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FACULDADES CEARENSES
CURSO DE SERVIÇO SOCIAL
SILVÂNIA TEIXEIRA DA SILVA
O ABANDONO E ABRIGAMENTO CONTEMPORÂNEOS: UM ESTUDO SOBRE A
REALIDADE SOCIAL DAS IDOSAS NA CASA DE NAZARÉ EM FORTALEZA-CE
FORTALEZA - CE
2014
SILVÂNIA TEIXEIRA DA SILVA
O ABANDONO E ABRIGAMENTO CONTEMPORÂNEOS: UM ESTUDO SOBRE A REALIDADE SOCIAL DAS IDOSAS NA CASA DE NAZARÉ EM FORTALEZA-CE
Monografia submetida à aprovação pela Coordenação do curso de Serviço Social da Faculdade Cearense - FAC, como requisito parcial para obtenção do grau de graduação. Orientadora: Ms. Luciana Sátiro Silva.
FORTALEZA - CE
2014
SILVÂNIA TEIXEIRA DA SILVA
O ABANDONO E ABRIGAMENTO CONTEMPORÂNEOS: UM ESTUDO SOBRE A REALIDADE SOCIAL DAS IDOSAS NA CASA DE NAZARÉ EM FORTALEZA-CE
Monografia como pré-requisito para obtenção de titulo de bacharelado de Serviço Social, outorgado pela Faculdade Cearense – FaC, tendo sido aprovada pela banca examinadora composta pelas (os) professoras (es). Data de aprovação: ___/___/___
BANCA EXAMINADORA
___________________________________________
Ms. Luciana Sátiro Silva (Orientadora)
___________________________________________
Professora Ms. Ivna de Oliveira Nunes
___________________________________________
Ms. Samara Hipólito da Conceição
Dedico este trabalho ao meu avô
Francisco Cicero Teixeira que nos deixou há um ano e oito meses. Vô sempre terá meu amor e minha admiração!
AGRADECIMENTOS
Tenho muito a agradecer a todos que estiveram ao meu lado no processo
desta elaboração. Primeiramente a Deus que me deu forças para lutar todos os dias,
foi e é minha inspiração para seguir em frente.
Agradeço a minha família, que sempre esteve ao meu lado torcendo por mim.
Sinto por todos um amor incondicional.
À minha mãe, Maria de Fatima Teixeira, uma guerreira que me fez através de
seus ensinamentos, um ser humano forte e digno. Meu exemplo de dedicação.
Ao meu pai, Francisco Ferreira que com sua alegria e leveza me fez levar a
vida com mais tranquilidade, me fazendo sorrir com suas palavras e tornando esse
processo de construção do TCC o mais leve possível. O admiro por sua dignidade
impar.
À minha irmã Maria Silvanêis Teixeira que sempre me acolheu, que nem por
um instante me deixou desistir de meus sonhos. Ser humano de uma bondade
incrível, que extraiu de mim uma admiração sem tamanho.
Ao meu noivo Alisson Morais que esteve comigo desde o principio, que me
incentivou a ingressar e concluir a graduação, que me apoiou e me apoia em tudo,
foi meu porto seguro, não teria enfrentado todas as dificuldades se ele não estivesse
ao meu lado.
Á minha estimada e querida orientadora Luciana Sátiro Silva que foi de
fundamental importância para a construção desse projeto, me guiou em todo o
processo do TCC.
A todos os docentes da Faculdade Cearense (FAC), pois sem eles nada disso
seria possível.
A banca examinadora que se disponibilizou a participar desse processo final
de conclusão do curso, com suas contribuições para um aperfeiçoamento futuro
dessa pesquisa.
Aos discentes da FAC, que passamos todo o processo de faculdade juntos
em uma parceria que se transformou em uma grande amizade, em especial a Tânia
Rocha, Juaniza Abreu, Chalisneide Xavier, Natasha Santos, Ana Lúcia de Jesus,
Sarah Alencar e Joelma Santos.
À minha técnica de estagio Ana Paula Cavalcante, assistente social do Fórum
Clovis Beviláqua. Profissional de uma competência inestimável e de uma
importância impar na minha vida como estudante e sem dúvidas como profissional.
À Casa de Nazaré e a Assistente Social do abrigo, que contribuiu a respeito
das idosas e nas informações do abrigo e a todos que fazem parte dessa casa, em
especial às idosas que contribuíram para essa pesquisa.
Á todos a minha eterna gratidão e meu muito obrigada.
“No mundo o falso e o verdadeiro se confundem mais os que
sabem jamais se iludem, não é fácil encontrar o caminho mais
é bom olhar pro lado e ver que eu não estou sozinho”.
(Chorão).
RESUMO
A presente monografia teve como objetivo central pesquisar quais as circunstâncias que levaram as idosas da Casa de Nazaré à situação de abrigamento e abandono familiar. Para que fosse possível compreendermos os motivos que levaram as idosas a institucionalização foi necessária elegermos categorias teóricas para discutirmos de uma forma mais especifica a problemática. A metodologia utilizada foi à pesquisa de campo, com abordagem qualitativa e as seguintes técnicas: observação participante e entrevistas semi-estruturadas, para a coleta dos dados. Ao tratarmos os dados chegamos à conclusão que muitas são as circunstâncias que levam as idosas a Casa de Nazaré. Percebemos que há idosas institucionalizas por conta própria e outras por abandono familiar, mas todas trazem marcas das adversidades da vida. As questões familiares apresentam naturezas diversas e situações imprevisíveis. Podemos mudar o passado dessas idosas? Não, não podemos, o que está ao nosso alcance é reproduzir, ampliar, melhorar e aperfeiçoar abrigos como a casa de Nazaré. Outro achado no contato do campo foi observado o esforço e a dedicação da casa de Nazaré em proporcionar serviços de qualidade para suas idosas, um ambiente com boa organização e com diferentes atividades, dentre elas voltadas para a saúde e bem estar das institucionalizadas. Mesmo com toda essa dedicação e trabalho constante em manter o abrigo sempre qualificado em receber, acolher e cuidar, muitos são os desafios da Casa de Nazaré, tendo como principal, a inconsistência do recebimento de recursos financeiros, pois necessitam da participação da sociedade, Estado e família para se manter e atender as demandas desse fenômeno tão crescente no Brasil. Analisando todo o contexto que envolve o abrigo observamos a necessidade de atenção por parte do poder público para atender a população idosa, especificamente as participantes da nossa pesquisa, para o melhor funcionamento do abrigo, maior contratação de profissionais, continuidade e melhoria na prestação de serviços como um todo. Palavras Chaves: Família. Políticas Sociais. Idoso. Institucionalização.
ABSTRACT
This monograph aimed mainly at research what the circumstances that made the older of the Nazareth House to the situation of shelter and family abandonment. So that they could understand the reasons why elderly institutionalization was necessary elect theoretical categories to discuss a more specific way the problem. The methodology used was to field research with a qualitative approach and the following techniques: participant observation and semi -structured interviews to collect data. In addressing the data we conclude that there are many circumstances that lead the elderly to Nazareth House. We realize that there are older institucionalizas on their own and others by family abandonment, but all bear marks the adversities of life. Family issues have diverse and unpredictable situations natures. We can change the past these older? No we can not, which is within our reach is to reproduce, enlarge, improve and enhance shelters as the home of Nazareth. Another finding in the contact field is subject to the effort and the dedication of the house of Nazareth to provide quality services for their elderly, an environment with good organization and with different activities, among them focused on the health and well being institutionalized. Even with all this dedication and constant work to keep the always under qualified to receive, accept and care , many are the challenges of the Nazareth House , the main , the inconsistency of receipt of funds , since they require the participation of society, State and family to stay and meet the demands of this growing phenomenon as in Brazil. Analyzing all the context in which the shelter has a necessity of attention from the government to meet the elderly population, specifically the participants of our research for the best under operation, most hiring professionals, continuity and improvement in service delivery as a whole. Key Words: Family. Social Policy. Elderly. Institutionalization.
LISTA DE GRÁFICOS
GRÁFICO 1: Idade das idosas entrevistadas institucioalizadas na Casa de Nazaré -
2014 .......................................................................................................................... 29
GRÁFICO 2: Nacionalidade das idosas entrevistadas institucionalizadas na Casa de
Nazaré - 2014 ............................................................................................................ 29
GRÁFICO 3: Estado Civil das idosas entrevistadas institucionalizadas na Casa de
Nazaré - 2014 ............................................................................................................ 30
GRÁFICO 4: Escolaridade das idosas entrevistadas institucionalizadas na Casa de
Nazaré - 2014 ............................................................................................................ 32
GRÁFICO 5: Filhos das entrevistadas institucionalizadas na Casa de Nazaré - 2014
.................................................................................................................................. 33
GRÁFICO 6: Idosas aposentadas entrevistadas institucionalizadas na Casa de
Nazaré - 2014 ............................................................................................................ 34
GRÁFICO 7: Anos de institucionalização das idosas da Casa de Nazaré - 2014 ..... 35
LISTA DE FIGURAS
FIGURA 1: Projeção da proporção da população de 60 anos ou mais de idade,
segundo o sexo – Brasil – 2000- 2020. ..................................................................... 61
FIGURA 2: Ceará: localização espacial das instituições de longa permanência para
idosos por Munícipio – 2007- 2008. .......................................................................... 70
FIGURA 3: Ceará: proporção de residentes nas instituições de longa permanência
por sexo segundo o grau de dependência – 2007- 2008. ......................................... 71
FIGURA 4: Ceará: distribuição proporcional das instituições de longa permanência
segundo o número de residentes – 2007- 2008. ....................................................... 72
FIGURA 5: Ceará: distribuição proporcional das isntituições de longa permanência
segundo a natureza -2007- 2008. ............................................................................. 73
FIGURA 6: Ceará: número e distribuição proporcional de isntituições de longa
permanência por ano de início de funcionamento – 2007- 2008. .............................. 74
FIGURA 7: ceará: distribuição proporcional das isntituições de longa permanência
segundo serviços oferecidos dentro da ILPI – 2007- 2008. ..................................... 75
FIGURA 8: Ceará: composição percentual do financiamento das instituições de
longa permanência – 2007- 2008. ............................................................................. 76
FIGURA 9: Ceará: tipos e formas de parceria ou convênio – 2007- 2008. ................ 77
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
BPC – Benefício de Prestação Continuada
CAP – Caixas de Aposentadoria e Pensão
ESTÁCIO- FIC – Faculdade Integrada do Ceará
FAC – Faculdade Cearense
IAP – Institutos de Aposentadoria e Pensões
IAPB – Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Bancários
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IFCE – Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia
ILPI – Instituição de Longa Permanência Para Idosos
INAMPS – Instituto Nacional de Assistência Medica da Previdência Social
INPS – Instituto Nacional de Previdência Social
IPEA – Instituição de Pesquisa Econômica Aplicada
LOAS – Lei Orgânica da Assistência Social
LOPS – Lei Orgânica da Previdência Social
LOS – Lei Orgânica da Saúde
PMAS – Planos Municipais de Assistência Social
PNAS – Política Nacional de Assistência Social
PNI – Política Nacional do Idoso
SAMDU – Serviço de Atendimento Médico Domiciliar de Urgência
SENAC – Serviço Nacional de Aprendizagem do Comercio
SENAI – Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial
SESC – Serviço Social do Comercio
SESI – Serviço Social da Indústria
SINPAS – Sistema Nacional de Previdência e Assistência Social
SUAS – Sistema Único de Assistência Social
SUS – Sistema Único de Saúde
UFC – Universidade Federal do Ceará
UNIFOR – Universidade de Fortaleza
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO....................................................................................................... 15
2 ELEMENTOS METODOLÓGICOS DA PESQUISA............................................. 20
2.1 Percurso Metodológico da Investigação........................................................20
2.2 As Interlocutoras da Pesquisa....................................................................... 28
3 UMA ANÁLISE SOBRE A INTERFACE ENTRE FAMÍLIA, POLÍTICAS SOCIAIS E
A POPULAÇÃO IDOSA BRASILEIRA.................................................................. 37
3.1 A Família no Brasil: uma discussão sobre os modelos e expressões das
famílias contemporâneas.................................................................................... 37
3.2 Breve históricos da política social no Brasil.................................................. 46
3.3 Os principais instrumentos legais para a pessoa Idosa................................ 60
4 O CONTEXTO HISTÓRICO DAS INSTITUIÇÕES DE LONGA PERMANÊNCIA
PARA IDOSAS (OS) (ILPI) NO BRASIL................................................................... 68
4.1 ILPI no Brasil e no Ceará.............................................................................. 68
4.2 Discorrendo acerca do Abrigo Casa de Nazaré............................................ 78
4.3 A percepção das (os) idosas (os) institucionalizadas sobre o abrigamento e
abandono............................................................................................................. 80
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................................. 99
REFERÊNCIAS................................................................................................... 105
APÊNDICE A........................................................................................................... 107
APÊNDICE B........................................................................................................... 108
15
1 INTRODUÇÃO
A expectativa de vida mais que dobrou de 33 anos ao final do século XX para
quase 70 anos no século XXI, tornando relevante o fenômeno do envelhecimento no
Brasil. Fundamentando esta acepção, consoante Minayo (2005, p.8), atualmente, há
pelo menos uma pessoa idosa em 26% dos lares brasileiros e há mais de 130 mil
pessoas com mais de 100 anos no país.
Haddad (2001, p. 9) interpreta esse fenômeno como um fantasma que
amedrontou o mundo neste fim de século e seus ruídos assustadores desafiam o
saber e o poder, levando ao mesmo tempo, o ser humano a novas problematizações
sobre a velhice. O ambicionado prolongamento da vida transforma-se, cada vez
mais, em realidade.
Sabemos que mudanças causam impactos, com o fenômeno do
envelhecimento não foi diferente; o país teve um aumento impressionante de idosos
como bem afirmou Minayo (2005), de um país jovem, passou a conviver com uma
nova realidade de uma população predominante de idosos, não precisamos ir longe
para detectar o impacto desse fenômeno para o Brasil.
Quando pensamos em um determinado tema para uma pesquisa social
associamos a fenômenos que de alguma forma nos inquietam, incomodam e nos
despertam a curiosidade de investigar, conhecer a causa, saber como esse
fenômeno se apresenta e se manifesta. Assim, a escolha do tema está ligado a
todos esses elementos fundantes para o conhecimento desse fenômeno.
O tema “abandono e abrigamento contemporâneos tomando como
experiência as idosas da Casa de Nazaré” surgiu a partir do contato direto com
diferentes abrigos através de visitas realizadas na disciplina de Gerontologia no 6º
semestre na Faculdades Cearenses (FAC), como ainda a observação da realidade
social do idoso pobre que ficam nas ruas mediados pela miséria, desigualdades e
riscos sociais. Vários foram os fatores que estimularam a análise dessa temática, um
deles foi deparar-se com idosos perambulando pela cidade.
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Foi essa inquietação em conhecer essa nova realidade que estimularam a
busca por respostas, impulsionando a pesquisar e conhecer as percepções das
idosas institucionalizadas, visando exatamente desvelar os motivos que estão
levando uma parcela da população de idosos a instituições de longa permanência.
Por ser uma realidade crescente em nosso país, o fenômeno da longevidade
e baixa mortalidade, sem dúvidas, é favorável para a população, pois estamos
vivendo mais, entretanto todos nós brasileiros, sabemos das nossas dificuldades e
conhecemos bem o país onde nascemos, nem tudo é motivo de comemoração.
Segundo Minayo (2005) ao comparar os dados do Brasil com outras regiões,
constata-se que o envelhecimento populacional aqui ocorre numa velocidade muito
maior do que em alguns países europeus, os quais levaram cerca de 140 anos para
envelhecer. No entanto, há grandes diferenças do Brasil em relação à realidade
europeia. Na Europa segundo a autora o grupo que mais cresce tem mais de 80
anos, e a longevidade é atribuída às confortáveis condições de vida e de bem-estar
social e de saúde. No Brasil a faixa de 60 a 69 anos é a que aumenta mais
rapidamente.
No Brasil, a autora atribui a longevidade à queda acelerada nas taxas de
fecundidade e de natalidade. Minayo (2005) afirma que infelizmente o país não tem
conseguido dar uma velhice tranquila a seus cidadãos, boa parte dos idosos sofre
muito e passam por profundos problemas sociais.
Ainda para esta autora discutindo os indicadores sociais do IBGE (2003) em
2002, 43% dos que têm 60 anos ou mais, têm renda per capita abaixo de um salário
mínimo. E 4.870.336 deles (30,4%), continuam a trabalhar, seja para se manter, seja
para auxiliar a subsistência de sua família.
Essa realidade nos preocupa pela conjuntura do nosso país, mesmo os
idosos sendo maioria no Brasil, o país não reúne meios nem suporte para suprir as
necessidades dessa faixa etária com qualidade e abrangência. Neri e Freire (2000,
p.8) falam que o envelhecimento ainda está ligado à deterioração do corpo, ao
declínio, incapacidade, decadência física e ausência de papeis sociais.
Neri e Freire (2000) interpretam da forma descrita acima o
envelhecimento do século XIX, porém é pertinente reforçar que há distintas
realidades de idosos no nosso país.
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Parte dessa população cultua qualidade de vida, se mantendo sempre
envolvidos com esportes e atividades físicas, muito desses idosos continuam
trabalhando, com suas vidas sociais ativas, conseguindo ainda com algumas
limitações da idade se manter o melhor possível, outros cultuam uma vida de
viagens e outros que preferem uma vida pacata, e por este motivo há tantas
interpretações em relação à velhice.
Desse modo esse fenômeno do envelhecimento vem nos trazer a realidade
mais latente. O povo brasileiro está vivendo mais, as taxas de mortalidade caíram,
mas um grupo de pessoas idosas está morando nas ruas, ou sendo
institucionalizados, fatos que impulsiona a busca por conhecimento, em um olhar
mais próximo dessa realidade.
Outro aspecto que também está intrinsecamente relacionado ao abandono e
abrigamento da pessoa idosa é sua relação no seu seio familiar. Para abranger a
totalidade de relações que envolvem esses fenômenos, estabelecemos como
categorias para dar conta do tema abordado: Família, Políticas Sociais, Idoso e
institucionalização.
Segundo a autora Osterne (2004) a definição dominante de família congrega
um conjunto de palavras afins: pai, mãe, filhos, casa, unidade doméstica, casamento
e parentesco. A família tida como legítima, nuclear, que se interioriza no imaginário
da maioria das pessoas, caracteriza-se como um conjunto de indivíduos
aparentados que se ligam por aliança, casamento, filiação, adoção ocasional ou
afinidade. É pressuposto comum que esses indivíduos habitam um mesmo teto.
A segunda categoria trata-se das políticas sociais que nasce no berço dos
movimentos sociais, das lutas dos operários e dos movimentos populares,
compreendida por Behring e Boschetti (2011) como expressão das relações de
produção e reprodução social no capitalismo.
Faleiros (2009) relata que as políticas sociais, na conjuntura do Estado
capitalista, representam um resultado da relação e do complexo desenvolvimento
das forças sociais. Elas são o resultado da luta de classes e ao mesmo tempo
contribuem para a reprodução das classes sociais.
A terceira e última categoria é o idoso, segundo a Política Nacional do Idoso
(2010), Lei nº 8. 842, de 4 de janeiro de 1994, e o Estatuto do Idoso (2003) Lei nº
10.741, de 1º de outubro de 2003, define como Idoso pessoas com 60 anos ou mais.
18
Essa discussão encontra-se em evidência por ser uma realidade da
sociedade contemporânea, é comum nos deparamos com idosos nas ruas, assim
como idosos institucionalizados.
O que percebemos no dia a dia é uma naturalização da violência contra o
idoso, porque o abandono é um tipo de violência, uma realidade constante que está
relacionada a vários fatores e situações, que não nos cabe julgar certo ou errado,
mas tentar mudar através de nossa atuação como futuros profissionais e como
membros da sociedade civil.
Devemos nos aprofundar nessa discussão, ampliando o olhar para todas as
circunstancias e expressões da questão social que abate nossa sociedade. Existem
relações de afeto e vínculos familiares, contudo em algum momento esses vínculos
e laços foram rompidos, por circunstancias que somente buscamos entender
mediante uma maior aproximação dessa realidade que faz parte de nossa rotina, e
por este motivo acabamos naturalizando essa realidade.
Nossa pesquisa busca de uma forma objetiva saber quais as circunstâncias
que levaram as idosas da Casa de Nazaré à situação de abrigamento e abandono
familiar.
Na busca de obter respostas para pergunta central do presente trabalho, foi
possível estruturar a pesquisa em quatro capítulos. O primeiro, intitulado como
“Introdução”, apresenta de forma sucinta uma discussão geral sobre o tema,
contendo as categorias e metodologia utilizadas.
No segundo capítulo, elementos metodológicos da pesquisa, divididos em
dois tópicos, o primeiro trata-se do percurso metodológico da investigação, no qual
detalhamos todo o percurso da metodologia, e o segundo tratamos das
interlocutoras da pesquisa de campo.
O terceiro capítulo é uma análise sobre a interface entre família, políticas
sociais e a população idosa brasileira, discutindo os seguintes pontos: a família no
Brasil: uma discussão sobre os modelos e expressões das famílias contemporâneas;
breve histórico da política social no Brasil; os principais instrumentais legais para a
pessoa Idosa: Constituição Federal e Lei Orgânica da Assistência Social; Política
Nacional do Idoso no Brasil e Estatuto do Idoso.
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Nosso quarto e último capítulo traz o contexto histórico das instituições de
longa permanência para idosos (as) (ILPI) no Brasil, tratando dos seguintes pontos:
ILPI em Fortaleza; discorrendo acerca do Abrigo Casa de Nazaré; contribuições
deste abrigo para o reestabelecimento dos vínculos familiares; idosos (as)
institucionalizados (as) como principais sujeitos da pesquisa e a percepção dos (as)
idosos (as) institucionalizados sobre o abrigamento e abandono.
O trabalho será finalizado com as considerações finais da pesquisa,
descrevendo o resultado do trabalho de investigação, que exigiu empenho,
compromisso e responsabilidade ao lidar com relatos da vida dessas idosas que se
propuseram a compartilhar suas experiências no intuito de enriquecer a pesquisa de
investigação.
20
2 ELEMENTOS METODOLÓGICOS DA PESQUISA
2.1 Percurso Metodológico da Investigação
Para iniciar a descrição do caminho para coleta de informações pertinentes a
esta pesquisa, é necessária fazer uma breve apresentação da metodologia em si,
destacando sua importância e o seu papel na construção dos resultados dessa
pesquisa em especial e em qualquer outra investigação.
Baseados em leituras da Metodologia Científica de Pedro Demo (2009), a
metodologia é o estudo dos caminhos, dos instrumentos, utilizado para fazer ciência,
sendo um instrumento a serviço da pesquisa.
Tratamos aqui de Metodologia, que significa, na origem do termo, estudo dos caminhos, dos instrumentos usados para se fazer ciência. É uma disciplina instrumental a serviço da pesquisa. Ao mesmo tempo em que visa conhecer caminhos do processo científico, também problematiza criticamente, no sentido de indagar os limites da ciência, seja com referência à capacidade de conhecer, seja com referência à capacidade de intervir na realidade. (IBID, 2009, p.11).
Seguindo a linha de raciocínio deste autor, a metodologia é um instrumento
de pesquisa que traz os métodos, técnicas e os elementos para organização da
pesquisa tanto na teoria quanto na prática. É na metodologia que construímos os
conhecimentos adquiridos com leituras e também com todo conhecimento colhido no
campo de pesquisa, dando a oportunidade ao pesquisador de usar sua criatividade,
sua capacidade pessoal e também sua sensibilidade.
Ao escolher um determinado tema para pesquisa, é essencial elaborar a
ordem dos diferentes processos da pesquisa para atingir os resultados desejados,
que são os métodos utilizados na investigação.
Em seu sentido mais geral, método é a ordem que se deve impor aos diferentes processos necessários para atingir certo fim ou um resultado desejado. Nas ciências, entende-se por método o conjunto de processos empregado na investigação e na demonstração da verdade. (CERVO, BERVIAN & DA SILVA, 2006, p. 27).
Segundo os autores Cervo, Bervian e da Silva (2007) na obra Metodologia
Científica, o método concretiza-se como o conjunto de diversas etapas e passos a
serem seguidos para a realização da pesquisa e que configuram as técnicas, que
são: técnica observação, que pode ser: assistemática, sistemática, não participativa,
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participativa, individual, em equipe e laboratorial, descrição, comparação, análise e
síntese.
