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Centro de Convenções Ulysses Guimarães Brasília/DF – 16, 17 e 18 de abril de 2013
NOVOS ARRANJOS DE GOVERNANÇA PARA A INTERSETORIALIDADE NA GESTÃO
SOCIAL: A EXPERIÊNCIA DO PROGRAMA TRAVESSIA
Igor de Souza Soares Ronan Ramos de Oliveira Júnior
Ronaldo Araújo Pedron Antônio Maria Claret de Souza Filho
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Painel 29/108 Governança e participação em políticas públicas
NOVOS ARRANJOS DE GOVERNANÇA PARA A
INTERSETORIALIDADE NA GESTÃO SOCIAL: A EXPERIÊNCIA DO PROGRAMA TRAVESSIA
Igor de Souza Soares
Ronan Ramos de Oliveira Júnior Ronaldo Araújo Pedron
Antônio Maria Claret de Souza Filho
RESUMO O presente trabalho trata da implementação de novos arranjos de governança como resposta ao aprofundamento da intersetorialidade na gestão social das políticas de combate à pobreza do Governo de Minas. Desde 2011, o Governo do Estado adotou um modelo metodológico que considera diferentes dimensões nas quais domicílios estejam em situação de pobreza e as sintetiza no Índice de Pobreza Multidimensional (IPM). Esse modelo novo compreende a pobreza como fenômeno complexo e multifacetado. Além disso, ele permite desenvolver projetos direcionados a privações sociais específicas. Partindo desse potencial de direcionamento e focalização, o Governo de Minas tem atuado com o Programa Travessia, sua principal política para o combate à pobreza. Executado por um conjunto de Secretarias de Estado (Desenvolvimento Social, Saúde, Educação e Trabalho e Emprego), o Programa apresenta práticas intersetoriais de gestão que dependem fortemente de um arranjo institucional específico, isto é, de uma articulação institucionalizada no âmbito do modelo de governança e da estrutura organizacional do Estado.
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SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO...................................................................................................... 04
2 O PROGRAMA TRAVESSIA................................................................................ 05
3 O ÍNDICE DE POBREZA MULTIDIMENSIONAL................................................. 09
3.1 O PORTA A PORTA E O MAPA DE PRIVAÇÕES SOCIAIS............................ 11
4 INTERSETORIALIDADE E GOVERNANÇA......................................................... 13
5 CONCLUSÃO: POBREZA COMPLEXA, POLÍTICAS PÚBLICAS INTEGRAIS... 26
6 REFERÊNCIAS..................................................................................................... 27
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1 INTRODUÇÃO
Cada vez mais os governos têm voltado sua atenção à pobreza e
verificado a necessidade de inserir, em suas agendas, políticas que respondam de
alguma forma a esse fenômeno. O sucesso dessas políticas depende, em grande
medida, de duas coisas: da conexão das metodologias utilizadas com os
pressupostos teóricos adotados; e da capacidade de os arranjos de governança
empreendidos sustentarem a implementação dessas metodologias. Nesse sentido, é
oportuno analisar o modo como uma compreensão específica de pobreza informa o
desenho de uma política pública e, além disso, como esse desenho depende de
condições específicas de governança para se implementar.
Este artigo tem por objetivos: 1) examinar como o conceito de pobreza
multidimensional influencia o desenho do Programa Travessia como adotado a partir
de 2011; e 2) analisar os novos arranjos de governança que ganham forma na
Administração Pública mineira para comportar e promover a intersetorialidade,
enquanto diretriz para o enfrentamento da complexidade dos fatores que envolvem a
pobreza. Para tanto, será utilizada metodologia de revisão bibliográfica de alguns
conceitos relacionados à gestão social e à intersetorialidade, depois do quê se
poderá analisar, com base em documentos e outros trabalhos produzidos, a
experiência atual do Programa Travessia.
No primeiro momento, o Programa Travessia será pormenorizado, de
modo a se conhecer a sua estrutura, composição, bem como outras características
gerais. Em seguida, tratar-se-á da acepção de pobreza multidimensional e da
metodologia do Índice de Pobreza Multidimensional (IPM), com sua aplicação à
etapa de diagnóstico do Programa Travessia, o Projeto Porta a Porta.
Tratar-se-á, então, da emergência da intersetorialidade, de como ela se
insere na pauta do governo estadual e de seu caráter funcional para equacionar as
dificuldades enfrentadas pelas políticas setoriais tradicionais que lidam com a
superação da pobreza. A análise dessas relações levanta o desafio que se coloca
aos governos no que diz respeito à pobreza: transformar a metodologia utilizada em
política pública.
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A consideração da pobreza como um fenômeno complexo requer
metodologias específicas que dão conta dessa complexidade. Essas metodologias,
por sua vez, precisam de arranjos de governança mais sofisticados que os adotados
tradicionalmente:
A complexidade pressiona em direção à redefinição conceitual e operativa das políticas sociais. Os critérios de integralidade na formulação das políticas, e de transversalidade como lógica de implementação, vão ganhando terreno diante de concepções setoriais e esquemas de gestão burocráticos e segmentados. A subjetivação pressiona em direção à redefinição dos aspectos relacionais das políticas de bem-estar. (GOMÀ, 2004, p.15).
Isso significa dizer que as características da atuação do Estado têm sido
redefinidas conforme uma necessidade partida de uma nova dinâmica social, na
qual a pobreza se configura como um fenômeno de natureza complexa. Essa
redefinição precisa passar pela criação de novos arranjos de governança que
comportem a gestão de políticas públicas que se adaptem à complexidade de seu
contexto e que, mais importante, alcancem as pessoas imersas nessa
complexidade.
2 O PROGRAMA TRAVESSIA
O Programa Travessia consiste em um conjunto integrado de projetos
promovidos pelo Governo de Minas e que visam ao combate à pobreza e à
vulnerabilidade social em municípios de baixo Índice de Desenvolvimento Humano
(IDH).
O Programa possui o seguinte fluxo (Figura 1): os municípios são
escolhidos segundo critério do IDH; os domicílios dos municípios selecionados são
diagnosticados conforme suas privações sociais (Porta a Porta); são elaborados os
mapas de privação social, por município (Governo do Estado em parceria com o
Município); com base no mapa de privação social, é construído o Plano Travessia,
documento que serve para orientar a alocação de recursos; de acordo com as
indicações do mapa de privação, os projetos Travessia são acionados e
implementados nos municípios, atendendo aos domicílios identificados como
multidimensionalmente pobres.
