1 - Benedict Anderson-Imaginar Timor Leste

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    [Traduo de Osvaldo Manuel Silvestre]Reproduzido deCiberkioske deArena Magazine4, Abril-Maio 1993

    Por que razo falhou a tentativa daIndonsia para absorver Timor Leste?E como explicar o to rpidodesenvolvimento do nacionalismotimorense desde 1975? BenedictAnderson, autor de Imagined

    Communi t ies, argumenta que aIndonsia no consegue imaginar ostimorenses de leste como indonsios.As suas relaes com eles so decolonizador a colonizado, dandoorigem ao nacionalismo timorenseassim como o colonialismo holandsem tempos deu origem ao nacionalismo indonsio.

    Desejo fazer duas perguntas bem concretas, as quais todavia envolvem uma

    certa problemtica terica comum. A primeira pergunta : Por que razo falhou atentativa indonsia para absorver Timor Leste? Era o fracasso inevitvel ou algoaconteceu entre 1975 e 1990 que podia ter sido evitado? Qual a natureza doserros cometidos, se que de fato foram cometidos erros? A segunda pergunta de algum modo a inversa: Como explicar o to rpido desenvolvimento donacionalismo timorense? Para mim esta segunda questo muito sria. Os meusescritos tericos sobre o nacionalismo tm-se focado na importncia da difusoda imprensa e na sua relao com o capitalismo, mas em Timor Leste semprehouve muito pouco capitalismo e o analfabetismo era geral. Como se nobastasse, Timor Leste etnicamente muito complicado, com diversos grupos de

    lnguas. O que foi ento que tornou possvel "pensar Timor Leste"?A primeira questo surgiu-me quando estive em Portugal em 1992. Entre os

    meus colegas portugueses corria ento uma discusso sobre o depoimento doGeneral Costa Gomes. Ele foi uma das figuras decisivas dos governosportugueses de 1974-76, data do colapso do imprio portugus, e uma das maisresponsveis pelas decises tomadas sobre Timor Leste. No seu depoimento,dizia que ele e os seus amigos pensavam que Timor Leste seria como Goa - queseria pacfica e facilmente absorvido pela grande Indonsia, tal como Goa foiabsorvida pela grande ndia. Defendia ele que se Jacarta no tivesse sido to

    brutal, se o exrcito indonsio no tivesse sido to opressivo e explorador, no

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    haveria hoje um problema de Timor Leste. Assim sendo, a tragdia de TimorLeste no era de sua responsabilidade nem do governo portugus. Timor Lestepodia facilmente ter-se tornado uma parte feliz, vibrante e participativa daIndonsia. Contudo, o depoimento de Costa Gomes, no fundo, no nos ajudamuito, j que no explica a brutalidade e o carter explorador da ocupaoindonsia.

    Neste ponto, vemo-nos confrontados com uma questo que respeita noapenas Indonsia, mas abarca toda a problemtica de como as naes seimaginam a si mesmas no final do sculo XX e de quais so as reaispossibilidades de as naes crescerem em tamanho em vez de se desagregaremem pedaos mais pequenos. Temos assistido muito a isso na Europa de Leste esuspeito de que mais do mesmo ir ocorrer no futuro noutras regies, numaespcie de reduo geral de escala da imaginao nacional - uma incapacidade de

    avanar para uma incluso e incorporao genunas. No caso especfico daIndonsia, necessrio inquirirmos sobre o modo como a liderana militar emJacarta pensa sobre o territrio e os povos que eles decidiram ser indonsios.Como evidente, a grande dificuldade tem sido a de se persuadirem a si mesmosde que os timorenses de leste so mesmo indonsios. Se o fossem, bastaria atarefa simples de raspar uma espcie de estranheza superficial atribuvel colonizao portuguesa, revelando um indonesianismo natural por baixo.

