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CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA I. Introdução A Administração Pública, atividade-meio através da qual o Estado desempenha sua função de promover o bem-estar social e o desenvolvimento, constitui bem jurídico de elevado alcance para a comunidade. Abrange não só as atividades administrativas propriamente ditas (Poder Executivo), como também atividades, de caráter administrativo, dos Poderes Judiciário e Legislativo. É neste sentido amplo que o legislador penal a elhn c na se refere como objeto jurídico do Título XI. A normalidade funcional desta atividade administrativa, sua probidade, sua incolumidade, e, sobretudo o seu prestígio perante os administrados, adquire tal relevo que o Estado houve por bem resguardá-la, incriminando determinadas condutas que contra ela atentam. Assim, dentre as condutas que atingem a normalidade administrativa, o legislador penal separou algumas, consideradas mais graves, tipificando-as como crimes. II. Ilícito penal e ilícito administrativo Os ilícitos penal, civil e administrativo, são espécies do gênero ato ilícito, que é aquele que contraria a ordem jurídica. Não há, portanto, entre esses ilícitos civil, penal e administrativo, diferença ontológica, de essência. A diferença entre eles é de grau. Assim, o mais grave deles é o penal, que submete o seu autor à sanção criminal, também a mais grave delas, por incluir até o encarceramento. Um pouco menos grave, o ilícito civil sujeita o seu autor às sanções civis, que são o desfazimento do ato e a obrigação de indenizar. Por último, o menos grave é o ilícito administrativo, que sujeita o seu autor a penalidades administrativas, que vão da advertência, suspensão, até a demissão, ou interdição de atividades. Algumas vezes, um ato ilícito de natureza administrativa constitui também um ilícito penal. Mas nem sempre isso acontece. Certos ilícitos administrativos, pela sua menor gravidade, não constituem ilícitos penais. Há, portanto, nítida separação na disciplina jurídica de ambos. A imposição de sanção administrativa, nos casos em que o ato também configura ilícito penal, independe da jurisdição criminal. A recíproca também é verdadeira. Magalhães Noronha sustenta haver certa prevalência do juízo penal sobre o administrativo, dependência relativa, é certo 1 . Dessa forma, se o agente é absolvido, no juizo criminal, por haver ficado provado que não praticou o fato, ou o fato não ocorreu, não pode ele ser punido, na esfera administrativa, pelo mesmo fato. No entanto, se a absolvição se dá por falta de provas, ou porque o fato não é típico, por exemplo, nada impede sua punição na esfera administrativa. No mesmo sentido a lição de Hely Lopes Meirelles, para quem a punição administrativa, que é autônoma, não depende do processo civil ou criminal a que se sujeite também o funcionário público pela mesma falta. Mas a decisão judicial prevalece, em determinadas hipóteses, como na de condenação criminal 2 . 1 Segundo ele, "se o funcionário é absolvido por determinado crime, no juízo penal, não se compreende que por ele seja condenado no processo administrativo" . Porém, esta prevalência é relativa. De fato, como diz mais adiante: "Tal não impede, evidentemente, que o funcionário, absolvido no juízo criminal pelo delito, seja condenado no administrativo, pela falta disciplinar ou administrativa, tal como se, por exemplo, não provada a prevaricação (art. 319) pela ausência de satisfação de interesse ou sentimento pessoal, permaneça a falta administrativa consistente na desídia ou retardamento do ato de ofício, como prevêem os arts. 241, III, e 253 da lei 10.261, de 28 de outubro de 1969 (Estatuto dos Funcionários Públicos Civis do Estado de São Paulo). Onde não houve o mais, pode haver o menos" (Direito Penal, Ed. Saraiva, 1986, vol. e, p. 249).

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CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

I. Introdução

A Administração Pública, atividade-meio através da qual o Estado desempenha sua função de promover o bem-estar social e o desenvolvimento,

constitui bem jurídico de elevado alcance para a comunidade.

Abrange não só as atividades administrativas propriamente ditas (Poder Executivo), como também atividades, de caráter administrativo, dos Poderes

Judiciário e Legislativo.

É neste sentido amplo que o legislador penal a elhn c na se refere como objeto jurídico do Título XI.

A normalidade funcional desta atividade administrativa, sua probidade, sua incolumidade, e, sobretudo o seu prestígio perante os administrados,

adquire tal relevo que o Estado houve por bem resguardá-la, incriminando determinadas condutas que contra ela atentam.

Assim, dentre as condutas que atingem a normalidade administrativa, o legislador penal separou algumas, consideradas mais graves, tipificando-as

como crimes.

II. Ilícito penal e ilícito administrativo

Os ilícitos penal, civil e administrativo, são espécies do gênero ato ilícito, que é aquele que contraria a ordem jurídica.

Não há, portanto, entre esses ilícitos civil, penal e administrativo, diferença ontológica, de essência. A diferença entre eles é de grau.

Assim, o mais grave deles é o penal, que submete o seu autor à sanção criminal, também a mais grave delas, por incluir até o encarceramento. Um

pouco menos grave, o ilícito civil sujeita o seu autor às sanções civis, que são o desfazimento do ato e a obrigação de indenizar. Por último, o menos grave é o

ilícito administrativo, que sujeita o seu autor a penalidades administrativas, que vão da advertência, suspensão, até a demissão, ou interdição de atividades.

Algumas vezes, um ato ilícito de natureza administrativa constitui também um ilícito penal. Mas nem sempre isso acontece. Certos ilícitos

administrativos, pela sua menor gravidade, não constituem ilícitos penais.

Há, portanto, nítida separação na disciplina jurídica de ambos.

A imposição de sanção administrativa, nos casos em que o ato também configura ilícito penal, independe da jurisdição criminal. A recíproca também é

verdadeira.

Magalhães Noronha sustenta haver certa prevalência do juízo penal sobre o administrativo, dependência relativa, é certo1.

Dessa forma, se o agente é absolvido, no juizo criminal, por haver ficado provado que não praticou o fato, ou o fato não ocorreu, não pode ele ser

punido, na esfera administrativa, pelo mesmo fato. No entanto, se a absolvição se dá por falta de provas, ou porque o fato não é típico, por exemplo, nada impede

sua punição na esfera administrativa.

No mesmo sentido a lição de Hely Lopes Meirelles, para quem a punição administrativa, que é autônoma, não depende do processo civil ou criminal a

que se sujeite também o funcionário público pela mesma falta. Mas a decisão judicial prevalece, em determinadas hipóteses, como na de condenação criminal 2.

A sentença penal condenatória prevalece sempre para reconhecimento da culpa administrativa. Já a absolutória prevalece apenas quando afasta a

existência do fato ou da autoria imputada ao acusado.

III. Conceito penal de funcionário público

Art. 327 - Considera-se funcionário público, para os efeitos penais, quem, embora transitoriamente ou sem remuneração, exerce cargo, emprego ou função pública.

Parágrafo único. Equipara-se a funcionário público quem exerce cargo, emprego ou função em entidade paraestatal.§ 1º - Equipara-se a funcionário público quem exerce cargo, emprego ou função em entidade paraestatal. (Parágrafo único renumerado pela Lei nº 6.799, de 1980)

§ 1º - Equipara-se a funcionário público quem exerce cargo, emprego ou função em entidade paraestatal, e quem trabalha para empresa prestadora de serviço contratada ou conveniada para a execução de atividade típica da Administração Pública.   (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)

Para o Direito Administrativo, funcionário público é somente aquele legalmente investido em cargo público, efetivo ou de confiança. E cargo público,

na lição de Hely Lopes Meireles, "é o lugar instituído na organização do serviço público, com denominação própria, atribuições e responsabilidades específicas

e estipêndio correspondente, para ser provido e exercido por um titular, na forma estabelecida em lei"3.

1 Segundo ele, "se o funcionário é absolvido por determinado crime, no juízo penal, não se compreende que por ele seja condenado no processo administrativo". Porém, esta prevalência é relativa. De fato, como diz mais adiante: "Tal não impede, evidentemente, que o funcionário, absolvido no juízo criminal pelo delito, seja condenado no administrativo, pela falta disciplinar ou administrativa, tal como se, por exemplo, não provada a prevaricação (art. 319) pela ausência de satisfação de interesse ou sentimento pessoal, permaneça a falta administrativa consistente na desídia ou retardamento do ato de ofício, como prevêem os arts. 241, III, e 253 da lei 10.261, de 28 de outubro de 1969 (Estatuto dos Funcionários Públicos Civis do Estado de São Paulo). Onde não houve o mais, pode haver o menos" (Direito Penal, Ed. Saraiva, 1986, vol. e, p. 249).2 Segundo ele, "a punição administrativa ou disciplinar não depende do processo civil ou criminal a que se sujeite também o funcionário público, pela mesma falta, nem obriga a Administração a aguardar o desfecho dos demais processos. Apurada a falta funcional, pelos meios adequados (processo administrativo, sindicância ou meio sumário), o servidor fica sujeito, desde logo, à penalidade administrativa correspondente". Mais adiante, completa: "a condenação criminal implica, entretanto, no reconhecimento automático das duas outras, porque o ilícito penal é mais que o ilícito administrativo e o ilícito civil. Assim sendo, a condenação criminal por delito funcional importa no reconhecimento, também, de culpa administrativa e civil, mas a absolvição no crime nem sempre isenta o funcionário destas responsabilidades, porque pode não haver ilícito penal e existir ilícitos administrativo e civil" (Direito Administrativo Brasileiro, RT, 10ª ed., pgs. 461 e 463). 3 op. cit., p. 404.

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Desta forma, nem toda pessoa que presta serviços para a Administração Pública se enquadra no conceito de funcionário público, como ocorre com os

empregados públicos4, os contratados por tempo determinado.

Contudo, este não é o conceito de funcionário público para o Direito Penal. Este conceito penal de funcionário público, como se vê do art. 327, é bem

mais amplo, abrangendo todos os que, embora transitoriamente ou sem remuneração, exercem cargo, emprego ou função pública.

Todas as pessoas que prestam serviços à Administração e a ela são vinculadas por relações profissionais, seja em cargo ou função pública, ou em

emprego, com retribuição pecuniária, são servidores públicos em sentido amplo.

Na categoria de servidores públicos em sentido amplo incluem-se os servidores públicos em sentido estrito (ou funcionários públicos), os empregados

públicos e os contratados por tempo determinado.

Funcionários públicos em sentido estrito (ou servidores públicos em sentido estrito) são os titulares de cargos públicos, seja efetivo, seja em comissão,

sujeitos a regime estatutário.

Empregados públicos são os titulares de empregos públicos, sujeitos ao regime disciplinar da Consolidação das Leis do Trabalho. Não ocupam cargos

públicos.

Já os contratados por tempo determinado são aqueles servidores públicos submetidos a regime jurídico administrativo especial com previsão no art. 37,

IX, da Constituição Federal.

Daí a diferença entre cargo e emprego público. O cargo público é aquele previsto em lei, com denominação própria, e remuneração específica. Já o

emprego público não tem previsão nem denominação própria definida em lei.

Por outro lado, função pública é a atribuição ou conjunto de atribuições que a Administração Pública confere a seus servidores.

Assim, todo cargo público tem função, mas pode haver função sem cargo público.

Veja-se que o ocupante do cargo de Procurador Jurídico do município tem suas funções definidas na lei que criou o cargo. Essas funções são

definitivas.

Já os empregados contratados com prazo determinado, devem realizar determinadas funções que são transitórias, relacionadas com o serviço que visam

atender. Assim as funções autônomas são transitórias, enquanto que as dos cargos são definitivas.

Funcionário Público para o Direito Administrativo é apenas e tão somente aquele que ocupa cargo público. Não abrange os empregados públicos,

submetidos ao regime da CLT, nem os contratados temporariamente.

Para o direito penal o conceito é diverso. Importa, agora, é o exercício de uma função pública. O texto penal fala em exercício de cargo, emprego ou

função pública. Mesmo que esse exercício seja transitório e sem remuneação.

Assim, os jurados que administrativamente não são considerados funcionários públicos, o são para fins penais. O mesmo ocorre com os Vereadores,

Deputados, Senadores, Serventuários da Justiça. Porque estes, embora não sejam nem ocupantes de cargos nem de empregos públicos, exercem, em tais

atividades, uma função pública.

O parágrafo único do art. 327 vai mais além, considerando funcionário público, para fins penais, também aqueles que exercem cargo, função ou

emprego em entidade paraestatal5, como também quem trabalha para empresa prestadora de serviço contratada ou conveniada para execução de atividade típica

de Administração Pública.

Consideram-se funcionários públicos, para fins penais, os empregados de sociedades de economia mista (em que o Estado é sócio majoritário) que

exercem função delegada pelo Poder Público6. O mesmo acontece com os empregados do Banco do Brasil que trabalham na Secção de Fiscalização Bancária, por

se tratar de serviço público a ele delegado.

Porém, não havendo exercício de função delegada, o empregado de sociedade de economia mista não é considerado funcionário público para fins

penais7.

Escrivães, escreventes ou serventuários de Cartórios não oficializados do Estado, porque exercem função pública, incluem-se nesta ampla conceituação

penal de funcionário público8.

Servidores da Rede Ferroviária Federal S/A, que não é entidade de direito público, e a quem não foram delegadas funções públicas, não se enquadram

neste conceito penal de funcionário público9.

IV. Aumento geral de pena

Art. 327§ 2º - A pena será aumentada da terça parte quando os autores dos crimes previstos neste Capítulo forem ocupantes de cargos em comissão ou de

função de direção ou assessoramento de órgão da administração direta, sociedade de economia mista, empresa pública ou fundação instituída pelo poder público. (Incluído pela Lei nº 6.799, de 1980)

4 "Os empregados públicos são todos os titulares de emprego público (não de cargo público) da Administração direta ou indireta, sujeitos ao regime jurídico da CLT" (Hely Lopes Meirelles, op. cit., p. 399)5 Entidades paraestatais são pessoas jurídicas de Direito Privado dispostas paralelamente ao Estado, ao lado do Estado, para executar cometimentos de interesse do Estado, mas não privativos do Estado. (cf. Hely Lopes Meirelles, Direito Administrativo Brasileiro, Malheiros Editores, 30ª ed., p. 366)6 Neste sentido decisão do E. Tribunal de Justiça de São Paulo, fazendo referência a decisões da Suprema Corte (RJTJESP, LEX, 132/565)7 RT 481/288, 472/3888 RT 488/312, 482/314), 461/333, 434/353, 375/1669 RT 499/388

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As penas cominadas para todos os crimes definidos no Título I (Crimes praticados por funcionário público contra a administração em geral) serão

aumentadas da terça parte quando seus autores forem ocupantes de cargos em comissão ou de função de direção ou assessoramento de órgão da administração

direta, sociedade de economia mista, empresa pública ou fundação instituída pelo poder público. É a regra do § 2º do art. 327, incluído pela lei n. 6799, de 1980.

Justifica-se a majoração de pena tendo em conta a maior gravidade da conduta em razão da função exercida pelos seus autores.

V. Classificação

O Título X do Código Penal agrupa os crimes contra a administração em quatro capítulos.

No primeiro (I), estão previstos os crimes praticados por funcionário público ( intranei) contra a administração em geral. São aqueles crimes próprios,

que só podem ser praticados por funcionário público. O critério se reveste de lógica, pois é natural que se chame à responsabilidade primeiramente os agentes da

Administração, incumbidos de fazer com que ela se desenvolva normalmente.

No segundo (II), estão os crimes praticados pelo particular (extranei) contra a administração em geral.

No terceiro (II A), os crimes praticados por particular contra a administração pública estrangeira;

E, no último, os crimes cometidos contra a administração da justiça.

Capítulo I - Crimes praticados por funcionários públicos contra a administração em geral

1. Peculato

Art. 312 - Apropriar-se o funcionário público de dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel, público ou particular, de que tem a posse em razão do cargo, ou desviá-lo, em proveito próprio ou alheio:

Pena - reclusão, de dois a doze anos, e multa.§ 1º - Aplica-se a mesma pena, se o funcionário público, embora não tendo a posse do dinheiro, valor ou bem, o subtrai, ou concorre para que seja

subtraído, em proveito próprio ou alheio, valendo-se de facilidade que lhe proporciona a qualidade de funcionário.Peculato culposo§ 2º - Se o funcionário concorre culposamente para o crime de outrem:Pena - detenção, de três meses a um ano.§ 3º - No caso do parágrafo anterior, a reparação do dano, se precede à sentença irrecorrível, extingue a punibilidade; se lhe é posterior, reduz de

metade a pena imposta.

1.1. Conceito e objetividade jurídica

O que é o peculato que não uma apropriação indébita qualificada pela condição de funcionário público de seu agente?

O peculato, numa breve síntese, pode ser definido como a apropriação indébita praticada por funcionário público.

São duas as suas modalidades previstas no caput do art. 312: o peculato-apropriação (primeira parte), em que o funcionário público se apropria de

dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel, público ou particular, de que tem a posse em razão do cargo, e o peculato-desvio (segunda-parte), em que o

funcionário público desvia, em proveito próprio ou alheio, o dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel, público ou particular, de que tem a posse em razão do

cargo.

Uma terceira modalidade, prevista no § 1º, é o peculato-furto, em que o funcionário público, embora não tendo a posse do dinheiro, valor ou bem, o

subtrai, ou concorre para que seja subtraído, em proveito próprio ou alheio, valendo-se da qualidade de funcionário público.

Finalmente, uma quarta modalidade, prevista no § 2º, é o peculato-culposo, em que o funcionário público concorre culposamente para o crime de

outrem.

Todas estas modalidades têm uma coisa em comum: sujeito ativo é sempre um funcionário público, valendo-se desta qualidade para a prática da ação

típica.

O que se tutela, com a incriminação, é a normalidade da atividade administrativa do Estado. De forma indireta se tutela tanto o patrimônio público

como o particular.

1.2. Ação típica

Na modalidade peculato-apropriação, a ação típica centra-se no verbo apropriar-se, significando assenhorear-se, fazer seu o bem alheio, inverter o

título da posse.

Assim, comete este crime o carteiro que, ao invés de entregar, viola e destrói a correspondência, apoderando-se dos valores registrados.

Eventual intenção de restituir não descaracteriza o peculato.

Na modalidade peculato-desvio, centra-se no verbo desviar, ou seja, dar ao objeto material do crime destinação diversa daquela para a qual lhe foi

confiado. O agente, embora não tendo intenção de fazer sua a coisa, a desvia, empregando-a em fim diverso, como na hipótese do funcionário emprestar a outrem,

com ou sem juros, dinheiro recebido em razão de seu ofício para recolhimento aos cofres públicos. O desvio deve ocorrer em proveito próprio ou alheio. Se o

desvio ocorrer no interesse da própria Administração, o crime será outro (art. 315), e não peculato.

É fundamental que o bem tenha sido recebido em razão do cargo ocupado pelo agente. Portanto, deve haver uma relação de causa e efeito entre o

cargo do agente e o recebimento do bem. Assim, o Oficial de Justiça que se apropria de valor em dinheiro que lhe foi entregue, a título de custas, para recolher em

Cartório, não comete este crime. Porque não é sua função recolher custas em Cartório. Portanto, não recebeu o dinheiro em razão do cargo de Oficial de Justiça 10.

1.3. Sujeito ativo

10 RT 558/312

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Agente deste crime, em qualquer de suas modalidades, será sempre o funcionário público. Trata-se, portanto, de crime próprio.

Convém lembrar que, em se tratando de co-autoria, as circunstâncias de caráter pessoal não se comunicam, salvo quando elementares do crime.

A qualidade de funcionário público do agente é circunstância de caráter pessoal. E também elementar do crime. Não há peculato sem que o autor seja

funcionário público.

Desta forma, no peculato, a qualidade de funcionário público do agente, embora se trate de circunstância de caráter pessoal, se comunica ao co-autor

porque é elementar do crime.

Assim, o particular que de qualquer modo concorre para o crime de peculato praticado pelo funcionário público também é considerado como tal para

fins penais, e incide nas mesmas penas.

1.4. Sujeito passivo

É o Estado (União, Estados, Municípios e Distrito Federal) ou suas entidades paraestatais ou autárquicas, em face da equiparação, porque titulares do

bem jurídico normalidade da função pública. Secundariamente também pode ser considerado o particular lesado com a conduta criminosa.

A Sociedade de Economia Mista apenas é sujeito passivo do crime quando executa serviço público que lhe foi delegado. É o que ocorre com a seção de

Fiscalização Bancária do Banco do Brasil.

1.5. Objeto material

É o dinheiro (moeda circulante no país), valor (qualquer título ou papel de crédito; documento negociável, representativo de obrigação), ou qualquer

bem móvel11 (coisa que pode ser transportada de um lugar para outro)12.

O objeto material do crime pode ser público ou privado. Mas deve estar na posse lícita do agente, em razão de sua qualidade de funcionário público,

nas duas primeiras modalidades (peculato-apropriação e peculato-desvio).

1.6. Elemento subjetivo

Na modalidade peculato-apropriação, há divergência doutrinária quanto à necessidade ou não do dolo específico. Nelson Hungria 13 e Julio Fabbrini

Mirabete14 entendem bastar o dolo genérico, ou seja, a vontade livre e consciente de se apropriar do bem em sua posse em razão do cargo, com vontade de não

mais restituí-lo. Magalhães Noronha15, Damásio E. de Jesus16 e Ney Moura Teles17, por sua vez, sustentam a necessidade também do dolo específico, que estaria

implícito na descrição típica, e consistiria na intenção de proveito próprio ou alheio.

Na modalidade peculato-desvio a doutrina, de forma unânime, entende necessários tanto o dolo genérico como o específico.

O proveito próprio tanto pode ser material como moral18.

1.7. Consumação e tentativa

Na primeira modalidade, a consumação ocorre no momento em que o agente se apropria do bem, ou seja, inverte o título da posse, passando a agir

como se proprietário fosse. Admite tentativa19.

Na segunda modalidade, a consumação coincide com o momento do desvio, ou seja, no instante em que o agente dá à coisa destinação diversa.

Também admite tentativa.

1.8. Peculato-furto

Nesta modalidade de peculato, ao contrário do que ocorre com as duas anteriores, o agente não tem a posse do objeto material. Mas a subtrai, a

exemplo do que ocorre no furto, mas valendo-se da facilidade que lhe proporciona a condição de funcionário público. Ou então, concorre, conscientemente,

para que terceiro a subtraia, valendo-se também da facilidade que lhe proporciona a condição de funcionário público.

A consumação ocorre no instante em que o agente tem a disponibilidade tranqüila, ainda que por instantes, da "res". Admite tentativa.

Além do dolo genérico, o crime, nessa modalidade, exige também o específico, caracterizado pelo "proveito próprio ou alheio".

1.9. Peculato-culposo

Implica num auxílio inconsciente para a prática do crime. O funcionário, culposamente, acaba concorrendo para que outrem pratique o crime. Há que

se fazer presente, no entanto, uma relação direta entre a culpa do funcionário e o crime praticado pelo terceiro.

11 O uso de mão-de-obra, ou de serviços da administração pública, constitui conduta não abrangida na tipificação do art. 312 ou em seu § 1º (RT 506/326).12 Agentes públicos (Prefeito, Governador, Presidente da República, Secretários Municipais ou Estaduais, e Ministros de Estado) que se utilizam de gasolina do poder público em seus carros particulares cometem o crime de peculato. É que o combustível constitui bem apropriável, cujo consumo onera o Erário ( RJTJSP 60/373).13 Comentários ao Código Penal, Revista Forense, 1958, vol IX, p. 347.14 Manual de Direito Penal, Ed. Atlas, 23ª ed., p vol. III, p. 266.15 Direito Penal, Ed. Saraiva, 1986, vol. 4, p. 211.16 Dirieto Penal, Ed. Saraiva, 2009, vol. 4, p. 131.17 Direito Penal, Ed. Atlas, 2004, vol. III, p. 389.18 RJTJSP, Lex, 15/46819 Admita-se a hipótese do carteiro que, após violar correspondência sobre sua guarda, coloca em sua bolsa importância em dinheiro que ali estava, mas é surpreendido por alguém neste momento, sem que tenha tido a posse tranquila da coisa.

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Não sendo possível co-autoria culposa em crime doloso, o funcionário desidioso responderá por peculato culposo, enquanto que o terceiro por peculato

doloso ou furto, conforme seja ou não funcionário público20.

No caso de ser culposo o peculato, a reparação do dano, antes da sentença, extingue a punibilidade. Depois da sentença, implica na redução da pena

pela metade (§ 3º).

2. Peculato mediante erro de outrem

Art. 313 - Apropriar-se de dinheiro ou qualquer utilidade que, no exercício do cargo, recebeu por erro de outrem:Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa.

2.1. Conceito e objetividade jurídica

O crime consiste em apropriar-se o funcionário de dinheiro ou qualquer utilidade que, no exercício do cargo, recebeu por erro de outrem. A pena é de

reclusão de um a quatro anos, e multa.

Nelson Hungria o chama de peculato-estelionato: o agente recebe a coisa por erro de outrem, no exercício do cargo e, ao invés de devolvê-la, dela se

apropria.

O que se tutela, também aqui, é a normalidade da atividade administrativa do Estado.

2.2. Ação típica

Centra-se no verbo "apropriar-se", que como visto significa inverter o título da posse, passar a agir em relação à coisa como se proprietário fosse.

Indispensável, no entanto, que o bem tenha vindo à posse do agente em virtude de erro de outrem. Este erro deve ser espontâneo. Se houver sido provocado o

crime será ou de estelionato ou de concussão.

O erro pode ser referir tanto à competência do funcionário para receber, como sobre a obrigação em si, e sobre o "quantum" da coisa entregue.

2.3. sujeito ativo

Somente o funcionário público pode cometer este crime. Ressalve-se a possibilidade do particular ser co-autor do crime.

2.4. sujeito passivo

É o Estado. Indiretamente, também o particular lesado.

2.5. objeto material

Dinheiro ou qualquer utilidade.

2.6. elemento subjetivo

É o dolo genérico.

2.7. consumação e tentativa

A consumação coincide com a apropriação. Admite-se a tentativa, como na hipótese aventada por Nelson Hungria, de funcionário dos Correios

receber, por erro, uma carta com valor para registrar, e quando está para violá-la, é surpreendido e impedido.

2.8. Peculato de uso

A utilização de veículos oficiais na realização de serviços particulares, com gasolina própria, não constitui peculato. É apenas suscetível de sanções

administrativas. Trata-se do denominado "peculato de uso", não punido em nossa legislação penal 21. Porém, se o combustível for da entidade pública haverá

peculato em relação a ele.

Saliente-se que o Dec. Lei 201 prevê, como crime de responsabilidade de Prefeitos, o uso indevido de bens, rendas ou serviços públicos.

2.9. Ressarcimento do dano

Em se tratando de peculato doloso, o ressarcimento do dano não implica em extinção da punibilidade. O que importa neste crime não é só a lesão

patrimonial, mas a desmoralização a que fica sujeita a Administração Pública22. Mas influi na fixação da pena23.