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Figura 1 - Fluxo do Programa Travessia
Fonte: Elaboração própria
O propósito de melhorar as condições de vida da população mineira que
ainda experimenta privações sociais leva em consideração a pobreza em suas
dimensões múltiplas e requer, portanto, atuação integrada e atenção especial do
governo, tradicionalmente acostumado a agir por meio de estruturas burocráticas
rígidas e setorizadas.
Neste sentido, o Programa conta com dois órgãos de coordenação: a
Secretaria de Estado de Desenvolvimento Social (Sedese), responsável pela
execução do Programa, e a Assessoria de Articulação, Parceria e Participação
Social da Governadoria (AAPPS), estrutura incumbida de zelar pela integralidade
das ações, por meio da interlocução entre os setores envolvidos, e evitar a
fragmentação de esforços no planejamento e na execução do Programa. Além
disso, à AAPPS cabe a tarefa de orientar e supervisionar a utilização do conteúdo
metodológico do Programa.
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Enquanto a Sedese concentra a gerência do Programa, a AAPPS
organiza o Comitê e o Subcomitê de acompanhamento, instâncias com
característica intersetorial, compostas por doze Secretarias de Estado e mais dois
órgãos estratégicos (Cemig e Copasa - empresas de energia e de saneamento do
Estado, respectivamente). O Subcomitê tem caráter técnico e se apresenta como
espaço de diálogo entre os gerentes dos diversos projetos envolvidos, ao passo que
o Comitê reúne os Secretários de Estado para decisões estratégicas.
Figura 2 - Estrutura Organizacional do Programa Travessia
Fonte: Cadernos Travessia
Os Projetos Estratégicos estão sucintamente descritos nas seções
seguintes. Estão também apresentadas as suas finalidades, conforme disposto no
Plano Plurianual de Ação Governamental (PPAG 2012-2015).
Porta a Porta: localiza, por meio de busca ativa, domicílios que
apresentam privações sociais.
Banco Travessia: promove a inclusão educacional, social e produtiva
de famílias com privações educacionais por meio de incentivos
financeiros.
Travessia Social: mediante a assinatura de um convênio entre o
Governo do Estado e o município, são executadas obras de
infraestrutura, tais como construção de módulos sanitários, reformas de
domicílios e em equipamentos públicos e ações de promoção de
acesso à água potável.
Programa Travessia
Porta a
Porta
Travessia
Social
Travessia
Educação
Travessia
Saúde
Travessia
Renda
Banco
Travessia
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Travessia Renda: tem sua atuação dividida em quatro eixos. São eles:
Qualificação Profissional; Elevação de Escolaridade; Mutirão da
Cidadania (oferta gratuita de emissão de documentos para a população
em vulnerabilidade social); e Formação de Gestores Municipais.
Travessia Saúde: contribui com a redução da desnutrição e da
mortalidade na infância, por meio da elaboração de um diagnóstico da
situação de saúde do município. O projeto capacita equipes municipais
do Sistema Único de Saúde e repassa recursos financeiros aos
municípios para o fortalecimento da atenção primária e da vigilância em
saúde.
Travessia Educação: tem o objetivo de ampliar as oportunidades
educacionais, melhorar os índices de aprendizagem e contribuir para a
elevação da escolaridade. O projeto atua em três eixos: melhoria da
infraestrutura escolar; capacitação em qualidade da gestão escolar e
oferta de turmas de Educação de Jovens e Adultos.
Ressalta-se que outros projetos governamentais vêm sendo envolvidos
nos diálogos promovidos no âmbito do Programa Travessia, devido à similaridade
entre os objetos tratados: o combate à pobreza.
As Secretarias de Estado diretamente envolvidas são: Desenvolvimento
Social (Sedese), executora dos projetos Porta a Porta, Travessia Social e Banco
Travessia; Trabalho e Emprego (Sete), executora do Travessia Renda; Saúde
(SES), executa o Travessia Saúde, e Educação (SEE), executa o Travessia
Educação. Além dessas estruturas já consolidadas, o Programa requereu a criação
do Núcleo Central de Inovação Social (NCIS), estrutura vinculada à Secretaria de
Estado de Planejamento e Gestão (Seplag) e responsável pelo monitoramento dos
projetos Travessia Social e Banco Travessia.
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3 O ÍNDICE DE POBREZA MULTIDIMENSIONAL
Tradicionalmente, os governos têm trabalhado com um conceito de
pobreza baseado no critério de renda, segundo o qual os pobres, potenciais
beneficiários de um conjunto de políticas sociais, são aqueles com rendimento
inferior a um determinado valor. Com a adoção do Índice de Pobreza
Multidimensional, em 2011, o Governo de Minas passou a adotar, no que tange às
ações do Programa Travessia, o conceito de pobreza multidimensional, para o qual
os domicílios são considerados pobres conforme as privações que apresentem em
diferentes dimensões, tais como saúde, padrão de vida e educação.
A acepção de pobreza sob o viés multidimensional recebe notoriedade a
partir dos trabalhos de Amartya Sen, prêmio Nobel de economia em 1998. Para Sen,
“a pobreza deve ser vista como privação de capacidades básicas em vez de
meramente como baixo nível de renda, que é o critério tradicional de identificação da
pobreza” (SEN, 2010). Isso se justifica porque a renda não é considerada como um
bem ou um valor em si mesmo, mas tão-somente um meio para, em alguns casos,
se alcançar outros bens. Dessa forma, é possível que, por vezes, a definição de
pobreza seja construída com base em privações de educação, saúde, emprego,
segurança ou de outras dimensões quaisquer. Esse entendimento tem o potencial
de colocar atenção na percepção que as pessoas pobres apresentam sobre
pobreza, desde que, é claro, ele considere a opinião dessas pessoas para a
determinação das dimensões de pobreza.
Nesse sentido, com base no conceito de privação de capacidades de Sen
(2010), as ações de combate à pobreza deveriam abranger, além da transferência
de renda, o desenvolvimento das diversas capacidades humanas que afetam
diretamente as condições de liberdade, bem como, poder-se-ia dizer, as de
cidadania. Assim sendo, proporcionar o desenvolvimento humano significaria
oferecer oportunidades para as pessoas viverem uma vida conforme seus próprios
valores e empoderá-las de modo que possam alcançar seus objetivos.
Inspirado por esse conceito mais complexo de pobreza, e um ano após
seu lançamento pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud)
em conjunto com o centro de pesquisas Oxford Poverty and Human Development
Initiative (OPHI), o Governo de Minas Gerais passou a adotar o Índice de Pobreza
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Multidimensional (IPM) para diagnosticar as múltiplas privações sociais pelas quais
passam domicílios nos municípios com os menores índices de desenvolvimento
humano (IDH). O IPM foi integrado ao Relatório de Desenvolvimento Humano (RDH)
do Pnud a partir de sua 20ª edição. O novo indicador substitui o Índice de Pobreza
Humana (IPH), incluído anualmente nas edições do RDH desde 1997.
