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.i' 1_ .. ~r r v l !~I~:~ ~ ~ ' .. '~- \. ,". Bloco lII Reflexões sobre o Conceito de Política Philippe C. Schmitter A ciência política contemporânea se disting.yç essencialmente por duas qualidades. A primeira ea maIS ãISCutIda é a sua vontade de ser científi- Cã. Isrn"implíca urna preocupaçao te6nca e me- , "'W;iol6gica - um escrúpulo de respeitar dados ~ .requisito do empiricismo) e de não afirmar "ver- ~des" ou "pnncípios certos" sem uma demons- - tração ngorosa (o requisito da verificação de hi- ]õtesesl· Mas nenhuma ciência se define pelo simples de- sejo de ser científica. É um erro comum, espÇ;: ..é!mente' entre os praticantes que se proclamam mais científicos, aplicar-se à metodologia ou a á ~quIsa em irica sem considerar a segunãa qualidade de uma ciência política. quer Izer. • sem ter uma consciência clara da "delimitação -da disciplina". Como tendem a operar sem um conceito adequado da política ou aceitar sem re- flexão qualquer definição corrente desta. às ve- zes as suas descobertas têm pouca pertinência. São descobertas científicas. sutil e inevitavelmen- te comprovadas. mas freqüentemente irrelevan- tes ou triviais por falta de um sentido de priori- dade que uma visão do conjunto de processo po- lítico daria. Como observa Raymond Aron, "eles gastam cada vez mais recursos, cada 'vez mais tempo 'para demonstrar com uma precisão cada vez mais rigorosa. proposições cada ~z menos interessantes'{I). , Por exemplo, estudavam o comportamento elei- toral com grande exatidão e imaginação durante algum tempo sem considerar a significação ou a função deste dentro do sistema político global(2) . Presumivelmente inspirados pela teoria "tradi- cionalista" que rejeitavam, eles asseguravam que a atividade eleitoral' era' de grande importância

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Bloco lII

Reflexões sobre o Conceito de Política

Philippe C. Schmitter

A ciência política contemporânea se disting.yçessencialmente por duas qualidades. A primeiraea maIS ãISCutIda é a sua vontade de ser científi-

Cã. Isrn"implíca urna preocupaçao te6nca e me- ,"'W;iol6gica - um escrúpulo de respeitar dados ~.requisito do empiricismo) e de não afirmar "ver-~des" ou "pnncípios certos" sem uma demons- -tração ngorosa (o requisito da verificação de hi-

]õtesesl·Mas nenhuma ciência se define pelo simples de-sejo de ser científica. É um erro comum, espÇ;:

..é!mente' entre os praticantes que se proclamammais científicos, aplicar-se à metodologia ou a á

~quIsa em irica sem considerar a segunãaqualidade de uma ciência política. quer Izer.

• sem ter uma consciência clara da "delimitação-da disciplina". Como tendem a operar sem um

conceito adequado da política ou aceitar sem re-

flexão qualquer definição corrente desta. às ve-zes as suas descobertas têm pouca pertinência.São descobertas científicas. sutil e inevitavelmen-te comprovadas. mas freqüentemente irrelevan-tes ou triviais por falta de um sentido de priori-dade que uma visão do conjunto de processo po-lítico daria. Como observa Raymond Aron, "elesgastam cada vez mais recursos, cada 'vez maistempo 'para demonstrar com uma precisão cadavez mais rigorosa. proposições cada ~z menosinteressantes'{I). ,Por exemplo, estudavam o comportamento elei-toral com grande exatidão e imaginação durantealgum tempo sem considerar a significação ou afunção deste dentro do sistema político global(2) .Presumivelmente inspirados pela teoria "tradi-cionalista" que rejeitavam, eles asseguravam quea atividade eleitoral' era' de grande importância