Podem ser chamados de técnicas aqueles procedimentos utilizados por uma ciência determinada no quadro das pesquisas próprias dessa ciência. Assim, há técnicas associadas ao uso de certos testes em laboratório, ao levantamento de opiniões de massa, à coleta de dados estatísticos; há técnicas para conduzir uma entrevista, para determinar a idade por medições de carbono, para decifrar inscrições desconhecidas etc. (IBID, 2007, p. 30).
Ainda nesta lógica de informações, para que o projeto se concretize, é
pertinente falar do intuito da pesquisa, que é de ajudar o pesquisador a conhecer a
realidade, e buscar respostas para seus questionamentos em relação a determinado
assunto ou situação, pois permite investigar e compreender a realidade.
Pesquisar é dispor-se a conhecer cientificamente algo e efetivar tal objetivo. A pesquisa é uma atividade de busca, questionamento, investigação, com o intuito de elaborar conhecimento que ajude a compreender a realidade, oriente as ações e ajude a solucionar problemas. (NÚBIA GARCIA, 2003, p. 30).
A abordagem dessa pesquisa é qualitativa, por permitir a obtenção de
conhecimento acerca do modo de vida das idosas, pois lidamos com sentimentos,
significados e emoções das entrevistadas. A pesquisa objetiva analisar percepções
de sujeitos, e para que essas informações sejam colhidas, é crucial o contato com o
sujeito, conhecer a realidade social das pessoas para extrairmos delas suas
vivências e consequentemente as informações que buscamos com a execução da
pesquisa.
No que se refere às pesquisas qualitativas, é indispensável ter presente que, muito mais do que descrever um objeto, buscam conhecer trajetórias de vida, experiências sociais dos sujeitos, o que exige uma grande disponibilidade do pesquisador e um real interesse em vivenciar a experiência da pesquisa. (MARTINELLI, 1999, p. 25).
Martinelli afirma que todos somos sujeitos políticos quando se trata de
pesquisa qualitativa, lembrando que a natureza desse tipo de pesquisa nunca é feita
apenas para o pesquisador, porque seu sentido é social, portanto deve retornar ao
sujeito, porque a pesquisa qualitativa lida com significados de vivências que
precisam ser devolvido aos sujeitos que dela participaram.
22
Na pesquisa qualitativa todos nós somos sujeitos políticos, o que nos permite afirmar que ela, em si mesma, é um exercício político, não há nenhuma pesquisa qualitativa que se faça a distância de uma opção política, então, ao estabelecermos o desenho da nossa pesquisa estamos nos apoiando em um projeto político singular que se articula a projetos mais amplos e que, em ultima analise, relaciona-se até mesmo com o projeto de sociedade pelo qual lutamos. (IBID, p.26).
Através da pesquisa qualitativa podemos elaborar e aplicar o que de fato a
pesquisa se propõe, permitindo o trabalho com outras fontes, ou seja, fazer uso de
técnicas diferentes como visitas, observação participativa, recurso de imagem, como
as fotografias que forem relevantes para os sujeitos e para a pesquisa.
É importante ressaltar, complementando, que esse tipo de pesquisa não é excludente, ou seja, não dispensa a recorrência a outras fontes. Trabalhamos com técnicas diferenciadas, podemos nos valer, por exemplo, da observação participativa, da visita domiciliar, além do recurso de imagem, como fotografias significativas para o sujeito e para a pesquisa. (IBID, p. 24).
Essa pesquisa segue os critérios do Ciclo de Pesquisa de Minayo (2010, p.
26) definido pela autora como um peculiar processo de trabalho em espiral que
começa com uma pergunta e termina com uma resposta ou produto que, por sua
vez, dá origem a novas interrogações. Esse Ciclo de Pesquisa é dividido em três
fases: exploratória, de campo, análise e tratamento do material empírico e
documental.
A fase exploratória que trata da produção do projeto de pesquisa e de todos
os procedimentos necessários para preparar a entrada em campo, segundo a
referida autora.
Desse modo é possível abordar o abandono e abrigamento contemporâneos:
um estudo sobre a realidade social das idosas na casa de Nazaré em Fortaleza-Ce,
o tema da pesquisa foi recortado de acordo com a viabilidade e possibilidade de
execução da investigação, pensando em uma pesquisa completa, não só teórica,
mas com o contato direto com o campo e os sujeitos da pesquisa, o que não poderia
ser diferente, por se tratar de um tema tão abrangente e amplo.
O tema de uma pesquisa indica a área de interesse ou assunto a ser investigado. Trata-se de uma delimitação ainda bastante amplo. Por exemplo, quando alguém diz que deseja estudar a questão “exploração sexual de crianças e adolescentes”, está se referindo ao assunto de seu
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interesse. Contudo, é necessário para a realização de uma pesquisa um recorte mais preciso deste assunto. (MINAYO, 2010, p. 39).
O objetivo geral dessa pesquisa foi investigar os principais fatores que
envolvem o rompimento dos laços familiares das idosas abrigadas na Casa de
Nazaré. Como específicos:
Elaborar o perfil socioeconômico das idosas institucionalizadas na
Casa de Nazaré;
Pesquisar as razões pelas quais algumas idosas abrigadas não
mantêm nenhum vínculo familiar;
Analisar a percepção das idosas sobre família, abandono e
abrigamento;
Identificar estratégias da instituição para o reestabelecimento dos
vínculos familiares;
Relacionar os limites e possibilidades do abrigamento na Casa de
Nazaré.
Através da formulação dos objetivos, foi possível identificar o propósito da
investigação, assim como o que alcançar no final de todo o processo, destacando
que esses objetivos devem ser viáveis, sendo assim possíveis de serem atingidos. É
comum formular um objeto geral, de dimensões mais expansivas, geral, os quais
foram articulados aos objetivos mais específicos, sendo algo mais fechado,
delimitado, um recorte específico do tema da pesquisa.
Buscamos com a formulação dos objetivos responder ao que é pretendido
com a pesquisa, que propósitos almejamos alcançar ao término da investigação. É fundamental que estes objetivos sejam possíveis de serem atingidos. Geralmente se formula um objetivo geral, de dimensões mais amplas, articulando-o aos objetivos específicos. (MINAYO, 2010, p.44).
A escolha dos sujeitos é um momento de fundamental importância, porque
permite traçar os perfis dos sujeitos da pesquisa. Para tanto, foram elencados
critérios para a escolha dos sujeitos: serem idosas abrigadas na instituição Casa de
Nazaré, já que o abrigo é para mulheres, que perderam os vínculos com suas
famílias, com pelo menos um ano de instituição, com idade de 70 a 85 anos, estas
24
foram orientadas quanto o processo da pesquisa e das entrevistas, solicitando o seu
consentimento, participando do processo de investigação seis idosas.
A pergunta de partida busca responder quais os principais fatores que
envolvem o rompimento dos laços familiares das idosas do abrigo Casa de Nazaré.
Ao formulamos perguntas ao tema estaremos construindo sua problematização. Um problema decorre, portanto, de um aprofundamento do tema. Ele é sempre individualizado e específico. (IBID, 2010, P. 39).
Entrando na fase do trabalho de campo dessa pesquisa, que segundo Minayo
(2010) consiste em levar para a prática empírica a construção teórica elaborada na
fase anterior, fase exploratória descrita acima. Na fase do trabalho de campo foram
definidos os instrumentos metodológicos e técnicas utilizadas para elaboração da
pesquisa, sempre articulados ao conteúdo teórico.
A pesquisa utilizada foi de campo, por ser importante na construção do
projeto. Os dados foram coletados no local da pesquisa, os instrumentos utilizados
foram à observação participante, que permitiu a utilização do instrumento diário de
campo e entrevista semiestruturada.
O diário de campo foi usado por ser uma ferramenta que enriquece a
pesquisa com anotações que somente a observação do campo pode oferecer.
Sendo um recurso capaz de registrar questionamentos, informações e angústias que
não conseguimos utilizando outras técnicas.
Essas anotações ajudaram a compor etapas da pesquisa, sem perder dados
que são importantes para alcançar o propósito que é elaborar e concluir a pesquisa
o mais próximo do real.
O diário de campo é pessoal e intransferível. Sobre ele o pesquisador se debruça no intuito de construir detalhes que no seu somatório vai congregar os diferentes momentos da pesquisa. Demanda um uso sistemático que se estende desde o primeiro momento da ida ao campo até a fase final da investigação. Quando mais ricas forem as anotações esse diário, maior será o auxílio que oferecerá à descrição e à análise do objeto estudado. (MINAYO, 2008, p. 64).
25
Para realização da coleta de dados, às condições devem ser naturais, no
momento em que o fenômeno ocorre, sem a intervenção do pesquisador na
realidade que se encontra inserido.
A pesquisa de campo possibilita ao pesquisador se aproximar do seu objeto
de pesquisa e criar novos conhecimentos a partir da realidade do campo, desse
modo possibilita não só conhecer e estudar as idosas da Casa de Nazaré, como
ainda de formular a partir dessa aproximação do ambiente natural que elas vivem,
sem modificações ou intervenções de quem quer que seja, incluindo o pesquisador,
de criar conhecimentos.
Esse conhecimento vai surgir através da investigação e de um olhar sobre a
realidade, já que o contato direto com o fenômeno a ser estudado nos permite não
só observar e entrevistar, mas de coletar os dados no próprio local, para compor de
informações do diário de campo.
O pesquisador põe-se em contato direto com o fenômeno a ser estudado e coleta os dados no local. Utiliza instrumentos como questionário, formulário, entrevista e observação com o fito de obter informações sobre o objeto de estudo, partindo da realidade presente no campo. (NÚBIA GARCIA, 2008, p. 34).
É possível trabalhar com dois tipos de entrevistas: a estruturada e não
estruturada. A entrevista estruturada possibilita a realização de perguntas
previamente formuladas e a entrevista semiestruturada possibilita execução de uma
entrevista aberta, permitindo que o entrevistado fale sobre o tema livremente.
[...] as entrevistas podem ser estruturadas e não-estruturadas, correspondendo ao fato de serem mais ou menos dirigidas. Assim, torna-se possível trabalhar com a entrevista aberta ou não-estruturada, onde o informante aborda livremente o tema proposto; bem como com as estruturas que pressupõem perguntas previamente formuladas. Há formas, no entanto, que articulam essas duas modalidades, caracterizando-se como entrevistas semi-estruturadas. (MINAYO, 2008, p.58).
Para a coleta das informações dos sujeitos entrevistados, foi utilizado o roteiro
formulado com perguntas voltadas para responder dúvidas e inquietações da
investigação, com o objetivo de captar as percepções das idosas institucionalizadas,
para essa finalidade foram utilizadas entrevistas semiestruturadas.
26
A pesquisa iniciou-se em agosto de 2014, período em que o tema foi definido.
Nos meses a seguir foi de orientações, leituras, produção dos capítulos teóricos,
visitas há instituição, entrevistas com as idosas (total de seis entrevistas), análise
dos dados, articulação dos dados com base teórica e por fim a transcrição de todos
os dados e informações coletados durante a investigação e conclusão do trabalho,
finalizando todo o processo em dezembro do mesmo ano.
A pesquisa versou aparentemente todos os procedimentos pertinentes e
fundamentais para sua execução, porém, foi primordial preterir algum procedimento
fundante para a legitimidade e veracidade da pesquisa, que é a ética do projeto de
pesquisa.
Esta trata do compromisso em não ferir a ética da elaboração de textos
científicos, o não cumprimento desse compromisso caracteriza-se em um
comportamento antiético, como a fraude, quando o pesquisador inventa dados
inexistentes a fim de justificar ou embasar suas propostas. O comportamento mais
conhecido como antiético é o plágio, isto é, se apropriar de ideias, expressões,
dados de autores sem referenciar essas informações, sem citar a origem dessas
informações.
O projeto de pesquisa tem em sua redação compromisso em não ferir a ética da elaboração de textos científicos. Um dos comportamentos antiéticos mais comuns é a prática de plágio, isto é, usar ideias, expressões, dados de outros autores sem citar a fonte de onde se originam. Outra espécie de procedimentos antiéticos é a fraude, ou seja, quando o pesquisador inventa deliberadamente dados inexistentes a fim de justificar ou embasar suas propostas. (MINAYO, 2010, p. 55).
Desse modo chegamos à fase final do Ciclo de Pesquisa e também na fase
final do processo da pesquisa, que é análise e tratamento do material empírico e
documental. Essa fase segundo Minayo (2010) diz respeito ao conjunto de
procedimentos para valorizar, compreender, interpretar os dados empíricos, articulá-
los com a teoria que fundamentou o projeto ou com outras leituras teóricas e
interpretativas cuja necessidade foi dada pelo trabalho de campo.
Após a coleta de todos os dados, entrevistas com os sujeitos, das anotações
feitas no local da pesquisa (diário de campo), das observações do espaço físico, da
análise da estrutura do abrigo, das leituras realizadas com autores que discutem a
27
temática e das informações colhidas no site do abrigo pesquisado, passamos para a
fase da organização e análise.
Minayo (2008, p. 77) em sua obra “Pesquisa Social” nos apresenta a proposta
dialética para análise dos dados, denominado método hermenêutico-dialético. Nesse
método, a fala dos atores sociais é situada em seu contexto para melhor ser
compreendido. Essa compreensão tem, como ponto de partida, o interior da fala; e,
como ponto de chegada, o campo da especificidade histórica e totalizante que
produz a fala.
A autora destaca dois pressupostos desse método de análise. O primeiro fala
da ideia de que não há consenso e nem ponto de chegada diante do processo de
produção do conhecimento. O segundo, que a ciência se constrói numa relação
dinâmica entre a razão daqueles que a praticam e a experiência que surge na
realidade concreta.
Minayo (2008, p. 77) fala que o primeiro nível de interpretação que deve ser
feito, são as determinações fundamentais. Esse nível, entre outros aspectos, diz
respeito à conjuntura socioeconômica e política do qual o grupo social pesquisado
faz parte, como ainda a história desse grupo e política que se relaciona. No segundo
nível de interpretação baseia-se no encontro que realizamos com os fatos surgidos
na investigação.
Nesse segundo nível a autora é ao mesmo tempo, ponto de partida e ponto
de chegada da análise. As comunicações individuais, as observações de condutas e
costumes, a análise das instituições e a observação de cerimônias e rituais são
aspectos a serem considerados nesse nível de interpretação.
A organização e análise dos dados requer um trabalho cuidadoso,
principalmente na hora de transcrevê-los. É importante atenção em relação às
modificações e as influências que sofremos, por diversos fatores, como as
conversas de corredores, experiências trocadas com outros pesquisadores, debates,
etc. É relevante haver uma articulação entre o trabalho de campo e a construção do
texto de pesquisa, são momentos de serenidade e de concentração, pois estamos
lidando com relatos e vivências de sujeitos que estão inseridos em um grupo social,
não podemos de nenhuma maneira distorcer os fatos, quer dizer, distorcer a
realidade do campo, o papel da pesquisa é desvelar o fenômeno natural e real.
28
2.2 As Interlocutoras da Pesquisa
As entrevistas foram realizadas nos dias 10 e 12 de novembro de 2014,
sendo dividida em duas etapas: quatro entrevistas na tarde do dia 10 de novembro e
duas na tarde do dia 12 de novembro do ano em curso. As entrevistas foram feitas
na própria instituição, em locais tranquilos e privados, priorizando o sigilo.
As idosas que participaram da pesquisa foram informadas do termo de
consentimento sobre todo o processo da pesquisa, deixando claro que seus nomes
ficarão no anonimato, resguardando sua identidade, explicando que os nomes
usados serão de flores: Violeta, Lírio, Margarida, Rosa, Magnólia e Jasmim.
No universo de 39 idosas institucionalizadas, oito foram convidadas a
participaram da construção dessa pesquisa, todas mulheres, por se tratar de uma
instituição de mulheres. Porém, duas se recusaram a participar, um direito delas,
uma vez que essa abordagem mexe com o emocional e a vida dessas idosas, sendo
de imediato respeitado sua decisão, participando da pesquisa seis idosas.
Ao receber essa recusa, foi possível adotar uma posição de observação.
Observamos as idosas, nas atividades realizadas pelos voluntários, estas se
comunicavam mais, e tivemos a contribuição da Assistente Social da instituição.
O perfil das participantes que contribuíram diretamente para a construção da
nossa pesquisa foram 06 idosas de 70 a 85 anos, residentes da Casa de Nazaré,
todas estavam orientadas e aceitaram espontaneamente contribuírem na construção
dessa investigação acadêmica.
Das seis idosas entrevistadas 50% tem entre 75 a 79 anos e 50% tem entre
80 a 85 anos, representando idades bem avançadas.
Camarano (2010) afirma que mais pessoas estão sobrevivendo às idades
elevadas, contudo isso não significa que tudo será perfeito. Segundo a autora, o
número das que não conseguirão manter a sua independência/autonomia tende a
aumentar, o que implica um crescimento da demanda por cuidados e
consequentemente se esses idosos não tiveram amparo familiar ou condições
financeiras bastante significativas para pagar os cuidadores e se manterem, vai
acabar em algum abrigo filantrópico.
29
GRÁFICO 1: Idade
75 a 79
80 a 85
Fonte: Pesquisa 2014.
Foi constado que 70% das idosas são de Fortaleza, 10% do Iguatu, 10% do
Maranhão e 10% do Sobral, todas cearenses e em sua maioria da própria capital.
Possivelmente por ser da metrópole, os laços familiares e afetivos se rompem com
mais intensidade do que os familiares que passam toda sua vida no interior.
Camarano (2010) esclarece que as instituições do Ceará se encontram com
1.014 residentes, dos quais 93,2% são idosos. Entre os residentes idosos, verificou-
se um predomínio de mulheres. Elas respondem por 64,2% do total, percentual
maior que o encontrado para a população idosa cearense não institucionalizada:
54,7%, os números explicam o fato de todas as interlocutoras serem cearenses,
nosso estado tem uma concentração muito grande de mulheres idosas abrigadas.
GRÁFICO 2: Nacionalidade das idosas entrevistadas institucionalizadas na Casa de Nazaré.
Fortaleza
Iguatu
Maranhão
Sobral
Fonte: Pesquisa 2014.
30
Declaram seu estado civil como 33,3% solteiras, 33,3% viúvas e 33,3% são
separadas, demonstrando assim que a falta do companheiro pode ser um dos
motivos para o abrigamento.
Camarano (2010) também contribui com outros motivos para a
institucionalização, explicando que a semelhantes determinações culturais, que não
são estáticas, mas que ainda hoje cumprem a agenda tradicional soma-se o fato de
que, em muitos contextos, embora vivam mais, as mulheres são mais pobres e mais
doentes do que os homens.
As regras sociais informais relativas ao matrimônio ainda hoje estabelecem
que as mulheres devam se casar com homens mais velhos e que, ao contrário dos
homens, as mulheres mais velhas não são boas candidatas ao casamento. Por
essas razões as mulheres mais velhas casadas têm grande chance de virem a ser
cuidadoras dos maridos e, quando viúvas, a serem cuidadoras de pais e sogros.
Após todos esses anos de cuidados com o marido, depois com os pais e
depois com os sogros, muitas idosas viúvas ou solteiras, sem filhos podem vir a ficar
sozinhas e desamparadas. Porém o que vemos na realidade não são apenas
mulheres idosas e sem filhos que estão nas instituições, mulheres casadas, viúvas e
separadas, com filhos e muitas vezes com mais de um filho, estão
institucionalizadas.
GRÁFICO 3: Estado civil das idosas entrevistadas institucionalizadas na Casa de Nazaré.
Solteita
Víuva
Separada
Fonte: Pesquisa 2014.
31
Nível de escolaridade das idosas participantes da pesquisa revela que 10%
fizeram o fundamental, 10% fizeram até a 4º serie e 80% nunca frequentaram a
escola. Essa realidade nos mostra um problema antigo do nosso país, o
analfabetismo, que esta diretamente ligada a uma também antiga questão social, a
pobreza, que traz consigo inúmeros infortúnios como falta de oportunidades, ter que
trabalhar cedo para se sustentar e sustentar suas famílias.
Podemos vê dados dessa realidade nos resultados do Censo Demográfico de
2010 que mostram que a desigualdade de renda ainda é bastante acentuada no
Brasil. O estudo mostra, por exemplo, que, embora no país como um todo a taxa de
analfabetismo da população de 15 anos ou mais de idade tenha se reduzido de
13,63% em 2000 para 9,6% em 2010, ainda chega a 28% nos municípios com até
50 mil habitantes na região Nordeste.
Além disso, o percentual de analfabetos entre pretos (14,4%) e pardos
(13,0%) era, em 2010, quase o triplo dos brancos (5,9%). No caso do analfabetismo
de jovens, a situação da região Nordeste é preocupante, na medida em que mais de
½ milhão de pessoas entre 15 a 24 anos de idade (502.124) declararam que não
sabiam ler e escrever. Na região do Semiárido a taxa de analfabetismo também foi
bem mais elevada do que a média obtida para o país, mas teve uma redução de
32,6%, em 2000, para 24,3%, em 2010. Entre os analfabetos residentes nessa
região, 65% eram pessoas maiores de 60 anos de idade.
A situação financeira dessas pessoas revela bem o porquê do analfabetismo,
não que a pobreza seja o único problema, mas é um fator determinante, um índice
tão alto de 80% das idosas que nunca frequentaram a escola, todas de baixa renda,
de historias de vida difícil, não podemos deixar de fazer essa articulação tão
importante.
32
GRÁFICO 4: Escolaridade das idosas entrevistadas institucionalizadas na Casa de Nazaré.
Fundametal
até 4 Serie
Nunca Estudaram
Fonte: Pesquisa 2014.
Em relação a filhos colhemos as informações que 50% têm filhos e 50% não
têm filhos. Das seis interlocutoras, três são viúvas, uma separada, e duas solteiras,
três tiveram filhos em seus relacionamentos, apenas uma casou-se e não teve filho,
as outras duas solteiras não tiveram filhos.
Esses dados nos faz refletir e associar a uma discussão muito importante da
autora Camarano (2010). Ela afirma que os homens esperam serem cuidados por
seus cônjuges e as mulheres esperam ser cuidadas por seus filhos, porém ela trata
algo comum na nossa sociedade, que as mulheres são as principais cuidadoras,
mas são menos propensas a receber cuidados familiares.
Sendo explicado pela autora que este é um dos fatores que ajudam a explicar
por que, em geral, as mulheres predominam nas instituições de longa permanência.
33
GRÁFICO 5: Filhos das entrevistadas institucionalizadas na Casa de Nazaré.
Tem Filhos
Não Tem Filhos
Fonte: Pesquisa 2014
A resposta sobre a renda das idosas foram que 90% recebem o Beneficio de
Prestação Continuada (BPC) e 10% são aposentadas por tempo de contribuição.
Podemos associar a dependência de benefícios socioassistenciais com a alta taxa
de analfabetismo, já que a maioria nunca estudou, e consequentemente não teriam
como trabalhar com carteira assinada.
Também devemos levar em consideração a conjuntura da época que essas
mulheres viviam, quando a mulher ainda não tinha essa autonomia de sair da casa
dos pais ou deixar seus maridos e filhos para estudar e trabalhar. Apenas uma das
idosas trabalhou de carteira assinada, ou seja, apenas uma contribuiu para a
previdência social.
Simões (2011) explica que tem direito de receber o BPC os brasileiros
(inclusive naturalizados, com domicilio no país) com deficiência incapacidade ou
idosos, que não tenham condições de prover sua própria subsistência ou por meio
de sua família. O BPC veio substituir, em parte, o antigo benefício previdenciário da
renda mensal vitalícia, que era pago a idosos carentes com 70 anos de idade (Lei n.
6.179/74, extinta a partir de janeiro de 1996). A medida Provisória n. 1.259 de
12/01/96 alterou a LOAS, regulando sobre o BPC e sua transferência da previdência
social para a assistência social.
Camarano (2010) esclarece que as principais ações de proteção social por
parte do governo federal para a pessoa idosa estão localizadas no âmbito da
assistência. Como o Benefício de Prestação Continuada (BPC) – que é oferecido no
âmbito na proteção básica do SUAS e os programas que dizem respeito aos
cuidados de longa duração na proteção especial.
34
Segundo a PNAS (2014) o BPC constitui uma garantia de renda básica, no
valor de um salário mínimo, tendo sido um direito estabelecido diretamente na
Constituição Federal e posteriormente regulamentado a partir da LOAS, dirigido às
pessoas com deficiência e aos idosos a partir de 65 anos de idade, observado,
para acesso, o critério de renda previsto na Lei. Tal direito à renda se constituiu
como efetiva provisão que traduziu o princípio da certeza na assistência social,
como política não contributiva de responsabilidade do Estado. Trata-se de prestação
direta de competência do Governo Federal, presente em todos os Municípios.
