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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÁO PAULO
PUC-SP
ISA GABRIELA DE ALMEIDA STEFANO
Um novo método de ensino jurídico: a
aprendizagem baseada em problemas
MESTRADO EM DIREITO
São Paulo
2007
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÁO PAULO
PUC-SP
ISA GABRIELA DE ALMEIDA STEFANO
Um novo método de ensino jurídico: a
aprendizagem baseada em problemas
Mestrado em Direito do Estado
Dissertação apresentada à banca examinadora da
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo,
como exigência parcial para obtenção do título de
MESTRE em Direito Constitucional,, sob
orientação da Professora Doutora Maria Garcia
São Paulo
2007
Banca Examinadora
___________________________
___________________________
___________________________
São Paulo, ____ de _____________ de 2007.
AGRADECIMENTOS
Esse trabalho teve a participação de pessoas importantes sem as
quais ele não seria possível.
Agradeço aos meus pais por estarem presentes em todas as fases
de minha vida, dando suporte e amor, além de ensinarem os valores que
realmente importam na vida. Foi pelo incentivo de vocês que esse trabalho tornou-
se realidade.
À minha querida irmã e ao meu cunhado, que sempre me ouviram
e me socorreram nos momentos de aflição, bem como a querida prima Norma
Romano Santos, que abriu as portas de sua casa e me abrigou durante a época
em que eu viajava para estudar.
Na vida profissional sempre temos pessoas que nos guiam e são
mestres tanto pelos ensinamentos como pela atenção, carinho e motivação,
assim, sou grata ao Oswaldo Peregrina Rodrigues que sempre acreditou em meu
potencial e me deu oportunidades que colaboraram para meu crescimento.
À querida professora e orientadora Maria Garcia, que é um
exemplo de profissional do Direito e de vida acadêmica. Com sua paixão traz a
magia do conhecimento para os alunos, que saem de suas aulas com entusiasmo
de perceber que a todo instante o aprendizado está presente.
“A educação consiste em ensinar aos homens não
aquilo que devem pensar, e sim a pensar.”
Clavin Coolidee
“Meus alunos ficam consternados quando digo:
dentro de 10 anos, estará provado que metade do
que vocês aprenderam na faculdade de medicina
estava errado. E o problema é que nenhum dos
seus professores sabe qual é essa metade.”
Dr. Sydney Burwell, Diretor da Harvard Medical
School
RESUMO
A educação é a base da sociedade, pois somente através dela as
pessoas são capazes de evoluir, conviver em comunidade e desenvolver sua
capacidade física, moral e intelectual.
Nosso sistema de ensino jurídico é o mesmo há décadas e
atualmente demonstra que não é capaz de cumprir com suas finalidades, ante o
baixíssimo número de bacharéis aprovadas no exame da OAB para o exercício da
profissão de advogado.
O aprendizado deve decorrer da busca do aluno, e não de aulas
em que o professor já traz o conteúdo que será ministrado e o aluno anota e
decora, sem, muitas vezes, perceber a importância daquilo para a vida prática.
O ensino só será eficaz quando o aluno “aprender a aprender” e
puder visualizar a aplicabilidade daquele estudo para sua vida prática e social,
pois assim a busca pelo saber torna-se mais interessante e necessária.
Acreditamos que a aprendizagem baseada em problemas ensina
o aluno a buscar o conhecimento sem a necessidade da presença de um
especialista que repasse informações. Além disso, permite visualizar desde o
início como o estudo ali direcionado encontra-se presente na vida prática e social.
PALAVRAS- CHAVE: aprendizagem baseada em problemas - ensino de direito -
relação ensino-aprendizagem.
ABSTRACT
The education is the base of a society, therefore through it the
people are only capable to evolve, to coexist in society and to develop its physical,
moral and intellectual capacity.
Our system of legal education is the same has decades and
nowadays it demonstrates that it is not being capable to fulfill with its purposes,
before low number of people who are approved in the examination of the OAB to
exert the lawyer profession.
The learning must elapse of the search of the pupil and not
through lessons where the professor already brings the content that will be given
and the pupil writes down, decorates without, many times, to perceive the
importance of that for the practical life.
Education will only be efficient when the pupil to learn to learn and
will be able to visualize the applicability of that study for its practical and social life,
therefore the search for knowing becomes more interesting and necessary.
We believe that the learning based on problems makes possible
the pupil to learn to search the knowledge without the necessity of the presence of
a specialist who the view information, as well as, since the begginnig already to
visualize as the study directed there meets present in the practical and social life.
KEY- WORDS: problem based learning - law teaching - teaching learning relation.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO........................................................................................................ 1
1. EDUCAÇÃO E ESCOLA..................................................................................... 4
2. A IMPORTÂNCIA DA CONSTITUIÇÃO DE WEIMAR NA EDUCAÇÃO............ 17
2.1 SISTEMA EDUCACIONAL..................................................................... 20
3. A EDUCAÇÃO NO BRASIL................................................................................ 26
4. O ENSINO SUPERIOR E ALGUNS PROBLEMAS... ......................................... 64
4. 1 O QUE É APRENDER............................................................................ 77
4. 2 O QUE É ENSINAR................................................................................ 82
5. A APRENDIZAGEM BASEADA EM PROBLEMAS: CARACTERÍSTICAS E
PROCESSOS..........................................................................................................
88
5. 1 AS BASES COGNITIVAS DA APRENDIZAGEM BASEADA EM
PROBLEMAS...............................................................................................
95
6. CURRÍCULO NO PBL......................................................................................... 98
7. A CONSTRUÇÃO E NARRATIVA DE PROBLEMAS......................................... 108
7. 1 GRUPO TUTORIAL.......................................................................................... 111
8. COMO AVALIAR OS ALUNOS........................................................................... 118
CONCLUSÕES........................................................................................................ 126
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS........................................................................ 129
INTRODUÇÃO
O sistema educacional de nossas universidades, especialmente
na área jurídica, está clamando por mudanças, basta observar os altos índices de
erros profissionais e especificamente o baixo número de aprovados no exame da
OAB. Atualmente a educação é considerada mera fonte de lucro em que as
instituições de ensino não se preocupam mais com o saber, mas tão-somente em
lotar salas de aula com um professor que ali despeja informações. Além disso, o
método de ensino é o mesmo de décadas.
Infelizmente verificamos que nosso sistema educacional, muitas
vezes não está em conformidade com o previsto no art. 205 da Constituição
Federal:
Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da
família, será promovida e incentivada com a colaboração da
sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu
preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o
trabalho. (grifo nosso)
A grande maioria das instituições de ensino está formando
verdadeiros robôs, pessoas que se acostumaram a decorar o que é dito, simples
autômatos, que não sabem como aplicar na prática seus aprendizados. Em
síntese, formam pessoas totalmente desqualificadas para o trabalho e para o
exercício da cidadania.
A grade curricular muitas vezes é fixa para todas as faculdades
sem observar as necessidades regionais que aquela determinada sociedade
precisa. O estudo não foca a sociedade a que os profissionais se destinarão, mas
fica, tão somente, baseado nas doutrinas e ensinamentos preestabelecidos.
Verifica-se que o objetivo do professor passa a ser de informar e não de formar
pessoas aptas a trabalharem para a sociedade.
Nossa proposta é estudar a “aprendizagem baseada em
problemas” (APB ou PBL), novo método de ensino cujo objetivo é que os alunos
aprendam a aprender, sejam independentes na busca do saber e aprendam a
pensar, para que no momento de exercer a profissão saibam como lidar com as
dificuldades sozinhos, resolvendo os problemas com eficiência.
No capítulo 1 iremos verificar a educação e a escola, passaremos
por seu conceito e evolução histórica. Interessante observar os tipos de educação
e percebermos como ela era até antes da Constituição de Weimar
No capítulo 2 abordamos a Constituição de Weimar desde seus
antecedentes históricos até sua formação e discorreremos sua importância para
as Constituições posteriores e sua influência na educação.
No capítulo 3 tratamos da evolução educacional no Brasil desde a
época colonial até os dias atuais, o que nos permite verificar nossa história
educacional em relação à importância dada por nossos sistemas de governo.
No capítulo 4 cuidamos das dificuldades que estão presentes em
nosso sistema de ensino e que fundamentam uma nova abordagem metodológica.
No capítulo 5 discorremos sobre a aprendizagem baseada em
problemas, suas características e processos, que de forma sucinta traz a idéia da
nova metodologia proposta nesse trabalho.
No capítulo 6 apresentamos uma revolução quanto à forma de se
estabelecer o currículo. Oferecemos uma proposta completamente diferente da
tradicional, em que os alunos aprendem determinados assuntos e não matérias. O
aprendizado é em blocos e sempre multidisciplinar.
No capítulo 7 cuidamos do ponto fundamental do estudo, qual
seja, a forma de elaboração dos problemas, que é a base de toda metodologia
aqui apresentada.
Por fim, no capítulo 8 tratamos da forma de avaliação dos alunos,
que deve ser vista como o momento de verificar se todo o processo de
aprendizagem está funcionando, e não como um momento de acerto de contas
com o aluno.
A nosso ver o presente estudo será de grande importância para o
ensino, sobretudo o ensino jurídico, pois até o momento nenhuma faculdade de
Direito no Brasil conseguiu adotá-lo da maneira aqui abordada
1. EDUCAÇÃO E ESCOLA
Para que possamos desenvolver nosso trabalho, julgamos de
fundamental importância apresentar o conceito e uma breve análise histórica da
educação. Somente através da educação se alcança o desenvolvimento do ser
humano e de um povo. Contudo, nem sempre a função educacional foi exercida
pelas escolas, tendo ocorrido grandes mudanças para chegar ao ensino que
temos hoje.
A palavra educação apresenta vários conceitos que foram dados
por estudiosos:
1. ato ou efeito de educar(-se). 2. processo de desenvolvimento da
capacidade física, intelectual e moral da criança e do ser humano
em geral, visando à sua melhor integração individual e social (...).
3. os conhecimentos ou aptidões resultantes de tal processo;
preparo. 4. o cabedal científico e os métodos empregados na
obtenção de tais resultados ; instrução, ensino (...) 6.
aperfeiçoamento integral de todas as faculdades humanas. 7.
conhecimento e prática dos usos de sociedade, civilidade,
delicadeza, polidez, cortesia1.
Podemos perceber a abrangência não apenas do sentido
intelectual da educação, mas também sua importância social, pois habilita a
pessoa a se portar no seio de uma dada sociedade.
Conforme o Dicionário de Filosofia:
Educação. Em geral, designa-se com esse termo a transmissão e
o aprendizado das técnicas culturais, que são as técnicas de uso,
1 FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo dicionário da Língua Portuguesa. 3. ed. Rio de
Janeiro: Nova Fronteira, 1999. p. 718.
produção e comportamento, mediante as quais um grupo de
homens é capaz de satisfazer suas necessidades, proteger-se
contra hostilidade do ambiente físico e biológico e trabalhar em
conjunto do modo mais ou menos ordenado e pacífico2.
Para esse conceito, a educação é apresentada como um conjunto
de técnicas que o ser humano aprende ao longo de sua vida possibilitando o
desenvolvimento e convívio de pessoas de um mesmo grupo. Por todos estarem
em um mesmo ambiente criam-se certas características específicas desse grupo,
que precisam ser transmitidas para suas gerações.
Abbagnano entende que a cultura são as técnicas transmitidas, e
a educação seria o modo pelo qual se transmite a cultura. Afirma esse autor que
uma sociedade não pode sobreviver se a sua cultura não é transmitida de geração
para geração; as modalidades ou formas de realizar ou garantir essa transmissão
chama-se educação.3
Através da transmissão da cultura é possível ocorrer a evolução
do homem, que está sempre aprimorando aquilo que lhe foi ensinado e que lhe dá
a capacidade de pensar e de criar.
O sentido da educação, como se concebe presentemente, provém
da tentativa de combinar e equilibrar esses dois elementos de
direitos individuais e deveres sociais, de desenvolvimento pessoal
e de serviço social. O sentido da educação atualmente encontra a
sua significação total neste processo de relacionar o indivíduo com
a sociedade, a fim de assegurar o desenvolvimento da
personalidade e o bem-estar social (...) A educação tem sido
definida como preparação para a cidadania, como ajustamento à
sociedade, como preparação para a vida social, como aquisição da
herança da raça (...) É o processo de conformar o indivíduo a dado
padrão ou tipo social, de tal modo que as capacidades inerentes
2 ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de Filosofia. 4. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2001. p. 305. 3 ABBAGNANO, Nicola, Op. cit., p. 306.
sejam desenvolvidas, sua maior utilidade e felicidade alcançadas,
e, ao mesmo tempo, conservando o supremo bem-estar da
sociedade4.
Segundo Gabriel Chalita:
Educação é um conceito mais amplo do que o ensino, é mais
abrangente, e significa um processo continuado de aprendizagem -
um aprender a aprender que não termina com os ciclos de ensino
previstos na Constituição Federal ou na Lei de Diretrizes e Bases
da Educação5.
A educação é muito abrangente em seu contexto, pois se inicia no
momento em que o ser humano nasce e começa a ter contato com outras pessoas
de sua sociedade. Pode ser também específica, quando realizada nos centros
acadêmicos em que aprendemos a ciência em si, ou seja, a educação intelectual.
Ressaltamos que aprender a falar, dançar, andar, escrever, rezar,
e todas as outras coisas que fazem parte do nosso cotidiano é educação, e por
isso ela pode ser dividida em duas: educação causal (natural/ informal) e
educação formal (intelectual).
A educação causal visa a transmissão dos costumes de um povo,
isto é, suas crenças, o convívio, o trabalho realizado para sobrevivência. Aprende-
se a conviver, em vez de continuar apenas a viver juntos6. Nesse contexto
verificamos que a educação causal não pretende ensinar a pensar e a aprender,
pois a criança praticamente copia o adulto.
Chalita afirma ainda que não se experimentou para a educação
informal nenhuma célula social melhor que a família, pois é na família que se 4 MONROE, Paul. História da educação. 19. ed . São Paulo: Editora Nacional, 1988. p. 370. 5 CHALITA, Gabriel. Educação: a solução está no afeto. São Paulo: Editora Gente, 2001. p. 259. 6 DEWEY, Jhon. Democracia e educação. 3. ed. São Paulo: Editora Nacional, 1959, p. 6.
forma o caráter7.
Os conhecimentos adquiridos por meio da educação causal são
utilizados habitualmente, ou seja, são postos em prática. Podemos afirmar que se
tornam feições características, pois existem com tal profundidade de significação
que se prendem a seu emprego nas urgentes necessidades de cada dia8.
A educação causal era utilizada pelos povos primitivos, mas
conforme os grupos sociais foram evoluindo, foi necessária a criação de um
modelo de educação mais específico, que buscasse o conhecimento intelectual.
Em razão disso, entendia-se que a criança precisava de conhecimentos
específicos para que pudesse copiar o adulto:
A aptidão para participar eficazmente da atividade dos adultos
dependerá, por isso, de uma preparação anterior, na qual tenha
em vista esse fim. Surgem então os fatores especiais – as escolas
– e a matéria determinada – os estudos9.
Esse tipo de educação é teórica e técnica, pois nem sempre
utilizamos todos os conhecimentos adquiridos, por isso não é possível visualizar
sua ocorrência na vida prática. Nesse cenário, a educação causal permaneceu,
estando presente em qualquer povo, e a ela somou-se a educação formal, que
cuidaremos a seguir.
A educação formal é transmitida por meio da escola, onde o aluno
aprende progressivamente, construindo uma seqüência de informações que o
possibilitará a entender o todo. Essa espécie de educação é necessária para o
progresso de uma sociedade desenvolvida, pois ministra a educação técnica por
profissionais especializados no assunto, facilitando o aprendizado dos elementos
que não estão tão presentes em nossa rotina.
7 CHALITA, Gabriel. Op. Cit. p. 17. 8 CHALITA, Gabriel. Op. Cit. p. 9. 9 CHALITA, Gabriel. Op. Cit. p. 8.
A educação causal ou informal e a formal se completam, confrome
se depreende dos ensinamentos de Anísio Spínola Teixeira:
A escola não surge como instituição destinada a substituir a
influência direta da sociedade, nas suas formas de participação
educativa, pela família, pelo trabalho em comum, ritos comuns e
recreação em comum; mas, sim, como uma instituição específica
para a formação de especialistas da tradição escrita, a latere, e
sem prejuízo daquela influência social direta, quanto à participação
e integração de todos na comunidade10.
Desse modo, verifica-se que a educação é composta por várias
fases: a) natural: há o contato com a vida em sociedade, por meio da qual
aprende-se seus costumes e modo de convivência; b) escolar: visa ensinar o
processo básico de aprendizagem, geralmente seguido por supervisão docente; e
c) individual: o indivíduo é quem vai dirigir seu conhecimento, exercendo sua auto-
determinação, mantendo ou adquirindo novos experiências.
Quanto à evolução histórica da educação, julgamos oportuno
analisar a educação primitiva, na Antiguidade e no período Contemporâneo, pois
são as fases que mais afetam o nosso objeto de estudo.
A educação dos povos primitivos era baseada na imitação dos
conhecimentos das gerações passadas.
Nos primeiros anos de vida esta imitação é inconsciente. A
criança, nas tribos selvagens e bárbaras, brinca com imitações, em
miniatura, dos instrumentos usados pelos adultos. (...) O segundo
estádio dessa educação, realizada pela imitação, é consciente.
Ambos, menino e menina, participam das atividades dos adultos e
aprendem por imitação, porque se passa a exigir deles o trabalho.
10 TEIXEIRA, Anísio Spinola. Educação no Brasil. São Paulo: Editora Nacional, 1969. p. 60.
Esta exigência por parte do adulto não tem o objetivo de educar a
criança, mas, sim, o de obter o trabalho11.
Isso ocorre porque neste período buscava-se apenas a
sobrevivência do povo sempre em harmonia com o ambiente.Maria Lúcia de
Arruda Aranha destaca que o homem desse período tem pouca consciência do
passado, como forma de vida a ser conservada, ou do futuro, como promessa de
maiores oportunidades que as do presente. Ele vive no presente, por isso a
ilimitada tendência para modificações, e o caráter acidental das mesmas12.
Na Antiguidade, principalmente na Grécia, a educação começa a
valorizar o desenvolvimento individual, passando de uma concepção mítica para o
pensamento racional e filosófico13, conforme ensinamos de Maria Lúcia de Arruda
Aranha:
Na época arcaica são introduzidas novidades que transformam a
visão que o homem tem de si próprio: a escrita, a moeda, a lei e a
pólis, culminando com o aparecimento do filósofo (...) os gregos
atingiram um grau de consciência de si mesmos que não ocorrera
antes em lugar algum. Uma nova concepção de cultura e do lugar
do indivíduo na sociedade repercute na educação bem como nas
teorias educacionais.
A educação passa então a ser considerada o berço da civilização
ocidental, exercendo sua influência ainda nos dias de hoje.
A educação grega, também conhecida como educação liberal,
permitiu que o homem buscasse livremente seu desenvolvimento em todos os
aspectos da personalidade. No entendimento de Paulo Monroe, é a educação
11 MONROE, Paul. Op. Cit., p. 2. 12 MONROE, Paul. Op. Cit., p. 8. 13 ARANHA, Maria Lúcia de Arruda. História da educação. São Paulo: Moderna, 1989. p. 35.
digna do homem livre, que o habilita a tirar proveito de sua liberdade ou dela fazer
uso14.
Surge nesse momento a noção de paidéia :
É a formação do homem através do contato orgânico com a
cultura, organizada em curso de estudos, com o centro dedicado
aos studia humanitatis, que amadurece por intermédio da reflexão
estética e filosófica e encontra na pedagodia – na teorização da
educação subtraída à influência única do costume- seu próprio
guia”15
Isso tornou possível ao homem se conhecer de forma ampla,
possibilitando-o expressar-se livremente, sempre em busca da vida feliz e bela tão
aclamada por Aristóteles. O ser humano está em constante busca pela sua
realização e seu crescimento máximo como homem, ou seja, em busca da razão
de viver.
Nessa época teve início a valorização do saber pelo saber, além
disso, a educação era tida como uma forma de preparação para a cidadania.
Ainda nesse período os homens começaram a querer entender os fenômenos
naturais. Conforme Franco Cambi:
Delineia-se também uma cultura mais crítica em relação ao saber
religioso e mitopoiético e mais técnicocientífica, que exalta a
dimensão livre e o livre exercício da razão próprio de cada
indivíduo e disposto a submeter à análise qualquer crença,
qualquer ideal, qualquer princípio da tradição16.
14 Paulo Monroe afirma que: “nenhum outro período há, até o século XVIII, tão cheio de sugestões
para o educador presente”. 15 CAMBI, Franco. História da Pedagogia. São Paulo: Fundação Editora da UNESP, 1999. p. 49. 16 CAMBI, Franco. Op. Cit., p. 85.
E continua:
É uma educação que se liga à palavra e à escrita e tende à
formação do homem como orador, marcado pelo princípio do
kalokagathos (do belo e do bom) e que visa cultivar os aspectos
mais próprios do homem em cada indivíduo, elevando-o a uma
condição de excelência, que todavia não se possui por natureza,
mas se adquire pelo estudo e pelo empenho17.
Com o homem procurando conhecer a si próprio, nasceu o
conceito moral de personalidade:
Pela realização da sua própria natureza, cada um executaria as
coisas pelas quais a vida vale a pena ser vivida; a ciência, a arte, a
filosofia, a religião, são meios para esse fim, e devem ser
realizados subordinando-se a ele. Dessa forma, a
responsabilidade moral e a liberdade moral, - liberdade sob a lei e
pela lei, contida em nossa própria natureza, - foram concebidas,
em primeiro lugar pelos gregos – e por eles aplicadas a todos os
indivíduos18.
O ensino passou a ser direcionado e era ministrado pelos sofistas,
que eram professores gregos, raramente filhos de Atenas, que viam os defeitos da
organização educacional existente na pólis e ofereciam aos jovens da cidade a
educação pela qual todos clamavam e que os preparavam para uma carreira de
engrandecimento pessoal na vida política e social da época19. Eles visavam
ensinar: o pensar, o falar e o agir.
Influenciaram de forma significativa o método da educação uma
vez que o estudo de gramática e retórica a que se surgiu, logo mais, o de outras
matérias, inverteu a velha ordem do método que fez da educação um processo de
17 CAMBI, Franco Op. Cit. p. 86. 18 MONROE, Paul. Op. Cit., p. 28. 19MONROE, Paul. Op. Cit., p. 54.
instrução teórica. A educação tornou-se, nitidamente um processo escolar voltado
para fins intelectuais, isto é, individuais20.
Os sofistas foram os criadores do sistema de aprendizagem
programado. A partir deles o docente passa a receber remuneração pelo ensino,
tornando-se um profissional que oferece ao mercado o seu produto, que é o
ensino.
Baseado no princípio básico dos sofistas, lançado por Protágoras,
“o homem é a medida de todas as coisas”, Sócrates empregava um método de
ensino cujo objetivo era estimular o indivíduo a estar em constante
amadurecimento de si próprio, sempre em busca do conhecimento, seja através
do mestre, seja ele mestre de si. Ele aplica a maiêutica (operação de trazer para
fora) e o diálogo feito com um mestre que instiga a busca pelo saber. Isso ocorre
por meio de um diálogo em que as partes, opondo seus pensamentos, buscam
uma unidade que será cada vez mais rica (dialética). Sócrates traz para o ser
humano a idéia de que o autodomínio e a autodireção são tarefas contínuas21.
Por entender que o aprendizado não se obtém pela simples
escuta, vale dizer, o mestre fala e o aprendiz absorve aquilo que lhe foi dito,
Sócrates discorda dos sofistas. Para ele o aprendizado é construído com a
dialética, ou seja, uma conversa entre duas pessoas em que se desfaz verdades
que na realidade são contraditórias, tudo em busca de conclusões corretas.
Ele traz a paidéia como problematização e como pesquisa,
relacionando-a à formação da alma individual, posto que o indivíduo deve realizar-
se em conformidade com sua liberdade e universalidade.
Para Monroe as principais contribuições de Sócrates foram:
20 MONROE, Paul Op. Cit., p. 57. 21 CAMBI, Franco. Op. Cit., p. 88.
1º ) o conhecimento possui um valor prático moral, isto é, um valor
funcional, e conseqüentemente é de natureza universal e não
individualista;
2º ) o processo objetivo para obter-se conhecimento é o da
conversação; o subjetivo, é o de reflexão e organização da própria
experiência;
3º) a educação tem por objetivo imediato o desenvolvimento da
capacidade de pensar, não apenas de ministrar conhecimentos22.
Embora tenha sido discípulo de Sócrates, Platão acreditava que
as pessoas não eram iguais, por isso deveriam ocupar diferentes lugares dentro
da sociedade. Para ele somente alguns eram capazes de adquirir conhecimentos.
Conforme as idéias de Platão, cabe ao Estado o dever de educar.
Para ele a educação da mulher deve ser semelhante ao do homem e os estágios
superiores da educação deveriam ser atingidos pela capacidade de cada um e
não pela sua riqueza. Além disso, os detentores do conhecimento seriam
admitidos como o corpo supremo dos magistrados23.
Platão acreditava que o ser humano tinha uma alma que tudo
conhecia, mas que havia se degradado ao encarnar, pois o corpo possui uma
alma irracional.
A alma intelectiva é superior, mas o corpo tem também uma alma
irracional, de natureza inferior, dividida em duas partes: uma
irascível, impulsiva, localizada no peito; outra concupiscível,
localizada no ventre e voltada para os desejos de bens materiais e
apetite sexual (...) aprender é lembrar (...) todo conhecimento é
22 MONROE, Paul. Op. Cit., p. 62. 23 ARANHA, Maria Lucia Arruda. Op. Cit., p. 51.
esforço para se lembrar do que a alma contemplou no mundo das
idéias e se esqueceu ao encarnar-se24.
Além das idéias pioneiras, Platão desempenhou papel
fundamental ao organizar o currículo escolar grego baseado na educação liberal.
No entendimento de Monroe, Platão formulou a primeira concepção de educação
liberal ao considerar que todas as matérias de estudos não têm valor prático
senão como disciplina mental, ou seja, como meio para o desenvolvimento da
capacidade de pensamento pelo uso do método dialético25.
Para Platão e Sócrates a finalidade da educação era o
conhecimento, e aquele que o possuía adquiria a virtude.
Por sua vez, Aristóteles foi um dos filósofos gregos que mais
influenciou a educação nas épocas posteriores. Ele acreditava que o homem
deveria buscar o conhecimento para a conquista da sua felicidade e do bem
(razão). Como método de ensino procurava a verdade na experiência da espécie
considerando sua consciência histórica. Sobre esse tema julgamos oportuno o
entendimento de Monroe:
Para Aristóteles, o método dialético de Platão, que procurava a
verdade na pura especulação, alcançava apenas verdades de
valor formal; ele, ao contrário, procurava a verdade na experiência
da espécie, aperfeiçoando desta forma o método indutivo, o qual
aplicava tanto objetiva como subjetivamente (...). Aristóteles, antes
de qualquer filósofo, procurou o sentido dos termos e dos fatos na
consciência da humanidade. Depois procurou a confirmação pelo
processo introspectivo (...) é considerado pai da ciência moderna
por ter aplicado tal método a campos completamente novos de
investigação26.
24 ARANHA, Maria Lucia Arruda Op. Cit., p. 51-52. 25 MONROE, Paul. Op. Cit., p. 65. 26 MONROE, Paul Op. Cit., p. 69.
Conforme Aristóteles, a educação deveria ser realizada pelos pais
e pelo Estado. Ele também criou o método da lógica formal, que delimita a
compreensão precisa dos processos de análise e síntese, indução, dedução e
analogia, ajudando a desenvolver o método lógico de pensar27.
De todas as inovações trazidas pela educação grega, Franco
Cambi considera que os seguintes aspectos foram essenciais para a educação
ocidental:
1. a noção de paidéia, que universalizou e tornou socialmente mais
independente e finalizado para o sujeito-pessoa o processo de
formação, entendido como um formar-se universalizando-se e
desenvolvendo a própria humanitas, por meio de um comércio
estreito, constante e pessoal com a cultura e sua história;
2. a pedagogia como teoria, tornada autônoma por referentes
históricos contingentes e destinada a universalizar e tornar
rigoroso (no sentido racional) o tratado dos problemas educativos:
nasce um saber da educação no sentido próprio, com todos os
riscos da abstração, de teorismo, de normativismo que isto
comporta;
3. a problematização da relação educativa, que supera o nexo
pedagodo-pais e docente-discente, relação autoritária e formalista,
abstrata e geralmente impessoal, para, ao contrário, delinear essa
relação como eminentemente espiritual, quase um segundo
nascimento, que faz do mestre o interlocutor fundamental de um
processo de formação, enquanto torna íntimo e envolvido em
primeira pessoa nesse processo28.
O período contemporâneo tem início com a Revolução Francesa
de 1789. A partir desse momento algumas questões, antes desconsideradas ou
relegadas a segundo plano, são alçadas à categoria de destaque, como: 27 ARANHA, Maria Lucia de Arruda. Op. Cit., p. 55. 28 CAMBI, Franco Op. Cit., p. 102-103.
dinamismo social, ideológico e político, tendo como primado os princípios da:
liberdade, igualdade e fraternidade.
