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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE
CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DO SERIDÓ
CAMPUS DE CAICÓ – DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA DO CERES
ESPECIALIZAÇÃO EM HISTÓRIA E CULTURA AFRICANA E AFRO-BRASILEIRA
MARIA DO CÉU ARAÚJO SILVA
CAPOEIRA
HOMENAGEM, RESISTÊNCIA E CONQUISTA DA LIBERDADE
CAICÓ-RN
2016
1
MARIA DO CÉU ARAÚJO SILVA
CAPOEIRA
HOMENAGEM, RESISTÊNCIA E CONQUISTA DA LIBERDADE
Trabalho de Conclusão de Curso, na modalidade
Relatório de Vivência Escolar, apresentado ao
Curso de Especialização em História e Cultura
Africana e Afro-Brasileira, da Universidade
Federal do Rio Grande do Norte, Centro de Ensino
Superior do Seridó, Campus de Caicó,
Departamento de História, como requisito para
obtenção do grau de Especialista, sob orientação da
Prof.ª Drª. Juciene Batista Félix Andrade
CAICÓ-RN
2016
2
MARIA DO CÉU ARAÚJO SILVA
Trabalho de Conclusão de Curso, na modalidade Relatório de Vivência Escolar, apresentado
ao Curso de Especialização em História e Cultura Africana e Afro-Brasileira, da Universidade
Federal do Rio Grande do Norte, Centro de Ensino Superior do Seridó, Campus de Caicó,
Departamento de História, como requisito para obtenção do grau de Especialista, analisado e
aprovado pela Banca Examinadora formada pelos professores:
Profa Dra. Juciene Batista Félix Andrade
(Orientadora)
Prof. Dr. Helder Alexandre Medeiros de Macedo
Prof. Dr. Joel Carlos de Souza Andrade
CAICÓ/RN, 14 de Maio 2016
3
AGRADECIMENTOS
A Deus, por ter me dado saúde e força para superar os desafios.
A professora Dra. Juciene Batista Félix Andrade, pela paciência na orientação,
incentivando-me a tornar possível a execução e conclusão desta monografia.
As minhas amigas Eva Salustiano, Dorinha Medeiros, Maria Dilza e tantos outros que,
de alguma forma, colaboraram com incentivo e apoio na elaboração desse trabalho,
partilhando compreensão, amizade, otimismo dificuldades e esperanças de recomeçar um
novo dia.
4
Só o respeito não é suficiente para vencer o preconceito.
É necessário, também, a mudança de consciência.
Maria do Céu Araújo Silva
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 09
1 A MEMÓRIA E O REGISTRO NA CONSTRUÇÃO DO PROCESSO HISTÓRICO ..... 12
2 A CARTOGRAFIA E O CONCEITO DE PATRIMÔNIO ................................................ 14
3 A LUDICIDADE COMO INSTRUMENTO DE APRENDIZAGEM ................................ 24
4 LEITURA QUE ENRIQUECE O CONHECIMENTO ....................................................... 26
5 O ALUNO COMO PARTICIPANTE NO CENÁRIO DA APRENDIZAGEM ................ 34
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................... 37
REFERÊNCIAS....................................................................................................................... 39
ANEXOS .............................................................................................................................. 42
ANEXO A - O HOMEM E O PATRIMÔNIO CULTURAL .............................................43
APÊNDICES ........................................................................................................................... 45
APÊNDICE A- ADVINHAS CULTURAIS COMO MATERIAL DIDÁTICO PARA O
ESTUDO ESTUDO DA CAPOEIRA .................................................................... 46
APÊNDICE B- PASSO A PASSO PARA A CONFECÇÃO DO JOGO, “ADIVINHAS
CULTURAIS CULTURAIS COMO MATERIAL DIDÁTICO PARA O ESTUDO DA
CAPOEIRA”...... CAPOEIRA................................................................................................48
APÊNDICE C- DOMINÓ DE RIMAS COMO MATERIAL DIDÁTICO PARA ESTUDO
DA CAPOEIRA DA CAPOEIRA ........................................................................................ 49
APÊNDICE D- PASSO A PASSO PARA A CONFECÇÃO DO JOGO, “DOMINÓ DE
RIMAS COM A RIMAS COM A CAPOEIRA”................................................................. .52
APÊNDICE E – TEXTOS PRODUZIDOS PELOS ALUNOS SOBRE A CAPOEIRA ....53
APÊNDICE F – DESENHOS FEITOS PELOS ALUNOS SOBRE PATRIMÔNIO ....... 57
APÊNDICE G – DESENHOS FEITOS PELOS ALUNOS SOBRE AS ATIVIDADES
COTIDIANAS DOS NEGROS ESCRAVIZADOS ................................ 59
APÊNDICE H – ATIVIDADE DE PRODUÇÃO TEXTUAL COM PALAVRAS DE
ORIGEM AFRO-BRASILEIRAS ......................................................... 61
APÊNDICE I– LISTA DE ALUNOS DO 5º ANO “A” ....................................................64
6
LISTA DE FOTOS
Foto 1: Alunos localizam sua cidade no mapa do município.................................................. 15
Foto 2: Alunos localizam o município no mapa do estado do RN.......................................... 15
Foto 3: Alunos localizam o município no mapa do Brasil...................................................... 15
Foto 4: Alunos localizam o município no mapa mundi........................................................... 15
Foto 5: Alunos ouvindo a música Família de Ouro............................................................... 17
Foto 6: Alunos recebem os versos da música Família de Ouro.............................................. 17
Fotos 7 e 8: Formação da palavra capoeira............................................................................. 18
Foto 9: Pesquisa do significado da palavra capoeira no dicionário........................................ 18
Foto 10: Montagem do texto “capoeira” ................................................................................ 20
Fotos 11 e 12: Exibição de Documentário.............................................................................. 20
Fotos 13 e 14: Alunos observam imagem de Debret ............................................................. 21
Foto 15: Professor fala sobre o timbre dos instrumentos usados na capoeira......................... 23
Foto 16: Ensaio rítmico com os instrumentos da capoeira...................................................... 23
Foto 17: Análise de anúncio de fuga de escravos.................................................................... 24
Foto 18: Visita à radio 95 FM................................................................................................. 24
Foto 19: Prática do jogo das advinhas..................................................................................... 25
Foto 20: imagem do jogo das advinhas................................................................................... 26
Foto 21: Prática do jogo das advinhas..................................................................................... 26
Fotos 22 e 23: Confecção de maquetes representando a árvore Baobá .................................. 27
Foto 24: Planta pau brasil........................................................................................................ 28
Foto 25: Alunos no dia da visita ao pau brasil........................................................................ 28
Foto 26: Alunos se auto declaravam morenos......................................................................... 31
Foto 27: Alunos se auto declararam negros............................................................................ 31
Foto 28: Visita à biblioteca do Campus.................................................................................. 34
Foto 29: Alunos observam esculturas afro.............................................................................. 34
Foto 30: Alunos em visita à exposição afro............................................................................ 34
Foto 31: Alunos observam placas no Campus, Currais Novos............................................... 34
Foto 32: Alunas explicam a divisão política da África........................................................... 35
Foto 33: Aluno explica como se brinca o jogo das advinhas.................................................. 35
Foto 34: Alunos observam as palavras afro-brasileiras estudadas.......................................... 35
Foto 35: Alunos leem os anúncios de fuga de escravos.......................................................... 35
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Foto 36: Alunos declamam as adivinhas com o auxílio de fantoches..................................... 36
Foto 37: Alunos cantam a música Família de Ouro................................................................ 36
Foto 38: Alunos com o grupo de capoeira.............................................................................. 36
Foto 39: Apresentação da roda de capoeira para a comunidade escolar................................. 36
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CAPOEIRA
HOMENAGEM, RESISTÊNCIA E CONQUISTA DA LIBERDADE
Maria do Céu Araújo Silva1
Drª. Juciene Batista Félix Andrade2
RESUMO
O trabalho Capoeira: homenagem, resistência e conquista da liberdade, relata atividades
desenvolvidas em sala de aula da Escola Municipal Presidente Castelo Branco, em Currais
Novos-RN, objetivando desconstruir atitudes e conceitos de cunho racistas presentes no
convívio escolar a partir do estudo sobre a capoeira, que na maioria das vezes é vista apenas
como manifestação folclórica e não como instrumento de luta e liberdade, remanescente da
cultura africana e afro-brasileira, ainda presente no nosso cotidiano. Para embasamento
teórico da pesquisa buscou-se apoio nos autores Adorno, Brasil, Romão, Munanga, Rangel,
Rodrigues, dentre outros. Analisou-se a importância da capoeira não apenas como
representativa da resistência à escravidão, mas para que nossas raízes africanas não sejam
esquecidas. Como resultado, os alunos negros existentes na sala que procuravam negar sua
descendência descrevendo-se como “morenos” passaram a se enxergar como fazendo parte da
identidade negra, e assim se autodeclarar como negros em relação a sua etnia e elevando sua
autoestima. Palavras-chave: Capoeira. Resistência. Liberdade. Currais Novos- RN
ABSTRACT
The paper Capoeira: homage, resistance and conquest of freedom, relates activities developed
in classroom at Presidente Castelo Branco Municipal School, in Currais Novos-RN, aiming to
deconstruct attitudes and concepts of racist nature present in the school conviviality by the
study about capoeira, which most of times is seen just as a folk expression and not as an
instrument of struggle and freedom, reminiscent of African and Afro-Brazilian culture, still
present in our daily lives. For theoretical basis of the research it was searched the support of
the authors Adorno, Brazil, Romão, Brandão, Munanga, Rodrigues, Rangel, among others. It
was analyzed the importance of capoeira not only as representative of the resistance to
slavery, but in order that our African roots not be forgotten. As a result, the black students in
the classroom who sought to deny their ancestry by describing themselves as "brunette"
passed to see themselves as part of the black identity, and so affirming themselves to be black
skinned related to their ethnicity and raising their self-esteem.
Keywords: Capoeira. Resistance. Freedom. Currais Novos- RN.
1 Discente do Curso de Especialização em História e Cultura Africana e Afro-Brasileira – Universidade Federal
do Rio Grande do Norte (UFRN), Centro de Ensino Superior do Seridó (CERES), Campus de Caicó,
Departamento de História (DHC). Graduada em Pedagogia – Licenciatura pela UFRN, CERES, Campus de
Currais Novos. Professora polivalente da Rede Municipal de Ensino, na Escola Municipal Presidente Castelo
Branco - Currais Novos-RN. E-mail: [email protected]. 2 Professora do DHC, CERES, UFRN. E-mail: [email protected].
