Post on 29-Jul-2015
VALTER PADULLA
SEGURANÇA PÚBLICA: ANÁLISE SEMIÓTICA DA PRAÇA
CORONEL BENEDITO DE ALMEIDA, MOGI DAS CRUZES/SP
Mogi das Cruzes
2011
VALTER PADULLA
SEGURANÇA PÚBLICA: ANÁLISE SEMIÓTICA DA PRAÇA
CORONEL BENEDITO DE ALMEIDA, MOGI DAS CRUZES/SP
Dissertação apresentada ao Curso
de Semiótica, Tecnologias de
Informação e Educação, da
Universidade Braz Cubas, para
obtenção do título de Mestre em
Semiótica, Tecnologias de
Informação e Educação.
Orientadora: Prof. Drª Rosália
Maria Netto Prados
Mogi das Cruzes
2011
AUTORIZO A REPRODUÇÃO E DIVULGAÇÃO TOTAL OU
PARCIAL DESTE TRABALHO, POR QUALQUER MEIO
CONVENCIONAL OU ELETRÔNICO, PARA FINS DE
ESTUDO E PESQUISA, DESDE QUE CITADA A FONTE.
PADULLA, Valter
Segurança Pública: Análise semiótica da Praça Coronel
Benedito de Almeida, Mogi das Cruzes-SP / Valter Padulla.
Mogi das Cruzes: UBC, 2011. 93 f.
Dissertação (mestrado) – Universidade Braz Cubas.
Programa de Pós-graduação em Semiótica, Tecnologias de
Informação e Educação. Mogi das Cruzes-SP.
Orientadora: Prof. Drª Rosália Maria Netto Prados
1. Linguagens. 2. Espaço urbano público. 3. Políticas públicas de segurança. 4. Semiótica. 5. Semiótica visual.
FOLHA DE APROVAÇÃO
SEGURANÇA PÚBLICA: ANÁLISE SEMIÓTICA DA PRAÇA CORONEL
BENEDITO DE ALMEIDA, MOGI DAS CRUZES/SP
Valter Padulla
BANCA EXAMINADORA:
Profª Drª Alba Lúcia Romeiro Tambelli, UniSuz/SP _______________
Prof Dr Wilton Garcia, Universidade Braz Cubas/SP _______________
Profª Drª Rosália Maria Netto Prados (Orientadora) _______________
Trabalho apresentado e aprovado em ___/___/______
A Roberta Moretti da Silveira Padulla, minha
amada esposa, pela companhia, compreensão
e auxilio sempre presentes.
Agradeço ao Criador, por mais
esta oportunidade de crescimento
pessoal, profissional e intelectual.
A meus pais, pelo dom da vida, o
exemplo e a motivação para sempre
seguir em frente com qualidade e
dignamente.
À Profª Drª Rosália Maria Netto
Prados, pelas sábias orientações e
direcionamento nos momentos de dúvida.
À Coordenação do Programa de
Mestrado da Universidade Braz Cubas,
professores e demais integrantes dessa
digna casa de ensino, pelos
conhecimentos que foram transmitidos.
O BOM SENSO
Inexiste no mundo coisa mais bem
distribuída que o bom senso, visto que cada
indivíduo acredita ser tão bem provido dele que
mesmo os mais difíceis de satisfazer em
qualquer outro aspecto não costumam desejar
possuí-lo mais do que já possuem.
E é improvável que todos se enganem
a esse respeito; mas isso é antes uma prova de
que o poder de julgar de forma correta e
discernir entre o verdadeiro e o falso, que é
justamente o que é denominado bom senso ou
razão, é igual em todos os homens; e, assim
sendo, de que a diversidade de nossas
opiniões não se origina do fato de serem
alguns mais racionais que outros, mas apenas
de dirigirmos nossos pensamentos por
caminhos diferentes e não considerarmos as
mesmas coisas. Pois é insuficiente ter o
espírito bom, o mais importante é aplicá-lo bem
(DESCARTES, 2000, p. 13).
SUMÁRIO
LISTA DE FIGURAS ............................................................................ 10
RESUMO.............................................................................................. 12
ABSTRACT .......................................................................................... 13
INTRODUÇÃO ..................................................................................... 14
Segurança pública: um tema palpitante ................................................................... 15
Relações do autor com o tema em estudo .............................................................. 24
Aspectos científicos da pesquisa ............................................................................. 26
Sinopse dos capítulos .............................................................................................. 31
1. FUNDAMENTOS CIENTÍFICOS DA SEMIÓTICA COMO BASE
TEÓRICA NA BUSCA DO SENTIDO DE UM TEXTO ......................... 33
1.1 Decodificação da imagem pela Semiótica ...................................................... 35
1.2 Semiótica das Culturas ................................................................................... 36
1.3 Níveis de entendimento .................................................................................. 39
1.4 Metodologia semiótica de análise ................................................................... 42
2. A PRAÇA: O CONTEXTO DO OBJETO DE ESTUDO .................. 45
2.1 A expectativa de segurança ........................................................................... 49
2.2 A “performance” de um espaço público .......................................................... 51
2.3 Breve histórico do espaço hoje denominado Praça Coronel Benedito de
Almeida .................................................................................................................... 54
2.4 Formas físicas, geométricas, estéticas ........................................................... 57
3. O QUE A PRAÇA, ENQUANTO TEXTO VISUAL, “DIZ” E COMO
ELA FAZ PARA “DIZÊ-LO” ................................................................ 59
3.1 O discurso de um espaço público (relativo à segurança pessoal) .................. 62
3.2 Análise e descrição semióticas de elementos constitutivos da praça, a partir
de uma fotografia do autor ....................................................................................... 68
3.3 Uma proposta de análise semi-simbólica de fotografia da Praça Coronel
Benedito de Almeida ................................................................................................ 70
3.4 Caminhando pela praça .................................................................................. 72
CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................. 80
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .................................................... 85
APÊNDICE A – OFÍCIO À PREFEITURA MUNICIPAL DE MOGI DAS
CRUZES .............................................................................................. 89
ANEXO A: IMAGENS DO ACERVO HISTÓRICO DE MOGI DAS
CRUZES .............................................................................................. 90
ANEXO B – BIOGRAFIA DE BENEDICTO JOSÉ DE ALMEIDA
(CORONEL ALMEIDA) ........................................................................ 92
LLIISSTTAA DDEE FFIIGGUURRAASS
Figura 1 – Conjunto habitacional em St. Louis (EUA). .............................................. 21
Figura 2 – Visão arquitetônica do uso dos corredores comuns. ................................ 21
Figura 3 – Situação do local após algum tempo. ....................................................... 22
Figura 4 – Local em abandono. ................................................................................. 22
Figura 5 – A solução adotada para o problema foi a implosão.................................. 22
Figura 6 - Usuários de entorpecentes em via pública. .............................................. 28
Figura 7 – Usuários de entorpecentes em via pública. .............................................. 28
Figura 8 – Flanco esquerdo da muralha do Castelo Neuschwanstein (Alemanha). .. 41
Figura 9 – Vista superior da Pça Cel Benedito de Almeida, e entorno, a destacar o
posicionamento de câmeras de segurança (pontuadas pelas estrelas) em
relação à praça (polígono verde). ...................................................................... 46
Figura 10 – Câmera posicionada na na confluência da Rua Paulo Frontin com a Rua
Presidente Rodrigues Alves. .............................................................................. 47
Figura 11 – Câmera instalada na esquina da Rua Senador Dantas com a Rua Major
Arouche de Toledo ............................................................................................. 48
Figura 12 – Câmera situada no cruzamento da Rua Padre João com a Rua Coronel
Souza Franco. .................................................................................................... 48
Figura 13 – Placa de identificação da Pça Cel Benedito de Almeida. ......................... 52
Figura 14 - Aspecto do Largo da Matriz em 1817. .................................................... 56
Figura 15 – Croquis de Mogi das Cruzes em 1650. .................................................. 56
Figura 16 – Vista superior da Praça Coronel Bendito de Almeida. ............................ 57
Figura 17 – Fotografia panorâmica da Praça Coronel Benedito de Almeida. ............ 59
Figura 18 – Telefones públicos na Praça Coronel Benedito de Almeida ................... 60
Figura 19 – Iluminação pública. ................................................................................. 61
Figura 20 – Muçulmanas, usando burcas, em Dubai. ............................................... 62
Figura 21 – Detalhe da Planta Arquitetônica da Praça Cel Benedito de Almeira. ..... 65
Figura 22 – Representação gráfica das relações entre Sensação de Segurança e
Semiótica. .......................................................................................................... 67
Figura 23 – Destaque para o Obelisco cercado por árvores. .................................... 70
Figura 24 – Vista superior da Praça Coronel Benedito de Almeida com linha
vermelha a apontar direção do trajeto pela praça. ............................................. 74
Figura 25 – Primeira etapa da caminhada, acesso à praça. ..................................... 75
Figura 26 – Segunda etapa da caminhada, acesso ao interior da praça. ................. 75
Figura 27 – Terceira etapa da caminhada, rumo ao obelisco.................................... 76
Figura 28 – Quarta etapa, chegada ao obelisco. ....................................................... 77
Figura 29 – Quinta etapa, rumo aos abrigos dos pontos de parada de ônibus. ........ 77
Figura 30 – Sexta etapa, visualizando a faixa de pedestres. .................................... 78
Figura 31 – Sétima etapa, saindo da praça. .............................................................. 78
Figura 32 – Placa de sinalização de trânsito. ............................................................ 80
Figura 33 – Reforma da Igreja Matriz (década de 1960). .......................................... 90
Figura 34 – “Grupo Escolar” Cel Benedito de Almeida e Coreto (1928). ................... 90
Figura 35 – Igreja Matriz de Mogi das Cruzes, em 1930. .......................................... 91
Figura 36 – Vista superior do obelisco e do Grupo Escolar Coronel Almeida, em
1930. .................................................................................................................. 91
Figura 37 – Coronel Benedicto J. de Almeida. .......................................................... 92
Padulla, Valter. Segurança Pública: Análise semiótica da Praça Cel Benedito de Almeida, Mogi das Cruzes/SP. Mogi das Cruzes, f. 93, 2011. [Dissertação de Mestrado em Semiótica, Tecnologias de Informação e Educação, Universidade Braz Cubas].
RREESSUUMMOO
SEGURANÇA PÚBLICA: ANÁLISE SEMIÓTICA DA PRAÇA CORONEL BENEDITO DE ALMEIDA, MOGI DAS CRUZES/SP é um trabalho de pesquisa que trata da análise do sentido e da exploração do impacto que os aspectos visuais e culturais da Praça em estudo produzem nos transeuntes, quanto à (in)tranquilidade ao transitarem por este espaço público. O estudo do percurso gerativo do sentido (PGS), segundo a Semiótica, tem por base a análise do texto visual, que afeta o indivíduo de tal forma que este se sentirá seguro ao transitar por um determinado local ou tenderá a evitá-lo a partir do que vê, não permanecerá neutro diante de um cenário visual que se lhe apresente. Fundamenta-se na metodologia de análise discursiva, de acordo com a teoria greimasiana para entender os percursos gerativos de sentido, especificamente neste trabalho os vivenciados pelos transeuntes nessa praça. Segundo essa metodologia, há a análise das estruturas narrativa, discursiva e semântica profunda dos processos discursivos apreendidos pela leitura semiótica do texto visual. Para esta análise, foram selecionados os textos visuais: fotografias da praça, fotografia panorâmica. É adotada, como via de pesquisa, a análise dos textos visuais encontrados na Praça Coronel Benedito de Almeida, a “fotografia” e o “olhar” que a paisagem arquitetônica e ambiental apresenta e as percepções que o espaço possibilita. Palavras-chave: Linguagens; Espaço urbano público; Políticas públicas de segurança; Semiótica; Semiótica visual.
AABBSSTTRRAACCTT
“PUBLIC SAFETY: SEMIOTIC ANALYSIS OF SQUARE COLONEL BENEDITO DE ALMEIDA, MOGI DAS CRUZES/SP” is a research that deals with the analysis of meaning and exploring the impact that the visual and cultural aspects of the path produced in the square passers-by, concerning to transit through this safe or unsafe public space. The analysis of a visual text is based on the concept of the course generate of meaning, according to semiotics, which affects the individual such a way that he will feel safe while in transit through a place or tend to avoid from what he sees, he will not remain inactive in face of a visual scenery. Based on the methodology of discursive analysis, according to theory as known as “Semiotics by Greimas”, specifically in this study the experience of the square passers-by. According to this methodology, occurs the analyze of the narrative structures, discursive and fundamental semantics obtained by the critical reading of the visual text. For this analysis, it was used some selected visual texts: photos of the square and a panoramic photography. It is adopted as the way of research, analysis of visual texts found in the square “Coronel Benedito de Almeida”, “photography” and “the look” of the urban design, environmental and personal observations that presents what the space evokes. Keywords: Languages; Urban public space, Public safety policies, Semiotics, Visual semiotics.
IINNTTRROODDUUÇÇÃÃOO
Produzir tranquilidade aos cidadãos é um objetivo permanente do Estado,
bem como a motivação da existência deste. Durante os idos da Idade Média havia
grande preocupação em relação à construção de castelos-fortalezas que pudessem
abrigar as pessoas durante ataques inimigos, ou seja, a tranquilidade dos cidadãos
que estivessem intramuros seria garantida proporcionalmente à “percepção de
intransponibilidade1” das muralhas.
Ações criminosas e seu efeito imediato, o medo do crime, são fatores de
intranquilidade no mundo contemporâneo. De forma similar à solução medieval
contra invasores pode-se observar o número crescente de condomínios “fechados”
com o objetivo de restringir a acesso a “pessoas estranhas” e controlar a
movimentação de pessoas nas áreas comuns, a buscar, nitidamente, formas de
garantir aos moradores que estão num espaço físico seguro e imune à violência e ao
crime.
A cada dia há maior destaque para as chamadas “notícias policiais” no
cenário contemporâneo e, em decorrência disto, o espaço midiático dedicado ao
assunto cresce e reflete a preocupação da sociedade em sentir-se segura, seja no
recôndito do lar, seja ao caminhar, ou trafegar, por vias públicas.
CLARKE (s.d.) teoriza que o crime ocorre quando há uma situação em que
estão presentes três fatores, o criminoso, a vítima e a oportunidade para a ação do
criminoso sobre a vítima. Prossegue, o criminologista citado, afirmando que a
oportunidade e o ambiente, espaço físico, onde acontecem delitos estão
intrinsecamente relacionados, isto é, o ambiente proporciona oportunidades. As
ações de um criminoso são precedidas por um planejamento mental, meticuloso ou
não, a respeito do local onde perpetrará determinado delito, se há caminhos para
adentrar e sair de um local com segurança, ou ainda, se há possibilidade de roubar,
por exemplo, sem ser observado por outras pessoas.
A importância do tema requer maior atenção à complexidade da situação que
apresenta como resultado a insegurança e o medo do crime, visto que o crime, para
ser controlado, demanda não somente policiais em viaturas, mas sim que outros
1 O aspecto visual dos muros e os materiais utilizados nas construções são fatores diretamente
ligados à percepção de que tais edificações imporiam dificuldade a quem se propusesse à transposição das paredes e invadir a cidadela.
Introdução 15
aspectos sejam levados em conta, por exemplo o ambiente (espaço físico). Em vista
da relevância do ambiente, quanto à segurança pública, esta pesquisa pretende
demonstrar alguns aspectos, referentes a características de um determinado espaço
físico, que atuam sobre a percepção que um indivíduo tem a cerca do local onde
está, e o que este local transmite em termos de segurança e tranquilidade ao usuário
de um espaço público.
SSeegguurraannççaa ppúúbblliiccaa:: uumm tteemmaa ppaallppiittaannttee
No estado de São Paulo por força da Lei Estadual 9.155, de 15 de maio de
1995,
Dados2 são divulgados trimestralmente no portal da Secretaria da Segurança Pública e seu conteúdo ajuda a monitorar a evolução e as tendências criminais em todo o Estado de São Paulo (SÃO PAULO, s.d.).
A evolução no número de delitos registrados em Boletins de Ocorrência e as
tendências de queda ou elevação no número de crimes praticados são entendidas
como índices de avaliação e apontadas como resultados diretos dos trabalhos
policiais, como segue:
As estatísticas criminais são utilizadas para retratar a situação da segurança pública e permitir o planejamento de ações policiais e de investimentos no setor. Em São Paulo, a compilação dos dados é feita pela Secretaria da Segurança Pública, por intermédio da Coordenadoria de Análise e Planejamento (CAP) - responsável pela análise dos dados de interesse policial e pela realização de estudos para prevenir e reprimir a criminalidade.3
Ao serem divulgados os dados e informações que, in tese, reproduzem a
situação relativa à segurança pública, a sociedade4 se manifesta e prognósticos,
diagnósticos e comentários são expostos. São realizadas análises e exposições a
explicar o quadro que se apresenta aos cidadãos, em primeira mão a discussão tem
2 Registros dos Boletins de Ocorrência, elaborados pela Polícia Civil do Estado de São Paulo,
agrupados temporalmente em um trimestre e organizados pela natureza das ocorrências e pelos locais onde aconteceram. 3 Texto disponível em <<http://www.ssp.sp.gov.br/estatistica/default.aspx>>, acesso em 17/05/11 às
10h50. 4 Imprensa, Autoridades do Poder Executivo, Legislativo e Judiciário e Pesquisadores.
Introdução 16
como tema a segurança pública, ou seja, se as pessoas têm motivos para sentirem-
se seguras em suas cidades, bairros, ruas e domicílios. Após o diagnóstico sobre a
evolução do crime o próximo momento é aquele em que os responsáveis pela
situação são nomeados.
É importante ter em mente que a divulgação dos dados ocorre para que as
políticas públicas de segurança tenham um caráter de transparência, ou seja, o
planejamento e investimentos são colocados em prática e o resultado é observável
pelos dados estatísticos. O Estado é colocado sob questionamento quanto à sua
eficácia no campo Segurança Pública. O representante mais visível do Estado nesta
questão é a Polícia, o que leva a inferir que se o Estado é ineficiente em garantir
segurança à sociedade então a Polícia não é eficiente. Entretanto, como dito
anteriormente, o tema não pode ser reduzido à eficiência policial em controlar o
crime e a violência, isto por que a questão é mais abrangente, em suas causas, que
apenas o trabalho policial.
A abrangência do assunto “segurança pública” é tal que desperta o interesse
de todos, visto que há consequências, em razão das ações da violência e da
criminalidade, em todas as camadas sociais da população. A relevância do tema
junto à sociedade transparece no fato de que a segurança pública é foco de atenção
ininterrupta e motivação das preocupações de brasileiras e brasileiras, em termos de
qualidade de vida, o que se verifica diretamente em pesquisas de opinião, no tempo
de exposição televisiva às situações policiais e nos gastos com segurança. Em
artigo da REVISTA ÉPOCA (2003) é apresentado:
Um estudo recém-concluído revela que os gastos com segurança no país somam 56 vezes o que o governo vai gastar neste ano no programa de combate à fome. São cinco vezes o orçamento do Ministério da Educação e quatro vezes o que todas as famílias brasileiras investem anualmente em planos de saúde.
O trabalho do economista Ib Teixeira, pesquisador da Fundação Getúlio Vargas e que desde 1995 monitora quanto o país paga no chamado “imposto-violência”, mostra que em 2002 os governos federal e estaduais gastaram R$ 47 bilhões em segurança. Empresas e cidadãos comuns desembolsaram outros R$ 55 bilhões em guardas particulares, armas e equipamentos, que vão de câmeras a carros blindados.
Introdução 17
A soma, R$ 102 bilhões, é igual ao patrimônio líquido de todos os bancos do país e corresponde a 10% do Produto Interno Bruto (PIB). Em 1997, o gasto era menor não apenas em números absolutos, mas em proporção - 5% do PIB (MENDONÇA e FERNANDES, 2003, p. 53-57).
