Post on 11-Feb-2018
7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2
1/48
GuitarraClssica 1
Nmero2Julho2010
ZoranDukicPauloVazdeCarvalhoOrlandoTrindadeRicardoBarcel
7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2
2/48
GuitarraClssica 2
Editorial:Algunsnmeros:Emseismeses,asduasediesdaRevistaforamacedidasmaisde5000vezes,estenmeroultrapassalargamenteonmeroqueaeventualpublicaoemformatofsicopoderiaatingirnumafase inicialcomoesta.Nestesentido,consideramosatagoracomomuitopositivaarecepoquetemtidodurantea suacurtaexistncia.Desdej,osnossosagradecimentosaos leitoresportuguesesebrasileirosqueajudaramaalargarestenmeroequecontriburamparaadivulgaodesteprojecto.NosprximosnmerosserapresentadooprimeiroConcursoNacionaldeComposioparaGuitarraeficadesdej lanadoodesafioparaquecompositores(enos)seaventuremaparticiparcomobrasparaguitarrasolocomduraode5a7minutos.MaisdetalhesembrevenaRevista.O Vero aproximase e consequentemente o grande nmero defestivais emasterclasses, votos deexcelentesfriascommuitamsica.
PedroRodrigues
NestenovonmerotivemosaoportunidadedeconversarcomoguitarristamaispremiadodaHistria,ocroata
Zoran
Dukic.
Professor
no
Conservatrio
de
Haia
ena
Escola
Superior
de
Msica
da
Catalunha,
Dukic opina sobre o novo sistema de Bolonha j incorporado na maior parte das universidadeseuropeias, abordando tambm a sua mais recente gravao, os 24 Caprichos de Goya de MarioCastelnuovoTedescoparaaeditoraNaxos.Contamos tambm comuma entrevistaaPauloVaz deCarvalho,naqual sedebrua sobreoactualpanoramamusical/guitarrsticoportugus; crticanovagravaodeZoranDukic;umapea inditaparaguitarrademaisumjovemcompositorportugus,RicardoAbreu;talcomodoisartigossobreduasgrandesfigurasdopanoramahistricodaguitarranareadaperformanceecomposio, IdaPrestieFernandoSor.Mais uma vez incentivamos aos leitores a escreverempara o espao do leitor emitindo as vossasopinies e crticas, para tal basta enviarem um email com o assunto Espao do Leitor pararevistaguitarra@gmail.com.
Osnossos
agradecimentos
especiais
aRicardo
Abreu
eRicardo
Barcel
pela
importante
colaborao
nestaedio.
AtOutubro!JooHenriques
ndice:EspaodoLeitor 3
EntrevistaaZoranDukic 4
Guitarrano
Feminino
11
EntrevistaaPauloVazdeCarvalho 16
Luthier.pt 24
NovasGravaes 28
OMthodepourlaguitaredeFernandoSor(Paris,1830) 29PginascomMsica 46
Equipa: Ricardo Abreu, Ricardo Barcel, Gil Ferreira, FranciscoMoraisFranco,JooHenriques,TiagoCassolaMarques,FilipaPintoRibeiro,Pedro
Rodrigues,Alba
Lpez
Snchez
7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2
3/48
GuitarraClssica 3
revistaguitarra@gmail.com
TOWRITEHERE!
7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2
4/48
GuitarraClssica 4
EntrevistaaZoranDukicporJooPauloHenriqueseAlbaLpezSnchez
Umanoite,depoisde teros seusfilhosadormir, tivemosaoportunidadedeconversarpelo
telefone
com
o
grande
guitarrista
croata
Zoran
Dukic,
que
estava
em
Barcelona,
uma
semana
antesdeviajarparaofestivaldeMikulov (naRepublicaCheca). Foiuma longaeagradvel
conversaqueagorapartilhamoscomosnossosleitores.
Revista Guitarra Clssica: Em primeiro lugar gostaramos de lhe agradecer o facto de teraceitadoonossopedidodeentrevista.umgrandeprazer.
Nas edies anteriores, tivemos entrevistas com CarloMarchione e RicardoGalln.Ambos
tiverameducaesmusicaismuitodiferentesenquanto cresciamemdoispasesdiferentes.
ContenoscomofoicrescernaCrociaenoseumeiomusical.
ZoranDukic:Eucomeceiatocarguitarracomseisanosnaescolaprimriaeaminhaprimeiracompetionacionalfoiaosseteanos,noqualganheiumprmio;massendoumacriana,no
trabalhava conscientemente, somente tocava guitarra na escola. Somente aos 13 anos
comecei a estudar com conscincia, formando a minha prpria personalidade e esttica.
Duranteessesanos,entreosseiseoscatorze,fuiumxitonascompetiesnacionaisoque
melevouaestudar,masfoiaminhamequemdirigiaomeuestudo,fazendoacontagemdo
nmerodevezesquerepetiatalcomotinhaespecificadoomeuprofessor.Quandocomeceio
graumdio,ensinosecundrio,eujestudavaconscientementeeasrio.Eutiveasortede
ter na Crocia sempre excelentes professores. Omeu professor da primria pagavame o
estudo com chocolate emais tarde no nvelmdio, tive umprofessormuito bom emuito
srio,quetocavatambmnumabandaderock,masmuitoatradopelamsicaclssica,que
meinspiroumuito.MaistardeestudeinaAcademiadeMsicadeZagrebcomDarkoPetrinjak.
R.G.C:Quemfoiamaiorinflunciamusicalduranteasuajuventude?Z.D:ApessoaquemarcouminhacarreirafoiDarkoPetrinjak.EleestudouemInglaterraetoca
oalade,o contrabaixoea guitarra,e foielequem iniciouodepartamentode guitarrana
Crocia e seus alunos antes demim,Goran Liste e Istvn Rmer, que agora compem o
Zagreb Guitar Trio junto com o Darko, ganhando prmios a nvel internacional.
ElefoiecontinuasendoumainspiraoparamimeparaaCrocia,easuainflunciamotivou
grandesxitosnos crculos guitarrsticosdaCrocia, continuandoaindahoje, com todosos
guitarristasquepassampelasmosdeDarko.Ele foiaminhamaior inspiraoequemme
7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2
5/48
GuitarraClssica 5
mostrouocaminho,comoeoqueestudar,comodesenvolveramsicaecomoenfrentlaa
srio, a partir daminha vocao. Ainda hoje inspirador e um grande amigo com quem
mantenhoocontacto,esvezestocamosjuntos.
R.G.C:Actualmente
voc
oprofessor
principal
no
Conservatrio
de
Haia.
Como
se
sucedeu
essaoportunidade?
Z.D:PrimeirofizumcursodepsgraduaocomHubbertKappel,naAlemanha,edepoiscasei
comLauraYoungeemconjuntodecidimosviveremAmesterdo.Mudamonospara lsem
nada,conhecendosomenteo luthierholands,OttoVowinkel,eaospoucos fuiconhecendo
pessoas,edepoisdedoisoutrsanos,em1997,apresenteimeaumconcursoparaprofessor
eobtiveavaga.
R.G. C: difcil conciliar o ensino em Barcelona e em Haia com os concertos e asmasterclasses?
Z.D:Bem,realmentecomoumtrabalho.EmHaia,todososmeusalunossoestudantesde
mestradoeosdeBarcelonasodeLicenciatura(emBarcelonaaindanohmestradodevido
acomplicaescomoprocessodeBolonha),porquenomomentonohnenhumprograma
demestrado.VouHolanda,duasvezesporms,etentoconectarasviagenscomosmeus
concertos,permanecendo
dois
dias
antes
edois
dias
depois
de
otour
na
cidade.
Amesterdo
umacidadequeestbemmuitobemconectadacomorestodomundoe,agora,Amesterdo
Barcelonasosomenteduashoras.
R.G.C:QualasuaopinionoquedizrespeitosalteraesqueestoincludasnoprocessodeBolonhaparaoensinosuperiorartstico?
Z.D:EunoestoudeacordocomBolonha.Apartirdaminhaexperincia,jqueeutrabalhei
durante trsanosem trsescolasdeensino superior (Haia,AacheneBarcelona)enoano
passadonaSucia,soudaopinioqueBolonhaumproblema,poistemalgunspontosque
estoabertosainterpretao.Porexemplo,naHolanda,oprojectofinaltratadocommuito
menos gravidade do que na ESMUC (Barcelona), onde a maioria dos alunos fazem um
semestreextraparaasuaconcluso;foialgoquenoentendinoincio,eporissoquealguns
pontospossamserinterpretadospordiferentesescolasdemaneiradiferente.
Poroutrolado,qualaideiadeBolonha?Estaexisteparaigualartodooensinosuperior,algo
comoumaglobalizaodauniversidade,eaglobalizaotemafinalidadedeunificartudoe,
portanto,mataradiversidade,queoquemaisenriqueceestemundo.Aglobalizao,tanto
7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2
6/48
GuitarraClssica 6
poltica,econmicaousocial,eliminaadiversidade.Hojeemdia,numaviagemChina,Japo,
CanadouBuenosAirestodososcentrosdascidadessoiguaiseissoalgoimpressionante,e
muito triste.Outro exemplo aAcademia de Zagreb. Eu estudei num sistema do este da
Europa,noqualsetrabalhamuitomaiscomateoriadamsica,desdeosseisanos,enoqual
os alunos/crianas tiveram duas horas semanais de aula individual de guitarra. Devido ao
planodeBolonha tiveramde reduzirashorasde instrumentoparaaumentaremoscrditos
em outro lado e, agora, de repente, todos os estudantes em Zagreb tmmenos aula de
guitarraporsemana,oqueridculo.Tudoestaserigualado,eemalgunscasosparamelhor,
emoutrosparapior.
Houtrosaspectosmenosbvios,mastambmnegativos.Porexemplo,anecessidadedeter
ummestradoparaconseguirumempregocomoprofessorexigequealgunsdosmeuscolegas
procurem um lugar para fazlo, acabando em alguns casos em centros ou pases onde se
obtmestettulocommuitomenosesforodoquenoscentrosepasescomprogramasmuito
mais exigentes; isto no deveria acontecer, porque os diplomas conforme Bolonha, tm a
mesmavalidade,masnoforamobtidoscomomesmoesforo.
R.G.C:Ns gostaramos de felicitlo pelo seu ltimo CDnoqual gravou 24 Caprichos deGoyadeMarioCastelnuovoTedesco lanadoemMarode2009.Comofoiaexperinciade
gravarumprogramatolongo?Z.D:Foiumaexperinciamaravilhosa.Averdadequenofoiminhaideia.Encontreimecom
Norbert Kraft, produtor artstico da guitarra da editora Naxos, numa competio na qual
ramosjris, e ele props que eu gravasse os 24 Caprichos de Goya e eu acheimuito
interessanteaproposta.Submergimenessemundo,muitomaisemTedescodoqueemGoya,
muito trabalho, muita msica de grande dificuldade, tentando ser o mais fiel possvel
partitura publicada.A gravao no Canad foi uma experinciamuito boa, sentimemuito
confortvel.
Dividimos
o
trabalho
em
duas
sesses
de
dois
dias
com
uma
semana
pelo
meio.
Foimaisdeumanodetrabalho, imersonacaricaturasocialdaobradeGoyaenacaricatura
musicaldeTedesco,sendoqueestetentoucapturaremmsicaogrotescodaobradeGoya,
masdevodizerque,emboraGoyatenhasidoumartista frentedoseutempo,Tedesco foi
ummsicomuitomaistradicional,nodevanguarda.Destepontodevista,osdoisartistasno
correspondem um ao outro, mas a partir da perspectiva de admirao de Tedesco pelo
trabalhodeGoya,sim.Tedescoconsideraestetrabalhocomoasuaobraprima.Acaricatura
que tentou capturar no est muito longe do seu estilo habitual que ainda muito
reconhecvel.Estoumuitofelizcomoresultado,comaexperincia,comamsica.
