Post on 24-Jun-2020
Porque estãoa políticae os jovensde costas voltadas?//PÁGS.6-7
O que afastaos jovensda política?
Preguiça, descrença no sistemapolítico ou desinteresse? Porquese afastam os jovens da política?
MAFALDA TEIXO SILVA
mafalda. silvaCdionline.pt
Os jovens portugueses estão cada
vez menos interessados na vidapolítica, apontam a maioria dos
estudos realizados nos últimosanos. A taxa de abstenção aumen-ta, o desinteresse dos mais novosaumenta. Há aqui uma causaefeito? Apesar de ainda não havernúmeros recentes que legiti-mem esta possível relação, há
quem considere incontestável
que os jovens estão cada vezmais longe da vida política. E oPresidente da República é umdeles. Marcelo Rebelo de Sousa
pediu, este sábado, a todos os
partidos para se questionaremsobre os motivos que levam os
jovens portugueses a não que-rerem saber da política.
"Os responsáveis políticos têmde pensar o que é que está erra-do na forma de funcionamentodos partidos, na forma de fun-cionamento dos parceiros eco-nómicos e sociais, na forma defuncionamento dos sistemas,
para os jovens não perceberem,não se sentirem motivados, não
se sentirem empenhados, nãoterem um sentimento de per-tença", apelou o chefe de Esta-do na sessão de abertura da Con-ferência Mundial de MinistrosResponsáveis pela Juventude2019, em Lisboa.
Mas serão os partidos os ver-
dadeiros culpados deste afasta-mento? António Costa Pinto con-
sidera que a resposta não é assim
tão simples. Segundo o politó-logo, é verdade que existe um
genuíno desinteresse dos jovenspela política, mas "isso não é
passível de ser resolvido" pelospartidos. "Hoje diz-se que as for-
ças políticas têm de encontrarnovas formas de mobilizaçãojuvenil. O que nós detetamos é
que, independentemente de os
partidos chegarem aos jovensatravés do Instagram ou do Face-book, esses contactos não reme-tem para processos de politiza-ção. Por isso, essa ideia de queos partidos têm de se adaptaràs novas plataformas é falsa",assegurou.
O investigador de Ciência Polí-tica refere duas causas para afalta de participação eleitoraldos jovens: primeiro, "já nasce-ram em democracia e não sen-
tem nenhuma preocupação par-ticular em relação à mesma" e,em segundo lugar, "o ativismo
partidário está hoje, na maiorparte dos casos nos partidosestruturais do sistema, resumi-do a um processo de profissio-nalização política".
Contudo, António Costa Pintosublinhou que, ao contrário da
participação eleitoral, em rela-
ção ao ativismo político, exis-tem alguns partidos que mobi-lizam bastantes jovens. "Os par-
tidos nas margens do sistema,como o PAN, mobilizam ativis-mo político nos jovens porquesão partidos de causas ou mais
ideológicos que os tradicionais.Ou seja, permite uma maior par-ticipação de ativismo. Os parti-dos tradicionais, como são par-tidos de Governo, não conse-guem ter a mesma mobilizaçãoporque têm um modelo de ati-vismo pouco ideológico", argu-menta o politólogo, acrescen-tando que esta premissa é visí-vel do ponto de vista histórico:"Os partidos radicais têm maior
mobilização de juventude, sejamde extrema-direita, ecologistasou verdes", esclareceu.
Mas se para uns são os jovensque se fecham à participaçãoeleitoral, para outros é o siste-
ma quem lhes fechou a porta."Eu creio que é o grande artifi-cialismo na intervenção políti-ca que afasta os jovens", afirmaao i José Ribeiro e Castro.
Ex-líderes das
jotas admitem quepartidos não
conseguem atrairos mais jovens
57% dos jovensnão quer saber da
política, diz umestudo realizado
em 2015
O antigo líder do CDS acredi-ta que os jovens não se sentem
representados pelos partidospolíticos e que cresceram "numambiente de descrédito" da prá-tica da democracia. "Enquan-to os mais velhos, por força de
hábito, se calhar até vão votar,os mais novos não estão paraisso. Os jovens sentem que o
seu voto não faz a diferença.Não sentem que vão escolher
alguém que vai ser fiel às suas
promessas, que lhes vai pres-tar contas. Não sentem que vão
ter o seu deputado no parla-mento", apontou. Nesse senti-
do, José Ribeiro e Castro, doMovimento Por Uma Demo-cracia de Qualidade, defende
que a única solução para cap-tar a atenção dos mais novos
passa por reformular o siste-ma político. "Há uma petiçãona Assembleia da Repúblicamas as resistências são muitograndes", recordou.