O contexto social, afetado pela violência, adquire contornos de transformação
cultural em níveis extremos, como a questão da construção de fortalezas. A matéria
jornalística da Revista Época (2003) continua abordando os gastos com segurança
pessoal e, ao esclarecer sobre a mudança de hábitos verificados na construção civil,
informa que
O fenômeno foi batizado pela professora de arquitetura da Universidade Federal Fluminense Sonia Ferraz de “medievalização”. Como o Estado é incapaz de garantir a segurança dos moradores, as ruas se tornam terra de ninguém, ao estilo das estradas da Idade Média.
Os bandoleiros assaltam quem passa e seqüestram os ricos para pedir resgates. Quem é mais abonado contrata um exército particular de seguranças.
E os cidadãos transformam suas moradias em verdadeiras fortalezas para impedir a invasão inimiga - a última moda são os “quartos do pânico”, recintos com portas blindadas para se defender de possíveis invasores. Já existem 40 mil casas com pelo menos um jogo dessas portas no país, e a procura é tanta que elas ficaram em falta no mercado (MENDONÇA e FERNANDES, 2003, p. 53-57).
A “medievalização” e o atual sistema de trabalho policial, a garantir a
preservação da ordem pública, provocam reflexões. Uma dessas consequências é
relevante para esta pesquisa, qual seja, a visão equivocada de que a Polícia é a
principal responsável pelo controle da criminalidade e da violência e teria a
possibilidade de controlar os fatores que geram o crime. Um dos fatores que não
pode ser alterado pelo trabalho policial é a conformação arquitetônica dos espaços
públicos.
Nesta pesquisa o texto visual encontrado num ambiente público é um fator
importante na formação cultural do sujeito, que a partir do que percebe visualmente
sentir-se-á (in)seguro num determinado local. O problema em questão nesta
Dissertação não é tocado em atividades típicas de Polícia, por ser uma questão que
envolve a disposição arquitetônica no projeto de uma praça pública, a conservação
Introdução 18
de espaços públicos, autorizações para comércio em vias públicas, e outras ações
da alçada da Administração Pública em esfera municipal.
Outro ponto revelador da importância deste trabalho está no fato de que os
procedimentos policiais não se alteram substancialmente, até por conta do padrão
de serviço exigido aos policiais militares5. A performance policial-militar é
padronizada em todas as cidades paulistas e, ainda assim, há alterações, positivas
ou negativas, nos registros criminais (nos tipos de crimes cometidos e/ou na
intensidade da prática destes crimes), ocorrendo de forma diversa em locais
distintos. O que leva ao entendimento de que há outras questões que impactam a
segurança pública, para além do trabalho desenvolvido por policiais.
É missão constitucional da Polícia Militar o Policiamento Preventivo
Ostensivo, mas a Corporação não detém o controle das condições que propiciam o
aparecimento do crime, como se observa no texto a seguir:
Em primeiro lugar, o aumento no número de policiais não reduz, necessariamente, as taxas de criminalidade, nem aumenta a proporção dos crimes resolvidos. O mesmo ocorre com a “injeção de dinheiro” nos departamentos policiais, aumentando os orçamentos da polícia e da sua mão-de-obra.
É claro que, se não houver nenhum policiamento, haverá mais crimes. Mas, uma vez que um certo limiar tenha sido alcançado, nem mais policiais nem mais dinheiro parecem ajudar muito. Tais medidas de controle do crime têm de fato algum efeito, mas constituem uma parte menos importante da equação.
As condições sociais, como renda, desemprego, população e heterogeneidade social, são indicadores muito mais importantes de variação nas taxas de crime e de resolução de crimes (SKOLNICK; BAYLEY, 2006, p. 67).
A Polícia tem limites físicos (número de integrantes e de equipamentos) a
usar na prevenção ao crime. A limitação também se aplica à sua operacionalidade,
ou seja, uma equipe de patrulhamento, num carro de polícia ou a pé, que acaba de
transitar por um determinado logradouro é observada por um infrator que aguarda o
momento mais oportuno para perpetrar um crime.
Considerar o policiamento ostensivo preventivo como única solução ao
5 Durante o processo de formação profissional a policiais militares há o ensino e instrução de
Procedimentos Operacionais Padrão, que servem como normas de atuação.
Introdução 19
controle da ocorrência de ilícitos penais é apequenar a situação. Inclui-se na
questão da limitação física o fato de que durante o atendimento a alguma solicitação
a equipe policial-militar está “ausente” de sua função preventiva, decorrendo daí que
a prevenção ao crime e à violência unicamente por via de viaturas e equipes policiais
é utópica. O patrulhamento ostensivo preventivo não pode ser considerado
onipresente. É importante que pesquisadores, autoridades, a sociedade e os
próprios policiais saibam que outros fatores concorrem de forma mais intensa para a
variação na percepção da criminalidade, por via dos dados estatísticos ou mesmo
pela experiência cotidiana das pessoas.
Ao considerar outros fatores a influenciar a sensação de segurança, traz-se à
colação o trabalho que NEWMAN (1996) desenvolveu a respeito da influência do
ambiente, no que se refere ao desenho arquitetônico e à disposição urbanística, na
prevenção da violência e da criminalidade. O trabalho resultou na teoria conhecida
como CPTED (CRIME PREVENTION THROUGH ENVIRONMENTAL DESIGN; em
português: PREVENÇÃO CRIMINAL ATRAVÉS DO DESENHO AMBIENTAL),
objeto de estudo da psicologia ambiental.
O conceito de CPTED, também conhecido como ESPAÇO DEFENSIVO,
afirma que o desenho arquitetônico de um espaço pode ser manipulado de tal forma
que o uso do ambiente proporcione condições para que a prática de crimes seja
inibida e, portanto, contribui para a redução do medo do crime, BEATO (2004)
explica, em linhas gerais, a teoria como
[...] ideia de espaço defensivo relaciona-se a soluções arquitetônicas de recuperação de moradias públicas nos Estados Unidos, obrigando seus moradores a exercer seus naturais instintos de “territorialidade”.
Este instinto é perdido quando se constroem grandes prédios de habitação coletiva, em que os moradores mal se conhecem, e onde existe uma variedade enorme de acessos não supervisionados que facilitam a atividade de predadores.
A ideia é reduzir esse anonimato não apenas pelo incremento da vigilância natural, mas também diminuindo as vias de escape para potenciais ofensores (BEATO et al., 2004).
A teoria que sustenta o conceito CPTED afirma que a organização do espaço
físico urbanística e arquitetonicamente gera no usuário deste espaço a sensação de
Introdução 20
que controla tal local6 e este controle produz tranquilidade no cidadão. A
tranquilidade, ou sensação de segurança, se deve a que a pessoa sabe o que está
ocorrendo e pode prevenir situações potencialmente perigosas, isto é, no caso de
suspeitar de alguém, ou perceber algum problema, há tempo e alternativas para
evitar o risco de ser vítima de acidentes ou de criminosos. A premissa básica é a de
que tanto a adequação do desenho urbano, como o eficiente uso do meio ambiente,
podem levar a uma redução na oportunidade de praticar delitos.
Nesta pesquisa o conceito CPTED presta-se a despertar a atenção para a
importância do ambiente na consecução dos objetivos de garantir segurança
pública. O argumento a considerar é que a “oportunidade” é um dos aspectos que
compõe o “triângulo do crime7” e que o ambiente gera oportunidades, ao propiciar
locais onde o encontro entre criminoso e vítima seja favorável ao criminoso8. É
relevante que os gestores da segurança pública considerem as questões relativas
ao espaço físico, e, portanto, o entendam como um fator inibidor à prática de delitos.
O envolvimento nos esforços, para integrar o desenho, com o usuário e com
os sistemas de segurança, garantidos por uma vigilância consistente com o
propósito do desenho e uso do ambiente, são medidas para gerar controle informal
do que acontece no espaço físico. O indivíduo é impactado de forma que as
mudanças produzam sensação de segurança e transfiram o risco de ser capturado
ao agressor. Este raciocínio alinha-se à doutrina de Policiamento Comunitário como
segue:
O policiamento comunitário impõe uma responsabilidade nova para a polícia, ou seja, criar maneiras apropriadas de associar o público ao policiamento e à manutenção da lei e da ordem (SKOLNICK e BAILEY, 2006, p. 18).
Apesar do planejamento urbanístico não ser atividade atribuída à Polícia, a
consulta a pesquisadores e técnicos em Segurança Pública sobre este aspecto da
vida municipal, reverterá em efeitos benéficos à comunidade, visto que o impacto do
desenho urbano na segurança pública é significativo e tende a afetar a todos
indistintamente.
A título de ilustração visual dos conceitos exarados nos parágrafos anteriores
6 O controle se refere a que o usuário de um espaço público pode, em seu campo visual e sensorial,
perceber o que ocorre, ou seja, as atividades de outras pessoas à sua volta. 7 Criminoso, vítima e oportunidade.
8 Pela conformação arquitetônica de um local propiciar esconderijos ao criminoso, isto é, obstáculos à
visão de quem caminha por um determinado local.
Introdução 21
há um estudo (NEWMAN, 1996, p. 10-12) por via de imagens, a esclarecer como a
desconsideração ao potencial impacto que o desenho arquitetônico9 pode causar,
quanto à segurança de uma comunidade:
Figura 1 – Conjunto habitacional em St. Louis (EUA). Fonte: NEWMAN (1996, p. 10).
Figura 2 – Visão arquitetônica do uso dos corredores comuns. Fonte: NEWMAN (1996, p. 10).
A figura 2 ilustra a concepção de uso dos construtores, comunicada aos
compradores, isto é, que o conjunto habitacional oferecia segurança e tranquilidade
aos moradores. O uso de imagens com crianças e mulheres em atividades
domésticas presta-se a transmitir sossego e ordem.
9 No estudo em questão um conjunto habitacional na cidade norte-americana de Saint Louis na
década de 1960
Introdução 22
Figura 3 – Situação do local após algum tempo. Fonte: NEWMAN (1996, p. 11).
Figura 4 – Local em abandono. Fonte: NEWMAN (1996, p. 11).
Figura 5 – A solução adotada para o problema foi a implosão.
Fonte: NEWMAN (1996, p. 12).
Introdução 23
Quanto aos objetivos deste pesquisa este trabalho pretende demonstrar
outras formas de prover a população de sensação de segurança que não são
atinentes, necessariamente, ao trabalho policial. Marcos Sá Correa ao apresentar
livro escrito por Luiz Eduardo Soares (SOARES, 2000, 9) afirma que “[...] segurança
pública se tornou um assunto sério demais para ser abandonado nas mãos da
polícia”. O autor concorda com a frase, todavia adota um novo olhar ao assunto ao
parafraseá-la da seguinte forma: Segurança Pública é um assunto tão sério que não
pode ser negligenciado por nenhum setor da sociedade.
Um dos setores que não tem negligenciado a Segurança Pública é o da
pesquisa em nível superior; teorias apresentadas e soluções implementadas pelas
Universidades são motivadoras de avanços e a discussão em ágoras neutras,
isentas tanto quanto possível de interesses politiqueiros e corporativos, é salutar e,
sobretudo, urgente para a sociedade brasileira, os temas relativos à segurança
pública têm entrado na pauta de discussões e estudos acadêmicos.
Pesquisa efetuada junto aos trabalhos constantes no Banco de Teses10 da
CAPES11, indica que a questão recebe, no decorrer dos anos mais atenção, visto
que a busca de trabalhos científicos que tenham como palavra-chave “SEGURANÇA
PÚBLICA” trouxe como resultado que não houve nenhuma Tese de Doutorado
registrada em 1987 ao passo que este número é de 15 trabalhos em 2009. Há neste
dado a demonstração de que o tema está mais frequente no mundo acadêmico. A
verificação também resultou, no que se refere às teses, que nenhum estudo, pela
leitura dos resumos, relaciona o espaço físico à sensação de segurança das
pessoas.
No gráfico “1”, há a anotação dos dados verificados no banco de teses da
CAPES, o que foi realizado com o método de pesquisar todos os trabalhos com a
palavra-chave “Segurança Pública”. A partir dos resultados foram lidos os resumos
dos trabalhos com o fito de se estabelecer se o estudo aborda as relações entre a
Segurança Pública e o ambiente.
10
Realizado levando em conta o filtro “Segurança Pública”, na página eletrônica <<http://www.capes.gov.br/servicos/banco-de-teses>>. 11
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior do Ministério da Educação.
Introdução 24
Gráfico 1 – Teses que trazem a palavra-chave “Segurança Pública”.
Em levantamento realizado sobre as Dissertações de Mestrado os números
são mais expressivos, entretanto, pelos resumos apresentados, apenas uma
Dissertação registra o estudo do ambiente relacionado à sensação de segurança.
Gráfico 2 – Dissertações que trazem a palavra-chave “Segurança Pública”.
Subjacentes à questão central da segurança pública estão as Políticas
Públicas de Segurança, visto que as autoridades municipais têm responsabilidade
em prover os moradores da comunidade de bem estar social, infra-estrutura, bem
como administrar os problemas da vida cotidiana dos cidadãos, nos variados
aspectos em que estes se apresentam. Cita-se o desenho arquitetônico das praças
públicas como um exemplo de atividade sob a responsabilidade da administração
pública do Município.
RReellaaççõõeess ddoo aauuttoorr ccoomm oo tteemmaa eemm eessttuuddoo
O autor teve contato mais próximo com a questão de relacionar ambiente e
segurança pública profissionalmente na época em que integrou as fileiras do 20o
Introdução 25
Batalhão de Polícia Militar do Interior12. Observou nas cidades do Litoral Norte
Paulista, mormente em Caraguatatuba, a prática de se voltar à atenção, quase que
exclusivamente, para a Polícia Militar, quando se discute problemas de segurança
pública e sensação de segurança13, notadamente quando os “índices criminais” são
desfavoráveis. Quando os “números” apontam aumento na incidência de crimes
entende-se que a situação está piorando, que as pessoas ficam mais inseguras e
que o medo do crime irá afetar, para pior, a qualidade de vida do cidadão.
O olhar do autor para a questão guarda algumas nuances que permitem uma
observação abrangente do espaço urbano. A formação de Oficial do Corpo de
Bombeiros14 traz a preocupação com as questões das edificações que devem ser
seguras aos usuários, em casos de sinistros. Dentre os trabalhos de bombeiros15 a
prevenção a sinistros ocorre, principalmente, pela análise de projetos e vistoria de
edificações.
As vistorias às edificações têm o objetivo de fiscalizar as características de
uma edificação que oferecem riscos e quais os meios de proteção a mitigar ou
eliminar estas situações (extintores, hidrantes, saídas de emergência, escadarias
protegidas). O desempenho das atividades de análise e vistoria no Corpo de
Bombeiros contribuiu, na formação profissional do autor, para que este, no primeiro
contato visual com um edifício, busque possíveis problemas relativos à segurança
dos ocupantes. Ressalta-se ainda que, com o fito de obter aprimoramento
profissional, o autor se graduou em Engenharia Civil e se especializou em
Engenharia de Segurança no Trabalho. A preocupação de bombeiro com o ambiente
amplia-se quanto espaço físico (de edificações para espaços físicos públicos) e ao
objetivo (da prevenção e combate a incêndios para a segurança pública).
12
Batalhão de Polícia Militar responsável pelo policiamento no Litoral Norte do Estado de São Paulo (nos municípios de Caraguatatuba, Ilhabela, São Sebastião e Ubatuba). 13
Neste trabalho a sensação de segurança é definida como o estado em que o indivíduo sente-se tranquilo e livre de ameaças à sua incolumidade, para ir e vir e para desenvolver suas atividades quotidianas (trabalho, estudos, lazer, etc), na sociedade em que vive. 14
Curso de Bombeiros para Oficiais, em 1988. 15
O autor serviu no Corpo de Bombeiros de São Paulo de 1988 a 2002.
Introdução 26
O trabalho policial-militar16 auxilia o presente estudo no sentido de que uma
praça pública passa a ser apreendida como um local de acesso público, público
esse que deve ter garantido seu direito constitucional de ir e vir. É relevante a
adoção do conceito de que a preservação da ordem pública é fator garantidor da
continuidade no exercício das atividades diárias (sociais, pessoais, profissionais,
etc.) das pessoas, a fim de que possam transcorrer em condições de tranquilidade, o
que é denominado, quanto à prevenção e controle da violência e criminalidade,
como prevenção primária17.
AAssppeeccttooss cciieennttííffiiccooss ddaa ppeessqquuiissaa
Quanto ao problema em estudo esta pesquisa analisa, descreve e estuda
“Como as características ambientais arquitetônicas de uma praça pública afetam a
sensação de segurança do transeunte?”.
Neste sentido, o estudo de campo, por via da análise de fotografias da Praça
Coronel Benedito de Almeida, Mogi das Cruzes, SP, pode corroborar a tese segundo
a qual o homem é um animal auto-eco-dependente, discussão contemporânea muito
importante para a psicologia, antropologia, filosofia, pedagogia, direito.
O impacto visual, consoante objetiva o autor demonstrar neste trabalho, é um
dos componentes que podem formar, no indivíduo, o entendimento de que há perigo
latente num determinado local, seja pela presença de pessoas cujo aspecto
comunique a idea de agressão/violência, seja pelo desenho arquitetônico, cujas
linhas inspirem cuidado e cautela em vista de pontos de difícil visibilidade ou mesmo
de conformações que se assemelhem a armadilhas (becos sem saída, por exemplo).
Há situações, propiciadas pelo design de um ambiente, em que o transeunte
perceba-se como potencial vítima prestes a se confrontar com um criminoso.
Pode haver um momento em que as pessoas deixem de passar por
determinados locais, por medo de ações de malfeitores. A esta ação a consequência
16
O autor trabalha diretamente no policiamento ostensivo preventivo a partir de junho de 2002, portanto 9 anos na lide policial-militar. 17
A melhora universal da qualidade de vida da população, através de ações do Município e do Estado em saneamento básico, coleta de lixo, melhorias na saúde, moradia e educação, entre outros. (KAHN, ZANETIC:s.d.).
Introdução 27
será a transmissão dessa informação àqueles de seu círculo de convivência. A partir
desse comportamento forma-se o entendimento comum de que tais locais são de
uso “privativo” de bandidos, cedendo-lhes o “direito de uso e permanência” nestes
espaços, anteriormente vistos como públicos.
Esta situação corresponde a entender que alguns locais da cidade estão
fechados para uso exclusivo de criminosos. Os incautos que por estes locais se
arriscarem sentirão os efeitos de transitarem por locais “pertencentes” a infratores da
lei, em outras palavras, estarão sob o regime da “lei do cão18”, usual em algumas
partes de nossas cidades, como se verifica nas páginas do Jornal Folha de São
Paulo (2010), como segue:
Por conta de um novo local de consumo usado diariamente por viciados em crack, trabalhadores que circulam pela região da estação Santa Cecília do metrô (centro de São Paulo) têm se mobilizado para andar em “comboios” e cruzar a área.
Há cerca de três meses, usuários de crack escolheram a alça de saída do elevado Costa e Silva, o Minhocão, que dá acesso à rua Ana Cintra, bem ao lado de um dos mais movimentados acessos da estação, para fumar a droga, segundo comerciantes.
No início da noite de ontem, a Folha contou 53 usuários no local, que fica ao lado de um terminal de ônibus.
Segundo a copeira Lourdes de Souza, 40, ela e suas colegas adotaram a tática de andar em grupo para evitar o assédio dos viciados.
“Pela manhã, a gente combina um horário na saída do metrô e só atravessa no sentido da [av.] São João quando estamos em duas ou três pessoas conhecidas. À tarde, quando eles têm mais vontade da droga, os viciados ficam mais em cima, atrás de arrumar qualquer centavo para comprar crack”, conta (FOLHA ON LINE, 2010).
18
Forma popular para definir uma situação onde o direito da força prevalece sobre a força do direito, a expressão normalmente é complementada pelo dito: “quem pode mais chora menos”.
Introdução 28
Figura 6 - Usuários de entorpecentes em via pública. Fonte: Jornal Folha de São Paulo (2010).
Comerciantes dizem ter sentido pequena queda no movimento. Segundo eles, as pessoas têm andado com muito mais pressa para evitar o assédio dos viciados.
