Post on 09-Nov-2018
Dor pós AVCOmalgia do Hemiplégico Evidências
Inês Campos
Dor pós AVC
• Frequente – ¼ dos doentes
• Subdiagnosticada– Geralmente pouco reportada de forma espontânea
• Associada a – Declínio cognitivo e funcional
– Fadiga
– Menor QoL
– Depressão
– Preditor de suicídio
Dor pós AVC
• Etiologia multifactorial– Mecanismos centrais
• Neuroplasticidade maladaptativa
• Alterações somato-sensoriais
– Mecanismos periféricos• Inflamação local
• Edema tecidular
• Hipóxia
• Alteração da actividade osteoclástica
– Mecanismos autonómicos• Hiperactividade simpática
• Hiperactividade adrenérgica
– Factores psicológicos• Depressão, ansiedade
Dor pós AVC
• Factores de risco:– Idade mais avançada aquando do AVC
– Espasticidade
– Maior compromisso motor do MS
– Défices sensoriais
– AVC isquémico
– AVC talâmico e do tronco cerebral
Dor pós AVC
• Dificuldades no diagnóstico– Défices de linguagem
– Neglect
– Défices cognitivos
• Escalas de avaliação não específicas para AVC– EVA
– Numérica
– De faces
– Descritores verbais
– Indicadores não verbais
Dor pós AVC
• Dor nociceptiva
– Activação dos nociceptores Aδ e C em resposta a um estímulo lesivo
• Dor neuropática
– Processamento anormal no SNP/SNC
– Lesão ou disfunção neurológica
– Dor central pós AVC
• SDRC tipo 1
Omalgia pós AVC
Complexo Articular do Ombro
Articulação gleno-umeral
Articulação acromio-clavicular
Articulação esterno-clavicular
Articulação sub-deltoideia
Falsa articulação escapulo-torácica
Sequelas pós AVC
• 50% com hemiplegia
– 70% atingem capacidade de deambulação
– 50% ficam com membro superior não funcional
Omalgia do Hemiplégico
• Omalgia do hemiplégico (OH) após AVC varia entre 5 e 84%
• + frequentemente reportada como 70%
• Mais frequente a partir do 2º/3º mês pós-AVC
• Pode mascarar a recuperação motora
• OH associada a:– Redução da QoL– Menor recuperação funcional– Depressão– Perturbações do sono– Hospitalização prolongada– Menos altas para o domicílio
Factores de risco para omalgia nos primeiros 6 meses pós AVC
• Controlo motor voluntário comprometido
• Propriocepção diminuída
• Alterações sensitivas
• Fenómeno de extinção táctil
• Espasticidade dos flexores de cotovelo
• Limitação das AA de abducção e RE do ombro
• Alterações tróficas do MS
Outros factores de risco para OH
• Idade
• Patologia prévia do ombro
• DM tipo 2
• Tempo pós AVC
– 16 a 20% com dor imediatamente após o AVC
– Maioria leva semanas a meses
Etiopatogenia
• A etiopatogenia da OH não está bem estabelecida –multifactorial
• 4 fontes principais de dor:
– Instabilidade
– Atrofia e/ou espasticidade
– Alterações sensitivas/sensoriais
– SDRC tipo 1/síndrome ombro-mão
Etiopatogenia
• Factores neurológicos– Défices de força muscular
– Espasticidade
– Lesão plexo braquial/neuropatia periférica
– SDRC tipo 1
– Sensibilização central/dor central
• Factores biomecânicos– Subluxação GU
– Lesão coifa dos rotadores
– Artropatia
– Capsulite adesiva
– Trauma directo
– Dor miofascial
– Patologia cervical
Geralmente a etiologia da dor envolve uma combinação destes
factores
Subluxação
• Perda da integridade da articulação GU instabilidade
• Fase flácida inicial lesão por tracção– Distensão capsular + isquemia tendinosa (SE e LPB)
– Atenção aos posicionamentos/transferências
• Flacidez subluxação inferior
• Espasticidade subluxação anterior/posterior e RI
• Estudos controversos acerca da associação subluxação e omalgia– Nem todos os doentes com subluxação têm dor
– Nem todos os doentes com omalgia têm subluxação
• É prudente tentar evitar a subluxação
Espasticidade
• Hemiplegia flácida 18% com OH
• Hemiplegia espástica 85% com OH
• Subescapular (++), grande peitoral (++), grande redondo e grande dorsal > flexão, adução e RI
– Alteração do ritmo escápulo-umeral
– Predisposição para lesão mecânica da coifa dos rotadores
– Dificuldade nas AVD
– Estudos mostram que o bloqueio/libertação do subescapular diminui a dor
• Bohannon et al. (1986) e Zorowitz et al. (1996) – limitação da RE é um dos factores mais correlacionados com omalgia
• Subescapular limitação da RE
• Grande peitoral limitação da abducção > RE
Capsulite adesiva/Ombro congelado
• Restrição movimentos activos e passivos ao exame objectivo
• Dor inibição de movimento atrofia muscular de desuso + processo inflamatório local contractura resultante das aderências
• A espasticidade também é um factor de imobilização
• EBRSR: A espasticidade e o subsequente ombro congelado, são das causas mais prováveis de omalgia pós AVC
Lesão coifa rotadores
• Roturas da coifa na população geral: 20 a 40% incidência aumenta com a idade– Pré-mórbido?