Busca-se uma sociedade mais justa, equilibrada e democrática,
que assegure os direitos do cidadão:
Nasce um organismo político-social novo que reclama participação
e responsabilidade social, civil e política por parte de todos,
desenvolvendo também oportunidade entre os homens, ao realizar
(pelo menos em teoria) a igualdade de oportunidades (...) é uma
época da educação social que dá substância ao político (enquanto
a política é governo dos e sobre os cidadãos), mas que também se
reelabora segundo um novo modelo teórico, que integra ciência e
filosofia, experimentação e reflexão crítica29.
O entendimento desse período é o de que a educação é
fundamental para que a sociedade se desenvolva, bem como para que o cidadão
possa efetivamente exercer sua cidadania e, ainda, que goze de melhor convívio
social.
Em 1919, com a Constituição de Weimar, a Alemanha apresenta a
escola com o fundamento sociológico e a estrutura que aplicamos hoje. Logo,
desde esse período a educação é concebida como dever do Estado, que deve
oferecê-la para todos e com qualidade mínima.
A grande contribuição da educação sociológica 30 consiste no fato
29 CAMBI, Franco. Op. Cit., p. 380. 30 Os sociólogos estão em busca do estudo da interação social das pessoas dentro de diferentes
organizações da vida, que entender como um grupo de pessoas se unem e convivem em busca de
um fim comum que possibilitará a perpetuação daquele determinado grupo de pessoas. É esse o
sentido que o sociólogo Emile Durkheim tem sobre educação: “A educação é a ação exercida,
pelas gerações adultas, sobre as gerações que não se encontrem ainda preparadas para a vida
social; tem por objetivo suscitar e desenvolver, na criança, certo número de estados físicos,
intelectuais e morais, reclamados pela sociedade política, no seu conjunto, e pelo meio especial a
dos sociólogos considerarem a educação como o processo pelo qual se perpetua
e desenvolve a sociedade. Eles encaram a matéria através do estudo da estrutura
social, das atividades sociais, das necessidades sociais, e consideram a finalidade
da educação como sendo a preparação do indivíduo para participação com êxito
nas atividades econômicas, políticas e sociais de seus companheiros. Paul
Monroe diz ser extraordinário interesse pelas matérias de estudo, adequadas a
cada estágio da educação, desde o jardim da infância até a universidade, e isto é
resultado da influência sociológica. Nota-se, pois, que a ampliação dos sistemas
da escola pública baseou-se na idéia de educação universal e gratuita seguiu-se,
como conseqüência necessária, a aceitação destes princípios contemporâneos31.
Depreende-se do exposto que a época contemporânea foi a
principal influência para os dias de hoje, e nosso sistema educacional está
baseado nas inovações advindas desse momento histórico.
que a criança, particularmente, se destine.” Emile Durkheim A educação, sua natureza e função.
In: Educação e Sociologia. 12 ed. São Paulo: Melhoramentos, 1978. p. 41.
A educação sociológica passa a verificar quais são os estudos necessário para o desenvolvimento
do grupo, nesse sentido a educação visa formar uma pessoa que pense e considere o meio social
em que vive com vistas a trazer maiores benefícios a seu sistema social. 31 MONROE, Paul. Op. Cit., p. 335-336.
2. A IMPORTÂNCIA DA CONSTITUIÇÃO DE WEIMAR NA
EDUCAÇÃO
Antes da Primeira Guerra Mundial a educação era fragmentada,
isto é, não havia uma grade pedagógica a ser seguida e, em regra, o ensino era
ministrado pela igreja.
Na Europa a educação era basicamente uma função dos
mosteiros cristãos, que foram os primeiros docentes nas universidade alemãs
(Fundação da Universidade de Praga, de língua alemã, 1348)32.
O ensino era diferenciado conforme a classe social do indivíduo.
Os nobres recebiam educação privilegiada, eram orientados por preceptores
particulares ou em internatos chamados de “seminário dos nobres”. Eles
aprendiam línguas estrangeiras, ciências e história, além de equitação, caça,
esgrima e dança.
A educação do povo, porém, confiada essencialmente à Igreja,
ocorre mais freqüentemente no interior de institutos de
beneficência onde somente poucos alunos dos grupos populares
recebem uma educação exclusivamente instrumental, limitada à
aprendizagem de técnicas elementares como ler e escrever. Com
relação a este tema, se, por um lado, deve-se registrar a
insuficiência do espaço concedido pelas organizações religiosas à
educação das massas, por outro, não pode ser esquecida a
omissão dos poderes públicos no que se refere a este problema33.
32 BECKER, Horst Bahro Willi. Educação, pesquisa e desenvolvimento: o sistema de ensino,
ciência e pesquisa na República Federal da Alemanha. Tradução de Pedro Georgen. Brasília:
Coordenação do aperfeiçoamento de pessoal de nível superior - CAPES, 1979. p. 20. 33 CAMBI, Franco. Op. Cit., p. 296.
Muito se critica o ensino pela religião, pois, freqüentemente visa o
estabelecimento de dogmas e a submissão do pensamento. Há quem entenda
que as igrejas são formas sociais de impor idéias que impedem o exercício livre da
razão34.
O ensino era feito à base de punições físicas como chicotadas,
reguadas na palma das mãos, socos na orelha e suspensões. Nota-se que não
havia a menor preocupação com a qualidade do ensino ou com o ser humano em
si. Buscava-se tão-somente um sistema de opressão.
No aclamado drama “O filho”, o escritor Walter Hasenclever traz a
seguinte afirmação do filho para o pai:
Lembro-me perfeitamente da época em que tu me ensinavas a
gramática grega a chicotadas! Era sempre bem antes de eu me
deitar, quando eu estava de pijama, de maneira que a correia
chegava mais perto de minha pele!35.
Embora não fosse permitido por lei o sistema de castigos
corporais era apoiado pela mentalidade dos pais:
Os professores conservadores, apoiados por essa vox populi, não
hesitavam em reclamar diversas vezes, por ocasião de
conferências e congressos pedagógicos, o retorno oficialmente
reconhecido da sacrossanta chibata36.
Mesmo antes da reforma educacional da Alemanha, Kant já se
manifestava sobre a importância de uma reforma educacional:
34 TRILLA, Jaume; Elena Cano e outros. El legado pedagógico del siglo XX para la escuela del
siglo XXI. Barcelona: Grão, 2001. p. 154. 35 Apud RICHARD, Lionel. A república de Weimar. São Paulo: Companhia das Letras, 1988. p.
164. 36 CAMBI, Franco. Op. Cit., p. 165.
O homem só pode tornar-se verdadeiro homem mediante a
educação, e ele é tal como ela faz. Deve-se notar que ele só pode
ser educado por outros homens que, por sua vez, foram educados.
Se um ser superior tomasse conta de nós, veríamos tudo o que o
homem pode vir a ser. Se pelo menos uma experiência fosse feita
com a ajuda dos poderosos ou com as forças colaborativas de
muitas pessoas, poderíamos conhecer o ápice da capacidade
humana. É extremamente penoso para o filósofo e para o
filantropo constatar como os poderosos na maioria das vezes só
pensam em si próprios e não tomam parte no importante
experimento sobre a educação para fazer a humanidade
aproximar-se de sua perfeição37.
Ainda nessa fase de transição, entre a reforma estatal e a
educacional, Johabb Gottlieb Fichte lembra a importância da educação em que
cada cidadão deveria, através do desenvolvimento integral de suas capacidades,
encontrar o seu lugar na sociedade e tornar-se um cidadão, responsável pelo
Estado38.
A partir dos ideais socialistas é feita uma importante alteração na
mentalidade educacional, assumindo grande importância temas como, a busca da
igualdade entre os homens e a ordenação racional e orgânica da sociedade.
Nasce um organismo político-social novo que reclama participação
e responsabilidade social, civil e política por parte de todos,
desenvolvendo também oportunidade entre os homens, ao realizar
(pelo menos em teoria) a igualdade de oportunidades (...) é uma
época da educação social que dá substância ao político (enquanto
a política é governo dos e sobre os cidadãos), mas que também se
37 CAMBI, Franco. Op. Cit., p. 362. 38 BECKER, Horst Bahro Willi. Op. Cit., p. 21.
reelabora segundo um novo modelo teórico, que integra ciência e
filosofia, experimentação e reflexão crítica39.
O Estado passa a controlar o sistema educacional, uniformizando-
o e fixando critérios pedagógicos. Além disso, começa a busca por professores
qualificados e retira-se da igreja a função pedagógica que até então era por ela
controlada e exercida.
A renovação das regras de convivência social, que devem ser
alimentadas pelo princípio da solidariedade, a transformação no
sentido liberatório das várias instituições sociais (família, fábrica,
Estado) e a projeção de uma harmoniosa sociedade ideal implicam
também uma profunda mudança do homem-cidadão, do ideal
antropológico que é colocado na base dessa sociedade
renovada40.
É nesse contexto que nasce o pensamento célebre segundo o
qual todo homem, e não somente poucos privilegiados, têm direito ao pleno,
autônomo e múltiplo desenvolvimento da personalidade41.
Para que se alcance a educação efetiva é necessário que se
tenha liberdade, pois o aprendizado pressupõe que a pessoa assimile a idéia e
não apenas a decore. O decorado não tem importância, não possibilita o
pensamento, tampouco o real entendimento. O ato de decorar não instiga o
pensar sobre as conseqüências e as razões daquele ensinamento. Sobre isso
leciona Edgar Morin:
Qualquer conhecimento opera por seleção de dados significativos
e rejeição de dados não significativos: separa (distingue ou
disjunta) e une (associa, identifica); hierarquiza (o principal, o
secundário) e centraliza (em função de um núcleo de noções-
39 MONROE, Paul. Op.Cit., p. 335-336. 40 MONROE, Paul. Op. Cit., p. 477. 41 CAMBI, Franco. Op. Cit., p. 380.
chaves); estas operações, que se utilizam da lógica, são de fato
comandadas por princípios supralógicosde organização do
pensamento ou paradigmas, princípios ocultos que governam
nossa visão das coisas e do mundo sem que tenhamos
consciência disso. Para isso é preciso, antes de mais nada, tomar
consciência da natureza e das conseqüências dos paradigmas que
mutilam o conhecimento e desfiguram o real42.
2.1 SISTEMA EDUCACIONAL
A Constituição de Weimar mostrou grande preocupação com a
reestruturação do sistema educacional, e por isso trouxe regras específicas
inseridas no sistema dos direitos e deveres fundamentais, reservando ainda um
livro específico para tratar dos assuntos da educação: Livro IV - Educação e
Escola. O art. 120 traz uma disposição muito importante para o nosso objeto de
estudo:
Art. 120. A educação das jovens gerações, com vista a fazer-lhes
adquirir as qualidades físicas, intelectuais e sociais, é o dever e o
direito natural dos pais; a sociedade política vigia o modo como
eles o cumprem.
Com toda expectativa pela mudança, começou então a busca pelo
desenvolvimento pleno da criança, notadamente de sua personalidade,
permitindo-se a exploração máxima de sua potencialidade.
Graças à efervescência revolucionária e às transformações
sociais, florescem tentativas inspiradas nesses princípios. Em
muitas cidades, instituições escolares experimentais aparecem.
Em Hamburgo, quatro escolas públicas, contando com mais de
42 MORIN, Edgar. Introdução ao pensamento complexo. Porto Alegre: Sulina, 2005, p. 10-11.
seiscentos alunos, são organizadas com base numa relação de
camaradagem entre alunos e mestres. A figura do mestre se
apaga, os alunos aprendem a contar com seus próprios recursos.
Graças a essas novas relações fraternas, a educação não é mais
ministrada do alto de uma cátedra; passa a ser adquirida através
da vida grupal, em liberdade43.
A partir deste momento meninos e meninas passam a ser tratados
como seres iguais, permitindo-se a convivência na mesma sala de aula. Agora a
escola era a mesma para todos, norteada pela idéia de responsabilidade e de
solidariedade, pois ambos os sexos trabalham juntos e encorajam-se uns aos
outros.
Ganha corpo a idéia de que as crianças deviam descobrir na
escola a sua própria verdade, sem copiar os adultos, numa atmosfera de
camaradagem com os educadores e na convivência mista44. Não se aprova mais a
imputação de ideais políticos e religiosos, o objetivo é apenas o conhecimento
livre.
Na seqüência selecionamos alguns artigos da Constituição de
Weimar que mais se relacionam o assunto tratado:
Art 142. A ciência e o ensino são livres, cabendo ao Estado seu
fomento45.
Art 143. As instituições públicas devem atender à educação da
juventude, sendo sua criação feita em colaboração pelo Império,
Estados e Municípios. A formação dos professores deverá ser
normatizada de modo homogêneo buscando princípios que se
apliquem à mais alta cultura. Os professores das escolas públicas
43 RICHARD, Lionel. Op. Cit. p. 167 44 Idem 45 Tradução livre.
possuem os mesmos direitos e obrigações que os funcionários do
Estado46.
Esse dispositivo demonstra a grande importância dos professores,
determinando que sua formação deverá ser homogênea e buscar princípios da
mais alta cultura. Além disso, estabelece que eles tenham os mesmos direitos e
obrigações que os funcionários do Estado. Em síntese, visa a máxima qualificação
dos professores para que o ensino tenha a mais alta qualificação cultural.
Art 144. Toda a organização escolar será sujeita à inspeção do
Estado (Reich), podendo este delegá-la aos municípios. A
inspeção escolar estará a cargo de funcionários tecnicamente
preparados e dependentes de uma direção central47.
O Estado passou a se preocupar com a unificação da escola.
Todos deveriam seguir um conteúdo programático e as aulas começavam após a
Páscoa.
Art 145. O ensino é obrigatório para todos nos primeiros oito anos
em que haverá escolas nacionais. Haverá escolas
complementares para o ensino até os 18 anos. Em ambas o
ensino e o material escolar são gratuitos48.
Art 146. A instrução publica deve estruturar-se de modo orgânico.A
escola média e o colegial devem estar baseados na escola
elementar que é comum a todos. Para o ingresso nas escolas
deve-se analisar apenas os talentos e aptidão do aluno, não
podendo ser analisada sua situação sócio-econômica e nem sua
religião49.
O ingresso na escola dependia unicamente das qualidades
46 Tradução livre. 47 Tradução livre. 48 Tradução livre. 49 Tradução livre.
culturais, como se depreende da leitura do trecho abaixo:
Meninas de longas tranças, como impunha a moda, tagarelavam
sem pudor com seus colegas rapazes, seus iguais. Não obstante,
no meio desses grupos novos e variados, as diferenças sociais,
mantidas, eram perceptíveis pelo comportamento, pelas roupas.
Os jovens filhos de burgueses eram reconhecidos pela cabeça
quase raspada, com larga mecha de cabelos conservada bem no
alto do crânio, dividida por uma risca em duas partes
cuidadosamente simétricas. Os outros usavam cabelos muito
curtos, às vezes quase raspados, sem modismo. A preocupação
das mães era vê-los limpos. Sem piolhos50.
Os arts. 147, 148 e 149 também apresentam preceitos de suma
importância:
Art 147. Admite a criação de escolas particulares, mas necessitam
de autorização do Estado para funcionarem, elas devem ter, no
mínimo, o mesmo padrão de qualidade das públicas, não podem
fazer distinção entre seus alunos e manter uma situação jurídica e
econômica de seus professores. Na falta de qualquer destes
requisitos será negada sua abertura51.
Art 148. Em todas as escolas deverão trabalhar nas bases da ética
educacional, com espírito patriota dando a necessária aptidão
pessoal e profissional, inspirando-se no espírito da nação alemã e
da concórdia entre as nações. Durante o ensino deve-se respeitar
as opiniões divergentes. Os direitos e os deveres cívicos e o
50RICHARD, Lionel. Op. Cit. p. 172. 51 Art 147 “As escolas privadas deverão obter do Estado autorização para seu funcionamento e
estão submetidas às suas leis. Deverão possuir os mesmos padrões das escolas públicas, nas
metas, instalações, objetivos e qualificação de seus funcionários garantindo que não haja
tratamento diferenciado aos alunos em razão de sua riqueza. Só se autorizará escola privada
primária se não houver uma pública para uma minoria de pessoas que solicitaram uma escola para
seus credos ou se a comunidade reconhecer como necessária.” Tradução livre
ensino profissional são matérias obrigatórias nas escolas. A todos
os alunos será dado uma constituição em sua formatura52.
Art 149. O ensino religioso como obrigatório, salvo nas escolas
leigas ou de confissão livre. Cabe ao Estado seu controle. Os
professores têm o direito de não ministrarem as aulas religiosas e
de não participarem das festas religiosas se assim for de sua
vontade. O mesmo se dá com os alunos. Nas universidades
manter-se-á a faculdade de Teologia53.
Mesmo buscando uma harmonia, são nítidas as diferenças entre
as universidades:
A teologia protestante, o direito, os estudos de alemão eram
geralmente considerados como de direita, enquanto a sociologia e
a psicologia passavam por derem de esquerda. Heidelberg e
Frankfurt tinham a reputação de universidades liberais, enquanto
em Berlim, de acordo com rumores inteiramente fundados,
dominava a direita mais conservadora... O corpo universitário, na
sua maioria, rejeitava a democracia parlamentar. E, curioso
paradoxo, era protegido por ela. Graças ao artigo 142 da
Constituição, que garantia a liberdade da arte, da ciência e do
ensino, a maioria dos professores de direito, de história ou de
filosofia julgavam que tinham liberdade para, do alto de sua
cátedra, externar aos estudantes suas opiniões, que eram anti-
republicanas54.
Carlos Cury traz três constatações sobre essa primeira
normatização constitucional da educação:
A primeira constatação é o elevado número de artigos (nove) no
capítulo referente à educação. E mais: eles são analíticos, com
52 Tradução livre. 53 Tradução livre. 54 RICHARD, Lionel. Op. Cit., p. 186.
uma intensidade de redação por vezes minuciosa. A educação
escolar goza da garantia constitucional. A seguir, pode-se
assinalar quatro grandes idéias que dominam o conjunto destes
artigos. Primeira: investir em educação é apostar no presente e no
futuro do Reich uma vez que ela é considerada peça estratégica
no soerguimento da nação. Daí o detalhismo na própria
Constituição. Segunda: busca-se uma democratização da
educação escolar, via sistema nacional, que contemple a escola
primária única, gratuita e obrigatória para todas as classes sociais
e para todos os cidadãos alemães sem quaisquer discriminações.
Terceira: a busca de um acordo mínimo em torno da questão do
ensino religioso, penosamente obtido. Criou-se, pois, uma
multiplicidade institucional de escolas públicas: umas com regime
laico, outras com regime confessional e outras com regime
interconfessional. Finalmente, tem-se a presença forte do Estado
no sentido de ser ele o titular da educação escolar. Só ele tem a
capacidade jurídica de inspecionar estabelecimentos, de autorizar
a abertura de escolas privadas, de restringir a amplitude da
liberdade de ensino e de interferir na educação religiosa55.
55 CURY, Carlos Roberto Jamil. A constituição de Weimar: um capítulo para a educação.
Campinas: Educ. Soc. v. 19, n. 63, 1998. p. 86.
3. A EDUCAÇÃO NO BRASIL
Para entendermos como funciona o atual sistema educacional é
fundamental verificar como nossas Constituições anteriores trataram do assunto,
pois nossas leis nada mais são do que a evolução de idéias e acontecimentos
ocorridos no passado, o que permitem a atualização e melhora na garantia dos
direitos presentes.
Na época do Brasil Colônia os portugueses queriam dominar os
índios, submetê-los à sua cultura e transformá-los em católicos, para isso era
fundamental educar estas pessoas.
Para que fosse possível concretizar essas ambições os jesuítas
resolveram pregar a fé católica através da catequese que incluía em seus
ensinamentos a leitura e a escrita.
Claudino Piletti afirma:
Os jeusuítas logo compreenderam que não seria possível
converter os índios à fé católica sem, ao mesmo tempo, ensinar-
lhes a leitura e a escrita. Por isso, ao lado da catequese,
organizavam nas aldeias escolas de ler e escrever, nas quais
também se transmitiam o idioma e os costumes de Portugal.56
Entretanto, o ensino não passava de lições básicas, não era
finalidade da Coroa Portuguesa ministrar um verdadeiro conhecimento que
possibilitasse o desenvolvimento do raciocínio lógico e questionador.
O conteúdo era somente para garantir a submissão dos índios e
incutir a crença católica.
56 PILETTI, Claudino; PILETTI, Nelson. Filosofia e história da educação. 15. ed. São Paulo: Ática,
2001, p. 166.
A leitura, a escrita e o cálculo eram, de fato, os conteúdos próprios
da instrução, que davam a base para a compreensão das
Sagradas Escrituras. Ter acesso aos catecismos, livros e cantos
religiosos, realizar o complicado cálculo dos dias e das festas
religiosas, entender e acompanhar ativamente os ritos e os
sacramentos era tudo o que se esperava da instrução do gentio.
Isso os civilizava, pacificava, tornando-os súditos da Coroa e filhos
de Deus57.
A educação era ministrada pela Igreja e também pela própria
família. Os padres foram os primeiros professores que tivemos no Brasil e eram
chefiados por Manoel da Nóbrega. A primeira escola brasileira foi montada em
Salvador e tinha como mestre o irmão Vicente Rodrigues.
Passada a primeira fase de alfabetização, os padres começaram a
ministrar cursos superiores de Humanidades, Teologia e Filosofia, mas para que
se recebesse o diploma era necessário que os estudos fossem terminados em
Portugal.
Esse método foi absoluto durante 210 anos, de 1549 a 1759, mas
com a chegada de Marquês de Pombal os jesuítas foram expulsos e o ensino
tornou-se um verdadeiro caos, pois os próprio jesuítas eram os responsáveis pela
educação. Com a saída deles não havia número de professores suficientes.
José Luiz de Paiva Bello leciona que:
No momento da expulsão os jesuítas tinham 25 residências, 36
missões e 17 colégios e seminários, além de seminários menores
e escolas de primeiras letras instaladas em todas as cidades onde
havia casas da Companhia de Jesus. A educação brasileira, com
isso, vivenciou uma grande ruptura histórica num processo já
implantado e consolidado como modelo educacional. Com a
57 XAVIER, Maria Elizabete; RIBEIRO, Maria Luisa; NORONHA, Olinda Maria. História da
Educação: a escola no Brasil. São Paulo: FTD, 1994, p. 43.
expulsão saíram do Brasil 124 jesuítas da Bahia, 53 de
Pernambuco, 199 do Rio de Janeiro e 133 do Pará. Com eles
levaram também a organização monolítica baseada no Ratio
Studiorum.
Desta ruptura, pouca coisa restou de prática educativa no Brasil.
Continuaram a funcionar o Seminário Episcospal, no Pará, e os
Seminários de São José e São Pedro, que não se encontravam
sob a jurisdição jesuítica; a Escola de Artes e Edificações Militares,
na Bahia, e a Escola de Artilharia, no Rio de Janeiro.
Os jesuítas foram expulsos das colônias em função de radicais
diferenças de objetivos com os dos interesses da Corte. Enquanto
os jesuítas preocupavam-se com o proselitismo e o noviciado,
Pombal pensava em reerguer Portugal da decadência que se
encontrava diante de outras potências européias da época. Além
disso, Lisboa passou por um terremoto que destruiu parte
significativa da cidade e precisava ser reerguida. A educação
jesuítica não convinha aos interesses comerciais emanados por
Pombal. Ou seja, se as escolas da Companhia de Jesus tinham
por objetivo servir aos interesses da fé, Pombal pensou em
organizar a escola para servir aos interesses do Estado58.
A educação estabelecida por Pombal passou a ser laica e de
responsabilidade da Coroa Portuguesa. Ela não era homogênea e cada professor
ministrava suas aulas de forma diversa. Isso foi mudado pelo Alvará de 28 de
junho de 1759, que estabeleceu aulas régias de latim, grego e retórica.
Ante a desordem estabelecida, Portugal tentou reestruturar o
sistema de ensino e em 1772 o sububsídio era uma taxação, ou um imposto, que
incidia sobre a carne verde, o vinho, o vinagre e a aguardente. Mesmo que exíguo,
nunca foi cobrado com regularidade e os professores ficavam longos períodos
58 BELLO, José Luiz de Paiva. História da educação no Brasil. Disponível em:
http://www.pedagogiaemfoco.pro.br/heb14.htm. Acessado em 27/05/2007.
sem receber vencimentos. Além disso, os professores geralmente não tinham
preparação para a função, já que eram improvisados e mal pagos. Eram
nomeados por indicação ou sob concordância de bispos e se tornavam
”proprietários vitalícios” de suas aulas régias59.
Com a vinda da família real para o Brasil houve uma melhora no
ensino com a criação das primeiras universidades: Academia Real da Marinha,
Academia Real Militar, Medicina, Economia. Nessa época também foi organizada
a primeira biblioteca do país, formada por acervo particular da família real.
Isso decorreu da necessidade de ter pessoas capacitadas, bem
como de formar uma elite brasileira.
Dom João teve a intenção de criar um sistema educacional público
e uniforme, mas a situação econômica não permitiu que a idéia fosse
implementada, pois, além de ser muito inovadora, a estrutura requeria
investimentos altos.
Antônio Chizzotti leciona:
O projeto elaborado por Conde de Barca, Gal. Francisco de Borja,
Gastão Stockler reproduziu o ideário de Condorcet, dividindo a
instrução pública em quatro graus: as pedagogias, que
compreendiam o ensino elementar primário; os institutos, que
acrescentavam às pedagogias os conhecimentos necessários aos
agricultores, artistas, operários e comerciantes; os liceus, que
ministravam os conhecimentos científicos; e as academias, que
desenvolviam os conhecimentos das ciências abstratas e os
estudos das ciências morais e políticas. O projeto, pela sua
inspiração liberal, pelo risco de se reformar uma massa letrada e
um sistema que nem Portugal, nem a própria França possuíam,
contrastava com os interesses da Coroa. Por outro lado, o erário,
59 Ibidem.
exaurido de todas as formas pelas cortes, não teria condições de
implementar plano tão amplo60.
A situação da colônia não era boa, seja economicamente ou
socialmente. Os impostos eram muito altos e havia pouco investimento para o
progresso do Brasil, pois a maior parte do dinheiro, se não tudo, era enviado para
Portugal para sustentar a Coroa. Um reflexo dessa situação era o completo estado
de penúria em que viviam agricultores, senhores de pequenos ofícios e artesãos.
Nesse momento surgiu uma corrente nacionalista organizada pelo
partido liberal brasileiro, formado por intelectuais que se espelhavam na
Revolução Francesa e advogavam a independência do Brasil.
Em 1822, Dom Pedro declarou a independência do Brasil e
convocou uma assembléia constituinte61 para a formação de nossa primeira
Constituição, que foi outorgada em 25 de março de 1824.
A constituinte era formada por 53 deputados, em sua maioria
bacharéis em Direito formados na Europa. Entre eles ainda havia médicos,
matemáticos e clérigos. Apesar de muitos debates e idéias a constituinte foi
dissolvida62 e Dom Pedro I enviou um projeto de Constituição e formou uma
comissão com 10 integrantes para elaborá-la. A nova Constituição concedeu 60 Chizzotti, Antônio. A constituinte de 1823 e a educação. In: FÁVERO, Osmar. A educação nas
constituintes brasileiras: 1823-1988. 2. ed, Campinas: Autores Associados, 2001, p. 38. 61 Na tentativa de estruturar uma educação e sem recursos suficientes ela promoveu um concurso
em que: “1º será reputado benemérito da pátria e como tal reconhecido com a Ordem Imperial do
Cruzeiro, ou nela adiantado se já tiver, aquele cidadão que até o fim do corrente ano apresentar à
Assembléia melhor tratado de educação física, moral e intelectual para a mocidade brasileira; 2º
uma comissão composta de sete cidadãos de conhecida literatura e patriotismo, nomeados pela
Assembléia, decidirá qual dos tratados oferecidos merece a preferência; 3º não havendo
concorrência e aparecendo um só tratado, ainda assim verificar-se-á o premio determinado pelo
parágrafo primeiros se a comissão julgar digno.” Chizzotti, Antônio. Op. Cit, p. 39 62 “A constituinte de 1823, com todos os arrazoados patrióticos e exultantes, em seis meses de
trabalho produziu mais discursos veementes e oradores esfuziantes sobre a instrução, que
diretrizes fundamentais para a educação nacional.” Ibidem. p. 50
amplos poderes ao imperador, instituiu um Estado Unitário, e seu sistema de
alteração era semi-rígido.63
As normas referentes à educação previam:
Art. 179. A inviolabilidade dos Direitos Civis, e Politicos dos
Cidadãos Brazileiros, que tem por base a liberdade, a segurança
individual, e a propriedade, é garantida pela Constituição do
Imperio, pela maneira seguinte.
...........................................................................................................
...............
XXXII. A Instrucção primaria, e gratuita a todos os Cidadãos.
XXXIII. Collegios, e Universidades, aonde serão ensinados os
elementos das Sciencias, Bellas Letras, e Artes.
Com a proclamação da República, em 15 de novembro de 1889,
houve a queda da Monarquia e junto dela a Constituição de 1824. Foi preciso criar
uma assembléia constituinte para a elaboração da nova Constituição, que foi
promulgada em 24 de fevereiro de 1891, e instituiu a República Federativa dos
63 Art. 1. O IMPERIO do Brazil é a associação Politica de todos os Cidadãos Brazileiros. Elles
formam uma Nação livre, e independente, que não admitte com qualquer outra laço algum de
união, ou federação, que se opponha á sua Independencia.
Art. 98. O Poder Moderador é a chave de toda a organisação Politica, e é delegado privativamente
ao Imperador, como Chefe Supremo da Nação, e seu Primeiro Representante, para que
incessantemente vele sobre a manutenção da Independencia, equilibrio, e harmonia dos mais
Poderes Politicos.