3. Inserção de dados falsos em sistema de informações (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)

20 Nelson Hungria nos dá o seguinte exemplo: "o funcionário encarregado da direção e vigilância de uma construção pública, dá lugar, por sua desídia, à subtração de materiais. Se quem subtrai é outro funcionário, com facilidade de acesso à obra (em razão dessa qualidade), incidirá no par. 1º do art. 312; se, ao contrário, é um operário contratado "ad hoc", responderá por furto qualificado (art. 155, par. 4º, II); se completamente estranho à obra, será réu de furto simples)" (op. cit., p. 350)21 RT 438/366, 383/71, 491/29322 RT 510/451, 498/27523 RT 446/360

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Art. 313-A. Inserir ou facilitar, o funcionário autorizado, a inserção de dados falsos, alterar ou excluir indevidamente dados corretos nos sistemas informatizados ou bancos de dados da Administração Pública com o fim de obter vantagem indevida para si ou para outrem ou para causar dano: (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000))

Pena - reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa. (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)3.1. Conceito e objetividade jurídica

Esse crime, resultante da vigência da lei n. 9983/00, resultou da necessidade de adequação aos novos tempos, em que a informática adquire papel de

relevo na atividade administrativa do Estado.

O que se incrimina é a conduta do funcionário que insere dados falsos, ou altera ou exclui dados verdadeiros nos sistemas informatizados ou bancos de

dados da Administração Pública, com o fim de obter vantagem indevida para si ou para outrem, ou para causar dano.

A pena cominada é de reclusão, de dois a doze anos, e multa.

Objeto jurídico da incriminação é a normalidade da atividade administrativa do Estado.

3.2. Ação típica

Inserir ou facilitar a inserção de dados falsos é a primeira modalidade. Inserir é introduzir o dado. Facilitar é tornar fácil a inserção.

Na segunda, o agente altera dado verdadeiro ou o exclui. A ação se pratica em relação a sistema informatizado ou banco de dados da Administração

Pública.

3.3. Sujeito ativo

Trata-se de crime próprio, que só pode ser cometido por funcionário público que esteja autorizado a acessar o sistema ou o banco de dados , no

exercício de suas funções.

3.4. Sujeito passivo

É o Estado.

3.5. Objeto material

São os dados falsos que são inseridos no sistema informatizado ou banco de dados, ou os dados verdadeiros que são alterados ou excluídos.

Dados são informações que, por interessarem à Administração, são armazenadas em seus sistemas informatizados ou banco de dados . Esses dados

constituem verdadeiros documentos virtuais da Administração.

3.6. Elemento subjetivo

Além do dolo genérico, consistente na vontade livre e consciente de praticar a ação típica, o crime exige também o específico, consistente naquela

finalidade especial que move o agente, no caso a obtenção de vantagem indevida para si ou para outrem, ou de causar dano.

3.7. Consumação e tentativa

A consumação coincide com o instante em que o dado falso é lançado no sistema informatizado ou no banco de dados; ou no instante em que o dado

verdadeiro é alterado ou excluído.

A tentativa é possível.

4. Modificação ou alteração não autorizada de sistema de informações (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)

Art. 313-B. Modificar ou alterar, o funcionário, sistema de informações ou programa de informática sem autorização ou solicitação de autoridade competente: (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)

Pena - detenção, de 3 (três) meses a 2 (dois) anos, e multa. (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)

Parágrafo único. As penas são aumentadas de um terço até a metade se da modificação ou alteração resulta dano para a Administração Pública ou

para o administrado.(Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)

4.1. Conceito e objetividade jurídica

Este crime, também resultado da vigência da lei n. 9983/00, tem em mira a proteção dos sistemas de informações ou programas de informática

utilizados pela Administração Pública.

O que se pune, assim, é a conduta de modificar ou alterar, esses sistemas ou programas, sem autorização ou solicitação da autoridade competente.

A pena cominada é de detenção, de três meses a dois anos, e multa.

Se da modificação ou alteração resultar dano para a Administração Pública ou para o administrado, as penas são aumentadas de um terço até metade.

Objeto jurídico é a Administração Pública, em sua normalidade funcional.

4.2. Ação típica

As condutas típicas são modificar ou alterar, expressões que em realidade podem ser consideradas sinônimas. Ambos têm o significado de mudança,

transformação, adulteração.

Essencial, para a configuração do crime, que tanto a modificação, como a alteração, não tenham sido autorizadas ou sido solicitadas pela autoridade

competente.

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4.3. Sujeito ativo

É o funcionário público.

4.4. Sujeito passivo

É o Estado.

4.5. Objeto material

É o sistema operacional em si. A alteração ou modificação são feitas no próprio sistema. Não se trata de modificar ou alterar os dados contidos no

sistema, como no crime anterior.

Também o programa utilizado pela Administração é objeto material do crime.

4.6. Elemento subjetivo

É o dolo genérico.

4.7. Consumação e tentativa

O crime se consuma no instante em que o funcionário público modifica ou altera o sistema ou o programa, sem estar autorizado a tal pela autoridade

competente.

4.8. Aumento de pena

Quando da alteração ou modificação resultar dano para a Administração ou para o administrado, a pena será aumentada de um terço até metade.

5. Extravio, sonegação ou inutilização de livro ou documento

Art. 314 - Extraviar livro oficial ou qualquer documento, de que tem a guarda em razão do cargo; sonegá-lo ou inutilizá-lo, total ou parcialmente:Pena - reclusão, de um a quatro anos, se o fato não constitui crime mais grave.

5.1. Conceito e objetividade jurídica

O crime, tal como definido no art. 314, consiste em extraviar livro oficial ou qualquer documento, de que tenha a guarda em razão do cargo; ou sonegá-

lo ou inutilizá-lo, total ou parcialmente. A pena cominada é de reclusão, de 1 a 4 anos, se o fato não constitui crime mais grave.

Saliente-se, desde logo, que a tipificação do crime exige que o agente tenha a guarda do livro oficial ou do documento em razão do cargo. Ou, como

diz Nelson Hungria, que o agente seja incumbido, “ratione officii”, da guarda do livro ou do documento24.

Trata-se de crime subsidiário, como se vê da ressalva final da pena cominada. Assim, o fato pode ser elemento de corrupção passiva (art. 317) ou

configurar falsidade documental por supressão (art. 305).

Objetividade jurídica continua sendo a normalidade da atividade administrativa do Estado.

5.2. Ação típica

Três as condutas previstas no tipo penal: a) extraviar, significando desviar, mudar de destino; b) sonegar, ou seja, não apresentar quando exigido,

ocultar intencionalmente; c) inutilizar, tonar inútil, tornar imprestável.

5.3. Sujeito ativo

Só o funcionário público. Fundamental, como já se disse, que tenha ele a guarda do livro ou do documento em razão de seu cargo.

5.4. Sujeito passivo

É o Estado.

5.5. Objeto material

É o livro oficial ou o documento (público ou particular) que esteja na posse do agente em razão do cargo. Indispensável que um ou outro, de qualquer

modo, afete o interesse administrativo ou de qualquer serviço. Exemplos: livros das repartições públicas, papéis de arquivos ou de museus, relatórios, plantas,

projetos, pareceres, provas escritas de concurso, autos de processo administrativo, etc.

Em se tratando de autos judiciais ou documentos de valor probatório, sendo a sonegação ou inutilização praticados por advogado ou procurador que os

recebeu nesta qualidade, o delito será o do art. 356.

5.6. Elemento subjetivo

24 ob. cit., pg. 354

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Basta o dolo genérico para a configuração do delito, consistente este na vontade livre e consciente de praticar o fato, com consciência de sua

injuridicidade.

Já se decidiu que escrivão de polícia que reteve, em sua gaveta, durante muito tempo, autos de inquérito policial, e cartas precatórias, por desídia, não

cometeu o crime, que exige segura demonstração de conduta livremente dirigida à sonegação dos documentos25.

Não há punição a título de culpa.

5.7. Consumação e tentativa

A consumação se dá com a prática de quaisquer daquelas condutas típicas, independentemente de dano efetivo. Na primeira modalidade, o crime é

permanente. Na última, instantâneo de efeitos permanentes.

Admissível a tentativa nas hipóteses de extravio e inutilização. Mas não na de sonegação, pois ou o funcionário ainda não está obrigado a apresentar o

livro ou documento, e nada se pode alegar contra ele, ou já se faz presente a obrigação, e a não entrega já configura o crime.

6. Emprego irregular de verbas ou rendas públicas

Art. 315 - Dar às verbas ou rendas públicas aplicação diversa da estabelecida em lei:Pena - detenção, de um a três meses, ou multa.

6.1. Conceito e objeto jurídico

O crime se configura quando o funcionário dá aplicação diversa daquela estabelecida em lei às rendas ou verbas públicas. A pena é de detenção de

um a três meses ou multa.

Este delito somente pode ser praticado por quem tenha poder de disposição sobre as rendas ou verbas públicas.

A razão da incriminação está na ofensa que a conduta representa para a regularidade administrativa. Indispensável que as verbas e rendas sejam

aplicadas conforme a destinação específica e prévia da lei orçamentária, e não de acordo com a vontade, preferência ou inclinação do servidor público.

Objeto jurídico da incriminação, portanto, é a normalidade da atividade administrativa do Estado.

6.2. Ação típica

Alude o texto legal a dar aplicação diversa, isto é, usar as verbas ou as rendas públicas sem observar a destinação legal. Ocorre quando o agente

emprega os fundos públicos em destino diverso daquele previsto em lei. Pouco importa eventual interesse próprio do agente.

Aqui, ao contrário do que ocorre no peculato, o agente não tem objetivo de locupletar-se à custa do Erário Público. Em realidade, o dinheiro acaba

sendo empregado em proveito da própria Administração. Porém, tal conduta é incriminada por representar uma grave irregularidade administrativa,

comprometendo o normal desenvolvimento da atividade administrativa do Estado.

6.3. sujeito ativo

Só o funcionário público com poder de disposição sobre verbas ou rendas públicas.

Assim, somente podem praticá-lo o Presidente da República, Ministros de Estado, Governadores de Estado, Secretários de Estado, Prefeitos

Municipais, Presidentes ou Diretores de entidades paraestatais, e, em geral os administradores públicos.

É importante observar que neste delito o agente não atua de molde a locupletar-se, ou a outrem, em prejuízo da administração pública, pois os

dinheiros, embora irregularmente, são empregados em benefício desta mesma Administração Pública. No caso dos Prefeitos Municipais, o Dec. Lei nº 201 define

como crime de responsabilidade, punido com detenção, de 3 meses a 3 anos, o ato de desviar, ou aplicar, indevidamente, rendas ou verbas públicas (art. 1º, III).

No que tange ao Presidente da República, Ministros de Estado, Governadores e Secretários de Estado, com supedâneo na lei 1.079/50, a conduta pode

levar ao “impeachment", com perda do cargo. Mas a imposição desta pena de natureza política não exclui o processo e julgamento do acusado por crime

comum, na justiça ordinária.

6.4. sujeito passivo

É o Estado.

6.5. objeto material

São as verbas e as rendas públicas.

Verbas públicas são somas em dinheiro reservadas, na lei orçamentária, para pagamento de determinadas despesas.

Rendas públicas são valores recebidos pelo Erário, qualquer que seja a origem legal.

As verbas públicas, porque destinadas, na lei orçamentária, a despesas específicas, não podem ser aplicadas, total ou parcialmente, em outras despesas.

As rendas públicas, por seu turno, somente podem ser aplicadas através de determinação legal.

6.6. Elemento subjetivo

É o dolo genérico.

Não há forma culposa.

25 RT 458/411

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6.7. consumação e tentativa

O crime se consuma com o efetivo emprego irregular das verbas ou rendas públicas.

Admissível a tentativa.

6.8. ação penal

É pública incondicionada.

7. Concussão:

Art. 316 - Exigir, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida:

Pena - reclusão, de dois a oito anos, e multa.

7. 1. conceito e objetividade jurídica

O crime, nos termos do art. 316 do C. Penal, consiste em "exigir, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de

assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida".

São, assim, elementos do crime: a) uma exigência, direta ou indireta; b) uma vantagem indevida; c) para si ou para outrem (elemento subjetivo do tipo);

d) em razão da função pública, mesmo que fora dela ou antes de assumi-la.

A pena cominada é de reclusão, de dois a oito anos, e multa.

Este crime, cujo "nomen juris" vem do Latim "concutere", que significa o ato de sacudir uma árvore para derrubar os frutos, nada mais é que uma

extorsão praticada por funcionário público, em razão de sua função pública, contra particular.

A essência do crime reside, portanto, no abuso de função por parte do funcionário.

Objeto jurídico da incriminação continua sendo a normalidade funcional do Estado, no exercício de sua função administrativa. Importante a

preservação da moralidade administrativa do Estado.

7.2. ação típica

O núcleo do tipo é o verbo exigir que significa impor, ordenar, obrigar, forçar; a exigência deve criar, no espírito da vítima, o medo de represália

por parte da autoridade26.

A exigência pode ser feita de forma direta, com explícita ameaça, ou de forma indireta, valendo-se o agente de interposta pessoa, ou de velada pressão,

fazendo supor ao particular a legitimidade da exigência, com capciosas sugestões.

Mas a exigência deve guardar relação direta com a função pública27.

Se a exigência, no entanto, beneficiar a própria administração, o crime será o de excesso de exação (§ 1º do art. 316).

A ação típica, repita-se, configura-se no exigir, e não no receber a vantagem indevida. Por isso, como veremos a seguir, a consumação ocorre com a

simples exigência, independentemente de sua aceitação ou não por parte do particular.

7.3. sujeito ativo

Trata-se de crime próprio, que somente pode ser cometido por funcionário público, em razão da função28.

7.4. sujeito passivo

É o Estado, titular do direito lesado pela conduta, ou seja, a normalidade da sua atividade administrativa.

7.5. objeto material

É a vantagem indevida, a vantagem ilícita, sem apoio no Direito. Esta vantagem pode ser imediata ou futura, mas deve ter conteúdo econômico ou

patrimonial.

7.6. elemento subjetivo

Além do dolo genérico, caracterizado pela vontade livre e consciente de praticar a ação típica, o crime exige também o específico, como se vê da

expressão utilizada: "para si ou para outrem". Isto é, a exigência da vantagem indevida deve ser feita em benefício do próprio agente ou de terceiro. Se for em

benefício da própria administração, o crime será outro: excesso de exação.

26 O E. Tribunal de Justiça do Estado já decidiu pela inexistência do crime na conduta de médico do INSS que cobra por cirurgia realizada no paciente. Entendeu a Corte Paulista inexistir a conduta típica de exigir, pois o médico em questão não incutiu medo de represália na vítima. Mesmo porque, quando da cobrança, a cirurgia já havia sido realizada. A cobrança foi irregular, sem dúvida, mas não configurou o crime porque não houve exigência da vantagem indevida (RJTJESP, 131/455).27 "Cumpre que o agente", diz Nelson Hungria, "proceda, franca ou tacitamente, em função de autoridade, invocando ou insinuando a sua qualidade" (op. cit., p. 359).28 Não comete este crime o Inspetor de Quarteirão que exige importância em dinheiro para permitir a evasão de pessoa detida para averiguação. Isto porque não está agindo em razão de função, eis que não possui poder para soltar alguém (RJTJSP, LEX, 41/338).

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7.7. consumação e tentativa

O crime é formal, consumando-se no instante da exigência da indevida vantagem. Pouco importa sobrevenha ou não a vantagem para o agente. Se isto

ocorrer, estaremos diante de simples exaurimento do crime.

Nelson Hungria entende inadmissível a tentativa, pois ou é feita a exigência, quando o crime se consuma, ou não é feita, hipótese em que não há

tipicidade29. Magalhães Noronha, admitindo que isso é o que ocorre geralmente, sustenta viável a tentativa, como no caso da carta que contém a exigência ser

interceptada antes de chegar ao conhecimento do particular. Segundo ele, com a remessa da carta houve início de execução, que não se consumou por

circunstâncias alheias à vontade do agente, ou seja, a interceptação da carta antes de chegar a seu destino30.

8. Excesso de exação

§ 1º - Se o funcionário exige tributo ou contribuição social que sabe ou deveria saber indevido, ou, quando devido, emprega na cobrança meio vexatório ou gravoso, que a lei não autoriza: (Redação dada pela Lei nº 8.137, de 27.12.1990)

Pena - reclusão, de três a oito anos, e multa. (Redação dada pela Lei nº 8.137, de 27.12.1990)§ 2º - Se o funcionário desvia, em proveito próprio ou de outrem, o que recebeu indevidamente para recolher aos cofres públicos:Pena - reclusão, de dois a doze anos, e multa.

8.1. conceito e objetividade jurídica:

O crime consiste em exigir o funcionário, sabendo indevido, tributo ou contribuição social; ou, quando devido, empregar na cobrança meio vexatório

ou gravoso, que a lei não autoriza.

A pena cominada é de reclusão, de três a oito anos, e multa.

8.2. ação típica

Duas as modalidades do crime.

Na primeira, a ação típica centra-se no verbo exigir, que significa intimidar, impor como obrigação; indispensável, portanto, que se crie, no espírito da

vítima, o medo de represália por parte da autoridade. A exigência, também, como já se disse, deve decorrer do exercício de função pública desempenhada pelo

agente. Há, também, como pressuposto, a intenção de recolher ao erário o excesso de arrecadação.

Na segunda, o núcleo é o verbo empregar meio vexatório na cobrança do imposto, da taxa ou do emolumento. Ou seja, embora devido o imposto, a

taxa ou emolumento, o funcionário emprega meio vexatório (humilhante, que causa vergonha), ou gravoso (que acarreta maiores despesas para o particular) que a

lei não autoriza.

8.3. sujeito ativo

É sempre um funcionário público. Trata-se, aqui também, de crime próprio.

8.4. sujeito passivo

É o Estado, titular do bem jurídico lesado. De forma indireta, também pode ser considerado sujeito passivo secundário o particular prejudicado.

8.5. objeto material

É o tributo (imposto, taxa, contribuição de melhoria) ou contribuição social.

8.6. elemento subjetivo

É o dolo genérico.

Na primeira modalidade é indispensável que o agente saiba indevido o imposto. Não basta, assim, o dolo eventual. Não há o crime, portanto, quando o

funcionário supõe, por erro, que o tributo é devido.

8.7. consumação e tentativa

Consuma-se o crime, na primeira modalidade, com a efetiva exigência do imposto, taxa ou emolumento que sabe indevido. Não é preciso, para a

consumação, que ocorra o efetivo recebimento.

Na segunda modalidade, a consumação coincide com o emprego do meio vexatório ou gravoso.

A tentativa é admissível.

8.8. figura qualificada

Nos termos do § 2º deste art. 316, a pena será de reclusão, de 2 a doze anos, além da multa, se o funcionário "desvia, em proveito próprio ou de outrem,

o que recebeu indevidamente para recolher aos cofres públicos".

9. Corrupção passiva

29 op. cit., p. 36030 op. cit., p. 237

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Art. 317 - Solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem:

Pena - reclusão, de 1 (um) a 8 (oito) anos, e multa.Pena - reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa. (Redação dada pela Lei nº 10.763, de 12.11.2003)§ 1º - A pena é aumentada de um terço, se, em conseqüência da vantagem ou promessa, o funcionário retarda ou deixa de praticar qualquer ato de

ofício ou o pratica infringindo dever funcional.§ 2º - Se o funcionário pratica, deixa de praticar ou retarda ato de ofício, com infração de dever funcional, cedendo a pedido ou influência de outrem:Pena - detenção, de três meses a um ano, ou multa.

9.1. Conceito e objetividade jurídica

A corrupção, a venalidade no exercício da função pública, é um dos maiores males da sociedade, e campeia, infelizmente, como um poder dentro do

Estado. O quadro de corrupção praticamente já se sistematizou entre nós. Quase todos os dias os jornais noticiam práticas ilícitas na condução dos negócios

públicos.

O Direito Penal não poderia ficar indiferente a essa praga. Dai a incriminação, neste art. 317, da corrupção passiva.

A corrupção, ou venalidade no exercício da função pública, é passiva quando se tem em vista a conduta do funcionário corrompido. E ativa quando se

considera a atuação do corruptor.

Nosso Direito Penal filiou-se ao sistema que incrimina separadamente as duas condutas, ativa e passiva, não ficando a consumação de qualquer delas

na dependência da consumação da outra. Não se exige convergência de vontades. Dai porque se cuida da corrupção passiva no art. 317, no capítulo dos crimes

cometidos por funcionário público contra a administração em geral, e da corrupção ativa no art. 333, dentro do capítulo relativo aos crimes cometidos por

particular contra a administração pública em geral.

Três as modalidades de crime previstas no art. 317. Na primeira, o agente solicita a vantagem indevida; tem, assim, uma conduta positiva. Na segunda,

ele apenas recebe a vantagem indevida que lhe foi oferecida; sua conduta é, pois, negativa. E na terceira ele aceita promessa de vantagem indevida; também aqui

é negativa sua conduta.

Objeto jurídico do crime é a moralidade da administração pública, atingida com a conduta incriminada.

9.2. Ação típica

Três os núcleos do tipo, porque três as condutas incriminadas.

Solicitar significa pedir, rogar com insistência. O pedido não precisa ser expresso, podendo ser feito de forma manhosa, indireta.

Receber significa aceitar, entrar na posse. A conduta do agente não é ativa, ele não pode, não solicita a vantagem, mas no momento que lhe é oferecida

aceita-a.

Aceitar significa consentir em receber. Também aqui a conduta do agente é negativa. Ele não pode, mas apenas consente em receber a vantagem que

lhe é oferecida.

Indispensável, em qualquer das três hipóteses, que a ação corresponda a um "comércio" da função.

Irrelevante a legitimidade ou ilegitimidade do ato objeto do tráfico, sua justiça ou injustiça, sua licitude ou ilicitude. Haverá o crime tanto na hipótese

de ser normal ou legal o ato praticado, como na hipótese de representar ele violação das funções do funcionário.

O que se pune é a venalidade no exercício da função pública.

Na doutrina costuma-se falar em corrupção própria quando o agente viola seus deveres funcionais, e em corrupção imprópria quando isto não

ocorre.

Mas o ato deve estar compreendido na competência do funcionário, dentro da esfera de suas específicas atribuições funcionais. Em caso contrário não

haverá o crime em estudo31.

A corrupção pode ser, ainda, antecedente ou subseqüente. A primeira ocorre quando o funcionário ainda irá praticar o ato para o qual foi peitado. Na

segunda, o funcionário executa o ato e depois recebe, sem anterior acordo ou promessa, a vantagem indevida ou ilícita.

9.3. Sujeito ativo

É sempre o titular ou exercente de função pública. Observe-se, ainda, que o crime pode ser cometido mesmo fora da função, ou antes de assumi-la,

indispensável apenas que aquelas ações sejam praticadas em razão da função pública.

É por isso que o Escrivão de Polícia, que não tem competência para indiciar quem quer que seja, não comete este crime ao solicitar ou receber

vantagem indevida para não realizar o indiciamento. Essa atribuição é exclusiva da autoridade policial que preside o inquérito, o Delegado de Polícia. E a

corrupção passiva exige, para sua configuração, que o ato objeto do tráfico seja da atribuição do funcionário.

9.4. Sujeito passivo

É sempre o Estado, titular do direito violado com a conduta incriminada.

31 Como na hipótese aventada por CARRARA, citada por Nelson Hungria, do magistrado que não vai julgar a causa, mas que recebe dinheiro para recomendá-la ao colega que a vai decidir, e obter dele a decisão favorável. O crime será o do art. 357, exploração de prestígio, e não o de corrupção passiva.

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9.5. Objeto material

É a vantagem indevida objetivada pelo agente.

Para Nelson Hungria, esta vantagem deve ser patrimonial, representativa de dinheiro ou qualquer outra utilidade material32.

Magalhães Noronha, por sua vez, sustenta que a expressão vantagem deve ser considerada em sentido amplo, ou seja, qualquer vantagem33.

Nelson Hungria adverte que pequenas gratificações, pagas por serviços extraordinários, ou as pequenas gratificações tradicionais de boas-festas de

Natal e Ano Novo, não constituem material de corrupção passiva34.

9.6. Elemento subjetivo

Além do dolo genérico, vontade livre e consciente de praticar a ação típica, o crime exige também o específico (ou elemento subjetivo do tipo),

consistente na intenção especial que move o agente, a saber, de obter a vantagem para si ou para outrem.

Não há o crime, em conseqüência, se o agente, Delegado de Polícia, aceita dinheiro para aquisição de gasolina para a viatura policial, pretendendo com

isso intensificar o policiamento na cidade35.

9.7. Consumação e tentativa

A consumação ocorre com a solicitação ou com o recebimento da vantagem indevida. Ou então com a aceitação de sua promessa.

Cuida-se de crime formal, que se consuma com a prática da conduta. Por isso, é irrelevante que o funcionário pratique ou não o ato funcional

objetivado.

Na modalidade solicitação, a tentativa é possível, como na hipótese de ser feita por escrito. Nas demais modalidades, não, porque ou o agente recebe a

vantagem e o crime já está consumado, ou não recebe, e o fato é irrelevante. Da mesma forma se aceita a oferta da vantagem.

9.8. Forma qualificada

Quando, em conseqüência da vantagem ou promessa de vantagem, o funcionário retarda ou deixa de praticar qualquer ato de ofício, ou o pratica

infringindo dever funcional, a pena é aumentada de um terço (§ 1º).

Trata-se da corrupção própria, em que há exaurimento do crime.

9.9. Figura privilegiada

Quando o funcionário cede a pedido ou a influência de outrem, deixando de praticar ou retardando ato de ofício, ou o pratica com infração de dever

funcional, a pena será de detenção de três meses a um ano, ou multa.

Nesta hipótese, não há solicitação, recebimento ou aceitação de promessa de vantagem.

Nesta hipótese, de corrupção passiva privilegiada, o funcionário não visa qualquer vantagem. Age com infringência de seu dever funcional apenas para

atender pedido de amigos ou de corresponder a desejo de pessoa prestigiosa.

9.10. Concurso de crimes

Haverá concurso material de infrações "se, após aceitarem vantagem indevida em razão da função pública que exercem, promovem os acusados a fuga

da pessoa legalmente presa"36.

Já se decidiu em sentido contrário37.

Também haverá concurso material "se o ato praticado pelo funcionário constitui por si só um crime (ex: arts. 305, 308, 320, etc)."38.

