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ATAS DO CONGRESSO INTERNACIONAL SABER TROPICAL EM MOÇAMBIQUE: HISTÓRIA, MEMÓRIA E CIÊNCIA IICT – JBT/Jardim Botânico Tropical. Lisboa, 24-26 outubro de 2012
__________________________________________________________________________________________________________________________ ISBN 978-989-742-006-1 ©Instituto de Investigação Científica Tropical, Lisboa, 2013
RAÇAS BOVINAS AUTÓCTONES DA ÁFRICA DO SUL – IMPORTÂNCIA NO ÂMBITO DA PECUÁRIA MOÇAMBICANA
ANDRÉ M. DE ALMEIDA, JOANA R. LÉRIAS e LUÍS ALFARO CARDOSO
IICT – Instituto de Investigação Científica Tropical. CVZ-FMV, Lisboa aalmeida@fmv.utl.pt
Resumo
A produção bovina representa um importante papel na economia da África do Sul. Esta fileira está assente em sistemas de exploração do tipo extensivo em que predominam as raças autóctones Afrikaner, Drakensberger, Bonsmara e Nguni, que actualmente se encontram espalhadas por vários países da África Austral como o Zimbabwe, o Botswana, a Namíbia e em especial Moçambique onde desempenham um papel muito relevante na recuperação do efectivo bovino daquele país. Este artigo de revisão visa sintetizar, a história, a caracterização racial e os dados produtivos destas raças no seu país de origem
Palavras-chave: Recursos genéticos, bovinos, África do Sul
*
INTRODUÇÃO
A produção bovina desempenha um papel extraordinariamente importante no contexto da pecuária da
África do Sul. Com efeito, segundo a FAO(s/a. 1998. “FAO Production Yearbook”, Roma.) estimam-se em
aproximadamente 14 milhões, o número de cabeças bovinas existentes naquele país. A variedade de raças
utilizadas é muito grande, existindo em 1998, vinte e oito associações de criadores(South Africa Stud Book
and Livestock Improvement Association (1998). South African livestock breeding 1998. Bloemfontein, África
do Sul.) englobando raças de vários troncos, como o europeu continental (Charolês e Pinzgauer), o britânico
(Hereford e Angus) ou o zebú (Brahman e Santa Gertrudis).
A maioria das raças provenientes de outras regiões que não a África do Sul, são no entanto de reduzida
expressão, excepção feita a raças bem adaptadas a climas tropicais como o Brahman, ou raças leiteiras de
expansão mundial como a Holstein-Friesland, que possuem efectivos bastante significativos. Grande parte
do efectivo no entanto, é constituído por raças autóctones excepcionalmente rústicas e muito adaptadas às
pastagens, doenças e parasitoses típicas destas regiões. A par da sua grande expansão na África do Sul, estas
raças encontram-se actualmente disseminadas por grande parte dos países limítrofes, como a Namíbia, o
Botswana, o Zimbabwe e a Suazilândia e em especial de Moçambique, onde desempenham um papel muito
importante na recuperação do efectivo bovino local, destruído em consequência da guerra civil (MACAMO,
2000).
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Este artigo possui como objectivo fornecer aos leitores lusófonos implicados na bovinotecnia da África
Austral, uma pequena introdução às quatro raças autóctones sul africanas (Afrikaner, Bonsmara,
Drakensberger e Nguni), no que diz respeito à sua história, origem, caracterização racial e produtiva.
ORIGEM DAS RAÇAS
A história da raça Afrikaner (também chamada de Afrikander), confunde-se com a do próprio país, estando
esta raça (ou os seus ancestrais) ligados à sua formação. Esta raça, terá como origem o gado selvagem
proveniente das estepes asiáticas, tendo sofrido posteriores cruzamentos com animais do tipo Bos indicus,
assim como raças europeias (South Africa Stud Book and Livestock Improvement Association, 1998. South
African livestock breeding 1998). De acordo com estes autores, estes animais terão atravessado a partir da
Arábia para o continente africano há cerca de 2000 anos, calculando-se que posteriormente tenham
migrado para o Sul, exercendo-se provavelmente uma forte selecção natural devido às doenças, parasitoses
e clima tropicais. Calcula-se que por volta de 1500 já haveria animais muito semelhantes aos esta raça na
zona do Cabo da Boa Esperança, tendo alegadamente sido avistados por navegadores portugueses, junto
das populações locais. A influência europeia, nomeadamente a portuguesa, poderá estar associada a esta
raça uma vez que as semelhanças fenotípicas entre o Afrikaner e o Alentejano são bastante grandes.