9
1 INTRODUÇÃO
Norteando-se pela Lei nº 10.639, de 9 de janeiro de 2003, que estabelece a
obrigatoriedade do ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana na Educação
Básica (MEC, SEB, DICEI, 2013, p. 497) o presente Relatório de Vivência Escolar discute
uma experiência interdisciplinar vivenciada no contexto de sala de aula, a partir do estudo
sobre um dos patrimônios imateriais brasileiros - a Capoeira, que na maioria das vezes é vista
como uma manifestação folclórica e não como um elemento de luta, conquista da liberdade e
afirmação remanescente da cultura africana e afro-brasileira, presente no nosso cotidiano.
Os temas geradores para objetos de pesquisas não surgem por acaso. Sendo assim,
numa reunião bimestral no dia 03 de março de 2015, da escola em que a autora trabalha, já
pensando na culminância dos projetos trabalhados para apresentação dos mesmos para toda a
comunidade escolar, discutia-se sobre quais manifestações folclóricas seriam apresentadas
para chamar a atenção do alunado. Logo, foi sugerido: – A “Capoeira”, pois, alguns dos
alunos fazem parte de um grupo existente na nossa cidade advindos do programa AABB
Comunidade.
De fato, a ideia apresentou-se como uma forma de inserção de aspectos da cultura negra
brasileira, mas ao discutirmos sobre outras heranças culturais afro, percebemos que o nosso
conhecimento é limitado e, de certa forma, depreciativo, pois no momento em que aceitamos
as “interpretações comuns” e não nos atentamos a um estudo aprofundado antes de
conclusões, corremos o risco de entender as coisas com um único olhar em uma mesma
direção.
Segundo Romão (2005) as ideologias da cultura brasileira tendem sempre a colocar os
africanos no campo do exótico, do precário ou do incompleto, principalmente porque partem
de um imenso desconhecimento sobre a África. E partindo desse pressuposto de que a
expressão cultural mais próxima e aceita pela comunidade escolar é a capoeira, construímos
um trabalho que se iniciou por esta prática comum a nós, perpassando por todo um contexto
histórico e social que culminou num conhecimento mais abrangente do que é a cultura afro-
brasileira e o que significa ser negro no Brasil, definição bem complicada, pois, muitos negros
não se declaram como tal, tornando-se herdeiros de um processo de identidade bem doloroso.
A capoeira é sempre vista de forma mágica e exótica e não como uma prática mais
ampla sobre a contribuição do negro na formação do povo brasileiro e de sua identidade.
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Percebeu-se que, em relação à capoeira, a maior parte dos comentários do alunado foi
positiva. No entanto, quando levados a pensar em outras práticas culturais, como, por
exemplo, o culto às divindades nos terreiros, a maioria dos comentários eram de cunho racista
e discriminatório, que não foram ouvidos somente por parte dos alunos do quinto ano A, mas
também de toda a comunidade escolar que muitas vezes passam despercebidos ou
camuflados. Observou-se melhor que ali estava instalada uma problemática que poderia ser
trabalhada pedagogicamente.
A partir das reflexões sobre as contribuições do negro para a formação da sociedade
brasileira, foi possível pensar em um trabalho de investigação onde aprendêssemos juntos e
desconstruíssemos alguns preconceitos, tomando como objeto de reflexão a Capoeira.
De acordo com a Constituição Brasileira, o artigo 216 diz:
Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material e
imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência
à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, nos
quais se incluem:
I- as formas de expressão;
II-os modos de criar, fazer e viver;
III-as criações científicas, artísticas e tecnológicas;
IV-as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados
às manifestações artístico-culturais;
V-os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico,
arqueológico, paleontológico, ecológico e científico (BRASIL, 2004, p.
124).
Sendo assim, chegou-se à conclusão de que, além de ser um patrimônio imaterial
brasileiro, a capoeira homenageia os deuses africanos, transcende o período da escravidão e
também serviu de escudo para alguns escravizados conquistarem a liberdade. Estava,
portanto, definido o tema a ser trabalhado. O recorte de tempo histórico a ser observado seria
a capoeira no final do Império, no início do Brasil República, período esse em que a mesma
passou a ser considerada uma contravenção prevista no Código Penal de 1890, e nos dias
atuais.
Privilegiou-se como objetivo deste trabalho descrever de forma sucinta o desenrolar de
um projeto de ensino desenvolvido no contexto de sala de aula, numa turma de 5.º ano do
Ensino Fundamental Menor, da Escola Municipal Presidente Castelo Branco, município de
Currais Novos/RN.
Ao se observar as manifestações culturais inseridas no contexto escolar, tem-se visto
que a capoeira só é lembrada como manifestação folclórica, apresentada apenas como
11
espetáculo, na culminância de projetos pedagógicos. Sendo assim, resolveu-se trabalhar o
tema suscitando ao aluno um novo olhar sobre a mesma, para que compreenda, reflita e
analise a capoeira como prática de luta, reafirmando a cultura do povo que a produziu, uma
forma de homenagear os deuses africanos, arma de resistência contra a escravidão e também
um meio para o escravizado conquistar sua liberdade, num período de opressão e exploração
em que o negro estava inserido.
Neste contexto, elegeu-se como ideia reconhecer a capoeira como expressão cultural
remanescente da luta do negro no Brasil contra a escravidão e a desconstrução do conceito de
“macumba” apresentado de forma tão depreciativa por parte da comunidade escolar.
Dessa forma, empreendeu-se um estudo das relações étnico-raciais, visando a
(des)construção de alguns conceitos, tais como: preconceito, entendido como opinião
antecipada sobre algo; racismo, como sendo pureza de raça; macumba, uma espécie de árvore
africana e também um instrumento musical utilizado em cerimônias de religiões afro-
brasileiras e nas rodas de capoeira; patrimônio, herança de bens materiais ou imateriais;
identidade, conjunto de características de um indivíduo, e discriminação, uma ação que viola
os direitos de alguém.
De acordo com Gomes (2012, p. 102),
Descolonizar os currículos é mais um desafio para a educação escolar. Muito
já denunciamos sobre a rigidez das grades curriculares, o empobrecimento
do caráter conteudista dos currículos, a necessidade de diálogo entre escola
currículo e realidade social, a necessidade de formar professores reflexivos e
sobre as culturas negadas e silenciadas nos currículos.
Sendo assim, estava posta a desconstrução e o estudo de conceitos da cultura afro, que
são tão negados, como diz a autora, nas propostas curriculares dos nossos sistemas de ensino.
Entende-se que um currículo deve ter a premissa de ser dinâmico para que possa adaptar-se às
transformações pelas quais a sociedade passa, ou seja, para que um currículo seja eficiente é
necessário que ele preconize a formação e a atualização sistemática do professor
(MUNANGA, 2008, p. 174).
Diante do pensamento acima, pôde-se observar que o que aconteceu e acontecerá de
agora em diante no interior de nossas escolas por parte dos educadores que participaram desse
tão importante curso, iniciando uma dinamização das propostas curriculares existentes nos
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nossos estabelecimentos de ensino em benefício dos que, até então, eram esquecidos por falta
de conhecimento.
Com a delimitação dos objetivos educacionais e a seleção dos conteúdos a serem
desenvolvidos elaborou-se uma sequência didática para ser vivenciada junto à turma do 5º ano
“A”, composta por 22 alunos, na faixa etária de 9 a 12 anos, regularmente matriculados na
Escola Municipal Presidente Castelo Branco, da cidade de Currais Novos/RN, localizada na
Rua José Bento de Souza, 241 - bairro Santa Maria Gorete. A clientela atendida por esta
instituição de ensino é, em sua maioria, carente. Muitos dos alunos são criados pelos avós, e
outros tantos são filhos de pais separados. Alguns sobrevivem apenas do recebimento do
Bolsa Família ou da aposentadoria dos seus avós. Sendo assim, se faz necessário que a escola
desenvolva estratégias de ensino que possibilitem a esses alunos satisfazerem suas
necessidades, sejam de ordem educacional, afetiva ou social.
Assim, o referido estabelecimento de ensino procura desenvolver projetos pedagógicos
que envolvam, motivem e despertem o interesse dos alunos pela descoberta do saber, tendo
em vista que a grande maioria dos pais destas crianças são analfabetos, semi-analfabetos ou
não concluíram seus estudos de ensino básico e médio, pois, de acordo com as pesquisas
realizadas junto às famílias no ato da matrícula, fica elucidada a situação educacional da
clientela que forma a comunidade escolar. Mesmo que os educandos passem por várias
necessidades, a escola vem sempre superando a meta do Índice de Desenvolvimento da
Educação Básica (IDEB), inclusive no ano de 2013 a média nacional era 4,6 e obteve-se 5,6.
Isto é o resultado de uma parceria entre os vários segmentos da comunidade escolar, visando
sempre o aprendizado dos mesmos.
As fontes que embasaram a pesquisa foram textos retirados dos livros didáticos,
Interagindo com a história (2011) e Aprender e criar história (2014), dos alunos, referentes ao
cotidiano do negro no Brasil contemporâneo, Império e início da República.
Quanto aos recursos imagéticos, foram utilizadas algumas obras de Jean Baptiste
Debret, pois essa foi a forma encontrada para chamar a atenção das crianças aos
questionamentos sobre o cotidiano dos afrodescendentes no Brasil. Dessa forma, as diversas
atividades programadas puderam atingir os objetivos aos quais se destinaram.
1 A MEMÓRIA E O REGISTRO NA CONSTRUÇÃO DO PROCESSO HISTÓRICO
Dando início ao projeto em sua execução prática, houve primeiramente um momento
de interlocução entre a professora e os alunos objetivando sondar os conhecimentos prévios
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dos mesmos. Este momento dialógico e motivacional foi desenvolvido por meio de uma
atividade denominada “Procurando um Guia”, onde o aluno, de olhos vendados, guiado pelo
colega, vivenciou nos espaços do interior da escola a ideia de distanciamento entre o presente
e o passado de épocas distantes, estando, assim, vendados para alguns fatos ocorridos outrora.
