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Variedades Diferenciáveis
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Publicações Matemáticas
Variedades Diferenciáveis
Elon Lages Lima
impa
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Copyright © 2011 by Elon Lages Lima
Impresso no Brasil / Printed in Brazil
Capa: Noni Geiger / Sérgio R. Vaz
Publicações Matemáticas
• Introdução à Topologia Diferencial – Elon Lages Lima
• Criptografia, Números Primos e Algoritmos – Manoel Lemos
• Introdução à Economia Dinâmica e Mercados Incompletos – Aloísio Araújo
• Conjuntos de Cantor, Dinâmica e Aritmética – Carlos Gustavo Moreira
• Geometria Hiperbólica – João Lucas Marques Barbosa
• Introdução à Economia Matemática – Aloísio Araújo
• Superfícies Mínimas – Manfredo Perdigão do Carmo
• The Index Formula for Dirac Operators: an Introduction – Levi Lopes de Lima
• Introduction to Symplectic and Hamiltonian Geometry – Ana Cannas da Silva
• Primos de Mersenne (e outros primos muito grandes) – Carlos Gustavo T. A. Moreira e NicolauSaldanha
• The Contact Process on Graphs – Márcia Salzano
• Canonical Metrics on Compact almost Complex Manifolds – Santiago R. Simanca
• Introduction to Toric Varieties – Jean-Paul Brasselet
• Birational Geometry of Foliations – Marco Brunella
• Introdução à Teoria das Probabilidades – Pedro J. Fernandez
• Teoria dos Corpos – Otto Endler
• Introdução à Dinâmica de Aplicações do Tipo Twist – Clodoaldo G. Ragazzo, Mário J. DiasCarneiro e Salvador Addas Zanata
• Elementos de Estatística Computacional usando Plataformas de Software Livre/Gratuito –
Alejandro C. Frery e Francisco Cribari-Neto• Uma Introdução a Soluções de Viscosidade para Equações de Hamilton-Jacobi – Helena J.
Nussenzveig Lopes, Milton C. Lopes Filho
• Elements of Analytic Hypoellipticity – Nicholas Hanges
• Métodos Clássicos em Teoria do Potencial – Augusto Ponce
• Variedades Diferenciáveis – Elon Lages Lima
• O Método do Referencial Móvel – Manfredo do Carmo
• A Student's Guide to Symplectic Spaces, Grassmannians and Maslov Index – Paolo Piccione eDaniel Victor Tausk
• Métodos Topológicos en el Análisis no Lineal – Pablo Amster
• Tópicos em Combinatória Contemporânea – Carlos Gustavo Moreira e Yoshiharu Kohayakawa
• Uma Iniciação aos Sistemas Dinâmicos Estocásticos – Paulo Ruffino• Compressive Sensing – Adriana Schulz, Eduardo A.B.. da Silva e Luiz Velho
• O Teorema de Poncelet – Marcos Sebastiani
• Cálculo Tensorial – Elon Lages Lima
• Aspectos Ergódicos da Teoria dos Números – Alexander Arbieto, Carlos Matheus e C. G.Moreira
• A Survey on Hiperbolicity of Projective Hypersurfaces – Simone Diverio e Erwan Rousseau
• Algebraic Stacks and Moduli of Vector Bundles – Frank Neumann
• O Teorema de Sard e suas Aplicações – Edson Durão Júdice
IMPA - ddic@impa.br - http://www.impa.br - ISBN: 978-85-244-0267-8
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What win I if I gain the thing I seek?
A dream, a breath, a froth of fleeting joy.
Prefácio
Estas notas são uma reimpressão não modificada do texto de
um curso introdutório sobre Variedades Diferenciáveis, que lecio-
nei algumas vezes no IMPA, anos atrás. Ao escrevê-las, vali-me
dos apontamentos do meu então aluno Jair Koiller. A presente
edição foi digitada por Rogerio Dias Trindade. As figuras foram
produzidas por Francisco Petrúcio. A todas estas pessoas, meus
agradecimentos.
Rio de Janeiro, maio de 2007
Elon Lages Lima
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Conteúdo
Capı́tulo I - Cálculo Diferencial . . . . . . . . . . . . . . 1
1. Espaço euclidiano de dimensão p . . . . . . . . . . . . 1
2. Casos particulares . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 4
3. Derivadas de ordem superior . . . . . . . . . . . . . . 6
4. Versão intŕınseca da regra da cadeia . . . . . . . . . . 8
5. A desigualdade do valor médio . . . . . . . . . . . . . 116. Derivadas parciais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13
7. O teorema da função inversa . . . . . . . . . . . . . . 15
8. Forma local das submersões e o teorema das funções
impĺıcitas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 16
9. A forma local das imersões . . . . . . . . . . . . . . . 20
10. O teorema do posto . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 22
11. Campos de vetores em Rn . . . . . . . . . . . . . . . . 28
12. Referências . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 30
Capı́tulo II - Superf́ıcies nos Espaços Euclidianos . . 31
1. Parametrizações . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 31
2. A noção de superf́ıcie . . . . . . . . . . . . . . . . . . 34
3. Mudança de coordenadas . . . . . . . . . . . . . . . . 36
4. O espaço tangente . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 42
5. Como obter superf́ıcies . . . . . . . . . . . . . . . . . . 46
6. Exemplos de superf́ıcies . . . . . . . . . . . . . . . . . 52
7. Grupos e Álgebras de Lie de matrizes . . . . . . . . . 60
8. Campos de vetores tangentes a uma superf́ıcie . . . . . 63
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Caṕıtulo III - Vetores Normais, Orientabilidade e
Vizinhança Tubular . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 70
1. Campos de vetores normais a uma superf́ıcie . . . . . . 71
2. Superf́ıcies Orientáveis . . . . . . . . . . . . . . . . . . 80
3. A vizinhança tubular de uma superf́ıcie compacta . . . 86
4. A vizinhança tubular de uma superf́ıcie não-compacta 93
Capı́tulo IV - Variedades Diferenciáveis . . . . . . . 102
1. Sistemas de coordenads locais . . . . . . . . . . . . . 102
2. Mudança de coordenadas . . . . . . . . . . . . . . . 105
3. Variedades diferenciáveis . . . . . . . . . . . . . . . 106
4. Exemplos de variedades . . . . . . . . . . . . . . . . 108
5. Variedades definidas por uma coleção de injeções . . 1136. Variedades de Grassmann . . . . . . . . . . . . . . . 123
Caṕıtulo V - Aplicações Diferenciáveis entre
Variedades . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 129
1. Aplicações diferenciáveis . . . . . . . . . . . . . . . . 130
2. O espaço tangente . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 134
3. A derivada de uma aplicação diferenciável . . . . . . 137
4. Algumas identificações naturais . . . . . . . . . . . . 139
5. A aplicação esférica de Gauss . . . . . . . . . . . . . 141
6. Estruturas de variedade em um espaço topológico . . 143
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Caṕıtulo VI - Imersões, Mergulhos e
Subvariedades . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 147
1. Imersões . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 147
2. Mergulhos e subvariedades . . . . . . . . . . . . . . . 151
3. Subvariedades . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 154
4. O espaço tangente a uma variedade produto.
Derivadas parciais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 156
5. A classe de uma subvariedade . . . . . . . . . . . . . 157
6. Imersões cujas imagens são subvariedades . . . . . . 159
7. A curva de Kronecker no toro . . . . . . . . . . . . . 163
Caṕıtulo VII - Submersões, Transversalidade . . . . 168
1. Submersões . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 168
2. Relações de simetria . . . . . . . . . . . . . . . . . . 172
3. Grupos de Lie . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 175
4. Transversalidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 177
5. Transversalidade de funções . . . . . . . . . . . . . . 181
6. Aplicações de posto constante . . . . . . . . . . . . . 183
Caṕıtulo VIII - Partições da Unidade e suas
Aplicações . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 186
1. Funções auxiliares . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 186
2. Algumas noções topológicas . . . . . . . . . . . . . . 190
3. Partições da unidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . 193
4. O lema de Urysohn diferenciável . . . . . . . . . . . 196
5. Aplicações diferenciáveis em subconjuntos arbitrários
de variedades . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 199
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Capı́tulo IX - Métricas Riemannianas . . . . . . . . 205
1. Variedades riemannianas . . . . . . . . . . . . . . . . 2052. A norma da derivada . . . . . . . . . . . . . . . . . 211
3. A distância intŕınseca . . . . . . . . . . . . . . . . . 215
4. A topologia geral de uma variedade . . . . . . . . . . 219
5. Isometrias . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 222
Capı́tulo X - Espaços de Funções . . . . . . . . . . . 230
1. Funções semicont́ınuas em uma variedade . . . . . . 230
2. Espaços de funções . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 233
3. Invariância da topologia de W 1(M ; N ) . . . . . . . . 237
4. Estabilidade de certas aplicações diferenciáveis . . . . 243
5. Aproximações em classe C 1 . . . . . . . . . . . . . . 251
6. Topologias de classe C r
. . . . . . . . . . . . . . . . 259
Caṕıtulo XI - Os Teoremas de Imersão e
Mergulho de Whitney . . . . . . . . . . . . . . . . . . 269
1. Conjuntos de medida nula em uma variedade . . . . 270
2. Imersões . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 274
3. Imersões injetivas e mergulhos . . . . . . . . . . . . 379
4. Espaços de Baire . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 286
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Caṕıtulo I
Cálculo Diferencial
Apresentamos neste caṕıtulo alguns resultados clássicos do Cál-
culo Diferencial em espaços euclidianos. Enfatizamos o aspecto
geométrico do Teorema da Função Inversa, que aplicaremos para
obter as “formas locais” de certas aplicações diferenciáveis. Esses
resultados serão amplamente utilizados no estudo das superf́ıciese das variedades diferenciáveis.
Omitimos a maior parte das demonstrações, pois o objetivo
principal deste caṕıtulo é fixar a notação e a terminologia para os
subseqüentes. As demonstrações omitidas podem ser encontradas
nas referências citadas no fim deste capı́tulo.
1 Espaço euclidiano de dimensão p
Como se sabe, o espaço euclidiano de dimens˜ ao p é o conjunto
R p de todas as seqüências x = (x1, . . . , x p) de p números reais.
Os vetores e1 = (1, 0, . . . , 0), e2 = (0, 1, 0, . . . , 0), . . . , e p =
(0, . . . , 1) constituem a base natural de R p.
Seja U um subconjunto aberto do Rm.
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2 [CAP. I: CÁLCULO DIFERENCIAL
Uma função vetorial f : U → Rn fica perfeitamente determi-nada por suas coordenadas
f 1, . . . , f n : U → R,
definidas pela relação
f (x) = (f 1(x), . . . , f n(x)), x ∈ U.
