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UNIVERSIDADE DE LISBOA
INSTITUTO DE EDUCAO
A CONSTRUO E UTILIZAO DE UM SISTEMA DE AUTOAVALIAO EM
DUAS ESCOLAS SECUNDRIAS
Rui Manuel Santos Pereira Gonalves
DOUTORAMENTO EM EDUCAO
ESPECIALIDADE EM AVALIAO EM EDUCAO
2013
i
UNIVERSIDADE DE LISBOA
INSTITUTO DE EDUCAO
A CONSTRUO E UTILIZAO DE UM SISTEMA DE AUTOAVALIAO EM
DUAS ESCOLAS SECUNDRIAS
Rui Manuel Santos Pereira Gonalves
Tese Orientada Pelo Professor Doutor Domingos Fernandes, especialmente elaborada
para a obteno do grau de doutor em Educao
na especialidade de avaliao em educao
2013
ii
DEDICATRIA
Neste iderio de afeto e liberdade em que consiste o ato de educar
Dedico este trabalho ao meu filho
Filipe, de quem tanto gosto e a
quem recomendo vivamente que nunca deixe
de estudar, de ler, de escrever, de aprender
e de sonhar.
iii
AGRADECIMENTOS
Aos principais responsveis pela concluso com xito desta caminhada:
Teresa companheira inseparvel nos bons e maus momentos.
Aos colegas Diretores que me abriram as portas das suas Escolas Secundrias num ato de
confiana e disponibilidade total.
Aos colegas professores e a todos os elementos integrantes das equipas de autoavaliao
com que tive o grato prazer de trabalhar em autntica parceria.
Ao Professor Doutor Domingos Fernandes pela amizade, pela partilha de saberes, pela
orientao, pelo apoio, pelo estmulo, pelo incentivo, pela crtica construtiva, que
proporcionou com sabedoria a descoberta guiada que tornou possvel esta viagem.
A todos, muito obrigado.
iv
RESUMO
A conceo deste trabalho assentou na premissa da escola perspetivada como uma
organizao complexa e aprendente e pela considerao da avaliao como construo
social e cultural e como atividade crtica de aprendizagem. Trata-se da escola encarada como
organizao que utiliza o seu sistema de autoavaliao em termos formativos para se
interrogar, para delinear estratgias de melhoria gradual e para consolidar a sua autonomia.
Afinal, as escolas e os professores podem fazer a diferena, repercutindo na qualidade das
aprendizagens dos alunos a melhoria da organizao da escola e a melhoria do trabalho
dentro das salas de aula.
A questo basilar que norteou esta investigao foi a de compreender como que as
escolas constroem e utilizam o seu sistema de autoavaliao organizacional. Deste modo
procurou-se captar e recolher informao substantiva em duas escolas pblicas secundrias
com 3. ciclo da regio de Lisboa sobre o modo como foram construdos os seus sistemas de
autoavaliao e quais os seus efeitos sobre a adequao da organizao escolar e sobre a
adequao da ao educativa.
A metodologia utilizada neste trabalho foi descritiva, analtica e interpretativa, e os dados
foram recolhidos atravs de observaes, entrevistas semiestruturadas e recolha de
documentos.
Os resultados revelaram que a iniciativa para a realizao da autoavaliao partiu dos
diretores; o envolvimento ativo no processo de autoavaliao est confinado a um pequeno
grupo de professores; as escolas tm dificuldade em mobilizar os alunos, os pais e outros
atores educativos para participarem no processo de autoavaliao; a sala de aula est fora do
mbito da autoavaliao; a falta de tempo e formao por parte dos atores surgem como
constrangimentos para a construo dos sistemas de autoavaliao; no so elaborados
planos graduais de melhoria na sequncia da realizao da autoavaliao.
O estudo permite afirmar como uma das principais concluses que apesar da tentativa
empreendida pelas escolas investigadas de apostarem na autoavaliao, os dispositivos que
utilizam esto longe de se constiturem como sistemas de autoavaliao sistemticos,
refletidos, participados e com real impacto no processo de transformao de melhoria da
vida pedaggica das escolas e das salas de aula.
Palavraschave: Avaliao; AutoAvaliao; Escola; Melhoria; Organizao; Qualidade.
v
ABSTRACT
This abstract is based on the premise which views school as a complex and learning
organization revealed in several factors as the evaluation appraisal viewed as a social and
cultural development besides a teaching perceptive activity. We are therefore discussing the
school viewed as an organization which uses its own self-evaluation system in instructive
terms to question itself, to define strategies in order to pursue continuing improvement and
at the same time to consolidate its own autonomy. After all, schools and teachers can make
the difference, reverberating improvement of school organization in students teaching
quality in addition to improving the work accomplished in the classroom.
The basic question that guided this research was to understand how schools construct and
use its own self-evaluation system. Thus we tried to capture and collect substantive
information in two public secondary schools with third cycle of the Lisbon region about how
their self-evaluation systems were built and what are its effects on the adequacy of school
organization and the adequacy the educational activity.
The methodology used in this study was descriptive, analytical and interpretative, and
data were collected through observations, semi-structured interviews and collecting
documents.
The results revealed that the initiative to promote the self-evaluation system came from
directors; active involvement in the self-evaluation process is confined to a small group of
teachers; schools have difficulty in mobilizing students, parents and other stakeholders to
participate in self-evaluation process, the classroom is outside the scope of school self-
evaluation; lack of time and training for the actors appears as constraints for the construction
of self-evaluation system; no plans of gradual improvement are made upon the completion
of self-evaluation.
According to the study as one of the main conclusion is that despite the attempt
undertaken by schools where the research occurred to engage in self-evaluation, the devices
they use are far, from constituting as systematic self-evaluation systems, reflected, and
participated with real impact on the transformation process of schools pedagogical life and
classrooms.
Keywords: Evaluation; Self-Evaluation; School; Improvement; Organization; Quality.
vi
RSUM
La conception de ce travail est fond sur la premisse de l`cole vue comme une
organisation complexe et apprenante marque par la considration de l`valuation
considre comme construction sociale et culturelle et comme activit critique
d`apprentissage. Il s`agit de l`cole vue comme organisation qui utilise son systme de auto-
valuation du point de vue formatif pour s`interroger, pour tracer des stratgies
d`amliorations graduelles et pour consolider son autonomie Finalement, les coles et les
professeurs peuvent faire la diffrence, en transmettant dans la qualit des apprentissages
des lves, une meilleure organisation des coles et un travail en sale de classe de meilleure
qualit galement.
La question fondamentale qui a guid cette recherche tait de comprendre comment les
coles tablissent et emploient son systme d'autovaluation organisationnelle. \nDe cette
faon nous avons essay de capturer et collecter des informations substantielles dans deux
coles d'Etat secondaires avec le 3me cycle de la rgion de Lisbonne sur le chemin ont t
construits leurs systmes d'autovaluation et ce qui les effets sur l'adquation de
l'organisation d'cole et au sujet de l'adquation de l'action ducative.
La mthodologie utilise dans cette tude tait descriptive, analytique et interprtative, et
les donnes ont t rassembles pour l'observation, les entrevues semi-structures et la
collection de documents.
Les rsultats prouvent que l'initiative de l'autovaluation est alle pour des directeurs ; la
participation active en cours d'autovaluation est confine un petit groupe de professeurs,
coles ont la difficult dans les tudiants de mobilisation, les parents et d'autres acteurs
ducatifs participer au processus ; la salle de classe est hors de porte de d'autovaluation ;
le manque de temps et la formation de la part des acteurs apparaissent comme contraintes
pour la construction des systmes de l'autovaluation ; ne sont pas les plans labors pour
l'amlioration progressive suivant l'achvement de l'autovaluation.
L'tude nous permet d'affirmer en tant qu'une des conclusions principales qui en dpit de
la tentative par des coles de s'engager dans l'autovaluation, les dispositifs qu'ils emploient
sont loin d'tre comme systmes d'auto-valuation systmatique, reflts au moment,
Occup et avec l'impact rel dans le processus de transformation d'amliorer la vie ducative
des coles et des salles de classe.
Mots-cls: valuation; Auto-valuation; cole; Amlioration; Organisation; Qualit.