Quando os colonos de origem holandesa (Boers) se estabeleceram na zona do Cabo, calcula-se que tenha
sido este tipo de animais que tenham começado a utilizar, obtendo-os por comércio ou pilhagem das aldeias
africanas da região. À medida que a influência inglesa (meados do século XIX) se estendia às zonas
inicialmente ocupadas pelos Boer, iniciou-se o grande movimento de massas dos Voortrekkers em direcção
ao interior da actual África do Sul, formando-se as antigas Repúblicas Boers do antigo Transvaal (províncias
actuais do Gauteng, Mpumalanga, Northwest e Northern Province) e do Orange Free State, desempenhando
os Afrikaners um importantíssimo papel na medida em que eram bois desta raça que puxavam os pesados
carroções dos emigrantes, sendo este um facto bastante bem documentado, nomeadamente através de
fotografias e desenhos da época (South Africa Stud Book and Livestock Improvement Association, 1998.
South African livestock breeding 1998).
O fim do século XIX foi bastante catastrófico para a raça, uma vez que grande parte dos animais desapareceu
na sequência da grande epidemia de peste bovina que grassou por todo o continente. A guerra dos Boers
(1899-1902), provocada pela expansão inglesa em direcção às minas de Ouro e Diamantes de Kimberley
(província do Cabo Norte) e de Johansburg (província do Gauteng) entretanto descobertas, eliminou e
arruinou grande parte das explorações Boers, exercendo um forte efeito sobre a agricultura da região
nomeadamente a criação de gado, quase extinguindo os animais sobreviventes à grande epidemia de peste
bovina (South Africa Stud Book and Livestock Improvement Association, 1998. South African livestock
breeding 1998).
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O Afrikaner moderno terá origem nestes animais, tendo sido alvo de intensa selecção a partir de 1912, altura
em que se formou também a associação de criadores.
A raça Drakensberger, também conhecida como o Afrikaner negro, tem provavelmente a mesma origem da
raça afrikaner. Tendo, alegadamente, animais deste tipo racial sido avistados pela primeira vez por
europeus, aquando das viagens dos navegadores portugueses dos séculos XV e XVI, junto das populações
locais da zona do Cabo (South Africa Stud Book and Livestock Improvement Association, 1998. South African
livestock breeding 1998). Aquando das migrações dos Voortrekkers, estes animais terão igualmente sido
utilizados em tracção dos carroções, nomeadamente por famílias boer provenientes do Cabo que se
instalaram na cadeia montanhosa do Drakensberg, onde tomou a designação de vaderland cattle (gado da
mãe pátria). O melhoramento desta raça esteve a cargo de uma série de agricultores privados, tomando
inicialmente o nome de um deles (Uys Cattle) até ao fim da segunda guerra mundial, altura em que se
fundou a associação de criadores e o nome Drakensberger adoptado e oficializado.
A raça Nguni toma o nome do povo homónimo que migrou, juntamente com gado do tipo Sanga, do África
Central e de Leste, tendo atravessado o Rio Zambeze entre 600 e 700 DC, instalando-se na actual província
sul-africana do KwaZulu-Natal, assim como na Suazilândia e na zona Sul de Moçambique (South Africa Stud
Book and Livestock Improvement Association, 1998. South African livestock breeding 1998). Poderá ser
também designado por outros nomes como por exemplo “landim” ou Sul do Save (em Moçambique), Swazi
(na Suazilândia), Zulu e (Ba)Pedi na África do Sul (PAYNE e HODGES, 1997). A criação desta raça esteve
sempre associada aos nativos africanos. A este facto não terá sido alheio o facto de que a região do
KwaZulu-Natal só muito mais tarde ter sido incluída na colónia da África do Sul, motivado pela resistência do
império Zulu que impediu a instalação de colonos europeus na região. Só por volta da década de 30 do
século XX a importância desta raça, nomeadamente a sua rusticidade e resistência a doenças, foi
reconhecida pelas entidades oficiais e a sua criação promovida (South Africa Stud Book and Livestock
Improvement Association, 1998. South African livestock breeding 1998). É no entanto de destacar que a
associação de criadores comerciais desta raça apenas foi fundada em 1985, ao contrário dos dois casos
anteriormente mencionados, o que será possivelmente indicador da tardia tomada de interesse dos
agricultores de origem europeia por esta raça, motivada provavelmente por motivos culturais e pela criação
muito generalizada do Afrikaner.