-"30 Curso de Introdução à Ciência Política

política (o que está longe de ser verdade um mui-tos países), e concentravam os seus esforços nestesetor quase exclusivamente. É interessante obser-var que foi unicamente quando perceberam queas suas descobertas não se acomodavam com estateoria tradicional (teoria que, apesar das suasdeficiências, apresenta uma visão global do fenô-meno político) que estes estudiosos começaram ase perguntar sobre as conseqüências possíveisdeste décalage entre teoria e realidade. Por er-rônea que fosse, a teoria tradicional forneceu aosbehavioristas esse sentido fundamental de priori- -dade e relevância. Por esse motivo, urna ciênciada política exige uma segunda qualidade: umadelimitação da disciplina. A ciência política pre-tende tratar da interpretação de um setor parti-cular do comportamento humano. Ospolitistasfõ) pretendem - e esta pretensão aindaé uma hipótese - que a política ou o conjuntode atividades políticas se diferencie de outros fe-nômenos sociais com características, relações epadrões distintos.Acho que cada politista tem por dever conside-rar conscientemente essa pretensão e definir ex-plicitamente o seu conceito de política. Essa defi-nição é uma espécie de "hipótese inicial" que co-mo observa Duverger, formará e deformará oseu trabalho profissional quer ele queira ou não.No restante deste ensaio apresentarei as que meparecem ser as principais abordagens à delimita-ção de campo de investigação da ciência políti-ca. A política pode ser definida por:!J-~uas "instituições", pelo quadroSõéial con:

_.c.rtto e estabelecido dentro do qual participa~os atores.

~ Se~ "r~cursos", pelos meios utilizados pelos

~~ ...âeus "processos", pela atividade princiQal- ual se consazrarn os arv- Sua "função", pelas conseqüências da suaatividade para a sociedade global de que faz paTte ,--Conforme esta tipologia geral, corresponderiamquatro definições especfficas de campo de inves-

~

- ação da política:I instituição: "Estado ou Governo. "'n Recu~so:';Poder, Influência ou Autorida-..~ _Processo: "Decision-making" ou "Poliq:-

armation" (formulação de decisões sobre linhase conduta coletiva .-V _:- "Resolução não violenta dos ronflitoG.

I - Estado ou Governo

A definição que predominava no séc. XIX e ueain a pre o~ma nos dicionários e em muitas fa-culdades é da política como "a arte e a ciência do

~Estado ou do governo". Em livro recente, MareeIPrélot a define como o "conhecimento sistemáti-co e ordenado dos fenômenos concernentes aoEstadof+). _~ a descoberta da importância

~lítica de instituições não-constitucionais, está"delimitação p-arecia estrita demais. Então os po-líticos amQliaram·na para incluir algumas orga-~

_nizações anexas que intervêm regularmente oumesmo ocasionalmente na atividade estatal; ór-gãos como partido; facções, grupos de pressão,figas consplratónas, SOCiedades de economiamista. cliques militares e grupos informais. Porexemplo, mais tarde no livro citado, o próprioPrélot afirma que: "A politologia que considera,como se acaba de ver, a instituição estatal em suatotalidade, não se limita entretanto a ela. Toma-se como ponto de partida e como referência parao estudo dos fenômenos que se ligam ao Estadona qualidade de pré-estarais e supra-estatais'{ê).Muitos poli tistas contemporâneos, dentre osquais o suíço Jean Meynaudtõ), relutam emabandonar este foco tradicional, concreto e apa-rentemente bem delimitado, por outras definições -mais abstratas e difusas.

JJ - Poder, Influência ou Autoridade

Sob essa rubrica, segundo Duverger, abriga-se agrande maioria dos politistas contemporâneos,inclusive ele próprio. Infelizmente, essa maioriaestá longe de ser unânime na utilização dessestermos4oder" l?Ea al~n~ si~c~ "~nfluên-cia"; para _qutros, "auton a es. a o stante,achamos possível distinguir entre três "escolas" e"subescolas" - todas tomando meios e recursosutilizados como foco principal da ciência políti-ca.A - ~"Poder". A...9.~odemos incluir todos os po-litistas que lembrando a afirmação de Max We;...