A metodologia de mensuração da pobreza multidimensional foi
desenvolvida por Sabina Alkire e James Foster, do centro de pesquisas Oxford
Poverty and Human Development Initiative (OPHI), da Universidade de Oxford, e
prevê privações em educação, saúde e padrão de vida. O Índice de Pobreza
Multidimensional tem como objetivo fornecer um retrato amplo sobre as pessoas que
são privadas em suas capacidades e que, portanto, têm sua condição de liberdade
limitada. As dimensões em que o IPM aponta privações são as mesmas do Índice de
Desenvolvimento Humano (IDH) e se subdividem, no IPM, em dez indicadores: anos
de escolaridade e crianças matriculadas (educação); nutrição e mortalidade infantil
(saúde); gás de cozinha, sanitários, água, eletricidade, pavimento e bens domésticos
(padrão de vida). De acordo com esse método, uma família é considerada
multidimensionalmente pobre conforme a intensidade das privações sociais
vivenciadas, e se apresentar privação em, pelo menos, 30% do peso total dos
indicadores. Cada dimensão tem peso de 1/3, que é dividido proporcionalmente pelo
número de indicadores analisados em cada uma. Quanto maior o IPM, maior é o
nível de pobreza multidimensional.
O Governo de Minas Gerais mantém com o Pnud, por meio da Seplag,
um termo de cooperação técnica internacional para o fortalecimento da estratégia de
utilização do IPM. Além disso, é recente uma parceria entre o Governo, a
Universidade de Oxford, por meio do OPHI, e a Fundação João Pinheiro (FJP), no
intuito de estabelecer, por meio de seminários, cursos e reuniões, um intercâmbio de
conhecimentos e experiências acerca da metodologia de cálculo do IPM, da sua
aplicação em políticas públicas e da formação de técnicos e pesquisadores direta ou
indiretamente envolvidos. A parceria prevê ainda o desenvolvimento de uma
pergunta aberta a ser incorporada no diagnóstico do IPM utilizado pelo Estado,
tendo em vista o propósito de avançar no desenvolvimento das dimensões faltantes
da metodologia, tais como empoderamento, bem-estar, segurança ou qualidade de
emprego.
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3.1 O Porta a Porta e o Mapa de Privações Sociais
O projeto Porta a Porta, conforme descrito acima, é a etapa inicial do
Programa Travessia e consiste em um diagnóstico censitário que investiga privações
sociais em educação, saúde e padrão de vida, com vistas a subsidiar e orientar a
execução dos demais projetos que compõem o Travessia. Sublinha-se que a
execução do projeto se dá em parceria com os municípios atendidos.
Para identificar as pessoas em privações sociais, o Porta a Porta realiza
uma busca ativa, que consiste em visitar, de porta em porta, todos os domicílios dos
municípios do Programa Travessia, aplicando o questionário para aferição do Índice
de Pobreza Multidimensional - IPM, a metodologia de mensuração de pobreza
utilizada pelo Pnud.
Tabela 1 - Privações sociais avaliadas pelo Porta a Porta
Dimensão Indicador Há privação se...
Peso
no
Índice
Educação
Anos de
Estudos
Pelo menos um membro com mais de 15
anos do domicílio não completou cinco anos
de estudo
16,7%
Matrícula das
Crianças
Pelo menos uma criança em idade escolar (6
a 14 anos) não está frequentando a escola
16,7%
Saúde
Mortalidade Pelo menos uma criança de zero a cinco
anos morreu nos últimos cinco anos
16,7%
Nutrição Pelo menos uma pessoa desnutrida 16,7%
Padrão
de Vida
Eletricidade Não possui energia elétrica 5,6%
Sanitários Não possui banheiro ou possui com
ausência de pia, vaso ou chuveiro, e ainda,
se possui banheiro mas este é de uso
compartilhado com outras famílias
5,6%
Água Não possui acesso a água potável e/ou o
acesso fica a mais de 30 minutos a pé de
casa
5,6%
12
Padrão
de Vida
Piso É de terra, areia ou esterco 5,6%
Combustível
para Cozinhar
Utiliza lenha, carvão e/ou esterco 5,6%
Bens
Domésticos
Não tem carro ou trator e possui apenas um
tipo dos seguintes elementos: rádio,
televisão, telefone, geladeira, bicicleta ou
moto
5,6%
Fonte: Baseado no Índice de Pobreza Multidimensional
Após a aplicação dos questionários em cada município, é elaborado o
Mapa de Privação Social, um amplo diagnóstico que aponta as maiores privações do
município e sua localização. É por meio deste documento que o Programa Travessia
direciona e aperfeiçoa suas ações.
A seguir, descrevem-se as etapas de que se compõe o fluxo do Porta a
Porta:
1. Treinamento:
a. A Prefeitura indica um articulador que cuidará da implementação do
Porta a Porta no município;
b. A equipe do Programa Travessia capacita o articulador na
metodologia do projeto;
c. O articulador repassa a informação para os visitadores sociais
(demais pessoas contratadas no município) que farão as visitas;
d. O município é dividido em regiões de acordo com a divisão utilizada
pelas equipes do Programa de Saúde da Família e da Assistência
Social local.
2. Pesquisa Domiciliar:
a. Os visitadores sociais são organizados por região e se
responsabilizam por todos os domicílios do espaço determinado;
b. O visitador social visita de porta a porta as famílias, aplicando o
questionário sobre pobreza multidimensional.
3. Mapa de Privação Social:
a. Os dados são consolidados e são montados os mapas de privação
social por município atendido;
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b. A equipe do Programa Travessia, junto da equipe da Prefeitura,
monta o Plano Travessia.
A importância do projeto consiste em possibilitar o Governo de Minas e as
Prefeituras conhecerem os domicílios e as suas privações sociais de modo
focalizado. Posto isto, o Governo de Minas se articula de forma coordenada para
enfrentar as privações sociais onde, de fato, elas estão. Até o início de 2013, mais
de 263 mil domicílios, divididos em 130 municípios, receberam os visitadores sociais
do Porta a Porta.