10. Facilitação de contrabando ou descaminho

Art. 318 - Facilitar, com infração de dever funcional, a prática de contrabando ou descaminho (art. 334):Pena - reclusão, de dois a cinco anos, e multa, de um conto a dez contos de réis. Pena - reclusão, de 3 (três) a 8 (oito) anos, e multa. (Redação dada

pela Lei nº 8.137, de 27.12.1990)

32 op. cit., p. 368.33 Segundo ele - referindo-se ao disposto no par. 2º deste art. 317 - "verifica-se ter a lei considerado como corrupção a ação do funcionário que cede ao mero pedido ou a simples influência. Porque não será, pois, corrupção, quando ele agir, promovendo interesse seu ou de outrem, embora não de natureza patrimonial ? Se pune o menos, como não se punir o mais ? Se é corrupto quem cede a simples pedido (desinteressadamente), por que não o será quem busca interesse próprio ? " De conformidade com esse posicionamento, haverá o crime quando o funcionário agir, por exemplo, para gozar dos favores sexuais de uma mulher, ou então para satisfazer um desejo de vingança (op. cit., p. 318).34 op. cit., p. 369.35 RT 527/40636 RT 414/7337 "aqueles que, como guardas de presídio e sob promessa de vantagem indevida, facilitaram a fuga de detentos e por isso foram incluídos como co-autores do delito, não podem responder, também, por corrupção passiva. Aplica-se, à hipótese, o princípio da especialidade. O crime do art. 351 do CP tem caráter específico, ao contrário do ditado pelo art. 317 do mesmo estatuto" (RT 539/270).38 RJTJSP, LEX, 9/566

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10.1. Conceito e objetividade jurídica

O delito, descrito no art. 318, consiste em facilitar, com infração de dever funcional, a prática de contrabando ou descaminho.

Trata-se de crime cometido por funcionário público que infringe dever funcional, e desta forma facilita os delitos de contrabando ou descaminho.

Estamos diante de uma exceção ao princípio unitário do concurso de pessoas. Porque, de acordo com tal princípio, o funcionário que facilita a prática

daqueles delitos deveria ser co-autor dos mesmos. Porém, levando em conta a gravidade desta conduta, relativamente à Administração Pública, houve por bem o

legislador em destacá-la com previsão autônoma.

A objetividade jurídica, portanto, continua sendo a normalidade da atividade administrativa do Estado.

10.2. Ação típica

Centra-se no verbo facilitar, ou seja, ajudar, colaborar naquelas práticas delituosas. Mas, repita-se, com infração de dever funcional.

Portanto, qualquer tipo de colaboração, por parte do servidor incumbido reprimir ou fiscalizar o contrabando, ou de cobrar os tributos aduaneiros, para

que terceiro pratique qualquer daqueles delitos, tipificará o crime em estudo.

10.3. Sujeito ativo

Somente o funcionário público a quem é imposto o dever de reprimir ou fiscalizar o contrabando, ou de cobrar os tributos referentes à entrada e saída

de mercadorias do País pode praticar este crime.

Desta forma, se funcionário público concorre para contrabando praticado por outrem, mas sem infringir dever funcional, será co-autor do crime de

contrabando, e não autor deste delito do art. 318.

10.4. Sujeito passivo

É o Estado.

10.5. Objeto material

É o contrabando e o descaminho.

Contrabando significa importar ou exportar mercadorias total ou parcialmente proibidas de entrar ou sair do país.

Descaminho, por sua vez, significa importar ou exportar mercadorias sem pagar os tributos respectivos.

10.6. Elemento subjetivo

É o dolo genérico.

Não há forma culposa.

10.7. Consumação e tentativa

O crime se consuma com a prática de qualquer ação que signifique facilitação à prática daqueles crimes. Irrelevante a consumação ou não do

contrabando ou descaminho. Importa é a ação de facilitar.

A tentativa é viável apenas quando a facilitação se dá por comissão. Importando em conduta comissiva, obviamente não se há falar em tentativa.

10.8. Ação penal

É pública incondicionada. A competência é da Justiça Federal.

11. Prevaricação

Art. 319 - Retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal:

Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa.

11.1. Conceito e objetividade jurídica

O legislador penal incrimina, neste art. 319, a conduta do funcionário público que retarda ou deixa de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou o

pratica contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal.

O sujeito ativo atua com a finalidade de satisfazer um interesse ou sentimento pessoal.

A pena cominada é de detenção, de três meses a um ano, e multa.

A incriminação desta conduta visa a normalidade do funcionamento da máquina administrativa do Estado, atingida, em dúvida, pelo funcionário que

descumpre sua função para satisfazer interesse ou sentimento pessoal.

11.2. Ação típica

Sob três formas o crime pode ser cometido.

Na primeira, o servidor retarda, injustificadamente, a prática do ato de ofício. Ou seja, não o pratica no momento oportuno.

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Na segunda, deixa de praticar o ato. Em outras palavras, omite-se no cumprimento de seu dever funcional.

Na terceira, ele pratica o ato de ofício contra disposição expressa de lei. Ou seja, pratica-o infringindo dever funcional. Pratica o ato embora haja

mandamento legal em contrário.

Indispensável a presença, nas duas primeiras modalidades, do elemento normativo do tipo - indevidamente -. Se devidos o retardamento ou a omissão,

o fato é atípico. E no último, a disposição expressa de lei.

11.3. Sujeito ativo

Somente o funcionário público.

11.4. Sujeito passivo

É o Estado. Costuma-se apontar, também, como sujeito passivo secundário o particular que sofre lesão com a conduta do funcionário.

11.5. Objeto material

É o ato de ofício, ou seja, aquele que se inclui no complexo das atribuições do servidor público. Pode ser ato administrativo, legislativo ou judicial.

11.6. Elemento subjetivo

Além do dolo genérico, o crime exige também o específico, consistente na finalidade de satisfazer interesse ou sentimento pessoal.

O interesse pessoal a que se refere o texto legal tanto pode ser patrimonial como moral. Porém, sendo patrimonial, para que se apresente o crime de

prevaricação é preciso que não tenha havido pacto anterior (corrupção passiva), nem exigência de vantagem indevida por parte do funcionário (concussão).

Incluem-se, na expressão sentimento pessoal, a afeição, a simpatia, a caridade, o ódio, o desejo de vingança, a paixão política, sempre relacionados a

alguma pessoa.

Não há forma culposa. Desta forma, se o fato decorre de negligência, preguiça ou desídia do funcionário, não haverá o crime, por falta do dolo

específico. O mesmo ocorre com a simples falta funcional.

11.7. Consumação e tentativa

O crime se consuma com a prática de qualquer daquelas condutas típicas. Ou seja, no momento em que o agente retarda a prática do ato; isto é, no

instante em que, devendo praticá-lo, não o pratica, deixando para fazê-lo em momento posterior; também no momento em que deixa de praticá-lo; isto é, quando,

presente a oportunidade, não o concretiza, com a intenção de não mais praticá-lo oportunamente. Finalmente, quando o pratica com infração de dever funcional.

A forma comissiva admite tentativa. As omissivas não.

11. A. Prevaricação imprópria ou especial.

Art. 319-A.  Deixar o Diretor de Penitenciária e/ou agente público, de cumprir seu dever de vedar ao preso o acesso a aparelho telefônico, de rádio ou similar, que permita a comunicação com outros presos ou com o ambiente externo: (Incluído pela Lei nº 11.466, de 2007).

Pena: detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano.

11.A. 1. Conceito e Objetividade jurídica

Esse tipo penal, que a doutrina tem denominado de prevaricação imprópria (em razão da não exigência do elemento subjetivo do tipo, consistente na

intenção de satisfazer interesse ou sentimento pessoal), ou especial (por implicar em infração de um dever específico), eis que a lei n. 11.466/07, que o instituiu,

não apresenta o seu "nomem iuris", tem por objetivo coibir o acesso de presos a aparelhos de telefonia, radio e outros similares, evitando, assim, que possam, de

dentro dos presídios, planejar e coordenar rebeliões e crimes no ambiente externo.

A lei das execuções penais, em seu art. 41, XV, assegura aos presos o direito de comunicação com o mundo exterior, o que pode ser feito por

correspondência escrita, leitura e outros meios de informação. Mas veda a posse de aparelhos que permitam a livre comunicação "intra e extra" muros,

incompatíveis com a segurança e disciplina nos presídios.

O mesmo diploma legal que instituiu esse tipo penal estabelece constituir falta disciplinar de natureza grave a conduta do preso que possui, fornece ou

utiliza referidos aparelhos de comunicação.

A pena cominada é de detenção, de três meses a um ano.

O que se tutela com a incriminação é a regularidade da administração pública no que tange ao funcionamento dos estabelecimentos prisionais.

11.A. 2. Ação típica

O crime, omissivo próprio, centra-se no verbo deixar, que significa não fazer. O agente descumpre, pois, um dever específico, a saber, aquele de

impedir ao preso o acesso àqueles aparelhos.

O dever do funcionário deve estar definido em lei ou regulamento específico, ou mesmo resultar de ordens concretas de superior hierárquico.

Comete o crime o funcionário público que tem esse dever e não o cumpre, deixando de apreender aparelho celular quando encontrado no interior do

estabelecimento prisional ou na posse de um visitante.

11.A. 3. Sujeito ativo

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Trata-se, também aqui, de crime próprio, que somente pode ser cometido por funcionário público.

O tipo penal, depois de se referir ao Diretor de Penitenciária, refere-se também a "e/ou agente público", com o que inclui como sujeito ativo igualmente

diretor ou funcionário de cadeias públicas ou outros estabelecimentos prisionais, desde que tenham como dever vedar ao preso o acesso àqueles equipamentos.

Tratando-se de crime omissivo puro, não admite co-autoria. Assim, se dois funcionários cujo dever funcional inclua o de vedar ao preso aquele acesso,

omitem-se, ambos cometem o delito isoladamente.

A participação, no entanto, é possível, como no caso de induzimento ou instigação.

11.A. 4. Sujeito passivo

É o Estado, titular do bem jurídico regular funcionamento da Administração Pública, relativamente aos estabelecimentos penitenciários.

11.A. 5. Objeto material

É o aparelho telefônico, de rádio ou similar.

11.A. 6. Elemento subjetivo

Basta o dolo genérico. Não se exige, como no crime estudado anteriormente, a intenção de satisfação de interesse ou sentimento pessoal.

Assim, mesmo que o agente se omita para a satisfação de interesse ou sentimento pessoal, o crime será o do art. 319 A, e não o do art. 319. É que

aquele é especial em relação a este.

Não há forma culposa. Desta forma, se o funcionário, agindo com descuido, acaba por permitir que o preso tenha acesso a qualquer daqueles aparelhos,

não há o crime, mas simples infração administrativa.

11.A. 7. Consumação e tentativa

A consumação coincide com o momento da omissão. Ou seja, quando o funcionário, podendo agir para evitar o acesso do preso ao aparelho, não age.

Não há necessidade que o preso venha, efetivamente, a ter acesso ao aparelho. Basta, à consumação, a omissão do dever.

Como se trata de crime omissivo próprio, não há possibilidade de tentativa. É que, ou o funcionário cumpre o seu dever, e não há o crime, ou não

cumpre, e o crime já está consumado.

11.A. 8. Prevaricação imprópria e corrupção passiva privilegiada

O art. 317, § 2º, define como corrupção passiva privilegiada a conduta do funcionário que pratica, deixa de praticar ou retarda ato de ofício, com

infração de dever funcional, cedendo a pedido ou influência de outrem.

À primeira visa parece que a conduta descrita no art. 319-A está contida neste tipo penal, quando o agente cede a pedido ou influencia de outrem. No

entanto, o crime de prevaricação imprópria é especial em relação à corrupção passiva privilegiada, aplicando-se, consequentemente, o princípio da especialidade.

12. Condescendência criminosa

Art. 320 - Deixar o funcionário, por indulgência, de responsabilizar subordinado que cometeu infração no exercício do cargo ou, quando lhe falte competência, não levar o fato ao conhecimento da autoridade competente:

Pena - detenção, de quinze dias a um mês, ou multa.

12.1. Conceito e objetividade jurídica

Duas as formas pelas quais o funcionário público pode cometer este crime. Na primeira, tomando conhecimento de infração cometida pelo

subordinado, e tendo competência para responsabilizá-lo, por indulgência, deixa de fazê-lo. Na segunda, sabendo da infração cometida pelo subordinado, mas não

tendo competência para responsabilizá-lo, deixa, por indulgência, de levar o fato ao conhecimento da autoridade competente.

A pena cominada é de detenção, de 15 dias a 1 mês, ou multa.

Trata-se de conduta que atinge a dignidade e a eficiência da máquina administrativa, dada a falta funcional que a compromete. A objetividade jurídica,

portanto, continua sendo a normalidade da atividade administrativa do Estado.

12.2. Ação típica

Duas as condutas incriminadas no texto legal:

a) na primeira, o agente deixa de responsabilizar o funcionário subalterno que comete infração no exercício do cargo. Em outras palavras, o agente,

embora tenha competência para tal, não promove a apuração da falta funcional do subalterno, e nem lhe aplica qualquer penalidade;

b) na segunda, o agente, não tendo competência para punir, deixa de levar a infração cometida por subordinado, no exercício do cargo, ao

conhecimento da autoridade competente para tal.

Indispensável que entre o agente e o funcionário que comete a infração haja relação de subordinação hierárquica.

12.3. Sujeito ativo

Somente o funcionário público que seja superior hierárquico do outro, que comete infração no exercício do cargo.

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12.4. Sujeito passivo

É o Estado.

12.5. Objeto material

É a infração disciplinar cometida pelo funcionário subalterno.

12.6. Elemento subjetivo

Além do dolo genérico, o crime exige o específico: a indulgência (clemência, misericórdia, pena, tolerância, condescendência, benevolência). Exige-

se, pois, uma finalidade específica na conduta omissiva do agente: a indulgência, a tolerância.

12.7. Consumação e tentativa

Consuma-se o crime com a omissão.

A tentativa é inadmissível por se tratar de crime omissivo próprio.

13. Advocacia Administrativa

Art. 321 - Patrocinar, direta ou indiretamente, interesse privado perante a administração pública, valendo-se da qualidade de funcionário:Pena - detenção, de um a três meses, ou multa.Parágrafo único - Se o interesse é ilegítimo:Pena - detenção, de três meses a um ano, além da multa.

13.1. Conceito e objetividade jurídica

O crime, definido no art. 321 do C. Penal, exige: a) o patrocínio perante a administração pública; b) de forma direta ou indireta; c) de interesse privado;

d) que o agente se valha, para isso, de sua qualidade de funcionário públicao.

É o crime do funcionário público que, violando dever funcional, patrocina, direta ou indiretamente, perante a Administração, interesse privado,

valendo-se desta sua qualidade. Com esta conduta, atinge a normalidade da atividade administrativa do Estado. Atenta, também, contra a própria dignidade da

função pública. Dai a incriminação, em defesa da Administração Pública como um todo.

13.2. Ação típica

Centra-se no verbo patrocinar, que significa advogar, apadrinhar interesse alheio. Embora o "nomen juris" seja advocacia administrativa, não se exige

que o autor seja advogado. O patrocínio tem o significado de promoção de defesa.

O patrocínio pode ocorrer em qualquer repartição, não precisando ser naquela que o servidor trabalha. Contudo, é indispensável que para tal se valha

de sua qualidade de servidor público.

O patrocínio será direto quando exercido pelo próprio funcionário, e indireto quando através de interposta pessoa.

Pouco importa seja justo ou injusto, legal ou ilegal, o interesse particular patrocinado. Mas este interesse deve ser de terceira pessoa, não do próprio

agente.

Sendo indireto o patrocínio, a interposta pessoa através da qual ele se dá, será co-autora do crime.

Contudo, se esta interposta pessoa também for funcionário público, que cede ao pedido do colega, ou à sua influência, faltando a dever funcional, o

crime cometido será o do art. 317, § 2º (corrupção passiva privilegiada).

13.3. Sujeito ativo

Somente o funcionário público.

13.4. Sujeito passivo

É o Estado.

13.5. Objeto material

É o interesse privado patrocinado pelo funcionário. Compreende qualquer vantagem ou ganho a ser obtido pelo particular.

Pouco importa, para a configuração do crime, que o interesse privado seja legítimo ou ilegítimo, justo ou injusto. A ilegitimidade, no entanto, qualifica

o crime.

13.6. Elemento subjetivo

É o dolo genérico. Não há forma culposa.

13.7. Consumação e tentativa

Com a prática do primeiro ato de patrocínio o crime se consuma. A tentativa é admissível.

13.8. Qualificadora

Se o interesse particular patrocinado for ilegítimo, a pena será de detenção de três meses a um ano, além da multa, conforme o parágrafo único. Maior,

como se vê, que aquela prevista para a forma simples, no caput.

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14. Violência arbitrária

Art. 322 - Praticar violência, no exercício de função ou a pretexto de exercê-la:Pena - detenção, de seis meses a três anos, além da pena correspondente à violência.

14.1. Conceito e objetividade jurídica

A primeira questão que se coloca, quando do estudo deste dispositivo legal, é saber se foi ou não derrogado pela lei 4898/65, que define os crimes de

abuso de autoridade, e que prevê, em seu art. 3º, letra "i", como infração penal, qualquer "atentado à incolumidade física do indivíduo".

Ora, a expressão atentado à incolumidade física abrange, sem dúvida, a prática de violência.

Dai sustentarem alguns doutrinadores, entre os quais Heleno Fragoso, Damásio de Jesus, Guilherme Nucci e Rogério Grecco, a insubsistência desse art.

322 do Código Penal frente àquela lei 4898/65.

Magalhães Noronha, Celso Delmanto e André Estefam, no entanto, têm posição contrária, a saber, pela subsistência do art. 322.

O Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento pela vigência desse dispositivo legal.

O que se tutela, com a incriminação, é, mais uma vez, a normalidade da função administrativa do Estado, nos particulares aspectos da probidade e da

moralidade. Esse, pois, o objeto jurídico do crime.

14.2. Ação típica

Centro do tipo é a expressão "praticar violência", ou seja, agir com violência no exercício da função ou a pretexto de exercê-la. O termo "violência"

significa emprego de força física, material, a "vis corporalis".

A violência deve ser arbitrária, desprovida de legitimidade. A violência, quando autorizada pela lei, e desde que se situe no estrito limite da

necessidade, não configura o crime. É o que ocorre quando o policial, para efetivar uma prisão, usa de força.

As vias de fato e as lesões corporais leves incluem-se no tipo. Já a lesão grave implica em punição autônoma.

Indispensável que a violência seja exercida no exercício da função pública, ou a pretexto de exercê-la.

14.3. Sujeito ativo

Trata-se de crime próprio, cujo sujeito ativo é sempre um funcionário público.

O particular, no entanto, pode concorrer para o ato, incidindo nas penas a ele cominadas, na forma dos arts. 29 e 30 do diploma penal.

14.4. Sujeito passivo

É o Estado. Secundariamente, também a pessoa que sofre a violência.

14.5. Elemento subjetivo

É o dolo genérico.

14.6. Consumação e tentativa

O crime se consuma no momento em que a violência é empregada.

A tentativa é possível.

15. Abandono de função

Art. 323 - Abandonar cargo público, fora dos casos permitidos em lei:Pena - detenção, de quinze dias a um mês, ou multa.§ 1º - Se do fato resulta prejuízo público:Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa.§ 2º - Se o fato ocorre em lugar compreendido na faixa de fronteira:Pena - detenção, de um a três anos, e multa.15.1. Conceito e objetividade jurídica

O que o legislador tutela, com essa incriminação, é a normalidade da atividade administrativo do Estado, que fica abalada, prejudicada, com o

abandono do cargo.

O crime consiste em abandonar cargo público, fora dos casos permitidos em lei.

15.2. Ação típica

Centra-se no verbo abandonar, que significa deixar ao desamparo, pressupondo, segundo magistério de Nelson Hungria, a conseqüente acefalia do

cargo, isto é, inexistência ou ocasional ausência de substituto legal39. Magalhães Noronha, por sua vez, subordina o abandono é possibilidade de dano ou prejuízo

à administração40.

39 op. cit., p. 391.40 op. cit., p. 285

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O abandono deve ser por prazo razoável, juridicamente relevante. E, também, deve ocorrer fora dos casos permitidos em lei (força maior; doença,

etc.).

Se o funcionário pede exoneração do cargo, deve permanecer em exercício até o deferimento de seu pedido. Porém, se é exonerado pela administração,

pode afastar-se de imediato.

15.3. Sujeito ativo

Somente o funcionário público ocupante de cargo público. Não se aplica a este crime a regra do art. 327, que amplia o conceito de funcionário

público.

15.4. Sujeito passivo

É o Estado.

15.5. Objeto material

É o cargo público, cujo conceito já foi estudado.

É bom lembrar que todo cargo público possui função, mas há função sem cargo.

15.6. Elemento subjetivo

É o dolo genérico. O agente deve atuar com consciência que está abandonando cargo público, sem qualquer justificativa.

Não há forma culposa.

15.7. Consumação e tentativa

A consumação ocorre com o efetivo abandono do cargo, desde que presente a probabilidade de dano.

A tentativa não é possível.

15.8. Formas qualificadas

Se por força do abandono do cargo ocorrer prejuízo público, a pena será de detenção de três meses a um ano e multa, nos termos do § 1º.

Se o abandono ocorre em lugar compreendido na faixa de fronteira, a pena será de detenção de um a três anos e multa, conforme estabelece o § 2º.

16. Exercício funcional ilegalmente antecipado ou prolongado

Art. 324 - Entrar no exercício de função pública antes de satisfeitas as exigências legais, ou continuar a exercê-la, sem autorização, depois de saber oficialmente que foi exonerado, removido, substituído ou suspenso:

Pena - detenção, de quinze dias a um mês, ou multa.

16.1. Conceito e objetividade jurídica

A conduta incriminada atenta contra a normalidade da atividade administrativa do Estado. Esse o objeto jurídico.

De duas formas pode o crime ser cometido: a) entrando no exercício de função pública antes de satisfeitas as exigências legais; b) continuando no seu

exercício, sem autorização, depois de saber oficial de sua exoneração remoção, substituição ou suspensão.

16.2. Ação típica

Duas as formas de cometimento do crime:

a) na primeira, o agente entra no exercício da função pública antes de satisfazer as exigências legais; trata-se de norma penal em branco, pois o tipo

penal se complementa com as normas que estabelecem as exigências legais para o início do exercício (posse, por exemplo); indispensável, pois, que o agente já

tenha sido nomeado.

b) na segunda, o agente continua a exercer a função pública mesmo depois de saber, oficialmente, que foi exonerado, removido, substituído ou

suspenso. Indispensável, nesta hipótese, que o agente tenha conhecimento pessoal e direto de quaisquer daquelas circunstâncias. Precisa, pois, ser pessoalmente

notificado, não bastando mera publicação pela imprensa. A existência de autorização para a continuidade do exercício exclui a ilicitude da conduta.

16.3. Sujeito ativo

Somente o funcionário público.

16.4. Sujeito passivo

É o Estado.

16.5. Objeto material

É a função pública, cujo conceito já foi estudado.

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16.6. Elemento subjetivo

É o dolo genérico.

Não há forma culposa.

16.7. Consumação e tentativa

Consuma-se o crime com a prática de qualquer ato de ofício, antes de satisfeitas as exigências legais para o exercício da função pública, ou depois da

exoneração, remoção, substituição ou suspensão.

Admissível a tentativa.

17. Violação de sigilo funcional (art. 325):

Art. 325 - Revelar fato de que tem ciência em razão do cargo e que deva permanecer em segredo, ou facilitar-lhe a revelação:Pena - detenção, de seis meses a dois anos, ou multa, se o fato não constitui crime mais grave.§ 1o Nas mesmas penas deste artigo incorre quem: (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)I - permite ou facilita, mediante atribuição, fornecimento e empréstimo de senha ou qualquer outra forma, o acesso de pessoas não autorizadas a

sistemas de informações ou banco de dados da Administração Pública; (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)II - se utiliza, indevidamente, do acesso restrito. (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)§ 2o Se da ação ou omissão resulta dano à Administração Pública ou a outrem: (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)Pena - reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos, e multa. (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)

17.1. Conceito e objetividade jurídica

O delito em estudo consiste em revelar fato de que tem ciência em razão do cargo e que deva permanecer em segredo, ou facilitar-lhe a revelação. A

pena cominada é alternativa, detenção ou multa, se o fato não constitui crime mais grave.

Como se percebe, trata-se de crime subsidiário. Assim, se a conduta importar em espionagem ou revelação de segredo com ofensa à Segurança

Nacional, o delito será o dos arts. 13, 14 e 21 da lei 7.170/83 - Lei de Segurança Nacional. Implicando em violação de correspondência epistolar, o delito será o do

art. 151, § 3º.

A objetividade jurídica ainda é a normalidade da função administrativa do Estado, atingida com tal conduta. Justifica-se a disposição com a

necessidade de se manter certos fatos em segredo, por parte da Administração Pública. Os fatos que devem ser mantidos em segredo devem constar de disposição

expressa de lei, de regulamento, ou de ordem administrativa.

17.2. Ação típica

Duas as condutas incriminadas:

a) revelar o fato, significando dar conhecimento a terceiro. Revelar significa contar, narrar a terceiro. É indispensável que o segredo tenha chegado ao

conhecimento do agente em razão do cargo. Indispensável, pois, a existência de um nexo causal entre a ciência do segredo e o exercício funcional. Se isso não

ocorrer, não haverá o crime.

b) facilitar a revelação, significando tornar fácil, dolosamente, a descoberta do fato que deve permanecer em segredo por terceira pessoa. É o que

ocorre, exemplificativamente com o funcionário que, agindo com dolo, não guarda devidamente documento sigiloso, possibilitando, desta forma, seu

conhecimento por terceira pessoa.

17.3. Sujeito ativo

Sempre o funcionário público. O crime é próprio.

Até mesmo o funcionário aposentado pode ser sujeito ativo, pois ainda frui vantagens do cargo, pelo que fica vinculado às obrigações que a lei lhe

impõe.

17.4. Sujeito passivo

O Estado.

17.5. Objeto material

É o fato que deve permanecer em segredo.

Mas o segredo há de se referir a um interesse público relevante; em outras palavras, é preciso que sua revelação cause dano ou perigo de dano à

Administração Pública41. Se a manutenção do segredo for de interesse particular, não haverá este crime, podendo se tipificar o do art. 154.

A violação do sigilo de provas em Universidade Pública configura este delito, pois o segredo se relaciona com um interesse público de relevo.

17.6. Elemento subjetivo

É o dolo genérico. Não punição a título de culpa.

17.7. Consumação e tentativa

41 JTACrimSP, 73/183

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A consumação ocorre no instante em que o segredo é revelado, ou no momento em que o agente, por alguma forma, facilita seu conhecimento por

parte do terceiro. Depende, em ambas as hipóteses, a consumação, de tomar o terceiro, efetivamente, conhecimento do segredo.

A tentativa é possível quando a conduta é praticada por escrito.

17.8. Violação do sigilo funcional de sistemas de informações

O § 1º do art. 325 contempla duas hipóteses em que o agente se sujeita às mesmas penas definidas no caput.

Na primeira, o agente permite ou facilita o acesso de pessoas não autorizadas a sistemas de informações ou a banco de dados da Administração. Na

segunda, o agente facilita esse acesso, contribui para que ele ocorra.

Os meios de execução estão previstos no tipo penal, ou seja, as condutas devem ser praticadas mediante atribuição, fornecimento ou empréstimo de

senha ou por qualquer outra forma análoga. A conduta pode ser comissiva ou omissiva.