Art. 99. A Pessoa do Imperador é inviolavel, e Sagrada: Elle não está sujeito a responsabilidade
alguma.
Art. 178. É só Constitucional o que diz respeito aos limites, e attribuições respectivas dos Poderes
Politicos, e aos Direitos Politicos, e individuaes dos Cidadãos. Tudo, o que não é Constitucional,
póde ser alterado sem as formalidades referidas, pelas Legislaturas ordinarias.
www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constitui%C3%A7ao24.htm. Acessado em 27/05/2007
Estados Unidos do Brasil. Criou um Estado independente com a estrutura e forma
de governo baseada na vontade do povo.
Carlos Roberto Jamil Cury nos lembra da fala de Benjamin
Constant:
O nós, isto é o poder de fato do governo provisório nascido do
fato do golpe militar e um futuro poder de direito legitimado pelo
voto popular e expresso em uma Assembléia Constituinte. 64
Durante o governo provisório criou-se a Secretaria da Instrução
Pública, Correios e Telégrafos com o intuito de integração nacional, tornando o
Estado presente em todas as áreas.
Em 30/10/1891 foi criado o Pedagogium que equivaleria
atualmente à Capes a ao Inep. Ao cuidar do assunto Cury afirma:
Foi empreendida a Reforma da Instrução Pública Primária e
Secundária no Distrito Federal, com vários artigos dignos de
estudo; foi selada a existência de escolas livres e criada uma
espécie de Protoconselho Nacional de Educação. Também
mediante este ministério foi empreendida a Reforma do Ensino
Superior, possibilitando as faculdades ‘livres’ e ‘oficiais’, bem como
a criação do Conselho de Instrução Superior do Distrito Federal65.
Houve a separação do Estado e da Igreja, que passou a ser de
âmbito privado, e estabeleceu-se a plena liberdade de crença, bem como o
casamento civil passou a ser o reconhecido.
64 Cury, Carlos Roberto Jamil. A educação e a primeira constituinte republicana. In: Fávero, Osmar.
A educação nas constituintes brasileiras: 1823-1988. 2ª ed, Campinas: Autores Associados, 2001.
p. 70. 65 Ibidem. p. 72-73
Essa Carta ainda garantia a livre manifestação do pensamento
sem dependência da censura, mas vedava o anonimato. Permitia o livre exercício
de qualquer profissão moral, intelectual ou industrial.66
As principais normas sobre educação foram:
Art 34 - Compete privativamente ao Congresso Nacional:
...........................................................................................................
...............
30º) legislar sobre a organização municipal do Distrito Federal bem
como sobre a polícia, o ensino superior e os demais serviços que
na capital forem reservados para o Governo da União67.
Art 35 - Incumbe, outrossim, ao Congresso, mas não
privativamente:
1º) velar na guarda da Constituição e das leis e providenciar sobre
as necessidades de caráter federal;
2º) animar no Pais o desenvolvimento das letras, artes e ciências,
bem como a imigração, a agricultura, a indústria e comércio, sem
privilégios que tolham a ação dos Governos locais;
3º) criar instituições de ensino superior e secundário nos Estados;
4º) prover a instrução secundária no Distrito Federal68.
66 Art 72 - A Constituição assegura a brasileiros e a estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade dos direitos concernentes à liberdade, à segurança individual e à propriedade, nos
termos seguintes:
§ 12 - Em qualquer assunto é livre a manifestação de pensamento pela imprensa ou pela tribuna,
sem dependência de censura, respondendo cada um pelos abusos que cometer nos casos e pela
forma que a lei determinar. Não é permitido o anonimato.
§ 24 - É garantido o livre exercício de qualquer profissão moral, intelectual e industrial. 67 Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constitui%C3%A7ao91.htm.
Acessado em 27/05/2007.
Art 72 - A Constituição assegura a brasileiros e a estrangeiros
residentes no País a inviolabilidade dos direitos concernentes à
liberdade, à segurança individual e à propriedade, nos termos
seguintes:
...........................................................................................................
.............................
§ 6º - Será leigo o ensino ministrado nos estabelecimentos
públicos.
Chama a atenção a proibição do analfabeto votar. Acreditava-se
que com essa proibição o poder público teria maior interesse em erradicar o
analfabetismo para ter um eleitorado maior69.
Com a liberdade de ensino e sua laicidade (as escolas públicas
não poderiam ter posição religiosa) o ensino passou a formar pessoas capacitadas
a enveredarem pelo ensino superior.
O grande retrocesso presente nesta Carta Constitucional é a não
previsão do ensino gratuito, posto que previa somente a competência para legislar
sobre a educação, sem colocá-la como responsabilidade do Estado. O direito à
educação era um direito individual conquistado por esforço próprio e
progressivamente, em conformidade com o mérito de cada um.
Cabia aos Estados e Municípios o encargo do ensino público
primário. A União tinha a função de estimular o desenvolvimento das primeiras
68 Ibdem.
69 Art 70 - São eleitores os cidadãos maiores de 21 anos que se alistarem na forma da lei.
§ 1º - Não podem alistar-se eleitores para as eleições federais ou para as dos Estados:
1º) os mendigos; 2º) os analfabetos; 3º) as praças de pré, excetuados os alunos das escolas militares de ensino superior; 4º) os religiosos de ordens monásticas, companhias, congregações ou comunidades de qualquer denominação, sujeitas a voto de obediência, regra ou estatuto que importe a renúncia da liberdade Individual.
letras e criar instituições de ensino secundário e superior nos Estados.
João Batista Herkenhoff cuida da educação legislada:
Como essa Constituição adotou o principio de que caberiam aos
Estados todos os poderes ou direitos não reservados à União,
ficou entendido que às esferas estaduais, em matéria de
educação, competiria: a) legislar sobre o ensino secundário e
primário; b) criar e manter instituições de ensino superior e
secundário, sem prejuízo de que também o Governo Federal
pudesse fazê-lo; c) criar e manter as escolas primárias70.
Esta Constituição foi um marco por trazer limites de atuação ao
Estado tornando-o de intervenção mínima garantindo direitos civis, mas não trouxe
nenhum direito social.
Cury observa que:
A constituinte avançou no sentido da defesa da plenitude dos
direitos civis, ampliou um pouco os direitos políticos e omitiu-se (ou
mesmo negou) os direitos sociais (...) Já no terreno específico da
educação escolar, além dos pontos anteriormente assinalados, é
possível dizer que a educação teria sido o único direito social
insinuado no campo de direitos civis. Mas, mesmo isto, com a
hegemonia do liberalismo oligárquico, será ancorado na dimensão
do virtus, própria do esforço individual de cada qual. Assim, não
haverá educação obrigatória exatamente porque a oportunidade
educacional será vista como demanda individual71.
70 Apud. Maliska, Marcos Augusto. O direito à educação e a constituição. Porto Alegre: Sergio
Antonio Fabris Editor, 2001. p. 23-24 71 CURY, Carlos Roberto Jamil. A educação e a primeira constituinte republicana. In: FÁVERO,
Osmar. A educação nas constituintes brasileiras: 1823-1988. 2. ed, Campinas: Autores
Associados, 2001. p. 79.
As idéias de Estado social nasce após a Segunda Guerra Mundial
sob a influência da Constituição de Weimar e da Constituição Mexicana de 1919.
Em 1930 houve uma importante revolução no Brasil quando os
governos de Minas Gerais, do Rio Grande do Sul e da Paraíba não apoiaram a
indicação de Júlio Prestes, feita pelo presidente Washington Luiz, e Getulio
Vargas foi derrotado nas urnas.
Essa derrota quebrou a tendência de alteração no poder entre
Minas Gerais e São Paulo, pois os paulistas haviam ficado no poder por duas
vezes seguidas.
Insatisfeito com a situação, Vargas lidera um golpe que o conduz
à Presidência da República.
Nessa época já havia a idéia de um Estado social que garantisse
direitos fundamentais aos cidadãos. Em termos mundiais, o mundo estava
passando por uma grave crise econômica com a quebra da bolsa de valores de
Nova York em 1929.
Todo este contexto, agravado por duas guerras mundiais e pela
Depressão, levou a uma relativa desarticulação da economia
mundial, tornando factíveis e abrindo espaços para a execução de
projetos nacionalistas, que levassem os distintos países a resolver
os impasses existentes. Isto significou que cada país procurou
proteger-se exportando mais, importando menos e expandindo
seus mercados internos, levando assim ao acirramento da luta
entre as economias nacionais72.
O Brasil superou a crise mundial priorizando seus próprios
72 BRITO, Silvia Helena Andrade de. A educação no projeto nacionalista do primeiro governo
Vargas (1930-1945). Disponível em:
http://www.histedbr.fae.unicamp.br/navegando/artigos_frames/artigo_101.html. Acessado em
01/06/2007.
produtos, o que contribuiu para o desenvolvimento industrial, que fortificou os
sindicatos e as idéias sociais.
Com o crescimento e desenvolvimento do país é dada mais
importância à educação. Em 14 de novembro de 1930 é criado o Ministério da
Educação e Saúde, liderado pelo Ministro Francisco Campos73.
Em 1932 houve o Manifesto dos Pioneiros da Escola Nova feito
por grandes intelectuais da época como, Antonio de Sampaio Dória, Anísio S.
Teixeira, Cecília Meirelles e outros, que afirmavam:
Se a evolução orgânica do sistema cultural de um país depende de
suas condições econômicas, é impossível desenvolver as forças
econômicas ou de produção, sem o preparo intensivo das forças
culturais e o desenvolvimento das aptidões à invenção e à
iniciativa que são os fatores fundamentais do acréscimo de riqueza
de uma sociedade. No entanto, se depois de 43 anos de regime
republicano, se der um balanço ao estado atual da educação
pública, no Brasil, se verificará que, dissociadas sempre as
reformas econômicas e educacionais, que era indispensável
entrelaçar e encadear, dirigindo-as no mesmo sentido, todos os
nossos esforços, sem unidade de plano e sem espírito de
continuidade, não lograram ainda criar um sistema de organização
escolar, à altura das necessidades modernas e das necessidades
do país. Tudo fragmentário e desarticulado (...) o educador, como
o sociólogo, tem necessidade de uma cultura múltipla e bem
diversa; as alturas e as profundidades da vida humana e da vida
73 “As principais medidas tomadas por Francisco Campos na pasta da Educação e Saúde Pública
datam de abril de 1931. Nessa ocasião foi assinado um decreto que afirmava ser preferível o
sistema universitário ao das escolas superiores isoladas e que estabelecia, como exigência para a
fundação de uma universidade, a existência de três unidades de ensino superior - as Faculdades
de Direito, Medicina e Engenharia ou, no lugar de uma delas, a Faculdade de Educação, Ciências
e Letras.” Disponível em: http://www.cpdoc.fgv.br/nav_historia/htm/anos30-37/ev_inteest_mec.htm.
Acessado em 01/06/2007.
social não devem estender-se além do seu raio visual; ele deve ter
o conhecimento dos homens e da sociedade em cada uma de
suas fases, para perceber, além do aparente e do efêmero, o jogo
poderoso das grandes leis que dominam a evolução social, e a
posição que tem a escola, e a função que representa, na
diversidade e pluralidade das forças sociais que cooperam na obra
da civilização (...) À luz dessas verdades e sob a inspiração de
novos ideais de educação, é que se gerou, no Brasil, o movimento
de reconstrução educacional, com que, reagindo contra o
empirismo dominante, pretendeu um grupo de educadores, nestes
últimos doze anos, transferir do terreno administrativo para os
planos político-sociais a solução dos problemas escolares (...) É
evidente que as diferentes camadas e grupos (classes) de uma
sociedade dada terão respectivamente opiniões diferentes sobre a
concepção do mundo, que convém fazer adotar ao educando e
sobre o que é necessário considerar como ‘qualidade socialmente
útil’. O fim da educação não é, como bem observou G. Davy,
‘desenvolver de maneira anárquica as tendências dominantes do
educando; se o mestre intervém para transformar, isto implica nele
a representação de um certo ideal à imagem do qual se esforça
por modelar os jovens espíritos’ (...) Mas, do direito de cada
indivíduo à sua educação integral, decorre logicamente para o
Estado que o reconhece e o proclama, o dever de considerar a
educação, na variedade de seus graus e manifestações, como
uma função social e eminentemente pública, que ele é chamado a
realizar, com a cooperação de todas as instituições sociais. A
educação que é uma das funções de que a família se vem
despojando em proveito da sociedade política, rompeu os quadros
do comunismo familiar e dos grupos específicos (instituições
privadas), para se incorporar definitivamente entre as funções
essenciais e primordiais do Estado74.
74 Disponível em: www.pedagogiaemfoco.pro.br/heb07a.htm. Acessado em 01/06/2007.
Esse documento foi fundamental para a reestruturação do sistema
educacional, pois denunciava a desordem do sistema e impunha a educação
como um dever do Estado e direito de todos. Logo, cabia ao poder público criar
um plano geral e uniforme de educação.
Em 1933 Getúlio convoca eleições para formar a Assembléia
Constituinte que, em 16 de julho de 1934, promulga a nova Carta Constitucional.
A Constituição de 1934 é um marco em nosso País por ter
quebrado com a tradição liberal democrática prevista nas outras Cartas.
Apresentava os ideais de um Estado social em conformidade com a já promulgada
Constituição Alemã de 1919. Outros pontos importantes trazidos pela nova ordem
são: direitos e garantias fundamentais, justiça eleitoral, família, educação e
cultura.
Ao encontro do manifesto ela traz a educação como direito de
todos e dever da família e dos órgãos públicos, ela se torna um direito social, isto
é, subjetivo e público. Diante disso, seus beneficiários podem exigir da autoridade
encarregada que cumpra com o preceito constitucional.
É o que dispunha o dispositivo abaixo:
Art 149 - A educação é direito de todos e deve ser ministrada, pela
família e pelos Poderes Públicos, cumprindo a estes proporcioná-
la a brasileiros e a estrangeiros domiciliados no País, de modo que
possibilite eficientes fatores da vida moral e econômica da Nação,
e desenvolva num espírito brasileiro a consciência da
solidariedade humana75.
Apesar de o Estado ter responsabilidade no oferecimento da
educação, esse dever é mitigado, pois é dividido com a família. Assim, só terá
direito a exigir o ensino público a pessoa que demonstrar ser de família sem
recursos suficientes para arcar com a educação particular.
75 www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constitui%C3%A7ao34.htm Acessado em 01/06/07
A educação foi estruturada de maneira uniforme em todo o país,
competindo à União legislar fixando suas diretrizes e fiscalizar sua execução.
Voltou a previsão da gratuidade, passando a ser obrigatória e assegurada,
inclusive aos adultos. Quanto ao ensino privado, para que tivessem autorização de
dar diplomas, as escolas particulares deveriam estar em conformidade com os
preceitos exigidos constitucionalmente. Mesmo trazendo princípios que deveriam
estar presentes nos currículos escolares foi garantida a liberdade de cátedra76.
Nesse sentido previa o art. 150:
Art 150 - Compete à União:
a) fixar o plano nacional de educação, compreensivo do ensino de
todos os graus e ramos, comuns e especializados; e coordenar e
fiscalizar a sua execução, em todo o território do País;
b) determinar as condições de reconhecimento oficial dos
estabelecimentos de ensino secundário e complementar deste e
dos institutos de ensino superior, exercendo sobre eles a
necessária fiscalização;
c) organizar e manter, nos Territórios, sistemas educativos
apropriados aos mesmos;
d) manter no Distrito Federal ensino secundário e complementar
deste, superior e universitário;
e) exercer ação supletiva, onde se faça necessária, por deficiência
de iniciativa ou de recursos e estimular a obra educativa em todo o
País, por meio de estudos, inquéritos, demonstrações e
subvenções.
Parágrafo único - O plano nacional de educação constante de lei
federal, nos termos dos arts. 5º, nº XIV, e 39, nº 8, letras a e e , só
76 Art 155 - É garantida a liberdade de cátedra.
se poderá renovar em prazos determinados, e obedecerá às
seguintes normas:
a) ensino primário integral gratuito e de freqüência obrigatória
extensivo aos adultos;
b) tendência à gratuidade do ensino educativo ulterior ao primário,
a fim de o tornar mais acessível;
c) liberdade de ensino em todos os graus e ramos, observadas as
prescrições da legislação federal e da estadual;
d) ensino, nos estabelecimentos particulares, ministrado no idioma
pátrio, salvo o de línguas estrangeiras;
e) limitação da matrícula à capacidade didática do estabelecimento
e seleção por meio de provas de inteligência e aproveitamento, ou
por processos objetivos apropriados à finalidade do curso;
f) reconhecimento dos estabelecimentos particulares de ensino
somente quando assegurarem. a seus professores a estabilidade,
enquanto bem servirem, e uma remuneração condigna.
O Conselho Nacional de Educação era o responsável pela
elaboração do plano nacional de educação, que devia ser aprovado pelo Poder
Legislativo. O referido órgão podia exercer função deliberativa acerca dos
assuntos educacionais de forma independente, mas essas decisões para serem
válidas dependiam de posterior aprovação.
Art 152 - Compete precipuamente ao Conselho Nacional de
Educação, organizado na forma da lei, elaborar o plano nacional
de educação para ser aprovado pelo Poder Legislativo e sugerir ao
Governo as medidas que julgar necessárias para a melhor solução
dos problemas educativos bem como a distribuição adequada dos
fundos especiais.
Parágrafo único - Os Estados e o Distrito Federal, na forma das
leis respectivas e para o exercício da sua competência na matéria,
estabelecerão Conselhos de Educação com funções similares às
do Conselho Nacional de Educação e departamentos autônomos
de administração do ensino.
Outra inovação importante foi a previsão da vinculação de
percentuais do orçamento da União, Estados, Distrito Federal e dos Municípios
para a manutenção do desenvolvimento dos sistemas de ensino:
Art 156 - A União e os Municípios aplicarão nunca menos de dez
por cento, e os Estados e o Distrito Federal nunca menos de vinte
por cento, da renda resultante dos impostos na manutenção e no
desenvolvimento dos sistemas educativos.
Parágrafo único - Para a realização do ensino nas zonas rurais, a
União reservará no mínimo, vinte por cento das cotas destinadas à
educação no respectivo orçamento anual.
E ainda:
Art 157 - A União, os Estados e o Distrito Federal reservarão uma
parte dos seus patrimônios territoriais para a formação dos
respectivos fundos de educação.
§ 1º - As sobras das dotações orçamentárias acrescidas das
doações, percentagens sobre o produto de vendas de terras
públicas, taxas especiais e outros recursos financeiros,
constituirão, na União, nos Estados e nos Municípios, esses
fundos especiais, que serão aplicados exclusivamente em obras
educativas, determinadas em lei.
§ 2º - Parte dos mesmos fundos se aplicará em auxílios a alunos
necessitados, mediante fornecimento gratuito de material escolar,
bolsas de estudo, assistência alimentar, dentária e médica, e para
vilegiaturas.
Ademais, as escolas oficialmente consideradas idôneas eram
imunes a qualquer tributo77. Nesse conceito estavam protegidas tanto as escolas
públicas como as privadas.
A matéria de ensino religioso voltou para a grade da escola
pública, mas por ser um País laico sua freqüência era facultativa78.
Por fim, o constituinte se preocupou com o ensino de qualidade e
para garantir que fosse alcançado valorizou o professor, prevendo garantias ao
docente, conforme se pode extrair do seguinte artigo:
Art 158: É vedada a dispensa do concurso de títulos e provas no
provimento dos cargos do magistério oficial, bem como, em
qualquer curso, a de provas escolares de habilitação,
determinadas em lei ou regulamento.
§ 1º - Podem, todavia, ser contratados, por tempo certo,
professores de nomeada, nacionais ou estrangeiros.
§ 2º - Aos professores nomeados por concurso para os institutos
oficiais cabem as garantias de vitaliciedade e de inamovibilidade
nos cargos, sem prejuízo do disposto no Título VII. Em casos de
extinção da cadeira, será o professor aproveitado na regência de
outra, em que se mostre habilitado.
Edvaldo Machado Boaventura destaca:
A vida constitucional brasileira, de 1823 a 1988, vai se
aperfeiçoando com a promulgação de textos constitucionais.
Avanços e retrocessos da educação se efetivam em períodos e
momentos fortes (...) a gratuidade da educação primária que surge 77 Art 154 - Os estabelecimentos particulares de educação, gratuita primária ou profissional,
oficialmente considerados idôneos, serão isentos de qualquer tributo. 78 Art 153 - O ensino religioso será de freqüência facultativa e ministrado de acordo com os
princípios da confissão religiosa do aluno manifestada pelos pais ou responsáveis e constituirá
matéria dos horários nas escolas públicas primárias, secundárias, profissionais e normais.
resplandecente na Carta outorgada por Pedro I e desaparece na
Constituição revisada por Ruy Barbosa79.
Apesar de a Constituição de 1934 ser a primeira a garantir direitos
sociais, a situação do País não permitiu que suas normas tivessem tempo de
serem efetivamente aplicadas e sua incongruência com a realidade do país fez
com que surgissem inúmeras crises.
Havia uma luta entre os partidos políticos com ideologias em
busca do poder e, para não sofrer golpes, Getúlio Vargas dissolve a Câmara e o
Senado e revoga a Constituição de 1934.
A alegação dada para fundamentar tal conduta foi:
Por outro lado, as novas formações partidárias, surgidas em todo o
mundo, por sua própria natureza refratária aos processos
democráticos, oferecem perigo imediato para as instituições,
exigindo, de maneira urgente e proporcional à virulência dos
antagonismos, o reforço do poder central80.
Em 1º de novembro de 1937 é outorgada mais uma Constituição,
dessa vez com notória falta de legitimidade por não ter sido elaborada por uma
Assembléia Constituinte eleita pelo povo, sendo fruto de um golpe que instaurou a
ditadura.
Essa Carta concentrou o poder nas mãos do Poder Executivo, por
isso seu representante podia legislar através de decretos. Ainda limitou as
garantias e a liberdade dos cidadãos.
No campo da educação ela não teve grande relevância, havendo
na realidade um retrocesso às previsões da anterior. Essa Constituição apenas
79 A educação na Constituinte de 1946. In Fávero, Osmar (org). A educação nas constituintes
brasileiras, 1823-1988. 2ª ed. Campinas: Autores Associados, 2001. p. 192 80 SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 23. ed, São Paulo: Malheiros,
2004, p. 82.
previa a obrigatoriedade, sempre com vistas ao desenvolvimento da moral e do
adestramento físico81.
Deixou de fazer menção à vinculação de receitas para serem
aplicadas na educação e previu um regime de cooperação entre indústria e Estado
para proporcionar o ensino profissionalizante82.
Ao final da Segunda Guerra Mundial os brasileiros estavam
descontentes com a Constituição a eles imposta e queriam uma redemocratização
do País. Muitos protestos são feitos e uma das reivindicações era sufrágio
universal, secreto e direto.
Uma das principais manifestações contra o Estado Novo imposto
por Vargas foi o chamado “Manifesto dos Mineiros” que ficou conhecido como a
81 Art 130 - O ensino primário é obrigatório e gratuito. A gratuidade, porém, não exclui o dever de solidariedade dos menos para com os mais necessitados; assim, por ocasião da matrícula, será exigida aos que não alegarem, ou notoriamente não puderem alegar escassez de recursos, uma contribuição módica e mensal para a caixa escolar.
Art 131 - A educação física, o ensino cívico e o de trabalhos manuais serão obrigatórios em todas as escolas primárias, normais e secundárias, não podendo nenhuma escola de qualquer desses graus ser autorizada ou reconhecida sem que satisfaça aquela exigência.
Art 132 - O Estado fundará instituições ou dará o seu auxílio e proteção às fundadas por associações civis, tendo umas; e outras por fim organizar para a juventude períodos de trabalho anual nos campos e oficinas, assim como promover-lhe a disciplina moral e o adestramento físico, de maneira a prepará-la ao cumprimento, dos seus deveres para com a economia e a defesa da Nação.
82 Art 129 - A infância e à juventude, a que faltarem os recursos necessários à educação em instituições particulares, é dever da Nação, dos Estados e dos Municípios assegurar, pela fundação de instituições públicas de ensino em todos os seus graus, a possibilidade de receber uma educação adequada às suas faculdades, aptidões e tendências vocacionais.
O ensino pré-vocacional profissional destinado às classes menos favorecidas é em matéria de educação o primeiro dever de Estado. Cumpre-lhe dar execução a esse dever, fundando institutos de ensino profissional e subsidiando os de iniciativa dos Estados, dos Municípios e dos indivíduos ou associações particulares e profissionais.
primeira manifestação pública organizada do período83.
Para conter as reivindicações, Vargas decreta que as eleições
seriam realizadas em outubro. Após as eleições Getúlio vê-se obrigado a
renunciar e o governo é entregue ao presidente do Supremo Tribunal Federal,
José Linhares. Após as eleições, o presidente escolhido foi o General Eurico
Gaspar Dutra.
Em 1º de fevereiro de 1946 a Constituinte inicia seus trabalhos e
em 18 de setembro de 1946 promulga a Constituição da República dos Estados
Unidos do Brasil.
Essa nova Carta inspirou-se nas anteriores de 1891 e de 1934,
reestruturou o equilíbrio entre os três Poderes, trouxe um rol dos direitos
fundamentais.
A educação foi tratada no Título “da família, educação e cultura”,
no Capítulo II “da educação e da cultura”. Essa Constituição traz o direito à
educação e prevê como responsáveis a família e o Estado, cabendo ao poder
83 Maria Victória Benevides aponta que sua importância decorreu: “1) de seu caráter precursor, por
ser a primeira manifestação ostensiva, coletiva e assinada, organizada por membros das elites
liberais, até então ausentes em qualquer contestação pública; 2) de seu significado regional, no
sentido de ser uma resposta dos mineiros ao que percebiam como a espoliação do poder político
de Minas Gerais a partir da ascensão de Getúlio Vargas, o que confirma a importância das
tradições regionalistas na política brasileira; 3) da reação do governo, recorrendo a sanções contra
os signatários (demissão ou aposentadoria dos cargos), o que foi objeto de grande repercussão
em todos os setores da oposição ao regime; 4) da vinculação entre os principais articuladores do
manifesto como movimento conspiratório que desembocaria na criação da União Democrática
Nacional (UDN) em torno da candidatura do brigadeiro Eduardo Gomes às eleições de 1945.”
Apud. OLIVEIRA, Romualdo Portela de. A educação na Assembléia constituinte de 1946. In:
FÁVERO, Osmar. A educação nas constituintes brasileiras: 1823-1988. 2. ed. Campinas: Autores
Associados, 2001. p. 154- 155.
público o principio de se buscar a solidariedade humana84.
O ensino é um direito social e subjetivo dos educandos, cabendo
ao Estado ditar as normas bases para sua implementação85. Faticamente, no
entanto, o o Brasil ainda não tinha meios de assegurar a todos os brasileiros o
ensino e por isso nem todas as pessoas em idade escolar tinham acesso à
educação.
Para aumentar o número de escolas e proporcionar a um maior
número de pessoas o ensino, autorizou-se a criação de escolas particulares que
deveriam obedecer as normas legais impostas.
Art 167 - O ensino dos diferentes ramos será ministrado pelos
Poderes Públicos e é livre à iniciativa particular, respeitadas as leis
que o regulem86.
Nota-se que o constituinte preocupou-se em trazer os princípios
educacionais constitucionais e continuou com a separação do Estado e Igreja,
autorizando o ensino religioso facultativo.
Art 168 - A legislação do ensino adotará os seguintes princípios:
I - o ensino primário é obrigatório e só será dado na língua
nacional;
II - o ensino primário oficial é gratuito para todos; o ensino oficial
ulterior ao primário sê-lo-á para quantos provarem falta ou
insuficiência de recursos;
III - as empresas industriais, comerciais e agrícolas, em que
trabalhem mais de cem pessoas, são obrigadas a manter ensino
primário gratuito para os seus servidores e os filhos destes; 84 Art 166 - A educação é direito de todos e será dada no lar e na escola. Deve inspirar-se nos
princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana 85 Art 5º - Compete à União: XV - legislar sobre: d) diretrizes e bases da educação nacional. 86 Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constitui%C3%A7ao46.htm
IV - as empresas industrias e comerciais são obrigadas a ministrar,
em cooperação, aprendizagem aos seus trabalhadores menores,
pela forma que a lei estabelecer, respeitados os direitos dos
professores;
V - o ensino religioso constitui disciplina dos horários das escolas
oficiais, é de matrícula facultativa e será ministrado de acordo com
a confissão religiosa do aluno, manifestada por ele, se for capaz,
ou pelo seu representante legal ou responsável;
VI - para o provimento das cátedras, no ensino secundário oficial e
no superior oficial ou livre, exigir-se-á concurso de títulos e provas.
Aos professores, admitidos por concurso de títulos e provas, será
assegurada a vitaliciedade;
VII - é garantida a liberdade de cátedra87.
Essa Carta também propôs a vinculação da renda de impostos
para garantir o fomento da educação e a descentralização de competência
legislativa. Cada órgão político teria seu sistema de ensino. Isso possibilitou que
os Estados organizassem seus próprios sistemas educacionais desde a pré-
escola até o ensino superior.
Art 169 - Anualmente, a União aplicará nunca menos de dez por
cento, e os Estados, o Distrito Federal e os Municípios nunca
menos de vinte por cento da renda resultante dos impostos na
manutenção e desenvolvimento do ensino.
Art 170 - A União organizará o sistema federal de ensino e o dos
Territórios.