7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2
7/48
7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2
8/48
GuitarraClssica 8
continuam a crescer muitos novos talentos. Enquanto soujri de um concurso, tenho a
oportunidade de ouvir novos talentos e ver como o nvel tcnico aumentou. O nvel de
autocrticados intrpretestambmsubiueosobjectivossomuitomaisambiciosos,eneste
aspecto temonosaproximadomuitopertodas restantesvertentes.Pensoqueaindahum
campo aberto em nossa frente, onde podemos melhorar ainda mais e procurar novos
caminhos.
R.G.C: Voc ganhoumais primeiros prmios em concursos internacionais do que qualqueroutrapessoa.dasuaopinioqueosconcursosajudamosjovensmsicosqueosvencem?Z.D:Obviamente,ajudamdevriasmaneiras.Partindodeumpontonegativo,pensoqueos
concursos perderam um pouco o seu valor devido ao facto de havermuitos; fazendo um
clculona
Europa
existem
agora
entre
70
e100
concursos
por
ano,
isso
leva
acerca
de
100
primeirosprmios,300primeirosprmiosemtrsanos!
Desdeopontodevistadautilidade,os concursosajudama fazercarreira,masagorano
suficienteganharsomenteumconcurso,necessrioganhar15ou20,simplesmenteporque
elesperderamovalor.Paraumjovemguitarristamuitointeressanteeeducativoestarnuma
situaodifciletocarsobpresso,assimcomotocarnovorepertrioque,emmuitoscasos,
noomaisconfortvel,enecessriohabituarseafazercoisasquenosoideais;uma
grandeformao,
um
passo
muito
importante
para
avida
de
um
concertista.
Dada
aminha
experinciaemcompetiesde627anos,omeuconselhoparaumcompetidorquevoc
deve irpara competir com a ideia de que no h nada a perder, somente pode ganhar.A
segundacoisaimportantequeosconcursosnotmvalorreal,seumapessoatocaumdia
paraumjridecincopessoasedepoistocaexactamenteomesmoparaoutrascincopessoas,
paraumjriganhariaoprimeiroprmioeparaoutronopermitiriaquepassesefinal.
O resultado finalmudamuito,dependendodojri,masno tanto sobrea interpretaodo
participante.Notemnenhumvalorreal,podeaproximarseumpouco,masnoarealidade.
Esta situao ocorre demodo exactamente igual em qualquer outro concurso de arte, por
exemplopintura,porqueaartealgoquenopodesermedido.Eomaiorperigoquandoos
concorrentesnotmxitoeolevamamal,tornandosedeprimidos,paramdetocar...eisso
acontececommuitosconcorrentes.precisoolharparaoconcursoapartirdeumpontode
vistapositivo.Outro conselhoqueoparticipantedeve tocaro repertrio comqueele se
sintaconfortvel, sempensaroquepodeagradarmaisaojri.ToqueioCaprichorabena
maioriados
concursos
em
que
participei,
porque
era
uma
pea
com
aqual
me
senti
muito
7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2
9/48
GuitarraClssica 9
seguroemqualquersituaodestress(luzes,problemasdeafinao,cordas...)esabiaqueem
qualquer uma das situaesme poderia defender. Eu acreditava no que estava fazendo.
Temosdeacreditarnaquiloquesefaz.
R.G.C:Apresenanafaseeliminatrianosconcursoscomobrasobrigatrias,emmuitoscasos,levaaquemuitosguitarristastoquemomesmorepertrioedifcilassistiraumconcertode
guitarra,semapresenadeumdoshits.Achaqueprejudicialparaorepertriodaguitarra,
ou no afecta significativamente o curso da evoluo natural do nosso repertrio?
Z.D: Eu no acho que tenha muita conexo com o problema que, obviamente, existe.Precisamosterumrepertriobsico,peloqualtmquepassartodososguitarristas,comoo
caso com outros instrumentos, que, no caso da guitarra adicionado s vezes a certos
trabalhosque so feitosde sucessoporum tempoe soouvidosde formacontnua,maso
problemaa faltade repertrio.Hobras como InvocacinyDanza,grandescomposies,
muitoteis,comasquais sepodeaprendermuitoduranteoprocessodeestudo,equeeu
recomendoaosmeusalunose,soexecutadascomfrequnciaemconcursos.
Em geral, amaioria dos intrpretesmovese dentro do repertrio central, embora alguns
tentamiralmdainclusodenovorepertrio,ampliandoasmargenseabrindonovasportas.
Nomeu caso, a obrigatoriedadede obras nos concursosproporcionoumemuitas coisas, e
trabalheirepertrioqueoutraformaprovavelmentenoteriatrabalhado.
R.G.C:FazpartedasuaagendaumfuturoconcertoemPortugal?Z.D:No,alias,eununcatoqueiemPortugal.Anosatrs,estiveemvriasocasiesnofestival
de Santo Tirso com o Trio de Colnia, e uma vez comojri,mas nunca toquei sozinho.
Gostariade referirqueemPortugalhum grande guitarristaque vemdaescoladeDarko
Petrinjak,DejanIvanovic.
R.G.C: Para terminar, voc tem algum conselho para estudantes de guitarra sobre comocomearaestudarobranova?
Z.D:Devesesemprecolocaramsicaemprimeirolugar,tendoaideiamusicaleafrasecomo
guias.Eunoestouadizerserqueprecisoserescravodamsica,maspelomenos,seguila
comosbdito.
R.G.C:Onossomuitoobrigadopelasuadisponibilidade.Votosdemuitosucesso!
7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2
10/48
GuitarraClssica 10
OguitarristaZoranDukic,nascido
em Zagreb em 1969, tem uma
agenda ocupada com ensino,
performance, gravaes e
publicaes. Actualmente
professornaESMUCemBarcelona
enoConservatriodeHaia,tendo
estudado com Darko Petrinjak e
HubertKppel.Entreosanos1990
e 1997, Dukic ganhou um
impressionante nmero de
concursosonde
se
incluem
os
Andrs
SegoviadeGranadaePalmadeMaiorca,e
concursosdedicadosaFernandoSor,ManuelPonce,ManueldeFalla,FranciscoTrrega,entre
outros. Alm disto, a sua expressividade e poesia nicas lanaram a sua carreira a nvel
mundial,arrecadandoincomparveldistinoentreosguitarristascontemporneos.
CDOpera3 CDNaxos
CDPrintempsdelaGuitare
7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2
11/48
GuitarraClssica 11
GuitarranoFemininoIdaPresti(19241967)porFilipaPintoRibeiro
Je veux faire de ma vie, une chose simple et droite,
comme un roseau vide afri que Dieu lemplisse de
Musique.
IdaPresti
Unanimemente reconhecida pelo seu extraordinrio
talento, Ida Presti foi um dos maiores prodgios da
guitarra do sculo XX. Infelizmente, foi ficando na
penumbradoesquecimentoaolongodosltimosanos,sem
odestaquequea suadedicaoguitarra lhe fazmerecer.Filhadeumprofessordepiano
francs(ClaudeMontagnon)edeme italiana(GraziaLoPresti), Idanasceua31deMaiode
1924, em Suresnes, nos subrbios de Paris, e foi baptizada de Yvette Montagnon. A sua
relaocomaguitarracomeouquando,a7deAbrilde1924,oseupai,impressionadocom
umrecital
de
guitarra
de
Segovia,
anunciou
sua
mulher
grvida
de
oito
meses:O
nosso
filho
vai ser guitarrista. E foi esta ambio de Claude Montagnon, que comeou entretanto a
aprenderguitarracomoautodidactaparaensinarafilha,quenosdeuoprivilgiodeconhecer
umdosmaioresgniosdaguitarra,ummilagredefacilidadeegraa,naspalavrasdeEmilio
Pujol.
Aosquatroanosde idade, IdaPresti iniciouoestudodesolfejoeharmoniacomopai,eaos
seisanos,osdeguitarra.Asuarotinadiriaerabastantergida.Depoisdasaulasdoliceufazia
umasesta
elogo
de
seguida
iniciava
as
suas
aulas
de
guitarra
esolfejo,
criando
desta
forma
uma disciplina que muito a ajudaria a desenvolver o seu talento. A sua musicalidade e
facilidadeexcepcionais foramdesde logoevidentese aosoito anosde idade apresentouse
pelaprimeiravezempblico.Oseuprimeirorecitalfoidoisanosdepois,a28deAbrilde1935,
naSalaChopinPleyel,emParis.
IdaPresti foi aprimeira guitarrista commenosdedoze anos a ser convidadadurantedois
anosconsecutivosparatocarnosconcertosdaSocitdesConcertsduConservatoiredeParis.
As suas primeiras gravaes datam de 1938 e revelam uma maturidade tcnica e musical
7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2
12/48
GuitarraClssica 12
surpreendentesparaumacrianadeapenas14anos,deixandoanteverumacarreirabrilhante.
Aclamadapelopblicoepelacrtica,onmerodeadmiradoresdeIdaPrestiaumentavacom
cada apresentao sua. Ida chegou inclusivamente a participar no filme La Petite Chose,
baseadonum romancedeAlphonseDaudete foiescolhidapara tocarcomaguitarradeN.
Paganini(edeH.Berlioz)nascomemoraesdocentenriodamortedocompositor.
A crtica fezlhe rasgados elogios:
aps o seu primeiro recital,
Bernard Gavoty escreveu a seu
respeito: Aos dez anos, ela tem
umagrandeseguranatcnicao
seusomcheioeasuavariedadede
timbres so dos mais sedutores
que j ouvi. (Le Figaro, 10 de
Maiode1935). LaPresseescrevia
:Ida Presti a guitarrista mais
nova, mais surpreendente, mais
prodigiosaevirtuosadaactualidade.O
prprioSegovia
confessou,
quando
Ida
tinha
13
anos,
que
no
tem
nada
para
lhe
ensinar
e
que ela no deveaceitar ensinamentos de nenhumoutro guitarrista. Em 1938, na revista
Rythm,A.P.ShapeescreveumartigointituladoAWonderGirlGuitarist,ondeapresentadae
discutidaapossibilidadedehaverummelhorguitarristaqueSegoviaeondeoautordoartigo
escreve:Essemelhorguitarristaestaquieumacrianadeapenas14anosdeidade.
Raras vezes na histria da guitarra uma criana de 13 anos tocou com tamanha qualidade
sonora, interpretativaevirtuosstica,orepertrioque Idaapresentavacomessaidade.Entre
1935e1938,
constavam
nos
seus
programas
obras
de
Bach,
Broqua,
Malats,
Sor,
Fortea,
MorenoTorroba,PaganinieAlbniz.
Apesardosucesso,avidadeIdanofoifcilprecisamenteapartirdestaidade.Em1938,oseu
paimorreucomumataquecardaco,oqueadeixounopapeldechefedefamlia,umavezque
tinhauma irmdeapenastrsanoseameno trabalhava.Desta forma,anica fontede
rendimentoda famliapassou a ser a guitarraeo talentode Ida.A guerra,que teve incio
pouco depois, agravou a situao da famlia, pois enfrentou srias dificuldades. Ida no
gostavaderecordaresteperodo.
Ida Presti aos 10 anos de idade
7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2
13/48
GuitarraClssica 13
Com19anos,casasecomHenryRigaut,doqualtemumafilha,ElisabethPresti,nascidaem
1944.Apesarda suanovavida,demulhercasadaeme, Idanuncadeixade tocarguitarra.
Gostavade tocar atdemadrugada,demonstrandoo seu carcterbomio,e ficavamuitas
vezesatocarats2h00ou3h00paraosseusamigos.Idatambmadoravacantare,segundo
relatosdapoca,osseusdotesvocaiseramsemelhantesaosguitarrsticos.Poroutrolado,Ida
era uma grande improvisadora, passando diversos seres em sesses de improvisao,
especialmente com Alexandre Lagoya, que viria a ser seu marido anos mais tarde, aps o
divrcio de Rigaut. Foi graas a Lagoya que passmos a conhecer uma outra faceta de Ida
Presti:adecompositora.Idatinhaporhbitoescreverassuascomposiesemfolhassoltas,
que deixava espalhadas pela casa e foi Lagoya quem fez a recolha das mesmas. Das suas
composies, para solo e duo, destacamse La Hongroise, Danse DAvila, Espagne, Danse
Rythmique,Six
tudes
etude
du
Matin.
