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«A correcta compreensão da natureza do Estado
é essencial para toda a acção revolucionária do proletariado»
Álvaro Cunhal, A questão do Estado, questão central de cada revolução
1. Com o advento do neoliberalismo o Estado desapareceu ou está em vias
de desaparecer?
Nos dias que correm, todos os intelectuais que pululam nos think tanks
neoconservadores afirmam a necessidade de o Estado abrir mão de serviços públicos em
benefício da (auto)iniciativa dos cidadãos e da sociedade civil. Economistas do
mainstream neoliberal advogam a urgência da libertação das “gorduras” do Estado,
tarefa a ser entregue à iniciativa privada com suas estruturas flexíveis, automatizadas e
eficientes. Políticos da esquerda da direita e da direita da direita falam na inevitabilidade
em diminuir o peso da máquina estatal, chegando a pronunciar a sua inutilidade social
em diversas áreas (educação, saúde, segurança social). Todos estes agentes do capital
insistem na redução do Estado a uma circunscrição de domínio político mínimo ajustada
em torno de três eixos centrais no discurso ideológico neoliberal: 1) perda da soberania
nacional; 2) tendência para o desvanecimento do Estado no quadro de organismos
transnacionais como a ONU, a UE, a OMC, a NATO, o FMI, etc.; 3) maior volume da
chamada sociedade civil empreendedora e com iniciativa – o grande capital – na
regulação do tecido social e económico.
Portanto, para o capital e seus apologistas, o Estado seria cada vez mais uma
velharia institucional com um papel residual na estruturação das sociedades
contemporâneas.
Será tudo isto uma verdade incontestável? Será que o Estado se tornou realmente
numa estrutura vestigial do modo de produção capitalista com uma função meramente
acessória na reprodução do capital? Haverá, então, um esbatimento do Estado-Nação
em prol da ascensão, a prazo, de um Estado mundial?
Do nosso ponto de vista, não faz sentido apostar às cegas no que já foi chamado
de “ideologia do fim” (Moura, 1997): fim das ideologias, fim do trabalho, fim da
dominação política, fim das classes. Uma mera observação sobre o quotidiano permite-
nos captar a persistências de enormes desigualdades sociais e, noutro nível, da
permanência de um aparato repressivo e zeloso defensor dos interesses de classe da
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burguesia. Assim, procurar-se-á demonstrar a falência das teses do “Estado mínimo” e
como o Estado é uma estrutura que tem um papel e um lugar vital no modo de produção
capitalista. A definição das propriedades estruturantes do Estado capitalista e a sua
configuração específica no neoliberalismo serão dois passos teóricos essenciais para a
posterior conceptualização das dinâmicas políticas, económicas e ideológicas do Estado
na actual fase de desenvolvimento do capitalismo. Perceber-se-á que a sinalização dos
vectores estruturantes do Estado neoliberal é uma tarefa essencial na luta de ideias que
os comunistas têm de continuar a travar.
2. Quais são as características gerais do Estado capitalista e o que é uma
forma de Estado?
Em primeiro lugar, importa definir o que se entende por Estado capitalista e o
que o distingue de outras formas de organização política pré-modernas. Sinteticamente,
o tipo de Estado capitalista consuma o processo de autonomização funcional e orgânica
da estrutura económica relativamente à estrutura política. Autonomização funcional, já
que a produção e a apropriação do excedente económico a partir do trabalho assalariado
– nervo central do capitalismo – implicou uma depuração da actividade económica. Ou
seja, a criação das relações sociais de produção deixa de depender directamente da
acção e intervenção políticas e o próprio direito burguês institui a igualdade jurídica –
portanto formal e não real – entre a classe produtora e a classe dominante, algo que não
ocorria no feudalismo. Consequentemente, dá-se a autonomização orgânica entre as
instâncias económica e política, expressa na criação de um aparelho de Estado com um
corpo de funcionários passíveis de serem recrutados em todas as classes, não só em
teoria mas na prática, se bem que com probabilidades diferenciadas em ascender na
hierarquia do aparelho. Todavia, o direito burguês é distinto do direito feudal pois, na
letra da lei, oculta a dominação de classe ao passo que este último mesmo na sua própria
linguagem assume e legitima a dominação classista (por exemplo, a divisão da
sociedade em ordens é uma vontade de Deus). O direito burguês, em contraste, cria a
figura do cidadão, poderosa criação ideológica que procura ocultar a existência de
relações de exploração e opressão, afirmando uma condição humana mistificada. Claro
que a criação dos direitos cívicos é, por um lado, um importante avanço civilizacional
face à servidão feudal e, por outro lado, é uma evidência para qualquer comunista e
progressista que a luta popular de massas é o melhor garante da defesa e
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aprofundamento dos direitos de cidadania e não uma qualquer “oferta de direitos” por
parte da burguesia. Mas isso são contas de um outro rosário…
Por aqui se percebe que o tipo de Estado capitalista, enquanto uma estrutura
imanente ao modo de produção capitalista e determinada em última instância pelas
relações de produção, é produtor de uma ideologia própria: a ideologia do povo-nação.
Isto é, o tipo de Estado capitalista «apresenta-se como o representante do “interesse
geral” de interesses económicos competidores e concorrenciais». Sistematizando, «este
tipo de Estado apresenta-se como a incarnação da vontade popular do povo/nação. A
construção do povo/nação é institucionalmente fixada como o conjunto de cidadãos ou
indivíduos, cuja unidade é representada pelo Estado capitalista» (Poulantzas, 1978,
p.133). Tal facto – a produção da ideologia do povo-nação – implica que a estrutura
interna do Estado seja regida por princípios de organização específicos que assegurem
um carácter de impessoalidade ao desempenho de um qualquer cargo no aparelho de
Estado. Com a perspicácia analítica que sempre caracterizou os seus escritos Lenine
afirmava que «a república democrática é o melhor invólucro político possível para o
capitalismo, e por isso o capital depois de se ter apoderado deste invólucro, que é o
melhor, alicerça o seu poder tão solidamente, tão seguramente, que nenhuma
substituição, nem de pessoas, nem de instituições, nem de partidos na república
democrática burguesa abala esse poder» (Lenine, 1978, p.231). Daqui importa ressaltar
o poder de despersonalização do Estado sobre os agentes sociais que nele actuam. No
tipo de Estado capitalista é o cargo, é a função administrativa, técnica ou política do
cargo que determina as acções individuais do funcionário estatal e não o contrário. É,
portanto, esta forma de organização interna do Estado – o burocratismo (Poulantzas,
1978, p.341-350) – que cimenta a unidade do Estado e impede a sua desestruturação.
Ao mesmo tempo é este pressuposto de suposta neutralidade tanto da sua ideologia (a
ideologia do povo-nação) como da sua estrutura interna (o tipo de burocratismo
aludido) que vai permitir a prossecução das políticas estatais como políticas com uma
natureza de classe objectivamente reprodutora do domínio do capital. É a partir daqui
que se compreende a frase lapidar do “Manifesto Comunista” de que «o executivo do
Estado moderno não é mais do que uma comissão para administrar os negócios comuns
de toda a classe burguesa» (Marx e Engels, 1975, p.62).
