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Universidade Federal de Campina Grande
Programa de Pós-Graduação em Linguagem e Ensino 1
ANAIS ELETRÔNICOS ISSN 235709765
SESQUICENTENÁRIO DE ALICE NO PAÍS DAS MARAVILHAS: UM CONVITE À LEITURA LITERÁRIA NOS ANOS FINAIS DO ENSINO
FUNDAMENTAL
Vera Lucia Oliveira CARDOSO1 verinhaolliveira@gmail.com
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia – IFPB
RESUMO
Este trabalho teve como objetivo resgatar nos alunos o gosto pela leitura do texto literário, proporcionando-lhes ricos momentos de descontração e aprendizagem significativa, com possibilidade de ampliação de seu repertório linguístico e cultural, buscando outros livros e tornando-se leitores ávidos a conhecer os fabulosos mundos que se escondem dentro das páginas. Como fundamento teórico, nos baseamos na proposta dos Parâmetros Curriculares Nacionais – PCN (BRASIL, 1998), que sugerem um trabalho com a linguagem pautada na diversidade dos gêneros e no uso da linguagem como forma de interação. Além disso, nos servem de aporte os estudos de Calvino (1993), Coelho (2000), Cosson (2014), Maia (2007) e Rezende et. al. (2013) sobre a importância da literatura na formação cidadã de nossos jovens. Escolhemos como corpus o clássico Alice no País das Maravilhas, de Lewis Carroll, por estar comemorando 150 anos de existência e inspirar adaptações para outros gêneros, tais como: peças teatrais, filmes, poemas, história em quadrinhos, desenho animado, jogos de videogames, entre outros. Como metodologia, realizamos uma sequência didática (Dolz & Schneuwly, 2004) de 10 aulas de 45 min. cada, com alunos do 6º ano, em que eles puderam ler, pesquisar, refletir e escrever sobre a narrativa escolhida. Os resultados dão conta de que o contato com a literatura, por meio de uma obra mundialmente conhecida e amplamente divulgada como é a história de Alice no País das Maravilhas, constitui-se como eficiente estratégia de ressignificar o ensino de língua portuguesa e incentivar o aluno a desenvolver o gosto pela leitura literária na escola e fora dela.
PALAVRAS-CHAVE: Ensino de Língua Portuguesa. Leitura Literária. Formação de Leitores.
1 Professora de Língua Portuguesa da rede pública estadual de ensino da Paraíba e professora substituta
no IFPB, campus Guarabira.
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INTRODUÇÃO
O “maravilhoso” sempre foi e continua sendo um dos elementos mais
importantes na literatura destinada às crianças. Por esse motivo, quando elas
adentram o mundo escolar, é comum que a literatura seja utilizada para introduzir
esses futuros leitores no mundo letrado, dado que sua magia e poder de instigar a
imaginação conquistam prontamente os pequenos estudantes, que encaram tudo
como uma grande brincadeira.
Esse contato com livros de literatura infantil acompanha os alunos durante
todos os anos da Educação Infantil e dos anos iniciais do Ensino Fundamental,
ajudando-os a desenvolver seu nível de relacionamento e interação com os colegas,
bem como conduzindo-os pelo mundo da ficção, em que são apresentados ideais e
valores humanos, tais como bondade, honestidade, esperança, beleza, objetados a
seus opostos, para que a criança, desde cedo, aprenda a se identificar com o herói
bom/ heroína boa.
Conforme Coelho (2000, p. 55), essa identificação da criança se dá, não pela
bondade ou beleza do herói em si, mas, “por sentir nele a própria personificação de
seus problemas infantis: seu inconsciente desejo de bondade e de beleza,
principalmente, sua necessidade de segurança e proteção”. Isto é, a literatura infantil
passa a funcionar como um importante elemento na construção da identidade da
criança.
Não obstante, esse contato com o texto literário vai diminuindo ao longo da
vida escolar do estudante. Ao chegar aos anos finais do Ensino Fundamental, os alunos
praticamente não têm contato com esse gênero, a não ser por alguns fragmentos
contidos no livro didático. E o mais grave: muitas vezes, esses excertos são usados
como mero pretexto para o ensino de tópicos de gramática normativa, excluindo todos
os outros elementos composicionais e estilísticos que dão expressividade e beleza a
esses textos. Essa tendência à subutilização do texto para o ensino de tópicos de
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gramática normativa contribui em grande medida para a desmotivação do estudante
em aprender a língua, e, sobretudo, em desenvolver o prazer da leitura.