Na segunda, o funcionário público se utiliza do acesso restrito, ou seja, faz uso não autorizado do acesso restrito ao sistema ou ao banco de dados.

O elemento subjetivo destas duas modalidades é o dolo genérico.

17.9. Forma qualificada

Se da ação ou omissão do funcionário resultar dano à Administração ou a outrem, a pena será de reclusão, de dois a seis anos e multa , nos termos do §

2º.

17.10. Concurso de crimes

Se o agente, ao revelar o segredo, ou para revelá-lo, praticar uma das condutas do art. 317 (corrupção passiva), ou seja, solicitar, receber ou aceitar

promessa de vantagem, estará incurso também nas penas deste crime, em concurso formal.

18. Violação de sigilo de proposta de concorrência

Art. 326 - Devassar o sigilo de proposta de concorrência pública, ou proporcionar a terceiro o ensejo de devassá-lo:Pena - Detenção, de três meses a um ano, e multa.

18.1. Conceito e objetividade jurídica

O delito, definido no art. 326 do C. Penal, consiste em devassar o sigilo de proposta de concorrência pública, ou proporcionar a terceiro o ensejo de

devassá-lo. A pena é de detenção, de três meses a um ano, de multa.

Este dispositivo legal, no entanto, está revogado pelo art. 94 da lei 8.666/93, que cuida das licitações, de redação semelhante: "Devassar o sigilo de

proposta apresentada em procedimento licitatório, ou proporcionar a terceiro o ensejo de devassá-lo". A pena cominada foi elevada: detenção de dois a três anos, e

multa.

Cuida-se, em realidade, de modalidade especial do crime de violação de sigilo profissional, destacada pelo legislador, com previsão autônoma, dada

sua importância.

A objetividade jurídica é a Administração Pública, no particular aspecto da relevância do procedimento licitatório.

18.2. Ação típica

Também é dupla, da mesma forma que no delito anterior.

a) devassar o sigilo de proposta apresentada em procedimento licitatório significa tomar conhecimento indevido de seu conteúdo. Não é necessário

que o envelope contendo a proposta seja aberto. Basta que seu conteúdo seja devassado, isto é, conhecido indevidamente pelo funcionário público.

b) proporcionar a terceiro o conhecimento do conteúdo significa praticar qualquer ação tendente a este resultado; permitir que o terceiro o devasse;

seja por ação, seja por omissão.

A devassa deve ocorrer durante a apresentação das propostas, pois o conhecimento da proposta de outro concorrente pode fraudar o espírito da

concorrência, quebrando a igualdade que deve norteá-la. Terminado o período da apresentação das propostas, o ato de devassar qualquer delas é inócuo, pois não

podem elas ser alteradas.

18.3. Sujeito ativo

O funcionário público que tem função específica no processo licitatório, como o recebimento das propostas, sua guarda, etc. Deve a conduta do

servidor relacionar-se diretamente com o procedimento licitatório.

18.4. Sujeito passivo

O Estado. Eventualmente, de forma indireta, os particulares que sofrerem prejuízo com a conduta incriminada.

18.5. Objeto material

É a proposta apresentada em procedimento licitatório, cujo sigilo deve ser resguardado. A licitação, como se sabe, é procedimento adotado pela

Administração que tem o objetivo de propiciar-lhe a melhor contratação, bem assim garantir igualdade de tratamento entre todos os interessados.

Sua base, portanto, é o sigilo das propostas apresentadas pelos concorrentes. Sem tal sigilo, a licitação torna-se inútil. Dai a incriminação.

18.6. Elemento subjetivo

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É o dolo genérico. Não há forma culposa.

18.7. Consumação e tentativa

O crime se consuma com a prática de qualquer daquelas condutas incriminadas, sendo viável a tentativa.

Porém, se a licitação vier a ser anulada posteriormente, mas por motivo diverso, ou seja, não pelo devassamento, haverá exclusão do crime.

18.8. Ação penal

O procedimento criminal está previsto no art. 83 da lei 8.666, sendo certo, ainda, que o funcionário por ele condenado, ainda que na forma tentada, está

sujeito também à perda do cargo, emprego, função ou mandato eletivo.

CRIMES PRATICADOS POR PARTICULAR CONTRA A

ADMINISTRAÇÃO EM GERAL

Os crimes que serão estudados a seguir, ao contrário daqueles do capítulo anterior, são sempre praticados pelo particular. Crimes comuns, portanto; os

do capítulo anterior, como vimos, são todos próprios.

19. Usurpação de função pública

Art. 328 - Usurpar o exercício de função pública:Pena - detenção, de três meses a dois anos, e multa.Parágrafo único - Se do fato o agente aufere vantagem:Pena - reclusão, de dois a cinco anos, e multa.

19.1. Conceito e objetividade jurídica

O crime consiste em usurpar o exercício de função pública. A pena é de detenção, de três meses a dois anos, e multa.

Se o agente, do fato aufere vantagem, a pena será de reclusão, de dois a cinco anos, além da multa, conforme dispõe o parágrafo único do art. 328.

A normalidade da atividade administrativa do Estado, atingida com a conduta incriminada, é o objeto jurídico do crime.

Esclareça-se que neste crime o particular não tem qualquer expectativa de ocupar legalmente cargo ou função pública; mas sim atua como se fosse

funcionário público, praticando atos inequívocos perante os administrados, de modo fraudulento. Diversamente do que ocorre no crime do art. 324, em que o

agente antecipa o exercício da função pública, sem o prévio preenchimento das exigências legais, ou então continua a exercê-la após ser exonerado, sem a devida

autorização.

19.2. Ação típica

Consiste em usurpar o exercício da função pública; isto é, exercê-la indevidamente; intrometer-se no aparelhamento legal, praticando ato que não lhe

compete.

Advirta-se que em determinados casos o particular pode, ainda que se investidura legal, exercer função pública, como decorrência de preceito legal. É

o que ocorre, exemplificativamente, com o particular que prende alguém em flagrante. O que se pune, neste art. 328, é a assunção ilegítima, indevida, ilegal, de

uma função pública.

É indispensável a prática efetiva de ato relativo à função pública42, não bastando a mera jactância43. Neste caso poderá se tipificar a contravenção

penal do art. 45 da lei respectiva.

19.3. Sujeito ativo

Normalmente, é o particular. Mas o funcionário público que exerce função que não lhe compete também pode ser sujeito ativo deste crime44 .

Neste sentido também a doutrina de Magalhães Noronha45.

Há, no entanto, decisões em sentido contrário46.

19.4. Sujeito passivo

42 "Usurpação de função pública - Caracterização - Paciente embriagado, que empunhando arma e intitulando-se policial federal, invade bar, passando em revista os presentes e submetendo-os a maus tratos, obtendo, ainda, bebidas sem pagamento - Embriaguez alegada - Inadmissibilidade - Voluntariedade do ato que não elide a responsabilidade - Absorção da contravenção, entretanto, pela prática delituosa - Condenação decretada (RJTJESP 47/380). "Configura os crimes de usurpação de função pública e de constrangimento ilegal o ato de quem, a pretexto de ser policial, a serviço, porém, de empresa particular, mediante violência, procura investigar sobre alcance praticado contra aquela e atribuído a empregado" (RT 533/316).43 "Usurpação de função pública - Delito não caracterizado - Acusado que se intitula detetive - Inexistência do cargo no organismo policial do Estado - absolvição decretada - Inteligência do art. 328 do CP - "Para que haja o crime de usurpação de função pública é mister que o agente se faça passar por ocupante de um cargo, função ou emprego que realmente existe, graças ao qual pratique atos a ele pertinentes, com a vontade deliberada de exercê-lo, sem que no entanto tenha sido regularmente nele investido" (RT 401/309)44 RT 533/316; 402/5645 Direito Penal, Saraiva, 20ª ed., vol. 4, pg. 29246 RT 490/283 e 687/305

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É o Estado, titular do bem jurídico atingido.

19.5. Objeto material

É o exercício de função pública. O crime exige, portanto, que o agente efetivamente exerça indevidamente uma função pública. Indispensável, pois, a

prática de pelo menos um ato inerente à função. Não basta dizer-se titular da função pública.

19.6. Elemento subjetivo

É o dolo genérico. Não há forma culposa.

19.7. Consumação e tentativa

Consuma-se o crime com a simples prática de qualquer ato indevido, e que seja inerente a uma função pública.

A tentativa é admissível.

20. Resistência

Art. 329 - Opor-se à execução de ato legal, mediante violência ou ameaça a funcionário competente para executá-lo ou a quem lhe esteja prestando auxílio:

Pena - detenção, de dois meses a dois anos.§ 1º - Se o ato, em razão da resistência, não se executa:Pena - reclusão, de um a três anos.§ 2º - As penas deste artigo são aplicáveis sem prejuízo das correspondentes à violência.

20.1. conceito e objetividade jurídica

O crime consiste em resistir à execução de ato legal, mediante violência ou ameaça a funcionário competente para executá-lo ou a quem lhe esteja

prestando auxílio.

A pena cominada é de detenção, de dois meses a dois anos.

São elementos do crime em estudo: a) uma oposição ativa à execução de um ato oficial; b) o emprego de violência ou ameaça; c) a qualidade de

funcionário competente da vítima para a execução do ato; d) a legalidade (formal e substancial) do ato a executar; e) dolo genérico e específico.

A objetividade jurídica é a normalidade da atividade administrativa do Estado, no particular aspecto da necessidade de se preservar o princípio da

autoridade e o prestígio da função pública, atingidos pela ação típica.

20.2. Ação típica

Núcleo do tipo é o verbo opor-se, que significa resistir à execução do ato. Esta oposição deve ter um caráter ativo. A simples desobediência, ou a

resistência passiva, não configuram o crime. Assim, negar-se a abrir a porta da casa para o Policial, ou agarrar-se a um poste para não ser preso, não configura o

crime de resistência.

Indispensável o emprego de violência ou ameaça contra o executor do ato. O emprego de força física, ou de ameaça, constitui elemento essencial ao

tipo.

Magalhães Noronha47 entende que a violência deve ser exercida sobre o executor do ato ou seu auxiliar. Nelson Hungria 48, por sua vez, admite também

a violência exercida contra coisa, como na hipótese de se derrubar a escada que o policial pretende usar para cumprir mandado de prisão; ou de se matar cavalo

utilizado pelo Policial na perseguição de um criminoso.

Outro requisito essencial do crime é que o executor do ato seja um funcionário público ou auxiliar deste. Também é preciso que o funcionário tenha

competência para a execução do ato. A proteção ao assistente deriva do fato de ser ele um "longa manus" do assistido. Mas é indispensável a presença do assistido

no local.

Veja-se que, se o sujeito passivo da resistência for um popular que prende alguém em flagrante, não haverá o crime em estudo, embora no exercício de

uma função pública. É que a regra do art. 329 apenas se aplica quando se trata de sujeito ativo.

Algumas hipóteses do crime de resistência: opor-se ao cumprimento de mandado de prisão, ao cumprimento de mandado de busca e apreensão, ao

cumprimento de mandado de despejo, à execução de penhora, à vistoria por perito judicial.

20.3. sujeito ativo

Qualquer pessoa. Trata-se de crime comum, não exigindo o tipo penal nenhuma qualidade especial do sujeito ativo.

20.4. sujeito passivo

É o Estado, titular do bem jurídico violado. Mas também o funcionário público com competência para a prática do ato, e contra quem a resistência é

exercida deve ser considerado sujeito passivo. Igualmente o terceiro que auxilia o funcionário na execução do ato legal deve ser considerado sujeito passivo do

crime. Este auxílio, no entanto, deve ser supletivo.

47 op. cit., p. 297.48 op. cit., p. 409.

22

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Quando é o particular quem pratica, sozinho, sem a presença de funcionário público, o ato legal (como na prisão em flagrante delito, nos termos do art.

301 do CPP), a resistência a este ato não configura o crime de resistência, pois o tipo penal do art. 329 faz referência a ato legal de funcionário competente para

executá-lo.

Já se decidiu que a oposição, mediante violência ou ameaça, a ato legal praticado por guarda municipal, porque membro de Corporação que exerce

função delegada e pública49, configura o crime de resistência.

A configuração do crime exige, também, que o funcionário, no momento da prática do ato, esteja no efetivo exercício de suas funções. Se estiver de

folga no momento em que pratica o ato legal (prisão em flagrante, por exemplo), a resistência, ainda que com violência ou ameaça, não configura o crime em

estudo.

20.5. objeto material

É o ato legal cuja execução se pretende impedir. A legalidade, substancial e formal do ato, constitui elemento essencial do crime.

A legalidade formal diz respeito à roupagem do ato, a seu aspecto exterior, à forma ou meio de sua execução. A legalidade substancial, por sua vez, se

refere a seu conteúdo intrínseco, à própria ordem a ser executada.

Ilegalidade formal haverá, por exemplo, na busca pessoal sem a fundada suspeita que a autoriza. Será substancial a ilegalidade quando faltar ao

executor competência para a execução do ato.

Costuma-se questionar quanto à existência de um direito de resistência quando o ato é ilegal. Para alguns, este direito não existe. Prevalece o princípio

da obediência passiva ou absoluta, independentemente da legalidade ou ilegalidade do ato oficial. Ampara os agentes do poder público uma presunção de

legalidade, razão pela qual os administrados devem se submeter à autoridade e depois, em sendo o caso, reclamar perante o seu superior hierárquico ou Tribunais.

Para outros, adeptos da teoria ultraliberal, não somente há o direito, como também o dever de se opor à ordem ilegal. Aquele que se curva diante do

arbítrio, da ilegalidade, está contribuindo para a generalização deste mal. Aquele que resiste ao ato ilegal age não só em defesa de si próprio, mas também da

própria coletividade.

Uma terceira corrente, moderada, defende a legitimidade da resistência quando o ato é flagrantemente ilegal. Esta a orientação de Nelson Hungria que

adverte, no entanto, que "não se deve confundir a ilegalidade material do ato oficial com a injustiça da decisão de que este deriva. Uma vez que o ato seja

regular na sua forma e se funde "in thesi" em preceito legal, já não é permitida a resistência"50.

20.6. Elemento subjetivo

É o dolo genérico, caracterizado pela vontade livre e consciente de praticar a ação típica, ou seja, opor-se à execução de um ato legal, com o emprego

de violência ou ameaça.

Indispensável que o agente tenha consciência da legalidade do ato. Na dúvida quanto à legalidade, ocorrerá o dolo eventual.

No entanto, ocorrendo erro quando à legalidade do ato, mesmo que culposo, não haverá o dolo.

No que tange à relevância da embriaguez na aferição do elemento subjetivo, a jurisprudência é bastante controvertida. Três as correntes que se

formaram.

A primeira corrente considera a embriaguez irrelevante51. De fato, a legislação penal brasileira, de forma expressa, estabelece que a embriaguez

voluntária ou culposa do agente, não exclui a responsabilidade penal.

A segunda corrente diverge totalmente52. Segundo seus adeptos, a embriaguez é incompatível com o elemento subjetivo do crime de resistência.

A terceira sustenta posição intermediária, ou seja, a embriaguez apenas é relevante quando o agente não tem condições de compreender o caráter ilícito

de sua conduta, ou de determinar-se de acordo com esse entendimento 53. Em outras palavras, quando o agente está completamente tomado pela intoxicação

alcoolica.

20.7. Consumação e tentativa

O crime se consuma com o emprego da violência ou ameaça contra o funcionário ou seu assistente. Cuida-se de crime formal, pelo que é irrelevante

que o sujeito ativo consiga ou não obstar o cumprimento da ordem. Basta, assim, a oposição, com emprego de violência ou ameaça.

A tentativa é admissível.

49 RT 357/20750 op. cit., p. 415.51 "É suficiente à configuração do delito de resistência conduzir-se o agente com dolo genérico. Assim, irrelevante à consumação do crime, encontrar-se o meliante em estado de ebriedade" (RT 430/380, 370/219, 368/258, 368/243, 601/381).

52 "A embriaguez do agente não permite atribuir-lhe intenção dolosa, sem a qual o delito de resistência não se integra " (RT 401/309, 368/242, 350/383, 427/422)."Não impede a caracterização dos delitos de desacato e de resistência o fato de o agente haver bebido ou se achar embriagado; a embriaguez só elide a presença do dolo específico quando infirme a consciência das atitudes " (RT 382/227, 113/821).

53 "Não impede a caracterização dos delitos de desacato e de resistência o fato de o agente haver bebido ou se achar embriagado; a embriaguez só elide a presença do dolo específico quando infirme a consciência das atitudes " (RT 382/227, 113/821).

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20.8. Figura qualificada

Se em razão da resistência o ato não se executa, a pena passará a ser de reclusão, de l a 3 anos. É o que consta do § 1º do art. 329.

Para que incida este aumento de pena é necessário que o funcionário não consiga vencer, efetivamente, a resistência 54. Não haverá a qualificadora se o

funcionário desiste da prática do ato por falta de emprenho, à menor dificuldade.

20.9. Concurso de crimes

Segundo regra do § 2º, haverá concurso material entre a resistência e eventual lesão corporal ou homicídio decorrentes do emprego da violência. Mas

as vias de fato são absorvidas pela resistência.

O crime de ameaça, no entanto, é absorvido pela resistência.

21. Desobediência

Art. 330 - Desobedecer a ordem legal de funcionário público:Pena - detenção, de quinze dias a seis meses, e multa.

21.1. Conceito e objetividade jurídica

O crime, como se vê do tipo penal, consiste em desobedecer a ordem legal de funcionário público.

A pena cominada é de detenção de 15 dias a seis meses, além da multa.

Embora a desobediência encerre uma verdadeira resistência à ordem legal do funcionário público, o certo é que não se confunde com a resistência, que

exige o emprego de violência ou ameaça. O mesmo não ocorre na desobediência, em que há uma resistência passiva ou, quando comissiva, desacompanhada de

violência física ou moral.

A objetividade jurídica continua sendo a normalidade da atividade administrativa do Estado, tendo em vista a necessidade de se preservar o princípio

da autoridade e o prestígio da função pública.

21.2. Ação típica

O núcleo do tipo é o verbo desobedecer, que significa não atender, deixar de cumprir55, não se submeter à ordem legal. A desobediência pode ocorrer

através de um ato positivo ou de um ato negativo. Quando a ordem for para fazer alguma coisa, a desobediência se dá através de um não fazer. Quando a ordem

for para não fazer alguma coisa, a desobediência ocorre através de um fazer, uma conduta positiva do agente.

É importante considerar que ninguém está obrigado a fazer ou não fazer alguma coisa senão em virtude de lei. É o princípio da legalidade, insculpido

na Constituição Federal.

O crime de desobediência, portanto, exige que a ordem seja legal, como veremos a seguir, emanada de autoridade competente.

Saliente-se que tanto doutrina como jurisprudência estão concordes em que havendo lei não penal prevendo penalidade administrativa, civil ou

processual, para o não cumprimento da ordem, não se configura o crime de desobediência. É o que ocorre, exemplificativamente, com a testemunha faltosa no

processo civil, de vez que a lei específica prevê, para esse caso, a condução coercitiva e o pagamento das custas da diligência, sem qualquer ressalva relativamente

ao crime de desobediência.

O mesmo não ocorre no processo penal, em que o art. 219 prevê a aplicação do crime de desobediência à testemunha faltosa, sem prejuízo de outras

sanções administrativas e processuais56.

Essa regra, no entanto, aplica-se somente á testemunha; não à vítima, ao indiciado e ao réu.

Assim, a testemunha que regularmente intimada não comparece para depor: a) no processo penal, comete o crime de desobediência; b) não processo

civil, não comete o crime de desobediência.

21.3. Sujeito ativo

Qualquer pessoa. Normalmente, é o particular, até porque o crime está no capítulo dos crimes praticados por particular contra a Administração Pública.

O funcionário público, quando não está no exercício de suas funções, também pode ser sujeito ativo do crime.

54 "as gravíssimas conseqüências penais da figura qualificada não podem advir do ânimo timorato, da tibiez ou da displicência do servidor público; só se há de reconhecer o par. 1º quando o funcionário não consegue dominar a resistência e tem de desertar ou ceder em face da violência material ou constrangimento" (RT 410/301).

55 "Responde pelo delito do art. 330 do CP o comerciante que, embora advertido da proibição de venda de bebida alcoólica em dia de eleição, reitera a prática no mesmo dia" (JUTACRIM, 46/354)."Responde por desobediência o motorista que, interpelado por policial, deixa de atender ordem de parar o veículo que dirige" (JUTACRIM, 70/254).56 No processo penal, face ao disposto no art. 219 do código respectivo, a testemunha faltosa sujeita-se à prisão administrativa, pagamento das custas da diligência, e a processo penal por crime de desobediência. Já o mesmo não ocorre no processo civil, porque o art. 412 do diploma processual civil diz que a testemunha faltosa será conduzida coercitivamente, pagando as custas da diligência, sem qualquer ressalva quanto ao crime de desobediência.

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No entanto, estando no exercício de suas funções, não cometerá este crime, podendo haver, se o caso, o crime de prevaricação no descumprimento de

ordem legal de outro funcionário público57.

21.4. Sujeito passivo

É o Estado. Também o expedidor da ordem desobedecida pode ser considerado sujeito passivo secundário.

21.5. objeto material

É a ordem legal. Também aqui a legalidade abrange os aspectos formal e material. Deve, ainda, emanar de autoridade competente. Indispensável,

assim, o exame da competência de quem expede a ordem e de quem a executa.

Deve se tratar de ordem, não bastando pedido ou solicitação. A ordem deve ser direta a expressamente dirigida ao agente, sendo fundamental que este

tenha conhecimento inequívoco dela. Sem isto não haverá o crime.

Além disso, indispensável que o destinatário da ordem tenha o dever jurídico de obedecer.

Por último, o conceito de funcionário público que emite a ordem é aquele do Direito Administrativo, e não o do art. 327 do C. Penal.

21.6. Elemento subjetivo

Basta o dolo genérico. Indispensável que o sujeito ativo tome conhecimento da ordem e saiba que ela emana de funcionário e que é legal 58 59. Este dolo

genérico há de ser deduzido de circunstâncias objetivas, de atos inequívocos, a indicarem, sem dúvida, o propósito do agente de se contrapor à ordem legal da

autoridade60.

Testemunha regularmente intimada que não comparece para depor no processo penal, por se equivocar quanto à data, não comete o crime por falta do

elemento subjetivo, ou seja, vontade e consciência de desobedecer.

21.7. Consumação e tentativa

Quando a ordem legal é para a prática de um ato, a consumação ocorre no instante em que o agente deixa de praticá-lo, vencido o prazo para tal.

Quando é para a abstenção, no instante em que o agente o pratica.

A tentativa é admissível na forma comissiva. Não na omissiva61.

21.8. Desobediência a atos normativos

A desobediência a atos normativos (Portarias, Avisos, Circulares, Editais) apenas configura o crime quando o agente tem inequívoca ciência dos

mesmos. Indispensável o dolo genérico, caracterizado pela vontade de desobedecer à ordem legal, sabendo-a expedida por funcionário competente.

22. Desacato (art. 331)

Art. 331 - Desacatar funcionário público no exercício da função ou em razão dela:Pena - detenção, de seis meses a dois anos, ou multa.

22.1. Conceito e objetividade jurídica

O crime consiste em desacatar funcionário público no exercício da função ou em razão dela.

A pena cominada é de detenção, de seis meses a dois anos, ou multa.

A normalidade funcional da administração pública, no particular aspecto da dignidade e do prestígio da função pública, é o objeto jurídico do crime.

O funcionário público é considerado um instrumento da vontade soberana do Estado. É por isso que a lei lhe confere uma especial proteção,

objetivando o normal funcionamento da máquina administrativa.

22.2. Ação típica

Centra-se no verbo desacatar, que significa desprezar, humilhar, ofender, menosprezar, vilipendiar. Configura-se por qualquer palavra ou gesto que

caracterize um menosprezo, um vexame ao funcionário público: palavras injuriosas, caluniosas, difamatórias, vias de fato, ameaças, gestos obscenos.

Mas a crítica, ou a censura, sem intenção de vilipendiar, não tipifica o desacato.

Por outro lado, o desacato deve dirigir-se a funcionário público:

a) no exercício da função, isto é, quando praticando ato de ofício decorrente de sua função, dentro ou fora da sede da repartição;

b) ou em razão dela, isto é, quando a ofensa, embora praticada quando o funcionário não está no exercício da função, relaciona-se a ela.

57 Mas, "na conceituação do crime capitulado no art. 330 do CP equipara-se ao particular o funcionário que não age nessa qualidade, isto é, em cujos deveres funcionais não se inclui o cumprimento da ordem" (RT 519/416).58 Magalhães Noronha, ob. Cit., vol. 4, pg. 30459 Hungria, ob. Cit., pg. 41760 RT 375/28761 Damásio Evangelista de Jesus, Direito Penal, Saraiva, 6ª ed., vol. 4, pg. 304.,

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Exige-se a presença do funcionário para a caracterização do crime; mas não é necessário que a ofensa seja irrogada face a face, bastando que, estando a

vítima próxima do ofensor, perceba a ofensa.

Não há desacato, assim, através de telefone, em petição ou razões de recurso. No caso poderá haver crime contra a honra.

Não se exige que o desacato seja presenciado por terceiro, de vez que a publicidade não é elemento do tipo.

Configuram desacato; tentar agredir funcionário público no exercício de suas funções; dirigir palavras de baixo calão ao funcionário público; fazer

gestos desrespeitosos ao funcionário público; gritar com o funcionário público; amassar e jogar ao chão, ou rasgar, auto de infração que está sendo lavrado; fazer

o mesmo com contra-fé fornecida por Oficial de Justiça.

Não importa que o funcionário se sinta ou não ofendido. O que configura o crime é o ato objetivo da ofensa.

Indispensável também o nexo funcional, ou seja, o funcionário deve estar, quando desacatado, no exercício de suas funções.

A ofensa por carta, por via telefônica ou pela imprensa, não constitui desacato, porque não proferida na presença do funcionário. Em tais casos, poderá

haver crime contra a honra.

22.3. Sujeito ativo

Tratando-se de crime comum, qualquer pessoa pode cometê-lo. Normalmente, sujeito ativo é o particular.

O funcionário público, desde que não esteja no exercício de suas funções, também pode ser sujeito ativo de desacato.

Controverte-se sobre a possibilidade do crime quando praticado por funcionário público contra funcionário público.

Uma corrente sustenta orientação negativa, ao argumento de que, estando o crime inserido no capítulo daqueles cometidos por particulares contra a

Administração Pública em Geral, somente o estranho poderá ser o seu autor. Se for funcionário público, a conduta não configurará o delito de desacato, mas sim

infração autônoma (injúria, lesão, ameaça, etc.).

Na doutrina, é esta a orientação de Nelson Hungria62. Neste sentido algumas decisões63.

A segunda corrente admite a possibilidade desde que o sujeito ativo seja hierarquicamente subordinado ao funcionário desatacado.

A terceira corrente admite a possibilidade em qualquer caso, não exigindo a subordinação hierárquica. Esta é a orientação de Julio Fabbrini Mirabete64.