A correcta definição teórica da natureza de classe do Estado tem efectivamente
consequências políticas de monta. A propósito da crítica das ilusões legalistas da
burguesia liberal relativamente à queda do fascismo português, portanto, num contexto
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diferente do que se vive hoje, mas sem por isso perder pertinência teórica e política,
Álvaro Cunhal afirmava que «depois de derrubado o fascismo, nenhuma política
democrática poderá ser levada a cabo em Portugal, nenhumas reformas sociais
profundas poderão ser realizadas, o poder dos monopólios e latifundiários não poderá
ser liquidado, nenhuma garantia poderá haver contra nova ofensiva vitoriosa da reacção
e do fascismo, se o aparelho do Estado for apenas conquistado, remodelado e
liberalizado. É um absurdo pensar que uma revolução pode realizar-se apoiada no
aparelho do Estado das classes contra as quais essa mesma revolução é dirigida»
(Cunhal, 1977, p.33). Logo, a inércia da estrutura estatal é muito poderosa e só é
amovível face à luta operária e popular capaz de transformar a configuração interna do
Estado em seu benefício. Não basta nunca, seja em que situação for, substituir os
dirigentes A pelos dirigentes B sem se levarem a cabo profundas mudanças no aparelho
de Estado.
Todavia, o Estado capitalista não é imutável e vai adquirindo diferentes formas
de Estado conforme o arranjo dinâmico do modo de produção capitalista: «a teoria
marxista da luta de classes permite explicar a origem e a natureza do Estado e os seus
diversos tipos e formas» (Cunhal, 1977, p.9). Só um esquerdismo inconsequente não vê
diferenças substanciais entre as várias formas de Estado (fascista, liberal,
keynesiano/fordista, ditadura militar, etc.) e não percebe as distintas correlações de
força entre as classes e respectivas alianças da classe trabalhadora em cada contexto
histórico. Com efeito, cada forma de Estado, para além de em grande medida reflectir o
estádio de desenvolvimento das relações de produção num determinado momento, é
também fruto das condições política e organizativa da classe trabalhadora e igualmente
das diferentes relações que se estabelecem entre as diversas fracções da burguesia,
dentro do bloco no poder. Este é um conceito de Poulantzas altamente devedor de
Gramsci e que se consubstancia no facto de «i) o bloco no poder constituir uma unidade
contraditória das classes e fracções politicamente dominantes, sob a protecção de uma
fracção hegemónica; ii) a luta de classes, a rivalidade entre os interesses destas forças
sociais, está constantemente presente, dado que estes interesses mantêm um carácter
específico de antagonismo». Um bloco no poder é sempre liderado por uma fracção
hegemónica da burguesia e que «puxa as restantes fracções para debaixo da sua égide»
(Poulantzas, 1978, p.239).
No final, uma forma de Estado no capitalismo é o resultado de um jogo que se
articula, de um lado, pelo arranjo de forças dentro do bloco no poder e dentro da
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estrutura interna do Estado e, de outro lado, da relação do Estado com as restantes
instâncias da sociedade (economia e cultura) e com a luta de classes.
3. No neoliberalismo, há ou não, uma nova forma de Estado?
A esta questão, a resposta só pode ser positiva. No neoliberalismo há, de facto,
uma nova forma de Estado a que chamaremos Estado neoliberal. Por outras palavras, as
novas dinâmicas das relações de produção capitalistas desde meados da década de 70
registaram e introduziram alterações no próprio Estado, influenciando a sua
recomposição. Esta recomposição ocorreu tanto ao nível da estrutura interna do
aparelho de Estado como nas modalidades de execução das suas funções de classe. As
derrotas conjunturais da classe trabalhadora e das forças progressistas e revolucionárias
nos anos 70 e 80 (derrota das lutas operárias em França e Itália em 1969-70; golpe de
Estado fascista no Chile em 1973; Portugal a partir de finais de 1975, com o início da
contra-revolução institucionalizada; adesão do PCE, PCF e PCI ao eurocomunismo;
derrota dos mineiros em Inglaterra em 1984-85), coroadas com a queda do “socialismo
realmente existente” no Leste europeu (1989-91), abriram espaço à contra-ofensiva
global da burguesia em larga escala. Uma das facetas dessa contra-ofensiva situou-se na
esfera do Estado.
Por conseguinte, a abordagem aqui utilizada terá como base o recurso a um
método histórico-comparativo. Isto é, privilegiar-se-á a comparação entre o capitalismo
na actualidade e na sua era mais tipicamente fordista (anos 30/40 – anos 70).
Nesse sentido, importa descrever as alterações ocorridas na relação entre o
Estado e a instância económica. No fordismo, o Estado tinha como missão orientar e
definir a política económica global, o Estado é o motor da economia. No fundo, era ao
Estado que competia não só elaborar o desenho estrutural do tecido económico, como
em muitos casos havia um controlo directoi sobre uma série de sectores económicos
estratégicos: energia, telecomunicações, sector bancário, etc. Tudo isto, conjuntamente
com um forte investimento público em infra-estruturas da mais variada espécie, era
concretizado pelo Estado fordista ou keynesiano.
Com o advento do neoliberalismo a partir dos anos 70-80, resultante das
crescentes dificuldades de valorização do capital e da enorme capacidade produtiva
inutilizada, a esfera económica não pôde continuar a viver na base de injecções
massivas de capital que não seria valorizado na sua totalidade no final do circuito D-M-
D’. Noutros termos, as dificuldades que o capitalismo encontra para reproduzir a
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acumulação de capital numa escala alargada são consideráveis. Isso implica que do
ponto de vista da grande burguesia não faça sentido levar a cabo uma política
económica de contínuo investimento produtivo, sob pena de se entrar numa crise de
sobreprodução. Em simultâneo, a consolidação dos sectores económicos anteriormente
parcial ou totalmente controlados pelo Estado, torna-os alvos apetecíveis para um
capital desejoso de combater a tendência estrutural para a queda da taxa de lucro do
sistema capitalista. Daí que tudo o que o Estado ajudou a criar (sistema de transportes,
vias de comunicação, infra-estruturas fornecedoras de energia, escolas, universidades,
hospitais, indústrias várias), e que o capital privado não tinha capacidade para o fazer no
contexto do fordismo, seja privatizado e entregue de mão beijada à grande burguesia.