_.ber de que "o meio decisivo na política é a vio-lência", dao ênfase ao fenômeno da coesão (con-_trainte), a dominação ou a monopolização daviolência ou de força física. Friednch Enge1s, por

-;xemplo, afirmou: "A sociedade até agora, ba-seada nos antagonismos de classe, teve a necessi-dade do Estado. Quer dizer, da organização deuma c1ass~particu~ar:que era a classe explorado-

I,I

Reflexão sobre o Con

ra ... especialmente com a intenção de conservarcom a (força) as classes exploradas na condiçãode opressão correspondente a um modo dado deprodução"(7). Um antropólogo se expressou demaneira semelhante (sem a suposição de dorni-nância de classe): "A organização política deuma sociedade é o aspecto de sua organização to-tal que interessa ao controle e à regulamentaçãoda força física'{ê). Finalmente, um politisra in-glês, baseando-se em um inquérito internacionalsobre a natureza da ciência política, chegou à se-guinte conclusão: "O foco de interesse do politis-.tª é claro e não ambíguo: ele se concentra sobrea.lura.para obter ou reter o poder, para exercer_poder ou influência sobre os outros ou para resis-tjr a esse exercícjo"(9) Com esta última defini-ção nos aproximamos à segunda "escola", a ~influência~B - "Influência", Muitos estudiosos da políticanorte-americana rejeitam esta ênfase na força -;:iõem-na na variedade e na sutileza dos me~.~ursos utilizados pelos atores políticos. Para elesnão se poderia reduzir a política a um só tipo derelação de dominância. Esta é o produto da inte-ração de uma pluralidade de tipos de dorninân-cia , dentro dos quais estão a força ou a coação.Eles preferem o termo influência por ser o mais"

~Segundo a célebre fórmula do livro de HaroldLasswell, "Politics: Who Gets What, When andHow" , o estudo da política é o estudo da in-fluência e dos que têm influência'{U'). Outronorte-americano, Quincy Wright, define a polí-tica de modo semelhante como a arte de in-tluenciar, manipular ou controlar grupos com.a---·

. intençao de avançar os eropósitos de alguns con-tra a oposiçao de outros"(l~). Provavelmente omais destacado representante desta escola nosEstados Unidos é Robert Dahl. No seu livro,Who Governs(12), rrenao apenas oferece umatipologia dos diferentes recursos que são a basede diferentes tipos de influência, mas faz a im-portante observação de que o grau de influênciadepende dos recursos disponíveis e da vontade deutilizá-los. Nesse livro, ele estuda ernpiricamentea distribuição de ambos os elementos de influên-cia (mensurada como capacidade-de iniciar ouvetar uma "policy") na cidade de New Haven,Connecticut. Ele concluiu que em um sistemapolítico pluralista (caso de New Haven , e, porextensão, dos EUA) a influência apresenta um

_padrão de "desigualdades dispersas" e não "desi-

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ceito de Política 311

gualdades cumulativas", o que parece estar im-plícito no modelo que utilizam os teoristas de po-der ou força física acima mencionados.C - "Autoridade". Nesta terceira subcategQlliL.

-'para os politistas Que tomam como foco a disci-plina, nem a ultimaratio do poder, nem as for-mas vagas e múltiplas de influência, mas um tipOespecífico de relacão social Que combina os dois:a autoridade, ooder legitimo ou herrschaft em

ralemão. Uma autoridade, conforme Weber, é~Jíoder que se faz obedecer yoluntanaiiieillZ_Haveria vários tipos, mas o elemento comum é

_.!ssa capacidade de criar e manter a crença deque as repartições de poder e influência existen-tes são as mais "justas" e "naturais"para essa sociedade. Como diz a feliz expressãofrancesa: Gouvemer c'est[aire croire .Aceita essa noção como foco principal, o estudo ,..__da política seria "o estudo das relações de aurori-dade entre os indjyíd49s e os gx.u-PQs.,-da-h.i@J;a~cuia de forças Que estabelecem no interior de to-das as comunidades numerosas ecomplexas'{tõ). A cúpula desta estrutura é o Es-