Contudo,
Ida
nunca
se
assumiu
como
compositora,
massimcomoumaguitarristaqueescreveparaoseuinstrumento.
AcarreiradeIdaprosseguiurepletadesucessose,compoucomaisdevinteanos,jsetinha
apresentado em Itlia, Holanda, Marrocos, Inglaterra, Indonsia, para alm dos vrios
concertosquedavaemFrana,noapenasnasgrandescidadescomonaspequenasvilase
aldeiasdopas.
Foi quando conheceu Alexandre
Lagoya,numadasfrequentestertlias
em casa de Andr Verdier (cuja casa
eraopontodeencontrodosAmisde
la Guitare) que a sua vida e,
consequentemente,a suacarreira, se
transformou. Estvamos no ano de
1952 e, um ano depois, Presti e
Lagoya casaramse. Depois do
nascimentodoprimeirofilhodocasal,
Sylvain, Ida decide formar um duo
com Lagoya, duo este que viria a
tornarsenumdosmaisimportantese
marcantes duos da histria da
guitarra. Este foi o primeiro duo
profissional,no
sentido
em
que
ambos
7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2
14/48
GuitarraClssica 14
osmembros abdicaramda sua carreiraenquanto solistas,procurandoum resultado sonoro
unificado,despidodequalquer individualidade,criandoassimumverdadeiroidealdemsica
decmara.CitandoFbioZanon:tantoIdaPresticomoAlexandreLagoyajtinhamassuas
carreirasencaminhadascomosolistas,masoseuencontroeassuastrspaixes pelamsica,
pelaguitarraeumpelooutro foramumacombinaoexplosiva,capazdecriarreverberaes
incalculveis.
Aprimeiraapresentaododuofoiem1955eobteveumaestrondosarecepoporpartedo
pblicoedacrticafrancesadapoca.Desdeessaaltura,eduranteosquinzeanosseguintes,o
duo PrestiLagoya deu mais de 2000 recitais e gravou diversas obras para a EditoraPhilips
RecordCompany,edeixaassim,umgrandiosolegadoeaoportunidadedasgeraesseguintes
poderemapreciarafacilidadequetinhamemseunificarnabuscadoseuidealmusical.Foia
partirde1956,que Idadecidiudedicarseexclusivamenteaoduo,aoabdicardacarreirade
sucessoquetinhaconstrudocomosolista.
Em pouco mais de dez anos, vrios
compositores escreveram para o duo
PrestiLagoya: Rodrigo (Tonadilla),
CastelnuovoTedesco (24 Preldios e
Fugas As Guitarras Bem
Temperadas), Andr Jolivet, Pierre
Petit, Daniel Lesur, MorenoTorroba,
Tomasi, Duarte, Jouvin, entre outros.
O duo PrestiLagoya conquistou um
estatutoqueotornounumareferncia
nestetipodeformao.
Em
conjunto
com
Alexandre
Lagoya,
Ida
Presti criou uma prestigiada classe de guitarra
na ScolaCantorum em Paris. Quando era mais nova, Ida Presti no demonstrou particular
interessenoensino,contudo,acaboupor se revelarumaexcelenteprofessora,dandoaulas
nosnaScolaCantorumcomonaAcademieInternationaldtdeNice.Asuapersonalidade
ternaedesimpatianatural,tornavaabastanteprximadosalunos,queporelatinhamuma
grandeadmiraoeafeio.SegundoAaronSkitri,omtododeensinodePrestinoconsistia
no tradicional mtodo de mestrediscpulo, em que o ltimo segue escrupulosamente as
indicaesdoprimeiro.Idapreferiaadoptarumaposturadeorientadora,dandoliberdadeaos
Ida Presti e Alexandre Lagoya
7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2
15/48
GuitarraClssica 15
alunosdeexploraremasuacriatividadeedesenvolveremasuapersonalidademusical,atravs
deorientaeseindicaesqueosajudassemnessepercurso.
CursodeVerodaAcademiaInternacionaldeNice,comIdaPrestieAlexandreLagoyaaocentro.Peranteesteinvulgarcasodetalentoegenialidade,omundorendeuseguitarradeIdaPresti
eaoduoPrestiLagoya.Contudo,numatournepelosEstadosUnidos,comapenas43anosde
idade, IdaPresti levadadeurgnciaparaoHospitalGrandMemorialRochester,emNova
Iorque,ondeacabouporfalecer,vtimadehemorragiainterna.Acausadahemorragianunca
foitotalmenteclara.Falasedeumerromdicoduranteumabroncoscopia,mas,tambmde
complicaesdevidoacancronopulmo.Oquecertoqueasuamorteprematura,noauge
dasua
carreira,
foi
um
choque
para
todos
os
seus
admiradores.
Lagoya,
de
tal
modo
afectado
por este sbito e inesperado acontecimento, ausentouse durante cinco anos dos palcos,
numaprofundadepresso.
Eisanossahomenagemeficaodesejoqueesteartigosusciteavontadede(re)descobriresta
grandeguitarrista,aquemtantodevemos.
Por um curtoperodo de tempo, estivemos napresena de um gnio, e muitopouco
provvel
que
venhamos
a
conhecer
outro
durante
a
nossa
vida
(John
Duarte,
1967).
7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2
16/48
GuitarraClssica 16
EntrevistaaPauloVazdeCarvalhoporGilFerreira
G.F.Comeoporagradecer,emnomedaRevistadaGuitarraClssica,por teracedidoao
nosso
convite.
DequeformavaemergnciadeumarevistaespecializadanombitodaGuitarraClssicaem
Portugal?
P.V.C. Primeiro, vem muito a
propsitoelavemnasequncia
de uma classe emergente de
guitarristas.
A
revista
oportuna
porque vem com aexistncia de
matriaparaimpulsionareparaa
preencher.
Hojeemdia,temosjumpblico
muito grande de guitarristas e
interessados na guitarra que justifica
perfeitamente
a
existncia
de
uma
revista
que
seja
uma
plataforma
de
troca
de
ideias/conhecimentotilepor issosadoa ideiadoPedroRodriguesedosseusamigospor
lanaremarevista.
AlmdomaisaguitarraestasermuitoestudadaemPortugal,tantoaonvelprticocomoao
nvel terico. Julgo que a emergncia de gente capaz de produzir texto acerca da cultura
guitarrsticatambmumelementodeimpulsodarevista.
G.F.
Perante
um
percurso
de
vida
que
cruza
diversas
experincias,
quais
as
referncias
musicaisdePauloVazdeCarvalho?
P.V.C. Imagina uma floresta onde existissem todas as rvores e te perguntassem a que
rvoretecheirava.
Eu nunca consigo escapar luz, de Bach, de Beethoven e de Stravinsky. So trs pontos
cardeais,umtringuloquemecerca.
7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2
17/48
7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2
18/48
GuitarraClssica 18
Jtoqueiobrasparatocarcomamigosejtoqueiobrasporseremdeamigos.Estouagoraa
verumaobraquepediaumamigo,ouviumaobradeleparapiano,pediparaescreveruma
obraparaeu tocareeleescreveu.Deixo issoaoacaso,aomelhorde todososacasos.Claro
que umacaso informado, um acaso determinadopelo gosto determinado at por algum
sentidodepocaeoportunidade,masprincipalmentepelogosto.
G.F.Naalturaemquecomeoua leccionarnoCursodeLicenciaturaemEnsinodaMsica
existiam apenas trs estabelecimentos de ensino superior de Msica em Portugal.
ActualmenteexistemonzeestabelecimentoscomcursossuperioresdeMsicaeonmerode
Festivais de Guitarra bem como de alunos tambm tem vindo a crescer. De que forma
descreveaevoluodaGuitarraemPortugal.
P.V.C.Emformadefesta.De
facto era muito pouca gente,
um universo muito pequeno
(estouafalardeh20anos)de
gente e da resultava que se
respirasse uma atmosfera
acanhada.
Eram poucas as pessoas em
lugaresdepoderdarumasada
profissionalaosalunosrefirome
aoensinoramosmuitopoucose,
emborahouvessejensinodealtaqualidade,agorahmuitagenteeveiogenteboaaumentar
aofertadeestilodeensinonasUniversidades/Politcnicoseissodevedarumasensaode
arlivreaosalunosquemuitosaudvelequeumacondioessencialparaqueelespossam
exerceratasuaescolhaestticaehumanadentrodaMsica.
G.F.EnquantoProfessordeGuitarra,quaissoassuasmaiorespreocupaesnoprocessode
orientaodosalunosquerecebenaUniversidadedeAveiro?
P.V.C.Essaperguntafaoeuati,eaguardoresposta!
G.F.Nofundoumaorientaonosentidodoalunoencontrarasua identidadeenquanto
intrpreteda
Guitarra,
uma
identidade
que
no
est
indissocivel
do
aconselhamento
tcnico,
Paulo Vaz de Carvalho com Oscar Flecha, David Russell,Manuel Barrueco e Eduardo Isaac (Santo Tirso 1997)
7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2
19/48
GuitarraClssica 19
estilsticoemusical.EstaparecemeamaiorpreocupaodoPauloVazdeCarvalho,quecada
alunoencontreasuaidentidade.
P.V.C.Eestsdeacordocomisso?Masentonoachasquedeviahaver,emAveironomeu
postode
trabalho,
uma
maneira
standard
de
ver
as
coisas
que
levasse
aque
os
pblicos
dissessem:aquiestumalunodoSr.Carvalho!
G.F.ClaroqueexisteumamarcadoProf.Carvalho,nomeparecequeosalunossejam
formatadoscomosmesmosprocessoscomoqueprovenientesdeumacunhagememsrie.
P.V.C. Essa uma preocupao
que eu tenho desde sempre e ser
bom
que
seja
de
todos
os
Professores de Msica, de Artes ou
de todos os Professores. Muitas
vezes somos tentados a pedir
nossa pereira que d melhores
masdoqueamacieiradovizinho,
mas a nossa uma pereira, ela vai
dar
peras
degeneradas
por
nossa
causa.Agentetemqueaprendera
tratar de pras. De facto acho uma
terrvel violncia estar a fazer dos
alunos telas do nosso projector,
recipientesdanossasensibilidade.Umavezlivresdens,nuncanosvoperdoar.
Um Professor tem que principalmente comunicar a sua experincia investigatria (e a dos
outros!),despertar
acuriosidade
eorganizar
acuriosidade
do
aluno.
Se
oaluno
no
for
curioso
econtinuaranosercurioso,entodevesaberaconselhloatempoamudardeProfessorou
deactividadequevparaumaactividadeemqueasrespostasjestejamdadas. Istosem
excluir que, pelo processo de formatao em srie no se consigam boas turmas. Podem
conseguirseboasturmas,talveznoseconsigamHomenslivres.
G.F.Humladoliterrionoseudiscurso?Falenosumpoucodassuasrefernciasliterriasedequeformaestassecruzamcomamsicaquefazeensina.
Paulo Vaz de Carvalho com Davide Amaral
7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2
20/48
GuitarraClssica 20
P.V.C.Nohnenhum lado literrionomeudiscurso.Todasasmatriasdanaturezaedo
espritotmdireitoaserexpressasempalavras.Oquehouverdeliterrionoqueeudigo,est
na potncia da msica. O que eu digo no literrio musical. H uma continuidade
expressivacomumacontinuidadedelinguagemtalvezentreoobjectosom,oobjectomsica,
o objecto obra de arte e o esprito, essa cadeia inquebrvel. De facto, entrar no mundo
artsticoumaviagemaoinfinitodasubjectividadeapedagogianopodeisolarsedisso.A
ressonncialiterriaumharmnicodanotacerta.
G.F. Paulo Vaz de Carvalho, Licenciado em Direito, Guitarrista, Docente Universitrio,tambmescreveSabemosquecompemsicaparacenaerecitaisdepoesia, falenosum
poucodasuaactividadecomocompositor.