Não obstante, o Estado não desaparece da vida económica, mas apenas mudou
as suas funções económicas. Metaforicamente, o Estado passou de motor da economia a
carroçaria desta. Em vez de definir a política económica global, o Estado passa a
enquadrar a acumulação de capital, é a muleta por excelência da política económica
previamente definida pelos grandes conglomerados capitalistas e pelos mercados
financeiros. Em poucas palavras, o papel de enquadramento da actividade económica
consiste na regulação da desregulação. Explicitando, as privatizações e a retirada de
importantes direitos sociais, políticos e económicos dos trabalhadores implicam, é certo,
uma inocultável desresponsabilização do Estado nesta matéria, em áreas de grande
importância para os trabalhadores. Mas essa desresponsabilização, usualmente chamada
de desregulação, implica um esforça titânico e essencial por parte do Estado para
concretizar e legitimar essa linha de acção. Só a acção organizada e concertada do
Estado permite a entrega de inúmeros sectores de actividade ao grande capital e a
redução de direitos à classe trabalhadora. Daí que, paradoxalmente, o Estado regule a
desregulação das suas anteriores linhas de acção.
Num tabuleiro distinto, se bem que intimamente relacionado, há que delinear as
mudanças a que o bloco no poder assistiu.
No capitalismo fordista, designadamente nos países centrais do sistema
capitalista internacional, a fracção hegemónica do bloco no poder era a burguesia
financeira. Esta fracção da burguesia agrupa e conjuga simultaneamente o capital
bancário com o capital industrial. A sua faceta (pre)dominante era o sector industrial.
Ou seja, havia uma orientação clara da burguesia financeira para, muito resumidamente,
através dos seus bancos captar as poupanças e capitais disponíveis para os investir na
esfera produtiva, de forma a incrementar a produtividade industrial. A esfera financeira
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propriamente dita (os mercados de acções, as cotações bolsistas, etc.) estava
subordinada à necessidade de elevar a produção de mais-valia pela introdução de
crescentes massas de capital constante (maquinaria) no processo produtivo. O Estado
tinha aqui um importante papel como acima se referiu. Por arrasto, a burguesia
industrial – fracção não hegemónica da burguesia quase só direccionada para o sector
industrial – era, apesar da hegemonia da burguesia financeira, uma fracção altamente
pujante. Esta fracção tinha, à época, um ascendente sobre uma outra fracção não
hegemónica muito relevante: a burguesia bancária (não confundir com a burguesia
financeira). Ou seja, a burguesia industrial tinha uma posição mais bem colocada tanto
no mercado como no Estado do que os bancos que não tinham indústria na sua posse.
No fordismo, tanto os bancos pertencentes à burguesia financeira como os restantes
bancos do capital bancário propriamente dito, resumiam a sua actividade ao crédito. Isto
é, destinavam-se sobretudo a prover as necessidades de capital-dinheiro para o
sorvedouro industrial, tendo em vista elevar a produção de valor na esfera produtiva.
Quando a produção de mais-valia começa a encontrar dificuldades de manter
níveis de crescimento mais ou menos equiparáveis à taxa de crescimento da composição
orgânica do capital, ou seja, quando se dá um ponto de viragem no metabolismo do
capital em que a taxa de mais-valia (a taxa de exploração da força de trabalho) é inferior
aos níveis de aplicação de trabalho morto no processo de produção capitalista, a política
desenvolvimentista acima traçada é revista pela burguesia financeira. De facto, não há
um abandono da actividade económica basilar do capitalismo – a produção de mais-
valia – já que esta se mantém e aumenta. Mas este aumento e demanda em elevar a taxa
de mais-valia ocorre de uma forma muito mais lenta e cautelosa sob pena de se agravar
as dificuldades de crescimento económico. A saber, da economia real, da economia
ligada à produção de bens (bens de consumo de massas, bens de capital, etc.). Assim,
com o neoliberalismo ocorre um direccionamento da burguesia financeira para a
revalorização de tudo o que é capital fictício: mercados cambiais, fundos de pensões,
desenvolvimentos de produtos financeiros de todo o tipo (derivados, junk bonds,
capitais de risco, etc.), especulação bolsista. Mesmo os grupos financeiros que tinham
uma clara vocação e predominância industrial sobre as actividades bancária e
especulativa, irão seguir esses desígnios. Com efeito, é a estagnação nos ritmos de
extracção de mais-valia que orientará a burguesia financeira para a esfera especulativa,
para o capital fictício (D – D’). A burguesia financeira mantém-se como a fracção
hegemónica do bloco no poder, mas agora com um guia de instruções completamente
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distinto. Concomitantemente, nas outras fracções não hegemónicas do capital
oligopolista, a burguesia bancária ultrapassa o capital estritamente industrial, dada a
menor importância do crédito, por sua vez fruto da quebra da importância relativa (mas
não absoluta) do investimento industrial. A burguesia bancária focar-se-á cada vez mais
na actividade económica que ainda vai servindo de almofada ao rebentar de uma crise
de sobreprodução do capitalismo: os mercados financeiros e a valorização do capital
fictício (ver Marx, 1991, p.525-542; capítulo dedicado ao capital fictício). A queda da
burguesia industrial no seio do bloco no poder é evidente e muitos “capitães da
indústria” têm sido submergidos na média burguesia. Os exemplos de grandes indústrias
têxteis em Portugal (Lameirinho, Coelima, Somelos, Riopele, Maconde, etc.) são
bastante ilustrativos. Numa dinâmica paralela, pequenas parcelas do capital industrial
têm sido absorvidas pela grande burguesia financeira ou bancária (como por exemplo as
dívidas de inúmeras indústrias a entidades bancárias). Confirma-se assim a tendência
para a concentração e centralização do capital.
Num terceiro nível, o Estado neoliberal resulta de uma outra alteração no mapa
social. Para uma melhor compreensão dar-se-á um breve “desvio”, se assim se lhe
quiser chamar. Marx na obra “18 de Brumário de Luís Bonaparte” – uma das grandes
obras de ciência política da modernidade e tão barbaramente esquecida e menosprezada
no meio académico – chama a atenção para o papel do campesinato na sustentação do
regime ditatorial de Luís Bonaparte. Com efeito, a desorganização política e ideológica
desta classe popular – bem como o medo da proletarização e o acenar por parte da
burguesia, intelectuais reaccionários e da igreja dos “perigos” de uma revolução
operária em França – concretizou-se no controlo político e ideológico do campesinato
pelo Estado francês de então. Assim, Marx partindo da tese que «o poder de Estado não
flutua no ar», chega à conclusão de que «Bonaparte representa, sem dúvida, a classe
mais numerosa da sociedade francesa: os camponeses detentores de parcelas». Isto
significa que
«na medida que subsiste entre os camponeses detentores de parcelas com uma conexão
apenas local e a identidade dos seus interesses não gera entre eles nenhuma
comunidade, nenhuma união nacional e nenhuma organização política, não formam
uma classe. São, portanto, incapazes de fazer valer o seu interesse de classe em seu
próprio nome, quer por meio de um parlamento quer por meio de uma Convenção. Não
podem representar-se, têm que ser representados. O seu representante tem de aparecer
ao mesmo tempo como seu senhor, como uma autoridade sobre eles, como um poder
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ilimitado de governo que os proteja das restantes classes e lhes envie do alto a chuva e
o sol» (Marx, 1983, p.502-503) [itálicos nossos].