Neste contexto, percebeu-se também a importância da memória para a construção do
conhecimento histórico. No retorno à sala de aula, houve uma discussão na qual os alunos,
através de registros escritos, expressaram as sensações sentidas com a aplicação da técnica.
Uns disseram que sentiram medo; outros, abandonados pelos colegas, e alguns protegidos
pelos seus guias. Nesse momento o entusiasmo dos alunos foi contagiante. Com isso,
concluiu-se que o desconhecimento do passado é semelhante à obscuridade que o aluno teve
com os olhos vendados, isto é, o desconhecimento total daquilo que não foi vivido por ele.
Dessa feita, de acordo com Freinet (1989, p. 23),
Estava depositada a confiança nas crianças: o que elas realizavam eram os
reflexos de suas próprias emoções, pois não imprimiam textos escritos por
adultos, e sim, escritos por elas mesma, numa total inter-relação entre a
criança e o meio, entre o meio e a criança. Havia uma plena reciprocidade.
É importante considerar dados básicos de conhecimentos dos alunos, caso contrário,
viveremos sempre na insegurança intelectual. Nesse contexto, os vários documentos são as
principais ferramentas do historiador para a construção do saber histórico. E sendo assim, é
fundamental que os alunos tenham contato direto com os diversos tipos de dados de uma
sociedade para que, a partir deles, produzam suas próprias noções da comunidade que ora
pesquisam.
Entendendo o conhecimento histórico como base fundamental à vida do ser humano, é
importante que os estudantes, ao se depararem com esses registros representativos de uma
época, de um pensamento ou de uma cultura, também tenham possibilidades de questionar o
que está posto, uma vez que não existem verdades absolutas.
Desse modo, a intenção deste trabalho foi que o aluno desenvolvesse a capacidade de
observar, extrair informações e confrontá-las, para assim, interpretar algumas características
da sua realidade através de seus aspectos mais gerais. Da mesma forma que os fatos foram
materializados em documentos históricos, os estudantes também têm a possibilidade de
produzir seus próprios registros através de desenhos, fotografias, descrições, entrevistas e
entre outros.
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Seguindo esse pensamento, pediu-se aos alunos que trouxessem de casa seus
documentos pessoais como: certidão de nascimento, cartão de vacina e carteira de identidade.
Este novo momento historiográfico entre alunos e seus familiares foi mediado pelo impacto
de curiosidade onde os mesmos queriam saber o porquê de conduzirem esses documentos
para a escola, pois alguns nunca haviam manuseado os mesmos, inclusive existem educandos
que desconhecem o seu próprio lugar de nascimento. Isto serviu de ponto de partida para uma
pesquisa no interior da escola, em que os alunos manusearam seus documentos pessoais,
advindos da secretaria escolar como: requerimento de matrícula e ficha individual. As fichas
individuais do aluno foram entregues por ordem alfabética, através do que foi possível
analisar data de nascimento, endereço, religião das famílias, profissão dos pais, renda familiar
e grau de instrução.
Ao término da atividade, foram surpreendentes as descobertas feitas por eles, por
desconhecerem as informações relatadas anteriormente. E a descoberta maior foi perceberem
que todos têm uma identidade escolar, quando alguns alunos afirmaram desconhecer a
importância dos documentos depositados na secretaria escolar: - “Professora, a gente não sabia a
importância desses documentos da secretaria escolar na nossa vida”.
Assim, pode-se entender que todos somos sujeitos históricos e, antes de estudar a
história de outros, precisa-se iniciar pelo conhecimento da própria identidade ou entender sua
própria historicidade.
2 A CARTOGRAFIA E O CONCEITO DE PATRIMÔNIO
Como seres vivos, ocupamos lugar no espaço e nele interagimos das mais diversas
formas. Segundo Alves (1999), o espaço “é produto das relações entre homens e dos homens
com a natureza, e ao mesmo tempo é fator que interfere nas mesmas relações que o
constituíram”. A partir dessa definição planejou-se, no início do ano letivo de 2015, uma
atividade visando despertar a consciência da orientação espacial dos educandos, através do
manuseio de mapas para a localização geográfica de seus endereços, tendo como orientação o
mapa do município de Currais Novos. Nessa iniciativa cartográfica utilizou-se como
orientação inicial a localização do município, começando da esfera menor para a maior, como
por exemplo: o município na região, no estado, no país e no mundo.
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Foto 1: Alunos localizam sua cidade no mapa do Foto 2: Alunos localizam o município no mapa
Município do RN
Fonte: Maria do Céu Araújo Silva Fonte: Maria do Céu Araújo Silva
Ano: 2015 Ano: 2015
Foto 3: Alunos localizam o município no mapa do Foto 4: Alunos localizam o município no mapa
Brasil mundi
Fonte: Maria do Céu Araújo Silva Fonte: Maria do Céu Araújo Silva
Ano: 2015 Ano: 2015
Esta experiência veio somar aos conhecimentos que os alunos já praticam no
cotidiano, na qual não sentiram dificuldade. Portanto, sentiram-se motivados, pois já
entendiam a leitura cartográfica em estudo. Após esta atividade, como norte para o
entendimento do significado do conceito de patrimônio em suas vidas, incluiu-se a este
momento a leitura, interpretação e ilustração do texto de Carlos Henrique Rangel, “O Homem
e o Patrimônio Cultural” (em anexo), em que se discutiu o significado de patrimônio, porque,
até então o conceito relativo ao termo era de coisa grandiosa.
Sabe-se que o conceito de patrimônio não existe isolado, mas em relação a alguma
coisa. Portanto, pode-se dizer que é um conjunto de bens materiais ou imateriais que contam
a história de um povo e sua relação com o meio ambiente. É o legado que herdamos do
passado e que transmitimos à gerações futuras.
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Coincidindo com esse estudo, no dia 22 de abril de 2015, o aluno Luan Guilherme, foi
convidado a participar da administração municipal por um dia, onde teve a oportunidade de
ver de perto o trabalho do Prefeito Municipal na prefeitura. Em entrevista à TV local, referiu-
se que uma de suas reivindicações ao Executivo foi pedir que tivesse mais cuidado com o
patrimônio material e imaterial do município, pois a Banda de Música, considerada um desses
patrimônios com quase cem anos de existência, não está tendo a atenção que merece.
Para aguçar a compreensão do conceito de patrimônio e memória que é compreendido
como lembranças e reminiscências do passado, foi exibido, na sala de aula, o filme
“Narradores de Javé”, com o intuito de reforçar junto à turma a importância da escrita como
forma de resguardar a história oral e a memória contada por todos e escrita por alguns.
No momento seguinte, com os olhos vendados, os educandos ouviram o poema
musicado cantado nas rodas de capoeira, “Família de Ouro”. Após ser tocado duas vezes o
poema foi entregue com os versos fatiados para ser posteriormente montado na ordem correta,
com o objetivo de fazer com que as crianças percebessem o lugar certo do encaixe das
palavras e versos. Em seguida cantaram o poema formando um coro. Um grupo cantava as
estrofes e o outro respondia com o refrão. O poema, naquele momento, serviu para mostrar a
importância dada pelos capoeiristas à roda de capoeira, considerada uma família de ouro e a
reverência a seus instrumentos que, para eles, são atributos sagrados.
FAMÍLIA DE OURO
Eu sou Capoeira sim senhor
Eu tenho uma família de Ouro
A Capoeira é a minha vida
E a roda é o meu tesouro
Eu sou Capoeira sim senhor
Eu tenho uma família de Ouro
A Capoeira é a minha vida
E a roda é o meu tesouro
Quando eu ouço o som do Berimbau
O meu corpo todo se arrepia
Toca no fundo da minha alma
E completa minha energia
Eu sou Capoeira sim senhor
Eu tenho uma família de Ouro
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A Capoeira é a minha vida
E a roda é o meu tesouro
Pandeiro, Reco Reco e Agogô
Mexe com o meu corpo inteiro
E seja na Angola ou Regional
Eu me transformo em um mandingueiro
Eu sou Capoeira sim senhor
Eu tenho uma família de Ouro
A Capoeira é a minha vida
E a roda é o meu tesouro
Atabaque repicando swingado
E o canto forte de um bom cantador
Eu faço Capoeira todo dia
Mas treino pra ser um bom jogador
Eu sou Capoeira sim senhor
Eu tenho uma família de Ouro
A Capoeira é a minha vida
E a roda é o meu tesouro
(Disponível em: http://www.capoeira-music.net/all-capoeira-songs/all-capoeira-corridos-songs-f/familia-de-
ouro/ Acesso em 25 abril 2015)
Foto 5: Alunos ouvindo a música Família de Ouro Foto 6: Alunos recebem os versos da música
Fonte: Maria do Céu Araújo Silva Fonte: Maria do Céu Araújo Silva
Ano: 2015 Ano: 2015
Após o poema ser montado e cantado, foram entregues as letras da palavra
„‟Capoeira‟‟ de forma aleatória para que os discentes descobrissem que palavra seria formada.
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Foto 7: Formação da palavra capoeira Foto 8: Formação da palavra capoeira
Fonte: Maria do Céu Araújo Silva Fonte: Maria do Céu Araújo Silva
Ano: 2015 Ano: 2015
O momento seguinte foi um trabalho em grupo com o objetivo de encontrar o
significado da palavra em evidência no dicionário, em que todos tiveram a oportunidade de
dizer o que tinham encontrado. Nessa exposição o que chamou a atenção foi a afirmação dos
alunos de que a capoeira é uma palavra de sentido polissêmico, pois possui várias
denominações como, por exemplo, dança, luta e resistência.
Foto 9: Pesquisa sobre o significado da palavra capoeira no dicionário
Fonte: Maria do Céu Araújo Silva
Ano: 2015
Segundo o poeta José Paulo Paes (2005, p. 7), “um mundo sem poesia é o mais triste
dos mundos”. Para tanto, é preciso que o fato poético esteja muito presente e seja bem
desenvolvido pela escola, para que o universo escolar possa romper o tédio e a indiferença
com que muitas vezes se vê descoberto, uma vez que existe certo preconceito em relação à
poesia baseado no senso comum e que permeia a família, os grupos sociais e a própria escola.
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Seguindo este pensamento, trabalhou-se com o grupo a música de Clara Nunes,
“Canto das Três Raças”, com o intuito de motivar os discentes a se autoafirmarem quanto à
sua identidade “racial”.