P.V.C. No sei se vale a pena gastar entrevista
comaminhaactividadeenquantocompositor....eu
no sei se sou compositor ou decompositor. O
compositorjuntapartespara compor,para aspr
emconjuntoeproduzirobrasde sntese.De facto
eu sou um decompositor, principalmente porque
intervenho em pequenos momentos sem
importnciamusical:
peas
de
Teatro,
recitais
de
Poesia at de exposies de Pintura. Quando
disseste que sou compositor, senti um abano
porqueaminhaactividadenoenvolveessasntese
daconstruodaobraquesesustentaporsi.Souum
fabricantedeelementossonorosparaumaboaexposiodePintura,paraumbomrecitalde
PoesiaouumapeadeTeatro.
Tenhoagradadobastanteaosactoreseaosencenadoresporque,principalmente, tenhoum
gostomuitograndeementrarnostextoseimagensplsticas.Tenhoumgostoenorme,muito
sinceroecrescentenamultiplicidadedelinguagensqueseencontramemcimadeumpalco
refiromeprincipalmenteaorecitaldePoesiaepeadeTeatro.Falomuitocomoencenador
eouoomuito.Ouoexaustivamenteosactores,vejocomoelesmexeme falamedepois,
quando a Msica j est apontada, doulhes muito a ouvir a minha Msica. H uma
combinao, uma conformao mtua muito sincera e muito calorosa entre as notas que
escrevoeocaminho
que
os
actores,
encenador
ecengrafo
vo
tomando.
7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2
21/48
GuitarraClssica 21
Souumaespciede cengrafopor somouajudantededramaturgopelaescritamusical.A
Msicatematmuitopoucaimportncia,aqualidadedotecidomusicalenquantoMsicatem
muito pouca importncia, no cmputo dessa construo muito laboriosa mas muito
gratificanteeapaixonadaque faodentrodaequipe toda.Participosemprenadiscussoda
obra...oquequesignificamosactores,asfalasouosplanos.
Sempre que fao msica, que no seja uma coisa pressa, fao esse trajecto e os
encenadores/actorescomquemtenho tidoogostodetrabalhar fazemno tambm.Oque
maiscuriosoque,humaliberdadeinfinitanacriaomusical,nestascircunstnciashuma
expressoindividualinfinita,harmonizadacomumdesejocolectivodefazerumaobradearte.
Umavezcomeceiporfazerumapartituramaisoumenoscomplicada,combastantespginas,
vriaspartesetalcomemosporfazerotrabalhodeactorcomassistnciadoencenadore
medidaqueotrabalhocomosactoresecomoencenadoravanava,amsicaiasetornando
sucessivamentemaisdesnecessriaeacaboupornohavermsicafoiemGilVicente,como
AugustoBarroseaEscoladaNoiteporqueosactoressemtocar,semcantar,sembaterem
batuques, assimilaram nas suas vozes, nas entradas, nos gestos e naspausas, tudo quanto
aquelaMsicapoderiatervindotrazereportantoaMsicaficouemparteincerta.
G.F.
Se
tivesse
de
eleger
um
nome
da
Guitarra
no
sculo
XX,
qual
seria?
P.V.C.Semeperguntasqualfoiomaisnecessriodelestodos,digoquefoioSegvia.
G.F. Como perspectiva aGuitarra parao sculo XXI,o que considera que falta fazer em
Portugal?
P.V.C.Faltaqueosguitarristascadavezmaisencontremespaoparaaplicaroseutrabalhoe
asuainvestigao.
O
que
vai
ser
feito
so
os
guitarristas,
cada
um
deles,
que
vo
decidir.
Mas
pelo
menos
j
pudemos verqueemPortugal,a classede guitarristas suficientemente grandepara criar
camposdefantasiajmuitodiferenciados.Issojumarealidadeenosumapromessa.
HojevsaGuitarra,apartirdaClssica,aplicadaamuitoscamposdeexpressomusicalevsa
Guitarracommuitacompetnciaecommuitosaberdeofcio.VsgentequesaiudaGuitarra
Clssica para o Jazz, para os instrumentos antigos, para o Alade, para a Viuhela, para a
GuitarraBarroca.VsgenteafazerexperinciasnocampodaGuitarrade8e10cordas,gente
quefazexperinciasnaGuitarraDigital.
7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2
22/48
GuitarraClssica 22
OreportriodaGuitarraClssicaemPortugalcomeaaserpontuadoquerpelaMsicaAntiga
querpelaMsicaModernaedevanguardaevsaGuitarraassociadasnovasproduesde
muitoscompositorescontemporneosportugueses.
Dizeroquevai seraGuitarranocabeaumguitarristaeeu souapenasumGuitarrista.
Estas duas dcadas so para mim uma afirmao enorme do talento portugus posto na
guitarraoensinoprofissionalfoifundamental.Amultiplicaodeescolaseescolhastambm
deixam,felizmente, estaperguntaimpossvelderesponder.
Acompanho os cursos
internacionais h mais de duas
dcadas e cada vez vejo mais os
professores
que
vo
passando
a
encontrar uma classe de
guitarristas altura daquele
paraso a que chamamos
estrangeiro. Tenho visto grandes
Professores a referenciarem com
entusiasmoaclassedosaprendizes
deguitarraemPortugale issosinal
quehumaclassedecolegasmeusqueestatrabalhar.
Estassoapenasasminhaspalavras. Importantesvoseraspalavrasdaquelesquehojeso
alunosouvoseralunosdestes,tenhoumagrandeesperana.
No estou a adiar por uma gerao as minhas responsabilidades mas tenho uma grande
esperananessagentequetemagoraentre10e20anosquejvaifruirdaaprendizagemda
guitarracomoummeiodelibertaoexactamentepelavariedadedeescolha,pelavariedade
depropostasepelapossibilidadedealteraroseucaminhovoter tantapossibilidadede
escolherumProfessorcomotudeescolherolivroquevaisleramanh;issoliberdade.
G.F. Estimado Paulo Vaz de Carvalho, agradeo mais uma vez a sua disponibilidade para
partilharumpoucode si com aRevistaGuitarraClssica.Desejolhe asmaiores felicidades
profissionaisepessoais.
P.V.C.Felicidadesrevista!
Masterclass de Paulo Vaz de Carvalho
7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2
23/48
GuitarraClssica 23
Paulo Vaz de Carvalho iniciou o estudo de
guitarracomoautodidactaemVilaReal.Apar
do curso de Direito, que concluiu em 1981,
frequentou cursos livres com os professores
Ribeiro da Silva, Lencart, Linhares, Nagy e
Ponce.FoialunodeGuitarradeLuizeWalkerna
Academia Superior de Msica de Viena;
finalizou os estudos superiores com a
classificao de Primeiro Prmio por
UnanimidadenoConservatriodeAulnaysoba
orientao de Raymond Grratien e orientao
particular de Robert Aussel. Frequentou cursos
livrescomRussel,Diaz,Cotsiolis,Ragossnig,ZsapkaeBrouwer.
Concluiu em 1993 Mestrado em Cincias Musicais. Sob orientao deJoo Pedro
OliveiraeFranoisDry,concluiuDoutoramentosobreDidcticadeGuitarra.Tocouem
programasmusicais de Rdio e Televiso e em temporadas da Fundao Calouste
Gulbenkian,MinistriodaCultura,FundaodeSerralves,CasadaMsica,Expo98,
CoimbraCapitaldaCultura2003,FestivaldeGuitarradeAveiro,SemanadeGuitarra
deLisboa,Festival InternacionaldeSantoTirsoeBolvarGuitarFestival,emLondres.
Temdivulgadoobrasdeautoresportugueses.Compemsicaparacenaerecitaisde
poesia.
LeccionounoCIFOPdeVilareal.OrganizouencontrosmusicaisemVilareal.Fundoua
AcademiaeMsicadeVilaReal.
ProfessorAuxiliardoCursodeMsicanaUniversidadedeAveiro.
http://www.meloteca.com/cordaguitarristas.htm#carvalho
7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2
24/48
GuitarraClssica 24
Luthier.ptRetratodeOrlandoTrindade(n.1973)PorFranciscoMoraisFranco
Natural de Caldas da
Rainha, acabou por se
tornar luthier de forma
quase imprevisvel.
Enquanto criana, a sua
mais remota influncia
vemdo seuavmaterno
(marceneiro que
trabalhavacomcuidadoe
pormenor),doqualguarda
ofascniodeovertrabalhara
madeiraassimcomoocontactocomasferramentasdetrabalho(assuntopeloqualaindahoje
seinteressaparticularmente).
Apesardestarefernciadeinfncia,smaistarde,em2000,seestreianaconstruodoseu
primeiroinstrumento,umaviolademorenascentista.Pelopercursocontactoucomdiversas
reas (desde um curso de cermica a reparaes de instrumentos elctricos e antigos) das
quaisfoiadquirindooseusaberpolivalenteeascoisasforamacontecendoquaseporsorte.
Apesar de no ter tido um mestre isolado que o tenha ensinado de raiz a construir
instrumentos,sendoemgrandeparteautodidacta,OrlandoTrindadereferea importnciade
algumas pessoas no seu percurso. Entre elas, Carlos Tavares (construtor de guitarras
elctricas)
com
o
qual
trabalhou
entre
1998
e
2003
e
se
iniciou
na
reparao
e
construo
de
instrumentoselctricos.
Em2000contactacomomusiclogoeintrpretedemsicaantigaPedroCaldeiraCabralassim
como com Joaquim Antnio Silva (membros dos grupos de msica antiga La Batalla e
ConcertoAtlntico).Destecontactoviriaasurgirumaimportanteparceriaaonveldatroca
deconhecimentossobreinstrumentosdemsicaantigaassimcomoaconstruoereparao
deinstrumentosparaestesagrupamentos.
7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2
25/48
GuitarraClssica 25
Apartirde2003passaadedicarseessencialmenteconstruodeinstrumentosacsticose
em 2004 frequenta com regularidade o atelier de Fernando Meireles (construtor de
cordofones tradicionais em Coimbra) com o qual aperfeioou tcnicas de construo e de
restauro. Neste contexto, colaborou na reparao de diversos instrumentos musicais
pertencentesColecoLouzHenriquesqueseencontraexpostaemCoimbranummuseu
comomesmonome.
Em2005frequentouocursode
"Manutenode Instrumentos
HistricosdeCordaDedilhada"
ministrado pela luthier Italiana
AnnaRadice.Noseguimentoda
participaoneste curso foilhe
encomendada uma guitarra
barroca que actualmente faz
parte do acervo de
instrumentos musicais do
ConservatrioNacionaldeLisboa.
Temparticipadoemvariaspalestraseexposiesde instrumentostradicionais,ejrecebeu
vriasencomendasde instrumentosdemsicaantigadeclientesportugueseseestrangeiros
(Brasil,BlgicaeEspanha).
Sobreaconstruodeguitarrasclssicas,OrlandoTrindade refereque foidos instrumentos
quemaistardecomeouaconstruir.Apesardeteriniciadooestudodoinstrumentoem1990
comoprofessorVascoAgostinhoedeposteriormenteterfrequentadooOrfeodeLeiriaeo
ConservatriodeCaldasdaRainhanaDisciplinadeguitarraclssicasem2007queiniciaa
construo
da
sua
primeira
guitarra.
Confessa
ainda
bem
que
assim
foi
pois
toda
a
bagagem
de conhecimentos que adquiriu permitiulhe formar bases para que as suas primeiras
experinciasfossembemsucedidas.
Filosofiadeconstruo
Orlando Trindade afirma que no apologista da aprendizagem meramente baseada por
tentativaeerro.