No que tange ao advogado65, não se pode excluí-lo do rol de pessoas que podem praticar o crime de desacato.

22.4. Sujeito passivo

É o Estado. Secundariamente, também o funcionário público ofendido.

22.5. Objeto material

É o funcionário público ofendido.

22.6. Elemento subjetivo

Além do dolo genérico, o crime exige também o específico, consistente na finalidade especial de desprestigiar a função pública do ofendido. O agente

deve estar consciente da presença do funcionário e da sua condição.

Neste sentido a jurisprudência dominante, havendo, no entanto, decisões no sentido de que basta o dolo genérico.

Quanto à embriaguez, a questão também é controvertida, valendo aqui o que foi dito relativamente ao crime de desobediência.

22.7. Consumação e tentativa

A consumação ocorre com a prática da ofensa, sendo de todo irrelevante que o funcionário se julgue ou não ofendido.

A tentativa é admissível, conforme o meio empregado.

22.8. Concurso de crimes

Se a ofensa consiste em injúria verbal, difamação, vias de fato, ameaça ou lesão corporal leve, a pena será exclusivamente a do art. 331.

No entanto, se consistir em calúnia, que no caso será qualificada (art. 141, § 2º), ou lesão corporal grave (cujas penas são mais graves que a do

desacato), haverá um concurso formal de crimes.

Assim, o desacato absorve a infração penal cometida em sua execução se menos grave a pena. Do contrário, haverá um concurso formal de infrações.

23. Tráfico de Influência

62 ob. Cit., 63 RT 452/384, 397/286, 487/28964 op. cit., p. 357.65 "O advogado, no efetivo exercício da profissão e na defesa de suas prerrogativas, não comete o crime de desacato ao se insurgir, ainda que de forma grosseira, contra ordem de investigador, impedindo-o de assistir interrogatório de cliente em dependência da delegacia" (JUTACRIM 80/191) "Mera desinteligência, no tocante à orientação da causa, entre promotor e advogado, não constitui o elemento integrativo do delito de desacato pois inexiste o propósito que lhe é imanente, de ultrajar o funcionário público" (RT 374/288) "A imunidade conferida pelo Estatuto da OAB não acoberta advogado para desacatar servidor do Fórum e rasgar, atirando ao lixo, documento público assinado por Juiz" (RT 718/474)

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Art. 332 - Solicitar, exigir, cobrar ou obter, para si ou para outrem, vantagem ou promessa de vantagem, a pretexto de influir em ato praticado por funcionário público no exercício da função: (Redação dada pela Lei nº 9.127, de 1995)

Pena - reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa. (Redação dada pela Lei nº 9.127, de 1995)Parágrafo único - A pena é aumentada da metade, se o agente alega ou insinua que a vantagem é também destinada ao funcionário. (Redação dada

pela Lei nº 9.127, de 1995)

23.1. Conceito e objetividade jurídica

O crime consiste em solicitar, exigir, cobrar ou obter, para si ou para outrem, vantagem ou promessa de vantagem, a pretexto de influir em ato

praticado por funcionário público no exercício da função.

A pena cominada é de reclusão, de dois a cinco anos, e multa. Esta pena, nos termos do parágrafo único deste art. 332, é aumentada de metade, se o

agente alega ou insinua que a vantagem é também destinada ao funcionário.

Convém observar que o legislador, no art. 357, incrimina, de forma específica, a conduta do particular que solicita ou recebe dinheiro ou qualquer

utilidade a pretexto de influir em Magistrado, jurado, órgão do Ministério Público, funcionário da justiça, perito, intérprete ou testemunha, tentando, assim, influir

no resultado de uma ação judicial. Cuida, ali, da tutela da administração da justiça. A disposição é, portanto, específica.

Já neste art. 332, a incriminação, genérica, se faz em tutela da administração pública em geral. É, como diz Magalhães Noronha, a venda de "fumo" ou

"fumaça" que o agente realiza, iludindo o comprador, mas desacreditando o prestígio da Administração Pública.

O que se tutela, com a incriminação, é o normal desenvolvimento da atividade administrativa do Estado, vulnerada em sua credibilidade com a conduta

em estudo.

23.2. Ação típica

Várias as condutas incriminadas: solicitar; exigir; cobrar; obter.

Solicitar significa pedir; exigir significa impor, obrigar; cobrar significa pedir algo como pagamento; obter significa receber, adquirir.

Estas condutas se relacionam com uma vantagem, ou promessa de vantagem, que constitui o objeto material do crime, a ser estudado logo mais.

Essa vantagem e essa promessa de vantagem devem estar ligadas a um pretexto: o de influir em funcionário público no exercício da função.

Pretexto significa "razão aparente ou imaginária, desculpa". Indispensável, pois, que o agente alardeie ter prestígio junto ao servidor. Mas não é

necessário que o agente indique o nome do servidor em relação ao qual possui o prestígio alegado.

Também é irrelevante a licitude ou ilicitude do fraudado.

É preciso observar que havendo, de fato, conluio com o funcionário público, o crime será o de corrupção (ativa e passiva). Porque então não se poderá

falar em pretexto.

23.3. Sujeito ativo

Qualquer pessoa, por se tratar de crime comum.

23.4. Sujeito passivo

O Estado, como titular do bem jurídico tutelado.

23.5. Objeto material

É a vantagem, ou promessa de vantagem, podendo esta ser material ou moral.

23.6. Elemento subjetivo

Além do dolo genérico, o crime exige também o específico, como se vê da expressão utilizada no tipo: "para si ou para outrem".

Não há forma culposa.

237. Consumação e tentativa

A consumação coincide com a solicitação, a exigência, a cobrança ou a obtenção da vantagem ou de sua promessa. Não há necessidade de obter o

agente a vantagem objetivada para a consumação.

A tentativa é possível.

24. Corrupção ativa

Art. 333 - Oferecer ou prometer vantagem indevida a funcionário público, para determiná-lo a praticar, omitir ou retardar ato de ofício:Pena - reclusão, de 1 (um) ano a 8 (oito) anos, e multa.Pena - reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa. (Redação dada pela Lei nº 10.763, de 12.11.2003)Parágrafo único - A pena é aumentada de um terço, se, em razão da vantagem ou promessa, o funcionário retarda ou omite ato de ofício, ou o pratica

infringindo dever funcional.

24.1. Conceito e objetividade jurídica

O crime consiste em oferecer ou prometer vantagem indevida a funcionário público, para determiná-lo a praticar, omitir ou retardar ato de ofício.

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A pena cominada é de reclusão, de dois a doze anos, além da multa. Esta pena é aumentada de um terço se, em razão da vantagem ou promessa, o

funcionário retarda ou omite ato de ofício, ou o pratica infringindo dever funcional (parágrafo único do art. 333).

A tutela penal tem em vista a necessidade de resguardar a administração pública desta conduta, que atenta contra sua moralidade.

24.2. Ação típica

Dois os núcleos do tipo: a) oferecer, que significa por à disposição, apresentar para que seja aceito; e b) prometer, significando obrigar-se a dar,

futuramente, alguma coisa.

Tanto o oferecimento como a promessa de vantagem devem ser inequívocos.

Estas duas condutas devem objetivar a prática, omissão ou retardamento de ato de ofício. Assim, se a vantagem for oferecida após a prática do ato, sem

anterior promessa, não se há falar no crime de corrupção ativa.

Recorde-se que ato de ofício é aquele inserido nas atribuições funcionais do servidor.

Se houve imposição do funcionário, antes da prática do ato, a submissão do particular, aceitando-a, não configura o crime, havendo apenas concussão

por parte do funcionário.

24.3. Sujeito ativo

Qualquer pessoa, inclusive o funcionário público, desde que despido de suas funções.

24.4. Sujeito passivo

É o Estado.

24.5. Objeto material

É a vantagem indevida, ou seja, não prevista em lei. Essa vantagem não precisa ser patrimonial, podendo ser de qualquer ordem, inclusive promessas

de natureza sexual.

24.6. Elemento subjetivo

Além do dolo genérico, o crime exige também o específico, consistente na intenção específica que move o agente, ou seja, de levar o funcionário a

praticar, omitir ou retardar o ato de ofício.

Não há forma culposa.

24.7. Consumação e tentativa

Ocorre a consumação quando o oferecimento ou a promessa chegam ao conhecimento do funcionário público, independentemente de serem ou não

aceitas. Trata-se de crime formal, ou de consumação antecipada.

A tentativa, em tese, é admissível.

25.8. Aumento de pena

Se em razão da vantagem ou promessa o funcionário retarda ou omite ato de ofício, ou o pratica infringindo dever funcional, a pena será aumentada de

um terço, nos termos do parágrafo único.

Estamos diante de uma hipótese de exaurimento do crime.

26. Contrabando ou descaminho

Art. 334 Importar ou exportar mercadoria proibida ou iludir, no todo ou em parte, o pagamento de direito ou imposto devido pela entrada, pela saída ou pelo consumo de mercadoria:

Pena - reclusão, de um a quatro anos.§ 1º incorre na mesma pena quem pratica:

        a) navegação de cabotagem, fora dos casos permitidos em lei;        b) fato assimilado em lei especial a contrabando ou descaminho.        § 2º A pena aplica-se em dobro, se o crime de contrabando ou descaminho é praticado em transporte aéreo.

§ 1º - Incorre na mesma pena quem: (Redação dada pela Lei nº 4.729, de 14.7.1965)a) pratica navegação de cabotagem, fora dos casos permitidos em lei; (Redação dada pela Lei nº 4.729, de 14.7.1965)b) pratica fato assimilado, em lei especial, a contrabando ou descaminho; (Redação dada pela Lei nº 4.729, de 14.7.1965)c) vende, expõe à venda, mantém em depósito ou, de qualquer forma, utiliza em proveito próprio ou alheio, no exercício de atividade comercial ou

industrial, mercadoria de procedência estrangeira que introduziu clandestinamente no País ou importou fraudulentamente ou que sabe ser produto de introdução clandestina no território nacional ou de importação fraudulenta por parte de outrem; (Incluído pela Lei nº 4.729, de 14.7.1965)

d) adquire, recebe ou oculta, em proveito próprio ou alheio, no exercício de atividade comercial ou industrial, mercadoria de procedência estrangeira, desacompanhada de documentação legal, ou acompanhada de documentos que sabe serem falsos. (Incluído pela Lei nº 4.729, de 14.7.1965)

§ 2º - Equipara-se às atividades comerciais, para os efeitos deste artigo, qualquer forma de comércio irregular ou clandestino de mercadorias estrangeiras, inclusive o exercido em residências.  (Redação dada pela Lei nº 4.729, de 14.7.1965)

§ 3º - A pena aplica-se em dobro, se o crime de contrabando ou descaminho é praticado em transporte aéreo. (Incluído pela Lei nº 4.729, de 14.7.1965)

26.1. Conceito e objetividade jurídica

28

Page 29: 1 - Crimes Contra a Administracao Publica - Resumido

29

O crime, descrito no art. 334 do C. Penal, consiste em importar ou exportar mercadoria proibida ou iludir, no todo ou em parte, o pagamento de direito

ou imposto devido pela entrada, pela saída ou pelo consumo de mercadoria. A pena cominada é de reclusão, de 1 a 4 anos.

A tutela, aqui, se faz em defesa do controle da entrada e saída de mercadorias do território nacional, de suma importância para a atividade

administrativa, e também tendo em conta o interesse da Fazenda Nacional.

26.2. Ação típica

São duas as figuras delituosas. Na primeira, pune-se o contrabando; na segunda, o descaminho.

Contrabando é a importação ou exportação de mercadoria proibida. O agente traz para o território nacional, ou leva para fora dele, mercadoria proibida.

A proibição pode ser absoluta, quando a proibição se relaciona com a própria mercadoria (drogas, literatura e filmes obscenos), ou relativa, quando vigora

somente em determinadas circunstâncias. De fato, às vezes o Governo, por razões várias, proibe a importação de certas mercadorias.

Em se tratando de contrabando, estamos diante de uma norma penal em branco, de vez que há necessidade de uma norma não penal indicando quais as

mercadorias de importação ou exportação proibidas.

A ação típica, na primeira figura, centra-se nos verbos importar, que significa trazer para dentro do país, e exportar, que significa levar para fora do

pais.

Descaminho, por sua vez, é o não pagamento do tributo devido quando da importação, da exportação, ou do consumo de mercadoria.

Nesta segunda figura núcleo do tipo é o verbo iludir, no sentido de não pagar o direito ou imposto devido pela entrada, saída, ou consumo da

mercadoria.

26.3. Sujeito ativo

Qualquer pessoa. Havendo funcionário público a colaborar com a conduta, estará ele cometendo o delito do art. 318, já estudado.

26.4. Sujeito passivo

É o Estado.

26.5. Objeto material

É a mercadoria, importada, exportada, ou consumida. Mercadoria é qualquer coisa móvel, nova ou usada, que pode ser apropriada e objeto de

comercialização.

26.6. Elemento subjetivo

É o dolo genérico.

Não há forma culposa.

26.7. Consumação e tentativa

Consuma o crime no momento em que a mercadoria entra ou sai do território nacional; sendo ela proibida, ou no momento em que o direito ou tributo

deveria ser pago e não o é.

A tentativa é possível.

26.8. Figuras assimiladas

O § 1º prevê diversas condutas assemelhadas, àquelas do tipo central, cominando-lhes a mesma pena.

I- A prática de navegação de cabotagem fora dos casos permitidos em lei também sujeita o seu autor às penas do art. 334, caput. Navegação de

cabotagem é a navegação costeira. Existe lei regulando a navegação costeira entre portos brasileiros, a qual estabelece critérios a serem seguidos. A infração penal

consiste, pois, na sua prática fora daqueles casos previstos em lei. Trata-se de norma penal em branco, pois a tipicidade depende da regulamentação de outra

norma não penal.

II- Também submete o seu autor às mesmas penas do art. 334, caput, a prática de fato assimilado, em lei especial, a contrabando ou descaminho. Outra

norma penal branco. Porque existem leis, como aquela que regula a Zona Franca de Manaus, que assimila fatos a contrabando ou descaminho. Desta forma, a

entrada ou saída de mercadorias da Zona Franca, sem o pagamento do imposto respectivo, constitui o crime de descaminho.

III- O uso comercial ou industrial de mercadoria que o próprio agente importou ou introduziu, ou que sabe ser produto de contrabando ou descaminho

igualmente implica no crime de contrabando ou descaminho. Se quem pratica essa conduta assemelhada é a mesma pessoa que importou ilegalmente a

mercadoria, responderá apenas pelo delito do parágrafo, absorvido o tipo do caput. No segundo caso, quando quem faz uso comercial ou industrial não é a pessoa

que importou ilegalmente, o legislador pena prevê um caso especial de receptação, que absorve o ilícito do art. 180, caput. É indispensável, no entanto, que o

agente tenha conhecimento da origem irregular da mercadoria. A lei exige o dolo direito, não se contentando com o eventual. A habitualidade é requisito deste

tipo penal, em razão da expressões utilizadas pelo legislador, comércio exercido. Não bastam, portanto, uma ou duas vendas esporádicas.

IV- Nas mesmas penas incorre quem adquire, recebe ou oculta, em proveito próprio ou alheio, no exercício de atividade comercial ou industrial,

mercadoria de procedência estrangeira, desacompanhada de documentação legal, ou acompanhada de documentos que sabe serem falsos. Tais condutas devem ser

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praticadas no exercício de atividade comercial ou industrial, sendo indispensável que o agente tenha conhecimento da origem ilícita da mercadoria. Este o crime

cometido pelo comercial que é surpreendido com mercadorias contrabandeadas em sua loja.

26.9. Equiparação às atividades comerciais

O § 2º equipara às atividades comerciais, para os efeitos deste artigo, qualquer forma de comércio irregular ou clandestino de mercadorias estrangeiras,

inclusive o exercido em residências.

26.10. Via aérea

A pena será dobrada sem o crime for praticado em transporte aéreo, estabelece o § 3º.

O transporte aéreo, no caso, é aquele clandestino. A agravante decorrer da maior dificuldade de fiscalização, dificuldade esta que não existe nos voos

regulares.

26.11. A extinção da punibilidade pelo pagamento do tributo

O Dec. Lei 157, de 10/2/67, previa a extinção da punibilidade, pelo pagamento do tributo, antes do início da ação penal, nos crimes decorrentes de não

pagamento de tributos. A súmula 560, do STF, por sua vez, mandava aplicar a regra ao crime de contrabando ou descaminho. Contudo, a lei 6.910, de 27/5/81, de

forma expressa, excluiu da hipótese o crime de contrabando ou descaminho. Via de conseqüência, aquela súmula passou a ser aplicável apenas aos crimes

cometidos antes de 27 de maio de 1981. Posteriormente, a lei 9.249, de 26/12/1995, em seu art. 34, previu a extinção da punibilidade "dos crimes definidos na lei

8.137, de 27 de dezembro de 1990, e na lei 4.729, de 14 de julho de 1965, quando o agente promover o pagamento do tributo ou contribuição social, inclusive

acessórios, antes do recebimento da denúncia". Como a Segunda das leis citadas já estava revogada, a extinção se aplicaria apenas à lei 8.137. Tem-se entendido,

então, que a restrição contida nesta lei 9.249/95 não se sustenta, constituindo clara ofensa ao princípio constitucional da isonomia, devendo-se a cochilo ou

despreparo do legislador. Desta forma, tem prevalecido a orientação que entende extinguir a punibilidade o pagamento do tributo antes da denúncia também em se

tratando do crime em estudo.

26.12. Receptação de coisa contrabandeada

Existem duas correntes a respeito da existência ou não do crime de receptação, relativamente a mercadorias contrabandeadas:

a) Inexiste receptação, pois a regra do art. 334, par. 1º, letra "d", é especial em relação àquela do art. 180, "caput", do C. Penal. Aplica-se, pois, o

princípio da especialidade. Se uma das condutas previstas neste § 1º, letra "d", ocorre em atividade comercial ou industrial, este será o crime cometido; se não

ocorre no exercício de atividade comercial ou industrial, haverá apenas ilícito fiscal.

b) Pode haver receptação, dolosa ou culposa, de mercadorias contrabandeadas.

26.13. Ação Penal

É pública incondicionada. E a competência é da Justiça Federal.

27. Impedimento, perturbação ou fraude de concorrência

Art. 335 - Impedir, perturbar ou fraudar concorrência pública ou venda em hasta pública, promovida pela administração federal, estadual ou municipal, ou por entidade paraestatal; afastar ou procurar afastar concorrente ou licitante, por meio de violência, grave ameaça, fraude ou oferecimento de vantagem:

Pena - detenção, de seis meses a dois anos, ou multa, além da pena correspondente à violência.Parágrafo único - Incorre na mesma pena quem se abstém de concorrer ou licitar, em razão da vantagem oferecida.

27.1. Conceito e objetividade jurídica

O Cód. Penal incriminava, no seu art. 335, a conduta consistente em impedir, perturbar ou fraudar concorrência pública ou venda em hasta pública,

promovida pela administração federal, estadual ou municipal, ou por entidade paraestatal; afastar ou procurar afastar concorrente ou licitante, por meio de

violência, grave ameaça, fraude ou oferecimento de vantagem. A pena cominada era de detenção, de seis meses a dois anos, ou multa, além da pena

correspondente à violência.

Ocorre, no entanto, que a lei 8.666, de 21/6/93, que instituiu normas para licitações e contratos, em seus arts. 93 e 95 disciplinou integralmente a

matéria. Assim é que no art. 93 incriminou a conduta de "impedir, perturbar ou fraudar a realização de qualquer ato de procedimento licitatório" com a pena de

detenção, de 6 meses a 2 anos, e multa. E, no art. 95 incriminou a conduta de "afastar ou procurar afastar licitante, por meio de violência, grave ameaça, fraude

ou oferecimento de vantagem de qualquer tipo", com a pena de detenção, de 2 a 4 anos, e multa, além da pena correspondente à violência. Como se percebe, o art.

93 transcreveu, em linhas gerais, a primeira parte do art. 335 do C. Penal. E o art. 95, "ipsis literis", a segunda parte deste artigo.

Por isso, sustentam Damásio E. de Jesus66 e Julio Fabbrini Mirabete67 que este art. 335 do C. Penal está inteiramente revogado pelos arts. 93 e 95 da lei

8.666. Os fatos continuam típicos, mas na lei especial, e não mais no C. Penal.

Há quem sustente, no entanto, que a revogação foi apenas parcial, eis que a lei de licitações abrange apenas a concorrência pública, deixando de fora a

hasta pública68, em relação à qual permaneceria em vigor o Cód. Penal.

66 op. cit., p. 21167 op. cit., p. 375.68 Hasta pública é a venda judicial feita pelo porteiro dos auditórios forenses ou por oficial de justiça designado para isso (Vocabulário Jurídico, De Plácido e Silva, p. 393).

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No entanto, a "hasta pública" está compreendida nas alienações judiciais, em relação às quais há tipo específico, o do art. 358.

A conduta é incriminada tendo em vista a necessidade de proteger o patrimônio público, um dos elementos indispensáveis à normalidade da atividade

administrativa. Porque a concorrência pública tem o objetivo de possibilitar à administração contratar, adquirir ou vender bens em melhores condições.

27.2. Ação típica

Duas as figuras descritas neste art. 335.

Na primeira, o tipo centra-se nos verbos impedir (não deixar realizar), perturbar (atrapalhar) e fraudar (usar de artifício ou ardil para que o ato não

atinja suas finalidades específicas). Tais condutas devem se relacionar com qualquer ato de procedimento licitatório promovido pela administração pública, em

qualquer de suas esferas, federal, estadual ou municipal. Não abrange, pois, as praças realizadas em juízo, que são objeto do art. 358.

Na segunda, o agente afasta ou procura afastar concorrente ou licitante, por meio de violência, grave ameaça, fraude, ou oferecimento de

vantagem.

27.3. Sujeito ativo

Qualquer pessoa.

27.4. Sujeito passivo

O Estado.

27.5. Objeto material

A ação típica expressa pelos verbos na primeira figura recai sobre o procedimento licitatório, que constitui, em conseqüência, o seu objeto material.

Licitação é um procedimento administrativo que tem por objetivo garantir o melhor serviço e o melhor preço nas contratações efetuadas pela

Administração Pública, para realização de obras, serviços ou aquisição de bens. Há várias espécies de licitação: concorrência, tomada de preços, convite, concurso

e leilão69.

Já as ações típicas da segunda figura recaem sobre o licitante, ou seja, aquele que participa do procedimento licitatório, qualquer que seja ele. Aqui,

então, o licitante é o objeto material.

27.6. Elemento subjetivo

É o dolo genérico, na primeira figura. Na segunda figura, exige-se também o dolo específico, que é a intenção de afastar o licitante.

Não há forma culposa.

27.7. Consumação e tentativa

Na primeira figura, a consumação coincide com a prática de qualquer daquelas condutas. Na segunda, com o emprego de qualquer daqueles meios que

visam o afastamento, sendo irrelevante que este ocorra ou não.

A tentativa é admissível.

27.8. Concurso de crimes

Por disposição expressa de lei, haverá concurso material entre este crime e o resultante da violência.

27.9. Corrupção passiva de concorrente

Nos termos do parágrafo único do art. 95 da lei 8666, incorre nas mesmas penas do "caput" a pessoa que se abstém ou desiste de concorrer ou licitar

em razão da vantagem oferecida.

28. Inutilização de edital ou de sinal

Art. 336 - Rasgar ou, de qualquer forma, inutilizar ou conspurcar edital afixado por ordem de funcionário público; violar ou inutilizar selo ou sinal empregado, por determinação legal ou por ordem de funcionário público, para identificar ou cerrar qualquer objeto:

Pena - detenção, de um mês a um ano, ou multa.

28.1. Conceito e objetividade jurídica

O crime consiste em rasgar ou, de qualquer forma, inutilizar ou conspurcar edital afixado por ordem de funcionário público; ou violar ou inutilizar selo

ou sinal empregado, por determinação legal ou por ordem de funcionário público, para identificar ou cerrar qualquer objeto. A pena é de detenção de um mês a

um ano, ou multa.

O que se tutela é a administração pública, atingida em sua normalidade com as condutas incriminadas.

28.2. Ação típica

Duas as figuras previstas neste art. 336.

69 Art. 22, caput, da lei 8.666/93

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a) Na primeira, o agente rasga (lacera, corta) ou, de qualquer forma, inutiliza (torna inútil) ou conspurca (suja, mancha, macula, tornando-o

ilegível) edital70 afixado por ordem de funcionário público71.

b) Na segunda, o agente viola (rompe, quebra) ou inutiliza (torna inútil) selo ou sinal empregado, por determinação legal ou por ordem de

funcionário público, para identificar ou cerrar qualquer objeto72.

Indispensável que o selo ou sinal sejam exigíveis por lei, ou que tenham sido utilizados pelo funcionário competente para identificar ou lacrar qualquer

objeto.

Assim, não comete tal crime o particular que rasga tira de papel afixada na porta de sua casa por Oficial de Justiça como anúncio de seu despejo.

Necessário, também, que o edital e o sinal ainda estejam em validade. Se já vencido o prazo de validade do edital, portanto, não haverá o crime.

Por último, trata-se de tipo misto cumulativo. Assim, se o agente rasga um edital, e ao depois rompe um sinal colocado, por determinação legal, para

fechar determinado objeto, cometerá dois crimes, em concurso material73.

28.3. Sujeito ativo

Qualquer pessoa. Até mesmo o funcionário público que determinou a afixação do edital ou do selo74.

28.4. Sujeito passivo

O Estado.

28.5. Objeto material

São o edital e o selo ou sinal.

Edital é o "ato pelo qual se faz publicar pela imprensa, ou nos lugares públicos, certa notícia, fato ou ordem, que deva ser divulgada ou difundida,

para conhecimento das próprias pessoas nele mencionadas, como de quantas outras possam ter interesse no assunto, que nele se contém "75. O Edital (edital de

casamento, o edital de citação, o edital de concorrência pública, o edital de concurso, etc) pode ser administrativo, judicial ou legislativo.

Selo, no sentido do texto legal, significa "a marca, ou sinal pequeno que se põem, ou se apõem às coisas, para as assinalar, as identificar, ou as tornar

invioláveis"76. Sinal, por sua vez, é "a firma, ou a assinatura das pessoas signatárias do documento, ou do tabelião"77.

28.6. Elemento subjetivo

É o dolo genérico. Indispensável que o agente saiba que o edital emanou de autoridade competente, ou que o selo ou sinal também.

Não há forma culposa.

28.7. Consumação e tentativa

Consuma-se o crime com a prática de qualquer daquelas condutas incriminadas. A tentativa é viável.

29. Subtração ou inutilização de livro ou documento

Art. 337 - Subtrair, ou inutilizar, total ou parcialmente, livro oficial, processo ou documento confiado à custódia de funcionário, em razão de ofício, ou de particular em serviço público:

Pena - reclusão, de dois a cinco anos, se o fato não constitui crime mais grave.

