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 ESCOLA DE HOTELARIA E TURISMO DE SANTARÉM 2008 / 2009 I Leia o poema que se segue. [Sem título] Não sei quantas almas tenho. Cada momento mudei. Continuamente me estranho. Nunca me vi nem achei. De tanto ser, só tenho alma. Quem tem alma não tem calma. Quem vê é só o que vê, Quem sente não é quem é, Atento ao que eu sou e vejo,  Torno-me neles e não eu. Cada meu sonho ou desejo É do que nasce e não meu. Sou minha própria paisagem, Assisto à minha passagem Diverso, móbil e só, Não sei sentir-me onde estou. Por isso, alheio, vou lendo Como páginas, meu ser. O que segue não prevendo, O que passou a esquecer. Noto à margem do que li O que julguei que senti. Releio e digo: “Fui eu?” Deus sabe, porque o escreveu. Fernando Pessoa,  Novas Poesias Inéditas 1. No poema que acabou de ler, o sujeito poético reflecte acerca de si próprio tentando responder à questão “Quem sou eu?”. 1.1. Saliente, nas duas primeiras estrofes, os versos que revelam: a fragmentação do sujeito poético; o seu desconhecimento em relação a si próprio; o sentimento de despersonalização; o seu papel de espectador de si; a sua constante inadaptação. 2. Relaci one, na primei ra estro fe, a altern ância temporal presente/p assad o com o valor expressivo do advérbio de modo “continuamente” (v.3). 3. No s tr ês úl ti mo s ve rsos da pr imei ra estr of e, o su je it o poét ic o pa ssa, abruptamente, da primeira para a terceira pessoa. 1 III

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ESCOLA DE HOTELARIA E TURISMO DE SANTARÉM 2008 / 2009

I Leia o poema que se segue.

[Sem título]

Não sei quantas almas tenho.Cada momento mudei.Continuamente me estranho.Nunca me vi nem achei.De tanto ser, só tenho alma.Quem tem alma não tem calma.Quem vê é só o que vê,

Quem sente não é quem é,

Atento ao que eu sou e vejo, Torno-me neles e não eu.Cada meu sonho ou desejoÉ do que nasce e não meu.Sou minha própria paisagem,Assisto à minha passagemDiverso, móbil e só,Não sei sentir-me onde estou.

Por isso, alheio, vou lendo

Como páginas, meu ser.O que segue não prevendo,O que passou a esquecer.Noto à margem do que liO que julguei que senti.Releio e digo: “Fui eu?”Deus sabe, porque o escreveu.

Fernando Pessoa, Novas Poesias Inéditas

1. No poema que acabou de ler, o sujeito poético reflecte acerca de si próprio

tentando responder à questão “Quem sou eu?”.

1.1. Saliente, nas duas primeiras estrofes, os versos que revelam: a fragmentação

do sujeito poético; o seu desconhecimento em relação a si próprio; o sentimento de

despersonalização; o seu papel de espectador de si; a sua constante inadaptação.

2. Relacione, na primeira estrofe, a alternância temporal presente/passado com o

valor expressivo do advérbio de modo “continuamente” (v.3).

3. Nos três últimos versos da primeira estrofe, o sujeito poético passa,abruptamente, da primeira para a terceira pessoa.

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3.1. Prove que com essa alteração o sujeito poético procede a uma generalização.

3.2. Interprete o sentido do verso 8.

3.3. Explicite o sentido dos versos 7 e 8 tendo em conta a relação que o sujeito poético estabelece entre ver/sentir/ser.

4. Na segunda estrofe, o sujeito poético volta a centrar-se em si próprio.

4.1. Indique os adjectivos usados nessa autocaracterização.

4.2. Esclareça o sentido dessa tripla adjectivação.

5. A terceira estrofe, que podemos considerar um segundo momento do poema,

encerra uma espécie de explicação.

5.1. Explique-a, considerando: o significado do adjectivo “alheio”, a comparação

“páginas”/”ser” e a metáfora livro/vida.

5.2. Sinalize os versos em que o sujeito poético se define como um ser sem

 passado nem futuro.

5.3. Explique por que razão os dois últimos versos são um desfecho lógico para o

 poema.

Bom trabalho! ☺Prof. Ana Pinheiro

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