vii
NDICE GERAL
DEDICATRIA ii
AGRADECIMENTOS iii
RESUMO iv
ABSTRACT v
RSUM vi
NDICE GERAL vii
NDICE DE QUADROS x
NDICE DE FIGURAS xi
NDICE DE ANEXOS (Em CD) xi
SIGLAS UTILIZADAS xii
INTRODUO. 1
Motivao..1 O Problema... 3
As questes de investigao.12 Pertinncia e necessidade.14 Os pressupostos da investigao .15 Da organizao da tese.17
CAPTULO 1 - AVALIAO: UM DILOGO ENTRE A RAZO E A EMOO
NUM CAMPO EM PERMANENTE EVOLUO 19
1.1.O conceito e o sentido da avaliao...................................................................22 1.2.Avaliao, prticas e experincia vivida...34 1.2.1. O acento tnico na teoria...36 1.2.2.O acento tnico nas prticas e na experincia vivida.....37
1.3.Tentativas de organizao das diferentes abordagens avaliativas. 39 1.4. Avaliao e qualidade uma coabitao necessria e incontornvel. 48 1.4.1.O conceito de qualidade.49 1.4.2.A qualidade quando referida a organizaes e processos educativos53
viii
CAPTULO 2 PARA UMA COMPREENSO DA ESCOLA COMO ORGANIZAO 61
2.1.O conceito de organizao.62 2.2.A Escola como organizao...68 2.3. Escola enquanto organizao nuclear dos sistemas educativos
contemporneos71 2.4.O papel da sala de aula dentro da organizao da escola. 77 2.5.Para uma anlise da escola como organizao......82 2.6.As escolas podem fazer a diferena...... 92 2.7.Quatro elementos chave para a eficcia das escolas100 2.8.Uma janela sobre o futuro tempo para uma nova gramtica da escola.107
CAPTULO 3 - AVALIAO DAS ESCOLAS RESPONSABILIDADE E COMPROMISSO NUM ESPAO DE POSSIBILIDADES ENTRE O REAL
E O IDEAL 118
3.1.Reformas no, compromissos sim...119 3.2.O que se passa na maioria dos pases da Europa 129
3.3.Autoavaliao das escolas131 3.3.1.Os modelos e as tendncias atuais.......139 3.3.2.Em Portugal, as experincias mais recentes....144
3.4.A investigao sobre a avaliao das escolas em Portugal..................................151
CAPTULO 4 - METODOLOGIA DA INVESTIGAO...160
4.1.Posicionamento epistemolgico da investigao 161 4.2.Questes de investigao 164 4.3.O design da investigao 165 4.4.Os estudos de caso como estratgia investigativa.. 169 4.5.Participantes... 171 4.6.O perfil das escolas participantes... 172 4.7.Fases da investigao e procedimentos de recolha de dados. 179 4.7.1.Fases da investigao 179 4.7.2.Procedimentos de recolha de dados.. 181 4.8.Transformao dos dados..... 190 4.9.Perspetivas e limitaes da investigao. 192
CAPTULO 5 ESCOLA A: UMA ESCOLA DESASSOSSEGADA COM A INDISCIPLINA E FOCADA NA PROMOO DA INCLUSO E DA
CIDADANIA..194
5.1.O Contexto...194 5.2.A entrada na escola..199 5.3.O conceito de escola de qualidade...203 5.4.A construo e utilizao do sistema de autoavaliao... 205 5.5.Sntese interpretativa226
ix
CAPTULO 6 - ESCOLA L: UMA ESCOLA CARATERIZADA PELA
DESCONTRAO E PELA INFORMALIDADE, ANCORADA NA SUA
PRETENSA QUALIDADE...231
6.1.O Contexto...231 6.2.A entrada na escola......235 6.3.O conceito de escola de qualidade.......237 6.4.A construo e utilizao do sistema de autoavaliao...240 6.5.Sntese interpretativa 263
CAPTULO 7 - AS DUAS ESCOLAS EM ANLISE...268
CONCLUSES, REFLEXES E RECOMENDAES 277
REFERNCIAS300
ANEXOS E ENTREVISTAS TRANSCRITAS (Em CD)
x
NDICE DE QUADROS
Quadro 1. As nove abordagens avaliativas mais promissoras
para o sculo XXI com base em Stufflebeam (2000).. 41
Quadro 2. Diferentes conceitos de organizao
a partir de Pina e Cunha et al.(2007).66
Quadro 3. Diferentes perspetivas da organizao
a partir de Pina e Cunha et al.(2007).67
Quadro 4. Caratersticas chave das escolas eficazes a partir de Sammons (1999). 98
Quadro 5. Transformao da escola em organizao aprendente
a partir de Lopes e Capricho (2007)....115
Quadro 6. Teses de Mestrado analisadas...153
Quadro 7. Teses de Doutoramento analisadas...157 Quadro 8. Cronograma das vrias fases da investigao...180
Quadro 9. Sntese das fontes de informao utilizadas no trabalho de campo..182
Quadro 10. Mapa de entrevistas realizadas na escola A 1. fase.186
Quadro 11. Mapa de entrevistas realizadas na escola L 1. fase.187
Quadro 12. Mapa de entrevistas realizadas na escola A 2. fase.188
Quadro 13. Mapa de entrevistas realizadas na escola L 2. fase.189
Quadro 14. reas de interveno constantes nos planos anuais de atividades
das escolas A e L ........................................................................................268
Quadro 15. Como o processo de autoavaliao se apresenta no plano anual de
atividades da escola L .270
Quadro 16. Como o processo de autoavaliao se apresenta no plano anual de
atividades da escola A..271
xi
Quadro 17. Algumas caratersticas dos sistemas de autoavaliao das escolas
A e L272
NDICE DE FIGURAS
Figura 1. Representao esquemtica do modo de funcionamento
dptico da escola enquanto organizao, a partir de Lima (1999) 86
Figura 2. Matriz de investigao168
Figura 3. Esquema geral dos procedimentos utilizados na sistematizao,
anlise e sntese dos dados na escola A..191
Figura 4. Grelha de recolha de resultados para anlise estatstica utilizada
Pela escola A...212
Figura 5. ndice do relatrio pormenorizado produzido pelo grupo de
autoavaliao da escola L 250
NDICE DE ANEXOS (Em CD)
ANEXO 1. Factos relevantes na histria da avaliao educativa
ANEXO 2. Seis grandes pocas de evoluo da avaliao
ANEXO 3. As quatro geraes de avaliao
ANEXO 4. Mapa sntese de algumas das principais abordagens avaliativas
ANEXO 5. 22 Abordagens avaliativas para o sculo XXI
ANEXO 6. Critrios de avaliao presentes nos principais modelos orientados para a
qualidade
ANEXO 7. Indicadores de Qualidade da Unio Europeia (2001)
ANEXO 8. Indicadores de Qualidade do Projecto ESSE/SICI
ANEXO 9. Experincias de avaliao de escolas em Portugal
xii
ANEXO 10. Declarao SYNEVA (Promover a qualidade atravs da sinergia entre as
avaliaes interna e externa)
ANEXO 11. Quadro de referncia para a avaliao externa das escolas e agrupamentos de
acordo com a Inspeco-Geral de Educao (2006-2011)
ANEXO 12. Domnios, campos de anlise e referentes da avaliao externa da IGE
para 2011/2012
ANEXO 13. Proposta de investigao aos diretores das escolas
ANEXO 14. Questes de investigao
ANEXO 15. Folheto de divulgao da oferta informativa da escola A
ANEXO 16. Exemplo de um dos questionrios de avaliao aos servios utilizados pela
escola A
ANEXO 17. Guio das entrevistas da 1. fase
ANEXO 18. Guio das entrevistas da 2. fase
ANEXO 19. Transcrio das entrevistas da 1. fase da escola A e Escola L
ANEXO 20. Exemplo da anlise de contedo efectuada 1. fase
ANEXO 21. Transcrio de uma entrevista da 2. fase da escola A e de uma entrevista da
escola L
SIGLAS UTILIZADAS
AEEP Associao dos Estabelecimentos do Ensino Particular e Cooperativo
CAF Common Assessment Framework/Estrutura Comum de Avaliao das Administraes Pblicas da Unio Europeia
CERI Centre for Educational Research
CNE Conselho Nacional de Educao
EFQM European Foundation for Quality Management/Fundao Europeia para a Gesto da Qualidade
ESSE Efective School Self-Evaluation
ESIS Education on Schools Improvement Service (Pas de Gales)
EURYDICE Key Data on Education in Europe
xiii
IEA International Educational Assessment
IGE Inspeco-Geral de Educao
IGEC inspeco-Geral da Educao e Cincia
INES Indicators of Educational Systems
ISO International Standardization Organization/Comit Internacional de Normalizao
KTRs Knowledge Regulation Tools
LLECE Laboratrio Latino-Americano de Avaliao da Qualidade da Educao
OCDE Organizao para a Cooperao e Desenvolvimento Econmico
OFSTED Office for Standards in Education. (Departamento governamental no ministerial criado atravs da Lei para a Educao Education Schools Act de 1992 para assumir a responsabilidade de inspeccionar todas as escolas em Inglaterra.
OTES Observatrio dos trajetos dos alunos do ensino secundrio
PIRLS Progress in International Reading Literacy Study (conduzido pela IEA)
PISA Programme for International Student Assessment; Coordenado e lanado pela OCDE em 1977
QUAL Formao em Servios e Gesto da Qualidade, Lda
SICI Standing International Conference of Control and General Inspectorates of Education (Conferncia Internacional das Inspeces da Educao)
TALIS Teaching and Learning International Survey
TIMMS Third/Trends in International Mathematics and Science Study; levados a efeito pelo International Study Center de Boston (1995 designao de Third, passou a Trends em 1999)
TQM Total Quality Management/Gesto da Qualidade Total
INTRODUO
1
INTRODUO
Sem a curiosidade que me move, que me inquieta, que me insere
na busca, no aprendo nem ensino. (Paulo Freire).
Motivao
H muito, que a educao me toca de perto: de incio como aluno, mais tarde
como professor, diretor de escolas, estudioso e observador. Neste percurso pelo mundo
da educao a avaliao das escolas, enquanto objeto de estudo e via de transformao
da qualidade das aprendizagens, tem atrado, ultimamente, a minha ateno.
Na retrica tudo harmonia, na prtica tudo complexo, sinuoso e no passvel
de leituras lineares e redutoras. Julgo que o pior que pode acontecer a um investigador
ou candidato a tal, agarrar-se a ortodoxias e rigores dogmticos. Acredito na
possibilidade de elaborao de uma perspetiva de avaliao informada, rigorosa,
estruturada, articulada, coerente e pragmtica em oposio ao ingnuo, ao superficial, s
aparncias, ao preconceito, s generalizaes abusivas.
Consciente de que a avaliao e a educao no so cincias exatas at porque a
gesto das expetativas, uma varivel no parametrizvel e com grande influncia
nestas reas do conhecimento, a minha aposta vai no sentido da humanizao e no da
abertura dvida. Integrar e compreender tenses e paradoxos com a considerao do
conhecimento tcito, experiencial, explcito e formal, o caminho que procuro seguir.
A conciliao e considerao da vertente terica e prtica da avaliao so um
pressuposto assumido. A teoria no intil: uma boa teoria cria uma estrutura que
permite organizar e compreender questes no estruturadas e complexas, at porque, a
prtica do que funciona supera em geral a teoria do que deveria funcionar o que
comporta perigos tais como as experincias erradas, os modelos errados, os contextos
errados. O caminho aleatrio da aprendizagem pela experincia pode conduzir ao
paraso ou ao inferno.