Consequentemente, o campesinato funcionou durante o regime de Luís
Bonaparte (1850-1871) como uma classe-apoio. Nas palavras de Poulantzas uma
classe-apoio caracteriza-se por se diferenciar do bloco no poder em duas dimensões: 1)
«o suporte e apoio que dão a uma determinada dominação de classe não é geralmente
baseada em qualquer tipo de sacrifício político real dos interesses do bloco no poder em
favor da classe-apoio», exactamente o oposto do que acontece na constituição de um
qualquer bloco no poder, onde a fracção hegemónica se vê a braços com a necessidade
de estabelecer compromissos com as restantes fracções burguesas; 2) «a aprovação
particular de uma classe-apoio é devida em boa parte ao medo, real ou imaginário, do
poder da classe trabalhadora» (Poulantzas, 1978, p.243-244).
Aplicando este conceito proveniente de Marx e sistematizado por Poulantzas
podemos constatar que a uma forma de Estado pode corresponder uma diferente classe-
apoio. No Estado keynesiano podemos identificar a classe-apoio não como uma classe
social mas numa categoria social: a aristocracia operária. Ou seja, uma faixa minoritária
(proveniente) do proletariado mas que detém ampla influência de massas no controlo
social da restante classe. Cooptada pelo Estado, a aristocracia operária foi um
importante sustentáculo da preservação da ordem capitalista no centro do sistema
capitalista internacional. Desde a AFL-CIO nos EUA, até aos casos do SPD na
Alemanha, do Partido Trabalhista no Reino Unido e de todos os sindicatos amarelos e
partidos da social-democracia um pouco por todo o lado, houve a constituição de forças
de bloqueio à luta operária e sindical das organizações de classe de então: Partidos
Comunistas muito fortes na generalidade da Europa Ocidental e sindicatos de classe
defensores dos direitos e interesses dos trabalhadores. No neoliberalismo, dado o recuo
das forças mais consequentes do movimento operário, todo o arsenal de aparatos de
enquadramento institucional de amplas camadas de trabalhadores com uma consciência
de classe intermédiaii deixou de ser necessário para o capital. Daí que a própria social-
democracia tenha deitado ao lixo o keynesianismo, o reformismo e a conciliação de
classes que a tinham caracterizado até então, tomando abertamente o lado do capital.
No Estado neoliberal a classe-apoio direcciona-se para o que muito
grosseiramente podemos chamar de novas classes médias. Por outras palavras, todo o
pessoal academicamente qualificado que desempenha funções de enquadramento e
supervisão da força de trabalho no processo de produção, assoma como a classe-apoio
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desta forma de Estado. É esta classe que não produz mais-valia, mas que também não se
apropria directamente dela, que vai consubstanciar a função económica de controlo e
vigilância dos trabalhadores na produçãoiii. Por outro lado, na esfera ideológica, é uma
outra “nova” camada social que legitima e procura “embelezar” a existência do
capitalismo: os “novos intermediários culturais”. Basicamente estes correspondem aos
fazedores de opinião, aos intelectuais que têm assento em think tanks e fundações
financiadas pela burguesia, os directores de instituições culturais, os engenheiros de
publicidade, os directores e editores dos media alinhados com o capital, etc. No fundo, é
a integração de intelectuais no status quo e a proliferação de profissões ligadas à
legitimação ideológica e cultural do capitalismo neoliberal e das (falsas) virtualidades
do mercado e da flexibilidade laboral que constituem um dos vectores da classe-apoio
do Estado neoliberal.
Rematando este ponto, há de facto uma nova forma de Estado mais ou menos
concordante com as modificações do padrão de acumulação capitalista: a forma de
Estado neoliberal.
4. Quais as funções políticas do Estado neoliberal?
Não procurando recensear exaustivamente todos os vectores de actuação política
do Estado neoliberal, procuramos enunciar alguns eixos que nos parecem significativos.
Assim teremos em consideração:
a) a forma como o Estado neoliberal assegura a coesão das estruturas do modo
de produção capitalista;
b) o reforço da componente estritamente política do Estado;
c) a transformação das instituições da democracia burguesa;
d) a forma de o Estado neoliberal assegurar a desorganização política do
proletariado e paralelamente manter a coesão política do bloco no poder, da burguesia
no seu conjunto;
e) a expansão do Estado a crescentes áreas da vida social.
a) O tipo de Estado capitalista tem como função estrutural nuclear a coesão entre
as instâncias económica, política e ideológico-cultural de uma qualquer formação social.
Neste aspecto, a forma de Estado neoliberal não foge à regra. Todavia, a nossa tese é de
que o Estado neoliberal reproduz a coesão e unidade da estrutura social total muito mais
a partir da lei e menos através do controlo directo sobre as restantes instâncias. Em
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suma, a articulação entre os múltiplos campos da vida social depende muito mais do
impacto do produto normativo mais específico do Estado – a lei – do que da acção do
Estado na configuração e regulação directa das restantes instâncias. Daí que o Estado
neoliberal privatize escolas, hospitais, serviços de notariado e até mesmo pequenas
parcelas das forças armadas (por exemplo, os milhares de mercenários contratados pelos
EUA e pela Inglaterra para ajudarem os respectivos exércitos na invasão e ocupação do
Iraque) sem, contudo, perder o controlo efectivo sobre essas esferas. O controlo é
político e envolve a regulamentação legal e jurídica de tudo aquilo por parte do Estado.
Escusado é dizer que o quadro legal instituído e promulgado tem muito pouco de
progressista (se é que tem algum) para a classe trabalhadora. No concreto, podem-se
visualizar as exemplificações concretas do Código do Trabalho, da Lei de Bases da
Educação, da Lei de Financiamento dos Partidos Políticos, ou a nível europeu a
proposta de Constituição Europeia – rejeitada pelos povos francês e holandês em
referendo – como marcos da evolução do direito burguês. A multiplicação de Códigos
legisladores (Código Penal, do Processo Penal, Civil, do Trabalho, Europeu de Conduta
Voluntário, da Estrada, de Ética para os Profissionais da Informação, etc.) é também
uma demonstração prática dessa nova tendência de controlo societal pelo Estado. No
fundo, há um recurso crescente à elaboração de documentos enormes, altamente
especializados e minuciososiv e com um poder de aplicação e regulamentação muito
forte. Daí que ocorra uma propensão para a hiper-especialização dos quadros legais
existentes com o objecto de miniaturizar a vida social até ao mais ínfimo detalhe
possível. Por aqui também se percebe porque acima se falou em regulação da
desregulação, já que a desregulação de determinadas relações sociais (mormente
laborais) implica uma fortíssima, minuciosa e intricada regulação legal. Portanto, a uma
desregulação social – correlativa da mercantilização das relações sociais – corresponde
uma intensa regulação legal.
