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ACADEMIA MILITAR
O Combate Corpo a Corpo na Academia Militar: Necessidade de uma
formação sustentada
Autor: Aspirante de Infantaria Marcelo Morais Funico Pereira Simões
Orientador: Tenente-coronel de Infantaria Paulo Alexandre Moreira Machado
Coorientador: Major de Infantaria Fernando Paiva Moura
Relatório Científico Final do Trabalho de Investigação Aplicada
Lisboa, maio de 2017
i
ACADEMIA MILITAR
O Combate Corpo a Corpo na Academia Militar: Necessidade de uma
formação sustentada
Autor: Aspirante de Infantaria Marcelo Morais Funico Pereira Simões
Orientador: Tenente-coronel de Infantaria Paulo Alexandre Moreira Machado
Coorientador: Major de Infantaria Fernando Paiva Moura
Relatório Científico Final do Trabalho de Investigação Aplicada
Lisboa, maio de 2017
ii
EPÍGRAFE
“…it’s doctrine on day one, and every day after it becomes dogma.”
John Boyd
iii
DEDICATÓRIA
A todos os militares, praticantes de
artes marciais, desportos de combate e defesa pessoal, que queiram aprender e expandir o
seu conhecimento.
iv
AGRADECIMENTOS
Após o término deste trabalho de investigação gostaria de agradecer a todos aqueles que
contribuíram para a realização deste.
Ao meu orientador e coorientador, o Tenente-Coronel de Infantaria Paulo Machado e
ao Major de Infantaria OE Fernando Moura, pelo seu apoio e disponibilidade.
Ao meu Mestre e amigo João Louzeiro e ao meu amigo e Treinador Pedro Silva por
todo o apoio que me deram ao longo dos anos e pela sua disponibilidade para responderem
a questões no decorrer deste trabalho.
À minha amiga Elisa de la Cruz por também se ter disponibilizado a responder e a ajudar
na elaboração de um possível método de ensino e planeamento de aulas de Krav Maga e
Combate Corpo a Corpo.
À minha namorada por todo o apoio que deu durante a realização deste trabalho.
A todos aqueles que me são mais próximos, família e amigos por todo o apoio que me
deram.
v
RESUMO
O presente Trabalho procura dar resposta à questão “Que alterações poderão ser
implementadas no atual modelo de ensino de Combate Corpo a Corpo ministrado na
Academia Militar para proporcionar uma formação sustentada e contínua para os futuros
Oficiais dos Quadros Permanentes do Exército e da GNR?”. Tem como objetivo esclarecer
se o atual modelo de ensino de Combate Corpo a Corpo na Academia Militar se encontra
adequado a um futuro Oficial dos Quadros Permanentes do Exército e da Guarda Nacional
Republicana (GNR), tanto no desempenho das suas funções como na sua vida quotidiana, se
este modelo carece ou não de uma revisão e que alterações poderão ser realizadas e como
realizá-las.
A metodologia utilizada nesta investigação científica teve por base o modelo de
raciocino hipotético-dedutivo, numa primeira parte através do enquadramento teórico,
análise documental e revisão da bibliografia, tendo por base literatura específica da área e
pesquisa de campo, e numa segunda parte através de duas entrevistas realizadas de modo a
responder a questões mais sensíveis e específicas.
Com este trabalho conclui-se que o atual modelo de ensino de Desportos de Combate e
Combate Corpo a Corpo na Academia Militar teria de sofrer alterações nomeadamente nas
técnicas a ensinar, deveria ser estruturado ao longo dos anos com uma continuidade temporal
e evolutiva, deveria ser diferenciado para a GNR e para o Exército, e deveriam ser
introduzidas mais horas de treino semanais e durante mais anos, apostando apenas numa
única modalidade de Combate Corpo a Corpo no decorrer dos cursos na Academia Militar.
Palavras-Chave: Combate Corpo a Corpo, Academia Militar, Defesa Pessoal,
Exército, Formação Sustentada.
vi
ABSTRACT
The present paper aims to give an answer to the question "What changes should be
implemented in the current model of Hand to Hand Combat taught at the Portuguese Military
Academy to provide sustained and ongoing training for the future Officers of the Army and
GNR?" It aims to clarify if the current model of Hand to Hand Combat at the Portuguese
Military Academy is suitable for a future Officer of the Army and GNR both in the
performance of their duties and in their daily lives, whether or not this model needs a review,
what changes should be made and how to accomplish them.
The methodology used in this scientific research was based on the hypothetical-
deductive reasoning model, first part through the theoretical framework, documentary
analysis and bibliography review, based on literature specific to the area of research and
field, and in a second part through two interviews made to answer more sensitive and specific
questions.
With this work it is concluded that the current model of Combat Sports and Hand to
Hand Combat in the Portuguese Military Academy would have to undergo some changes, in
particular in choosing which techniques to teach, should be more structured over the years
with a temporal and evolutionary continuity, should be differentiated for the GNR and for
the Army, and should be introduced more hours of training weekly and during more years,
betting only on a single modality of Hand to Hand Combat during the courses at the Military
Academy.
Keywords: Hand to Hand Combat, Military Academy, Self Defense, Army,
Sustained Training.
vii
ÍNDICE GERAL
ROSTO…………………………………………………………………………………………………………i
EPÍGRAFE ................................................................................................................................................ ii
DEDICATÓRIA ....................................................................................................................................... iii
AGRADECIMENTOS ............................................................................................................................. iv
RESUMO ................................................................................................................................................... v
ABSTRACT .............................................................................................................................................. vi
ÍNDICE GERAL ..................................................................................................................................... vii
LISTA DE ANEXOS E APÊNDICES ...................................................................................................... ix
LISTA DE ABREVIATURAS, SIGLAS E ACRÓNIMOS ...................................................................... x
INTRODUÇÃO ......................................................................................................................................... 1
CAPÍTULO 1. DEFESA PESSOAL E COMBATE CORPO A CORPO ................................................. 5
1.1. Definição de defesa pessoal ................................................................................................................ 5
1.2. Definição de Combate Corpo a Corpo .............................................................................................. 6
1.3. Combate Corpo a Corpo vs Defesa pessoal ....................................................................................... 7
1.4. Características a considerar no ensino de CCC aos militares ........................................................ 11
CAPÍTULO 2. DISCIPLINAS E MODALIDADES ............................................................................... 16
2.1. Judo ................................................................................................................................................. 16
2.2. Boxe ................................................................................................................................................. 17
2.3. Combate Corpo a Corpo ................................................................................................................. 17
2.4. Jiu-Jitsu Brasileiro/MMA ............................................................................................................... 21
2.5. FMA ................................................................................................................................................. 24
2.6. Krav Maga ....................................................................................................................................... 29
2.7. Síntese .............................................................................................................................................. 34
CAPÍTULO 3. METODOLOGIA DE ENSINO ..................................................................................... 36
3.1. Estrutura e planeamento das aulas ................................................................................................. 37
3.2. Fase de um processo de aprendizagem............................................................................................ 43
3.3. A importância da automatização e do OODA loop......................................................................... 45
3.4. Métodos a utilizar pelo instrutor para promover a automatização ................................................ 47
3.5. Tempo necessário para atingir a proficiência ................................................................................. 49
3.6. Como planear um possível modelo para o ensino de CCC ao longo dos anos ................................ 54
CAPÍTULO 4. METODOLOGIA ........................................................................................................... 56
CAPÍTULO 5. MÉTODOS E MATERIAIS ........................................................................................... 58
viii
CONCLUSÕES ....................................................................................................................................... 59
RECOMENDAÇÕES .............................................................................................................................. 62
BIBLIOGRAFIA ..................................................................................................................................... 63
ix
LISTA DE ANEXOS E APÊNDICES
Anexo A - Escalar da força ........................................................................................................................ I
Anexo B - Estrutura das aulas da FPKM ................................................................................................. II
Anexo C - OODA Loop ........................................................................................................................... IV
Anexo D - Número médio de sessões para se atingir a proficiência ......................................................... V
Apêndice A - Entrevista a Pedro Silva ..................................................................................................... V
Apêndice B - Entrevista a João Louzeiro ............................................................................................. VIII
x
LISTA DE ABREVIATURAS, SIGLAS E ACRÓNIMOS
AM Academia Militar
CAU Combate em Áreas Urbanas
CCC Combate Corpo a Corpo
CQB Close Quarters Combat
DC/CCC Desportos de Combate e de Combate Corpo a Corpo
ENP Estágio de Natureza Profissional
ESSE Escola de Sargentos do Exército
FMA-P Filipino Marcial Arts Portugal
GNR Guarda Nacional Republicana
IDF Israel Defense Forces
MACP Modern Army Combatives Program
NEP Norma de Execução Permanente
ROE Rules of Engagement
ROM Range of Motion
SOCP Special Operaticon Combatives Program
TIA Trabalho de Investigação Aplicada
TPOI Tirocínio para Oficial de Infantaria
UFC Ultimate Fighting Championship
1
INTRODUÇÃO
O presente Trabalho de Investigação Aplicada (TIA) está inserido no Estágio de
Natureza Profissional (ENP), componente do Tirocínio para Oficial de Infantaria (TPOI), e
pretende investigar “a necessidade de fornecer aos alunos da Academia Militar (AM) uma
formação sustentada e contínua de Combate Corpo a Corpo (CCC), identificando as suas
vantagens e importância”. Está estruturado de acordo com a Norma de Execução Permanente
522/1ª de 20 de janeiro de 2016 e está inserido na área científica da Motricidade Humana
(H4 – MH).
Esta investigação visa não só dar a conhecer aos leitores a importância e as vantagens
do Combate Corpo a Corpo na Academia Militar (AM) e a necessidade de fornecer aos
alunos uma formação sustentada e contínua, como também analisar a rentabilidade do atual
modelo de ensino de Desportos de Combate e Combate Corpo a Corpo (CCC) nas diversas
especialidades dos cursos para Oficiais dos Quadros Permanentes do Exército e da Guarda
Nacional Republicana (GNR) ministrados na Academia Militar, analisando e justificando
cientificamente o modelo atual, de forma a criar condições para averiguar a necessidade de
alteração deste ou criação de um novo modelo, procurando a proficiência e eficácia na
utilização do gesto técnico por parte dos praticantes.
O trabalho pretende ainda proporcionar ao autor uma oportunidade de expandir o seu
conhecimento e de realizar um estudo que contribua para a melhoria e desenvolvimento tanto
do Exército como da Guarda Nacional Republicana, investigando se os futuros Oficiais dos
Quadros Permanentes do Exército e da Guarda Nacional Republicana (GNR) ficam
capacitados para “aplicar competências e desenvolver a capacidade de compreensão que
permita e constitua a base de desenvolvimento e/ou de aplicações originais, em ambiente de
investigação aplicada, nos domínios da segurança e defesa e, em particular, na sua área de
especialização” 1.
Com isto, o presente Trabalho procura aprofundar e desenvolver o tema para esclarecer
o leitor sobre o atual estado do ensino dos Desportos de Combate e de Combate Corpo a
Corpo (DC/CCC) na Academia Militar, analisando e referenciando eventuais propostas de
melhoria no atual modelo de ensino, quais as disciplinas de ensino escolhidas e averiguar a
necessidade de introdução de um novo modelo de formação sustentado e contínuo que opte
1 Regulamento do Tirocínio para Oficial do Quadro Permanente do Exército e da Guarda Nacional
Republicana, anexo à Ordem de Serviço nº145 de 29 de julho de 2015.
2
pelo ensino de técnicas apoiadas num planeamento centrado numa escolha específica e
criteriosa, direcionada para as necessidades dos militares nos diversos possíveis cenários,
treinando/praticando até alcançar a proficiência e automatização do gesto técnico, tornando
eficaz e efetiva a aprendizagem para que, após o termino do curso na AM e através de
formação certificada, os Oficiais possuam capacidades e valências para ensinarem CCC nas
unidades onde serão colocados, propondo até a possibilidade de, no futuro, ser criada uma
“rede” de ensino de CCC para todo o Exército e GNR.
Relativamente ao Enquadramento/ Contextualização da Investigação, a escolha do tema
para o desenvolvimento deste trabalho procurou dar continuidade ao trabalho de
investigação elaborado por José Silva (2013) cujo tema focava “A importância da defesa
pessoal na formação da Academia Militar – Exército e GNR”. Este procurou “analisar de
que forma está estruturada toda a formação na Academia Militar no que concerne ao ensino
dos desportos de combate, procurando indagar se esta se encontra estruturada numa lógica
de ensino sequencial, e se constitui uma vantagem para os oficiais no que concerne ao
desempenho de funções”, assim como “indagar as alterações necessárias ao atual programa
de formação de forma a adequar o mesmo à realidade” e “quais os benefícios que uma
formação progressivamente estruturada acrescenta e desenvolve nos formandos.” (Silva J.
A., 2013, p. iv)
Partindo das conclusões do Trabalho de Investigação de Silva J. A. (2013), o qual refere
que “a defesa pessoal e os desportos de combate ensinados atualmente na AM não se
adequam ao desempenho de funções dos oficiais dos quadros permanentes”, podemos
afirmar que a atual formação pode necessitar de eventuais alterações e ser trabalhada de
forma a aproximar-se mais às necessidades do desempenho de funções dos oficiais dos
quadros permanentes, quer do Exército quer da GNR. Partimos do pressuposto que os
DC/CCC são ferramentas indispensáveis para ajudar o militar a lidar com uma situação de
stress, combate ou medo, fazendo com que este tenha uma resposta correta2 aos estímulos
exteriores originários de uma situação dessas, e para o cumprimento das missões
operacionais que poderão ser atribuídas a um militar, onde o mesmo poderá estar limitado
pelas Regras de Empenhamento (ROE3), as quais condicionam o uso de força por parte do
2 Algo que só pode ser atingido com treino contínuo e realista para obter uma correta automatização
do gesto técnico, bem como uma resposta certa para o estímulo sentido. 3 “As Regras de Empenhamento (ROE – Rules of Engagement) são diretivas elaboradas para regular
o uso da força durante as operações. As ROE reconhecem sempre o direito à legítima defesa. São desenvolvidas
para cada operação, baseadas na lei e incluídas no treino das forças, podendo sofrer alterações durante a
execução, caso a tipologia da missão se altere. O cumprimento das ROE assegura aos militares que estão a
3
militar, sendo possível que este tenha de controlar os agressores, saber técnicas de retenção
de armas e de uso da mesma como arma de impacto.