Um dos mais velhos do grupo (muitos são crianças, com no máximo 14 anos de idade), Ricardo Luís Almeida, 43, disse que a opção de fumar crack no Minhocão se deve ao fato de a polícia passar pouco pela região.
O Comando Geral da PM disse, por nota, que a área do Minhocão “tem sido objeto de especial atenção do comando de policiamento com a realização de operações específicas naquela região” (FOLHA ON LINE, 2010).
Figura 7 – Usuários de entorpecentes em via pública. Fonte: Jornal Folha de São Paulo (2010).
Introdução 29
A hipótese levantada é a de que a população que transita pela praça em
estudo é impactada pelo aspecto visual que se lhe apresenta. Tal impacto pode
provocar ansiedade no sujeito, a se traduzir em apreensão quanto à manutenção
sua integridade física e psicológica durante sua permanência como transeunte na
Praça Coronel Benedito de Almeida, ou seja, se não será alvo de nenhum tipo de
violência, se não será abordado por malfeitores. Em outras palavras: o transitar por
um local público deveria ser unicamente uma parte de seu itinerário e não uma
aventura.
Os objetivos desta pesquisa constituem em determinar a influência que o
aspecto visual exerce no indivíduo, ao passar por uma praça pública, no que tange a
compreender um determinado local como seguro ou não. Outro alvo do trabalho de
pesquisa é buscar a atenção de gestores de segurança pública para a relevância do
desenho arquitetônico de locais públicos, para prover os cidadãos de sensação de
segurança. Um terceiro ponto é a demonstração de que a Semiótica é uma ciência
que pode auxiliar no entendimento das questões relativas à segurança pública nas
cidades.
Ainda quanto aos objetivos esta pesquisa visa entender as relações dos
usuários com o espaço “Praça Coronel Benedito de Almeida/Mogi das Cruzes/SP”,
observando, descrevendo e analisando os percursos gerativos de sentido quanto à
tranquilidade, e à sensação de não-vulnerabilidade, das pessoas que utilizam o
espaço como rota de passagem. Não é intenção do pesquisador compor o trabalho
inserindo descrições e análises advindas da observação sobre a permanência das
pessoas no ambiente, ou seja, atividades que não estejam restritas ao exercício do
caminhar pela praça objetivando locomover-se de um ponto a outro.
A função social desta dissertação transparece na busca por compreender e
expor como um transeunte percebe segurança, ou insegurança, ao caminhar por
uma praça pública. É relevante saber se o cidadão entende um cenário visto numa
praça pública como tranquilizador ou não. Ao estabelecer como ocorre tal percepção
abre-se o caminho para constatar se um local público oferece as condições para que
tal ocorra, isto por que determinar o processo pressupõe decompô-lo em seus
aspectos básicos e, sobretudo, entender que a junção destes fatores produzirá o
resultado pretendido, e exigido aos administradores públicos, que é a sensação de
Introdução 30
segurança ao andar por um espaço público.
Outro aspecto em destaque, quanto à justificativa do estudo do tema é a sua
relevância quando se leva em consideração o montante, como será demonstrado no
capítulo “1”, dos gastos públicos e privados com segurança pública, revelando a
importância da questão aos cidadãos brasileiros, em termos práticos.
O posicionamento metodológico adotado nesta pesquisa se caracteriza pela
escolha de algumas premissas, sobre as quais o trabalho está calcado, quais sejam,
determinar a Semiótica como provedora de instrumentos de análise, para o estudo
dos percursos gerativos de sentido (específicamente a Semiótica greimasiana), a
observação pessoal do autor no espaço, numa perspectiva interdisciplinar, e o uso
de fotografias como textos visuais, a enunciar mensagens que serão decodificadas
por via de aspectos culturais e pessoais, e que transmitem sensação de segurança,
ou não.
A visão interdisciplinar também lança luzes sobre a pesquisa, visto que se faz
importante, no estudo em questão, a utilização de várias disciplinas em
complementação e a união da teoria à prática com a maneira interdisciplinar de
compreensão, pois,
Falar de interdisciplinaridade é falar de interação de disciplinas. A questão interdisciplinar tem como propósito superar a dicotomia entre: teoria e prática; pedagogia e epistemologia; entre ensino e produção de conhecimento científico; apresenta-se contra um saber fragmentado, em migalhas, contra especialidades que se fecham (FRANCISCHETT, 2005, p.9).
Além da perspectiva interdisciplinar, que permite olhar as questões relativas à
segurança pessoal como fenômeno complexo (social, político, psicológico) há a
intercorrência da metodologia da Semiótica que auxilia na identificação e
compreensão da transmissão de mensagens, pelo desenho arquitetônico, ao
transeunte de praças públicas, como segue:
Seu objeto (da Semiótica) é estudar e compreender fenômenos provenientes de uma produção de significados e de sentidos. Ou seja, as coisas, objetos materiais e não-materiais, se tornam concebíveis, traduzidos e de sentido através da semiótica com sua específica linguagem de interpretação dos fenômenos inerentes ao ser humano (LUBACHEVSKI E SAHAR, 2005, p.3).
A Semiótica possibilita identificar os significantes e símbolos, observar e
descrever os discursos de segurança pública/pessoal e as significações encontradas
Introdução 31
nos espaços públicos de praças públicas. O estudo da fotografia da praça ilustrará,
por via dos conceitos exarados nas pesquisas afetas à semiótica greimasiana19, e
ainda pelo auxílio gráfico do método de estabelecer as relações semióticas pelo
octógono semiótico, como se dá entendimento visual vivenciado pelos usuários
destes locais e sua significação em relação à segurança física dos mesmos.
Aliando interdisciplinaridade (o olhar) e semiótica (instrumento) tem-se como
resultado uma visão mais nítida de como ocorre a decodificação do texto visual na
sociedade20 contemporânea. Entende-se mais claramente esta formação cultural
revelada no cotidiano, na visão estabelecida a respeito dos problemas relativos à
segurança pessoal a ser transmitida de geração em geração, nas respostas caseiras
ao crime e finalmente no entendimento coletivo de que certos locais (bairros, por
exemplo) são sossegados, ou não. Alguns signos trazem consigo a marca do perigo,
da prática de infrações à legalidade. A questão da formação do sujeito, portanto,
está em destaque nesta pesquisa.
SSiinnooppssee ddooss ccaappííttuullooss
O desenvolvimento do texto está dividido em três partes, a primeira com a
fundamentação teórica necessária ao estudo do assunto segundo o rigor de uma
pesquisa científica, na qual estão os conceitos da semiótica mais atual, bem como o
desenvolvimento desta ciência, autores e postulados. Neste capítulo os autores
adotados como principais a esta pesquisa, de quem derivam os conceitos teóricos e
argumentações científicas, são Algirdas Julien Greimas, Jean-Marie Floch e Antonio
Vicente Pietroforte.
No segundo capítulo a tônica é contextualizar a praça em estudo, as
influências culturais, políticas, históricas que o espaço físico sofreu e como estas
características transparecem no uso do local por pedestres. A formação cultural e a
apreensão do espaço físico pelos usuários, apesar de relevantes, não são
explorados à exaustão pelo fato de que as imagens, nas fotografias, apresentam
cenários que revelam a observação e descrição pelo autor sobre como ocorre a
decodificação cultural. O entendimento das imagens é imanente ao processo de
formação cultural e a apreensão do espaço físico pelos transeuntes.
19
Análise dos enunciados do texto nas estruturas narrativa, discursiva e da semântica profunda. 20
Nesta pesquisa a comunidade composta pelo grupo das pessoas que transitam pela Praça Coronel Benedito de Almeida.
Introdução 32
No último capítulo há a aplicação prática do que foi visto em teoria e
particularizado pela contextualização da Praça Coronel Benedito de Almeida. Esta
operacionalização de conceitos toma forma nas análises e de um trajeto pela praça,
registrado num itinerário proposto pelo autor e fotografado etapa a etapa. Há
também no 3º capítulo a análise por via do octógono semiótico proposto para
registrar graficamente a emergência da axiologia que envolve o pedestre ao
exercitar o caminhar pelo local.
11.. FFUUNNDDAAMMEENNTTOOSS CCIIEENNTTÍÍFFIICCOOSS DDAA SSEEMMIIÓÓTTIICCAA CCOOMMOO BBAASSEE
TTEEÓÓRRIICCAA NNAA BBUUSSCCAA DDOO SSEENNTTIIDDOO DDEE UUMM TTEEXXTTOO
FLOCH (1993) ao dispor sobre as conclusões que advém de uma análise
semiótica, o que também se aplica ao texto visual, rejeita a concepção de que tal
empresa se produza de forma não científica quando diz:
Em primer lugar, el mundo del sentido es inteligible para la semiótica. La semiótica no comparte, por tanto, el gusto por lo inefable, que caracteriza ciertas estéticas o ciertas críticas. Por ejemplo, a un semiótico le repugna decir que “la eficacia de la publicidad reside en encanto”. Ello puede ser cierto “hasta cierto punto” y “a fin de cuentas”, pero este espacio y este tiempo no son los de la actividad semiótica, cuyo objetivo es y seguirá siendo la descripción de las condiciones de producción y de comprensión del sentido21 (FLOCH 1993, p. 22-23).
JOLY (2007) ao sistematizar teoricamente o entendimento a respeito das
peculiaridades de uma imagem descreve as dificuldades de tal trabalho, pois há
muitas possibilidades de abordagem, seja por via das matemáticas, da estética, da
psicologia, enfim, por várias ciências. Tal situação levaria o estudioso a um beco
sem saída, ou melhor, a uma espécie de labirinto com tantos caminhos que seria
impossível escolher um sem abrir mão de todos os demais e, assim, não levar em
conta uma teoria que fosse importante ao entendimento da imagem. É nesse ponto
que a Semiótica recepciona o pesquisador, por ser mais abrangente, a ultrapassar
as categorias funcionais da imagem.
Ainda por conta do trabalho de JOLY (2007) conclui-se que “vislumbrar” uma
imagem por via do entendimento de sua significação, como propõe a Semiótica,
possibilita a compreensão mais ampla, visto que:
[...] podemos dizer, agora, que abordar ou estudar certos fenômenos sob o seu aspecto semiótico é considerar o seu modo de produção de sentido, por outras palavras, a maneira como eles suscitam significados, ou seja, interpretações. Efetivamente, um signo é um signo apenas quando exprime ideas e suscita no espírito daquele ou daqueles que o recebem uma atitude interpretativa.
21
Tradução: Em primeiro lugar, para a Semiótica o mundo do significado é inteligível racionalmente. A Semiótica não partilha, portanto, com o gosto pelo inefável, caracterizador do estudo estético ou da análise crítica artística. Por exemplo, é inadmissível à Semiótica afirmar que “a eficácia da publicidade está no encanto”. Isso pode ser verdade “em certa medida” e “dentro de alguns limites”, mas estes campos de análise não são os da atividade semiótica, cujo objetivo é e continua a ser a descrição das condições de produção e compreensão do sentido.
Os fundamentos científicos da Semiótica como base teórica na busca do sentido de um texto
34
Deste ponto de vista poderemos afirmar que tudo pode ser signo, pois que a partir do momento em que somos seres socializados aprendemos a interpretar o mundo que nos rodeia, seja ele cultural ou natural. Mas o propósito do cientista semiótico não é o de decifrar o mundo nem o de recensear os diferentes significados que nós atribuímos aos objetos, às situações, aos fenômenos naturais, etc. esse poderá ser o trabalho do etnólogo ou do antropólogo, do sociólogo, do psicólogo ou mesmo do filósofo.
A tarefa do cientista semiótico consistirá antes em tentar ver se existem categorias de signos diferentes e se estes diferentes tipos de signos possuem uma especificidade e leis de organização próprias ou processos de significação particulares (JOLY, 2007, p. 30-31).
Os parágrafos anteriores permitem encontrar um recorte quanto ao estudo ora
apresentado. As informações históricas, culturais, comportamentais aparecem como
coadjuvantes e se prestam a contextualizar o espaço físico e ecologia do objeto do
presente estudo, ou seja, a “passagem” pela Praça Coronel Benedito de Almeida.
A teoria semiótica deve apresentar-se inicialmente como o que ela é, ou seja, como uma teoria da significação. Sua primeira preocupação será, pois, explicitar, sob forma de construção conceitual, as condições da apreensão e da produção do sentido (GREIMAS e COURTÉS, 2008, p. 455).
A análise semiótica trará a lume, objetivo primaz nesta pesquisa, a relação de
significados, evocados e transmitidos pelas imagens visuais captadas pelos olhos
dos pedestres (representados neste trabalho por fotografias da Praça Coronel
Benedito de Almeida).
Estudar o registro imagético fotográfico permitirá entender e explicar o
percurso gerativo de sentido que se apresenta ao transeunte em suas relações
diante de uma das principais preocupações do(a) cidadão(ã) moderno(a), no que se
refere à vida urbana, que é a segurança pessoal. E aí encontramos os processos de
significação particulares a este caso.
À guisa de recomendação (ao nível das políticas públicas), ou ainda de
descoberta, pode-se aduzir que um registro fotográfico contém significados que
podem ser repetidos em projetos arquitetônicos para outros espaços físicos, no caso
da geração de sentido apontar para a tranquilidade, ou então serem evitados,
quando a análise demonstrar que a aparência visual indica um espaço que transmite
ao pedestre a ideia de perigo.
Outro ponto destacado por FLOCH (1993) é o registro de que a ciência
Os fundamentos científicos da Semiótica como base teórica na busca do sentido de um texto
35
Semiótica deve ser conhecida e vista como tal, como uma ciência. A semiótica não
é, pois, fruto de reflexões filosóficas ou de conclusões lógicas a partir de um estudo
de signos em geral e isto porque
La semiótica nació a partir de la necesidad de quienes “ejercen la prática” de las realidades significantes, de volver explícitos sus procedimientos de análisis e interdefinir sus conceptos. Desciende de una “tradición de rigor” a la que se remiten muchos de los que quieren escapar del ensayismo y reunirse com la prática científica, a causa de sus exigências de coherencia, de su capacidad de transmisión y de la experimentación de los resultados22 (FLOCH 1993, p. 23-24).
11..11 DDeeccooddiiffiiccaaççããoo ddaa iimmaaggeemm ppeellaa SSeemmiióóttiiccaa
“Fuera del texto, no hay salvación”23. Indica o recuerda suficientemente que la semiótica es, ante todo, una relación concreta con el sentido; una atención dirigida a todo lo que tiene sentido. Puede tratarse de un texto, por supuesto, pero también de cualquier outro tipo de manifestación significante: un logotipo, un film, un comportamiento...24(FLOCH, 1993, p. 21).
A imagem, pode-se dizer, é o veículo pelo qual se transmite o maior número
de informações, com maior ênfase nos dias atuais. O “visual”, por via da tecnologia
que possibilita emissões em grande escala, é absorvido com velocidade pelas
pessoas sendo que dentre as formas de comunicação de massa destacam-se a
televisão, o cinema, a internet, a vídeo-conferência, exemplos em que a imagem é o
principal meio de mensagem. Nas “páginas” de sítios eletrônicos há prevalência dos
textos visuais, imagéticos, aos textos escritos, codificados em letras.
A propósito da importância das imagens e o interesse semiótico pela
entendimento e decodificação de textos visuais registram SOUZA e SANTARELLI
(2008) que:
O autor25 trouxe uma nova abordagem sobre estes estudos usando a semiótica greimasiana como instrumento de análise cujo interesse
22
Tradução: A Semiótica nasceu da necessidade dos que “exercem a prática”, das realidades significativas, de verificação de seus procedimentos de análise interdefiníveis e conceitos. Descende de uma “tradição de rigor” a que se referem muitos que querem escapar do ensaismo e pesquisar de acordo à prática estritamente científica, na consecução de se obter coerência, capacidade de transmissão e validação dos resultados experimentais. 23
Frase do pesquisador e semioticista Algirdas Julien Greimas, registrada em FLOCH (1993, pag. 21). 24
Tradução: “Fora do texto, não há salvação”. Indica, ou lembra, que a semiótica é, acima de tudo, uma relação concreta com o sentido, uma atenção dirigida para tudo o que faz sentido. Pode ser um texto, é claro, mas também aplica-se a qualquer outro tipo de demonstração com sentido: um logotipo, um filme, um comportamento... 25
O autor aqui referido é Jean-Marie Floch.
Os fundamentos científicos da Semiótica como base teórica na busca do sentido de um texto
36
principal é a idéia de poder compreender os atos de linguagem (enunciação). Floch trata a imagem como um texto-ocorrência significando assim que a semiótica estabelece inicialmente uma relação de sentido e que o mesmo é possível de ser encontrado em um texto, filme, desenho, logotipo ou qualquer outro “objeto” de estudo (SOUZA e SANTARELLI, 2008, p. 146).
Há no excerto um reforço à idéia de que o texto visual é de grande relevância
aos estudos desenvolvidos pela Semiótica por via da relação de sentidos encontrada
em textos visuais. Mesmo antes da escrita temos textos visuais como instâncias de
significação, um exemplo é constatável pelos pictogramas de Lascaux26.
A imagem pode ser utilizada, de forma autônoma, como veículo de
mensagem, como pode ser observado na evolução de desenhos para ideogramas,
como se verifica nos atuais códigos de escrita chinês e japonês, além da antiga
escrita egípcia. A fotografia é um veículo que registra uma imagem e que pode ser
submetida, com sucesso, a análise semiótica com o fito de se ter revelado(s) seu(s)
significado(s) e seu(s) propósito(s), isto é, o que pretendeu o fotógrafo ao produzi-la
e expô-la às pessoas.
GREIMAS e COURTÉS (2008, p. 254) afirmam que em semiótica visual,
[...] a imagem é considerada uma unidade de manifestação auto-suficiente, como um todo de significação, capaz de ser submetido à análise. Da mesma forma, enquanto para a semiologia da imagem a iconicidade dos signos faz parte da própria definição de imagem, a semiótica planar considera a iconicidade um efeito de conotação veridictória, relativa a uma determinada cultura, que julga certos signos “mais reais” que outros, e que conduz, em certas condições, o produtor da imagem a se submeter às regras de uma construção de um “faz de conta” cultural.
11..22 SSeemmiióóttiiccaa ddaass CCuullttuurraass
Os seres humanos nascem como seres biológicos (PAIS, 2007) e com o
tempo, e o conseqüente desenvolvimento cognitivo, vão adquirindo características
que os qualificam como seres culturais. Estes indivíduos farão parte de uma
coletividade, terão entendimentos e ações semelhantes, bem como aspectos morais,
conceituais e tecnológicos compartilhados, pois a soma de conhecimentos e saberes
compartilhados em um determinado grupo de humanos é o que estabelece a cultura
deste grupo (povo, nação, tribo).
26
Desenhos rupestres pré-históricos a representar animais e narrar atividades de caça, encontrados nas cavernas de Lascaux, França. (PEREIRA, s.d.).
Os fundamentos científicos da Semiótica como base teórica na busca do sentido de um texto
37
A riqueza do homem é a sua diversidade lingüística, cultural, social e histórica. A língua e os seus discursos, juntamente com as semióticas não-verbais, conferem a uma comunidade humana: a sua memória social; a sua consciência histórica; a consciência de sua identidade cultural; a consciência de sua permanência no tempo. Assim, configura-se a semiótica das culturas como uma ciência da interpretação (PAIS, 2007, p. 150).
Da formação cultural emerge um imaginário coletivo, compartilhado pelos
indivíduos partícipes desta cultura, por exemplo, na identificação informal de
“agressores da sociedade” pela repetição de características encontradas nas
narrativas orais daqueles que estiveram submetidos a situações de perigo. Aspectos
frequentes nas descrições de ataques por criminosos incluem a ocorrência de
situações similares, observadas e disseminadas em relação aos autores de crimes,
tais como o uso de gírias, vestimentas, expressões faciais, expressões corporais,
dentre outros.
A relação entre situações de perigo também podem ocorrer em razão do
ambiente onde ocorreram roubos ou furtos, tais relatos influenciam ouvintes,
potenciais disseminadores de informações, quanto à classificação do local quanto à
sua “periculosidade”. A caracterização de um espaço de uso como perigoso conduz,
culturalmente, à decisão de não mais frequentar o lugar, mesmo que esse
“frequentar” seja, como no caso desta pesquisa, simplesmente passar por uma
praça pública, em determinados horários.