Um simples exemplo. Na revista que os gestores dos Correios distribuem pelos
seus funcionários, um dos directores da empresa diz muito explicitamente que a
(defendida abertamente) liberalização dos serviços postais não pode passar sem uma
«regulação do mercado» feita através de «legislação e fiscalização que estabeleçam
claramente as mesmas regras para todos os que estejam nas mesmas circunstâncias –
criando assim um campo de actuação e sustentação justo e igual para todos os
intervenientes no sector postal» (Silva, 2006, p.34) [itálicos meus]. “Campo de actuação
e sustentação” que não é mais do que o mercado. Com efeito, os próprios gestores e
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capitalistas sabem perfeitamente que precisam do Estado. Do Estado não querem os
direitos dos trabalhadores e os serviços públicos, mas apenas o que lhes possa aumentar
as margens de lucro e o que possa assegurar a reprodução do sistema económico
capitalista.
Sintetizando, não há um controlo directo, dispendioso e desgastante mas um
controlo indirecto, relativamente mais barato e muito mais eficaz, mantendo intacta a
estrutura de poder. Sem falar que o Estado actua de forma muito mais silenciosa e
subterrânea criando a ilusão do seu desaparecimento ou, no mínimo, de um enganador e
pretenso alargamento da liberdade dos indivíduos relativamente ao Estado neoliberal.
b) Na verdade, se o Estado neoliberal deixou de deter importantes funções
sociais e se deixou igualmente de controlar empresarialmente faixas significativas do
tecido económico, tal não é sinónimo de seu desaparecimento ou esbatimento da
realidade social. Bem pelo contrário. O Estado neoliberal expressa um reforço da sua
componente política, do seu core business, isto é, o aparelho repressivo do Estado. A
multiplicação e o reforço logístico e financeiro de agências como a CIA, a NSA, o MI6,
e a monitorização da polícia, exército, sistemas de segurança e vigilância (o Echelon por
exemplo) continuam fundamentalmente sob a tutela do Estado e têm uma natureza cada
vez mais repressiva e com o propósito de fortalecer o controlo político dos
trabalhadores e suas organizações políticas e sindicais. Todo o clima de histeria anti-
muçulmano – que é, diga-se em abono da verdade, uma forma altamente perversa do
racismo mais puro e duro típico do imperialismo –, em articulação com a
securitarização da vida socialv e a promulgação de leis penais “anti-terroristas” e “anti-
comunistas”vi são sintomas do acentuar do papel repressivo do aparelho de Estado
neoliberal.
c) Decorrente do ponto anterior, compreende-se imediatamente que as próprias
instituições formalmente democráticas do Estado burguês sofrem um impacto
considerável. Nesse sentido, há um claro robustecimento do Estado em torno dos seus
órgãos executivos de poder. Tudo o que é mais conotado com a democracia
representativa – parlamento, poder local democrático, etc. – é transmutado, em muitos
casos, em organismos fantoche do Estado neoliberal sem qualquer poder decisório e
manietados pelos órgãos executivos, nomeadamente os governos ou a elite militar e
administrativa do Estado. Em linha paralela com o ponto b) pode-se falar numa
![Page 13: 1. Com o advento do neoliberalismo o Estado desapareceu ou ... · 1 «A correcta compreensão da natureza do Estado é essencial para toda a acção revolucionária do proletariado](https://reader036.fdocumentos.tips/reader036/viewer/2022071218/6051adfd41fa9c22e742112a/html5/thumbnails/13.jpg)
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dinâmica de muscular a democracia burguesa que chega mesmo a atingir contornos de
fascização, como no caso do aparelho de Estado estadunidense (ver Urbano Rodrigues,
2003). Assim, a própria democracia burguesa é cada vez mais um instrumento de
legitimação e menos uma prática por muito limitada que seja.
Ora, este processo acaba por importar elementos ideológicos da filosofia
económica neoliberal e com efeitos consideráveis na ideologia estrutural do Estado, na
ideologia do povo-nação. De facto, o Estado neoliberal tende a mesclar a ideologia do
povo-nação com critérios economicistas de eficácia empresarial tipicamente neoliberais,
transformando progressivamente o tradicional político profissional burguês (carreiristas,
populistas e demagogos como Mário Soares, Santana Lopes, Paulo Portas, Alberto João
Jardim) num político-gestor que salta das grandes empresas para o Estado e vice-versa.
Com um discurso reaccionário, mas pouco compreensível nas suas linhas mais
profundas pelas massas mais despolitizadas, esses políticos-gestores (José Sócrates,
Bagão Félix, Carmona Rodrigues, Rui Rio) apostam muito mais numa suposta
neutralidade e independência políticas, partidárias e de classe em nome da eficácia
empresarial e do pragmatismo tecnocrático. Mais do que políticos-espectáculo,
populistas e demagogos, os políticos-gestores evidentemente têm fortes interesses
individuais na vida política. Contudo, não fogem à partitura de orientações que o capital
e o Estado neoliberal lhes colocam à frente e são competentes na sua execução dessas
políticas de direita. Onde o político burguês tradicional aposta no virtuosismo
individual, tendo a ambição mais ou menos manifesta de passar a maestro da orquestra e
colocá-la a favor dos seus interesses particulares, o político-gestor é muito mais
obediente e os seus proveitos individuais nunca ultrapassam os da burguesia e do Estado
neoliberal. Quanto mais não seja porque estes últimos têm uma educação política feita
em empresas do grande capital onde eram gestores e altos executivos. Portanto,
procurando desvalorizar os fundamentos ideológicos da cena política, estes homens de
mão do capital, apresentam-se como os paladinos de uma nova fornada de políticos
altamente competentes para os interesses do capital financeiro.
Desse modo, a prossecução da ideologia do povo-nação, numa palavra, a forma
como se assegura a representação dos interesses de classe da burguesia como
supostamente universais pelo corpo burocrático do Estado depende não só da
interpretação e execução mecânicas da lei. Mas, igualmente, esta interpretação e
execução dependem directamente da incorporação e assunção de comportamentos de
eficácia e cálculo. Daí que para esses políticos-gestores o encerramento de maternidades
![Page 14: 1. Com o advento do neoliberalismo o Estado desapareceu ou ... · 1 «A correcta compreensão da natureza do Estado é essencial para toda a acção revolucionária do proletariado](https://reader036.fdocumentos.tips/reader036/viewer/2022071218/6051adfd41fa9c22e742112a/html5/thumbnails/14.jpg)
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ou de escolas primárias seja fruto de uma avaliação dos custos que acarretam para o
Estado neoliberal e não uma avaliação feita na base do clientelismo com as elites locais
ou de oportunidade política. Não é por acaso que o discurso político do estilo – “o
governo tem de tomar decisões difíceis sem ter medo dos resultados eleitorais” –
ganhou maior acutilância e é aceite pelo político-gestor, ao mesmo tempo que engana as
massas.