4 INTERSETORIALIDADE E GOVERNANÇA
A adoção de uma metodologia de diagnóstico que considera a pobreza
como composta por diferentes dimensões representa a incorporação, pelo Programa
Travessia, de uma abordagem notadamente transdisciplinar e que, portanto, abre
espaço para o desenvolvimento de práticas intersetoriais. A partir daí, a necessidade
de integrar as políticas públicas na mesma coesão com que se apresentam as
privações vivenciadas pelas famílias cobra uma engenharia institucional que integre
as diferentes pastas do Governo e, mais ainda, que perpasse os diferentes níveis de
sua atuação, desde a fase inicial de planejamento até o momento de execução,
quando as políticas encontram seus beneficiários.
Um modelo de gestão intersetorial1 não se sustenta com uma simples
composição ou justaposição de projetos ou programas que continuem sendo
formulados e realizados setorialmente; há que se infundir uma nova dinâmica para o
aparato governamental (INOJOSA, 2001). Esse entendimento tem alimentado um
esforço de consolidar novos arranjos de governança que sustentem e promovam a
integração dos projetos de que é composto o Programa Travessia. A sua disposição
em diferentes pastas se justifica pela especialidade das ações desenvolvidas, mas,
sem estruturas adequadas que viabilizem a sua articulação, a fragmentação das
políticas aparece como limite à superação da pobreza.
1 Conforme Junqueira et al (1997, p.24), a intersetorialidade consiste na “articulação de saberes e experiências no planejamento, realização e avaliação de ações, com o objetivo de alcançar resultados integrados em situações complexas, visando um efeito sinérgico no desenvolvimento social”.
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Segundo Magalhães (2004), a fragmentação, a dispersão e a
sobreposição de projetos e ações constituem-se problemas tradicionais nas políticas
e nos programas sociais. A cultura de gestão que concebe as ações ou os
programas sob o ângulo do setor ou da especialidade tem resultado,
insistentemente, em dispersão dos recursos, duplicação de esforços, disputas entre
áreas e setores de serviço e em distorções e disfunções no atendimento à
população. Essa gestão pontual e fragmentada comprometeria a continuidade de
seus efeitos, reduzindo, portanto, seu potencial transformador da realidade. Ocorre
que esse aspecto setorial e segmentado é, muitas vezes, produto de um aparato
institucional inapropriado, insuficientemente articulado. Daí adviria uma tendência
emergente ao reordenamento institucional dos organismos governamentais e à
incorporação de uma nova cultura nas relações internas entre as diferentes
instâncias governamentais e destas com os destinatários das ações públicas.
A articulação dos projetos do Programa Travessia é um desafio proporcional ao de
intervir simultaneamente nas diferentes privações sociais vivenciadas pelas
pessoas. O perfil intersetorial do Programa busca responder a essa natureza
complexa e multidimensional da pobreza. Como já foi dito, os diferentes projetos
estão distribuídos conforme sua especialidade em mais de uma Secretaria de
Estado. Aparece, então, a necessidade de geri-los de forma suficientemente
coordenada e intersetorial, não apenas para a simples otimização de recursos ou
para uma maior dinamicidade da atuação estatal, mas principalmente porque a
efetividade dessas políticas está condicionada a que a engenharia presente na
execução acompanhe a engenharia metodológica do conceito que as embasa.
A intersetorialidade tem sido identificada como uma diretriz do Programa
Travessia já nos primeiros anos de seu funcionamento. De fato, Barbosa (2009)
reconhece que a implementação do Programa sob essa ótica “teve alguns acertos,
em especial, nos instrumentos criados para que se obtivesse a viabilidade política da
intersetorialidade”. À época, e com dois anos de funcionamento, o Travessia já
dispunha de “uma instância coletiva de deliberação e consulta e um agente catalítico
bem definido e com autoridade e legitimidade” (BARBOSA, 2009), quais sejam: o
Comitê de Acompanhamento do Programa Travessia e o então Vice-Governador do
Estado. No entanto, a autora pontua o que faltava quanto à aplicação da perspectiva
intersetorial ao Programa: “o aperfeiçoamento de mecanismos que permitam a
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criação de visões de sentido comum (tal como um diagnóstico com uma abordagem
intersetorial) e que induzam o compartilhamento de objetivos” (BARBOSA, 2009).
Ainda segundo a autora:
Não se verifica ainda, no Programa, a vigência de mecanismos integradores construídos de forma a garantir a viabilidade técnica da intersetorialidade. Nesse sentido, está aí o ponto em que o Programa precisa se aperfeiçoar caso pretenda ser um Programa intersetorial de fato. Deve-se, assim, se esforçar para que sejam criados pontos concretos de conexão entre os setores de forma a garantir a construção de ações mais integrais. A esse respeito percebe-se que fatores que contribuiriam para uma gestão mais integrada do Programa seria o estabelecimento de um marco de atuação comum, bem como a definição conjunta de objetivos e metas de resultados e sua materialização em ferramentas de planejamento. (BARBOSA, 2009, p.141)
Os mecanismos integradores, os pontos concretos de conexão e o marco
de atuação comum de que fala a autora são aspectos ligados diretamente à noção
geral de governança, entendida como “a capacidade financeira e administrativa, em
sentido amplo, de um governo implementar políticas” (BRESSER-PEREIRA, 2002).
São justamente esses arranjos de governança que cumprem o papel de assegurar a
intersetorialidade e, com ela, a viabilidade de políticas públicas que respondam à
complexidade considerada no conceito de pobreza.
Para Inojosa (2001), a adoção de uma perspectiva intersetorial na gestão
de políticas sociais reclama necessariamente um conjunto de alterações no modo
como o Estado atua e se organiza (INOJOSA, 2001). Essas mudanças conjugam
aspectos políticos e organizativos. Um projeto que busque a inclusão da sociedade
no processo de planejamento e que reformule a política social de modo a perseguir
o desenvolvimento e a justiça sociais é eminentemente político. Ao mesmo tempo, a
busca de um novo modelo organizacional que viabilize e subsidie uma perspectiva
intersetorial de gestão, com a dinâmica e a articulação necessárias ao seu
funcionamento, consiste em uma preocupação de ordem prática, instrumental. Ao
delinear as dimensões envolvidas no conceito de intersetorialidade, Grau (2005)
identifica duas premissas que o sustentam:
Uma premissa é que a integração entre os setores possibilita a busca de soluções integrais. Essa suposição atribui um fundamento expressamente político à intersetorialidade e se traduz na suposição de que todas as políticas públicas que persigam estratégias de desenvolvimento globais, tais como a modificação da qualidade de vida da população, devem ser planejadas e implementadas intersetorialmente. 2. Outra premissa que sustenta uma parte do discurso sobre intersetorialidade é que a integração entre os setores permite que as diferenças entre eles podem ser usadas
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produtivamente para solucionar problemas sociais. Esse pressuposto remete a um fundamento técnico da intersetorialidade consistente com a idéia de que cria melhores soluções (que a setorialidade) porque permite o compartilhamento dos recursos específicos de cada setor.” (GRAU, 2005, p.1, grifo do autor, tradução nossa).