Escrevemos f = (f 1, . . . , f n).
f U
Rm
Rn
f (x)
f (U )
x
Figura 1.1.
Diz-se que a aplicação f : U → Rn é diferenci´ avel no pontox ∈ U quando existe uma transformação linear T : Rm → Rn talque
f (x + h) = f (x) + T · h + r(h), com limh→0
r(h)
|h| = 0.
(O dońınio natural de uma aplicação cuja diferenciabilidade que-remos investigar é um conjunto aberto, a fim de que seja arbitrário
o modo pelo qual o ponto variável x + h tende para o ponto x.)
É fácil de ver que as condições acima implicam:
T · h = limt→0
f (x + th) − f (x)t
o que é interpretado geometricamente pela Figura 1.2:
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[SEC. 1: ESPAÇO EUCLIDIANO DE DIMENSÃO P 3
f
x
U
x + hf (x)
f (x + h)
Rm
Rn
Th
Figura 1.2.
É única, portanto, a transformação linear T : Rm → Rn que dáa boa aproximação de f perto de x. Ela é chamada a derivada de
f no ponto x e é indicada por f (x) ou Df (x).A aplicação f é diferencíavel no ponto x se, e somente se, cada
uma de suas coordenadas f i o for. E além disso vale a equação
Df (x) · h = (Df 1
(x) · h , . . . , D f n
(x) · h).
Se T é uma transformação linear de Rm em Rn, isto é, T ∈L(Rm,Rn), a matriz de T em relação às bases usuais do Rm e doRn é a matriz (ti j) com n linhas e m colunas cujo elemento (i, j) é
a i-ésima coordenada do vetor T ·e j ; imaginando cada T ·e j comovetor-coluna, temos:
M (T ) = (T · e1 · · · T · e j · · · T · em).
A matriz associada a T = f (x) chama-se matriz jacobiana de f no ponto x e é indicada por Jf (x). O elemento (i, j) desta
matriz é a i-ésima coordenada do vetor ∂f
∂x j(x) = f (x) · e j =
(Df 1(x)
·e j , . . . , D f
n(x)
·e j), denominado j-ésima derivada parcial
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4 [CAP. I: CÁLCULO DIFERENCIAL
de f no ponto x. Portanto
Jf (x) =
∂f 1
∂x1(x) ∂f
1
∂x2(x) . . . ∂f
1
∂xm(x)
∂f 2
∂x1(x)
∂f 2
∂x2(x) . . .
∂f 2
∂xm(x)
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .∂f n
∂x1 (x)
∂f n
∂x2 (x) . . .
∂f n
∂xm(x)
2 Casos particulares
a) Seja J ⊂ R um intervalo aberto. Um caminho em Rn ésimplesmente uma aplicação f : J → Rn.
Diz-se que o caminho f : J → Rn tem vetor-velocidade no pontot0
∈J se existe o limite
df
dt(t0) = lim
h→0f (t0 + h) − f (t0)
h
cuja interpretação é dada na Figura 1.3:
t0 + h
t0
J f (t0)
f (t0 + h)f
df dt
(t0)R
n
Figura 1.3.
O vetor-velocidade df
dt(t0) existirá se, e somente se, o caminho
f : J
→Rn for diferenciável no ponto t0 . A identificação de f (t0)
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[SEC. 2: CASOS PARTICULARES 5
com df
dt(t0) é dada pelo isomorfismo
L(R,Rn) ≈ RnT → T · 1
ou seja,
df
dt(t0) = f
(t0) · 1 = limh→0
f (t0 + h) − f (t0)h
·
b) Seja f : U ⊂ Rm → R uma função real diferenciável em x ∈ U .A derivada f (x) é um elemento de L(R
m
,R) = (Rm
)∗, espaçodual do Rm. É tradicional chamar f (x) a diferencial de f noponto x e indicá-la por df (x). A matriz jacobiana de f tem uma
linha e m colunas, a saber
Jf (x) =
∂f
∂x1(x), . . . ,
∂f
∂xm(x)
.
Obtém-se assim a relação clássica df (x)·
h =m
i=1∂f
∂xi(x)
·hi.
O produto interno natural de Rm induz um isomorfismo
Rm ≈ (Rm)∗x → x∗, x∗(y) = x, y.
O gradiente de f no ponto p ∈ U é o vetor grad f ( p) ∈ Rmque corresponde ao funcional linear f ( p) ∈ (Rm)∗ por este iso-morfismo.
Em outras palavras, o gradiente é caracterizado pela proprie-
dade
grad f ( p), v = f ( p) · v para todo v ∈ Rm.Em particular, grad f ( p), ei = ∂f
∂xi( p), ou seja,
grad f ( p) =
i∂f
∂xi( p)ei.
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6 [CAP. I: CÁLCULO DIFERENCIAL
A expressão de grad f ( p) em termos de uma base arbitrária
(não ortonormal) é complicada. A definição intŕınseca, que vimos
acima, é muito conveniente para as aplicações teóricas.
3 Derivadas de ordem superior
Dado U ⊂ Rm aberto, diremos que uma aplicaçãof : U → Rm é diferenci´ avel em U quando ela for diferenciávelem todos os pontos x
∈U . Define-se então a aplicaç˜ ao derivada
f : U → L(Rm,Rn)x → f (x).
Algumas vezes imaginamos f como sendo a aplicação que acada x ∈ U associa a matriz jacobiana Jf (x). Deste modo, f setorna uma aplicação de U em Rmn.
Dada T ∈ L(Rm,Rn), escreve-se |T | = sup{|T ·u|; u ∈ Rm, |u| =1}. Isto define uma norma no espaço vetorial L(Rm,Rn). Comof toma valores nesse espaço, é natural indagar se f é cont́ınuaou mesmo se f tem derivada. Dizemos que f é continuamente diferenci´ avel ou de classe C 1, e escrevemos f ∈ C 1, quando f édiferenciável em U e f : U → L(Rm,Rn) é cont́ınua.
Se f : U → L(Rm,Rn) tem derivada no ponto x ∈ U , dizemosque f é duas vezes diferenci´ avel no ponto x e escrevemos
f (x) : Rm → L(Rm,Rn)
para indicar a derivada de f em x. A rigor, f (x) é um ele-mento de L(Rm, L(Rm,Rn)), mas existe um isomorfismo natu-ral L(Rm, L(Rm,Rn)) ≈ L2(Rm,Rn) que associa a cada trans-formação linear T : Rm
→ L(Rm,Rn) a transformação bilinear
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[SEC. 3: DERIVADAS DE ORDEM SUPERIOR 7
T : Rm × Rm → Rn tal que T (u, v) = (T · u) · v. Isto nos per-mite considerar a derivada segunda de f em x como sendo uma
transformação bilinear, f (x) : Rm × Rm → Rn.As derivadas de ordem superior podem ser definidas indutiva-
mente. Se f : U ⊂ Rm → Rn é (k − 1)-vezes diferenciável em U ,então
f (k−1) : U → Lk−1(Rm,Rn)é uma aplicação de U no espaço das aplicações (k − 1)-lineares deRm em Rn.
Se f (k−1) for diferenciável no ponto x ∈ U , diremos que f ék-vezes diferenci´ avel neste ponto. O isomorfismo canônico
L(Rm, Lk−1(Rm,Rn) ≈ Lk(Rm,Rn)
permite considerar a derivada de f (k−1) em x como sendo umaaplicação k-linear de Rm em Rn. Se f (k)(x) existe em cada ponto
x ∈ U , define-se a aplicação f (k) : U → Lk(Rm,Rn), e se f (k) forcont́ınua diz-se que f é de classe C k ou k-vezes continuamente
diferenci´ avel , e escreve-se f ∈ C k ou f ∈ C k(U,Rn).O conjunto C k(U,Rn) de todas as aplicações f : U → Rn que
são k vezes continuamente diferenciáveis é um espaço vetorial real
(de dimensão infinita).
A importante classe C ∞ das aplicações infinitamente diferen-
ci´ aveis é a interseção de todas as classes C k
,
C ∞ = C 0 ∩ C 1 ∩ C 2 ∩ . . .
É claro que C ∞ ⊂ · · · ⊂ C k ⊂ C k−1 ⊂ · · · ⊂ C 1 ⊂ C 0.Pode-se mostrar que uma aplicação f : U → R é de classe C k se
existem, e são cont́ınuas em U , todas as derivadas parciais mistas
de f até a ordem k inclusive. (Vide 1.6 adiante.)
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8 [CAP. I: CÁLCULO DIFERENCIAL
4 Versão intŕınseca da regra da cadeia
Sejam U ⊂ Rm e V ⊂ Rn conjuntos abertos, f : U → Rnuma aplicação diferenciável no ponto x ∈ U , com f (U ) ⊂ V , eg : V → R p uma aplicação diferenciável no ponto y = f (x) ∈ V .Então a aplicação composta g◦f : U → R p é diferenciável no pontox e (g ◦ f )(x) = g (y) ◦ f (x) : Rm → R p.
É útil ter em mente os diagramas
U f g
V
g ◦ f (g ◦ f )(x)
f (x)R
pR
mR
pg(y)
Rn
Considerando as matrizes jacobianas de f , g e g ◦ f obtemos aantiga regra da cadeia,
∂ (gi ◦ f )∂x j
(x) =
nk=1
∂gi
∂yk(f (x)) · ∂f
k
∂x j (x),
1 ≤ i ≤ p1 ≤ j ≤ m
·
Aplicações
1) Seja f : U → Rn diferenciável em x0 ∈ U . Dado v ∈ Rm,seja λ : t → λ(t) um caminho em U , diferenciável em t = 0, comλ(0) = x0 e λ
(0) = v. Então f (x0) · v é o vetor-velocidade docaminho t → f (λ(t)) em t = 0.
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[SEC. 4: VERSÃO INTŔINSECA DA REGRA DA CADEIA 9
λ
Rn
t
0
U
v f f (x0)
f (λ(t))
f (x0) · v
λ(t)
x0
Rm
Figura 1.4.
2) Seja f : U → Rn diferenciável em x ∈ U ⊂ Rm e admitamos quef tem uma inversa g = f −1 : V → Rm, V ⊂ Rn, (isto é, f (U ) = V ,g(V ) = U , f ◦ g = idV e g ◦ f = idU ) que é diferenciável no pontoy = f (x). Então f (x) : Rm → Rn é um isomorfismo, cujo inversoé g(y) : Rn → Rm. Em particular m = n.
Um difeomorfismo f : U → V é uma bijeção diferenciável cujainversa é também diferenciável. Se ambas, f e f −1 são de classeC k, dizemos que f é um difeomorfismo de classe C k.