Relativamente à justificação da escolha deste tema, atualmente, nos currículos dos
diversos cursos da Academia Militar, são ministradas várias modalidades no âmbito dos
Desportos de Combate, muito distintas entre si, implicando o início de uma nova modalidade
em cada ano letivo, com novas técnicas, ensinadas e aprendidas de novo, sendo
extremamente difícil alcançar a proficiência desejada como produto final, objetivo último
no ensino de qualquer técnica em qualquer Desporto de Combate. Com a realização deste
trabalho pretende-se explorar a importância e vantagens do ensino do Combate Corpo a
Corpo aos alunos da Academia Militar, assente numa formação sustentada e atualizada, que
lhes confira, como futuros Oficiais do Quadro Permanente do Exército e da GNR, uma
aprendizagem contínua e evolutiva temporalmente, tendo como finalidade não apenas a
aprendizagem do gesto técnico4, como também a prática com vista à automatização do
mesmo.
Este trabalho tem como objetivo e pretende esclarecer se o atual modelo de ensino de
Combate Corpo a Corpo na Academia Militar se encontra adequado a um futuro Oficial dos
Quadros Permanentes do Exército e da Guarda Nacional Republicana (GNR), no
desempenho das suas funções como na sua vida quotidiana, se este modelo carece ou não de
uma revisão e que alterações poderão ser realizadas e como as realizar.
Pretende-se ainda comprovar a necessidade de existir uma formação contínua, adequada
e bem estruturada, consoante os níveis de aprendizagem de cada aluno e das suas futuras
funções em cada área. Na verdade, a metodologia atual do ensino de desportos de Combate
na Academia Militar carece de uma análise consciente acerca da eficácia dos seus objetivos,
pelo facto de cada ano ser introduzida uma modalidade diferente, não permitindo que o aluno
alcance o nível necessário e pretendido à mecanização das diferentes técnicas e princípios
para utilização numa possível situação de stress, tanto no desempenho das suas funções
como fora deste.
Finalmente, este trabalho visa igualmente comprovar os benefícios e características que
o Combate Corpo a Corpo fornece ao aluno, para além das técnicas e conhecimentos próprios
deste.
atuar de acordo com a lei internacional, a política nacional e os regulamentos militares” (Exército Português,
2012, pp. 1-17 1-18). 4 Pode-se definir gesto técnico como um movimento que um jogador realiza de modo a responder
eficazmente a cada momento de um desporto. (Mauss, 1974)
4
Este TIA iniciou-se com a Questão Central (QC) “Que alterações poderão ser
implementadas no atual modelo de ensino de Combate Corpo a Corpo ministrado na
Academia Militar para proporcionar uma formação sustentada e contínua para os futuros
Oficiais dos Quadros Permanentes do Exército e da GNR?”
O presente TIA é constituído por três partes: Pré-textual, Textual e Pós-textual, de
acordo com a NEP 522/1ª de 20 de janeiro de 2016.
A parte Pré-textual é composta pelos seguintes elementos: Capa, Folha de Rosto,
Epígrafe, Dedicatória, Agradecimentos, Resumo, Palavras-Chave, Abstract e Keywords,
Índice Geral, Lista de Apêndices e Anexos, Lista de Abreviaturas, Siglas e Acrónimos.
A parte Textual é composta pela Introdução, Enquadramento Teórico/ Revisão da
Literatura (composto por três capítulos), Metodologia, Métodos e Materiais, Conclusões,
Recomendações e Referências Bibliográficas.
A presente introdução irá incidir sobre os temas do enquadramento/contextualização da
investigação, justificação do tema, objetivos, questão central e estrutura do mesmo.
O Enquadramento Teórico/ Revisão da Literatura está estruturado em Capítulo 1-
Defesa Pessoal e Combate Corpo a Corpo, Capítulo 2 - Disciplinas e Modalidades e Capítulo
3 - Metodologia de Ensino.
A parte Pós-textual é composta por três anexos e dois apêndices.
5
CAPÍTULO 1. DEFESA PESSOAL E COMBATE CORPO A CORPO
1.1. Definição de defesa pessoal
O conceito de defesa pessoal é um conceito muito vago, que visa essencialmente a
sobrevivência de um indivíduo e que pode ser utilizado não só numa vertente de combate
como de “… defesa a uma reação violenta, justificada pela necessidade de uma pessoa se
proteger de uma agressão ou de proteger outrem” (Escola da Guarda, 2010, p. 1), assim
como de um ataque violento e inesperado por um ou mais indivíduos (San Diego, 2015).
Contudo, o conceito de defesa pessoal abrange muitos outros contextos uma vez que
consiste não só na defesa de uma ação violenta, como também, e possivelmente com maior
importância, na prevenção de uma ação violenta, sendo assim atingido o objetivo de
qualquer sistema de defesa pessoal, garantir a integridade física e sobreviver ao confronto
(KM360, 2015).
Podemos afirmar que a defesa pessoal tem uma vertente mais adequada à área civil do
que o conceito de Combate Corpo a Corpo, sendo que, como já foi referido, a defesa pessoal
visa principalmente evitar o conflito e garantir integridade física e, tal como Thompson
(2000), afirma caso tenhamos outras alternativas que não a violência para garantirmos a
nossa integridade física, e se as treinarmos e conhecermos, podemos evitar o uso da força e
garantir a vitória atingindo o nosso objetivo.
Algumas alternativas a destacar serão evitar e não permanecer em locais de perigo e
evitar sempre que possível um conflito, quer abandonando o local do conflito, quer através
da dissuasão verbal do agressor, ou ainda adotando uma postura5 ameaçadora e dissuasiva
de um conflito.
Segundo Kahn (2004), a defesa pessoal oferece ainda outras vantagens para os seus
praticantes tais como a capacidade de aumentar a confiança e robustez mental, reduzir o
medo e improvisar a capacidade de lidar de forma correta com situações hostis.
Existem várias definições de defesa pessoal por diversos autores6, no entanto, é de
grande importância destacar a definição dada por Camp (1999), que defende a ideia da defesa
pessoal não como uma ação ou um ato, mas sim como um estado mental e um estilo de vida
que se centra na proteção e preservação pessoal e que implica viver num estado de alerta
5 “Posturing is the all but lost art of beating people by means of psyche, winning with guile as opposed
to force. It is the art of fighting without fighting. In layman’s terms it means scaring the shit out of the opponente
with ‘blag’, so that they don’t want to enter physical arena with you.” (Thompson G., 2000, p. 140) 6 Autores referidos por (Silva J. A., 2013)
6
permanente, não de medo constante ou paranoico, procurando ter acesso constante a várias
ferramentas ou medidas para prevenir ou contrariar as adversidades e situações que possam
surgir.
A defesa pessoal e todos os sistemas de defesa pessoal assentes numa vertente civil, tal
como a maioria dos sistemas de ensino de Krav Maga, defendem a ideia de que “não existem
dois ataques iguais, não existem duas pessoas iguais” ou seja, os sistemas estão criados para
que qualquer pessoa independentemente do sexo, idade ou capacidade física, consiga
defender-se de modo eficaz de um ataque ou situação hostil – “Everybody can learn it,
everybody must learn it” (Imi Licthenfeld citado em KM360, (2015)). Além disso, a defesa
pessoal visa também contribuir para o aumento da força física, flexibilidade, balanço
corporal, capacidade cardiorrespiratória (Cheung, 2001), bem como promover ao máximo
as potencialidades físicas, cognitivas e emocionais do interveniente (Pires & Ramalho,
2010).
1.2. Definição de Combate Corpo a Corpo
O conceito de Combate Corpo a Corpo, ao contrário do conceito de defesa pessoal, é
muito menos abrangente, referindo-se apenas à parte do confronto ou conflito existente entre
duas ou mais pessoas com recurso a mãos vazias ou a armas tais como facas, bastões e
espingardas com baionetas (Army, 1992). Neste manual é também referido quando forças
amigas ou inimigas combatem a curtas distâncias onde o recurso a armas de fogo ou granadas
não se torna prático nem possível, o conhecimento de técnicas de Combate Corpo a Corpo é
extremamente benéfico.
Em 2002, o Exército Americano renovou o seu manual de Combate Corpo a Corpo
“Combatives” (Army, FM 3-25.150, 2002), no qual a definição de Combate Corpo a Corpo
foi ligeiramente alterada para englobar o uso não só de espingarda com baioneta, mas de
qualquer arma de fogo que não possa realizar fogo por qualquer motivo, afirmando ainda
que o Combate Corpo a Corpo é um bloco fundamental para o treino de um soldado
moderno, uma vez que o recurso à baioneta entrou em desuso, devido à tipologia das missões
mais orientadas para o Combate em Áreas Urbanas (CAU).
Segundo United States Marine Corps (1999), no manual MCRP 3-02B, e indo de
encontro à definição acima referida, este identifica o Combate Corpo a Corpo como um
confronto físico entre dois ou mais oponentes que envolve técnicas com recurso a armas ou
não, e com recurso a força letal ou não, com um conjunto de técnicas que varia desde o
7
controlo e domínio do agressor até ao uso de força letal. Acrescenta também que o propósito
do Combate Corpo a Corpo é executar técnicas com recurso a armas ou não, para produzir
resultados letais ou não-letais. Refere ainda que as técnicas sem recurso a armas devem
incluir técnicas de combate de mãos vazias e de defesa de ataques armados, e que as técnicas
de uso de armas devem incluir o uso de espingardas com ou sem baioneta, facas, bastões ou
qualquer outra arma de oportunidade7.
Também no documento Fundamentals of U.S Marine Corps Marcial Arts é referida a
necessidade de saber adequar o nível de força consoante o espetro da violência, ou seja, é
necessário saber quando controlar um agressor ou quando o matar, conforme a necessidade
e/ou possibilidade, de acordo com a missão e com as ROE (United States Marine Corps).
Já na doutrina Portuguesa segundo o Manual de CCC de 2013 nível I “o Combate Corpo
a Corpo pode ser descrito como uma luta ou contenda entre dois ou mais oponentes, com ou
sem armas, em que o confronto físico se tornou necessário ou incontornável e são necessárias
aptidões físicas e psicológicas para o resolver com sucesso” e “ tem por finalidade a
aquisição de qualidades físicas, técnicas e psicológicas para a utilização no combate
desarmado ou armado, em circunstâncias o mais próximo possível do real, desenvolvendo
características de autoconfiança e combatividade a par da força, flexibilidade e rapidez de
reação, com o objetivo final da aquisição e melhoria de técnicas eficazes.” (Exército
Português, 2013)
1.3. Combate Corpo a Corpo vs Defesa pessoal
Como foi possível observar pelas diversas definições dadas tanto de defesa pessoal
como de Combate Corpo a Corpo, conseguimos afirmar que estes dois conceitos, apesar de
terem semelhanças, não são sinónimos como é costume afirmar. Segundo Brown, (1951), o
termo defesa pessoal surgiu após a 2ª Guerra Mundial, quando se verificou um aumento de
criminalidade e a consequente necessidade quer por parte da polícia que carecia de técnicas
de controlo de criminosos sem derramamento de sangue e aplicando a mínima força possível,
quer por parte dos civis que procuravam proteger as suas famílias, tendo sido então criados
vários manuais de defesa pessoal para o cidadão comum e para a polícia (Rose, 1954).
7 Por armas de oportunidade o autor refere-se a qualquer arma.
8
O conceito de defesa pessoal é um conceito ligado a uma vertente civil que visa a
sobrevivência e a proteção da integridade física, sendo essencial nestas situações evitar o
conflito por completo, assim como situações perigosas.
Considerando que o principal objetivo do conceito de defesa pessoal é evitar o conflito,
é contraditório afirmar que os militares deveriam aprender defesa pessoal uma vez que no
decorrer das suas funções são colocados em cenários de perigo onde o confronto com o
inimigo é inevitável. Contudo, tal como foi referido por Camp (1999), que defende a ideia
da defesa pessoal não como uma ação ou um ato, mas sim como um estado mental e um
estilo de vida que se centra na proteção e preservação pessoal, este conceito deve ser
ensinado, dando enfâse à proteção e preservação da integridade física para que os militares
saibam defender-se sem correr riscos desnecessários.
Outra particularidade da defesa pessoal é o facto de não prever o ato de matar, salvo em
último recurso quando não existirem mais opções, nem reconhece o termo inimigo, sendo
este substituído por um termo mais brando como agressor ou oponente. Neste sentido, a
maioria das artes marciais e sistemas de defesa pessoal não se foca e não ensina técnicas que
possam ferir gravemente ou matar o agressor, estando o ensino destas excecionalmente
reservado a instruendos avançados e/ou formações para militares.
Por outro lado, no decorrer das suas funções e operações, especialmente quando a
finalidade da missão é destruir, os militares poderão ter de matar como primeira opção, razão
pela qual se ensinam os militares a tirar o melhor rendimento do uso de armas de fogo, pelo
que o mesmo deveria ser ensinado para o uso de armas de impacto, corte, ou mãos vazias
(Singleton II, 2012).