GRÁFICO 6: idosas aposentadas entrevistadas institucionalizadas na Casa de Nazaré.
Aposentadas
BPC
Fonte: Pesquisa 2014
Antes de iniciarmos a exposição das falas das interlocutoras entrevistadas na
nossa investigação, achamos pertinente associar uma afirmação da autora Berzins
(2003, p. 28) quando ela fala que a velhice é uma experiência que se processa
diferente para homens e mulheres, e como nossos sujeitos são mulheres teremos
oportunidade de conhecer as percepções das idosas diante as questões que
envolvem a velhice, não só a respeito do abrigamento e abandono em si, mas
resgatar experiências de vida.
Todas as idosas participantes da pesquisa responderam todas as perguntas,
ao percebermos que alguma pergunta emocionou as interlocutoras não instigamos a
conversa, porem isso não mudou a dinâmica das entrevistas, tudo ocorreu de uma
maneira natural e tranquila.
Discorrendo sobre os questionários que seguiu um roteiro de entrevistas
semiestruturadas anexadas a essa pesquisa, todas as idosas responderam a nossa
primeira indagação, há quantos anos a senhora mora na casa de Nazaré,
35
afirmaram que: 90% moram na instituição de um a dez anos e 10% têm mais de 10
anos de instituição.
GRÁFICO 7: Anos de institucionalização das idosas da Casa de Nazaré.
1 a 10 anos
Mais de 10 anos
Fonte: Dados da pesquisadora/2014.
Como vemos em relação aos anos que moram na instituição é bem dinâmico,
temos idosas que moram há 15 anos, 5 anos, 4 anos e 2 meses, 3 anos, 2 anos e a
idosa que tem menos tempo na instituição é Lírio com 1 ano e 9 meses, tivemos
relatos de idosas que já estiveram na instituição saíram e voltaram novamente.
Uma realidade comum, já que as famílias por muitas vezes no desespero
buscam os abrigos para lhe auxiliar em alguma situação, ao se instabilizarem
buscam novamente seus idosos, porém na maioria das vezes outras situações
acontecem como um relato de uma idosa que falou que sua filha ficou doente, diante
dessa realidade foi trazido para casa de Nazaré e permanece até hoje.
Camarano (2010) acredita que pode se esperar um aumento da demanda por
cuidados de longa duração formal no Brasil devido, em primeiro lugar, ao
envelhecimento da população idosa e à redução da oferta de cuidadores familiares.
Segundo ela isso se deve ao declínio da mortalidade nas idades avançadas, à
redução da fecundidade, as mudanças nos arranjos familiares e ao aumento maciço
da participação das mulheres no mercado de trabalho.
Esse relato da autora nos remete a pensar que a institucionalização será
ainda mais recorrente no nosso país, e ainda mais cedo do que encontramos em
nossa pesquisa, todos esses elementos impulsionam os idosos cada vez mais e
mais cedo a procurarem cuidados nas instituições de longa permanência.
36
Os perfis obtidos nos ajudaram a entender melhor as percepções das
interlocutoras a respeito do objetivo da nossa pesquisa. Proporcionando-nos uma
articulação das entrevistas com o referencial teórico, para prosseguir com o objetivo
da nossa pesquisa nos próximos capítulos.
37
3 UMA ANÁLISE SOBRE A INTERFACE ENTRE FAMÍLIA, POLÍTICAS SOCIAIS E
A POPULAÇÃO IDOSA BRASILEIRA
3.1 A Família no Brasil: uma discussão sobre os modelos e expressões das famílias
contemporâneas.
Família segundo Simões (2011) constitui a instância básica, na qual o
sentimento de pertencimento e identidade social é desenvolvido e mantido e,
também, são transmitidos os valores e condutas pessoais. Apresenta certa
pluralidade de relações interpessoais e diversidades culturais, que devem ser
reconhecidas e respeitadas, em uma rede de vínculos comunitários, segundo o
grupo social em que está inserido.
Iniciamos essa discussão, com a definição de família na percepção de
Simões (2011), porém nosso objetivo é discutir essa família ou esses modelos e
expressões de famílias na contemporaneidade do nosso país, por isso trouxemos a
contribuição de Oliveira (2009). Essa autora afirma que as transformações ocorridas
com o início da industrialização, o advento da urbanização, a abolição da
escravatura e a organização da população provocaram alterações nas configurações
familiares e sociais.
Osterne (2004) também traz sua percepção sobre as transformações da
família tradicional para a contemporânea. As autoras afirmam que a família patriarcal
foi paulatinamente sendo substituída pela família nuclear urbana sem, entretanto,
deixar de lado sua matriz patriarcal. Em nível do movimento conjuntural, algumas
mudanças, parte delas estruturais, aconteceram paralelamente à transformação da
família. Foi o caso da abolição da escravatura, o progressivo processo de imigração,
o desenvolvimento industrial e urbano, a proclamação da república e a emergência
da classe média.
Oliveira (2009) esclarece que hoje nossa realidade não é mais apenas os
homens saindo para trabalhar. As mulheres conhecidas como esposas, mães e
donas de casa, fazem parte dessa nova conjuntura da família contemporânea,
entraram no mercado de trabalho vendendo sua força de trabalho.
Essa mudança foi gerada pela expansão da economia, com o aumento do
consumo de bens e serviços advindos do capitalismo, as famílias passaram a
38
necessitar de uma renda maior para sua subsistência, gerando a saída das mulheres
dos seus lares e passando a serem trabalhadoras assalariadas.
A expansão da economia acelerou o processo de retirada da produção de casa para o mercado, e a pressão pelo consumo de bens e serviços, características inerentes ao capitalismo, anteriormente produzidos no espaço doméstico, passa a apertar os orçamentos familiares, e o trabalho assalariado passa a ser um instrumento também utilizado pelas mulheres. (OLIVEIRA, 2009, p. 65).
Porém Oliveira (2009) relata que mesmo com todas as transformações a
família conjugal contemporânea ainda conserva traços da família do passado, como
a de controlar a sexualidade das mulheres e também na preservação das relações
de classe. Para esse autor: “Apesar de todas as transformações, a nova família
conjugal conserva traços tópicos da família anterior: o de controlar a sexualidade
feminina e preservar as relações de classe”. (IBID, 2009, p. 65).
Osterne (2004) contribui para a discussão afirmando que, mesmo com todas
as modificações, essa nova família preservaria algumas características do modelo
colonial: a repressão da sexualidade feminina, o tabu da virgindade, a intolerância
para com o adultério feminino, ao lado da tolerância para com o adultério masculino
e para com a prostituição.
Oliveira (2009) afirma que os costumes do passado podem ou não estar
distantes de nossos costumes, segundo ela os conceitos evoluíram ou, até mesmo,
mudaram de denominação, mas, se estudarmos esses conceitos atualmente, é
possível verificar, que muitos desses costumes ainda estão presentes na sociedade,
ainda que de forma oculta.
A autora relata que a dificuldade está em compatibilizar a individualidade e a
reciprocidade familiares, pois, ao abrir espaço para tal individualidade, renovam-se
as concepções das relações familiares. O impacto desses desafios influencia o
cotidiano dessas relações. Segundo a autora as mudanças são radicais na
composição familiar, nas relações de parentesco e na representação de tais relações
na família.
Essa representação citada pela autora tem seu fundamento direto na
transformação da configuração familiar e também nas relações sociais, ocasionando
impacto profundo na construção da identidade de cada componente no interior da
família. Essa construção da identidade irá rebater nas relações sociais ampliadas,
39
não somente no seio familiar. Nessa conjuntura encontramos de acordo com Oliveira
(2009) a nova família, que se caracteriza pelas diferentes formas de organização,
relação e em um cotidiano marcado pela busca do novo. Os arranjos diferenciados
podem ser propostos de diversas formas, renovando conceitos preestabelecidos,
redefinidos, os papéis de cada membro do grupo familiar.
Essa representação citada pela autora tem seu fundamento direto na
transformação da configuração familiar e também nas relações sociais, ocasionando
impacto profundo na construção da identidade de cada componente no interior da
família. Essa construção da identidade irá rebater nas relações sociais ampliadas,
não somente no seio familiar. Nessa conjuntura encontramos de acordo com Oliveira
(2009) a nova família, que se caracteriza pelas diferentes formas de organização,
relação e em um cotidiano marcado pela busca do novo. Os arranjos diferenciados
podem ser propostos de diversas formas, renovando conceitos preestabelecidos,
redefinidos, os papéis de cada membro do grupo familiar.
Segunda a autora atualmente as famílias estão com os papéis confusos e
difusos se formos comparar com os modelos tradicionais, que tinham seus papeis
severamente definidos. As relações das novas famílias atualmente comparadas com
as tradicionais estão modificadas. Ainda para a autora, os próprios membros dessa
nova família estão diferentes, a composição não é mais a tradicional, e as próprias
pessoas estão se transformando, no que desrespeito na forma de pensar, nos seus
questionamentos, na maneira de viver no mundo, que também esta em processo de
mudança, ou seja, ambos, mundo e ser humano estão se transformando.
[...] Cada vez mais, são encontradas famílias cujos papéis estão confusos e difusos se relacionados com os modelos tradicionais, cujos papéis eram rigidamente definidos. As relações, comparadas com as estabelecidas no modelo tradicional, estão modificadas, os próprios membros integrantes da nova família estão diferenciados, a composição não é mais a tradicional, as pessoas também estão em processo de transformação, no sentido da forma de pensar, nos questionamentos, na maneira de viver nesse mundo em processo de mudança. (OLIVEIRA, 2009, p.68).
Segundo a autora em comento com o processo de mudanças, temos o
modelo tradicional internalizado operando, enquanto temos as novas maneiras de
ser família, revelando novos conceitos aos que já estão imposto, ocasionando
contradições no próprio contexto familiar, balanceando o que há favor e contra nas
duas formas. É certo que há uma herança simbólica falada pela autora, que é
40
transmitida entre as gerações que revela tais modelos e orienta a socialização dos
segmentos sociais.
A tendência atual é de que a convivência familiar se torne socializada e
visualizada como um local onde existe a mudança, evoluindo por meio do diálogo. O
mundo familiar mostra-se em uma variedade de formas de organização, com
crenças, valores e práticas desenvolvidas na busca de soluções para os desafios
que a vida vai trazendo, segundo Oliveira (2009).
Na concepção de Osterne (2004) no mundo contemporâneo, as mudanças,
que vêm ocorrendo da família, relacionam-se com a perda da tradição. Desse modo,
o amor, o casamento, a família, a sexualidade e o trabalho, antes vivenciados a
partir de papéis preestabelecidos, hoje são concebidos como parte de um projeto em
que a individualidade prevalece e adquire importância social, colocando como
problema atual a necessidade de compatibilizar a individualidade e a reciprocidade
familiares. As pessoas parecem estar querendo aprender a serem sozinhas e a
serem juntas. Esse, porém, supõe-se ser um dilema mais peculiar às camadas
médias que têm aparecido como a vanguarda da individualização.
No Brasil, Oliveira (2009) nos traz a informação que a novos formatos de
parentesco das famílias e os próprios membros da instituição familiar colocam os
profissionais a buscarem novas denominações ou tentar compreender socialmente
essas mudanças.
A autora explica que com a legalização do divórcio, e o inicio de uma nova
discussão referente aos papeis sociais de cada composição familiar, ocorreram
mudanças, e essas levaram a perguntar sobre o valor do casamento. São indícios
de que alterações mais significativas estão abalando o modelo de família brasileira
tradicional.
Desde a legalização do divórcio, com o início de uma nova discussão referente aos papéis sociais de cada composição familiar, têm ocorrido mudanças que levam a questionamentos sobre o valor do casamento indissolúvel e inquestionável. Esse é um dos indícios de que alterações mais profundas na estrutura da família brasileira estão iniciando seu processo. Não podemos negar o fato de que, após instituído o divórcio, a lei passou a permitir quantos divórcios e posteriores novos casamentos o homem e a mulher desejassem, o que ocasionou transformações profundas no âmbito familiar. (OLIVEIRA, 2009, p. 69).
41
Nessa afirmação da autora, verificamos que, apesar de muitas denominações
atuais sobre família, como: família reestruturada, reconstituída, reorganizada, nova
família, não há um conceito novo de família, pois embutidos na família, existem
várias possibilidades de novas configurações, não ficando exclusivamente em um
único modelo. Mesmo com todos os estudos sobre famílias existentes, ainda existe
a dificuldade dos autores de conceituar e denominar tais configurações familiares.
Essas novas famílias denominadas pelo autor estão cada vez mais presentes
e começam a ter visibilidade, pois fazem parte do cotidiano das pessoas e não
podemos negá-las. Apesar de fazer parte do cotidiano das pessoas, não podemos
afirmar que são socialmente aceitas, pois o embate entre a realidade e a ideologia
existente não permitiu ainda sua superação por toda a população.
Oliveira (2009) afirma que as temáticas sobre a família contemporânea
podem nos levar por diferentes realidades em transformações, e por questões
complexas, pois geralmente temos uma família ou um modelo familiar internalizado.
Esta intimidade do conceito de família pode causar confusão entre as famílias com
as quais pesquisamos e nossas próprias concepções sobre a configuração familiar.
A autora nos informa que para compreendermos essas transformações, torna-
se necessária uma mudança na maneira de visualização da configuração da nova
família, levando-se em conta que há o reflexo da sociedade, tanto na forma de se
viver em família, quanto nas relações interpessoais.
Oliveira (2009) afirma que devemos analisar a maneira pela qual as pessoas
concebem a família, que devemos considerar o sentido e a ideologia que as levaram
escolherem uma ou outra forma de organização e constituição familiar, sua forma de
relacionamento intrafamiliar. Levando em consideração a questão histórica, que não
se encontra dissociada das circunstancias do cotidiano, sendo necessário também
que compreendemos as escolhas que definem um ou outro rumo no pensar ou no
vivenciar a maneira de ser família, porém a autora esclarece que, não significa
necessariamente um determinante da forma como se dá a relação.
Segundo a autora podemos encontrar duas famílias com a mesma
composição que apresentam modos de relacionamento completamente diferentes.
Nesse contexto, o que se pode levar em conta são suas histórias e as questões
socioculturais. As mudanças societárias afetam a dinâmica familiar como um todo e,
42
particularmente, cada família, conforme sua composição, história e condições
socioeconômicas.
Oliveira (2009) afirma que na conjuntura de um mundo gerido pelo
capitalismo, ou seja, gerido pela produção excessiva, não importa a família, a
convivência familiar, mas, o ter, acumular bens como principal característica do
sistema capitalista.
No mundo governado pelo consumo excessivo, herança do capitalismo acelerado, podemos verificar que o que está realmente importando não é o ser com o qual está se convivendo em família, mas o ter enquanto característica principal do modo capitalista de produção. A situação atual da família também pode ser analisada a partir da transformação das formas da vida conjugal, dos modos de gestão da natalidade e no modo de compartilhar os papéis na família e a maneira pela qual a mesma é visualizada atualmente. (OLIVEIRA, 2009, p. 72).
Motta (20007) também contribui para a discussão afirmando que a família
exibe novas configurações, de acordo com ritmo das mudanças sociais, que
interatuam, e a partir de vivências internas, também subjetivas, de gênero e de
gerações, em relação aos ditames (convocações e exclusão) do mercado de
trabalho e aos ecos da dimensão política. Persiste como nuclear, como modelo
ideal, fixada nas representações expectativas; mas também no deixar estar da
confortável permanência em casa dos filhos solteiros, ainda quando empregados, no
novíssimo padrão de comportamento das camadas médias urbanas atuais.
Oliveira (2009) esclarece que as novas configurações familiares estão cada
vez mais presentes, não podemos dizer que são socialmente aceitas. Há o embate
entre o real vivido e o que se idealiza. Dentre as mudanças que afetam os laços
familiares, encontramos as famílias monoparentais, que são aquelas cujas pessoas
vivem sem cônjuge, com um ou vários filhos solteiros.
Família monoparental é aquela na qual vive um único progenitor com os filhos
que não são ainda adultos. Instalam-se no interior das famílias, diversificadas
maneiras de vivenciar a questão de gênero. As atualizações ocorridas podem ter o
lado bom e o lado difícil, em que é necessária a compreensão dessas relações
diversificadas, segundo a percepção de Oliveira (2009).
Oliveira (2009) nos informa que se se instala no interior das famílias, diversas
formas de vivenciar a questão de gênero. Acrescentando que as atualizações
43
ocorridas podem ter um lado bom e também um lado difícil, que necessita de uma
compreensão dessas relações diversificadas.
As famílias modernas ou contemporâneas constituem-se em um núcleo
evoluído a partir do desgastado modelo clássico, matrimonializado1, patriarcal,
hierarquizado, patrimonializado2 e heterossexual, centralizador de prole numerosa
que conferia status ao casal.
A autora afirma que historicamente, o homem vem se transformando, em
decorrência dos avanços sociais, com isso a mulher passa a assumir papeis que
anteriormente eram exclusivos dos homens.
Oliveira (2009) esclarece que muitos homens não aderiram essa nova
realidade da contemporaneidade, e pensam que as mulheres ainda devem continuar
exercendo seu antigo papel acrescentando ainda mais um papel, de ajudar na
manutenção das despesas da família, ou seja, uma dupla jornada.
A autora destaca também o papel da mulher e suas conquistas, apesar de
que culturalmente ainda se reproduz a ideologia machista no que diz respeito aos
afazeres domésticos. Essa carga de responsabilidade exclusiva pelas tarefas
domésticas por parte da mulher pode ser aceita consciente e inconscientemente,
buscando, na maioria das vezes, amenizar alguns conflitos que podem ocorrer entre
as desigualdades sociais e sexuais entre a mulher e homem.
A autora nos alerta que mesmo com todas essas mudanças, com todas essas
transformações, várias questões devem ser refletidas em relação à família, sendo
citada pela autora a desvalorização do trabalho da mulher, como exemplo, como a
má remuneração.
Diante dessas transformações, várias questões precisam ser melhor refletidas. Apesar de todos os avanços familiares, a desvalorização do trabalho da mulher ainda ocorre nitidamente, principalmente entre as pessoas que não possuem acesso às políticas públicas, à escola e às condições dignas de sobrevivência, fatos estes que propiciam à mulher a má remuneração por sua mão de obra. Paralelamente à má remuneração,
existe também a má formação para as tarefas a serem realizadas, justamente pelos fatores anteriormente citados. (IBID, 2009, p.75)
1 Matrimonialização: vem de matrimonio que é o pacto pelo qual o homem e a mulher constituem
entre si o consórcio de toda vida ordenado ao bem dos cônjuges e a geração e educação dos filhos. 2 Patrimonialização: é o ato, efeito ou ação de tornar um bem com valor de patrimônio cultural e
social através do estudo, salvaguarda, preservação, conservação e divulgação. http://www.dicionarioinformal.com.br/
44
Oliveira (2009) nos faz refletir sobre a desvalorização da força trabalho
feminina no mercado de trabalho, e ao chegar a casa, a mulher continua esse
processo, a dupla ou a tripla jornada de trabalho pode ocasionar desgastes à
mulher, que não tem seu potencial de dona de casa, esposa, mãe e profissional
reconhecidos.
A autora traz à discussão a questão da contemporaneidade, retratando o
questionamento sobre a capacidade da mulher em cuidar de sua família, gerando
sustento, e a capacidade do homem em administrar, com maior independência,
havendo um estigma de que famílias monoparentais femininas não possuem
condições de oferecer cuidados e proteção a seus membros. Porém, a autora
esclarece que este pensamento está sendo redefinido, pois existem inúmeras
famílias em que a mulher exerce papel central na esfera produtiva. São as famílias
chefiadas por mulheres.
As famílias recompostas, que são formadas por pessoas que terminam sua
união conjugal e iniciam outra, nascendo dessa nova união agregando os sujeitos
aos novos que vão nascendo. As famílias recompostas estão também presentes
nesse novo contexto. Pode ser que houve nova união após o término da outra união
conjugal e que, dessa união, novos sujeitos históricos venham a existir. (Oliveira,
2009, p. 75).
Outra discussão abordada pela autora que também está inserida nesse novo
contexto é o número reduzido de filhos e a modificação do conceito de maternidade
e o impacto dessas transformações na sociedade. O filho e a maternidade são
experiências sociais diferenciadas para pessoa. Podemos observar o reflexo dessa
nova realidade da população, de uma maneira geral, têm envelhecido, as crianças
têm sido evitadas, com o controle de natalidade, e as pessoas têm cada vez mais se
divorciado, cenário bem diferenciado da décadas atrás.
Por fim, a autora nos alerta acerca da necessidade de discussões sobre a
temática família, algo que perpassa pelos caminhos da sociedade. Muito se tem
afirmado vários conceitos evoluíram ou, até mesmo, encontram-se novamente
perceptíveis em nossa realidade. Todas as questões que estão sendo refletidas
convidam-nos a um olhar diferenciado e especial a esta organização. É importante
verificarmos que as diferentes maneiras de configurações familiares são, em sua
maioria, devidas às circunstâncias da vida e não uma opção de vida.
45
Na realidade, ainda carregamos resquícios do modelo patriarcal de família,
que foi evoluindo até a formação do modelo nuclear. Consideramos que os arranjos
familiares, ou as novas maneiras de ser família não são contrapostos ao modelo
nuclear de família. Nesse sentido, eles são apenas diferentes formas de expressão
da família. É certo que, se partirmos da perspectiva de análise da totalidade,
chegaremos à conclusão que a familiar está intimamente ligada à conjuntura social.
O que vemos na nossa realidade, é que de fato, se tem novos conceitos a
respeito de família, porém devemos estar certos de que velhos conceitos continuam
sendo reproduzidos, mas, como bem afirmou a autora, com outras roupagens,
repaginados.
A autora esclarece que apesar de os conceitos de família terem sido aprimorados, ou ainda, inseridos dentro da realidade concreta de cada época, atualmente ainda encontramos determinados conceitos que se repetem com outra roupagem. (OLIVEIRA, 2009, p. 76).
Atualmente segundo a autora, os arranjos familiares estão muito presentes, e
esses arranjos não se inicial com o casamento, ou mesmo, as famílias
monoparentais também não apresentam este tipo de composição, estão presentes
somente apenas um dos pais e dos filhos, ou seja, a família tem a figura do pai ou
da mãe.
Oliveira (2009) observa, que, contudo, é a existência de grande parcela da
população que se separa, constitui uma nova família, com os mesmos padrões da
família nuclear, apesar de ser a segunda constituição. Geralmente, o ex-cônjuge
busca constituir uma nova união, sendo que dessa união descendem os filhos do
novo casal.
Segundo a autora é certo que atualmente o modelo tradicional de família deu
espaço a uma infinidade de outros modelos familiares que têm muitas diferenças do
padrão nuclear tradicional. Essas alterações são partes de nossas histórias, de
nossa sociedade e de nossas vidas. A situação em que estamos vivendo demonstra
as possibilidades de reflexões acerca das famílias na sociedade contemporânea.
Independente das expressões e das várias formas de organizações das
famílias contemporâneas, esta possui um papel muito importante e fundamental na
vida das pessoas, pois como tratado nessa discussão, devemos entendê-la como
espaço da iniciativa dos afetos e todo aprendizado que esses afetos podem trazer e
46
seus componentes, é ímpar na sociedade. Toda a construção feita nesse espaço
rebatera na construção dos sujeitos históricos da sociedade.
Independentemente das múltiplas maneiras de se organizar, de se constituir enquanto família, ela possui um papel de socialização importante e primordial na vida das pessoas. Entendê-la, como espaço de construção da iniciação dos afetos e de todo aprendizado que esses afetos podem trazer a seus componentes, é ímpar na sociedade. Essas construções rebaterão na construção dos sujeitos históricos da sociedade. (OLIVEIRA, 2009, p. 83)
Enfim, a autora nos faz pensar o Brasil enquanto país que também vivencia
as manifestações da questão social tão presentes em seu cotidiano. Faz-nos
reportar ao fato de que as famílias brasileiras precisam de melhorias em suas
condições de vida, em suas construções do dia a dia, em seus componentes. A
manifestação da desigualdade social presente traz o retrato da nova família em um
novo cenário, nos mostrando que essa nova conjuntura familiar se distancia do
acesso ao mínimo de sobrevivência.
A desigualdade social é um fato reproduzido pela ideologia capitalista. A
sociedade contemporânea é modificada pela realidade dessa conjuntura de trabalho,
consumo e muitas outras expressões da questão social que se enlaça com as
relações familiares. A autora afirma que em meio às novas configurações, as
famílias tem um desafio de sobreviver nessa sociedade em tempo de mudanças e
de continuar exercer o seu papel, mesmo nessa nova conjuntura. Destacando a
importância da família, no qual os sujeitos desenvolvem suas primeiras experiências
enquanto membros da sociedade.