A raça Bonsmara é, comparativamente aos três casos anteriores, de formação muito mais recente. Com
efeito trata-se de uma raça desenvolvida por J.C. Bonsma na estação zootécnica de Mara (dando a junção
destes nomes a designação da raça), no período 1936 – 1955 (PAYNE, W.J.A. e J. HODGES, 1997. “Tropical
Cattle, Origins, Breeds and Breeding Policies”, Oxford.). O desenvolvimento desta raça surgiu como resposta
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a uma necessidade de aumentar as produções de carne em zonas de savana, procurando-se melhorar uma
menor precocidade sexual do Afrikaner e reduzir as quebras de produção durante a época seca, exibidas
pelas raças do tronco britânico exploradas na África do Sul (South Africa Stud Book and Livestock
Improvement Association, 1998. South African livestock breeding 1998). Esta raça sintética possui assim
10/16 de sangue Afrikaner, 3/16 de Shorthorn e 3/16 de Hereford (PAYNE e HODGES, 1997). Foi reconhecido
como raça em 1956 e rapidamente se tornou uma raça de extrema popularidade junto dos agricultores
comerciais, estimando-se que em 1989 representaria cerca de 40 % do efectivo de carne naquele país (South
Africa Stud Book and Livestock Improvement Association, 1998. South African livestock breeding 1998). Para
tal terá certamente contribuído a quase ausência de problemas reprodutivos nos touros (por exemplo
prolapsos do prepúcio) que surgem com alguma frequência no Afrikaner.
CARACTERIZAÇÃO MORFOLÓGICA
No que respeita às características morfológicas das raças, em especial a côr da pelagem do animal, registam-
se duas realidades muito distintas: as raças mais importantes do ponto de vista comercial (Afrikaner,
Drakensberger e Bonsmara) são muito mais homogéneas do que as raças tradicionalmente mais ligadas a
sistemas de produção mais tradicionais ou de autosubsistência, como por exemplo a Nguni.
O Afrikaner (ver Fig. 1) é considerado uma raça grande e muito rústica. A pelagem é de côr castanha
avermelhada, surgindo com frequência animais com manchas brancas na zona ventral. A cabeça é comprida,
com orelhas pequenas. Os cornos emergem lateralmente crescendo para trás e para baixo. Possuem ambos
os sexos uma bossa cervico-toráxica, mais proeminente no macho do que na fêmea (PAYNE e HODGES,
1997).
O Drakensberger (ver Fig. 2) é igualmente uma raça grande e rústica evidenciando um dimorfismo sexual
muito acentuado. A pelagem é negra, a pele solta e pigmentada. Nesta raça, apenas o macho apresenta
bossa cervico-toráxica (PAYNE e HODGES, 1997).
O Nguni (Fig. 3) é uma raça de tamanho médio. A sua côr da pelagem varia do branco com orelhas negras
até negro com riscas brancas ou pequenas manchas brancas, vermelhas, castanhas, beges ou amareladas. A
pele é escura e pigmentada. A cabeça é comprida com orelhas pequenas. Os cornos são pequenos e em
forma de crescente nos machos e em forma de lira nas fêmeas. A bossa é cervico-toráxica, muito
desenvolvida nos machos e pouco visível nas fêmeas (PAYNE e HODGES, 1997).
O Bonsmara (Fig. 4) é uma raça grande, de pelagem castanha avermelhada e cornos médios. Nesta raça,
apenas o macho possui bossa cervico-toráxica (PAYNE e HODGES, 1997).
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Figura 1 - Novilho Afrikaner (Fotografia de André Almeida)
Figura 2 - Novilho Drakensberger (Fotografia de André Almeida)
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Figura 3 - Vaca Nguni, em primeiro plano, Free State central (Fotografia de André Almeida)
Figura 4 – Touro Bonsmara em exposição (Fotografia de André Almeida)
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Caracterização Produtiva
As produtividades das raças sul africanas podem ser extremamente variadas, mercê das condições de
exploração e do maneio alimentar a que os animais estão sujeitos. Existe uma bibliografia muito variada a
este respeito, reflectindo essa mesma variedade de sistemas produtivos, animais em estudo, etc, sendo
muito difícil fazer um estudo comparativo das produções das diferentes raças, partindo desses dados
bibliográficos.