Apesar
de
ter
conscincia
de
que
sempre
que
se
constri
um
modelo
novo
e
7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2
26/48
GuitarraClssica 26
sem precedentes, que se pode aprender com os erros que este apresenta, prefere fazer
tentativassegurasemqueconsigapreveniraomximopossveisdefeitos.Paratal,defende
acimadetudo,umaboainvestigao,amaiscompletapossvel(quasedecarctercientfico),
baseadaentreoutrosaspectos,na leituradefontestcnicasentreasquaisdestacaoestudo
deconstruode JosRomanillos (famoso luthierMadrileno)eRobertBouchet (importante
luthierFrancs).Forammuitoteisvistoquejnomeencontravanumafasedeiniciantena
construodeinstrumentos.
Osmodelosque realizou at agora surgiramno seguimentodepedidospersonalizados,em
particular, ao nvel das dimenses. Vejase o exemplo de ter construdo uma guitarra com
comprimento de corda de 64,5cm (por divergncia aos normais 65cm) e neste momento
encontraseadesenvolverummodelocom66,8cm,devidosexignciasdosclientes.
Apesar de se encontrar
neste momento a
desenvolver um modelo
standard, considera que
difcil estabelecer medidas
que sejam universais e
ideais, defendendo que
paracadacomprimentode
cordapossveladaptaro
volume e forma da caixa
de ressonncia. O
conhecimento histrico e
retrospectivo dos
instrumentos antigos e da
sua evoluo, revelase
proveitoso na construo
das guitarras clssicas ao
nvel da aplicao de
tcnicasdeconstruoede
processosdeinvestigao.
Asmadeirasutilizadasnaconstruodeguitarrasclssicassooabetonrdico (PiceaAbies)
paraostampos,ocedrodasHonduras(CedrellaOdorata)parabraoecabea,banoafricano
7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2
27/48
GuitarraClssica 27
(DiospyrosCrassiflora)paraaescalaepausantodoBrasil (DalbergiaLatifolia)paraocorpo.
Para os barramentos interiores, que normalmente so feitos com cedro, Orlando Trindade
utiliza o mesmo PiceaAbies do tampo, procedimento que recorrente na construo de
instrumentosantigosmasqueaquiusadoejustificadopelassuascaractersticasdesermais
leve,maisresistenteemaisressonante.
OrlandoTrindadenotemporhbitoconstruiremsrie.Pornorma,osinstrumentosquefaz
sodesde inciodestinadosaumcliente.Otempodeesperadesdeaencomendaentrega
rondaos12mesesenofazqualquerexignciadepagamentopartida.
PerspectivaseopiniosobreaguitarraemPortugal
Sobreofuturo,OrlandoTrindademostraseoptimistaerefereaexplosodealunos inscritos
emguitarraclssicaportodoopas(noseguimentodasnovasreformasdoensinodaMsica).
Defendeque actualmenteexistemmais facilidadesaoestudodeum instrumentomusicale
que isso acabar por trazer
consequncias positivas para
os que esto envolvidos no
meio. Apesar de no existir
muita gente ligada
construo vo sempre
aparecendo pessoas com
valor()eaqualidadevaise
aperfeioando.
Contactos:
orlandotrindade@hotmail.com
CaldasdaRainha
http://www.orlandotrindade.com/
7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2
28/48
GuitarraClssica 28
NovasGravaesporTiagoCassolaMarques
No finaldo sc.XVIII,opintorespanhol FranciscoGoya
(17461828),
recm
nomeado
primeiro
pintor
da
corte
espanholaemMadrid,dinciocriaodeumadassuas
obrasprimas: uma srie de 80 gravuras com profundas
conotaes sociais, polticas e psicolgicas, a que deu o
nome de Caprichos. O impacto do carcter grotesco,
irnico, ou introspectivo deste conjunto no compositor
italiano Mario CastelnuovoTedesco (18951968) fezse
sentir na dcada de 50 do sc. XX, seleccionando 24
Caprichos para formar o corpus de uma no menos
monumentalsequnciadepeasparaguitarrasolo,semdvidaoinstrumentoidealizadopelo
compositorpara
atransmisso
desses
ambientes
to
simblicos
ecaricaturais,
quanto
cnicos
e intimistas. O repertrio de qualidade inequvoca, tecnicamente muito exigente e
completssimo.Tratasedepequenaspeascaractersticasaoinconfundvelestilopiansticode
Tedesco;comideiassubstancialmentesimples,desenvolvidascombomgosto,compequenas
subtilezas de articulao, baseadas em danas europeias, e numa linguagem formal
neoclssica tonal, apresentando pequenos quadros musicais de carcter muito diverso.
Sobressaema ironia,a levezaeogiocoso,bemcomoo ladograve, impetuosoeausterodas
suas composies.Kazuhito Yamashita, Lily Afshar e Frank Bungarten so alguns dosguitarristas que, antes de Dukic, se debruaram sobre a leitura deste colosso quase
intransponvel.
Mas
a
abordagem
proposta
pelo
guitarrista
croata
soberba.
Aliada
sua
tcnicaportentosa,musicalidadeeexpressividadeatestadaspelosseusinmerosprmiosnos
mais importantesconcursosdeguitarraeuropeus,ZoranDukicapresentasenestediscocom
um som belo e potente (resultante tambm da sua guitarra Daniel Friederich), uma
compreenso extraordinria do texto, com todas as texturas harmnicas evidenciadas, as
dinmicas, aggicas e articulaes bem sopesadas, a conduo das vozes muito clara, bem
comoodiferentecarcterquecadaestampapossui,tornandoaaudiododisconumafruio
permanente. Embora com opes discutveis num ou noutro Capricho (porque diversas de
outrasinterpretaesqueseguemumaleituramaisprximadapartitura),norestamdvidas
dequeDukicfazsobressairoseusentidodasproporeseasuaintuio,interpretandooraa
levezaeafria,
ora
aironia
eagravidade
presentes
na
riqueza
composicional
de
cada
Capricho.Para quem um amante de CastelnuovoTedesco, este certamente uma
monografiamuitobemconseguida,comrepertriosingulareraro,executadocomumnvel
extraordinrio,numdiscoduploaumpreoconvidativo.Aenriquecerodisco,estopresentes
no libreto interno a reproduo dos 24 pratos de Goya que inspiraram os Caprichos de
CastelnuovoTedesco,comnotasdocrticoGrahamWadeafazeraponteentreagravuraea
pearesultante.Seguramente,oprodutofinalaconcretizaodeumdosmelhoresdiscosda
colecodaNAXOSGuitarCollection.
MarioCASTELNUOVOTEDESCO,24CaprichosdeGoya,Op.195
ZoranDukic,
guitarra
Ref:Naxos8.57225253
7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2
29/48
GuitarraClssica 29
OMTHODEPOURLAGUITAREDEFERNANDOSOR(PARIS,1830)por
Ricardo
Barcel
1. Aspectos Biogrficos de Fernando Sor (17781839).
FernandoSorMontadas,tambmconhecidopeloseunomecataloFerranSorpeloseunome
debaptizadoJosephFernandoMacarioSor,nasceu,provavelmente,nodia13deFevereirode
1778emBarcelona.Aprendeuatocaraguitarra1eoviolinodesdeasuainfncia,evidenciando
grandes capacidades naturais para a msica. Pouco tempo depois de morrer o seu pai,
ingressouno
Mosteiro
de
Montserrat
onde,
durante
cerca
de
seis
anos,
esteve
integrado
no
coroenaorquestra,tendoaoportunidadedeentraremcontactocomintrpretesdediversos
instrumentos.Em1795abandonouoMosteiroparaseguiracarreiramilitar,jquenoestava
destinado,por influnciasfamiliares,aseguirumaprofissomusical.Noentanto,foiumdos
maiorescompositoresdemsicaparaoinstrumentohojeconhecidocomoguitarraromntica
ouclssicoromntica.
Porvoltadoanode1810,depoisdasinvasesfrancesasaEspanhaeduranteoreinadodeJos
Bonaparte irmo de Napoleo , Sor apoiou os ocupantes,jurou fidelidade ao regime e
chegou,at,a seroficialdasmilcias francesasemEspanha.primeira vista,a suaatitude
pode parecer pouco patritica, mas Sor, tal como Beethoven2, no tinha a perspectiva
histricaque temosactualmenteeviaNapoleo, igualmentequeoutros ilustrados, comoo
1Secalculamosotempo transcorridoentreaapariodasprimeirasguitarrasdeseisordensdasque
temosnotcias porvoltade1760 easprimeirasexperinciasdeSorcomoinstrumento,oqueteria
acontecidocercadoano1783,quandotinhaaproximadamentecincoanos,nosdumresultadode23
anos.Portanto,seriamprovavelmenteasguitarrasdoseuprogenitorguitarristaamadorasprimeiras
que a criana conhecera, talvez alguma guitarra tardobarroca, ou uma das relativamente recentes
guitarrasdeseisordens.Sabemosqueavoltadoano1780sevendiamemCatalunhaobras,taiscomo
asdeAntnioAbreuoportugus,paraguitarradecincoeseisordens,segundoas investigaesde
JosepMariaMangado,publicadasno livroLaguitarraenCatalua17691939.Tecla.Londres,1998.
AnexoN_1.
2 Beethoven dedicou a Napoleo Bonaparte a sua Sinfonia n3 emmi bemolmaior, apelidada de
Eroica, embora a dedicatria foi retirada posteriormente. A sua durao eramuitomaior do que
qualquersinfoniaescritaataquelemomento.
7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2
30/48
GuitarraClssica 30
salvador da Europa e no como a um dspota conquistador. Por outro lado, tal como foi
referido no captulo anterior, Paris no era s a capital da Frana, como tambm o plo
culturalmais importantedapocaealguns intelectuaiseuropeusvislumbraramnas invases
napolenicasapossibilidadedoprogressoculturalesocialdepasescomoEspanha.
Quando os franceses foram derrotados, as foras militares napolenicas retiraramse para
FranaeSor, identificadocomoafrancesado,noteveescolhaeviuseobrigadoaretirarse
comelas,juntocommuitosoutrosintelectuais,noano1813,paraevitarrepreslias.Instalou
seemPariseposteriormenteemLondres,comeandoumavidaitineranteportodaaEuropae
Rssia.Nodifcil imaginarqualfoiodestinodasobrasdeSoremEspanha.OexliodeSor
trouxecomo
consequncia
que
muitos
guitarristas
espanhis
s
soubessem
da
produo
musicaletericadeSoratravsderefernciasindirectas.
Noano1815teveumafilha
chamada Carolina e sobre a sua
esposa no temos dados. S
podemos referir que Sor enviuvou
poucotempo
aps
onascimento
da
filha.Nessemesmoanoestabelece
se em Londres, onde ganhou boa
reputao como compositor e
guitarrista, sendo verdade que
tambm chegou a ter fama como
professordepianoecanto.NestacidadeconheceuoluthierJosephPanormoeadquiriuuma
dassuasguitarras,construdasaoestiloespanhol.3
No ano 1819 comea uma intensa relao profissional e sentimental com Felicit Hullin,
bailarinadoTeatrodaOperadeParis;trsanosdepoisestreadonoTeatroRealdeLondreso
seu ballet Cenerentola, inspirado num conto de Perrault4. Em 1823 a mesma obra
3 Os instrumentos fabricados por Panormo e pelo construtor francs Lacte foram alguns dos
predilectosdeSor.
4EmfrancsCendrillon.ConhecidonospaseslusfonoscomoCinderellaouAGataBorralheira e
noshispano
falantes
como
Cenicienta.
O
conto
de
Perrault
(1628
1703)
possui
elementos
que
podem
considerarse reaccionrios, j que, como o destacam alguns autores, exalta valores da sociedade
Hotel Favart. Paris, 2007.
7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2
31/48
GuitarraClssica 31
representadanaperadeParis,sendoomaiorsucessoteatraldeSor5.Nomesmoano,viaja
para aRssia com a sua filhae com FelicitHullin contratada comoprimeirabailarinado
Ballet de Moscovo , instalandose neste pas, onde rapidamente obtm fama e
reconhecimento.DepoisdamortedoczarNicolauem1825edaimperatrizElisabeteem1826,
Sor ficou sem o apoio da famlia imperial; acabou tambm ento a relao com Felicit e
voltou a Paris, onde a sua merecida fama tinha sido consolidada merc da publicao de
diversas obras suas pelo editor Meissonnier. Na capital francesa publica o seu famoso
Mthode pour la guitare no ano 1830 e em 1835 escreve a sua autobiografia para
LEncyclopediepittoresque de Ledhuy. Vive em Paris os ltimos anos da sua vida, muito
prolficos no que refere sua produo musical, quase exclusivamente guitarrstica.