Por fim, Oliveira (2009) afirma que este desafio de poder buscar reflexões
sobre os conceitos de família traz para nós uma experiência enriquecedora e, ao
mesmo tempo, cumula-nos de expectativas para aprofundarmos em determinados
temas que não são somente polêmicos, mas estão presentes em nosso cotidiano.
3.2 Breve históricos da política social no Brasil.
Frederico (2009) inicia sua fala nos explicando que os momentos mais
importantes de nossa história foram marcados pela composição das elites e pela
exclusão da participação popular. Da independência ao fim do regime militar, as
transformações modernizadoras foram realizadas pelo alto. A própria industrialização
não se deu num confronto da burguesia com o mundo agrário. Ao contrário, foi o
47
capital da cafeicultura que bancou o desenvolvimento industrial. Desde o início,
portanto, não tivemos uma oposição aberta entre uma burguesia progressista e os
retrógrados latifundiários.
Segundo o autor a essa característica soma-se a forma como se deu a
abolição da escravatura e o destino reservado aos antigos escravos. Último país a
colocar fim ao escravismo nas colônias, o Brasil herda uma tradição de brutalidade
nas relações de trabalho que irá persistir no capitalismo industrial. Essa tradição faz
com que o trabalho manual seja considerado uma atividade desprezível e, em
contrapartida, o trabalho intelectual, privilégio das classes altas, uma atividade
honorífica e que, portanto, não precisa ser bem remunerada. Quanto aos antigos
escravos e seus descendentes, não encontrando lugar no mercado de trabalho,
ficaram desde então condenados á marginalidade e ao nosso racismo cordial.
A industrialização nascente precisava de mão-de-obra e, para isso, recorreu
ao trabalho dos imigrantes europeus que trouxeram para cá as formas de
consciência e organização do movimento anarquista. Os primeiros jornais dos
trabalhadores, escritos em italiano e espanhol, testemunham o isolamento dessa
classe social em formação. Frederico (2009) afirma que o desenvolvimento industrial
e o impacto causado pela revolução russa de 1917 propiciarão a entrada em cena
dos comunistas.
Uma peculiaridade sempre assinalada pelos historiadores é que o
comunismo, no Brasil, não foi o resultado de uma cisão da socialdemocracia, como
na Europa, mas um desdobramento do anarquismo. Depois, com a entrada dos
tenentes no Partido Comunista e de seu líder, Luiz Carlos Prestes, outra
peculiaridade irá se refletir no movimento operário e em sua organização política: a
forte presença dos militares.
O autor esclarece que as greves nesse período eram consideradas uma
questão de política. Para entender essa frase, é preciso lembrar que o liberalismo
então vigente mantinha o Estado afastado das relações trabalhistas. Tais relações
ocorriam na esfera do direito privado. Uma greve, assim, era interpretada como
perturbação da ordem pública a ser reprimida pela ação policial.
O autor afirma que a década de 30 foi marcada por profundas alterações na
forma de atuação do Estado. Este não se limitou a interferir momentaneamente nos
rumos da economia, mas a executar uma ação coesa em todas as franjas da vida
social. Para o bem e para o mal, Vargas criou o moderno Estado brasileiro e pôs em
48
movimento um plano que fez com que o Brasil se tornasse o país capitalista que
mais se desenvolve no século XX.
Frederico (2009) enforma que a presença do Estado manifestou-se
plenamente nas relações de trabalho, através de uma impressionante criação de leis
e decretos que se cristalizaram, em 1943, na Consolidação das Leis do Trabalho. A
presença do Estado nas relações de trabalho significa, antes de tudo, a admissão
legal de que as partes envolvidas, os compradores e vendedores da mercadoria
força de trabalho, não são sujeitos iguais. O reconhecimento do trabalho assalariado
como a parte mais fraca da transação impôs limites legais à voracidade do capital.
O autor afirma que, por outro lado, a luta operária logo se encarregou de
desmascarar esse formalismo jurídico, ao evidenciar que o que se passa no
mercado de trabalho não é uma mera troca de equivalentes entre cidadãos livres,
mas uma relação de exploração entre classes, dissimulada sob o manto do contra
atualismo. Acrescentando que após a intervenção estatal, as relações de trabalho
saíram da esfera do direito privado e passaram a existir no terreno conflitivo do
direito público. A presença estatal politizou o mercado de trabalho que se
transformou no campo de batalha das classes antagônicas e não mais na esfera
privada dos litígios individuais. Assim de caso de política, o movimento operário
transformou-se num caso de política, num ato privilegiado das lutas sociais.
O autor esclarece que a história pós-30 foi o desenvolvimento de uma ideia
filosófica aplicada ao conjunto da vida social. O Estado deixa de lado o não
intervencionismo pregado pelos liberais e promove o desenvolvimento econômico do
país. Os sindicatos passaram a abarcar o conjunto da classe operária urbana,
deixando de serem sindicatos de minorias militantes. Entendido como instrumento
gerador da coesão social, deveria servir para fermentar a solidariedade entre os
trabalhadores e ser um órgão de colaboração com o Estado. Paralelamente à
criação dos sindicatos oficiais, foi implantada uma rede de proteção social, expressa
nas leis trabalhistas e na instituição do salário mínimo, cujo patamar, até hoje, é uma
reivindicação inalcançável: necessitaria de um aumento de aproximadamente 300%.
O autor acrescenta que a herança getulista foi um tema que propiciou
discussões apaixonadas no movimento operário. O controle ministerial sobre os
sindicatos durante a ditadura militar serviu para desarticular o movimento operário.
Essa constatação foi a principal referência do novo sindicalismo, que, em sua fase
49
inicial, levantou as bandeiras contra o controle estatal, a unicidade sindical e o
imposto compulsório.
O autor encerra sua participação na discussão onde fala sobre as classes e
as lutas sociais que impulsionaram a garantia de direitos, nos informando que em
seu discurso de despedida do senado, Fernando Henrique Cardoso anunciou que
seu governo iria marcar o fim da era Vargas. De fato, a ofensiva neoliberal fez o que
pôde para desmanchar a antiga ordem, começando pela privatização das
companhias estatais.
Entrando na área da saúde, vamos trazer para discussão Simões (2011) o
autor afirma que no âmbito da saúde, institui um sistema corporativista, voltado
especificamente para os trabalhadores, incentivando-os à integração no sistema
sindical, por meio da transformação das antigas Caixas de Aposentadoria e Pensão
(CAPs) nos Institutos de Aposentadorias e Pesões (IAPs), autarquias dirigidas por
conselhos, com representação tripartite (empregadores, trabalhadores e governo),
como adiante exposto, acerca da previdência social.
O autor esclarece que a alteração fundamenta foi: até então, a integração dos
trabalhadores era pontual, por meio das empresas em que trabalhavam, pois havia
uma CAP para cada empresa; pelos IAPs, passaram a integrar-se por categorias
profissional, vinculada a atividade econômica (industriários, comerciários, bancários,
portuários e outros). O autor cita como exemplo, os bancários, que
independentemente do banco de que eram empregados, tinha um único instituto, o
famoso IAPB.
Os IAPs, além dos benefícios previdenciários, desenvolveram serviços de
saúde, um sistema classista que sobreviveria mesmo após sua unificação, com a
instituição do antigo Instituto Nacional de Previdência Social (INPS) e do Instituto
Nacional de Assistência Médica da Previdência Social (INAMPS), até a extinção
deste, quando foi substituído pelo Sistema Único de Saúde (SUS), pela Constituição
de 1988.
Simões (2011) afirma que os institutos asseguravam o acesso dos
trabalhadores a um plano de assistência médica. Até então, desde antes da
República e durante a República velha, eram atendidos pelas Santas Casas, em
razão dos baixos salários e de horários extensivos de trabalho. Os serviços desse
plano passaram a ser prestados diretamente ou em hospitais e clínicas conveniados,
50
por médicos assalariados ou credenciados. Nas grandes cidades, os institutos
organizaram o Serviço de Atendimento Médico Domiciliar de Urgência (SAMDU).
Segundo o autor com a unificação do ILPs, a uniformização dos benefícios
previdenciários, prevista na LOPS de 1960 e a criação no INPS, em 1967, o regime
militar viabilizou a política dos convênios com os setores privados de assistência
médica. A medicina previdenciária teve seu auge no regime militar, durante os anos
do denominado milagre econômico, incentivando-se o atendimento à saúde do
trabalhador, em face dos recordes de acidentes e doenças do trabalho no período e
a regulamentação das normas de higiene e segurança do trabalho.
Em 1969, o então Ministério do Trabalho e Previdência Social autorizou os
convênios de assistência médica, inclusive de trabalhadores rurais. Segundo o autor
a tendência à privatização da assistência médica previdenciária recrudesceu. Em
1970, o INPS contava com apenas 25 hospitais próprios, mas mantinha convênios
com 2.634 hospitais privados. Essa situação resultava da política adotada pelo
famoso Plano Nacional de Saúde, que pretendeu descentralizar a assistência
médica, transferindo-a da previdência para o Ministério da Saúde. Mas essa medida,
que, em tese, era correta e veio a ser adotada pela Constituição de 1988 (SUS),
entretanto, estava subordinada ao principio da privatização, apoiada por
financiamentos públicos e prevendo, inclusive, o pagamento dos serviços médicos
pelos trabalhadores, de acordo com uma escala salarial. A privatização, que era
apenas complementar do sistema, tornou-se regra.
O autor finaliza, nos informando que com a instituição do Sistema Nacional de
Previdência e Assistência Social (SINPAS), em 1977, a assistência médico-
odontológica ficou a cargo do Inamps. A constituição de 1988 extinguiu a medicina
previdenciária, como adiante exposta, ao instituir o SUS.
A constituição de 1988 declarou o direito à saúde como universal, não
condicionado a contribuição. É o que diz o art. 196 da Constituição e a Lei n. 8.080,
de 19/9/1990 (Lei Orgânica da Saúde- LOS -, que regulamentou os arts. 196 a 200
da Constituição Federal, alterada pelas Leis ns. 9.832/1999 10.424/2002 e
11.108/2005). A Lei n. 8.142, de 28/12/1990, regulou a participação da comunidade
na gestão do SUS e as transferências intergovernamentais de recursos financeiros
na área da saúde. Além disso, instituíram as conferências e conselhos de saúde,
sua estrutura e funcionamento.
51
Por fim, Simões (2011) informa que o SUS é um sistema universal, de que é
usuária toda a população brasileira, rica ou pobre. Mesmo os que não utilizam, dele
se beneficiam por meio das campanhas de vacinação, ações de prevenção e de
vigilância sanitária (como o controle de sangue e hemoderivados, registro de
medicamentos e outros) e de eventual atendimento de alta complexidade, assumido
pelos hospitais públicos universitários, onde se encontram os melhores
especialistas, quando é recusado pelos planos particulares.
As autoras Behring e Boschetti (2011) entram na discussão afirmando que
não existe um momento específico do surgimento dos primeiros indícios das
políticas sociais, pois se trata de um processo social, mas as autoras demarcam
como provável surgimento nos movimentos de ascensão do capitalismo com a
Revolução Industrial.
Não se pode indicar com precisão um período específico do surgimento das primeiras iniciativas reconhecíveis de políticas sociais, pois, como processo social, elas se gestaram na confluência dos movimentos de ascensão do capitalismo com a Revolução Industrial, das lutas de classe e do desenvolvimento da intervenção estatal. Sua origem é comumente relacionada aos movimentos de massa social-democratas e ao estabelecimento dos Estados-nação na Europa ocidental do final de século XIX (Pierson, 1991), mas sua generalização situa-se na passagem do capitalismo concorrencial para o monopolista, em especial na sua fase tardia, após a Segunda Guerra Mundial (pós-1945). (BEHRING E BOSCHETTI, 2011, p. 47).
As políticas sociais advêm de uma formação do capitalismo, porém no Brasil
as relações sociais típicas do capitalismo ocorreram de forma diferente no nosso
país, mas se manteve as características essenciais.
[...] não fomos o berço da Revolução Industrial e as relações sociais
tipicamente capitalistas desenvolveram-se aqui de forma bem diferente dos países
de capitalismo central. (Behring e Boschetti, 2011, p. 71).
No Brasil baseando-nos nas leituras do Caderno da Escola de Educação e
Humanidade, do autor Fernando (2011), de uma forma simplificada, as políticas
sociais começaram a surgir no início do século XX como uma alternativa para conter
os conflitos existentes entre a classe dominante e a classe trabalhadora, com o
intuito de harmonizar essas relações, e não com o objetivo de gerar o bem estar
social.
52
Na visão de Behring e Boschetti (2011, p. 78) o surgimento da política social
no Brasil não acompanha o mesmo tempo histórico dos países de capitalismo
central. Não houve no Brasil escravista do século XIX uma radicalização das lutas
operárias, sua constituição em classe para si, com partidos e organizações fortes.
A questão social já existente nesse país por já apresentar na época, natureza
capitalista, com manifestações objetivas de pauperismo e iniquidade, em especial
após o fim da escravidão e com imensa dificuldade de incorporação dos escravos
libertos para o trabalho. Essa, só se colocou como questão política a partir da
primeira década de século XX, com as primeiras lutas de trabalhadores e as
incipientes iniciativas de legislação voltadas ao mundo do trabalho.
O processo de implantação das políticas sociais no nosso país se deu de
forma lenta, pois foram construídas por meio de muita luta e reivindicações da classe
dominada, alcançando assim um mínimo de condição para atender suas
necessidades básicas para uma vida com mais dignidade.
Podemos constatar isso também nas falas Behring e Boschetti (2011) quando
relatam que o surgimento das políticas sociais foi gradual e difere entre os países,
por depender dos movimentos de organização e pressão da classe trabalhadora, do
desenvolvimento das forças produtivas e das correlações e composições de força do
Estado.
O surgimento das políticas sociais foi gradual e diferenciado entre os
países, dependendo dos movimentos de organização e pressão da classe trabalhadora, do grau de desenvolvimento das forças produtivas, e das correlações e composições de força no âmbito do Estado. (BEHRING & BOSCHETTI, 2011, p.64).
No Brasil os direitos sociais não foram mencionados nas duas primeiras
Constituições Federais. Segundo Fernando (2011) estes apareceram no governo de
Getúlio Vargas, registrando mudanças de ordem econômica e social, na época foram
sancionados diferentes tipos de direitos sociais assegurando ao povo melhores
condições no trabalho e também na sua vida social, obviamente que esses direitos
sociais não foram dados pelos governantes na forma de garantir direitos para os
trabalhadores, mas pela pressão popular.
53
A política social tem seu reconhecimento maior no contexto após a Segunda
Guerra Mundial com o Estado de Bem Estar Social, o famoso Welfare State, dando
enfoque nas classes trabalhadoras, sendo necessário para a reconstrução do
Estado e estabilização da economia.
Fernando (2011, p. 27) relata que no Brasil, o Estado de Bem Estar teve
pouca repercussão, não teve o feito que teve na Europa, na teoria essa política foi
implantada, mas na realidade, ou seja, na prática não foi concretizada.
É comum encontrar na literatura sobre políticas socais a utilização do termo
Welfare State para designar genericamente os países que implementaram políticas sociais sob orientação keynesiano-fordistas, ainda que alguns países não se definam dessa forma [...], também é usual encontrar na literatura brasileira esse mesmo tratamento, ou então utilizar sua tradução (Estado de Bem-Estar) para explicar a realidade brasileira. Encontra-se ainda, mas de modo menos frequente, também a utilização do termo Estado-providência para designar genericamente a ação social do Estado. Essas expressões, entretanto, são formuladas e utilizadas em cada nação para designar formas determinantes e especificas de regulação estatal na área social e econômica. (BEHRING & BOSCHETTI, 2011, p.96).
Nessa época, o Estado começa a ter maior participação na regulação das
políticas voltadas para o interesse no aumento e desenvolvimento capitalista. As
políticas sociais existentes hoje é resultado da conjuntura histórica determinante
para a construção desses direitos sociais, marcada por uma forte influência da
economia liberal mundial, com o seu modelo de acumulação de capital, o qual
também afetou o Brasil.
Ainda em Fernando (2011), vimos que a política pública tem uma forte
caracterização pelo controle aos conflitos sociais. Estes eram e ainda são vistos
como uma possível ameaça à ordem social estabelecida pelos governantes (ordem
aqui referida é aquela implantada injustamente e discriminatória), a qual poderia
colocar em risco a manutenção do modelo de produção e acumulação capitalista da
classe dominadora, e também por ser um instrumento de manipulação por parte do
Estado e pelas instituições capitalistas, passando a ser uma prática de concessões e
não de concretização de direitos estabelecidos na Constituição Federal de 1988.
Assim, no Brasil, no decorrer das décadas, essas políticas sociais foram se
modificando, no sentido de se tornarem de caráter compensatório, isto é, são
destinadas a determinados grupos sociais que contribuem para manutenção do
sistema, ou ordem estabelecida, sendo custeada pelo próprio beneficiário.
54
Com isso emergia ainda mais a desigualdade social aumentando o número da
pobreza que necessitava de proteção assistencial. Esses grupos, os quais recebiam
os benefícios do governo, tinham que atender a critérios de merecimento, isto é,
tendo que contribuir para a acumulação capitalista, com isso o governo regulava as
verbas públicas.
Behring e Boschetti (2011) afirmam que o ano 1923 é a chave para que
possamos entender de fato o formato da política social brasileira, como prova disso
é aprovado à lei Eloy Chaves, que institui a obrigatoriedade de criação de Caixas de
Aposentadorias e Pensão (CAPS), para algumas categorias estratégicas de trabalho
como os ferroviários e marinheiros entre outros.
Nessa época, o Brasil tinha uma economia basicamente fundada na
monocultora do café voltada para a exportação. Por este motivo, os direitos
trabalhistas reconhecidos foram destinados para aquelas categorias inseridos
diretamente nesse processo de produção e circulação de mercadorias.
As CAPS foram às formas originárias da previdência social brasileira, junto com os Institutos de Aposentadorias e Pensão (IAPS), sendo o dos funcionários públicos o primeiro a ser fundado, em 1926. Por fim, em 1927 foi aprovado o famoso Código de Menores, de conteúdo claramente punitivo da chamada delinquência juvenil, orientação que só veio a se modificar substantivamente em 1990, com a aprovação do Estatuto da Criança e do Adolescente. (BEHRING & BOSCHETTI, 2011, p. 80).
Segundo Fernando (2011) se analisarmos todo o contexto histórico do
processo de implantação das políticas sociais no Brasil até os dias atuais, veremos
que realmente o país teve um grande avanço e melhoria da distribuição desses
direitos sociais, mas se analisarmos como funciona o processo de administração e
organização do Estado de hoje, e o que é realmente destinado para a assistência
pública, notaremos que as práticas patrimonialistas e clientelistas ainda persistem. A
demora na execução de tais políticas se dá por estas atitudes, e também pelo puro
desinteresse dos governantes que inibe e trava a efetivação das políticas sociais.
Behring e Boschetti (2011) relatam que o século XX traz mudanças, com a
formação dos primeiros sindicatos na agricultura e nas indústrias rurais a partir de
1903, os trabalhadores urbanos em 1907, quando é reconhecido o direito de
organização sindical, essas mudança aconteceram sob a influência dos imigrantes
que traziam os ares dos movimentos anarquistas e socialista europeus para o Brasil.
55
A passagem para o século XX foi sacudido pela formação dos primeiros sindicatos, na agricultura e nas indústrias rurais a partir de 1903, dos demais trabalhadores urbanos a partir de 1907, quando é reconhecido o direito de organização sindical. Esse processo se dá sob uma forte influencia dos imigrantes que traziam os ares dos movimentos anarquistas e socialista europeus para o país. (IBID, 2011, p. 79).
Com a presença dos movimentos sindicais no cenário político e social
trouxeram de fato mudanças no que desrespeito a relação de força da classe
dominante, Estado e trabalhadora. Como resultado disso, houve a redução legal da
jornada de trabalho para 12 horas diárias em 1911, porém a lei não foi assegurada,
em 1919 foi regulamentada a questão dos acidentes de trabalho no Brasil, mas,
tratando-se pela via do inquérito policial e com ênfase na responsabilidade individual
em detrimento das condições coletivas de trabalho. (Cf. Behring e Boschetti, 2011).
Essas autoras abordam o contexto do final do século XIX e início do século
XX, e afirmam que é fundamental compreendermos que nosso liberalismo à
brasileira não comportava a questão dos direitos sociais, que foram incorporados
não por livre vontade, mas sob pressão dos trabalhadores e com dificuldades para a
sua implementação e garantia efetiva.
É importante concluir esta discussão apontando que a política social, no contexto do capitalismo em sua fase madura, não é capaz de reverter esse quadro, nem é essa sua função estrutural. Contudo, levar as politicas sociais ao limite de cobertura numa agenda de lutas dos trabalhadores é tarefa de todos os que têm compromissos com a emancipação política e a emancipação humana, tendo em vista elevar o padrão de vida das maiorias e suscitar necessidades mais profundas e radicais. Debater e lutar pela ampliação dos direitos e das políticas sociais é fundamental porque engendra a disputa pelo fundo público, envolve necessidades básicas de milhões de pessoas com impacto real nas suas condições de vida e trabalho e implica um processo de discussão coletiva, socialização da política e organização dos sujeitos políticos. (BEHRING & BOSCHETTI, 2011, p. 190).
As autoras explicam que a criação dos direitos sociais no Brasil é resultado da
luta de classes e expressa a correlação de forças predominante. Por um lado, os
direitos sociais, sobretudo trabalhistas e previdenciários, são pauta de reivindicação
dos movimentos e manifestações da classe trabalhadora. Por outro, representam a
busca de legitimidade das classes dominantes em ambiente de restrição de direitos
políticos e civis, como demostra a expansão das políticas sociais no Brasil os
56
períodos de ditadura (1937-1945 e 1964-1984), que as instituem como tutela e favor:
nada mais simbólico que a figura de Vargas como pai dos pobres, os anos 1930.
Fernando (2011) afirma que atualmente o Brasil esta em constante
desenvolvimento econômico, o que é de muita importância para o país, mas em se
tratando de desenvolvimento social, não evolui na mesma proporção, muito pelo
contrário, a exploração da força de trabalho por parte das indústrias capitalistas, as
quais só pensam em acelerar o ritmo de produção visando somente os lucros, só
contribui para o aumento da desigualdade social. Não há eficiência em atingir os
objetivos de erradicar a pobreza nos diferentes segmentos sociais das políticas
públicas no país, como consta na Constituição Federal de 1988. Na verdade, não se
é possível erradicar pobreza com politicas sociais, mas, sobretudo, no
enfrentamento das desigualdades de classes sociais.
A Constituição Federal de 1988 define um modelo de proteção social,
configurado segundo Gomes (2009) como um sistema de seguridade social, esse
sistema engloba três políticas sociais: a previdência social (elaborada nos moldes de
seguro social contributivo), assistência social (para quem dela necessita) e a saúde
(com acesso universal a todos).
Art. 194. A seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos poderes públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social. (BRASIL, Constituição 1988, 2012, p. 115).
Interpretamos inicialmente a Constituição Federal de 1988 porque iremos falar
um pouco da seguridade social, porém antes entrarmos no âmbito do Brasil, é
necessário voltar para o passado e conhecer de fato a origem da seguridade antes
da sua história com o povo brasileiro.
Salvador (2010) vem nos falar que a ideia de seguridade social se desenvolve
gradualmente a partir da sansão do Social Security Act pelo presidente norte-
americano Franklin Roosevelt, em 1935, mas somente após o Informe Beveridge,
em 1942, quando ocorreu uma ampliação e doação para diversos países a favor da
universalização da seguridade social.
57
O autor também nos fala que a lei norte-americana de seguridade social de 14
de agosto de 1935 deve ser compreendida no âmbito da profunda crise da economia
capitalista que se instalou a partir de 1929, que teve seu lado mais perverso na
explosão do desemprego, atingindo 25% da população ativa dos Estados Unidos, e,
1933. Entre as medidas tomadas por Roosevelt, que passaram a integrar o chamado
New Deal, destaca-se a política de seguridade social, cujo objetivo era garantir, por
parte do Estado, níveis satisfatórios de vida para dignidade humana, incluindo todos
os esforços para aumentar o nível de bem-estar da comunidade.
Boschetti (2009, p. 324) relata que a seguridade social nasce nos marcos dos países
capitalistas da Europa ocidental e da América Latina, sua estrutura tendo como
referência a organização social do trabalho, porém se constituía de forma bem
diferenciada em cada país, em decorrência de questões estruturais, como grau de
desenvolvimento do capitalismo e de questões conjunturais, como a organização da
classe trabalhadora.