A aplicação t ∈ R → t3 ∈ R é exemplo de um homeomorfismodiferenciável C ∞ que não é um difeomorfismo.
Para finalizar, examinaremos as derivadas sucessivas da apli-
cação composta gf , onde g e f são r vezes direrenciáveis.
A regra da cadeia pode escrever-se, resumidamente, como
(1) (gf ) = g f · f .
Isto significa, evidentemente, que (gf )(x) = g (f (x)) · f (x), paracada x ∈ U , o ponto indicando composição de aplicações lineares.Observemos que, se L1 e L2 são lineares (e a composta L2 · L1 fazsentido), a aplicação (L1, L2)
→ L2
·L1 é bilinear. Resulta então
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10 [CAP. I: CÁLCULO DIFERENCIAL
da regra de derivação de aplicações bilineares, que (1) acarreta
(gf ) = (gf ) · f + gf · f .Usando a regra da cadeia:
(2) (gf ) = g f · (f , f ) + gf · f .
Na fórmula (2), usamos a notação B · (L1, L2), onde B é bilineare L1 , L2 são lineares, para indicar a aplicação bilinear (h, k) →
B(L1 · h, L2 · k). Observe-se que a aplicação (B, L1, L2) → B ·(L1, L2) é trilinear. Portanto, derivando (2), obtemos
(3) (gf ) = g f · (f , f , f ) + 3gf · (f , f ) + gf · f .
Na fórmula (3), se L, L1 , L2 , L3 são lineares, se B é bilinear e T é
trilinear, as notações T ·(L1, L2, L3) e T ·(B, L) indicam respectiva-mente as aplicações trilineares (h1, h2, h3) → T (L1 · h1, L2 · h2, L3 ·h3) e (h1, h2, h3) → T (B(h1, h2), L · h3). De maneira análoga, de-rivando (3), obteremos a fórmula para a 4a¯ derivada da composta
gf :
(gf )IV = g IVf · (f , f , f , f ) + 6gf · (f , f , f )(4)+ 4gf · (f , f ) + 3gf · (f , f ) + gf · f IV.
As notações são análogas às anteriores. De um modo geral, uma
indução fácil permite constatar que, dado i, para cada partiçãoi1 + · · · + ik = i, existe um inteiro n(i1, . . . , ik) tal que a i-ésimaderivada da aplicação composta gf tem a expessão seguinte:
(g ◦ f )(i) =i
k=1
n(i1, . . . , ik)gkf · f (i1), . . . , f (ik)
onde, para cada k, temos i1 +
· · ·+ ik = i.
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[SEC. 5: A DESIGUALDADE DO VALOR MÉDIO 11
5 A desigualdade do valor médio
Se x, y ∈ Rm, indiquemos por
[x, y] = {x + t(y − x); 0 ≤ t ≤ 1}
o segmento de reta fechado ligando x e y. O correspondente seg-
mento de reta aberto é
(x, y) ={
x + t(y−
x); 0 < t
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12 [CAP. I: CÁLCULO DIFERENCIAL
O quociente de |f (x + h) − f (x)| por |h| não excede
M = sup0≤t≤1
|f (x + th)|.
Seja U ⊂ Rm aberto. Uma aplicação diferenciável f : U → Rndiz-se uniformemente diferenci´ avel no conjunto X ⊂ U quandopara todo ε > 0 existe δ > 0 tal que
|h
| < δ implica
|f (x + h)
−f (x) − f (x) · h| < ε · |h|, seja qual for x ∈ X .É uma conseqüência da desigualdade do valor médio que se
K ⊂ U é compacto, então toda aplicação f : U → Rn, de classeC 1, é uniformemente diferenciável em K . (Vide AERn, pag. 28.)
Como aplicação deste fato, temos a proposição abaixo. (Vide
AERn, pag. 31, Exerćıcio 3.)
Proposição. Seja f : U → Rn de classe C 1 num aberto U ⊂Rm. Se f (x) : Rm → Rn é injetiva em todos os pontos x de um
compacto K ⊂ U , ent˜ ao existem n´ umeros reais c > 0 e δ > 0 tais que |f (y) − f (x)| ≥ c|y − x| quaisquer que sejam x ∈ K , y ∈ U com |g − x| ≤ δ .
Demonstração: Definamos λ : K ×
S m−
1
→ R pondo
λ(x, u) = |f (x) · u|. Como λ > 0 em todos os pontos do conjuntocompacto K × S m−1, existe c > 0 tal que λ(x, u) ≥ 2c, sejamquais forem x ∈ K , u ∈ S m−1. Dáı resulta que |f (x) · h| ≥ 2c · |h|para todo x ∈ K e todo h ∈ Rm. Ora, sendo f uniformementediferenciável em K , existe δ > 0 tal que |h|
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[SEC. 6: DERIVADAS PARCIAIS 13
|f (y) − f (x)|= |f (x) · (y − x) + f (y) − f (x) − f (x) · (y − x)|≥ |f (x) · (y − x)| − |f (y) − f (x) − f (x) · (y − x)|≥ 2c · |y − x − c|y − x| = c · |y − x|.
6 Derivadas parciais
Seja Rm = E ⊕ F o espaço euclidiano Rm, escrito como somadireta de dois subespaços E , F . Cada elemento z ∈ Rm é repre-sentado por um par z = (x, y), x ∈ E , y ∈ F .
Dados um aberto U ⊂ Rm e uma aplicação f : U → Rn, as de-rivadas parciais de f num ponto (a, b)
∈U são aplicações lineares
∂ 1f (a, b) : E → Rn, ∂ 2f (a, b) : F → Rn, definidas pelas relações
f (a + h, b) =f (a, b)+∂ 1f (a, b) · h+r1(h), com limh→0
r1(h)
|h| → 0
e
f (a, b + k) = f (a, b)+∂ 2f (a, b) · k+r2(k), com limh
→0
r2(k)
|k
| → 0.
Naturalmente, f pode possuir uma, ambas, ou nenhuma das deri-
vadas parciais em um ponto (a, b) ∈ U .A derivada parcial ∂ 1f (a, b), caso exista, é a derivada da apli-
caç˜ ao parcial x → f (x, b) no ponto a ∈ E , estando tal aplicaçãodefinida em um aberto de E contendo a. Analogamente, ∂ 2f (a, b)
é a derivada, em b
∈F , da aplicação parcial y
→f (a, y).
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14 [CAP. I: CÁLCULO DIFERENCIAL
É imediato ver que, se f : U → Rn é diferenciável no ponto z =(a, b)
∈U , então as derivadas parciais existem e ∂ 1f (z) = f
(z)
|E ,
∂ 2f (z) = f (z)|F . A rećıproca é falsa, como se aprende no cálculoelementar.
O teorema abaixo dá uma condição suficiente para diferencia-
bilidade em termos de derivadas parciais.
Teorema. Sejam U ⊂ Rm um aberto e Rm = E ⊕ F uma decom-posiç˜ ao em soma direta. Uma aplicaç˜ ao f : U
→ Rn é de classe
C 1 se, e somente se, para todo z = (x, y) ∈ Rm as derivadas par-ciais existem e, além disso, as aplicaç˜ oes ∂ 1f : U → L(E,Rn) e ∂ 2f : U → L(F, Rn) s˜ ao cont́ınuas.
No caso da decomposição usual Rm = E 1 ⊕ · · · ⊕ E m , ondecada E i é o subespaço unidimensional gerado pelo i-ésimo vetor
básico ei , para cada z = (x1, . . . , xm), identificamos ∂ if (z) com o
vetor
∂f
∂xi(x) = lim
t→0f (x1, . . . , xi + t , . . . , xm) − f (x1, . . . , xm)
t ·
Podemos então enunciar o
Corolário. Seja U ⊂ Rm
um aberto. Uma aplicaç˜ ao f : U → Rn
,f (z) = (f 1(z), . . . , f n(z)), é de classe C k se, e somente se, todas
as derivadas parciais mistas
∂ αf i
∂xi1 . . . ∂ xiα(z), z ∈ U, 1 ≤ i ≤ n, 1 ≤ i1, . . . , iα ≤ m
de ordem α ≤ k existem e dependem continuamente de z ∈ U .
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[SEC. 7: O TEOREMA DA FUNÇÃO INVERSA 15
7 O teorema da função inversa
Sejam U ⊂ Rm um aberto e f : U → Rm uma aplicaç˜ ao C k(1 ≤ k ≤ ∞) tal que, num ponto x0 ∈ U , a derivada f (x0) ∈L(Rm) é um isomorfismo. Ent˜ ao f aplica difeomorficamente uma vizinhança menor V de x0 sobre uma vizinhança W de f (x0).
x
Rn
Rm
V
U f (V ) = W
Figura 1.6.
Deve-se lembrar sempre que se f : U → V é um difeomorfismoentão, para todo x ∈ U , f (x) : Rm → Rm é um isomorfismo, maso Teorema da Função Inversa não é uma rećıproca completa deste
fato. Ele permite apenas concluir que se f ∈ C k (k ≥ 1) e f (x)é um isomorfismo para todo x ∈ U , então f é um difeomorfismolocal , isto é, cada x ∈ U tem uma vizinhança aplicada por f difeo-morficamente sobre uma vizinhança de f (x).
A aplicação f : R2 → R2, definida por f (z) = ez, fornece umexemplo de difeomorfismo local C ∞ que não é globalmente umdifeomorfismo.
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16 [CAP. I: CÁLCULO DIFERENCIAL
O teorema da função inversa evidencia o fato de ser f (x0) uma“boa aproximação” de f , pois a informação de que f (x0) é um
isomorfismo acarreta ser f biuńıvoca em uma vizinhança de x0 .
8 A forma local das submersões e o teorema
das funções impĺıcitas
Seja U
⊂ R
m+n um aberto. Uma aplicação diferencíavel
f : U → Rn chama-se uma submers˜ ao quando, para todo x ∈ U , aderivada f (x) : Rm+n → Rn é sobrejetora. O exemplo t́ıpico é aprojeção
π : Rm+n = Rm × Rn → Rn(x, y) → y.
Com relação ao teorema abaixo, lembramos que, dada umatransformação linear sobrejetora T : Rm+n → Rn, se tomamos
E = núcleo de T e
F = qualquer subespaço suplementar de E em Rm+n então,
necessariamente, a restrição
T
|F : F
→Rn é um isomorfismo.