– Pode ser assintomático
• Roturas da coifa nos hemiplégicos: 33 a 40%
• Factores de risco para conflito e rotura:– Posicionamentos/transferências incorrecto(a)s
– Desequilíbrio muscular causado pela fraqueza
– Desequilíbrio muscular causado pela espasticidade
– Quedas
– Uso de roldanas
Fraqueza muscular
• Fraqueza dos estabilizadores dinâmicos do ombro instabilidade
• Fraqueza dos músculos do pescoço e do tronco alterações posturais > subluxação anterior do ombro > conflito subacromial e tracção da cápsula articular
•Factores simultaneamente neurológicos e biomecânicos
Lesão nervosa periférica
• Lesão plexo braquial– Tracção nas transferências/subluxação
– Posicionamentos incorrectos no leito
• Mononeuropatias– Lesão nervo axilar
• Em contexto de subluxação inferior do úmero
• Não é consensual– 1 estudo com EMG de agulha: desnervação no SE e deltóide
– Outros estudos não demonstraram evidência de lesão nervosa periférica/do plexo braquial em associação à OH
Diagnóstico
• O diagnóstico etiológico é dificultado:
• pelo défice de força muscular
• exame objectivo de um ombro com referênciasanatómicas alteradas
• patologia prévia associada (traumática/degenerativa)
• ECD poderão ser úteis: Radiografia, Ecografia, RMN
O diagnóstico diferencial entre as inúmeras causas de ombro doloroso édifícil, pelo que se torna essencial o conhecimento dos mecanismos delesão, assim como dos procedimentos diagnósticos.
DiagnósticoHISTÓRIA CLÍNICA
SINTOMAS - Dor nociceptiva/neuropática
- Limitação funcional
- Edema distal do membro
EXAME OBJECTIVO
INSPEÇÃO - Assimetrias
- Amiotrofias
- Alterações vasomotoras (sudorese/edema
AMPLITUDE ARTICULAR ACTIVA/PASSIVA
- Limitações
TESTES “DO OMBRO” - Jobe, palm-up, testes de conflito, etc
PALPAÇÃO - Comparar com ombro contra-lateral
- Intervalo entre o acrómio e a cabeça umeral – Sinal do sulco ?
EX. “NEUROLÓGICO” - Reflexos
- Espasticidade
- Força muscular
- Coordenação
Síndrome de Dor Regional Complexa tipo 1 / Síndrome ombro-mão
SDRC tipo 1
• Síndrome ombro-mão
• Incidência: 12 a 48%
• Dificuldades no diagnóstico critérios inconsistentes– Dor desproporcional ao estímulo (alodinia, hiperalgesia)
– Edema fusiforme dos dedos (++MCF e IFP)
– Sudorese/Alterações vasomotoras
– Limitação das amplitudes articulares ombro, punho e mão
• Diagnóstico clínico critérios IASP
• Dor intensa limitação da mobilidade capsulite adesiva
SDRC tipo 1
• Critérios da IASP
– Alterações sensoriais• Dor espontânea, hiperalgesia (mecânica, térmica)
– Alterações vasculares• Vasodilatação/vasoconstrição, alterações da temperatura do
membro, alterações da cor da pele
– Edema, hiper/hipohidrose
– Alterações motoras e tróficas• Fraqueza, tremor, distonia, alterações coordenação
• Atrofia cutânea, alterações crescimento pêlos e unhas, rigidez articular
≥1 sintoma de ≥3 categorias
E
≥1 sinal de ≥2 categorias
SDRC tipo 1
• Etiologia desconhecida
• Sensibilização periférica: – Inflamação neurogénica
– Activação nociceptores da pele activação de mecanorreceptores que funcionam como nociceptores Amplificação
• Sensibilização central– Hiperexcitabilidade espinhal e
cortical
– Alterações dos mapas somato-sensoriais corticais
• Papel do SNA– As fibras simpáticas eferentes
activam nociceptores periféricos
– Sympathetically maintained pain
SDRC tipo 1
ESTADIO I :
Fase aguda ou pseudo-inflamatória
-Dor (+ MCF)
-Edema (+ mão)
-Pele brilhante
-Hipersudorese
-Aumento de temperatura
ESTADIO II :
Fase de estado ou atrófica
-Dor
-Vasospasmo e Cianose
-Alterações distróficas da pele
-Rigidez articular
ESTADIO III :
Fase sequelar ou distrófica
-Alterações tróficas da pele
-Rigidez articular
.Ombro congelado
-Desaparecimento da dor
-Desaparecimento alterações vasomotoras