Neste trabalho em redor das questes da avaliao e da qualidade das escolas, as
implicaes sociais, polticas, ticas, e educacionais que emergem da problemtica em
anlise esto sempre presentes. Uma anlise social e poltica parece tornar-se uma
INTRODUO
2
condio necessria para a compreenso da natureza da avaliao e da qualidade das
escolas. Uma das questes mais importantes em avaliao no ser poltica? que a
maioria das controvrsias e das negociaes no campo da educao consiste, em debates
polticos sobre ideias, valores, poderes, recursos, compromissos e expetativas, jogos de
interesses e de poderes.
Neste sentido fazer avaliao ser tambm fazer poltica e ser tambm mexer
com a sociedade. E no ser a avaliao tambm uma arte? No me parece verosmil a
considerao da avaliao como uma mera tcnica cientfica mensurvel e objetiva ou
como refere Machado (2013, p.22) que a avaliao possa ser concebida comouma
mquina asstica que os professores, as escolas e os sistemas educativos se limitam a
pr a funcionar.
A avaliao depende das pessoas, assenta em factos, recolha de evidncias, mas
tambm tem subjacente, necessidades urgentes, a utilidade, as expetativas, a intuio, a
tica, a razo e a emoo. De sublinhar que a intuio tem ganho cada vez maior
respeitabilidade cientfica devido a descobertas recentes sobre a aprendizagem implcita,
ou seja, sobre as lies que se vo aprendendo com a vida, sem disso se estar
consciente.
Como recorda Machado (2013, p.25) A avaliao continua a ser um campo de
foras onde se combinam determinismo e liberdade, onde se cruzam as ambies do
controlo com desejos de individualizao, onde se confrontam em suma, os dispositivos
de poder e os sujeitos.
As pessoas so diferentes, as situaes so diferentes, as escolas so diferentes, as
aes so diferentes e o mundo est sempre a mudar pelo que, no existem frmulas
mgicas em educao, mas antes vontades inovadoras persistentes. Nesta linha de
pensamento, a qualidade exige uma significativa responsabilizao e implicao de
todos pela prossecuo de ideias e objetivos.
Dando relevo centralidade da escola e sua qualidade entendidas como servio
pblico em que a misso fundamental passa pela promoo da aprendizagem para todos
os alunos, pelo ensinar a pensar e a abrir horizontes de sentido, pelo saber-se relacionar-
se consigo e com os outros e pela contribuio para um aumento da lucidez e do bem-
estar das pessoas dos alunos, urge perguntar:
Ser verdade que enquanto no se tiver uma escola pblica de qualidade, a ideia
de que existe uma sociedade onde vigora a igualdade de oportunidades um mito?
INTRODUO
3
No tero os alunos, direito a terem professores que estimulem e ajudem os que
mais precisam a romper com o crculo de destituio em que se encontram encerrados
por fora de um estatuto socioeconmico desfavorvel ou por fora da vivncia num
ambiente familiar de privaes e desestruturado?
E no ser que no interior das escolas e nas salas de aula que se trava muito do
essencial da batalha decisiva pela qualidade da educao?
E no ser por isto que bom que existam escolas de qualidade?
E no ser que a avaliao das escolas fundamental para a qualidade das
mesmas? Dito de outro modo, ser possvel construir uma escola de qualidade sem
avaliao?
Sim, ns podemos com inteligncia coletiva construir uma escola de qualidade -
qualidade como construo social negociada.
Ser uma atitude demasiado ingnua, acreditar no papel da avaliao como
projeto aberto ao futuro, questionador do significado das ideias e das aes, tendo como
referencial os valores fundadores da educao e, como perspetiva, a construo da
escola do futuro democrtica, aberta e plural?
Na esteira de Pessoa, o sonho o que temos de realmente nosso, de
impenetravelmente e inexpugnavelmente nosso, por isso, sonho poder contribuir para
uma escola pblica portuguesa melhor esta a motivao maior e principal deste
trabalho.
O problema
A escola um edifcio com quatro paredes e o amanh dentro dele
(George Bernard Shaw).
Num tempo de aceleradas transies culturais, de modernizao tecnolgica, de
fragmentao social e cultural, de globalizao da economia e da sociedade, de
envelhecimento da populao, de alteraes significativas na estrutura familiar
(crescimento do n. de divrcios e aumento das famlias monoparentais), de uma
elevada taxa de feminizao do emprego, as crianas e os jovens tm vindo a aumentar
o seu tempo de permanncia no espao escola.
INTRODUO
4
Desta forma a centralidade da escola quer do ponto de vista social, cultural e
econmico tem ganho relevo acentuando concomitantemente o papel da escola como
unidade estratgica de toda a poltica educativa.
Esta centralidade da escola como unidade estratgica dos sistemas educativos
referida por vrios autores. Assim, Prez Juste (1999), Tiana Ferrer (1999) e Lukas, et
al. (2000, citados em Lukas e Santiago 2004), referem as seguintes razes para centrar a
ateno na escola: a) a necessidade de informao da sociedade com respeito ao sistema
educativo em geral e a cada escola em particular; b) a ideia de que a escola contribuir
para a melhoria qualitativa da educao; c) o aumento da autonomia das escolas que
acarreta, como contrapartida, a prestao de contas.
Desta mesma opinio sobre o papel nuclear da escola parece comungar Lurdes
Rodrigues (2010) ao afirmar o seguinte:
as escolas so hoje o centro do sistema educativo, porque nesse espao que se
concretiza a prestao do servio pblico de educao [] que se resolve a tenso
entre as exigncias do currculo nacional, que garante a todos os alunos acesso
universal ao conhecimento, e os projectos educativos adequados s
especificidades e necessidades dos contextos em que elas se inserem (p. 294).
Desta forma, tudo indica que o lugar concreto de trabalho e de investimento
central a escola, com a sua identidade especfica, a subjetividade dos seus professores
e alunos, as prticas pedaggicas dos profissionais, as suas crenas e representaes, as
suas atitudes face aos alunos e s aprendizagens.
Assim, urge perguntar, ser que as escolas e os professores podem fazer a
diferena repercutindo na qualidade das aprendizagens a melhoria da organizao da
escola e as mudanas no trabalho nas salas de aula?
Ser que a escola construda sob o paradigma da consolidao dos Estados-Nao
e sob os desgnios do Estado-Providncia, e que de acordo com Azevedo (2009, p.5)
no se desenvolveu reordenando-se profundamente, apenas cresceu estar apta a
responder aos desafios da contemporaneidade?
INTRODUO
5
Num tempo atual marcado indelevelmente por duas lgicas argumentativas, a da
modernizao e a da democratizao, ser possvel compagin-las numa escola de
qualidade?
Ser possvel promover na esteira de Nvoa (2009) uma escola que assegura a
presena de todos e a construo de uma identidade partilhada, valorizando a dimenso
pblica da educao, acolhendo uma diversidade de iniciativas organizacionais,
curriculares e pedaggicas, dotada de capacidade para promover as aprendizagens,
respondendo aos desafios da sociedade do conhecimento?
Sendo as escolas, o lugar central de execuo das polticas educativas urge
perceber como estaro elas a exercer este seu papel relevante. que ao que tudo indica
a mudana consistente e planeada da realidade exige um projecto; no havendo
projecto, a rotina o melhor seguro contra o futuro incerto. surpreendente que
nestes ltimos trinta anos se tenham mantido tantas rotinas ancestrais e se tenham
criado rapidamente outras apenas cosmeticamente distintas das que as
precederam, no parlamento e nos jornais, nas universidades e nas fbricas, no
funcionalismo pblico e no Governo, na famlia e na rua. Contra o projecto, o
mtodo, o rigor, a persistncia e a responsabilizao, a rotina o governo do
conhecido pelo conhecido, a facilidade prpria do deixar correr. A rotina incerta
uma forma de prestao de contas que mal se distingue da irresponsabilidade e da
impunidade (Sousa Santos, 2011, p.54).
Como lutar ento nas escolas contra esta rotina incerta procurando trilhar novos
caminhos?
em minha opinio, o que importa caminhar no sentido de uma autonomia das
escolas, o que significa conter e reduzir o papel da administrao central e
outorgar responsabilidades s escolas, como forma de resoluo dos problemas
que ali se sentem e vivem, seja na rea do currculo, dos sistemas de avaliao,
das questes disciplinares ou do relacionamento com os outros parceiros do
processo educativo (Maral Grilo, 2010, p.225).
No mesmo sentido parece ir a posio adotada por Lurdes Rodrigues (2010, p.41)
quando afirma [] igualmente importante prosseguir o caminho de reforo da
autonomia das escolas em matria de organizao pedaggica e de gesto de recursos,
para que estas possam mais eficazmente responder diversidade de uma escola para
todos.
INTRODUO
6
Mas nem sempre esta constatao da centralidade da escola e do seu papel
decisivo para as aprendizagens dos alunos foi reconhecido. Talvez seja ento
recomendvel olhar para o passado para melhor discernir sobre o presente e preparar o
futuro.
Ao sair-se da atualidade nacional e ao viajar-se at dcada de 60 do sculo XX,
encontram-se vrios trabalhos empricos que atriburam ao nvel socioeconmico das
famlias dos alunos o fator explicativo para o seu desempenho escolar. Dentre os
trabalhos da poca, o mais destacado o Relatrio Coleman et al. (1966), que pesquisou
milhares de estudantes norte-americanos. A pesquisa levada a efeito por Coleman e
colaboradores, respondeu a uma iniciativa do Governo e do Congresso norte-
americanos, explicitada no documento Civil Right Act, de 1964, para que se investigasse
a ausncia de igualdade de oportunidades educacionais para os indivduos em funo do
sexo, da etnia, da religio ou da regio de origem das escolas pblicas de todos os nveis
de ensino no pas. Os autores procuraram perceber se as desigualdades no desempenho
escolar seriam melhor explicadas pelo sistema escolar ou pelo sistema familiar. A
concluso a que chegaram apontava no sentido de que as escolas no faziam a diferena
na vida dos alunos.