Uma das razões pela qual não deveriam ser ensinadas artes civis e de competição a
militares, por não serem adequadas para o desempenho das suas funções, é a criação de
automatismos errados que podem colocar em perigo a vida de um militar. Um desses
exemplos é o relato de Singleton II (2012), do acontecimento de 18 de junho de 2010, quando
uma equipa de Marines Americanos sofreu uma emboscada, na qual o Cabo Wooldrige
matou dois inimigos e quando começou a troca de carregadores deparou-se com um cano de
uma espingarda no canto de uma parede a menos de um metro e meio. Tendo a sua arma
sem munições agarrou o cano da espingarda inimiga e iniciou a luta corpo a corpo, tentando
submeter o inimigo e controlá-lo múltiplas vezes sem sucesso. No decorrer do combate, o
inimigo tentou agarrar uma granada do Cabo, tendo este agarrado a espingarda do inimigo e
coronhado-o até à morte, tendo assim prevenido a sua morte e da sua equipa.
9
Este relato verídico é um ótimo exemplo de uma automatização errada e de uma escolha
errada de técnicas para a situação presente. O Cabo, sendo um Marine Americano, foi
treinado de acordo com o programa Marine Corps Marcial Arts que, segundo Singleton II
(2012) é um sistema que tem predominância de grappling numa vertente competitiva, em
que o conceito de técnicas letais foi esquecido. Logo, o Cabo deparando-se com um inimigo
que já tinha aberto fogo sobre si e sobre a sua equipa, tentou controlá-lo através de técnicas
de grappling, sendo que só quando o inimigo estava prestes a conseguir obter uma granada
sua é que se lembrou de fazer algo que não grappling (mesmo já tendo morto outros inimigos
com recurso a arma de fogo). Isto aconteceu porque a maioria do seu treino de Combate
Corpo a Corpo tem como base grappling competitivo, e por essas razões é que ele, sem
pensar, reagiu ao estímulo de agarrar o cano e tentar submeter o inimigo. Tendo o Cabo
legitimidade para matar o seu inimigo, mesmo assim optou pela solução mais difícil,
tentando controlá-lo sem sucesso, em vez de optar pela escolha mais fácil e prática de matar,
recorrendo a técnicas letais desde o início do combate, tal como referido por Singleton II
(2012) evitando assim perigos desnecessários para si e para a sua equipa.
Assim, podemos observar as seguintes situações. A primeira é que em casos de stress o
nosso subconsciente poderá recorrer a técnicas que estejam automatizadas para determinado
estímulo, caso estas existam, independentemente de serem corretas ou não, porque a mente
humana, segundo John Boyd, numa situação de stress e surpresa, caso exista uma técnica
automatizada, não vai pensar, apenas de agir com uma resposta pré-determinada para esse
estímulo ou ataque, não realizando os passos dois e três do OODA loop.8
A segunda é que uma escolha incorreta de técnicas por parte do militar e um ensino
errado de técnicas por parte do instrutor pode provocar a morte do militar e dos seus
camaradas, e aqui observa-se a importância de existir um sistema de CCC que não foque
exclusivamente artes civis e de competição, mas sim em técnicas adequadas e testadas para
os militares.
A terceira é que situações de CCC acontecem cada vez mais nos dias de hoje devido ao
ambiente urbano das missões (Thompson G. , 2011).
Apesar das lacunas referidas por Singleton II (2012), o programa de artes marciais usado
pelos Marines Americanos está bem estruturado, tendo sofrido alterações desde então como
será explanado posteriormente. Um exemplo a ser tido em consideração que colmata estas
8 Referido no capítulo 3.3.
10
lacunas é o programa do Exército Americano Modern Army Combatives Program (MACP),
pois possui o programa Special Operacion Combatives Program (SOCP), que visa o uso de
uma faca específica para situações de Close Quarters Combat (CQB), seja para ganhar
distância ou para matar o inimigo e que poderá ser ministrado após o término do MACP.
Quarta porque na defesa pessoal e nos sistemas de defesa pessoal, o treino é, por norma,
realizado com fardamento próprio, seja este calças, t-shirt e ténis; calções e descalço; kimono
ou qualquer outro tipo de fardamento para se poder tirar melhor proveito do treino e para se
adequar o treino à realidade da arte que se está a praticar, ou seja no Kickboxing e no Mixed
Marcial Arts (MMA) treina-se descalço e de calções porque os combates são realizados
assim; no Judo e Jiu-Jitsu treina-se de kimono porque este permite ser agarrado e usado
como uma arma; nos sistemas de defesa pessoal como o Krav Maga treina-se de t-shirt,
calças ou calções e ténis, para adequar o treino a uma situação real.
Ora se cada arte ou sistema adequa o seu fardamento à função, também os militares
deveriam treinar com o fardamento adequado às suas funções, seja ele camuflado, botas ou
até mesmo colete tático ou balístico, capacete, espingarda, etc. No entanto, numa fase inicial,
de modo a que o praticante tenha uma maior motivação e consequente melhor aprendizagem
e mais rápida automatização do gesto técnico, não deve começar o treino com o equipamento
todo.
Por último, a defesa pessoal está limitada pelas leis civis e pelo código penal, motivos
pelos quais não tem por base certos pressupostos tais como matar, causar mais danos ao
agressor do que os necessários para proteger a integridade física da vítima, uso de certas
armas, algemagem ou detenção de um indivíduo. Os sistemas de defesa pessoal e artes
marciais por norma não ensinam essas técnicas e mais uma vez os que ensinam tal como o
Krav Maga reservam-nas para instruendos avançados e/ou para formações para militares,
uma vez que elas não se enquadram no conceito de defesa pessoal.
Os militares por outro lado, em especial a Guarda Nacional Republicana nos controlos
e técnicas de algemagem e o Exército nestas técnicas e também nas letais, devem saber usá-
las de forma eficaz e eficiente, de acordo com as necessidades específicas de cada ramo
(Silva J. A., 2013). Por exemplo, o ensino de CCC na GNR deveria focar-se mais em
controlos e algemagem e menos no uso de força letal, espingarda ou eliminação de sentinelas
em virtude da GNR estar por vezes limitada pelas leis civis.
11
Além disso, o uso de armas como facas, bastões e espingardas, devido ao seu uso
diminuto no meio civil, não é por norma ministrado nos sistemas de defesa pessoal, salvo
raras exceções como na FMA-P, e os que ministram normalmente não o fazem da forma
mais correta ou com uma extensão suficiente.9
Por estas razões e através das definições de defesa pessoal e de Combate Corpo a Corpo,
podemos afirmar que a defesa pessoal não é indicada para os militares e que existem certos
parâmetros militares específicos a ter em conta na escolha de uma disciplina de Combate
Corpo a Corpo que incida e englobe todos estes aspetos, pelo que no próximo capítulo se
encontram explicadas quais as características que a disciplina de CCC deve possuir para se
adequar aos soldados modernos.
1.4. Características a considerar no ensino de CCC aos militares
Como referido anteriormente, o conceito de defesa pessoal não se adequa às funções e
missões desempenhadas pelos militares nos dias de hoje, pelo que é importante encontrar
uma definição que englobe todas as outras acima referidas. Para tal, antes de enumerar as
diversas características que o CCC ensinado a militares deve conter, é importante sintetizar
a definição de CCC, a qual poderá ser definida como um confronto físico entre dois ou mais
oponentes e no qual podem ser usadas técnicas com recurso a armas (desde facas, bastões,
espingardas com ou sem baioneta, ou qualquer outra arma de oportunidade ou de fogo que
possa realizar fogo ou não), assim como a possibilidade de recurso a força letal, englobando
um conjunto de técnicas desde controlo e domínio do agressor até ao uso de força letal
aplicada de forma adequada e crescente visando sempre a integridade física do militar.
No seguimento da definição de CCC, e considerando as diferenças entre defesa pessoal
e CCC anteriormente referidas, é agora possível identificar certas características presentes
no CCC tais como a necessidade de ensinar combate não só de um contra um como também
de um contra vários ou de vários contra um, o uso de armas de vários tipos, a necessidade
de se ensinar técnicas letais bem como técnicas não letais de acordo com o escalar da força
do agressor, a compreensão do termo defesa pessoal não como um sistema mas como um
9 Existem sistemas de defesa pessoal como o Krav Maga ensinado na KM360 que através de uma
parceria com um sistema de combate de faca e de armas de corte “Armed Combat and Tactics” (ACT) tem
vindo a tentar combate esta falha. Outra opção é por exemplo o sistema “Filipino Marcial Art” FMA cuja base
é o trabalho com armas.
Estes sistemas encontram-se explicados nos capítulos seguintes.
12
estado mental, o uso de fardamento adequado, a diferenciação entre Exército e GNR e o
tempo disponível para o ensino de CCC a militares.
Começando por explicar o que se entende por escalar da força, Thompson G. (2011),
refere que este é composto por vários níveis sendo estes: mostrar presença física, dissuasão
verbal, postura e movimento dissuasivos de uma ação, técnicas de controlo (como
posicionamento das mãos, empurrar, escoltar, algemar), táticas agressivas (como golpes e
estrangulamentos, e controlos e algemagem dois para um), uso de armas de impacto (com
espingarda ou pistola, uso de bastões ou qualquer outra arma de oportunidade), e força letal,
através de uso da espingarda ou pistola como arma de fogo, faca ou qualquer outra arma de
oportunidade que cause danos graves ao inimigo. Ver anexo A
Relativamente à necessidade de ensinar técnicas letais bem como técnicas de controlo e
submissão do inimigo, esta prende-se com a finalidade das missões atribuídas a um militar,
sejam estas de destruir ou simplesmente capturar, onde é imperativo não matar. Além disso,
a tipologia da missão, bem como as ROE, podem ditar que não se possa matar, e na lida com
civis em controlo de motins ou em manifestações é imperativo saber aplicar técnicas que
não firam a integridade física dos civis, bem como força apenas quando necessário.
Outro motivo prende-se com as funções desempenhadas pela GNR, cujo “…objetivo é
deter, imobilizar, e conduzir”, pelo que “…deveria haver uma separação entre o Exército e
GNR”, e eventuais “ligações com os EESM e policial e naturalmente com a GNR”,
(Entrevistado citado por Silva J. A., 2013, p.38). Como a GNR trabalha dentro da Lei e do
código penal não pode usar como primeiro recurso técnicas letais, sendo que não se deve dar
ênfase ao ensino destas a militares da GNR para não criar automatismos errados, devendo o
pouco tempo disponível para treinar ser rentabilizado para o ensino de técnicas cuja
finalidade seja “deter, imobilizar e conduzir” e não matar, pois a GNR e a polícia devem
“…subdue offenders and keep the law with a minimum of bloodshed. It is neither the desire
nor the job of the police officer to kill. To best accomplish is job, every policeman must be
thoroughly versed in the science of rough and tumble fighting.” (Brown, 1951, p. v)
Outro aspeto a ter em conta é o tempo disponível para o ensino de CCC aos militares.
Numa arte marcial ou num sistema de defesa pessoal, o tempo médio para atingir a
proficiência nessa arte são normalmente necessários oito a dez anos constantes de treino. No
entanto, um militar não possui oito a dez anos de treino para aprender CCC, pelo que é
imperativo criar um sistema de fácil aprendizagem e apenas com técnicas relevantes para a
função do militar. No caso da Academia Militar, com um ano de aprendizagem e prática de
13
CCC, é impossível atingir a proficiência e uma correta automatização do gesto técnico, tal
como foi concluído por Silva J. A. (2013), a “… prática do Combate Corpo a Corpo teria
necessariamente de ser estendida por mais tempo, com o mínimo de 2 anos ou até ao máximo
de 5 anos, durante a frequência da Academia Militar.”
O tipo de fardamento também deve ser algo a considerar de forma a adequar o treino à
realidade do combate sendo que, numa fase inicial, apenas seria composto por camuflado
sem armas (Thompson G. , 2011) tal como é feito na Academia Militar pelo Major Moura
e, numa fase mais avançada, por colete tático ou balístico, capacete, espingarda, etc.
Uma hipótese para resolver este dilema do tempo disponível para a prática de CCC
poderá passar pela criação de um sistema por módulos e níveis, em que um militar só poderia
fazer o próximo nível após o término e avaliação do módulo anterior, à semelhança dos
diversos sistemas de Krav Maga, tal como a KM360 ou a FPKM, como referido por Silva J.
A. (2013), ou até mesmo pelos Marines Americanos com um sistema de cintos10 (USMC,
2011). Desta forma, motivam os militares a praticar para atingir a proficiência nesse nível e
poderem avançar para o nível seguinte. Já no Exército Americano, separam o seu programa
em três partes, sendo que o primeiro e o segundo nível fazem parte do Modern Army
Combatives Program e o último que faz parte do SOCP visa distâncias mais curtas, uso de
faca específica para o trabalho de clinch e solo, bem como de transição de armas, não
incluídas nos módulos anteriores e só ensinadas após o término dos módulos anteriores
(Thompson G. , 2011).
Ao adotar um sistema por módulos, para além de motivar os praticantes podendo estes
escolher os módulos que querem fazer de acordo com as suas necessidades, permitiria uma
melhor gestão do tempo e diferenciação do ensino de técnicas do Exército e da GNR.
O ensino de técnicas de um contra vários também é algo que se deve ter em conta pois
raramente, numa situação de combate que não em ringue, nos vamos deparar com uma
situação de um para um, ainda mais no meio militar onde a superioridade numérica e o
elemento de surpresa são sempre procurados, pelo que existe a probabilidade de nos
depararmos com uma situação de um contra vários.
Por exemplo, num caso em que a finalidade da missão seja capturar, o uso de técnicas
de CCC para deter, controlar e conduzir o inimigo é essencial, tanto para o Exército e mais
em específico para a GNR, técnicas essas que poderão ser feitas em grupo para deter um
10 Sistema composto por cinco níveis básicos, tan, gray, green, grown, black e seis níveis de negro.
14
inimigo ou criminoso, pois um militar nesses casos não vai estar sozinho, aproveitando assim
o elemento de surpresa e a vantagem numérica para conseguirem de modo mais fácil deter,
controlar e conduzir.
