Post on 14-Dec-2018
PERCEPÇÃO AMBIENTAL E ENSINO DE GEOGRAFIA: TRILHANDO O
CAMINHO DE UM RIACHO URBANO EM DELMIRO GOUVEIA-AL.
Aline Alves dos Santos
UFAL-Campus do Sertão
Graduanda em Geografia
aline_s_15@hotmail.com
Kleber Silva Costa
UFAL-Campus do Sertão
Docente do curso de Graduação em Geografia
Kleberperfil@hotmail.com
Mayara Gomes Vieira
UFAL-Campus do Sertão
Graduada em Geografia
maisufalsertao@gmail.com
INTRODUÇÃO:
Este trabalho parte de uma discussão sobre a percepção dos estudantes do ensino
fundamental da escola Noêmia Bandeira da Silva, em relação à organização do espaço
urbano da cidade de Delmiro Gouveia-AL, frente ao processo de poluição do riacho
Caraibeirinha. Dentro dessa perspectiva, procurou-se desenvolver atividades de caráter
educacional, a fim de melhorar o processo de ensino-aprendizagem dos alunos e de
exercitar a iniciação à docência.
OBJETIVOS:
Este trabalho pretendeu ser um exercício de iniciação à pesquisa e à docência em
geografia com foco voltado à apreciação da percepção ambiental de estudantes do
ensino fundamental da escola municipal Noêmia Bandeira da Silva, situada na cidade de
Delmiro Gouveia, Sertão de Alagoas. Buscou-se, especialmente, uma aproximação
breve da temática da percepção ambiental e da problemática da poluição do Riacho
Caraibeirinha no tocante ao significado deste Riacho à reflexão ampla sobre a produção
da paisagem urbana delmirense. Aliado a tal enfrentamento, construiu-se uma proposta
de ensino de geografia a situar alunos da escola no contexto desta mesma reflexão e
através da confecção de relatos de experiências de leituras de paisagens na forma de
imagens-mapas mentais.
METODOLOGIAS:
Como pressuposto teórico-conceitual considerou-se, inicialmente, o espaço
urbano como fruto da relação entre a sociedade e a natureza, ao longo do tempo. Dessa
relação surgiu a possibilidade de realizar uma discussão sobre as categorias de espaço e
lugar que são fundamentais para averiguar a realidade local e fazer algumas leituras
envolvendo a cultura, a organização espacial, os modos de vida e o meio físico-natural.
Diante disso, coube-nos tratar de alguns conceitos pertinentes a esta categoria, a
fim de entender os lugares de vivência, construídos pelos valores simbólicos, afetivos e
pelas relações sociais e familiares.
Para isso, foram analisados alguns autores como Tuan (2013, p. 72), onde o
mesmo definiu lugar como sendo “O espaço fechado e humanizado é lugar [...]”
estabelecidos pelo caráter subjetivo, dando forma a “[...] um centro calmo de valores
estabelecidos. [...]”. Considerando-o como “[...] uma pausa no movimento [...] A pausa
permite que uma localidade se torne o centro de reconhecido valor. [...]” (TUAN, 2013,
p. 169). Com base nisso, podemos afirmar que os valores construídos pelo homem, ao
longo do tempo, se materializam no espaço e são caracterizados pelo caráter simbólico.
Pensando nisso, buscou-se estudar o sentido do lugar na geografia para entender
como o homem pode superar as adversidades naturais do lugar em nome do amor ao seu
lar, a sua casa, ao seu bairro e a sua cidade. Oliveira (2012, p. 15) abordou essa questão
afirmando “refletir sobre o lugar é refletir o seu sentido na geografia” mais adiante
estudou lugar na geografia como parte da “experiência, do habitar, do falar e dos ritmos
e transformações”. Nesse sentido, este trabalho se vinculou a estudar uma espécie de
moradia, onde o sujeito se adapta a condições precárias de habitação, resultando na má-
qualidade de vida oferecida pela cidade e pela falta de planejamento urbano. Sendo
pois, considerada hostil, na qual o sujeito se adapta e constrói sua história a partir da
convivência com a vizinhança.
Assim, com o uso e ocupação dos espaços, o sujeito inicia o processo de
modificação do meio natural, em prol das suas necessidades. Acarretando num processo
de poluição ambiental decorrente da ação do homem na natureza. Sob esse viés,
ressaltamos que o processo de povoamento das cidades vem modificando e alterando a
qualidade das águas de bacias hidrográficas. Mais especificamente nos rios, riachos ou
córregos quando atravessam o tecido urbano, transformando-os em grandes canais
receptores de esgotos e lixos.