O CANTO DAS TRÊS RAÇAS
Ninguém ouviu
Um soluçar de dor
No canto do Brasil
Um lamento triste
Sempre ecoou
Desde que o índio guerreiro
Foi pro cativeiro
E de lá cantou
Negro entoou
Um canto de revolta pelos ares
No Quilombo dos Palmares
Onde se refugiou
Fora a luta dos Inconfidentes
Pela quebra das correntes
Nada adiantou
E de guerra em paz
De paz em guerra
Todo o povo dessa terra
Quando pode cantar
Canta de dor
ô, ô, ô, ô, ô, ô
ô, ô, ô, ô, ô, ô
E ecoa noite e dia
É ensurdecedor
Ai, mas que agonia
O canto do trabalhador
Esse canto que devia
Ser um canto de alegria
Soa apenas
Como um soluçar de dor
(Fonte: http://www.vagalume.com.br/clara-nunes/canto-das-tres-racas.html#ixzz3x4FU1geA)
20
No dia seguinte, foi realizada a leitura e interpretação do texto de Rosane Cristina
Thahira “A Capoeira”, no qual se discutiu o significado da palavra em estudo segundo a
autora, porque até então o conceito relativo ao termo era de manifestação folclórica,
constantemente evidenciada por eles. O texto lido em sala foi fatiado e entregue aos grupos
para que as crianças o montassem. Para tanto, organizou-se uma técnica motivadora
encaixando os pedacinhos cortados e os alunos denominaram esta atividade lúdica de quebra-
cabeça.
Foto 10: Montagem do texto “Capoeira”
Fonte: Maria do Céu Araújo Silva
Ano: 2015
Dando continuidade às atividades foi exibido o documentário Capoeira (parte1)
(2015), tendo como tarefa a anotação dos pontos significativos para discussão posterior. Outro
vídeo, também utilizado foi “Instrumentos Musicais” utilizados na capoeira. O mesmo
acrescentou informações importantes sobre a origem e o timbre de cada um dos objetos
tocados na roda de capoeira, como por exemplo, o curioso nome da árvore africana chamada
de Macumba, da qual é confeccionado o reco-reco, como também o porquê dos componentes
do grupo sempre se organizarem para as apresentações em círculo e a cronologia da luta ao
longo da história.
Foto 12: Exibição de documentário
Fonte: Maria do Céu Araújo Silva
Ano: 2015
Foto 11: Exibição de documentário
Fonte: Maria do Céu Araújo Silva
Ano: 2015
21
Após a exibição dos vídeos foi feita uma atividade de produção de vários acrósticos a
partir das palavras: capoeira, homenagem, resistência e liberdade, relacionadas às
informações adquiridas. Ao término da atividade foi percebido que o alunado compreendeu o
conteúdo exposto ao conseguir sistematizar diversos aspectos inerentes a essas palavras,
construindo frases que expressavam todo o contexto histórico-social dos africanos e afro-
brasileiros. Essa foi a proposta do acróstico realizado: perceber quais impressões esses
discentes captaram no decorrer do estudo desses aspectos culturais e sociais dos povos
africanos no Brasil. É importante que, no processo de aquisição do conhecimento, o aluno
tenha contato com documentos que representem determinado contexto, como forma de auxílio
na fixação dos conteúdos.
Um desses tipos de documento é a ilustração impressa, cujas imagens, coloridas ou
não, fixam uma impressão mais duradoura na mente do educando. Dessa forma, a iconografia
se revela um importante instrumento para sistematização da aprendizagem, e foi utilizada no
projeto como forma de fazer o aluno “ver a realidade como se estivesse lá” no ambiente em
que os negros viviam. De forma acentuada, a iconografia tem se tornado uma fonte preciosa
para a História Cultural e para a História Comparada. Seu potencial informativo é enorme e
torna-se ainda maior quando as imagens são complementadas com dados provenientes de
outras fontes e quando tudo isso é lido com apurado aparato metodológico-conceitual. Como
qualquer outro tipo de fonte histórica, as imagens são expressões temporais, resultado de
construções que estão longe de terem sido imparciais (caso isso existisse), que carregam em si
visões e valores de tempos passados que se alteram a cada nova leitura, e que jamais devem
ser tomadas como um “retrato” de uma pretensa realidade tal qual ela teria sido. (PAIVA,
2009, p. 17).
A partir desse pensamento, levou-se para a sala algumas imagens das pinturas de Jean
Batiste Debret, para que os educandos pudessem observar, refletir e analisar o cotidiano do
negro no Brasil a partir dessas imagens e, posteriormente, reproduzissem à sua maneira.
Foto 13: Alunos observam imagens de
Debret
Fonte: Maria do Céu Araújo Silva
Ano: 2015
Foto 14: Alunos observam imagens de
Debret
Fonte: Maria do Céu Araújo Silva
Ano: 2015
Ano: 2015
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Como a realidade pode ser materializada em documentos históricos, os estudantes
também tiveram a possibilidade de produzir as mesmas imagens de Debret de acordo com seu
próprio olhar. Essa foi uma forma prática e decisiva para que eles entendessem que os
momentos históricos são representados a partir da óptica de um indivíduo e que ele,
dependendo de sua vontade, manipula o documento da maneira que lhe é cabível. Isso explica
que não podemos tomar nenhuma informação como verídica, mas como passível de mudança.
Continuando os trabalhos, exibiu-se o filme documentário Mestre Bimba: A capoeira
Iluminada (2015). Realizamos um debate, e logo após foi pedido à turma que produzisse um
texto intitulado: “O Que Aprendi com a Capoeira”. Esta produção textual foi realizada com
muita tranquilidade, pois foi colocado na sala um aparelho de som emitindo suaves melodias
para que todos se sentissem motivados a realizá-la. Em seguida realizou-se uma roda de
conversa acerca das impressões que continuaram e as que tinham sido modificadas na cabeça
de cada um, como por exemplo, o significado da palavra macumba, que é interpretada de
forma tão depreciativa. Percebe-se que o que nos falta é a oportunidade de conhecimento e
estudo de determinada informação, o que nos leva a distinguir entre o verdadeiro e o falso, o
que é preconceito e o que não é.
Observamos que a cultura negra se apresenta (e se representa), das mais variadas
formas, e dentre elas destaca-se a dança, com instrumentos musicais únicos, de fabricação
artesanal, e seus ritmos cadenciados e marcantes, sendo esse ritmo uma forma de ensinar os
passos de algo que no passado era uma forma de luta corporal de defesa e ataque.
Para Munanga (2008, p. 132)
Mais importante que o ritmo das palavras é o ritmo dos instrumentos de
percussão. O som dos tambores é linguagem: é a palavra dos antepassados,
que falam por meio deles fixando os ritmos fundamentais. Certos ritmos
provocam uma qualidade específica de movimento e nível de energia, a
maior parte dos quais no esquema africano.
Reconhecendo a importância dos instrumentos de percussão para os africanos, houve
uma apresentação destes, que eram usados para marcar o ritmo nas rodas de capoeira, em
parceria com o professor, músico, mamulengueiro e artista plástico de nossa cidade -
Francinaldo Moura, que além de repassar novos conhecimentos, fez um pequeno ensaio
rítmico harmonioso com os discentes, fazendo-os perceber o timbre de cada instrumento
tocado, dando exemplo de como são dadas as batidas na capoeira, no maracatu, frevo,
candomblé e forró.
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Foto 15: Aprendendo sobre o timbre dos Foto 16: Ensaio com os instrumentos da capoeira
instrumentos usados na capoeira Fonte: Maria do Céu Araújo Silva
Fonte: Maria do Céu Araújo Silva Ano: 2015
Ano: 2015
Paulo Freire (2002, p. 24) ao se referir ao processo de ação pedagógica, começando
pelo meio que envolve o educando, afirma que “antes de aprender a dizer a palavra é
fundamental que o oprimido saiba ler o mundo”. Partindo dessa premissa, apresentando os
instrumentos musicais utilizados na capoeira, procurou-se demonstrar ao nosso alunado a
importância da mesma para os afro-brasileiros. A prática, que antes era proibida e utilizada
como defesa pessoal para resistir à escravidão e conquistar a liberdade, é hoje conhecida em
quase todos os países do mundo e, a partir do ano de 2008, foi declarada Patrimônio Cultural
e Imaterial Brasileiro.
De acordo com Rodrigues (2014, p. 60),
Além das religiões, outros elementos uniram os africanos escravizados e
seus descendentes, ajudando-os a enfrentar o cativeiro. A capoeira foi um
deles. Quando a capoeira nasceu, a música e a dança eram um disfarce para
os africanos escravizados e seus descendentes poderem treinar a luta e usá-la
como instrumento de defesa ou ataque.
Desta feita, além da capoeira como forma de resistência à escravidão, a fuga também
foi outra forma de resistir à opressão e exploração dos escravizados. A fim de recuperar
escravos fugidos, seus donos colocavam anúncios, as vezes ilustrados, oferecendo
recompensa pela sua captura. Para esse estudo, pediu-se aos alunos que trouxessem, para
análise, anúncios impressos de pessoas desaparecidas encontradas nas redes sociais.
Observaram-se vários aspectos pelos quais as pessoas procuradas pudessem ser encontradas,
como por exemplo, a linguagem e imagem utilizada no anúncio para descrever o
desaparecido, para em seguida fazer um paralelo com os aspectos físicos dos anúncios de
24
fugas de escravos do século XIX, encontrados em jornais como O Globo do ano de 1875, e O
Universal do ano de 1836.
Puderam-se observar, por meio de alguns anúncios de fuga de escravos, alguns hábitos
e cultura, características e composições étnicas, conceituação de termos apresentados como
cabra, fulo e pardo. Esta ação foi executada em forma de rodízio. Os anúncios impressos
passavam pelos grupos e, em seguida, eram lidos e comentados para que toda a classe pudesse
interagir. Como atividade enriquecedora a esse momento, no dia 30 de julho de 2015, fez-se
uma visita à Rádio 95 FM, para observar na prática como são feitos e divulgados na rádio os
anúncios, com o objetivo de encontrar pessoas desaparecidas.
Foto 17: Análise de anúncio de fuga de escravos. Foto 18: Visita à radio 95 FM
Fonte: Maria do Céu Araújo Silva Fonte: Maria do Céu Araújo Silva
Ano: 2015 Ano: 2015
3 A LUDICIDADE COMO INSTRUMENTO DE APRENDIZAGEM
O professor é a mola que impulsiona o maquinismo do trabalho em grupo, processo
que move a socialização da classe e encoraja as crianças a cooperarem umas com as outras.