Parágrafo único - O sistema federal de ensino terá caráter
supletivo, estendendo-se a todo o País nos estritos limites das
deficiências locais.
87 Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constitui%C3%A7ao46.htm
Art 171 - Os Estados e o Distrito Federal organizarão os seus
sistemas de ensino.
Parágrafo único - Para o desenvolvimento desses sistemas a
União cooperará com auxílio pecuniário, o qual, em relação ao
ensino primário, provirá do respectivo Fundo Nacional.
Foi garantida a liberdade de cátedra aos professores e a
vitaliciedade aos concursados. Além disso, estabeleceu-se que não haveria a
incidência direta de impostos sobre sua remuneração88
Em 31 de março de 1964 ocorre o golpe militar e o presidente
eleito é destituído.
José Luiz Paiva Bello analisa as conseqüências do período militar
para a educação:
Depois do golpe militar de 1964 muitos educadores passaram a
ser perseguidos em função de posicionamentos ideológicos.
Muitos foram calados para sempre, alguns outros se exilaram,
outros se recolheram a vida privada e outros, demitidos, trocaram
de função.
O Regime Militar espelhou na educação o caráter anti-democrático
de sua proposta ideológica de governo: professores foram presos
e demitidos; universidades foram invadidas; estudantes foram
presos, feridos, nos confronto com a polícia, e alguns foram
mortos; os estudantes foram calados e a União Nacional dos
Estudantes proibida de funcionar; o Decreto-Lei 477 calou a boca
de alunos e professores; o Ministro da Justiça declarou que
88 Art 187 - São vitalícios somente os magistrados, os Ministros do Tribunal de Contas, titulares de
Ofício de Justiça e os professores catedráticos.
Art 203 - Nenhum imposto gravará diretamente os direitos de autor, nem a remuneração de
professores e jornalistas.
"estudantes tem que estudar" e "não podem fazer baderna". Esta
era a prática do Regime89.
Com isso, a Carta veio a sofrer inúmeras alterações através de
emendas, culminando com o Ato Institucional n. 4, que convocou a reunião
extraordinária do Congresso Nacional. Em 24 de janeiro de 1967 foi promulgada
mais uma nova Constituição, entrando em vigor em 15 de março do mesmo ano.
A Constituição de 1967 caracteriza-se por ser um retrocesso
democrático. Sua primordial preocupação era garantir a segurança nacional e dar
maiores poderes à União e ao Presidente da República, por isso não causa
espanto que tenha retirado a previsão dos porcentuais destinados à manutenção e
desenvolvimento da educação.
José Afonso da Silva afirma:
Sofreu ela poderosa influência da Carta Política de 1937, cujas
características básicas assimilou (...) Reduziu a autonomia
individual, permitindo suspensão de direitos e de garantias
constitucionais, no que se revela mais autoritária do que as
anteriores, salvo a de 1937 (...) avançou no que tange à limitação
do direito de propriedade, autorizando a desapropriação mediante
pagamento de indenização por títulos da dívida ativa pública, para
fins de reforma agrária90.
Carlos Castello Branco relata os fins almejados durante a
elaboração do projeto:
As fontes inspiradoras e coordenadoras do projeto do Governo são
hoje visivelmente duas: ao Ministro da Justiça, Sr. Carlos Medeiros
Silva, coube consolidar os princípios institucionais do movimento
revolucionário e sugerir sugestões referentes à estrutura dos três
Poderes; ao Ministro Roberto Campos coube ajustar o texto aos 89 BELLO, José Luiz Paiva Op. Cit., p.87 90 SILVA, José Afonso da. Op. Cit., p. 87.
princípios de seu programa de ação econômica, que se projetam
assim para o futuro através de uma formulação que aspira à
estratificação91.
Para assegurar o regime militar e os ideais da revolução, a nova
Constituição tolheu a liberdade de expressão e relegou a educação à segundo
plano, cuidando do tema em seis artigos:
Art 168 - A educação é direito de todos e será dada no lar e na
escola; assegurada a igualdade de oportunidade, deve inspirar-se
no princípio da unidade nacional e nos ideais de liberdade e de
solidariedade humana.
§ 1º - O ensino será ministrado nos diferentes graus pelos Poderes
Públicos.
§ 2º - Respeitadas as disposições legais, o ensino é livre à
Iniciativa particular, a qual merecerá o amparo técnico e financeiro
dos Poderes Públicos, inclusive bolsas de estudo.
§ 3º - A legislação do ensino adotará os seguintes princípios e
normas:
I - o ensino primário somente será ministrado na língua nacional;
II - o ensino dos sete aos quatorze anos è obrigatório para todos e
gratuito nos estabelecimentos primários oficiais;
III - o ensino oficial ulterior ao primário será, igualmente, gratuito
para quantos, demonstrando efetivo aproveitamento, provarem
falta ou insuficiência de recursos. Sempre que possível, o Poder
Público substituirá o regime de gratuidade pelo de concessão de
bolsas de estudo, exigido o posterior reembolso no caso de ensino
de grau superior;
91 CASTELLO BRANCO, Carlos. Os militares no poder. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1977, p.
609.
IV - o ensino religioso, de matrícula facultativa, constituirá
disciplina dos horários normais das escolas oficiais de grau
primário e médio.
V - o provimento dos cargos iniciais e finais das carreiras do
magistério de grau médio e superior será feito, sempre, mediante
prova de habilitação, consistindo em concurso público de provas e
títulos quando se tratar de ensino oficial;
VI - é garantida a liberdade de cátedra92.
Prevê a igualdade de oportunidades ao tratar da educação como
direito de todos, o que foi um grande avanço na época. Aumentou a
obrigatoriedade de ensino fundamental para oito anos, sendo oferecido
gratuitamente. Para os demais graus a gratuidade era reservada ao aluno que
comprovasse falta de recursos, sob a condição de apresentar bom rendimento.
Houve a expansão das universidades no Brasil, mas elas ainda
não eram suficientes para receber todos os alunos interessados em cursá-las, e
nesse momento surge o vestibular como critério de seleção de alunos.
Art 169 - Os Estados e o Distrito Federal organizarão os seus
sistemas de ensino, e, a União, os dos Territórios, assim como o
sistema federal, o qual terá caráter supletivo e se estenderá a todo
o País, nos estritos limites das deficiências locais.
§ 1º - A União prestará assistência técnica e financeira para o
desenvolvimento dos sistemas estaduais e do Distrito Federal.
§ 2º - Cada sistema de ensino terá, obrigatoriamente, serviços de
assistência educacional que assegurem aos alunos necessitados
condições de eficiência escolar93
92 Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constitui%C3%A7ao67.htm.
Acessado em 07/06/2007
Trouxe a responsabilidade das empresas em proporcionar
educação para os filhos menores de seus empregados, bem como curso de
aprendizagem aos trabalhadores:
Art.170 - As empresas comerciais, industriais e agrícolas são
obrigadas a manter, pela forma que a lei estabelecer, o ensino
primário gratuito de seus empregados e dos filhos destes.
Parágrafo único - As empresas comerciais e industriais são ainda
obrigadas a ministrar, em cooperação, aprendizagem aos seus
trabalhadores menores.
O crescente descontentamento de estudantes, trabalhadores e
progressistas religiosos pressionou o governo, que reagiu editando os atos
institucionais e uma importante emenda constitucional, a n. 1/69.
A educação não foi muito afetada por essa emenda, mas retirou-
se mas teve uma perda significativa com a exclusão da importante menção à
igualdade de oportunidades. A Constituição passou a ser denominada
Constituição Federativa do Brasil.
Na matéria educacional as principais alterações foram: imposição
da idade dos filhos dos trabalhadores com direito ao ensino primário gratuito dos
sete aos quatorze anos, instituição do salário educação, obrigatoriedade das
empresas proporcionarem o preparo de empregados qualificados, restrição à
liberdade de cátedra que não poderia ter idéias subversivas94.
93 Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constitui%C3%A7ao67.htm.
Acessado em 07/06/2007
94 Art. 154. O abuso de direito individual ou político, com o propósito de subversão do regime
democrático ou de corrupção, importará a suspensão daqueles direitos de dois a dez anos, a qual
será declarada pelo Supremo Tribunal Federal, mediante representação do Procurador Geral da
República, sem prejuízo da ação cível ou penal que couber, assegurada ao paciente ampla defesa.
Por fim, temos a Constituição de 1988, que, conforme José Afonso
da Silva, trouxe grandes inovações:
Sua estrutura difere das constituições anteriores. Compreende
nove títulos, que cuidas: 1) dos princípios fundamentais; 2) dos
direitos e garantias fundamentais, segundo uma perspectiva
moderna e abrange dos direitos individuais e coletivos, dos direitos
sociais dos trabalhadores, da nacionalidade, dos direitos políticos
e dos partidos políticos; 3) da organização do Estado, em que,
estrutura a federação com seus componentes; 4) da organização
dos Poderes: Poder Legislativo, Poder Executivo e Poder
Judiciário, com a manutenção do sistema presidencialista,
derrotado o parlamentarismo, seguindo-se um capítulo sobre as
funções essenciais à Justiça, com ministério público, advocacia
pública (da União e dos Estados), advocacia privada e da
defensoria pública; 5) da defesa do Estado e da instituições
democráticas, com mecanismos do estado de defesa, do estado
de sítio e da segurança pública; 6) da tributação e do orçamento;
7) da ordem econômica e financeira; 8) da ordem social; 9) das
disposições gerais. Finalmente, vem o Ato das Disposições
Transitórias95.
Por toda sua estrutura a Constituição de 1988 ficou conhecida
como Constituição Cidadã, por formar um Estado Democrático de Direito e por dar
fundamental importância aos direitos sociais tratando-os de maneira aprofundada.
Sofreu grande influência da Constituição alemã que tem a
concepção do Estado social quando trata da obrigatoriedade da prestação de
direitos sociais que traz ao individuo garantias de exigir deste prestações positivas
como a educação, saúde, previdência demais direitos sociais.
Baseou-se, também, na Constituição francesa que dispunha:
“toda sociedade na qual não esteja assegurada a garantia dos direitos nem
95 SILVA, José Afonso da. Op. Cit., p. 82.
determinada a separação de poderes não possui Constituição96.
Prevê em seu art. 6º:
Art. 6º. São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho a
moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à
maternidade e à infância, assistência aos desamparados, na forma
desta Constituição.
José Afonso da Silva assim se manifesta sobre esses direitos:
São prestações positivas proporcionadas pelo Estado, direta ou
indiretamente, enunciadas em normas constitucionais, que
possibilitam melhores condições de vida aos mais fracos, direitos
que tendem a realizar a igualização de situações sociais desiguais.
São, portanto, direitos que se ligam ao direito de igualdade97.
A educação é tratada como um direito social por ser responsável
pela preparação para a cidadania (que é um dos fundamentos da República
Federativa do Brasil, previstos no art. 1º) e para a formação de recursos humanos
que permitirá garantir o desenvolvimento social construindo uma sociedade livre,
justa e solidária.
Nina Ranieri afirma:
A Constituição Federal, ao definir o dever do Estado com a
educação (arts. 205) e o seu comprometimento com o
desenvolvimento nacional e com a construção de uma sociedade
justa e solidária (art 3º) individualiza a educação superior como
bem jurídico, dado o seu papel fundamental na formação de
recursos humanos nas áreas da ciência, pesquisa e tecnologia
(art. 218, § 3º), e no desenvolvimento do País. Para garanti-lo,
franqueia a atividade à iniciativa privada, dentro dos limites fixados
96 MALISKA, Marcos Augusto. Op. Cit., p. 40. 97SILVA, José Afonso da Op. Cit., p. 285.
na lei; permite a vinculação de receita tributária para a manutenção
e desenvolvimento do ensino público ( art 165, IV); concede
autonomia às universidades (art. 207); garante gratuidade do
ensino nos estabelecimentos oficiais (art. 206); e encarrega o
Estado de assegurar padrão de qualidade, bem como acesso aos
níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística,
segundo a capacidade de cada um (art. 208, V), numa atuação de
permanente colaboração entre a União, Estados, o Distrito Federal
e os Municípios (art. 211)98.
Podemos verificar que apesar de a educação não vir
expressamente prevista no título dos direitos e garantias fundamentais, faz parte
desses direitos por ser verdadeiro direito fundamental do ser humano, pois é pela
educação que o homem conquista sua dignidade, liberdade e igualdade.
A dignidade da pessoa humana é um valor supremo que atrai o
conteúdo de todos os direitos fundamentais do homem, desde o
direito à vida. Concebido como referência constitucional
unificadora de todos os direitos fundamentais (...) Daí decorre que
a ordem econômica há de ter por fim assegurar a todos a
existência digna (art. 170), a ordem social visará a realização da
justiça social (art 193), a educação, o desenvolvimento da pessoa
e seu preparo para o exercício da cidadania (art 205) etc, não
como meros enunciados formais, mas como indicadores do
conteúdo normativo eficaz da dignidade da pessoa humana99.
Mesmo não estando expressa no art. 5º, o direito à educação é
um direito fundamental, conforme se depreende das lições de Maria Garcia sobre
direitos fundamentais:
98 RANIERI, Nina Beatriz. Educação Superior, Direito e Estado: na Lei de Diretrizes e Bases. São
Paulo: Edusp. p. 24 99 SILVA, José Afonso. Op. Cit. p. 109
Todos os direitos e garantias diretamente vinculados a um dos
cinco direitos fundamentais básicos constantes do art 5º, caput.
(...) assim vinculados diretamente ao direito à vida, os direitos
sociais constantes do art. 6º (a educação, a saúde, o trabalho, o
lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade
e à infância, a assistência aos desamparados)100.
Por ser um direito fundamental e essencial para o ser humano, a
educação deve proporcionar seu desenvolvimento, sempre em busca do aumento
de sua capacidade integral.
Desta forma, pode-se afirmar que a educação é um processo de
informação e de formação física e psíquica do ser humano para uma existência e
coexistência. É um direito individual que é, ao mesmo tempo, social101.
Regina Maria Fonseca Muniz:
A educação, como um dos direitos humanos, tendo origem no
direito natural, deve ser assegurada de maneira primordial.
Considerada apenas como um direito social, deve ser mais que
isso. Ínsita no direito à vida, é instrumento fundamental para eu o
homem possa se realizar como homem. Santo Tomás De Aquino,
o homem tem sede de saber. Seu potencial para aprender só se
transformará em ato no momento em que lhe forem propiciadas
todas as condições necessárias para tal. E isso só é possível
através da educação. É a consagração desse direito102.
Ao tratar deste direito, o constituinte estabelece os princípios da
100 Garcia, Maria. Mas, quais são os direitos fundamentais? In Revista de Direito Constitucional e
Internacional. Caderno de Direito Constitucional e Ciência Política. n. 39. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2002. p, 122 101 GARCIA, Maria. A nova lei de diretrizes e bases da educação nacional. In: Revista de Direito
Constitucional e Internacional. Caderno de Direito Constitucional e Ciência Política. n. 39. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 1988. p. 59. 102 MUNIZ, Regina Maria Fonseca. O direito à educação. Rio de Janeiro: Renovar, 2002. p. 79.
universalidade e da uniformidade, ou seja, a União é quem disciplinará as normas
gerais sobre educação, devendo sempre observar os princípios educacionais
constitucionais, pois o constituinte trouxe expressamente princípios que jamais
podem ser descumpridos. Trata-se de balizas, diretrizes que o legislador deverá
observar para a regulamentação das normas infraconstitucionais. O art. 206 prevê
que o ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:
a) Igualdade
Refere-se ao inciso I, igualdade de condições para acesso e
permanência na escola (visa que não haja qualquer discriminação para o ingresso
nas escolas e universidades, não deve haver privilégio de uns em detrimento de
outros).
O presente dispositivo trata da igualdade material, isto é, aquela
que equipara a todos perante os bens da vida, Ritinha Alzira Stevenson
Georgakilas leciona:
A igualdade material ou substancial deve ser entendida como o
tratamento uniforme de todos os homens e a sua equiparação no
que se refere à concessão de oportunidades. Estas devem ser
iguais, segundo a proposta da igualdade material ou substancial,
para todos os habitantes de determinado Estado na proporção dos
bens da cultura103.
Ela proporciona a igualdade de oportunidades.
A igualdade formal é a igualdade perante a lei, ela deve ser
aplicada de forma igualitária a todas as pessoas. Nada mais é do que a igualdade
jurídica abstrata, que trata todos como se estivessem nas mesmas condições. O
exemplo deste princípio é a previsão constitucional do art. 5º, caput, primeira
parte, que diz que todos são iguais perante a lei sem distinção de qualquer
103 Apud. GUERRA, Renata Rocha. Princípios constitucionais do ensino. Dissertação. São Paulo:
PUC, 1996. p. 103.
natureza
A igualdade formal vem perdendo espaço para a igualdade
material, pois essa visa a efetiva equiparação dos seres humanos mediante
constatação de desigualdades fáticas, utilizando a lei como instrumento de
concretização da igualdades.
O Estado deve oferecer escola para os necessitados e também
material escolar, transporte, alimentação e ensino especial para os deficientes.
Somente dessa maneira teremos a efetiva aplicação da igualdade104.
Maliska afirma:
O direito de igualdade gera direito subjetivo de exigir que, na
hipótese de situações idênticas, ocorra o tratamento isonômico.
Como o princípio também vincula as escolas privadas, nestas
pode ser admitido qualquer tipo de apadrinhamento ou distribuição
de benefícios, de forma desigual. Mesmo se tais benefícios não
provierem do Estado, mas da própria escola, esta não possui o
direito de arbítrio105.
II - liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o
pensamento, a arte e o saber (deve haver liberdade para a manifestação da
104 Em decorrência de tal postulado a Constituição trouxe as seguintes normas:
Art 208, III - atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino;
VI - oferta de ensino noturno regular, adequado às condições do educando;
VII - atendimento ao educando, no ensino fundamental, através de programas suplementares de material didático-escolar, transporte, alimentação e assistência à saúde.
Art 212, § 4º - Os programas suplementares de alimentação e assistência à saúde previstos no art. 208, VII, serão financiados com recursos provenientes de contribuições sociais e outros recursos orçamentários.
105 MALISKA, Marcos Augusto., Op. Cit., p. 174.
educação).É um dos objetivos fundamentais da República, pois a Constituição
prevê em seu art 3º, I, construir uma sociedade livre, justa e solidária (grifamos).
Apesar de ser um direito previsto pela Carta sabemos que não há
direitos absolutos e por essa razão ele pode ser restringido.
O direito livre de aprender é restringido quando o Estado se obriga
e também obriga os pais a colocar as crianças na escola para que, pelo menos,
completem o ensino fundamental. Não há liberdade de colocar ou não o filho na
escola, trata-se de um dever da família, que poderá escolher onde seu filho
estudará.
Tratando do assunto, Maliska ressalta que qualquer restrição ao
direito de liberdade deve ser ponderada, ou seja, deve-se verificar meios pelos
quais a restrição seja mínima possível e seus efeitos atinjam o máximo
pretendido106.
Esse direito engloba a liberdade de ensino dos professores,
liberdade do aluno na compreensão e no pensar científico, em outras palavras, é a
liberdade de aprender e ensinar107.
José Afonso da Silva entende que:
A fórmula empregada agora é mais compreensiva porque se dirige
a qualquer exercente da função de magistério, a professores de
qualquer grau, dando-se liberdade de ensinar, e mais ainda porque
também abrange a outra face da transmissão do conhecimento, o
outro lado da liberdade de ensinar, ou seja, a liberdade de
aprender assim como a liberdade de pesquisar (modo de aquisição
do conhecimento)108.
106 Ibidem, p. 175. 107 A Constituição com base nesse princípio garante no art. 218: O Estado promoverá e incentivará
o desenvolvimento científico, a pesquisa e a capacitação tecnológica. 108 SILVA, José Afonso da, Op. Cit., p, 248.
A sociedade só avança com a descoberta de novas técnicas, e
para que isso seja possível é preciso inovar, pesquisar, ter liberdade para criar e
inventar. A educação é responsável pelo avanço da nação. Quanto às
descobertas, Olivier Reboul leciona:
A invenção, que não pode ser programada: não se inventa por
encomenda; só pode ser fecunda se assumir o risco de ser livre de
toda a instrução dos poderes e de todo o constrangimento de
aplicação, ou até de êxito109.
III - pluralismo de idéias, de concepções pedagógicas, e
coexistência de instituições públicas e privadas de ensino. Vidal Serrano Nunes
assim se manifesta sobre o assunto:
Pois somente por meio de várias opções pedagógicas pode, tanto
quem oferece como quem recebe o ensino, escolher o que melhor
lhes atende, e a coexistência de escolas públicas e privadas, que
descarta tanto monopólio estatal (que cercearia as liberdades já
consagradas) como a atuação exclusiva da iniciativa privada110.
Através dele se possibilita a prática da tolerância, pois nosso país
é composto por diversas classes sociais, políticas, econômicas, culturais que
coexistem, não sendo possível estabelecer uma hegemonia nacional, uma vez
que cada região possui necessidades específicas. Está intrinsecamente ligada à
noção de democracia que, por sua vez, aceita as divergências de pensamento,
crenças, concepções pedagógicas e políticas.
Com todo esse pluralismo e como o Estado não é capaz de
proporcionar o ensino para todos, autorizou-se a criação de escolas privadas que
deverão observar o cumprimento das normas gerais da educação nacional e ter
autorização, além disso, a qualidade dessas escolas passa pelo crivo de
109 REBOUL, Olivier. A filosofia da educação. Lisboa: Edições 70, p. 37. 110 ARAÚJO, Luiz Alberto David; NUNES JÚNIOR, Vidal Serrano. Curso de direito constitucional.
São Paulo: Saraiva, 2004, p. 445.
avaliações do poder público.
Como a educação é um direito social, há o interesse estatal em
controlá-la, por isso a escola particular sofrerá intervenção do Estado.
IV - gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais:
significa que as escolas que forem públicas não poderão cobrar de seus
discentes, mesmo que estes possuam renda para fazê-lo.
Tal princípio sofre exceção prevista no art. 242:
Art. 242. O princípio do art. 206, IV, não se aplica às instituições
educacionais oficiais criadas por lei estadual ou municipal e
existentes na data da promulgação desta Constituição.
V - valorização dos profissionais do ensino, garantidos, na forma
da lei, planos de carreira para o magistério público, com piso salarial profissional e
ingresso exclusivamente por concurso público de provas e títulos.
É fundamental valorizar os profissionais do ensino para que
tenham dignidade no trabalho e sintam-se estimulados a desempenhar de maneira
satisfatória a atividade docente.
Para Maliska:
Condições adequadas de trabalho compreendem não só as
instalações físicas do estabelecimento de ensino, mas também e,
principalmente, os instrumentos, colocados à disposição do
professor para desempenhar um bom trabalho. Os instrumentos
são as bibliotecas, os laboratórios, enfim, os diversos meios de
que necessitam os diversos níveis de educação111.
VI - gestão democrática do ensino público, na forma da lei.
Sobre esse aspecto pontua Marcos Maliska: 111 MALISKA, Marcos Augusto Op. Cit. p. 185
Viver em uma sociedade democrática é participar dela
democraticamente, é o cidadão, em seu ambiente de vida, poder
dar a sua contribuição, participando, dando idéias, para melhor
solucionar os problemas112.
Assim, pais, alunos e professores devem ser convocados para
participar da política de ensino, do projeto pedagógico, bem como opinar sobre as
necessidades e peculiaridades da escola.
O debate acerca dos rumos da educação é de interesse de toda a
sociedade:
A Universidade não é um corpo isolado. Ela se integra numa
comunidade maior que é a sociedade civil. Influi e é influenciada
por esta. E hoje, especialmente, com os contínuos e vertiginosos
progressos da ciência e da técnica, a abertura e a comunicação
entre ambos são cada vez mais importantes. Pedir ao estudante
que se limite ao estudo das disciplinas curriculares e se afaste dos
problemas da sociedade significa condenar à marginalização os
futuros dirigentes da nação e, ao mesmo tempo, privar a
coletividade da contribuição inestimável das críticas e sugestões
de um setor particularmente capaz de acelerar as transformações
necessárias a uma sociedade em mudança113.
VII - garantia do padrão de qualidade. Esse princípio é dos mais
importantes, pois assegura o direito à igualdade. Não podemos ter ensino
diferenciado para pessoas que possuem a mesma capacitação, é dever das
escolas ministrarem o ensino com seriedade, sempre com vistas ao
desenvolvimento do conhecimento e do pensar. Não é admissível que pessoas na
mesma situação tenham ensinos diversos em que se finge que aprende e finge
que se ensina, é necessário que haja o máximo de seriedade no conteúdo
ministrado e que ele seja suficiente para capacitar o aluno em sua vida social e
112 MALISKA, Marcos Augusto. Op. Cit., p. 216. 113 MONTORO, Franco. Estudos de Filosofia do Direito. São Paulo: Saraiva, 1995. p. 237
profissional.
O poder público chama para si a responsabilidade de oferecer aos
mais necessitados condições de estudar em escolas com a mesma qualidade das
particulares, a fim de que todos tenham a mesma oportunidade de se desenvolver.
O Estado traz apenas um conteúdo mínimo a ser ministrado nas
escolas, mas estas podem ampliar o plano pedagógico nacional adequando-o à
realidade local. O art. 26 da LDB114 permite a complementação do conteúdo por
parte dos estabelecimentos de ensino.
Toda escola deve ter uma base mínima que será igual para todas,
mas nada impede que elas acrescentem conteúdos a serem ministrados. É
importante que o ensino tenha qualidade, pois em nada adiantaria ter padrões
mínimos se o que se leciona não é absorvido pelos alunos. É direito do aluno
exigir a qualidade do ensino e função do Estado fiscalizá-lo para garantir escolas
de qualidade.
Rubem Alves faz o seguinte relato sobre a qualidade:
Todos os seres vivos cuidam da qualidade. Peixe foge da água
poluída, passarinho não faz ninho em chaminé de fábrica, cachorro
não come comida estragada. O nenezinho, ignorante de tudo o
mais, sabe distinguir entre leite bom e leite ruim (...) o que é bom
dá prazer. O que é ruim faz sofrer (...) Sapiência é isto: o
conhecimento do bom sabor que traz felicidade ao corpo. E sábio,
no sentido etimológico, é o provador, degustador, aquele que,
havendo se diplomado na cozinha de Babette, põe a comida na
boca e diz: ‘Delicioso! Está bom para ser servido’ (...) Assim são
nossas escolas, que ensinam tudo sobre fogo, panelas,
114 Art 26 - Os currículos do ensino fundamental e médio devem ter uma base nacional comum, a
ser complementada, em cada sistema de ensino e estabelecimento escolar, por uma parte
diversificada, exigida pelas características regionais e locais da sociedade, da cultura, da economia
e da clientela. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil/LEIS/L9394.htm
ingredientes, condimentos, reações, transformações, mensurações
– mas em nenhum lugar ensinam a arte suprema sem a qual não
se faz comida boa: a arte de degustar. Nas escolas forma
cozinheiros castrados em língua (...) A vida é uma grande cozinha.
Quem aprendeu a sabedoria da cozinha aprendeu a sabedoria
necessária para se viver. E a sabedoria da cozinha é esta: que
tudo o que se aprende, que se sabe que se faz tem por objetivo
esse momento supremo de felicidade e prazer. Controle de
qualidade é controle de prazer. Gestão de qualidade é gestão de
prazer. Qualidade total é prazer total115.
Por meio da observância desses princípios será possível alcançar
a finalidade prevista no dispositivo a seguir:
Art. 205 - A educação, direito de todos e dever do Estado e da
família, será promovida e incentivada com a colaboração da
sociedade, visando o pleno desenvolvimento da pessoa, seu
preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o
trabalho. (grifo nosso)
Os princípios devem ser obedecidos, pois não são meros
conselhos, mas sim nortes que estruturam o sistema constitucional. Nesse
sentido, Celso Antônio Bandeira de Mello pontua:
Violar um princípio é muito mais grave que transgredir uma norma.
A desatenção ao princípio implica ofensa não apenas a um
especifico mandamento obrigatório, mas a todo o sistema de
comandos. É a mais grave forma de ilegalidade ou de
inconstitucionalidade, conforme o escalão do principio atingido,
porque representa insurgência contra todo o sistema, subversão
de seus valores fundamentais, contumélia irremissível a seu
arcabouço lógico e corrosão de sua estrutura mestra. Isto porque,
ao ofendê-lo, abatem-se as vigas que o sustém e alui-se toda a 115 AUTOR, Conversa com quem gosta de ensinar (+ qualidade total na educação). 4. ed.
Campinas: Papirus, 2001, p. 127- 134 .
estrutura neles esforçada116.
Infelizmente a finalidade e os princípios educacionais não têm sido
respeitados. O que vemos são pessoas portadoras de diplomas e títulos e
totalmente desqualificadas para o exercício de sua profissão, em nada
contribuindo para a melhora da sociedade.
José Afonso da Silva afirma que:
A grande expansão dos cursos jurídicos no País, demonstra que o
Conselho Nacional de Educação não é nada rigoroso no autorizar
o funcionamento desses cursos (...) essa situação acaba gerando
um geométrico e crescente aumento de cursos jurídicos, muitos
dos quais sem qualquer substancia, criando uma legião de
bacharéis desesperados, em prejuízo não só de si próprios, como
da coletividade e da imagem dos operadores do direito,
especialmente os advogados117.
E continua:
Ora, o baixíssimo nível de aprovação nesse Exame (cerca de 15%
dos candidatos) vem demonstrando a precariedade do ensino
jurídico na maioria das Faculdades de Direito do País. Isso é
confirmado pelo programa OAB Recomenda118.