A escola é um espaço público em que cada um, aluno ou professor, convive
com o outro, com suas diferenças e peculiaridades, constituindo, assim, um espaço
para a construção e reconstrução simbólica, e todos os sujeitos são produtores e
reprodutores de cultura. Nessa perspectiva, é fundamental que a escola ofereça aos
estudantes o contato com o texto literário, pois alguns deles não dispõem de outros
espaços para esse acesso.
Com base nessas constatações, o presente projeto nasceu do desejo de
reinserir no cotidiano escolar dos alunos o contato com a literatura, conforme
recomendação dos Parâmetros Curriculares Nacionais – PCN (BRASIL, 1998), visando a
tornar o processo de ensino-aprendizagem de língua materna mais significativo e
instigante para os educandos. Para isso, aproveitamos a comemoração do
sesquicentenário da obra Alice no País das Maravilhas, de Lewis Carroll, para
proporcionar aos alunos a oportunidade de realizar diferentes leituras e retomar o
contato com a literatura na escola.
Não é à toa que este livro é lido e relido desde sua publicação em 1865, já foi
traduzido para mais de cinquenta idiomas e tem servido de inspiração para releituras
igualmente interessantes em outros gêneros, tais como peças teatrais, filmes, poemas,
histórias em quadrinhos, desenhos animados e até jogos de videogames. Nas palavras
de Cosson (2014, p. 19), “o trânsito de uma obra a outra, a passagem de um veículo a
outro, acontece justamente porque o terreno em que eles se movem é comum: o
espaço literário”. Seus significados simbólicos estão ligados aos eternos dilemas que o
homem enfrenta em seu amadurecimento emocional, daí a atualidade das questões
levantadas sobre a lógica das coisas e a formação da identidade que subjazem à obra.
É inegável o potencial da literatura em envolver os alunos na aprendizagem,
pois ao adentrar universo literário, familiarizar-se com sua linguagem e sentir-se parte
dele, os estudantes se reconhecem como sujeitos capazes de refletir sobre a sociedade
em que estão inseridos e a atuar sobre ela. Ao encurtar a distância entre os
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adolescentes e os conhecimentos por meio da leitura literária, a escola abre caminhos
para o sucesso não apenas na vida escolar, mas também na vida social como um todo.
Conforme os PCN (BRASIL, 1998, p. 71),
Para ampliar os modos de ler, o trabalho com a literatura deve permitir que progressivamente ocorra a passagem gradual da leitura
esporádica de títulos de um determinado gênero, época, autor, para a leitura mais extensiva, de modo que o aluno possa estabelecer vínculos cada vez mais estreitos entre o texto e outros textos, construindo referências sobre o funcionamento da literatura e entre esta e o conjunto cultural; da leitura circunscrita à experiência possível ao aluno naquele momento, para a leitura mais histórica por meio da incorporação de outros elementos, que o aluno venha a descobrir ou perceber com a mediação do professor ou de outro leitor; da leitura mais ingênua que trate o texto como mera transposição do mundo natural para a leitura mais cultural e estética, que reconheça o caráter ficcional e a natureza cultural da literatura.
Dessa forma, entendemos que proporcionar aos alunos momentos de leitura
de uma obra literária, bem como de outros gêneros inspirados nela é uma eficiente
estratégia de incentivo à leitura, assim como uma valiosa oportunidade para produzir
textos variados, reconhecendo a finalidade de cada um e ampliando seu domínio
discursivo.
Assim, o projeto SESQUICENTENÁRIO DE ALICE NO PAÍS DAS MARAVILHAS: um
convite à leitura literária nos anos finais do Ensino Fundamental foi desenvolvido com
educandos de uma turma do 6º de uma escola estadual, na cidade de Guarabira, tendo
em vista que estes alunos estavam iniciando a 2ª etapa do Ensino Fundamental e nesta
fase, faz-se necessário desenvolver as habilidades e o gosto pela leitura, auxiliando no
desenvolvimento da capacidade de reflexão sobre a linguagem, na competência em
produção textual, como também na melhoria de seu nível de relacionamento humano.