Essa aprendizagem colaborativa se torna ainda mais atraente quando se faz uso de jogos e
brincadeiras que, divertindo, ensinam as regras da vida em grupo e desenvolvem os
movimentos e a inteligência da criança.
Almeida (1995, p. 41), comentando sobre o uso da ludicidade no processo de ensino-
aprendizagem, ressalta que:
25
A educação lúdica contribui e influencia na formação da criança,
possibilitando um crescimento sadio, um enriquecimento permanente,
integrando-se ao mais alto espírito democrático enquanto investe em uma
produção séria do conhecimento. A sua prática exige a participação franca,
criativa, livre, crítica, promovendo a interação social e tendo em vista o forte
compromisso de transformação e modificação do meio.
.
Fundamentada nessa compreensão, foram utilizados alguns jogos pedagógicos para
enriquecer a aprendizagem dos alunos. Dentre eles, pode-se citar o dominó, um jogo formado
por peças retangulares, dotadas normalmente de uma espessura que lhes dá a forma de
paralelepípedo, em que uma das faces está marcada por pontos indicando valores numéricos.
Fez-se adaptação com o objetivo de explorar os conceitos estudados durante o desenrolar do
Projeto Capoeira, a partir de palavras rimadas. Foi utilizado também o jogo Twister,
confeccionado em um tapete plástico reaproveitado, que se assemelha a um jogo de tabuleiro.
Este tem quatro linhas com círculos coloridos, e sobre as mesmas uma cor diferente em cada
linha: vermelha, amarelo, azul e verde. Uma roleta indica onde os jogadores devem posicionar
suas mãos e pés, sendo que não podem ter uma mão ou pé sobre o mesmo círculo. Sendo
assim, teve-se como finalidade fazer adaptações para o estudo com as adivinhas, levando os
alunos a refletirem sobre o estudo da capoeira, colocadas nestes círculos.
Mesmo sendo o professor quem faz as propostas e conduz o processo de ensino e
aprendizagem, ele deve elaborar sua intervenção de modo que os alunos tenham escolhas a
fazer, decisões a tomar, problemas a resolver, pois assim os alunos podem tornar-se cada vez
mais independentes e responsáveis (PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS:
EDUCAÇÃO FÍSICA, 1997, p.60).
Tomando como base este pensamento, o texto para as adivinhas e as palavras para o
dominó foram elaborados coletivamente pelos alunos e o professor. O passo-a-passo dos
jogos estão descritos nos apêndices.
Foto 19: Prática do jogo das advinhas
Fonte: Maria do Céu Araújo Silva
Ano: 2015
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Foto 20: Jogo das advinhas. Foto 21: Prática do jogo das advinhas
Fonte: Maria do Céu Araújo Silva Fonte: Maria do Céu Araújo Silva
Ano: 2015 Ano: 2015
Os jogos das adivinhas e o dominó de rimas foram o resultado de um empreendimento
coletivo com o objetivo de fixar de forma prazerosa e lúdica o que já se tinha estudado e
reformular conceitos e opiniões dos alunos com relação ao estudo da capoeira. Foi nesse
momento que, por meio do jogo, pôde-se facilitar e memorizar o aprendizado do que havia
sido estudado até então por meio de expressões culturais afro-brasileiras.
4 LEITURA QUE ENRIQUECE O CONHECIMENTO
O trabalho em duplas e grupos, em que a cooperação seja fundamental e haja
coordenação de diferentes competências, é algo valioso para se perceber que todos, sem
exceção, têm algum tipo de conhecimento. (PARÂMETROS CURRICULARES
NACIONAIS: EDUCAÇÃO FÍSICA, 1997. p. 83). Seguindo este pensamento realizou-se,
por meio do livro didático de História, a leitura e interpretação de textos que abordavam o
cotidiano do Rio de Janeiro e São Paulo, no período imperial. A discussão nos grupos acerca
das diferenças e semelhanças entre essas cidades no século XIX e a nossa cidade no século
XXI estabeleceu pontos em comum, inclusive a questão do abastecimento de água e o
problema dos esgotos a céu aberto prejudicando a saúde de seus moradores, principalmente
nos bairros periféricos.
Dentre os comentários enfatizados por algumas crianças na hora da leitura, observou-
se que a mensagem atingiu o objetivo a que se propunha, ou seja, o entendimento da forma de
trabalho realizado pelos escravos, que consistia em despejar os dejetos no mar, como se
27
referem às autoras do livro didático. Com isto, surgiu de uma criança a seguinte afirmação: –
“Professora, pude ver que os piores trabalhos na cidade eram feitos pelos escravos, mas isso não é
falado no texto, e hoje, muitas vezes também ainda é assim. Eles, os negros, ficam com os piores
empregos”. Dessa forma, foi possível notar um olhar crítico do aluno quando este se referiu à
condição social do negro no cotidiano histórico do Brasil Imperial, relacionando-o com os
dias atuais.
A Tradição Oral, para o povo africano, está diretamente relacionada ao seu modo de
vida, portanto, constitui-se na principal forma de transmissão da sua cultura, de seus
sentimentos e de suas atitudes. Durante muitos séculos os africanos utilizaram a tradição oral
para transmitir seus ensinamentos, saberes, conhecimentos, valores e também para oferecer
explicações sobre os mistérios do universo e do planeta Terra. (SECADI, 2014, p. 67).
Norteando-se por este pensamento, deu-se destaque à literatura para mostrar a
importância da tradição oral através da leitura poética do livro A África, meu pequeno Chaka,
de Marie Sellier (2006). No livro, em uma conversa cheia de desejo com o avô, o menino
Chaka aprende sobre seus antepassados e sobre os costumes de seu povo. Muito se aprendeu
sobre a África e muitas curiosidades surgiram a respeito de tão rico continente. A partir da
palavra baobá o neto faz referência à altura de seu avô Dembo, que segundo ele é considerada
a árvore das palavras, pois, ao seu redor a aldeia se reúne para ouvir as histórias contadas por
seus griots.
Assistiu-se a um documentário apresentado por Regina Cazé, intitulado “Um Pé de
Quê? Baobá - Parte 1 e 2” (2015), e constatou-se a exuberância desta planta africana, que
inclusive existe um exemplar dessa árvore na Rua São José, bairro de Lagoa Seca, em Natal-
RN e também na cidade de Assú- RN. Os alunos produziram maquetes retratando o baobá
nas aldeias africanas, representando o que aprenderam sobre a importância do mesmo na
contação de história para os africanos.
Foto 22: Confecção de maquetes representando a árvore
Baobá
Fonte: Maria do Céu Araújo Silva
Ano: 2015
Foto 23: Confecção de maquetes representando a
árvore Baobá
Fonte: Maria do Céu Araújo Silva
Ano: 2015
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O baobá é para a África o que o pau-brasil é para o nosso país, uma árvore símbolo,
que deu origem ao nome do Brasil. A característica mais marcante dessa árvore está
relacionada ao seu extraordinário tronco, que tem formato encorpado na base e vai se
estreitando como se fosse um cone, com grandes protuberâncias e galhos que permanecem
sem folhas durante nove meses. Por isso, quando observada com atenção, a árvore parece ter
sido plantada de cabeça para baixo. O tronco é oco e resistente ao fogo e, nos meses de chuva,
serve de reservatório de água – algumas espécies possuem capacidade de armazenar até 120
mil litros. Por esse motivo, o baobá é conhecido como “árvore garrafa”. Também graças a
essas peculiaridades, é comum encontrar pessoas que usem o tronco como moradia,
santuários, bares, pontos de ônibus e até como prisões.
Como não havia oportunidade para se conhecer o baobá os alunos foram levados à
biblioteca pública municipal de nossa cidade para conhecer exemplares de pau-brasil
existentes por lá, pois, mesmo passando diante daquelas plantas a caminho da escola, não
sabiam a importância da mesma para a história do Brasil. As árvores estavam bastante
floridas, proporcionando o embelezamento do local.
Foto 24: Árvore pau Brasil Foto 25: Alunos visitando a árvore pau-brasil
Fonte: Maria do Céu Araújo Silva Fonte: Maria do Céu Araújo Silva
Ano: 2015 Ano: 2015
Uma das principais contribuições para o idioma português do Brasil vem das línguas
de tradição banto. Há cinco mil palavras registradas no “Dicionário Banto do Brasil”, de Nei
Lopes. Além delas, inúmeras pesquisas e estudos registraram as contribuições do iorubá ou
nagô, com expressões usadas para designar práticas e utensílios ligados à tradição dos orixás,
como culinária, vestimenta e a música afro-brasileira (SECADI, 2014, p. 75).
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Com isso em mente realizou-se uma pesquisa com o intuito de observar quais palavras
de origem africana são usadas no nosso vocabulário diário, sem que se tivesse conhecimento
de sua procedência. Para esse fim, utilizou-se o livro de Ana Paula Brandão, “Memória das
Palavras” (2006), contendo as palavras organizadas em ordem alfabética, facilitando a
compreensão do aluno. A classe foi dividida em grupos e os mesmos produziram frases com
as palavras estudadas, como por exemplo: O meu irmão caçula sente muito sono, vive a
cochilar; Catunda é um sítio da zona rural do município de Currais Novos; Para fazer um
bolo de milho bem gostoso, preciso de um bom fubá; A capoeira foi uma arma contra os
jagunços malvados; No sítio, minha avó ainda retira feijão da panela com o quengo; Na aula
de recreação, nós brincamos com o bambolê; A fofoca pode destruir a vida das pessoas; O
pai do meu amigo toma muita pinga; Minha avó chama as bonecas da minha irmã de
calunga; No dia de domingo tem muito fuzuê em um bar em frente a minha casa; No
primeiro ano, tem muitos meninos banguelos, caíram seus dentes da frente; Na minha rua tem
uma velhinha que fuma cachimbo; Minha mãe diz que quando a canjica está fina é um angu.
Posteriormente, algumas das palavras estudadas fizeram parte das produções de textos dos
alunos.
A partir das palavras estudadas, pôde-se perceber o quanto as mesmas fazem parte do
nosso cotidiano, sem que se observe a contribuição das línguas afro na nossa comunicação
diária. Também, enxergou-se na comunidade escolar as atitudes de cunho racista,
preconceituoso e discriminatório que antes passavam despercebidas por estarem disfarçadas
de “brincadeira”.