As produções das várias raças sul africanas estão organizadas no designado “National Beef Cattle
Performance Testing Scheme” que regularmente emite relatórios com os resultados produtivos obtidos em
várias estações e explorações privadas a nível nacional (South African Journal of Animal Science, 1996, 26:
15-19), correspondendo a uma média nacional aceite como a da raça.
O Relatório de 1998 (BERGH e GERHARD, 1999) incluía o estudo de 28 raças existentes na África do Sul,
analisando-se nove classes de animais, dentro de cada raça, sendo a grande maioria animais de raças
autóctones, em especial a Bonsmara.
Com o intuito de se fazer uma caracterização mais simples das capacidades produtivas destas raças,
reproduzem-se sob a forma de gráfico (Gráficos 1 a 10), alguns dos resultados mais importantes do relatório
“National Beef Cattle Performance Testing Scheme” de 1998 para as raças Afrikaner, Bonsmara,
Drakensberger e Nguni. A título comparativo apresentam-se também valores obtidos pelas raças Brahman,
Charolês, Hereford e Simmentaler, assim como a média do total de animais analisados para as 28 raças.
No Gráfico 1 são apresentados os pesos ao nascimento de ambos os sexos. Como se pode ver, as quatro
raças autóctones possuem pesos ao nascimento da ordem dos 27 a 36 kg, inferiores aos registados pelas
raças do tronco europeu (acima dos 37 kg), mas semelhantes ao obtido por animais da raça Brahman. De
entre as raças autóctones, o Bonsmara é o mais pesado à nascença, seguido pelo Drakensberger, pelo
Afrikaner e pelo Nguni.
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O peso ao nascimento vai influenciar o peso ao desmame (ver Gráfico 2), onde o Bonsmara é mais uma vez o
mais pesado (216 kg), seguido do Drakensberger, do Afrikaner e do Nguni (respectivamente 200, 187 e 152
kg), sendo estes pesos no entanto inferiores aos verificados para as raças exóticas em análise. O Ganho
Médio Diário (ver Gráfico 3) é igualmente maior nas raças exóticas. O Bonsmara é a única raça autóctone
que regista valores superiores a 0,8 kg / dia, claramente superior aos valores do Drakensberger, Afrikaner e
Nguni (respectivamente 0,80, 0,75 e 0,71 kg / dia).
Gráfico 1 - Peso ao nascimento (Machos e Fêmeas)
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5
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25
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No que diz respeito aos pesos das fêmeas aos 12 e 18 meses (ver Gráfico 4), volta-se a verificar que as raças
autóctones apresentam menores pesos do que as raças exóticas. Com efeito, um animal de 18 meses de
raças exóticas apresenta um peso da ordem dos 240 (Nguni) a 320 (Bonsmara) kg, enquanto que rondará os
340 kg no caso da Hereford ou do Brahman e os 380 kg em raças como o Charolês ou o Simmentaler.
Como é explícito no Gráfico 5, a raça Bonsmara obtém uma das mais baixas idades ao primeiro parto (30
meses), inferior entre 4 e 5 meses aos valores obtidos pelas raças exóticas, com excepção da raça
Simentaller. Este valor é também inferior aos registados pelas restantes raças autóctones cujas idades ao 1º
Gráfico 2 - Peso aos 205 dias (Machos e Fêmeas)
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100
150
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Pes
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kg)
Gráfico 3 - GMD aos 205 dias (Machos e Fêmeas)
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0,2
0,4
0,6
0,8
1
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GM
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kg)
Gráfico 4 - Pesos aos 12 e 18 meses (Fêmeas)
0
50
100
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300
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Peso
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g) Peso 12 meses(Fêmeas)
Peso 18 meses(Fêmeas)
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Parto ultrapassam em média os 35 meses (36 meses para a Nguni e Drakensberger e 37 meses para a
Afrikaner).
O Intervalo entre partos (ver Gráfico 6) é, em todas as raças, superior a 365 dias, o que traduzirá uma grande
dificuldade em se obter 1 parto por ano, dadas as condições de exploração. Este parâmetro é indicador de
uma superioridade das raças Bonsmara e Nguni sobre as exóticas, com excepção do Hereford, na medida em
que apresentam os menores intervalos, indicando assim as vantagens da rusticidade destas raças. Os piores
intervalos entre partos são os obtidos pelas raças Afrikaner e Drakensberger (ambas 441 dias), justificando
Gráfico 5 - Idade ao 1º parto
0
5
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25
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Mes
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Gráfico 6 - Intervalo entre partos
360
370
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talvez as correlações negativas entre características reprodutivas e aptidão para a tracção para que estes
animais foram seleccionados.