Para isso, as atividades foram desenvolvidas tanto em sala de aula como fora
dela, com a participação efetiva dos alunos trabalhando como protagonistas de sua
aprendizagem, tanto individualmente, como em equipes, utilizando estratégias
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variadas, tais como: leitura do livro Alice no País das Maravilhas, do autor Lewis
Carroll, e de outras versões, análise dos elementos simbólicos, pesquisa sobre a
biografia do autor, exibição do filme homônimo, do diretor Tim Burton, montagem de
uma peça teatral, tudo isso visando enriquecer o trabalho pedagógico e o incentivo à
leitura, bem como otimizando o processo de ensino-aprendizagem.
Como produto final, foi organizada uma exposição com objetos relacionados à
obra, assim como com as produções textuais realizadas pelos alunos durante todo o
período de execução do projeto, que ficou aberta para visitação da comunidade
escolar na culminância do projeto.
REFERENCIAL TEÓRICO
O referencial teórico que norteia este projeto são os Parâmetros Curriculares
Nacionais – PCN (BRASIL, 1998), que propõem um ensino de língua materna pautada
na visão bakhtiniana de língua enquanto forma de interação, bem como com a
proposta de trabalho com os gêneros discursivos, que Bakhtin descreveu como “tipos
relativamente estáveis de enunciados” (BAKHTIN, 2011, p. 262). Com isso, os PCN
(BRASIL, 1998, p. 26) trazem também a proposta de trabalho com o gênero literário de
forma diferenciada, quando afirma que:
O texto literário constitui uma forma peculiar de representação e
estilo em que predominam a força criativa da imaginação e a intenção estética. Não é mera fantasia que nada tem a ver com o que se entende por realidade, nem é puro exercício lúdico sobre as formas e sentidos da linguagem e da língua.
Nesse sentido, cabe à escola oferecer aos alunos as ferramentas necessárias
para que eles se familiarizem com o gênero literário e sua linguagem e se tornem
capazes de construir sentidos para aquilo que leem, já que essa leitura envolve vários
fatores ligados às experiências individuais e sociais vivenciadas ao longo do tempo.
Aqui, cabe ressaltar o papel fundamental do professor enquanto mediador entre o
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estudante e o texto literário, pois o docente precisa criar estratégias que incentivem o
aluno a desenvolver o gosto pela leitura literária na escola e fora dela.
Para Cosson (2014, p. 35), “ler é um diálogo que se faz com o passado, uma
conversa com a experiência dos outros”, isto é, quando lemos, interagimos com o
outro e produzimos cultura e conhecimento. Dessa forma, o trabalho com o texto
literário na escola se faz necessário para ampliar as possibilidades de diálogo entre o
estudante e épocas longínquas que ele não viveu, mas a que pode ter acesso por meio
das obras que retratam aquele contexto.
Acreditamos que o contato com a literatura, por meio de uma obra
mundialmente conhecida e amplamente divulgada como é o livro Alice no País das
Maravilhas constitui-se como uma forma de ressignificar o ensino de língua materna e
está em consonância com as matrizes de referência de língua portuguesa, que
orientam o processo avaliativo do IDEB, uma vez que permite o estudo da língua e das
nuances da linguagem de forma lúdica e atraente, fazendo com que os estudantes
melhorem seu nível de proficiência em leitura e possam se comprometer mais com a
construção de sua aprendizagem.
Além disso, na disciplina de Língua Portuguesa, em especial, a leitura é uma
atividade basilar, constituindo pilar obrigatório para o desenvolvimento de outros
saberes. Daí a importância da reflexão sobre a língua e seus usos a partir de variados
textos, inclusive o literário, possibilitando ao estudante a ampliação de seu domínio
discursivo, bem como o diálogo com outras disciplinas escolares, construindo pontes
interdisciplinares no fomento ao desenvolvimento pleno do educando.