Permaneceualgum temponoHotelFavart6at oano1832,juntoa sua filhaCarolina,que
tinha
desenvolvido
uma
carreira
como
harpista e pintora. Depois mudouse para
um apartamento em March SaintHonor,
tambmemParis,ondemorouatamorte
deCarolina,noano1837.
Dois anos mais tarde, falece Fernando Sor
nodia10deJulhode1839.Foienterradono
Cemitrio
de
Montmartre,
onde
actualmente se pode visitar o seu tmulo
comodefuntoclebre.
patriarcal,onde
opapel
da
mulher
de
total
submisso
etm
singular
importncia
as
figuras
da
realeza.
Aapologiadesseselementos aparentementeanacrnicadepoisdaRevoluoFrancesa fazsentido
comoregressoaFranadadinastiaBourbon,representadapeloReiLusXVIII,nopoderentre1815e
1824, imediatamente depois da queda do Imprio Napolenico, que ainda defendia as ideias
monrquicastradicionais.
5AobratevetalrepercussoquefoiCenerentolaaprimeiraobracnicaqueseinterpretounoTeatro
BolshoideMoscovoem1825.
6Estehotelaindaexiste.EstsituadonaruaMarivauxN5, apoucosmetrosdaOperaCmicadeParis,
erelativamentepertodoTeatrodaOpera.Outrosclebreshspedesdomesmohotelforamopintor
espanholFranciscoGoyaeoguitarristaDionisioAguado.
Tmulo de Fernando Sor.
Cemitrio de Montmartre.
Paris, 2007
7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2
32/48
GuitarraClssica 32
2.OMTODOPARAGUITARRADEF.SORCerca do ano 1826, Sor comeou a escrever o seu prprio mtodo, que foi publicado
originalmenteem
lngua
francesa
em
Paris,
em
1830.
Posteriormente
foi
traduzido
para
alemo e para ingls.7 Jeffery afirma que apesar de existirem pelo menos seis verses
diferentesdeste livro averso francesa foianicaautorizadapeloprprioSor,aqualno
seria reimpressa at a nossa poca8. Depois de comparar a verso francesa com a inglesa
podemos comprovar que esta ltima que a mais difundida em todo o mundo e, em
especial, nos pases anglosaxnicos possui algumas pequenas diferenas em relao
original, no s no texto, ilustraes e exemplos musicais, como na sua estrutura, com as
imagensintercaladasnoslugarescorrespondentesenonofinaldolivro,comoaparecemna
versooriginal.
Uma verso modificada do Mtodo de Sor9
foieditadapelo guitarrista francsNapoleon
Coste (18051883),discpulodirectoe amigo
deSor.Narealidade,estapublicaoeraum
novomtodoqueincorporavaalgumasideias
seleccionadas
de
Sor
e
no
s
uma
edio
apenasrevistaporCostedomtodooriginal.
Dequalquermaneiraestelivrointeressante
porque,na sua introduo,Costeno s faz
7UmaversofrancoalemfoipublicadaporSimrockemBonnnoano1831eatraduoao inglsde
Arnold Merrick foi publicada em Londres por R. Cocks & Co em 1832. No ano 2008, o autor deste
trabalho,juntoaoguitarristaEduardoBaranzano,editaramemPortugal,comaeditoraLabirinto,a
primeirapublicaodoMtododeSoremidiomacastelhano.Em2010,MatanyaOpheepublicouuma
novaversoinglesadesteMtodo.
8 Jeffery, Brian. Ferrans Sors. Compositor i Guitarrist. Curial, Edicions Catalanes. Publicacions de
LAbadiadeMontserrat,1982.
9Coste,Napoleon.MthodecompltepourGuitareparFerdinandSor.ditionsHenryLemoine.Paris,
1880 (reimpressodoMthodedeGuitareparFerdinandSor.Schonenberger.Paris,1851).Os 26
tudespourlaguitare/parFerdinandSor,revues,classes,etdoigtesdaprslestraditionsdelauteur
parN.Coste,integradosnofinaldolivro,tmumparticularinteresseporque podemrevelarintenes
maismadurasdeSor,adquiridasporCostemedianteocontactodirectocomoautor.
Mthode de Sor (ed. Coste)
7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2
33/48
GuitarraClssica 33
uma crtica da atitude dos adversrios de Sor,mas tambm da reaco deste ltimo, que
lamentavelmente se reflecte no seu mtodo atravs de alguns pargrafos que deixam
transparecerumacargaemocionalnegativa,inadequadaaquemexerceolabordeeducador.
Essefacto,comoodeclaranaIntroduo,levaoaactualizaroMtododeSor,quemaistarde
foi traduzido para castelhano e conhecido popularmente como o Mtodo de Sor ou Sor
Coste. Isto ajudou a difundir o nome do seu autor e parte do seu trabalho didctico e
composicional,masocultoudurantevriosanosocontedooriginal, frutodeumparticular
contextohistrico,quedeulugaracertasmanifestaesdeSorquedesagradavamaCoste:
OsucessodestegrandeArtistano lhedeixouasalvodacrtica invejosa.Osproblemas
provocadosporcolegas ignorantesquenoocompreendiam,amargaramlheoespritoefoi
soba influnciadestasdesgostosas impressesqueescreveuotextodoseuMtodo,noqual
pareciaestar
mais
preocupado
em
responder
aos
supostos
ataques
que
creia
sofrer,
ede
devolverguerraporguerra,queemdesenvolveros seuspreceitosedeplosaoalcancede
todos.10
Vamosagoraanalisarottulodaobra,quepodesertraduzidoparaportuguscomoMtodo
paraGuitarra.Numfragmentodoreferidolivro,Sorconsideraqueosautoresnodeveriam
entender como sinnimos os termos mtodo, exerccios, lies e estudos, e define
Mtodo11daseguintemaneira:
Mtodo:
Tratado
de
princpios
raciocinados
nos
quais
se
apoiam
as
normas
que
devem
orientarasoperaes.12
MatanyaOphee,peranteestefacto,realizaasseguintesobservaes:
Comoum volumedediscussespedaggicas,o livropode vira iluminarnos sobrea
filosofia do compositor/educador. Usado juntamente com a matria musical contida nos
estudos,ofimpedaggicodecadaumadaspeassurgiria,supostamente,clarocomoagua.
Oupelomenosdeveria serassim.Adificuldade radicanofactodeomtododeguitarrade
FernandoSornoserummtododeguitarranosentidotradicionaldapalavra,apesardoseu
ttulo.
,
antes,
um
manifesto,
uma
tentativa
de
codificar
a
teoria
pedaggica
em
relao
10Ibidem.Pg.1.(Todasastraduessodanossaautoria).
11AprimeiraaceponoDicionriodaLnguaPortuguesa(PortoEditora.Porto,2000)definemtodo
comos.m.programaqueantecipadamenteregularumasequnciadeoperaesaexecutar,comvista
aatingircertoresultado;processotcnicodeclculooudeexperimentao;maneiraordenadadefazer
as coisas;modo de proceder; processo; feio, esforo para atingir um fim; sistema educativo ou
conjuntodeprocessosdidcticos;obraquecontmosprincpioselementaresdeumacinciaouarte;
ordem;prudncia;circunspeco(Dogr.mthodos,id,pelolat.methodu.id).
12Sor,Fernando.Mthodepourlaguitare.Pg.82.Paris,1830.
7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2
34/48
GuitarraClssica 34
tcnica aplicada, revelando ideias numa mistura de extravagantes exageros e bvias
contradies.Muitasvezesdifcil,atravsdeste livro,perceberexactamentequaisas ideias
de Sor relativas guitarra ea sua tcnica []o seumtodo no contm necessariamente
instrues ou regraspara realizar operaesprticas. Na verdade, expressa osprincpios
filosficosdoautor.13
Porconseguinte,desdeestepontodevista,estaobradidcticanopoderiaserconsiderada
um mtodo convencional, como outras obras intituladas da mesma maneira, por outros
msicosda suapoca.Noentanto, Sorachava que amaiorpartedestes trabalhoseraum
compndiodematerialquenoserainsuficienteparaaformaodeumintrprete,como,
aindapior,ocultavaoobjectivofinaldotrabalhodomesmo,vindoaserumobstculoparaa
compreenso global do binmio tcnica/msica por parte do estudante, tal como a sua
independnciademestrescomumaformaomaisprofunda:
Tenhovistoqueamaiorpartedosmtodoscomeamondeeuinicioaterceiraparte,sem
aprofundarminimamenteosassuntosqueintegramasduasprimeiraspartesdomeu[][]
achoqueumalunoficariamenosdesanimadolendooquedevefazer,guiandoseasiprprio
na ausncia doprofessor [] Se um aluno chegasse emmenos tempo aoponto em que
pudesseprescindirdassuaslies,oseuexemploanimariaosquehesitamcomearpelomedo
de se aborrecerem durante muito tempo comprincpios ridos e exerccios dos que no
percebem o verdadeiro objectivo. As normas transmitidas sem se apoiar na autoridade,
explicandoasrazespelasquaistmsidoestabelecidas,seriammelhorassimiladassefossem
recebidasatravsdapersuasoenosimplesmentememorizadas14
2.1.BASESFILOSFICASNa realidade, nomtodo de Sor se reflecte a filosofia do seu autor, que para sermelhor
compreendido deveria ser contemplado, segundo a nossa opinio, luz da domovimento
culturaleintelectualdaIlustraoouLuzes.
Segundooshistoriadores,aRevoluoFrancesade1789defineconvencionalmenteo fimda
IdadeModerna,
para
estabelecer
oincio
da
Idade
Contempornea.
Esta
tambm
foi
apoca
do florescimento de novos pensamentos filosficos e de grandesmudanas em todos os
13 Ophee, Matanya. Fernando Sor. The Complete Studies for Guitar. pg. 5. Chanterelle Verlag,
Heidelberg1997.
14Sor,Fernando.Op.cit.Pgs.35e36.
7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2
35/48
GuitarraClssica 35
campos,surgindoomovimentoconhecidocomoLuzesouIlustrao15,peloqueosculoXVIII
foichamadooSculodasLuzes.
FernandBraudelafirmaque:
Opresentedacivilizaodehojeessaenormemassadetempo,cujoamanhecerseria
assinaladopelo sculoXVIII e cuja noite no estaria aindaprxima. Por volta de 1750, o
mundo,comassuascivilizaesmltiplas,converteusenoobjectodeumasriedeagitaese
decatstrofesemcadeia (quenosoapangioexclusivodacivilizaoocidental).Nelanos
encontramoshoje16 []Heinrich Freyer afirmavaque aracionalidadeeraotrend17do
pensamentodooccidente.18
Para Braudel, a poca das Luzes no s um perodo histrico bastante delimitado, que
comummentedesignadodestamaneira,narealidadeumadastendnciasdefundo,talvez
amais
caracterstica
da
histria
europeia.
Paulatinamente,enodecursodeumsculo,vaisedesenvolvendoumanovaformade
conceberomundoquemarcaasuapresenaem todososcamposdosaber,dando
lugaraotpicopensamento racionalistada Ilustraoquesereflectenafilosofia,nas
cincias, na economia, nas letras e nas artes em geral. Em relao linguagem,
adoptaseumdiscursomaissbrioefuncional,ondeapalavradeixamenosmargem
paraos
equvocos.