Tado ou gover;o, a instituição que tem a autori-dade última e o "direito" de utilizar a força físicapara se fazer respeitar; mas a tarefa da ciênciapolítica seria a de analisar e explicar toda essa es-trutura e as forças e influências respectivas que acompõem.Duverger, quando afirma no seu manual que "aciência política é a ciência do poder" (14), quer di-zer, em nossos termos, "a ciência da autoridade",porque anteriormente declarou que "o poder éreconhecido como poder; sua autoridade é ad-mitida". O sociólogo norte-americano, TalcottParsons, recentemente prestou o seu imensoprestígio intelectual a uma delimitação da ciên-cia política em termos de "poder". Como foi o

_:0so de Duverger, o seu conceito de poder "é,.~uivalente ao fenômeno que aqui chamamos deautoridade"(l6L.Não são raros os estudiosos da política que com-binam todos ou alguns desses meios de ação nassuas tentativas de definir a po.lítica. O'mais eo-

..••nhecido exempJo de5~Hsmt:>.é proyayelmen-- te o de....Max Weber. que acentuou poder e in-_fluência na sua defínícãcfnnnal, "Política signL

fica, para nós, elevação para a participação noj.pD.d.ex.~p'ara a (influência) na sua repartiçãõ,..§..ej~Rtr-e--Estados.seja no interior de um EStaaq;:-entre os grupos humanos que nele existem" (l21_~que concentrou a.sua atencão eIIl}2ÍrÍca~bre tiPOSj

Curso de Introdução à Ciência Política

"UC":"'.UC VUUd.Ut:> w). r..<:c<:m<:melue um aes· cia repousa na flexibilidade,. na FJ?SSibilidadeds..,__u..J_ .1:.'-- _. ~ aplicá-Ia a vários níveis da sociedade onde decio

sões parciais ou parcialmente imperiosas são to·madas(23). Um importante foco de análise seriaprecisamente o de fazer comparações entre esseprocesso social nos diferentes níveis. Somente as-sim podemos verificar a macró-hipôtese da nossadisciplina - hipótese que data de Platão e Aris-tóteles, que decisões aplicáveis à sociedade intei-ra, decisões públicas têm características e pa-drões diversos das decisões tomadas em socieda-des menos globais, i.e., decisões privadas.Se a definição da política pelo Estado foi formu-lada especialmente pelos politistas que utiliza-ram métodos jurídico- formais , se a definiçãoem termos de poder parece mais utilizada pelosmarxistas e behavioristas, se a definição emtermos de influência parece especialmente com-patível com a "teoria política dos grupos", emtermos de autoridade com a sociologia históricaa definição de política pelo decision- makingvai de acordo com a teoria dos sistemas políticos.A última que vamos abordar neste ensaio acom-panha essencialmente uma abordagem funcio-nalista do estudo da política.

,~o da alocação autoritária ou imperiosa (au-thoritatzve altocation) dos valores. de maneira ~A~última novidade em termos de definição é o!4.ue essa alocação seja influenciada pela distri· ~funcionalismo. No seu sentido mais amplo, defi-buição e utilização do poder"(20). A ênfase é so· , nir algo pela sua função quer dizer considerá-Iobre o fenômeno da repartição - da administra- sob o aspecto da sua conseqüência ou conseqüên-ção de decisões sobre bens escassos na sociedade; cias no sistema global do qual faz parte. O algomas Easton chega a incluir na definição todos os pode ser concebido como "requisito:', isto é, ati-

-meios aCIma citados: autoridade, influência ~ - vidade necessária ao bom funcionamento do sis-poder: Numa outra definição, menos conhecida, tema global, eu como "tarefa", isto é, padrão de