29.1. Conceito e objetividade jurídica

O crime se configura com o subtrair, ou inutilizar, total ou parcialmente, livro oficial, processo ou documento confiado à custódia do funcionário, em

razão de ofício, ou de particular em serviço público.

A atividade administrativa do Estado continua sendo a objetividade jurídica desta incriminação.

A pena cominada é de reclusão, de dois a cinco anos, se o fato não constitui crime mais grave. Trata-se, pois, de crime subsidiário.

29.2. Ação típica

70 Delito não caracterizado - acusado que rasgou "portaria" policial afixada em seu estabelecimento - Distinção entre aquela e "edital" - Absolvição decretada: "A figura penal do art. 336 do CO cogita apenas da inutilização de edital, como o qual não se confunde a portaria" (RT 516/299)71 Delito não configurado - Advogado que risca o seu nome do rol de devedores de custas judiciais, constante de edital afixado no Fórum - Singelo e fino traço a lápis, sem inutilização do édito, que continuou legível: "o ato de cancelar, por meio de traços, um nome em lista de devedores por custas judiciais, na presença de Oficial de Justiça não configura o conteúdo criminoso apenado no art. 336 do CP, que exige à formação do "corpus delicti" a inutilização ou o conspurcamento do edital" (RT 514/415)72 "Infringe o art. 336 do Cpenal aquele que rompe lacre que interditava o seu estabelecimento comercial, por ordem da autoridade pública" (RT 402/275).73 André Estefam, Direito Penal, Parte Especial, Saraiva, vol. 4, p. 324.74 Magalhães Noronha, Direito Penal, Saraiva, 20ª ed., vol. 4, pg. 343.75 De Plácito e Silva, op. cit., p. 294.76 op. e pg. cits.77 op. cit., p. 760.

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Centra-se nos verbos subtrair78 e inutilizar.

Subtrair significa tirar às escondidas, surrupiar. Inutilizar significa tornar inútil a coisa para aquilo a que ela se destina. A inutilização pode ser parcial

ou total.

29.3. Sujeito ativo

Qualquer pessoa.

Sendo o agente advogado ou procurador, e tendo recebido os autos ou documentos nesta qualidade, o crime será o do art. 356 do CP.

29.4. Sujeito passivo

O Estado.

20.5. Objeto material

São o livro oficial (criado por lei e utilizado em escriturações), o processo (administrativo ou judicial) ou o documento (de qualquer espécie) confiado

à custódia de funcionário em razão do ofício, ou de particular em serviço público.

29.6. Elemento subjetivo

É o dolo genérico. Não há forma culposa.

Heleno Fragoso sustenta que na modalidade subtrair exige-se o dolo específico, consistente na vontade de fazer seu o objeto material, em outras

palavras, a intenção de assenhorear-se. Com base nessa orientação Vereador que subtraiu, da Secretaria da Câmara Municipal, processo contendo projeto de lei,

para exibi-lo a autoridades militares, foi absolvido. Da mesma forma advogado que subtraiu processo de Cartório, sem autorização do serventuário, devolvendo-o

dias depois. No entanto, o texto do art. 337 não exige, como faz o do art. 155, que a subtração seja para si ou para outrem, razão pela qual a remoção da coisa,

ainda que momentânea e com intenção de restituir, desde que suscetível de violar a respectiva guarda, configura o crime 79. É que neste caso há infringência da

normalidade da atividade administrativa do Estado.

29.7. Consumação e tentativa

A consumação coincide com a subtração ou com a inutilização, total ou parcial.

A tentativa é possível.

29.8. Crime subsidiário

Na cominação da pena, o legislador deixa expresso que esse crime é eminentemente subsidiário. Assim, quando se trata de documento com fé pública,

e que se destina à prova de relação jurídica, o crime será o do art. 305. Se o agente é funcionário público que tem a guarda do documento em razão do cargo,

estaremos diante do crime do art. 314. Se o sujeito ativo é advogado ou procurador, e o objeto material são autos judiciais, o crime será o do art. 356.

30. Sonegação de contribuição previdenciária (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)

Art. 337-A. Suprimir ou reduzir contribuição social previdenciária e qualquer acessório, mediante as seguintes condutas: (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)

I - omitir de folha de pagamento da empresa ou de documento de informações previsto pela legislação previdenciária segurados empregado, empresário, trabalhador avulso ou trabalhador autônomo ou a este equiparado que lhe prestem serviços; (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)

II - deixar de lançar mensalmente nos títulos próprios da contabilidade da empresa as quantias descontadas dos segurados ou as devidas pelo empregador ou pelo tomador de serviços; (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)

III - omitir, total ou parcialmente, receitas ou lucros auferidos, remunerações pagas ou creditadas e demais fatos geradores de contribuições sociais previdenciárias: (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)

Pena - reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa. (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)§ 1o É extinta a punibilidade se o agente, espontaneamente, declara e confessa as contribuições, importâncias ou valores e presta as informações

devidas à previdência social, na forma definida em lei ou regulamento, antes do início da ação fiscal. (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)§ 2o É facultado ao juiz deixar de aplicar a pena ou aplicar somente a de multa se o agente for primário e de bons antecedentes, desde que: (Incluído

pela Lei nº 9.983, de 2000)I - (VETADO) (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)II - o valor das contribuições devidas, inclusive acessórios, seja igual ou inferior àquele estabelecido pela previdência social, administrativamente,

como sendo o mínimo para o ajuizamento de suas execuções fiscais. (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)§ 3o Se o empregador não é pessoa jurídica e sua folha de pagamento mensal não ultrapassa R$ 1.510,00 (um mil, quinhentos e dez reais), o juiz

poderá reduzir a pena de um terço até a metade ou aplicar apenas a de multa. (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)§ 4o O valor a que se refere o parágrafo anterior será reajustado nas mesmas datas e nos mesmos índices do reajuste dos benefícios da previdência

social. (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)

30.1. Conceito e objeto jurídico

78 "Subtrair não é a simples tirada da coisa do lugar em que se achava; exige, como momento posterior, a sujeição dela ao exclusivo poder de disposição do agente. O fim deste é Ter a coisa, definitivamente, para si próprio (animus rem sibi habendi) ou para terceiro. Se sua intenção é apenas usar passageiramente a coisa, seguindo-se a reposição desta, intacta, sob o poder de disposição do dono, não há falar em subtração" (RT 415/59)79 Julio Fabbrini Mirabete, op. cit., pg. 357.

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O patrimônio da previdência social constitui fator de grande relevo na sua administração, que se inclui também na atividade administrativa do Estado.

Por isso a incriminação das diversas condutas neste art. 337-A, que atentam contra tal patrimônio.

O tipo penal se configura na supressão ou redução de contribuição previdenciária ou qualquer acessório, mediante as condutas descritas nos três

incisos deste artigo.

A pena cominada é de reclusão, de dois a cinco anos, e multa.

O § 1º consagra hipótese de extinção da punibilidade; o § 2º, perdão judicial; o § 3º, redução de pena; e o § 4º, reajuste do valor mencionado no

parágrafo anterior.

30.2. Ação típica

Dois os verbos que integram o tipo: suprimir e reduzir.

Suprimir tem o sentido de afastar, tirar, impedir que apareça. Reduzir é diminuir.

O agente, portanto, subtrai, isto é, afasta, impede que apareça, esconde, ou reduz contribuição previdenciária e qualquer acessório dela.

Essa supressão e essa redução da contribuição previdenciária ou qualquer acessório, devem ocorrer através das três condutas omissivas descritas nos

incisos deste art. 337-A.

I- O primeiro comportamento omissivo, definido no inciso I, se relaciona com a folha de pagamento da empresa ou a documento de informações

previsto pela legislação previdenciária segurados empregado, empresário, trabalhador avulso ou trabalhador autônomo ou a este equiparado que lhe prestem

serviços.

II- O segundo, deixar de lançar mensalmente nos títulos próprios da contabilidade da empresa as quantias descontadas dos segurados ou as devidas

pelo empregador ou pelo tomador de serviços;

III- A terceira conduta omissiva, total ou parcial, se relaciona com receitas ou lucros auferidos, remunerações pagas ou creditadas e demais fatos

geradores de contribuições sociais previdenciárias.

Trata-se de tipo misto alternativo80.

30.3. Sujeito ativo

A pessoa responsável por aqueles lançamentos omitidos que implicam em redução ou supressão de contribuição previdenciária ou qualquer acessório.

Trata-se, assim, de crime próprio.

30.4. Sujeito passivo

A previdência social, que integra a Administração Pública.

30.5. Objeto material

São as contribuições sociais previdenciárias e seus acessórios legais.

Contribuição previdenciária é uma espécie de tributo destinado ao custeio da previdência e assistência social.

30.6. Elemento subjetivo

Dolo genérico.

30.7. Consumação e tentativa

O crime, material, se consuma no instante em que se dá a supressão ou a redução da contribuição previdenciária ou de qualquer acessório.

A tentativa é possível.

30.8. Extinção da punibilidade

Se o agente, espontaneamente, declara e confessa as contribuições, importâncias ou valores e presta informações devidas à previdência social, na forma

definida na lei ou regulamento, antes do início da ação fiscal, extingue-se a punibilidade, nos termos do § 1º.

Se a declaração e confissão ocorrem depois do início da ação fiscal, mas antes do recebimento da denúncia, a hipótese será de diminuição de pena por

arrependimento posterior (art. 16).

No entanto, o art. 9º81 da lei 10684, de 30/6/2003, posterior à lei n. 9.983/2000, prevê a extinção da punibilidade pelo pagamento integral do débito,

sem a restrição do § 1º.

80 André Estefam, ob. cit., p. 330.81 Art. 9o É suspensa a pretensão punitiva do Estado, referente aos crimes previstos nos arts. 1 o e 2 o da Lei n o 8.137, de 27 de dezembro de 1990, e nos arts. 168A e 337A do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, durante o período em que a pessoa jurídica relacionada com o agente dos aludidos crimes estiver incluída no regime de parcelamento.§ 1o A prescrição criminal não corre durante o período de suspensão da pretensão punitiva.§ 2o Extingue-se a punibilidade dos crimes referidos neste artigo quando a pessoa jurídica relacionada com o agente efetuar o pagamento integral dos débitos oriundos de tributos e contribuições sociais, inclusive acessórios.

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Page 35: 1 - Crimes Contra a Administracao Publica - Resumido

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Como a lei posterior revoga a anterior com a qual se mostra incompatível, a extinção da punibilidade ocorre com o pagamento das contribuições a

qualquer tempo.

30.9. Perdão judicial

O § 2º permite ao juiz deixar de aplicar a pena se o sujeito ativo for primário e com bons antecedentes, desde que o valor das contribuições devidas,

inclusive acessórios, seja igual ou inferior àquele estabelecido pela previdência social, administrativamente, como sendo o mínimo para ajuizamento de suas

execuções fiscais.

O pequeno valor sonegado, que inclusive dispensa o ajuizamento da ação de execução fiscal, justifica a regra.

30.10. Crime privilegiado

A pena pode ser reduzida de um terço, ou aplicada apenas multa, quando o empregador não é pessoa física e sua folha de pagamento mensal não

ultrapasse R$ 1.510.00, sendo esse valor reajustado nas mesmas datas e nos mesmos índices do reajuste dos benefícios da previdência social.

CAPÍTULO II-A

(Incluído pela Lei nº 10.467, de 11.6.2002)

DOS CRIMES PRATICADOS POR PARTICULAR CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA ESTRANGEIRA

Preocupado com a tutela da normalidade nas transações comerciais internacionais, o legislador brasileiro introduziu, através da lei 10467/02, novos

tipos penais: corrupção ativa nas transações comerciais internacionais; e tráfico de influência em transação comercial internacional. O que se pretende, com tais

incriminações, é garantir a lisura nas transações comerciais internacionais. Esse, pois, o objeto jurídico dos crimes.

Conceito de funcionário público estrangeiro

Art. 337-D. Considera-se funcionário público estrangeiro, para os efeitos penais, quem, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, exerce cargo, emprego ou função pública em entidades estatais ou em representações diplomáticas de país estrangeiro. (Incluído pela Lei nº 10467, de 11.6.2002)

Parágrafo único. Equipara-se a funcionário público estrangeiro quem exerce cargo, emprego ou função em empresas controladas, diretamente ou indiretamente, pelo Poder Público de país estrangeiro ou em organizações públicas internacionais. (Incluído pela Lei nº 10467, de 11.6.2002)

Como fez no capítulo relativo aos crimes cometidos por funcionário público contra a Administração Pública, preocupou-se o legislador de firmar um

conceito próprio de funcionário público estrangeiro. E o fez no art. 337-D.

O que diferencia esse conceito daquele constante do capítulo I, é o fato de se tratar de entidades estatais ou representações diplomáticas de país

estrangeiro, ou empresas controladas, direta ou indiretamente, pelo Poder Público de país estrangeiro, ou de organizações públicas internacionais.

31. Corrupção ativa em transação comercial internacional

Art. 337-B. Prometer, oferecer ou dar, direta ou indiretamente, vantagem indevida a funcionário público estrangeiro, ou a terceira pessoa, para

determiná-lo a praticar, omitir ou retardar ato de ofício relacionado à transação comercial internacional: (Incluído pela Lei nº 10467, de 11.6.2002)

Pena - reclusão, de 1 (um) a 8 (oito) anos, e multa. (Incluído pela Lei nº 10467, de 11.6.2002)

Parágrafo único. A pena é aumentada de 1/3 (um terço), se, em razão da vantagem ou promessa, o funcionário público estrangeiro retarda ou omite o

ato de ofício, ou o pratica infringindo dever funcional. (Incluído pela Lei nº 10467, de 11.6.2002)

31.1. Conceito e objeto jurídico

O tipo é praticamente o mesmo da corrupção ativa comum (art. 333), com acréscimo do verbo “dar”. Além disso, a conduta visa a funcionário público

estrangeiro, e tem por objetivo a obtenção de benefício relacionado com transação comercial internacional.

O delito em estudo consiste em prometer, oferecer ou dar, direta ou indiretamente, a funcionário público estrangeiro, ou a terceira pessoa, vantagem

indevida para determiná-lo a praticar, omitir ou retardar ato de ofício relacionado a transação comercial internacional.

Objeto jurídico da incriminação é a normalidade da atividade administrativa de Estado estrangeiro, e também aquele interesse da administração pública

brasileira relativamente à honestidade, probidade e moralidade das transações comerciais internacionais das quais participem brasileiros.

A pena cominada é de reclusão, de um a oito anos, e multa.

O parágrafo único prevê hipótese de aumento de pena, quando, em razão da vantagem ou promessa, o ato de ofício é retardado ou omitido, ou

praticado com infração de dever funcional.

31.2. Ação típica

Centra-se nos verbos prometer, oferecer e dar.

Prometer significa obrigar-se verbalmente ou por escrito, comprometer-se.

Oferecer significa propor para que seja aceito, expor, exibir.

Dar significa presentear, doar, entregar.

A promessa e o oferecimento podem ocorrer direta ou indiretamente, podendo ocorrer, também, de variadas formas, verbal, por escrito, através de

gestos.

E devem destinar-se a funcionário público estrangeiro ou terceiro, que então se torna partícipe do crime.

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31.3. Sujeito ativo

Qualquer pessoa.

31.4. Sujeito passivo

É a administração pública estrangeira, com relação a transações comerciais internacionais. Também o Estado brasileiro é sujeito passivo.

31.5. Objeto material

É a vantagem indevida, isto é, a que ele não tem direito.

A vantagem pode ser de qualquer ordem, econômica ou não.

31.6. Elemento subjetivo

Além do dolo genérico, o crime exige o específico, consistente naquela intenção de levar o funcionário público estrangeiro ou o terceiro a praticar,

omitir ou retardar o ato de ofício.

31.7. Consumação e tentativa

O crime se consuma com a simples promessa ou oferta da vantagem indevida, hipóteses em que ele é formal. Ou então, no momento em que o agente

entrega a vantagem, na modalidade "dar".

A tentativa é possível.

31.8. Aumento de pena

Se o funcionário público estrangeiro, em razão da oferta, promessa, ou recebimento da vantagem indevida, efetivamente retarda, omite ou pratica o ato

de ofício com infração de dever funcional, a pena é aumentada de um terço.

32. Tráfico de influência em transação comercial internacional(Incluído pela Lei nº 10467, de 11.6.2002)

Art. 337-C. Solicitar, exigir, cobrar ou obter, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, vantagem ou promessa de vantagem a pretexto de influir em ato praticado por funcionário público estrangeiro no exercício de suas funções, relacionado a transação comercial internacional: (Incluído pela Lei nº 10467, de 11.6.2002)

Pena - reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa. (Incluído pela Lei nº 10467, de 11.6.2002)Parágrafo único. A pena é aumentada da metade, se o agente alega ou insinua que a vantagem é também destinada a funcionário estrangeiro.

(Incluído pela Lei nº 10467, de 11.6.2002)

32.1. Conceito e objeto jurídico

Com o objetivo de dar maior lisura às transações comerciais internacionais, e evitar ofensas aos interesses da administração pública de estados

estrangeiros, o legislador penal incluiu, neste título final do Código Penal, dois crimes: corrupção ativa em transação comercial internacional e tráfico de

influência em transação comercial internacional.

É bom considerar, ainda, que ao incriminar estas condutas o legislador penal o faz, igualmente, na tutela da administração pública brasileira, que tem

interesse direto em que nas transações comerciais internacionais realizadas com participação de pessoas físicas ou jurídicas brasileiras sejam observados os

princípios de probidade, moralidade e honestidade.

O crime consiste em solicitar, exigir, cobrar ou obter vantagem ou promessa de vantagem a pretexto de influir em ato praticado por funcionário público

estrangeiro relacionada a transação comercial internacional.

A pena cominada é de reclusão, de dois a cinco anos, e multa.

Objeto jurídico é a correção das transações comerciais internacionais, a que têm interesse tanto a administração pública nacional quanto a estrangeira.

32.2. Ação típica

Centra-se nos verbos solicitar, exigir, cobrar e obter.

Solicitar significa pedir.

Exigir significa ordenar, intimar.

Cobrar significa pedir ou exigir o cumprimento de alguma coisa.

Obter significa ganhar, conseguir, alcançar.

32.3. Sujeito ativo

Qualquer pessoa.

32.4. Sujeito passivo

A administração pública de estado estrangeiro e a administração pública nacional.

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32.5. Objeto material

É a vantagem ou promessa de vantagem que é exigida, solicitada, cobrada ou obtida pelo agente do crime.

32.6. Elemento subjetivo

Além do dolo genérico, o crime exige também o específico, consistente naquele pretexto de influir em ato praticado por funcionário público

estrangeiro no exercício de suas funções, relacionado a transação comercial internacional.

32.7. Consumação e tentativa

O crime se consuma com a prática efetiva de qualquer umas condutas típicas definidas neste art. 337-C.

A tentativa é possível.

CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO DA JUSTIÇA

34. Reingresso de estrangeiro expulso

Art. 338 - Reingressar no território nacional o estrangeiro que dele foi expulso:Pena - reclusão, de um a quatro anos, sem prejuízo de nova expulsão após o cumprimento da pena.

34.1. Conceito e objetividade jurídica

O crime, tal como definido no art. 338, ocorre quando estrangeiro, que foi expulso do território nacional, nele reingressa. A pena é de reclusão, de um a

quatro anos, sem prejuízo de nova expulsão, após o cumprimento da pena.

O ato de expulsão de estrangeiro tem natureza administrativa, inserindo-se na competência do Presidente da República. No entanto, ao Judiciário cabe

a apreciação de sua regularidade formal. Neste sentido é que o legislador penal incluiu o delito em questão no capítulo dos crimes contra a administração da

justiça. De certa forma, portanto, a conduta típica atenta contra o normal desenvolvimento da administração da justiça.

Este, portanto, o objeto jurídico da incriminação.

34.2. Ação típica

Centra-se no verbo reingressar, que significa ingressar de novo, voltar. Pressuposto do crime é que o estrangeiro tenha sido expulso por ato regular.

Se, embora expulso, o estrangeiro continua no país, dele não chegando a sair, não haverá o crime.

O crime exige que o estrangeiro tenha sido expulso82. Não abrange, assim, as hipóteses de deportação83 e extradição84.

Pouco importa que a expulsão tenha sido justa ou injusta. Basta que o ato de expulsão tenha sido regular no aspecto formal.

34.3. Sujeito ativo

Trata-se de crime próprio, pois somente pode ser praticado por estrangeiro.

34.2. Sujeito passivo

É o Estado.

34.3. Objeto material

É o território nacional, em outras palavras, o solo, subsolo, espaço aéreo e águas territoriais dentro das fronteiras do Estado.

34.6. Elemento subjetivo

É o dolo genérico.

Necessário que o agente tenha consciência que foi expulso, e mesmo assim atue no sentido de reingressar no território nacional.

A suposição, por parte do agente, que seu reingresso foi autorizado, pode configurar erro de proibição85.

34.7. Consumação e tentativa

A consumação coincide com o reingresso no território nacional. A tentativa é possível, como ocorre na hipótese do estrangeiro ser preso logo que

ingressa no território nacional, próximo à fronteira. Para a consumação, portanto, é preciso que o agente permaneça um tempo juridicamente relevante no

território nacional, em seguida ao reingresso.

82 Expulsão de estrangeiro, na lição de De Plácido e Silva, "é a medida administrativa, tomada pelo poder público para fazer retirar do território nacional, o estrangeiro que se mostra prejudicial ao interesse do país" (op. cit., p. 340). Conforme salienta José Afonso da Silva, "é um modo coativo de retirar o estrangeiro do território nacional por delito ou infração ou atos que o tornem inconveniente" (Curso de Direito Constitucional Positivo, Malheiros Editores, 25ª ed., p. 342) .83 A deportação é outro modo de devolver o estrangeiro ao exterior, através de sua saída compulsória, em face de haver ele entrado ou permanecido irregularmente no território nacional (José Afonso da Silva, op. cit., p. 342). A deportação, portanto, decorre do não cumprimento dos requisitos para entrar ou permanecer no território brasileiro.84 No magistério de José Afonso da Silva, "é o ato pelo qual um Estado entrega um indivíduo, acusado de um delito ou já condenado como criminoso, à justiça de outro, que o reclama, e que é competente para julgá-lo e puni-lo" (op. cit., p. 341).85 Júlio Fabbrini Mirabete et all, Manual de Direito Penal, Ed. Atlas, 24ª ed., vol. III, p. 367.

Page 38: 1 - Crimes Contra a Administracao Publica - Resumido

Trata-se de crime de mera conduta86.

34.8. Ação penal

É pública incondicionada, mas a competência para julgar o crime é da Justiça Federal.

35. Denunciação caluniosa:

Art. 339. Dar causa à instauração de investigação policial, de processo judicial, instauração de investigação administrativa, inquérito civil ou ação de improbidade administrativa contra alguém, imputando-lhe crime de que o sabe inocente: (Redação dada pela Lei nº 10.028, de 2000)

Pena - reclusão, de dois a oito anos, e multa.§ 1º - A pena é aumentada de sexta parte, se o agente se serve de anonimato ou de nome suposto. § 2º - A pena é diminuída de metade, se a imputação é de prática de contravenção.

35.1. Conceito e objetividade jurídica

Esse crime ocorre sempre que alguém dá causa à instauração de investigação policial, de processo judicial, investigação administrativa, inquérito civil

ou ação de improbidade administrativa, contra alguém, acusando-o de crime de que o sabe inocente.

Em outras palavras, o agente, mesmo sabendo que alguém é inocente, provoca, com denúncia, uma daquelas situações, com acusação de prática de

crime.

A pena cominada e de reclusão, de dois a oito anos, e multa.

A pena é aumentada da sexta parte se o agente se vale de anonimato ou de nome suposto (§ 1º).

E é diminuída de metade se a imputação é de prática contravencional (§ 2º).

Tutela-se, com a incriminação, em primeiro lugar a administração da justiça, que sofre atentado com tal conduta. A movimentação da máquina da

Justiça, sem motivo, causa prejuízos, econômicos e morais, à Administração da Justiça. Essa a razão da incriminação.

35.2. Ação típica

A conduta punida é dar causa àquela instauração, com a imputação a alguém de crime de que se o sabe inocente. Ou seja, o agente provoca, faz com

que tenha início a investigação policial ou o processo judicial, ou a investigação administrativa (abrangendo as sindicâncias, inquéritos administrativos), ou o

inquérito civil87, ou a ação de improbidade administrativa88, contra alguém, imputando-lhe o crime, embora o saiba inocente.

Para dar causa a tais situações pode o agente valer-se de qualquer forma, até mesmo oralmente. Importa é que o meio utilizado seja idôneo para

provocar a ação da autoridade policial ou judiciária.

O crime pode ser praticado através de uma denunciação formal, ou de forma indireta (ex.: colocação da "res furtiva" no bolso de alguém).

Necessário que a imputação seja feita a pessoa determinada. E que se refira a crime. Se a imputação se referir a contravenção, a pena é reduzida de

metade (§ 2º). Fundamental, também, que o agente saiba que o denunciado é inocente, ou porque não foi o autor do crime, ou porque o crime não existiu. Não

haverá crime de denunciação se já estiver extinta a punibilidade do fato que configura o crime imputado.

Para que se configure a denunciação caluniosa, portanto, "é preciso que se demonstre, inequivocamente e desde logo, que o sujeito ativo de tal delito,

objetiva e subjetivamente, agiu de má-fé, dando causa à instauração policial de fato atípico, ou de que sabia ser o indiciado inocente"89

Alerta Magalhães Noronha que a denunciação caluniosa não se confunde com a conduta de quem "solicita à polícia que apure determinado delito,

fornecendo-lhe os elementos de que dispõe"90.

O Delegado de Polícia, o Promotor Público e o Juiz de Direito também podem cometer o crime quando, mesmo cientes da inocência do imputado, dão

causa à instauração daqueles procedimentos. Diga-se o mesmo do advogado que age com consciência da falsidade da imputação feita pelo seu cliente 91.

35.3. Sujeito ativo

Qualquer pessoa.

35.4. Sujeito passivo

É o Estado. Secundariamente, a pessoa acusada caluniosamente.

35.5. Objeto material

Múltiplo o objeto material, abarcando a investigação policial, o processo judicial, a investigação administrativa, o inquérito civil e a ação de

improbidade administrativa que são instaurados por causa da ação do agente.

35.6. Elemento subjetivo

86 id.87 Lei n. 7347, art. 8º, § 1º.88 Lei n. 8429/92.89 RT 605/30190 ob. cit., IV/36791 cf. Jílio Fabrini Mirabete, op. cit., p. 368.

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Page 39: 1 - Crimes Contra a Administracao Publica - Resumido

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O crime exige o dolo direto, não bastando o eventual, pois o texto diz "de que o sabe inocente". Se o agente atuar em dúvida quanto à inocência do

denunciado, não cometerá o crime em estudo92. Assim, se a pessoa, subjetivamente, acreditar que o denunciado foi mesmo o autor do crime, não se pode falar em

denunciação caluniosa, por falta de seu elemento subjetivo.

Não há forma culposa.