A autora nos informa que os direitos da seguridade social são baseando em dois
modelos: o modelo alemão bismarckiano e o modelo beveridgiano inglês, ambos
tomando parâmetro com os direitos do trabalho, visto que desde sua origem, esses
assumem a função de garantir benefícios derivados do exercício do trabalho para os
trabalhadores que perderam momentâneos ou permanentemente, sua capacidade
laborativa.
Entrando no território brasileiro, a seguridade social segundo Boschetti (2009, p.324)
foi instituída com a Constituição Federal brasileira de 1988, incorporando princípios
desses dois modelos, ao restringir a previdência aos trabalhadores contribuintes,
universalizar a saúde e limitar a assistência social a quem dela necessitar. Sendo
relatado pela autora que esse modelo brasileiro fica entre o seguro e a assistência, o
que deixa uma grande parcela da população sem acesso aos direitos da seguridade
social.
Em um contexto de agudas desigualdades sociais, pobreza estrutural e fortes relações informais de trabalho, esse modelo, que fica entre seguro e a assistência, deixa sem acesso aos direitos da seguridade social uma parcela enorme da população. (BOSCHETTI, 2009, p. 324).
A autora afirma que as políticas existentes e que constituem os sistemas de
seguridade social em diversos países apresentam as características dos dois
modelos, com maior ou menos intensidade.
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Boschetti (2009) esclarece que um dos pilares de estruturação da seguridade social
é sua organização com base na lógica que estrutura os direitos da previdência social
em praticamente todos os países capitalistas. No Brasil, a lógica do seguro
estruturou e estabeleceu os critérios de acesso da previdência e da saúde desde a
década de 1923 até a Constituição de 1988.
A autora afirma que o principio é garantir proteção, às vezes exclusivamente,
e às vezes prioritariamente, ao trabalhador e sua família. Ainda, segundo a autora, é
um tipo de proteção limitada pelo fato de garantir direitos apenas aqueles
trabalhadores que estão inseridos no mercado de trabalho ou que contribui
mensalmente à seguridade social.
O Brasil segue essa mesma lógica. Só tem acesso aos direitos da seguridade
social os chamados segurados e seus dependentes. Isso acontece porque esses
direitos são considerados como decorrentes do direito do trabalho. São destinadas,
em sua maioria, a pessoas que estão inseridas em relações formais e estáveis de
trabalho possuindo essas duas características centrais.
Boschetti (2009) relata que, inicialmente, são condicionados a uma
contribuição prévia, ou seja, só têm acesso àqueles que contribuem mensalmente e
segundo, o valor dos benefícios é proporcional à contribuição efetuada. Essa é a
característica básica da previdência social no nosso país, que assegura
aposentadorias, pensões, salário-família, auxílio doença e outros benefícios somente
aos contribuintes e seus familiares.
A autora nos relata que essa lógica impõem limites para a universalização da
seguridade social, pelo fato do acesso ser apenas pela via do trabalho. Nos países
onde tinha uma situação de quase pleno emprego podia garantir uma proteção mais
universalizada, porém nem todos os países tiveram essa realidade. Essa foi vivida a
exemplo dos países nórdicos e nem os países da Europa central garantiam esse
pleno emprego para os seus trabalhadores, esse padrão de seguridade social,
fundado na lógica do seguro, só universaliza direitos se universalizar igualmente o
direito ao trabalho.
Segundo a autora a seguridade social pode garantir mais, ou menos, acesso
a direitos, porém é necessário se desvencilhar da lógica do seguro e assumir a
lógica social. Mas, ambas são profundamente dependentes da organização social do
trabalho.
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A seguridade social pode garantir mais, ou menos, acesso a direitos, quanto mais se desvencilhar da lógica do seguro e quanto mais assumir a lógica social. De todo modo, ambas são profundamente dependentes da organização social do trabalho. (BOSCHETTI, 2009, p. 327).
Boschetti (2009) afirma que com a crise vivenciada pelo capitalismo no
início da década de 1970, a implementação de medidas neoliberais e a incapacidade
estrutural de garantir trabalho para todos.
Esses países passaram a abrandar a lógica do seguro no âmbito da
seguridade social e passaram a instituir benefícios desprovidos da exigência de
prévia contribuição, sobretudo na modalidade de programas de transferência de
renda. Na situação predominante até a década de 1970, os benefícios assistenciais
não são incompatíveis com o trabalho caracterizando-se como complemento
importante na redução das desigualdades sociais e satisfação de necessidades
específicas.
Por outro lado a autora vem defender que, na situação contemporânea, os
benefícios assistenciais, sob a forma de programas de transferenciais de renda
permanentes, passam a ter um papel de substituição dos rendimentos dos empregos
inexistentes. Essa situação não resolve, ao contrário, agudiza à histórica tensão
entre trabalho e assistência social, pois é a ausência de trabalho ou emprego que
provoca a demanda pela expansão da assistência, sem que essa seja capaz de
resolver a questão do direito ao trabalho e o direito a ter direitos, nos marcos de
capitalismo.
A autora acrescenta afirmando que a assistência social não pode nem deve
substituir o trabalho, mas pode ser um elemento dentro de um sistema maior de
proteção social, algo amplo, um trabalho conjunto, complementando nos direitos do
trabalho, dando sua contribuição através da transferência de renda do capital para o
trabalho.
Assim, a assistência social não pode e não deve substituir o trabalho, mas pode ser um elemento intrínseco de um sistema maior de proteção social, complementar aos direitos do trabalho, podendo contribuir para transferir renda do capital para o trabalho. (BOSCHETTI, 2009, p. 329).
60
Porém a autora nos informa que no Brasil estamos longe desse padrão de
seguridade social. Pois segundo ela o capitalismo brasileiro implantou um modelo de
seguridade social sustentado predominantemente na lógica do seguro. Desde o
reconhecimento legal dos tímidos e incipientes benefícios previdenciários com a Lei
Elóy Chaves em 1923, predominou o acesso às políticas de previdência e de saúde
apenas para os contribuintes da previdência social. A assistência social manteve-se,
ao longo da história, como uma ação pública desprovida de reconhecimento legal
como direito, mas associada institucionalmente e financeiramente à previdência
social.
Boschetti (2009) assevera que somente com a Constituição de 1988 foi que
as politicas de previdência, saúde e assistência social foram reorganizadas e
reestruturadas com novos princípios e diretrizes e passaram a compor o sistema de
seguridade social brasileiro. A autora afirma que apesar de reconhecer as conquistas
da Constituição no campo da seguridade social, também é impossível deixar de falar
seus limites estruturais na ordem capitalista.
Limites esses que se agravam em países em com condições
socioeconômicas como as do Brasil, de frágil assalariamento, baixos salários e
desigualdades sociais agudas. A autora nos informa que assistência social e a
previdência social, no âmbito da seguridade social, constituem um campo de
proteção que não restringem e nem limitam a lógica de produção e reprodução do
capitalismo. No Brasil, sua lógica securitária determinante a aprisiona no rol das
políticas, que agem mais na reiteração das desigualdades sociais que na sua
redução. E mesmo essa conquista vem sofrendo duros golpes, que estão
provocando seu desmonte, e não sua ampliação.
3.3 Os principais instrumentos legais para a pessoa Idosa:
Ao longo dos anos, o Brasil vem mudando seu perfil demográfico, percebido
pelo aumento da longevidade. Atualmente, os brasileiros tem uma perspectiva de
vida cada vez maior, assim como uma menor taxa de mortalidade.
Segundo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2002)
considerando a continuidade das tendências verificadas para as taxas de
fecundidade e longevidade da população brasileira, as estimativas para os próximos
20 anos indicam que a população idosa poderá exceder 30 milhões de pessoas ao
61
final deste período, chegando a representar quase 13% da população informado no
gráfico do IBGE (2002) abaixo.
A análise da evolução da relação idoso > criança mostra que a proporção de
idosos vem crescendo mais rapidamente que a proporção de crianças: de 15,9% em
1980, passou para 21,0% em 1991, e atingiu 28,9%, em 2000. Em outras palavras,
se em 1980 existiam cerca de 16 idosos para cada 100 crianças, 20 anos depois
essa relação praticamente dobra, passando para quase 30 idosos por cada 100
crianças. Assim, embora a fecundidade ainda seja a principal componente da
dinâmica demográfica brasileira, em relação à população idosa é a longevidade que
vem progressivamente definindo seus traços de evolução.
FIGURA 1: projeção da proporção da população de 60 anos ou mais de idade,
segundo o sexo – Brasil – 2000-2020.
Analisando os dados da nossa realidade, nos perguntamos se o nosso país
está preparado para cuidar, ou melhor, garantir o bem estar, uma vida digna,
qualidade de vida, saúde, educação, enfim, se o nosso país está atendo a todas
essas mudanças de perfil do povo brasileiro e se está de fato preparado para
62
atender essa população com qualidade nos seus serviços, e quando nos referimos
em preparação, estamos nos remetendo a acesso à política pública de qualidade.
Se olharmos para os dois lados da moeda veremos que por um lado é um
avanço, nossos idosos estão vivendo mais, os brasileiros hoje tem uma vida longa,
porém o outro lado nos mostra que com a idade também vem uma série de
complicações, como o adoecimento dessa população, o que alerta ao nosso país a
focar e investir, nas políticas voltadas para todas as políticas sociais.
Munhol (2009) afirma que o marco das conquistas relacionadas aos direitos
dos idosos teve seu início em 10 de dezembro de 1948, quando a assembleia Geral
das Nações unidas adotou e proclamou a Declaração Universal dos Direitos
Humanos.
A declaração afirma que todas as pessoas nascem livres e iguais em
dignidade e direitos, que não haverá distinção de raça, sexo, cor, língua, religião,
política, riqueza ou de qualquer outra natureza, e prescreve, no artigo 25, os
chamados direitos dos idosos:
Toda pessoa tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar a si e a sua família saúde e bem-estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação, cuidados médicos e os serviços sociais indispensáveis, e direito à segurança, em caso de desemprego, doença, invalidez, viuvez, velhice ou outros casos de perda dos meios de subsistência em circunstâncias fora de seu controle. (MUNHOL, 2009, p.31).
A longevidade da população brasileira é um fato da contemporaneidade.
Assim como a taxas de mortalidade estão caindo a cada ano, significa dizer que o
país que antes era visto como um país jovem mudou seu perfil, se tornou um país
predominante de pessoas idosas, diante dos fatos, se fez necessária uma atenção
especial para essa nova realidade por parte do Estado, o que significou em mais um
avanço para os idosos, que foi a criação de algumas legislações nas três útimas
décadas.
Para que seja possível conhecermos os instrumentos legais para a pessoa
idosa no nosso país, é necessário que comecemos com uma pequena introdução
dos pilares de sustentação desses instrumentos, que parte dos princípios legais da
Constituição Federal de 1988, baseando-nos na leitura do livro de Gomes (2009)
Políticas públicas para a pessoa idosa: marcos legais e regulatórios, vamos falar
sobre os instrumentos legais que dão suporte a pessoa idosa no nosso país.
63
Começando com Constituição Federal de 1988, que define um modelo de
proteção social como um sistema de seguridade social que envolva a previdência
social (elaborada nos moldes de seguro social), a assistência social (entendida
como direito e não como filantropia) e a saúde, ou seja, uma articulação com os
direitos contributivos e transferências de renda não contributivas vinculadas à
assistência social sob a égide dos direitos sociais. (Gomes, 2009, p. 13).
Essa proteção social definida na constituição federal de 1988 como
seguridades social, em uma linguagem mais simples se trata de um direito do
cidadão que deve ser garantido pelo Estado para essas políticas.
Anos após a Constituição Federal, partindo da mesma direção da assistência
social, foi promulgada a Lei Orgânica da Assistência Social (Loas) em 1993. A LOAS
foi reconhecia como politica pública de seguridade social, se tornou responsável
pela oferta de proteção social não contributiva à população socialmente mais
vulnerável; gestão compartilhada pela implantação dos conselhos e criação dos
fundos de assistência social nas três esferas de governo; elaboração dos Planos
municipais de assistência Social (PMAS); criação de instâncias de pactuação e
realização de conferências nos três níveis governamentais, participação e
consensos na evolução dessa polÍtica. (Gomes, 2009, p. 14).
A Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS), Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993, foi criada com o objetivo de garantir uma política de proteção a quem necessita. Sua promulgação foi fruto do esforço conjunto de parlamentares, gestores, servidores públicos e representantes da sociedade civil. (LOAS, 2013, p. 7)
O Parágrafo Único das LOAS (2013) trata-se do enfrentamento da pobreza,
afirmando que a assistência social realiza-se de forma integrada às políticas
setoriais, garantindo mínimos sociais e provimento de condições para atender
contingências sociais e promovendo a universalização dos direitos sociais.
Segundo Gomes (2009), a LOAS traz também, formas de transferência de
renda direta ao beneficiário, como o Benefício de Prestação Continuada (BPC). O
modelo de financiamento é de responsabilidade da união, dos estados, Distrito
Federal e municípios, primando pelo co-financiamento construído por meio de pacto
federativo.
64
O BPC é um direito constitucional regulamentado pela LOAS, no valor de um
salário mínimo para idosos com 65 ou mais e pessoas com deficiência que
comprovem renda familiar inferior um quarto do salário mínimo, que prove que não
tem condições de prover sua subsistência. Trata-se de um beneficio assistencial,
não sendo necessário contribuir para a previdência.
Benefício de Prestação Continuada (BPC) é um direito constitucional regulamentado pela LOAS no valor de um salário mínimo para idosos com 65 anos ou mais e pessoas com deficiência que comprovem renda familiar inferior a um quarto do salário mínimo, ou seja, sem condições de prover sua subsistência. Não se trata de uma aposentadoria ou pensão, mas de um benefício assistencial, cujo beneficiário não precisa ter contribuído anteriormente para a Previdência Social. (GOMES, 2009, 18).
A autora acrescenta que em mais de 70% dos casos direcionados ao sustento
da família, representa, para a população idosa, o principal benefício social operado
por meio de transferência de renda. Os fundos de assistência social estão alocados
nos órgãos gestores responsáveis pela política de assistência social, e o repasse de
recursos é feito somente quando a instituição e funcionamento dos respectivos
conselhos e planos de assistência social.
Tendo em vista a mudança do perfil populacional do nosso país de jovem para
predominante de pessoas idosas, no qual o povo brasileiro vive mais e a taxa de
mortalidade diminuiu, se fez necessária uma atenção especial para essa nova
realidade por parte do poder público. Assim, criou-se a Política Nacional do Idoso no
Brasil, Lei Nº 8.842, que deriva o Conselho Nacional do Idoso e dá outras
providencias para assegurar os direitos dos Idosos, foi decretada pelo Congresso
Nacional e sancionada pelo Presidente da República em 04 de Janeiro de 1994.
A Política Nacional do Idoso tem como objetivo assegurar os direitos sociais
dos idosos, não apenas vista por um ângulo, mas de uma foram mais abrangente,
quando se refere ao Art. 3°. Inciso I - que tanto a família como sociedade e estado,
tem e deve assegurar ao idoso todos os direitos da cidadania, garantindo sua
participação na comunidade, defendendo sua dignidade, bem-estar e o direito a vida.
Artigo 1º trata-se dos objetivos da PNI, que é de assegurar os direitos sociais
do idoso, criando condições para promover sua autonomia, integração e participação
efetiva na sociedade.
65
A lei nº 8.842, que instituiu a Política Nacional do Idoso (PNI), foi sancionada
em 4 de janeiro de 1994 como já citado acima, mas sua regulamentação veio pelo
Decreto nº 1.948, de 3 de julho de 1996.
A referida lei cumpre sua missão, entre outras estratégias, quando atribui
competências a órgãos e entidades públicos, sempre de forma alinhada a suas
respectivas funções. Determina que cada esfera de governo e ministério de acordo
com suas competências elabore proposta orçamentária visando ao financiamento de
programas compatíveis e integrados (inter e intraministeriais) voltados aos idosos e
promova cursos de capacitação, estudos, levantamentos e pesquisas relacionados à
temática da velhice e envelhecimento, em suas múltiplas dimensões.
A Politica Nacional do Idoso institui várias modalidades de atendimento ao
idoso, entre elas: Centro de Convivência; Centro de Cuidados Diurno: Hospital-Dia e
Centro-Dia; Casa-lar; oficina abrigada de Trabalho; atendimento domiciliar. Pontua
que a atenção ao idoso deve ser feita por intermédio de sua família, em detrimento
da internação em instituições de longa permanência. Assim, o atendimento integral
institucional será prestado ao idoso sem vínculo familiar que não tenha condições de
prover a própria subsistência no tocante a moradia, alimentação, saúde e
convivência social. Nessa hipótese, serviços nas áreas sociais e da saúde são
prestados a esta população.
A Lei 10.741 de 1º de outubro de 2003 deu origem ao Estatuto do Idoso que
conhecemos, assegurando os direitos às pessoas com idade igual ou superior a 60
(sessenta) anos, na tentativa de garantir aos idosos uma vida de cidadania, como
direito a vida, liberdade, respeito, dignidade, alimentação, saúde, vacinação, exames
regulares, medicamentos, contratos de planos de saúde sem aumento de valores
por idade, educação, cultura, lazer, profissionalização e do trabalho, previdência
social, assistência social, habitação, transporte, carteira do idoso e acesso à justiça.
O Estatuto foi elaborado com a participação forte das entidades de defesa dos
interesses das pessoas idosas, e não poderia ser diferente, pois como saberiam as
reais dificuldades e problemas enfrentados pelos idosos, se nessa importante
elaboração deste instrumento, não tivessem pessoas com reais interesses em
garantir os direitos das pessoas idosas.
Ao analisar o Estatuto do Idoso como um todo, nós percebemos a importância
de cada capitulo, de cada artigo. Diferentemente da PNI que tem a finalidade de
assegurar direitos sociais que garantiriam a promoção da autonomia,
66
integração e participação efetiva do idoso na sociedade, o estatuto é uma lei
que vem garantir e ampliar os direitos dos idosos, ou seja, ele é muito mais
abrangente. Destacamos um artigo que é capaz de resumir todos os outros de
uma forma bem objetiva, que serve como base para a formulação dos demais, o Art.
3.º da todas as informações a respeito das garantias de direitos dos idosos antes de
ser esmiuçado ao longo dos capítulos.
Art. 3.º É obrigação da família, da comunidade, da sociedade e do Poder Público assegurar ao idoso, com absoluta prioridade, a efetivação do direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, à cultura, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à liberdade, à dignidade, ao respeito e à convivência familiar e comunitária. (BRASIL. 2003.p.8).
Parágrafo único. A garantia de prioridade compreende:
I - atendimento preferencial imediato e individualizado junto aos órgãos públicos e privados prestadores de serviços à população; II - preferência na formulação e na execução de políticas sociais públicas específicas; III - destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção ao idoso; IV - viabilização de formas alternativas de participação, ocupação e convívio do idoso com as demais gerações; V - priorização do atendimento do idoso por sua própria família, em detrimento do atendimento asilar, exceto dos que não a possuam ou careçam de condições de manutenção da própria sobrevivência; VI - capacitação e reciclagem dos recursos humanos nas áreas de geriatria e gerontologia e na prestação de serviços aos idosos; VII - estabelecimento de mecanismos que favoreçam a divulgação de informações de caráter educativo sobre os aspectos biopsicossociais de envelhecimento; VIII - garantia de acesso à rede de serviços de saúde e de assistência social e locais. (BRASIL, p. 8-9).
A responsabilidade para com idoso não é apenas da família, como muitos
pensam, é também obrigação da sociedade civil, assim como é dever do Estado
garantir e assegurar seus direitos e o bem estar desses idosos lhe proporcionando
uma vida de qualidade, com saúde, cultura, lazer, esporte, trabalho, liberdade,
cidadania, enfim, garantir uma vida digna, respeitando os direitos desses idosos.
Outro momento importante para a população idosa brasileira foi a aprovação
da Política Nacional de Assistência Social (PNAS), em 15 de outubro de 2004,
regulamentada em 2005, pelo Sistema Único de Assistência Social (Suas), que
67
estabelece um pacto federativo para a operacionalização da PNAS.
A assistência social é uma política pública de direitos voltada à prevenção,
proteção, inserção e promoção social, desenvolvida em conjunto com outras
políticas públicas, como bem sabemos o histórico da assistência social sempre
esteve associada ao caráter clientelista, imediatista e assistencialista, porém como
politica pública vem romper com esses paradigmas e trilhar novos caminhos, de
direitos e não de favores, a assistência social visa garantir proteção social a todos os
que dela necessitam, independentemente de qualquer contribuição prévia.
A PNAS promove, sobretudo, a defesa e atenção dos interesses e
necessidades sociais, particularmente das famílias, seus membros e indivíduos mais empobrecidos e socialmente excluídos. Cabem, por isso, à assistência social, segundo essa política, as ações de prevenção, proteção, promoção e inserção; bem como o provimento de um conjunto de garantias ou seguranças que cubram, reduzam ou previnam a vulnerabilidade, o risco social e eventos; assim como atender às necessidades emergentes ou permanentes, decorrentes de problemas pessoais ou sociais de seus usuários e beneficiários. (SIMÕES, 2011, p. 314)
Ou seja, qualquer cidadão brasileiro tem direito aos benefícios, serviços,
programas e projetos socioassistenciais sem precisar contribuir, o que permite
eliminar ou reduzir os níveis de vulnerabilidade e risco social.
Tratamos dos instrumentos legais que regem as pessoas idosas, de uma
forma simplificada, sabemos que todos esses acontecimentos não surgiram do
nada, existe entre esses espaços de uma conquista, a organização de lutas por
essas garantias de direitos, como tratamos no tópico do contexto histórico das
politicas sociais no Brasil, onde tratamos das lutas da classe trabalhadora, como
bem explicou Behring e Boschetti (2011) que a criação dos direitos sociais no Brasil
é resultado da luta de classes. Porém nosso objetivo neste tópico foi de informar os
instrumentos existentes que regem as pessoas idosas no nosso país.
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4 O CONTEXTO HISTÓRICO DAS INSTITUIÇÕES DE LONGA PERMANÊNCIA
PARA IDOSAS (OS) (ILPI) NO BRASIL
4.1 ILPI no Brasil e no Ceará.
Camarano (2008) afirma que não se tem informações de caráter mais geral
sobre a aceitação (ou não) da população brasileira, em particular dos idosos, de uma
possível residência em uma instituição.
Historicamente, as instituições têm sido vistas com resistência e preconceito,
como depósito de idosos, lugar de exclusão, dominação e isolamento ou,
simplesmente, um lugar para morrer. Isto pode ser resultado do fato, dentre outros,
de que a história da institucionalização da velhice começou como uma prática
assistencialista, predominando na sua implantação a caridade cristã.
A autora esclarece que as instituições abrigavam as pessoas abandonadas
e/ou não desejadas pela sociedade: “loucos”, crianças, mendigos, “vagabundos” e
idosos. A residência em instituições era resultado da pobreza individual e familiar e o
termo asilo era sinônimo de residência para idosos pobres. Apenas no início do
século XX, as instituições tiveram seus espaços ordenados: as crianças em
orfanatos, os loucos em hospícios e os velhos em asilos. Além disso, a velhice era
percebida como um problema social.
Ainda segundo a autora não há consenso no Brasil sobre o que seja uma
Instituição de Longa Permanência para Idosos (ILPI). Os asilos constituem a
modalidade mais antiga de atendimento ao idoso fora do convívio familiar. Em geral,
surgem, espontaneamente, em razão das necessidades da comunidade, e, por isso,
podem apresentar problemas na qualidade dos serviços oferecidos, o que afeta as
condições de vida dos residentes. Na maioria deles, predomina o caráter
assistencial.
Camarano (2008) afirma que o envelhecimento da população e o aumento da
sobrevivência de pessoas com redução da capacidade física, cognitiva e mental
estão requerendo que os asilos deixem de fazer parte apenas da rede de assistência
social e integrem a rede de assistência à saúde. Salienta-se que esses são
constituídos por domicílios coletivos e devem, portanto, fazer parte de uma política
de habitação. Para expressar a nova função híbrida dessas instituições, a Sociedade
Brasileira de Geriatria e Gerontologia sugeriu a adoção da denominação Instituição
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de Longa Permanência para Idoso (ILPI). Trata-se de uma adaptação do termo
utilizado pela Organização Mundial de Saúde (Long-Term Care Institution).