o nosso ver maIS c ara, e e fixa o atividade geralmente encontrado em qualquertes do sistem~olítico como todas as açõe-nmris- sociedade. Utilizando o primeiro e mais rigorosoõlÍmenos relacionadas com a formulação de de·" conceito- de função como "requisito", TalcottCISOesaufonfanas ou Impenosas para uma socie· Parsons sugeriu que o subsistem a político se apli-<lade: the making of binding decisions for a so- ca principalmente à "realização de objetivos co-ctetypí). letivos" goal attainrnent)(24). O politista Dayjd .•O emprego do qualificativo "autoritário" ou ,Apter define a função da política como a "ma-"impenoso" ImplIca que o autor limitaria a clén:- . nutenção do sistema do qual faz p,arte"(25).da polrtica ao estudo do Ôrgão Que toma e !tn- Nossa tentativa de delimitar o campo da investi-plementa as decisões que são authorÜative ou gação política se inspira na segunda tradição.birvling para toda a sociedade, o que chega a Não afirmamos que a seguinte função é um re-voltar a definir a política em termos de Estado - quisito para a manutenção do sistema existente;Estado sendo desta vez definido como processo e . afirmamos simplesmente que o padrão de ativi-Di" 6Qmo instituicão(22) •. Outros politistas que dade que chamamos política se encontra em~ti1izam o decÚion- making-a./Lp.T.fJll.ch' estão muitas sociedades com vários graus de cornplexi-tonvencidos de que, ao contrário, a sua eficiên- dade.

111-- Decision-Making(formulaçãodede-cisões sobre linhas de conduta coletivas).

Surgiu nos últimos anos uma nova tentativa desituar campo de investigação da política, dest;-

"'-~ezem termos de um processo social - processo-'que evidentemente utilizaria os meios de ação 50- .

~ima mencionados. Esta tentativa destaca aformulação de decisões ou de "policies" como fo-co de análise. A tarefa de uma ciéncia da políti-,ca seria, então a de explicar e presumivelmente

,predizer, porque uma determinada linha de con-duta foi, é ou será adotada. Como foi formula- -da? Quem participou? Quais foram os determi-nantes desta atividade? Qual foi o resultado e seuimpacto sobre decisões posteriores? Essas são al-gumas das perguntas implícitas nesta definição.O intérprete mais conhecido desta linha é o cien-tista político da Universidade de Chicago, David

. ~st0n. ~uma definição que deve ser a m~.cada e comentada da ciência política contempo·rânea. ele.afirma.oue esta deve se aplicar ao "es- IV - A Resolução não- uiolenta dos

Conflitos

Reflexão sobre o Conceito de Política 33

'Para nós, a função da política é a de resolver tica; porque, naturalmente, a sociedade políticaconflitos entre mdlvJduos e gru~os, sem que este é a multidão. Se for levada à unidade" tornar-se-

--e0R-i4-H.e destTlJ3 um dos parti os em conflit;;:á família; de família, indivíduo, porque a pala-Talvez resolução não seja a melhor expressão vra "um"· deve ser aplicada mais à família que a

c porque impJjca (falsamente) que a atividade po- _sociedade política, e ao indivíduo, de preferên-lírica põe fim ao conflito. Ao contrário; existem icia à família ... A sociedade política, não se com-

....•. conflitos permanentes dentro de qualquer sOCle; põe apenas de indivíduos reunidos em maior oudade que a política não ode extin ir, embora menor número; ela se forma de homens especifi-a sociedade sem conflito seja um antigo son o e camente diferentes; os elementos que a consti-

-JnUItOS h!ósotos poIiHGÇ~:A pelitÍçõl pode .si~ tuem não são absolutamente semelhanres'{ãõ).plesmente ."desarmar" o conflito, canalizá;lo, O importante a reter é a última fras~transformá-Io em formas não destrutivas para os elementos-componentes de uma sociedade políti-

, partidos e ã êoletiyjdade t:m ge~éjI. 7a são heterogêneos, isto é, estão ao mesmo tem-Dentro dessa perspeçtiy~. para que um ato social po em conflito e em interdependência. A nature-