O modo como a perspectiva da intersetorialidade mobiliza mudanças de
ordem técnica e política no que se refere à atuação e à organização do Estado
reflete uma dupla constituição dessa diretriz da gestão social. Assim sendo, a
atenção para com a gestão intersetorial de políticas sociais vai naturalmente se
confundir com a atenção emprestada ao duplo objetivo de uma estrutura
organizacional mais dinâmica e permeável e de um projeto político dirigido para o
desenvolvimento social (SOARES, 2011). A esses objetivos correspondem algumas
necessidades de mudança que Barbosa (2009) havia apontado no Programa
Travessia e que poderiam aprofundar sua experiência intersetorial.
No que tange ao aspecto técnico, de se produzirem soluções para
problemas práticos, a autora afirma que o Plano de Trabalho construído
setorialmente deveria ser feito em conjunto, pelos vários setores participantes. Outra
alteração seria estabelecer mais fluxos e rotinas comuns aos setores e desenhar e
implementar instrumentos e ferramentas de gestão compartilhada. Nesse sentido,
seria também de fundamental importância utilizar o orçamento como um instrumento
potencializador da intersetorialidade. Mais um fator que contribuiria para viabilizar
tecnicamente a intersetorialidade seria adaptar o sistema criado para o
acompanhamento e monitoramento do Programa de forma que ele garantisse uma
maior circulação das informações entre os parceiros, tornando-se, assim, um
instrumento propiciador de uma maior integração. Já no que se refere à
preocupação política de aprofundar a intersetorialidade como estratégia para
políticas públicas integrais, que objetivem a melhora da qualidade de vida da
população, Barbosa (2009) afirma que faltaria ao Programa um diagnóstico com
abordagem intersetorial.
Em 2011, o início de um novo Governo representou alterações
significativas para o programa Travessia. Sandim (2012) relaciona essas mudanças
às diretrizes recém-criadas do paradigma de gestão denominado “Estado em Rede”,
e as divide nas seguintes categorias: 1) normativa; 2) da estrutura de gestão;
3) da estrutura institucional; 4) metodológica; e 5) dos recursos orçamentários.
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Em rigor, no entanto, essa categorização não é estanque, marca apenas os
diferentes planos de governança em que o Programa se organiza. Assim é que, por
exemplo, uma novidade normativa representa também uma institucional, e poderá
prever uma mudança de gestão correspondente.
Das alterações normativas, a autora identifica a publicação, em março de
2011, do Decreto 45.570, que trouxe ao Travessia as seguintes alterações:
1) A constituição de uma etapa diagnóstica, denominada Porta a Porta, para subsidiar as ações a serem desenvolvidas pelas secretarias envolvidas no Programa.
2) A determinação de uma instância governamental – a Assessoria de Articulação, Parceria e Participação Social (AAPPS) – como responsável por acompanhar as ações dos órgãos e entidades estaduais no âmbito do Programa com vistas a assegurar a gestão transversal, a partir dos princípios de colaboração institucional e de intersetorialidade.
3) A especificação de diretrizes a seguir desde o diagnóstico até a avaliação das ações realizadas.
4) A ampliação na composição do Comitê de Acompanhamento do Programa Travessia, incluindo novas secretarias, bem como a diminuição da periodicidade das reuniões do Comitê Travessia para intervalos mensais. O Decreto também estabeleceu claramente que as pastas só poderiam ser representadas nessa instância por meio do Secretário de Estado, do Secretário Adjunto ou de um dos Subsecretários. (SANDIM, 2012, p.131)
Outra alteração normativa apontada é o Decreto 45.694, de setembro de
2011, em que se estabelece a vinculação entre o Plano Brasil Sem Miséria, do
Governo Federal, e o Programa Travessia, fazendo deste o seu interlocutor
exclusivo no Estado. Entre as atribuições do Comitê de Acompanhamento do
Programa foi incluída a articulação com os demais órgãos estaduais e federais para
o acompanhamento e execução de ações comuns ou tocantes ao Travessia. Em
síntese, as alterações normativas representam já algumas mudanças no campo
amplo das instituições e abrem caminho para aquelas relacionadas à gestão, além
de anunciarem a adoção metodológica de uma etapa de diagnóstico.
No que tange ao campo abrangente das mudanças institucionais, além
daquelas normativas, talvez a principal delas tenha sido devida à instituição do
Plano Plurianual de Ação Governamental (PPAG) 2012-2015, que prevê uma nova
estrutura para a carteira de projetos prioritários de governo e, para Sandim (2012),
teve impacto direto na estrutura de gestão do Travessia, uma vez que este passou a
ser um dos Programas Estruturadores da Rede de Desenvolvimento Social e
Proteção. Como reporta a autora,
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Até então, não havia outros Projetos Estruturadores vinculados a outras secretarias. Cada secretaria elaborava seu planejamento e considerava prioritários os municípios que recebiam o Programa Travessia naquele ano. Assim, cada uma delas destinava uma parcela dos próprios recursos para a execução de ações nos municípios do Programa. (SANDIM, 2012, p.134)
Desde então, o Programa passou a contar com seis projetos estratégicos
a ele vinculados. Segundo a autora, "a instituição de projetos estratégicos ligados ao
Programa Travessia em outras secretarias é a mudança mais substancial ocorrida
nessa dimensão [institucional]” (SANDIM, 2012, p.134).
Com relação aos recursos financeiros, uma mudança verificada é que
outras secretarias para além da Sedese passam a ter recursos dedicados
especificamente ao Programa Travessia. Com a existência, em cada secretaria, de
recursos vinculados unicamente aos municípios contemplados com o Programa,
diminui-se a arbitrariedade de aplicação desses recursos no âmbito interno a essas
secretarias e garante-se a prioridade do Programa na agenda central do Governo.
Nesse aspecto, Sandim (2012) aponta para a possibilidade de “engessamento” das
ações desenvolvidas, “uma vez que a criação do projeto supõe a construção de um
escopo de projeto no qual as atividades são discriminadas detalhadamente”
(SANDIM, 2012).
Por último, e como a mudança conceitual mais significativa pela qual
passou o Programa Travessia, tem-se a adoção do IPM para o diagnóstico das
privações sociais nos novos municípios participantes, o que Sandim (2012)
categoriza como alteração metodológica.