d) O Estado neoliberal como qualquer Estado capitalista desarticula a luta
operária e ao mesmo tempo organiza politicamente o bloco no poder. A forma como o
Estado neoliberal concretiza a organização política da burguesia no seu todo, quer dizer,
a forma como mantém o bloco no poder coeso sob a égide da burguesia financeira e sua
estratégia de financeirização da economia expressa-se na aceitação da política
económica neoliberal, se bem que com maiores ou menores fricções entre as várias
fracções da burguesia. O Estado neoliberal para manter a unidade do bloco no poder é
obrigado a realizar um jogo de cintura para “agradar a gregos e troianos”. Por outras
palavras, o Estado neoliberal prossegue uma dinâmica política de acordo com a fracção
hegemónica do bloco no poder mas que comporta uma elasticidade capaz de manter o
compromisso político entre as várias fracções do grande capital. No fundo, porque a
burguesia é constituída por fracções que se digladiam pela apropriação da mais-valia –
bem como dentro de cada fracção – o Estado tem como objectivo político a conciliação
entre as várias fracções da burguesia. Desde a legislação de disposições legais que não
reabram as feridas existentes até ao estabelecimento de compromissos para manter o
bloco no poder em torno da sua fracção hegemónica, qualquer forma de Estado
capitalista está para a burguesia como o Partido leninista (ou qualquer outro tipo de
liderança revolucionária) está para o proletariado e demais classes populares. O Estado
capitalista é a vanguarda política das ofensivas da burguesia contra os trabalhadores –
repressão de lutas operárias, legislação favorável ao capital, etc. – e contra os povos –
invasões imperialistas a cargo dos aparatos militares, logo estatais das grandes potências
capitalistas.
Assim, no que respeita à organização política da burguesia, o Estado neoliberal
não se diferencia, no fundamental, das outras formas de Estado.
A sua marca de especificidade está na outra face da moeda: a desorganização
política do proletariado e seus aliados. Se no fordismo existia um amplo
desenvolvimento de sindicatos de grande influência de massas bem como de partidos
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que agrupavam vastos contingentes de operários – independentemente de serem
organizações amarelas ou serem organismos de classe – tal não se passa no
neoliberalismo. Hoje a preocupação do capital passa por reduzir a contestação operária
e popular ao máximo, quando não a vituperando ou a criminalizando. Para conseguir
esse intento, o Estado neoliberal opera uma recomposição da social-democracia,
retirando-lhe o carácter de massas, com consequências óbvias no desligar de inúmeros
trabalhadores da luta, por muito limitada que fosse de facto a luta sindical da social-
democracia. Portanto, o Estado neoliberal procurou dispersar grandes massas de
trabalhadores, despolitizando e atomizando-as.
Num movimento coincidente, o Estado neoliberal contribuiu decisivamente para
a destruição de espaços comunitários de sociabilidade popular: ilhas, cortiços, bairros
operários, pátios, etc. Todas estas micro-estruturas de sociabilidade das classes
populares – donde derivava um sentimento comunitário de fomento e de educação de
valores como a pertença e a solidariedade, bem como eram igualmente locais
riquíssimos de produção cultural e artística popular (canções, poesia, bibliotecas,
leituras em voz alta, convívio entre os vários membros da comunidade) –, requisitos
essenciais para desenvolver laços espontâneos de identificação colectiva, solidariedade
e unidade de classe, acabaram por ser destroçados, muito por obra das políticas estatais
de ordenamento do território e planeamento urbanístico dos últimos 20/30 anos. A
expulsão das camadas populares dos centros históricos das grandes cidades para os
subúrbios e sua acomodação em zonas residenciais pensadas e organizadas
deliberadamente para assegurar a sua fragmentação, é um dos processos mais
importantes que o Estado neoliberal levou a cabo para desorganizar a classe
trabalhadora.
e) É indubitável que a área que o Estado neoliberal ocupa na superfície territorial
das sociedades contemporâneas é menor. A questão acima aludida (item a) sobre a
passagem do controlo directo do Estado para um paradigma de controlo da coesão das
estruturas mais baseado na lei, tem muito que ver com o que está em discussão neste
ponto.
Paradoxalmente, o encolhimento da estrutura do Estado neoliberal é o que lhe
permite controlar mais esferas da vida social. Explicitando, o Estado está fortemente
condicionado pela tributação fiscal que conseguir recolher aos seus cidadãos. Ora, nas
últimas três décadas o grande capital (burguesia financeira, burguesia bancária,
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burguesia industrial) tem progressivamente pago muito menos impostos e contribuições
(exemplo as centenas de milhões de euros que o grande capital deve à Segurança Social
em Portugal) e criado múltiplas artimanhas de fuga a essas obrigações. Um exemplo
disso são os offshore e paraísos fiscais. Claro que o Estado não desempenha um papel
inocente neste processo e é mesmo um dos seus executores máximos. O offshore da
Madeira é um exemplo entre muitos outros. Em paralelo, as amputações de serviços
públicos das mãos do Estado são um vector do encolhimento deste.
Como se explica então que este encolhimento tenha redundado na maior
capacidade de o Estado neoliberal exercer a sua função de controlo social das classes
dominadas? Basicamente, o Estado neoliberal é uma estrutura mais flexível e com uma
posição pivotal à qual respondem os seus anteriores apêndices, agora privatizados. Ou
seja, a gestão privada tomou conta de hospitais, empresas, serviços das universidades,
etc. mas o seu quadro regulamentar de funcionamento interno provém do Estado. Logo,
o Estado neoliberal não tem custos tão elevados com serviços originalmente públicos e
centraliza o controlo destes muito mais facilmente. Na outra face, a qualidade da
prestação desses serviços deteriora-se e encarece, com naturais prejuízos para a classe
trabalhadora.
Num outro âmbito, o fenómeno recente das ONG’s, algo tão apreciado e
aplaudido por certos teóricos burgueses, também se relaciona com estes procedimentos
do Estado (a este propósito ler Fontes, 2005, p.167-196). Por exemplo, nas políticas de
combate à pobreza e exclusão social, a União Europeia – representando directivas
expressas pelos seus Estados mais poderosos – assevera que tal deve ser uma prioridade
da dita sociedade civil (misericórdias, IPSS’s, entidades privadas, cidadãos anónimos,
etc.) e não do Estado. Portanto, para o grande capital europeu não devem ser os Estados
a delinear políticas públicas globais e de intervenção mais abrangente, mas as IPSS’s e
outras pequenas instituições que têm o papel de intervir local e regionalmente. Uma boa
parte do financiamento dessas instituições provém da UE, mas a legislação que baliza a
sua actuação e quem monitoriza a partir “de cima” as suas actividades é o Estado
nacional. Assim, o Estado não tem tantos custos com políticas sociais e, por outro lado,
como é quem em última instância supervisiona a actuação das ONG’s ou IPSS’s, acaba
por conseguir controlar muito melhor e até a um nível mais micro as franjas mais
pauperizadas do proletariado. Claro que esta situação impede sequer a existência de
políticas sociais democráticas amplas e duradouras e muito mais propícias à integração
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social e ao combate à pobreza, mas isso não é o que preocupa o grande capital e o seu
Estado neoliberal.