2.2.SOREAILUSTRAO
Kant,noseuartigoRespostapergunta:queoIluminismo?19,escritoseisanosdepoisdo
nascimentodeSor,definiaaIlustraodaseguintemaneira:
O Iluminismoa sadadohomemda suamenoridadedequeeleprprioculpado.A
menoridadea incapacidadedeseservirdoentendimentosemaorientaodeoutrem.Tal
15Porvezes,omovimentodasLuzes temsidomalchamado Iluminismo,especialmenteemtradues
realizadas para portugus, e tambm para castelhano, de ingls ou de alemo: Enlightenment,
Aufklrung,oquepodechegaraconfundirasLuzescomomovimentodos Iluminados(Perfekbilisten)
doltimoquarteldosculoXVIII,comideaistotalmentediferentesdosIlustrados.
16Braudel,Fernand.HistriaeCinciasSociais.Pg.129.Ed.Presena.Lisboa,1990.
17Trend,umtermoinglsquesignificatendncia,inclinaooudireco.
18Ibidem.Pg.113.
19
Kant,Emanuel.
Beantwortung
der
Frage:
Was
ist
Aufklrung?
Prssia,
1784.
Verso
portuguesa
extradadolivro Apazperptuaeoutrosopsculos.Edies70.Lisboa,1989.Pg.11.
7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2
36/48
GuitarraClssica 36
menoridadeporculpaprpriaseasuacausanoresidenafaltadeentendimento,masna
faltadedecisoedecoragememseservirdesimesmosemaorientaodeoutrem.Sapere
aude!Temacoragemdeteserviresdoteuprprioentendimento!Eisapalavradeordemdo
Iluminismo20.
Dasdeclaraes
de
Sor,
no
incio
do
seu
Mtodo,
pode
inferir
se
que
Sor
pensa
que
amaior
partedosguitarristasseencontramnumestadoquepoderiaserconsideradodemenoridade,
ondepodemosverreflectidasalgumasdasideiasqueKantsustenta:
Aoescreverummtodo,spretendofalardosistemaqueusoparatocar,oqualtenho
estabelecido baseandome nas minhas reflexes e experincia. Aqueles que considerarem
algunsdosmeuspreceitos contraditriossprticasadoptadasatagoraporguitarristas
que,porcausadeumasubmissocegaeumrespeitoreligiosopelosseusmestres,tmseguido
as suas mximas sem examinar ofundo equivocarseiam vendo neles uma atitude de
oposio.21
AsduraspalavrasdeSordirigidasaosguitarristasdasuapoca:submissocegaerespeito
religioso,coincidemperfeitamentecomasreflexesdeKant22:
Apreguiaeacobardiasoascausasporqueoshomensemtograndeparte,apsa
naturezaosterhmuitolibertadodocontroloalheio(naturalitermaiorennes),continuem,no
entanto,deboavontademenoresdurantetodaavida;etambmporqueaoutrossetornato
fcil assumiremse como seus tutores. to cmodo sermenor. [] ,pois, difcil a cada
homem desprendersedamenoridadequepara ele se tornou quaseumanatureza.At lhe
ganhou
amor
e
por
agora
realmente
incapaz
de
se
servir
do
seu
prprio
entendimento,
porque nunca se lhepermitiufazer uma tal tentativa. Preceitos efrmulas, instrumentos
mecnicosdousoracionalou,antes,domauusodosseusdonsnaturaissoosgrilhesdeuma
menoridadeperptua.23
Sor,naConcluso,insistesobreomesmotema:
[] a submisso cega da razo degrada o esprito humano, e ainda muito mais
quandoestatemlugaraexpensasdosdogmasreligiosos.24
20Ibidem.Pg.13.
21Sor,Fernando.Op.cit.Pg.1.
22ConsiderandoqueomencionadoopsculodeKantsobreaIlustrao,doano1784,fuetraduzidodo
alemopara inglsem1798,pelotradutoringlsJohnRichardson,equeSorviveuemLondresapartir
doano1816,existeapossibilidadedequeoguitarristao tenha lidodurantea suapermannciaem
Inglaterraequeasideiastransmitidaspeloprestigiadofilsofo tenhaminfluenciadoassuasopinies.
23Kant,Emanuel.Op.cit.Pg11e12.
24Sor,Fernando.Op.cit.Pg.82(Conclusion).
7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2
37/48
GuitarraClssica 37
Oestudiosodascinciasoudasletras aquemKantchamaerudito teriaporvocaoepor
misso partilhar com os seus leitores, ouvintes ou estudantes, as suas indagaes e
questionamentos,assuashipteseseteses(sempreprovisriasepassveisdesubmeterse
crtica),assuasdvidaseincertezasperanteoterritriodosaberqueeleprprioinvestiga:
[]comoerudito,templenaliberdadeeatamissodeparticiparaopblicotodos
os seus pensamentos cuidadosamente examinados e bemintencionados sobre o que de
errneohnaquelesmbolo,easpropostasparaumamelhorregulamentaodasmatrias.25
PodemosencontrarclaramenteestaatitudeemSor:
Tenhosempreditoaosmeusalunosdecantoedeguitarra:Quandoeu lhesdisser
para seguir algum preceito, nunca acreditem, simplesmente, pela minha autoridade.
Perguntemme omotivo. Se eu no tiver capacidade suficientepara satisfazlos devero
diminuirmuito
aconfiana
com
que
me
honram,
em
benefcio
da
cincia26
[]
Peoao leitorqueexaminebemasminhas ideiasequenoascondene sem tlas
julgado.Possoenganarmeeerrarcomoqualquerpessoa,massigocomboafe,comotentei
demonstraro exposto, nopoderiaadmitirumaopinio contrria quenofossedefendida
atravsdeumademonstraoracional.27[]
Respeite opblico e no lhe entregue o brinquedo da sua ignorncia. Se tem a
obrigao de ensinar, siga um dos mtodos que provem que o autor tem raciocinado
correctamente28
Dopontodevistakantiano,eruditooindivduoquecolocaarealidade,metodologicamente,
soboolharcrticodadvida,sujeitandosesempreanovasindagaessobreosseusescritos,
sobreoscritriosquepautaramasua investigao,sobreas fonteseos recursosdequese
valeuparasustentarpublicamenteasuacredibilidade.
Sorapreciaaerudio,eeleprpriodeseja serumeruditono sentidoque falaKant,como
podemos apreciar atravs da leitura do seuMtodo, imbudo do esprito da Ilustrao. O
mestre
consegue
o
merc
das
explicaes
e
demonstraes,
embora
a
falta
de
clareza,
alguns
erroseamisturacomtemasheterogneos,alheiosaodomniotcnicoinstrumental,possam
criar,porvezes,umacertaconfusonoleitor.
25Kant,Emanuel.Op.cit.Pg.14
26Sor,Fernando.Op.cit.Pg.36.
27Ibidem.Op.cit.Pg.86.
28Ibidem.Op.cit.Pg.78(notaderodap).
7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2
38/48
GuitarraClssica 38
Voltando ao ttulo do livro de Sor, DellAra29 afirma que, de facto, como foi exposto
anteriormente,omsicocatalonoescreveuumMtodonosentidoestritodapalavra.No
seria uma compilao de materiais tcnicomusicais ordenados de maneira que possam
orientar o estudante para resolver gradualmente as dificuldades, tal como j tinham
apresentado outros guitarristas,mas sim um autntico Tratado, o primeiro da histria da
guitarra.30
Ophee,numartigo,teceoseguintecomentrio:
AverdadeiranaturezadomtododeSornofoicompreendidapormuitosestudiosos.
A razoestnofactoque simplesmentenoummtodocomoqual sepossaaprendera
tocaraguitarra.31
Perguntamonos:
qual
omtodo
com
que
se
pode
aprender
atocar
um
instrumento
musical
semumaatitudeparticipativa?
Oartigocontinuarealizandoumasriedeobservaessobreapsicologiadoautor,eatsobre
uma suposta parania que o leva a confrontarse com outros guitarristas da sua poca,
tornando complexa a leitura para o estudante que procura resultados imediatos. Riboni32
defendeaposiodeOphee,acrescentandoqueasargumentaesdeSorestoimpregnadas
deumaanimosidadeprpriadoespritderationalitdeumatpicaquerelleparisiense.Do
nossopontodevista,estasobservaespoderiamsercorrectas,masnodevemossubestimar
oescritornemesquecerque comoexpressoemvriaspartesdomtodo nodeixouestas
impressesdemaneira involuntriaou sem repararnaspossveisconsequncias,antespelo
contrrio.
Para a burguesia francesa, a guitarra era o instrumento namoda e tudo o que estivesse
relacionadocomelaeradeinteresse.Sorseguramenteimaginavaqueospotenciaisleitoresdo
seumtodoconheciampreviamenteoutraspublicaesdogneroquecontinhamtudooque
pudesse faltarnele,equemuitasdestasestavamdisponveis.Alis,nosltimosanosdasua
29DellAra,Mario.Metodi e tratatti. La chitarra.A curadeRuggeroChiesa.Pg.253.EDT. Torino,
1990.Pg.253.
30AprimeiraaceponoDicionriodaLnguaPortuguesa(PortoEditora.Porto,2000)definetratado
como:Estudoouobraescritasobretemacientfico,artstico,etc.
31Ophee,Matanya.Iltocoappoggiato.Precisazioneeargomentistorici.IlFronimo.SuviniZerboni.
Milo,1983.
32Riboni,Marco.FernandoSoreilMthodepourlaGuitare.Pg.389,emGsser,Lus.Estudiossobre
FernandoSor.EdicionesdelICCMU.Madrid,2003.
7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2
39/48
GuitarraClssica 39
vida,compsosestudosintrodutriosaoestudodaguitarraOp.60,conscientedanecessidade
deproveraosnovosestudantesdematerialadequado,aindadeixandoclaro naintroduoa
estesestudosqueportrsdessapublicaonohaviaumamotivaocomercial.
Sor,atravs
do
seu
livro,
quer
defender
os
ideais
dos
quais
est
plenamente
convicto,
que
pode apoiar com as suas virtudes composicionais e interpretativas e, ao mesmo tempo,
preencher um espao sobre o qual os guitarristas ainda no se tinham debruado. Nesse
sentido,cincoanosantesdapublicaodomtododeSor,elogiandoa suamsica,Aguado
tinhadito:
Mas,pela razodequeestamsica toboae tonovoomodode toclacomo
corresponde,serianecessrioummtodoqueaexplicasse.NoseiseSoroterescrito(pelo
menos no tenho notcias da sua publicao). Se isto se efectuasse, de mais nada
necessitariamosamadores.33
Existemartigos comoosquevimosanteriormente,deCoste,OpheeeRiboni nosquais
destacadoofortedesprezoquedemonstraSor,noseuMtodo,pelamaneiradeprocederde
alguns guitarristas profissionais, acusando acidamente alguns de ignorantes e outros de
comerciantes.Contudo,consideramosnecessrioequilibrarestasobservaes,jquetambm
nomesmolivro,SorfazumjulgamentopositivodaobradeguitarristascomoMoretti,Carulli,
Carcassie,especialmente,deAguado,cujosmtodoseestudostambmestavamvendaem
Parisnaqueles
anos,
eno
deixavam
de
ser
concorrncia
verdade que, impulsionado por um sentimento que no romantismo ser generalizado e
exacerbado, Sor ataca os guitarristas que no entregavam o melhor da sua capacidade,
compondo ou arranjando materiais para as massas vidas de comprar msica fcil,
considerandoosmercantilistas,talcomopodeversenaseguintecitao.
Em vez de estudar oMtodo do Sr. Carulli, desfigurar o seu textofazendo um
resumo,paraqueasuaobra,menosvolumosa,sejareputadacomomaissimples.Assimum
editortermenosdificuldadesparaacomprar34
Mas, em relao ao material didctico complementar do qual antes falamos, tambm
poderamos interpretar estas palavrasde Sor comoumamensagem indirecta que avaliza a
33Aguado,Dionisio.EscueladeGuitarra.Madrid,1825.Pg.1.
34Ibidem.
Pg.
77.
7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2
40/48
GuitarraClssica 40
utilizaodoMtododeCarulli,35especialmente tendoem contaque,no seuMtodo, Sor
assinaladirectamenteosduetosdeesteautorcomoobrasdeboaqualidade36.
2.3.PRECEITOSETEMASPRINCIPAIS.