    O nacionalismo indonsio v-se a si mesmo, de modo auto-consciente, comoincorporando ou abrangendo grupos tnico-lingusticos variados e diferentes

    culturas religiosas, aquelas aglomeradas ao longo de sculos nas ndias Orientaisholandesas. O elemento comum da Indonsia est fundamentalmenterelacionado com a experincia histrica e a mitologia. Por um lado, existe umaideia de sculos de luta contra o colonialismo holands. Por outro lado, existe omito, poderoso mas tambm potencialmente criador de divises, de grandesestados pr-coloniais, sendo o mais notvel o Majapatit, nos sculos XIV e XV.O imprio Majapatit tem a vantagem de que as suas fronteiras um tantoindefinidas podem ser interpretadas para incluir todo o Timor, assim comoregies hoje partes solidamente integrantes da Malsia e de Singapura. Temcontudo a grande desvantagem de estar intimamente identificado com apenas um

    dos grupos tnicos indonsios, o javans. Da o facto de os lderes estatais teremsido muito cautelosos quanto ao seu uso como uma base fundadora daidentidade histrica da Indonsia moderna.

    Para Jacarta, portanto, a questo reside em como recompor a narrativanacional popular de modo a incorporar nela os timorenses de leste. Tal no podeser feito em termos de resistncia ao imperialismo holands. Nem pode s-lo nostermos dos slidos contactos histricos com o resto do arquiplago, pois umadas caractersticas peculiares do colonialismo portugus residiu em que elemanteve Timor Leste extremamente isolado, excepo de ligaes entre

    Portugal, Macau, Moambique, Angola e Goa. A alternativa bvia a um

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    nacionalismo historicizado , como evidente, um essencialismo biolgico-tnico. Em princpio Jacarta podia dizer: "Afinal, ns temos os mesmos traosfsicos, as nossas lnguas esto relacionadas, as nossas culturas originrias eramidnticas". Mas esta linha de argumentao traioeira, pois conduz a pretenses,hoje inaceitveis, a territrios das Filipinas ou da Malsia.

    Creio que o resultado tem sido uma profunda incapacidade para imaginarTimor Leste como indonsio. E se no se capaz de imaginar os timorenses deleste como "irmos" de verdade, o que fazer? Falei recentemente com umtimorense de leste muito inteligente sobre as suas conversas com outrostimorense de leste, estudantes das universidades indonsias. Existem pelo menosuns dois mil estudantes nessas condies. Muitos deles desistem, em parte porproblemas de lngua, mas sobretudo em resultado do que sentem como um climasocial intolervel. Disse-me ele que o que realmente enfurece os estudantes de

    Timor Leste que esto sempre a ouvir dizer-lhes o quo ingratos eles so."Vejam tudo o que fizemos por vs! Onde est a vossa gratido?", eis o queouvem dias a fio da parte de decanos, professores, colegas, etc. como se noauge do nacionalismo indonsio as pessoas corressem o pas, dizendo aosindonsios que alistavam para a causa nacionalista, que eles deviam sentir-se"gratos". Mesmo nos anos 50, quando a Indonsia foi abalada por vrias revoltasregionalistas, a acusao de ingratido nunca veio tona. Na altura, a acusaoouvida de todos os lados era, tipicamente, de "traio" de um projeto histricocomum. Por contraste, a "ingratido" era uma acusao tpica dos oficiaiscoloniais holandeses contra o nacionalismo "nativo": "Vejam s tudo o que

    fizemos aqui por vs, na segurana, na educao, no desenvolvimentoeconmico, na civilizao". A linguagem a do superior e civilizado em relaoao inferior e brbaro. No anda muito longe do racismo e revela uma profundaincapacidade para "incorporar" os timorenses de leste, um sentimento noreconhecido de que na verdade eles so estrangeiros.

    Pode-se argumentar que esta posio demonstrada pelos mtodosextremistas de domnio que foram usados em Timor Leste aps a invaso de1975. A vasta escala de violncia usada, o uso de bombardeamentos areos, o usode napalm sobre aldeias, o arrebanhar sistemtico de populaes em campos de

    acantonamento, o que tudo conduziu s terrveis fomes de 1977-80, no tmcontrapartida real nas polticas do governo indonsio em relao, digamos, aos"verdadeiros indonsios". Mais parecem polticas para inimigos do que paranacionais. verdade que houve violncia macia na campanha anti-comunista de1965-66. Contudo, o grosso dessa violncia foi de carter local, alimentada pelopnico de milhes de pessoas sobre o que lhes iria acontecer e s suas famlias"se o comunismo vencesse". Ela tinha em si, certamente, um elemento de friaplanificao, mas nada comparvel frieza e planificao da devastao de TimorLeste, a qual me lembra em muito a horrfica depredao levada a cabo pelos"agentes espectrais" de Leopold, no Corao das Trevasde Conrad. Conrad insistiu

    em que para esses agentes todas as regras civilizadas eram abandonadas em

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    "frica". A, atrocidades que nunca lhes seriam permitidas na Blgica, eramadmitidas.