,~a político, precisa satisfazer duas condições:, za da dominància política, contrariamente a ou-1. A condição necessária é que o ato deva s~ tras formas de dominància, é a de reconhecer oscontroverso, indique um conflito, um antagonis- conflitos e a variedade de interesse e atitudes quemo entre interesses ou atitudes expressas por di- dão base a esses conflitos e a de tratar de contê-ferentes indivíduos ou gru12os.~to implica q~ los dentro de um quadro social comum, A domi-muitos atos governamentais nãosejam políticos nància do tipo político não destrói essa heteroge-.por não serem controversos, tal como a publica- neidade natural para fazer uma sociedade maisção de documentos, a vacinação de cães etc. unificada - o que implicaria um tipo de domi-Mas devemos insistir em que qualquer acontecl- nância mais repressivamento SOCialé potencialmente político. Sezundo essa concepção, o estudo da política2. A condição suficiente para que os conflitos se- _.-: nderá dois focos distintos mas altamente

.jam políticos é a de que os atores reconheçam r'"e: relacionados. De um lado, o estudo dociprocamente suas limitações nas reivindicações "conflito": tipos, fontes, padrões e intensidades;das. suas exigências. Isto quer dizer que os confli- e de outiõ"lado, o estudo da "integração": auto-tos políticos acontecem dentro de um quadro ridade, estruturas, formulaçao de decisões e(framework) de restrições mútuas, o que ImplIca 'crenças comuns. Como afirma Duverger,~gue o conflito político exige um certo grau de m- do os homens pensam na política eles oscilam

~gRção de COQperação entre os combatentes, _ ~re duas interpretações completamente opoL"integraçâo" ou "cooperação" entre indivíduos e tas. Para alguns, a política é essencialmente uma

_g:!upos, é, então o segundo elemento da equa- .1l.!,ta 11m cQW,!:>ateem ,gue o poder permite a ar-S;ãopo]ítiq,.J,ssa qualidade de autolimitação ou runs cue o têm, assezuar a sua dominància so-restrição mútua pode ser baseada em uma cren- )'~e a secíedade e desta tirar p.artido. Para ou-ça comum nos atores em conflitos (então haveria ~ros. a política é um esforço para fazer governar

, . . . .

nente. Mas a partir do momento em que os com-,_batentes decidem limitar reciprocame~te os seus'~petitivos em vez de se destnrírem,-estao ao nosso ver numa sltuaçao política. -,A primeira expressão dessaqualidade "dualista"da atividade política encontramos na Políticade Aristóteles. Argumentando com a de Platão,o Stagirito nega que a sociedade política (acidade-estado) possa ser governada por uma fa-mília."A sociedade política; à medida que se forma ese torna mais. trpa, deixa de, $!I _sÇ>C:ied2de'.poli:

particulares •.•.•O Estado é mais geralmente, opoder institudonalizado de uma sociedáde: é .

.sempre, em toda pane, tanto o instrumento d~dommancla ae certas classes-sob-l'e-6mrasC0ll10 omeio de assegurar uma certa ordêin social, umacerta integraçao de todos na co[etlvlda~bem comum"(27). Deste "[anos" que é a política,ê interessante observar que alguns, especialmen-

te os marxistas oposicionistas e _revoluncionáriosnacionalistas, tendem a ver unicamente a face"conflito", enquanto outros, especialmente mui-tos politísras norte-americanos e marxistas situa-

)"(~

Curso de Introdução à Ciência Política

cionistas, tendem a ver somente a face "integra-ção". Uma disciplina completa de ciência políti-ca deve incluir a ambas. Ela deve também distin-guir cuidadosamente entre processos e aconteci-mentos que são propriamente políticos e os quenão o são. De um lado, atos puramente de con-trole administrativo cometidos num ambiente deabundância, sem qualquer manifestação anta-gonista, não podem ser qualificados de política.De outro lado, atos de dominância violenta ourepressiva, que sejam cometidos por autoridadespúblicas ou não, tampouco são políticos: são aevidência da falta de resolução política ou do seufracasso.Não queremos afirmar que estes atos não te-nham interesse para o politista. Ao contrário, eledeve estar altamente interessado nas condiçõesque permitem por um lado a "despolitização'' deatividades sociais ou que indicam, de outro lado,os limites de uma solução pol1'tica dos conflitos.Ambos os tipos de atividades são relevantes parao politista porque fixam a fronteira da sua disci-plina - e essa fronteira flutua muito entre socie-dades e entre os períodos históricos da mesma so-ciedade. O que implica.a nossa delimitação dapolítica é que aros de dominância administrativae de dominância violenta ou repressiva merecemanálises distintas à base de conceitos e hipótesesdistincos(28).Recapitulando brevemente, a política é o confli-to entre atores para a determinação de linhas decbhduta (pouaes) coletivas dentro de um quadro