Todas essas mudanças podem ser consideradas como a tentativa de
aprimorar as condições de governança que influem e ajudam a determinar o
sucesso de implementação do programa Travessia enquanto política pública de
inclusão social. No caso desse Programa, os arranjos cumprem um papel muito
importante no sentido de assegurar a intersetorialidade e, assim, possibilitar a
gestão de políticas que respondam à complexidade considerada no conceito de
pobreza. Mas se os arranjos asseguram a intersetorialidade, também há de haver
algo que os assegure.
Martins (1994), citado por Inojosa (1998), afirma não ser possível que um
novo modelo de gestão ou de organização governamental seja implementado com
sucesso sem o apoio de uma rede de órgãos especialmente criados para fazê-lo.
19
Essa rede de órgãos especiais deve garantir os recursos e gerir os instrumentos que
irão viabilizar a materialização da nova estrutura e das novas práticas de governo.
Nesse sentido, foi criada, em 2011, a Assessoria de Articulação, Parceria e
Participação Social (AAPPS), estrutura diretamente vinculada à Governadoria de
Estado. No que se refere ao Programa Travessia e aos diversos arranjos de
governança envolvidos em seu funcionamento, a AAPPS é o órgão ou estrutura
especial dedicada a garantir os recursos e gerir os instrumentos que irão viabilizar a
materialização da nova estrutura e das novas práticas de gestão. Outra estrutura
importante no cotidiano dos projetos do Travessia é o Núcleo de Inovação Social da
Secretaria de Estado de Planejamento e Gestão – NCIS/Seplag. A partir de 2012, O
Núcleo passou a desempenhar a função de monitorar a implementação e a
execução dos projetos do Travessia, o que representou um ganho no
acompanhamento das gerências e na assistência à participação dos governos
municipais.
Desde o primeiro semestre de 2012, a AAPPS e o NCIS passaram a
acompanhar conjuntamente os projetos que visam ao enfrentamento das privações
sociais identificadas pelo Projeto Porta a Porta, articulando suas equipes e as de
outros setores de governo num esforço de desenvolver metodologias e fomentar
práticas que incentivassem mais integração no âmbito do Programa. Nesse sentido,
nota-se que a diretriz da intersetorialidade tem colaborado por via daquele
fundamento técnico de que fala Grau (2005): de que a integração entre os setores
permite que as diferenças entre eles sejam usadas produtivamente para solucionar
problemas sociais. Conforme será dito mais adiante, por meio da instituição de
grupos de trabalho temáticos, em que participam projetos ou entidades
governamentais, já se pode relatar avanços pelos quais a dinâmica intersetorial foi
responsável. Mas e quanto ao fundamento expressamente político (GRAU, 2005)
que justifica a intersetorialidade, de que é a integração entre os setores que
possibilita a busca de soluções integrais e que, portanto, é capaz de modificar a
qualidade de vida da população?
A questão que se coloca a seguir diz respeito aos limites e possibilidades
da contribuição das práticas intersetoriais de gestão na composição de um projeto
político que tenha a inclusão social por objetivo. Dito de outro modo, o que se
pretende questionar é em que medida as metodologias e arranjos de governança
20
que realizem práticas intersetoriais de gestão são suficientes para sustentar um
projeto político dirigido para o desenvolvimento social. A partir das possibilidades
que a perspectiva intersetorial oferece para a construção de políticas sociais que
atendam à população de forma integrada, torna-se necessário estabelecer os
critérios para a combinação dessas políticas. Nesse sentido, Magalhães (2004)
procura analisar as possíveis estratégias para as ações intersetoriais, já que, a
princípio, haveria inúmeras possibilidades de combinação no campo das políticas
sociais. O grande contingente de cidadãos que poderiam ser alvos das políticas e a
escassez dos recursos necessários para implementá-las configuram um quadro de
escolhas trágicas (SANTOS, 1989, apud MAGALHÃES, 2004). Os critérios de
atendimento das políticas públicas podem ser embasados tecnicamente, mas sua
escolha é sempre de natureza política. Para Magalhães (2004), uma dessas
escolhas é aquela entre políticas que atendam muitas pessoas em poucas de suas
dimensões de vulnerabilidade e outras que atendam poucas pessoas em muitas
dimensões. E nesse ponto algumas questões devem ser ampla e cuidadosamente
discutidas, preferencialmente com a inclusão da sociedade civil no debate. Ao
mesmo tempo em que grupos populacionais em situação de miséria devem ser
priorizados em detrimento de outros menos pobres, mínimos sociais devem ser
garantidos a todos. Essa análise evidencia que a intersetorialidade não é uma
diretriz de gestão independente, é possível que ela se oriente de modos particulares
no contexto de diferentes projetos políticos. De todo modo, é desejável que ela o
faça sempre conforme as demandas legitimamente provindas da população. São
alguns pontos tocantes aos desafios que enfrenta o Travessia no momento em que
se acha: os critérios de atendimento do Programa precisam ser melhor discutidos
com a sociedade civil, e os espaços onde isso poderia se dar já se encontram
constituídos: são, por exemplo, os comitês e fóruns regionais criados pelo Governo
no âmbito da proposta do Estado em Rede.
A abordagem de Magalhães (2004) considera as estratégias de
intersetorialidade atreladas ao entendimento da dinâmica da exclusão social, tendo a
inclusão como foco e objetivo. Devido ao caráter multifacetado e multicausado da
exclusão, deve haver uma preocupação no sentido de conhecer a sua configuração
nas diferentes circunstâncias em que ela acontece, uma vez que as diversas facetas
não se constituem necessariamente como causas do fenômeno. Nesse sentido, a
21
eficácia das intervenções não é determinada pelo número de facetas ou dimensões
envolvidas nas políticas, mas antes pela qualidade e pela dinâmica da intervenção.
Importa também que mesmo que se identifiquem as causas da exclusão, muitas
vezes não será possível reverter o processo de exclusão, sendo necessário o
desenvolvimento de novos mecanismos e a geração de novos espaços de inclusão.
Nesse sentido, o foco das estratégias intersetoriais não se dirige apenas para a
exclusão em si mesma, mas também para a inclusão e suas condições de
ocorrência, o que torna necessário considerar não apenas as fragilidades
situacionais, mas sobretudo as potencialidades de intervenção existentes,
considerados os grupos populacionais envolvidos (MAGALHÃES, 2004).