Estas peculiaridades são codificadas culturalmente pela apreensão de
informações e formações imagéticas, numa comunidade, gerando a consequência
de que signos serão compreendidos de forma similar pelos integrantes de uma
mesma sociedade. Por exemplo tem-se que a visão de alguém que se enquadre em
estereótipos entendidos como de ladrões provocará medo, ou mesmo intenção de
reação, antes mesmo da ocorrência de alguma ação, é notório em locais de alto
índice de crimes perpetrados por menores a alteração no comportamento das
pessoas diante de crianças identificáveis como infratores.
A argumentação exarada no parágrafo anterior encontra aplicação no que se
refere ao ambiente utilizado por pedestres numa praça pública, ou seja, o mesmo
percurso gerativo de sentido em relação às características pessoais e
comportamentais de indivíduos ocorre em relação às características do ambiente.
Num ambiente escuro, onde o pedestre se sinta isolado e vulnerável, sem a
possibilidade de buscar socorro a significação estabelecida será a de perigo e a
Os fundamentos científicos da Semiótica como base teórica na busca do sentido de um texto
38
ação, em resposta a esta situação, será afastar-se do local.
Afirmam WILSON e KELLING (s.d.):
But how can a neighborhood be "safer" when the crime rate has not gone down - in fact, may have gone up? Finding the answer requires first that we understand what most often frightens people in public places. Many citizens, of course, are primarily frightened by crime, especially crime involving a sudden, violent attack by a stranger. This risk is very real, in Newark as in many large cities. But we tend to overlook or forget another source of fear -- the fear of being bothered by disorderly people. Not violent people, nor, necessarily, criminals, but disreputable or obstreperous or unpredictable people : panhandlers, drunks, addicts, rowdy teenagers, prostitutes, loiterers, the mentally disturbed27 (WILSON e KELLING, s.d.).
A argumentação acima, fundada em pesquisas científicas de criminologistas,
atesta que a cultura, como visto anteriormente, sendo o conjunto dos usos,
costumes e valores de um grupo humano, é afetada por um contexto entendido
como nocivo, ou potencialmente perigoso, e quando este cenário é encontrado num
local público ocorrem, em relação à cultura, as condições anotadas por PRADOS:
Pode ser entendida (a significação, como função semiótica), também como semiose, isto é, os processos de significação se armazenam na memória, se recuperam e ser transformam permanentemente (PRADOS, 2009, p. 17).
A significação do local será formada a partir das informações que são
recebidas e caracterizam o espaço físico em questão e da experiência pessoal de
mulheres e homens que conhecem a praça, por localizá-la geograficamente num
mapa mental ou por passarem pelo local (frequentemente ou não).
A dinâmica das informações e transformações, como afirma PRADOS (2009,
p. 17) na citação anterior, permite concluir que novos dados, novas informações
gerarão novas significações a constituir alterações na cultura partilhada por uma
comunidade. Os conjuntos mais recentes de informações modificarão, ou
estabelecerão, a forma de entender um espaço público, se está28 (no momento da
27
Tradução: Mas como pode um bairro ser “mais seguro”, quando o número de ocorrências não é baixo, ou ainda, pode estar aumentando? Encontrar a resposta exige, primeiro, que se entenda o que, com mais frequência, assusta as pessoas em lugares públicos. Muitos cidadãos, é claro, creditam sua intranquilidade, em locais públicos, à ação de criminosos, especialmente crimes envolvendo ataque súbitos e violentos. Este risco é muito real, em Newark como em muitas grandes cidades. Mas nós tendemos a ignorar ou esquecer outra fonte de medo - o medo de ser incomodado por pessoas desordeiras. Nem todas as pessoas violentas, ou mesmo os criminosos, mas pessoas de má reputação ou encrenqueiros: mendigos, bêbados, viciados, adolescentes arruaceiros, prostitutas, vadios, os mentalmente perturbados. 28
O verbo “estar” foi utilizado exatamente para transmitir a intenção do autor em estabelecer que há transitoriedade de situação produzindo noções não definitivas sobre o mesmo espaço físico.
Os fundamentos científicos da Semiótica como base teórica na busca do sentido de um texto
39
formação da ideia) seguro ou não passar pelo lugar.
11..33 NNíívveeiiss ddee eenntteennddiimmeennttoo
Assim, o homem é um ser de linguagem, ou melhor, é um ser de discurso. Discurso é o Ato da Fala. O homem fala com suas roupas, com seu sorriso, olhares, enfim comportamentos, além de falar com suas artes plásticas, musicais, literatura, arquitetura etc. Não importa o tratamento da informação, é o discurso que tem o poder, pois a significação só existe em discurso.
Num prédio construído na Idade Média, por exemplo, numa catedral, percebe-se o discurso arquitetônico medieval: as colunas altas até a abóboda, os vitrais coloridos, sugerem ao homem o que o discurso religioso medieval refletia e refratava o poder divino (ou da Igreja Estado) pesando sobre ele. Por outro lado, na arquitetura moderna, nos grandes edifícios de vidro e aço estão os centros empresariais e bancos evidenciando-se, assim, o atual discurso que reflete e refrata o poder da economia numa sociedade de consumo (PRADOS, 2008, p. 68-69).
Os discursos são identificáveis concreta e abstratamente e revelam intenções
sociais, ideológicas e pragmáticas29 de seus idealizadores, bem como de seus
executantes. O planejamento de um espaço público demonstra o que pensa o
arquiteto/urbanista a respeito de como a população deve ser tratada pelo Estado.
Esta é uma parte do percurso gerativo de sentido e não o caminho todo. A
enunciação que um texto visual apresenta não pode prescindir do entendimento por
parte de quem passa por este espaço público. Se o enunciado for incompreensível,
ou ainda mal compreendido, não haverá comunicação e a intenção não surtirá seus
efeitos em transmitir sentido aos usuários do espaço público em questão.
A enunciação, consoante GREIMAS e COURTÉS (2008, p. 166), aparece
como a instância de mediação, que assegura a colocação em enunciado-discurso
das possibilidades em comunicação ao se considerar que o enunciado é o resultado
a ser alcançado. GREIMAS e COURTÉS ainda afirmam, sobre a enunciação, que
[...] seria necessário prever, com efeito, prever estruturas de mediação, imaginar também como o sistema social que é a língua pode ser assumido por uma instância individual, sem com isso se dispersar numa infinidade de falas particulares [...] (GREIMAS e COURTÉS, 2008, p. 166).
29
O pragmatismo numa construção civil em execução refere-se, neste trabalho, às decisões de “canteiro de obra”, isto é, desde a substituição de uma coloração de tinta que esteja em falta no mercado até as pressões sobre o engenheiro civil para a finalização dos trabalhos. Estas decisões também indicam as prioridades, formadas por valores, da parte de quem oferece à comunidade uma obra pública.
Os fundamentos científicos da Semiótica como base teórica na busca do sentido de um texto
40
A mediação, na proposição greimasiana, ocorre no momento em que há a
atualização no discurso por parte do sujeito que recebe o enunciado. Os valores que
emergirão como consequência do contato deste indivíduo com o texto, mais
especificamente com as intenções subjacentes neste texto, correspondem às
vivências, aos ensinamentos, enfim à cultura do sujeito, remetendo à formação desta
pessoa, como afirma MELLO ao referir-se ao simbolismo na arquitetura:
Como fenômeno cultural, a obra é oferecida à leitura do usuário, sempre novo. O processo de recepção cria e recria a arquitetura, garantindo sua mutabilidade e continuidade, mesmo que a obra não venha a sofrer novas intervenções espaciais. A espacialidade simbólica não depende, assim, só daqueles que contribuíram para a concretização da obra, mas deve-se igualmente ao usuário, leitor e criador de novos sentidos (MELLO, 2007, p. 15).
Esta emergência axiológica toma corpo em três níveis de complexidade, o
discursivo, o narrativo e nas estruturas fundamentais, conforme ordenação mais
superficial à mais profunda da pessoa. Um pedestre, ao deparar com um
determinado cenário, em passagem pela Praça Coronel Benedito de Almeida,
captará mensagens, transmitidas visualmente, nestas três etapas, conforme
preceituam GREIMAS e COURTÉS (2008) em sua teoria a respeito do Processo de
Geração de Sentido. Primeiramente toma contato com o discurso, com o nível mais
superficial da significação, a primeira impressão, o que salta aos olhos, é a história
contada.
A estrutura da história contada é descrita na análise do nível narrativo. Onde
encontramos o sujeito e sua busca pelo objeto de valor. No nível narrativo são
determinados os participantes da história e seus papéis. O nível fundamental, por
sua análise, nos apresenta os termos simples do texto, com maior grau de
abstração. A significação do texto, estabelecida pelas relações entre os termos e
valores, é estruturada neste nível. As análises resultantes da aplicação da teoria a
ensinar que o entendimento se dá em três níveis serão expostas no capítulo “3”.
A narrativa da busca do objeto de valor pelo ator é recorrente e é encontrada
em praticamente todas as histórias. Nos assuntos relativos à segurança pública, ao
nível da semântica profunda, na exposição dos elementos mais abstratos de um
discurso são encontrados a tranquilidade - que também pode ser designada por
sensação de segurança - e a qualidade de vida do cidadão. Quanto à sensação de
segurança, há o reconhecimento, por via indireta, de que o medo do crime, a
Os fundamentos científicos da Semiótica como base teórica na busca do sentido de um texto
41
apreensão por algum crime que poderá ocorrer, é um fator pertinente e
caracterizador do cotidiano da comunidade em vista de que não é somente o crime
que causa transtornos, mas, fundamentalmente, o medo de que o crime ocorra, pois
O tema do “medo do crime”, portanto, merece especial atenção por seu potencial de alterar a qualidade de vida dos indivíduos e das comunidades. Um melhor entendimento do “medo do crime” pode permitir maior controle da insegurança pública (DANTAS; PERSIJN E SILVA JUNIOR, 2006, p. 20).
Por via da Semiótica30 há o entendimento de a geração de sentido é
consequência da articulação entre dois planos de enunciação, o plano de expressão
e o plano de conteúdo. O plano de expressão é o meio pelo qual a mensagem é
transmitida, televisão, fotografia, texto escrito, gestual e demais formas, o plano de
conteúdo é o que se entende do texto. O plano de expressão pode ser invariável,
uma fotografia será sempre a mesma fotografia, mas a forma de olhar o plano de
expressão pode variar. Ao ler um cartaz escrito num idioma desconhecido ao
observador as figuras e cores serão importantes e a escrita indecifrável. Algum
tempo depois, ao aprender a ler no idioma antes desconhecido, pode-se afirmar que
novas luzes são lançadas às antigas cores e figuras propiciando a compreensão
mais cabal do cartaz. O plano de expressão não foi alterado, mas o conteúdo sim e
isto ocorreu pela mudança no indivíduo, de onde é possível dizer que enunciatário é
quem faz a maior diferença no plano de conteúdo.
Figura 8 – Flanco esquerdo da muralha do Castelo Neuschwanstein (Alemanha). Autor: Valter Padulla, 2011.
30
Neste trabalho de pesquisa dizer Semiótica equivale a dizer Semiótica greimasiana.
Os fundamentos científicos da Semiótica como base teórica na busca do sentido de um texto
42
A figura 8 ilustra a importância da contextualização, em relação ao
entendimento da representação arquitetônica e a segurança pessoal, quando à
percepção a formar a sensação de segurança no indivíduo, inserido em sua
comunidade. Ao compreender o obstáculo apresentam-se três possibilidades de
entendimento, quais sejam, a dificuldade de transpassar o paredão e tomar o castelo
e, portanto, submeter o inimigo que se defende, de outro ponto de vista a segurança
que os habitantes do interior da fortaleza vivenciam em saber que o muro é de
dificílima transposição e ainda uma terceira opinião, de alguém não inserido no
contexto cultural e temporal das duas anteriores, que é a admiração pela
consecução do objetivo de construir uma obra civil de tamanho porte numa área de
acesso difícil e cuja execução demandou engenhosidade e tenacidade.
Em relação à percepção pessoal e particular dos ambientes públicos pode-se
concluir que as apresentações estatísticas prestam-se a indicar e retratar o que
ocorre na comunidade como um todo, entretanto cada indivíduo busca tranquilidade
pessoal e entende que sua vida também deve ser valorizada e protegida. No que se
refere à Semiótica o texto é lido e decodificado pelo indivíduo, o que enseja uma
leitura individual e, portanto a possibilidade de encontrar várias versões para um
mesmo texto, a serem homogeneizadas, em maior ou menor grau, pela cultura.
A opinião pública é importante, mas esta é formada pela soma das
singularidades, pelo conjunto das opiniões individuais e só emerge, como opinião
pública, quando fizer sentido num conjunto de indivíduos, ou seja, a satisfação
individual também demanda atenção.
Tendo estabelecido a relevância da opinião individual é de se considerar que
não basta demonstrar e noticiar resultados favoráveis, no campo da segurança
pública, para um indivíduo que foi, de alguma forma, vítima de ação criminosa ou
violenta. Quando o cidadão não é “recepcionado” pelo Estado, quanto à sua
proteção e segurança, um gráfico demonstrando, estatisticamente, que há queda
nos índices da violência e da criminalidade não produzirá a significação
“tranquilidade”.
11..44 MMeettooddoollooggiiaa sseemmiióóttiiccaa ddee aannáálliissee
A metodologia de análise de textos conforme proposição do pesquisador
Algirdas Julien Greimas é a adotada neste trabalho como guia para os
Os fundamentos científicos da Semiótica como base teórica na busca do sentido de um texto
43
procedimentos de leitura e interpretação de textos visuais, especificamente as
fotografias da Praça Coronel Benedito de Almeida, feitas pelo autor desta
dissertação. Os pressupostos da semiótica greimasiana para o entendimento do
texto visual, inserido no contexto cultural da área central do Município de Mogi da
Cruzes/SP, apontam as direções norteadoras a serem utilizadas, para que a análise
não esteja desvinculada de parâmetros científicos.
A apreensão do que pode significar determinado texto é o objeto de estudo da
Semiótica, não apenas no sentido de significação, ou do que transmite em termos de
mensagens, mas também, e sobretudo, o entendimento sobre como31 a
comunicação torna-se inteligível a quem o texto é destinado, ou ainda a quem lê o
texto, visto que para que seja compreensível, ao receptor, o texto é estruturado de
forma a entrosar diversos elementos que possibilitem a constituição de um sentido
coerente.
Elucida PIETROFORTE (2010) que o entendimento de um texto, conforme
preceitua a semiótica greimasiana, ocorre em três níveis, a saber, o narrativo, o
discursivo e o fundamental, independentes e harmônicos entre si para que o sentido
seja preservado e não ocorra confusão na interpretação do texto. O sentido emerge,
por via dos níveis, das idéias mais simples e concretas para aquelas mais
complexas32 e abstratas.
O nível narrativo é onde ocorre a descrição, é a exposição mais simples, isto
é, a sequência dos fatos como o enunciador dispõe. No nível narrativo ocorre a ação
realizada pelos personagens, num texto visual é a descrição do que é observável, as
disposições espaciais numa foto por exemplo.
O nível discursivo é mais complexo que o anterior e apresenta, em sua
análise, as relações entre os personagens. No nível discursivo ocorrem as
associações com outras situações vistas em outros textos, a comparação entre um
texto e outro. O discurso de um texto pode ser encontrado em outro texto com atores
e ações diferentes mas com as mesmas sequências, o que enseja que o resumo de
31
N.A.: a responder a questão: Qual o percurso gerativo de sentido? 32
N.A.: o termo “complexas” neste local do texto não é referente a algo difícil ou complicado, mas sim à situação de ser multifacetário.
Os fundamentos científicos da Semiótica como base teórica na busca do sentido de um texto
44
um texto seja idêntico ao resumo de outro texto. Quanto ao texto visual o nível
discursivo, em termos de análise semiótica greimasiana, será a descrição das
relações transeunte/praça e também é visto em outros espaços públicos.
O nível fundamental, também denominado como semântica profunda, é o
momento da análise em que emergem os valores, as motivações para que os atores
realizem suas ações. GREIMAS e COURTÉS (2008) definem o Nível Fundamental
como abstrato pois é o “lugar” onde ocorre o percurso gerativo do discurso, onde são
encontradas as estruturas elementares da significação. O nível fundamental, na
análise semiótica greimasiana, é o que propicia a axiologia exposta graficamente no
QUADRADO SEMIÓTICO, explicado da seguinte forma pelos autores declinados:
Compreende-se por quadrado semiótico a representação visual da articulação lógica de uma categoria semântica qualquer. A estrutura elementar da significação, quando definida – num primeiro ,momento – como uma relação entre ao menos dois termos, repousa apenas sobre uma distinção de oposição que caracteriza o eixo paradigmático da linguagem: ela é, portanto, suficiente para construir um paradigma composto de n termos, mas não permite por isso mesmo distinguir, no interior desse paradigma, categorias semânticas baseadas na isotopia (o parentesco) dos traços distintivos que nele podem ser reconhecidos. Faz-se necessária uma tipologia das relações, por meio da qual se possam distinguir os traços intrínsecos, constitutivos da categoria, dos traços que lhe são alheios (GREIMAS e COURTÉS, 2008, p. 400).
Destaca-se que a coerência de um texto é decorrente da capacidade do leitor
em associar o que lê à sua compreensão, e esta compreensão está pautada pela
cultura, a possibilitar a decodificação do texto e a contraposição dialética dos valores
encontrados com os valores intrínsecos ao leitor, a tornar inteligível a leitura. Ao
entender que no texto subsiste pelo menos um discurso, ou seja, no mínimo um
conjunto33 de valores ideológicos, a Semiótica busca decompô-lo, como será
verificado no capítulo 3, com o fito de expor o interior do texto (o que o texto diz e
como faz para dizê-lo) e o que está exterior ao texto (qual a motivação do texto).
33
N.A.: Ao declarar “no mínimo um conjunto” está aberta a possibilidade de que num texto subsistam vários conjuntos de valores a partir do momento em que estejam inseridos num determinado texto visual vários discursos, o discurso político de uma prefeitura que tem como valor zelar pela cidade, ou ainda o discurso social de que a Praça Cel Benedito de Almeida é um bom lugar por ser possível, neste espaço físico, propiciar atividades comerciais de compra e venda de lanches, dentre outros discursos possíveis.
22.. AA PPRRAAÇÇAA:: OO CCOONNTTEEXXTTOO DDOO OOBBJJEETTOO DDEE EESSTTUUDDOO
É importante fazer a construção do cenário, e seu histórico de
transformações, a compor a praça em estudo neste trabalho e seus indicativos
visuais, como veículos de significação de (in)segurança aos transeuntes deste
espaço público. A contextualização, portanto, tange o aspecto de que o local é o
ponto central da cidade, no sentido de que nesta praça está o marco zero e a
história a aponta como o lugar no qual se inicia a colonização das terras, que mais
tarde serão conhecidas como Município de Mogi das Cruzes.
Ao descrever a formação cultural contemporânea BAUMAN (2008) afirma
que:
Os perigos dos quais se tem medo (e também os medos derivados que estimulam) podem ser de três tipos. Alguns ameaçam o corpo e as propriedades. Outros são de natureza mais geral, ameaçando a durabilidade da ordem social e a confiabilidade nela, da qual depende a segurança do sustento (renda, emprego) ou mesmo da sobrevivência no caso de invalidez ou velhice. Depois vêm os perigos que ameaçam o lugar da pessoa no mundo – a posição na hierarquia social, a identidade (de classe, de gênero, étnica, religiosa) e, de modo mais geral, a imunidade à degradação e à exclusão sociais. Mas numerosos estudos mostram que, nas consciências dos sofredores, o “medo derivado” é facilmente “desacoplado” dos perigos que o causam. As pessoas às quais ele aflige com o sentimento de insegurança e vulnerabilidade podem interpretá-lo com base em qualquer dos três tipos de perigos – independentemente das (e frequentemente em desafio às) evidências de contribuição e responsabilidade relativas a cada um deles. As reações defensivas ou agressivas resultantes, destinadas a mitigar o medo, podem assim ser dirigidas para longe dos perigos realmente responsáveis pela suspeita de insegurança.