acão recrprocamente reco-nhecido.09). Tradicionalmente, os pounstas to-calizaram a determinação de linhas de condutapública - quer dizer, comuns a toda sociedade- formuladas dentro de um quadro social essen-

cialmente autoritário que é o Estado. A nossa de-finição não limitaria o estudo da política à ativi-dade desta instituição de cúpula. Procuraria odesempenho de um~ função - a de resolver con-flitos sem distinguir um dos partidos - a qual-quer nível da sociedade.O fundamento intelectual da nossa concepção depolítica é disperso, como se deduz da variedadede obras citadas nas notas finais. Ele ainda nãotem uma formulação definida. É ao mesmo tem-po uma concepção tradicional e contemporâneado que deve ser o foco da nossa disciplina. Pre-parando esse ensaio, encontramos para a nossagrande surpresa uma formulação muito seme-lhante - não de um outro politista, mas de umeconomista brasileiro: "A partir do momento emque uma sociedade cresce O saficielité paI a qUi!'

- seus membros necessitem pautar seu comporta~~mento por normas gerai~, çlJja aplicação deve ser

- imposta por uma autoridade que não deriva a---"""sua legitimidade de vínculos de parentesco, es"tã-se em face de um embrião de organização poIítl-'ca, sendo irrelevante ue o chamemos de soci;--

a e civil ou de Estado. O que importa é reco-'":n1le~er que qualquer estrutura SOCIalque haja

alcançado um certo grau de diferenciação, ne-cessitará organizar-se politicamente a fim de queOSseus conflitos internos não a- tornem mVláveL

- Um ponto importante a ter em conta é o caratersui generis da organização política, instrumentoque a própria sociedade ut inz a paraautodlsClphnar-se, cabendo-lhe o monopólio de..-uso de força em nome de coletividade como umtodo"(30)_ A nosso ver, nenhum outro cientist;'social definiu a essência da atividade política tãoconcisa e claramente como essa citação de CelsoFurtado,

I. Raymond Aron. "Dix-huit Leçons sur Ia Societé Indus-trielle". (Paris: Galliman:l, 1962), pág. 17.2. Alguns esforços recentes dos behamoristas não merecemeste descrédito. Ver, por exemplo, os (,Itimos capítulos deAngus Campbell et al. "The American Voter" (N. York; Wi-ley, 1960) .3. Esta expressão será usada aqui no sentido de "politicalscientist" .

Notas

4. Marcel Prêlot , "A Ciência Política". (São Paulo: DifusãoEuropéia do Livro, pág. 1964).

5. Ibid. pág. 91.6. Jean Meyraud, "A Ciência Política, Sua Natureza e SeuAlcance". (Rio: FGV, 1960),capo I. Ver também Themfsto-eles Cavalcanti, "A Metodologia na Ciência Política". Rev.do tcs, Vol. I, N.· 2 (julho-dez. 1962),pág. 95-118.

Reflexão sobre o .Conceito de Política

7. Friederich Engels. "Socialism: Utopia and Scientific", enL. F. Deuer (ed.) "Marx and Engels": Basic Writings on Politics and Philosophy, N. York, Doubleday Anchor Books,1959,pág. 106(a ênfase é nossa).8. A. R. Radeliffe-Brown citado em Mauriee Duverger,"Ciência Política: Teoria e Método" (Rio: Zahar Edirores ,1962),pás:. 25.