Teorema (forma local das submersões). Sejam U ⊂ Rm+n um aberto e f : U → Rn uma aplicaç˜ ao de classe C k, k ≥ 1. Suponha que, no ponto z0 ∈ U , a derivada f (z0) : Rm+n → Rn é sobreje-tora. Escolhida uma decomposiç˜ ao em soma direta E ⊕F = Rm+n(z0 = (x0, y0)) tal que ∂ 2f (z0) = f (z0)|F é um isomorfismo, ent˜ aof se comporta localmente como uma projeç˜ ao. Com isto queremos
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[SEC. 8: FORMA DAS SUBMERSÕES E O TEOREMA DAS FUNÇ ÕES 17
dizer que existem abertos V , W , Z , com
x0 ∈ V, V ⊂ E,z0 ∈ Z, Z ⊂ U,f (z0) ∈ W, W ⊂ Rn,
e um difeomorfismo de classe C k, h : V × W → Z tal que f ◦h : (x, w) → w.
Convém ter em mente a Figura 1.7, que põe em relevo o caráter
geométrico do difeomorfismo h:
c = f (z0)
W
Rn
(x0, c)
(x, c)
x0
f
V × W h
π = f ◦ h : (x,w) → w
x V E
Z U
z0
ξ(x, c)
Figura 1.7.
Fazendo uso do teorema da função inversa podemos demons-
trar rapidamente a forma local das submersões, como se segue:
Seja ϕ : U → E × Rn de classe C k, definida por ϕ(x, y) =(x, f (x, y)). A derivada ϕ(z0) : Rm+n → E × Rn é dada pelafórmula (h, k) → (h, ∂ 1f (z0)·h+∂ 2f (z0)·k), h ∈ E , k ∈ F . Obser-vemos que a aplicação linear (u, v)
→ (u, (∂ 2f (z0))−1
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18 [CAP. I: CÁLCULO DIFERENCIAL
(v − ∂ 1f (z0) · u)), u ∈ E , v ∈ Rn, é a inversa de ϕ(z0) e ganhemoso direito de aplicar o teorema da função inversa. Se escrevemos
f (z0) = c, ϕ é um difeomorfismo de classe C k de uma vizinhançade z0 sobre uma vizinhança de (x0, c). Esta última pode ser esco-
lhida na forma V × W , onde V é aberto em E e W é aberto emRn. Ponhamos
Z = ϕ−1(V × W ) e ϕ−1 : V × W → Z.Resta examinar o aspecto da composta f ◦ h.Como ϕ(x, y) = (x, f (x, y)) segue-se que h = ϕ−1 é da formah(x, w) = (x, h2(x, w)). Se (x, w) ∈ V × W , então
(x, w) = ϕ ◦ h(x, w)= ϕ(x, h2(x, w))
= (x, f (x, h2(x, w)))
= (x, f ◦ h(x, w)).Logo f ◦ h(x, w) = w, para todo (x, y) ∈ V × W .Corolário. Uma submers˜ ao de classe C k (k ≥ 1) é uma aplicaç˜ aoaberta.
Observações:
1) Pode parecer estranho aplicar o teorema da função inversa a
ϕ : U
⊂Rm+n
→E
×Rn pois E
×Rn não é um espaço euclidiano.
O leitor está convidado a justificar esta passagem.
2) Da relação f ◦ h = π : V × W → W resulta que a derivadaf ( p) é sobrejetora para todo p ∈ Z . Assim o conjunto dos pontos p ∈ Rm+n tais que f ( p) é sobrejetora é aberto.3) A decomposição em soma direta Rm+n = E ⊕F pode ser sempretomada com E e F gerados pelos eixos coordenados. É o que
faremos doravante em todas as aplicações. Com efeito:
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[SEC. 8: FORMA DAS SUBMERSÕES E O TEOREMA DAS FUNÇ ÕES 19
Uma decomposiç˜ ao em soma direta do tipo Rm+n = Rm⊕Rn si-gnifica uma partição
{e1, . . . , em+n
}=
{ei1 , . . . , eim
}∪{e j1 , . . . , e jn
}da base canônica do Rm+n. Dada a partição, pomos Rm ⊂ Rm+ncomo sendo subespaço gerado por {ei1, . . . , eim} e Rn ⊂ Rm+ncomo o subespaço gerado pelos vetores restantes {e j1 , . . . , e jn}. Éóbvio que Rm+n é a soma direta desses dois subespaços e escreve-
mos Rm+n = Rm ⊕ Rn.Uma vez dada tal decomposição, escrevemos os elementos de
Rm+n como pares z = (x, y), x
∈Rm e y
∈Rn. Por exemplo, seja
R3 = R2 ⊕R, onde R2 é gerado por e1, e3 e R por e2 . Então todoz = (x1, x2, x3) será denotado por z = (u, v), u = (x1, 0, x3) ∈ R2e v = (0, x2, 0) ∈ R.
Dada uma aplicação linear sobrejetora T : Rm+n → Rn, e-xiste uma decomposição Rm+n = R ⊕ Rn tal que T |Rn : Rn →Rn é um isomorfismo. Basta observar que os vetores T e1, . . . ,
T em+n geram Rn e portanto é posśıvel selecionar dentre eles uma
base {T e j1 , . . . , T e jn}. Sejam i1, . . . , im os ı́ndices restantes. Apartição {1, 2, . . . , m + n} = {i1, . . . , im} ∪ { j1, . . . , jn} fornece adecomposição desejada.
4) Na demonstração do teorema surgem fatos importantes,
que devemos destacar: o difeomorfismo h é da forma h(x, w) =
(x, h2(x, w)), x ∈ V , w ∈ W . Isto significa que as “fibras” {x}×W são movimentadas apenas no sentido vertical, como aparece na
Figura 1.7. Outra novidade aparece se consideramos a aplicação
ξ = ξ 0 : V → F , ξ (x) = h2(x, c), de classe C k. Observemos quef (x, ξ (x)) = c para todo x ∈ V . Por outro lado, se (x, y) ∈ Z é tal que f (x, y) = c, então (x, y) = h ◦ ϕ(x, y) = h(x, c) =(x, h2(x, c) ) = (x, ξ (x)), ou seja, y = ξ (x). Este fato é o im-
portante teorema das funç˜ oes implı́citas , que pode ser sintetizado
na seguinte afirmação:
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20 [CAP. I: CÁLCULO DIFERENCIAL
O conjunto f −1(c)∩Z é o gr ́afico da aplicaç˜ ao x ∈ V → ξ (x) =h2(x, c)
∈F , de classe C k.
Em outras palavras, a equação f (x, y) = c define, implicitamente,
na vizinhança de x0 , a aplicação y = ξ (x), de classe C k cuja
derivada é dada por
ξ (x) = −∂ 2f (x, ξ (x))−1 ◦ ∂ 1f (x, ξ (x)).O parâmetro c pode variar no aberto W . Conclui-se que
existem abertos V ⊂ E , contendo x0 , W ⊂ Rn contendo c eZ ⊂ U contendo z0 tais que para cada y ∈ W e para cada x ∈ vexiste um único ξ (x, y) = h2(x, y) ∈ F tal que (x, ξ (x, y)) ∈ Z e f (x, ξ (x, y)) = y. Tal situação fica também evidente na Figura
1.7.
Veremos no Caṕıtulo II que o conjunto f −1(c) ∩ Z é uma su-perf́ıcie m-dimensional de classe C k no Rm+n (seção 2.5.2).
9 A forma local das imersões
Seja U ⊂ Rm um aberto. Uma aplicação diferenciável f : U →Rm+n chama-se uma imers˜ ao quando, para cada x ∈ U , a deri-
vada f (x) : Rm → Rm+n é uma transformação linear injetora. Oexemplo t́ıpico é a inclusão
i : Rm → Rm × Rn = Rm+n, x → (x, 0).
Teorema (forma local das imersões). Sejam U ⊂ Rm um abertoe f : U → Rm+n uma aplicaç˜ ao de classe C k, k ≥ 1. Suponha que no ponto x0 ∈ U a derivada f (x0) : Rm → Rm+n é injetora.Ent˜ ao f se comporta localmente como uma inclus˜ ao. Com isto
queremos dizer que existem abertos V , W , Z , com
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[SEC. 9: A FORMA LOCAL DAS IMERSÕES 21
f (x0) ∈ Z, Z ⊂ Rm+n,x0
∈V, V
⊂U
⊂Rm,
0 ∈ W, W ⊂ Rn,e um difeomorfismo de classe C k, h : Z → V ×W , tal que h◦f (x) =(x, 0), para cada x ∈ V .
A Figura 1.8, que corresponde a m = n = 1, indica geometri-
camente a situação geral. Convém entendê-la bem.
h
V
U ⊂ Rmx0
V i = h ◦ f 0
W ⊂ Rn
π
x0
(x0, 0)
F
ξ
Z
f(x )
f E = f (x0) · R
m
Figura 1.8.
Demonstração: Seja E = f (x
0)·Rm e escolhamos para F qual-
quer suplementar de E em Rm+n, ou seja, Rm+1 = E ⊕ F . De-finamos a aplicação de classe C k, ϕ : U × F → Rm+n, dada porϕ(x, y) = f (x) + y. Então ϕ(x0, 0) = f (x0) e, se (u, v) ∈ Rm × F ,temos ϕ(x0, 0) ·(u, v) = f (x0) ·u +v. É imediato ver que ϕ(x0, 0)é um isomorfismo. Pelo teorema da função inversa, ϕ é um difeo-
morfismo de classe C k de uma vizinhança de (x0, 0) sobre uma vi-
zinhança de f (x0). Podemos escolher a primeira da forma V
×W ,
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22 [CAP. I: CÁLCULO DIFERENCIAL
com x0 ∈ V ⊂ U e 0 ∈ W ⊂ F , e escrever Z = ϕ(V × W ).Seja h = ϕ−1 : Z
→ V
×W . Como ϕ(x, 0) = f (x), segue-se que
h ◦ f (x) = h ◦ ϕ(x, 0) = (x, 0), x ∈ V .Para concluir, identificamos F com Rn (escolhendo uma base para
F ) a fim de simplificar o enunciado do teorema.
Observação: Se π : V × W → V , π(x, w) = x, é a primeiraprojeção, então ξ = π ◦ h : Z → V goza da propriedadeξ ◦ f (x) = π ◦ h ◦ f (x) = π(x, 0) = x. Portanto ξ |f (V ) = (f |V )−1.Conclusão: f é um homeomorfismo de V sobre f (V ) cujo inverso
é a restrição a f (V ) da aplicação ξ : Z → V de classe C k. Estaobservação será de importância no futuro.
A interpretação intuitiva de uma imersão f : U → Rm+n (k ≥1) é a seguinte: para cada conjunto aberto suficientemente pe-
queno V ⊂ U ⊂ Rm, f (V ) é uma “superf́ıcie m-dimensional noRm+n ” dotada de um “plano tangente” f (x)+f (x) ·Rm em cada
ponto f (x) ∈ f (V ). Este plano varia continuamente com x ∈ V .Esta interpretação geométrica das imersões será desenvolvida nopróximo caṕıtulo.