É por essa razão que propomos um novo método de ensino na
área jurídica. Trata-se de método que vem sendo aplicado com sucesso na
Medicina, cumprindo com as finalidades e princípios constitucionais acima
mencionados.
116 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Elementos de Direito Administrativo. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 1980. p. 230. 117 Ética Acadêmica. In: RIBEIRO, Lauro Luiz Gomes; BERARDI, Luciana Andréa Accorsi. Estudos
de direito constitucional em homenagem à professora Maria Garcia. São Paulo: IOB- Thomson,
2007. p.209-211 118 Ibidem, p. 211.
4. O ENSINO SUPERIOR E ALGUNS PROBLEMAS
O ensino superior vem apresentando diversos problemas e parte
deles já é percebido há muito tempo. Embora no ensino tenhamos muitas
questões locais, para os fins desse estudo vamos destacar as dificuldades que
estão presentes de modo universal, isto é, independentemente da região.
O problema do ensino jurídico já foi relatado na literatura por Eça
de Queirós, em sua obra O conde de Abranhos:
Têm alguns espíritos, ávidos de inovação, ainda que no fundo
sinceramente afeiçoados aos princípios conservadores,
sustentando que o sistema da sebenta (como, na sua jovial
linguagem, lhe chama a mocidade estudiosa) é antiquado. Eu
considero, porém a sebenta como a mais admirável disciplina para
os espíritos moços. O estudante habituando-se, durante cinco
anos, a decorar todas as noites, palavra por palavra, parágrafos
que há quarenta anos permanecem imutáveis, sem os criticar, sem
os comentar-ganha o hábito salutar de aceitar, sem discussão, e
com obediência, as idéias preconcebidas, os princípios adotados,
os dogmas provados, as instituições reconhecidas. Perde funesta
tendência – que tanto mal reproduz – de querer indagar a razão
das coisas, examinar a verdade dos fatos; perde enfim funesto
hábito de exercer o livre-exame – que não serve senão para ir
fazer um processo cientifico a venerandas instituições, que são a
base da sociedade. O livre-exame é o principio da revolução. A
ordem o que é? – A aceitação obediente das idéias adotadas. Se
se acostuma a mocidade – a não receber nenhuma idéia de seus
mestres, sem verificar se é exata – corremos o perigo de os ver,
mais tarde, não aceitar nenhuma instituição do seu país sem
verificar se é justa. Temos o espírito da revolução – que termina
pelas catástrofes sociais. Hoje, destruído o regime absoluto, temos
a certeza que a Carta liberal é justa, é sábia, é útil, é sã. Que
necessidade há de examinar, discutir, verificar, criticar, comparar,
pôr em dúvida? O hábito de decorar a sebenta – produz mais tarde
o hábito de aceitar a Carta. A sebenta é a pedra angular da Carta!
O Bacharel é o gérmen do Constitucional119.
O texto transcrito evidencia muito dos problemas que ainda hoje
são encontrados, como professores que não ensinam o aluno a pensar ou que só
aceitam o posicionamento que julgam correto, alunos que são acomodados a
decorar e fazer o que o professor manda sem o menor questionamento e que no
futuro são reprodutores fiéis do que decoraram, currículos escolares
desatualizados que seguem a mesma tradição como se a necessidade de hoje
fosse a mesma de outrora.
Versando sobre o assunto afirma José Afonso da Silva:
A grande expansão dos cursos jurídicos no País demonstra que o
Conselho Nacional de Educação não é nada rigoroso no autorizar
o funcionamento desses cursos (...) essa situação acaba gerando
um geométrico e crescente aumento de cursos jurídicos, muitos
dos quais sem qualquer substancia, criando uma legião de
bacharéis desesperados, em prejuízo não só de si próprios, como
da coletividade e da imagem dos operadores do direito,
especialmente os advogados120.
Para esse autor o baixíssimo nível de aprovação no Exame de
Ordem, que atualmente é cerca de 15% dos candidatos, demonstra a
precariedade do ensino jurídico na maioria das Faculdades de Direito do país. Isso
119 Apud. AGUIAR, Roberto A. R. de. Habilidades: ensino jurídico e contemporaneidade. Rio de
Janeiro: DP&A editora, 2004. p. 179-180. 120 Ética Acadêmica. In: RIBEIRO, Lauro Luiz Gomes; BERARDI, Luciana Andréa Accorsi. Estudos
de direito constitucional: em homenagem à professora Maria Garcia. São Paulo: IOB- Thomson,
2007. p.209-211.
é confirmado pelo programa “OAB Recomenda”121.
A par desse cenário, advogamos em prol de um novo método de
ensino na área jurídica, que vem sendo aplicado na Medicina e tem demonstrado
cumprir com as finalidades e princípios constitucionais acima mencionados.
Nosso estudo tem como ponto de partida as evidências que
cercam a atividade docente. Na maioria das vezes a docência é exercida como
profissão secundária a outra profissão principal. Uma das causas é a forma da
composição do quadro docente, pois a maioria das escolas de Direito busca
formar seu corpo docente com profissionais cuja atividade principal é a profissão
de advogado, juiz, promotor, procurador ou delegado, e muitos desses
profissionais não têm a capacitação pedagógica necessária.
José Afonso da Silva critica as faculdades particulares nesse
aspecto ao afirmar que a seleção de professores, em sua maioria, é feita entre
profissionais sem titulação acadêmica e por meio de contratação, segundo
escolha e critério de seus proprietários, de sorte que seus corpos docentes são
precários e instáveis122.
Nesse sentido, Gustavo Smizmaul Paulino pondera:
Lamentavelmente, os cursos jurídicos notabilizam-se pela pouca
exigência acadêmica no que se refere ao corpo docente.
Freqüentemente, o professor de Direito é um profissional da ativa
que leciona para complementar sua renda ou porque o status de
professor de Direito pode gerar-lhe dividendos em marketing
pessoal. É comum a prática entre faculdades de Direito agraciar,
por exemplo, juizes, promotores, delegados e procuradores do
Estado ou advogados famosos com uma cadeira. É certo que
muito desses profissionais se dedicaram (e ainda se dedicam) com
esmero no ensino superior, sendo importante referência intelectual
121 Ibidem. p. 211. 122 SILVA, José Afonso da. Ética Acadêmica. p. 217.
e profissional para os estudantes. Mas isso, por si só, não afasta a
realidade de contratações sem o mínimo de aptidão para o
trabalho educacional que exige outras habilidades além de saber
redigir petições ou ditar sentenças. Muitos fizeram e ainda fazem
da sala de aula palco da auto-idolatria, de exercício descomedido
da autoridade jurídica, entre outras práticas perniciosas num
verdadeiro desserviço educacional a pretexto de estarem
mostrando os bastidores do Direito e de como na prática a teoria é
outra. Certamente, a valorização e a profissionalização do corpo
docente com ênfase na vocação para o magistério superior são
fundamentais para a recuperação da vitalidade que o curso de
Direito há muito tempo deixou de demonstrar123.
Como conseqüência dessa dupla atuação profissional, os
professores geralmente possuem pouco tempo para a atualização, e quando o
fazem em regra são autodidatas. Raramente fazem um curso de pedagogia para
que saibam como lidar com esse processo tão complicado e fascinante que é a
educação, o que gera insegurança ao ensinar, verificado em atitudes auto-
protetoras como comunicação muito formal, exagerado nível de exigência nas
provas, emprego de ironia, sarcasmo, tudo visando manter sua autoridade e auto-
estima. Também pode ocorrer o inverso: atitudes humildes, facilitação demasiada
nas provas e trabalhos e tolerância à indisciplina124.
Não pode haver bom ensino jurídico se o corpo docente não
dispõe de um bom preparo acadêmico, para o exercício de suas
elevadas funções (...) até porque os compromissos do professor
de direito se estendem além da sala de aulas, incluindo a tarefa de
educar para a cidadania, capacitar para o exercício ético da
123 Das razoes da crise do ensino do Direito: subsídios para o exame da possibilidade de um saber
emancipatório. Dissertação Mestrado. PUC: São Paulo, 2004. p. 65. 124 BORDENAVE, Juan Díaz; PEREIRA, Adair Martins. Estratégias de ensino-aprendizagem. 25
ed. Petrópolis: Editora Vozes, 2004, p.16.
profissão, preparar para os desafios profissionais, incutir a chama
da busca no justo espírito do estudante de direito125.
É necessário valorizar o professor como tal, incentivar a pesquisa
e a atualização. O docente é aquele que está disposto a constantemente buscar o
aprendizado e ver no aluno uma pessoa que ali está para compartilhar
conhecimento e aprender. Ele deve ter ciente que na sala de aula sua função é de
professor, e não qualquer outra que exerça fora dali.
Segundo Freire e Shör:
Não há docência verdadeira em cujo projeto não se encontre a
pesquisa como pergunta, como indagação, com curiosidade,
criatividade, assim como não há pesquisa em cujo andamento
necessariamente não se aprenda porque se conhece e não se
ensine porque se aprende126.
Os problemas do ensino jurídico não são atuais, mas nos parece
que ainda hoje eles permanecem os mesmos. A citação de José Eduardo Faria foi
feita em 1987, no entanto, parece ter sido feita ainda hoje:
As Faculdades de Direito (...) funcionam como meros centros de
transmissão do conhecimento jurídico oficial e não, propriamente,
como centros de produção do conhecimento jurídico. Neste
sentido, a pesquisa nas Faculdades de Direito está condicionada a
reproduzir sabedoria codificada e a conviver respeitosamente com
as instituições que aplicam (e interpretam) o direito positivo. O
professor fala de códigos e o aluno aprende (quando aprende) em
códigos (o conhecimento jurídico tradicional é um conhecimento
125 SILVA, José Afonso da. Ética acadêmica. p. 218 126 Apud. MELLO, Reynaldo Irapuã Camargo. Ensino Jurídico: formação e trabalho docente.
Curitiba: Juruá, 2007. p. 24.
dogmático e as suas referencias de verdade são ideológicas e não
metodológicas)127.
Outros problemas podem surgir, como: falta de integração entre os
programas das diversas disciplinas ocasionando a repetição dos temas e erro de
seqüência cronológica; falha no planejamento do conteúdo programático, que
prevê carga horária insuficiente para a quantidade de matéria, ocorrendo apenas o
cumprimento de parte da grade de temas; os programas são confeccionados sem
prévia pesquisa de necessidades e condições da região onde está localizada a
faculdade, havendo pouca aplicação no desempenho profissional. Versando sobre
o assunto adverte Rubens Approbato Machado:
As deficiências do ensino, aliadas a grades curriculares defasadas,
a corpos docentes descomprometidos com a eficiência dos cursos,
a interesses meramente mercantilistas ensejadores da profusão de
cursos e de muitas de suas extensões sem a necessária
capacitação, a flagrante falta de formação e de informação dos
alunos, são alguns dos motivos de um despreparo gritante de uma
ponderável parcela dos operadores do Direito128.
Ainda mais grave é a fragmentação dos conhecimentos, conforme
salienta Edgar Morin:
Há inadequação cada vez mais ampla, profunda e grave entre os
saberes separados, fragmentados, compartimentados entre
disciplinas, e, por outro lado, realidades ou problemas cada vez
mais polidisciplinares, transversais, multidimensionais,
transnacionais, globais, planetários.Em tal situação, tornam-se
invisíveis: os conjuntos complexos; as interações e retroações
127 FARIA, José Eduardo A reforma do ensino jurídico. Porto Alegre: Fabris, 1987. p. 34. 128 Apud. José Afonso da Silva. Ética acadêmica, p. 212.
entre partes e todo; as entidades multidimensionais; os problemas
essenciais129.
Embora seja uno, o Direito é didaticamente dividido em matérias
para facilitar o aprendizado: civil, penal, constitucional, comercial, tributário,
consumidor, trabalho e processual. Essa divisão, no entanto, faz com que o
discente não consega relacioná-las, tampouco harmonizá-las com outras ciências.
Edgar Morin também trata do assunto:
A supremacia do conhecimento fragmentado de acordo com as
disciplinas impede freqüentemente de operar o vínculo entre as
partes e a totalidade, e deve ser substituída por um modo de
conhecimento capaz de apreender os objetos em seu contexto,
sua complexidade, seu conjunto130.
Sem dúvida esse é um dos principais motivos pelo qual o aluno
não sabe resolver os casos práticos ou elaborar petições e recursos. Sabemos
que quando o cliente procura o advogado ele espera que o profissional tenha
conhecimento global da área jurídica. Ao advogado cabe verificar a situação
econômica e psicológica do cliente ao narrar os fatos.
Elizete Alves afirma:
O discurso educacional tradicional tem como vertente a formação
integral, todavia, na prática é invertida, voltada ao individualismo
de cada disciplina, impedindo a formação do cidadão crítico,
consciente de sua participação social e política, sem a base sólida
da formação global voltada ao desenvolvimento de suas
129 MORIN, Edgar. A cabeça bem feita: repensar a reforma, reformar o pensamento. 8. ed. Rio de
Janeiro: Bertrand Brasil, 2003, p. 112. 130 MORIN, Edgar Os sete saberes necessários à educação do futuro. São Paulo: Cortez, 2004. p.
14.
potencialidades, habilidades e competências e continua: é urgente
a busca por caminhos de integração do conhecimento científico
quebrando o paradigma da desconexão e da fragmentação, da
visão ortodoxa e conservadora, herança de um positivismo jurídico
que pautou a formação pedagógica até o final do século passado,
quando a interpretação por partes significativa uma forma bem
mais simples de entender o mundo e seus fenômenos131.
O ensino superior é estruturado em disciplinas132, que, por sua
vez, são os componentes dos departamentos, os quais formarão o corpo do curso
de Direito. Nota-se, todavia, que as informações são transmitidas sem considerar
o ser humano, a quem todo esse conhecimento se destina e aquele que sofrerá
seus efeitos.
Para que o ensino cumpra com suas finalidades deve-se atentar
para a responsabilidade da instituição de ensino:
A responsabilidade da universidade na formação do profissional do
Direito está fundamentada na qualidade do curso e isso abarca um
bom projeto pedagógico que priorize a interdisciplinaridade, que
propicie a inserção do profissional no mercado de trabalho, com
destaque, não pelo simples fato de ter um diploma, mas, sobretudo
pela capacidade de argumentação e de percepção crítico-
construtiva do fenômeno jurídico, qualificação do corpo docente,
131 ALVES, Elizete Lanzoni. A interdisciplinaridade no ensino jurídico: constuição de uma proposta
pedagógica. In: MANDARO, Dilsa; ALVES, Elizete Lanzoni; SANTOS, Sidney Francisco Reis dos.
Ensino Jurídico interdisciplinar: um novo horizonte para o Direito. Florianópolis: OAB/SC, 2005, p.
18-19 132 “Disciplina significa um conjunto de conhecimentos específicos de conteúdos de formação e
estrutura cognitiva, com objeto próprio de investigação e metodologia de desenvolvimento.”. A
interdisciplinaridade é “a inter-relação entre as disciplinas, considerando seus objetivos e
metodologias próprias para a estruturação de um conhecimento compartilhado. Exemplo: a relação
entre Psicologia, Direito e Serviço Social para atendimento ao público em um Núcleo de Prática
Jurídica, com a aplicação dos conhecimentos inerentes a cada uma das áreas envolvidas.”
Ibidem. p. 21-22
grade curricular adequada, biblioteca, pesquisa, extensão,
atividades complementares, núcleo de prática, mas isso significa
parte do processo de excelência, pois nada faz sentido sem o
interesse efetivo do aluno no aproveitamento da estrutura
educacional proporcionada133.
Embora primordial, buscar a natureza humana não é suficiente
para a ampliação do conhecimento, pois devemos ter em mente que o saber e a
cultura do ser humano iniciaram-se com o primeiro pensador da espécie. Desse
modo, o conhecimento se faz por meio de processo dinâmico, evolutivo e de
acumulação progressiva, pertencendo a toda a humanidade, pois se formou
graças a incontáveis seres humanos que existiram em distintos espaços temporais
e geográficos.
O ensino do direito não se restringe apenas a normas jurídicas e
sua interpretação, pois, como ciência, o direito visa a sociedade, que, por sua vez,
é composta por inúmeros conceitos: religião, moral e costumes. Além disso, a
sociedade também é influenciada pela posição geográfica e seus elementos
decorrentes: clima e meios produtivos. Nesse sentido, ensinar o direito sem
associá-lo à realidade tem como resultado um ensino-aprendizagem de
característica reducionista, fria e desumana, pois não avalia as condições
individuais e sociais a que se dirige.
Esclarece Roberto Aguiar:
As extensões, salvo as exceções raras de sempre, não prestam
serviços às comunidades, não estimulam as práticas da cidadania,
não tematizam questões importantes para a sociedade, não se
manifestam diante de injustiças e problemas que afligem as
diversas regiões, o país e o mundo, não estimulam práticas
multidisciplinares, contentando-se em repassar temas da
internalidade dogmática do direito, ou questões que vêm sendo
133 Ibidem. p. 26.
discutidas há séculos, mas que propiciam palco para egos que
necessitam constantemente de um pente para não se dissolverem
em nidificação (...) Ante esse paradoxo de formar profissionais
práticos, mas referidos a um mundo inexistente, a concretude local
e os problemas que ela traz são olimpicamente esquecidos, como
objetos da ação jurídica. Assim, em regiões com graves problemas
ambientais, o direito ambiental não consta do currículo; nas que
apresentam problemas minerários, o direito da mineração é
ignorado; nas regiões com grave conflito rural, o direito agrário não
é tocado. É como se o direito existisse independentemente das
sociedades que tem de normar. Se não houver uma inserção das
escolas no contexto onde estão, certamente elas não terão
qualquer importância social para a comunidade, a não ser a
alimentação de um orgulho beócio pra existir uma faculdade no
local134.
Há preciso ser feito o eterno questionamento do ”por que?”. Vale
dizer, quais os fundamentos e fatos sociais que clamaram por uma norma
jurídica? Quais as conseqüências sociais e individuais que dela decorreram? Elas
respeitam os princípios fundamentais da dignidade humana, a condição humana?
As aulas são demasiadamente expositivas, sem a participação do
aluno, com poucas aulas práticas marcadas ainda por escasso ou deficiente uso
de recursos audiovisuais. Normalmente o acervo da biblioteca é desatualizado e
há baixa proporção de livros para o número de alunos, sem contar a ausência de
indicação bibliográfica pelos professores, horário de atendimento incompatível e
instalações incômodas. É preciso implementar o debate entre docente e discente,
sempre no sentido de questionar como a matéria ministrada se aplica na
sociedade e quais são as relações interdisciplinares relacionadas ao tema.
Para Camargo Mell, toda prática pedagógica encontra suas
dimensões significativas uma vez que é uma ação educativa. Portanto, ensinar
134 AGUIAR. Roberto A. R. de. Op. Cit. p. 182-183.
Direito é mais do que proferir lições em sala de aula é despertar a consciência
jurídica do acadêmico135.
Quanto aos alunos critica-se:
Muito numerosos para as instalações disponíveis e em turmas
bastante heterogêneas; demasiadamente exigentes em relação ao
professor, de quem esperam receber tudo esmiuçado;
irresponsáveis e imaturos; muitos ingressam em determinadas
faculdades sem autêntica vocação, apenas por serem da região ou
por terem passado no vestibular. Por esta razão estão
desajustados e desinteressados; passivos apesar do desejo de
independência; sem hábito de estudar ou de pensar por sua conta;
sem base suficiente para os estudos universitários; valorizam
excessivamente as notas e diploma e muito menos aprender136.
Já com base na deficiência do aluno, as escolas e universidades
passaram a adotar a idéia de que não se deve reprovar o aluno para evitar sua
evasão. Essa idéia é inclusive a adotada pelo Ministério da Educação, que não
aceita reprovações no ensino fundamental, resultando em alunos analfabetos e
com diploma. Regis Morais assim se manifesta:
A grande evasão escolar, pode dever-se, em parte, a exigências
intelectuais elitistas e promotoras pela erudição; mas, com muito
mais verdade, ela esconde nossas conhecidas precariedades
econômicas e financeiras. Ocorre, no entanto, que as escolas
freqüentemente tentam evitar os abandonos em massa diminuindo
suas exigências no ensino mediante formas de avaliação que não
se constrangem a aprovar inclusive os que não estudam e não
produzem. Isso é muito mais expediente de sobrevivência
institucional do que intento de promoção do ser humano. Como o
ensino de 2º grau nem sempre é levado a sério, com extraordinária
135 Op. Cit., p. 64. 136 BORDENAVE, Juan Díaz Op. Cit., p.18.
exigência material escolar e livros descartáveis mas um tanto sem
empenho real de ensino, chegam às universidades inúmeros
alunos mal preparados e incultos; isto é, o 2º grau empurra para a
universidade uma responsabilidade terrível, pois esta deverá
colocar profissionais no mercado – coisa muito mais delicada do
que promover para um grau seguinte e lavar as mãos -, e o meio
acadêmico vê-se em dificuldades para cumprir sua tarefa. Ora,
ante um quadro como este, as universidades têm que desenvolver
recursos de apoio ao aluno mal preparado, a fim de proteger a
sociedade de futuros maus profissionais e evitar humilhações que
recairão sobre o individuo formado, tendo nas mãos sua
habilitação mãos não contando com a habilidade
correspondente137.
A maioria das faculdades faz uso do vestibular para o
recrutamento de seus alunos. Essa técnica avalia os conhecimentos que o aluno
adquiriu durante os ensinos fundamental e médio, e os mais capacitados são
aprovados. A nosso ver essa seleção é mais eficaz para as faculdades públicas,
pois na rede particular há elevado número de faculdades, com considerável
número de vagas que, para a maioria, torna-se apenas uma mera
formalidade.Não se pode desconsiderar que a instituição de ensino particular visa
lucro, por isso a maior parte dos inscritos ingressa na ensino superior.
A maioria dos alunos apresenta deficiências dos ensinos
fundamental e médio, como vocabulário limitado e incapacidade de interpretação.
Por conseqüência, não compreendem os termos e significado das normas e por
isso passam a copiar ao invés de criar, ou seja, não conseguem aplicar o
conhecimento aprendido. Para José Afonso da Silva a questão se revela mais
grave, quando se sabe que o ensino médio no País sofre de crise crônica de
qualidade, de sorte que os candidatos ao ensino superior carecem de formação
adequada para o bom desempenho dos respectivos cursos, e conclui relatando
sua experiência docente: 137 MORAIS, Regis. A universidade desafiada. Campinas: Editora da Unicamp, 1995. p. 49.
Tínhamos, porém, grande dificuldade, especialmente nos dois
primeiros anos, porque os estudantes que ali ingressavam eram
profundamente mal preparados (...) Lembro-me de um senhor que
era açougueiro, dono do açougue, que resolveu conquistar um
diploma de direito, mas não tinha a menor condição, porque era
semi-analfabeto (...) Sem ser muito rigoroso, assim mesmo não
tive outro remédio senão reprová-lo (...) isso era, de fato, penoso
também para o professor que sabia que aquele aluno tinha
despendido recursos financeiros e tempo para freqüentar a escola.
Mas, por outro lado, aprová-lo seria dar-lhe uma ilusão de
conhecimento e capacidade que ele não tinha (...) Fiquei aliviado,
porque me pareceu que se aquele aluno continuasse como
açougueiro prestaria melhor serviço à coletividade do que
malformado em Direito138.
A revista Exame constatou em recente publicação:
Há muito tempo sabemos que as deficiências do Brasil na
educação afetam a distribuição de renda e o crescimento pessoal
dos indivíduos. Com a pesquisa ficou claro que essas deficiências
também provocam a perda de competitividade do país em relação
a economias com as quais disputa o mercado global (...) Há seis
meses, Elizabeth Cerqueira Leonetto, diretora de recursos
humanos da Fnac, tenta, em vão, encontrar alguém qualificado em
literatura para uma das lojas de São Paulo e destaca que é
lamentável e frustrante ver universitários que não sabem escrever,
falar em público e trabalhar em equipe139.
Também se nota dificuldades na avaliação, pois geralmente se
dedica a medir a capacidade de retenção do aluno, e não seu crescimento
integral. A falta de monitores, de auxiliares de ensino e de material didático para
138 SILVA, José Afonso da. Ética acadêmica, p. 221-226. 139 Salomão, Alexa. O preço da ignorancia. Revista Exame. Ano 40, n. 19 27/09/2006. São Paulo:
Editora Abril, p. 21-24.
os professores agrava esse quadro. Convém anotar que as avaliações não estão
sendo satisfatórias para medir a absorção do conhecimento e a capacidade de
raciocínio dos alunos e isso pode decorrer da pouca freqüência com que é
aplicada (semestralmente). O formato da prova também compromete a avaliação,
pois não exige raciocínio, mas mera memorização. Esse tipo de prova é
ultrapassado, especialmente porque o conhecimento não pode ser medido em um
único dia, sem contar as manobras incríveis dos alunos para “colar” sem que o
professor perceba.
Nessa esteira leciona Roberto Aguiar:
(...) as avaliações se estruturam como farsas, como formalidades
de professores amedrontados pelas direções das escolas, que
temem a perda de alunos e que acreditam que o processo
educacional se traduz por um contrato sinalagmático de compra e
venda a prazo entre um pagador-estudante que deve saldar seus
compromissos financeiros pontualmente para adquirir o direito de
receber o diploma, quando da quitação de todas as prestações. O
resultado dessa concepção na avaliação é o de nada ser exigido,
ou, se exigido, não reprovar. Aos alunos, nessas relações, não
cabe reclamar de professores medíocres, mas tão-somente
daqueles que exigem, isto é, daqueles que quebram o pacto da
mediocridade140.
No nosso entendimento esses são apenas alguns pontos gerais
que clamam por solução para melhorar o ensino.
4.1 O QUE É APRENDER?
A palavra aprender deriva de apreender, que pode ter os
seguintes significados:
140 SILVA, José Afonso da. Ética acadêmica Op. Cit., p. 188.
1. tomar conhecimento de; 2. reter na memória, mediante o
estudo, a observação ou a experiência ; 3. tornar-se apto ou capaz
de alguma coisa, em conseqüência do estudo, observação,
experiência e advertência141.
Para Platão o aprendizado deve-se à associação das coisas entre
si, pela qual a alma pode, após haver captado alguma coisa, captar também a
outra que a esta se encontra vinculada, ou seja, aprender é relembrar142. Dessa
feita, há aprendizagem quando o homem adquire uma capacidade diversa da que
possuía, ganha novas experiências, emoções e conhecimentos.
A sociedade desenvolve-se pelo aprendizado, por isso tudo o que
o homem conquistou e aprimorou é decorrência direta deste fenômeno. Segundo
Olivier Reboul, tudo o que torna o homem humano, tal como a linguagem, o
pensamento, os sentimentos, as técnicas, as ciências, as artes e a moral, o
homem tem porque aprendeu. Para ele o fim da educação é permitir a cada um
realizar a sua natureza no seio de uma cultura que seja verdadeiramente
humana143, e prossegue afirmando:
A palavra estudo, que designa uma maneira de aprender, distinta
ao mesmo tempo da informação (aprender que) e da
aprendizagem (aprender a), um ensino e uma investigação que
valem por si mesmo e progridem pelo outro. Ora qual a meta do
estudo? (...) ver-se-á que este fito se resume numa só palavra:
compreender, aprender porquê144.
O aprendizado ocorre quando o sujeito tem verdadeiro interesse
participando da busca pelo saber. Ele conhece a importância e a finalidade do
objeto apreendido e se interessa por perceber sua necessidade. Depois de
141 FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Dicionário da Língua Portuguesa. 2.ed.. Rio de
Janeiro: Nova Fronteira, 1986, p.148. 142 Apud. ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de Filosofia. São Paulo: Martins Forense, 2000. p. 75. 143 Op. Cit., p. 20- 24 144 REBOUL, Olivier. Op. Cit., p. 140.
aprendido algo buscamos a competência, ou seja, saber como aplicar o saber e
como adaptá-lo a situações imprevistas145. Mas, como se aprende?
Há muitas teorias que tratam da aprendizagem, mas nenhum
consenso sobre qual deve ser usada, ficando a critério de cada pessoa seguir a
que lhe for mais conveniente. Podemos dizer que nessas teorias encontramos
basicamente três filosofias: a comportamentalista (behaviorismo), a cognitivista
(construtivismo) e a humanista, as quais foram seqüencialmente construídas. No
entanto, nem sempre é possível enquadrar determinada teoria da aprendizagem
em uma única corrente filosófica.
De qualquer forma, temos de ter sempre em mente que na
educação há pelo menos dois sujeitos, e fim do ensino, ou pelo menos seu objeto,
é o aluno. O objeto da formação é a função social146, assim, devemos sempre
respeitar os limites do discente para que o aprendizado seja efetivo.
O Comportamentalismo surgiu no início do século XX nos Estados
Unidos, como uma reação à mentalidade psicológica que predominava na Europa.