35.7. Consumação e tentativa

O crime se consuma com a efetiva instauração da investigação policial, do processo judicial, da investigação administrativa, do inquérito civil ou da

ação de improbidade administrativa.

Uma vez consumado o crime, irrelevante a retratação do agente.

A tentativa é possível, como na hipótese de não ser instaurado o procedimento por circunstâncias alheias à vontade do agente.

35.8. Aumento de pena

Se o agente, para a denunciação, se vale de anonimato, ou de nome suposta, a pena será aumentada da sexta parte (§ 1º).

35.9. O advogado e a denunciação caluniosa

A simples exposição dos fatos, em nome do cliente, com estrita observância das instruções recebidas, não faz do advogado co-autor de denunciação

caluniosa. Porém, se agiu sabendo da falsidade da imputação, poderá ser responsabilizado em co-autoria93 .

36. Comunicação falsa de crime ou de contravenção

Art. 340 - Provocar a ação de autoridade, comunicando-lhe a ocorrência de crime ou de contravenção que sabe não se ter verificado:Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa.

36.1. Conceito e objetividade jurídica

Esse crime ocorre sempre que alguém provoca a ação de autoridade comunicando-lhe a ocorrência de crime ou de contravenção, que sabe não ter se

verificado.

A pena cominada é de detenção, de um a seis meses, ou multa.

O que se tutela é a administração da justiça, comprometida com condutas como a incriminada. A movimentação da máquina investigatória, sem razão,

constitui grave ofensa à normalidade da atividade de distribuir justiça.

36.2. Ação típica

Provocar, diz o texto legal, significando fazer com que a autoridade tome alguma providência para apurar o crime ou contravenção.

Esta comunicação pode ser verbal ou escrita.

Mas deve referir-se a crime ou contravenção que o agente sabe que não existiu. Não há necessidade de apontar o autor do crime ou da contravenção,

bastando apenas comunicar falsamente a sua ocorrência.

36.3. Sujeito ativo

Qualquer pessoa.

36.4. Sujeito passivo

O Estado.

36.5. Objeto material

É a ação da autoridade, seja policial, judiciária ou administrativa.

36.6. Elemento subjetivo

Além do dolo genérico, que deverá ser sempre direto (que sabe, diz o texto penal), não bastando o eventual, exige o crime também o específico,

consistente na intenção de provocar a ação da autoridade.

A dúvida do agente quanto à ocorrência ou não do crime exclui o dolo94.

Não há forma culposa.

36.7. Consumação e tentativa

Consuma-se o crime no momento em que a autoridade toma qualquer providência em relação ao crime ou à contravenção denunciados. Não há

necessidade de instauração efetiva do inquérito policial. Basta que a autoridade tenha tomado qualquer providência inicial.

92 RJTJSP, 65/29893 RT 591/325.

94 Indivíduo que perde o dinheiro que trazia consigo e fica na dúvida se foi furtado ou não, e comunica o fato à Polícia, não comete o crime.

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A tentativa é possível.

37. Auto-acusação falsa

Art. 341 - Acusar-se, perante a autoridade, de crime inexistente ou praticado por outrem:Pena - detenção, de três meses a dois anos, ou multa.

37.1. Conceito e objetividade jurídica

Esse crime se verifica quando o agente se auto-incrimina, perante autoridade, de crime inexistente ou praticado por outrem.

A pena cominada é de detenção, de três meses a dois anos.

Esta conduta também compromete a atividade estatal relativa à administração da justiça. Ao se acusar de crime inexistente ou praticado por outrem, o

agente compromete a atividade investigatória.

37.2. Ação típica

Acusar-se, diz o texto legal. Ou seja, imputar a si próprio a prática de um crime. Esta auto-acusação deve ocorrer perante autoridade (policial ou

judiciária). Essa expressão usada na lei, perante, não significa que o agente deva estar face a face com a autoridade. Assim, se alguém dá causa à lavratura de

Boletim de Ocorrência com a auto-incriminação já comete este crime.

Autoridade é a policial, a administrativa e a judicial.

Não há necessidade de ser espontânea a auto-acusação, podendo mesmo ocorrer quando inquirido o agente pela autoridade.

37.3. Sujeito ativo

Qualquer pessoa

37.4. Sujeito passivo

O Estado.

37.5. Objeto material

É o crime inexistente ou praticado por outrem. É necessário, portanto, que o agente se auto acuse de crime (não basta contravenção) que não

ocorreu, ou do qual não foi o autor.

37.6. Elemento subjetivo

É o dolo genérico.

Não há forma culposa.

37.7. Consumação e tentativa

Trata-se de crime de perigo, razão pela qual a consumação coincide com o momento em que o agente se auto-incrimina. Independe a consumação de

qualquer providência por parte da autoridade.

A tentativa é possível.

38. Falso testemunho ou falsa perícia

Art. 342. Fazer afirmação falsa, ou negar ou calar a verdade como testemunha, perito, contador, tradutor ou intérprete em processo judicial, ou administrativo, inquérito policial, ou em juízo arbitral: (Redação dada pela Lei nº 10.268, de 28.8.2001)

Pena - reclusão, de um a três anos, e multa.§ 1o As penas aumentam-se de um sexto a um terço, se o crime é praticado mediante suborno ou se cometido com o fim de obter prova destinada a

produzir efeito em processo penal, ou em processo civil em que for parte entidade da administração pública direta ou indireta.(Redação dada pela Lei nº 10.268, de 28.8.2001)

§ 2o O fato deixa de ser punível se, antes da sentença no processo em que ocorreu o ilícito, o agente se retrata ou declara a verdade. (Redação dada pela Lei nº 10.268, de 28.8.2001)

38.1. Conceito e objetividade jurídica

Esse crime, que é próprio de testemunha, perito, contador, tradutor ou intérprete, consiste em fazer afirmação falsa, negar a verdade, ou calar a verdade

em processo judicial, ou administrativo, inquérito policial, ou em juízo arbitral. Anote-se que a lei n. 1.579/72, em seu art. 4º, incluiu também o inquérito

parlamentar.

A pena cominada é de reclusão, de um a três anos, e multa.

A pena é aumentada, de um sexto a um terço, se o crime é cometido mediante suborno, ou cometido com o fim de obter prova em processo penal ou

em processo civil em que for parte entidade da Administração Pública direta ou indireta. (§ 1º).

Por último, se o agente se retrata ou declara a verdade antes da sentença no processo em que ocorreu o ilícito, a punibilidade será extinta (§ 2º).

A conduta é incriminada porque compromete a atividade estatal de administrar a justiça.

38.2. Ação típica

40

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41

Fazer afirmação falsa significar dizer uma mentira. A conduta é comissiva95.

Negar a verdade é negar o que sabe. O agente nega saber, quando na realidade sabe.

Calar a verdade, por último, é deixar de dizer o que sabe; o agente se omite; é a conduta reticente.

A falsidade deve relacionar-se com fato juridicamente relevante, em condições de influir na decisão final. Referindo-se a fato irrelevante, incapaz de

causar prejuízo, não haverá o crime.

Há divergência quanto à necessidade ou não de influência do falso na decisão da causa onde se dá a falsidade. No sentido positivo, pela exigibilidade,

há várias decisões96. Em sentido contrário, ou seja, de que o crime é de natureza formal, bastando à consumação que o comportamento seja apto à produção do

prejuízo, encontramos, na doutrina, Nelson Hungria e Magalhães Noronha. Na jurisprudência essa a orientação dominante97.

Outra questão polêmica se relaciona com a necessidade ou não de se aguardar o fim do processo onde se deu o falso testemunho ou a falsa perícia.

Pela necessidade98; pela desnecessidade99.

Há duas teorias a respeito do conceito de falsidade: a) para a objetiva, falso é o que não corresponde a um acontecimento real; b) para a subjetiva,

falso é o que não corresponde ao que o agente efetivamente percebeu. Esta última é a que predomina100.

A nulidade do processo faz desaparecer o crime, porque também o testemunho, a perícia, etc., serão declarados nulos. O mesmo ocorre com a extinção,

pela prescrição, do processo onde foi prestado o falso testemunho101. Há, contudo, decisões em sentido contrário102.

Também há controvérsia quanto à necessidade ou não do compromisso para a caracterização do crime. Há pessoas que a lei dispensa do compromisso

legal de dizer a verdade. São as testemunhas informantes. Por isso, há quem sustente que tais testemunhas informantes não cometem o crime caso mintam no

depoimento, de vez que não estariam obrigadas a dizer a verdade. Outros têm posição diversa, sustentando que qualquer testemunha, compromissada ou não, tem

o dever de dizer a verdade, sob pena de cometimento deste crime.

A testemunha que mente para não se incriminar não comete crime, de vez que o ordenamento jurídico garante o direito à não incriminação.

Outro tema controvertido. Tratando-se de crime de mão-própria, que só pode ser cometido pelas próprias pessoas indicadas no tipo penal, questiona-se

se admite ou não co-autoria. Sustenta-se que dado o caráter personalíssimo da infração, não pode haver co-autoria. No entanto, Julio Fabbrini Mirabete tem

posição diversa. Segundo ele, o crime não admite co-autoria, mas admite participação, em que os agentes, embora não pratiquem o ato executivo do crime,

concorrem, de algum modo, para sua realização, como na instigação, por exemplo103.

Por último, a conduta típica deve ser pratica em processo judicial, civil ou penal, contencioso ou voluntário; em processo administrativo, em que se tem

em mira a apuração de faltas ou transgressões disciplinares ou administrativas; inquérito policial, espécie de procedimento administrativo que se destina a colher

elementos de prova para instruir a ação penal; ou em juízo arbitral.

38.3. Sujeito ativo

O crime é próprio, pois somente pode ser cometido por pessoas investidas de determinadas qualidades.

95 "Se o acusado, ao depor como testemunha em outro processo, não só faltou à verdade, dizendo-se presente ao local dos acontecimentos, quando ali não esteve, como também deformou os fatos que não presenciou, dando-lhes outra versão para beneficiar o então réu, que escapou à sanção penal, comete delito previsto no art. 342 do CP" (RT 464/352)96 "Se a circunstância em nada influi, se não há possibilidade de prejuízo, apesar da inverdade, não haverá falso testemunho, pois não prejudica a prova " (RT 422/128). "Se o depoimento acoimado de falso nenhuma influência teve no deslinde da causa, não há falar, sequer em tese, do delito do art. 342 do CP, por não conter aquele qualquer potencialidade lesiva" (RT 511/356). "Se o depoimento falso em nada influiu na decisão da causa, se não há possibilidade de prejuízo, apesar da inverdade, não há falar no delito de falso testemunho" (RT 570/289).97 "A ofensa à Justiça, que resulta do falso testemunho, se consuma ainda quando o depoente não tenha conseguido o fim a que se propusera, com a condenação ou absolvição do imputado. A existência do crime é de todo independente do êxito do julgamento principal, porque a Administração tem interesse não só na sentença justa, mas, também, num processo honesto" (RT 410/114) "É de todo irrelevante que o falso não tenha influído sobre a decisão final. Para o aperfeiçoamento do crime de falso testemunho, previsto no art. 342 do CO basta que dê causa a perigo de injustiça" (RT 467/331). "Se o falso testemunho incidiu sobre fato juridicamente relevante e pertinente ao objeto do processo criminal em que foi prestado, pouco importa, para a pretendida exclusão de sua ilicitude, o fato de não haver influído na decisão da causa, dada a sua indiscutível potencialidade lesiva" (RJTJSP 74/338)98 RT 498/293, 528/314, 651/28099 RT 460/281, 531/294, 542/308100 "A falsidade a que se refere o art. 342 do CP não é contraste entre o depoimento e a realidade dos fatos, mas entre o depoimento e a ciência da testemunha" (RT 498/293) "O critério da falsidade do testemunho não depende da relação dentre o dito e a realidade das coisas mas, sim, da relação entre o dito e o conhecimento da testemunha" (RT 522/322) "Falso é o depoimento que não está em correspondência qualitativa ou quantitativa com o que a testemunha viu, percebeu ou ouviu" (RJTJSP 105/422)101 RT 582/285, 611/322, 693/329102 RT 540/263, 546/432103 op. cit., p. 379

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Testemunha104 é a pessoa arrolada por uma das partes para depor sobre fato relevante para o julgamento da causa.

Perito é o técnico chamado a emitir parecer sobre determinado tema.

Tradutor é a pessoa incumbida de verter para o idioma nacional texto estrangeiro.

Intérprete é a pessoa que serve de intermediário para o entendimento entre duas pessoas.

Réus e indiciados não podem ser sujeito ativo deste crime, eis que não estão obrigados a dizer a verdade.

Tem-se entendido que advogado que induz, instiga ou influencia testemunha a mentir responde como co-autor do crime105.

38.4. Sujeito passivo

O Estado.

38.5. Objeto material

É a afirmação falsa, ou a verdade negada ou calada.

38.6. Elemento subjetivo

Basta o dolo genérico 106. Não há forma culposa.

38.7. Consumação e tentativa

No instante em que se completa a conduta incriminada. Controvertida a admissibilidade da tentativa.

39. Corrupção ativa de testemunha ou perito

Art. 343. Dar, oferecer ou prometer dinheiro ou qualquer outra vantagem a testemunha, perito, contador, tradutor ou intérprete, para fazer afirmação falsa, negar ou calar a verdade em depoimento, perícia, cálculos, tradução ou interpretação: (Redação dada pela Lei nº 10.268, de 28.8.2001)

Pena - reclusão, de três a quatro anos, e multa.(Redação dada pela Lei nº 10.268, de 28.8.2001)Parágrafo único. As penas aumentam-se de um sexto a um terço, se o crime é cometido com o fim de obter prova destinada a produzir efeito em

processo penal ou em processo civil em que for parte entidade da administração pública direta ou indireta. (Redação dada pela Lei nº 10.268, de 28.8.2001)

39.1. Conceito e objetividade jurídica

Em seu art. 343, o legislador penal pune, com pena de reclusão de um a três anos, além de multa, a conduta de dar, oferecer ou prometer dinheiro ou

qualquer outra vantagem a testemunha, perito, tradutor ou intérprete, para fazer afirmação falsa, negar ou calar a verdade em depoimento, perícia, tradução ou

interpretação, ainda que a oferta não seja aceita.

Sendo o crime cometido com o fim de obter prova destinada a produzir efeito em processo penal ou em processo civil em que for parte entidade da

administração pública direta ou indireta, a pena será aplicada em dobro, nos termos do parágrafo único.

Trata-se de modalidade especial, com previsão autônoma, de corrupção ativa.

Objeto jurídico do crime é a normalidade da atividade de administração de justiça.

39.2. Ação típica

Centra-se nos verbos dar (=ceder, entregar), oferecer (=propor para que seja aceito) e prometer (=comprometer-se a alguma coisa)107.

A conduta do sujeito ativo deve visar testemunha, perito, contador, tradutor ou intérprete, e ter por objetivo que estes façam afirmação falsa, neguem ou

calem a verdade em depoimento, perícia, cálculos, tradução ou interpretação.

Necessário, para que haja o crime, que a pessoa que se pretende subornar, ou subornada, já estejam na posse da qualidade de interveniente no feito. Em

outras palavras, já estejam na posse da qualidade de testemunha, de perito, de contador, de tradutor ou de intérprete.

A testemunha portanto, já deverá ter sido arrolada nos autos, ou já haver determinação da autoridade para ouví-la.

39.3. Sujeito ativo

Qualquer pessoa.

39.4. Sujeito passivo

O Estado.

39.5. Objeto material

É o dinheiro ou qualquer outra vantagem108.

104 "O sujeito ativo do delito de falso testemunho só pode ser a testemunha, jamais a vítima, tanto que esta sequer está sujeita a prestar o compromisso, por não ser obrigada a dizer a verdade" (RT 598/320)105 RT 554/347, 566/388, 598/443, 403/76106 "Não é suficiente para configurar o falso testemunho que o depoimento seja contrário à verdade e possa causar prejuízo; é preciso, ainda que tenha sido feito com intenção dolosa" (RT 445/384)107 "Simples súplicas feitas a testemunha, para não envolvimento no processo, de autoridade, não bastam para configurar o delito previsto no art. 343 do CP." (Rt 481/388)

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39.6. Elemento subjetivo

Além do dolo genérico, o crime exige também o específico, configurado por aquela finalidade especial que move o agente.

39.7. Consumação e tentativa

O crime é formal, e se consuma com a prática de quaisquer daquelas condutas.

A tentativa, quando escrito o meio executivo, é tecnicamente viável.

39.8. Aumento de pena

Sendo o crime cometido com o fim de obter prova destinada a produzir efeito em processo penal ou ação civil em for parte entidade da administração

pública direta ou indireta, a pena será aplicada em dobro. É o que dispõe o parágrafo único deste art. 343.

40. Coação no curso do processo

Art. 344 - Usar de violência ou grave ameaça, com o fim de favorecer interesse próprio ou alheio, contra autoridade, parte, ou qualquer outra pessoa que funciona ou é chamada a intervir em processo judicial, policial ou administrativo, ou em juízo arbitral:

Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa, além da pena correspondente à violência.

40.1. Conceito e objetividade jurídica

Nesse crime o agente, com a finalidade de favorecer interesse próprio ou alheio, em processo judicial, policial ou administrativo, ou em juízo arbitral,

emprega violência, física ou moral, contra autoridade, parte, ou qualquer pessoa que funciona ou é chamada a intervir naqueles procedimentos.

A pena cominada é de reclusão, de um a quatro anos, e multa, além da correspondente à violência.

Cuida-se de crime contra a administração da justiça.

40.2. Ação típica

Núcleo do tipo é o uso de violência, física ou moral, por parte do agente.

40.3. Sujeito ativo

Qualquer pessoa.

40.4. Sujeito passivo

É o Estado. Secundariamente, a pessoa que sofre a coação.

40.5. Objeto material

São a autoridade, parte ou qualquer outra pessoa que funciona ou é chamada a intervir no processo judicial, policial ou administrativo.

Autoridade é a pessoa a quem são conferidos poderes no processo (Juiz de Direito, Delegado de Polícia). Partes são os sujeitos que intervêm na

relação processual, na defesa de seus interesses (Autor, réu, Promotor Público). Além destas, existem outras pessoas que funcionam no processo (escrivão,

escrevente, oficial de Justiça, contador, etc.), ou nele são chamadas a intervir (tradutor, intérprete, perito). É contra tais pessoas que deve ser empregada a violência

para que se configure o crime.

40.6. Elemento subjetivo

Além do dolo genérico, o crime exige o específico, consistente naquele fim especial de agir, ou seja, favorecer interesse próprio ou alheio.

40.7. Consumação e tentativa

Consuma-se o crime com o simples emprego da violência, pouco importando que ela surta ou não efeito.

A tentativa é viável.

41. Exercício arbitrário das próprias razões

Art. 345 - Fazer justiça pelas próprias mãos, para satisfazer pretensão, embora legítima, salvo quando a lei o permite:Pena - detenção, de quinze dias a um mês, ou multa, além da pena correspondente à violência.Parágrafo único - Se não há emprego de violência, somente se procede mediante queixa.

41.1. Conceito e objetividade jurídica

O art. 345 pune quem, por assim dizer, faz justiça pelas próprias mãos, mesmo que a pretensão seja legítima.

A pena cominada é de detenção, de quinze dias a um mês, ou multa, além daquela correspondente à violência.

108 "O delito previsto no art. 343 do CP estabelece duas possibilidades alternativas de oferta ou promessa: dinheiro ou qualquer outra vantagem. A promessa de prestação de serviços profissionais gratuitos, para que a testemunha preste depoimento falso, constitui uma promessa de vantagem e caracteriza, em tese, o delito de corrupção ativa de testemunha ou perito" (RT 539/264)

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A ninguém é dado fazer justiça pelas próprias mãos, ainda que se trate de satisfazer pretensão legítima. Cuida-se de regra essencial ao normal

funcionamento da administração da justiça, e da própria convivência social.

Objeto jurídico da incriminação, portanto, é a normalidade da atividade estatal de distribuição de justiça.

41.2. Ação típica

A ação típica consiste em fazer justiça pelas próprias mãos. Isto é, o agente, titular de uma pretensão legítima, ao invés de recorrer ao Judiciário para

obtê-la, arbitrariamente satisfaz sua pretensão109.

O meio empregado pode ser qualquer um: violência, fraude, subtração, etc.

Necessário que o agente suponha, de boa-fé, possuir o direito. Porque o texto legal fala em pretensão, embora legítima. Significa, pois, que embora

ilegítima a pretensão, deve o agente pressupor o contrário, isto é, que é legítima, que tem o direito objetivado.

O reconhecimento da sinceridade da convicção, essencial para a configuração do delito, exige pelo menos a aparência de um direito, o "fumus boni

juris".

Exclui-se a ilicitude da conduta, por expressa disposição do tipo, quando a lei permite a satisfação do direito por mão própria. É o que ocorre,

exemplificativamente, com a lei civil, que permite ao possuidor esbulhado o emprego de força para recuperar a posse, desde que o faça logo.

41.3. Sujeito ativo

Qualquer pessoa110.

41.4. Sujeito passivo

O Estado.

41.5. Objeto material

Pode-se dizer que é a pretensão que se quer garantir com a conduta.

41.6. Elemento subjetivo

Além do dolo genérico, o crime exige também o específico, consistente na finalidade de satisfazer pretensão.

41.7. Consumação e tentativa

Parte da doutrina sustenta que a consumação ocorre com a efetiva satisfação da pretensão 111. Outros, no entanto, sustentam que a consumação se dá

com o simples emprego dos meios de execução112.

A tentativa é possível.

41.8. Ação penal

Como regra geral, é pública. Porém, quando não há emprego de violência, somente se procede mediante queixa (ação privada).

42. Subtração, supressão ou danificação de coisa própria no legítimo poder de terceiro

Art. 346 - Tirar, suprimir, destruir ou danificar coisa própria, que se acha em poder de terceiro por determinação judicial ou convenção:Pena - detenção, de seis meses a dois anos, e multa.

42.1. Conceito e objetividade jurídica

O crime, definido no art. 346, consiste em tirar, suprimir, destruir ou danificar coisa própria, que se acha em poder de terceiro por determinação judicial

ou convenção. A pena cominada é de detenção, de 6 meses a 2 anos, e multa.

Trata-se de modalidade especial de exercício arbitrário das próprias razões. O art. 345 é genérico, enquanto o art. 346 é específico, referindo-se apenas

ao direito que recai sobre coisa própria que se encontra em poder de terceiro. Tanto que o legislador penal não trouxe, neste artigo 346, rubrica lateral nomeando o

crime. A denominação que se deu acima parte da doutrina, e decorre do fato típico, tal como descrito.

Tutela-se, uma vez mais, a administração da justiça, atingida com a conduta típica.

42.2. Ação típica

Centra-se nos verbos tirar (subtrair), suprimir (fazer desaparecer), destruir (eliminar a coisa em sua individualidade) ou danificar (estragar,

deteriorar).

42.3. Sujeito ativo

Sempre o proprietário da coisa que está em poder de terceiro.

109 "Constitui crime de exercício arbitrário das próprias razões exigir, mediante ameaça, restituição de dinheiro perdido em jogo fraudado" (RF 113/200) "Comete o delito de exercício arbitrário das próprias razões o vizinho que derruba o muro divisório de sua propriedade erguido pelo confinante" (RT 485/332)110 "Ao Oficial de Justiça obstado no cumprimento de um mandado compete requisitar força e não executá-lo à força, com uso de arma, pois, assim agindo, estará cometendo, em tese, os delitos de ameaça e de exercício arbitrário das próprias razões" (RT 398/277)111 Heleno Fragoso, Celso Delmanto, Júlio Fabbrini Mirabete (op. cit., p. 392)112 Magalhães Noronha

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42.4. Sujeito passivo

É o Estado.

42.5. Objeto material

É a coisa própria, seja ela móvel ou imóvel, que se encontra em poder de terceiro por força de determinação judicial ou convenção (penhor, anticrese).

Indispensável, pois, que a coisa esteja em poder do terceiro ou por determinação judicial, ou por convenção 113.

42.6. Elemento subjetivo

É o dolo genérico.

42.7. Consumação e tentativa

O crime se consuma com a prática de qualquer daquelas condutas típicas.

Viável a tentativa.

43. Fraude processual

Art. 347 - Inovar artificiosamente, na pendência de processo civil ou administrativo, o estado de lugar, de coisa ou de pessoa, com o fim de induzir a erro o juiz ou o perito:

Pena - detenção, de três meses a dois anos, e multa.Parágrafo único - Se a inovação se destina a produzir efeito em processo penal, ainda que não iniciado, as penas aplicam-se em dobro.

43.1. Conceito e objetividade jurídica

O crime de fraude processual, tal como definido no art. 347 do C. Penal, consiste em inovar artificiosamente, na pendência de processo civil ou

administrativo, o estado de lugar, de coisa ou de pessoa, com o fim de induzir a erro o juiz ou o perito.

A pena cominada é de detenção, de três meses a dois anos, além da multa. A pena será dobrada se a inovação se destina a fazer prova em processo

penal, ainda que não iniciado.

Objeto jurídico da incriminação é a normalidade da atividade estatal de administração da justiça.

43.2. Ação típica

Inovar, verbo utilizado pelo legislador para definir a ação típica, consiste em uma alteração, uma modificação da coisa, do lugar ou da pessoa. Esta

inovação deve ser praticada artificiosamente, isto é, mediante artifício ou ardil. A inovação deve ser idônea para enganar.

32.3. Sujeito ativo

Qualquer pessoa.

43.4. Sujeito passivo

O Estado.

43.5. Objeto material

É o estado de lugar, de coisa ou de pessoa que é inovado pelo agente, na pendência do processo. Corte de árvores (inovação do estado de lugar),

abertura de janelas (de coisa), cirurgia plástica (de pessoa).

43.6. Elemento subjetivo

Além do dolo genérico, caracterizado pela vontade livre e consciente de praticar a conduta típica, o crime exige também o dolo específico, ou seja, a

conduta deve ter por finalidade induzir a erro o juiz ou o perito.

43.7. Consumação e tentativa

Alguns autores sustentam que a consumação coincide com a inovação artificial. Outros, no entanto, entendem necessária que a inovação chegue ao

conhecimento do destinatário. Mas, de qualquer forma, é indiferente que o agente consiga iludir tais pessoas (juiz ou perito). Basta a idoneidade da alteração para

enganar.

A tentativa é admissível.

44. Favorecimento pessoal

113 "O procedimento do dono que tira coisa própria que se acha em poder de terceiro injustificadamente, não integra a figura do art. 346 do CP, uma vez que a posse desta não resulta de determinação judicial, nem, tampouco, de convenção subsistente" (RT 536/300)

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Art. 348 - Auxiliar a subtrair-se à ação de autoridade pública autor de crime a que é cominada pena de reclusão:Pena - detenção, de um a seis meses, e multa.§ 1º - Se ao crime não é cominada pena de reclusão:Pena - detenção, de quinze dias a três meses, e multa.§ 2º - Se quem presta o auxílio é ascendente, descendente, cônjuge ou irmão do criminoso, fica isento de pena.