Dentre os gêneros literários voltados para o público infantojuvenil, o conto
maravilhoso é certamente um dos mais prestigiados e indicados para incentivar jovens
leitores, tendo em vista sua riqueza temática e simbólica e, consequentemente, o
encantamento que provoca nos pequenos estudantes. Conforme Chauí (2012, p. 3), “o
artista é um ser social que busca exprimir seu modo de estar no mundo na companhia
dos outros seres humanos, reflete sobre a sociedade, volta-se para ela, seja para
criticá-la, seja para afirmá-la, seja para superá-la”. Isto mostra o quanto as obras
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literárias carregam marcas do contexto sociocultural dos autores e como isso
influencia de forma significativa suas criações.
A literatura, como um todo, sempre se encontra dentro de um contexto
cultural e histórico, o que confere a ela a alcunha de “arte da linguagem humana”.
Falando ou escrevendo, fazer literatura é expressar-se de forma a combinar palavras
provocando variados efeitos, mexer com o seu significado, utilizar as entrelinhas do
texto para deixar sua mensagem e dialogar com os leitores. Nesse sentido, torna-se
indispensável que a escola possibilite o contato com essas diferentes visões do mundo
que estão presentes nos clássicos da literatura universal aos estudantes, em especial
na fase da adolescência, em que estão formando sua personalidade, construindo suas
crenças e que poderão enveredar pelo caminho da criação literária, inscrevendo seus
nomes na História.
Entendemos, dessa forma, que cabe à escola a função de promover momentos
de leitura prazerosa aos alunos, permitindo-lhes ampliar seus conhecimentos e seu
repertório linguístico, pois ao exprimir o que outras pessoas sentem, por meio da
leitura de uma obra literária, também o leitor está modificando a si mesmo e
enriquecendo sua bagagem cultural. Em outras palavras, a literatura ajuda a
humanizar e a expressar mais claramente sentimentos, que por outros meios não seria
possível.
RELATO DE APLICAÇÃO DA SEQUÊNCIA DIDÁTICA PARA LEITURAS DE ALICE NO PAÍS
DAS MARAVILHAS
A leitura de clássicos da literatura universal tem se tornado uma tarefa cada vez
mais desafiadora no contexto escolar, seja pela alegada falta de interesse dos alunos
seja pelo escasso tempo dedicado à leitura literária em sala de aula, dadas as
demandas de conteúdos gramaticais do livro didático, que, muitas vezes, engessam o
cotidiano das aulas de língua materna.
De acordo com Calvino (1993, p.11),
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Um clássico é um livro que nunca terminou de dizer aquilo que tinha para dizer; são aqueles livros que chegam até nós trazendo consigo as marcas das leituras que precederam a nossa e atrás de si os traços que deixaram na cultura ou nas culturas que atravessaram (na linguagem ou nos costumes).
Em outras palavras, um clássico é um livro que conhecemos de tanto ouvir os
outros falarem dele, mas quando o temos ao alcance e lemos, de fato, revelam-se
novos, inesperados, inéditos. Isso porque a obra literária possui duas características
fundamentais. A primeira delas é a leitura de mundo que o artista faz, de acordo com
suas crenças, valores e vivências; a segunda se deve ao especial trabalho com a
linguagem, o que dá ao texto literário esta característica peculiar de tornar-se imortal
e atemporal.
Por esse motivo, para a execução deste projeto, escolhemos como metodologia
o trabalho com Sequência Didática (SD), que, de acordo com Dolz & Schneuwly (2004,
p. 82) “é um conjunto de atividades escolares organizadas, de maneira sistemática, em
torno de um gênero textual oral ou escrito”. Esse modelo de trabalho permite ao
professor organizar sua prática e possibilitar aos alunos dominar melhor um gênero,
ajudando-os a desenvolver seus conhecimentos linguísticos e a melhorar suas relações
sociais.
Os autores apresentam o seguinte esquema para descrever uma SD:
Esquema da Sequência Didática
Figura 1: Esquema da Sequência Didática (SD)
Fonte: DOLZ, J. & SCHNEUWLY, B. Gêneros orais e escritos na escola. Tradução e organização Roxane Rojo e Glaís Sales. Campinas, SP: Mercado de Letras, 2004. p. 83
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O projeto teve início no dia 13 de julho, quando foi apresentado à turma. Foi
feita uma sondagem acerca dos conhecimentos dos alunos sobre a obra Alice no País
das Maravilhas, de Lewis Carroll. Alguns comentaram já ter assistido a filmes e ouvido
falar na história, mas apenas uma aluna afirmou ter lido o livro, numa versão infantil.