Assim, a partir dos clebres trabalhos de Coleman et al. (1966) e mais tarde de
Jencks et al. (1972), desenvolveu-se a ideia de que as escolas no contribuam
grandemente para a melhoria dos resultados dos alunos, os quais eram ditados quase na
sua totalidade, pelo respetivo meio socioeconmico e cultural.
No mesmo sentido alinharam alguns estudos da Sociologia da Educao em
Frana, tendo sido marcantes os trabalhos de Pierre Bourdieu e colaboradores (Bourdieu
e Passeron, 1975). Para estes defensores da tese da reproduo social a escola tinha um
mero papel de reproduo das desigualdades sociais.
No entanto, e como reao aos trabalhos e concluses de Coleman, surgiram
novos estudos voltados para a problemtica educacional que sem colocarem de lado a
forte relao entre a origem social e o desempenho escolar dos alunos, conseguiram
contrariar o determinismo social ao identificaram escolas que, atravs das suas prticas
pedaggicas, conseguiam que alunos de classes sociais e culturais desfavorecidas
obtivessem desempenhos escolares elevados (Bressoux, 2003).
INTRODUO
7
Outros estudos (Teddlie e Reynolds, 2000) demonstraram que as escolas faziam
de facto a diferena e que, de entre as caratersticas das escolas apelidadas de eficazes,
se encontravam nomeadamente uma cultura e clima de escola produtivos; uma nfase
nas aprendizagens fundamentais; processos adequados de monitorizao; atividades de
desenvolvimento profissional orientadas no sentido da prtica letiva; o envolvimento
das famlias nos processos de aprendizagem; elevada expetativa de sucesso.
Corroborando estes resultados, Sammons, Hillman e Mortimore (1995) constroem
inclusive uma sntese das onze caratersticas chave das escolas eficazes: liderana
profissional - firmeza e coerncia na tomada de decises; viso e objetivos partilhados
consenso na definio de objetivos e trabalho partilhado pelos docentes; ambiente de
aprendizagem um clima propcio aprendizagem; foco no ensino e na aprendizagem
nfase no desempenho acadmico, j que o objetivo principal da escola deve ser a
aprendizagem; ensino com propsitos definidos ensino de qualidade, com contedos
que faam sentido para os alunos; expetativas elevadas os alunos gostam de ser
desafiados, mas as metas precisam ser alcanveis; reforo positivo - monitorizao do
progresso; direitos e responsabilidades dos alunos receber responsabilidades aumenta
a auto-estima dos alunos; relacionamento escola-famlia estabelecer uma relao de
cooperao; organizao orientada para a aprendizagem os professores, atualizam-se
continuamente para melhorar a qualidade da sua prtica.
A informao adquirida sobre a eficcia das escolas permitiu assim, uma pista
adicional de reflexo para ajudar ao desenvolvimento da escola como organizao
estimulando e promovendo, de forma informada a reflexo dos professores e a
autoavaliao das escolas.
Pode assim afirmar-se que, as evidncias de vrios estudos e pesquisas sugerem
que a escola pode ser um meio efetivo de contrariar o determinismo social (Mortimore e
Whitty, 1997), sendo que, do ponto de vista mais pragmtico, as evidncias empricas
provenientes dos estudos das escolas eficazes podem potenciar, de acordo com
Sammons (1998), a melhoria da escola.
Em sntese, pode-se dizer que a partir da dcada de noventa do sculo XX, o
movimento a favor da eficcia das escolas (school effectiveness), centrado nos
resultados dos alunos e no uso de metodologias quantitativas e correlacionais (e.g.,
Brookover et al., Edwards, 1979; Mortimore et al., 1988; Rutter et al., 1979; Smith e
INTRODUO
8
Tomlinson, 1989) e o movimento a favor da melhoria das escolas (school
improvement), centrado nos processos organizacionais da escola, e na utilizao da
metodologia qualitativa (e.g., Hargreaves et al., 1998; Reynolds e Stoll, 1996) tenderam
a integrar-se no chamado movimento da melhoria eficaz das escolas (effective school
improvement). (Fullan, 1982)
Algo contudo parece inquestionvel, quer o movimento das escolas eficazes, quer
o movimento da melhoria das escolas, quer o movimento da melhoria eficaz das
escolas, contriburam de forma decisiva para a elegibilidade da escola como a unidade
base da mudana.
O movimento das escolas eficazes combateu o pessimismo sociolgico e o
determinismo estrutural e cultural que afirmava ser a escola incapaz de contrariar as
diferenas sociais existentes. Desta forma o debate foi relanado. O bom professor
afinal pode fazer a diferena na vida dos alunos, e uma escola preocupada com a
qualidade pode contribuir para o sucesso de todos os alunos ou de uma grande maioria
dos alunos e no s de alguns.
Em Portugal, e nesta esteira, Justino (2005), acredita no efeito escola quando
pensa que preciso acabar com a obsesso pelo determinismo sociolgico evidenciado
por alguns autores, pois o facto de se verificar uma relao estatstica entre resultados
educativos e classes sociais, no pode servir para dizer que tudo est na dependncia
desse binmio. que, a ser assim, o papel da escola tornar-se-ia perfeitamente
irrelevante. Alm do mais, estudos realizados com base nas classificaes em exames
do 12. ano, escola a escola, permitem deduzir que as boas escolas existem
independentemente do estrato social dominante dos seus alunos, da sua localizao
geogrfica e do seu estatuto pblico ou privado.
Nesta procura da boa escola parece emergir a necessidade de desconstruir os
constrangimentos sociais, culturais e institucionais que interferem no processo de
ensino-aprendizagem e no desempenho escolar dos alunos. Sobre este problema Lurdes
Rodrigues (2010, p.175) refere que Muito antes de qualquer seleco, constitui
objectivo da escola pblica ensinar o mais possvel ao maior nmero possvel de
alunos.
Assim, verificado e declarado a existncia de um efeito escola, por intermdio
da pesquisa sobre as escolas eficazes que veio afirmar que, em funo da natureza de
cada escola, os resultados sobre os alunos podem ser diferentes, a escola passou a
INTRODUO
9
ocupar, com mais acuidade, o centro da investigao educacional, sendo encarada como
um lugar decisivo para o sucesso ou insucesso dos alunos.
De sublinhar pela sua importncia O relatrio A Nation at Risk, (1983), e a
investigao de John Goodlad (1984), que embora de natureza e com concluses algo
diferentes, acordam ambos na centralidade do trabalho desenvolvido na escola e pelos
professores para a melhoria da qualidade das aprendizagens.
neste sentido, e chamando a ateno para o papel decisivo dos professores na
sua prtica quotidiana que nos alerta Lurdes Rodrigues (2010, p.36) ao afirmar Os
professores enfrentam ainda o desafio de reflectir sobre os mtodos de ensino e as suas
prticas pedaggicas. No dia-a-dia da vida das escolas cabe aos professores escolher e
decidir sobre a melhor forma de ensinar em funo das caractersticas dos seus alunos.
Esse o cerne da autonomia profissional no ensino.
Assim, da discusso das questes em redor do papel das escolas e dos professores
parece inferir-se que em pleno sculo XXI mais do que uma convico, um facto
emergente presente em vrios estudos e investigaes empricas que, as escolas e os
professores podem fazer a diferena na vida dos alunos.
Desta forma, no deixando de ser difcil ultrapassar fatores como o capital cultural
das famlias e o seu nvel socioeconmico, e no se conhecendo um modelo de escola
ideal, as escolas pblicas portuguesas tm razes para acreditar que atravs do trabalho
e profissionalismo dos seus professores, atravs da organizao da escola sustentada em
dados concretos e atravs das atividades desenvolvidas essencialmente na sala de aula,
podem fazer a diferena na vida dos alunos.
Por outro lado outra questo intimamente conetada com esta surge com acuidade:
Poder a avaliao das escolas e em concreto a autoavaliao, influenciar positivamente
a qualidade da organizao da escola e do ensino e a melhoria das aprendizagens dos
alunos?
Neste momento porque no adotar na esteira de Sousa Santos (2011, p.154) uma
manifestao de otimismo trgico, que segundo este autor consiste em estarmos muito
conscientes das dificuldades com que nos confrontamos, mas recusarmo-nos a admitir
que no h alternativas. A conscincia das dificuldades impede o facilitismo, enquanto a
conscincia das alternativas impede a autoflagelao.
Sendo assim, e parecendo incontornvel que a qualidade das aprendizagens hoje
uma exigncia social e que, para tal acontecer, se torna necessrio conciliar os
INTRODUO
10
princpios da equidade, da justia e do bem-estar, ento, de acordo com Alarco e
Tavares (2003, p.131) Requer-se que a escola se pense a si prpria, tenha um projecto
especfico e contextualizado no seu ambiente histrico, geogrfico e scio-cultural e se
responsabilize pelo seu cumprimento e pela avaliao da qualidade da sua concepo e
realizao.
Sendo assim, qual o papel da avaliao e em particular da autoavalio das
escolas como projeto aberto ao futuro, questionador do significado das ideias e das
aes, ao servio de uma nova inteligncia poltica tendo como perspetiva, a construo
da escola do futuro?
Como refere MacBeath (1999), as escolas deveriam estar em condies de falar
por si prprias na senda de construo de uma cultura de discusso e reflexividade
alimentadas por um clima de confiana profissional.