Para Inojosa (2001), um modelo intersetorial de gestão deveria se pautar
em dois pontos-chaves: a preocupação com os resultados e impactos das políticas,
programas e projetos; e a focalização, com base regional, em segmentos da
população. O primeiro ponto-chave se justifica pela necessidade de garantir que os
serviços e programas públicos estejam contribuindo efetivamente para a superação
da exclusão e para a promoção do desenvolvimento social. Também no Travessia
essa necessidade está posta: uma avaliação do desempenho dos diferentes
projetos, juntamente com um novo diagnóstico nos municípios atendidos pelo
Programa, poderão dizer de sua efetividade na redução da pobreza
multidimensional. Por sua vez, o segundo ponto-chave nortearia a perspectiva
intersetorial colocando seu foco em grupos populacionais de características
específicas e especialmente distribuídos no território.
Para melhor intervir na sociedade, o Estado deve considerar que ela é
formada por conjuntos diversos de pessoas e grupos sociais distribuídos de alguma
forma no território, ocasionando situações humanas que precisam ser consideradas
de acordo com suas peculiaridades espaciais. A idéia de focalização regional sugere
a necessidade de uma atenção do Estado aos aspectos específicos que marcam as
populações, bem como a necessidade de saber, por elas, o que consideram mais
especial. A esse respeito, o Travessia pretende, ainda na próxima etapa de
diagnósticos a ser realizada em 2013, inserir no questionário do Porta a Porta uma
pergunta que pretende identificar o que mais, além das dimensões de saúde,
educação e padrão de vida, poderia constituir uma dimensão de pobreza, na opinião
do público diagnosticado.
22
Como meio de fortalecer ainda mais a participação social na formulação e
implementação das políticas, seria um modelo viável que essas discussões fossem
estendidas aos conselhos municipais gestores de políticas públicas, proporcionando
ao Programa uma significativa permeabilidade à participação de seu público
potencial. Em nível local, há, além disso, maiores possibilidades de se
desenvolverem respostas intersetoriais mais ajustadas aos problemas enfrentados
pela população. Essa consideração chama a atenção também para a necessidade
de se estabelecer, no Travessia, critérios específicos para o direcionamento de cada
projeto ou ação para municípios e localidades específicas, conforme o diagnóstico
de suas privações. Pode-se dizer que parte desse trabalho complexo já foi iniciado
com a organização dos grupos de trabalho temáticos, que apresentam o potencial
de coordenar e deliberar sobre as intervenções de seus participantes de forma a
melhor solucionar as privações sociais diagnosticadas nos municípios e localidades.
Os grupos de trabalho temáticos do Programa Travessia são arranjos de
governança que buscam alinhar projetos ou entidades governamentais em torno de
objetivos comuns de redução de privações sociais determinadas. A primeira
experiência surgiu com a formação, em 2012, de um dos três grupos de trabalho
atualmente existentes: o Grupo de Trabalho de Elevação da Escolaridade.
Coordenado pela AAPPS, pelo NCIS e pela Sedese, esse grupo reuniu as gerências
de projetos vinculados ao Travessia e de outros Programas, os quais se aproximam
por seu objetivo de promoção e elevação da escolaridade de jovens e adultos nos
municípios em que atuam. Alguns desses projetos ou Programas têm um recorte
específico, no sentido de que se insere numa etapa determinada do percurso da
educação básica. Esse percurso se inicia com a alfabetização, prossegue com os
anos iniciais e finais do ensino fundamental e termina com o ensino médio.
23
Figura 3 – Ciclo da Elevação de Escolaridade.
Fonte: Elaboração Própria
Ainda que não apresente informações da capacidade de execução de
cada projeto em face das privações diagnosticadas e da ocorrência dos projetos
nos municípios, a figura estabelece uma correspondência entre as etapas da
trajetória educacional básica (Alfabetização, Ensino Fundamental I, Ensino
Fundamental II e Ensino Médio) e os projetos existentes que se destinam a cada
uma, e mostra como para cada uma dessas etapas passou a corresponder pelo
menos um dos projetos do Governo do Estado. Participam do Grupo, além desses,
mais três projetos que não ofertam propriamente atividades educacionais, mas
fomentam a elevação da escolaridade pela oferta de incentivos, identificação de
público-alvo, mobilização ou encaminhamentos: Banco Travessia, Professor da
Família e Com Licença, Vou à Luta.
Com base no objetivo comum que reúne os projetos participantes e na
particularidade de cada um deles, foi proposta nesse grupo de trabalho uma
metodologia específica de articulação, que abrangeu os seguintes pontos: a)
Promover o alinhamento estratégico das ações desenvolvidas pelos projetos; b)
Incentivar a consecução das metas de cada projeto e a corresponsabilização pela
24
meta comum de elevação da escolaridade; c) Propor um fluxo de troca de
informações, listas de beneficiários e compartilhamento de cronograma de ações
entre os gerentes estaduais e os interlocutores locais (municipais ou regionais); d)
Promover a sinergia dos ativos oferecidos pelos projetos de modo a potencializar os
seus efeitos nas famílias beneficiadas. Tais procedimentos buscavam gerar e
aprofundar o conhecimento dos projetos, construir fluxos de informações,
compatibilizar e compartilhar a relação de beneficiários e de público-alvo, além de
produzir e distribuir material informativo sobre os projetos. Com base nesse trabalho,
foi realizada uma oficina para construção de um planejamento integrado das ações
de 2013, contemplando propostas de articulações possíveis nos níveis estadual
(gerências dos projetos e do programa Travessia) e local (interlocutores municipais
ou regionais e agentes executores).
Os trabalhos desenvolvidos em 2012 pelo Grupo de Trabalho de
Elevação da Escolaridade representaram um empreendimento inédito no esforço de
articulação intersetorial no âmbito do Programa Travessia. Percebeu-se uma
melhora na coordenação entre os projetos e possibilitou-se a corresponsabilização
de seu objetivo comum de elevação da escolaridade. O Grupo de Trabalho teve
também o mérito de assegurar que, em 2013, houvesse uma maior correspondência
entre as ações desenvolvidas pelos projetos de promoção de escolaridade nos
municípios do Programa Travessia e as privações educacionais identificadas no
diagnóstico do Porta a Porta.
A experiência do Grupo de Trabalho de Elevação da Escolaridade serviu
de modelo para a criação de outros dois grupos de trabalho no âmbito do Programa
Travessia: os Grupos de Trabalho de Água e de Geração de Renda, que
recentemente começaram suas atividades. Com os novos arranjos que são os
grupos de trabalho, a programática de gestão do Travessia tem procurado instituir
alguns daqueles mecanismos integradores e pontos concretos de conexão de que
fala Barbosa (2009) para a construção de uma gestão mais integrada. Nesse
sentido, a institucionalização dessas estruturas representa um passo dado na
direção do objetivo maior de fazer as políticas públicas encontrarem seus
beneficiários com uma coesão maior, tornando-as para eles soluções mais integrais
e, assim, mais efetivas na superação da pobreza. No entanto, os trabalhos apenas
começaram e é sabido que há muito o que se fazer nesse sentido.