O preconceito manifesta-se em brincadeiras ou apelidos alusivos à cor, na seleção
racial do colega de estudo ou banco escolar e na própria expectativa do professor quanto ao
rendimento do aluno negro quando comparado ao branco. Além disso, embora todos os
professores tenham se declarado destituídos de preconceitos, o conteúdo de seus discursos
muitas vezes demonstra o contrário. (MUNANGA, 2008, p. 52).
Para se desconstruir algumas expressões e atitudes racistas, ditas com muita
naturalidade, trabalhou-se com o livro, “Grandes Personagens do Sertão” (2012), da autora
curraisnovense Francisca Noélia de Oliveira. As expressões e atitudes são as seguintes:
“Nêgo quando não caga na entrada, caga na saída”;
“Tá preto igual as três noites de escuro”;
“É um tição preto”;
“Lá vem um homem e um nêgo”;
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“Nêgo só tem de branco os dentes e a palma da mão”;
“Nêgo tem parte com o cão”;
“Onde tiver dois brancos falando, nêgo não se mete”;
“Nêga só serve pra lavar penico de branco”;
“Aquilo é um lambrechote preto”.
Essas expressões ainda são utilizadas, hoje em dia, por alguns para demonstrar seu
desprezo pela cor negra, seja em forma de piadas, seja como ofensa mesmo. E apesar dos
estudos do retrato molecular do Brasil dizerem que temos em nosso DNA mais elementos
genéticos de negro e ameríndio, muitas pessoas ainda insistem em se autodeclarar como
pertencentes só ao grupo dos brancos, tornando o termo “raça” como um determinador de
inferioridade, deixando visível a existência do preconceito racial.
De acordo com Lopes, (2006, p. 22).
O preconceito racial conta, como suporte para a sua veiculação, o primeiro
equipamento básico do homem: seu corpo. Assim, tomando o corpo negro
como portador da informação de uma diferença que desencadeia a expressão
do preconceito. As outras dimensões do negro que o constitui como ser
humano, sua capacidade intelectual, seu universo moral e sua afetividade,
são agregadas a este suporte biológico, já marcadas de antemão pela
desqualificação e pela inferiorização.
Partindo do pensamento da autora, observa-se que a aparência física do negro é uma
característica fenotípica que determina o motivo para várias atitudes de caráter
preconceituoso. Por exemplo, no passado, se alguém fosse fazer um negócio e encontrasse um
negro no caminho, desistia da viagem e do negócio. Onde um negro se sentasse as outras
pessoas não queriam sentar, pois diziam que podia pegar “pretume”. A moça de família que
olhasse para um negro era dita sem vergonha (OLIVEIRA, 2012, p. 17). Esse comportamento
extremo não existe mais hoje em dia de forma tão explícita, sendo, porém, substituído por
outras formas mais veladas de preconceito que não precisa de palavras para ser demonstrado,
pois é evidente no modo de olhar, de tratar, em ações cotidianas da vida.
A escola, diante de tal pressuposto, não deveria deixar passar despercebidos os saberes
que seu alunado traz de casa, aprendido com os mais velhos, de sua convivência familiar.
Porém, se faz necessário proporcionar formações no interior de seus estabelecimentos, pois
alguns educadores não se dispõem a sair de sua comodidade para estudar fora dela. Isso
melhoraria o nível de conhecimento de seus profissionais, tornando seu corpo docente munido
de informações atualizadas e preciosas para repassar e ajudar a desconstruir conceitos tão
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enraizados por uma cultura de dominação e que fazem parte de todo um cotidiano de
reprodução de uma cultura onde é valorizada aquela advinda do continente europeu, tão
notório nos livros didáticos distribuídos nas redes de esfera municipal e estadual.
Infelizmente, os cursos de formação ainda não conseguiram persuadir um contingente
de educadores que tiveram sua formação profissional baseada ainda no antigo Curso de
Habilitação Profissional ao Magistério, hoje equivalente a um ensino médio, e mesmo assim,
não desejam participar de curso nenhum, privando a si mesmos e aos seus alunos de terem
uma educação um pouco mais inovadora, para se tornarem cidadãos com consciência de seu
papel como agentes de mudança na sociedade em que vivem.
Todo o aprendizado adquirido foi muito significativo, pois teve origem a partir do
desenvolvimento do projeto Capoeira: Homenagem, Resistência e Conquista da Liberdade,
proporcionando novas descobertas sobre a cultura, costumes e contribuição dos afro-
brasileiros na formação da nação brasileira. Com isso, observou-se que os alunos negros
existentes na sala, que no início do ano quando se referia a contribuição dos negros na
formação de nosso país eles baixavam a cabeça e quase não participavam das discussões,
passaram então a interagir com os outros colegas e com o professor nas rodas de conversa,
dando suas contribuições diante do que entendiam sobre os temas em evidência no momento.
O mais surpreendente é que, nas fases finais do desenvolvimento das tarefas, quando se
fazia a pergunta: “Como você se autoafirma quanto à identidade racial” o resultado foi bem
diferente daquele do início do trabalho. Os que se autoafirmavam como “morenos”, agora se
afirmam como “negros”. Interrogados sobre o porquê da mudança logo confirmam: - “Depois
que aprendemos que o negro foi tão importante na história do Brasil, não temos mais
vergonha da nossa cor”. Ali estava posta a importância de tal empreendimento para a elevação
da autoestima de nossos alunos negros que tanto sofrem com a discriminação racial ainda tão
presente na nossa sociedade. Esse resultado pode ser observado nas tabelas e gráficos que se
seguem.
Foto 26: Alunos que se autodeclaravam morenos Foto 27: Alunos que se autodeclararam negros Fonte: Maria do Céu Araújo Silva Fonte: Maria do Céu Araújo Silva
Ano: 2015 Ano: 2015
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Tabela1- Respostas dos alunos à pergunta: Como você se autoafirma quanto à identidade racial?
(início do trabalho)
RESPOSTA NÚMERO %
Branco 9 42,9
Pardo 4 19
Moreno 7 33,3
TOTAL 21 100
Gráfico 1- Respostas dos alunos à pergunta: Como você se autoafirma quanto à identidade
racial? (início do trabalho)
BRANCO45%
PARDO20%
MORENO 35%
IDENTIDADE RACIAL
Tabela 2 - Respostas dos alunos à pergunta: Como você se autoafirma quanto a identidade racial? (final
do trabalho)
RESPOSTA NÚMERO %
Branco 8 38,09 %
Pardo 6 28,57 %
Negro 7 33,33 %
TOTAL 21 100
33
Gráfico 2 - Respostas dos alunos à pergunta: Como você se autoafirma quanto a identidade racial? (final
do trabalho)
BRANCO38%
PARDO29%
NEGRO33%
IDENTIDADE RACIAL
A leitura das tabelas comparativas transformadas em gráficos nos permite concluir
que as leituras reflexivas, observações e questionamentos na sala de aula deram origem a um
aprendizado coletivo que levou a uma conscientização acerca da importância da identidade
negra. De posse do conhecimento sobre o que, até então, era desconhecido acerca da
contribuição dos africanos na formação do povo brasileiro, ficou mais fácil para o alunado se
enxergar como fazendo parte dessa identidade, e assim se autodeclarar como tal.
Como professora polivalente com vinte e sete anos de docência, foi um desafio
sistematizar várias estratégias para que diversos conceitos fossem estudados e aprendidos
juntos - professor e aluno - acerca de um tema tão abrangente como é a capoeira e ter
conseguido alcançar tão gratificante resultado.
Sendo assim, baseando-se em Munanga (2008, p. 13),
Não existem leis no mundo que sejam capazes de erradicar as atitudes
preconceituosas existentes nas cabeças das pessoas, atitudes essas
provenientes dos sistemas culturais de todas as sociedades humanas. No
entanto, cremos que a educação é capaz de oferecer tanto aos jovens como
aos adultos a possibilidade de questionar e desconstruir os mitos de
superioridade e inferioridade entre grupos humanos, introjetados pela cultura
racista na qual foram socializados.
Como projeta o autor, a educação é capaz, com muito esforço e em longo prazo, de
fazer com que as pessoas tomem consciência de que a desconstrução de atitudes racistas é
necessária para que se tenha uma convivência pacífica. Sendo o espaço escolar um ambiente
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para formação de opinião, é preciso que se tenha a consciência de que a mudança ocorre a
partir da transformação do pensamento de seus educadores. Só assim é possível alcançar bons
resultados junto ao alunado e ao contexto familiar em que estão inseridos.
5 O ALUNO COMO PARTICIPANTE NO CENÁRIO DA APRENDIZAGEM
Para que o aluno tenha um conhecimento mais interativo e palpável é interessante a
experiência da visita in loco a diferentes ambientes que proporcionem aprendizagem,
possibilitando ao mesmo sentir-se como elemento participante desse cenário em que a
aprendizagem acontece, e não apenas como um mero receptor de informações advindas de
livros didáticos e materiais de leitura. Com isso em mente, por ocasião da passagem do Dia da
Consciência Negra, 20 de novembro, além da importância da data ser mencionada em sala,
também fez-se uma visita ao Campus Universitário de Currais Novos, pois na ocasião estava
acontecendo uma exposição de objetos afro-brasileiros. Os alunos ficaram admirados com o
que estava sendo exposto, com a biblioteca e as placas das turmas que por lá já passaram,
inclusive identificaram as professoras que os acompanharam.
Foto 28: Visita à biblioteca da UFRN-CERES Foto 29: Alunos observam esculturas afro
Fonte: Maria do Céu Araújo Silva Fonte: Maria do Céu Araújo Silva
Ano: 2015 Ano: 2015
Foto 30: Alunos em visita à exposição afro de CN Foto 31: Alunos observam placas no Campus
Fonte: Maria do Céu Araújo Silva Fonte: Maria do Céu Araújo Silva
Ano: 2015 Ano: 2015
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Encerrando o ano letivo e os trabalhos do projeto Capoeira: Homenagem, Resistência
e Conquista da Liberdade, realizou-se a exposição dos trabalhos executados durante o
desenvolvimento do mesmo. A exposição deu-se da seguinte forma: todos os alunos da escola
vieram até à sala da turma do 5.º ano. Ao entrarem eram convidados a se sentar para ouvir
uma explanação de como as tarefas tinham sido desenvolvidas. Em seguida os alunos,
separados em grupos, iam explicando como tinham efetuado cada tarefa e respondendo as
perguntas dos visitantes acerca do que tinha sido explicado.