Uma vez que um militar transporta sempre consigo pelo menos a sua arma de fogo, é
imperativo que este a saiba usar quer como arma de fogo quer como arma de impacto, caso
fique sem munições, tal como o exemplo do Cabo Wooldrige anteriormente referido, ou num
caso em que por motivo das ROE, não possa fazer uso desta como arma de fogo sendo
obrigado a usá-la como arma de impacto, ou mesmo para saber técnicas de retenção caso
alguém a tente retirar dele. No caso da GNR o caso é semelhante pois também é imperativo
saber técnicas de retenção de arma e de uso da pistola como arma de impacto, caso esta
encrave numa situação crítica, e não haja tempo para resolver a falha (Thompson G., 2011),
(US Army, 2002), (US Army, 1992).
O uso de facas e bastões também se torna importante, a faca mais para o Exército, e o
bastão mais para a GNR. O uso de faca para o Exército também deve ser regulado para
coincidir com as necessidades e as missões dos dias de hoje pois, de acordo com um estudo
feito por Thompson G. (2011), e o Exército Americano, pelo menos 50% das lesões
resultantes de facas nos soldados Americanos decorreram de um insurgente que conseguiu
apoderar-se da faca do militar e usá-la contra ele11. Por esse motivo, foi criada uma faca
específica (SOPC knife) para o uso em situações de clinch, solo, de retenção de arma e
transição entre espingarda, pistola e faca, sendo que esta faca permite o uso correto tanto da
espingarda como da pistola, sem ser necessário voltar a guardar a faca para empunhar a
espingarda ou a pistola com as duas mãos, diminuindo assim o tempo da sua ação e
melhorando muito as técnicas de transição entre armas. Esta faca, também devido às suas
curtas dimensões, torna o seu acesso por parte de um insurgente extremamente difícil,
constituindo-se assim como uma solução para o problema acima referido (Thompson G. ,
2011).
O uso de armas de oportunidade ou improvisadas, também deve ser algo a ser
introduzido, tal como referido nos manuais FM 3-21.150, MCRP 3-02B e H2H Combatives,
pois os militares devem conseguir observar o seu meio envolvente e usar qualquer arma ou
objeto que tenham à mão para sobreviver, garantir a sua integridade física e cumprir a
11 Isto porque os militares ainda usavam facas de largo porte, com o motivo de serem usadas como
baioneta ou para sobrevivência, facas estas desenhadas para serem usadas no mato e na selva, não em terreno
urbano.
15
missão, desde areia, cadeiras, pedras, paus ou até mesmo o capacete, sendo que os
fundamentos de uso de faca podem ser usados para uma caneta, lápis, pedra, etc., e os
fundamentos do uso de bastão podem ser usados com uma pá, uma espingarda partida, um
pau ou mesmo um cinto, tal como referido no manual MCRP 3-02B (USMC, 2011).
O ensino de técnicas de transição de armas também é algo que deve ser ensinado pois
de acordo com Thompson G. (2011), quando alguém nos agarra a arma, deixa-se vulnerável
sendo possível fazer a transição para pistola ou faca. No caso da faca, pode usar esta para
ganhar distância, reter a espingarda e fazer uso desta ou sacar da pistola e fazer uso dessa,
tal como descrito por Thompson G. (2011), pois uma faca ou pistola numa situação de
combate em curtas distâncias tal como clinch, grappling ou solo possuem muito mais
manobrabilidade do que uma espingarda.
Em conclusão, é possível saber algumas das características essenciais que o ensino de
CCC para os militares deve conter, pelo que, resta agora saber qual a disciplina, sistema de
artes marciais ou defesa pessoal se adequam mais a estas características, e se as disciplinas
ensinadas atualmente na AM contêm ou não essas características, o que será explicado no
próximo capítulo.
16
CAPÍTULO 2. DISCIPLINAS E MODALIDADES
Atualmente são lecionadas três modalidades de Luta na AM: Judo, ensinado no primeiro
ano com uma duração de um tempo semanal (aproximadamente vinte e seis horas por ano),
Boxe, ensinado no segundo ano também com a duração de um tempo semanal
(aproximadamente vinte e seis horas por ano) e CCC, ensinado no terceiro ano com a
duração de dois tempos semanais (aproximadamente cinquenta e duas horas por ano), sendo
que no decorrer dos restantes anos não é ensinada nenhuma modalidade específica.
Passamos à análise das disciplinas ensinadas tentando fazer correspondência com as
características acima apresentadas.
2.1. Judo
“Judo (judo 柔道 - caminho suave) é uma arte marcial praticada como desporto, fundada
por Jigoro Kano em 1882. Os seus objetivos são fortalecer o físico, a mente e o espírito de
forma integrada, para além de desenvolver técnicas de defesa pessoal.” (Judokai, p. 10)
Este tem como objetivo, tal como referido por Reay, (1990) citado por Siva, (2013,
p.10), “suplantar uma outra pessoa sem qualquer outra vantagem que não seja a perícia, a
força e os recursos próprios. Isto significa que os judocas (praticantes de judo) competem
uns com os outros em termos iguais, sem armas e, por questões de segurança, dentro de um
conjunto de regras. O objetivo é tentar ser mais lesto, manobrar um adversário e atirá-lo ao
chão, ou imobilizá-lo, ou levá-lo a submeter-se antes que ele nos faça o mesmo - tudo sem
provocar ferimentos. Tenho ouvido descrever o judo como um jogo de xadrez físico - o que
o condensa de facto muito bem.”
Assim, podemos afirmar que o Judo “…is considered, even today, as a "new" sport, a
"different" sport...”, (yerkow, 1947, p. 15) ou seja, o judo é um desporto e como tal está
submetido a regras, as quais protegem os praticantes de lesões e limitam os combates.
Podemos também afirmar que este utiliza um fardamento próprio “A vestimenta
utilizada nessa modalidade é o keikogi (não confundir com kimono), que no judo recebe o
nome de judogi, e que com o cinturão forma o equipamento necessário à sua prática. O
judogi pode ser branco ou azul, ainda que o azul seja utilizado normalmente para facilitar as
arbitragens”, pelo que os militares não o usam (Judokai, p. 10).
17
Por estas razões, este desporto seria uma mais-valia se fosse adaptado numa vertente
militar, sem regras nem uso de fardamento específico e integrado num conjunto de técnicas.
2.2. Boxe
Este desporto é caracterizado pelo combate entre duas pessoas apenas com o recurso
aos punhos, sendo apenas permitido golpear da cintura para cima. Segundo Sugen (1996), a
origem do boxe é desconhecida, sendo que, pode ser definido simplesmente como duas
pessoas a lutar somente com os próprios punhos “given that people have fought in this way
as long as history has been recorded, then we may conclude that alongside running, boxing
is the most ancient of all sports” (Sugen, 1996, p. 9) Também Swift (1840, p.8), afirma
“With regard to the antiquity of boxing, it requires no strength of imagination to come to
the conclusion that it is coeval with the existence of man himself; and that as the fist is the
first weapon with which man was provided, either for offence or defence, it takes precedence
of all others.”
O boxe moderno, sendo um desporto de competição e estando limitado por regras muito
específicas, em especial apenas ao uso dos punhos, fornece vantagens tanto a nível físico
como psicológico (Silva J. A., 2013).
Não obstante, não se adequa na totalidade a um militar porque não lhes fornece todas as
capacidades necessárias ao desempenho das suas funções, mas poderá constituir uma mais-
valia se associado a outro sistema que envolva também o uso dos punhos.
2.3. Combate Corpo a Corpo
Ao longo dos anos é possível traçar uma evolução muito grande no ensino de CCC tanto
no Exército como na GNR, e em específico na Academia Militar, que sendo uma Instituição
de Ensino Universitária, sempre esteve na vanguarda do Exército na área de investigação,
procurando sempre a melhoria do ensino. Desta forma, tem vindo a realizar um excelente
trabalho de melhoria do ensino de CCC através da criação de documentos/manuais de CCC
desde 1961 e do esforço de muitos intervenientes ao longo dos anos que disponibilizam o
seu tempo para treinar e pesquisar novas técnicas e novos modelos de ensinos, procurando
uma constante melhoria da instrução de CCC, não só na Academia Militar, como em todo o
Exército e GNR.
18
O Combate Corpo a Corpo foi uma disciplina que sempre existiu no Exército e na GNR,
mas foi na Academia Militar que sempre teve mais relevância, pelo que, em 1961 foi criado
por Joaquim Chito Rodrigues um “trabalho de consulta, tradução e compilação…”, que “não
é um regulamento, nem um tratado de metodologia e luta corpo a corpo. É sim um conjunto
ordenado de assuntos, onde o cadete da Academia poderá rever as suas primeiras noções
sobre o Combate Corpo a Corpo, quando um dia esquecer tudo ou parte de quanto sobre o
assunto lhe foi ensinado no decorrer do curso.” (Rodrigues, 1961, p. 5)
Este “conjunto ordenado de assuntos”, tal como o autor refere, não pode ser considerado
como o primeiro manual de CCC do nosso Exército, pois apesar de ter sido criado para os
alunos da Academia Militar, os seus princípios e técnicas podem ser transferidos para todos
os militares. Este manual, apesar de ser antigo, possui ainda muitos conceitos, princípios e
técnicas válidos ainda hoje, sendo por isso uma obra muito bem conseguida. Este inicia com
uma pequena resenha histórica sobre a origem e importância do CCC, bem como alguns
princípios universais e intemporais do CCC. De seguida, descreve os “três elementos
principais” que “intervêm na instrução de Combate Corpo a Corpo: a luta (greco-romana;
livre), o boxe (francês e inglês) e o judo. Ao falar destes “três elementos principais” o autor
refere também a importância de um “estudo progressivo e por uma grande repetição de todos
os movimentos, a fim de se obter a necessária mecanização e execução perfeita e rápida,
para que daí resulte a indispensável eficácia de todos eles”, sendo também referidos os
motivos da escolha de cada técnica. De seguida, são descritos “alguns princípios e conselhos
importantes”. Posteriormente, o manual está dividido em mais cinco partes, Generalidades,
Combate desarmado, Desarmamentos, Ações especiais e Segurança.
Este manual, apesar de muito bem conseguido para a sua época, foi substituído pelo
Manual Técnico de Educação Física do Exército – MT 110-5, aprovado em 24 de outubro
de 1989, que colocou o ensino de CCC como parte integrante da Educação Física e dividiu-
o em vinte sessões mais organizadas para o ensino, de modo a proporcionar ao aluno uma
aula mais estruturada. Este manual colmatou algumas falhas do manual anterior, na vertente
de um ensino estruturado, pois o manual de 1961 não continha métodos de ensino, sendo
apenas um “conjunto ordenado de assuntos” com o objetivo de consulta de técnicas por parte
dos alunos, não abrangendo métodos de ensino. Este novo manual passou a definir a
finalidade do CCC, a organização da aula, normas gerais e de comando, normas de segurança
e a divisão da aula em três fases. Uma lacuna deste manual relativamente ao anterior é a
maior dificuldade de consulta, sendo que está dividido em vinte sessões, o que torna mais
difícil a procura de uma técnica específica (Exército Português, 1990).
19
Em novembro de 2002, foi aprovado o Regulamento de Educação Física do Exército
(REFE) “que manteve um figurino semelhante ao seu antecessor, mas deixou de incluir o
Combate Corpo a Corpo, por se ter considerado que este método de treino Físico de
aplicação militar deveria integrar um volume separado” (Exército Português, 2013, p. VII).
Por este motivo, e como o ensino de CCC no Exército ficou desregulado, foi então
criado e promulgado um manual de CCC unicamente para a Escola de Sargentos do Exército
(ESE) a 1 de agosto de 2008, composto por cinco capítulos: Generalidades, Técnicas básicas,
Técnicas de libertação, Técnicas defensivas e Programa de instrução ( Escola de Sargentos
do Exército, 2008).
No primeiro capítulo é explicada a sua finalidade, objetivos, a necessidade do treino e a
organização. O quinto capítulo refere o modo como as aulas devem ser estruturadas,
afirmando que deve existir um mínimo de dez sessões de cinquenta minutos repartidas em
três módulos, mas refere poderão existir sessões de revisão e ou consolidação para além das
dez planeadas.
Este manual foi tomado como referência para a criação do Manual de Combate Corpo
a Corpo Nível 1 para todo o Exército, aprovado em 29 de julho de 2013.
Estando muito bem estruturado, este manual traduziu-se numa enorme evolução do
CCC no Exército, uma vez que de novembro de 2002 a julho de 2013 o ensino de CCC não
estava regulamentado, colmatando as falhas dos manuais anteriores, podendo-se afirmar que
este é o primeiro manual de CCC do Exército, sendo que os dois primeiros não se
encontravam regulamentados e o terceiro apenas regulamentava o ensino de CCC na ESE.
Este manual é composto por dois níveis, o Nível 1 para a formação comum de todos os
militares do Exército e o Nível 2 para complementar a formação dos militares das Tropas
Especiais (Comando, Operações Especiais e Paraquedistas).
O manual estruturado desta forma permite a cada uma das Tropas Especiais criar o seu
próprio manual de CCC de modo a adequar o ensino de CCC às suas missões, ficando assim
cada Tropa Especial livre de ensinar o que mais se adequa a si, permitindo por exemplo o
ensino de Krav Maga nos Comandos, modalidade de CCC escolhida por eles.
O Manual é composto por dez capítulos, Introdução, Regras de segurança, Fase
preparatória/Aquecimento, Técnicas básicas, Técnicas de bloqueio, Técnicas de libertação,
Técnicas defensivas, Técnicas ofensivas, Programas e Avaliação.