INSATISFEITOS Duarte Marques,deputado do PSD e antigo líderda JSD, concorda com MarceloRebelo de Sousa e subscreve que"os partidos têm de olhar mais
para os jovens". Contudo, o social-
democrata não considera queos mais novos sofram de umaapatia política. Duarte Marquesjustifica o descontentamentodos jovens com o facto de serem"os principais prejudicados do
rumo que o país tem levado.Estão insatisfeitos com o siste-ma político e não toleram maiserros".
O deputado social-democratadefende ainda que a adaptaçãodos meios de participação elei-toral também pode ajudar a
reconquistar o voto das gera-ções mais novas. "Um jovemmais depressa vota online ouatravés de um sistema digitaldo que vai a uma urna".
Para além de a questão tecno-
lógica, Ivan Gonçalves, deputa-
do do PS, considera que os líde-res políticos são responsáveis
por chegar ao eleitorado e quetêm de fazer uma melhor apre-ciação do que são hoje as preo-cupações e expectativas de quemos elege. "Os partidos mais tra-dicionais, incluindo o PS, têmde olhar para os tempos de hojee para a forma como o mundofunciona e perceberem comodevem transmitir a sua mensa-gem", diz o cx-líder da JS.
abstenção No entanto, chegaraos mais novos parece uma metacada vez difícil de se alcançar.57% dos jovens não quer saberda política, avançou um estudo
patrocinado pela Presidência da
República, em 2015. "A absten-
ção marca a relação da juven-tude com a política", sustentouMarina Costa Lobo, investiga-dora e uma das responsáveispelo estudo.
Seja por conformismo, por fal-
ta de interesse ou por descrédi-to no sistema político, a falta de
participação dos jovens na horade ir votar sente-se em toda aUnião Europeia. Tendo em con-ta que os mais novos são geral-mente um dos maiores benefi-ciários das medidas da UniãoEuropeia é com estranheza que,muitas vezes, a opinião públicavê este fenómeno.
Só este ano, para as Europeias,28 milhões de jovens, entre os
18 e os 22 anos, puderam votar
pela primeira vez. De acordocom as primeiras previsões, ape-nas cerca de 7% desses novoseleitores se dirigiram às urnas.
Segundo o Parlamento Euro-
peu, os jovens são a faixa etáriacom uma participação mais bai-
xa. A instituição divulgou ainda
que a idade média de um euro-
deputado ronda os 55 anos,expressando a falta de jovenstambém enquanto atores polí-ticos.
"Há aqui umproblema queé universal (...)é bom queseja debatido"
Marcelo Rebelo de SousaPRESIDENTE DA REPÚBLICA
"É o grandeartificialismona intervençãopolítica que afastaos jovens. Quandohá causas que os
motivam, os jovensrespondem"José Ribeiro e CastroEX-PRESIDENTE DO CDS
"Até aconservadoraIgreja Católicase modernizoue se adaptou maisaos nossos temposdo que os partidospolíticosportugueses"Duarte MarquesDEPUTADO DO PSD
"A participaçãodos jovens napolítica e o seuafastamento sãoum temasrecorrentesdos políticosportugueses e,em particular, dosúltimos Presidentesda República"António Costa Pinto.potrrôLOGO
"Os partidos maistradicionais,incluindo o PS,têm de olhar paraos tempos de hoje e
para a forma comoo mundofunciona"Ivan GonçalvesDEPUTADO E EX-LÍDER DA JUVENTUDESOCIALISTA
Duarte MarquesDeputado do PSD
"Os partidos têmde olhar maispara os jovens"
Que razões levam os jovensa afastarem-se da política?Os partidos são um reflexo danossa sociedade. Por diversasvezes, o PSD e a JSDtentaram alertar para oafastamento dos jovens davida política. Chamo a atençãopara o período da crise
quando, nos finais de 2008,alertámos recorrentemente
para o facto de serem os mais
novos quem ia pagar mais
pelos os erros daquelageração. Não houvesolidariedade intergeracional.Como diz o Presidente, ospartidos têm de olhar mais
para os Jovens. E o facto denão o terem feito, nos últimos
tempos, é nítido hoje.
Não considera que existadesinteresse por partedos jovens?Os jovens têm interesse pelapolítica, mas foram os
principais prejudicados pelorumo que o país tem levado.Mas o problema não é só dapolítica. A política também não
pode ser o bode expiatório detudo o que acontece emPortugal.
O que pode ser feitopara atrair os jovens?Os jovens mais depressa têmsucesso nas empresas, nauniversidade ou na sociedadecivil do que nos partidospolíticos. Se calhar também é
preciso inverter isso. Tambémé necessário modernizar osmétodos de participaçãoeleitoral. Se fosse possívelvotar de uma forma digital, os
jovens iriam participar mais.Ainda é preciso ter em mente
que as gerações mais novasestão mais exigentes. Nãotoleram erros ou corrupção equerem viver numa cultura queprivilegie o mérito e não a lista
de contactos.