O “medo derivado” é uma estrutura mental estável que pode ser mais bem descrita como um sentimento de ser suscetível ao perigo; uma sensação de insegurança (o mundo está cheio de perigos que podem se abater sobre nós a qualquer momento com algum ou nenhum aviso) e vulnerabilidade (no caso de o perigo se concretizar, haverá pouca ou nenhuma chance de fugir ou de se defender com sucesso; o pressuposto da vulnerabilidade aos perigos depende mais da falta de confiança nas defesas disponíveis do que do volume ou da natureza das ameaças reais). Uma pessoa que tenha interiorizado uma visão de mundo que inclua a insegurança e a vulnerabilidade recorrerá rotineiramente, mesmo na ausência de ameaça genuína, às reações adequadas a um encontro imediato com o perigo; o “medo derivado” adquire a capacidade de autopropulsão (BAUMAN, 2008, p. 9).
Apesar de contextualizadoras importantes as ações de policiamento ostensivo
A Praça: O contexto do objeto de estudo. 46
preventivo, imagens de câmeras de vídeo-monitoramento voltadas à segurança
pública não são aspectos em estudo neste trabalho. A decisão de desconsiderar tais
fatores se deve por duas razões. Não há nenhuma instalação física da Polícia Militar
na praça analisada e também por que as imagens das câmeras municipais de vídeo-
monitoramento não compõem o texto visual dos transeuntes da Praça Coronel
Benedito de Almeida.
Em pesquisa junto à Secretaria de Segurança da Cidade de Mogi das
Cruzes34 o autor foi informado de que há três câmeras que captam imagens desde a
Praça Coronel Benedito de Almeida, mas nenhuma dentro dos limites da praça.
Estão instaladas em pontos de difícil visualização ao transeunte, ou seja, não fazem
parte do texto visual observável pelo indivíduo que passa pela praça. A seguir o
autor indica a localização das câmeras e a visualização destas:
Figura 9 – Vista superior da P
ça C
el Benedito de Almeida, e entorno, a destacar o
posicionamento de câmeras de segurança (pontuadas pelas estrelas) em relação à praça (polígono verde).
Fonte: Sítio Eletrônico Google Earth, acesso em 23/06/11 às 12h30.
A figura 9 destaca a posição das câmeras de vídeo-monitoramento pelas
formas em estrela. A estrela azul indica a posição da câmera na confluência da Rua
Paulo Frontin com a Rua Presidente Rodrigues Alves. A estrela vermelha destaca o
equipamento instalado na esquina da Rua Senador Dantas com a Rua Major
Arouche de Toledo. A estrela amarela representa a câmera situada no cruzamento
da Rua Padre João com a Rua Coronel Souza Franco. A seguir o autor, por via de
34
Contato com o Secretário Eli Nepomuceno.
A Praça: O contexto do objeto de estudo. 47
fotografias, apresenta a visão possível destes equipamentos a alguém que esteja
passando pela praça:
Figura 10 – Câmera posicionada na na confluência da Rua Paulo Frontin com a Rua
Presidente Rodrigues Alves. Fonte: Fotografias feitas pelo autor.
A figura 10 demonstra que não é possível, ao transeunte, visualizar a câmera
de vídeo-monitorizamento, e, assim sendo, esta não está presente no texto visual
que se lhe apresenta. Ao não constar no texto visual não comunica nenhuma
mensagem, situação que é reforçada pelo fato de que não há nenhuma placa
indicativa de que a praça é vigiada por câmeras. As fotografias constantes da figura
10 reafirmam, materialmente, a máxima de Greimas: “Fora do texto não há
salvação”.
A Praça: O contexto do objeto de estudo. 48
Figura 11 – Câmera instalada na esquina da Rua Senador Dantas com a Rua Major Arouche de Toledo Autor: Valter Padulla, 2011.
Figura 12 – Câmera situada no cruzamento da Rua Padre João
com a Rua Coronel Souza Franco. Fonte: Fotografias feitas pelo autor.
A Praça: O contexto do objeto de estudo. 49
A figura 12 expõe, como ocorre com a figura 10, que as câmeras de vídeo-
monitoramento não estão inclusas no texto visual percebido pelas pessoas que
estão na praça.
22..11 AA eexxppeeccttaattiivvaa ddee sseegguurraannççaa
O grau de tranquilidade vivenciada pelo transeunte de uma praça pública está
atrelado à possibilidade de riscos à sua incolumidade física e ao patrimônio, ou seja,
quanto maior a possibilidade de ocorrer algum problema maior o medo do cidadão e,
consequentemente, sua apreensão e receio ao andar pelas ruas. A relação entre as
considerações sobre o texto visual encontrado na praça com a percepção da
possibilidade de riscos à segurança pessoal é proposta nesta pesquisa sendo de
importância o reconhecimento, pelas pessoas, sobre como se caracteriza
determinado ambiente, quanto ao quesito segurança pública.
O artigo 12 da Declaração Francesa dos Direitos do Homem e do Cidadão, de
1789, indica a importância do Estado em prover os cidadãos de bem estar e
segurança quando afirma que:
Para garantir os direitos do Homem e do Cidadão, é necessária uma força pública: essa força é instituída, portanto, para a vantagem de todos, e não para utilidade particular daqueles a quem é confiada (FRANÇA, 2006, p. 244-245).
A Força Pública, nomeada na citação, é a representação simbólica, e prática
quando age, da presença do “ente” Estado a proteger os direitos das pessoas e,
portanto, manter a ordem e as condições de segurança pessoal para a consecução
do objetivo maior que é a “felicidade de todos”.
O Estado nasce, conforme preceitua JEAN-JACQUES ROUSSEAU
(ROUSSEAU, 2006, p. 209) da busca do homem por segurança, ou ainda a defesa e
proteção das pessoas e de seus bens. Portanto a natureza do Estado, sua
existência, aponta diretamente para a expectativa da população em que seus
direitos fundamentais sejam preservados e, sobretudo, garantidos. O argumento da
expectativa de proteção pelo Estado é solidificado pelo dizer de WEBER (1978) ao
afirmar que:
Today legal coercion by violence is the monopoly of the state. All other groups applying legal coercion by violence are today
A Praça: O contexto do objeto de estudo. 50
considered as heteronomous and mostly also as heterocephalous35 (WEBER, 1978, p. 314).
Ao cidadão que não pode, em razão da lei, exercer a justiça por suas
“próprias mãos” cumpre esperar que o Estado lhe garanta segurança pessoal e
patrimonial. Este indivíduo entregou ao Estado o monopólio do uso da força e, por
isso, desarmou-se, passando a confiar a outros a sua própria defesa. Ainda neste
diapasão a Constituição Federal do Brasil, com o peso de ser a mais alta norma a
regulamentar a vida dos brasileiros e a produzir reflexos no cotidiano de todos os
habitantes do território brasileiro, reforça o conceito da responsabilidade do Estado.
Em seu preâmbulo a Constituição Federal reza:
[...] Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar [...] (BRASIL, 1988).
E no artigo 144 caput, do mesmo documento:
A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio [...] (BRASIL,1988).
Este é um consenso universal, que as pessoas dependem de tranquilidade e
segurança para desenvolver suas atividades diárias, e a norma aceita institui o
conceito de que o Estado passa a existir, dentre outras atribuições, para garantir
proteção aos cidadãos. Esta ideia tem sido reiterada como norma, por vários
pesquisadores e estudiosos, em vários países e em diferentes momentos36.
A Administração Pública Municipal detém um papel de importância capital nos
destinos da cidade e, com resultados imediatos, no aspectos da vida cotidiana das
pessoas, o cidadão mora na cidade e sente imediatamente os reflexos de uma
política voltada para o bem estar dos usuários dos bens públicos. As
responsabilidades do Administrador Público Municipal, no que tange ao objeto de
pesquisa deste trabalho, estão registradas na Carta Magna da seguinte forma:
A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes (Art. 182 da Constituição Federal do Brasil – BRASIL, 2010).
35
Tradução: Atualmente o monopólio no uso da violência e coerção legal é exercido pelo Estado. Qualquer outro grupo a utilizar a violência é considerado fora-da-lei e distinto do Estado. 36
Thomas Hobbes, com a obra o Leviatã e Jean-Jacques Rousseau, com o estudo Contrato Social, para citar dois autores clássicos dentre muitos que escreveram e escrevem sobre o tema.
A Praça: O contexto do objeto de estudo. 51
O artigo 3º da LEI COMPLEMENTAR Nº 46, DE 17 DE NOVEMBRO DE 2006
(Plano Diretor de Mogi das Cruzes), diz:
O Plano Diretor tem por finalidade realizar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e o uso socialmente justo e ecologicamente equilibrado de seu território, de forma a assegurar a função social da propriedade e o bem estar de seus habitantes, nos termos dos artigos 182 e 183 da Constituição Federal.37
22..22 AA ““ppeerrffoorrmmaannccee”” ddee uumm eessppaaççoo ppúúbblliiccoo
Um espaço público, como a se personalizar e adquirir vida própria, pode ser
entendido como um lugar que interage com as pessoas que o usam, o que se
conclui quando alguém cita sua terra natal com emoção ao dizer que tem suas
“raízes” no lugar onde nasceu, ou ainda onde passou a maior parte de sua vida. O
processo de naturalização implica em oficializar que alguém a partir do processo,
formal ou informal, passou a “pertencer” a um lugar distinto de onde vivia antes.
O actante pode ser concebido como aquele que realiza ou que sofre o ato, independentemente de qualquer outra determinação. Assim, para citar L. Tesnière, a quem se deve o termo, “actantes são os seres ou as coisas que, a um título qualquer e de modo qualquer, ainda a título de meros figurantes e da maneira mais passiva possível, participam do processo”. Nossa perspectiva, actante designará um tipo de unidade sintática, de caráter propriamente formal, anteriormente a qualquer investimento semântico e/ou ideológico (GREIMAS e COURTÉS, 2008, p. 20 e 21).
A praça realiza sua “performance” quando lhe são atribuídos atributos que a
personificam, por seus usuários, quando as pessoas conferem características
humanas a um conjunto arquitetônico, instalado num espaço físico, e o classificam
como um bom lugar, um lugar apreciável, ou ainda, um espaço físico a ser evitado.
Esta interação ocorre quando há o contato pessoal com a praça. Também existe a
possibilidade do contato não ser pessoal, quando ocorre por informações de outras
pessoas, noticiário pela mídia.
O contato não-pessoal com o ambiente indica a transmissão de conhecimento
por processos culturais, interações entre pessoas da comunidade que partilham
dados, informações e conhecimentos. O indivíduo é relevante, em suas impressões,
pois comunica estas noções a outros membros da comunidade.
37
Texto disponível em <<http://www.mogidascruzes.sp.gov.br/Canais/ Plano_Diretor /plano_diretor.pdf>> acesso em 11/10/10 às 20h10.
A Praça: O contexto do objeto de estudo. 52
Figura 13 – Placa de identificação da Pça
Cel Benedito de Almeida.
Autor: Valter Padulla, 2011.
A qualidade de vida urbana está diretamente atrelada a vários fatores que estão reunidos na infra-estrutura, no desenvolvimento econômico-social e àqueles ligados à questão ambiental. No caso do ambiente, as áreas verdes públicas constituem-se elementos imprescindíveis para o bem estar da população, pois influencia diretamente a saúde física e mental da população (LOBODA; DE ANGELIS, 2005, p. 7).
A forma de atuação dos profissionais que laboram na segurança pública
guarda similaridades com os trabalhos relativos à saúde. Os objetivos da segurança
e da saúde são similares, inclusive no aspecto de que ambos buscam atender,
acolher e incluir indistintamente, visando o foco principal de prover todos de bem
estar. Ambos os serviços públicos são, ou deveriam ser, formas de democratizar o
que é oferecido pelo Estado ao brasileiros. Destaca-se também o fato de que são
agências do Estado a salvaguardar a incolumidade dos cidadãos.
O lugar pode ser entendido como espaço qualificado; e o espaço é qualificado em função do receptor. O lugar não se realiza na crueza perceptiva e sim na intersecção sujeito-objeto.
O espaço simbólico pode ser então, à guisa de introdução, entendido de duas maneiras: como espaço físico, corpo do símbolo encarnado como produção e/ou recepção, ou como espaço supra-físico, a dimensão particular de manifestação de leis, valores, crenças, culturas, tradições, ideas, abstratos ou mesmo realidades psicológicas ou espirituais (MELLO, 2007, p. 14).
Ao analisar a importância e significação de um espaço físico (a praça desta
pesquisa) para seus usuários adotou-se a metodologia de entender a interação
deste espaço público com seus usuários, ao que pode ser designada como a
performance da praça visto que no decorrer da história podem ser caracterizados
A Praça: O contexto do objeto de estudo. 53
períodos distintos de uso deste espaço, que serão vistos com detalhes no sub-título
a seguir.
O espaço público deve ser observado e descrito com o olhar cultural atual. Ao
ser a cultura contemporânea também um “lugar” no sentido de possibilitar e formar
entendimentos característicos quanto ao contexto (formado por aspectos
relacionados à política, ao tempo, aos usos e costumes) ela é contemporânea por
excelência. SANTOS (2006) aponta uma guia neste estudo ao conceituar o espaço,
quanto à cultura, da seguinte forma:
Ao nosso ver, a questão a colocar é a da própria natureza do espaço, formado, de um lado, pelo resultado material acumulado das ações humanas através do tempo, e, de outro lado, animado pelas ações atuais que hoje lhe atribuem um dinamismo e uma funcionalidade. Paisagem e sociedade são variáveis complementares cuja síntese, sempre por refazer, é dada pelo espaço humano.
Os movimentos da sociedade, atribuindo novas funções às formas geográficas, transformam a organização do espaço, criam novas situações de equilíbrio e ao mesmo tempo novos pontos de partida para um novo movimento. Por adquirirem uma vida, sempre renovada pelo movimento social, as formas - tornadas assim formas-conteúdo - podem participar de uma dialética com a própria sociedade e assim fazer parte da própria evolução do espaço (SANTOS, 2006, p. 69).
Ao aliar os conceitos de saúde pública e perfomance, conforme aplicação
relativa a esta pesquisa, forma-se a idea mais geral de que quando um espaço
público não atende a comunidade em seu sentido de acolhimento, de rota de
passagem, de lazer e outros mais, pode se dizer que este espaço está “doente”, que
não cumpre seu papel, ou ainda, que sua perfomance junto à comunidade está
prejudicada, pois foi idealizado, planejado e executado para que as pessoas fossem
atendidas. Ressalta-se, para entendimento da metodologia de trabalho adotada
nesta pesquisa, que o foco de intenção de observação, descrição e análise, sob a
ótica apontada pela fundamentação teórica proposta por Algirdas Julien Greimas, ou
seja a Semiótica dita greimasiana, o objeto de estudo é esclarecer a aludida
interação especificamente ao aspecto “passagem” de pessoas pelo espaço físico da
Praça da Matriz de Mogi das Cruzes.
Ao observar a performance de um espaço público atrelada ao entendimento
da “saúde” deste local é relevante levar em conta as noções e práticas de urbanismo
e planejamento da cidade. Destaca-se o documento norteador da arquitetura
A Praça: O contexto do objeto de estudo. 54
“CARTA DE ATENAS38”, que aponta alguns conceitos e orientações a respeito das
necessidades e ideais de vida humana nas cidades, nas seguintes linhas:
Trinta e três cidades foram analisadas, por ocasião do Congresso de Atenas39, por diligência dos grupos nacionais dos Congressos Internacionais de Arquitetura Moderna: Amsterdã, Atenas, Bruxelas, Baltimore, Bandoeng, Budapeste, Berlim, Barcelona, Charieroi, Colônia, Como, Dalat, Detroit, Dessau, Frankfurt, Genebra, Gênova, Haia, Los Angeles, Litoria, Londres, Madri, Oslo, Paris, Praga, Roma, Roterdã, Estocolmo, Utrecht, Verona, Varsóvia, Zagreb e Zurique.
Elas ilustram a história da raça branca sob os mais diversos climas e latitudes. Todas testemunham o mesmo fenômeno: a desordem instituída pelo maquinismo em uma situação que comportava até então uma relativa harmonia; e também a ausência de qualquer esforço sério de adaptação.
Em todas essas cidades o homem é molestado. Tudo que o cerca sufoca-o e esmaga-o. Nada do que é necessário a sua saúde física e moral foi salvaguardado ou organizado. Uma crise de humanidade assola as grandes cidades e repercute em toda a extensão dos territórios. A cidade não corresponde mais a sua função, que é abrigar os homens, e abrigá-los bem (CARTA DE ATENAS, s.d., p. 28).
A conclusão deste importante documento para arquitetura e urbanismo é
prestar-se a nortear os trabalhos de planejamento das cidades e, em especial neste
texto, aponta a necessidade de compreender um espaço dito público pela função
que deve exercer. A expectativa do usuário é que o local seja útil e, na medida das
possibilidades, agradável, confortável e seguro.
22..33 BBrreevvee hhiissttóórriiccoo ddoo eessppaaççoo hhoojjee ddeennoommiinnaaddoo PPrraaççaa CCoorroonneell
BBeenneeddiittoo ddee AAllmmeeiiddaa4400
Os aspectos das transformações culturais e de performance atinentes à Praça
Coronel Benedito de Almeida são melhor visualizados à luz de processos históricos,
com desdobramentos na política, na economia, na sociedade e na cultura. A linha do
tempo apresenta marcos que destacam as alterações nos usos e formas de interagir
com o espaço em questão nesta pesquisa.
Anteriormente à chegada dos portugueses ao Brasil o local era habitado por
índios guaianases que conheciam a clareira junto ao atual rio Tietê. O local fazia
38
A Carta de Atenas é o manifesto urbanístico resultante do IV Congresso Internacional de Arquitetura Moderna (CIAM), realizado em Atenas em 1933. 39
Realizado em 1933. 40
Pesquisa da história de Mogi das Cruzes, efetuada pelo autor, junto ao COMPHAP.
A Praça: O contexto do objeto de estudo. 55
parte da sesmaria41 de Braz Cubas, que passou pela clareira ao fazer o
reconhecimento de suas terras, todavia sem fixar residência o que ocorreu apenas
alguns anos depois com a chegada de Gaspar Vaz, que, vindo da Vila de São Paulo
de Piratininga (atual cidade de São Paulo) estabeleceu comunicação, uma estrada,
com outros grupos de colonizadores interligando o “sertão” e o litoral, que é o
primeiro ponto de fixação dos portugueses.
A dinâmica de transformações e usos do local pode ser resumida de acidente
geográfico (uma clareira próxima a M’Boigy42) passando a povoado (entreposto de
abastecimento aos viajantes em trânsito entre São Paulo de Piratininga e a costa
brasileira). Em 1611 o povoado adquire a condição de vila (em 1611), que foi
elevada a cidade (1865) e estabelecida como comarca (1874). Ainda quanto ao
nome da cidade, a partir da Praça da Matriz:
Mogi é uma alteração de Boigy que, por sua vez, vem de M'Boigy, o que significa "Rio das Cobras", denominação que os índios davam a um trecho do Tietê. Quando a Vila foi criada em 1611, devido ao costume de adotar o nome do padroeiro, passou a ser denominada “Sant'Anna de Mogy Mirim”.43
41 Terreno sem culturas ou abandonado, que a antiga legislação portuguesa, com base em práticas
medievais, determinava que fosse entregue a quem se comprometesse a cultivá-lo. Quem a recebia
pagava uma pensão ao estado, em geral constituída pela sexta parte do rendimento através dele
obtido. Quando o Brasil foi descoberto, para cá transplantou-se o regime jurídico das sesmarias. O
rei, ou os primeiros donatários de capitanias, faziam doações de terras a particulares, que se
comprometiam a cultivá-las e povoá-las. Só em 1812 as sesmarias foram oficialmente extintas. Texto
disponível em <<http://www.dicio.com.br/sesmaria/>>, acesso em 25/04/11 às 20h35.