Este começa por oferecer uma definição e finalidade do CCC, e apesar do manual MT
100-5 fornecer uma finalidade, só neste manual é que é apresentada uma definição de CCC.
20
Este divide também o nível 1 em 1A e 1B, sendo que o nível 1A (elementar) deve ser
ministrado em todos os cursos de formação inicial, e o B (complementar) destina-se a
complementar a formação e deve ser ministrado, pelo menos, nos cursos de formação de
oficiais e sargentos destinados aos Quadros Permanentes (Academia Militar e Escola de
Sargentos do Exército), mais uma vez destacando a importância do ensino de CCC na AM.
O Manual também refere os princípios base do CCC, regras de segurança, desde áreas
de treino, uniforme e equipamento, material de treino, etc.
Algo muito relevante neste manual é o Capítulo 3 – Fase preparatória/Aquecimento, que
explica o método correto de ensino de CCC, bem como a estrutura do aquecimento e os tipos
diferentes de aquecimento, separando assim o CCC do aquecimento tipo Base 1, como era
previsto no MT 110-5, permitindo assim uma maior diversidade e adequação do
aquecimento ao CCC.
O manual também prevê no capítulo nove um programa de ensino composto por um
mínimo de dezasseis sessões para o nível 1A e mais sete sessões para o nível 1B, aumentando
assim o número de horas de treino, e referenciando a necessidade de mais sessões e de
adequar as sessões ao tempo disponível e ao número de elementos por turma.
No último capítulo estão referenciados os objetivos da avaliação, bem como os quatro
blocos de avaliação.
Este manual introduziu inúmeras melhorias no ensino de CCC, desde o aquecimento,
até a avaliação, e mesmo nas técnicas ensinadas distanciou-se dos “Três elementos
principais” tal como referido por Rodrigues (1961) e, não deixando de os usar, adotou uma
vertente com grande foco no Krav Maga.
A adoção de novas técnicas demonstra a constante evolução do CCC para os teatros
atuais, no entanto, existem técnicas de grande relevo nos manuais antigos, não referenciadas
neste novo manual, que não devem ser esquecidas.
Sendo o novo manual uma mais-valia para o ensino de CCC no Exército, este também
possui falhas, especialmente em algumas técnicas que faltam ou que podem ser melhoradas,
pelo que o ensino de CCC na Academia Militar ministrado pelo Major Moura é
complementado com outras técnicas de relevância, tentando assim colmatar as falhas do
manual e proporcionar aos cadetes um ensino de excelência.
Apesar do grande avanço que este manual proporcionou no ensino de CCC, também
este não cumpre todas as características necessárias ao ensino de CCC pois, tal como referido
pelo Major Moura, este manual necessita de uma revisão e por essa razão é que na Academia
Militar a disciplina de Defesa Pessoal e Combate Corpo a Corpo introduz técnicas que não
21
estão referenciadas no atual manual de CCC. Além disso, e não querendo menosprezar o
excelente trabalho realizado na elaboração deste manual, também ele possui falhas pois não
refere algumas das técnicas referidas nos manuais anteriores que ainda hoje são de extrema
importância, nomeadamente técnicas para imobilizar prisioneiros e técnicas letais, sendo que
este manual não faz referência a estas últimas que poderão ser muito úteis para os militares
numa situação semelhante à referida por Singleton II (2012). Seria pertinente introduzir
técnicas de um contra vários, de vários contra um e de uso de armas improvisadas, assim
como de técnicas de transição e retenção de armas. O ensino de técnicas de solo é muito
limitado, e apesar de ser mencionado o treino com equipamento de combate, no Capítulo 2
alínea d “Quando se entrar nas técnicas de CCC com arma, poderá ser determinado o uso de
capacete, cinturão e suspensórios ou colete tático (sem carregadores ou outro equipamento
metálico/duro)” este não refere técnicas específicas para o uso desses materiais (Exército
Português, 2013, pp. 2-1, 2-2). É igualmente importante rever as técnicas de uso de faca e
bastão, tal como referido anteriormente e feito pelo Exército Americano (Thompson G.,
2011).
Além disto, este manual é apenas para o ensino de CCC no Exército, mas na Academia
Militar também é ensinado CCC à GNR pelo que, apenas com o uso deste manual, não é
possível ensinar tanto Exército como GNR na AM, sendo esta também outra razão para o
ensino de CCC na Academia ser diferenciado do resto de Exército e englobar técnicas extra
manual.
Por estas razões podemos afirmar que este manual, apesar de ser uma grande melhoria
em relação aos seus antecessores, também ele necessita de uma revisão e melhoria.
Após analisarmos as três disciplinas de combate ensinadas na AM, conseguimos chegar
à conclusão de que todas elas possuem falhas na sua adequabilidade para os militares e em
especial na AM, por isso vou agora expor mais algumas disciplinas de combate que poderão
ser introduzidas na AM.
2.4. Jiu-Jitsu Brasileiro/MMA
O Jiu-Jitsu Brasileiro ou BJJ “é uma arte marcial de origem japonesa que utiliza
essencialmente golpes de alavancas, torções e pressões para levar um oponente ao chão e
dominá-lo. Literalmente, jū em japonês significa “suavidade”, “brandura”, e jutsu, “arte”,
“técnica”. Daí seu sinónimo literal, “arte suave” (Gracie Magazine, 2017).
22
Este foca-se na ideia de usar a força de um indivíduo contra ele, permitindo assim que
um indivíduo mais leve consiga ganhar a um mais pesado e forte.
Relativamente à história do Jiu-Jitsu, de acordo com o site Gracie Magazine (2017) e
Gracie (2001), não é possível afirmar com exatidão a origem desta arte, mas é possível
afirmar que esta teve início nas escolas samurais do japão pois, tal como os militares de hoje
em dia, um samurai poderia, durante um combate, ficar sem a espada ou lança, necessitando
assim de um método de defesa sem armas mas, como estes lutavam de armadura, os golpes
de impacto tal como murros e pontapés eram pouco eficazes, sendo assim desenvolvido um
sistema com base em quedas e torções.
Por volta de 1870/1880 Jigoro Kano, o pai do Judo, adotou esta arte como um meio de
defesa pessoal devido à sua baixa estatura e físico, e após se tornar proficiente em vários
estilos de Jiu-Jitsu, concluiu que existiam vários problemas com o ensino da arte, sendo
estes, a impossibilidade dos alunos treinarem com a força máxima devido à letalidade de
algumas técnicas; o Jiu-Jitsu estava estruturado como uma “simples coleção de truques”; e
finalmente o ensino feito maioritariamente através de kata sendo que, ao longo dos tempos
se tinha perdido a parte prática das kata, tornando estas numa coreografia. Para colmatar
estes problemas, criou um novo método de ensino que se focou no sparring, tendo sido
forçado a retirar do Jiu-Jitsu algumas técnicas mais letais que não eram passíveis de praticar
em sparring com outro colega, tais como ataques aos olhos, puxar o cabelo, qualquer tipo
de golpes com os punhos e pernas, sendo apenas permitidas chaves aos cotovelos, criando
assim o Judo.
O Judo ganhou influência por volta de 1886, quando a polícia de Tokyo organizou um
torneio em que a arte vencedora seria escolhida para o treino dos seus membros, o que levou
a que várias academias de Jiu-Jitsu quisessem ter essa honra. Este torneio foi criado com um
conjunto e regras muito específicas em que só era válido projetar ou submeter o adversário,
sendo que o Judo foi então o vencedor do torneio apesar de na altura esta arte ter apenas
cerca de quatro anos, acabando assim com a era do Jiu-Jitsu clássico e tornando o Judo como
a arte marcial mais proeminente.
Foi então que Kano enviou para a América dois discípulos, Tomita e Maeda, os quais
realizaram uma demostração na Academia Militar de West Point, na qual foram desafiados
por um jogador de futebol americano de maior estatura do que eles, demostração esta que
correu mal tendo este ganho aos dois lutadores de acordo com as regras do judo.
23
Após isto, Maeda e Tomita separam-se, pois Maeda achou que esta tinha sido uma
derrota humilhante para o Judo, e tentando provar a eficácia da sua arte começou a lutar
contra campeões de outros estilos, desde wrestling até ao Boxe.
Tendo viajado por toda a América aceitando lutas profissionais, algo que era contra as
normas do judo, e usando técnicas que não eram permitidas no judo, chamou ao seu estilo
de Jiu-Jitsu. Ao longo dos anos foi ganhando combates contra vários oponentes de estilos de
luta diferentes por todo o mundo, sendo que este apenas tinha cento e sessenta e oito
centímetros e sessenta e oito quilos.
Carlos Gracie tendo visto uma demostração de Maeda no Brasil, em 1917, pediu ao seu
pai Gatão Gracie, amigo de Maeda, para este o ensinar, tendo este aceite.
Devido a isto surgiu o Jiu-Jiutso Brasileiro, tendo esta arte proliferando pela família
Gracie.
Carlos Gracie, continuou a tradição de Maeda, competiu numa luta sem regras chamada
de “vale-tudo”, em 1924, a qual ganhou. Também Helio Gracio o fez, tornando assim o BJJ
como uma arte vencedora em torneios de “vale-tudo”, aperfeiçoando a arte ao longo das
gerações.
Posteriormente e com o início do MMA e da criação do Ultimate Fighting
Championship (UFC) por Rorion Gracie, também aí o BJJ se tornou como uma arte de
referência, sendo que hoje em dia não existe nenhum lutador de MMA qua não saiba BJJ,
isto porque quase todos os combates acabam no solo. Independentemente do que um lutador
saiba fazer em pé, se cair no solo tem de pelo menos saber defender- se para não ser
submetido e levantar-se corretamente deste.
Hoje em dia, também o BJJ e o “vale tudo”/ MMA foram alterados para um conjunto
de regras e proibições de modo a proteger os praticantes e tornar o combate menos mortífero
e violento. É possível observar as vantagens inerentes à pratica de BJJ aquando os combates
eram verdadeiramente de “vale tudo”, e um dos lutadores não tinha noções de solo.
Tentando adequar esta arte para os militares, o Exército Americano e os Marines
utilizam sistemas de Combate Corpo a Corpo com base no BJJ devido à sua eficácia
comprovada ao longo dos anos, mas como dito por Blanton (2008), é um sistema de luta de
solo, o que traz várias desvantagens para os militares, desde a complexidade de
aprendizagem e ensino, à flexibilidade e ligeireza de movimentos necessária para a executar,
e sendo que um militar moderno poderá transportar mais de 30kg de equipamento, tornar-
se-á difícil realizar alguns movimentos mais complexos, e ainda o facto de o BJJ ser
extremamente vulnerável numa luta de um contra muitos, como pode ser o caso no campo
24
de batalha moderno. Outro motivo não menos importante é o facto de o BJJ hoje em dia
também ser um sistema de competição, o que elimina a letalidade da arte.
Não obstante, o ensino do BJJ a militares traz inúmeras vantagens quando combinado
com outras artes marciais, sendo impossível ignorar os benefícios que todo o trabalho de
solo num sistema de CCC oferece aos militares quer em técnicas de solo, quer em técnicas
de grappling, como no controlo de agressores tanto em pé como no solo (extremamente úteis
para a GNR) e de controlo, retenção e transição de armas (úteis para o Exército e para a
GNR).
Segundo um estudo feito por (Thompson G. , 2011) quando desenvolveu o MACP e o
SOCP no decorrer das operações no Afeganistão, e através de centenas de entrevistas a
militares que experienciaram CCC no Afeganistão, todos eles referiram que o combate tinha
envolvido grappling, mas não existiu nenhum relato de o combate apenas ter sido resolvido
com golpes (apesar de muitos terem tido golpes e grappling). Além disso, cerca de 30% dos
encontros envolvem disparos de armas, pelo que num ambiente de CQB em que todos os
intervenientes estão armados, o vencedor é quem melhor consegue controlar a arma e utilizá-
la contra o seu inimigo, sendo por este motivo que o sistema de CCC do Exército Americano
foi criado com base no grappling, tendo também influências de wrestling, judo, muay thay,
e mestres de armas como Marc Denny dos Dog Brothers12. O problema deste sistema, como
referido por Blanton (2008) e Singleton II (2012) é o facto de ser um sistema de solo por
isso tem as suas falhas que já foram acima referidas, motivo pelo qual Greg Thomson criou
em 2009 o sistema SOCP.
Com isto podemos afirmar que é imperativo adicionar técnicas de solo e grappling para
retenção e transição de armas no ensino de CCC do Exército e da GNR, e atualizar o atual
manual de CCC do Exército, mas não caindo no erro de criar um sistema com o solo como
base primária de luta.
2.5. FMA
As FMA (Filipino Martial Arts – Artes Marciais Filipinas) são também conhecidas
pelos nomes de Arnis, Eskrima13 ou Kali.
12 Dog Brothers são um grupo de lutadores de bastão, onde permitem lutas entre participantes de várias
artes marciais com recurso a armas, principalmente ao bastão. 13 “Eskrima comes from the Spanish word esgrima, which means “fencing”. In the Visayas, Eskrima
is the common name primarily referring to blade-based Filipino martial art (though not always these days as
stick has come into more popular use).” (Abenir, 2014, p. 7)
25
Os nomes Arnis e Eskrima são mais frequentes nas Filipinas, enquanto o nome Kali foi
divulgado nos Estados Unidos. Atualmente, nas Filipinas, o nome mais utilizado no Sul é
Eskrima e no Norte é Arnis. O nome Kali, dificilmente se encontra nas Filipinas. Por serem
Artes marciais multifacetadas e de várias influências, o nome FMA parece ser o que mais
cria consenso e melhor define o ecletismo das Artes Marciais Filipinas (Silva P. , 2014).
Artes Marciais Filipinas ou FMA são originárias das filipinas e englobam o uso de armas
de impacto, de corte, de arremesso, de projeção14 e combate de mãos vazias (Abenir, 2014).