Para finalizar este último item relativo à importância da expansão do controlo
social por parte do Estado, demos a palavra a Marx:
«o Estado manieta, controla, regulamenta, vigia e tutela a sociedade civil, desde as suas
manifestações mais amplas de vida até às suas vibrações mais insignificantes, desde as
suas modalidades mais gerais de existência até à existência privada dos indivíduos,
onde este corpo parasitário adquire, pela mais extraordinária centralização, uma
omnipresença, uma omnisciência, uma capacidade acelerada de movimento e uma
elasticidade que só encontram correspondência na dependência desamparada, na
disformidade incoerente do corpo social efectivo» (Marx, 1983, p.454).
5. Quais as funções económicas do Estado neoliberal?
A forma de Estado neoliberal objectiva disposições de cariz económico. Quer
dizer, o Estado neoliberal tem uma natureza de classe burguesa não apenas em função
do seu papel político. Se na maioria dos países o Estado neoliberal já não é proprietário
de parte significativa de unidades empresariais, não se pode deduzir mecanicamente que
o Estado se encontra desprovido de qualquer funcionalidade económica.
Em primeiro lugar, o Estado neoliberal não abandonou completamente o
investimento público. A construção de auto-estradas, aeroportos, barragens, etc.
continua a ser em boa medida assegurada pelo Estado. Singularmente, é também o
Estado que literalmente salva a iniciativa privada quando determinadas falências
acontecem. A Enron e a WorldCom nos EUA ou os caminhos-de-ferro no Reino Unido
quando, por diversas razões, estavam prestes a falir, foi o Estado que injectou
volumosos capitais, permitindo a sobrevivência desses organismos moribundos,
previamente canibalizados e delapidados pela supostamente eficiente e idónea iniciativa
privada.
Aliás, o Estado neoliberal mesmo quando desprovido de importantes serviços
públicos, é muitas vezes um financiador privilegiado dessas funções sociais entregues
ao capital privado. As parcerias público-privadas (PPP) registadas nos hospitais SA (ver
Rosa, 2004) são um exemplo. Desta forma, o Estado cumpre muito mais funções do
lado do capital, retirando direitos a quem trabalhavii. Como já se viu acima a grande
alteração do tipo de actuação do Estado neoliberal na instância económica relativamente
ao Estado fordista/keynesiano, expressa-se na passagem de uma actuação avalizada na
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definição global da política económica para uma acção concertada de enquadramento
institucional da acumulação de capital. Fruto desta transformação, o Estado neoliberal
praticamente deixa de actuar na esfera económica produtiva e industrial (com o fim da
posse directa de empresas), mas detém um trunfo na economia financeirizada. É o
Estado neoliberal, nomeadamente por intermédio de instituições como o BCE (Banco
Central Europeu, altamente enfeudado ao Bundesbank) e o FED (Reserva Federal dos
EUA), que ditam a política monetária actual. Dada a importância incontornável dos
mercados cambiais no mundo económico – nem que seja por causa da convertibilidade
de inúmeras moedas (currencies) da periferia, sobretudo, em dólares, procurando assim
recolher a riqueza produzida nesses países – e dado o seu elevado nível de concorrência,
só instituições estatais podem municiar compromissos entre as empresas e os Estados
rivais. A própria autonomização do BCE, do FED e dos vários bancos centrais
relativamente aos governos não é um sinal de perda de poder da parte do Estado, mas
antes é o furtar desses organismos a qualquer tipo de controlo popular, sendo mais um
exemplo da tendência para o reforço do poder executivo do Estado em detrimento do
legislativo.
Portanto, algo tão apaniguado pelos catedráticos neoliberais das últimas décadas
– a política monetária e cambial – não é apenas resultado das forças “livres” do
mercado, mas é altamente condicionado pelo Estado neoliberal. Milton Friedman, o
mais famoso dos economistas da corrente (neoliberal) monetarista, sabia perfeitamente
que não há estabilidade monetária sem a intervenção do Estado. Intervenção do Estado
antes da implementação de políticas neoliberais (como no Chile em 1973, com o golpe
fascista de Pinochet, apoiado por Friedman). E intervenção do Estado posteriormente,
aquando da aplicação em cada país de políticas de altas taxas de juro e ulterior redução
relativa da emissão de moeda.
Num outro âmbito, o Estado desempenha um outro papel essencial nos mercados
financeiros: o de emissor de títulos da dívida pública. Hoje, os EUA a braços com uma
grave crise nas taxas de crescimento económico, vivem da sucção de valor e de capital
fictício do resto do mundo. Transaccionando títulos do Tesouro americano em troca da
transformação das riquezas nacionais em dólares, a economia dos EUA sobrevive em
boa medida graças a este papel do Estado no que se refere à dívida pública (ver
Dumenil, 2004, p.11-36).
6. Quais as funções ideológicas do Estado neoliberal?
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Muito haveria a dizer relativamente às operações simbólico-ideológicas que o
Estado neoliberal produz. Focaremos apenas o que nos parece particularmente
pertinente.
As derrotas operárias e populares das últimas décadas abriram as portas para a
difusão e penetração da(s) ideologia(s) dominante(s) na classe trabalhadora. Nesse
domínio, a ideologia do povo-nação não foi uma excepção. O Estado neoliberal
continua a legitimar-se ideologicamente em resultado da permanência de directrizes
ideológicas que o consignam como uma estrutura independente dos conflitos da
sociedade civil, portanto, acima das classes e como representante geral de interesses
particulares. Ora, a novidade que o Estado neoliberal opera neste preceito mais ou
menos transversal a qualquer Estado capitalista, tem a ver com a exposição de uma
pretensa progressiva desideologização do seu corpo burocrático de topo. Dá-se uma
transformação dos partidos políticos da burguesia, em que estes se apresentam como
defensores dos direitos de todos os cidadãos de um determinado país. Em nome da
“estabilidade governativa” e da “eficiência na gestão da despesa pública”, os partidos
burgueses pronunciam-se contra a ideologia e a discussão política e programática. Mais
importante do que discutir o que consideram ser minudências estéreis como a divisão
esquerda/direita – apontada pelos apologistas do capital como uma visão antiquada de
observar e julgar a vida política –, valoriza-se a execução de um plano de políticas de
austeridade e com uma liderança política forte e determinada que não ceda aos lobbies e
interesses corporativos (sindicatos, confederações patronais, etc.). No fundo, um
governo regido por preceitos neoliberais define-se por ter uma agenda própria e
autónoma e à qual o capital e o trabalho teriam de se adequar. no interesse da nação,
pois claro.
Todavia, esta visão técnica e ideologicamente depurada dos governos e dos
chamados partidos do “arco do poder” é, ao contrário do que assumem, a elevação ao
máximo da ideologia de classe do povo-nação. Quanto mais ideologicamente neutro o
Estado (e seus corpos intermédios) se apresentar(em), maior a sua eficiência ideológica,
por muito contraditório que isso possa parecer. Ou seja, o carácter pretensamente
imparcial, necessário e inevitável da aplicação das políticas de privatizações, cortes nas
políticas sociais e retirada de direitos económicos, sociais e políticos, decorre de todo
um trabalho ideológico repetido até à exaustão de identificação tácita entre essas
políticas e os supostos interesses genéricos do país. Assim, directrizes políticas de
classe perpassam no discurso político como atendentes aos interesses e necessidades de
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toda a população. Seriam assim as únicas linhas políticas possíveis, bem como as únicas
não-ideológicas pois, pretensamente, não estariam vinculadas a nenhum grupo social
específico, mas diriam respeito a todos. E todos, então, partilhariam os seus custos e
benefícios.