    certamente verdade que Timor Leste colocava problemas muito especiaisa Jacarta. Uma parte substancial da populao fora h muito convertida aocatolicismo. Alm do mais, devido ao fato de Portugal ser membro da NATO, aresistncia timorense tinha melhores armas e treino militar, no incio, do quequalquer anterior oposio local a Jacarta. Ela resistiu ferozmente e muitosmilhares de soldados indonsios foram feridos ou mortos em combate,estimulando uma forte atmosfera de zona de combate no territrio. Por outrolado, a guerra dura agora h dezessete anos - o que mais do que qualquer outraguerra j conduzida por Jacarta. Isto significa que Timor Leste tem sido crucialnas carreiras dos oficiais militares indonsios. A maioria dos oficiais de maiorsucesso e ambio lutou em Timor Leste, e as suas promoes dependeram em

    parte do seu sucesso na conduo de uma desapiedada represso e controlo.

    O governo indonsio tem sido incapaz de incorporar Timor Lesteimaginativamente, no sentido mais lato e popular. Ao longo dos anos tem-mesurpreendido muitssimo a forma extraordinria como Timor foi "fechado", noapenas ao mundo exterior, mas tambm ao resto da Indonsia. At h bempouco tempo, o indonsio comum no podia visitar esta parte oficial do seuprprio pas sem uma autorizao especial. A cobertura jornalstica de TimorLeste era excepcionalmente dbil, e ainda mais falseada do que a coberturameditica das outras partes da Indonsia. Foi assim possvel a muitos indonsios

    no pensar muito em Timor Leste, e nem sequer saber dele. Em consequncia,Timor Leste nunca conseguiu fazer parte do sentimento nacional popular. Este"vazio" muito flagrante se o compararmos com a agitada provncia de Irian,onde Jacarta tem vindo a lutar h anos contra uma resistncia quase-nacionalista.

    Tenho agora em minha casa um rapaz de 19 anos, filho de um amigo meu, queterminou h pouco o liceu em Java Ocidental. Ele mal consegue recordar o nomede um nico timorense oriental, mas conhece os de jogadores irianeses defutebol, de jornalistas, e um grande f de Ade, o popular travesti irianscomediante de TV. Irian tem uma presena imaginativa na Indonsia.Independentemente da forma como os irianeses so maltratados em Irian, para

    os indonsios no seu todo eles so parte de "ns".Uma ltima questo a levantar antes de abordarmos o nacionalismo

    timorense tem a ver com o problema da imaginao. Tero os militaresindonsios alguma vez considerado a hiptese de estarem a pr em prtica, demodo invertido, a trajetria final da relao colonial entre eles e os holandeses?Os holandeses estiveram no arquiplago desde o incio do sculo XVII, mas ummovimento nacionalista reconhecvel no apareceu seno no fim do sculo XIXou o incio do XX. O seu despontar est claramente ligado deciso doscolonialistas holandeses de comear a educar as pessoas, especialmente em

    holands, difuso dos meios de comunicao modernos, a projetos de

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    desenvolvimento "macios", e ao crescimento de uma polcia secretaprofissionalizada e ao seu aparelho de investigao. Pela primeira vez, desde1900, os nativos tomaram conscincia de si mesmos. As pessoas eram o alvo deum aparelho de segurana sistemtico e centralizado. Tinham agora conscinciade estarem sujeitos a um projeto de desenvolvimento nico, e de terem emcomum, na mente dos seus governantes, o seu inerradicvel "carter nativo". Pormeio da lngua holandesa que lhes foi imposta nas escolas, acabaram porentender a prpria idia do colonialismo como sistema e quais os meiosmodernos para se emanciparem dele. Como que o governo indonsio noentendeu que a Educao-Represso-Desenvolvimento em Timor Leste seguiaexatamente a mesma lgica das anteriores polticas holandesas, e que o seufalhano estava "previsto" no prprio nascimento moderno da Indonsia?