10 O teorema do posto
O posto de uma aplicação linear T : Rm → Rn é a dimensão desua imagem T ·Rm, isto é, o número máximo de vetores linearmenteindependentes entre T e
1, . . . , T e
m . O posto de T é igual a r
(ρ(T ) = r) se, e somente se, a matriz de T (relativamente às bases
canônicas de Rm e Rn, por exemplo) tem um determinante menor
r × r não nulo e todo determinante menor de ordem r + 1 é nulo.O posto de uma aplicaç˜ ao diferenci´ avel f : U ⊂ Rm → Rn num
ponto x ∈ U é, por definição, o posto de sua derivada f (x) : Rm →Rn. Por exemplo, uma submersão f : U → Rn tem posto n em
todo ponto x
∈U . Analogamente, uma imersão f : U
⊂Rm
→Rn
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[SEC. 10: O TEOREMA DO POSTO 23
tem posto m em cada ponto. Por esta razão, as submersões e as
imersões são denominadas as aplicaç˜ oes de posto m´ aximo.
A aplicação que associa a cada x ∈ U o posto de f em x ésemi-cont́ınua inferiormente. Mais precisamente, se f tem posto r
num ponto x ∈ U , existe uma vizinhança V do ponto x tal que f tem posto ≥ r em todos os pontos de V . Com efeito, existe umdeterminante menor r × r não nulo da matriz jacobiana Jf (x).Por continuidade, este menor não se anula em uma vizinhança V
do ponto x, de modo que o posto de f é ≥ r em todos os pontosde V .
O teorema a ser demonstrado nesta seção estuda as aplicações
de posto constante. Cont́em, como casos particulares, as formas
locais das aplicações de posto máximo.
Lembramos que um subconjunto A de um espaço vetorial E é
convexo se, para cada par de pontos x, y ∈ A, o segmento de reta[x, y] está contido em A. Por exemplo, uma bola aberta Bδ(a), de
centro em a e raio δ , num espaço normado, é convexa. Realmente,
dados x, y ∈ Bδ(a) e 0 < t < 1, temos |[(1 − t)x + ty] − a| =|(1−t)(x−a)+t(y−a)| ≤ (1−t)|x−a|+t|y−a|
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24 [CAP. I: CÁLCULO DIFERENCIAL
E
A = V × W
W
F
B
V
Figura 1.9. Os conjuntos A e B são verticalmente convexos.
Lema 1. Seja U ⊂ Rm × Rn um aberto verticalmente convexo.Se f : U → R p tem segunda derivada parcial ∂ 2f identicamente nula em U ent˜ ao f é independente da segunda vari´ avel, isto é,
f (x, y) = f (x, y) para quaisquer (x, y) e (x, y) em U .
Demonstração: Dados (x, y) e (x, y) ∈ U , o caminhoϕ : [0, 1] → R p dado por ϕ(t) = f (x, (1−t)y+ty) está bem definidoe é diferenciável. Como ϕ(t) = ∂ 2f (u, (1 − t)y + ty) · (y − y) = 0para todo t ∈ [0, 1], resulta que ϕ é constante. Em particular,ϕ(0) = ϕ(1), ou seja f (x, y) = f (x, y).
Lema 2. Seja E ⊂ Rm+ p um subespaço m-dimensional. Existe uma decomposiç˜ ao em soma direta Rm+ p = Rm ⊕ R p tal que a primeira projeç˜ ao π : Rm+ p → Rm, π(u, v) = u, aplica E isomor-
ficamente sobre Rm.
Demonstração: Escolhamos uma base {u1, . . . , um} em E . Amenos que seja E = Rm+ p (isto é, p = 0) existe um vetor básico
e j1 ∈ Rm+ p − E . Então u1, . . . , um , e j1 são linearmente inde-pendentes e geram um subespaço E 1 ⊂ Rm+ p. A menos queE 1 = R
m+ p ( p = 1), existe um vetor básico e j2 ∈ Rm+ p − E 1 .Então u1, . . . , um , e j1 , e j2 são linearmente independentes. Pros-
seguindo o racioćınio, obteremos vetores básicos e j1 , . . . , e jp tais
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[SEC. 10: O TEOREMA DO POSTO 25
que {u1, . . . , um, e j1 , . . . , e jp} seja uma base do Rm+ p. Isto deter-mina as decomposições em soma direta Rm+ p = Rm
⊕R p = E
⊕R p.
A projeção π, relativa à primeira decomposição, transforma R p emzero, logo aplica E isomorficamente sobre Rm.
Teorema do Posto. Sejam U ⊂ Rm+n um aberto e f : U →Rm+ p uma aplicaç˜ ao de classe C k (k ≥ 1). Suponha que f tem
posto m em todos os pontos de U . Ent˜ ao, para todo z0 ∈ U existem difeomorfismos de classe C k
α, de um aberto do Rm
×Rn
sobre uma vizinhança de z0β, de uma vizinhança de f (z0) sobre um aberto em R
m × R p.tais que β ◦ f ◦ α : (x, y) → (x, 0)
βf (Z ) = V × 0
V × W ⊂ Rm × R p
(x0, 0) (x, 0)
βfα : (x,w) → (x, 0)
f
α
R p Z
f(Z )
f (z0)
β
V × W ⊂ Rm × Rn
f (U )
Rm
U ⊂ Rm+n
Z
(x, y)
(x0, y0)
z0
Figura 1.10.
Demonstração: Sejam z0 ∈ U , arbitrário, e E = f (z0) ·Rm+n ⊂Rm+ p. Pelo Lema 2 existe uma decomposição em soma direta
Rm+ p = Rm⊕R p cuja primeira projeção aplica E isomorficamente
sobre Rm. Então (π ◦ f )(z0) = π ◦ f (z0) : Rm+1 → Rm é sobre- jetora. Pela forma local das submersões existe um difeomorfismo
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26 [CAP. I: CÁLCULO DIFERENCIAL
α ∈ C k de um aberto V 0 ×W ⊂ Rm×Rn sobre uma vizinhança dez0 tal que πf α(x, y) = x. Isto significa que f α(x, y) = (x, λ(x, y))
onde λ : V 0 × W → R p é de classe C k.Afirmação: ∂ 2λ ≡ 0. Realmente, para cada ponto (x, y) ∈ V 0 × W tem-se
(f ◦ α) : (h, k) → (h, ∂ 1λ · h + ∂ 2λ · k), h ∈ Rm, k ∈ Rn.Segue-se que π ◦ (f α) : (h, k) → h. Se denotarmos por E xy aimagem da aplicação linear (f α)(x, y), levando em conta que
dim E xy = m concluiremos que π leva isomorficamente E xy sobreRm, para cada (x, y) ∈ V 0 × W . Se em algum ponto (x, y) a de-
rivada ∂ 2λ fosse não-nula, isto é, ∂ 2λ · k = 0 para algum k ∈ Rn,então (f α)(0, k) = (0, ∂ 2λ · k) = 0. Por conseguinte, π levaria umvetor não-nulo de E xy no zero, o que contradiz a condição de iso-
morfismo. Podemos supor que W é conexo. Pelo Lema 1 resulta
que λ(x, y) não depende de y.
Seja α(x0, y0) = z0 . Consideremos a injeção i : V 0 →
V 0×
W ,
dada por i(x) = (x, y0). Então f α(x, y) = f αi(x) = (x, λ(x, y0))
para todo (x, y) ∈ V 0 × W . Como f αi tem derivada injetora emx0 , podemos aplicar a forma local das imersões: existe um difeo-
morfismo β ∈ C k, de uma vizinhança de f (z0) sobre um abertoem Rm × R p tal que βfαi : x → (x, 0), x ∈ V ⊂ V 0 . (V é umavizinhança de x0 , possivelmente menor que V 0).
Finalmente, β
◦f
◦α(x, y) = β
◦f
◦α
◦i(x) = (x, 0), o que
conclui a demonstração.
Proposição. Sejam U ⊂ Rm um aberto e f : U → Rn de classe C 1. Para cada r = 0, 1, . . . , p ( p = min{m, n}), seja Ar o interior do conjunto dos pontos x ∈ U nos quais f tem posto r. Ent˜ aoA = A0 ∪ · · · ∪ A p é (aberto e ) denso em U .Demonstração: Seja V um subconjunto aberto não vazio de U .
Queremos mostrar que V
∩A
= ϕ. Consideremos um ponto x
∈V
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[SEC. 10: O TEOREMA DO POSTO 27
onde o posto de f assume seu valor máximo r0 em V . Como a
aplicação x
∈ U
→ ρ(f (x)) é semi-cont́ınua inferiormente, existe
uma vizinhança W ⊂ U de x na qual o posto de f é ≥ r0 . Então oposto de f é exatamente igual a r0 em todos os pontos de W ∩ V .Ou seja, ϕ = W ∩ V ⊂ Ar0 . Logo V ∩ A = ϕ.Corolário 1. Dada f : U → Rn de classe C 1, existe um subcon-
junto aberto denso A ⊂ U tal que o posto de f é constante em cada componente conexa de A.
A0
A1A2
A1
Figura 1.11.
Corolário 2. Seja U ⊂ Rm aberto. Se uma aplicaç˜ ao f : U → Rnde classe C 1 é 1 − 1, ent˜ ao m ≤ n e o conjunto dos pontos x ∈ U tais que f (x) : Rm → Rn é injetora é aberto e denso em U .Demonstração: Seja A = A0 ∪ · · ·∪A p, p = min{m, n}, como naproposição. Pelo teorema do posto, f não pode ser injetora em Ar,
a menos que r = m = p. Portanto m ≤ n e Ar = ϕ para r = m,de modo que A = Am. Isto demonstra o corolário, pois o conjunto
dos pontos x ∈ U tais que f (x) tem posto m é claramente aberto.Corolário 3. Seja U ⊂ Rm aberto. Se uma aplicaç˜ ao f : U → Rnde classe C 1 é aberta, ent ̃ao m ≥ n e o conjunto dos pontos x ∈ U tais que f (x) : Rm → Rn é sobrejetora é aberto e denso em U .
A demonstração é, mutatis mutandis, como a anterior.
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28 [CAP. I: CÁLCULO DIFERENCIAL
11 Campos de vetores em Rn
Seja U um subconjunto aberto em Rn. Um campo de vetores em U e simplesmente uma aplicação v : U → Rn. Se v ∈ C kdizemos que o campo de vetores é de classe C k.