Foto 32: Alunas explicam a divisão política da África Foto 33: Aluno explica o jogo das advinhas
Fonte: Maria do Céu Araújo Silva Fonte: Maria do Céu Araújo Silva
Ano: 2015 Ano: 2015
Foto 34: Alunos observam as palavras afro- Foto 35: Alunos leem os anúncios de fuga de escravos
brasileiras estudadas Fonte: Maria do Céu Araújo Silva
Fonte: Maria do Céu Araújo Silva Ano: 2015
Ano: 2015
Além de apresentarem as produções escritas, os alunos cantaram para os visitantes a
música Família de Ouro e recitaram as adivinhas que deram origem ao jogo produzido como
material didático.
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Foto 36: Alunos declamam as adivinhas com o Foto 37: Alunos cantam a música Família de Ouro
auxílio de fantoches Fonte: Maria do Céu Araújo Silva
Fonte: Maria do Céu Araújo Silva Ano: 2015
Ano: 2015
Encerrando as atividades de exposição foi feita uma apresentação da roda de capoeira
“Cordão de Ouro”, advinda do Projeto AABB Comunidade, no pátio da escola. Os alunos
puderam ver na prática o que tinham aprendido durante o desenrolar do projeto, com muita
música e interação da turma com os capoeiristas que tão bem explicaram cada passo da
apresentação.
Foto 38: Alunos com o grupo de capoeira Foto 39: Apresentação da roda de capoeira para a
Fonte: Maria do Céu Araújo Silva comunidade escolar
Ano: 2015 Fonte: Maria do Céu Araújo Silva
Ano: 2015
A cultura afro-brasileira é um patrimônio que não pode ser esquecido nem relegado a
mero folclore, mas deve ser valorizada, respeitada e repassada entre as gerações de
aprendizes, sendo a capoeira um desses elementos. E em relação à perpetuação dessa
memória, Adorno (1999, p. 93) afirma que,
37
A sobrevivência da Capoeira estará assegurada pela ação dos inúmeros
praticantes que compreendam de forma exclusiva e magnífica de expressão
corporal, cultivando a graça e leveza dos movimentos, as possibilidades
técnicas e plásticas de traduzir fisicamente elasticidade, flexibilidade e
controle. E o que é mais importante, sem descuidar do seu conceito – a
liberdade – que resume o objetivo a ser alcançado e o caminho a percorrer.
Partindo deste pensamento, conclui-se que a capoeira hoje em dia não é mais praticada
como meio para resistir à escravidão, nem como forma de entretenimento de “marginais”, mas
sim, um legado deixado por um povo que antes era considerado um empecilho à formação da
nação brasileira, agora e sempre, mas que lutaram pelo reconhecimento de seus direitos
merecidos e manifestação da sua cultura.
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A História é vista como uma disciplina plural, pois o aluno pesquisa, formula dados,
estuda vestígios e memórias, compartilhando esses saberes com o professor e a comunidade
em que está inserido. Isso reforça a ideia de um novo fazer pedagógico. A partir deste projeto
o trabalho do educador sobre a África passou a ter um novo sentido. Observou-se que o
empreendimento foi significativo, podendo ser um despertar para atividades futuras que
certamente acontecerão no âmbito de nossas escolas, tão privadas de conhecimento a respeito
dos africanos e afro-brasileiros. O impacto resultou em um aprendizado coletivo por parte dos
discentes e docentes, refletindo-se positivamente nas relações cotidianas da sala de aula.
Por meio das leituras realizadas observou-se que, na capoeira, enfatiza-se a
prevalência dos princípios da cooperação acima da competição. Visto ser a única luta marcial
que utiliza instrumentos musicais dentro de sua prática, há espaço e recursos para todos como
um meio para a inclusão social de homens, mulheres, idosos e portadores de necessidades
especiais, que tocam, cantam e lutam de igual para igual dentro de suas capacidades.
Valorizar a cultura afro-brasileira, tendo em vista a grande contribuição desta para a
nossa sociedade, é de importância primordial nas nossas escolas. Contudo, apesar da Lei
10.639 ter sido sancionada em 2003, a Secretaria Municipal de Educação do nosso município
ainda não implantou a mesma, para que seja trabalhada como disciplina curricular nas escolas.
Até o presente momento houve apenas uma única iniciativa neste sentido, promovida pela
UFRN através de um encontro para os profissionais da área de educação do campo. Além
disso, encontrou-se e ainda se encontra certa resistência em introduzir a cultura africana na
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escola, não tanto por parte dos pais dos alunos, mas por alguns membros do corpo docente do
estabelecimento de ensino em que o projeto foi aplicado.
Entretanto, ao longo do desenvolvimento deste projeto, das experiências vivenciadas,
constatou-se que embora apenas um pequeno passo tenha sido dado é possível suscitar
mudanças em relação ao conceito e a concepção das pessoas tratando-se da capoeira,
mudando a opinião vigente de que a mesma é uma atividade destinada a pessoas desocupadas
ou como prática de incentivo à desordem e violência. Foi bastante válido trabalhar com o
tema da valorização da cultura africana e o etnocentrismo, combatendo o preconceito racial e
as manifestações de racismo disfarçadas. Pretende-se dar continuidade a este processo
educacional envolvendo o alunado, a família e a comunidade escolar, propondo a arte da
Capoeira como medida educativa libertadora e de combate aos fenômenos discriminatórios
supracitados.
39
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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41
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2011. (p. 16-17, 22).
Um pé de quê? Baobá parte 1- https://www.youtube.com/watch?v=GFm-Mu8_8mk. Acesso
em 06 de Junho de 2015.
Um pé de quê? Baobá parte 2-https://www.youtube.com/watch?v=XxZClCcrBoQ. Acesso
em 06 de Junho de 2015.
42
ANEXOS
43
ANEXO A - O HOMEM E O PATRIMÔNIO CULTURAL
Ao longo de nossas vidas vamos acumulando conhecimentos, objetos, vivências. Viver
é adquirir...
Adquirir manias, coisas, sabedoria...
Perdemos também. Perdemos a inocência e muitas vezes a simplicidade... Os entes
queridos... Coisas...
Nus chegamos, recebemos nossos primeiros patrimônios: roupas, sapatinhos,
brinquedos... Carinho.
Logo aprendemos uma língua para nos comunicarmos com os nossos protetores, uma
aquisição maravilhosa.
Aprendemos a gostar dos objetos e espaços que nos cercam: Mamãe, papai, o quarto,
o berço o travesseiro tão querido, a mamadeira... o bico.
Logo é a rua que nos atrai com suas pessoas diferentes desiguais.
E a praça... A praça, seus brinquedos e suas crianças... uma extensão da casa.
Vem depois a escola este lugar de conhecimento cheia de novos mistérios, amigos
tias...
O nosso quintal cresce e logo vislumbramos a cidade e o parque da cidade, a igreja
da cidade, os espaços da cidade.
Assim crescemos. E crescendo vamos nos apropriando de coisas, pessoas, ideias,
sentimentos, crenças, desejos, esperanças. Compartilhando com grupos de iguais, ideais
iguais.
Somos muito então: Filho/filha, marido/mulher, pai/mãe, aluno(a), torcedor(a),
mineiro, brasileiro, latino, terráqueo...
Rótulos sociais, elos e mais elos adquiridos com o viver...
Viver é criar patrimônio... Cultura...
O registro do que foi fica na memória... Fotos, diários, cartas...
Os objetos dos que se foram são relíquias a serem guardadas com carinho e respeito.
A minha primeira escola... A Saudade dói no peito ao ver o velho prédio cheio de
histórias...
Quando fiz a primeira comunhão... Professora Rita... A menina loura que amei aos
dez anos...
As cadeiras de dupla na escola...
Os bons tempos das matinês no Cinema que virou igreja...
Mamãe me chamando para jantar...
O pegador de lata, rouba bandeira...
Nadar no Córrego... A atividade politicamente incorreta: Caçar passarinho com
bodoque...
O congado passando... A gente acompanhando...
Semana Santa e o pó de café com rosas e serragem no chão para os outros pisarem.
Carnaval... Uma namorada por noite... Tinha bloco e Baile no clube.
Saudade do Pedrinho e suas palhaçadas. Morreu... Ainda vou ao velho bairro ver minha casa do passado...
A faculdade não é mais a mesma.
Minha cidade não é a mesma...
Dói ver o tempo passar... Mexendo comigo e com todos. Dói ver as coisas passarem
por causa do desrespeito e ganância de alguns.
Passam os sonhos, os ideais, os amigos, os pais... Passamos nós...
Tudo passa... Tudo se transforma...
44
E qual a nossa tarefa?
Nossa tarefa é evitar que esse passar seja assim tão rá
pido.
Que esse transformar seja agressiva...
Administrar a transformar sem congelar, sem engessar.
Esse é o nosso papel.
Deixar a herança e ensinar o respeito a essa herança.
Viver é criar patrimônio e preservar é continuar com dignidade.
É crescer com identidade...
(Carlos Henrique Rangel)
RANGEL, Carlos Henrique. O homem e o patrimônio cultural. Disponível em
http://proteuseducacaopatrimonial.blogspot.com.br/2009/05/preservacao-do-patrimonio-
cultural.html.
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APÊNDICES
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APÊNDICE A - Adivinhas culturais como material didático para o estudo da Capoeira
1- SOU UMA CANTIGA CURTA,
IMPROVISO, IDENTIFICO E APRESENTO
NA RODA DE CAPOEIRA, CAUSO
BASTANTE CONTENTAMENTO. QUEM
SOU? CHULA
2-SOU UM FRUTO. RESSONÂNCIA DO
BERIMBAU. INSTRUMENTO DE
PERCUSSÃO. E TRANSPORTO ÁGUA NO
SERTÃO. QUEM SOU? CABAÇA
3- NÃO GOSTO DE PREGUIÇA E
MOLEZA. ACELERO O RITMO DAS
CANTIGAS. ME DERAM NOME
ENGRAÇADO PARA FALAR ESSA
PROEZA. QUEM SOU? CORRIDO
4- SOU UMA PALAVRA POLISSÍLABA E
TAMBÉM PAROXÍTONA. TENHO TRÊS
CONSOANTES E 8 LETRAS. ANTES ERA
PROIBIDA E HOJE NÃO SOU MAIS. QUEM
SOU? CAPOEIRA
5-NA RODA DE CAPOEIRA POSSO
FAZER ADVERTÊNCIA FALAR DE
LENDAS, FATOS HISTÓRICOS OU
FIGURAS DA DEFESA, CANTADA COM
ARTE, POESIA E DESTREZA. QUEM
SOU? QUADRA
6- FUI UM PERÍODO ONDE A CAPOEIRA
ERA CONTRAVENÇÃO, HOJE,
TRANSFORMOU-SE EM PATRIMÔNIO E
ADMIRAÇÃO. QUEM SOU? INÍCIO
DA REPÚBLICA
7- SOU ORAÇÃO LONGA DO JOGO DE
ANGOLA, CANTADA ANTES DO
INÍCIO CHAMANDO PARA O DESAFIO.