    Passo agora questo de saber por que razo Timor Leste se tornou

    nacionalista to depressa. Neste ponto as respostas so muito menos claras.Tudo comea com o prprio nome: "Timor Leste". uma expresso queprovm do mapa de Mercator, no qual uma linha administrativa a lpis divide

    Timor ao meio. Como pde esta demarcao "area" tornar-se uma realidade toreal que possvel os jovens de Dli julgarem que perfeitamente normalchamarem-se "Timorenses de Leste", como se essas duas palavras fossem umas, sem apontarem imediatamente para "Timor Ocidental"? No vdeo domassacre de Dili, os placares dos adolescentes exibem slogans como "Viva

    Timorleste" numa palavra apenas. As origens desta nova conscincia derivamcertamente em parte de uma imaginao burocrtica que antecede em muito a

    inveno do nacionalismo. anloga forma pela qual (como defendi nocaptulo 9 da nova edio do meu Imagined Communities) os Irianeses foramimaginados ou nasceram, talvez apenas nos ltimos 30 anos. E contudo, a"imaginao mapeada" no uma explicao suficiente. E quanto questo daformao social? Se observarmos a situao at 1974-75, deparamo-nos com umaordem colonial tipicamente ibrica. Sob o estrato dominante portugus havia,por ordem hierrquica, chineses ricos e apolticos, os ento mestios deascendncia mista africana, rabe, portuguesa e local, e uma pletora decomunidades etnolingusticas "nativas". Poder-se-ia esperar que dessa ordemsocial emergisse algo como aquilo que se encontra nas Filipinas: chefes com uma

    ambgua conscincia poltica, muito conscientes das suas ascendncias mistas edos seus laos externos. Na verdade, entre os mais velhos lderes leste-timorensesdos anos 70, encontrava-se com bastante frequncia uma espcie de inseguranaidentitria e uma ligao ressentida s coisas portuguesas. Timor Leste era umlugar to real como qualquer outro, mas existia ento uma real comunidade "Este

    Timorense" da qual eles fossem os lderes naturais? A minha percepo de queem 1974-75 o verdadeiro nacionalismo timorense tinha ainda uma tnue base deapoio; talvez apenas uma pequena percentagem da populao pudesse entoimaginar realmente o futuro Estado-Nao de Timor Leste.

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    Desde 1975 a situao mudou dramaticamente. A questo est em saberporqu, dada a virtual ausncia de capitalismo e imprensa e a ainda substancialiliteracia. Numa recente entrevista Editor, uma grande revista de Jacarta, oGeneral Sjafei, comandante militar de Timor Leste, disse algo de muitorevelador. Ao descrever as medidas tomadas para desviar o Lusitnia, o navioque tentou ir at Dili, via Darwin, com um grupo de estudantes e reprteres abordo, ele referiu que o barco em si no era perigoso, mas foi dizendo que se eleconseguisse ancorar no porto de Dili, "eu poderia deparar-me com 120.000habitantes da cidade de Dili" e "dadas as circunstncias, eu no poderia garantirque no houvesse uma exploso de massas". Esta linguagem completamentenova. Nunca o exrcito falou anteriormente em "exploses de massas" em TimorLeste ou de que se confrontava como "120.000 pessoas em Dili". Ao longo dosanos o exrcito proclamou que apenas umas dzias de irredutveis opositoresexistiam no interior montanhoso. O depoimento de Sjafei claramente o de uma

    potncia colonial de sbito consciente da sua derrota iminente. idntico aoreconhecimento holands em 1946 de que a Indonsia tinha mudadocompletamente desde 1940, altura em que o seu poder parecia inabalvel.