Sejam p ∈ U e v : U → Rn um campo vetorial de classe C k.Chama-se curva integral do campo v, com condição inicial p, a um
caminho diferenciável λ : J → U , definido num intervalo abertocontendo 0 ∈ R, tal que λ(0) = p e λ(t) = v(λ(t)) para todo
t ∈ J .Visualizamos o campo v associando um vetor v(x) ∈ Rn a cadaponto x ∈ U . O vetor-velocidade de uma curva integral de v numdeterminado ponto é justamente o vetor associado a este ponto
pelo campo v.
xv(x)
U
Figura 1.12.
Consideraremos agora o teorema de existência e unicidade dascurvas integrais.
Teorema. Sejam U um subconjunto aberto do Rn e v : U → Rnum campo vetorial de classe C 1. Dado qualquer p ∈ U , existe uma curva integral λ : (−c, c) → U do campo v com condiç˜ ao inicial λ(0) = p. Se µ : (−ε, ε) → U for outra curva integral de v com µ(0) = p, ent˜ ao λ = µ num intervalo (
−δ, δ )
⊂(
−c, c)
∩(
−ε, ε).
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[SEC. 11: CAMPOS DE VETORES EM RN 29
Demonstração: Seja B uma bola fechada de centro p, na qual
as normas
|v
| e
|v
| são limitadas por uma constante k > 0. Em
particular, x, y ∈ B implica |v(x) − f (y)| ≤ k|x − y|. Seja c umnúmero real positivo tal que o produto ck seja menor do que 1 e
do que o raio de B.
Consideremos o espaço métrico E , formado pelos caminhos
cont́ınuos λ : [−c, c] → B, com a métrica da convergência uniforme.Sabe-se que E é completo. Definamos uma aplicação f : E → E pondo, para cada λ ∈ E , f (λ) = µ, onde
µ(t) = p + t
0v(λ(s)) ds.
Note-se que |µ(t)− p| ≤ ck
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30 [CAP. I: CÁLCULO DIFERENCIAL
Logo λ é uma curva integral com origem em p. Dada qualquer
outra curva integral µ : (
−ε, ε)
→ U com µ(0) = p, podemos res-
tringir λ e µ a um intervalo [−δ, δ ] tal que δk
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Caṕıtulo II
Superf́ıcies nos EspaçosEuclidianos
A noção de superf́ıcie de dimensão m num espaço euclidiano
Rn (n ≥ m) é generalização direta dos objetos que econtramos
na geometria diferencial clássica – as curvas em R3 ou R2 quepossuem vetor tangente em cada ponto e as superf́ıcies em R3 que
possuem plano tangente em cada ponto.
1 Parametrizações
Seja U 0 um subconjunto aberto de Rm. Uma imersão de classe
C k, ϕ : U 0 → Rn, diz-se um mergulho de classe C k de U 0 em Rn,quando ϕ é um homeomorfismo de U 0 sobre ϕ(U 0).
Dizemos também que ϕ é uma parametrizaç˜ ao de classe C k e
dimensão m do subconjunto U = ϕ(U 0) ⊂ Rn.Em relação à injetividade de ϕ(x): Rm → Rn, lembremos que
as seguintes condições são equivalentes:
(i) ϕ(x) : Rm
→Rn é injetora.
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32 [CAP. II: SUPERF́ICIES NOS ESPAÇOS EUCLIDIANOS
(ii) ∂ϕ
∂x j(x) = ϕ(x) · e j , j = 1, . . . , m são vetores linearmente
independentes.
(iii) A matriz jacobiana n×m, J ϕ(x) =
∂ϕi
∂x j(x)
, tem posto m,
isto é, algum de seus determinates menores m ×m é distintode zero.
Rm
x0 e1
e2
U 0
Rn
∂ϕ
∂x2
ϕ∂ϕ
∂x1
U
x = ϕ(x0)
Figura 2.1.
Exemplos:
1) Parametrizações de dimensão 1.
Seja J um intervalo aberto de números reais. Um caminho de
classe C k, ϕ : J → Rn, é um mergulho se, e somente se, ϕ : J →ϕ(J ) é um homeomorfismo e o vetor velocidade ϕ(t) nunca seanula. Existem imersões biuńıvocas C ∞ de um intervalo abertodos reais em R2 que não são homeomorfismos sobre sua imagem.
Voltaremos a tratar do assunto posteriormente. A Figura 2.2 ilus-
tra esta situação:
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[SEC. 1: PARAMETRIZAÇ ÕES 33
R
ϕ
∞
∞
R2
R
ψ
Figura 2.2.
2) Parametrizações de dimensão 2 em R3.
Seja U 0 um subconjunto aberto em R2 e ϕ : U 0 → U = ϕ(U 0) ⊂R
3, ϕ(u, v) = (ϕ1(u, v), ϕ2(u, v), ϕ3(u, v)) uma parametrização de
classe C k.
O conjunto U = ϕ(U 0) é chamado uma superf́ıcie local . A
independência linear dos vetores
∂ϕ
∂u =
∂ϕ1
∂u ,
∂ϕ2
∂u ,
∂ϕ3
∂u e
∂ϕ
∂v =
∂ϕ1
∂v ,
∂ϕ2
∂v ,
∂ ϕ3
∂v é equivalente a ser não-nulo o produto vetorial n = n(u, v) =∂ϕ
∂u × ∂ϕ
∂v , chamado vetor normal a U no ponto ϕ(u, v).
R3
U 0
n(u, v)
∂ϕ∂u
∂ϕ∂v
ϕ(u, v)
U
R2
ϕ
Figura 2.3.
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34 [CAP. II: SUPERF́ICIES NOS ESPAÇOS EUCLIDIANOS
2 A noção de superf́ıcie
R
n
U
M
ϕ
U 0
Rm
p
Figura 2.4.
Definição: Uma superf́ıcie m-dimensional do Rn (de classe C k) é
um subconjunto não vazio
M = M m ⊂ Rn
no qual todo ponto p possui uma vizinhança aberta U dotada de
uma parametrização de classe C k e dimensão m.
O conjunto M tem a topologia induzida de Rn. Assim a vizi-
nhança U é a interseção de M com um conjunto aberto em Rn.
O número n − m é chamado a co-dimens˜ ao de M em Rn.Uma superf́ıcie de dimensão n no Rn+1 é denominada uma
hiperf́ıcie .
Uma superf́ıcie zero-dimensional em Rn é um conjunto de pon-
tos isolados. Uma superf́ıcie de dimensão n em Rn é um subcon-
junto aberto de Rn. Vemos assim que os casos extremos não têm
maior importância. Mais interessante é o exemplo abaixo.
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[SEC. 2: A NOÇÃO DE SUPERF́ICIE 35
y
S 2 ⊂ R3
x
z
Figura 2.5.
A esfera unit´ aria de dimens˜ ao n é o conjunto
S n = {y ∈ Rn+1; y, y = 1}.
S n é uma hiperf́ıcie compacta de classe C ∞ em Rn+1. Vamosmostrar que 2(n + 1) parametrizações são suficientes para cobrir
a esfera.
Para cada i = 1, 2, . . . , n + 1, ponhamos:
H +i = {y ∈ Rn+1; yi > 0} e H −i = {y ∈ Rn+1; yi 0} e U −i =H −i ∩S n = {y ∈S n | yi< 0}
são abertos em S n en+1i=1
(U +i ∪ U −i ) = S n. Cada uma destasvizinhanças U +i é dotada de uma parametrização de classe C
∞, asaber
ϕ±i : B →
U ±i ; i = 1, . . . , n + 1
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36 [CAP. II: SUPERF́ICIES NOS ESPAÇOS EUCLIDIANOS
x = (x1, . . . , xn) → (x1, . . . , xi−1, ±
1 = |x|2, xi, . . . , xn).
Estamos indicando com B a bola aberta de centro 0 e raio 1 em
Rn: B = {x ∈ Rn; |x| 0} e U −1 = {(x, y) ∈ R2; x
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[SEC. 3: MUDANÇA DE COORDENADAS 37
Rn
x = (x1, . . . , xm)
U 0
y = (y1, . . . , ym)
Rm
V 0
U
p
M
ψ
ξ
ϕ
Figura 2.6.
Mostremos agora que esta é a única maneira de obter novas
parametrizações de U .
Se ϕ : U 0 → U e ψ : V 0 → V são parametrizações em M taisque U ∩ V = ϕ, é evidente que a aplicação
ξ = ψ−1 ◦ ϕ : ϕ−1(U ∩ V ) → ψ−1(U ∩ V )é um homeomorfismo entre abertos do Rm.
ψU 0 U
V
ξ = ψ−1 ◦ ϕ
V 0
ϕM
Figura 2.7.
Mas não se pode concluir de imediato a diferenciabilidade de
ψ−1
◦ϕ, visto que ψ−1 não está definida num aberto do Rn. Para
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38 [CAP. II: SUPERF́ICIES NOS ESPAÇOS EUCLIDIANOS
contornar esta dificuldade, apresentamos o seguinte resultado, que
dá conta de uma situação um pouco mais geral.
Proposição 1. Sejam V 0 um subconjunto aberto do Rm e ψ : V 0 →
V uma parametrizaç˜ ao de classe C k do conjunto V ⊂ Rn. Dados U 0 ⊂ Rr, aberto, e f : U 0 → V ⊂ Rn de classe C k, ent˜ ao:
(i) a composta ψ−1 ◦ f : U 0 → V 0 ⊂ Rm é de classe C k
(ii) para x ∈ U 0 e z = ψ−1◦f (x) temos (ψ−1◦f )(x) = [ψ(z)]−1◦f (x).
Demonstração: (i) Como ψ : V 0 → V é uma imersão (injetora)C k, para cada ponto p ∈ V existem um aberto Z em Rn queo cont́em e uma aplicação de classe C k, g : Z → Rm, tal queg|(V ∩ Z ) = ψ−1 (v. observação da seção 9 do Cap. I).
Seja p um ponto arbitrário de f (U 0) ⊂ V . Então ψ−1 ◦ f =g ◦ f : f −1((U 0) ∩ Z ) ⊂ Rr → Rm. Resulta então que ψ−1 ◦ f é declasse C k, pois f e g o são.
x
U 0
Rr
Rn
p
z
Rm
ψ −1 ◦ f
V f
ψ
f (U 0)
V 0
Figura 2.8.
(ii) Ponha h = ψ−1 ◦ f e aplique a regra da cadeia à igualdadeψ
◦h = f .
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[SEC. 3: MUDANÇA DE COORDENADAS 39
Corolário. Sejam U 0 e V 0 subconjuntos abertos em Rm e ϕ : U 0 →
V , ψ : V 0
→ V parametrizaç˜ oes de classe C k do mesmo conjunto
V ⊂ Rn. Ent˜ ao a mudança de coordenadas ξ = ψ−1 ◦ ϕ é um difeomorfismo de classe C k.