SDRC tipo 1
• Exames complementares de diagnóstico
– RX do membro superior• Osteopenia periarticular
• 1 mês após os sinais clínicos
– Cintigrama OA• Aumento da captação periarticular (++ombro e punho)
• Alterações precoces relativamente ao RX
– Bloqueio simpático (gânglio estrelado)• Resolução temporárias das queixas com o bloqueio
• Diagnóstico é fundamentalmente clínico
Dor central
Dor central
• Dor neuropática (“Dor do hemicorpo”)
• Incidência: 8%
• 3 a 6 meses pós AVC
• AVC talâmicos; do tronco cerebral; corticais envolvendo o lobo
parietal; do hemisfério direito
• Sempre associada a lesão na via espinho-talâmico-cortical
– Alterações da sensibilidade termoálgica
– Sensibilidade táctil e vibratória pode estar conservada
• Desaferenciação + mecanismos de sensibilização central
Dor central
• Sintomas:– Dor em “facada” ou “queimadura” constante, com paroxismos
– Disestesias espontâneas ou evocadas
– Alodinia/hiperalgesia
– Distribuição concordante com o território da lesão cortical
• Geralmente é um diagnóstico de exclusão
• Pode estar combinada com outros tipos de dor
Tratamento
Tratamento
• Resposta geralmente insatisfatória
• Não há consenso relativamente ao melhor tratamento
– Etiopatogenia não está bem estabelecida
• Apostar na prevenção
– Suporte e protecção na fase flácida precoce
– Mobilização passiva suave precoce
Posicionamento
• Minimizar subluxação e contracturas/ombro congelado
• Mau posicionamento afecta simetria, equilíbrio, marcha e imagem corporal
• EBRSR: “A posição recomendada é a de abducção, RE e flexão do ombro”– Em que graus?
– Posição antiespástica
Suporte do ombro/Sling
• Uso controverso
• Pode facilitar sinergias flexoras pouco usados na fase espástica
– Uso alternado com exercícios terapêuticos
• Melhora por si só o equilíbrio/eficiência na marcha
• Parece ser o melhor método para suporte do MS flácido nas transferências/em posição ortostática– Evitar tracção nas transferências
Suporte do ombro/Sling
Cochrane (2005): “evidência insuficiente de que estes dispositivos previnam a subluxação do ombro pós AVC, diminuam a dor ou aumentem a função”
Suporte do ombro/Sling
• Várias possibilidades no mercado
– Slings
– Tabuleiros/Hemitabuleiros
– Apoio antebraço para CR
Cinesioterapia
• Mobilização articular activa é preferível
• Mobilização articular suave efectuada por terapeuta reduz a
dor na OH
– Evitar estiramentos agressivos/estáticos prolongados
• As roldanas podem agravar a omalgia sobretudo se
exercício acima dos 90º de elevação
• Fortalecimento ativo dos músculos da coifa dos rotadores e
estabilizadores da escápula é importante
Cinesioterapia
Estimulação Eléctrica
• Pode reduzir desenvolvimento de subluxação– Estudo em doentes agudos (>2 dias); SE e deltóide 10min 2x/dia;
estimulação galvânica pulsada de alta voltagem; internamento e tto durante 12 dias; avaliação radiológica admissão e alta
– Estudo durante 4 semanas em AVC subagudos com subluxação; SE e deltóide posterior 1h/dia, 5dias/semana; redução do ganho de subluxação; sem redução ROM e dor
• Pode melhorar a função– Estudo durante 6 dias em AVC subagudos com plegia flácida do MS; SE
e deltóide post 6h/dia; melhoria na função do MS e aumento do tónus
• Sem efeitos na dor
Estimulação Eléctrica
Os estudos não conseguiram mostrar efeito na redução da dor
(Paci et al. 2005): a intensidade ideal de tratamento seria de 6h/dia, 5 dias/semana durante 6 semanas, a frequências entre 35 e 50Hz
Os músculos mais importantes para a estabilidade GU são o SE e o deltóide posterior
Toxina botulínica
• Cochrane (2010):
– 5 RCT com omalgia pós AVC, poucos doentes e risco elevado de viés
– Redução da dor aos 3 e 6 meses
– Sem redução da dor após 1 mês• Atraso no início de acção?