[...] Os rios das cidades não são mais apenas caminho para as águas,
são também destinos de esgotos e lixo. Não são mais fontes de água
para o consumo nem de inspiração para canções e o azul foi trocado
por outras menos límpidas. (CARVALHO, 2011, p. 16).
Constatou-se, a partir desta leitura, que o riacho Caraibeirinha se tornou um
grande canal a céu aberto. Tendo em vista que este exerce duas funções: a natural e o
social, no qual, o homem utiliza o leito do riacho para coletar os esgotos domésticos.
Além deste problema, verificou-se a construção de residências muito próximas
ao canal, com construções irregulares resultando em um sério problema social. Dessa
forma, as comunidades ribeirinhas a essas águas contaminadas convivem diariamente
com o mau cheiro e presenciam o surgimento de animais, como os ratos e baratas.
Diante disso, desenvolvemos algumas atividades de caráter educacional com os
estudantes do 9° ano da escola Noêmia Bandeira da Silva, a fim de exercitarmos a
percepção desses estudantes. Anteriormente, foram coletadas as águas do riacho em três
pontos distintos que serviram de subsídio, na aula de campo, para orientação dos alunos
e identificação das áreas com maior poluição. Com isso, exercitamos a percepção
ambiental destes, com objetivo de despertar no aluno a compreensão de uma realidade
não vivenciadas por eles, embora os problemas da poluição dos recursos hídricos
estejam presentes em todos os trechos dos canais, dentro da cidade de Delmiro Gouveia-
AL.
Enquanto conceito, podemos afirmar com base em Tuan (2012, p. 30) que a
percepção é “uma atividade, um entender-se para o mundo”, ou seja, é um exercício
cognitivo que o sujeito realiza a partir da sua relação com o objeto, com o objetivo de
entender o seu entorno. Marczwski (2006, p.20) defendeu como sendo “uma atividade
mental de interação do indivíduo com o meio, que ocorre através de mecanismos
perceptivos propriamente ditos e, principalmente, cognitivos. ” Diante disso,
reafirmamos a importância e o ato de perceber os objetos que se transformam nos
lugares e se revelam através da paisagem. Tais objetos passam despercebido pelos olhos
daqueles que já vivenciam os espaços. Então, pensamos analisá-lo a partir da percepção
e do julgamento daqueles que não vivenciam esses lugares. Como disse Tuan (2012, p.
99) “O visitante, frequentemente, é capaz de perceber méritos e defeitos, em um meio
ambiente, que não são mais visíveis para o residente. ” Pensando nisso, coletamos
novos resultados que demonstram defeitos e qualidades, até então não percebidos.
As atividades foram divididas em três etapas. Na primeira, por exemplo,
discutiu-se alguns conceitos, como espaço vivido, mapas mentais, percepção ambiental,
rio/riacho/riacho urbano, lugar e ensino-aprendizagem. Na segunda, levamos os alunos
para conhecer o percurso do riacho Caraibeirinha ou canal. Esta atividade tinha um
caráter estritamente de observação e análise do lugar por meio da paisagem. Na terceira
etapa, realizamos uma atividade de mapas mentais como forma de avaliação.
Para a coleta das águas do riacho Caraibeirinha, utilizou-se uma sonda
multiparâmetros YSI Incorporated modelo 556. Quando imersa no meio líquido, a ser
avaliado, os resultados são obtidos de forma imediata através do display acoplado.
RESULTADOS PRELIMINARES;
Tendo o riacho Caraibeirinha se modificado, ao longo do tempo, e se tornado um
“esgoto a céu aberto”, tornou-se imagem central para a reflexão ora pretendida a
respeito da relação entre sociedade e natureza; recebe diariamente esgotos domésticos e
grande quantidade de lixo jogado pela população. Frente a esse processo, levamos essas
discussões para a sala de aula, considerando os conceitos já citados acima.
Num segundo momento, realizamos uma aula de campo com os alunos para
conhecermos o riacho Caraibeirinha, localizado no bairro Caraibeirinha. Com intuito de,
analisar o processo de contaminação das águas. Percebemos, inicialmente, algumas
características físicas do canal. Este é caracterizado por secções irregulares, pouca
vegetação, solo arenoso, ausência de infraestrutura e falta de iluminação. Assim,
procuramos desenvolver a percepção e os sentidos dos estudantes. Para isso, foi
solicitado que eles fechassem os olhos e dissessem qual outro sentido, além da visão,
seria possível diagnosticar a poluição do riacho. Em consenso, informaram-nos que
seria pelo olfato, devido ao mau cheiro.
Foto 1: Aula de campo nas proximidades do bairro Caraibeirinha.