O Corolário acima permite estender o conceito de aplicação
diferenciável, até agora só definido no caso em que o domı́nio era
um aberto do espaço euclidiano.
Seja M m ⊂ Rn uma superf́ıcie de classe C k. Diremos que umaaplicação f : M → Rs é diferenci´ avel num ponto p ∈ M quandoexiste uma parametrização ϕ : U 0 → U , de classe C k, com p ∈ U ,tal que f ◦ ϕ : U 0 → Rs é diferenciável no ponto p0 ∈ U 0 , ondeϕ( p0) = p. Segue-se da Proposição 1 que f ◦ψ = (f ◦ϕ)◦(ϕ−1 ◦ψ)é diferencíavel no ponto ϕ−1( p), seja qual for a parametrização ψ,de classe C k, de uma vizinhança de p. Esta definição não depende,
portanto, da parametrização ϕ escolhida.
Vê-se facilmente como estender à aplicação f : M m → Rs a
noção de classe C k
. Observa-se, porém, que tal noção tem sentidoapenas quando M é uma superfı́cie de classe C k. Do contrário,
f ◦ ϕ pode ser de classe C k para uma certa parametrização ϕ semque o seja para outras.
Se tivermos M m ⊂ Rr e N n ⊂ Rs superf́ıcies de classe C k,diremos que f : M → N é diferenci´ avel no ponto p ∈ M quando,considerada como aplicação de M em Rs, f for diferenciável
naquele ponto.
Analogamente se define f : M m → N n de classe C k: para cada p ∈ M deve existir uma parametrização ϕ : U 0 → U ⊂ M , declasse C k, com p ∈ U , tal que f ◦ ϕ : U 0 → N ⊂ Rs seja de classeC k. Pela Proposição 1, f ◦ ϕ ∈ C k seja qual for a parametrizaçãoϕ : U 0 → U , de classe C k, com p ∈ U .
Observemos o seguinte: a fim de que f : M → N seja de classe C k é necess ́ario e suficiente que, para todo p
∈ M existam para-
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40 [CAP. II: SUPERF́ICIES NOS ESPAÇOS EUCLIDIANOS
metrizaç˜ oes C k, ψ : V 0 → V ⊂ N e ϕ : U 0 → U ⊂ M , com p ∈ U ,f (U )
⊂V e tais que ψ−1
◦f
◦ϕ : U 0
→V 0
⊂Rn seja de classe C k.
p
N V
M
f ( p)
U f
ψ
ψ−1
◦ f ◦ ϕ
Rm
U 0
Rn
V 0
ϕ
Figura 2.9.
Demonstração: Seja f : M → N de classe C k. Dado p ∈ M ,tomemos uma parametrização ψ : V 0 → V ⊂ N de classe C k, comf ( p) ∈ V , V 0 ⊂ R
n
. Como f é cont́ınua, existe uma parame-trização ϕ : U 0 → U ⊂ M , com p ∈ U , tal que f (U ) ⊂ V . Pordefinição de f ∈ C k, vemos que f ◦ ϕ : U 0 → V ⊂ Rs e de classeC k. Em virtude da Proposição 1, segue-se que ψ−1 ◦ f ◦ ϕ : U 0 →V 0 ⊂ Rn é de classe C k. A rećıproca é deixada a cargo do leitor.
Corolário. Se f : M → N e g : N → P s˜ ao de classe C k ent˜ aog
◦f : M
→P é de classe C k.
Por exemplo, se M m ⊂ Rr é uma superf́ıcie de classe C k, entãoa aplicação da inclusão i : M m → Rr é de classe C k. Do mesmomodo, se M m ⊂ W , onde W é um aberto em Rr, a aplicação deinclusão i : M → W também é de classse C k. Se f : W → Rs forde classe C k, então a restrição f |M : M → Rs será de classe C k(estamos supondo M ∈ C k!) pois f |M = i ◦ f , logo podemosaplicar o Corolário.
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[SEC. 3: MUDANÇA DE COORDENADAS 41
Exemplo - (O ângulo como parâmetro em S 1.)
A aplicaç˜ ao exponencial de R em R2 é o homomorfismo do
grupo aditivo dos reais no grupo multiplicativo dos números com-
plexos, dado por
ξ : R → R2, t → eit = (cos t, sen t).
A exponencial ξ é uma imersão C ∞ não-injetora, pois ξ (t) =(− sen t, cos t) = 0 para todo t, e ξ (s) = ξ (t) se, e só se, s−t = 2kπ,k ∈
Z. Intuitivamente, ξ enrola a reta em torno de S 1, sem esticá-
la, no sentido anti-horário. O número t é uma determinação do
ângulo (em radianos) que ξ (t) ∈ S 1 faz com o semi-eixo positivodos x.
V 0
x
ξ(t)
t
t
U 0
R
ϕ
ξ
Figura 2.10.
Seja t ∈ R, arbitrário, porém fixo neste racioćınio. Seja ϕuma parametrização C
∞ de uma vizinhança de ξ (t)
∈ S 1, com
ϕ(x) = ξ (t) (ϕ pode ser uma das parametrizações anteriormente
construı́das). Como [ϕ−1 ◦ ξ ](t) = [ϕ(x)]−1 ◦ ξ (t) = 0, o teo-rema da função inversa garante que ϕ−1 ◦ ξ é um difeomorfismode uma vizinhança U 0 de t ∈ R sobre uma vizinhança V 0 de x ∈ R(Fig. 2.6). Conseqüentemente, ξ = ϕ ◦ (ϕ−1 ◦ ξ ) : U 0 → ξ (U 0) é umhomeomorfismo. Em outras palavras, a exponencial ξ : R → S 1é um homeomorfismo local. A conclusão é que em cada intervalo
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42 [CAP. II: SUPERF́ICIES NOS ESPAÇOS EUCLIDIANOS
aberto (a, b) ⊂ R com b − a ≤ 2π, a exponencial
ξ : (a, b) → S 1
é uma parametrização do ćırculo. Ela é geometricamente mais
significativa que as parametrizações ϕ±i descritas anteriormente.
0
ϕ
x
t
π
ξ
p = (cos t, sin t) =“x,√
1 − x2”
t (1, 0)(−1, 0)
ϕ−1 ◦ ξ : (0, π) → (−1, 1)
x 1-1 0
→ x = cos tt
Figura 2.11.
4 O espaço tangente
Uma caracteŕıstica importante das superf́ıcies diferenciáveis é
que elas possuem, em cada ponto, uma aproximação linear, que é
seu plano tangente.
Sejam M = M m ⊂ Rn uma superf́ıcie de dimensão m e classeC k (k ≥ 1). Seja ϕ : U 0 → U uma parametrização com p = ϕ(x) ∈M , x ∈ U 0 . O espaço tangente a M no ponto p é o espaço vetorialde dimensão m
T M p = ϕ(x)
·Rm.
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[SEC. 4: O ESPAÇO TANGENTE 43
Os vetores ∂ϕ
∂xi(x) = ϕ(x) · ei , i = 1, . . . , m formam uma base de
T M p .
Esta definição só terá utilidade se mostramos que o espaço
tangente em p independe da escolha da parametrização ϕ. Seja
ψ : V 0 → V uma outra parametrização em p. Seja ξ = ψ−1 ◦ϕ : ϕ−1(U ∩ V ) → ψ−1(U ∩ V ) a mudança de coordenadas, como p = ϕ(x) = ψ(z). Ora, ξ é difeomorfismo, logo ξ (x) · Rm = Rm.Finalmente, pela regra da cadeia, temos
ϕ(x) · Rm = ψ (z) · ξ (x) · Rm = ψ (z) · Rm.
U ∩ V
ϕ−1(U ∩ V ) ψ−1(U ∩ V )ξ
ϕ ψ
Rn
Rm
Rm
ξ(x)
ϕ(x) ψ
(z)
A proposição abaixo dá uma caracterização para T M p que é
bastante significativa por seu conteúdo geométrico:
Proposição 2. Os elementos de T M p s˜ ao os vetores-velocidade
em p dos caminhos diferenci´ aveis contidos em M que passam por
p. Mais precisamente ,
T M p=
{v =λ(0); λ : (
−ε, ε)
→M
⊂Rn diferenci´ avel, λ(0)= p
}.
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44 [CAP. II: SUPERF́ICIES NOS ESPAÇOS EUCLIDIANOS
Demonstração: Seja v ∈ T M p . Por definição do espaço tangenteT M p , existe uma parametrização ϕ : U 0
→ U com ϕ(x) = ϕ tal
que
v = ϕ(x) · u = limt→0
ϕ(x + tu) − ϕ(x)t
, u ∈ Rm.Escolhendo ε > 0 suficientemente pequeno, a imagem do caminho
t ∈ (−ε, ε) → x + tu ∈ Rm está toda contida em U 0 . Assim v éo vetor velocidade em t = 0 do caminho em M , λ(t) = ϕ(x + tu),
λ(0) = p.
Por outro lado, seja λ : (−
ε, ε)→
M um caminho diferenciável
com λ(0) = p. Consideremos uma qualquer parametrização
ϕ : U 0 → U tal que p ∈ U . Podemos supor, sem perda de ge-neralidade, que λ(t) ∈ U para todo t ∈ (−ε, ε). Então, pela Pro-posição 1, o caminho ϕ−1◦λ : (−ε, ε) → U 0 ⊂ Rm é diferencíavel e,escrevendo u = (ϕ−1 ◦λ)(0), temos u = [ϕ(x)]−1 ·λ(0). Portantoλ(0) = ϕ(x) · u, como queŕıamos demonstrar.
O espaço vetorial tangente T M p é um subespaço vetorial de Rm
e, por conseguinte, passa pela origem. Nas ilustrações geométricas,
porém, sempre desenhamos a variedade afim tangente p+T M p que
e paralela a T M p e passa por p.
p
M
p + TM p
Figura 2.12.
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[SEC. 4: O ESPAÇO TANGENTE 45
O espaço tangente em um ponto de uma superf́ıcie de dimensão
zero consiste apenas do vetor zero. O espaço tangente T U p a uma
superf́ıcie de dimensão n, U ⊂ Rn, é igual a todo o Rn.O espaço tangente (T S n) p à esfera unitária S
n consiste em
todos os vetores v ∈ Rn+1 que são perpendiculares a p. De fato,
p⊥ = {v ∈ Rn+1; v, p = 0}
é um subespaço vetorial de dimensão n do Rn+1. Além disso,
se v
∈ (T S n) p , então v = λ(0), onde λ : (
−ε, ε)
→ S n é um
caminho diferenciável com λ(0) = p. Diferenciando a identidadeλ(t), λ(t) = 1, obtemos
2λ(t), λ(t) = 0,
e, pondo t = 0, vem v, p = 0. Portanto (T S n) p ⊂ p⊥. Como oespaço tangente a S n em p tem dimensão n, resulta que
(T S n) p = p⊥.