Os alunos lembraram de personagens como Alice, Chapeleiro Maluco, Coelho
Branco, Gato Risonho, Rainha Vermelha, além da Rainha Branca e os gêmeos, que são
personagens de outro livro do mesmo autor: Alice através do Espelho, mas que
costumam aparecer em adaptações fílmicas, que, geralmente, abrangem os dois
volumes da obra.
Para convidar os educandos a adentrar o universo literário do clássico a ser
estudado, foi exibido o filme Alice no País das Maravilhas, do diretor Tim Burton.
Figura 2: Capa do Filme: Alice no País das Maravilhas
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Os alunos se mostraram bastante interessados e se divertiram assistindo ao
filme. Após a exibição, foi feita a explanação sobre a obra e o seu sesquicentenário,
comemorado no dia 04 julho. Isso deixou os educandos surpresos, pois nunca haviam
parado para pensar sobre há quanto tempo existem as histórias que eles crescem
ouvindo.
Nessa ocasião, os alunos também aprenderam sobre a biografia do autor e
ficaram admirados em saber que ele era professor de matemática de uma
universidade (Oxford, na Inglaterra), e que Lewis Carroll não era seu nome verdadeiro,
mas um pseudônimo que ele criou quando da publicação da história em 1865. Além
disso, as iniciais “LC”, pronunciadas em inglês, formam o nome “Alice”. A
aprendizagem se deu de forma espontânea e prazerosa para os estudantes, que se
mostraram ávidos a saber mais sobre o livro em questão.
Continuando as atividades, os alunos receberam um kit com a versão impressa
do livro Alice no País das Maravilhas, da Série Aventuras Grandiosas, coleção de lápis
de cor, marcatexto, lápis e borracha. Como era uma adaptação econômica, não havia
gravuras, e os alunos foram instigados a levá-la para casa, para ler e ilustrar cada
capítulo, à medida que iam lendo. Essa tarefa gerou significativos frutos: uma das
alunas leu o livro para as irmãs mais novas, que se encantaram pela história e pelos
desenhos dela. Outra aluna teve a oportunidade de mostrar sua habilidade,
desenhando personagens da obra, como o Chapeleiro Maluco.
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Figura 3: Chapeleiro Maluco desenhado por uma aluna participante do projeto
Na semana seguinte, foi o momento de comentar sobre a leitura realizada e
expressar suas opiniões sobre o texto. Cada capítulo foi resenhado e explanado,
fazendo com que os alunos aprofundassem seus conhecimentos e os ligassem à vida
prática. Houve momentos de reflexão sobre o comportamento e as atitudes das
personagens, como também sobre a presença de animais e o tratamento dado a eles.
Por exemplo, os alunos reconheceram a ocorrência de maus-tratos contra animais e
puderam refletir sobre como isso ocorre em nosso dia a dia e o que fazer para
sensibilizar a si e aos outros a não cometer tais atitudes.
A leitura de uma outra versão: o cordel, de João Gomes de Sá também foi de
grande valia. Esta leitura rendeu bons comentários e um ótimo estudo comparativo
sobre o léxico utilizado em cada obra. A leitura foi feita de forma coletiva e cadenciada
pelas rimas do cordel, fazendo com que os alunos se envolvessem na atividade.
Após a leitura, seguiu-se um estudo comparativo das duas obras, que culminou
com os alunos montando um cartaz com diferenças entre elementos da obra de Lewis
Carroll e de João Gomes de Sá, como, por exemplo: em vez de cair na Toca do Coelho
no tronco de uma árvore, Alice cai numa cacimba; em vez de comer um bolo para
crescer, Alice come um pedaço de rapadura; em vez de uma cartola, o Chapeleiro
Maluco usa um chapéu de cangaceiro.
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Figura 4: Trechos do livro Alice no País das Maravilhas em Cordel
Os alunos tiveram a oportunidade de contato com diferentes versões do livro
estudado, como por exemplo, cordel, mangá, creepy, história em quadrinhos, entre
outras edições da obra original. Cada uma delas foi apresentada e comentada para que
os educandos sefamiliarizassem com a linguagem e o estilo de cada uma, e
escolhessem qual iriam ler posteriormente.