Toxina botulínica
• Músculo subescapular é o mais injectado
• Músculo grande peitoral também é frequente
• Estudo com BTX intra-articular mostrou benefício (Castiglione et
al. 2011)
– Amostra pequena (n=5)
– Avaliação 2 e 8 semanas após injecção intra-articular de BTX-A
– EVA e ROM
– Correlação entre a injecção e a melhoria da dor
Infiltrações com corticóide
• Triamcinolona (Trigon Depot®)
Bloqueio nervo supraescapular
• 3 estudos publicados
• RCT, n=10, bloqueio vs US (5dias/sem, 4 sem)– Redução significativa no grupo do bloqueio supraescapular
• RCT, n=26, infiltração triamcinolona vs bloqueio– Redução semelhante da dor em ambos os grupos
• RCT, n=30, infiltração vs bloqueio vs infiltração+bloqueio– Redução semelhante da dor em todos os grupos
Massagem
Fármacos
• Dor nociceptiva– Analgésicos
– AINE
– Opióides
– Antiespásticos orais/toxina botulínica
– Infiltração com corticóide (corticoterapia oral)
• Dor neuropática– Tricíclicos
– ISRS
– Anticonvulsivantes (++gabapentina)
SDRC tipo 1 - tratamento
• Abordagem multifactorial
• Não há uma terapêutica mais eficaz e há pouca evidência na maioria das terapêuticas utilizadas
• Objectivos:– Redução da dor
– Manter amplitude articular
– Restaurar a função
SDRC tipo 1 - tratamento
PREVENÇÃO - Cinesioterapia passiva precoce (pain free)- Evitar subluxação
TRATAMENTO
FISIOTERAPIA- Cinesioterapia passiva e activa (pain free)- Termoterapia superficial/banhos de contraste- TENS- Técnicas de desensibilização periférica- Terapia espelho/Ideomotricidade
MEDICAÇÃO- Corticoterapia oral (++); infiltração - Analgésicos/AINE pouco eficazes- Antidepressivos tricíclicos- Anticonvulsivantes (gabapentina, carbamazepina)- Capsaícina tópica- Bifosfonatos
OUTROS- Bloqueio simpático (gânglio estrelado)- Simpatectomia
PSICOTERAPIA
Dor Central - tratamento
• Tratamento difícil e muitas vezes ineficaz
• Abordagem multimodal
• Fármacos– Antidepressivos tricíclicos
– ISRS
– Anticonvulsivantes (gabapentina e pregabalina)
• TENS
• Neuroestimuladores
• TMS
Conclusão
• A dor pós AVC é um problema frequente
• Muitas vezes negligenciado
• Comprometimento franco no processo de reabilitação
• Etiologia multifactorial
• Podem estar presentes simultaneamente vários tipos de dor
• Diversas etiologias podem explicar a mesma dor
• Tratamento geralmente complexo e muitas vezes ineficaz
• Importante tentar identificar a causa
• Tratamento deverá ser dirigido ao agente etiológico
• Desafio terapêutico
Referências
• http://www.ebrsr.com
• http://www.iasp-pain.org
• http://www.cochrane.org
• Vasudevan J, Browne B. Hemiplegic shoulder pain – an approach to diagnosis andmanagement. Phys Med Rehabil Clin N Am 2014;25:411-437
• Kalichman L, Ratmansky M. Underlying pathology and associated factors of hemiplegicshoulder pain. Am J Phys Med Rehabil 2011;90:768-780
• Viana R, Pereira S, Mehta S, Miller T, Teasell R. Evidence for therapeutic interventions forhemiplegic shoulder pain during the chronic stage of stroke: a review. Top Stroke Rehabil2012;514-522
• Benlidayi I, Basaran S. Hemiplegic shoulder pain: a common clinical consequence of stroke.Pract Neurol 2013;0:1-4.
• Harrison R, Field T. Post stroke pain: identification, assessment and therapy. Cerebrovasc Dis2015;39:190-201.