A investigao realizada nos ltimos anos (e.g., MacBeath 2000; Murillo, 2003;
Costa e Ventura, 2002) parece apontar no sentido de que a avaliao das escolas,
nomeadamente a sua vertente autoavaliativa, pode contribuir de forma substancial para
a tomada de passos firmes no sentido de as ajudar a organizarem-se para melhorar a
qualidade do seu desempenho e para reduzir o insucesso sem pr em causa a qualidade
das aprendizagens, atravs de uma mudana no discurso, nas prticas e nas atitudes.
Estar-se- em presena de uma mudana cultural?
Para a Eurydice (2004), o destaque conferido avaliao das escolas relaciona-se
com duas tendncias que marcam a generalidade dos pases europeus: a
descentralizao de meios e a definio de objetivos nacionais e de metas em termos de
resultados escolares.
A presente investigao tem como contexto esta nova centralidade discursiva e
poltica situada ao nvel da realidade educacional portuguesa. A nvel de prticas
discursivas sobre a avaliao das escolas podem identificar-se quatro reas: o discurso
oficial normativo que encontra acolhimento no quadro legislativo existente; o confronto
pblico de (i)racionalidades patenteado ao nvel da imprensa; a teia de relaes nem
sempre clara entre os atores escolares e a administrao educativa; o quotidiano e o
concreto ao nvel da gesto e da vida das escolas.
Deste modo, se a sua concretizao prtica ainda incipiente, parece no existir
dvidas de que a avaliao uma realidade nos discursos, caraterizada por uma vasta
polissemia. A semntica do discurso variada, quer associada inovao e mudana,
INTRODUO
11
participao, responsabilidade partilhada, flexibilidade, eficincia, eficcia,
qualidade e melhoria contnua. A avaliao parece, assim, ter entrado definitivamente
para o lxico do sistema educativo portugus.
No contexto da poltica educativa, a avaliao das escolas parece indissocivel das
questes da descentralizao do sistema educativo, da autonomia das escolas e da
reestruturao da administrao escolar. Por sua vez, esta problemtica no pode ser
analisada sem ter em conta o contexto do atual quadro de globalizao, em que as linhas
mestras das polticas educativas so definidas a um nvel que ultrapassa o dos Estados e
em que atravs de ajustamentos e reinterpretaes na aplicao de medidas polticas
resultam, ao nvel local, diferentes realidades de pas para pas, de regio para regio e
de escola para escola.
Por outro lado ao equacionar-se uma perspetiva de avaliao como contributo para
a melhoria da educao e das escolas ela no pode deixar de ser considerada uma
questo poltica e social at porque como afirma Sobrinho (2004), toda a avaliao est
relacionada com ideias, qualidades, escolhas, valores, interesses, grupos, instncias e
poder.
J Weiss (1973, 1991) citado por Kestman e Conner (2006) aponta trs razes
pelas quais a avaliao e a poltica esto ligadas: A poltica e os programas com que a
avaliao se confronta so o produto de decises polticas; a avaliao levada a efeito
em ordem tomada de decises e os seus relatos entram na arena poltica; a avaliao
estabelece implicitamente afirmaes polticas ao colocar em causa a formulao de
certos objetivos ou estratgias.
Alm do mais e como refere Machado (1999, p.7) referindo-se avaliao, esta
[] envolve objectivos ambguos, lgicas diferenciadas e envolvimentos diversos que
constituem um desafio para os agentes educativos, porquanto tanto pode ser uma
estratgia de desenvolvimento organizacional como tornar-se num ritual simblico de
legitimao quer da escola enquanto instituio quer de prticas arreigadas e poderes
instalados.
Mas se a avaliao e a poltica esto incontornavelmente ligados ento no poder
o poder dos atores ser potenciado em cada escola concreta atravs de um sistema de
avaliao participado, contextualizado, dinmico, multidimensional e amplamente
divulgado que permita a manuteno de um dispositivo simples e exequvel, eticamente
INTRODUO
12
apropriado e sistemtico que propicie a melhoria gradual e contnua do servio
educativo?
Neste mesmo sentido parece apontar Bettencourt (2005, p.18) quando refere que
A auto-avaliao entendida como um processo social contextualizado, que permite a
informao e a participao dos diferentes actores, assim como a negociao dos
objectos de avaliao, dos referenciais, dos indicadores e/ou dos mtodos de recolha de
dados.
J para MacBeath et al. (2005), a autoavaliao pertinente porque se as prprias
escolas no sabem se so boas e se esto a fazer progressos ou a piorar, a culpabilizao
ir cair indiscriminadamente maus alunos, pais inadequados, fracos recursos, baixo
oramento. Pelo contrrio, se as escolas souberem os seus pontos fortes e os seus pontos
fracos e possurem sistemas de autoavaliao, at as piores escolas podem melhorar.
So vrios os autores (e.g., Bettencourt, 2005; Lukas e Santiago, 2004; MacBeath,
2005; Meuret e Morlaix, 2003) que apontam a importncia da autoavaliao das escolas
para a sua melhoria e para a qualidade das aprendizagens que propiciam aos alunos.
Em resumo, depois de aclarado que a escola e os professores podem fazer a
diferena na vida dos alunos torna-se necessrio esclarecer se a autoavaliao das
escolas a despeito da sua complexidade e dos seus incontornveis desafios, se pode
constituir como elemento estratgico de gesto pedaggica contribuindo igualmente
para a melhoria do servio pblico de educao.
As questes de investigao
The question is not Is it possible to educate all childrem well? But rather, - Do we want to do it badly enough? (Deborah Meir).
Os objetivos deste trabalho passam por ajudar a clarificar e compreender os
desafios, problemas e oportunidades que so inerentes aos sistemas de autoavaliao das
escolas.
Trata-se de ajudar a perceber as questes tericas que fundamentam os sistemas
de avaliao das escolas, as concees de aprendizagem e ensino que os sustentam, os
valores e a tica que os orientam, as polticas que os motivam, perspetivando
simultaneamente formas de conceber e organizar prticas de autoavaliao das escolas
INTRODUO
13
que ajudem ao desenvolvimento organizacional, contribuindo para o processo de
transformao de melhoria da vida pedaggica das escolas e das salas de aula.
A questo basilar que orientou a presente investigao a seguinte: Como que
as escolas constroem e utilizam o seu sistema de autoavaliao organizacional?
Como sub questes principais surgem as seguintes:
1. Como se organizam as escolas para a autoavaliao?
2. Como que as escolas envolvem os diferentes stakeholders no processo de
autoavaliao?
3. Como se podero caraterizar os principais factores de sucesso e bloqueio
associados construo e implementao dos sistemas de autoavaliao?
4. Como e de que forma se fez sentir o efeito da autoavaliao nas prticas dos
rgos institudos?
5. Como e de que forma se fez sentir o efeito da autoavaliao na ao educativa
(e.g., estratgias de ensino-aprendizagem; superviso da prtica lectiva;
avaliao das aprendizagens; desenvolvimento profissional; formas de atenuar
os efeitos desiguais das condies de partida dos alunos, quer no interior da
escola quer no interior da sala de aula)?
Com a formulao destas questes de investigao e a procura das possveis
respostas, tenta-se contribuir para a abertura a horizontes de sentido. que certas
formas de sentir e de pensar podem por si mesmas favorecer as transformaes na
escola como lugar privilegiado onde se efetua o processo educativo.
Neste sentido importa clarificar a forma como as escolas constroem e se
apropriam dos seus sistemas de autoavaliao como uma axiologia sobre o que
melhor para a prestao do bem pblico que a educao at porque como refere
Sousa Santos (2011, p.8) No obstante o perodo apinhado de urgncias que vivemos,
merece a pena reflectir dentro do momento como se ele tivesse janelas e ousar fazer
propostas para alm das imposies e contra elas. muito o que est em causa.
INTRODUO
14
Pertinncia e necessidade
Ns no vemos as coisas como elas so. Ns vemos as coisas como ns somos.
(Annais Nin)
Como afirma Silva (2006, p.44) numa reflexo sobre a cincia O que a cincia
faz melhor problematizar. O discurso cientfico um discurso de questionamento, de
interrogao, de interpelao. Pea-se-lhe mais perguntas do que respostas, que as
respostas so habitualmente novas perguntas.
Este mesmo autor (2006) acredita ainda que o valor maior que o cientista pode
trazer para o espao pblico a prtica da interpelao, o questionar, o interrogar, o
problematizar, o transformar em poliedros de mltiplas faces o que a experincia social
tende a encarar como figuras planas. Inversamente, o pior que pode fazer pensar por
slogans e comunicar por frases feitas, simplistas e redutoras.
Sendo assim, num sentido problematizador e de questionamento crtico da
realidade educativa, contrria ao dogma e crena, capaz de desmontar muitas das
falcias argumentativas, julgo ser pertinente conhecer e compreender melhor como as
escolas se organizam para construo dos seus sistemas de autoavaliao e de que forma
utilizam os resultados decorrentes dessa autoavaliao para a melhoria da sua ao
educativa e da sua capacitao organizacional.
Julgo ser pertinente perceber como referem vrios autores (e.g., Bettencourt,
2005; Costa e Ventura, 2002; Lukas e Santiago, 2004; MacBeath, 2005; Meuret e
Morlaix, 2003; Murillo, 2003) das potencialidades da vertente autoavaliativa das
escolas para melhorarem a sua organizao pedaggica e a qualidade das aprendizagens.