Sua principal característica é o foco nos comportamentos observáveis e
mensuráveis do sujeito, isto é, nas respostas que ele dá aos estímulos externos. A
idéia básica mais recente é a de que o comportamento é controlado pelas
conseqüências: se a conseqüência for boa para o sujeito, haverá uma tendência
de aumento na freqüência da conduta, logo, se for desagradável, a freqüência de
resposta tenderá a diminuir. Isso significa que a manipulação de eventos 145 Olivier traz que: “a competência, para lá da transmissão e da espontaneidade, é o acto que
buscávamos. Supõe duas coisas. Em primeiro lugar, que o espírito humano é, à partida, capaz de
aprender, que possui no estado implícito as regras que lhe permitem utilizar e, antes de mais,
assimilar os saberes lingüísticos, matemáticos, éticos e outros, saberes pelos quais o espírito é
‘humano’, a aptidão para os adquirir, pois é isso o que o define como espírito. A competência
supõe também que os saberes não constituem uma bagagem inerte, mas uma forma dinâmica; a
competência do jogador de xadrez não se reduz a conhecer as regras, nem sequer a reter um
grande número de jogadas típicas; consiste em encontrar de cada vez a melhor solução, já que as
regras e os modelos não passam de auxiliares.” Op. Cit., p. 45-46. 146 Ibidem, p. 18.
posteriores à exibição do comportamento permite, a princípio, que se possa
controlá-los. E isso acontece sem a necessidade de se recorrer à hipóteses sobre
quaisquer atividades mentais entre o estímulo e a resposta dada.
Conforme Marco Antonio Moreira:
Esta idéia fundamentou todo um enfoque tecnológico à instrução
que, durante muito tempo, particularmente nas décadas de
sessenta e setenta, dominou as atividades didáticas em qualquer
matéria de ensino. Grande parte da ação docente consistia em
apresentar estímulos e, sobretudo, reforços positivos
(conseqüências boas para os alunos) na quantidade e momento
corretos, a fim de aumentar ou diminuir a freqüência de certos
comportamentos dos alunos.As aprendizagens desejadas, isto é,
aquilo que os alunos deveriam aprender, eram expressas em
termos de comportamentos observáveis. Os objetivos
comportamentais definiam, da maneira mais clara possível, aquilo
que os alunos deveriam ser capazes de fazer, em quanto tempo e
sob que condições, após a instrução. A avaliação consistia em
verificar se as condutas definidas nos objetivos comportamentais
eram, de fato, apresentadas ao final da instrução. Se isso
acontecia, admitia-se, implicitamente, que havia ocorrido
aprendizagem147.
O Cognitivismo surge praticamente na mesma época de
nascimento do Behaviorismo, em contraposição a este, mas também como uma
reação à mentalidade da época que se ocupava basicamente de estudar o que as
pessoas pensavam e sentiam,. Enfatiza exatamente aquilo que é ignorado pela
visão behaviorista: a cognição, ou seja, o ato de conhecer. Para os behavioristas a
psicologia deve ocupar-se daquilo que as pessoas fazem, omitindo, por
irrelevante, qualquer discussão sobre a mente. Para os cognitivistas, o foco deve
estar nas variáveis inerentes entre estímulos e respostas, nas cognições e nos
147 MOREIRA, Marco Antonio. Teorias de aprendizagem. São Paulo: EPU. 1999. p. 14.
processos mentais superiores (percepção, resolução de problemas, tomada de
decisões, processamento de informação, compreensão). Em síntese, o foco deve
estar na mente, mas de maneira objetiva, científica, e não especulativa.
Depreende-se que a filosofia cognitivista trata principalmente dos
processos mentais, ocupando-se da atribuição de significados, da compreensão,
da transformação, do armazenamento e do uso da informação envolvida na
cognição. Na medida em que se admite, nessa perspectiva, que a cognição se dá
por construção, chega-se ao Construtivismo, tão apregoado nos anos noventa.
O Construtivismo é uma posição filosófica cognitivista
interpretacionista. É cognitivista porque se ocupa da cognição, de como o
indivíduo conhece, de como ele constrói sua estrutura cognitiva. É
interpretacionista porque supõe que os eventos e objetos do universo são
interpretados pelo sujeito cognoscente. O ser humano tem a capacidade criativa
de interpretar e representar o mundo, não somente responder a ele148.
O Construtivismo observa o aluno como sendo capaz de realizar
sua própria estrutura cognitiva de forma livre, sem arbitrariedade. Assim, deixa de
enxergá-lo como um mero receptor de informações.
O Humanismo passa a ter a concepção do aluno como pessoa
(sentimentos, pensamentos e ações) e não como objeto, visa à auto-realização e
o crescimento pessoal.
Joseph Novak tem o seguinte entendimento:
A aprendizagem significativa, que subjaz a integração construtiva
de pensar, sentir e agir, engrandecendo o ser humano. Quer dizer,
o aprendiz é visto como um ser que pensa, sente e age de
maneira integrada, mas é a aprendizagem significativa que torna
148 Ibid. p. 17.
positiva esta integração, se modo a levá-lo à auto-realização, ao
crescimento pessoal149.
Apesar de grandes filósofos terem se dedicado ao estudo do
processo de aprendizagem, nos deteremos apenas aos ensinamentos de John
Dewey, por ser o que está mais está ligado ao nosso objeto de estudo.
Dewey traz a importância do experimento para o aprendizado,
argumentando que a experiência é um processo bifásico, pressupõe que se aja
sobre algo e que sofra as conseqüências dessa ação. Assim, atividades mentais
ausentes nos planos anteriores passam a fazer parte desse agir e sofrer reação.
Para que possam ser consideradas como experiência é
necessário que as ações sejam acompanhadas de percepção consciente da
mudança ocorrida e de seu reflexo sobre nós, tornando-se, assim, um
aprendizado. É o que ele chama de “aprender da experiência:
Não há aprendizagem genuína em processos divorciados da
experiência, onde se memorizam fatos sem perceber
relacionamentos, gerando um conhecimento superficial e
destituído de significado pessoal para o ser que aprende. A
aquisição de significado torna-se, assim, o elemento vital para que
uma experiência seja educativa. E para que isso ocorra o ato de
reflexão deve, necessariamente, estar presente150.
O princípio da continuidade ou continuum experimenta é usado
para discriminar entre experiências com valor educativo e sem esse valor. Ele
nada mais é do que a idéia de que toda experiência modifica quem a faz e por ela
passa. Segundo esse princípio a modificação afeta, queiramos ou não, a
qualidade das experiências subseqüentes, pois é outra, de algum modo, a pessoa
que vai passar por essas novas experiências. Isso significa que toda e qualquer
149 Apud. MOREIRA, Marco Antonio. Op. Cit., p. 18. 150 MAMEDE, Silvia; et al. Aprendizagem Baseada em Problemas: anatomia de uma nova
abordagem educacional. Fortaleza: Hucitec, 2001. p. 60
experiência toma algo das experiências passadas e modifica de algum modo as
experiências subseqüentes151.
Desse modo, a cada nova experiência podemos dizer que se tem
uma nova pessoa que exibirá novas atitudes emocionais e intelectuais reagindo de
forma diferente a cada nova situação. O processo de aprendizado torna-se cíclico
e eterno, pois sempre estaremos diante de novas experiências, e a experiência
anterior converte-se em um instrumento para que se possa entender a nova
experiência, e assim sucessivamente.
Outro princípio fundamental trazido por Dewey é o da interação,
segundo o qual a experiência se realiza em meio a coisas e na coletividade,
considerando-se sempre a cultura acumulada da espécie, ou seja, há uma
interação do indivíduo com o ambiente. Dessa forma, o aprendizado ocorre dentro
de um contexto, pois quando isso não acontece há um conhecimento morto:
A matéria em foco foi aprendida isolada de um contexto; foi
armazenada em um compartimento estanque. Quando se pergunta
o que dela foi feito, qual o seu destino, a resposta é que ainda se
encontra no compartimento especial em que foi originalmente
estocada. Se recorressem as mesmas condições em que aquele
conhecimento foi adquirido, seu resgate tornar-se-ia possível. Mas
como foi adquirido de forma segregada, desconectado do resto da
experiência, torna-se indisponível nas condições reais de vida152.
Segundo Dewey a motivação genuína para aprender nasce
somente quando o objeto da aprendizagem identifica-se em algum grau com a
auto-expressão do sujeito153. Nesse contexto, podemos dizer que aprender não é
apenas decorar, mas saber como e quando utilizar o conhecimento adquirido,
estar sempre procurando aprender, principalmente de maneira aberta, 151 DEWEY, Jhon. Experiência e educação. 3, ed. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1979.
p. 26. 152 MAMEDE, Silvia. Op. Cit., p. 65. 153 Ibid p. 71.
transdisciplinar, envolvendo tudo o que nos cerca, porque sempre estaremos
diante de ações desconhecidas e precisaremos saber e aprender como com elas
lidar. A grande questão, no entanto, não é apenas aprender a aprender, mas
também aprender a desaprender para realizar uma nova construção sobre o
conhecimento que evolui de forma dinâmica.
4.2 O QUE É ENSINAR
Ensinar significa ministrar o ensino de alguma coisa, transmitir
conhecimentos, instruir; lecionar, educar154. Diferentemente da definição do
dicionário da língua portuguesa, quando pensamos sob o ponto de vista
pedagógico a palavra ensinar adquire outros significados, pois ensinar não é
transmitir conhecimentos, mas criar as possibilidades para sua produção ou a sua
constrição. Pelo contrário, é preciso que desde o início do processo fique cada vez
mais claro que, embora diferentes entre si, “quem forma se forma e reforma ao
formar, e quem é formado forma-se e forma ao ser formado”155.
Bittar faz a seguinte distinção entre educação e ensino:
(...) a educação envolve todos os processos culturais, sociais,
éticos, familiares, religiosos, ideológicos, políticos que somam para
a formação do indivíduo. Trata-se de vislumbrar na educação,
nesse sentido, a formação e o desenvolvimento das faculdades e
potencialidades humanas, sejam psíquicas, sejam físicas, sejam
morais, sejam intelectuais por quaisquer meios possíveis e
disponíveis, extraídos ou não do convívio social (...) ensino
representa uma relação mais pontual, que se destaca de um
154 FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Op. Cit. p. 660 155 FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. 29. ed. São
Paulo: Paz e Terra, 1996, p.22-23.
processo de aprendizado direcionado e direto, em que se podem
detectar dois pólos relacionais, a saber, o educador e o educando
(...) o ensino é apenas um capítulo da educação de uma pessoa156.
Cabe ao professor instigar nos alunos o gosto pelo conhecer, a
dúvida, o aprender questionando e sempre pesquisando. No aprendizado não se
deve impor, mas sim permitir que o indivíduo eleja um sentido que norteie sua
existência.
Para Paulo Freire saber ensinar não é transferir conhecimentos,
mas criar possibilidades para a sua própria produção ou a sua construção.
Na mesma linha segue Olivier Reboul:
Educar não é fabricar adultos segundo um modelo, é libertar em
cada homem o que o impede de ser ele mesmo e lhe permite
realizar-se segundo seu gênio singular (...) Assim, parece-nos que
o fim da educação é permitir a cada um realizar a sua natureza no
seio de uma cultura que seja verdadeiramente humana157.
A imposição traz em si mais um adestramento do que educação,
pois retira da pessoa o direito de pensar e de criar. Paulo Freire chamada esse
tipo de educação de “bancária”, na medida em que visa apenas o “depósito” de
conhecimentos, violando a característica própria do homem que é compreender e
transformar o mundo, e não simplesmente se adaptar a ele, como fazem os
animais.
Cabe observar que nesse tipo de educação a percepção do
mundo transmitida e imposta é apenas a do professor, não havendo a
preocupação com a do aluno, o que causa grande conflito e desinteresse pelo
156 BITTAR, Eduardo C. B. Direito e ensino jurídico: legislação educacional. São Paulo: Atlas, 2001.
p. 15-16 157 REBOUL, Olivier. A filosofia da educação. Lisboa: Edições 70, p. 22 – 24.
aprendizado158.
Podemos traçar as seguintes características da educação
bancária: a) atribui importância suprema ao "conteúdo da matéria" e,
conseqüentemente, espera que os alunos o absorvam sem modificações e o
reproduzam fielmente nas provas; b) seu objetivo fundamental é produzir um
aumento de conhecimentos do aluno, sem a preocupação com ele como pessoa
integral e como membro de uma comunidade; c) como conseqüência natural, o
aluno é passivo, grande tomador de notas, exímio memorizador, preferindo
manejar conceitos abstratos a resolver de forma original e criadora os problemas
concretos da realidade em que vive.
Nessa linha:
Na educação superior, é necessário repensar a formação dos
profissionais comprometidos com a sua realidade de atuação.
Deve-se romper com o modelo tradicional de educação, centrado
158 DUARTE JUNIOR, João Francisco. Fundamentos estéticos da educação. São Paulo: Cortez.
1981, p. 55-56.
no professor especialista em determinada área do conhecimento,
que só se preocupa com o repasse de informações159.
No mundo atual não basta a imposição de conhecimentos certos e
determinados, pois isso só funciona em uma sociedade imutável como a primitiva.
Em uma sociedade em constante mutação a educação deve a facilitar a mudança
e a aprendizagem. Nessa linha é o ensinamento de Carl Rogers:
O único homem educado é aquele que aprendeu como aprender,
como adaptar-se à mudança; o homem que tenha compreendido
que nenhum acontecimento é seguro, e que somente o processo
de buscar o conhecimento dá uma base para a segurança160.
Para que tenhamos um ensino efetivo é fundamental que haja um
processo para o dia da aula como: preparação da aula determinando seus
objetivos, estratégias de ensino e o conteúdo a ser dado.
A relevância de um conteúdo é determinada por diversos fatores,
entre eles as características psicossociais dos alunos, seu grau de
desenvolvimento intelectual, a aplicabilidade dos objetos de
conhecimento ensinados, a capacidade do aluno estabelecer
relações entre o conteúdo ensinado, as necessidades de seu dia-
a-dia e o contexto cultural dos alunos43.
Podemos dizer que o processo de ensino consiste em planejar,
orientar, controlar a aprendizagem do aluno. Somente isso não basta, é
fundamental que haja a conscientização dos professores para que saibam como
se portar na sala de aula, sendo capazes de instigar a vontade do saber nos
159 MELLO, Reynaldo Irapuã Camargo. Op.Cit., p. 21. 160 ROGERS, Carl R. Freedom to learn. Columbus, Ohio, Ch. E. Merril, 1969. 43 MORETTO, Vasco Pedro. Prova: um momento privilegiado de estudo não um acerto de contas,
4. ed. Rio de Janeiro: DP&A. 2004. p.17.
alunos. Diante disso, Rogers161 traz as características que devem estar presentes:
O facilitador deve ser uma pessoa real, autêntica, vivencial, no
sentido de ser e viver os sentimentos e pensamentos de cada
momento.
Ele deve apreciar e respeitar o estudante.
O facilitador deve saber escutar com empatia, isto é, colocando-se
no lugar de quem lhe fala.
Sobretudo, deve confiar sinceramente na capacidade potencial do
estudante de crescer e aprender, se lhe for propiciado um clima de
liberdade e apoio.
O professor deve sempre estar pesquisando, atualizando-se para
ensinar, pois somente assim as aulas terão maior conteúdo e o
professor terá maior confiança em si mesmo, o que traz a
possibilidade de participação dos alunos com perguntas e
possibilidade de expor seus pensamentos.
Com base no que foi exposto, para que o ensino jurídico possa ser
eficaz devem ser observadas as seguintes recomendações dadas por Álvaro de
Melo Filho:
1) os métodos de ensino devem aguçar o raciocínio jurídico e
desenvolver a autonomia intelectuais; 2) à didática jurídica
compete transfundir o discente de espectador passivo em partícipe
ativo do processo de aprendizagem inovadora do direito; 3)
necessidade de ensinar o aluno a pensar os códigos e os fatos
jurídicos relevantes, nunca a pensar apenas com os códigos,
evitando o desvalioso ensino cosmético e piedosamente superficial
de um direito que é dado e não construído; 4) a questão medular
está em implodir uma educação jurídica conservadora em que
predominam a patologia da interpretação literal e retrospectiva das 161 Op. Cit.
leis e manuais jurídicos, bem como o pedantismo retórico, acrítico
e a-histórico na imposição de um saber jurídico empacotado onde
a eloqüência muitas vezes substitui o argumento preciso, o
raciocínio jurídico ou o pleno domínio da matéria, sem habilitar o
aluno a aprender a aprender; 5) o exclusivismo da aula expositiva
ou do monólogo estereotipado deve ceder espaço às aulas
dialogadas, às técnicas audiovisuais e aos recursos
teleiformáticos, sem descurar dos seminários e debates; 6) os
excessos no uso da aula expositiva inibem qualquer processo
metodológico emancipatório; 7) citando João Baptista Villela,
acredita que a aula jurídica deve proporcionar ao futuro
profissional a instrumentação capaz de levá-lo a operar o direito
segundo uma visão heraclitiana, isto é, sob o signo de um
constante devenir; 8) por isso é de suma relevância que as figuras
do professor informador e aluno-ouvinte sejam substituídas pelo
professor – animador e aluno-pesquisador, pois, o problema
fundamental da pedagogia jurídica é muito mais a questão de
consciência do que de conhecimento; 9) ataca os métodos de
ensino que levam à miopia dos alunos obrigados à repetição
mecânica de verdades escravas, conduzidos por professores
pedantes, petulantes em seu dogmatismo e portadores de um
falso cientismo fundado na eloqüência devaneadora; 10) destaca a
dimensão problematizadora do ensino do direito162.
Em razão do exposto no presente capítulo, acreditamos que o
método da Aprendizagem Baseada em Problemas é o mais adequado para o
ensino, principalmente para o ensino jurídico, pois a universidade deve ser um
local que proporcione a troca de idéias entre professor e alunos, considerando
ambos como seres humanos que trazem em si uma bagagem de experiências
anteriores, possibilitando o conhecimento técnico, cultural e geral.
Mario Osório Marques afirma:
162 Apud. AGUIAR, Roberto A. R. de. Op. Cit., p. 232-233.
Dessa forma, conversar sobre as próprias experiências de vida e
sobre sues prévios saberes é realizar a interlocução de saberes,
dos quais faz a educação, é aprender enquanto reconstrução dos
saberes anteriores, é imprimir, assim, vida nova e novos
significados de face aos dinamismos da sociedade e da cultura, à
ampliação dos horizontes que se abrem como desafios ao
entendimento compartilhado e à ação solidária de todas nas
comunidades em que vivem163.
5. A APRENDIZAGEM BASEADA EM PROBLEMAS:
CARACTERÍSTICAS E PROCESSOS
A metodologia da “Aprendizagem Baseada em Problemas” - ABP
(Problem Based Learning - PBL) foi implantada no final da década de 1969 na
Universidade de McMaster, no Canadá, tendo sido aplicada pela primeira vez por
Howard Barrows, professor da faculdade de medicina. Pouco depois foi
empregada na Universidade de Maastricht, na Holanda. Entretanto, a Harvard
Business School, desde a década de 30 aplica problemas como forma do
processo de aprendizagem164.
No Brasil, as primeiras instituições a implantarem o método foram
a Faculdade de Medicina de Marília, em 1997, e a Faculdade de Medicina da
Universidade Estadual de Londrina (UEL), em 1998.
A grande diferença entre o “novo” método e o aplicado em
Harvard é o momento da aplicação dos problemas. Em Harvard a discussão de
casos ocorre somente nas fases finais do curso, ou seja, nos primeiros anos os
163 Apud. Reynaldo Irapuã Camargo Mello . Op. Cit., p. 6.8 164Shashidhar Venkatesh Murthy. Experience with Problem Based Learning in MBBS course at Fiji
School of Medicine. Disponível em: http://www.fsm.ac.fj/PWS/Resources/General/Article-
PBL%20at%20FSM-%20shashi-final.doc
alunos têm aulas ministradas da forma tradicional que conhecemos: método
expositivo. Logo, somente após terem aprendido grande parte do conteúdo
curricular é que os alunos passam a problematização. A Universidade de
Mcmaster, por sua vez, trabalha com uma concepção diferente
Na aprendizagem baseada em problemas, todo o conhecimento
necessário para a solução do problema era adquirido depois que
os estudantes começavam a trabalhar com a situação
problemática. Em outras palavras, a confrontação com o problema
desencadeava o processo de aprendizagem, constituindo-se no
aspecto central de todo o programa curricular.2
O PBL baseia-se na aprendizagem resultante da orientação para a
solução de problemas e, para que esse processo seja eficaz Schmidt elenca seis
componentes centrais: o problema, os grupos tutoriais, o tutor, o estudo individual,
a avaliação do estudante e os blocos ou unidades por meio dos quais currículo é
estruturado165.
Além dos componentes supracitados, o PBL apresenta as
seguintes características: a) é centrado no aluno estimulando seu raciocínio
crítico; b) desenvolve-se em pequenos grupos tutoriais; c) apresenta problemas
em contexto jurídico; d) é um processo ativo, cooperativo, integrado e
interdisciplina; e) é orientado para a aprendizagem do adulto.
Os estudos acerca da metodologia do ABP têm se enriquecido
com os conhecimentos sobre a gênese do processo cognitivo, da
aprendizagem do adulto e da fisiologia da memória, ressaltando-se
a importância da experiência prévia e da participação ativa como
2 MAMEDE, Silvia. Op. Cit., p. 52.
165 MAMEDE, Silvia. Op. Cit p.29
pontos fundamentais para a motivação e a aquisição de
conhecimentos166.
Estimula no aluno a capacidade de aprender a aprender, de
trabalhar em equipe, de ouvir outras opiniões, ainda que contrárias às suas, e o
induz a assumir um papel ativo e responsável pelo seu aprendizado. Além disso,
objetiva conscientizar o aluno do que ele sabe e do que precisa aprender,
motivando-o a buscar informações relevantes. Outro ponto fundamental do PBL e
que tem sido alvo de elogios é o aprimoramento na capacidade de dialogar e de
discutir dos alunos:
O diálogo é um processo pelo qual os estudantes procuram se
entender um ao outro, levando assim a definições e significados do
problema, comuns aos membros do grupo. O objetivo não é haver
concordância ou discórdia no grupo, e sim se há entendimento dos
vários pontos de vista. Portanto, ouvir efetivamente e pensamento
crítico são habilidades cruciais (...) A discussão é usada com o
propósito de se chegar à decisão ou à conclusão do problema.
Para que a discussão seja efetiva, deve seguir o diálogo167.
A aplicação da PBL possibilita que o aluno aprenda a buscar as
respostas que necessita, relembrando o que foi apreendido ao longo de sua vida e
o que foi ministrado pelo professor. Além disso, esse método estimula o
autoaprendizado, ponto fundamental para a carreira jurídica, pois sabemos em
nosso país as leis mudam constantemente. Desse modo, esse item é
indispensável para a formação de um bom profissional, pois ele deverá atualizar-
se ininterruptamente, adequando-se às mudanças legais, sociais, econômicas e
ambientais.
No sistema jurídico romano-germânico a lei é a principal fonte do
Direito, por essa razão a maioria das escolas jurídicas preocupa-se em estudar
166 http://www.famema.br/pbl/manuais/guia2003.pdf. Acessado em 20/07/2005. 167 CUNHA, José Carlos Silveira. Op. Cit., p. 12.
somente as normas e interpretá-las, utilizando o raciocínio dedutivo, que parte de
uma verdade universal para uma singular.
Manifestando-se sobre esse sistema de ensino, Harriet Christiane
Zitscher faz uma comparação com o sistema alemão:
Apesar de – como todos os outros sistemas romano-germânicos –
empregar método dedutivo na aplicação do direito, o sistema
alemão prefere um sistema misto. Neste sistema, nas aulas se usa
muito o caso, tanto abstrato, construído, quanto o concreto,
extraído da vida forense (...) Mesmo que o método alemão de
ensino seja baseado predominantemente no caso concreto,
verifica-se traços dedutivos na aplicação do Direito, também por se
tratar de uma inclinação genérica para o pensamento abstrato e
sistemático dominante na Europa Continental. Também há
elementos dedutivos no ensino do Direito. O ensino baseia-se no
caso, mas não deixa de apresentar ao aluno o sistema do Direito.
Não é como no sistema da common law, cujos métodos são
prevalentemente dedutivos168.
Na mesma linha, José Carlos Silveira Cunha faz importante
apontamento em prol do PBL:
Ele satisfaz três critérios importantes para que se promova um
aprendizado ótimo. Primeiro, ele utiliza um ambiente onde os
estudantes estão imersos em uma atividade participativa prática,
na qual o aluno recebe feedback de outros estudantes e do tutor.
Segundo, o estudante recebe orientação e suporte de seus amigos
e instrutores, ou seja, o aprendizado é multidirecional, incluindo
outros estudantes, instrutores e professores. Terceiro, o
168 Metodologia do ensino jurídico com casos – teoria & prática: com exemplos do direito do
consumidor e do direito civil. Belo Horizonte: Del Rey, 2004. p. 30
aprendizado é funcional, baseado em resolver um problema
real169.
O processo inicia-se com a apresentação de um problema como
uma descrição neutra de fenômenos ou eventos da realidade, que devem ser
explicados pelos estudantes, em termos de seus processos, princípios ou
mecanismos subjacentes170.
Não há dúvida de que a simulação é fundamental para o ensino,
pois o professor deve estimular os alunos por meio de casos que sejam o mais
próximo possível da realidade deles, gerando interesse na resolução do problema.
Ao se depararem com o caso concreto, os alunos delimitam as bases de estudo
relevantes e partem para a pesquisa em livros, revistas e monografias.
A finalidade, portanto, é estimular o desenvolvimento dos alunos
para o autoaprendizado e para a pesquisa, posto que eles precisam buscar
materiais para a resolução de cada caso concreto apresentado. Nesse sentido
declara Howard Barrows:
Seu papel é proporcionar aos estudantes oportunidades de
desenvolver seu pensamento e habilidades de estudo, e guiá-los a
estudar com maior número de materiais em busca de alcançar o
conhecimento que precisam171.
Em síntese, pretende-se que o aluno seja capaz de descobrir seus
erros, desenvolver autodisciplina e notar seu desenvolvimento.
Cabe ressaltar que os alunos não possuem informações
anteriores, ou seja, o ponto de partida é o problema que será estudado por meio
169 Problemas em “Problem –Based Learning”. Revista Ponto e Vírgula. São Paulo: Fmusp. Índice
n. 44, junho de 1998. p. 11. 170 Schmidt. Apud. MAMEDE, Silvia. Op. Cit., p. 29-34. 171 BARROWS, Howard S. How to design a problem based curriculum for the preclinical years. New
York: Springer Series on Medical Education. v. 8. p. 31. Tradução livre.
de grupos tutoriais com o número de 8 (oito) a 10 (dez) alunos no máximo e um
facilitador, que é o professor. Isso é fundamental para a eficiência do método, pois
permite que os alunos e o professor verifiquem quais são os conhecimentos que o
aluno já possui, estimulando e exigindo da memória matérias e assuntos
anteriormente vistos. Por essa razão o aluno não se restringe às mesma
informações, ao notar quais já estão presentes ele vai em busca dos pontos
falhos.
Isso proporciona um efetivo aprendizado, pois sabemos que
comumente acredita-se ter “aprendido” determinado assunto, mas na verdade não
se consegue visualizar sua importância, tampouco sua aplicabilidade. Infelizmente
essas situações são freqüentes e a título ilustrativo citamos o seguinte exemplo:
nas primeiras aulas do curso de Direito o professor cuida do tema “interpretação
da lei”. Esse tema é muito distante da realidade do aluno e por isso ele
simplesmente o decora. Posteriormente, na aplicação da lei, percebe que ela só
se concretiza pela interpretação e então nesse momento ele se dá conta de que o
tema, na verdade, é primordial. Como resultado, ele terá de estudar novamente o
assunto, porque no momento em que foi abordado na faculdade sua importância e
aplicabilidade não foram notadas.
O ser humano tem maior capacidade de aprendizado quando
aplica e associa o que se está aplicando, por essa razão é que não pode ser dada
a matéria anteriormente ao problema, este deve instigar o aluno a resolvê-lo.. Mais
uma vez é Howard Barrows quem lança luz sobre o tema:
Isso permite aos estudantes perceberem quanto conhecimento já
possuem para resolver o problema e como este pode ser resolvido
com as informações e habilidades coletadas entre eles (…) O
conhecimento considerável está armazenado no cérebro e só virá
para a mente através de associações, discussões ou com
questionamentos (…) Como resultado, cada aluno percebe qual
informação não precisa ser estudada em detalhes. Isso permite a
eles concentrarem os estudos nas áreas que realmente precisam
de reforço (…) nenhum de nós percebe o que realmente sabemos
e o que precisamos nos aprofundar, tal percepção só ocorre
quando nos envolvemos com uma tarefa que precisamos resolver
(…) Qualquer pessoa lê com maior interesse quando o estudo
torna-se relevante à questão ou à área em que estamos buscando
respostas e quando estamos curiosos sobre fatos172.
O grupo tutorial é de fundamental importância, pois é nele que o
problema será analisado, traçando-se os objetivos da aprendizagem. Após esse
encontro os alunos devem buscar a solução do problema individualmente, visando
a coleta de novas informações.
A análise bibliográfica fica a critério do aluno. Depois os alunos
reúnem-se novamente no grupo tutorial para a discussão do problema. Pode ainda
ocorrer reuniões antes da resolução do problema para que se verifique como o
estudo do grupo está sendo conduzido.
Para que haja uma boa funcionalidade é necessário que os grupos
sejam pequenos, pois isso facilita a aprendizagem com a participação obrigatória
de todos os membros. Quando cada um expõe os conhecimentos adquiridos há
cooperação e aprendizado mútuo.