As Filipinas ou República das Filipinas, (nome dado em 1543, pelo navegador Ruy
Villalobos, em honra do Rei Filipe II de Espanha), têm a particularidade de ter sido uma
colónia espanhola por mais de trezentos anos, devido ao seu posicionamento geográfico o
que as tornou um local de intensas trocas comerciais, migrações, imigrações e de constantes
ataques. Sofreram uma forte influência latina e asiática, na alimentação, na língua, na
religião (o único país asiático de maioria católica), na cultura, na arquitetura e, claro, nas
artes marciais.
De acordo com Silva P., (2014) a origem desta arte é algo incerta, pois existem poucos
documentos escritos anteriores ao século XX, provavelmente por grande parte dos mesmos
terem sido queimados pelos espanhóis e a prática da arte proibida pelos mesmos. Durante
muito tempo a tese principal foi a de que as FMA seriam uma arte de origem local, milenar,
treinada antes da chegada dos espanhóis e desenvolvida pelos indígenas. Contudo, esta teoria
nunca foi sustentada, sendo defendida principalmente por alguns filipinos locais e por
filipinos estabelecidos nos Estados Unidos.
Outra tese já mais comprovada é a de que os espanhóis ensinaram os filipinos na arte
de Esgrima, como se verifica através da leitura de alguns documentos conhecidos (inclusive
um documento oficial da Coroa espanhola, de um exame de Maestro de esgrima realizado a
um Filipino, de Manila). Também se tem conhecimento de que Espanha fez um grande
recrutamento militar nas Filipinas, tendo empregado população local como soldados pagos.
Outro facto conhecido foi o envio de padres guerreiros com a dupla missão de
evangelizar o catolicismo e ensinar as populações costeiras a defender-se de piratas e outros
invasores.
Este facto relacionado com a proibição do treino de artes marciais por parte do
Espanhóis durante o seu reinado, sob pena de morte, levou a que os nativos mascarassem a
14 Nas armas de arremesso e projeção incluem-se armas como o arco, armas de sopro e facas.
26
sua prática com danças ritualizadas e treino com paus/bastões. Os soldados filipinos após o
regresso a casa ensinavam aos filhos o ofício das armas e em específico da espada, usando
o bastão como método de treino para esta.
Este método de treino com o bastão deu origem a que as FMA, ao longo do tempo, na
procura de funcionalidade fossem obrigadas a adaptar e criar novas formas de combate que
se adaptassem ao uso de novas armas, num contexto civil, criando a sua especificidade no
trabalho com objetos civis adaptados ao combate, tais como o bastão (de vários tamanhos),
o machete (vulgo “catana”) a faca, o pau comprido e as mãos-vazias. Nas Filipinas as FMA
apesar de terem sofrido grande influência das artes militares da esgrima ibérica15, também
foram influenciadas pela América durante o período de 1898, (altura em que a Espanha e os
Estados Unidos da América assinaram o tratado de Paris, que levou a que a posse das
Filipinas passasse para os Estados Unidos) em 1946, onde após o término da 2ª Guerra
Mundial os Estados Unidos reconheceram, finalmente, a independência das Filipinas, com
o tratado de Manila. Foram também influenciadas pelo Japão durante 1942 e 1945, devido
aos acontecimentos da 2ª Guerra Mundial, tendo sido ocupadas por este.
Em 1970, em Stockton, na Califórnia, pelas mãos do grandemestre (GM) Angel
Cabales, abriram-se as primeiras escolas de Eskrima abertas a não filipinos, dando-se assim
início à divulgação das FMA.
Também GM Remy Presas e GM Ernesto Presas, decidiram modernizar o Arnis,
modificando o sistema de treino para um sistema mais pedagógico, lúdico e menos doloroso.
Ao observarem as artes japonesas e chinesas introduziram uniformes, sistemas de graduação
e formas padronizadas.
De acordo com Pedro Silva, sem termos fontes documentais suficientes, mas
analisando os movimentos e táticas encontradas nas FMA, podemos dizer que existem
influências chinesas, indonésias, japonesas e americanas, sendo estas mais visíveis no
trabalho de mãos-vazias. Aí, vê-se claramente a influência do Boxe ocidental, do Judo e do
Ju-Jutsu japonês, do Kung-fu chinês (sistemas do Sul) e do Silat (Indonésia).
As FMA chegaram a Portugal, com o GM “Manong” Carlos Pulanco, aluno de longa
data de Ernesto e Remy Presa. Também Pedro Silva começou o seu treino em Arnis, pela
mão do Mestre Rui Ramunni, em 2002. Em 2006 foi treinado pelo GM Ernesto Presas, até
ao falecimento deste.
15 Esgrima utilizada na Ibéria, mas também largamente difundida, com algumas ligeiras diferenças,
por toda a Europa ao longo dos séculos XVI e XIX
27
Entre 2008 e 2015 foi aluno do GM Carlos Pulanco e do Guro Vicente Batalla, sendo
atualmente aluno de Emin Sabovic16.
Também possui uma licenciatura em Psicologia Clínica e é treinador desportivo grau 2
pela Federação Portuguesa de Lohan Tao (FLT) e grau 1 pela Federação Portuguesa de Lutas
Amadoras (FPLA).
Após esta pequena resenha histórica, é possível observar que as FMA são originais na
sua abordagem, pois conseguiram ao longo do tempo e da sua evolução evitar o foco no uso
das mãos-vazias, ou seja substituir a arma pelas mãos-vazias, tal como foi empreendido por
praticamente todas as artes marciais atuais; manter o princípio de superioridade da arma
(lutar em superioridade e não em igualdade), ou seja, procurar sempre ter uma vantagem no
conflito; adaptarem-se a uma nova realidade, sem perder a funcionalidade (civil vs. militar);
acrescentar o que era favorável para o combate, “se funciona, passa a usar-se” e usar objetos
de uso comum para lutar.
“Em Portugal a FMA-P (FMA-Portugal) possui um sistema coerente assente em quatro
pilares: fundamentos, estratégia, táticas e validação. Assume que utiliza a tecnologia marcial
de um tempo antigo com as adaptações possíveis a um tempo moderno. Fruto de anos de
experiência, aprendizagem e pesquisa, utiliza um processo bem apoiado em diferentes
escolas, mestres e referências.” (Pedro Silva, 2017)
“Na prática, o seu trabalho estende-se nos seguintes focos, o combate com e sem armas
(excluindo as de fogo); contra um ou vários oponentes; diferentes armas de impacto e corte
(em relação a tamanho, peso e uso); contextos de combate assimétricos – não limitados por
regras e arma e contextos de combate simétricos – limitados por regras (duelo)” (Pedro Silva,
2017).
“Em relação ao contexto militar, as FMA (na forma como são abordadas pela FMA-P)
apresentam informação bem sistematizada e facilmente adaptada a operações civis e na parte
de utilização de armas de impacto e de corte.” (Pedro Silva, 2017)
Passando agora a observar as vantagens que esta arte traz aos militares, sendo
principalmente focada no uso de armas para combate e defesa, é útil para os militares na
medida em que estes devem dar primazia ao uso de todo o tipo de armas à sua
disponibilidade, incluindo a faca, o bastão ou a machete, ou qualquer outra arma de
16 Emin Sabovic nasceu na Suécia, e é ex-militar de carreira e especialista em marketing, para além de
possuir vários graus em diferentes artes marciais.
28
oportunidade, em vez de optarem pelo uso das suas próprias mãos como primeira escolha,
algo que é ensinado nas FMA (principio da superioridade da arma).
Outro motivo é o combate de um contra vários e de vários contra um, táticas ensinadas
há muito tempo pelos militares, com o uso de espada ou bastão, mas perdidas e substituídas
pelo aparecimento das armas de fogo, e que poderão voltar a ser usadas em cenários onde
não seja possível recorrer a armas de fogo, como por exemplo na GNR em que é utilizado o
bastão em manifestações ou motins ou até mesmo quando um militar ou uma parelha se
encontra rodeada por vários agressores. Tal como afirmado por Pedro Silva, quando
deparado com a questão “De que forma o seu estilo poderá contribuir para a formação dos
militares em situações de Combate Corpo a Corpo onde o uso da arma de fogo não se torna
possível?”, à qual ele responde que “No caso de o militar participar em missões civis, o uso
de bastão pode ser necessário (e aí podemos ajudar com a nossa especialidade) ” e “No caso
de missões em que o corpo-a-corpo é um risco possível, o uso de habilidades de mãos-vazias
e o uso de habilidades com a faca (procurando proteger ou criar espaço para utilizar a arma
de fogo, ou mesmo substituí-la).”
Outro motivo prende-se com o facto do ensino de FMA ser relativamente rápido pois,
como referido pelo Guro Pedro Silva “Com o nosso método, entre 30 a 40 horas de prática
seriam o tempo suficiente para o treino base, levando em conta um sujeito dito normal.” se
bem feito e estruturado, onde muitas das técnicas ensinadas em FMA não são de origem
filipina, mas sim Ibérica e Europeia, uma vez que os filipinos foram treinados no uso da
espada pelos espanhóis e usados na sua armada. Ora, se estas técnicas eram ensinadas por
militares da altura é natural que sejam de fácil ensino e adequadas para estes, isto porque os
militares da época tal como os de hoje não possuem muito tempo disponível para treino,
sendo por isso que as técnicas têm de ser bem escolhidas e ensinadas.
Outro motivo é que, ao contrário do Boxe, Judo e Jiu-jitsu, esta arte não tem regras
limitativas, mas possui competição/duelo17, bem como defesa pessoal com o uso de armas
principalmente, mas também com as mãos vazias. Todas as técnicas ensinadas na FMA-
Portugal (FMA-P) foram testadas em full contact e adaptadas ou para competição/duelo
(contextos de combate simétricos) ou para defesa pessoal (contextos de combate
assimétricos), através de táticas defensivas muitas vezes retiradas de antigas táticas militares
com o uso da espada e adaptadas para a realidade dos dias de hoje. Na FMA-P “Acreditamos
17 O Duelo é um contexto de combate 1 vs. 1, em que as regras estão estabelecidas à partida. Não pode
ser confundido com defesa-pessoal. (silva, 2017)
29
que as Artes marciais são o que são – artes da guerra – e que a defesa-pessoal é a sua versão
civil e o duelo e competição a sua forma de recriação.” (Silva P. , 2017)
Um defeito desta arte quando ensinada a militares é que, tal como afirmado por Pedro
Silva, não prevê o uso de armas de fogo, nem transições entre armas de fogos, se bem que o
uso de faca e posicionamento desta no corpo, bem como o acesso a esta é muito semelhante
a uma pistola. “No entanto, certos exercícios de agressividade, de sobrevivência em contexto
de inferioridade, de trabalho de equipa e de atitude mental pode ser transportado do nosso
treino para a área militar, mas com armas que não as de fogo (porque isso não treinamos).”
Outro defeito é também o trabalho de solo um pouco limitado, e não prevê mais uma
vez o uso e retenção de armas de fogo no solo, apenas de faca ou bastão que poderá ser
adaptado para outro tipo de armas.
Por estas razões, o ensino de FMA-P aos militares é uma mais-valia, mas também esta
arte por si só não completa a 100% as necessidades e características que uma disciplina de
CCC deve conter.
2.6. Krav Maga
O Krav Maga pode ser caracterizado como “um sistema híbrido de combate e de defesa
pessoal, de origem israelita, desenvolvido por Imi Lichtenfeld.” (KM360, 2015)
“O Krav Maga (que em hebraico significa "combate próximo" ou "combate de
contacto") resulta num sistema único que, ao evoluir num contexto singular (que o afasta da
definição clássica de "arte marcial"), tornou-o livre da rigidez, tradições e dogmas que
caracterizam os sistemas de combate tradicionais. O seu carácter singular advém do facto de
ser um sistema aberto e em constante evolução e esta é uma das suas maiores vantagens em
relação a outros.” (KM360, 2015)
De acordo com KM360, (2015) e Cheung, (2001), Imi Lichtenfeld nasceu a 26 de maio
de 1910 em Budapeste num ambiente em que o desporto, a lei e educação era muito
respeitado, isto também devido ao seu pai, Samuel Lichtenfel, que, para além de ser
halterofilista de circo, wrestler e inspetor-chefe no corpo de polícia de Bratislava, também
era dono do ginásio Hercules onde ensinava técnicas de defesa pessoal.
Imi, inspirado pelo pai, tornou-se desde muito cedo um grande atleta, tendo ganho em
1928 o Campeonato da Juventude Eslovaca de Luta, em 1929 o mesmo campeonato, agora
no escalão sénior em duas categorias de peso diferentes e, ainda no mesmo ano, consagrou-
se também como campeão nacional de Boxe e nos campeonatos internacionais de ginástica.
30
Também entre 1936 a 1940, Imi consagrar-se-ia como um dos mais importantes
lutadores europeus, colecionando medalhas e prémios.
Durante os anos 30, a atmosfera em Bratislava começou a mudar, propagando-se as
ideias antissemitas e, com a ascensão do nazismo, o antissemitismo e os movimentos radicais
antijudaicos assolaram as sociedades dos países da Europa Central. Foi então que Imi se
envolveu com um grupo de jovens judeus, cujo objetivo era disturbar as atividades
antissemíticas em que alguns grupos eram apoiados por poderes políticos, iniciando assim
uma luta contra estes grupos que atacavam a comunidade judaica em Bratislava. Imi ficou
então como líder deste grupo de jovens, em que a maioria tinha um histórico em boxe,
wrestling e halterofilismo tal como ele.
Entre 1936 e 1940 esteve envolvido em muitos combates de rua decorrentes de protestos
contra o poder político, e foi então que este se apercebeu das diferenças entre combates de
rua sem regras e combates de competição, decidindo então fundir todo o seu conhecimento
como atleta, com os ensinamentos do pai e com os conhecimentos aprendidos na rua, para
mais tarde dar origem ao que viria a ser o Krav Maga civil.