Em qualquer caso e como nos recorda Silva (2006) nos pases de desenvolvimento
intermdio ou tardio de que Portugal parece ser um exemplo paradigmtico, a
visibilidade e a fora social das comunidades e das suas instituies e prticas
tradicionais so ainda intensas, o que constitui uma boa oportunidade de construo de
solues que, em vez de desperdiadas, podem ser usadas proativamente, como
possibilidades de futuro.
nesta oportunidade de futuro em torno da avaliao das escolas que se ergue
este projeto de investigao, em que considero como pertinente os questionamentos, as
interpelaes, as anlises e reflexes em torno de uma agenda educativa que, incidindo
INTRODUO
15
na vertente da autoavaliao das escolas estar atenta aos processos educativos,
relao pedaggica na sala de aula, s culturas e saberes profissionais, aos padres de
relao com as famlias e as comunidades, s vozes dos atores educativos.
que, A cidadania, o saber ser, conhecer e fazer, a emancipao, o
esclarecimento, qualquer que seja a expresso que as preferncias filosficas e polticas
de cada um levem a usar, no so aquisies ipso facto da escolarizao alargada e
alongada: so problemas sempre em aberto da construo social da exigncia
educativa. (Silva, 2006, p.21).
Os pressupostos da investigao
Quem se interroga, quem procura compreender em profundidade o que faz e as
suas consequncias, quem tenta introduzir mudanas que exigem esforo interpela
automaticamente aqueles que nada querem fazer (Santos Guerra).
O foco principal desta investigao a avaliao das escolas. neste contexto que
se desenvolveu a ideia de esclarecer e compreender melhor a relao entre os processos
de autoavaliao das escolas e os seus processos de melhoria. De que modo a avaliao
das escolas se insinua na histria presente? No ser possvel instalar um desassossego
que, como afirma Jos Gil (2009, p.20) faz devir as subjectividades, que abre o futuro
e a dinmica do presente?.
Como recorda Antnio Nvoa (2009) precisamos de vistas largas no nos
deixando alimentar pelos fechamentos do imediatismo qui alimentados e guiados por
modismos nem caindo na iluso de um futuro mais que perfeito.
No pretendo descobrir a verdade sobre a avaliao das escolas, mas to s
desenvolver sem dogmatismos e ortodoxias uma perspetiva integrada, coerente e
pragmtica com a capacidade de acomodar situaes divergentes e complementares
prprias de um pensamento capaz de melhor discernir uma atividade social complexa
como a avaliao.
A minha preocupao enquanto investigador movida por uma permanente
preocupao pela coerncia entre os factos, explicaes e interpretaes, e enquanto
professor e diretor de escolas, pela procura permanente de maior conhecimento que
INTRODUO
16
fundamente as prticas e as decises, e que contribua para a melhoria do bem-estar das
pessoas e a melhoria da qualidade do servio pblico de educao.
Na senda de Fernandes (2007), qualquer que seja a perspetiva terica ou filosfica
adotada, dificilmente as avaliaes contemporneas podero contornar as questes
sociais, polticas e ticas assim como as questes relativas sua utilizao,
participao dos intervenientes e aos potenciais utilizadores. Trata-se pois da
considerao da problemtica da avaliao numa dimenso no meramente tcnica ou
instrumental, mas tambm em dimenses mais amplas de natureza tica, social, poltica
e pedaggica.
Como relembra o Conselho Nacional de Educao (2007) a educao escolar
fulcral para a o desenvolvimento da sociedade e para a formao de cidados mais
autnomos, livres e solidrios alm de que, tudo o que envolve as escolas pode ter um
papel determinante para o sucesso da educao que nela se fomenta quotidianamente.
Tendo presente a importncia do impacto da escola na sociedade e nos cidados, e
da sua qualidade para o aumento do bem-estar, esta investigao teve em considerao a
natureza especfica do trabalho escolar e do que a escola e assentou em pressupostos
organizados em torno de dois eixos estruturantes:
1. Teve em conta os contributos das diferentes teorias da organizao para a
compreenso da escola entendida como organizao, como totalidade singular, e
adotou uma perspetiva da escola como organizao aprendente (e.g., Guerra, 2002;
Scheerens, 2004; Senge, 1990, 2000) em que a) tida em conta a sua histria, o seu
contexto econmico, social e poltico, a sua identidade; b) reconhecido o papel
central dos atores, o seu poder, e a relevncia da qualidade dos professores e das
lideranas escolares; c) assumido o papel da escola como unidade estratgica de
toda a poltica educativa; d) relevado o aluno como pessoa, como algo singular,
com interesses, motivaes, sentimentos, que atribui significado aos saberes que lhe
so destinados para aprender; e) tida em conta a sala de aula como lugar central
da ao da escola sala de aula como sistema de atividade;
2. Partiu do contributo das vrias abordagens avaliativas e das prticas em avaliao,
para adotar um conceito de avaliao como disciplina da complexidade, como
construo social e cultural e como atividade crtica de aprendizagem (Fernandes,
2006; Mndez, 2003; Silva, 2002) assumindo uma perspetiva de avaliao das
INTRODUO
17
escolas, que sublinha o papel da vertente autoavaliativa a) como suporte ao
melhoramento contnuo e sustentado da escola; b) como ajuda tomada de deciso
fundamentada; c) como apoio mobilizao interna para a mudana e realizao
com xito do Projecto Educativo; d) como suporte de ligao avaliao externa; e)
como meio de promoo do desenvolvimento profissional dos professores; f) como
suporte aprendizagem organizacional.
Dentro desta perspetiva a) a avaliao das escolas pode contribuir para a ao e a
tomada de decises, abarcando quer a dimenso organizacional, quer a dimenso da sala
de aula, tendo carter estratgico para a melhoria da qualidade das aprendizagens dos
alunos da escola/agrupamento; b) a avaliao das escolas tem carter sistemtico,
contnuo e sustentado funcionando ao longo do desenvolvimento do projecto educativo
integrada na vida quotidiana das escolas e no seu ciclo anual de gesto; c) a avaliao
das escolas tem carter participativo associando o conjunto dos atores s prticas de
avaliao, de forma a facilitar a devoluo dos resultados aos principais interessados e a
permitir a confrontao entre grupos com interesses distintos; d) a avaliao das escolas
tem carter formativo criando as condies para uma aprendizagem mtua entre os
atores educativos, atravs do dilogo, da colegialidade e da tomada de conscincia
individual e coletiva.
Da organizao da tese
A presente tese inicia-se com a introduo onde se faz a apresentao de um rol de
questes e consideraes que se constituem como o ponto de partida para esta
investigao que considera a escola como local central da poltica educativa, que
sublinha que a escola e os professores podem fazer a diferena na vida dos alunos
contrariando desta forma os determinismos sociais e os dogmatismos e que perspetiva o
papel da avaliao das escolas, em particular na sua vertente autoavaliativa, como
fulcral e estratgico para as organizaes educativas promoverem a melhoria dos seus
processos e dos seus resultados e concomitantemente almejarem a qualidade.
No captulo 1, o foco foi colocado no conceito e no sentido da avaliao e no seu
entrecruzamernto com o conceito de qualidade relevando os aspetos com impacto nas
organizaes educativas.
INTRODUO
18
No captulo 2, discutiu-se a escola como organizao complexa e social
especfica, constatou-se a sua relevncia como organizao nuclear dos sistemas
educativos contemporneos e perscrutou-se sobre a possibilidade de instituio de uma
nova gramtica da escola para um tempo futuro.
No captulo 3, a nfase foi colocada na anlise da problemtica da avaliao das
escolas em particular na sua vertente autoavaliativa e, nas possibilidades que
proporciona quando perspetivada numa lgica de melhoria contnua da escola.
No captulo 4, apresentaram-se as opes metodolgicas, descrevendo
fundamentadamente as escolhas que orientaram a metodologia usada nomeadamente as
condies em que a investigao se desenrolou: os participantes e sua seleo, as
condies de recolha de dados e o design da investigao.
No captulo 5 e no captulo 6, primeiro apresentam-se e discutem-se os resultados
obtidos nas duas escolas onde decorreu o estudo emprico, sua contextualizao e
depois procede-se discusso (anlise e interpretao dos resultados).
No captulo 7, efetua-se uma anlise comparativa e interpretativa dos resultados
obtidos nas duas escolas
Finalmente, e no mbito das concluses, reflexes e recomendaes, foram dadas
as respostas s questes de investigao baseadas nas concluses decorrentes da
interpretao dos resultados e da sua discusso luz do quadro concetual adotado e de
seguida foram feitas algumas reflexes e recomendaes a ter em conta pelos principais
atores educativos e por possveis investigadores em sede de novos trabalhos. Estas
recomendaes foram suscitadas pelo discernimento que se foi obtendo com o
desenrolar da investigao e que a sistematizado.
AVALIAO: UM DILOGO ENTRE A RAZO E A EMOO NUM CAMPO EM PERMANENTE EVOLUO
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CAPTULO 1 - AVALIAO: UM DILOGO ENTRE A RAZO E A
EMOO NUM CAMPO EM PERMANENTE EVOLUO
Num tempo marcado pela ampliao dos sentimentos de insegurana, incerteza e
instabilidade, num mundo global e simultaneamente local, num contexto voltil e
complexo, o campo da educao tem sido marcado por tenses vrias, onde se faz sentir o
conflito latente entre a democratizao da escola com a universalizao do direito
educao e a necessidade de manter nveis de exigncia compaginveis com as
necessidades das pessoas e da sociedade do sculo XXI.
O campo educativo e as escolas em particular, neste perodo de transies e
incertezas encontram-se desta forma confrontados com um trade off de difcil resoluo.
Como conciliar equidade e qualidade, ou se se quiser, como construir uma escola para
todos que seja ao mesmo tempo exigente sem ser discriminatria?
Por conseguinte, estou em crer, que a avaliao em educao conhece hoje
oportunidades e desafios inauditos, exigindo um reforo do debate, da reflexo e do
discernimento. Qual dever ser o papel de uma avaliao educacional, neste processo
fludo e ambivalente que faz balanar a avaliao e as polticas educativas num continuum
entre uma lgica racionalizadora na procura da eficincia e eficcia numa perspetiva mais
preocupada com a prestao de contas e o controlo e uma lgica formativa de
transformao e melhoramento que pe em relevo o papel dos atores, das suas
experincias e emoes, num processo dialgico de interpretao e de procura de sentidos
e consensos?