Comopassar
do
tempo,
alguns
dos
preceitos
de
Sor
chegaram
aser
de
domnio
popular,
para
algunsdeorigemannima,eassumidosporumainfinidadedeprofessoresquelhesucederam.
Mas, em parte graas aos seus esforos, o estudo da guitarra actual abrange uma grande
bagagem de conhecimentos tericoprticos, pelo que merece o mais alto respeito e
reconhecimento.
EntreoamplolequedetemastocadosporSornoseuMtodoencontramse:
2.3.1.Construodeguitarras.Oferece
solues
alternativas
enomeia
alguns
luthiers
destacados
da
poca,
dando
informaodegrandeinteresseprticonasuapocaehistricohojeemdia.
2.3.2.Colocaodoinstrumento.Realiza uma propostade comodeveria situarse a guitarra em relao ao executante para
optimizar osmecanismos, criando uma comparao artificiosa com a postura habitual dos
teclistas:umpianistasentasefrenteaodcentraldopianoparadarasmesmaspossibilidades
deexecuoaambososbraos;apartirda,deduzqueametadedacordavibrantedaguitarra
deveriaficar
ao
meio
do
corpo,
sem
ter
em
conta
que
aguitarra
no
um
instrumento
simtricocomoopiano37.
2.3.3.UsodoTripodison.Na introduo da sua Fantasia ElegacaOp. 59 (1836), declara que o Trip de Aguado ou
Tripodisneraamelhorsoluoparaacolocaodaguitarraquando,noseumtodo,jtinha
35Carulli,Ferdinando.MthodeCompletteOp.27.Paris,ca.1811.
36 Sor, Fernando.Op. Cit.Pg. 79, nota de rodap: Certains duos de Carulli sont dunombre. Sor
recomendaosduosdeCarulliapesarde rivalizarcomele, tal comodestacaPaulSparks:Thewhole
op.48 is seen tobean ironiccommenton theeasyguitarmusic thatwasbeingproducedby rival
ParisianteachercomposerssuchasCarulli.Op.cit.Sparks,Paul,enGsser,Luis.Theguitarvariations
ofFernandoSor.Pg441.
37 Se tal teoria se aplicasse ao violino,o resultado seriaumaposio talvez similardo kemanch,o
kemenchedasiaMenor,instrumentodecordafriccionadadotamanhodeumpequenoviolino,quese
tocaapoiado sobreapernaesquerda,posturaque seadaptaaoestiloesnecessidades tcnicasda
msicafolclrica
dessa
regio,
muito
afastadas
das
do
violino
eda
msica
erudita
ocidental.
7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2
41/48
GuitarraClssica 41
explicitadoasuaexperimentaocomumamesaparaconseguiroapoioparaaguitarraea
posturacorporaladequados(noencontreinadamelhorqueprumamesaaminhafrente38).
Em relao a este ponto, Ophee sustm que Sor nunca usou este sistema de apoio numa
mesa,comosepodevernasilustraesdoseumtodo,porqueomusiclogobelgaFranois
JosephFtis,ouvinteeobservadoratentodosconcertosdeSor,nuncafeznenhumcomentrio
sobreesteaspecto.Se tivesseusadoumaposio foradonormal, tal factohaveriacausado
algumasurpresae,seguramente,Ftistloiaregistado.Paracorroborarestaideia,podemos
referirnosfrasedeAguado:
OsquetenhamouvidooSr.FernandoSor,recordaroquehabitualmenteapoiavaa
partecncavaE.F.daguitarra(lmina1)sobreapernaesquerda,e,sobreadireitaopontoH,
uniodasilhargas.39
Na nossa opinio, Sor queria dar outras sadas, estimular a imaginao dos guitarristas
apresentando novas possibilidades. No
consideramos que a sua ideia era enganar a
algum,emboratalvezquisesse,issosim,provocar
osinstrumentistas,incentivandoosabuscarnovas
solues, a pensar, a raciocinar livremente,
fomentando a sua maioridade no sentido
kantiano.A
tcnica
clssico
romntica
ainda
no
estava suficientemente estandardizada e no
havia uma vasta experincia nem estudos
profundos sobre ela, pelo que no podemos ver
comolhosdosculoXXIasvivnciasdeSor.Foiele
um dos pioneiros, tal como Aguado, um dos
precursoresdetodososnossosmestresactuais.
2.3.4.Posturascorporais.Faz uma observao crtica sobre as posturas mais habituais dos guitarristas italianos e
franceses,queconsiderapoucoergonmicasefuncionais,apoiandoseemexplicaesgrficas
egeomtricas.Sobreesteponto,nosvemosaproblemticadestaforma:
[Diferentesposturas] Sofuncionais sepermitem a realizao dasmanobras tcnicas
necessriasligadasaumcertoestilo,peloquenodeixamdeservlidasnestecampo,desde
38Sor,Fernando.Op.cit.Pgs.11e12.
39Aguado,Dionisio.Escuela deGuitarra.Pg.4.Paris,1820.
Aguado e o Tripodison
7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2
42/48
GuitarraClssica 42
que satisfaam os objectivos previstos. Um observador imparcial pode notar a falta de
naturalidade[ouno]naposiogeraldoinstrumentista,quepodeserevidenciadaretirandoa
guitarranoactodasuaexecuo.O instrumentopodeocultarou servirdejustificaopara
umaatitudecorporalincorrecta,comooobservouDominiqueHoppenot.40
2.3.5.Funcionamentodeambasasmos.Utilizaumaargumentaoquetemorigemnoseuconhecimentoemprico,emborabaseiaa
suademonstraoemestudosgeomtricos.Quandotratadaproblemticadamoesquerda,
introduz, entre explicaes puramente tcnicas, alguns relatos anedticos sobre as suas
experincias,durantedilogoscomoutrosguitarristas,maisprpriosdeumensaiobiogrfico
quedeummtodooutratado.
2.3.6.Colocaodopolegaresquerdo.Uma das questes que produziamaior atrito nas discusses com outros guitarristas era a
colocao deste dedo que, para Sor, nunca deveria actuar sobre as cordas, no diapaso,
recurso que era bem visto pormuitos guitarristas da sua gerao (em especial nas cordas
graves), entreeles os famososCarulli eGiuliani. Esta ideia no era original de Sor, porque
FrancescoMolino,janteriormente,noaprovavaousodopolegarcalcandoascordassobrea
escala, e famosa a guerra virtual deste ltimo com Carulli por este motivo. Sor,
curiosamente, no fala em nenhummomento deMolino,mas recomenda a colocao do
polegarnaparteposteriordomastro,formandoumanelcomodedo2.
2.3.7.Formadeatacarascordasequalidadedosom.Continua com as demonstraesmatemticas,mas tornasemais simples perceber a sua
intenoatravsdotextodoqueatravsdasilustraes,porvezesconfusas.
2.3.8.Efeitostmbricosecomposio.Apresentaumrecurso,emvoganapoca,daimitaodediferentesinstrumentos,mudandoo
timbremedianteotipodeataque ondeachatil,excepcionalmente,ousodepoucaunha ,
concebendo a guitarra como um instrumento no qual se podia realizar uma espcie de
orquestrao.Comoera tradicionaldesdeaantiguidade,entreosmsicosprofissionaisno
estavam ainda muito diferenciadas as categorias de instrumentista e compositor; pelo
contrrio, ambas estavam ligadas. Por este motivo, Sor d conselhos e exemplos para
conseguirosmelhores resultados, indicandoqueno suficienteameramudana tmbrica
paraconseguirumbomefeito.Paraestefim,aspassagensdevemestarescritasdeacordocom
osrecursosidiomticosdecadaumdosinstrumentosimitados.Nasuamsicanoaparecem
indicaes relativas s partes destinadas imitao instrumental, e ainda menos qual o
40Barcel,Ricardo.AdestramentoTcnicoparaGuitarristas.RealMusical.Madrid,2001.
7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2
43/48
GuitarraClssica 43
instrumento imitado. Istopodeseentendercomoumaprticadeixada livrementevontade
do intrprete,noobrigatria,oucomoconfiana,talvezporvezesexcessiva,nacapacidade
dediscernimentodosseusintrpretes.
2.3.9.Usodasunhas.TambmaquiseencontraumadasideiasdeSormaisdifundidasepiorcompreendidas,sobre
aexecuocomunhasqueagoratranscrevemos,pelasuaimportncia:
Nuncaouviumguitarristaquetocassedeumamaneirasuportvelseofaziacomunhas;
[]nosfortesouviasemaisorudodasunhascontraacordadoqueoprpriosomdacorda41
Destasmanifestaes,podededuzirsequeoqueSornoaprova,na realidade,noouso
dasunhas,masouso incorrectodelas,porquantomuitosguitarristas,aparentemente,ainda
notinham
encontrado
amaneira
adequada
de
produzir
um
som
limpo
ede
boa
qualidade
usandoasunhas.Porestarazo,tinhaalgunspreconceitosrelativosaestaprtica.Contudo,
quandoAguadotocouumacomposiodeSornasuapresena,disseaesserespeito:
Comalgumesforoconseguiutocarmuitonitidamentetodasasnotas.Eseasunhasno
lhepermitiamexpressardamesmamaneiradoqueeu,tocavacomumaexpressoquenoa
desvirtuavaemabsoluto42
Portanto,eapesardemanterassuasideias,nosecolocanumaposiofechada:noaprova
normalmente
o
uso
das
unhas,
mas
louva
Aguado
pelo
bom
uso
que
faz
delas,
deixando
implicitamenteocaminhoabertoparaosseguidoresdestemestre.
2.3.10.Conhecimentododiapasoedigitaodeambasasmos.Considerafundamentaloconhecimentoperfeitodasescalasmaioresemenores,paraorientar
a digitao, sendo as referenciasmusicaismais importantesque asmecnicas.A digitao
deveria ser guiadaapartirdospadres intervalaresdasescalasnasdiferentes tonalidades,
dandoespecial importncias terceiraseassextas.Para talefeito,destinauma importante
partedolivro,sendoateoriailustradacomnumerososexemplosprticos.
Chamaaatenoaausncia totalde referncias relativasao SistemaPosicionalaplicvel
moesquerdadenominadoPosio, talcomoerahabitualnosmtodosdestapoca, tendo
em conta a grande quantidade de elementos tcnicos referidos. Mas, por outro lado,desenvolveuma teoria de digitao, quer para asmelodias quer paraos acordes, baseada
41Sor,Fernando.Op.cit.Pg.22
42Ibidem
7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2
44/48
GuitarraClssica 44
fundamentalmentenadistribuiodas terceiraseas sextas,quedependentedaafinao
convencionaldaguitarraequepoderiafuncionarcomoalternativaaousodaPosio.
2.3.11.Movimentosdocotovelo.Destaca a importncia da colaborao dos movimentos do cotovelo para a adequada
colocaodosdedosdamoesquerda.Nosc.XX,estaimportanteideiaretomadaporAbel
Carlevaro, para desenvolver basicamente os conceitos de apresentao longitudinal e
transversaldamoesquerdaemrelaoescaladaguitarra.
2.3.12.Harmnicos.Neste
captulo
fica
em
evidncia
que
naquele
momento
aproduo
de
sons
harmnicos
ainda
noestava suficientementedifundidanemexplorada.Descreveminuciosamentea formade
produzirosharmnicosnaturaiseoitavados.Sor,noseumtodo,admitequepodefalharnas
suas observaes como bom Ilustrado , e de facto, chega a concluses erradas sobre a
origem dos harmnicos, ficando patente o seu desconhecimento dos pontos nodais e das
teoriasacsticassobreosharmnicos,desenvolvidasprincipalmenteporJ.Wallis(16161703,
J.Sauveur(16531706).)eD.Bernoulli(17001782).
2.3.13.Acompanhamentosetranscries.Comovimosantes,Sorconsideravaqueosguitarristasdeviamdominarnosainterpretao,
mastambmaspectosrelacionadoscomacomposio.Dsugesteseexemplosprticosde
comorealizardemaneiraadequadatranscriesperfeitamentefunci