42 Denominação indígena, provavelmente dos Índios Guaianases, que se traduz por Rio das Cobras,
atualmente conhecido como Rio Tietê. 43
Texto disponível em <<http://www.pmmc.com.br/Cidade/historia.php>>, acesso em 07/04/11 às 15h30.
A Praça: O contexto do objeto de estudo. 56
Figura 14 - Aspecto do Largo da Matriz em 1817.
Fonte: GRINBERG (2001, p. 25).
A “clareira” também passa por transformações políticas e culturais, de sede
do povoado, aliás no início é o povoado em si, a largo da Matriz, após isso a Praça
da Matriz (nome mais disseminado entre os mogianos de hoje) e finalmente a Praça
Coronel Benedito de Almeida.
Figura 15 – Croquis de Mogi das Cruzes em 1650
44.
Fonte: COMPHAP.
Outro destaque histórico e importante na formação cultural prestada ao
espaço é a instalação da primeira escola de educação formal da cidade, como
44
A elipse em vermelho marca o local onde hoje se encontra a Praça Cel Benedito de Almeida.
A Praça: O contexto do objeto de estudo. 57
segue:
Apresenta no lado oposto à igreja a escola Coronel Almeida, construída em 1897; foi o primeiro grupo escolar de Mogi das Cruzes, inicialmente estudavam-se os quatro anos do curso primário, depois era preciso ir para a capital ou cidades do interior mais privilegiadas (HIJIOKA, 2007, p. 60).
22..44 FFoorrmmaass ffííssiiccaass,, ggeeoommééttrriiccaass,, eessttééttiiccaass
A observação do lugar, nas visitas de pesquisa do autor, apontam algumas
características físicas do ambiente que compõem, para além da visualização, a ideia
da praça quanto às suas significações culturais. A verificação in loco, da ambiência,
desperta a percepção, num percurso gerativo de sentido, para as edificações e a
composição das formas, descritas nos parágrafos seguintes.
A praça é rodeada, junto à Rua Dr Paulo Frontin por prédios de até quatro
andares, cerca de 10 metros de altura. Do outro lado da praça, à Rua José Bonifácio
a delimitação do espaço se dá pelas coberturas aos pontos de parada de ônibus. As
duas situações, os prédios da Paulo Frontin e os pontos de parada de ônibus,
geram, visualmente, um destaque maior às duas construções a “encarar-se”, a
Catedral Diocesana e o “Grupo Escolar Cel Benedito de Almeida”.
Figura 16 – Vista superior da Praça Coronel Bendito de Almeida. Fonte: Sítio Eletrônico “Google Earth”, acesso em 28/04/11 às 07h30.
A constituição arquitetônica da Praça Cel Benedito de Almeida ocorre de
modo a que um retângulo “vazio” esteja, à guisa de passarela, entre a Igreja Matriz
de Mogi das Cruzes e a Escola Estadual Coronel Almeida, este plano geométrico
A Praça: O contexto do objeto de estudo. 58
indica ao transeunte que este se desloca em um ambiente tranquilo e protegido.
Numa “ponta” da praça está a igreja e ao lado oposto uma escola, ambas
tradicionais e simbólicas ao peculiarizar este espaço público, ou seja, somente neste
lugar está a matriz de Mogi das Cruzes e da mesma forma em relação ao primeiro
“Grupo Escolar” da cidade.
A igreja marca a chegada do europeu “colonizador” ao local e a escola aponta
o desenvolvimento e o caráter autônomo do município. Desde o momento da
instalação de uma escola para educação formal, a cidade não mais envia seus
“filhos” a outros municípios a buscar qualificação.
A significação cultural da igreja e da escola está presente no entendimento e
na apreensão, pelos transeuntes, do espaço físico, que ao receber atenção e afeto
da comunidade passa à condição de “lugar”.
Como foi visto a partir dos processos históricos a gerarem mudanças na
destinação da Praça da Matriz em relação ao uso político e cultural, a visão cultural
que ser forma a respeito do espaço público também é viva, isto é, alterações
históricas, sociais e culturais provocam mudanças na apreensão deste espaço físico
público pela comunidade.
33.. OO QQUUEE AA PPRRAAÇÇAA,, EENNQQUUAANNTTOO TTEEXXTTOO VVIISSUUAALL,, ““DDIIZZ”” EE CCOOMMOO
EELLAA FFAAZZ PPAARRAA ““DDIIZZÊÊ--LLOO””
Figura 17 – Fotografia panorâmica da Praça Coronel Benedito de Almeida. Autor: Valter Padulla, 2011.
A fotografia constante na figura 17, feita pelo autor num dia de semana à
noite, é bem significativa no que diz respeito à tranquilidade das pessoas, pode ser
observado na figura 17 pessoas desenvolvendo normalmente suas atividades, o
presume, teoricamente, que a ordem pública está mantida. A presunção confirma-se
pelo testemunho do autor desta pesquisa, que ao realizar o registro visual vivenciou
momentos de tranquilidade pessoal e dos indivíduos ao redor.
As “traduções” do que se vê podem ser estruturadas em observar, analisar e
descrever um texto visual com o objetivo de compreender e estabelecer os
percursos gerativos de sentido, sendo que:
[...] o sentido45 pode ser estudado em uma teoria semiótica, que pretende descrever os processos de sua formação, ou seja, a significação. A semiótica proposta por Greimas concebe o sentido como um processo gerativo, em um percurso que vai do mais simples e abstrato ao mais complexo e concreto. Essa geração é formalizada no modelo teórico do percurso gerativo do sentido, [...] (PIETROFORTE, 2010, p. 12).
A citação de Pietroforte (2010) possibilita a aplicação da teoria semiótica
greimasiana a um espaço público (uma praça, por exemplo), no sentido de
compreender qual é o percurso gerativo de sentido (PGS) a partir da percepção,
pelo indivíduo que passa por uma praça. O PGS propicia o entendimento sobre
como se forma a concepção de um indivíduo, a partir da aparência visual de um
local, de que está num ambiente seguro ou não. As partes constituintes da imagem,
que primeiro é entendida como um todo e após visualizada parte a parte,
demonstram a situação de segurança pessoal neste espaço físico, a presença de
45
O sentido de um texto.
O que a praça, enquanto texto visual, “diz” e como ela faz para “dizê-lo” 60
um carrinho de pipoca (ao centro da figura 17) aponta que o local provê sossego ao
vendedor e compradores, visto que à noite é possível parar e comprar um saco de
pipocas. Acresce-se que além deste ponto de venda de pipocas, no dia em que foi
feita a fotografia, haviam mais três carrinhos-lanchonete, a vender sanduiches,
batatas fritas e outros quitutes.
Ainda outro ponto a garantir sossego, consoante se observa nas figuras 18 e
19, é a presença do Estado no local, de forma a demonstrar a garantia dos direitos
individuais das pessoas, especificamente a garantir comunicação ou mesmo
solicitação de auxílio aos serviços de emergência que o Estado disponibiliza (figura
18), e iluminação pública de qualidade (figura 19).
Figura 18 – Telefones públicos na Praça Coronel Benedito de Almeida Autora: Roberta Moretti da Silveira Padulla, 2011.
O telefone público em bom estado de conservação e em condições de uso
revela ausência de atos de desordeiros. Outra percepção que um telefone público
pode despertar é a de que o Estado mantém e conserva equipamentos de uso
público, o que possibilita o entendimento de que atenção é dedicada ao conforto do
munícipe, mais detalhe que comunica segurança ao transeunte que passa pela
praça.
O que a praça, enquanto texto visual, “diz” e como ela faz para “dizê-lo” 61
Figura 19 – Iluminação pública. Autora: Roberta Moretti da Silveira Padulla, 2011.
GREIMAS e COURTÉS (2008) afirmam que a imagem é uma unidade de
manifestação que existe e tem significação por si própria, possível de ser entendida
por via de análise, o que perfaz com que para a semiótica planar, a imagem seja,
sobretudo, um texto-ocorrência. Ainda em relação às “imagens” em destaque numa
imagem:
a semiótica planar considera a iconicidade um efeito da conotação veridictória, relativa a uma determinada cultura, que julga certos signos “mais reais” que outros, e que conduz, em certas condições, o produtor da imagem a se submeter às regras de uma construção de um “faz de conta” cultural (GREIMAS e COUTÉS, 2008, p. 254).
O texto indica que os processos históricos e, sobretudo, culturais, a que um
espaço esteja submetido determinam o entendimento e a significação das imagens
encontradas neste local, pelo fato de que a “leitura” deste texto visual ocorre de
modo individual e este “sujeito leitor” está conectado à sua comunidade, em seu
momento histórico e sua cultura.
O entendimento do cenário é afetado, no que simboliza, pelas condições
contextuais do momento histórico-cultural em que é “lido”, sendo que adquire
significações outras de acordo com o entendimento do indivíduo, isto é, havendo
diferenças culturais entre duas pessoas estas perceberão os textos visuais com
significações diferentes. Há destaque para o fato de que é o indivíduo, o “leitor” de
O que a praça, enquanto texto visual, “diz” e como ela faz para “dizê-lo” 62
um texto visual, e sua leitura também será individual e representará um produto que
passa por seu crivo e filtros individuais.
Tornando o conceito mais “visível” pode ser dito que uma vestimenta pode ser
simbólica e terá uma significação para um sul americano inserido na cultura
ocidental e possivelmente uma outra significação para uma pessoa que é
participante de uma outra cultura, com outros usos e costumes, uma burca46 por
exemplo.
Figura 20 – Muçulmanas, usando burcas, em Dubai. Fonte: Internet
47.
33..11 OO ddiissccuurrssoo ddee uumm eessppaaççoo ppúúbblliiccoo ((rreellaattiivvoo àà sseegguurraannççaa
ppeessssooaall))
Um espaço físico com forte aparato para segurança indica que há a
expectativa de que a violência e o crime é uma possibilidade concreta, talvez prestes
a ocorrer. Ao perceber sua localização num espaço físico com a mensagem
inequívoca de que há um preparo quanto à violência (muros altos, cercas
eletrificadas e grades, ou seja, símbolos que indicam defesa territorial), o transeunte
poderá assimilar a ideia de que está num lugar perigoso, e, portanto, corre riscos por
estar neste local. BURKE, sobre esse assunto, escreve que:
46
N.A.: Peça do vestuário feminino em uso no mundo islâmico que cobre totalmente o corpo da mulher, da cabeça aos pés, com uma única abertura na região dos olhos. 47
Imagem disponível em <<http://www.minasdehistoria.blog.br/2009/07/a-burca-o-isla-radical-e-a-republica-laica/>>, acesso em 10/05/2011 às 12h20.
O que a praça, enquanto texto visual, “diz” e como ela faz para “dizê-lo” 63
A violência e a expectativa dela deixaram muitos traços na paisagem urbana atual. Em Chicago, as fortalezas dos líderes dos muçulmanos negros chamam a atenção. Os morros cariocas também podem ser considerados como fortalezas, ou como no-go áreas48, como dizem em Belfast49, onde a polícia normalmente não ousa entrar. Os modernos condomínios de São Paulo, Nova York, Los Angeles e outras cidades, com sua segregação espacial, seus altos muros ou cercas e guardas de segurança na entrada – para não mencionar os cães e sistemas de alarme – são outro sinal da expectativa de violência (BURKE, 2002, 42).
Se por um lado uma “fortaleza” indica o cuidado em proteger-se também há
outra característica a comunicar insegurança a quem passa por um lugar público,
isto é, um espaço pode ser classificado, ou entendido, como inóspito quando a
interação com quem utiliza este espaço transmite a mensagem de “não-
acolhimento”. O “não-acolhimento” é materializado à percepção pelo descuido
estético, a indicar que a intenção de quem planeja, executa e conserva uma
determinada edificação (no caso deste trabalho um espaço público) não é a de
comunicar bem estar para as pessoas.
A ausência de zelo e o equipamento voltado à defesa (cerca eletrificada, por
exemplo) não comunicam mensagens de acolhimento, conforto e sensação de
segurança, mas sim de um ponto da cidade onde o “permanecer” deve ser o mais
breve possível e quando necessário. O aspecto visual, pelos exemplos e
argumentação apresentada, aponta um percurso gerativo de sentido percebido pelas
pessoas. A percepção de significados, motivado pela cultura do local e comungado
pelos usuários de um local público, provocará reações, sendo que a reação que
interessa a esta pesquisa é a relacionada ao decidir estar, ou não, em um
determinado espaço físico em vista da sensação de (in)segurança ali vivenciada.
Num texto visual onde atores50 realizam a performance51 de ir e vir é
estabelecida uma relação transeunte/espaço físico público, desde simplesmente
caminhar a assentar-se sob o céu para contemplar outras pessoas caminhando e
desenvolvendo outros fazeres. A ação “caminhar” é uma organização sintagmática52
48
N.A.: Locais onde a entrada é proibida, significando um ambiente controlado por grupos, conhecidos como “crime organizado”. 49
N.A.: Capital da Irlanda do Norte. 50
N.A.: Especificamente neste trabalho os atores são os pedestres que usam o espaço físico denominado Praça Coronel Benedito de Almeida. 51
N.A.: A performance aqui referida tem seu significado consoante a definição proposta por GREIMAS e COURTÉS (2008, p. 364-365), isto é, como estrutura modal do fazer (seja decisão quando situada na dimensão conginição, seja execução quando na dimensão pragmática). 52
Termo encontrado em GREIMAS e COURTÉS (2008, p. 18).
O que a praça, enquanto texto visual, “diz” e como ela faz para “dizê-lo” 64
de atos, uma sequência ordenada (marcada por etapas, isto é, a subseqüente
depende, para ocorrer, da predecessora). Esta atitude demanda vontade e decisão
da parte do ator pedestre, actancialmente entendido neste exemplo, e as “respostas”
e “diálogos” que o ambiente proporciona.
As ações do ambiente53 a provocar novas ações, entre sujeito e ambiente,
demarcam a narrativa “passagem pela praça”, pois quando da passagem é possível
ouvir sons, inteligíveis ou não, perceber odores, temperatura, consistência e cor que
o solo apresenta, dentre outras possibilidades. A narrativa contemplará todos os
fatores que compõem o caminho, metaforicamente expostos em outras narrativas,
como a conhecido conto infantil dos irmãos Grimm “Chapeuzinho Vermelho” – entra
o sujeito num local, passa por este local e após isso prossegue para atingir o
objetivo.
A relação performática (transeunte/espaço físico público) em estudo nesta
pesquisa é o uso da praça como local de trajeto, como passagem, ao caminhar de
um determinado ponto a outro ponto. Além de local de passagem o uso da praça
também revela traços de convívio e relações de afeto com o espaço, ao adquirir,
simbolicamente, características de uma personagem da cidade, ainda que
arquitetônica e inanimada. Esta parte da cidade é alvo da atenção, de emoções e
outras manifestações a humanizá-la e lhe hipotecar peculiaridades aprazíveis ou
não, adjetivando um espaço físico que é substantivo por natureza.
O autor entende a narrativa do lugar como o conjunto dos enunciados
aludidos nos parágrafos anteriores, ou ainda, o que o lugar transmite em se tratando
dos textos (verbais, visuais, gestuais e outros) encontrados numa praça pública. E é
este o discurso da praça, é o que a praça “diz” aos pedestres que por sua extensão
caminham.
Ao longo de sua utilização história o local hoje conhecido por Praça Coronel
Benedito de Almeida foi “traspassado” e, portanto, caracterizado por vários
discursos, vários conjuntos de mensagens sob um determinado tema. De forma
breve, e a grosso modo, podem ser citados os discursos colonial, o da catequese
dos habitantes primitivos da terra, o discurso do império brasileiro, da república, etc.
53
Por ações do ambiente o autor está a designar as condições físicas e geométricas da praça como “atitudes” deste espaço físico a provocar ações do transeunte, ou seja, quando o transeunte se depara com um obstáculo físico, uma árvore por exemplo, está diante de uma “ação” da praça e esta ação provoca uma nova ação do transeunte, mudança de trajetória. O mesmo se aplica a outros “obstáculos”, quais sejam, pessoas conversando, carrinhos de pipoca, etc.
O que a praça, enquanto texto visual, “diz” e como ela faz para “dizê-lo” 65
O próprio nome atual da praça é um discurso, visto que faz alusão ao Coronel
Benedito de Almeida54, um político que atuou decisivamente na cidade nas últimas
décadas do século XIX e nas duas primeiras décadas do século XX. São estes
conjuntos de mensagens que determinam, pelo entendimento cultural dos indivíduos
da comunidade que habita e caminha pelas ruas do centro da cidade, a forma de
conviver com a praça.
A estrutura narrativa do discurso em estudo neste trabalho se atém ao
pedestre em seu percurso pela praça, o sujeito é o transeunte e o objeto de valor é a
transposição, caminhando, de um ponto a outro. Prados descortina esta estrutura da
seguinte forma:
A análise das estruturas narrativas, segundo a metodologia greimasiana, tem como núcleo central o conceito de actante, obtido no cruzamento entre a análise morfológica de Propp e os actantes sintáxicos de Tésnière, que é uma relação estrutural, a de dependência e funções, e permitem construir a sintaxe narrativa a partir de três pares de categorias actanciais, como já visto: as relações entre Sujeito e o Objeto, no percurso da ação; entre o Destinador e o Destinatário – no percurso da manipulação; e a relação entre o Adjuvante e o Oponente, também no percurso da ação (PRADOS, 2008, p. 69).
Ao adotar o objeto de valor como sendo a transposição a pé de um ponto a
outro ponto da praça, cumpre destacar os pontos possíveis de execução deste
percurso. A concepção arquitetônica demonstra a preocupação com esta questão do
uso do bem público. A planta de implantação da praça indica o cuidado com o ir e
vir, como se observa na figura 21.
Figura 21 – Detalhe da Planta Arquitetônica da Praça Cel Benedito de Almeira. Fonte: Sec. Mun. de Planejamento e Urbanismo – Prefeitura de Mogi das Cruzes.
54
Nesta dissertação há a jundada de uma biografia do Cel Benedito de Almeida (Anexo “A”, página
91).
O que a praça, enquanto texto visual, “diz” e como ela faz para “dizê-lo” 66
Pelo desenho é perceptível que todas as rotas são delineadas por linhas
retas, sem obstáculos, e rampas de acesso a possibilitar o uso da praça por pessoas
com dificuldades físicas.
A figura 21 ainda indica, geograficamente, os pontos possíveis ao
caminhante, quais sejam, de uma rua a outra (daquelas que compõem o entorno da
praça), e os pontos determinados pelos objetivos, que também simbolizam aspectos
culturais e sociais da comunidade de Mogi das Cruzes, a saber, a Igreja Matriz (a
tradição, a religiosidade, moral e os bons costumes), a escola (a educação formal),
os pontos de parada de ônibus e de taxi (provimento ao cidadão de transporte
público, ou seja, meios de locomoção), o comércio e a banca de jornais. Alguns
outros objetivos não foram citados em decorrência do foco principal desta pesquisa,
assim não se analisa os bancos da praça e nem o ajuntamento de pessoas (também
um objetivo possível ao caminhante) para a tradicional “feira do rolo55” que ocorre
todos os dias.
Para além das informações superficiais transmitidas pelo desenho da planta
arquitetônica da praça uma forma de materializar graficamente as relações lógicas
fundamentais de uma categoria semântica dada (SOUZA, 2006, p. 59) é a
encontrada no Quadrado Semiótico56, proposto pelo pesquisador Algirdas Julien
Greimas para estabelecer graficamente as redes de relações básicas que geram o
sentido de um texto.
O conceito exposto em GREIMAS e COURTÉS (2008) é que o quadrado
semiótico sistematiza graficamente que não é possível o encontro simultâneo de
dois termos categoriais contrários. A vida é um termo categorial contrário à morte,
logo os dois não podem se apresentar juntos. A partir da relação “vida ↔ morte” há a
complementaridade na relação “vida → não morte” e “morte → não vida”. Este
conceito é denominado PRIMEIRA GERAÇÃO DE TERMOS CATEGORIAIS.