9. William Robson, "The University Teaching of SocialSciences: Political Sciences" (Paris: UNESCO, 1954)págs.17-18.10. In "The Political Writings of Harold Lasswell", Clencoe:Free Press.

lI. Apud, Bemon Van Dyke, Political Science: A Philoso-phical Analisys (Stanford Univ. Press. 1960)pág. 113.12.New Haven: Yale Univ. Press: 1961.13. Apud, Duverger, op. cit., pág. 20.14. Ibid_, pág. 22.15. Ibid., pág. 17.16.Talcott Parsons, "On the concept of Political Power".Proceedings of the American Philosophical Association,I~Q3. A sua definição do poder não é facilmente rraduzível;

"Power is the generalized capa -ity to secure the performanceof biding obligation when the obligations are legitirnaredwith reference to their bearing on collective goals." "O Poderé a capacidade generalizada de assegurar o cumprimento deobrigações que se legitimam na medida em que visam a ob-jetiuos coletivos", (nossa a ênfase).17.Apud .. Duverger op. cit., pág. 20.18.Especialmente em Wirtschaft und Gesellschaft, Tubigen.1947.19. Modero Poli/ical Analysis (Englewood Cliffs: ?rentice-HaU.

2U. "The Political Systern" (N. York: Knopf, 1953).21. "The Analysis of Poutical Systems" in T. Macridis e B.Brown (eds.) "Comparariv- Politics: Notes and Rcadings"(Homewood: Dorsey Press, 1964),pág. 90.22. Cfr. Jean Meynaud, op, cit .. pág. 35-37.23. Richard Snyder, "A Decision-Making Approach to theStudy of Political Phenornena" in R. Young ed. Approachesto the Study of Politics (Evanston: Northwestern Univ. Press,

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1958),pp. 3-38.Este livro contém a meihor coleção de en-saios sobre várias abordagens à disciplina que conheço.24. T. Parson e N. Smelser, "Economy and Society" (Lon-dres: Routledge and Kegan Paul. 1956)e o artigo acima cita-do. nota n." 16.25. "A Comparative Method for the Study of Polirics" m H.Eckstein e D. Apter, "Compara tive Politics: A Reader" (N.York: Free Press, 1963),pág. 84.26.São Paulo: Atenas Editora. s.d. pág. 44. Foi o professorBemard Crick, no seu excelente livro. "In Defence of Policies"(Londres: Pelican Books, 1964)que me lembrou esta citaçãoe que me sugeriu esta.interpretação dela.

27. Maurice Duverger, "Introduction à Ia Politique" (Paris:Gallimard, 1964).pág. 20-22.28. Esta definição de política nos ajuda a compreender por-que dois focos de escudo da ciência política têm um estatutoum tanto especial. ° estudo da administração pública parece;à primeira vista. não preencher a condição necessária à exis-tência do conflito. O estudo das relações internacionais pare.ce, ao contrário. implicar conflito sem a condição suficientede integração. Estudos mais detalhados revelaram que hámais conflitos dentro da administraçâo pública e mais inte-gracão dentro das relações internacionais do que se supunha.Esta definição, também. ajuda a explicar porque os politistasnão têm contribuído muito para o estudo da revolução. Onossoconceito implica que a ciência política pode e deve con-tribuir para a compreensão das pré-condiçôes para um rorn-pirnerito violento com as estruturas e valores políticos antigose das condições depoisda revolução que permitem o resrabe-lecimento da dominãncia política. O estudo da revoluçãomesma nos parece merecer outros conceitos e técnicas deanálise. Não devemos esquecer que algumas revoluções _como a "Revolução Brasileira" de 19~0 - altamente"Políticas"; isto é. ocorreu uma rejeição definitiva e abruptadas formas e fórmulas antigas de resolução de conflitos.

29.Cfr. a definição de Vemon Van Dyke. op. cü., pág. 133-135.30. "A Dialética do Desenvolvimento", pág. 37 (Rio: Fundode Cultura, 1964).

Questões1_ Na sua opinião, qual seria o melhor critério de

..definição da política?

2_ De acordo com cada critério, encontramos di-»versas definições do campo de investigação da

política. Descreva brevemente as característicasgerais de cada uma dessas definições,comparando-as em relação à definição corres-pondente ao critério de definição de política quevocê escolheu.