Sobre esta mesma questo da necessidade de discernimento e no simplificao das
questes da avaliao em contextos formais de educao e formao se pronunciou
Machado (2013) referindo que o reconhecimento da prevalncia desta tenso essencial
entre o controlo e emancipao, tantas vezes ofuscada por uma certa enfatizao retrica e
ingnua, uma hiptese fundamental para a superao dos atuais paradoxos da educao e
da avaliao (p.25).
Por outro lado parece incontornvel como afirma Ventura (2006, p.206) que A
avaliao est na moda em muitos domnios, nomeadamente no mundo da educao. Este
fenmeno tem-se verificado no domnio pedaggico a partir dos anos sessenta e podemos
dizer que hoje ele um universal incontestvel no mbito da educao.
AVALIAO: UM DILOGO ENTRE A RAZO E A EMOO NUM CAMPO EM PERMANENTE EVOLUO
20
Neste sentido Donaldson e Christie (2006), aludem ao facto de que as sociedades
atuais um pouco por todo o mundo, esto a abraar os valores da prestao de contas e do
profissionalismo e as organizaes de todo o tipo e dimenso esto a levar a efeito
avaliaes a uma taxa crescente de molde a promover o bem-estar das pessoas e a alcanar
os objetivos estabelecidos, ou seja, est-se a assistir emergncia e globalizao da prtica
avaliativa.
Quer como instrumento de inteligibilidade do real quer como dispositivo de ao,
a avaliao em geral e a avaliao em educao em particular, parecem ganhar contornos
de inexorabilidade nos tempos que correm.
No que concerne avaliao em educao, quer se trate da avaliao dos
professores, da avaliao dos alunos, da avaliao de um dado programa ou da avaliao
das escolas, dificilmente a questo avaliativa escapa ao confronto de vises ideolgicas, de
modelos pedaggicos, de opes cientficas e de interesses profissionais.
Mas poder a avaliao fazer parte de um conjunto de elementos das polticas
pblicas fundadas em princpios e valores do bem-comum, democraticidade, participao,
transparncia, responsabilizao, cidadania ativa? Ser que a avaliao pode ajudar a ler
os sinais ajudando a colocar as questes essenciais para a melhoria?
Na sua legitimao discursiva e simblica a avaliao parece ser uma condio
perene da sociedade ps-moderna em que vivemos. Por um lado, ligada a uma necessidade
de perceber os resultados obtidos fruto de presses sociais e recursos escassos, por outro
lado, ligada necessidade de ajudar autonomia dos sujeitos atravs da sua reflexividade
e profissionalismo. Isto mesno refere Machado (2013) ao afirmar que No contexto actual,
que muitos autores designam de ps-moderno [] o confronto entre as narrativas
fundadoras da avaliao continuam, do nosso ponto de vista a manter a sua pregnncia
(p.23).
A propsito da pertinncia dos sistemas de avaliao no campo educativo se
pronunciou Fernandes (2008, p.4) afirmando Creio que o fundamental de qualquer sistema
de avaliao reside na compreenso das questes tericas que o fundamentam. Das
concepes e vises do mundo, de escolas, de aprendizagem e de ensino que o sustentam.
Dos valores e da tica que o orientam. E tambm das polticas que o motivam.
E qual ser o impacto da avaliao na vida das pessoas? E que tipo de avaliao?
Que tipos de racionalidades, negociaes, compromissos, cumplicidades, questes
simblicas, estaro subjacentes avaliao?
AVALIAO: UM DILOGO ENTRE A RAZO E A EMOO NUM CAMPO EM PERMANENTE EVOLUO
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Se, por um lado, como nos diz Gil (2009, p.10) a nossa falta de confiana, a inrcia,
a autocomplacncia, o queixume e a inveja so pragas nacionais que nos envenenam,
todos decorrem naturalmente do tipo de subjectividade produzido pela doena da
identidade; tambm importante recordar que, como nos refere Giddens (1999, p.15)
para controlarmos o futuro, necessrio que nos libertemos dos hbitos e preconceitos do
passado.
Em sentido similar, Maria do Carmo Fonseca (2011) no seu discurso de aceitao do
prmio Pessoa, afirma que Portugal para se desenvolver social e economicamente precisa
que os portugueses mudem de atitude. Para esta cientista a primeira mudana fazer
quebrar com as tradies e enfrentar a prpria mudana o que, significa pensar, conceber
estratgias, traar um rumo para que todos sejam contaminados, nas suas diversas
profisses, pela curiosidade e a ambio de ver o que nunca foi visto e fazer o que nunca
foi feito.
Tendo em conta que como refere Guilherme de Oliveira Martins (1998, p.76) este
desgnio de mudana no sentido da melhoria tem que ter em ateno que A Educao
constitui, [] uma tarefa complexa a que no pode ser indiferente a organizao social, a
harmonizao da equidade e da eficincia, a compatibilidade entre autonomia e
responsabilidade, a ligao entre igualdade de oportunidades e qualidade, olhar para a
avaliao de forma crtica e sustentada do ponto de vista ontolgico, epistemolgico,
metodolgico e pedaggico, parece fundamental no contexto atual dos sistemas
educativos.
Neste sentido h que construir a melhor soluo possvel face s circunstncias
concretas de cada situao o que, implica perceber como refere Mndez (2002) que,
quando relativamente avaliao se coloca o foco nas questes tcnicas - O que avaliar?
Como avaliar? Quando avaliar? As preocupaes subjacentes so a objetividade. Por outro
lado, quando relativamente avaliao a nfase posta nas questes ticas - Para qu
avaliar? Ao servio de quem est a avaliao? Que utilizao se far da informao e dos
resultados da avaliao? As preocupaes so com a justia e a equidade.
Assim, a avaliao trata tanto de ser objetiva como justa. Como Mndez (2002,
p.61) afirma os aspectos tcnicos adquirem sentido precisamente quando orientados por
princpios ticos. Os aspetos tcnicos e ticos no se excluem mas tambm no se
confundem.
AVALIAO: UM DILOGO ENTRE A RAZO E A EMOO NUM CAMPO EM PERMANENTE EVOLUO
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Deste modo, parece ser num permanente dilogo entre a razo e a emoo, num
interagir feito de cumplicidades e num jogo de equilbrios em permanente
reconfigurao/evoluo entre a tcnica e a tica, entre a instrumentalidade racional e os
desgnios da melhoria e da reflexividade, que faz sentido perspetivar a avaliao.
Ser que um dos pontos importantes em avaliao reside no evitamento de formas de
pensamento dicotmico buscando preferencialmente o equilbrio e a integrao?
Um alerta parece tambm impor-se desde j Parece no existirem frmulas
mgicas, regras definitivas, receitas infalveis, modelos de sucesso garantido em avaliao,
afinal tudo no mundo nico, singular e est em permanente mudana. A avaliao no se
trata da terra prometida. No existe o one best way no campo avaliativo.
1.1.O conceito e o sentido da avaliao
Assim, vislumbrar o sentido que pode ter hoje a avaliao, quando pensada numa
perspetiva democrtica de ampliar o conhecimento e ajudar a compreender os processos
complexos que atravessam os diferentes nveis da organizao escola (para o caso
concreto desta investigao) parece ser relevante. Procurar o sentido de algo pretender
determinar a sua orientao prpria, o seu valor intrnseco e a sua significao vital para as
pessoas. Desta forma, a interrogao a propsito do sentido da avaliao no se limita a
ser O que a avaliao? Mas significa essencialmente O que se quer da avaliao? Ou
at O que se deve reclamar da avaliao?.
Como refere Ventura (2006) de um ponto de vista histrico a avaliao foi
perspetivada como uma atividade de abordagem racional da vida (p.208). Encarada
desta forma, a avaliao apresenta-se como parte incontornvel do empreendimento
humano. A este propsito Ventura (2006) alude ainda ao facto de que desde sempre os
seres humanos se envolveram em inmeros atos avaliativos com o intuito de perceber o
valor das coisas. Esta mesma ideia expressa por Valadares e Graa (1998, p.34) quando
afirmam que A avaliao uma necessidade vital do ser humano porque lhe serve para
orientar, de forma vlida, as decises individuais e colectivas.
Perspetivada desta forma natural e no formal, a avaliao parece ser uma atividade
simples. Mas s-lo- de facto? Efetivamente, quando encarada de uma forma formal e
profissional a avaliao , como nos recorda Fernandes (2005, p.99), [] por natureza,
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uma disciplina complexa, influenciada por contributos tericos da pedagogia, da didctica
e da psicologia cognitiva e social, mas tambm da sociologia, da antropologia e da tica.
Etimologicamente avaliar significa atribuir valor a algo, dar a valia e, por isso, no
se configura como uma atitude neutra. A avaliao parece relacionar-se com valor no
duplo sentido da palavra valor: valiosa e vlida. Trata-se da avaliao assumida como uma
atividade complexa e um processo sistemtico de identificao e determinao do mrito e
valor que envolve diversos momentos e diversas pessoas.
Desta forma e para autores como Scriven (1967), Guba e Lincoln (1982) e House
(1989) que partilham desta definio de avaliao, o valor aparece associado ao uso e
aplicao num determinado contexto (qualidade extrnseca) e o mrito relaciona-se com as
caratersticas intrnsecas do objeto sob avaliao, que so independentes da satisfao
expressa por determinados pblicos.
Como referem Formosinho, Ferreira e Machado (2000), um conceito pode ter
diferentes sentidos, de acordo com a perspetiva, os interesses, os objetivos ou ainda de
acordo com o contexto cultural, poltico e ideolgico em que utilizado. H ainda a
registar que, o mesmo conceito na boca de diferentes pessoas pode ter significados
diferentes consoante a carga simblica e ideolgica posta por cada pessoa, atendendo sua
posio social, profissional e ao contexto especfico da ao.