Há uma SEGUNDA GERAÇÃO DE TERMOS CATEGORIAIS, estabelecida
pelos metatermos contraditórios e os metatermos contrários. O metatermo
contrário apresenta a relação lógica entre eixo dos contrários, isto é, para a uma
dada relação “ser ↔ parecer” será estabelecido o metatermo verdade e para a
55
Encontro de pessoas que fazem trocas e comércio envolvendo objetos de pequeno valor, uma atividade remanescente ao antigo mercado municipal que havia na local até a construção do Grupo Escolar (final do século XIX). 56
Foi utilizado o Quadrado Semiótico de acordo com o conceito da SEGUNDA GERAÇÃO DOS TERMOS CATEGORIAIS (GREIMAS e COURTÉS, 2008, p. 403).
O que a praça, enquanto texto visual, “diz” e como ela faz para “dizê-lo” 67
relação “não-parecer ↔ ser” há o metatermo segredo.
Ao analisar a percepção vivenciada pelo transeunte, por via do Modelo de
análise da estrutura profunda do texto, as categorias fundamentais, expondo,
graficamente, a axiologia que envolve a busca do objeto de valor (caminhar pela
praça com tranquilidade) pelo ator Transeunte, foi elaborado a octógono semiótico57
a seguir:
Figura 22 – Representação gráfica das relações entre Sensação de Segurança e
Semiótica.
Os objetos de valor básicos registrados no octógono (figura 22) refletem,
consoante intenção do autor, a experiência de um pedestre que transita por uma
praça pública, em primeiro lugar há a contrariedade entre os termos
“tranquilidade/intranquilidade”, referentes às possibilidades dos textos visuais, e o
que comunicam, durante a passagem pela praça. Outra relação de contrariedade é
estabelecida nos sub-termos “não risco/risco”, referentes à percepção (pelo
gestual, por exemplo) quanto à iminência de situações de violência.
A partir da relação de contrariedade é gerada uma relação de contradição
“tranquilidade/risco” relativa a que um texto visual a comunicar que o ambiente é
seguro é sucedido por outro texto visual que indique a possibilidade de que algum
tipo de violência ocorra, outra relação contraditória é encontrada nos termos
“intranquilidade/não risco”, ao estar em um local onde se sinta desconfortável o
transeunte observa, em outro texto visual, que uma determinada situação talvez não
resulte em alguma ação que lhe seja danosa.
As relações têm como metatermos contrários “segurança/medo”, que
57
N.A.: Outra designação para o Quadrado Semiótico – segunda geração dos termos categoriais.
O que a praça, enquanto texto visual, “diz” e como ela faz para “dizê-lo” 68
remetem aos termos58 “vida/morte” quando se observa que a segurança está ligada
à preservação da vida e o medo diz respeito ao risco de morte. A decorrência da
relação entre segurança e medo são os metatermos contraditórios “controle do
ambiente/expectativa de perigo”.
O octógono demonstra que há o valor principal segurança que é entendido
com mais veemência a partir da vivência do medo a indicar um “espaço físico” onde
nenhum transeunte quer estar, a inviabilizar o espaço público ao transformá-lo,
potencialmente, em espaço de uso privativo de criminosos. A segurança é traduzida
e experimentada pelo sentimento de que há o controle do ambiente vivenciada
pelo indivíduo que sabe o que está a ocorrer na praça no momento em que caminha
por ela, sem possibilidade, segundo seu julgamento, de ser surpreendido por alguma
situação que comunique periculosidade.
Quando há falta de percepção visual sobre como é, física e geometricamente,
o trajeto e do que pode ocorrer no ambiente no momento do caminhar, o cidadão
vivencia a expectativa do perigo, há o entendimento de que algo ruim (ação
criminosa), nocivo, pode acontecer.
33..22 AAnnáálliissee ee ddeessccrriiççããoo sseemmiióóttiiccaass ddee eelleemmeennttooss ccoonnssttiittuuttiivvooss
ddaa pprraaççaa,, aa ppaarrttiirr ddee uummaa ffoottooggrraaffiiaa ddoo aauuttoorr
A enunciação, a partir do pós-estruturalismo, é vista como um processo mental e só pode ser estudada através das marcas que deixa no enunciado – o discurso, como processo e o texto, como produto (PRADOS, 2008, p. 72).
Por seus elementos constitutivos (ao observar as árvores e o obelisco) a
praça em questão apresenta a contraposição e, paradoxalmente, a simbiose entre a
natureza e a cultura. O obelisco atrai o olhar contemplativo e o culto à história,
especificamente o histórico da presença humana (bandeirantes e colonizadores)
“vencendo” a natureza e seus primeiros habitantes59.
A cultura se estabelece no espaço e a natureza, por seu turno, também revela
sua tenacidade e o prazer dos indivíduos em tê-la por perto. Estas características,
possibilidades, de entendimento de um texto visual são norteadas, segundo
58
N.A.: Termos mais adequados em razão da articulação do universo semântico como o universo individual do pedestre. 59
Pesquisa junto ao COMPHAP resultou na informação de que em 1601 já não há mais a presença de índios em tribos organizadas pela região.
O que a praça, enquanto texto visual, “diz” e como ela faz para “dizê-lo” 69
PIETROFORTE (2010), da seguinte forma:
No processo de geração de sentido, a semiótica define um nível fundamental do qual se pode partir para a formalização de seu estrato mais geral e abstrato. O sentido é definido pela semiótica como uma rede de relações, o que quer dizer que os elementos do conteúdo só adquirem sentido por meio das relações estabelecidas entre eles (PIETROFORTE, 2010, p. 12 e 13).
Neste trabalho um dos componentes da observação, que compõem a
descrição e a análise posteriormente, é o fato de que o autor é profissional de
segurança pública, trabalha há 28 anos com questões pertinentes ao bem estar da
comunidade. Além do fator citado há, na bagagem de experiência profissional do
pesquisador, conceitos e noções adquiridas na análise de projetos, e a vistoria da
execução de projetos de prevenção e combate a incêndios60.
A atividade profissional de bombeiro trouxe condições de atentar a uma
edificação, ou espaço físico, com um olhar voltado a contemplar o exercício de
atividades, nestes locais, pelas pessoas e em quais condições de segurança estas
atividades seriam realizadas. Ainda soma-se às características anteriores a
formação do autor em Engenharia Civil, a contribuir com o aperfeiçoamento do olhar
para as questões que importam ao uso confortável, seguro e útil de edificações.
A narrativa está presente, num texto visual, em dois momentos, conforme
preceitua PIETROFORTE (2010), o momento do conteúdo e o momento da
expressão, em primeiro lugar a Semiótica está atenta ao plano de conteúdo, às
significações de um discurso. Todavia o meio pelo qual a mensagem é transmitida,
plano de expressão, também pode estar presente na rede de relações a ser
analisado semioticamente, como segue:
Em muitos textos o plano da expressão funciona apenas para a veiculação do conteúdo, como na conversação, por exemplo. No entanto, em muitos outros, ele passa a “fazer sentido”. Quando isso acontece, uma forma da expressão é articulada com uma forma do conteúdo, e essa relação é chamada semi-simbólica. Uma pintura em que o conteúdo é articulada de acordo com a categoria semântica vida vs. morte, por exemplo, pode ter sua expressão formada de acordo com uma categoria plástica luz vs. sombra, de modo que a sombra refira-se à morte e a luz, à vida (PIETROFORTE, 2010, p.21).
60
O autor trabalhou como Oficial do Corpo de Bombeiros de 1988 a 2002, sendo que fazia parte de suas atribuições a análise e vistoria de edificações com vistas à segurança contra incêndios destes locais.
O que a praça, enquanto texto visual, “diz” e como ela faz para “dizê-lo” 70
33..33 UUmmaa pprrooppoossttaa ddee aannáálliissee sseemmii--ssiimmbbóólliiccaa ddee ffoottooggrraaffiiaa ddaa
PPrraaççaa CCoorroonneell BBeenneeddiittoo ddee AAllmmeeiiddaa
Figura 23 – Destaque para o Obelisco cercado por árvores. Autora: Roberta Moretti da Silveira Padulla, 2011.
Ao definir a significação como seu objeto de estudos, a semiótica desenvolve uma tecnologia de análise de texto que contribui bastante para responder à conhecida questão a respeito do que um texto quer dizer, ou seja, o que ele significa. Ao lado dessa questão, a semiótica responde também como ele diz aquilo que diz. A semiótica plástica e a teoria dos sistemas semi-simbólicos, portanto, são parte dessa tecnologia, permitindo estudar o plano da expressão e suas relações com o plano de conteúdo (PIETROFORTE, 2010, p. 66).
A consequência gerada pela observação das situações na praça em estudo é
a descrição semiótica da fotografia. A descrição proposta neste trabalho, como dito
anteriormente, ocorre não somente pelo texto visual (plano de expressão, fotografia),
mas, fundamentalmente, pelos olhos que observam e traduzem (plano de conteúdo)
em palavras o que se vê na fotografia. Narrar o que se vê no texto registrado na
figura 23, sob a ótica da semiótica greimasiana e o estudo do semi-simbolismo,
importa em narrar e traduzir o que é encontrado no plano de expressão (na
fotografia), ou seja, o que a foto mostra.
A descrição analítica o contexto é muito importante, todavia só é possível, ao
se referir ao percurso gerativo de sentido, ao narrar a partir da visita ao espaço
físico, no dizer de PIETROFORTE (2010) este argumento é exposto da seguinte
O que a praça, enquanto texto visual, “diz” e como ela faz para “dizê-lo” 71
forma:
Fotografado, o texto arquitetônico é traduzido de uma semiótica do volume para uma semiótica do plano, de modo que a sensação espacial que ele nos oferece fica totalmente desfigurada. Um texto de arquitetura deve ser visitado para ser sentido, por isso, seu leitor deve estar dentro dele (PIETROFORTE, 2010, p. 131).
Ao posicionar-se junto à grade da Escola Estadual Coronel Almeida sentido
Catedral, com toda extensão da praça à frente, a câmera fotográfica captou a
imagem reproduzida na figura 23.
O trabalho intelectual de dizer o que se encontra na fotografia não é realizado
aleatoriamente e sem rigor científico, mas sim de acordo com os parâmetros
propostos pela Semiótica greimasiana, aliada à contribuição das pesquisas e
teorização de Jean-Marie Floch.
O quadro real61, representado pela figura 23, traz como primeira impressão a
procura do olhar pelo local mais iluminado (as formas semicirculares dos arcos
presentes na matriz), que na figura 23 estão centralizadas. Após isso, reconhecendo
o local circularmente, então a atenção se volta às árvores, ao obelisco, às pessoas,
às atitudes das pessoas. Quanto às atitudes há um destaque especial ao gestual, a
expressão corporal dos indivíduos indica tranquilidade, o caminhar, o estar próximo
a outrem; não há nenhum atitude agressiva, ou que possa assim ser entendida,
sobretudo ao observar os braços e seus movimentos, dado relevante ao analisar
atitudes humanas em relação à violência e à prática criminal.
O plano de expressão “figura 23” traz como termos básicos ensolarado versus
ensombrado, esta contraposição traduz por si própria, significações a partir do
momento registrado, isto é, as pessoas estão agasalhadas e nenhuma pessoa está
sob as sombras, há aqui um indicativo de as sombras se traduzirem, por óbvio, em
ausência da luz solar, mais uma característica visual que é encontrada na imagem,
qual seja, a maior parte dos indivíduos estão usando agasalhos, outro aspecto,
desta vez informando que a temperatura do ambiente está abaixo daquela que
possibilitaria o uso de roupas mais leves.
O semi-simbolismo está presente no alinhamento dos bancos aos canteiros e
a limpeza da via por onde as pessoas passam transmitindo harmonia, por conta do
simbolismo presente no alinhamento geométrico.
61
Vivenciado pelo autor ao estar no local e realizar a fotografia.
O que a praça, enquanto texto visual, “diz” e como ela faz para “dizê-lo” 72
A ausência de lixo acumulado ou de equipamentos danificados (o canteiro do
jardim ou os bancos) identifica o local como recebedor de cuidados (atenção) da
parte do poder público municipal. O tratamento dispensado ao local é recebido pelo
usuário do espaço como sendo a ele, visto que se há conservação esta é destinada
às pessoas que usam o lugar e não ao lugar em si.
As formas circulares das copas das árvores, as formas semicirculares dos
arcos de entrada da Catedral, as mesmas formas semicirculares observadas nas
coberturas alinhadas dos pontos de parada de ônibus convidam o pedestre a “estar”
no local, indicando acolhimento. Novamente há uma indicação que o local é bem
cuidado não como um fim em si mesmo mas para que as pessoas se sintam bem ao
estar na praça.
O gestual das pessoas, o céu azul por trás das torres da igreja também são
acolhedores e tranquilizadores. O obelisco feito de pedras, a igreja feita de “pedras”
e o chão com pavimento de pedras trazem à mente o sentido de perenidade, que
por sua vez evoca a segurança, visto que a durabilidade também pode ser traduzida
por segurança.
O conjunto Praça Coronel Benedito de Almeida é um convite ao estar e a sua
utilização é democrática, um projeto arquitetônico estudado cientificamente e
realizado com primor, alie-se estes fatores à presença da Catedral, marco fundador
da cidade, ao “Grupo Escolar” centenário e descortina-se ao pedestre um espaço
público que transmite sensação de segurança, sem que para tal tenha que ter
sempre por perto um policial militar, ou seja, o ambiente, neste caso, é o fator a
garantir segurança ao munícipe.
33..44 CCaammiinnhhaannddoo ppeellaa pprraaççaa
¿Por qué se puede abordar el trayecto como si se tratara de un texto susceptible, por tanto, de un análisis semiótico? En primer lugar, porque el trayecto, al igual que cualquier otro tipo de texto, posee un final que lo individualiza en cuanto totalidad relativamente autônoma y hace posible que su organización se estructure. Todo trayecto realizado por un viajero posee un final: una salida que implica simétricamente una entrada. Otra razón: al igual que un texto, el trayecto puede ser objeto de una segmentación, es decir, de una división en un número limitado de unidades, de etapas, de
O que a praça, enquanto texto visual, “diz” e como ela faz para “dizê-lo” 73
“momentos” que se relacionan entre ellos según ciertas reglas62 (FLOCH, 1991, p. 39).
FLOCH (1991) trata do tema “trajeto” ao discorrer sobre o uso do Metrô de
Paris e a forma de abordar o assunto é pertinente a esta pesquisa, no sentido de
que o caminhar dos usuários do Metrô é o mesmo caminhar dos pedestres na praça
em estudo. O trajeto por etapas tendo um objetivo, transpor a pé a praça, é o mesmo
também, o que possibilita aplicar a teoria enunciada por Jean-Marie Floch, neste
trabalho.
O autor deste trabalho exercitou o caminhar pela Praça Coronel Benedito de
Almeida às 21h30 do dia 05/05/11 (quinta-feira). O dia foi escolhido por ser um dia
“de semana” onde há expectativa de maior movimento e à noite pelo fator de que à
noite há a presunção de maior insegurança pelos transeuntes. As condições da
praça, em tese, pela experiência profissional do pesquisador não deveriam transmitir
um sentimento de segurança, todavia a visita ao local revelou um ambiente familiar e
acolhedor, propícios ao passeio e mesmo à permanência (ainda que este não seja o
foco de estudo deste trabalho merece ser registrado).
A “vida noturna” da praça numa quinta-feira é multifacetária quanto à
movimentação e atividades desenvolvidas pelos usuários, havia pessoas em vários
fazeres, garotos “passando” trote por telefone, comércio de pipoca pronta em
saquinhos, venda de sanduiches, rapazes treinando artes marciais e, foco de estudo
desta pesquisa, transeuntes caminhando pela praça.
A passagem pelo local expõe o indivíduo a odores, cores e sons. O conjunto
arquitetura-pessoas-transporte público transparece harmonia e o gestual, como dito
anteriormente sobre a figura 23, inspira paz.
Com o objetivo de ilustrar visualmente os cenários que se apresentam ao
pedestre durante sua passagem pela foi realizado o exercício de caminhada por um
trajeto específico, o qual foi pensado para que o pesquisador percorresse a praça de
ponta a ponta. O percurso foi eleito para que fosse atingida a maior distância
62
N.A.: Porque é possível tratar um trajeto como um texto suscetível de análise semiótica? Em primeiro lugar, porque o trajeto, como ocorre em qualquer outro texto, é realizado com vista a alcançar um objetivo, o que o caracteriza como único num percurso relativamente autônomo e torna possível, portanto, entendê-lo e estruturá-lo como um processo. Todo trajeto percorrido por um transeunte tem um destino, ou seja, um início e fim. Também é possível entender o trajeto como um texto analisável semioticamente pois pode ser segmentado em suas partes integrantes, isto é, pode ser dividido num número limitado de unidades (descrito de um ponto a outro ponto), de etapas, de “momentos” interrelacionados que obedecem certas regras.
O que a praça, enquanto texto visual, “diz” e como ela faz para “dizê-lo” 74
possível dentro da praça, com o fito de obter a maior diversidade de textos visuais.
O ponto inicial é localizado defronte o número 261 da Rua Doutor Paulo
Frontin e o ponto final a faixa de passagem de pedestres à frente do número 302 da
Rua José Bonifácio, a ligação entre os dois pontos é uma reta diagonalmente
posicionada no retângulo que forma o centro da praça. A figura 24 ilustra o caminho
realizado, como se vê a seguir:
Figura 24 – Vista superior da Praça Coronel Benedito de Almeida com linha vermelha a apontar direção do trajeto pela praça. Fonte: Google Earth.
A linha, na figura 24, aponta o trajeto escolhido, o qual está segmentado em 7
etapas, cada trecho é marcado pela mudança de cenário visual, ou seja, cada novo
“quadro visual” foi tido como uma meta menor para atingir o objetivo maior de passar
por toda praça.
A praça, no que se refere ao visual percebido pelo transeunte, é marcada,
positivamente, pela iluminação, destaca-se também o fato de que as árvores e
arbustos na praça não impedem a visualização, ao caminhar pela praça. Outra
ênfase verificável do projeto arquitetônico de implantação da praça é a liberdade de
movimento63 e amplitude espacial, ou seja, acessibilidade e flexibilidade para
caminhar.
Não existem pontos inacessíveis aos olhos, o que se traduz em segurança,
pois quem usa a praça pode visualizar o espaço cabalmente e assim estar tranquilo.
A tranquilidade é estabelecida pela sensação de que não haverá nenhum ataque de
surpresa. O ambiente, sobretudo um ambiente público, pode conter armadilhas ao
transeunte, locais com características que propiciem situações favoráveis ao
63
N.A.: Não existem obstáculos a impedir deslocamentos em qualquer direção.
O que a praça, enquanto texto visual, “diz” e como ela faz para “dizê-lo” 75
criminoso, pontos de esconderijo onde seja possível abordar a vítima
surpreendendo-a e, assim, minimizando possibilidades de fuga ou resistência.
As figuras a seguir (25 a 31) dividem o caminho em destaque na figura 24
dividindo-o visualmente em sete etapas. O registro é um testemunho eloquente da
experiência do pesquisador, que poderia ser a de qualquer pedestre, ao passar pela
praça:
Figura 25 – Primeira etapa da caminhada, acesso à praça. Autor: Valter Padulla, 2011.
O início do trajeto atravessando o espaço físico “praça” é alentador, no que se
refere à tranquilidade, visto que a iluminação e a disposição arquitetônica dos
canteiros, do obelisco e dos abrigos dos pontos de parada de ônibus não impedem a
visualização do transeunte, há controle do ambiente, no sentido de que qualquer
movimentação ou situação que signifiquem ameaça física, ou ao patrimônio do
pedestre, podem ser prevenidas e evitadas.
Figura 26 – Segunda etapa da caminhada, acesso ao interior
da praça. Autor: Valter Padulla, 2011.
O que a praça, enquanto texto visual, “diz” e como ela faz para “dizê-lo” 76
Ao adentrar o espaço demarcado como Praça Coronel Benedito de Almeida o
indivíduo continua percebendo visualmente todo o trajeto que será percorrido até o
ponto final de seu caminho. O gestual de outros usuários da praça não se traduz em
ameaças e o comércio (carrinho de pipoca) e a atitude de pessoas a permanecer
pelo local, indicam que o local não oferece riscos e insegurança.