Em temas de grande complexidade pode ser feita uma aula
interativa com um especialista no assunto. Esse formato diferencia-se do
tradicional também quanto à atuação do professor, que não leciona, mas interage
com os alunos provendo o debate e a solução das dúvidas. Silvia Mamede
destaca a importância da discussão em grupo:
Contribui ainda para estimular o interesse nos temas relacionados
ao problema e ajuda no desenvolvimento de habilidades próprias
do trabalho em grupo, tais como a capacidade de apresentar e
172 BARROWS, Howard S. Op.Cit., p. 58-59.
sistematizar idéias, de coordenar uma discussão, de compatibilizar
interesses individuais e coletivos173.
Nota-se que a interatividade provocada pela discussão em grupo
amolda-se perfeitamente à área jurídica, pois o profissional do Direito lida com o
poder de argumentação e a capacidade de sistematizar o raciocínio e, não raro,
precisa expor suas idéias perante grande número de pessoas.
O currículo tradicional é estruturado em espiral, e no PBL é em
unidades com blocos temáticos. Desse modo, cada bloco tem um tema específico
que será estudado por meio de vários problemas relacionados entre si. Ressalte-
se que os problemas são interdisciplinares, o que facilita o aprendizado e a futura
aplicação prática, assim, tudo o que for relacionado a determinado assunto deve
ser aprendido simultaneamente, independentemente da matéria. Exemplo: um
problema que trate do tema “propriedade” deve necessariamente abordar
questões afetas ao processo civil, ao direito civil e ao direito constitucional.
Depreende-se, pois, que esse método não pode ser usado
isoladamente para determinadas disciplinas, devendo ser aplicado do primeiro ao
último dia de aula, posto que se for fragmentado deixa de ser um método de
ensino.
5.1 AS BASES COGNITIVAS DA APRENDIZAGEM BASEADA EM
PROBLEMAS
Hodiernamente verificamos significativas e sucessivas mudanças
na legislação, fator que dificulta e até inviabiliza o ensino teórico. Diante disso,
para que haja o ensino efetivo é necessário que o aluno “aprenda a aprender”, ou
seja, aprenda a estudar, a se atualizar e a interpretar, e não se limite a 173 MAMEDE, Silvia. Op. Cit., p. 30.
simplesmente decorar o que foi ensinado, sobretudo em um período em que os
conhecimentos adquiridos hoje provavelmente serão ultrapassados amanhã. Esse
cenário é o mesmo da Medicina, que evolui a cada dia com novas descobertas.
Por isso acreditamos que a experiência positiva das Faculdades de Medicina
citadas nesse estudo indica que essa metodologia de ensino também será muito
eficaz no ensino jurídico.
Considerado o criador da presente metodologia, Barrows propôs
que os estudantes deveriam “aprender” no sentido mais extenso da palavra:
(...) estender ou aprimorar a sua base de conhecimentos, para se
conservarem atualizados nos seus eventuais campos da medicina
e para proverem uma atenção apropriada para os problemas
novos ou únicos que eles podem enfrentar no seu trabalho. Isso é
aprendizagem auto-direcionada. Vários componentes integram
essa habilidade. (...) Um componente é a formulação apropriada
de necessidades de aprendizagem, para determinar os melhores
recursos, em termos de eficiência e de disponibilidade, para
satisfazê-las. Um outro componente é o uso apropriado dos
recursos disponíveis (...). A auto-aprendizagem não está concluída
até que os conhecimentos e as habilidades recém-adquiridos
através do estudo individual estejam apropriadamente codificados
na memória para uma subseqüente recuperação e uso. O ensino
na maioria das escolas médicas não enfatiza essas habilidades174.
.Sem dúvida o ensino jurídico também não enfatiza o aprendizado
efetivo. Com a aplicação do PBL, pretende-se que o aluno seja capaz de explicar
os fenômenos que ocorrem no caso concreto, bem como seus princípios e leis.
Dessa feita, por não haver uma preparação prévia do aluno, espera-se que ele
seja capaz de explicar e questionar quais os pontos a serem estudados,
baseando-se tão-somente em bom-senso, conhecimento prévio e raciocínio
lógico. Dessa forma, o aluno estará continuamente relembrando o que sabe e
174 Apud. MAMEDE, Silvia. Op. Cit., p. 82.
questionando o que precisa ser aprendido, ou seja, está sempre aplicando o que
aprendeu. Nessa esteira acrescenta Silvia Mamede:
É uma forma de aprendizagem colaborativa, na qual uma
construção ativa de conhecimento, mais do que simplesmente um
processamento, é o foco das atividades. É também uma forma de
aprendizagem contextual, porque princípios, idéias e mecanismos
não são estudados em abstrato, mas no contexto de uma situação
concreta, que pode ser reconhecida como relevante e
interessante175.
Convém salientar que um dos princípios da psicologia cognitiva
consiste em afirmar que o conhecimento não pode ser transferido, vale dizer, deve
ser uma capacidade do aluno adquiri-lo, pois as estruturas cognitivas nele já se
encontram, e sua porção de conhecimento pré-existente determinará em que grau
alguma coisa nova pode ser aprendida.
Nota-se que o grau de conhecimento prévio é fundamental para o
PBL, pois é o referencial do aluno. Exemplo: ao fazer uma pesquisa o aluno
estudará de acordo com os livros que supram suas necessidades. Isso não ocorre
nas aulas dispositivas, em que o conteúdo dado é o mesmo para todos, devendo
haver imediato entendimento para que se possa compreender o assunto que for
ministrado na seqüência.
Bransford e Johnson destacam a prévia apresentação do
problema com a seguinte situação: sugerindo a leitura de um texto para um grupo
de pessoas com a instrução de que deveriam relembrá-lo em seguida, nota-se que
os que leram sem ter acesso ao título têm maior dificuldade de relembrar do que
aqueles que leram com o título. Segundo os autores, isso ocorre porque o título do
texto ativa ou cria um contexto através do qual a nova informação poderia ser
relacionada ao conhecimento já existente, resultando numa memória superior176.
175 Op. Cit., p. 87. 176 Ibid., p. 91.
A apresentação do problema faz com que o aluno sinta a
necessidade de aprender, tornando o aprendizado mais instigante e interessante.
Isso dá a idéia de necessidade ao aluno, causando a motivação intrínseca, ou
seja, ele deseja aprender por uma vontade interna, e não por uma recompensa,
como passar na prova, que seria a motivação extrínseca. Diante disso, não
poderíamos nos refutar dos ensinamos de Schmidt ao cuidar da psicologia
cognitiva, tema intimamente relacionado ao nosso objeto de estudo:
A psicologia cognitiva é a ciência, um ramo da psicologia que
estuda a cognição, o processo mental que hipoteticamente está
por detrás do comportamento. É uma das disciplinas da Ciência
cognitiva. Está área de investigação cobre diversos domínios,
examinando questões sobre a memória de trabalho, atenção,
percepção, representação de conhecimento, raciocínio,
criatividade e resolução de problemas177.
Dessa leitura, verificamos que o PBL está fundamentado em três
princípios da psicologia cognitiva:
1. O PBL ativa o conhecimento prévio do aluno, uma vez que ele
precisa usar esse conhecimento para direcionar o problema proposto. O
conhecimento prévio pode ser o principal determinante da natureza e da
quantidade de informação nova que pode ser processada.
2. Ao discutir o caso os alunos trabalham com o conhecimento
que foi apresentado inicialmente e a ele acrescenta o novo conhecimento. Nesse
cenário, criam novas associações entre conceitos e fazem múltiplas ligações
cognitivas entre os velhos e os novos aprendizados. Quanto maior o número de
associações, melhor será a capacidade de recuperação das informações
armazenadas na memória dos estudantes.
3. O PBL oferece problemas semelhantes às situações reais, logo,
177 Disponível em: http://pt.wikipedia.org/wiki/Psicologia_cognitiva.
o problema e sua resolução dão ao estudante pistas para aprender a solucionar os
problemas similares que surgirão na prática profissional. Esse norte é essencial
para acessar o conhecimento prévio embutido em nossa memória178.
178VARGAS, Lúcia Helena Mendonça. A bioquímica e a aprendizagem baseada em problemas.
Revista Brasileira de ensino de bioquímica e biologia molecular. v. 1/2001. Disponível em:
http://www.sbbq.org.br/revista/artigo.php?artigoid=5. Acessado em 22/07/2005.
6. CURRÍCULO NO PBL
O currículo baseado em um método PBL tem por objetivo
apresentar o conteúdo ao aluno de modo integrado e, ao mesmo tempo,
integrador de conhecimentos. A nosso ver, é indispensável para que o processo
de aprendizagem efetivamente ocorra.
O PBL não é apenas um método, mas uma maneira de aprender,
mas todo o seu potencial como abordagem educacional é intrinsecamente
dependente do desenho do currículo. A par desse contexto, passamos a seguir ao
estudo do currículo.
A palavra currículo vem do latim curriculum de currere, que
significa correr. Desse modo, um de seus significados refere-se à série de cursos
que o estudante tem de percorrer.
W. H. Kilpatrick assim manifesta-se sobre o assunto:
Currículo é uma sucessão de experiências escolares adequadas a
produzir, de forma satisfatória, e contínua reconstrução da
experiência, sendo o papel do professor preparar o ambiente para
que esta sucessão se faça de tal forma que promova o
desenvolvimento dos alunos e os faça atingir os fins de
autodireção, no redirecionamento de suas capacidades,
potencialidades e atividades179.
O Documento n. 28, da Série de Estudos e Documentos da
UNESCO, de 1968, oferece a seguinte definição:
Currículo são todas as experiências, atividades, materiais,
métodos de ensino e outros meios empregados pelo professor ou 179 Disponível em: http://www.serprofessoruniversitario.pro.br/ler.asp?TEXTO=1704. Acessado em
23/07/2005
considerados por ele para alcançar fins de educação, em que se
vê uma preocupação que se envolve com uma totalidade de
situações: os fins que serão perseguidos; como serão as
experiências em seu tipo, qualidade a número; natureza das
atividades desenvolvidas pelos educandos e mestres; tipos,
qualidade e variedade de materiais empregados ou utilizados na
situação ensino-aprendizagem; métodos, recursos, instrumentos,
técnicas etc.180.
O planejamento do currículo deve ser realizado em conjunto pelos
professores e por especialistas, a fim de delimitar o objetivo da universidade com
seus alunos e qual o tipo de profissional que deseja formar. Aqui é preciso que se
verifiquem as necessidades locais para que matérias específicas sejam incluídas
com o fulcro de satisfazes as necessidades sociais.
Antônio Carlos Gil coloca:
O planejamento curricular é de natureza multidisciplinar, envolve a
direção do estabelecimento de ensino, seu corpo docente e
também especialistas na área. Seu resultado é concretizado em
planos, que definem os objetivos que a faculdade espera atingir, o
perfil do profissional que pretende formar e as estratégias a serem
adotadas para favorecer o processo ensino-aprendizagem181.
A Portaria n. 1889/94 estabeleceu o conteúdo mínimo que dos
cursos de Direito, lembrando que em virtude do princípio da qualidade não se
pode suprimir nenhuma matéria, mas é permitido aumentar o rol de assuntos a
serem abordados.
Paulo Luiz Neto Lôbo discorre:
Nunca é demais lembrar que se cuida de conteúdo mínimo e de
diretrizes curriculares gerais, como bem explicitou a emenda da
180 UNESCO, Documento n. 28, Serie Estudos e Documentos. Paris: 1958. 181 GIL, Antônio Carlos Metodologia do ensino superior. São Paulo: Atlas, 1997, p. 35.
Portaria n. 1.886. Constituem ossatura comum de todos os cursos
jurídicos existentes no país. O conteúdo mínimo dos cursos (ou
currículo mínimo, como é denominado) é igual para todos. Por seu
turno, o currículo pleno resulta do conteúdo mínimo acrescido das
matérias e atividades definidas no projeto pedagógico de cada
curso, mercê de sua autonomia didático-científica182.
Dessa feita, ainda que a direção do curso opte em lecionar
somente o currículo mínimo, deve ministrá-lo de forma interdisciplinar, sempre em
busca da relação entre os conteúdos e diferentes disciplinas.
O conteúdo mínimo é subdividido em matérias fundamentais,
profissionalizantes e parte prática. A seguir transcrevemos a relação das
primeiras:
I. Fundamentais (5): introdução ao direito, filosofia, sociologia,
economia e ciência política;
II. Profissionalizantes (10): direito constitucional, direito civil, direito
administrativo, direito tributário, direito penal, direito processual
civil, direito processual penal, direito do trabalho, direito comercial
e direito internacional183.
Conforme Eduardo Bittar, a interdisciplinaridade, a prática jurídica,
a pesquisa e as aulas curriculares devem estar harmonizadas por meio da grade
curricular, que, por sua vez, deve proporcionar ensino de qualidade e estrutura de
formação fundamental184.
Com base nas lições de Ten Cate185, descrevemos a seguir os
182 O novo conteúdo mínimo nos cursos jurídicos. In. Catalano, Pirangelo; et al. Seminário
Internacional sobre ensino jurídico. Rio de Janeiro: Consulex, 1996. p. 36. 183 Ibidem. p. 37. 184 BITTAR, Eduardo C. B. Direito e ensino jurídico: legislação educacional. São Paulo: Atlas, 2001
p. 96. 185 Apud. MAMEDE, Silvia. Op. Cit., p. 115.
dez passos para o desenho do currículo:
1. Descrição da justificativa do currículo;
2. Elaboração dos objetivos gerais do currículo;
3. Análise do perfil da clientela;
4. Estabelecimento dos princípios educacionais aplicados ao
currículo;
5. Estruturação do currículo;
6. Descrição das unidades do curso;
7. Elaboração do sistema de avaliação dos alunos;
8. Descrição do modelo de organização do currículo;
9. Estabelecimento do processo de gerenciamento do currículo;
10. Montagem do sistema de avaliação do curso.
O item 3 refere-se aos conhecimentos e habilidades prévios dos
estudantes. O item 4 diz respeito aos princípios constitucionais e pedagógicos
adotados pelo curso. Dessa feita, não pode haver a convivência simultânea de
vários métodos de ensino, pois isso confundi o aluno e gera um caos pela
ausência de delimitação das regras. Logo, se a opção for pelo PBL todos os
professores devem seguir as regras dessa sistema de ensino. O item 5 indica
como será distribuído o conteúdo programático ao longo dos anos. A estruturação
deve observar a interdisciplinaridade e exigir o conhecimento adquirido nos anos
anteriores
O desenho do currículo parte da formulação de três perguntas: 1)
Quais as necessidades dos potenciais usuários dos serviços prestados pelo
treinado, ou seja, quais as necessidades da comunidade?; 2) Por que é
necessário o desenvolvimento desse currículo em particular nessa instituição de
ensino?; 3) De que maneira ele difere de outros cursos sobre o mesmo
assunto?186.
No primeiro passo de respostas fica estabelecido o ponto 1 dos 10
passos justificando-se as necessidades do presente currículo para os alunos e
para a sociedade em que que estão inseridos, o que causará sua eficiência na
futura aplicação profissional. A título exemplificativo citamos duas situações a) a
importância social na área cível pode ser facilmente constatada em algumas
cidades do interior que possuem forma específica de venda de gado, baseada nos
costumes da região; b) a importância do erro de proibição pode ser verificada pelo
caso do argentino que vem ao Brasil e usa lança perfume sem saber que essa
substância é proibida, pois em seu país o uso é permitido.
No passo 2 são estabelecidos os objetivos gerais do currículo,
para tanto alguns ponto são levados em consideração, como, a análise das
tarefas, as necessidades dos alunos (verificado no passo 1) e entrevistas com
eventuais empregadores.
Wiers afirma que a descrição clara dos objetivos serve para, pelo
menos, três finalidades:
Primeiro, os objetivos servem como guia para o seguimento dos
passos para o desenho do próprio currículo. Segundo, os
potenciais alunos devem conhecer antecipadamente o que se
espera deles antes de passar por determinado currículo. E
terceiro, os próprios empregadores também devem ter uma noção
sobre o que o currículo se propõe187.
Nesse momento deve-se verificar os graus de importância e de
dificuldade dos temas, para que se possa priorizar os mais relevantes e
estabelecer o tempo a ser gasto com cada assunto. Tanto a importância como a 186 MAMEDE, Silvia. Op. Cit. p. 116. 187 Apud. MAMEDE, Silvia. Op. Cit. p., 117.
dificuldade deve receber um número de 1 a 5, que servirá como guia para a
decisão de inserir ou não determinado tema no currículo.
O passo 3 é fundamental no PBL, pois tem como característica a
abordagem centrada no aluno. Nesse momento verifica-se a habilidade do aluno e
suas necessidades educacionais para que então possa ser formado o currículo.
Nesse ponto também se considera a informação anteriormente obtida para que o
currículo possa ser eficiente na posterior contratação profissional dos recém-
formados.
No passo 4 nota-se uma das maiores diferenças entre o PBL e os
demais métodos de ensino. Convém salientar que no PBL encontram-se os
seguintes aspectos: centrado no estudante, baseado em problemas,
multidisciplinar, baseado na comunidade, eletivo e sistemático. O quadro abaixo
apresenta as distinções entre o ensino tradicional e o PBL188
a) Centrada no
estudante/
centrada no
professor
Na abordagem centrada no estudante, ele é
estimulado a estabelecer os seus próprios
objetivos de aprendizagem, enquanto que na
abordagem centrada no professor, o próprio
professor decide o que vai ser ensinado.
b) Baseada em
problemas/
Baseada em
informação
Na abordagem baseada em problema, os
estudantes adquirem conhecimentos,
habilidades e atitudes pela análise e
resolução de problemas. Na abordagem
baseada na informação, a ênfase é na
transmissão da informação (aulas teóricas)
188 MAMEDE, Silvia. Op. Cit. p., 121.
c) Integrada
(multidisciplinar)/
Baseada em
disciplinas
(especialidades)
No ensino integrado diversas disciplinas são
abordadas conjuntamente (ex. sistemas do
corpo humano-respiratório, neurológico; ciclo
de vida - saúde da criança, saúde do adulto).
Na segunda o ensino é baseado em
disciplinas isoladas (ex. anatomia, fisiologia)
d) Baseada na
comunidade/
Baseada em
hospital
Na primeira abordagem o ensino é centrado
na comunidade, como no centro de saúde
comunitário. Na segunda o hospital é o
principal lócus do ensino.
e) Eletivo/
Padrão
Em programas eletivos é dado tempo para o
estudante escolher o que estudar e se
aprofundar. No currículo padrão todos os
estudantes têm de cumprir todo o programa e
não tem tempo para estudar o que é de seu
maior interesse
f) Sistemática
(planejada)/ Não
planejada
No currículo sistemático as atividades
educacionais são planejadas e registradas.
Na outra abordagem as atividades
educacionais são realizadas sem uma
sistematização (ex. acompanhamento do
atendimento em um ambulatório).
No passo 5 é feita a estruturação do currículo. Todas as
informações anteriormente colhidas devem ser integradas nesse momento.
Estabelece-se o que o curso irá oferecer, os objetivos gerais, a estrutura geral, o
cronograma, além da introdução à metodologia adotada, à biblioteca e outros
recursos de aprendizagem, como sistema de avaliação do aluno e do curso.
Nesse caso não se pode fazer a estruturação por disciplinas por
ser contrário ao método por nós proposto, devendo-se estruturar por módulos ou
blocos com fim de aprendizado voltado para a multidisciplinaridade189. Assim,
nesse passo os docentes das várias disciplinas devem reunir-se para estruturar o
modo pelo qual cada assunto será trabalhado, para que se construa a unidade do
módulo.
O passo 6 é muito parecido com o passo 5, posto nele também
ocorre o desenho das unidades do curso. São estabelecidos os objetivos gerais da
unidade, os métodos de ensino-aprendizagem, o modo de avaliação do aluno e da
unidade, os recursos de aprendizagem (bibliografia indicada e sugerida, vídeos) e
o cronograma da unidade.
O passo 7 consiste na elaboração do sistema de avaliação dos
alunos. Também se diferencia do método tradicional e dada sua grande relevância
cuidaremos detidamente desse assunto no capítulo 8 (oito).
O passo 8 refere-se à descrição do modelo de organização do
currículo:
Um formato muito utilizado pelas escolas que utilizam o PBL é
conhecido como gerenciamento matricial, no qual há dois tipos de
grupos distintos dentro da organização: os departamentos
permanentes, representando as várias disciplinas ou campos do
conhecimento, e as equipes temporárias responsáveis pelas
atividades curriculares. Pode haver equipes temporárias para
diferentes unidades do currículo, e também para atividades
curriculares específicas, tais como avaliação ou desenvolvimento 189 Aqui cabe uma frase de Jacques Labeyrie: “Quando não se encontra solução em uma
disciplina, a solução vem de fora da disciplina”.
institucional. É recomendado que as equipes temporárias sejam
organizadas em um projeto específico, tenha um orçamento e seja
coordenada por um diretor com responsabilidades executivas. O
diretor do projeto deve ser apoiado por um comitê curricular
composto por pessoas que ocupem posições-chave dentro do
curso. O coordenador do curso deve articular com os diversos
departamentos a participação dos seus docentes em vários
projetos190.
O passo 9 refere-se ao processo de gerenciamento do currículo,
em que deve haver a comunicação entre todos os envolvidos, seja quanto ao
desenho do currículo ou quanto à execução, visando evitar falhas como,
esquecimento, sobreposição e repetição no ensino de determinado tema.
Por fim, o passo 10 cuida da montagem do sistema de avaliação
do curso. Essa avaliação deve ser completa, vale dizer, envolver alunos,
professores e a sociedade.
Dessa forma, verifica-se que no currículo dirigido ao preparo de
um profissional generalista, em regra o ponto de partida são as condições,
características e causas mais prevalentes na região onde o aluno vai atuar, bem
como nas práticas e habilidades que aquele profissional costuma desempenhar
tradicionalmente na região. A esfera cognitiva do currículo PBL deve garantir ao
aluno o estudo das situações necessárias para sua capacitação, como procurar o
conhecimento por si mesmo ao deparar-se com uma situação problema. Além
disso, o currículo PBL deve internalizar essa atitude no aluno como parte de seu
comportamento como profissional.
O currículo PBL deve sofrer revisões permanentes a partir da
retroalimentação feita à comissão de currículo pelos tutores e monitores de
estágios, bem como pelas avaliações cognitivas e de habilidades. A comissão de
currículo deve ter caráter permanente e seus membros devem ser submetidos a
190 MAMEDE, Silvia. Op. Cit., p. 126.
rodízio regular juntamente com os demais membros da escola. Geralmente a
substituição não é total, é apenas parcial, mas paulatinamente, após determinado
período, toda a comissão será substituída. Esse método de substituição
proporciona a convivência de membros experientes com novos membros, sem
contar a continuidade do trabalho de revisão permanente do currículo191.
Neto Lôbo afirma que para ser satisfatório e cumprir com suas
finalidades, o curso de Direito deve atingir uma tríplice função a ser considerada
para a elaboração do currículo:
(...) a) formação fundamental e sócio política que forneça ao aluno
uma sólida base humanista e de capacitação crítica; b) formação
técnico jurídica, que o capacite ao exercício competente de sua
profissão, reconhecendo que as disciplinas dogmáticas admitem
espaço à reflexão crítica; c) formação prática, oferecendo-lhes os
meios para aplicar os conhecimentos obtidos192.
191 KODJAOGLANIAN, Vera Lucia, BENITES, Clarice Cristina Andrade, MACARIO, Irma et al.
Inovando métodos de ensino-aprendizagem na formação do psicólogo. Psicol. cienc. prof. [online].
mar. 2003, v. 23, n. 1. Disponível em: <http://pepsic.bvs-
psi.org.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1414-98932003000100002&lng=pt&nrm=iso>. ISSN
1414-9893. 192 Op. Cit., p. 38.
7. CONSTRUÇÃO E NARRATIVA DE PROBLEMAS
O problema apresentado aos alunos geralmente consiste na
descrição de certo fato que é observado como um fenômeno, ou, ainda, situações
ou eventos que precisam de explicações. Tem por finalidade ativar a motivação
intrínseca do estudante, pois mostra a relevância do tema.
Na formação dos problemas pretende-se que os alunos tentem
resolvê-lo com base em seus conhecimentos prévios, aprendendo a trabalhar em
grupo de forma interativa, em que cada um irá expor o que sabe. Além disso, cabe
ao aluno analisar o que precisa ser estudado para que possa dar a solução
adequada e aprofundar-se no tema.,
O resgate dos conhecimentos prévios do aluno possui as
seguintes finalidades: a) complementar o conhecimento se este possuir
fundamento e não for completo; b) reforçar o conhecimento se este já for
adequado; c) substituir o conhecimento, ou seja, aprender a desaprender, se este
possuir erros em seu conceito e definição.
O problema deve ser formulado de maneira a contemplar no
mínimo duas disciplinas, pois se trata de um método multidisciplinar. Assim, o
aluno é estimulado a buscar a resposta,ante as diversas informações disciplinares
e as diferentes fontes.
O problema não pode se limitar aos aspectos do conteúdo
disciplinar. Na área jurídica há situações que envolvem o comportamento humano,
social, a moral, a ética, a economia, ou seja, além da matéria jurídica ainda há o
aspecto humanístico, social, intelectual, psicológico, enfim, a ciência deve ser
exercida por meio da transdisciplinariedade.
Conforme Edgar Morin, em sua evolução muitas vezes a ciência
utiliza-se de conceitos de outras áreas, mas que são também aplicados naquele
caso porque o todo é uno e a divisão de disciplinas serve apenas para facilitar o
ensino:
(...) têm o propósito de insistir na espantosa variedade de
circunstâncias que fazem progredir as ciências, quando rompem o
isolamento entre as disciplinas: seja pela circulação de conceitos
ou de esquemas cognitivos; seja pelas invasões e interferências;
seja pelas complexificações de disciplinas em áreas
policompetentes; seja pela emergência de novos esquemas
cognitivos e novas hipóteses explicativas; e seja, enfim, pela
constituição de concepções organizadoras que permitam articular
os domínios disciplinares em um sistema teórico comum193.
O problema deve apresentar um título capaz de direcionar os
alunos para o interesse central a ser estudado. Além disso, o texto não deve ser
extenso, devendo ser claro e evitando situações ambíguas. Recomenda-se que
tenha perguntas para conduzir a discussão ao tema definido, vale dizer, quanto
mais preciso for, menos desvio do assunto e dispersão no debate haverá. Desse
modo, devem apresentar as seguintes características:
1) ser pertinente no nível de conhecimentos adquiridos
anteriormente pelos estudantes;
2) motivar os estudantes para aprofundar novas temáticas;
3) ser adequado aos conteúdos que serão abordados;
4) dirigir os estudantes para atingir um número variável de objetos
didáticos do curso (Majoor GD);
5) estimular um processo caracterizado pela coleta e interpretação
dos dados, a formulação do problema, o desenvolvimento de
hipóteses, a estratégia de pesquisas194.
193 MORIN, Edgar. Op.Cit., p. 112. 194 Apud. MAMEDE, Silvia. Op. Cit., p. 151.
Para a criação do problema Harriet Christiane Zitscher faz a
seguinte sugestão:
Primeiro escolhe-se um caso interessante da jurisprudência
(preferivelmente da última instancia), que trate de um problema
típico da matéria. Depois, adaptam-se os fatos do acórdão a um
caso para os alunos. Se for necessário, é possível e até útil alterar
os fatos ou somar-lhe algumas circunstancias para abranger
melhor a área do Direito tratada, a fim de que os alunos possam
descobrir as soluções passo a passo195.
Depreende-se que criar um problema apropriado para uma classe
de PBL é um componente crítico que determina se a aprendizagem será ou não
bem sucedida. Diante disso, convém ressaltar que as variáveis principais a
considerar incluem: a) escolher um problema relevante; b) verificar se a cobertura
do problema inclui a idéia geral e habilidades básicas; e c) assegurar que a
complexidade apresentada imite situações vida real196.
A relevância é ponto fundamental para que os alunos tenham
motivação, para isso é importante que os problemas tratem de assuntos atuais e
corriqueiros, que realmente estão presentes no cotidiano. Entretanto, os objetivos
de estudo devem estar interligados e serem capazes de estimular a aquisição de
conhecimentos, pois a aprendizagem será conduzida através do texto. A seguir
elencamos dois exemplos de problemas práticos:
Exemplo 1: João lê o jornal a seguinte afirmação: o direito à vida é
assegurado no Brasil. Sua prima vem a sofrer um estupro que resulta em
gravidez. Diante disso ela se socorre de um advogado que informa que ela poderá
fazer o aborto. João fica confuso e procura um advogado para verificar qual a
atitude correta diante da lei, a fim de evitar que sua prima venha a cometer um
195 Op. Cit., p. 41 196 http://edweb.sdsu.edu/clrit/learningtree/PBL/Choosing_PBL_problem.html
crime.
Exemplo 2: Pedro pede a seu amigo João que seja fiador em seu
contrato de aluguel. João aceita, mas diz que a única propriedade que tem é a
casa em que mora com seus três filhos. Posteriormente Pedro deixa de pagar os
aluguéis e o credor cobra de João penhorando sua casa. Essa solução é permitida
em nosso ordenamento?
Os problemas devem sempre ser atender ao conteúdo
programático do módulo a que pertencem, e necessariamente deve haver uma
seqüência lógica entre eles, para que possam abordar diferentes etapas do
processo a ser aprendido.