Terminamos esta seção definindo o referencial móvel associado
a uma parametrização.
Sejam M = M m uma superf́ıcie de classe C k em Rn, e ϕ : U 0 →U ⊂ M uma parametrização em M . Denominamos referencialmóvel associado a ϕ no ponto p = ϕ(x) ao conjunto
Bϕ(x) = ∂ϕ∂x1
(x), . . . , ∂ϕ∂xm
(x)base do espaço tangente a M no ponto p. Um vetor tangente
v ∈ T M p se escreve da forma v =
αi∂ϕ
∂xi(x). Consideremos o
problema de determinar as coordenadas de v com respeito a uma
nova base Bψ(y), originada de outra parametrização ψ : V 0 → V tal que ψ(y) = p.
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46 [CAP. II: SUPERF́ICIES NOS ESPAÇOS EUCLIDIANOS
Seja ξ a mudança de coordenadas, isto é,
ϕ[ϕ−1(U ∩ V )] = ψ ◦ ξ.Então
ϕ(x) = ψ (y) · ξ (x) (regra da cadeia) e
∂ϕ
∂x j(x) = ϕ(x) · e j = ψ (y) · (ξ (x) · e j)
= ψ (y) ·i∂ξ i
∂x j (x) · ei
=i
∂ξ j
∂x j(x) · ψ(y) · ei
=i
∂ξ i
∂x j(x) · ∂ψ
∂yi(x).
A relação acima mostra que a matriz de passagem da base
Bψ(x)
para a base Bψ(y) de T M p é a matriz jacobiana de ξ no ponto x.Podemos resumir tudo isto nas equações
v =
αi∂ϕ
∂xi(x) =
β i
∂ψ
∂yi(y)
β i = j
∂ξ i
∂x j(x) · α j .
5 Como obter superf́ıcies
Seja M um subconjunto de Rn. Se queremos mostrar que
M é uma superf́ıcie, é necessário obtermos parametrizações de
vizinhanças de todos os pontos de M ; esta tarefa, requerida pela
definição, pode vir a ser trabalhosa. Nesta seção apresentamos
outras maneiras de se obterem superf́ıcies.
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[SEC. 5: COMO OBTER SUPERF́ICIES 47
5.1 O gráfico de uma aplicação C k.
Sejam U
⊂ Rm aberto e f : U
→ Rn uma aplicação de classe
C k. Então o gráfico de f ,
G(f ) = {(x, f (x)); x ∈ U }
é uma superf́ıcie de dimensão m e classe C k no Rm+n.
Realmente, ϕ : U → G(f ), ϕ(x) = (x, f (x)), é uma parame-trização de todo o conjunto G(f ).
´E claro que nem toda superf́ıcie é um gráfico: a esfera S
n
, porexemplo, não o é. Generalizando, nenhuma superf́ıcie compacta
pode ser, globalmente, um gráfico.
Localmente, toda superf́ıcie de classe C k é o gráfico de uma
aplicação da mesma classe. Provemos isto.
Proposição 3. Seja M m ⊂ Rn uma superf́ıcie de classe C k.Ent˜ ao todo ponto p ∈ M possui uma vizinhança V , parametrizada por uma aplicaç˜ ao de classe C
k
ψ : V 0 → V , da forma ψ(y) =(y, f (y)), y ∈ V 0 ⊂ Rm.Demonstração: Seja ϕ : U 0 ⊂ Rm → U ⊂ M uma parame-trização de uma vizinhança U de p = ϕ(x). Escolhamos uma
decomposição Rn = Rm ⊕ Rn−m de tal modo que a primeiraprojeção π : Rn → Rm leve T M p isomorficamente sobre Rm (Lema2, seção 10 do Cap. I). Seja η = π ◦ ϕ : U 0 ⊂ Rm → Rm.Então η(x) = π ◦ ϕ(x) : R
m
→ Rm
é um isomorfismo. Peloteorema da função inversa, η é um difeomorfismo C k de uma vi-
zinhança menor, U 1 x, sobre uma vizinhança V 0 π( p). Indi-quemos com ξ = η−1 : V 0 → U 1 o difeomorfismo inverso. Entãoψ = ϕ ◦ ξ : V 0 ⊂ Rm → V = ψ(v0) ⊂ Rn é uma nova parame-trização de uma vizinhança de p. Da relação
π
◦ψ = π
◦(ϕ
◦ξ ) = (π
◦ϕ)
◦ξ = η
◦ξ = idV 0
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48 [CAP. II: SUPERF́ICIES NOS ESPAÇOS EUCLIDIANOS
segue-se que a primeira coordenada de ψ(y), relativa à decom-
posição Rn = Rm
⊕Rn−m, é y. Chamemos f (y) a segunda co-
ordenada. Então ψ(y) = (y, f (y)), y ∈ V 0 . Nota-se que ψ =(π|V )−1 : V 0 → V , isto é, a parametrização que faz de V um gráifcoé simplesmente a inversa local da projeção π : Rm ⊕ Rn−m → Rmque leva T M p sobre R
m isomorficamente.
η
M
p
V
U 0 V 0
U 1
π
ϕ
x
ξ
T M p
Figura 2.13.
5.2 Superf́ıcies definidas implicitamente.
Seja f : R3
→ R dada por f (x,y,z) = x2 + y2 + z 2. Então
f ∈ C ∞, e a esfera unitária S 2 fica definida implicitamente pelaequação f (x,y,z) = 1. Se g(x,y ,z) = x2 + y2 − z2, então g−1(c) éuma superf́ıcie de classe C ∞ para cada c = 0 (um hiperbolóide deuma folha para c > 0, um hiperbolóide de duas folhas para c
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[SEC. 5: COMO OBTER SUPERF́ICIES 49
g−1(0) é homeomorfa a um aberto do R2. Logo g−1(0) não é umasuperf́ıcie.
O teorema abaixo dá condições suficientes para que a equação
f (x) = c defina uma superf́ıcie.
Proposição 4. Sejam U ⊂ Rm+n aberto e f : U → Rn uma aplicaç˜ ao de classe C k. Seja c ∈ Rn. Consideremos o conjunto
M = { p ∈ U.f ( p) = c e f ( p) : Rm+n → Rn é sobrejetora }
Ent˜ ao
(i) M é aberto em f −1(c).
(ii) Supondo que M é n ̃ao vazio, M é superf́ıcie de dimens ̃ao me classe Ck do Rm+n, e
(iii) (T M ) p = Ker f ( p) para todo p ∈ M .
Demonstração: (i) imediato. (ii) Seja p ∈ M .Pelo teorema as funções impĺıcitas (seção 8 do Cap. I), existem
uma decomposição Rm+n = Rm⊕Rn com p = (x0, y0), vizinhanças p ∈ Z ⊂ Rm+n, x0 ∈ V ⊂ Rm, e uma aplicação ξ : V → Rn, declasse C k, tal que G(ξ ) = Z ∩ f −1(c). Assim ϕ : V → Z ∩ f −1(c),dada por ϕ(x) = (x, ξ (x)) é uma parametrização de classe C k de
uma vizinhança aberta de p ∈ f −1(c). Pela Observação 2, seção8 do Cap. I, vem Z ∩ f −1(c) ⊂ M , o que conclui a demonstraçãode (ii).
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Rm
ϕ
V
M f
Rn
c p
Rn
U
Z
Figura 2.14.
(iii) Seja v ∈ T M p . Consideremos um caminho λ : (−ε, ε) → M tal que λ(0) = p e λ(0) = v. Então f ( p) · v = f (λ(0)), λ(0) =(f ◦λ)(0) = 0, pois f ◦λ é constante (= c). Portanto v ∈ Ker f ( p).Como T M p e Ker f
( p) são subespaços m-dimensionais do Rm+n
e T M p ⊂ Ker f ( p) segue-se que T M p = Ker f ( p).Observações:
1) Sejam U ⊂ Rm aberto e f : U Rn uma aplicação diferenciável.Um ponto c ∈ Rn chama-se valor regular de f quando, para cadax ∈ U tal que f (x) = c, a derivada f (x) : Rm → Rn é umatransformação linear sobrejetiva.
Se não existe x ∈ U tal que f (x) = c então c é trivialmente umvalor regular de f . Quando n = 1, o funcional linear f
(x) : Rm
→R ou é zero ou é sobrejetiva. Neste caso o número real c é valorregular de f se, e somente se, f (x) = 0 para todo x ∈ f −1(c).
Por exemplo, seja f : R3 → R dada por f (x,y ,z) = x2 +y2−z2.Representando por (dx,dy,dz) a base canônica de (R3)∗, entãof (x,y,z) = 2x dx + 2y dy − 2z dz. Segue-se que f (x,y,z) = 0somente para x = y = z = 0; como f (0, 0, 0) = 0, vemos que
0
∈R é o único valor não-regular de f .
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[SEC. 5: COMO OBTER SUPERF́ICIES 51
O teorema que acabamos de provar se reescreve da seguinte
maneira, tendo em vista a definição de valor regular:
Teorema 1. Sejam U ⊂ Rn aberto e f : U → Rn−m de classe C k,k ≥ 1. Se c ∈ Rn−m é um valor regular de f , ou bem f −1(c) é vazio ou bem é uma superf́ıcie m-dimensional de classe C k em Rn.
Além disso, para cada p ∈ f −1(c), o espaço tangente T [f −1(c)] p é o n´ ucleo de f ( p) : Rn → Rn−m.
Observações:
2) A imagem inversa f −1(c) pode ser uma superf́ıcie sem que cseja um valor regular. Por exemplo, seja f : R2 → R dada porf (x, y) = y2. 0 ∈ R não é valor regular de f mas f −1(0) = eixodos x é uma superf́ıcie C ∞ de dimensão 1 em R2.
3) Mesmo quando c ∈ Rn não é valor regular de f : U → Rn,o primeiro enunciado do teorema garante que M = f −1(c) ∩
{ p
∈ U ; f ( p) é sobrejetiva
} é uma superf́ıcie. Convém notar que
M não é necessariamente denso em f −1(c). Por exemplo, sejaf : R2 → R dada por f (x, y) = x2y. Como f (x, y) = 2xy dx +x2 dy, f ( p) = 0 se, e só se, p está no eixo dos y.
Neste exemplo a imagem inversa de 0 ∈ R é a união dos eixoscoordenados x e y (não é superf́ıcie), enquanto que M consiste no
eixo dos x menos a origem.
Localmente, qualquer superf́ıcie M m