Destaque-se que pela praça não há indicação de que o Estado, por via de
seus agentes (policiais), esteja atuando no sentido de prover a população de meios
de proteção, todavia age passivamente com o mesmo resultado. A “proteção
passiva” do Estado é verificada, quanto à segurança pública, ao se observar que o
local é sossegado, que abriga vendedores de pipoca e pessoas aguardando o
transporte coletivo em abrigos, em situação confortável (limpeza pública e
iluminação, por exemplo). É paradoxal observar que a presença de policiais militares
neste local ensejaria preocupação por parte dos transeuntes e usuários da praça,
visto que o lugar é pacífico sem a intervenção policial, ou seja, a presença destes
significaria que há algum tipo de situação emergencial, potencialmente perigosa, o
que reforça o entendimento de que segurança pública é um tema com abrangência
muito maior que simplesmente prover as cidades com mais viaturas e equipes
policiais.
Figura 27 – Terceira etapa da caminhada, rumo ao obelisco. Autor: Valter Padulla, 2011.
O interior da praça continua a revelar seus aspectos a remeter o transeunte a
um clima bucólico, ainda que instalada no coração de Mogi das Cruzes. As pessoas
O que a praça, enquanto texto visual, “diz” e como ela faz para “dizê-lo” 77
em sua gestualidade e atitudes não ofensivas, ou não agressivas, representam ao
pedestre que o ambiente está tranquilo.
Figura 28 – Quarta etapa, chegada ao obelisco. Autor: Valter Padulla, 2011.
Figura 29 – Quinta etapa, rumo aos abrigos dos pontos de parada de ônibus. Autor: Valter Padulla, 2011.
Outro fator de destaque e relevância quanto à percepção da ausência de
riscos é a presença de grupos de pessoas, a caracterizar uma família, utilizando o
espaço público, há um reforço no efeito de que o lugar é seguro.
O que a praça, enquanto texto visual, “diz” e como ela faz para “dizê-lo” 78
Figura 30 – Sexta etapa, visualizando a faixa de pedestres. Autor: Valter Padulla, 2011.
Ao visualizar o final do percurso o pedestre, pelas pessoas junto à igreja e
pelo comércio de sanduiches, entende, ainda que inconscientemente, que o local
não propicia condições para ação de criminosos sem que os malfeitores sejam
descobertos em suas atitudes e, sobretudo, sem que se possa solicitar auxílio a
outras pessoas.
Figura 31 – Sétima etapa, saindo da praça. Autor: Valter Padulla, 2011.
Ao atravessar a praça, e sair de seus limites físicos, o pedestre caminha com
tranquilidade e pacificamente pela espaço público. Durante o trajeto não houve
nenhum texto visual cujo conteúdo de significação fosse o perigo à incolumidade
O que a praça, enquanto texto visual, “diz” e como ela faz para “dizê-lo” 79
física do transeunte. Todos os símbolos observados nas figuras 25 a 31 comunicam
paz e segurança.
Aplicam-se às percepções do autor desta dissertação, ao caminhar pela
praça, as palavras de SALLES (2007) ao afirmar que:
Existem lugares movimentados e seguros, outros, abandonados e evitados. Nestes, não se evidencia o sentimento de estar seguro, pois a sensação de segurança está intensamente ligada à vitalidade que o lugar possui. Havendo trocas, encontros e conversas, a qualquer horário, os ambientes terão múltiplos usos, serão apropriados pela comunidade e terão sustentabilidade econômica e social (SALLES, 2007, p. 39).
CCOONNSSIIDDEERRAAÇÇÕÕEESS FFIINNAAIISS
Figura 32 – Placa de sinalização de trânsito. Autor: Valter Padulla, 2011.
No Brasil a presença de praças e largos vem de longa data, remontando aos primeiros séculos da colonização. Sobre esses espaços recaíam as atenções principais dos administradores, pois constituíam pontos de atenção e focalização urbanística, localizando-se ao redor da arquitetura de maior apuro, já que pontos de concentração da população (REIS FILHO, 1968 apud LOBODA; DE ANGELIS, 2005, p. 5).
Vendo uma fotografia, que se apresenta como um plano de expressão,
possibilitado está o “transporte” do observador ao momento em que a imagem foi
captada. O instante do registro desperta percepções, sentidos e a consciência para
várias dimensões. Nas dimensões largura e altura há a percepção da geografia do
local, comparações de tamanho a partir de referenciais conhecidos (pessoas,
objetos, veículos). Percorrendo o texto visual com os olhos também nota-se a
profundidade, ainda relativa à geografia, ao espaço.
O espaço transforma-se em lugar, ao ser particularizado, quando a atenção
se volta a duas outras dimensões que a fotografia registra e expõe, quais sejam, o
tempo, no sentido cronológico do termo (dia, noite, entardecer) e as condições
climáticas (ensolarado, chuvoso, nublado, escuro).
A simples passagem a pé por uma via pública, por mais casual que possa
parecer, é pontuada por informações históricas, culturais e comportamentais, que
Considerações Finais 81
influenciam este ato corriqueiro do cotidiano de milhares de habitantes de Mogi das
Cruzes. O contexto de uma praça acompanha o caminhar do pedestre como
coadjuvante no trajeto, lado a lado seguem seus caminhos, o contexto e o indivíduo,
ao transitar por este espaço público.
A intercorrência do caminhar pela praça e os interesses científicos da
Semiótica transparecem no fato de que um aspecto tão importante ao cotidiano dos
seres humanos, sobretudo ao considerar que 81% da população brasileira mora em
cidades64, é um fato que gera, pratica e consome cultura. A cultura é o recorte por
onde é encontrada a Semiótica, visto que para que ocorra a geração de sentido65
faz-se necessário a submissão às regras culturais do local, ou ainda ao “faz de
conta” cultural (PAIS, 2007, p.150).
Quanto aos aspectos culturais e de leitura de textos visuais a teoria semiótica
elucida a relação de significados, evocados e transmitidos pelas imagens captadas
pelos olhos dos pedestres. A conceptualização de como ocorre e como emerge a
compreensão de textos visuais é encontrada nos estudos semióticos, que servem de
base a este trabalho, principalmente ao considerar que as sensações que um texto
visual desperta são de grande relevância à qualidade de vida dos cidadãos.
Os valores que emergem como consequência do contato de indivíduos com o
ambiente, mais especificamente com as significações subjacentes a um texto visual,
correspondem às vivências, aos ensinamentos, à cultura do sujeito, remetendo à
formação desta pessoa. Esta axiologia pode ser encontrada em aspectos
arquitetônicos de um espaço público, consoante explica MELLO (2007, p. 15). As
formas, as dimensões e a denominação, para citar alguns aspectos, emitem e
confirmam a existência de valores de uma comunidade, o que é reforçado pelo fato
de que o entendimento cabal destas mensagens ocorre dentro da sociedade que
produz e consome seus valores culturais.
No que se refere à segurança pública destaca-se que da formação da cultura
emerge um imaginário coletivo, compartilhado pelos indivíduos partícipes desta
cultura, na identificação informal de “agressores da sociedade” ou mesmo de locais
considerados perigosos, o que ocorre por via do entendimento cultural de que um
64
Fonte: IBGE, Censo demográfico de 2000. Texto disponível em <<http://sintese.ibge.gov.br/ brasil_em_sintese/>>, acesso em 18/05/11 às 22h00. 65
O objetivo da Semiótica é estudar e compreender fenômenos provenientes de uma produção de significados e de sentidos. (LUBACHEVSKI E SAHAR, 2005, p.3)
Considerações Finais 82
local com determinadas características ambientais é perigoso.
O dinamismo, característico de processos culturais contemporâneos, também
é demarcatório para a segurança pública, pois as informações mais recentes
formarão uma espécie de consenso coletivo sobre a garantia de segurança em
determinado local. SALES (2007) ajusta o tema segurança pública à cultura,
ambiente e convivência ao afirmar que:
Sem hesitação, a história afirma que o homem optou pela vida na cidade, pelas facilidades e segurança que ela oferecia, em oposição ao meio rural distante e inseguro. No entanto, o que há hoje são questões conflituosas, certamente inesgotáveis e ao mesmo tempo instigantes, provocando gestores públicos, academia e cidadãos (SALLES, 2007, p. 110).
Ao nível narrativo o caminhar pela praça apresenta a simplicidade de uma
decisão, pelo pedestre, de atravessar a praça a pé, saindo de um ponto dirigindo-se
a outro ponto. Uma história repetida muitas vezes e cotidianamente.
Quanto ao nível discursivo o ator pedestre interage com o ambiente em
conjunção com seu objetivo de andar pela praça. Não é interesse deste trabalho
analisar a motivação do indivíduo para que percorra o espaço físico, mas sim a
caracterização da atitude pelo poder-fazer, ou seja, toma a decisão e é competente
para executá-la. As peculiaridades apresentadas no texto visual são nuances
existentes no percurso do pedestre que tornam o caminho mais significativo e a
história mais rica em detalhes. Um mendigo a pedir donativos, os odores da padaria
situada junto à praça, os ônibus chegando e saindo, os motoristas de taxi
aguardando passageiros, dentre outros detalhes que compõem o texto visual e
dotam a narrativa de mais dados e informações.
O nível fundamental, ou semântica profunda, serve de alicerce à narrativa e o
discurso, ou seja, torna plausíveis e com sentido o que é explicitado nos níveis mais
superficiais da análise semiótica. A camada de significação mais profunda revela,
neste trabalho de pesquisa, quais são os valores que “atingem” o pedestre ao
caminhar pela Praça Coronel Benedito de Almeida, a definir o espaço, em estudo
nesta pesquisa, como signo semiótico.
A conceptualização do que representa o lugar chamado Praça Coronel
Benedito de Almeida emerge da vivência da pessoa, no sentido de ser a vivência um
momento temporal a que se é submetido e “bombardeado” por definições, conceitos
e, sobretudo, valores adotados e aceitos como direcionadores do que é verdadeiro e
Considerações Finais 83
correto. Essa situação propicia que o espaço passe à condição de lugar (espaço que
é objeto e objetivo de afeto) e como tal adquire a condição de signo semiótico, visto
que este status altera a percepção da praça em, pelo menos, duas formas, quais
sejam, a praça é única pois assim é conhecida, identificada e vivencia e também é
única em virtude de que a apreensão do lugar66 é individual, cada usuário da praça a
terá à sua maneira.
Na composição da consciência do lugar ainda há outras duas dimensões que
contribuem para a construção da imagem e estas ocorrem pela observação das
relações sociais (pessoa-pessoa) e das relações pessoa-ambiente. No
relacionamento pessoa-ambiente se tem a consciência mais vívida, e, portanto,
produtora de sentido, deste lugar enquanto espaço de convivência e de existência
cidadã.
A fotografia revela se as pessoas estão assentadas confortavelmente, ou
seja, se há oferta de assentos, e sob quais condições de uso, aos usuários da praça.
Outro componente a transmitir tranquilidade é a disposição de pessoas em
contemplar a arquitetura do lugar, no caso em estudo temos a Igreja Matriz de Mogi
das Cruzes, o Obelisco comemorativo-histórico da cidade, os jardins, os abrigos dos
pontos de transporte coletivo, dentre outros marcos arquitetônicos.
Um conceito a ser destacado é o de que há transitoriedade na visão que se
tem, culturalmente, sobre a segurança pessoal numa praça pública. As informações
tendem a transformar os significados adotados culturalmente por um grupo social,
num processo semiótico de significação a ocorrer por via de dados e informações
mais recentes, gerando modificações na forma de entender e conviver com o espaço
público, que é o tema deste trabalho.
A constante transformação, acresce o trabalho de administradores públicos
de maior responsabilidade no que tange à conservação e constante
aperfeiçoamento nos serviços prestados à comunidade, inclusive na apresentação
de uma cidade “melhorada” constantemente.
Ao considerar, a partir das verificações constantes neste trabalho, o efeito de
textos visuais nos usuários de espaços físicos públicos no que ser refere à
percepção de tranquilidade, ou ainda da falta desta, os administradores públicos, em
especial os que atuam no Poder Executivo, podem prover às cidades segurança
66
N.A.: O termo apreensão da praça é utilizado no sentido de designar a forma pela qual o indivíduo entende a praça, como é vista, sentida, usada.
Considerações Finais 84
pública sem que o assunto esteja única e exclusivamente afeto a atividades policiais,
não que o aparato policial público deva ser descartado ou que careça de
importância, mas sim que o conjunto arquitetônico público de um município também
é um dos fatores que compõem um contexto que garanta sensação de segurança
aos cidadãos.
Por via da semiótica greimasiana este trabalho apresentou as possibilidades
da visão individual dos transeuntes que caminham pela Praça Coronel Benedito de
Almeida quanto à sensação de segurança. É compreensível o papel relevante que
os dados espacializados representam, como norteadores de políticas públicas de
segurança, todavia não é razoável adotar como correto que ações governamentais
que não levem em consideração, durante o planejamento de investimentos e
atividades relativas à Segurança Pública, a percepção individual de cada cidadão ao
“estar” em sua comunidade e ao utilizar espaços públicos.
A compreensão de que a percepção individual, quanto à sensação de
segurança, é de suma importância transparece na falta de significação de
estatísticas a indicar que o momento atual é de tranquilidade ao cidadão vitimado
por alguma ação criminosa, por ter sofrido pessoalmente ou por ter presenciado,
ainda que os números sejam favoráveis o sujeito que as lê ainda sentirá medo do
crime e da violência.
RREEFFEERRÊÊNNCCIIAASS BBIIBBLLIIOOGGRRÁÁFFIICCAASS
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CCRRUUZZEESS
Mogi das Cruzes, 24 de maio de 2011.
Ao Sr Eli Nepomuceno Ilmo Secretário de Segurança Urbana Prefeitura de Mogi das Cruzes/SP
Prezado Secretário,
conforme contato pessoal mantido com VSª, venho por meio desta formalizar o
pedido de informações a respeito da cobertura visual, por câmeras de
monitoramento de vias públicas, quanto à segurança pública da Praça Coronel
Benedito de Almeida.
A solicitação tem por escopo documentar informações, de forma oficial, a comporem
trabalho de pesquisa acadêmica que ora desenvolvo como aluno do Programa de
Mestrado, da Universidade Braz Cubas, neste município.
As informações necessárias à pesquisa são:
Se existem câmeras, de monitoramento de vias públicas, instaladas na Praça Coronel Benedito de Almeida.
Em caso positivo quantas são e onde estão posicionadas.
Caso não existam câmeras instaladas na Praça, informar se há câmeras, posicionadas em outros endereços, que cubram visualmente o espaço local público mencionado.
Certo de sua sensibilidade e atenção ao assunto agradeço antecipadamente,
externando meus protestos de elevada estima e distinta consideração.
Atenciosamente,
Valter Padulla
Pesquisador
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Figura 33 – Reforma da Igreja Matriz (década de 1960). Fonte: Arquivo Histórico de Mogi das Cruzes
Figura 34 – “Grupo Escolar” Cel Benedito de Almeida e Coreto (1928). Fonte: Arquivo Histórico de Mogi das Cruzes
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Figura 35 – Igreja Matriz de Mogi das Cruzes, em 1930. Fonte: Arquivo histórico de Mogi das Cruzes
Figura 36 – Vista superior do obelisco e do Grupo Escolar Coronel Almeida, em 1930. Fonte: Arquivo histórico de Mogi das Cruzes.
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Figura 37 – Coronel Benedicto J. de Almeida.
Fonte: Arquivo histórico de Mogi das Cruzes.
O calendário marcava 18 de abril de 1847. A pequena Vila de Mogi das
Cruzes servia de cenário para o nascimento do filho de uma lavradora de nome
Inocência Maria Almeida.
Benedicto José de Almeida foi o nome dado ao menino, cuja vida parecia já
estar predestinada a se transformar em um marco na história da cidade.
Aos oito anos de idade, começou a frequentar as aulas de alfabetização com
o ilustre professor Fidélis. Ao terminar o ciclo, sempre como o primeiro da classe,
passou a frequentar as aulas de continuidade com Manoel Caetano, licenciado pelo
Governo Provincial para dar aulas de Português e Latim.
Neste período, Benedicto já demonstrava ser uma pessoa dotada de grande
inteligência, sendo logo convidado por seu professor para auxiliar outros alunos,
ensinando as matérias que aprendera.
Os anos passaram e, com 18 anos, passou a administrar sua casa, tendo a
responsabilidade de cuidar dos outros irmãos, devido à morte dos pais.
Sua devoção não somente a favor do ensino e da educação, já demonstrada
desde esta época, como também por seu espírito de liderança com que lidava seus
deveres, fez com que sua imagem fosse conduzida à popularidade. Para os homens
67
Referência Bibliográfica: BARROS (2003, p. 67-70).
93
públicos da época, era tido como uma figura cujos dotes o levariam ao destaque na
vida política da cidade. E assim foi convidado para ingressar na política pelo Partido
Conservador. Foi feito vereador, mas, com o passar dos anos, resolveu se afastar da
política, por não se identificar com seus ideais partidários.
Mesmo desligado da vida pública, sempre fez da sua própria força uma
ferramenta para realizar benfeitorias, participando dos movimentos mais importantes
da época em favor do bem comum. Vale registrar o ano de 1873, quando foi um dos
colaboradores na fundação do Asilo da Sociedade Mogiana de Beneficiência, atual
Santa Casa de Misericórdia.
Demonstrando afinidade com o movimento republicano, Benedicto retornou à
política e, junto de outros líderes, como Francisco Souza Franco, elevou a bandeira
e apoiou publicamente a Proclamação da República. Em Mogi das Cruzes, foi em 19
de novembro de 1889 que a Câmara Municipal, sob sua presidência, se reuniu para
menção de aplausos aos proclamadores republicanos.
Em fevereiro de 1890, o novo Governo pediu a dissolução das Câmaras
Municipais e Benedicto José de Almeida foi destituído do cargo, fato que o levou a
afastar-se novamente da vida política.
Já em janeiro de 1891, foi eleito Presidente da Sociedade Mogiana de
Beneficiência, que anos anteriores ajudara a fundar. Nesta mesma data, lançou a
campanha para obter recursos para a construção de um novo prédio próprio para o
hospital. Graças à sua liderança, as novas instalações vieram a ser inauguradas em
julho de 1899, dando grande salto para a solidificação da instituição.
Em 1896, retornou a presidir a Câmara Municipal, permanecendo no cargo
até 1904.
No exercício de sua vereança, coube a ele as maiores iniciativas para
instalação e construção do prédio do “Primeiro Grupo Escolar de Mogi das Cruzes”,
que, atualmente, leva seu nome, além de outras realizações que vieram contribuir
decisivamente para evolução do ensino e da educação em Mogi das Cruzes.
Em 1900, presidiu a “Associação Construtora do Teatro”, que resultou na obra
e fundação do antigo “Teatro Vasques”.
Já em 1908, retornou a presidir a Câmara Municipal, dando continuidade aos
trabalhos.
Em maio de 1909, data da inauguração da luz elétrica em Mogi das Cruzes, a
chave de inauguração recebeu seu nome, pois sua imagem era a que melhor
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representava o progresso mogiano.
Em junho de 1911, quando foi fundado o primeiro Tiro de Guerra, o antigo
“Linha de Tiro 120” passou a ser chamado Coronel Almeida, devido à sua alta
patente da Guarda Nacional que integrava. Foi seu primeiro presidente.
Em 1910, após ter desistido de presidir a Câmara Municipal, o Partido
Republicano lançou novamente sua candidatura para concorrer com Dr. Armindo
Freire à vaga de vereador deixada pelo pedido de renúncia do Major Arouche de
Toledo. Foi sua última estada na política, pois, ao encerrar o ano, resolveu se afastar
definitivamente dos cargos públicos.
No dia 4 de setembro de 1920, o Coronel de Almeida deixou a vida.
Por tudo que realizou, ficou eternizado o seu nome na história de Mogi das
Cruzes.