Por fim, Silvia Mamede lança luz sobre o tema ao descrever os
quatro tipos de problemas que podem ser formulados:
1) descritivo: o texto apresenta um evento de forma neutra e os
participantes têm de aprofundar o tema explicando e/ou
fornecendo um sentido aos eventos;
2) explicativo: neste caso, diferentes aspectos têm de ser
explicitados em termos do processo, deixando claros os
mecanismos causais. Trata-se de estabelecer relações de causa-
efeito ou mecanismos seqüenciais que permitem explicar a
evolução;
3) obstáculo do processo: o problema está construído ao redor de
um personagem, que tem de realizar uma ação, mas não sabe
como;
4) dilema: o texto apresenta duas opções, duas possíveis
propostas de intervenção e os participantes têm de escolher uma
argumentando as razões da escolha. Por dilema entende-se
sobretudo a discussão ao redor de um problema ético. Os
participantes, neste caso, expressam considerações baseados em
seus próprios valores morais e éticos197.
7.1 GRUPO TUTORIAL
O grupo tutorial é formado por até 10 (dez) alunos, sendo que
dentre eles haverá ainda a escolha de um coordenador e de um relator, bem como
de um facilitador que trabalhará na resolução do problema.
O papel do tutor ou facilitador é ser o parceiro e o estimulador dos
estudantes na busca de novos conhecimentos. Ele orienta a discussão visando
estabelecer os objetivos a serem alcançados e estimular a discussão. O tutor
jamais deve dar a resposta pronta ao aluno, nem mesmo aulas expositivas sobre o
tema. Cabe a ele ajudar o aluno a aprender a descobrir os objetivos de
aprendizagem no problema, a buscar informações relevantes e a trabalhar em
grupo. As perguntas que os alunos devem ter em mente para solucionar o
problema são: quem? O quê? De quem? Por que?
O facilitador deve assegurar que todos do grupo participem de
forma igualitária, bem como estimular a participação daqueles que são mais
tímidos para que desenvolvam sua habilidade de oratória e exposição do
pensamento. Ele deve sempre manter o processo de aprendizagem e evitar que
ocorram desvios, focando a discussão em conformidade com o problema. Em
termos práticos, o facilitador deve estimular o pensamento crítico e profundo sobre
o tema, deve ainda fazer perguntas que estimulem o exercício reflexivo sobre a
relevância, profundidade e aplicabilidade do tema, além de detectar os pontos
positivos e negativos do grupo, como a contribuição de cada membro e se há
participação mútua.
197 Op. Cit., p. 147-150.
O tutor também exerce outras funções dentro da dinâmica de
grupo, como lidar com eventuais problemas de relação interpessoal dos alunos,
assegurar que todos estejam envolvidos e notar o desenvolvimento do grupo
como um todo.
Ele não precisa ser um especialista no assunto, basta ter pelo
menos três qualidades: a) possuir um razoável conhecimento sobre o tema em
estudo; b) ter disponibilidade para envolver-se com os estudantes de maneira
autêntica (congruência social); e c) ter habilidade para expressar-se numa
linguagem inteligível para os alunos (congruência cognitiva)198.
A função dos alunos, por sua vez, é participar ativamente da
discussão, contribuindo com seus conhecimentos e experiências anteriores na
primeira reunião, Nas reuniões subseqüentes eles devem contribuir com os novos
conhecimentos e referências bibliográficas complementares encontradas. Além
disso, os alunos devem respeitar os colegas permitindo que todos expressem
suas opiniões, sabendo o momento de intervir, e deve colaborar para o bom
desenvolvimento do grupo.
Dentre os alunos serão escolhidos um coordenador e um relator,
que exercerão um papel importante no grupo tutorial. O coordenador tem o dever
de contribuir para que o grupo tutorial funcione de maneira eficiente e efetiva,
mantendo o tema em discussão e assegurando a participação de todos, evitando
que haja a monopolização por parte de alguns. Nota-se que algumas de suas
funções confundem-se com a do facilitador, mas isso é para que se garanta o
efetivo aprendizado e que não haja distorções.
O relator deve anotar a lista de objetivos de aprendizagem
definidos no Encontro de Análise do Problema e as referências bibliográficas, bem
como relatar as discussões ocorridas no grupo tutorial. Recomenda-se que as
anotações sejam feitas em um quadro para que todos possam acompanhar.
198 MAMEDE, Silvia. Op. Cit., p.182.
Ao final do ciclo de cada problema, o grupo deve escolher um
novo coordenador e um novo relator, em sistema de rodízio.
A seguir abordaremos o tratamento dado pela Universidade
Federal do Ceará ao procedimento da tutoria e reunião dos grupos para a solução
dos problemas199.
a) Encontro de análise do problema
1. Explicar o ciclo básico do PBL: encontro de análise do
problema; levantamento bibliográfico e estudo; encontro de
monitorização bibliográfica e resolução do problema; encontro de
resolução do problema e avaliação do trabalho em grupo.
2. Esclarecer que o grupo está no encontro de análise do
problema, explicando a finalidade dessa atividade: a partir de troca
de conhecimentos e experiências prévias, o grupo deve analisar o
problema e identificar o que necessita aprender para se tornar
capaz de resolvê-lo (formular objetivos de aprendizagem). Depois,
deve buscar os recursos de aprendizagem necessários para atingir
os objetivos. Escolher um coordenador e um relator.
3. Distribuir o texto do problema e dar tempo para leitura.
4. Pedir aos participantes para identificarem termos que precisam
ser esclarecidos e facilitar a formulação de uma definição
apropriada. Se o grupo não conseguir nenhuma definição
aceitável, a definição deve se constituir em objetivo de
aprendizagem. Questões-chave a serem formuladas: a) Existe
algum termo nesta história que necessita ser esclarecido? b) Em
caso positivo, algum membro do grupo pode contribuir para este
esclarecimento?
199Disponível em: http://www.medsobral.ufc.br/pbl/pbl.htm. Acessado em 20/07/2005
5. Pedir a um participante para ler em voz alta o problema e a
instrução.
6. Ajudar o grupo a definir o problema, ou seja, identificar a idéia
central que o constitui e que precisa ser explicada ou resolvida.
7. Estimular o grupo a uma chuva de idéias sobre o problema,
assegurando que cada membro do grupo tenha oportunidade de
contribuir para a discussão. Incentivar a troca de conhecimento e a
ativação de experiências prévias, para que o grupo defina os
diferentes elementos constitutivos do problema. Questão-chave a
ser formulada: à luz do seu conhecimento e da sua experiência, o
que você comentaria a respeito deste tema?
8. Perguntar a cada participante o que ele gostaria de aprender
para conseguir uma melhor compreensão do problema e fazer
sugestões apropriadas para sua resolução.
9. Ajudar os participantes a enunciar apropriadamente os objetivos
de aprendizagem e solicitar que escrevam a lista no quadro. A lista
dos objetivos específicos do problema deve ajudar o tutor a guiar a
relevância dos objetivos identificados pelos participantes.
10. Esclarecer quais são as responsabilidades de cada um no
processo de aprendizagem: cada participante deve identificar,
através da pesquisa bibliográfica, o material de aprendizagem
relevante (artigos, capítulos de livros, etc.), aconselhando-se,
quando necessário, com o tutor.
11. A lista dos objetivos de aprendizagem definidos pelo grupo é
anotada pelo relator.
Lembrar aos alunos a finalidade do próximo encontro e enfatizar a
importância de que cada participante estude todos os objetivos de
aprendizagem.
b) Encontro de monitorização bibliográfica e discussão do
problema
1. Explicar o propósito do encontro:
a) compartilhar os materiais de aprendizagem coletados,
selecionados ou desenvolvidos por cada membro do grupo e
escolher os mais relevantes para o estudo subseqüente;
b) discutir o problema e identificar dúvidas ou pontos a serem
aprofundados no próximo encontro;
c) estar atento ao desenvolvimento do trabalho do grupo.
Acompanhar o processo de trabalho em grupo e identificar
aspectos positivos a serem reforçados e fragilidades que
necessitem de reforço para o desenvolvimento de habilidades
necessárias para o trabalho efetivo do grupo.
2. Pedir ao grupo para reler a tarefa estabelecida pelas instruções
do problema. Solicitar ao relator que leia os objetivos específicos
determinados pelo grupo no encontro de análise do problema
3. Pedir a cada membro do grupo para sumarizar a) o que ele fez
até agora para coletar e selecionar material relevante e comentar
as dificuldades encontradas; b) quais os materiais ele sugere para
os outros membros do grupo estudarem;
4. Pedir ao grupo para avaliar o material selecionado, se é
relevante e suficiente. Caso contrário, enfatizar a importância da
pesquisa bibliográfica complementar.
5. Encerrada a discussão sobre os materiais de aprendizagem,
iniciar a discussão do problema (e não dos objetivos de
aprendizagem).
6. Relembrar que o grupo deve permanecer atento à necessidade
de pesquisa bibliográfica complementar para a solução do
problema.
7. Incentivar os participantes a fazerem suas apresentações
esquematizando-as no quadro. Questão-chave a ser formulada:
com base no que você aprendeu durante este período, como você
solucionaria o problema?
8. Procurar sempre levar o participante a justificar suas propostas
com as evidências encontradas nas referências bibliográficas
estudadas. Questões-chave a serem formuladas: a) por que você
acha que está medida ou proposta deve ser adotada? b) você
pode explicitar como isso seria realizado? c) Vocês identificam
alguma contradição ou divergência entre as várias proposições
feitas pelos membros do grupo? Se sim, como solucioná-las.
9. A cada passo ou medida proposta, procure envolver os outros
participantes, pedindo a cada um por vez.
10. Procure evitar que a discussão se faça unicamente a partir das
experiências individuais dos participantes ou do bom senso. Faça
com que os participantes justifiquem suas intervenções com os
novos conhecimentos teóricos adquiridos, sempre procurando
fazer com que eles se reportem às referências bibliográficas
estudadas.
11. Quando o grupo chegar a uma solução de consenso para o
problema, solicite que os participantes façam uma síntese dos
principais tópicos e identifiquem pontos que precisam ser
aprofundados.
12. Relembrar o propósito do próximo encontro, o de resolução do
problema. Esclarecer que o Encontro de resolução do problema
incluirá também um acompanhamento do processo de trabalho em
grupo. Explicar as finalidades dessa atividade: identificar aspectos
positivos a serem reforçados e fragilidades que necessitem de
reforço para o desenvolvimento das habilidades necessárias para
se trabalhar efetivamente em grupo.
c) Encontro de resolução do problema
1. O procedimento é basicamente o mesmo do encontro anterior,
tendo agora o objetivo de aprofundar a discussão incluindo os
temas escolhidos.
2. Peça ao relator para ler os pontos que foram listados no
encontro anterior para que sejam aprofundados.
3. Verifique com os alunos a bibliografia que foi utilizada e inicie a
discussão sobre o problema inserindo os temas citados.
4. Peça aos membros do grupo para comentarem e discutirem as
apresentações dos colegas.
5. Orientar a construção da árvore temática.
6. No encerramento do problema (10 minutos) é feita uma
avaliação a respeito do desenvolvimento das sessões de tutoria.
Cada aluno avalia a sua participação, a dos colegas e do tutor,
objetivando-se o melhor desempenho individual e do grupo.
8. COMO AVALIAR OS ALUNOS
A avaliação pode ser feita de diversas formas, e em nossa cultura
o meio mais utilizado é a prova, que pode ser escrita, oral ou de múltipla escolha.
A prova é necessária para que se identifique os erros e acertos que estão sendo
cometidos e para avaliar se os objetivos e metas estão sendo alcançados.
Entretanto, a forma com que é realizada nem sempre permite a efetiva percepção
da aprendizagem, pois geralmente o professor pede ao aluno exatamente aquilo
que foi dado em sala de aula e se espera que o aluno tenha aprendido como se
fosse um acumulador de informações. O professor pergunta, mas já tem em sua
cabeça a resposta que considera correta.
Vasco Pedro Moretto afirma:
Nessa visão de ensino, o aprender tem sido visto como gravar
informações transcritas para um caderno (cultura cadernal) para
devolvê-la da forma mais fiel possível ao professor na hora da
prova200.
As provas das linhas tradicional têm as seguintes características:
a) explorar de forma exagerada a memorização, ou seja, visa
apenas verificar o acúmulo de informações que o aluno é capaz de reter, sem se
preocupar com o que foi realmente compreendido, é por essa razão que a maioria
das pessoas não se lembra do que “aprenderam” nos anos anteriores, pois foi
somente uma memorização de conteúdos sem significados;
b) falta de parâmetros para a correção, deixando grande
arbitrariedade em poder do professor, ou seja, só é correto aquilo que o professor
espera que o aluno responda;
200 MORETTO,Vasco Pedro. Op. Cit. p. 94
c) utilização de palavras de comando sem precisão de sentido no
contexto, por exemplo: comente, discorra, dê sua opinião, o que você sabe sobre
e como você justifica. Todos esses comandos fazem com que qualquer resposta
que o aluno dê esteja correta, pois parte de pontos de vista internos. Para maior
precisão é necessário que o professor estabeleça a linha da resposta que espera,
como exemplifica o trecho abaixo:
No estudo que fizemos sobre filosofia da educação, afirmamos
que, para haver o desenvolvimento do indivíduo para a cidadania,
é preciso que ele conheça seu contexto social. Além disso, que ele
tenha um profundo conhecimento de si mesmo. Nos debates que
fizemos em aula, citamos uma frase atribuída a Sócrates:
conhece-te a ti mesmo. Partindo da frase e das discussões feitas
em aula sobre o assunto, explique o significado da frase no
contexto da filosofia da educação 201.
Assim, o aluno sabe o que se espera dele e que a resposta será
analisada dentro de um contexto específico: a filosofia da educação. Sobre esse
aspecto destaca Silvia Mamede:
De uma forma genérica, pode-se afirmar que deve existir uma
relação quase linear e direta entre os objetivos de aprendizagem,
métodos instrucionais e métodos de avaliação dos estudantes. Se
um sistema de avaliação de estudantes não se porta de modo
congruente com os objetivos de aprendizagem, os resultados
dessa avaliação podem ser contraditórios e ambíguos 202.
A avaliação no PBL para que seja eficaz deve estar em
conformidade com a filosofia do novo método, com seus processos inovadores. A
avaliação não pode ser um mero acerto de contas do professor com o aluno, deve
ser feita com o propósito de melhorar a aprendizagem do educando. Ela deverá
prover informações os objetivos alcançados e se os alunos estão tendo progresso.
201 MORETTO,Vasco Pedro. Op. Cit p. 107. 202 MAMEDE, Silvia. Op. Cit., p. 185
Através das informações obtidas será possível observar a forma
pela qual ocorre o ensino, o ritmo das atividades, a relevância do conteúdo e o
nível dos alunos. A instituição deve analisar também se o tutor está conduzindo os
grupos tutoriais da forma adequada.
Não pode haver uma única forma de avaliação, é preciso que
todos os estudantes tenham a oportunidade de demonstrar seu empenho no
aprendizado, por isso convém que o aluno não seja avaliado em apenas um dia
determinado. No PBL é necessário que a avaliação seja constante, ou seja,
sempre se deve atentar ao progresso do aluno desde o primeiro dia de aula, sua
participação nas discussões em sala, material que traz para complementar os
assuntos, e não apenas o que ele escreve em um único dia pré estipulado, o dia
da prova.
Todos os participantes do processo educacional devem estar
conscientes do modo pelo qual se realiza a avaliação, que deve ser feita com
ética, a fim de demonstrar, de forma confiável, o desempenho do aluno sem seja
retirada sua individualidade, pois o aprendizado não é igual para todos.
Ao tratar das disposições básicas para a educação, a LDB traz a
seguinte previsão no art 24, V:
Art. 24.........................................................................................
V - A verificação do rendimento escolar observará os seguintes
critérios:
a) avaliação contínua e cumulativa do desempenho do aluno, com
prevalência dos aspectos qualitativos sobre os quantitativos e dos
resultados ao longo do período sobre os de eventuais provas
finais.
Discorrendo sobre o ensino contínuo afirma Sonia Maria Nogueira
Balzano:
Um processo contínuo pressupõe acompanhamento e controle
constante da aprendizagem, de modo a prevenir as dificuldades,
agindo de imediato sobre elas, por meio de recursos pedagógicos
adequados, capazes de identificar suas causas e de enfrentá-las.
Sobre o sentido dinâmico ou contínuo da avaliação, Lucese afirma
que ‘não existe avaliação sem ação, a não ser por exercício de
nominalismo: avaliar é ver, julgar e agir, num ciclo ininterrupto203.
É exatamente nos termos da lei e da Constituição que o PBL atua.
Ele tem um processo de avaliação contínuo em que o docente está avaliando a
evolução do aluno, e sempre que uma falha for detectada pode ser prontamente
corrigida. Como o sistema fundamenta-se na auto-aprendizagem permite-se que o
aluno aprimore suas deficiências ao focar o estudo nas áreas que possui mais
dificuldades.
Uma avaliação eficiente precisa ser abrangente, ou seja, ter
variedade de procedimentos:
Testes de múltipla escolha e de respostas curtas são úteis para a
mensuração da compreensão e aplicação do conhecimento
aprendido, mas ensaios e outros projetos escritos são necessários
para avaliar a habilidade de organizar e expressar idéias. Assim,
uma imagem completa do que foi aprendido pelo aluno requer o
uso de diferentes procedimentos de avaliação204.
Com base nos ensinamentos de Silvia Mamede205, descrevemos a
seguir os três tipos de avaliação mais abordados pela literatura
1) Avaliação de situação: pretende avaliar quais são os
conhecimentos que o estudante possui ao iniciar o curso, com a finalidade de 203 Do direito ao ensino de qualidade ao direito de aprender com qualidade – o desafio da nova
década. In: LIBERATI, Wilson Donizeti. Direito à educação: uma questão de justiça. São Paulo:
2004. p. 154. 204 BORDENAVE, Juan Díaz. Op. Cit. p. 269. 205 Op. Cit. p. 190-192.
observar se ele será capaz de atingir aos objetivos de aprendizagem, conforme
relata a autora:
O uso de pré-testes sobre os objetivos do curso, técnicas
observacionais, entre outros, podem auxiliar na determinação –
não só para o curso atual, mas inclusive para as futuras turmas –
da posição do estudante na seqüência e no modo instrucionais
mais benéficos.
2) Avaliação formativa: monitora o processo de aprendizagem
durante a instrução. Deve ser feita por módulos e preparada em conformidade
com cada um deles.
Devido ao fato de que a avaliação formativa é direcionada para a
melhoria ensino-aprendizagem, os resultados tipicamente não são utilizados para
a obtenção de notas para o curso. Entretanto, quando se verifica que o estudante
possui reiterados problemas de aprendizagem, deve ser feita uma avaliação
diagnóstica para verificar se a dificuldade é do aluno com o método educacional,
ou se ele tem problemas de ordem comportamental, psicológica, cognitiva ou
mesmo problema físico.
3) Avaliação somativa ou certificativa: verifica se foram atingidos
os objetivos ao final da instrução. Tem como principal objetivo a avaliação dos
estudantes para a verificação de seu aprendizado e para obtenção de notas.
No PBL não se usa a prova como meio de teste porque isso limita
as habilidades dos alunos nas resoluções dos problemas que é de grande
importância metodológica.. Para a citada autora, os mecanismos de avaliação
tradicionais, como os testes de múltipla escolha, são considerados inapropriados,
uma vez que podem desencorajar os estudantes a autodeterminar o conteúdo de
sua aprendizagem e estudar com foco no teste206.
206 MAMEDE, Silvia. Op. Cit. p. 193.
Os métodos de avaliação orientados por processo estruturam suas
estratégias avaliativas nas habilidades de comunicação dos
participantes nas sessões tutoriais, na aceitação da
responsabilidade para a aprendizagem, no processo de aprender a
aprender, na seleção e uso apropriado de recursos de
aprendizagem e no desenvolvimento de habilidades de resolução
de problemas207.
A avaliação deve englobar um todo: participação, desempenho,
interesse e apreensão do conteúdo. O aluno está em constante avaliação e a
vantagem é que o professor pode ir notando as falhas e corrigindo-as durante o
processo de aprendizagem
Objetivando um caráter elucidativo, descrevemos na seqüência o
método de avaliação da UEL (Universidade Estadual de Londrina) 208, que tem
quatro tipos de avaliação: modular, progressiva, de habilidades e informal:
a) Avaliação modular: ocorre ao fim de cada módulo temático.
Refere-se ao conteúdo desses módulos e tem por finalidade principal avaliar a
qualidade do módulo. Um módulo temático deve conduzir os alunos a
determinados objetivos de conhecimento. O núcleo central do módulo temático
são os problemas desenvolvidos para a abordagem dos temas. Um bom problema
deve ensejar uma boa discussão no grupo tutorial, de modo que, ao final da
discussão, os alunos elejam objetivos de aprendizado adequados ao
conhecimento do tema em estudo.
b) Avaliação progressiva: ocorre a intervalos regulares. Tem por
finalidade avaliar a progressão dos conhecimentos do aluno. Um dos modelos de
avaliação progressiva é a aplicação de uma prova comum a todos os alunos do
207 Idem, ibdem. 208 http://www.uel.br/ccs/pbl/AVALIA.HTM
curso, independentemente de sua série, com um número fixo de questões que
versem sobre toda a medicina. Um bom parâmetro para determinar a
profundidade dessas questões e o balanceamento das disciplinas na prova é o
perfil determinado pelo currículo e as exigências legais vigentes no país para a
graduação. Em um currículo PBL é fundamental que o aluno receba
retroalimentação quanto ao seu desempenho nessas avaliações, assim como ao
desempenho relativo de seus parceiros de série. Sua colocação entre esses
parceiros permitirá a ele avaliar com propriedade se seu estudo está adequado ou
inadequado, bem como quais áreas de conhecimento ele precisa melhorar.
c) Avaliação de habilidades: constitui-se da observação metódica
do desempenho do aluno na realização das habilidades esperadas para sua série.
Um método (OSCE - Objective Structured Clinical Examination) é a gincana entre
situações preparadas para o desempenho destas habilidades. Para cada situação
há uma banca que dispõe de um fluxograma de desempenho preparado para
aquela situação específica. Essa avaliação geralmente requer um grande esforço
do corpo docente, razão pela qual é feita com menos freqüência do que a
avaliação progressiva ou a avaliação dos módulos temáticos.
d) Avaliação informal: além das três avaliações descritas, há ainda
a avaliação informal permanente feita pelos tutores e pelos monitores nos grupos
tutoriais e nas práticas. Esta avaliação tem por objetivo verificar o interesse, a
conduta e a responsabilidade. Também há uma avaliação permanente do curso
que é desenvolvida pelos alunos por meio de suas representações nos colegiados
diretivos da escola e na Comissão de Currículo.
Na Faculdade de Medicina de Marília a avaliação ocorre já no
inicio das tutorias. Ao final de cada tutoria ocorre uma auto-avaliação, na fala
inicial, e posteriormente o membro do grupo levanta dados positivos ou negativos,
de forma individual, a cada membro do grupo tutorial, inclusive o tutor.
Ao final do módulo, por escrito e em impresso adequado, o tutor
irá classificar individualmente cada discente. Os conceitos serão: suficiente ou
insuficiente, que indica a reprovação do aluno. Essa avaliação feita pelo docente
será conhecida pelo aluno, que verificará todos os argumentos positivos ou
negativos a ele referidos. Os discente também avaliam o tutor em relação aos
mesmos critérios, e seus formulários escritos também conterão os aspectos
positivos ou negativos do docente, bem como se ele foi suficiente ou insuficiente
ao grupo tutorial.
As provas escritas e as teóricas realizadas ao final de cada
módulo não são formuladas e nem aplicadas pelos tutores, mas sim por um grupo
denominado de “grupo de avaliação”. Os discentes realizarão as provas escritas
ou práticas com a avaliação final de “suficiente” ou “insuficiente”. O discente será
considerado suficiente se responder de forma adequada a todas as questões
formuladas. Caso seja insuficiente, o discente será submetido a nova prova, que
versará apenas sobre os temas em que demonstrou insuficiência. Exemplo: se um
aluno do módulo de direito constitucional não se qualificar no tema de controle de
constitucionalidade, ele será reexaminado somente sobre quanto a esse assunto.
Diante disso, depreende-se que o aluno não pode ser considerado
“meio” qualificado para determinada área do conhecimento, tal como ocorre nas
universidades e escolas que possuem média final 5,0 (cinco), ou média 7,0 (sete)
para não fazer exame. O ser humano deve dominar a área do conhecimento que
será objeto de sua atuação profissional. Não formamos “semi-profissionais”, mas
também não formamos “super-especialistas”.
Por fim, não é somente o conteúdo material que deve ser
examinado, pois o aluno precisa ser capaz de analisar os aspectos biológicos,
psíquicos e mentais de cada ser humano envolvido no problema da questão.
Podemos perceber que embora existam diversas formas de
avaliação, todas têm como fundamento a mesma base. Importante notar que esse
tipo de avaliação pode, também, ser usado no método tradicional, não sendo
aplicado somente ao PBL.
CONCLUSÕES
Embora por meio de um processo lento e cumulativo, verifica-se
que desde seus primórdios a humanidade reuniu extensas informações às quais
denominamos conhecimento. Devido à sua natureza, o ser humano necessita de
conhecimento para as mais variadas funções, desde obter elementos que
satisfaçam sua necessidade biológica, até a proteção frente à biosfera que habita.
Além disso, como ser pensante que é, pelo conhecimento o ser humano relembra
seu passado, vive plenamente seu presente e é capaz de pensar de forma
abstrata seu futuro, buscando respostas para sua existência e a manutenção da
vida.
Posteriormente, com suas necessidades básicas já satisfeitas, o
ser humano procurou explicações, por meio da filosofia, para os fenômenos que
despertam nossa admiração ou nos causam espanto.
Vimos que o conhecimento está em franco desenvolvimento e o
que hoje é uma verdade, amanhã deixa de ser, passando a uma nova forma de
pensar. Isso decorre da evolução inerente a todas as ciências, sobretudo a ciência
jurídica. Por essa razão o ensino deve ser capaz de estimular o aluno a estar
sempre em busca das respostas e não ter o professor como a fonte única de
informação. Nosso sistema legal é diariamente alterado, o que nos impõe a
constante atualização.
Apesar dessa realidade, constatamos que no Brasil ainda não há
uma faculdade que utilize do método da aprendizagem baseada em problemas.
Nota-se que o ensino é baseado na transmissão do conhecimento pelo professor.
Verificou-se que o ensino tradicional foi o que proporcionou nossa
formação e ainda é metodologia mais utilizada no mundo científico, muito embora
não se mostre suficiente. Esse método demonstrava-se efetivo para a época em
que os conhecimentos eram limitados, pois pouco se conhecia da física, da
química, da medicina, enfim de todas as áreas do conhecimento. O estudo do
Direito, nessa perspectiva anterior, reportava-se aos grandes filósofos, ao estudo
da história do direito pátrio, estrangeiro e, da sociologia.
A sociedade, apesar de dinâmica, possuía limitações diversas,
desde o número populacional até a ausência de tecnologia, o que gerava um
corpo de conhecimentos jurídicos com objetivos mais restritos que na atualidade.
Ao nosso entender, o método tradicional era um instrumento relativamente
adequado para o ensino – aprendizagem da sociedade até os anos 60-70.
Com o aumento do volume do conhecimento, da tecnologia, das
necessidades sociais e humanas frente à manutenção de sua sobrevivência digna
e humanizada, os conteúdos a serem conhecidos, sua multidisciplinaridade,
transdisciplinaridade, tornaram-se imensos, por isso afirmamos que a mudança
radical dos conceitos que regem a sociedade é o principal agravante do quadro de
ensino e aprendizagem.
Os conhecimentos adquiridos pelo homem ao longo do tempo
devem ser valorizados em qualquer ensino escolar, e isso não exclui as
universidades. Por isso acreditamos que a tarefa primordial da universidade é
preservar uma identidade cultural. Nesse cenário, entendemos que seria
absolutamente válido o ensino de uma língua em via de desaparecimento, não
porque é útil, mas porque, sendo inútil, corre o risco de para sempre se perder.
Em suma, a universidade é a memória intelectual e crítica de uma sociedade.
Além disso, é fundamental o estímulo à reflexão e associação de
ciências entre si, pois a interdisciplinaridade que, infelizmente, é mais proclamada
que praticada, não é uma opção, é o meio de sobrevivência da universidade.
Precisamos ter o “todo” como nosso objeto do conhecimento, a
relação do ser humano com toda a vida, sua responsabilidade. A faculdade de
Direito deve habilitar seu aluno a perceber quais são os valores e interesses que
nossa sociedade busca. Temos que aplicar o Direito em prol da maioria, em
conformidade com o objetivo da solidariedade previsto em nossa Constituição,
coibindo a aplicação dos conhecimentos para a prática de lobbies.
Com o avanço das descobertas científicas e a vigorosa criação
legislativa em nosso país, faz-se necessário capacitar profissionais que avaliem
criticamente a aplicação de seus esforços na sociedade, bem como tenham
consigo o compromisso social de estarem sempre atualizados, para que possam
exercer adequadamente o papel esperado pela sociedade. Para tanto, é preciso
que saibam desenvolver de forma autônoma o aprendizado ao longo de suas
vidas profissional.
A nosso ver o método de aprendizagem baseada em problemas
(ABP - PBL) não é a última fronteira para o ensino – aprendizagem. Esse método
visa fornecer ao estudante um instrumento que lhe permita a atualização continua
de sua profissão futura, tendo como ponto de partida a natureza humana, que é
apenas um fragmento da natureza global, em suas feições biológica, psíquica e
social, que anseia a felicidade e a dignidade para a sua existência.
Acreditamos que o presente método é o mais adequado a cumprir
a finalidade estabelecida na Constituição Federal de garantir o pleno
desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua
qualificação para o trabalho.
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