Vinhos tropicais: nova realidade, novos desafios · Vinhos tropicais: nova realidade, novos...

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10 Junho de 2006

Vinhos tropicais: nova realidade, novos desafiosCelito Crivellaro GuerraDoutor em enologia, pesquisadorda Embrapa Uva e Vinho

Até há poucos anos considerava-se queo cultivo da videira para a produção devinhos era um negócio restrito às regiõesde clima temperado. Os especialistasrefutavam categoricamente a possibilidadede elaborar-se vinhos de qualidade emregiões de clima quente, principalmente emse tratando de regiões tropicais. Certamenteos mesmos não levavam em consideraçãoa variabilidade genética da videira (certasvariedades ou clones adaptam-se bemem ambientes quentes). Ademais, oconhecimento de detalhes do manejoagronômico da videira em climas quentestem progredido bastante, resultando emganho adicional de qualidade da uva paravinificação. Como resultado, nos últimosanos este paradigma está seriamenteameaçado pela produção de vinhos dequalidade por vezes surpreendente embaixas latitudes.

No Brasil, a região do Vale do SãoFrancisco (VSF), encravada na junçãodos estados da Bahia e Pemambuco, estáentre as principais regiões vitivinícolastropicais de importância econômica doplaneta. Está localizada entre os paralelos

8 e 9° de latitude sul e em altitude nãosuperior a 400m acima do nível médiodo mar (diferentemente de outras regiõesvitivinícolas da zona inter-tropical, comono Peru e na Bolívia, que estão localizadasa altitudes consideráveis).

Na região, as temperaturas são elevadasdurante todo o ano, o que traz a vantagemde poder-se obter duas safras anuais em ummesmo vinhedo. Por outro lado, existemdesvantagens, como a grande combustãode certos compostos durante a maturaçãoda uva, principalmente ácidos orgânicos,aromas e matéria corante. Assim, asvariedades de videira que melhor seadaptam nessas condições são as de ciclomédio a tardio, produtoras de uvas comaltos teores de acidez, aroma delicado e,no caso das tintas, com alto potencial paraprodução de antocianinas e taninos.

Considerando que as variedadestradicionalmente cultivadas na regiãoapresentam certa limitação quanto aosatributos acima mencionados, recentementenovas variedades foram testadas, em projetocoordenado pela Embrapa Uva e Vinho. Apartir de observações do comportamentoagronômico e da maturação das uvasem distintas épocas do ano, foram pré-selecionadas doze variedades, boa partedas quais parece apresentar potencial paraa produção de vinhos de qualidade. Outros

estudos sobre o manejo agronômico dasvariedades selecionadas estão em curso,visando otimizar o potencial observado.

Quanto à tecnologia enológica,necessita-se ainda adaptá-Ia às condiçõesparticulares sob as quais as uvas sãoproduzidas na região. A elaboraçãode vinhos de qualidade caracteriza-sepela aplicação da tecnologia clássica,dando-se especial atenção a um grandenúmero de detalhes que, no conjunto,aportam atributos que tomam o produtodiferenciado. Nesse sentido, há muitastécnicas, procedimentos e parâmetros ea ser testados e otimizados.

Nas condições do VSF, especialatenção deve ser dispensada ao controleda maturação da uva, à colheita e aoscontroles durante a vinificação.

O controle da maturação da uva éparticularmente importante, uma vezque a fase de maturação é muito curta e acombustão de ácidos, aromas, polifenóis eoutros compostos é intensa e rápida.

Dois dos principais atributos de vinhosbrancos e espumantes são o frescoraromático e gustativo e a tipicidadearomática varietal. Para consegui-los emcondições tropicais, é importante colheras uvas com acidez relativamente elevada,sem comprometer a riqueza em açúcares.Uvas sobre maduras tendem a apresentarbaixa acidez e a perder boa parte do

Vinhedos no Vale do São Francisco.a velocidade de reações de oxidação domosto.

Relativamente ao controle da vinificação,uvas produzidas em condições de climaquente apresentam composição químicasemelhante àquela de uvas produzidas emregiões de clima temperado. A diferençaestá na menor estabilidade química decertos compostos de uvas produzidas emclimas quentes. Este fato tem conseqüênciadireta sobre a qualidade, a longevidade e oequilíbrio organoléptico dos vinhos, razãopela qual o controle nas diversas etapasda vinificação, nessas condições, deve serparticularmente severo.

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. .potencial aromático. Como resultado,o vinho não terá frescor aromático egustativo e seu aroma não será floral. Teránotas de frutas sobremaduras e compota,com sensível redução da qualidade, Nocaso de uvas tintas, é importante observara maturação dos compostos fenólicos. NoVSF, em determinadas épocas do ano podehaver um descompasso importante entre omomento ideal de colher a uva em relação aaçúcares e ácidos (maturação tecnológica)e aos compostos fenólicos (maturaçãofenólica).

Por ocasião da colheita, é importantetransportar rapidamente a uva à vinícola,acondicionada em embalagens queassegurem a integridade fisica das bagas,Na vinícola, a primeira e imprescindíveltarefa é efetuar um rápido resfriamentoda uva, visando inibir o desenvolvimentode microorganismos nocivos durante asprimeiras horas de processamento e reduzir

Os vinhos tropicais são uma realidadeindiscutível no mundo vitivinícola. NoBrasil, a região do VSF alcançou umgrau de desenvolvimento que a tornaconsolidada como região vitivinícola.A mesma possui um atributo singular:o clima vitícola com variabilidadeintra-anual, fator que pode aumentar oleque de possibilidades de elaboraçãode diferentes produtos. Entretanto, osdesafios para sua consolidação definitivasão imensos, assim como imensas sãoas oportunidades de desenvolvimento.As ações atualmente em curso, tanto noque se refere ao empreendedorismo dainiciativa privada, quanto no que se refereao incremento da infra-estrutura regionale aos esforços públicos em pesquisa edesenvolvimento, estão permitindo aconstrução da notoriedade da região, oque talvez motive o aparecimento de outrasregiões vitivinícolas tropicais no país.