Para motivá-los à leitura, foi criado um cenário, em forma de labirinto em “L”
para representar a “Toca do Coelho”. Enquanto os alunos entravam, tocava a trilha
sonora do filme. Isso colaborou na concentração e envolvimento dos alunos.
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Figura 5: Labirinto em forma de “L” representando a “Toca do Coelho”
Figura 6: Exposição de livros de Alice no País das Maravilhas
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Após o momento de leitura, os alunos se vestiram como personagens livro,
para encenar, de forma espontânea, o enredo história, e nesse momento de
descontração e aprendizagem, foram convidados a participar de um “Chá
Maravilhoso”, reproduzindo mais uma famosa cena do livro, o que os deixou ainda
mais motivados a ler e aprender brincando.
Conforme Rubem Alves (1987, p. 22),
O lúdico privilegia a criatividade e a imaginação, por sua própria ligação com os fundamentos do prazer. Não comporta regras preestabelecidas, nem velhos caminhos já trilhados, abre novos caminhos, vislumbrando outros possíveis. [...] O lúdico se baseia na atualidade, ocupa-se do aqui e do agora, não prepara para o futuro inexistente. Sendo o hoje a semente de qual germinará o amanhã, podemos dizer que o lúdico favorece a utopia, a construção do futuro a partir do presente.
Constatamos a verdade dessa afirmação ao executar este projeto, pois alunos
que estavam prestes a desistir de estudar, voltaram a frequentar a escola e se
mostraram motivados à aprendizagem. Com isso, percebemos a grande contribuição
que a literatura pode trazer, tanto na vida escolar como na vida social dos educandos,
uma vez que os estudos ainda são o meio mais eficaz de mudança de vida e ascensão
social para alunos provenientes de classes menos abastadas.
A partir de então, os alunos se dedicaram a ensaiar uma peça baseada na obra
de Lewis Carroll para apresentar aos demais alunos da escola. Para isso, pensamos, em
conjunto, como seria a montagem dos cenários, bem como das cenas que
colocaríamos no palco. Foi importante mostrar para os alunos as adaptações
necessárias a cada gênero, pois nem todos os episódios descritos no livro ou vistos nos
filmes são possíveis de serem levados para o texto teatral. Com isso, definimos o
roteiro, as cenas e os personagens que comporiam a peça. Interessante ressaltar a
dedicação dos alunos em aprender sobre o gênero texto teatral, com suas rubricas
para orientar os atores a realizar a cena.
Após muitos ensaios, a peça foi apresentada para os demais alunos da escola.
Foi um momento muito significativo para todos, pois antes desse projeto, a turma
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encontrava-se desmotivada e sem interesse em apresentar-se em público, no entanto,
no decorrer das atividades, eles foram se engajando e se comprometendo com sua
aprendizagem, como sujeitos atuantes, e, acreditando em seu potencial, venceram o
desafio da timidez e realizaram a encenação teatral.
Os alunos ficaram muito satisfeitos com o resultado da apresentação, que
rendeu elogios dos professores e dos colegas que assistiram à peça. Além disso, eles
ficaram encantados e surpresos com sua própria capacidade de decorar as falas e
lembrar delas na hora de se apresentar. Conforme Antunes (2008, p. 22),
As crianças não vão à escola apenas para aprender e pronto, mas para construir conhecimentos em um sentido de aproximar-se do culturalmente estabelecido, mas também como “motor” do desenvolvimento do seu tempo, de suas capacidades e equilíbrio pessoal, de sua inserção social, de sua autoestima e relações interpessoais.