Com efeito, a eficácia deste discurso depende da camuflagem do seu cunho
ideológico de classe, atribuindo às críticas e propostas alternativas ao projecto
neoliberal uma marca estigmatizante de “irrealistas”, “contra a mudança” e
“corporativistas”. Estes foram alguns dos epítetos atribuídos à recente manifestação da
CGTP em 12 de Outubro passado contra as políticas neoliberais do governo
PS/Sócrates. Portanto, e para sumariar, os partidos burgueses – intermediários do
Estado neoliberal – legitimam a sua acção assumindo que as medidas que propõem e
concretizam não são devedoras de nenhum valor ideológico per si, de ser de esquerda
ou de direita, de serem a favor do trabalho ou do capital, mas de serem medidas
políticas eficazes, fatais e necessárias.
Tudo isto porque o Estado neoliberal consuma a ideologia do povo-nação ao
máximo, onde para neutralizar politicamente o proletariado, apresenta um discurso e
uma política politicamente neutras. Com um discurso e uma prática neutros e
estritamente técnicos e fatais, o Estado neoliberal e seus apêndices partidários colam as
aspirações das camadas populares e assalariadas com uma consciência de classe menos
desenvolvida aos intentos da burguesia financeira consagrados no Estado.
Parafraseando Eça, sob o manto diáfano da neutralidade, a nudez forte da
ideologia.
7. Finalizando…
Neste ensaio preferiu-se uma abordagem extensiva de temas. Quer isto dizer que
se deu prioridade a uma análise que desse conta do maior número possível de questões
relacionadas com o Estado neoliberal, em detrimento do que poderia ser um estudo mais
aprofundado e sustentado de alguns (poucos) tópicos. Achou-se mais útil dar uma visão
geral das coordenadas políticas, económicas e ideológicas em que se funda o Estado
neoliberal.
Não sendo este um ensaio académico, houve uma preocupação de utilizar uma
linguagem o mais simples possível, de forma a permitir uma leitura e uma discussão o
mais abrangente possível dos enunciados aqui apresentados.
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Ao mesmo tempo, partiu-se do pressuposto leninista de que “sem teoria
revolucionária não há movimento revolucionário”. Sem uma análise marxista da forma
de Estado capitalista actual – o Estado neoliberal – dificilmente se poderá avançar na
definição de uma estratégia política anticapitalista e revolucionária para o nosso tempo.
O anti-dogmatismo do marxismo-leninismo, a sua frescura e actualidade teórica
decorrem da capacidade dos comunistas aplicarem criativa, correcta e fecundamente os
seus conceitos nucleares num determinado momento histórico. Por conseguinte, a
reflexão teórica dos fenómenos políticos é um pré-requisito fundamental para que a
nossa prática revolucionária comunista seja ainda mais lúcida e consequente. Não se
trata de resolver a prática na teoria. Ou seja, não é a teoria que nos oferece a solução
para a superação do actual estado de coisas. Só na prática se poderá efectivar a contra-
ofensiva dos trabalhadores e dos povos (sobre a necessidade de uma contra-ofensiva dos
trabalhadores ler Papariga, 2006). Igualmente não se trata de resolver a teoria na
prática. Isto é, a prática não é um espelho límpido da abstracção teórica. A teoria
clarifica e elucida a prática revolucionária mas não a determina. A reflexão teórica
marxista é um tipo específico da prática, uma actividade necessária à prática
revolucionária quotidiana e concreta, à luta de classe do proletariado e seus aliados
contra as relações de produção burguesas e contra o Estado capitalista. Para concluir, é
uma condição indispensável, mas nunca suficiente.
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URBANO RODRIGUES, Miguel (2003) – Ascensão do fascismo nos EUA. In
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i É verdade que muitos governos do capital nacionalizaram importantes sectores económicos. Contudo, há uma diferença de fundo entre um governo da burguesia (governo de Mitterand na França do início dos anos 80) e um governo revolucionário (os governos de Vasco Gonçalves em Portugal nos anos de 1974 e 1975) no que toca às nacionalizações. O primeiro tipo de governos procura nacionalizar como forma de desenvolver as forças produtivas existentes para posteriormente entregar todo esse novo aparato técnico-empresarial ao capital privado. Sucintamente, um governo da burguesia quando nacionalizava algo naquela época dos anos 40 a 70 era com o intuito de servir os interesses do capital a longo prazo. A pressão das massas populares também é um factor a não descartar. Inversamente, um governo revolucionário nacionaliza porque o seu objectivo é colocar a economia ao serviço do povo, satisfazer as suas necessidades, assegurar a independência económica do país e ir progressivamente passando o controlo da economia para as mãos dos trabalhadores. ii Ou seja, trabalhadores que não estando sujeitos ao impacto da ideologia reaccionária burguesa, apenas tinham desenvolvido uma consciência de classe económica, isto é, estritamente sindical, daí a maior facilidade de sua manipulação pela social-democracia. Ao contrário dos operários comunistas e outros operários progressistas, não tinham uma consciência de classe política muito desenvolvida: na sua subjectividade de classe não colocavam em causa a ordem burguesa. iii A este propósito ver a Secção nº3, subponto II do nosso artigo “A actualidade científica do conceito marxiano de exploração capitalista” (Aguiar, 2006). iv O Código Civil português tem qualquer coisa como 553 páginas e o Código do Trabalho 229 páginas. A abstrusa proposta de Constituição Europeia contava com 265 páginas. v A instalação de câmaras de vídeo e sistemas de vigilância em tudo o que é espaço público e privado. vi A vergonhosa ilegalização da Juventude Comunista Checa e o projecto apresentado no Parlamento Europeu de criminalização do comunismo são dois sinais do ódio anti-comunista, algo que está inscrito no genoma político e cultural da grande burguesia, mas agravado pelo actual contexto de barbárie imperialista. vii Um parêntesis. O Estado capitalista (independentemente da sua forma específica) até ser tomado e transformado pelo proletariado, é sempre uma estrutura burguesa. Contudo, o Estado capitalista, por ter uma autonomia relativa baseada – a) num burocratismo assente na competência e na impessoalidade das tarefas dos seus funcionários; e b) na ideologia do povo-nação – tem de enquadrar e almofadar as
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convulsões sociais de classe. Daí que o Estado ceda concessões à classe trabalhadora – sempre depois da luta popular de massas – sem no entanto subverter as relações de propriedade e a natureza de classe do Estado. [*] Estudante de Sociologia na Faculdade de Letras da Universidade do Porto. O texto original pode ser encontrado em http://joaovalenteaguiar.googlepages.com. http://asvinhasdaira.wordpress.com é o endereço do seu blog pessoal.