o Estranho

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O Estranho(1919)

“Podemos descobrir que significado veio a ligar-se à palavra “estranho” no decorrer da sua história; ou podemos reunir todas aquelas propriedades de pessoas, coisas, impressões sensoriais, e inferir, então, a natureza desconhecida do estranho a partir de tudo o que esses exemplos têm em comum (…) Direi, de imediato, que ambos os rumos conduzem ao mesmo resultado: o estranho é aquela categoria do assustador que remete ao que é conhecido, de velho e há muito familiar. Como isso é possível, em que circunstâncias o familiar pode tornar-se estranho e assustador é o que mostrarei no que se segue.”

“A palavra alemã unheimelich é obviamente o oposto de heimelich – o oposto do que é familiar, e somos tentados a concluir que aquilo que é estranho é assustador precisamente porque não é conhecido ou familiar. Naturalmente, contudo, nem tudo o que é novo e não familiar é assustador; a relação não pode ser invertida. Só podemos dizer que aquilo que é novo pode tornar-se facilmente assustador e estranho, algumas novidades são assustadoras, mas de modo algum todas elas. Algo tem que ser acrescentado ao que é novo e não familiar, para torná-lo estranho.”

O estranho passa a definir-se, então, como um conceito em psicanálise.

Freud relata sua experiência de estranhamento ao ver sua imagem no reflexo de um espelho no trem e se refere ao retorno de um recalcado na vida real.

Através da análise do conto literário O Homem da Areia de Ernst Theodor Amadeus Hoffman, Freud identifica o efeito de estranhamento como relativo a um retorno no recalcado [...] e destaca que a familiaridade percebida como estranha denota a estrutura mesma do recalque: esse intimo estrangeiro que nos habita, esse desejo que recusamos reconhecer como nos dizendo respeito, esse não querer saber o que inequivocamente se sabe.

O efeito do estranhamento resulta do reencontro com algo que não se havia perdido. Após a publicação deste texto, Freud inicia sua incursão por tudo aquilo que privilegia o que é inquietante e angustiante na subjetividade humana, amparado pela experiência clínica.

Segundo Seligman-Silva (2010), existe uma relação do mal-estar (Unbehagen), de Freud, com o Unheimlich. Freud ([1919] 1989) aponta: “‘Unheimlich’ é o nome de tudo que deveria ter permanecido secreto e oculto, mas veio à luz (Schelling)”. Aquilo que está recalcado retorna trazendo junto de si um familiar que causa mal-estar, pois estava oculto. Assim situa-se a relação entre o estranho e o mal-estar está no encontro com aquilo em si que lhe pertence no mais profundo e de lá retorna causando perturbação.

“Somos tan complicados, nosotros, tan llenos de misteriosos resortes, de resonancias secretas, de alianzas y hostilidades, de encuentros y desencuentros…Jugamos un ajedrez casi demoníaco y maravilloso.”

Julio Cortázar

An itinerant surgeon extracting stones from a man’s head; symbolising the expulsion of ‘folly ‘(insanity), they are surrounded by a group of people. Pencil drawing by Pieter Jansz Quast (1606-1647)

Em defesa de uma certa anormalidade

A normalidade não é um conceito psicanalítico

“A ideia que um sujeito faz de sua normalidade só pode ser estabelecida em relação a um conjunto de referências: normal em relação ao que? Aos olhos de quem? Quer nos julguemos ou julguemos a um outro normal ou anormal, estamos necessariamente nos referindo a uma norma”.

E no que se refere à sexualidade, existiria uma sexualidade normal?

Freud “Três ensaios sobre a sexualidade” (1905). Na problemática sexual o positivo seria a neurose e o seu negativo a perversão.

Claro que a sexualidade de hoje não é a mesma que da época de Freud, mas ele mesmo dizia que existia uma distinção entre a vida erótica na Antiguidade Clássica e na sua época. Os antigos glorificavam a pulsão sexual o que valorizava também o objeto, ao passo que o homem moderno idealiza o objeto, desvalorizando porém a pulsão.

Caso de Gabriel e caso de Pedro André

Um sintomático e o outro não sintomático

Carência executiva x carência afetiva (pg. 179)

Qual conduta está dentro da “norma”?

Se por um lado Gabriel acentua a importância da pulsão e do seu sintoma sexual, Pedro André coloca o acento no lado do objeto e identifica o sintoma a nível de suas relações objetais.

Podemos dizer que as preocupações sexuais de Pedro André estão estatisticamente dentro da norma. No entanto, é provável que a maioria dos analistas afirme que este paciente esconde, sob um aspecto aparentemente normal, sintomas ainda mais complexos que os de Gabriel.

Se tanto Gabriel, impotente, como Pedro André, incapaz de amar, podem ser tratados pela psicanálise não é pelo comportamento sexual deles, mas sim porque ambos se questionam (pg 179, segundo paragrafo)