Nesta linha de complexidade do fenmeno avaliativo MacDonald (1977) postula que
a avaliao tem ancorada uma viso da sociedade, sendo que as divergncias sobre a
avaliao advm do facto de as pessoas divergirem sobre o que a sociedade, o que ela
pode ser e o que ela deveria ser. Para este autor, uma grande parte do debate sobre a
avaliao mais no que ideologia disfarada de tecnologia.
Passados mais de trinta anos, ser que esta ideia continua atual? Ser que as
diferentes abordagens avaliativas mais no escondem que os interesses dos patrocinadores
das dmarches ou das agendas avaliativas?
Como afirma Terrasca (2008, p.9) [] a avaliao tanto uma prtica social
como um acto poltico, organiza determinadas vises do mundo e constitui, pelo menos
potencialmente, um instrumento de interveno democrtica.
Parece assim visvel e incontornvel que a avaliao um processo que, quando
aplicado no campo educativo, permite desvendar as concees subjacentes sobre a
sociedade, sobre a escola, sobre a educao, sobre o trabalho dos professores.
Sobre estas concees subjacentes avaliao educativa parece-me interessante dar
a conhecer alguns factos relevantes na histria da avalio educativa (Anexo 1), que
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ajudam a perceber do ponto de vista histrico evolutivo a dinmica do conceito de
avaliao.
Para Dahler-Larsen (2003) a avaliao uma fora criativa que serve para ajudar a
compreender a sociedade num tempo em que esta se complexificou e a confiana no
progresso decresceu, e, em simultneo, se constata uma discusso crescente sobre os
problemas colocados pela nova modernidade.
Nos dias que correm, e intimamente ligado ao inerente e inexorvel debate
ideolgico, parece claro a existncia de uma perspetiva de avaliao ao servio da
performatividade com o acento tnico nos resultados e, portanto, com um cariz
instrumental e tcnico, inserido numa estratgia de desenvolvimento da gesto, e uma
avaliao como alicerce da autonomia poltica e reflexiva ao servio das pessoas e das
instituies. Estas duas perspetivas parecem constituir os plos de um continuum ao longo
do qual se desenvolvem mltiplas avaliaes de diferentes cambiantes e ao servio de
diferentes racionalidades.
A este respeito Lois-Ellin Datta (2005) refere que as administraes preocupadas
com a equidade e a justia social, tm, do ponto de vista histrico, tentado utilizar a
avaliao como fonte de informao para os beneficirios dos programas, procurando que
esta fornea informao pertinente e til, tentando que os seus impactos se faam sentir no
desenvolvimento das comunidades, na participao, no empowerment, ou seja, na
atribuio de maiores competncias e autonomia s pessoas, na sua busca de compreenso
dos problemas e para a procura de solues.
Por outro lado, as administraes que colocam a nfase na eficincia e eficcia e na
procura de resultados mais concretos do ponto de vista quantitativo tm-se preocupado
com as avaliaes que desenvolvem critrios e padres que buscam a causalidade, que
julgam se os programas funcionam como planeado e se do ponto de vista do custo
benefcio so rentveis.
Num sentido similar e no campo educativo, como nos recorda Afonso (1998), os
discursos que fazem apelo excelncia, eficcia e eficincia, competitividade e
produtividade e outros aspetos conetados com a racionalidade econmica podem querer
significar que os nveis de rendimento escolar, aferidos pelas baixas classificaes dos
exames nacionais e por resultados maus em testes internacionais esto a descer. Ou seja,
tem-se verificado em perodos de crise econmica e perodos tensos e contraditrios a
tentativa de o Estado passar para o campo da educao as culpas da crise sentidas na
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economia. A Educao seria assim uma espcie de bode expiatrio da crise econmica e
qui poltica.
Na mesma esteira, Lima (1996) referindo-se ao paradigma de educao que apelida
de educao contbil, relaciona-a com a avaliao que, importada da literatura de gesto,
adquire foros de tcnica inovadora de gesto e controlo da qualidade, tornando-se um
meio de controlo poltico e administrativo, cientfico e pedaggico.
Contudo, Sobrinho (2004) no deixa de lembrar que a avaliao como produo de
sentidos, reflexo sobre valores e significados tem um grande potencial educativo. que,
sem deixar de ser rigorosa e utilizar instrumentos tcnicos, a avaliao pode alimentar
debates, interrogar-se sobre os significados, as causalidades e os processos, trabalhar com
a pluralidade e a diversidade, abrir possibilidades de emancipao, construo e
dinamizao.
Assim, a despeito das diferentes concees e dos intensos debates sobre a avaliao
parece incontornvel a sua existncia e pacfica a sua importncia. A avaliao tem-se
vindo a configurar como uma multiplicidade de mltiplos: mltiplos mtodos, mltiplas
funes, mltiplos impactos, mltiplas racionalidades, mltiplas negociaes, mltiplos
compromissos.
Logo, ao tentar discernir-se sobre a problemtica avaliativa, inevitavelmente se
encontra na literatura diferentes conceitos de avaliao fruto quer de uma evoluo
histrica quer de uma incorporao de diferentes matrizes de carter filosfico, social,
poltico e econmico.
A este propsito interessante recordar aqui seis grandes pocas de evoluo da
avaliao (Anexo 2).
Contudo e independentemente das pocas importante reter na esteira de Guba e
Lincoln (1989, p.21) que no h uma forma certa de definir avaliao, de uma forma
que se possa de uma vez por todas pr fim discusso sobre como realizar a avaliao e
quais os seus objectivos.
Como definio clssica de avaliao pode encontrar-se a defendida por Tyler
(1950) para quem a avaliao o processo de determinar o grau de consistncia entre os
objetivos realizados e os estabelecidos previamente. Os clebres trabalhos de Tyler que
atingiram notoriedade no livro Eigth Year Study of Secondary Education, publicado, em
1942, vm, de acordo com Mateo (2000) citado em Ventura (2006), atribuir avaliao
um papel de maior dinamismo alargando o seu objeto de estudo e conferindo-lhe um papel
de fornecer informaes sobre a eficcia dos programas permitindo aperfeioar
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continuamente o trabalho dos professores. Trata-se de uma conceo de avaliao por
objetivos, assente numa metodologia dedutiva de pendor quantitativo.
Para Alkin (1969), Stufflebeam (1971), MacDonald (1976) e Cronbach (1982), a
avaliao o processo de determinar, obter e providenciar informaes relevantes para
julgar decises alternativas com vista tomada de decises. Est-se aqui em presena de
uma avaliao orientada para a tomada de deciso. A metodologia usada dedutiva,
geralmente quantitativa, objetiva, baseada em instrumentos de medida e em inquritos.
Por seu turno, numa abordagem avaliativa de pendor mais qualitativo Scriven (2000)
defende a avaliao orientada para os consumidores e independente dos objetivos (goal
free-evaluation). Esta avaliao baseia-se na definio de critrios e os instrumentos mais
usados para o efeito so listas de verificao. Aquele autor (1967) foi o primeiro a
estabelecer a diferena entre avaliao formativa e avaliao sumativa. A avaliao
formativa destinar-se-ia melhoria e ao desenvolvimento enquanto na avaliao sumativa
o propsito seria a prestao de contas, a certificao ou a seleo.
Para Patton (2003) a avaliao deve ter o seu foco na utilizao concreta e especfica
que se pretende que venha a ser feita pelos seus reais utilizadores. Trata-se da avaliao
focada na utilizao. Para aquele autor a metodologia usada depende da situao concreta
pois cada situao de avaliao nica. Neste caso dada grande nfase ao fator pessoal,
uma vez que so as pessoas e no as organizaes que usam a informao da avaliao, e
ao fator situacional, dado que a situao concreta e especfica que guia o processo
interativo entre o avaliador e os utilizadores.
Numa avaliao de cariz assente numa metodologia indutiva, qualitativa e subjetiva
Ernest House e Kenneth Howe (2003) defendem uma avaliao deliberativa democrtica
que informa as pessoas sobre as questes relevantes, de modo a que possam discuti-las em
profundidade e que, simultaneamente inclui procedimentos democrticos de recolha e
anlise de dados. Aqueles autores defendem os princpios da incluso os interesses
relevantes de todas as partes tm de ser includos na avaliao; do dilogo o avaliador
tem de se envolver em dilogo extensivo com os destinatrios e promover o dilogo entre
eles; e de deliberao as perspetivas, valores e interesses emergentes so questionados e
sujeitos a anlise, atravs de procedimentos racionais, para determinar a sua validade e,
so depois, transformados em concluses de avaliao.
Por outro lado, tambm pode encontrar-se uma avaliao responsiva ou respondente,
que a defendida por Robert Stake (2003). Nesta abordagem assente numa metodologia
naturalista com recurso fundamentalmente a observaes e entrevistas, tem-se um tipo de
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avaliao que procura dar resposta s preocupaes e necessidades de informao
identificadas pelos destinatrios, sendo que, o avaliador desenvolve todo o processo em
conjunto com os principais destinatrios.
J numa avaliao tambm conhecida como de quarta gerao, Egon Guba e Yvonna
Lincoln (2000) propem uma metodologia construtivista (hermenutica e dialtica),
indutiva, qualitativa e subjetiva para a realizao de uma avaliao. Aqui os dados so
recolhidos e analisados sob mltiplas perspetivas, o avaliador considerado um agente de
mudana que realiza a avaliao num contexto natural, abarcando toda a sua
complexidade.
Neste ponto ser interessante verificar e conhecer as quatro geraes de avaliao
propostas por Guba e Lincoln (Anexo 3).
A avaliao apresenta-se assim incontornavelmente um conceito plurvoco cujo
entendimento tem sido merecedor de debates. Isto mesmo nos diz Figari (1996, p.35)
quando refere a confuso que reina em torno da prpria noo de avaliao: com efeito, e
de acordo com as