No entanto, Camarano (2008) salienta que na literatura e na legislação,
encontram-se referências indiscriminadas a ILPIs, casas de repouso e asilos. Pode-
se falar que, de uma maneira geral, as instituições brasileiras oferecem basicamente
residência e algum serviço de saúde. Na maior parte dos casos, as instituições não
se autodenominam ILPIs.
Bibliotecas e/ou sala de leitura são encontradas em apenas 17,9% delas. Por
outro lado, apenas 33,1% dos idosos são dependentes, ou seja, não conseguem
realizar sozinhos as atividades básicas da vida diária e 30,2% são
semidependentes. Reconhece-se que mesmo no caso de idosos independentes,
estes necessitam de algum tipo de serviço de saúde. No entanto, uma parcela
expressiva dos residentes é independente, aproximadamente 37%, o que requer que
as instituições disponibilizem outros tipos de serviços e atividades que propiciem
alguma integração dos mesmos com a sociedade e entre eles próprios.
A autora afirma que não se conhece o número de instituições existentes no
país. O que temos são estimativas de que sejam em torno de 5.000, concentradas
nas capitais estaduais e nas grandes cidades. Nas três regiões onde a pesquisa foi
concluída, foram identificadas 991 unidades. Camarano (2008) esclarece que são
grandes os números de municípios que não tem instituições de longa permanência.
Esses dados, ainda conforme a autora em análise pode ser um reflexo da
legislação vigente e dos preconceitos a ela associados. Consequentemente, é baixa
a sua utilização. Por exemplo, em 2003, existiam no país aproximadamente 2,2
milhões de idosos com dificuldades para a realização das atividades da vida diária e,
aproximadamente, 100 mil residiam em instituições, sendo que nem todos os
residentes tinham a sua autonomia comprometida. Isso significa que pelo menos,
2,1 milhões de idosos frágeis estavam sendo cuidados ou descuidados pela família.
Camarano (2008) aponta para a importância da família como a instância
cuidadora ou negligenciadora dos idosos dependentes. A maioria das instituições
identificadas pela pesquisa é filantrópica, 56,1%, incluindo as religiosas e as leigas.
Destaca-se a importância da Sociedade São Vicente de Paulo (SSVP), que é
responsável por aproximadamente 700 instituições no País. Em segundo lugar,
70
colocam-se as instituições privadas com fins lucrativos; constituem um terço do total.
É baixa a proporção de públicas, 10,6%.
A autora aponta como os motivos mais frequentes na literatura para a
internação dos idosos são baixas condições financeiras, falta de moradia, relações
familiares conflituosas, morte de familiares próximos ou amigos, reduzida atividades
de lazer, saúde precária, falta de cuidador, atendimento médico e de enfermagem
reduzido e ausência de planos privados de saúde.
Entrando no território cearense baseando-nos nos dados do Instituto de
Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) do livro Características das instituições de
longa permanência para idosos da região Nordeste (2008) dos 184 municípios
cearenses, apenas 7,6% possuem ILPIs, do que se pode concluir que o estado
apresenta uma baixa cobertura desta modalidade de serviço. Foram encontradas 30
ILPIs no Ceará, e todas participaram da pesquisa. O maior número dessas
instituições se localiza na capital Fortaleza (10) e em Juazeiro do Norte (7),
enquanto as demais se encontram dispersas em outros municípios do estado, como
mostra o mapa a seguir.
FIGURA 2: Ceará: localização espacial das instituições de longa permanência para idosos por munícipio – 2007-2008.
71
Nas instituições do Ceará encontram-se 1.014 residentes, dos quais 93,2%
são idosos.
Em relação ao total de idosos do estado, dados do Ipea (2008) declaram que
apenas 0,1% da população idosa reside em ILPIs, ou seja, uma proporção muito
baixa. Entre os residentes idosos, verificou-se um predomínio de mulheres. Elas
respondem por 64,2% do total, percentual maior que o encontrado para a população
idosa cearense: 54,7%. Para o Ceará, pode-se concluir que a demanda por
cuidados de longa permanência entre as mulheres é diferenciada por idade, o
mesmo não ocorrendo para os homens.
FIGURA 3: Ceará: proporção de residentes nas instituições de longa permanência por sexo segundo o grau de dependência – 2007-2008.
Ainda consoante os dados da pesquisa do Ipea (2008) mostram que o
número de residentes por instituição no Ceará varia entre 04 e 240 pessoas. Porém
declarando que a média de lotação é de 33 residentes, o padrão geral é de
instituições pequenas. Como mostra o gráfico 4, por exemplo, 30,0% contam com
menos de 10 moradores. Aproximadamente 74% das ILPIs declararam um número
de residentes inferior à média de 33. Apenas 13,3% possuem acima de 50. A
predominância das mulheres nas ILPIs cearenses fica ainda mais evidente, já que
30% das instituições não contam com a presença de homens.
72
FIGURA 4: Ceará: distribuição proporcional das instituições de longa permanência segundo o número de residentes – 2007-2008.
Em termos jurídicos, a pesquisa do Ipea (2008) mostra que no Ceará
predominam as instituições privadas filantrópicas (90,0%), sendo que 46,7% são
religiosas e 43,3% não-religiosas. Das instituições que se declararam filantrópicas,
apenas 53,8% possuem registro de filantropia. Isso se verifica de forma mais
frequente entre as instituições religiosas: 69,2% possuem o registro. A proporção
comparável para as filantrópicas não religiosas foi de apenas 38,5%. Percebe-se,
portanto, que a atribuição da natureza filantrópica do ponto de vista das instituições
não está necessariamente associada à posse do registro de filantropia. Instituições
públicas constituem apenas 10,0% do total. Não há no estado instituições mistas ou
privadas.
73
FIGURA 5: Ceará: distribuição proporcional das instituições de longa permanência segundo a natureza -2007-2008.
Segundo a pesquisa do Ipea (2008) no Ceará as instituições existentes no ato
da pesquisa, a mais antiga foi fundada em 1905 e mais nova em 2008, a partir da
década de 1980 o número de instituições aumentaram com mais rapidez, sendo
esclarecido que em 1990 surgiu o mesmo número de instituições abertas entre 1940
e 1979. Sendo afirmado que a partir de 2000, houve uma diminuição no ritmo de
aparecimento de novas instituições. Sendo associada essa diminuição com a
legislação que tornaram mais rígidos as condições de funcionamento das ILPIs.
Das instituições existentes no Ceará no momento da pesquisa, a mais antiga foi fundada em 1905 e a mais recente, em 2008. Como mostra a tabela 2, 31,0% das em funcionamento iniciaram suas atividades no período compreendido entre 1940 e 1979. A partir da década de 1980, o número de instituições passou a crescer mais rapidamente, sendo que na década de 1990 surgiu o mesmo número de instituições abertas entre 1940 e 1979. A partir de 2000, nota-se uma diminuição no ritmo de aparecimento de novas instituições. Isto pode estar associado às legislações que tornaram mais rígidas as condições de funcionamento de uma ILPI. Salienta-se que esses dados referem-se às instituições em funcionamento no momento da pesquisa, não se tendo informações das que fecharam nesse período de tempo. (IPEA, 2008, p. 75).
74
FIGURA 6: Ceará: número e distribuição proporcional de instituições de longa permanência por ano de início de funcionamento – 2007-2008.
Em relação aos serviços oferecidos nas ILPIs do Ceará, a pesquisa informa
que fisioterapia é o serviço disponível no maior número de instituições (51,7% delas)
seguido por serviços médicos, declarados por 37,9%. No entanto, apenas 20,0% das
instituições informaram possuir serviços médicos próprios. Cerca de 90,0% das ILPIs
declararam utilizar o Sistema Único de Saúde (SUS), enquanto 33,3% utilizam
também serviços médicos particulares, incluindo planos de saúde. Outros serviços
relacionados aos cuidados específicos com a saúde também foram mencionados,
entre eles terapia ocupacional (em 27,6%), serviços psicológicos e dentários (13,8%
cada) e fonoaudiologia (6,9%). Além disso, são oferecidos aos residentes cursos
diversos (tricô, crochê, tecelagem, jardinagem etc.) e atividades educacionais por
27,6% e 6,9% das instituições, respectivamente. Embora as mulheres predominem
entre os residentes, 35,6% destes são homens, e as atividades oferecidas, tais como
cursos, são voltados principalmente para as mulheres.
75
FIGURA 7: Ceará: distribuição proporcional das instituições de longa permanência segundo serviços oferecidos dentro da ILPI – 2007-2008.
As pessoas que atuam dentro das ILPIs cearenses contam com profissionais
que possuem variados vínculos. Segundo a Ipea (2008) a maior parte deles é
constituída por funcionários da própria instituição ou de cedidos por órgãos públicos
(65,1%). Em segundo lugar estão os voluntários, responsáveis por 26,9%, divididos
em 18,5% que comparecem regularmente às instituições e 8,3% que são voluntários
esporádicos. Estagiários representam 8,1% do quadro de pessoa.
E por fim, a pesquisa trata a respeito do financiamento das instituições e das
parcerias, no financiamento apresenta uma variada composição, como mostra o
gráfico 14, e está associado à natureza das instituições cearenses. Conforme
mencionado anteriormente, 90,0% das ILPIs são filantrópicas. Verifica-se uma
predominância dos recursos de origem pública, que respondem por 31,3% do total.
Participam também de maneira expressiva das fontes de financiamento as doações
em dinheiro (27,9%) e os recursos provenientes das contribuições dos residentes e
do pagamento de mensalidades (27,4%). Outro tipo de recurso financeiro é oriundo
das próprias instituições, tais como os repasses das mantenedoras e a realização de
bazares.
76
FIGURA 8: Ceará: composição percentual do financiamento das instituições de longa permanência – 2007-2008.
As parceria segundo os dados do Ipea (2008) contam com recursos obtidos
por uma rede estabelecida com diversos órgãos e instituições. No Ceará, 55,2% das
instituições declaram possuir algum tipo de convênio ou parceria. A segunda
parceria mais importante se dá através de convênios com prefeituras municipais ou
com suas secretarias. Outro parceiro importante para as ILPIs é o Sistema S-
Serviço Social do Comércio (Sesc), Serviço Nacional de Aprendizagem do Comércio
(Senac) Serviço Social da Indústria (Sesi) e Serviço Nacional de Aprendizagem
Indústria (Senai). Entre os serviços obtidos por essas redes, os mais frequentes são:
serviços médicos, fornecimento de medicamento, atividades de lazer e repasses
financeiros.
77
FIGURA 9: Ceará: tipos e formas de parceria ou convênio – 2007-2008.
78
Essa rede de suporte das ILPIs também se deve aos voluntários e estagiários
que atuam dentro da instituição. Todos os professores de educação física que
trabalham nas instituições são voluntários. Estes se destacam também nas funções
de nutricionista, psicólogo e enfermeiro. Os estagiários compõem a maior proporção
do quadro de terapeutas ocupacionais e fisioterapeutas.
4.2 Discorrendo acerca do Abrigo Casa de Nazaré.
Após a apresentação dos dados das Instituições de Longa Permanência no
Brasil e Ceará, chegamos ao abrigo Casa de Nazaré, nosso lócus de investigação.
Este é uma instituição filantrópica sem fins lucrativos e de utilidade pública dirigida
pela Companhia das Filhas da Caridade de São Vicente de Paulo de Fortaleza, que
dá assistência às idosas desamparadas, em relação à sua saúde física e bem-estar
mental, sem discriminação de cor, credo religioso, político ou condição social,
observando sempre as disposições legais.
A instituição foi fundada em 15 de Novembro de 1941por Sandulfo Chaves e a
Irmã Mariana Vasconcelos, membro da Companhia das Filhas da Caridade de São
Vicente de Paulo e suas companheiras, com objetivo de abrigar em suas
dependências, senhoras da terceira idade, carentes e desemparadas, oferecendo-
lhes conforto, lazer, assistência médica, moradia e assistência em toda a sua
dignidade como pessoa humana.
Nosso esforço é o de assistir a idosas desamparadas, em relação à sua
saúde física e bem-estar mental, sem discriminação de cor, credo religioso, político
ou condição social, observando sempre as disposições legais.
A Instituição tem como missão: “Servir Jesus Cristo corporal e espiritual na
pessoa dos pobres”
Assim como abrigar, em suas dependências, senhoras idosas carentes e
desamparadas, oferecendo-lhes conforto, lazer, assistência social, religiosa,
moradia, enfim, a promoção para uma VIDA digna.
"Pedacinho do céu", como denominam as idosas que nela residem, está
sempre de braços abertos para acolher com alegria sua clientela e todos os seus
visitantes.
79
A casa tem como objetivos oferecer, às idosas, experiências que
proporcionem a elas a aceitação e compreensão de que necessitam.
Enfatizar sua importância por sua condição humana, pelo que ofereceram à
sociedade, no passado, e pela experiência e sabedoria de vida que podem oferecer
hoje.
A instituição recebe profissionais de Universidades públicas e particulares de
Fortaleza, que oferecem em parceria e voluntariamente diversos tipos de atividades
às idosas acolhidas como: Orientação e exercícios preventivos com alunos de
Enfermagem (UFC e Estácio-FIC); Roda de conversa com Psicóloga (UFC);
Atividades físicas do Curso de Educação Física (UFC); Orientação de Saúde Bucal
do Curso de Odontologia (UFC e UNIFOR); Atendimento Médico da Equipe de
Geriatria (UFC); Orientação e palestras preventivas com alunos do Curso de
Enfermagem e Farmácia (ESTÁCIO FIC x UFC); Organização de Doação dos
medicamentos e equipamentos com Especialista de Farmácia e acadêmicos da
UFC; Orientação psicológica grupal e individual – UNIFOR; Grupo de oração do
terço – Legião de Maria e Voluntária; Terapia Assistida por Animais – Cadelas.
Imunização e acompanhamento de equipe multiprofissional do Posto Roberto Bruno;
Terapia Ocupacional, Aula de Artes Manuais, Dança Sênior, Aula de Música,
Aula de Informática (IFCE), Fisioterapia (FIC).
A casa de Nazaré segue os critérios de um perfil para que seja possível a
admissão das idosas que devem encontrar-se na faixa etária entre 60 a 80 anos,
com o estado de saúde em condições de se autogerir na Casa, ou seja, de ser
lúcida, ser independente na sua higienização pessoal, medicação e alimentação.
Ser visitada, em domicílio, pela assistente social, para conhecer a realidade
da idosa interessada em entrar no abrigo, e, mediante o regimento interno da
instituição, verificar sua adequação ao perfil solicitado. Nesse caso, é preenchido um
documento de admissão da idosa e assinado o contrato de vínculo com a instituição.
É preenchido, também, um formulário para que se tenha uma melhor compreensão
do quadro clínico e do relacionamento familiar da idosa.
A equipe da vila são Vicente de Paulo é composta por: Idosas acolhidas
integralmente (39), Cuidadoras (4), Serviço de limpeza e Lavanderia (4), Assistente
social (1) Filhas da Caridade (02). No Espaço físico: Lavanderia (1), Refeitório (1),
Sala de Atendimento em Domicílio, Sala da Assistente Social (1), Auditório (1),
Capela (1), Acomodações (40).
80
A instituição recebe ajuda cotidiana de benfeitores e voluntários amigos da
casa. As doações são diversificadas desde materiais de higiene pessoal; roupas;
medicamentos; móveis e gêneros alimentícios como também de empresas,
paróquias e pastorais da Igreja Católica.
Outras fontes de recursos financeiros: Cupom Fiscal; Coleta da Missa Diária;
Telemarketing; Contribuição financeira das idosas com a Aposentadoria até 70%,
conforme Estatuto do Idoso.
As atividades diárias desenvolvidas na instituição são: Missa (06 h de
segunda à sexta-feira e 17 h aos sábados); Visitas (Manhã 8h às 10h e Tarde 14h
às 16h); Oração do Terço. Horário das refeições: Café às 7:00h, Lanche às 9:00h,
Almoço às 11:00h, Lanche às 14:30h, Jantar às 17:00h.
A casa segue os seguintes valores: motivar para a prática do bem; promover
a autoestima das idosas acolhidas; escutá-las em suas dificuldades; estimular e
motivar para o exercício da amizade, respeito, perdão, bondade entre elas.
E por fim a Casa de Nazaré declara ter como dificuldade a falta de recursos
financeiros.
4.3 A percepção das (os) idosas (os) institucionalizadas sobre o abrigamento e
abandono.
Antes de descrevermos e analisarmos as percepções das idosas, vale
destacar a abordagem metodológica da pesquisa, trata-se de uma pesquisa
qualitativa, tendo em vista que estamos lindando com relatos de vida, que mexe com
o emocional das idosas e com os sentimentos. Dessa forma, se enquadra em uma
pesquisa que trabalha com o universo dos significados, dos motivos, das aspirações,
das crenças, dos valores e atitudes, como bem relatou Minayo (2010).
Para tanto, realizamos uma cuidadosa pesquisa de campo, colhemos as
informações, direto no local da pesquisa, intencionando descrever exatamente como
o fenômeno aconteceu. Utilizamos a técnica de observação participante, definida por
Minayo (2010, p. 70) como um processo pelo qual um pesquisador se coloca como
observador de uma situação social, com a finalidade de realizar uma investigação
científica. O observador fica em relação direta com seus interlocutores no espaço
social da pesquisa, na medida do possível, participando da vida social deles, no seu
81
cenário cultural, mas com a finalidade de colher dados e compreender o contexto da
pesquisa.
Foi utilizado o principal instrumento da observação participante, o diário de
campo, através do caderno foi possível fazer anotações que não fazem parte do
material formal de entrevistas, esse instrumento foi importante porque possibilitou
por muitas vezes, colher informações do ambiente de convivência e a rotina das
idosas de uma forma que as entrevistas não se aprofundariam.
Minayo (2010) destaca que o trabalho científico em pesquisa qualitativa
divide-se em três etapas: fase exploratória, que consiste na produção do projeto de
pesquisa e de todos os procedimentos necessários para preparar a entrada em
campo; a segunda etapa é o trabalho de campo, que consiste em levar para a
prática empírica a construção teórica elaborada na primeira etapa, que combina
instrumentos de observação, entrevistas ou outras modalidades de comunicação e
interlocução com os pesquisados, sendo uma etapa de fundamental importância
para essa pesquisa, por permitir contato direto com as idosas.
A terceira e última etapa é a analise e tratamento do material empírico e
documental, definido pela autora como o conjunto de procedimentos para valorizar,
compreender, interpretar os dados empíricos, articulá-los com a teoria que
fundamentou o projeto ou com outras leituras teóricas e interpretativas cuja
necessidade foi dada pelo trabalho de campo.
A análise das respostas de cada sujeito da pesquisa irá proporcionar o
entendimento a respeito do que levou essas idosas à situação de abandono e
consequentemente a institucionalização, que relações mantiveram com suas
famílias antes do fato, qual a percepção dessas idosas sobre sua realidade.
Questionamos as idosas, sobre como vieram morar na casa de Nazaré,
relataram que:
Por que eu já morei aqui uma vez, eu cheguei em 60 e passei 18 anos aqui, não aqui na casa, fora, mas “ai” fui morar em São Luiz com minha irmã e ela morreu, “ai” eu voltei pro meu Ceará de novo. (VIOLETA) Eu vim por conta própria ninguém me trouxe. (LÍRIO) [...] decidi por conta própria, eu morava numa casinha sozinha e a violência está muito grande. (MARGARIDA) Morava com meu filho [...], me sentia sozinha, e eu mesma quis vim. (ROSA)
82
Eu morava com minha filha, eu e meu velho, mas ele faleceu e ficamos só nós duas [...] com 8 anos minha filha também faleceu de infarto [...] “ai” fiquei só, doente das pernas, pressão alta minha salvação minha filha foi minha vizinha que consegui-o essa vaga pra mim, não tinha condições de viver só. (MAGNÓLIA)
Minha neta que me trouxe, minha filha ficou doente e não tinha ninguém para ficar comigo. (JASMIM)
Analisando os relatos das idosas em relação à situação que lhes trouxeram
para o abrigo, 60% afirmou que foi por conta própria, 30% moravam com parentes
que morreram, e 10% veio através de outras pessoas.
As causas da institucionalização são diversas, como: moravam com uma irmã
que faleceu, adoecimento da filha que cuidava da idosa, adoecimento da irmã e da
idosa, dificuldades financeiras para pagar “cuidadores”, solidão, ou seja, situações
que nos revelam as circunstâncias da vida, sem alternativas foram acolhidas pelo
abrigo.
Constatamos também que 60% das idosas tomaram a decisão de morar na
casa de Nazaré, nos revelando uma autonomia dessas idosas, como por exemplo,
Lírio decidiu morar no abrigo e ponto. Existem sim circunstâncias que aos poucos
vão levando as idosas à institucionalização, como bem declarou a Margarida que
morava sozinha e temia a violência. Rosa que se sentia sozinha na casa do filho,
mas não lhes faltou autonomia para decidir suas vidas, isso serve para desmistificar
essa ideia de que idosos não decidem nada, que a família e os filhos devem estar
sempre a frente dos assuntos relacionados aos idosos.
As autoras Camarano e Scharfstein (2010) em sua pesquisa sobre Instituição
de Longa permanência para Idosos relatam que usualmente parte-se da premissa
que a família é quem decide pela mudança de residência do seu idoso, no entanto,
assume-se neste trabalho que nem sempre é assim que ocorre. Isto depende da
existência de familiares, do grau de autonomia do idoso, da qualidade das relações
familiares, entre outros fatores.
É este ponto que achamos justo citar, assim como a afirmação das autoras,
os dados nos mostram esse outro lado, era comum julgar apenas os familiares como
responsáveis pela institucionalização, porém nossa pesquisa mostra esse outro lado
também descoberto pelas autoras, o lado da autonomia, não ter mais parentes vivos,
das circunstâncias que as idosas estavam vivendo com suas famílias, isso nos
revela outros fatores antes não percebidos.
83
Sobre como era sua relação com seus familiares e por que veio para
esta instituição, referiram que:
Graças a Deus muito bem, minha família mora toda aqui, meus irmãos. Porque minha irmã morreu e não quis morar com ninguém não. (VIOLETA) Minha filha era assim, eu acho que a pessoa sabendo viver, ela vive em todo canto [...], 1980 eu fui morar com uma irmã, ela é viúva, ai morei 33 anos com ela e de lá vim pra cá. Mas eu sair de lá [...] mas eu sair de lá porque eu tenho um problema na coluna, “ai” tinha acompanhamento ali no hospital das clinicas [...] o reumatologista perguntou o que eu fazia da minha vida, sou faxineira lá na casa onde eu vivo na casa da minha irmã [...] o medico disse que eu não podia viver nessa vida não, que era perigoso deslocar o fêmur, ai eu não podia viver na casa da minha irmã sem ajudar ela [...]. Foi por isso, eu vim porque era necessidade. (LÍRIO) Eu não tenho família minha mesmo, eu tenho 11 irmãos biológicos que moram no Paraná e uma adotiva que mora aqui mesmo. Como sempre morei só eu decide vir pra cá. (MARGARIDA) Minha família mesmo é meu filho, só tinha um irmão e faleceu já uns 5 anos [...] meu filho tem uma moça já de 19 anos, mas desde que vi morar aqui, nunca mais vi nem ela nem a mãe dela. Assim, quando eu morava lá era tudo bem, não tenho do que me queixar não, foi eu mesma que quis vir mesmo, agente tem que saber reconhecer a realidade da gente “né não? (ROSA) Como já lhe falei minha família era meu velho e minha filha e já se foram, eu não tenho mais parente, só tive um irmão e morreu, eu ainda era criança. (MAGNÓLIA)
Era boa, nunca tive desentendimento com meus filhos, nunca tive má querência com ninguém da família alias [...]. (JASMIM)
A indagação que trata das relações das idosas com seus familiares e por que
veio para o abrigo, a maioria relataram que tinham um bom relacionamento com
seus familiares, inclusive as que não têm mais parentes vivos declaram que quando
os tinha nunca tiveram desentendimentos, apenas a Sra. Margarida diz não ter
família dela mesmo, ou seja, filhos, apenas irmãos no qual a própria não se deteve a
pergunta e logo mudou de assunto. Em relação ao que levou as idosas para o
abrigo, esta relacionado às seguintes questões, morte de familiares, problemas de
saúde e recomendação médica, não ter família e um caso da Sra. Rosa que declara
que veio por conta própria porque soube reconhecer a realidade dela.
Segundo a literatura, os motivos mais frequentes que levam à busca de uma residência coletiva ou uma instituição são ausência de família,
84
dificuldades de a família cuidar, relações familiares conflituosas aliadas à carência de renda, falta de moradia, dentre outros. (CAMARANO & SCHARFSTEIN, 2010, p.166).