No Gráfico 7 apresentam-se os pesos médios das vacas ao parto e ao desmame. Como se pode verificar e à
semelhança do observado para os pesos às várias idades anteriormente mencionados, as raças exóticas
possuem pesos superiores às raças autóctones sul-africanas. Dentro destas, a Bonsmara é a mais pesada,
seguida da Drakensberger, da Afrikaner e da Nguni.
As raças autóctones sul africanas registaram no entanto um maior aumento de peso proporcional no
período parto-desmame (ver Gráfico 8) o que poderá indicar uma maior capacidade de recuperação de peso
e consequentemente uma maior rusticidade e adaptação ao meio, na medida em que consegue amamentar
o bezerro e ao mesmo tempo aumentar de peso de uma forma mais eficiente do que as raças exóticas em
estudo, com excepção da Hereford.
Gráfico 7 - Pesos das vacas ao parto e ao desmame
0
100
200
300
400
500
600
700
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Bon
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kg
Peso Vaca ao parto Peso Vaca ao desmame
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Os Ganhos Médios Diários (GMD) e os Indices de Conversão (IC) em engordas intensivas em feed lot
encontram-se apresentados respectivamente nos Gráficos 9 e 10. Como seria de esperar, as raças exóticas
apresentam GMD superiores às raças autóctones, com excepção do Bonsmara que regista um GMD da
ordem dos 1618 , superior ao do Brahman e semelhante ao do Hereford, porém muito inferior ao do
Charolês e do Simmentaller. No que respeita às restantes raças sul africanas, a que tem maior GMD será o
Drakensberger, seguido pelo Afrikaner e pelo Nguni. Relativamente aos IC, é de destacar os melhores
resultados obtidos pelas rasças Bonsmara e Nguni, ligeiramente superiores aos valores do Charolês e
semelhante ao do Simmentaller. Os IC da raça Drakensberger são da mesma ordem do das raças Brahman e
Hereford, enquanto que a raça afrikaner alcança o resultado menos interessante (6,98).
0,00
1,00
2,00
3,00
4,00
5,00
6,00
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Gráfico 8 - Peso da vaca ao desmame em função do peso da vaca ao parto
0
200
400
600800
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14001600
18002000
g
Afr
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Bon
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Gráfico 9 - Ganhos médios diários de machos em engorda intensiva de 384 dias
5,6
5,8
6
6,2
6,4
6,6
6,8
7
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Bon
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Gráfico 10 - Índice de Conversão (machos em engorda intensiva de 384 dias)
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Uma análise dos resultados do “National Beef Cattle Performance Testing Scheme” coloca em evidência em
primeiro lugar, a menor dimensão das raças autóctones, face aos animais de raças exóticas. Estes resultados,
não traduzem no entanto uma menor produtividade na medida em que a menor dimensão destes animais
permitirá possivelmente maiores encabeçamentos e, consequentemente, semelhantes produtividades por
hectare, parâmetro esse que não está incluído neste estudo. O relatório apresenta no entanto algumas
características importantes que evidenciam a rusticidade das raças autóctones, em especial no que diz
respeito a características reprodutivas como o intervalo entre partos. Finalmente não são apresentados
quaisquer dados relativos a caracteres como a facilidade de parto ou taxas de sobrevivência dos bezerros o
que permitiria evidenciar a rusticidade e a adaptação às díficeis condições de exploração.
Outro dos aspectos não estudados no “National Beef Cattle Performance Testing Scheme” diz respeito às
características da carcaça. A este propósito será de referir os ensaios de Swanenpoel et al. (South African
Journal of Animal Science, 1990, 20: 180-187), que compararam uma série de características da carcaça para
as raças Afrikaner e Nguni a quatro pesos de abate diferentes. Os principais resultados deste estudo
encontram-se resumidos no Quadro 1.