44.1. Conceito e objetividade jurídica

Pratica o crime quem auxilia autor de crime punido com reclusão a subtrair-se à ação da autoridade pública.

A pena cominada é de detenção, de um a seis meses, e multa.

Se o auxílio é prestado a alguém que cometeu crime punido com detenção, a pena será de detenção, de quinze dias a três meses, e multa (§ 1º).

O § 2º prevê hipótese de isenção de pena, quando quem presta o auxílio é ascendente, descendente, cônjuge ou irmão do criminoso.

Assim, qualquer auxílio prestado a autor de crime, de molde a que se subtraia à ação da autoridade, constitui delito punível, por importar em atentado à

administração da justiça.

44.2. Ação típica

Centra-se no verbo auxiliar, que significa ajudar de alguma forma.

O crime em estudo consiste num favorecimento ao autor do crime, e não ao crime, porque então haveria co-participação.

Importante que o auxílio se dê depois da prática do crime. Tampouco pode ter havido promessa de auxílio anterior ao cometimento do crime, porque

se isto ocorrer haverá co-autoria, e não favorecimento pessoal.

O auxílio pode ser prestado de qualquer forma. Importa é que o autor do crime seja subtraído à ação da autoridade pública114.

44.3. Sujeito ativo

Qualquer pessoa. Menos o co-autor do crime115.

Haverá, no entanto, isenção de pena, se o sujeito ativo for ascendente, descendente, cônjuge ou irmão do criminoso, conforme §2º.

44.4. Sujeito passivo

É o Estado.

44.5. Objeto material

É o autor de crime. Pressuposto do fato, portanto, é a existência de um crime anterior.

44.6. Elemento subjetivo

Basta o dolo genérico.

Não há forma culposa.

44.7. Consumação e tentativa

Consuma-se o crime com a efetiva subtração do criminoso, ainda que temporariamente, à ação da autoridade.

A tentativa é admissível, como na hipótese de se prestar o auxílio, mas este ser insuficiente.

45. Favorecimento real:

Art. 349 - Prestar a criminoso, fora dos casos de co-autoria ou de receptação, auxílio destinado a tornar seguro o proveito do crime:Pena - detenção, de um a seis meses, e multa.

45.1. Conceito e objetividade jurídica

O favorecimento real consiste também num auxílio prestado ao criminoso. Porém, não para subtrai-lo à atuação da autoridade, mas para tornar seguro

o produto do crime. Esse auxílio não poderá configurar co-autoria ou receptação.

A pena cominada é de detenção de um a seis meses e multa.

A administração da justiça continua sendo a objetividade jurídica.

45.2. Ação típica

Consiste em prestar auxílio ao criminoso, ou seja, ajudar o criminoso para garantir o proveito do crime116. Esta prestação de auxílio deve ser posterior

ao cometimento do delito, e não pode ter sido prometida anteriormente. Do contrário estaria configurada a co-autoria.

45.3. Sujeito ativo

Qualquer pessoa.

45.4. Sujeito passivo

114 "Pratica, em tese, o delito de favorecimento pessoal quem subtrai criminoso das diligências policiais, auxiliando-o a fugir, após a perpetração do delito" (RT 393/83) "A incriminação do art. 348 do CP consiste no auxílio de qualquer natureza prestado a quem acaba de cometer um crime, objetivando subtraí-lo à ação da autoridade, bastando somente a ajuda idônea e eficiente dispensada ao criminoso para evitar a sua captura" (RT 604/414)115 RT 512/358116 "A prestação de auxílio ao criminoso para que consiga fugir com o produto do delito por ele praticado configura o favorecimento real" (TACRIM-SP - AC 349.411)

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O Estado.

45.5. Objeto material

É o proveito do crime anterior.

45.6. Elemento subjetivo

Além do dolo genérico, o crime exige o específico, caracterizado pelo fim de tornar seguro o proveito do crime.

Não há forma culposa.

45.7. Consumação e tentativa

Com o efetivo auxílio, desde que idôneo, pouco importando sua eficácia.

A tentativa é admissível.

46. Exercício arbitrário ou abuso de poder

Art. 350 - Ordenar ou executar medida privativa de liberdade individual, sem as formalidades legais ou com abuso de poder:Pena - detenção, de um mês a um ano.Parágrafo único - Na mesma pena incorre o funcionário que:I - ilegalmente recebe e recolhe alguém a prisão, ou a estabelecimento destinado a execução de pena privativa de liberdade ou de medida de

segurança;II - prolonga a execução de pena ou de medida de segurança, deixando de expedir em tempo oportuno ou de executar imediatamente a ordem de

liberdade; III - submete pessoa que está sob sua guarda ou custódia a vexame ou a constrangimento não autorizado em lei;IV - efetua, com abuso de poder, qualquer diligência.

46.1. Conceito e objetividade jurídica

Consiste o crime definido no art. 350 em ordenar ou executar medida privativa de liberdade individual, sem as formalidades legais ou com abuso de

poder. A pena cominada é de detenção, de 1 mês a um ano.

O parágrafo único consagra figuras assemelhadas, sujeitas à mesma pena do caput: I- funcionário que ilegalmente recebe e recolhe alguém à prisão, ou

a estabelecimento destinado a execução de pena privativa de liberdade ou de medida de segurança; II- funcionário que prolonga a execução de pena ou de medida

de segurança, deixando de expedir em tempo oportuno ou de executar imediatamente a ordem de liberdade; III- funcionário que submete pessoa que está sob sua

guarda, ou custódia, a vexame ou a constrangimento não autorizado em lei; IV- pessoa que efetua, com abuso de poder, qualquer diligência.

A conduta descrita no caput foi integralmente reproduzida no art. 4º, letra "a", da lei n. 4.898/65, que disciplina o abuso de autoridade. As condutas dos

incisos I e II do parágrafo único estão compreendidas na descrição típica do caput; a conduta definida no inciso III está descrita, com maior abrangência, na letra

"b" daquele art. 4º; a conduta do inciso IV está subsumida em vários dispositivos da lei especial (arts. 3º e 4º)117.

117 Art. 3º. Constitui abuso de autoridade qualquer atentado:        a) à liberdade de locomoção;        b) à inviolabilidade do domicílio;        c) ao sigilo da correspondência;        d) à liberdade de consciência e de crença;        e) ao livre exercício do culto religioso;        f) à liberdade de associação;        g) aos direitos e garantias legais assegurados ao exercício do voto;        h) ao direito de reunião;        i) à incolumidade física do indivíduo;        j) aos direitos e garantias legais assegurados ao exercício profissional. (Incluído pela Lei nº 6.657,de 05/06/79)Art. 4º Constitui também abuso de autoridade:        a) ordenar ou executar medida privativa da liberdade individual, sem as formalidades legais ou com abuso de poder;        b) submeter pessoa sob sua guarda ou custódia a vexame ou a constrangimento não autorizado em lei;        c) deixar de comunicar, imediatamente, ao juiz competente a prisão ou detenção de qualquer pessoa;        d) deixar o Juiz de ordenar o relaxamento de prisão ou detenção ilegal que lhe seja comunicada;        e) levar à prisão e nela deter quem quer que se proponha a prestar fiança, permitida em lei;        f) cobrar o carcereiro ou agente de autoridade policial carceragem, custas, emolumentos ou qualquer outra despesa, desde que a cobrança não tenha apoio em lei, quer quanto à espécie quer quanto ao seu valor;        g) recusar o carcereiro ou agente de autoridade policial recibo de importância recebida a título de carceragem, custas, emolumentos ou de qualquer outra despesa;        h) o ato lesivo da honra ou do patrimônio de pessoa natural ou jurídica, quando praticado com abuso ou desvio de poder ou sem competência legal;        i) prolongar a execução de prisão temporária, de pena ou de medida de segurança, deixando de expedir em tempo oportuno ou de cumprir imediatamente ordem de liberdade. (Incluído pela Lei nº 7.960, de 21/12/89.

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Percebe-se, pois, que este art. 350 está derrogado pela lei 4.898/65.

O tema, no entanto, não é pacífico. Embora haja muitos julgados no sentido da revogação ou absorção deste art. 350 pela lei 4.898, o certo é que o

entendimento atual é em sentido contrário118.

A despeito do ponto de vista expressado, pela revogação desse dispositivo legal, e tendo em conta a divergência, analisaremos tais condutas como

postas na redação originária do Código Penal.

Objeto jurídico do crime é a normalidade da atividade estatal de administração da justiça. Não se pode deixar de reconhecer, no entanto, que também se

tutela a liberdade individual, imprescindível àquela normalidade da atividade jurisdicional do Estado.

46.2. Ação típica

Ordenar (mandar) ou executar (tornar efetiva a ordem) são os verbos empregados pelo legislador, referindo-se a qualquer medida privativa de

liberdade individual.

A prisão somente pode ser ordenada e executada quando permitida em lei, e na forma que esta determina. Em não sendo assim, será ilegal, arbitrária.

Tirante o caso de flagrante delito, somente se admite a prisão mediante ordem escrita da autoridade (art. 153, § 12, da C.F.).

Assim, ocorre este crime quando a prisão é feita sem mandado, salvo a hipótese de flagrante; ou quando a autoridade que expede o mandado de prisão

é incompetente; ou quando ele é expedido contrariamente ao que dispõe a lei.

A chamada prisão para averiguações configura esse crime, de vez que não tem previsão legal.

46.3. Sujeito ativo

Trata-se de crime próprio, que só pode ser cometido por funcionário público, eis que somente as autoridades ou seus representantes é que podem

ordenar ou executar medida privativa de liberdade individual.

Na hipótese do inciso I, somente o Diretor do Presídio, ou a pessoa responsável pelo estabelecimento penal, podem cometer o crime.

46.4. Sujeito passivo

O Estado. Secundariamente, também a pessoa atingida com a arbitrariedade do funcionário.

46.5. Objeto material

É a medida privativa de liberdade individual. Pode ser a prisão ou a internação em Manicômio Judiciário.

46.6. Elemento subjetivo

É o dolo genérico.

46.7. Consumação e tentativa

Consuma-se o crime com a prática de qualquer das condutas incriminadas no tipo penal.

A tentativa é possível.

47. Fuga de pessoa presa ou submetida a medida de segurança:

Art. 351 - Promover ou facilitar a fuga de pessoa legalmente presa ou submetida a medida de segurança detentiva:Pena - detenção, de seis meses a dois anos.§ 1º - Se o crime é praticado a mão armada, ou por mais de uma pessoa, ou mediante arrombamento, a pena é de reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos.§ 2º - Se há emprego de violência contra pessoa, aplica-se também a pena correspondente à violência.§ 3º - A pena é de reclusão, de um a quatro anos, se o crime é praticado por pessoa sob cuja custódia ou guarda está o preso ou o internado.§ 4º - No caso de culpa do funcionário incumbido da custódia ou guarda, aplica-se a pena de detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, ou multa.

47.1. Conceito e objetividade jurídica

Promover ou facilitar a fuga de pessoa legalmente presa ou submetida a medida de segurança detentiva, constitui o crime do art. 351, com pena

cominada de detenção, de seis meses a dois anos.

Objetividade jurídica é a administração da justiça.

47.2. Ação típica

Consiste em promover, isto é, realizar a fuga; ou facilitar, ou seja, auxiliar, ajudar na fuga.

Vários os meios executivos.

47.3. Sujeito ativo

Qualquer pessoa, salvo o próprio preso fugitivo, pois a fuga em si não constitui crime. Até mesmo o funcionário público pode ser sujeito ativo deste

crime.

47.4. Sujeito passivo

O Estado.

118 RT 537/299, 592/344

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47.5. Objeto material

É a pessoa que está legalmente presa ou submetida a medida de segurança.

47.6. Elemento subjetivo

Basta o dolo genérico. Não há forma culposa.

47.7. Consumação e tentativa

Consuma-se o crime com a fuga efetiva, ainda que por breve tempo. A tentativa é possível 119.

47.8. Figuras qualificadas

a) sendo o crime cometido a mão armada, ou por mais de uma pessoa, ou mediante arrombamento, a pena será de reclusão, de dois a seis anos;

b) havendo emprego de violência contra pessoa, aplica-se também a pena correspondente à violência.

c) se o agente é pessoa sob cuja custódia ou guarda está o preso ou internado, a pena será de reclusão, de um a quatro anos.

47.9. Figura culposa

Havendo culpa por parte do funcionário incumbido da custódia ou guarda, aplica-se-lhe a pena de detenção, de três meses a um ano, ou multa.

48. Evasão mediante violência contra a pessoa:

Art. 352 - Evadir-se ou tentar evadir-se o preso ou o indivíduo submetido a medida de segurança detentiva, usando de violência contra a pessoa:Pena - detenção, de três meses a um ano, além da pena correspondente à violência.

48.1. Conceito e objetividade jurídica

No art. 352, pune o C. Penal a conduta de evadir-se ou tentar evadir-se o preso ou o indivíduo submetido a medida de segurança detentiva, usando de

violência contra pessoa. A pena cominada é de detenção, de três meses a um ano, além da pena correspondente à violência.

O legislador penal não pune a fuga de preso. A incriminação deste art. 352 se faz em razão do emprego de violência. Trata-se, mais uma vez, de crime

contra a administração da justiça.

48.2. Ação típica

Consiste em evadir-se (fugir) com o emprego de violência contra pessoa, ou tentar evadir-se com o emprego da violência.

Quanto ao local da evasão, existem duas correntes: a) uma não considera evasão a fuga fora do estabelecimento carcerário, quando o preso está sendo

transportado, por exemplo; b) outra sustenta que evasão haverá sempre que o agente já esteja preso ou internado, pouco importando o lugar.

Indispensável o uso de violência física, não bastando a simples ameaça.

48.3. Sujeito ativo

Somente a pessoa legalmente presa, ou submetida a medida de segurança detentiva, podem ser sujeitos ativos do delito, que é próprio.

48.4. Sujeito passivo

O Estado. Secundariamente, a vítima da violência.

48.5. Objeto material

É a pessoa que sofre a violência.

48.6. Elemento subjetivo

Dolo genérico.

48.7. Consumação e tentativa

Consuma-se o crime com a prática da violência. Não há tentativa, pois ela é equiparada ao crime consumado. Evadir-se ou tentar evadir-se, diz o texto

legal.

49. Arrebatamento de preso

Art. 353 - Arrebatar preso, a fim de maltratá-lo, do poder de quem o tenha sob custódia ou guarda:Pena - reclusão, de um a quatro anos, além da pena correspondente à violência.

49.1. Conceito e objetividade jurídica

119 "Configura o crime de facilitação de fuga de pessoa presa, na forma tentada, a ação de agente que introduz, em presídio, para fuga do marido, pedaços de serra utilizada para serrar parcialmente barra de ferro de porta de cela, iniciando, assim, a execução de plano de fuga que só não se consumou por circunstâncias alheias à vontade da agente" (RT 405/295)

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Arrebatar preso, a fim de maltratá-lo, do poder de quem o tenha sob custódia ou guarda, diz o art. 353. A pena cominada é de reclusão, de um a quatro

anos, além da pena correspondente à violência.

Trata-se de crime que atenta contra a administração da justiça.

49.2. Ação típica

Arrebatar é o núcleo do tipo, significando tirar à força o preso do poder de quem o tem sob custódia ou guarda. É irrelevante o local onde se encontre

o preso. Não se exige, também, a legalidade da prisão. O delito, outrossim, não abrange o indivíduo submetido a medida de segurança.

49.3. Sujeito ativo

Qualquer pessoa.

49.4. Sujeito passivo

O Estado. Secundariamente, o preso arrebatado.

49.5. Objeto material

É o preso arrebatado do poder de quem o tem sob custódia ou guarda.

49.6. Elemento subjetivo

Além do dolo genérico, o crime exige também o específico, consistente na finalidade de maltratar o preso.

49.7. Consumação e tentativa

Consuma-se o crime com o efetivo arrebatamento do preso, ainda que não se chegue a maltratá-lo.

A tentativa é possível.

50. Motim de presos

Art. 354 - Amotinarem-se presos, perturbando a ordem ou disciplina da prisão:Pena - detenção, de seis meses a dois anos, além da pena correspondente à violência.

50.1. Conceito e objetividade jurídica

O art. 354 pune a conduta de amotinarem-se presos, perturbando a ordem ou disciplina da prisão. A pena cominada é de detenção, de seis meses a dois

anos, além da pena correspondente à violência.

Além do motim, é indispensável que haja perturbação da ordem ou da disciplina da prisão.

O crime tem como objetividade jurídica a normalidade da administração da justiça.

50.2. Ação típica

Amotinarem-se, diz o texto penal, significando tumulto sério, com atos de violência contra funcionários e instalações do presídio. Exige um número

significativo de presos. Não se há falar em motim quando os presos desobedecem ordens, ou protestam pacificamente. O motim exige violência, tumulto, grave

perturbação da ordem e da disciplina.

Simples briga entre presos não configura motim.

50.3. Sujeito ativo

Somente os presos. Trata-se de crime coletivo, ou de concurso necessário.

50.4. Sujeito passivo

É o Estado.

50.5. Objeto material

São os próprios presos amotinados.

50.6. Elemento subjetivo

É o dolo genérico.

50.7. Consumação e tentativa

Consuma-se o crime com a efetiva perturbação da ordem e da disciplina da prisão.

A tentativa é possível, mas de difícil configuração na prática.

51. Patrocínio infiel

Art. 355 - Trair, na qualidade de advogado ou procurador, o dever profissional, prejudicando interesse, cujo patrocínio, em juízo, lhe é confiado:Pena - detenção, de seis meses a três anos, e multa.

51.1. Conceito e objetividade jurídica

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O crime de patrocínio infiel consiste em trair, na qualidade de advogado ou procurador, o dever profissional, prejudicando interesse, cujo patrocínio,

em juízo, lhe é confiado. A pena é de detenção, de seis meses a três anos, e multa.

A objetividade jurídica é, uma vez mais, a administração da justiça, atingida seriamente com a conduta incriminada.

51.2. Ação típica

Trair o dever profissional significa violar o dever profissional; ser infiel a este dever. Indispensável, ainda, que seja prejudicado interesse em juízo. E

que este interesse devesse ser patrocinado pelo sujeito ativo. Exige-se, pois, a existência de um mandato, escrito ou verbal.

A traição pode ocorrer por ação ou omissão.

51.3. Sujeito ativo

Somente o advogado (regularmente inscrito na OAB), ou o procurador judicial (estagiário). Trata-se, pois, de crime próprio.

51.4. Sujeito passivo

É o Estado.

51.5. Objeto material

É o dever profissional. Incumbe ao advogado e ao procurador judicial a defesa intransigente dos interesses que lhe foram confiados. Isto constitui um

dever profissional, cuja violação configura o crime em estudo.

51.6. Elemento subjetivo

É o dolo genérico.

51.7. Consumação e tentativa

Consuma-se o crime com o efetivo prejuízo causado ao interesse que foi confiado ao agente. A tentativa é viável, mas apenas na forma comissiva.

52. Patrocínio simultâneo ou tergiversação:

Parágrafo único - Incorre na pena deste artigo o advogado ou procurador judicial que defende na mesma causa, simultânea ou sucessivamente, partes contrárias

52.1. Conceito e objetividade jurídica

Nos termos do parágrafo único deste artigo 355, incorre nas mesmas penas o advogado ou procurador judicial que defende na mesma causa,

simultânea ou sucessivamente, partes contrárias. A objetividade jurídica continua sendo a administração da justiça.

52.2. Ação típica

Defender, verbo utilizado no texto, significa patrocinar o interesse em juízo; de partes contrárias, completa o texto, significando aquelas cujos

interesses são conflitantes. O dispositivo lega alude à mesma causa, pelo que não há de ser necessariamente no mesmo processo. Causa é a lide, a questão

controvertida, a pretensão jurídica. Uma mesma causa pode ser debatida em vários processos. O que se coíbe é a defesa de partes contrárias na mesma causa.

52.3. Sujeito ativo

Somente o advogado ou procurador judicial.

52.4. Sujeito passivo

O Estado.

52.5. Objeto material

É a parte contrária defendida na mesma causa pelo advogado ou procurador judicial.

52.6. Elemento subjetivo

É o dolo genérico.

52.7. Consumação e tentativa

Consuma-se o crime com a prática de qualquer ato processual, sem que se exija prejuízo efetivo. Não basta, portando, a mera aceitação de procuração.

A tentativa é possível.

53. Sonegação de papel ou objeto de valor probatório:

Art. 356 - Inutilizar, total ou parcialmente, ou deixar de restituir autos, documento ou objeto de valor probatório, que recebeu na qualidade de advogado ou procurador:

Pena - detenção, de seis a três anos, e multa.

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53.1. Conceito e objetividade jurídica

O crime, definido no art. 356, consiste em inutilizar, total ou parcialmente, ou deixar de restituir autos, documentos ou objeto de valor probatório, que

recebeu na qualidade de advogado ou procurador. A pena cominada é de detenção, de 6 meses a 3 anos, e multa.

Objetividade jurídica é a administração da justiça.

53.2. Ação típica

Inutilizar (tornar inútil ao fim a que se destina), total ou parcialmente, ou deixar de restituir (não devolver) 120. Pressuposto do delito é que o agente

tenha entrado na posse do objeto material em razão de sua qualidade de advogado ou procurador.

53.3. Sujeito ativo

Somente o advogado ou procurador podem cometer este crime.

53.4. Sujeito passivo

É o Estado.

53.5. Objeto material

São os autos (conjunto de peças de um processo), documentos ou objeto de valor probatório (coisas capazes de fornecer elemento de convicção).

53.6. Elemento subjetivo

É o dolo genérico. A negligência do advogado poderá implicar em infração ao Código de Ética, mas não deste dispositivo legal, que exige o dolo

genérico, não admitindo forma culposa.

53.7. Consumação e tentativa

Na primeira modalidade, o crime se consuma no instante em que o objeto material é inutilizado (destruído), total ou parcialmente. Na Segunda, quando

o agente excede o prazo fixado para devolução, após legítima solicitação.

A primeira modalidade admite tentativa. A Segunda, não.

54. Exploração de prestígio

Art. 357 - Solicitar ou receber dinheiro ou qualquer outra utilidade, a pretexto de influir em juiz, jurado, órgão do Ministério Público, funcionário de justiça, perito, tradutor, intérprete ou testemunha:

Pena - reclusão, de um a cinco anos, e multa.Parágrafo único - As penas aumentam-se de um terço, se o agente alega ou insinua que o dinheiro ou utilidade também se destina a qualquer das

pessoas referidas neste artigo.

54.1. Conceito e objetividade jurídica

Consiste o crime em solicitar ou receber dinheiro ou qualquer outra utilidade, a pretexto de influir em juiz, jurado, órgão do Ministério Público,

funcionário da justiça, perito, tradutor, intérprete ou testemunha. Pena: reclusão, de 1 a 5 anos, e multa.

As penas serão aumentadas de um terço se ao gente alega ou insinua que o dinheiro ou utilidade também se destina a qualquer das pessoas referidas no

"caput" (Parágrafo único do art. 357).

Objetividade jurídica é a administração da justiça.

54.2. Ação típica

Solicitar (pedir) ou receber (tomar para si o que lhe é oferecido). Na primeira modalidade, a iniciativa é do agente, que propõe a traficância, não se

exigindo a aceitação por parte do presumível comprador do tráfico de influência. Na Segunda, a iniciativa não é do agente, mas sim do terceiro.

Tanto uma como outra conduta são exercidas a pretexto de influir naquelas pessoas elencadas no texto penal, a indicar o comportamento fraudulento

do agente. Porque se realmente o dinheiro ou utilidade fosse destinado a tais pessoas, o crime seria de corrupção ativa e passiva.

54.3. Sujeito ativo

Qualquer pessoa.

54.4. Sujeito passivo

O Estado.

120 "Em tese, a infração do art. 356 do CP de 1940 considera-se configurada, na modalidade de retenção dos autos, a partir do decurso do prazo de 24 horas após a intimação do retentor, consoante o art. 196 do CPC" (RT 605/409)

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54.5. Objeto material

É o dinheiro ou a outra utilidade qualquer.

54.6. Elemento subjetivo

Dolo genérico.

54.7. Consumação e tentativa

Consuma-se o crime com o recebimento ou com a solicitação, pois se trata de crime de mera conduta.

Possível a tentativa.

55. Violência ou fraude em arrematação judicial:

Art. 358 - Impedir, perturbar ou fraudar arrematação judicial; afastar ou procurar afastar concorrente ou licitante, por meio de violência, grave

ameaça, fraude ou oferecimento de vantagem:

Pena - detenção, de dois meses a um ano, ou multa, além da pena correspondente à violência.

55.1. Conceito e objetividade jurídica

Pune-se, no art. 358, a conduta consistente em impedir, perturbar ou fraudar arrematação judicial, afastar ou procurar afastar concorrente ou licitante,

por meio de violência, grave ameaça, fraude ou oferecimento de vantagem. A pena cominada é de detenção de 2 meses a 1 ano, ou multa, além da pena

correspondente à violência.

Objetividade jurídica é a administração da justiça.

55.2. Ação típica

Na primeira modalidade, centra-se a ação típica nos verbos impedir (não deixar realizar), perturbar (dificultar) ou fraudar.

Na Segunda, nos verbos afastar ou procurar afastar concorrente ou licitante.

A descrição típica se assemelha bastante à dos art. 93 e 95 da lei 8.666, já estudados quando do crime do art. 335.

55.3. Sujeito ativo

Qualquer pessoa.

55.4. Sujeito passivo

O Estado.

55.5. Objeto material

É a arrematação judicial.

55.6. Elemento subjetivo

Genérico o dolo.

55.7. Consumação e tentativa

Consuma-se o crime, na primeira modalidade, no instante em que se praticam quaisquer das condutas típicas de impedir, perturbar ou fraudar.

Na Segunda, no instante do emprego da violência ou oferecimento da vantagem, ainda que o concorrente não se deixe afastar.

Admissível a tentativa na primeira modalidade. Na Segunda, o legislador equipara a tentativa ao crime consumado.

56. Desobediência a decisão judicial sobre perda ou suspensão de direito:

Art. 359 - Exercer função, atividade, direito, autoridade ou múnus, de que foi suspenso ou privado por decisão judicial:Pena - detenção, de três meses a dois anos, ou multa.56.1. Conceito e objetividade jurídica

O crime, definido no art. 359, consiste em exercer função, atividade, direito, autoridade ou munus, de que foi suspenso ou privado, por decisão judicial.

A pena cominada é de detenção, de 3 meses a 2 anos, ou multa.

56.2. Ação típica

Centra-se no exercício da função, atividade, direito, autoridade ou munus.

56.3. Sujeito ativo

Qualquer pessoa.

56.4. Sujeito passivo

O Estado

56.5. Objeto material

É a função, atividade, direito, autoridade ou munus exercida a despeito de suspensão ou privação por decisão judicial.

56.6. Elemento subjetivo

Dolo genérico.

56.7. Consumação e tentativa

Consuma-se o crime com o efetivo exercício.

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A tentativa é possível.

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