QUEM SOU? LADAINHA
8- SOU O CARNAVAL PERNAMBUCANO,
LEMBRO OS MOVIMENTOS DA
CAPOEIRA. NO CANAVIAL DO
FAZENDEIRO ONDE SOFRIA O NEGRO
DESCENDENTE E AFRICANO. QUEM
SOU? FREVO
9- ORIGINEI-ME NO BRASIL PARA
RESISTIR À ESCRAVIDÃO.
HOMENAGEIO DEUSES AFRICANOS,
HÁ ALGUNS ANOS CONQUISTEI A
LIBERDADE. QUEM SOU? CAPOEIRA
10- SURGI DA MADEIRA, FUI TOCADO NA
COLHEITA, INCOMODEI OS SENHORES,
HOJE SOU ACEITO, E POUCA GENTE ME
REJEITA. QUEM SOU? ATABAQUE
11- NASCI NA BAHIA, DA CAPOEIRA
REGIONAL FUI PRECURSOR, AINDA
HOJE SOU LEMBRADO COM CARINHO
E AMOR. QUEM SOU? MESTRE
BIMBA
12- SOU UM INSTRUMENTO QUE TOCO
JUNTO AO BERIMBAL, MARCO O
COMPASSO DAS BATIDAS E TORNO
O JOGO LEGAL. QUEM SOU? CAXIXI
13- SOU UM CONJUNTO DE 10 ANOS,
GOVERNADA POR GETÚLIO VARGAS,
O VOTO PASSOU A SER SECRETO E A
CAPOEIRA PERMITIDA. QUEM SOU?
DÉCADA DE 30
14- ENGANEI SENHORES E FEITORES,
DISFARÇADA DE MÚSICA E DANÇA.
CONQUISTEI A LIBERDADE A CAMINHO
DO QUILOMBO, NOS PASSOS DA
ESPERANÇA. QUEM SOU? CAPOEIRA
47
15- SOU CAPOEIRA E TENHO DOIS
ESTILOS: ANGOLA E REGIONAL.
QUAL O MAIS LENTO? ME RESPONDA
PESSOAL! QUEM SOU? ANGOLA
16- SOU NÚMERO PAR E TAMBÉM MUITO
FECHADO. ANO QUE A CAPOEIRA
TORNOU-SE PATRIMÔNIO BRASILEIRO.
QUEM SOU? 2008
17- COM TRABALHO E CIÊNCIA UMA
PALAVRA DESCONTRUIMOS, NA
ÁFRICA É UMA PLANTA E TAMBÉM
UM INSTRUMENTO MUSICAL. NO
BRASIL, PARA ALGUNS É OFENSA,
ESTÁ FALTANDO ESTUDO E
CONSCIÊNCIA. QUEM SOU?
MACUMBA
18- ESTABELEÇO A OBRIGATORIEDADE
DO ENSINO DE HISTÓRIA E CULTURA
AFRO-BRASILEIRA E AFRICANA NA
EDUCAÇÃO BÁSICA. AJUDO A
COMBATER O RACISMO E OS NEGROS A
SE RECONHECEREM NA CULTURA
NACIONAL POR MEIO DAS POLÍTICAS
PÚBLICAS QUEM SOU? LEI 10.639/2003
19- SOU DIVIDIDO EM TRÊS
CATEGORIAS: GUNGA, MÉDIO E
VIOLA. USADO NA ÁFRICA E BRASIL,
NA LUTA REGIONAL E ANGOLA.
QUEM SOU? BERIMBAU
20- SOU INSTRUMENTO MUSICAL DAS
CERIMÔNIAS RELIGIOSAS E TAMBÉM DA
CAPOEIRA, DO CANDOMBLÉ E
UMBANDA. RELIGIÕES AFRO-
BRASILEIRAS. QUEM SOU? RECO RECO
48
APÊNDICE B- PASSO A PASSO PARA A CONFECÇÃO DO JOGO, “ADIVINHAS
CULTURAIS COMO MATERIAL DIDÁTICO PARA O ESTUDO DA CAPOEIRA”.
OBJETIVO: Revisar o aprendizado da turma, a respeito do estudo realizado sobre a Capoeira,
por meio de jogo.
MATERIAL
-Banner reaproveitado;
-5 círculos de EVA na cor verde;
-5 círculos de EVA na cor vermelha;
-5 círculos de EVA na cor amarela;
-5 círculos de EVA na cor azul;
-Texto com as adivinhas, recortado e enumerado para ser colado com o número de alunos da
turma;
-1 caixa no formato de cubo para transformar-se em dado;
-Papel madeira para cobrir a caixa;
-Círculos coloridos com as mesmas cores das do tabuleiro para serem colados no dado;
-Cola, tesoura e fita adesiva.
PROCEDIMENTO
O professor fará o sorteio de quem iniciará o jogo, a partir dos números da chamada de
presença;
O aluno sorteado, jogará o dado, a cor que ficar para o lado de cima, será a que o mesmo irá
procurar nas listas coloridas seguindo a numeração;
Encontrada a adivinha, o aluno lê para a turma e responde;
Se o aluno não conseguir respondê-la certo, o professor fará a pergunta novamente para a
turma e a mesma responderá em coro;
O sorteio para a participação, será até o momento em que todos tenham participado do jogo e
ainda tenha adivinha por responder;
O jogo não terá ganhadores, pois é uma atividade de enriquecimento e revisão dos
conhecimentos adquiridos durante a proposta em estudo.
49
APÊNDICE C- Dominó de rimas como material didático para estudo da capoeira
DOMINÓ DA CAPOEIRA
CAPOEIRA
RASTEIRA
TAMBOR
AGOGÔ
BERIMBAL
REGIONAL
ANGOLA
VIOLA
RODA
MODA
CARNAVAL
IMATERIAL
BRASIL
ANIL
CONTRAVENÇÃO
AMBIÇÃO
RESISTÊNCIA
SOBREVIVÊNCIA
LIBERDADE
50
LEALDADE
QUILOMBO
JONGO
SAMBA
MUAMBA
MOÇAMBIQUE
ALAMBIQUE
CANDOMBLÉ
CAFUNÉ
INVADIDO
CORRIDO
MORTE
ESPORTE
TRISTEZA
DEFESA
BIONGO
CONGO
MANDINGUEIRO
PANDEIRO
ATAQUE
51
ATABAQUE
TUPI
CAXIXI
CONQUISTA
EGOÍSTA
LADAINHA
RAINHA
CULTURAL
CANAVIAL
MACUMBA
ZABUMBA
IMPÉRIO
MISTÉRIO
MENSAGEM
HOMENAGEM
ESCRAVIDÃO
LIBERTAÇÃO
52
APÊNDICE D - PASSO A PASSO PARA A CONFECÇÃO DO JOGO, “DOMINÓ DE
RIMAS COM A CAPOEIRA”.
OBJETIVO- Organizar palavras que foram mencionadas durante o exercício com a capoeira,
combinando a sonoridade das mesmas de forma ritmada e lúdica, para que formem um
dominó.
MATERIAL
-Cartolina;
-Papel ofício;
-Cola;
-Lápis de cor;
-Tesoura.
PROCEDIMENTO
Recortar a cartolina e o papel ofício de forma retangular e dividi-los ao meio, escrevendo as
palavras que se combinarão posteriormente pela sonoridade ritmada.
O professor inicia o jogo, distribuindo uma, ou várias peças do dominó, para cada um dos
participantes;
O docente chama para o centro da sala, o aluno que está com a peça que inicia o dominó;
O aluno lê a palavra que está contida em sua;
Em seguida, chama a peça que contém a palavra que rime, com a que tem em mãos;
O jogo, termina com a peça que está com a segunda parte em branco.
53
APÊNDICE E – TEXTOS PRODUZIDOS PELOS ALUNOS SOBRE A CAPOEIRA
54
55
56
57
APÊNDICE F – DESENHOS FEITOS PELOS ALUNOS SOBRE PATRIMÔNIO
58
59
APÊNDICE G – DESENHOS FEITOS PELOS ALUNOS SOBRE AS ATIVIDADES
COTIDIANAS DOS NEGROS ESCRAVIZADOS
60
61
APÊNDICE H – ATIVIDADE DE PRODUÇÃO TEXTUAL COM PALAVRAS DE
ORIGEM AFRO-BRASILEIRAS
62
63
64
APÊNDICE I – LISTA DE ALUNOS DO 5º ANO “A”
01-Ana Caroline Oliveira
02-Alejandro Emanuel Sabino Serapião
03- Ana Tália Alves da Costa
04- Cláudia Gabryella Oliveira de Araújo
05- Dayerlly Estéffanny Lima da Silva
06- Dayvison Diego Oliveira Cunha
07-Emily Gabrielly Silva Farias Chaves
08- Everton Vinícios Medeiros de Araújo
09- Gabriel Vinícios França de Matos
10- Jeniffer Ketyllin Duarte Galvão
11- José Denner de Assis Silva
12- José Emanuel Campelo do Nascimento
13- Juciene Macedo dos Santos
14- Luan Guilherme Barbosa dos Santos
15- Maria Luiza Rocha FernandesSouza Silva
16- Mayonara Kethilly Silva
17- Pedro Henrique Araújo dos Santos
18- Pedro Vinícios Batista de Oliveira
19- Rychard Chrysthian
20- Thiago Henrique Marcelino Santos
21- Victor Gabriel Nascimento de Santana
22- Wallyson Gheyzon de Lima Horácio