenas com base em seus conhecimentos empíricos e sua percepção do local em

que se insere a aldeia Tekoa Pyau. Se comparados os croquis com a fotografia aérea da área

(Figura 12), evidencia-se a ótima percepção e representação dos jovens indígenas com relação

ao ambiente ao qual pertencem.

Figura 11 - Fotografia Aérea da Região onde se encontra a TEKOA Pyau,

Rodovia dos Bandei-

rantes

TEKOA Pyau

Estrada Turística do

Jaraguá

Direção em que se

encontra o Pico do Jaraguá

TEKOA Ytu

Base da Policia

Rodoviária

N

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Distrito do Jaraguá – São Paulo/SP. Escala original 1:5000. Fonte: Resolo – Departamento de obras da prefeitura de São Paulo, 2001.

Diante do evidenciado pelos jovens indígenas, a elaboração da representação

tridimensional do relevo (Figura 12) permitiu fazer com que o grupo revisse algumas noções

básicas da cartografia desenvolvida pelos não índios e que foram abordadas durante as

oficinas, e que muitas vezes se constituem em conceitos abstratos ou envolvem operações

matemáticas, como é o caso da escala, curvas de nível, altitude, noções de posição, distância,

direção, entre outros, que puderam ser trabalhados de maneira prazerosa e permitiram uma

melhor ficção de tais noções.

Figura 12 - Representação Tridimensional do relevo elaborada por jovens indígenas da aldeia Tekoa Pyau. Fonte: PASCHOAL, L. G., 2008.

A representação tridimensional do relevo permitiu a visualização exata da situação do

todo que envolve a comunidade indígena, permitindo-lhes argumentar sobre a situação de

contato, as interferências que tal ocasiona sobre sua cultura, entre outros.

Na maquete a aldeia foi pintada na cor marrom, segundo os jovens, por ser esta a cor

predominante dentro de seus limites, contrastando com o exuberante verde da floresta do

Parque Estadual do Pico do Jaraguá. Foi possível observar, por meio das construções da

cidade de São Paulo, representadas pela cor vermelha, a proximidade com que a aldeia se

encontra desta, e como a expansão urbana se alastra rapidamente em direção à aldeia e à

Floresta Estadual do Pico do Jaraguá, podendo-se notar espaços construídos no sopé desta

área. Nota-se ainda outros dois elementos representados na maquete, a Rodovia dos

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Bandeirantes, que faz limite com a Tekoa Pyau, e é fonte de infortúnio para toda a

comunidade, e o pequeno lago existente próximo à aldeia, mas que pouco ou nada satisfaz

suas necessidades.

O ensino e o aprendizado da Geografia e da Cartografia, no contexto do conhecimento

e domínio do espaço da aldeia e de seu entorno se tornam de grande importância,

principalmente devido ao fato de que as políticas nacionais vêm, mesmo que indiretamente,

cada vez mais confinando as populações indígenas em porções cada vez mais restritas e

delimitadas de seu território, o que vai contra a concepção de espacialidade indígena.

O governo atual, presidido por Luiz Inácio Lula da Silva, dentro do contexto

indigenista, por meio do decreto nº. 5.051, de 19, de Abril de 2004, promulgou a Convenção

nº. 169 da Organização Internacional do Trabalho - OIT - sobre Povos Indígenas e Tribais do

ano de 1989. Convenção esta que reconhece o desejo dos povos indígenas em assumir o

controle de suas próprias instituições, formas de vida, desenvolvimento econômico,

manutenção e fortalecimento de suas identidades, línguas e religiões, dentro do âmbito dos

Estados onde moram.

Quanto à questão das terras, o Artigo 14, parágrafo 1º, do decreto nº. 5.051/2004, cita

que:

Dever-se-á reconhecer aos povos interessados os direitos de propriedade e de posse sobre as terras que tradicionalmente ocupam. Além disso, nos casos apropriados, deverão ser adotadas medidas para salvaguardar o direito dos povos interessados de utilizar terras que não estejam exclusivamente ocupadas por eles, mas às quais, tradicionalmente, tenham tido acesso para suas atividades tradicionais e de subsistência. Nesse particular, deverá ser dada especial atenção à situação dos povos nômades e dos agricultores itinerantes (BRASIL, 2004).

É neste ponto em que se concentram as dificuldades, já que a tradição nômade

indígena contrasta com a maioria sedentária da sociedade não-índia, que acaba muitas vezes

desconsiderando a necessidade de preservação de terras que possuem um significado social e

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mítico para as comunidades indígenas; o que resulta na delimitação de espaços inferiores ao

necessário para a manutenção de suas culturas, em formas de reservas que se configuram em

verdadeiras “ilhas” de habitação indígena.

Acredita-se que os jovens participantes das oficinas realizadas possam contribuir com

a luta de sua comunidade já que a área da Tekoa Pyau não se encontra demarcada até o

presente momento.

CONCLUSÕES

A falta de áreas verdes dentro da Tekoa Pyau e seu confinamento entre rodovias,

construções e poluição, dificultam a manutenção de sua cultura tradicional e a articulação da

territorialidade indígena, não habituados à imposição de limites físicos sobre o espaço, sendo

o futuro das crianças Guarani M’bya e a conservação desta cultura uma das questões mais

preocupantes evidenciada pelos mais velhos. Dentro desta perspectiva, a cultura Guarani

M’bya tem se conservado por meio da manutenção das migrações, da religião e da língua

materna.

A Geografia auxiliada pela Cartografia torna-se um importante instrumento, para que

membros da comunidade indígena saibam dominar alguns princípios básicos da técnica usada

pelos não-índios, por exemplo, para que possam melhor administrar seus territórios, entender

como são demarcadas suas terras, para que possuam maior entendimento dos aspectos

relativos à paisagem e as diferentes formas de ocupação do espaço e entendimento do mesmo

pelos índios e não-índios, os impactos ambientais e suas conseqüências para a vida dessas

comunidades, entre outros.

Desta maneira, o desenvolvimento e aplicação de oficinas envolvendo temas

cartográficos, possibilitaram a coleta de produtos em forma de relatos, desenhos, croquis e

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maquetes, demonstrando-se uma metodologia eficiente para se atingir o objetivo proposto de

análise das diferentes percepções e representações do espaço geográfico. A metodologia

adotada permitiu também uma reflexão sobre a forma com que a percepção de território e

espaço da comunidade não índia vem interferindo na forma de viver e de compreensão

espacial intrínseca à comunidade indígena Guaraní em questão.

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AGRADECIMENTOS

FAPESP (Processo 2006/06578-0); Projeto CECEMCA/UNESP-Campus Rio Claro .