Concordamos com o autor e pudemos ver que, alimentando a autoestima dos
educandos, eles aprendem com maior facilidade e se comprometem com sua
aprendizagem. Para finalizar o projeto, montamos novamente uma exposição com os
diversos livros de Alice no País das Maravilhas, desta vez, para serem explicados pelos
alunos aos visitantes da mostra. Essa atividade provou que os alunos aprenderam
sobre o livro, sobre o autor, bem como sobre o enredo da obra, o que gerou avaliações
muito positivas dos professores e alunos de outras escolas que vieram prestigiar o
evento.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os resultados obtidos com esse projeto foram satisfatórios e gratificantes para
toda a comunidade escolar, pois os alunos se envolveram verdadeiramente,
acreditando em seu potencial criativo, e isso foi determinante para o sucesso na
execução das atividades propostas. Além disso, constatamos a considerável diminuição
da evasão e a elevação do rendimento dessa turma. Tudo isso se deveu ao sentimento
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que o projeto despertou nos alunos, fazendo-os acreditar em seu potencial enquanto
leitores e sujeitos capazes de aprender de forma lúdica e significativa.
Conforme Coelho (2000, p. 181),
A linguagem visual dos desenhos, imagens ou ilustrações, associada à linguagem verbal, é das mais eficazes como processo educativo – não só no sentido de promover o encontro da criança com o imaginário literário (que tanto a seduz), mas também no seu desenvolvimento psicológico.
Tivemos a oportunidade de constatar a veracidade desta afirmação durante a
realização desse projeto, uma vez que, ao estudar uma obra mundialmente conhecida,
seu autor, e sobre como ela resiste ao tempo e continua despertando o interesse de
novos leitores, os alunos enriqueceram sua bagagem de conhecimentos,
desenvolvendo seu aspecto intelectual e cultural, e sendo protagonistas na construção
de sua aprendizagem.
A organização da peça teatral, que exigiu muita criatividade e determinação
dos alunos, se revelou como veículo de interação, permitindo que eles explorassem
um novo horizonte, o de apresentar-se ao público com desenvoltura.
Acreditamos ter conseguido atingir os objetivos deste projeto, auxiliando os
alunos a adquirir conhecimento sobre o livro estudado, levando-os a apreciar o gênero
literário conto maravilhoso, assim como aprofundar os conhecimentos sobre a obra e
seu autor.
Isso nos mostrou que estamos no caminho certo para oferecer aos educandos
uma proposta de ensino-aprendizagem significativa e coerente com os preceitos dos
PCN, pautada no protagonismo do estudante como sujeito agente de sua
aprendizagem.
REFERÊNCIAS
ALICE no País das Maravilhas. [Filme] Direção: Tim Burton. Distribuição: Walt Disney Studios Motion Pictures, 2010. 109 min. Cor. ALVES, R. A gestação do futuro. Campinas: Papirus, 1987.
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ANTUNES, C. Professores e professauros: reflexões sobre a aula e práticas pedagógicas diversas. 2ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2008. BAKHTIN, M. [Volochínov]. Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico da linguagem. Tradução de Michel Lahud e Iara Frateschi Vieira. 13 ed. rev. São Paulo: Hucitec, 2009. __________. Estética da criação verbal. Tradução de Paulo Bezerra. 6 ed. Rev. São Paulo: Martins Fontes, 2011. BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais: terceiro e quarto ciclos do ensino fundamental: Língua Portuguesa. Secretaria de Educação Fundamental. Brasília: MEC/SEF, 1998. CALVINO, Í. Por que ler os clássicos? 2ed. São Paulo: Companhia das Letras, 1993. CARROLL, L. Alice no País das Maravilhas. 2ed. São Paulo: Rideel, 2011. ____________. Alice no País das Maravilhas. Rio de Janeiro: Zahar, 2015. (Edição comemorativa – 150 anos) CHAUÍ, M. Pensando bem a Arte e a Cultura: Arte e Filosofia. Disponível em: http://www.ufjf.br/pensandobem/files/2012/02/CAF%C3%89FIL-2012-Texto-IV.pdf Acesso em: 15/Jul./2015. COELHO, N. N. Literatura Infantil: teoria, análise, didática. São Paulo: Moderna, 2000. COSSON, R. Círculos de leitura e letramento literário. São Paulo: Contexto, 2014. DOLZ, J. & SCHNEUWLY, B. Gêneros orais e escritos na escola. Tradução e organização Roxane Rojo e Glaís Sales. Campinas, SP: Mercado de Letras, 2004. SÁ, J. G. de. Alice no País das Maravilhas em Cordel. São Paulo: Nova Alexandria, 2010.