25
Paralelamente às discussões dos grupos de trabalho, ocorreu no segundo
semestre de 2012 o alinhamento estratégico do Programa Travessia, em que se
realizou:
a) A construção de uma matriz de correspondência entre as privações
sociais identificadas pelo projeto Porta a Porta e as ações
desenvolvidas pelos demais projetos que integram o Travessia;
b) Um alinhamento conceitual dos projetos e das equipes;
c) A proposição de ações mais correspondentes aos objetivos do
Programa, visando ao enfrentamento das privações sociais
identificadas pelo Porta a Porta;
d) O planejamento integrado de 2013 referente aos projetos Travessia
Social, Travessia Saúde, Travessia Renda, Travessia Educação,
Banco Travessia e Com Licença, Vou à Luta, sob a coordenação da
Seplag, da Sedese e da AAPPS;
e) Início da construção do plano de comunicação do Programa Travessia,
que foi finalizado em 2013.
Tais ações no âmbito do planejamento contribuem de alguma forma para
o “aperfeiçoamento de mecanismos que permitam a criação de visões de sentido
comum [...] e que induzam o compartilhamento de objetivos” (BARBOSA, 2009).
Juntamente com a instituição dos grupos de trabalho, as práticas de alinhamento
conceitual e planejamento integrado existentes no Programa consolidam novos
fluxos, rotinas intersetoriais e a utilização de instrumentos e ferramentas de gestão
compartilhada. Diante desse quadro, restam ainda como desafios ao Programa: a) a
conjugação de uma dinâmica ainda mais intersetorial com a construção dos Planos
de Trabalho; b) potencialização da intersetorialidade por meio do orçamento
dedicado ao Programa; c) avaliação das políticas implementadas, por meio de novo
diagnóstico, e eventual revisão do desenho dos projetos; d) discussão com a
sociedade civil dos critérios de focalização e a respeito das dimensões a serem
consideradas para uma intervenção ainda mais legítima no que diz respeito à
pobreza. Espera-se que, respondendo a esses desafios, o Programa Travessia
possa dar soluções cada vez mais efetivas ao fenômeno complexo e dinâmico da
pobreza.
26
5 CONCLUSÃO: POBREZA COMPLEXA, POLÍTICAS PÚBLICAS INTEGRAIS
Em um contexto em que as relações sociais muitas vezes reproduzem
uma lógica mercantil de desmanche, depreciação e instabilidade, os indivíduos se
acham em uma dinâmica complexa, em um tecido social de rupturas que de muitas
formas os fazem vulneráveis à exclusão. O Estado tem de se adaptar a essa
complexidade, como meio de prover a sociedade com sistemas de proteção social e
políticas que promovam o bem estar da população. Para tanto, o máximo que o
Estado faça de forma fragmentada é pouco, porque a exclusão tem causas diversas
e muitas dimensões. É assim que a gestão social, e especialmente as políticas de
inclusão social, passam a exigir uma metodologia integrada de ação.
A intersetorialidade se coloca como a alternativa no campo da gestão
para a consideração dos problemas sociais em uma perspectiva ampla, mais
próxima de como eles se configuram na realidade. Por meio dessa metodologia,
busca-se ajustar as políticas públicas à natureza estrutural dos problemas sociais, e
estabelece-se a diretriz para que as populações possam ser atendidas integralmente
conforme sua necessidade.
O perfil intersetorial do Programa Travessia busca responder à natureza
complexa e multidimensional da pobreza. A articulação dos projetos existentes é um
desafio proporcional ao de intervir simultaneamente nas diferentes privações sociais
vivenciadas pelas pessoas. Nesse sentido, a introdução da etapa de diagnóstico
com a metodologia do IPM no Travessia representou um salto substancial no
potencial de o Programa localizar seu público, direcionar suas ações e mensurar os
resultados alcançados. A partir daí, empreende-se um esforço na busca de uma
engenharia institucional que integre as diferentes pastas do Governo e que faça tais
políticas chegarem juntas ao encontro dos beneficiários.
Para melhor conformar a articulação dos diferentes setores na formulação
e na implementação das políticas públicas sociais, é necessário que haja um
conjunto de alterações no modo como o Governo as gere. Essas mudanças
precisam ser estimuladas por arranjos de governança apropriados, capazes de
sustentar o desenvolvimento contínuo e o aperfeiçoamento das práticas
intersetoriais. O Programa Travessia passou por mudanças significativas, e que
aprimoraram em muitos aspectos o seu desenho. Todas essas mudanças podem
27
ser consideradas como a tentativa de aprimorar as condições de governança que
influem e ajudam a determinar o sucesso de implementação do programa Travessia
enquanto política pública de inclusão social. No caso desse Programa, os arranjos
cumprem um papel muito importante no sentido de assegurar a intersetorialidade e,
assim, possibilitar a gestão de políticas que respondam à complexidade considerada
no conceito de pobreza.
Finalmente, entende-se que, a partir das possibilidades que a perspectiva
intersetorial oferece para a construção de políticas sociais que atendam à população
de forma integrada, torna-se necessário estabelecer os critérios para a combinação
dessas políticas. No caso do programa Travessia, a discussão desses critérios com
a sociedade civil e em uma abordagem regional pode trazer o potencial de
aprofundar a experiência intersetorial do Programa para, assim, contribuir no desafio
de integrar as políticas públicas na mesma coesão com que se apresentam as
privações vivenciadas pelas famílias.
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AUTORIA
Igor de Souza Soares – Assessor de Articulação, Parceria e Participação Social na Governadoria do Estado de Minas Gerais
Endereço eletrônico: igor.soares@governo.mg.gov.br Ronan Ramos de Oliveira Júnior – Assessor de Articulação, Parceria e Participação Social na Governadoria do Estado de Minas Gerais
Endereço eletrônico: ronan.junior@governo.mg.gov.br Ronaldo Araújo Pedron – Assessor-chefe de Articulação, Parceria e Participação Social na Governadoria do Estado de Minas Gerais
Endereço eletrônico: ronaldo.pedron@governo.mg.gov.br Antônio Maria Claret de Souza Filho – Assessor de Articulação, Parceria e Participação Social na Governadoria do Estado de Minas Gerais
Endereço eletrônico: antonio.claret@governo.mg.gov.br