Em 1940, perseguido pelo governo, Imi sai de casa e embarca no último navio de
refugiados para escapar aos nazis.
Durante dois anos, Imi esteve ao serviço do exército Britânico na “Legião Checa” onde
serviu durante a 2ª Guerra Mundial, no Líbano, Síria, Líbia e Egipto, o que o levou a refinar
ainda mais as suas competências.
Em 1942, quando dispensado, foi-lhe autorizado, a seu pedido, que emigrasse para
Israel, o que fez com que Isaac Sadeh (oficial comandante da Haganah) e Musa Zohar
(instrutor chefe do treino físico da Palmach), após ouvirem histórias da juventude de Imi em
Bratislava e repararem nas suas capacidades em defesa pessoal, o recrutassem para treinar
os seus homens.
Imi treinou Kapap18 durante dois meses, que era a disciplina de Combate Corpo a Corpo
existente nas unidades de forças especiais da Haganah, a Palmach e Palyam (Gross, 2010).
Durante este período e até 1948 como o uso de armas de fogo era algo muito reduzido
pois estas estavam proibidas, Imi e os restantes instrutores de Kapap desenvolveram o seu
estilo de Combate Corpo a Corpo para acomodar estas necessidades, tendo por base o uso
de mãos vazias.
18 KAPAP é um acrónimo que significa “Krav Panim el Panim, que se traduz por “face-to-face
combat” (Nardia, 2008).
31
Em 1948, com a criação do estado de Israel e da Israel Defense Forces (IDF), Imi foi
convocado para ser instrutor de treino físico em que fazia parte de um grupo de oito
instrutores de Kapap da IDF.
Entre 1948 e 1958 Imi foi nomeado instrutor chefe de atividade física e Kapap-Krav
Maga19.
Foi então em 1958 que o termo Kapap foi completamente substituído pelo termo Krav
Maga, mas ainda sem grandes mudanças no seu ensino. Na década de 60, antes de se
reformar em 1964, Imi introduz o termo defesa 360, que passa a aparecer nos documentos
oficias da IDF na década de 60.
Em 1964, Imi reforma-se do Exército e passa a ensinar civis. Foi então que este começou
a alterar o Krav Maga para acomodar a necessidades dos civis que, como já foi referido, se
manteve praticamente inalterado desde o seu tempo como Kapap na Haganah até a década
de 60 quando Imi decide criar a versão civil (Gross, 2010).
Imi abriu duas escolas, uma em Netanya (cidade onde viveu) e outra em Tel Aviv, e
começou assim a ensinar civis, tendo criado um sistema de graduação por cintos e realizando
o treino com kimono de judo para obter a aprovação das outras artes marcais, algo que não
existia quando este ensinava no Exército.
Mais tarde, Imi arrepende-se da sua escolha e decide voltar a retirar os cintos e o
kimono, usando assim apenas níveis de aprendizagem e calças pretas com t-shirt branca
como fardamento.
Durante este tempo, apesar de reformado, Imi continuou a trabalhar com o Exército
como consultor para questões de segurança.
Em 1972, iniciou-se o primeiro curso de formação de instrutores civis credenciados por
si e pelo Ministério da Educação de Israel no instituto Wingate e, em 1978, Imi funda a
Israeli Krav Maga Association com o objetivo de disseminar o sistema e transmitir os seus
valores. Imi manteve-se como Presidente da IKMA até ao fim da sua vida.
A partir de 1981, Imi começa a sair de Israel e a divulgar o Krav Maga pelo mundo com
a criação de curso de instrutores vindos da Europa, Estados Unidos e América do Sul.
Em 1995 Imi cria a Interacional Krav Maga Federacion e morre a 8 de janeiro de 1998,
em Netanya com 87 anos.
19 Entre 1948 e 1958 os termos Kapap e Krav Maga eram usados em documento oficias da IDF como
sinónimos e, apesar do nome Krav Maga ter aparecido em 1948 com a criação da IDF, não existiu nenhuma
mudança significativa nas técnicas ensinada até 1958 (Gross, 2010).
32
A grande diferença entre o Krav Maga militar e o civil ensinado por Imi é que este após
sair do Exército teve mais liberdade para desenvolver o sistema e difundi-lo, isto porque as
bases do Kapap e subsequentemente do Krav Maga são jiu-jitsu/judo, boxe, e combate de
faca e bastão, e de todas as técnicas disponíveis para escolhas, só algumas, as melhores e
mais eficazes dessas disciplinas foram escolhidas para o ensino dos militares. O currículo de
técnicas foi refinado e melhorado ao longo do tempo para adequar-se às necessidades dos
militares, devido ao pouco tempo disponível para treino e para se obter a máxima eficácia
técnica. E como é possível observar nos documentos e manuais da IDF poucas alterações
ocorreram durante o período de Imi como instrutor, sendo que as alterações mais
significativas ocorreram depois de 1964 quando Imi decide ensinar a civis. Ora se o currículo
de Krav Maga civil é muito mais extenso que o militar e com o histórico de Imi de boxe,
wrestling e judo para além do seu treino em kapap, exatamente as disciplinas que criaram o
Krav Maga a razão para este programa ser mais extenso na altura que Imi o ensinava era que
“now that it was being taught to civilians there was a need for more material, and far less
for practical reasons. The system worked fine for the military for more than 20 years without
any additions. And in fact when I examine military Krav Maga manuals as late as 1973
almost a decade after civilian Krav Maga started the curriculum is identical in 90% to 1964,
1960 and even 1953.” (Gross, 2010). Com isto podemos afirmar que o treino de Krav Maga
para os militares não pode ser igual ao Krav Maga para civis, é necessário uma melhor
escolha das técnicas de modo a adequar estas às suas necessidades, pois não existe tempo
para muitas variações da mesma técnica como é ensinado aos civis, ou seja não se justifica
devido ao pouco tempo disponível para treino ensinar várias defesas para o mesmo ataque
nem várias maneiras de realizar o mesmo ataque, basta ensinar uma que funcione bem e que
seja mais fácil de executar e de aprender, tal como foi feito desde muito cedo na IDF, só
quando Imi saiu do Exército é que este expandiu o Krav Maga e aumentou o seu leque de
técnicas.
Com esta história podemos afirmar que o Krav Maga é uma disciplina de Combate
Corpo a Corpo que se adequa às necessidades dos militares, mas é preciso ter cautela, pois,
o Krav Maga civil não é o mesmo que o militar, e foca-se muito mais em defesas com o uso
a mãos vazias do que com o uso de armas, inclusive a arma de fogo, e os militares hoje em
dia dificilmente se vão encontrar em situações em que vão estar sem qualquer arma, seja ela
de fogo, corte ou impacto, tal como acontecia no tempo de Imi e do Kapap.
Outro motivo é que o Krav Maga ensinado hoje em dia não é o mesmo que na altura de
Imi na IDF, a vertente militar do Krav Maga foi esquecida e substituída pela civil, e mesmo
33
que se ensinasse a versão militar da década de 1960 esta também não se ia adequar às
necessidades de hoje em CAU, porque este tipo de tipologia de missão não existia nessa
altura em Israel e para além disso também a IDF alterou os seus manuais várias vezes ao
longo dos anos.
Outra deficiência do Krav Maga é o trabalho de chão que é quase nulo, e como já foi
referido acima, e tendo por base os manuais atuais de CCC tanto do US Army (FM 3.-
25.150) e dos Marines (MCRP 3-02B) estes focam os seus manuais modernos por base no
trabalho de solo e de grappling devido às necessidades de hoje de retenção de arma, por se
combater em espaços muito confinados e onde o Inimigo pode aparecer de qualquer lado
por muita vezes ser civil e não militar, ou seja é muito difícil de manter uma distância de
segurança do inimigo, e a tipologia de ataques modernos são que estes são muito mais
discretos e repentidos ao contrário de antigamente onde o inimigo era fácil de ser
identificado.
Outro motivo é que o uso de armas de corte e impacto por parte do Krav Maga também
constitui algumas falhas quando comparado com este mesmo trabalho feito nas FMA, isto
mais uma vez possivelmente com a introdução da versão civil onde o foco é quase só o uso
das mão vazias sendo que o uso de uma arma tal como referido por Pedro Silva e pelo Mestre
João Louzeiro é que estas oferecem uma vantagem muito grande tanto ao tempo de treino
necessário como a probabilidade de sucesso quando comparado com o uso de mão vazias, e
sendo que só se deve recorrer ao uso de mão vazias quando o uso de uma arma não é possível,
sendo que antigamente o foco das artes marciais era o uso de armas e só quando estas eram
proibidas tal como nas Filipinas é que o treino passava para as mãos vazias ou para o uso de
armas inferiores, por isso mesmo é que desde sempre os militares procuraram obter armas
melhores que os seus inimigos devido à vantagem que estas fornecem, e à sua capacidade
de dissuadir o inimigo mesmo sem se ter de recorrer ao uso desta, só o facto de as ter pode
ser suficiente para dissuadir qualquer ação por parte do inimigo ou agressor. Por estas razões
é o treino de mão vazias e em especial mãos vazias contra armas se torna um pouco utópico,
sendo que a probabilidade de sucesso é muito reduzida contra um ataque bem planeado. O
Mestre João Louzeiro afirma também que “Na sua génese o KM surge como sistema de
mãos nuas, ou seja, todos os seus princípios foram construídos para que o seu praticante se
possa defender não tendo a possibilidade de utilizar qualquer arma. No entanto defende
também que qualquer objeto pode ser uma arma e que deve ser utilizado se aumentar a
capacidade de defesa ou ataque da vítima. Podemos então assumir vários patamares do
34
sistema e dar ao praticante também a capacidade e os instrumentos para utilizar uma arma,
mas sempre partindo do pressuposto que inicialmente não temos acesso a qualquer arma.”
2.7. Síntese
Com a análise de diversas disciplinas de combate ou defesa pessoal chegamos então à
conclusão de que nenhuma destas por si só consegue cobrir por completo as necessidades
dos militares sendo então necessário atualizar a disciplina atual de CCC ou criar uma nova
disciplina com bases de várias, em especial destas referidas. Uma possível solução que
depois teria de ser analisada é a alteração da disciplina de CCC já ensinada que tem por base
o Krav Maga, para um Krav Maga mais moderno e que se adeque mais aos militares e às
missões de hoje, não às da altura de Imi. Uma possível hipótese é a parceria com a KM36020,
que se originou da separação da FPKM e tem por base as técnicas ensinadas na FPKM, mas
com alterações significativas para uma maior probabilidade de sucesso nas defesas e ataques,
após o estudo com especialistas de outras artes tal como Alexander Zhelezniak e Noah Gross
criadores do sistema de combate com armas Armed Combat and Tactics (ACT) e após a
criação de um programa completo de trabalho de solo específico para situações de rua criado
pelo autor e por outro instrutor da KM360, e da melhoria do trabalho de armas onde o Mestre
João Louzeiro “defende também que qualquer objeto pode ser uma arma e que deve ser
utilizado se aumentar a capacidade de defesa ou ataque da vitima podemos então assumir
vários patamares do sistema e dar ao praticante também a capacidade e os instrumentos para
utilizar uma arma…”.
Esta parceria poderia ser realizada, tal como afirmado pelo Mestre João Louzeiro
quando deparado com a questão “Recomendaria o ensino do seu estilo aos militares? De que
forma e como?” à qual responde “Recomendaria com toda a certeza, para mim a melhor
forma é pelo carácter, como já mencionado, de fácil adaptação do KM, seria perceber em
primeiro lugar quais as necessidades e lacunas dos próprios militares. Analisar situações
reais, onde os mesmos sentiram dificuldades. A partir daí elaborar um plano com as técnicas
adequadas, feitas à medida para o próprio exército ou equipa.”
20 Entidade formadora pela Direção-Geral do Emprego e das Relações de Trabalho (DGERT) desde
20 de fevereiro de 2017 nas áreas de desenvolvimento pessoal, formação de professores e formadores de áreas
tecnológicas e desporto.
35
Outra arte a ter em conta é a FMA pois o trabalho de uso armas sejam elas improvisadas,
facas, ou bastões curtos ou longos está muito à frente do trabalho realizado em Federações
ou Associações de Krav Maga devido a um estudo contínuo e de longa data em uso de armas.
Por fim também o trabalho de solo deve ser cuidadosamente estudado e introduzido
devido às vantagens já explicadas que fornece, uma hipótese para a sua introdução pode ser
mais uma vez com parceria com a KM360 que tem um programa de solo já criado, e com a
FMA-P que também trata do uso, acesso e retenção de armas no solo que facilmente pode
ser adaptado para pistola ou espingarda.
Sendo assim é possível afirmar com exatidão que se deve apostar no ensino de só uma
disciplina de CCC, criada pelo Exército com parceria com entidades civis de modo a integrar
todas as disciplinas numa só, e a reduzir o currículo de técnicas o mais possível de modo a
torná-las fáceis de aprender e de usar no menor tempo possível.
No próximo capítulo vamos então explicar como é que o ensino desta disciplina deve
ser feito de modo a rentabilizar as aulas de CCC e a promover uma automatização do gesto
técnico.
36
CAPÍTULO 3. METODOLOGIA DE ENSINO
Após analisarmos as várias disciplinas que poderão constituir as bases para o ensino de
uma disciplina de CCC, iremos justificar a necessidade de aumentar a carga horária de ensino
e de adequar o método de ensino aos militares.
Como é possível observar, Silva J. A. (2013), já afirmou na resposta à questão derivada
“Que alterações se poderão ou deveriam efetuar nos programas da Academia Militar para
adequar a atual formação em defesa pessoal ao desempenho de funções dos oficiais dos
quadros permanentes?”, que “os resultados obtidos permitem responder que a aposta deveria
ser num sistema progressivo de ensino, onde a prática do Combate Corpo a Corpo teria
necessariamente de ser estendida por mais tempo, com o mínimo de 2 anos ou até ao máximo
de 5 anos, durante a frequência da Academia Militar” (Silva J. A., 2013, p. 43).