Quadro 1 – Características da carcaça das raças Afrikaner e Nguni
Característica em estudo 290 kg de Peso Vivo 390 kg de Peso Vivo
Afrikaner Nguni Afrikaner Nguni
Massa da carcaça (kg) 159,00 164,50 220,26 237,56
Rendimento de carcaça (%) 60,47 63,23 63,31 66,46
Espessura GSC (mm) 2,77 3,30 5,73 3,53
Classificação (1 a 4) 3,20 3,40 3,60 3,80
% Músculo 67,43 68,77 68,58 66,00
% Gordura 18,11 16,47 17,35 19,32
% Osso 13,78 14,16 13,31 13,34
% GSC 4,72 4,11 5,77 4,76
% Carne total 86,22 85,84 86,70 86,66
GSC – Gordura Sub Cutânea
Fonte: Swanenpoel et al. (South African Journal of Animal Science, 1990, 20: 180-187)
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ATAS DO CONGRESSO INTERNACIONAL SABER TROPICAL EM MOÇAMBIQUE: HISTÓRIA, MEMÓRIA E CIÊNCIA IICT – JBT/Jardim Botânico Tropical. Lisboa, 24-26 outubro de 2012
__________________________________________________________________________________________________________________________ ISBN 978-989-742-006-1 ©Instituto de Investigação Científica Tropical, Lisboa, 2013
Como se pode verificar, ambas as raças tiveram resultados muito semelhantes quanto às características da
carcaça, sendo no entanto de destacar o maior peso de carcaça obtido pela raça Nguni, comparativamente a
animais do mesmo peso mas da raça Afrikaner o que conduz necessariamente a rendimentos de carcaça
superiores na primeira. É de destacar também a classificação da carcaça, em que os resultados, apesar de
muito semelhantes, apontam igualmente para uma superioridade da raça Nguni.
RESISTÊNCIA ÀS DOENÇAS TRANSMITIDAS POR CARRAÇAS
As doenças transmitidas por carraças constituem uma séria limitação à produção bovina na África Austral
(Tropical Animal Health and Production, 1993, 25:19-29.). Uma das características mais notável das raças
autóctones sul africanas é a sua capacidade de tolerância a doenças transmitidas por carraças. Este facto é
evidente em estudos como os de Fivaz et al. (Tropical Animal Health and Production, 1993, 25:19-29.), que
compararam, em animais da raça Mashona (uma raça autóctone do Zimbabwe) e cruzados de Sussex, a
resistência às carraças da espécie Boophilus decoloratus, sendo significativamente superior nos primeiros.
Estes dados coincidem com os de Fourie et al. (15 e 16) que determinaram maior resistência a Ixodes
rubicundus em animais Bonsmara, comparativamente à raça Frísia. Spicket et al. (The Onderstepoort journal
of veterinary research, 1996, 63: 19-23.) comparam a resistência a carraças Amblyomma hebraeum,
Boophilus decoloratus e Hyalomma spp. nas raças Nguni, Bonsmara e Hereford, estando a resistência
associada à quantidade de sangue Zebú (Nguni), seguindo-se o Bonsmara e finalmente o Hereford. Estudos
efectuados pelos mesmos autores (The Onderstepoort journal of veterinary research, 1989, 56: 245-250.)
relacionaram a maior resistência aos Ixodídeos com menores perdas de produtividade na raça Nguni.
Semelhantes conclusões foram alcançadas por Rechav e Kostrzewski (1991) que comparam a resistência a
Boophilus decoloratus em seis raças distintas, sendo menor no Simmentaller, seguido do Santa gertrudis, do
Bonsmara, do Afrikaner, do Brahman e do Nguni, estando mais uma vez a percentagem de sangue Zebú
associado à maior resitência às doenças transmitidas por carraças.
IMPORTÂNCIA DAS RAÇAS SUL-AFRICANAS NO CONTEXTO MOÇAMBICANO
Pelo que foi anteriormente descrito, é claro que as raças autóctones Sul-Africanas estão perfeitamente
adaptadas a sistemas de exploração típicos da África do Sul e facilemnte transponíveis para algumas zonas
de Moçambique. É igulamente claro que, não obstante o facto destes animais terem tido origem em
melhoramento de gado local, ocorrido durante a épocal colonial, muitas destas raças são elas próprias
semelhante ao gado existente em Moçambique. O facto dos seus níveis productivos serem relativamente
baixos por comparação com os do gado europeu seleccionado poderá constituir um problema. No entanto é
de destacar que os seus níveis productivos são superiores ao da maioria das raças autóctones, tendo ainda a
vantagem da adaptabilidade a algumas das dificeis condições locais, em especial a tolerância a doenças
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transmitidas por carraças. Neste sentido, é de destacar que estas raças constitutem uma importante
alternativa à importação de raças europeias não adaptadas às doenças e condições de exploração locais e
que é de toda a importância apoiar e incrementar a presença destas raças em Moçambique.
Este artigo é dedicado à saudosa memória de Luís Manuel Justino Schwalbach, insigne veterinário Luso-Moçambicano-Sul Africano
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