As autoras tratam exatamente vários dos motivos que identificamos nos
relatos das entrevistadas, como: ausência da família, dificuldades da família de
cuidar, falta de moradia, ou seja, esses são um dos principais motivos que levam os
idosos a institucionalização.
Partindo do principal ponto trouxemos segundo Simões (2011) sua visão de
família. Segundo o autor a família constitui a instância básica, na qual o sentimento
de pertencimento e identidade social é desenvolvido e mantido e, também, são
transmitidos os valores e condutas pessoais. Apresenta certa pluralidade de relações
interpessoais e diversidade culturais, que devem ser reconhecidas e respeitadas, em
uma rede de vínculos comunitários, segundo o grupo social em que está inserida.
A família está relacionada a todos os casos, diretamente ou indiretamente,
todos nós tivemos em algum momento essa base de sentimento e pertencimento,
nas vidas dessas idosas não é diferente. A rotina quebrou algumas dessas relações,
outras perderam no caso de morte e outras mesmo que ainda vinculada a essas
relações citadas pelo autor estão fragmentadas e fragilizadas pela rotina das
famílias, a institucionalização associada ao sistema capitalista no caso das rotinas
de trabalho, interferem na manutenção e no reestabelecimento das relações
familiares das idosas que ainda as possuem.
Ao questionarmos sobre com quem moravam antes do abrigamento,
afirmaram que:
[...] já morei com um irmão, mas antes daqui morava com minha irmã [...]. (VIOLETA) [...] morava com minha irmã, passei 33 anos com ela. (LÍRIO) [...] sozinha, sempre morei só [...]. (MARGARIDA) [...] Com meu filho. (ROSA) Morava com minha filha [...]. (MAGNÓLIA) [...] com minha filha e minhas netas. (JASMIM)
85
Antes da institucionalização Rosa morava com um filho, sua nora e uma neta,
porém todos passavam o dia trabalhando, deixando-a muito sozinha. Não
aguentando mais a situação contou tudo para o filho, que se sentia só, o filho
entendeu a situação e o próprio procurou o abrigo para a mãe.
Magnólia morava com uma filha, que faleceu aos 53 anos de infarto, sem ter
mais nenhum parente e sem reunir condições físicas e financeiras para morar
sozinha foi levada por uma vizinha para casa de Nazaré.
Jasmim morava com sua filha mais nova de três filhos, e duas netas, mas sua
filha ficou muito doente, nem a própria idosa sabe qual a doença, por este motivo foi
morar com sua outra filha, porém passou poucos meses. Relatou que sua filha não
tinha tempo e nem condições de pagar alguém para cuidar da idosa, em meio a toda
essa situação sua neta sugeriu o abrigamento, sendo de imediato aceito pela idosa,
pois não queria dar trabalho nesse momento tão complicado da família.
Violeta morava com um irmão, mas seu irmão casou-se, sem querer morar
com a cunhada, foi morar com uma irmã em São Luiz, após a morte dessa irmã
voltou para Fortaleza e procurou o abrigo. Lírio também morava com uma irmã, e
pelo fato de sua irmã ser doente, cuidava da faxina da casa, mas por causa de rotina
de passar o dia trabalhando como vendedora na loja de um amigo e quando
chegava ainda iria fazer faxina, adquiriu um problema na coluna. Quando foi ao
médico foi aconselhada a mudar totalmente sua rotina, porém a idosa disse que não
poderia permanecer na casa da irmã sem ajudar nas tarefas de casa, por este
motivo decidiu morar no abrigo.
Por fim, Margarida que sempre morou sozinha, relatou que sofreu uma
tentativa de furto dentro de sua casa, que desde desse dia não dormia, mas passava
a noite olhando para as telhas de sua casa, apavorada, com muito medo e por isso
decidiu se institucionalizar.
Motta (2010) vem contribuir exatamente falando sobre idosas que moram
sozinhas. Segundo essa autora, apesar das novas multiplicidades de gerações na
família, em contraponto vem crescendo o número de pessoas que moram sozinhas,
principalmente idosos, mas uma questão de gênero são sobre tudo mulheres,
segundo a autora vários estudos apontam para isso desde o final do século
passado. Ela afirma que dos idosos que moram sós, 8% em 1980, 10% em 1989,
dos quais dois terços eram de mulheres.
86
Ainda consoante à autora, são vários os estudos que têm apontado para isso
desde o final do século passado, afirmando que 08% em 1980 e 10% em 1989
moravam sozinhos. Destes, dois terços eram de mulheres, declarando ainda que
75% dos homens idosos encontram-se chefiando uma família com esposa com ou
sem filhos, enquanto 60% das mulheres idosas estão chefiando sozinha uma família,
com filhos ou com outros parentes, ou morando sozinhas.
Quando perguntamos sobre que sentimento traz de seus familiares,
relataram que:
Eu tenho saudade do que é bom. (VIOLETA) Eu entrei aqui sem família, eu digo que não tenho é família, porque a família que a gente tem é os filhos, eu não tenho filho, esse negocio de irmão, sobrinho não. (LÍRIO) Sentimento assim, eu não trago revolta [...] mas acho que penso assim porque eu nunca convivi com ninguém da minha família, não tenho contato com ninguém. (MARGARIDA) Eu tenho só coisas boas deles, me acolheram, tenho saudade. (ROSA)
Eu sinto saudades de quando eu tinha os meus “ne” [...] sinto uma saudade grande da minha filha, era tudo que tinha, sabe aquela pessoa dedicada era ela. (chorou) (MAGNÓLIA)
[...] saudades de todos, dos meus filhos, minhas netas. (JASMIM)
As idosas que mantiveram uma relação anterior ao abrigamento informaram
sentir saudades e ter bons sentimentos. Magnólia, por exemplo, se emocionou ao
falar da filha que morreu por esta ser muito dedicada a ela.
De forma geral, as idosas que mantiveram esse contato anterior trazem boas
lembranças e bons sentimentos de suas famílias. Margarida justificou apenas que
não traz revolta de familiares, mas relaciona a isso ao fato de nunca ter tido contato
com nenhum parente. Lírio declarou não ter família, pois considera família quem tem
filhos e ela não os têm. Cada uma traduziu o sentimento da sua forma, de acordo
com suas vivencias e convivências anteriores à institucionalização.
Laços e vínculos são construídos a partir da convivência da proximidade
diária ou pelo menos através de um contato que envolva o mínimo de afeto.
Articulando as percepções de Camarano (2010), a manutenção de vínculos
familiares está associada, em muitos casos, à dinâmica familiar precedente à
mudança de moradia, gerando vivências emocionais ambivalentes.
87
Vínculo significa uma relação particular com o objeto, ou seja, trata
exatamente o que já falamos acima. As idosas que tiveram essa dinâmica familiar,
que construíram esses vínculos trazem bons sentimentos de suas famílias mesmo o
que já faleceram, as que não tiveram essa dinâmica não falaram em laços ou
lembranças, mas não demonstraram nem sentimento de revolta ou ressentimento.
Falar de sentimento familiar em uma ILPI é algo extremamente difícil porque
mesmo as idosas que foram diretas em suas respostas em algum momento
revirando suas lembranças suas expressões mudaram. O passado traz marcas
umas boas e outras ruins, e muitas das lembranças dessas idosas revelam as
dificuldades e sofrimento que passaram por isso uma pergunta tão difícil de
encontrar respostas.
Ao questiona-las sobre de quem partiu a ideia da institucionalização,
declaram que:
Eu decidi morar aqui por contra própria, morar com os outros da certo não. (VIOLETA) Foi minha mesmo, por necessidade mesmo. (LÍRIO) Eu que decidi vir pra cá, morava só, morria de medo. (MARGARIDA)
Foi minha mesmo, mas foi meu filho que ajeitou tudo e to aqui ate hoje. (ROSA)
[...] minha vizinha que me falou da casa, e como eu não tinha condições de viver só eu nem tive o que aceitar, era só vir mesmo. (MAGNÓLIA)
Assim, minha neta que já conhecia tudo por aqui que falou, mas eu que quis vir mesmo, não fui obrigada não. (JASMIM)
Ao tratarmos sobre de quem partiu a ideia de institucionalização quatro idosas
declaram ter partido de si próprias. Outra a vizinha lhe falou sobre o abrigo e Jasmim
explicou que a ideia veio de uma neta.
Isso nos leva novamente a refletir com as autoras Camarano e Scharfstein
(2010) quando afirmam que usualmente parte-se da premissa que a família é quem
decide pela mudança de residência do seu idoso.
Nossa pesquisa retrata que as idosas que a maioria das pessoas associa que
a família decide tudo. A ideia de institucionalização por quatro idosas partiram delas
mesmas, apenas duas declaram que a ideia veio por sugestão de uma neta e outra
da vizinha.
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Porém muito dessa “autonomia” esta relacionada às famílias deste idoso. Na
percepção da idosa, ela acredita estar atrapalhando a vida da família, por ser um
peso, e decide morar em uma instituição para não atrapalhar nem dar trabalho a
suas famílias. Opta por uma decisão julgando ser melhor para todos.
Na realidade a família tem o dever de amparar, proteger e defender a
dignidade e bem estar do idoso, além de lhes garantir o direito à vida, assim como a
sociedade e Estado, família, sociedade e Estado deveriam complementar o outro,
andando lado a lado, mas, como isso não acontece na conjuntura do nosso país, na
falha de um o outro deve assumir as responsabilidades. No Brasil é bem assim, por
exemplo, a família negligencia seu idoso, o estado negligencia seu idoso e sobra
para as ILPIs na grande maioria filantrópica, ocorrida pela participação da sociedade
civil na cena pública.
É sabido que é de responsabilidade do Estado amparar não apenas os idosos
mais suas famílias, porque muitos dos casos as famílias não abandona o idoso por
livre e espontânea vontade não, mesmo havendo casos. A mais recorrente é a
pobreza, não ter como cuidar daquele idoso, as famílias brasileiras muitas vezes mal
conseguem comer, imagine cuidar de um idoso e garantir todos os aparatos que
estão associados aos idosos, são pessoas que precisam de cuidados específicos.
Em relação à vontade de voltar ao convívio familiar declararam que:
Deus me defenda nenhuma, isso eu recebo como um castigo [...]. (VIOLETA) De jeito nenhum, eu peço há Deus todo dia “pra” proteger essa casa com as moradoras e com as irmãs que tomam conta [...]. (LÍRIO) Vontade de vê eu tenho, mas de morar com os outros não, sempre morei só [...]. (MARGARIDA) Vontade mesmo tenho não, sabe por que, porque aqui eu vivo como quero, vejo gente, converso, faço as atividades, e lá eu vivia em casa sozinha, passava o dia calada, dormindo [...] da vida que eu elevava lá sinto falta nenhuma. (ROSA)
[...] se eu tivesse “Ave Maria”, eu estaria com eles até hoje, aqui é bom, não tenho nada pra falar não, mas família é nosso sangue. (MAGNÓLIA)
Tenho, mas aqui é tão bom [...] não quero dar trabalho ainda mais não, aqui tá ótimo. (JASMIM)
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Ao questiona-las se gostariam de voltar ao convívio familiar, 60%
declaram que não, que se sentem bem como estão vivendo, 10% afirma ter vontade
de vê-los não de morar junto e 30% declaram ter sim vontade de voltar ao convívio
da família.
Em termos gerais a maioria das idosas tem autonomia em falarem que não
querem, mas voltar ao convício familiar, mas isso não quer disser que as idosas que
ainda tem família não querem, mas saber deles, não é isso de forma alguma, as
idosas que manteve um bom relacionamento ou tiveram contato com suas famílias
falam de saudades, trazem bons sentimentos.
O que é notório além das circunstâncias já tratada em outra pergunta como
morte de parentes, não ter família, doenças e etc., é um domínio é uma autonomia
de decidir o que julga melhor para cada uma, saindo daquela imagem de fardo para
a família. Camarano (2010) afirma que alguns residentes escolheram a instituição
para não ser um peso para a família.
Essa situação também foi constatada, que as idosas não querem dar trabalho
ou atrapalhar a vida de seus familiares e por isso muitas vezes buscaram o seu bem
estar e dão essa independência para suas famílias, mas nem tudo gira apenas no
bem esta familiar não, as idosas buscam também sua qualidade de vida e de
atenção, buscam um local onde possam ser cuidadas, compreendidas, respeitadas,
ouvidas, onde possa interagir, viver da melhor forma possível ate o fim de suas
vidas.
Tratando-se do abrigo, perguntamos se gostavam da Casa de Nazaré,
por que e se pudessem viveriam em outro lugar, todas afirmaram que:
Gosto, aqui é meu canto, minha vida, não sai daqui nem “pra” passear, só saio se for com as irmãs. (VIOLETA)
Aqui é minha casa, tem tudo que a gente precisa, saiu daqui agora só quando morrer. (LÍRIO)
Eu não tenho nada “pra” reclamar não [...] eu não posso mais nem pensar em sair daqui [...] to velha e aqui é bom de mais, minha casa é aqui, até o resto da minha vida. (MARGARIDA)
Gosto de mais, aqui é um céu, sou bem tratada de mais, a gente aqui tem tudo. Tenho não, meu lugar é aqui mesmo, nem penso em morar em outro canto até o fim da minha vida não. (ROSA)
90
Gosto de mais, aqui eu fui acolhida, sou bem tratada pelas irmãs pelos funcionários, aqui é minha casa até o fim. (MAGNÓLIA)
Gosto de mais, aqui todo mundo fala por uma boca só, é um céu [...] todos tratam agente bem [...]. Se eu pudesse ir pra ouro lugar eu queria morar com minha filha Rosa e minhas netas, passei a minha vida toda com elas
[...]. (choro) (JASMIM)
A resposta desse questionamento foi unânime, todas afirmaram gostarem de
mais da instituição, alegando que o abrigo é sua casa, que são bem tratadas, tem
tudo que precisam, são acolhidas, que o abrigo é um céu, ou seja, foram só elogios
e palavras de gratidão, em relação ao desejo de morar em outro lugar apenas uma
declarou ter o desejo de voltar a morar com sua filha, Jasmim que chegou a se
emocionar ao falar desse desejo, o restante afirmam querer morar na instituição até
o fim de suas vidas.
Todas as idosas, independentes de sentimentos pessoais, afirmaram que a
instituição cuida de fato das suas idosas, com inúmeras atividades de lazer,
principalmente profissionais de saúde, e tivemos a oportunidade de presenciar essas
atividades em uma de nossas visitas, com terapia ocupacional, atendimento com
fisioterapeutas, palestras de estudantes de fisioterapia sobre cuidados com
acidentes domésticos como quedas, presenciamos voluntários fazendo unhas das
idosas e atendimento ortodôntico, enfim notamos os esforços da instituição em
proporcionar o melhor para suas idosas.
Camarano, Leitão e Mello (2010) declara que apesar das instituições asilares
constituírem a modalidade mais comum de cuidado ao idoso dependente fora do
âmbito familiar, é comumente associadas a imagens negativas e preconceitos em
todo o mundo. A sua história remonta à Grécia Antiga e sua trajetória no Ocidente
explica grande parte do preconceito que ainda cerca este tipo de instituição.
Essa trajetória é fruto da caridade cristã europeia, o que resultou na
associação de asilos com pobreza, negligência e abandono do idoso pelas famílias.
Algumas das percepções existentes na origem dos asilos encontram-se presentes
ainda hoje, em maior ou menor grau.
O preconceito sem dúvidas existe, pelo fato das instituições serem a maioria
filantrópica, e como sabemos vivem em constantes dificuldades de oferecer e manter
os cuidados necessários e de qualidade para os idosos, porém isso não é motivo
determinante para se prestar serviços de qualidade, a prova disso é a Casa de
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Nazaré, que mesmo enfrentando dificuldades financeiras, oferece um ambiente com
uma ótima infraestrutura, com acomodações confortáveis, área ampla ao ar livre,
para as idosas ficarem sentadas ou fazerem atividades, refeitório amplo, enfermaria,
assistência médica de diversas áreas, capela, um ambiente de uma limpeza que
chama atenção dos visitantes, ou seja, mesmo passando por dificuldades o abrigo
administra tudo com muita competência e dedicação.
A falta de conhecimento muitas vezes da população faz com as pessoas
reproduzam pensamentos preconceituosos em relação aos abrigos. Se sociedade
se voltasse um pouco e se propusessem a conhecer mais sobre os abrigos, sobre a
vida dos idosos institucionalizados, iriam desmistificar a ideia de pobreza,
negligência e abandono do idoso pelas famílias, ao contrario disso o abrigo tira o
idoso da situação de vulnerabilidade e de abandono, o que não quer disser que
todos os institucionalizados são pessoas vulneráveis e em situação de abandono,
muitos casos é uma decisão do idoso morar em uma instituição, enfim, os abrigos
para muitos que não tiveram a oportunidade de conhecê-los, fazem um importante
trabalho a população idosa, pois eles fazem um trabalho de dever do Estado e ao
invés de serem incentivados e ampliados seus serviços são negligenciados pelo
poder público.
Quando perguntamos sobre como se deu o processo de visitas por parte
se seus familiares, como era no início e como é agora, esclareceram que:
[...] Quando podem vêm [...]. (VIOLETA) Tem visita todo dia, agora eu receber visita não. Eu não sinto falta deles não [...] eu sou assim eu não peço nada a ninguém nem exijo nada, se eles quiserem vir, podem vir agora eu chamar não. (LÍRIO) Nunca veio ninguém não, quem me visita é um amigo de infância, mas família mesmo não. (MARGARIDA) No começo “que” vim morar aqui, meu filho vinha, minha neta e minha nora veio umas vezes também [...] mas faz mais de um ano que eles não veem, mas meu filho liga quando pode, minha neta também liga [...] tenho revolta nem raiva de ninguém não. (ROSA)
Nunca recebi visita de nenhum parente não [...] não tenho mais ninguém. (MARGNÓLIA)
Logo quando cheguei elas vinham me visitar, toda semana [...] quem nunca veio foi meu filho que mora no São Paulo [...] mas “ai” minha filha faz uns 6 meses que elas não aparecem, falo com elas pelo telefone mais vim aqui mesmo, elas não vieram mais não [...]. (JASMIM)
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Diante dos relatos das idosas em relação às visitas é fato que a maioria não
recebe visitas de familiares ou não mais recebem como é o caso da Rosa e Jasmim,
que no começo da institucionalização recebiam visitas, porém com o passar do
tempo pararam de receber, apenas duas afirmam que recebem visitas, uma de um
amigo de infância e outra da família quando podem, mas nem uma das duas idosas
explicaram com que frequência essas visitas acontecem.
Camarano e Scharfstein (2010) explicam que a manutenção de vínculos
familiares está associada, em muitos casos, à dinâmica familiar precedente à
mudança de moradia, gerando vivências emocionais ambivalentes. Isso reflete o que
já foi constatado em muitos outros relatos, as idosas que mantilha uma convivência,
um bom relacionamento, que tinha de fato um vínculo com suas famílias,
conseguiram trazer essa dinâmica após a mudança de moradia como bem declarou
as autoras.
As idosas que não mantinham essa proximidade nunca receberam visitas e
também as que não têm parentes vivos, o que é justificável, porém surge uma nova
questão, as que não mantilha vínculos e as que não têm mais parentes vivos
conseguimos entender a situação, mas percebemos que as idosas que tinham um
bom relacionamento, que recebiam visitas, por algum motivo, que as idosas não
sabem qual, deixaram de receber visitar de seus familiares.
Camarano e Scharfstein (2010) ao tratar da manutenção dos vínculos, afirma
que dentre outras modalidades a manutenção se dá através de visitas dos parentes
ao residente, mas afirma que as visitas de familiares aos residentes é a modalidade
mais comum de expressar a relação entre eles.
Podemos concluir que de alguma forma a institucionalização contribui para
esse afastamento dessas famílias as idosas abrigadas, mas por outro lado não
podemos negar os novos laços que essas idosas criaram com as outras
institucionalizadas e o carinho que elas tanto afirmam ter pelas irmãs e funcionários
da Casa de Nazaré, os motivos desse distanciamento podem ser inúmeros: trabalho,
a falta de tempo, problema de saúde, isso não podemos prever.
Nossa contribuição como pesquisadores é sugerir que se criem estratégias,
projetos e programas, que trabalhem esse resgate dos vínculos familiares, não nos
reportando apenas para as Instituições em geral, mas, o próprio poder público e a
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sociedade civil, pois a responsabilidade de proteção e cuidados com os idosos não é
apenas das famílias e o do Estado, mas, de todos.
Ao questioná-las sobre o que acham da Casa de Nazaré, como se dá o
tratamento na instituição e como se dá a sua rotina no abrigo todas afirmaram
que:
Melhor eu desconfio, aqui temos tudo do bom e do melhor. Temos coisa de mais pra fazer, saiu um e entra outro. Tem muita atividade pra saúde da gente. (VIOLETA) Eu acho bom demais, tudo bem cuidado, dia de terça feira vem médico, consultar quem precisa, tem as “cuidadoras” de noite e de dia, “pra” aquelas que estão acamadas. [...] É psicólogo é terapia é enfermagem é educação física, na segunda são 4 atividades. (LÍRIO) Aqui eu sou respeitada, sou cuidada, eu me sinto amada, acolhida, amparada, aqui tem muita coisa “pra” gente fazer [...] não fico parada. (MARGARIDA) Sou tratada como uma princesa gosto de mais daqui, aqui a gente tem médico, enfermeira, assistente social o que você quiser tem aqui. Minha filha aqui não tem tempo “pra” pensar besteira não, tem atividade de mais. (ROSA)
Eu acho um sonho [...] temos tudo, não falta nada, temos do médico as moças que vem fazer nossas unhas, sou muito bem tratada aqui. Aqui é coisa de mais [...] tem tudo que você imaginar, é bom de mais. (MAGNÓLIA)
Aqui é o céu, sou muito bem tratada, tenho tudo aqui, não tenho do que reclamar. Agora tem muita coisa pra gente fazer, tem dia que to mole, mas elas vêm e me levam. (risos) (JASMIM)
Ao tratarmos sobre o que acham da Casa de Nazaré todas responderam que
gostam muito do abrigo, que a casa é um céu, um sonho, que são tratadas como
“princesas”, que acham bom de mais, que tratamento melhor desconfia. Explicaram
que na instituição tem tudo que elas necessitam, tem: médico, psicólogo,
fisioterapeuta, enfermagem, educação física, terapia, assistente social, tem
profissionais para fazer as unhas, sendo relatadas por todas que o abrigo tem varias
atividades, principalmente voltado para a saúde das idosas, sendo relatado com
risos por uma idosa, que são tantas as atividades que tem hora que fica cansada,
mas alguém chama ela vai novamente participar das atividades, todas estão
satisfeitas com o abrigo e só trazem boas referencias do local onde moram.
As atividades voltadas para saúde das idosas como colocou uma das idosas,
são as mais frequentes, são mais rotineiras, essa constatação me leva diretamente
ao fato tratado pelas autoras Camarano, Kanso, Mello, Carvalho (2010) em
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Cuidados de Longa Duração para a População Idosa, que apesar das instituições de
longa permanência não serem instituições de saúde, quando se analisa o conjunto
delas no Brasil, os serviços de saúde são os principais oferecidos, e constamos
exatamente esse fato na casa de Nazaré, os serviços mais frequentes ou até
rotineiros são serviços de saúde para as idosas.
Camarano (2010) faz um importante levantamento quando afirma que o
cuidado institucional desejável deve ser ao mesmo tempo global e individualizado,
pois a pessoa idosa costuma apresentar modificações próprias do envelhecimento e
ainda outras condições de ordem clínica, funcional e/ou psicossocial.
A autora alerta para questão muito importante, em relação a muitas pessoas
trabalharem nas intuições, declarando que quantidade não é a solução, pois
segundo ela há grandes evidências de que os idosos que recebem mais cuidados
podem receber também mais tratamentos desnecessários ou ficarem expostos a
mais complicações.
Esses relatos da autora nos alerta para os cuidados que realmente são
necessários para as idosas, não exagerando em atividades que não vão contribuir
em nada para sua saúde e nem para os seu bem estar no abrigo, esse excesso
pode se tornar inconveniente e exaustivo para as institucionalizadas.