    Regressamos aqui lgica irnica do colonialismo. Se atentarmos nosdiscursos oficiais sobre Timor Leste, vemos Suharto ou os generais a falar sobreesse povo apenas como "timorense de leste", apesar de na regio existirem pelomenos trinta grupos tnicos ou tribais. Da mesma forma, o regime de Jacartanunca fala dos Asmat ou dos Dhani, mas exclusivamente dos Irianeses. Isto umanlogo muito exacto das ndias Orientais holandesas, em que os colonizados

    sabiam que eram todos "nativos" aos olhos dos seus dominadores, qualquer quefosse a ilha, a etnicidade ou a religio a que pertencessem. Um profundo sentidode uma identidade comum emergiu do vu do estado colonial. O poderindonsio infinitamente mais penetrante, infinitamente mais espalhado do queo poder colonial portugus alguma vez foi. Ele est nas aldeias mais pequenas e representado por centenas de postos militares e por um enorme aparelho derecolha de informao. A conscincia de se ser timorense oriental aumentourapidamente desde 1975 devido, precisamente, expanso do Estado, do qualfaziam tambm parte as novas escolas e os projetos de desenvolvimento.

    Um dos principais projetos do estado de Suharto foi o de "desenvolver" aIndonsia. Isto envolve necessariamente um certo tipo de definio do quesignifica ser um verdadeiro indonsio. Parte dessa definio decorreu dosmassacres anti-comunistas de 1965-66, que foram em parte entendidos comouma luta contra o atesmo. Em consequncia, hoje todo o indonsio tem deseguir uma religio do Livro. Neste ponto, o estado indonsio acaba enredadonuma estranha ratoeira. Em 1975 a maioria dos timorenses era ainda animista.Fazer deles "indonsios" significou "ergu-los" do animismo a uma religiodecente, o que, dadas as realidades existentes, significou Catolicismo. Ao mesmotempo, o Estado estava perfeitamente consciente dos perigos da implantao docatolicismo, sobretudo devido ao fato de Roma insistir em tratar diretamente

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    com Timor Leste, ultrapassando a conformista hierarquia catlica indonsia.Assim, o regime indonsio a um tempo desejou e receou o alargamento dainfluncia do catolicismo. Nos ltimos dezessete anos, a populao catlica doterritrio mais que duplicou de tamanho. Em Timor Leste todos sabem que se se membro da Igreja catlica, beneficia-se de proteo de acordo com a prprialgica do estado; ao mesmo tempo desenvolveu-se um catolicismo popular comoexpresso de um sofrimento comum, tal como sucedeu na Irlanda do sculoXIX. Este elemento comum catlico num certo sentido substituiu aquele tipo denacionalismo de que falei noutros lugares, o qual deriva da articulao entreimprensa e capitalismo. Alm do mais, a deciso da hierarquia catlica em TimorLeste de usar Tetum, e no indonsio, como a lngua da Igreja, teve efeitosprofundamente nacionalizadores. Transformou o Tetum, de uma lngua local oulngua franca em certas partes de Timor Leste, na lngua da religio e daidentidade de Timor Leste.

    Mas existe ainda, subjacente, uma ltima ironia colonial. Para os jovensintelectuais indonsios na viragem do sculo, a linguagem do colonizador, oholands, foi a linguagem pela qual se tornou possvel comunicar atravs dacolnia e compreender a verdadeira condio do pas. Foi tambm a lngua deacesso modernidade e ao mundo para alm da colnia. Por uma gerao pelomenos, o holands desempenhou a funo absolutamente essencial de arrastar osnativos para fora das prises das lnguas tnicas locais. Da mesma forma, oalargamento do indonsio no sistema escolar patrocinado por Jacarta, criou umanova gerao de jovens timorenses que so muito fluentes em indonsio e que,

    por meio do indonsio, acederam ao mundo para l da Indonsia. O indonsiono a lngua da solidariedade interna entre os timorenses de leste, mas umadas lnguas importantes de acesso vida moderna. A relao indonsio/tetumcorresponde em 1990 relao holands/indonsio em 1920.

    Benedict Anderson ensina poltica indonsia na Cornell University. Entre outros livros, autor de ImaginedCommunities: Reflections on the Origin and Spread of Nationalism[Comunidades Imaginadas: Reflexes sobre a origem e a

    difuso do nacionalismo, So Paulo: Companhia das Letras; 2009]. Este artigo baseado numa conferncia naMonash University em 1992.

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