Autoria: Haroldo Oséias de Almeida, Delmiro Gouveia-AL, 16/05/2014
Seguimos em direção ao bairro Novo. Este é caracterizado como um canal
retilíneo, paredes verticais moldados pela rocha, com um fundo concreto sem
acabamento, com pouca vegetação e um ambiente iluminado. No entanto, neste trecho,
predomina-se as construções de casas irregulares e muito próximas ao canal.
Foto 2: Aula de campo no bairro Novo. Autoria: Haroldo Oséias de Almeida,
Delmiro Gouveia-AL, 16/05/2014
Em seguida, os alunos conversaram com os moradores e puderam ter uma leitura
das histórias de vida dos mesmos, no sentido de conhecer um pouco o modo de vida dos
ribeirinhos.
Foto 3: Conversa com os moradores ribeirinhos do Canal no bairro Novo.
Autoria: Haroldo Oséias de Almeida, Delmiro Gouveia-AL, 16/05/2014
Posteriormente, seguimos em direção à avenida principal do bairro, onde os
alunos se acomodaram no banco da praça do bairro para uma leve apreciação do lugar.
Durante nosso diálogo, perguntamos se era mais agradável estar ali ou no bairro
Caraibeirinha. A resposta foi favorável ao bairro Novo. Além disso, analisamos a
paisagem para compreendermos a dinâmica do comércio, as residências e as vias de
acesso ao canal.
Foto 4: Aula de campo no bairro Novo.
Autoria: Haroldo Oséias de Almeida, Delmiro Gouveia-AL, 16/05/2014
Por fim, analisamos as características predominantes do bairro COHAB Nova,
onde as águas do antigo riacho Caraibeirinha desaguam no riacho Batoque.
Apresentando, pois, irregularidades no seu leito, poucas árvores e grama no seu entorno,
além de uma grande contaminação das águas, embora o ambiente possua um caráter
estritamente natural.
Foto 5: Encontro do riacho Caraibeirinha e Batoque no bairro COHAB Nova.
Autoria: Aline Alves, Delmiro Gouveia-AL, 17-01-2014.
Por último, realizamos uma atividade de mapas mentais para avaliarmos o
desempenho dos alunos como exercício complementar de fixação do conteúdo e
verificarmos como os alunos perceberam os lugares por onde eles passaram.
Foto 6: Mapa mental da aluna Bianca de 13 anos. A atividade foi realizada em 25 de
março de 2014, em Delmiro Gouveia-AL.
Ao longo da pesquisa buscou-se desenvolver, principalmente, dois sentidos para
constatarmos a poluição do riacho Caraibeirinha; foram eles: visão e olfato. No entanto,
para maior veracidade das informações expostas aos alunos, buscou-se subsídios
técnicos para averiguar a qualidade das águas através de análise química da água. Tal
realidade se expressou na contaminação do Riacho (Escolheu-se fazer uma identificação
de alguns pontos para coleta de dados sobre poluição do curso d´água: na primeira,
tivemos um PH de 5,6, um OD de 3,65 mg/l e um DQO de 192,25 mg DQO/L; na
segunda, tivemos um PH de 6,96, um OD de 1,59 mg/l e um DQO de 238,27 mg
DQO/L e na terceira obtivemos um PH de 6,69, um de OD de 1,63 mg/l e um DQO de
264,01 mg DQO/L). Dentre os resultados destacam-se os valores do OD (Oxigênio
Dissolvido), em que este indica o grau de poluição das águas por compostos orgânicos.
Verificou-se um alto índice de oxigênio no início do percurso; já no final ele é
consideravelmente baixo. Significa dizer que é impossível haver a presença de peixes
ou qualquer tipo de espécie que sobreviva do oxigênio nessas águas.
Foto 7: Coleta de água através da sonda multiparâmetros YSI Incorporated modelo 556.
Autoria: Aline Alves, Delmiro Gouveia-AL, 17-01-2014
A realização desse trabalho teve início a partir de um processo de investigação
envolvendo pesquisa e ensino em geografia que possibilitou importante experiência de
iniciação à docência. Ao longo da atividade, constataram-se alguns aspectos importantes
para empreendermos o trabalho de pesquisa e de ensino: a) pontos de poluição junto ao
Riacho Caraibeirinha se revelaram através do processo de monitoramento através da
sonda multiparâmetros (a revelar os pontos principais dos bairros Caraibeirinha, Novo e
COHAB Nova); b) a apreciação por parte dos alunos a revelar coincidências no que toca
a tais consciências de pontos e poluição ambiental. Tal atividade permitiu o
amadurecimento da questão ambiental como temática relevante ao processo de ensino-
aprendizagem em geografia.
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