Ao perguntamos se as idosas ainda pensam em procurar seus
familiares, expuseram que:
Não, quando podem vem aqui, mas eu ir atrás não, sou apegada não. (VIOLETA) Não penso não, eu peço a Deus “pra” ficar aqui até meu último suspiro. (LÍRIO) Minha filha se eu tivesse saúde eu poderia ate ir, mas não tenho e ainda o meu ganho não da “pra” pagar avião e de ônibus eu não aguento viajar não, e mesmo assim faz muito tempo que não tenho notícias. (MARGARIDA)
Eu tenho vontade de visitar, mas morar com ninguém tenho não, mas nem sei mais onde eles moram, se mudaram faz é tempo [...]. (ROSA)
Não [...] “pra” mim eu não tenho mais ninguém. (MAGNÓLIA)
Eu pergunto por eles todo dia, quando ninguém liga fico preocupada de mais, tenho vontade de ir lá. (JASMIM)
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As respostas foram variadas então achamos pertinente trazer esse
pensamento de cada uma. Violeta e Lírio disseram que não procuraria que eles
veem quando podem. Margarida declarou que poderia procurar sua família, mas
justifica que não tem saúde nem condições financeiras de pagar passagem de avião.
Rosa disse ter o interesse em visitá-los, mas não de morar com ninguém. Magnólia
disse que não tem mais ninguém para procurar, e por último Jasmim afirma que
quando ninguém liga tem vontade de procurá-los.
Camarano e Scharfstein (2010) vem tratar sobre os vínculos familiares dos
idosos, segundo elas parece que a manutenção de vínculos familiares pode ser
mantida ou refeita apesar da mudança de moradia. Na verdade, pode-se falar de
uma continuação das relações anteriormente vividas, embora a situação da
institucionalização crie modalidades distintas, ora pelo viés da proteção e contínuo
zelo pelo seu familiar idoso, ora pelo descaso e abandono.
As autoras relatam que mesmo após a mudança do idoso para o abrigo, é
possível a manutenção dos vínculos com as famílias ou até serem refeitos, ou seja,
idosos que tiveram esses vínculos com a família rompidos podem ser reiterados, no
caso das nossas interlocutoras a maioria afirma não ter o desejo de ir procurar
parentes, não apenas porque não querem, mas idosas institucionalizadas com uma
idade já avançada e com problemas de saúde, realmente é um grande empecilho
essa mobilidade, porém, nem uma idosa falou que não queriam essa proximidade,
apenas que não iriam.
Ao questionarmos as idosas sobre o que acham do abandono familiar,
responderam:
[...] eu não tenho medo de ser abandonada não, tenho não, nem um pingo [...]. (VIOLETA) [...] eu acho que filhos tem que cuidar dos pais, os pais casam, criam os filhos “ne”, então quando os filhos tão crescidos e os pais estão como crianças, eles tem que cuidar deles também. Eu sou muito revolta com quem não cuida de mãe e pai direitinho [...]. (LÍRIO) [...] eu, como foi uma escolha minha eu senti necessidade de vir pra cá, penso que seja ruim de mais, mas eu como sempre vivi só, eu não me incomodo não. (MARGARIDA) [...] eu vejo como ruim “ne”?, mas cada um sabe das suas dificuldades, eu via o sacrifício do meu filho pra ganhar a vida, eu não concordo em abandonar [...]. (ROSA) É triste, [...] eu porque não tenho mais “ne”?, mas pra quem tem deve ser triste não viver com os seus. (MAGNÓLIA)
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[...] eu minha filha morria, têm esses meses que elas não vêm, eu fico triste de mais, saudade grande, mas sei que alguma coisa aconteceu, minhas filhas são muito apegadas a mim, se elas não vêm é porque não pode mesmo, não é porque me abandonaram não. (JASMIM)
Em relação ao abandono, das seis entrevistadas apenas uma diz não ter
medo do abandono, as outras associaram o abandono como algo ruim, triste e
revoltante, sendo relatado por uma delas que morreria caso fosse abandonada.
Minayo (2005, p. 15) da sua contribuição afirmando que o abandono é uma forma de
violência que se manifesta pela ausência ou deserção dos responsáveis
governamentais, institucionais ou familiares de prestarem socorro a uma pessoa
idosa que necessita de proteção.
De fato o abandono é uma violência, mas não podemos apontar culpados,
nem julgar a família, estado ou sociedade civil, se há o abandono o ato já foi
consumado, o que devemos fazer como um todo é buscar garantir os direitos
efetivos.
É necessário unir a família, sociedade e Estado e juntos trabalharem por um
bem comum, pensar no abandono como uma violência crescente, pois como bem
sabemos o fenômeno do envelhecimento no nosso país chamam atenção, ou seja,
essa violência tende a aumentar, o Brasil deve se atentar ao futuro, agir agora para
evitar ou prevenir futuros transtornos.
Romero, Marques, Barbosa e Sabino (2010) relata que o abandono do idoso
por parte de seus familiares deve ser entendido também como efeito da falta de
suporte social e governamental as famílias.
Não podemos tirar a responsabilizar das famílias, pois o cuidado também é de
responsabilidade desta, porém não podemos ser hipócritas de julgar que todos os
casos de abandono são por pura negligencia e descaso, até porque isso não nos
cabe julgar.
Conhecemos a realidade do nosso país, e nem se quisermos conseguiríamos
fugir dessa realidade. Um país que enfrenta inúmeras questões sociais,
subdesenvolvido, submerso no sistema capitalista de exploração, de negação de
direitos de uma desigualdade social extrema, miséria, falta de suporte e apoio social,
dentre inúmeros outros problemas.
Baseados nessa realidade, entendemos bem as dificuldades das famílias
brasileiras em manterem suas famílias, principalmente em relação ao dinheiro, a
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maioria dos institucionalizados são pobres. Isso se torna recorrente em alguns
relatos das idosas em relação à situação financeira, muitas famílias não têm
alternativas nem meios de cuidarem de forma correta, de respeitarem as dificuldades
e as necessidades dos idosos. Isso torna um dos principais motivos que levam os
idosos a institucionalização, toda essa situação deriva da questão social no Brasil.
Ao perguntarmos sobre o que acha sobre abrigamento de idosas,
responderam:
[...] graças a Deus eu acho bom de mais, recebe a gente, trata bem, eu gosto de mais [...]. (VIOLETA) A casa de Nazaré vai fazer 73 anos agora dia 15, se não existisse a casa de Nazaré e várias outras iguais, como seria a vida das idosas lá fora, sem família, ou com família mesmo que não liga como seria? Então eu acho uma coisa boa [...]. (LÍRIO) [...] Olha “minha filha” eu decidi vir pra cá principalmente por causa da violência, eu não dormia mais, passava a noite acordada olhando “pras” telhas, aqui eu fico tranquila é protegido tem vigia a noite toda acho importante de mais ter um canto como esse “pras” idosas [...]. (MARGARIDA) [...] eu acho que é um céu um lugar desses, eu gosto de mais. (ROSA) Acho uma coisa de Deus, porque já imaginou “pra” aonde ia? morar na rua, meu aposento não da “pra” manter uma casa, pagar aluguel, remédio, médico, alimentação, e aqui eu tenho tudo, graças a Deus [...]”. (MAGNÓLIA) [...] Eu vejo como uma benção de Deus “ne”?, recebe a gente, cuida [...] não falta nada, é um céu mesmo. (JASMIM)
A respeito da visão das idosas sobre o abrigamento, todas foram unânimes,
afirmam ser bom. Expressões como: “é um céu, que é coisa de Deus, julgam
importante a existência um lugar que acolham as idosas, cuide e proteja, pelo fato
de muitas não terem para onde ir”, sendo necessários abrigos como a Casa de
Nazaré para acolhê-las.
Segundo Christophe e Camarano (2010) acreditam que as vantagens e/ou
desvantagens dessa forma de cuidado dependem muito das necessidades de cada
idoso e da disponibilidade da família de cuidar. O pertencimento a uma instituição
pode representar uma alternativa de amparo, proteção e segurança, principalmente,
para os que não têm família e para aqueles que experimentam uma situação de
conflito familiar.
As autoras afirmam que morar em uma ILPI, para muitos, pode ser mudar de
domicílio e ter a vida organizada, renovando laços sociais. Mesmo para idosos que
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viviam com familiares antes da ida para uma instituição, os vínculos podem se
manter após a mudança, dependendo da relação estabelecida entre os membros.
Para finalizar essa discussão trouxemos uma contribuição que julgamos muito
importante dos autores Giacomin e Couto (2010).
A ILPI precisa existir, de fato, como um equipamento de alta complexidade do Suas, sob a coordenação desta política, com o apoio das demais políticas (saúde, defesa dos direitos de cidadania, abastecimento, esportes, cultura, educação etc.) e ainda sob a vigilância dos órgãos reguladores, no contexto local. Deve-se cobrar do Estado, além do cumprimento do seu papel fiscalizador, o respeito efetivo à garantia constitucional da universalidade da assistência social à população idosa. (GIACOMIN & COUTO, p.237)
Não podemos negar nossa realidade, os idosos estão sendo
institucionalizados e cada vez mais, então ao invés de julgarmos muitas vezes os
abrigos como muito se fala pelas ruas, que é um depósito, que lá as famílias jogam
os idosos, que os órgãos competentes não dão conta das demandas. Todas essas
questões que já conhecemos, existem sim, famílias que negligenciam seus idosos,
assim como bem sabemos que o Estado negligencia os idosos e a sociedade
negligencia e apontam o idoso como improdutivo. O fato é que diante essa quebra
de braço e essa eterna discussão de quem tem mais responsabilidades estão
esquecendo ampará-los.
É exatamente em meio a esse turbilhão que a ILPI entra, são elas que
acolhem, cuidam e protegem esses idosos, então ao invés de difamarem e julgarem
essas instituições, é necessário que façamos uso das palavras das autoras, as ILPIs
precisam existir, mas como um equipamento de alta complexidade do Suas, sob a
coordenação desta política, com o apoio das demais políticas de saúde, defesa dos
direitos de cidadania, abastecimento, esportes, cultura, educação, lazer e tudo mais
que um cidadão tem por direito, e ainda sob a vigilância dos órgãos reguladores de
cada município.
Deve-se cobrar do Estado, além do cumprimento do seu papel fiscalizador, o
respeito efetivo à garantia constitucional da universalidade da assistência social à
população idosa, é isso que esperamos do estado, que se apoiem as instituições e
que os órgãos trabalhem em parceria pelo presente e também pelo futuro, pois isso
interessa a todos.
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5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
As instituições de longa permanência (ILPI) no Brasil não tem definição
específica sobre o que seja. O que sabemos é que os asilos constituem a
modalidade mais antiga de atendimento ao idoso fora do convívio familiar, eram
inicialmente dirigidos à população carente, que necessitava de abrigo. Por esta
razão, muitas das instituições brasileiras se autodenominam abrigos. Surgem,
espontaneamente, em razão das necessidades da comunidade, na maioria deles,
predomina o caráter assistencial.
O envelhecimento da população e o aumento da sobrevivência de pessoas
com redução da capacidade física, cognitiva e mental requerem que os asilos
deixem de fazer parte apenas da rede de assistência social e integrem a rede de
assistência à saúde. Com essa nova função das instituições a Sociedade Brasileira
de Geriatria e Gerontologia sugeriu a adoção da denominação de Instituições de
Longa Permanência para Idoso (ILPI).
Camarano (2008) afirma que não temos números específicos de ILPI no
Brasil, o que temos são estimativas de que sejam em torno de 5.000, concentradas
nas capitais estaduais e nas grandes cidades, esclarecendo que são grandes os
números de municípios que não tem instituições de longa permanência.
No território cearense segundo os dados do Instituto de Pesquisa Econômica
Aplicada (IPEA) do livro Características das instituições de longa permanência para
idosos da região Nordeste (2008) dos 184 municípios cearenses, apenas 7,6%
possuem ILPIs, do que se pode concluir que o estado apresenta uma baixa
cobertura desta modalidade de serviço. Foram encontradas 30 ILPIs no Ceará. O
maior número dessas instituições se localiza na capital Fortaleza (10) e em Juazeiro
do Norte (7), enquanto as demais se encontram dispersas em outros municípios do
estado.
Ressaltamos a Casa de Nazaré em Fortaleza, uma instituição filantrópica sem
fins lucrativos e de utilidade pública dirigida pela Companhia das Filhas da Caridade
de São Vicente de Paulo de Fortaleza, que dá assistência às idosas desamparadas,
em relação à sua saúde física e bem-estar mental, sem discriminação de cor, credo
religioso, político ou condição social, observando sempre as disposições legais.
A referida instituição é um ambiente tranquilo, harmônico, acolhedor, reúne
todos os meios para um tratamento digno das idosas, oferece uma estrutura física e
100
organizacional, com total capacidade de atender com qualidade integralmente todas
as institucionalizadas, visando à proteção social, o que nos remete que o abrigo
preconiza o que diz a LOAS que tem como objetivo a proteção social, garantir a vida
de qualidade para os idosos, assim como o estatuto do idoso de garantir direitos.
É notória a preocupação da instituição na questão da qualidade de vida, com
atendimentos diários de várias especialidades primando pela saúde e bem estar das
idosas, além da socialização, são feitas inúmeras atividades e eventos, mobilizando
as idosas à participar e interagir com os visitantes e voluntários que se
disponibilizam a fazer palestras, a atendê-las nas suas necessidades e também para
o lazer, a instituição faz passeios, para centros culturais, teatros, recebem
voluntários para fazer as unhas, cabelo e maquiagem, e uma gama de atividades
proporcionando uma vida verdadeiramente com qualidade e dignidade.
A observação do campo nos proporciona riqueza de informações, além das
entrevistas, é possível observar um pouco da rotina da instituição, das idosas e dos
funcionários, aonde vimos à preocupação de todos com as idosas, com as
atividades do dia, o cuidado com a organização da instituição e tudo pautado na
rotina das idosas, tudo feito para elas, por elas, algo que chamou atenção em uma
das visitas, foi a organização do ambiente, por se tratar de um número baixo de
institucionalizadas comparada com outras instituições. São 39 idosas, e a
organização chama atenção por tudo ter seu tempo, sua hora, sendo
cronologicamente organizado, de acordo com as prioridades das idosas.
Porém ser uma instituição filantrópica traz seus infortúnios, mesmo com todos
os esforços e trabalho, a casa de Nazaré enfrenta uma dificuldade bem antiga,
problemas financeiros, necessitando de doações. Não só a casa de Nazaré em si,
mas todas as ILPIs identificadas nesta pesquisa necessitam de parcerias e de
recursos para continuarem garantindo essa vida de qualidade e dignidade aos
idosos. Toda essa dificuldade financeira da casa de Nazaré de falta de recursos nos
revela um ponto fraco das políticas sociais.
101
A pesquisa implementada nos proporcionou responder aos nossos objetivos
expostos no início de nossa pesquisa, que era investigar os principais fatores que
envolvem o rompimento dos laços familiares das idosas abrigadas no abrigo, nossos
resultados achados foram:
Das interlocutoras da pesquisa apenas uma é aposentada por tempo de
contribuição. As restantes recebem Benefício de Prestação Continuada
(BPC).
As razões que levaram as idosas a institucionalização foram: morte das
pessoas que cuidavam dessas idosas; não ter família; doenças; condições
financeiras e medo de morar sozinha.
As idosas abrigadas demonstraram autonomia diante de suas escolhas,
mesmo em meio às circunstâncias da vida, não deixaram de se impor e fazer
valer seus desejos de ter uma vida digna.
Idosas que recebiam visitas constantes com o tempo pararam de receber
essas visitas se transformando em telefonemas. Outras nunca receberam
visitas de parente, porque não tem ou nunca mantiveram relação com
nenhum familiar ou por que simplesmente não recebem visitas, de todas as
interlocutoras apenas uma recebe visitas com maior frequência.
As idosas que mantiveram uma relação anterior ao abrigamento têm boas
lembranças e trazem um sentimento de saudade de suas famílias.
As idosas que afirmaram não ter família e que nunca tiveram contato com
nenhum parente declaram não ter revolta por viveram da forma que vivem.
Em relação ao abrigamento todas encaram como algo bom, pois foram
acolhidas e bem cuidadas no abrigo, julgam necessário existir esses espaços.
A instituição não informou nenhuma estratégia para reestabelecer vínculos
familiares, fato esse também relatado pelas idosas que desconhecem tais
iniciativas de reestabelecer vínculos.
A instituição tem apenas uma Assistência Social, com uma enorme
sobrecarga de trabalho, isso revela os limites do profissional em ser pleno e
as dificuldades em ampliar seus serviços.
A casa de Nazaré é um abrigo comprometido, sério e que não mede esforços
para fazer o melhor para suas idosas, porém em sua trajetória existem limites
e barreiras impedindo uma atuação completa, como as dificuldades
102
financeiras.
A casa de Nazaré recebe diariamente voluntários de instituições de ensino, e
também de pessoas que disponibilizam algumas horas de suas rotinas diárias
para contribuir de alguma forma com o trabalho da instituição.
Conhecer a realidade das idosas foi a ampliação de tudo que antes só
conhecíamos por relatos, aquele pensamento de tristeza, de abandono, se
desmistificou, constatou abandono sim, descaso, mas constatamos autonomia,
constatamos circunstâncias de vida que qualquer ser humano esta sujeito a passar.
Seguir para lado A ou lado B não necessariamente é uma opção, nem tudo são
escolhas, algumas situações requerem de nós aceitação. Não estamos falando em
aceitar tudo sem lutar, sem reivindicar, mas a fatos do passado que não podem ser
mudados.
Porém, podemos melhorar nosso presente e construir nosso futuro. Nossa
pesquisa nos alertou para um olhar crítico, para a necessidade de se deter e voltar o
foco para a população idosa, de se investir em pesquisas para as situações de
abandono e perda de vínculos familiares. Acreditamos que não apenas nós,
envolvidos nesta pesquisa, mas todos as que já pesquisaram sobre abandono,
institucionalização, idoso, se perguntam: o que faremos como profissionais de
Serviço Social, o que faremos diante dessa problemática quando estivermos
atuando?
Essa indagação segue conosco. Será que como futuros profissionais
poderemos (re) elaborar e implementar projetos com o intuito não apenas de
reestabelecer vínculos, mas de garantir os direitos dos idosos integralmente.
Acreditamos que esse seja o maior sonho de um (a) assistente social, garantir
direitos, seja a quem for, apenas fazer valer o que se é de direito.
Tratar da institucionalização no nosso país é complexo porque envolve vários
fatores, sendo o principal o Estado, dai se deriva o sucateamento das políticas, falta
de efetividade das leis para pessoa idosa, descaso com as garantias dos direitos dos
idosos, descaso com os abrigos, principalmente financeiramente.
Camarano (2010) traduz exatamente nosso pensamento, que no Brasil, as
ILPIs não são resultado de uma política pública, e sim a marca registrada da sua
ausência, guardando uma relação profunda com a filantropia e a religião exatamente
como a casa de Nazaré, que atendiam aquelas idosas sem família e/ou sem renda.
103
Essas instituições não são benefícios a mais para população idosa, o que
deveria ser mais é exatamente o de menos. O que resta para o idoso, depois de
todas as alternativas falharem, quando a família falha, quando o Estado falha,
quando a sociedade falha, quando a vida não lhes dá mais oportunidades, e o abrigo
chega como um alento para alguém que teve seus direitos negados, quando sua
qualidade de vida e dignidade foram violados.
Existem muitas legislações no Brasil, porém do que adianta existir leis se elas
não são de fato efetivadas, não são colocadas em prática. Se os idosos têm leis que
lhes protegem da violência em demasia, por que eles estão passando dificuldades
mesmo depois de tantos direitos já terem sido negados? Por que mesmo após
estarem nos abrigos, no caso da Casa de Nazaré que vivem da ajuda de benfeitores
e voluntários, na coleta de cupom fiscal, coleta da missa diária, telemarketing,
contribuição financeira das idosas com a aposentadoria até 70%, conforme Estatuto
do Idoso, perguntamos, onde estão as ações do Estado?
A atuação do Estado deveria ser integral, se ele efetivou essas leis por que
não garanti-las. É seu dever, o seu papel diante da sociedade, onde está a
Constituição Federal, PNI, Estatuto do Idoso, a existência desses abrigos são
importantíssimas, porque eles fazem a obrigação do Estado, o que as leis não
fazem, e mesmo tapando essa grande lacuna do poder Público não recebem
atenção necessária, ou melhor, nem o mínimo estão recebendo, porque um abrigo
que acolhe de 39 a 40 idosas com inúmeros problemas de saúde, sustentado com
doações, é algo para se preocupar muito. O que temos atualmente são ILPIs mesmo
que precárias, limitadas, enfrentando desafios constantes, estão fazendo seu melhor
na possibilidade que lhes permitem, desse modo falta o Estado assumir
integralmente a sua parte no cuidado dos idosos.
É correto um idoso tão injustiçado, pobre, muitas vezes sem nenhum parente,
abandonado contribuir com 70% de qualquer benefício previdenciário ou de
assistência social? Essa cobrança é facultativa segundo o Estatuto do Idoso.
Camarano (2010) declara que para ser justo e correto deveria ser fixado em 0% pelo
fato de tratar de uma política universal de seguridade social. Segundo a autora, um
prestador conveniado à assistência social também não poderia/deveria receber
qualquer quantia da família ou do idoso, além daquela paga pelo próprio SUAS.
104
Camarano (2010) afirma que a ILPI precisa existir, de fato, como um
equipamento de alta complexidade do SUAS, sob a coordenação desta política, com
o apoio das demais políticas (saúde, defesa dos direitos de cidadania,
abastecimento, esportes, cultura, educação etc.) e ainda sob a vigilância dos órgãos
reguladores, no contexto local. Concordamos com a autora, as ILPIs devem ser
amparadas, devem ter suporte do Estado, das políticas públicas, das leis que
deveriam garantir uma vida digna, de qualidade para os idosos.
A Casa de Nazaré é uma instituição ímpar que nos proporcionou essa
aproximação e a qualidade desta pesquisa. É uma instituição incansável em manter
um ambiente de qualidade, acolhimento, respeitar, cuidar de suas idosas, de forma
tão justa, na garantia de direitos, na garantia de vida integral. Agradecemos por fazer
parte da construção desse projeto, não apenas como estudante, mas como ser
humano, de ter tido a oportunidade de conhecer esse universo de pertinho, o qual
tantas vezes nos encantou e nos chamou a atenção, nos trazendo um sentimento de
gratidão, principalmente as idosas, que fizeram essa teoria real, materializada nesse
projeto acadêmico.
105
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107
APÊNDICE A
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Fortaleza, ____/____/______
Eu, (_____________________________________________________,
RG________________/_____) brasileira, residente e domiciliada nesta capital, estou
sendo convidada a participar do estudo, cujo objetivo é investigar os principais
fatores que envolvem o rompimento dos laços familiares das idosas abrigadas na
Casa de Nazaré.
A minha participação no referido estudo será no sentido de responder a
entrevista que será conduzida pela pesquisadora e facilitar dados e informações
para a pesquisa documental.
Estou ciente de que minha privacidade será respeitada, ou seja, meu nome ou
qualquer outro dado ou elemento que possa, de qualquer forma, me identificar, será
mantido em sigilo. Também fui informada de que posso me recusar a participar do
estudo, ou retirar meu consentimento a qualquer momento, sem precisar justificar.
A pesquisadora envolvida com o referido estudo é Silvânia Teixeira da Silva e
com ela poderei manter contato pelos telefones por ela já ofertados. FONE: (85)
34836047/87512882.
É assegurado que me será garantido o livre acesso a todas as informações e
esclarecimentos adicionais sobre o estudo.
Enfim, tendo sido orientada quanto ao teor de todo o aqui mencionado e
compreendido a natureza e o objetivo do referido estudo, manifesto meu livre
consentimento em participar, estando totalmente ciente de que não há nenhum valor
econômico, a receber ou a pagar, por minha participação.
_____________________________ _____________________________
Assinatura da entrevistada Assinatura do Pesquisador
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APÊNDICE B
Idade:
Estado Civil: Naturalidade:
Escolaridade: ( ) Fundamental ( ) Médio ( ) Superior
Filhos? Sim ( ) Não ( )
Renda: ( ) Aposentada ( ) pensionista ( ) S/ Renda
1- Há quantos anos a senhora mora na casa de Nazaré?
2- Como veio morar aqui na casa de Nazaré?
3- Como era sua relação com seus familiares? Por que veio para esta instituição?
4- Antes do abrigamento morava com quem?
5- Que sentimento traz de seus familiares?
6- De quem partiu a ideia da institucionalização?
7- Tem vontade de voltar ao convívio da família?
8- Você gosta do abrigo? Por quê? Se pudesse viver em outro lugar, onde seria?
9- como se deu o processo de visitas por parte se seus familiares? Como era no
início e como é agora?
10- O que acha da Casa de Nazaré? Como se dá o tratamento na instituição? Como
se dá a sua rotina na Casa de Nazaré?
11- Ainda pensa em procurar seus familiares?
12- O que acha sobre abandono familiar?
13 - O que acha sobre abrigamento de idosas?