Ao levantar a sua primeira hipótese, “A formação em defesa pessoal incrementa e
desenvolve capacidades aos oficiais dos quadros permanentes”, também afirma que
“podemos concluir que a hipótese é válida, no entanto o atual tempo de prática só permite a
aquisição de capacidades mais básicas e elementares que só serão mais desenvolvidas
aumentando o tempo de prática.”
Além disso, ao responder à sua questão central, “A formação na Academia Militar, na
área dos Desportos de Combate, está organizada numa lógica progressiva de incremento e
desenvolvimento de capacidades e adequação destas à realidade do desempenho de funções
dos Oficiais dos Quadros Permanentes?”, afirma que “dos resultados obtidos podemos
constatar que, apesar das recentes alterações feitas ao antigo programa, a formação necessita
ser ajustada. Através do aumento do tempo de prática, bem como na aposta num sistema
progressivo com base numa só disciplina de combate.” Referindo ainda “que a formação
atual não assenta numa lógica totalmente progressiva de incremento de capacidades, visto
que o facto de todos os anos os alunos iniciarem a prática de uma disciplina diferente não
permite o desenvolvimento gradual das capacidades pretendidas. Relativamente à adequação
da formação recebida à realidade, conclui-se que esta não está completamente ajustada.”
(Silva J. A., 2013, p. 44)
Assim, e sabendo que não existiram mudanças significativas no ensino das disciplinas
de combate desde 2013 até hoje, podemos afirmar que este método de ensino ainda não se
encontra adequado à realidade do desempenho de funções dos Oficiais dos Quadros
37
Permanentes, pelo que, resta saber quanto tempo leva um praticante de uma arte a conseguir
obter proficiência num gesto técnico, e qual o melhor método de ensino para o fazer.
3.1. Estrutura e planeamento das aulas
Analisando o mais atual manual de CCC do Exército (nível 1), o capítulo 3 incide sobre
a Fase Preparatória/Aquecimento, começando por explicar o que é o aquecimento e em que
é que este consiste: “O aquecimento é uma preparação psicológica, fisiológica e motora do
indivíduo para o exercício que irá efetuar, fazendo com que este esteja melhor preparado
para o esforço, conseguindo assim ter uma melhor performance e prevenir possíveis lesões
(Exército Português, 2013, p. 25).
O aquecimento consiste assim no aumento da temperatura interna, da lubrificação das
articulações, ativação da circulação sanguínea, estimulação progressiva do aparelho
cardiorrespiratório, preparação psicológica (aumento da concentração, motivação, atenção e
vigilância), etc.” (Exército Português, 2013, p. 25)
De seguida, refere os efeitos práticos do aquecimento, e posteriormente refere a
estrutura do aquecimento, que deve começar com mobilização articular, aquecimento geral
e aquecimento específico.
Na mobilização articular, refere que “todas as articulações devem ser trabalhadas
ordenadamente de cima para baixo ou vice-versa (cabeça, membros superiores, tronco,
membros inferiores), sendo que a intensidade e amplitude dos movimentos deve aumentar
gradualmente. As articulações que serão mais utilizadas na sessão (seja ela de lazer/ treino
ou competição) e as de maior probabilidade de lesão deverão ser mais
estimuladas/trabalhadas. Deve ter uma duração aproximada de 2 a 3 minutos.” (Exército
Português, 2013, p. 26)
O aquecimento geral “deve possibilitar o funcionamento do organismo como um todo.
Eleva a Frequência Cardíaca e a temperatura corporal, através de exercícios globais que
utilizem grandes grupos musculares. A intensidade dos exercícios deve ser aumentada
gradualmente. Deve ter uma duração aproximada de 5 a 10 minuto.” (Exército Português,
2013, p. 26)
O aquecimento específico “distingue-se do aquecimento geral, já que se concentra nas
partes neuromusculares do corpo, que serão utilizadas nos exercícios físicos subsequentes e
mais intensos, ou seja, consiste em exercícios que se assemelham tecnicamente aos que serão
38
executados na atividade posterior. Qualquer movimento que envolva movimentos similares
ao que será praticado, mas com nível de intensidade reduzido, é considerado como
aquecimento específico. Ainda podem ser realizados exercícios que, embora não similares
aos movimentos que serão executados em seguida, promovem o aquecimento localizado
(trem superior, inferior, tronco), promovendo desta forma um redireccionamento sanguíneo
para estas regiões, tornando-as mais irrigadas e supridas de oxigénio. Deve ter uma duração
aproximada de 10 a 15 minutos.” (Exército Português, 2013, p. 26)
Neste capítulo, são ainda referidas algumas preocupações gerais, nomeadamente que
“um aquecimento geral deve ser realizado antes do específico, sendo que a intensidade deve
aumentar gradualmente”, “deve durar o tempo necessário para concretizar os objetivos do
aquecimento (aproximadamente 10 a 20 minutos) ”, “ter em conta que vários fatores
influenciam o aquecimento: a idade, o género, a temperatura ambiente, condição física do
indivíduo, a modalidade, etc.” e que “no fim do aquecimento devem ser realizados
alongamentos de baixa intensidade. Certos atletas têm necessidade de alongar após o
aquecimento enquanto outros não se sentem bem com o alongamento antes do exercício
físico mais intenso. Quanto a esta matéria, deve ser dada a possibilidade de os atletas fazerem
o que sentem mais necessidade, tanto a nível de intensidade como de grupos musculares
mais necessitados.” (Exército Português, 2013, pp. 27,28)
No capítulo 9 – Programas – refere que “com vista a um melhor desempenho orgânico
geral e consequentemente um melhor aproveitamento em relação aos objetivos propostos,
bem como reduzir o risco de lesões, uma sessão de CCC deve ser dividida em três fases:
preparatória (esquema de aquecimento, com uma duração mínima de 10 minutos, destinado
a promover uma ativação geral e específica), fundamental (esquema principal das sessões,
durante o qual são executadas as técnicas de CCC) e final (esquema destinado a restabelecer
o equilíbrio funcional, retorno à calma, com uma duração de aproximadamente de cinco
minutos) ” (Exército Português, 2013, p. 121), ou seja, dividindo a estrutura de uma aula em
três fases: preparatória, fundamental e final.
Relativamente ao tempo de ensino, este manual divide o programa em 1A (elementar)
com 16 sessões devidamente estruturadas e em 1B (complementar) com 7 sessões, dando
um total de 23 sessões com um mínimo de um tempo de formação.
Segundo o manual do curso de instrutor da FPKM, a aula é dividida em quatro fases,
introdução, preparatório (pré-aquecimento e aquecimento), parte principal (tema ou temas)
e parte final.
39
Na introdução pretende-se um “aumento dos níveis de concentração, motivação e
vontade dos praticantes” e “explicação dos objetivos da sessão de treino bem como os
métodos e os exercícios a atingir” (FPKM, 2011, p. 16).
A fase preparatória está dividida em pré-aquecimento e aquecimento geral (aquecimento
articular ao nível da flexibilidade) e específico (movimentos específicos do Krav Maga com
ou sem parceiro) que procura “ativar o organismo, tanto ao nível muscular e articular como
também orgânico (função respiratória, circulatória, metabólica, energética), como a nível
mental (nível de motivação e excitação, ótimas para realizar tarefas de treino e combate)”
(FPKM, 2011, p. 16).
Na parte principal pretende-se “cumprir as tarefas principais, exigindo as capacidades
especiais aos praticantes: disciplina, vontade, concentração, memória e execução eficiente
das ações técnicas em resposta aos problemas colocados pela situação de treino” (FPKM,
2011, p. 16). Os dois objetivos desta parte são “o ensino/aprendizagem de novos
comportamentos (procedimentos técnicos ou comportamentos táticos) – (temas novos) ” e o
“aperfeiçoamento e desenvolvimento de comportamentos já apreendidos ou estabilização da
eficiência/eficácia das ações motoras – (temas de revisão) ” (FPKM, 2011, p. 17), ou seja,
nesta parte pretende-se ensinar técnicas novas e/ou aperfeiçoar e rever técnicas já
ministradas anteriormente.
Na parte final, pretende-se a “redução do trabalho, de forma a elevar o organismo a um
estado o mais próximo possível do seu estado inicial, criando condições favoráveis para a
recuperação” (FPKM, 2011, p. 17) e pode estabelecer-se através de divertimento, diminuído
a tensão emocional atingida na parte principal, recuperação com alongamentos ou relaxar
para repor os valores fisiológicos próximo do normal ou avaliação com uma avaliação
sucinta da forma como correu a sessão.
Relativamente à estrutura da aula, estes afirmam que a aula deve ter uma duração
mínima de uma hora até um máximo de uma hora e trinta minutos, sendo que a fase do
aquecimento/preparatório pode variar entre quinze a vinte e cinco minutos (com um tempo
médio de cinco minutos para o pré-aquecimento, dez minutos para aquecimento e dez
minutos para a condição física) a parte principal com uma duração de quarenta minutos
(vinte minutos para uma nova técnica e vinte minutos para revisão) e a fase final/retorno à
calma entre cinco a dez minutos (de acordo com o anexo B).
40
Outro exemplo é a KM360 que, de acordo com a pedagogia das aulas de Elisa de la
Cruz, as divide em Macrociclo, Mesociclo e Microciclo, adaptando estes ciclos de (Pedro J,
2008) e (Platanov, 2011) para a prática de Krav Maga pela KM360.
Um Macrociclo é, segundo Platanov, 2001 citado em Pedro J, 2008, a unidade de
planificação a longo prazo que envolve a colocação em forma máxima para a participação
numa competição desportiva e, segundo Cianti (2007) citado em Pedro J (2008), o período
mínimo para alcançar a forma física máxima, sendo que este recomenda a periodização
destes por temporadas. Este pode conter vários Mesociclos dentro de si.
Um Mesociclo insere-se dentro de um Macrociclo e é, segundo Platanov (2011) citado
em Pedro J (2008), uma etapa do processo de treino relativamente homogénea, com uma
duração de três a seis semanas, e permite sistematizar esse processo em função do objetivo
principal do período ou etapa.
Segundo Cianti (2007) citado em Pedro J (2008), este define-o como o tempo necessário
(quatro a seis semanas) para se obter de um modo considerável uma determinada capacidade
física. Este pode conter vários Microciclos dentro de si.
Um Microciclo insere-se dentro de um Mesociclo e é, segundo Platanov (2011) citado
em Pedro J (2008), uma série de sessões realizadas durante vários dias que asseguram a
construção conjunta dos objetivos de uma etapa específica de formação. Para ele, este
período varia entre três a quatro dias até dez a catorze dias.
Segundo Cianti (2007) citado em Pedro J (2008), este é o tempo mínimo que permita
alcançar algum resultado com o treino. Para este, o tempo de duração de um Microciclo
depende do momento e objetivo da temporada de treino.
Uma sessão é a unidade estrutural de um Microciclo e, segundo Platanov (2011) citado
em Pedro J (2008), é uma unidade estrutural independente do processo de preparação.
Cada sessão deve estar orientada para cumprir um objetivo concreto e deve ser
estruturada em aquecimento, parte inicial e parte final/retorno à calma.
Na vertente de Krav Maga, a KM360 e Elisa de la Cruz definem que a durabilidade de
um Macrociclo é um ano ou até a um exame de graduação, sendo este composto por vários
Mesociclos, que por sua vez são compostos por vários microciclos e estes por várias aulas.
41
Segundo Elisa de la Cruz21 e a KM360, ao adaptar a estrutura de Elements System a uma
aula de Krav Maga, esta deve ter de duração entre uma hora a uma hora e quinze minutos
de tempo prático, devendo estar estruturada da seguinte forma: aquecimento,
técnica/técnicas, combate/treino físico, técnica/técnicas (nova ou de revisão), combate/treino
físico, revisão das técnicas realizadas na aula e alongamentos.
O aquecimento tem como objetivos incrementar a temperatura corporal, sensibilidade
propriocetiva e a estabilidade central, afinar os padrões dos movimentos e o foco mental
para o treino, detetar possíveis ajustes necessários no treino previsto, prevenir lesões,
aumentar o rendimento, sem provocar fadiga metabólica, psicológica ou muscular. Deve ter
a duração de dez a quinze minutos e ser realizado na seguinte ordem: pré-mobilidade
articular, cardio e cardio coordenativo, ativação dinâmica e aquecimento específico.
A pré-mobilidade é a capacidade para deslocar um segmento ou parte do corpo dentro
de um arco de movimento o mais amplo possível, mantendo a integridade das estruturas
anatómicas implicadas (ROM- Range of Motion). Tem como objetivos preparar as
articulações para esforços posteriores, aumentar a temperatura do corpo e articulações,
aumentar o ROM, prevenir lesões e ajudar a cuidar de lesões existentes e sincronização dos
padrões primários do movimento.22
O cardio e cardio coordenativo tem como objetivo, para além do já referido na pré-
mobilidade, ativar e preparar o sistema respiratório (aumento da frequência respiratória) e
ativar e preparar o sistema cardiovascular (aumento da frequência cardíaca). O coordenativo
visa desafiar os praticantes na execução de habilidades motoras coordenativas e
sincronização dos padrões primários do movimento.
A atividade dinâmica é realizada através de exercícios de mobilidade, compensatórios
ou core. A mobilidade é um trabalho específico para aumentar o ROM, trabalhando por
séries e repetições. Os compensatórios têm o objetivo de prevenir lesões trabalhando os
músculos opostos aos que serão usados na nossa mobilidade. Por exemplo, o facto de se
estar em guarda de combate e de desferir socos durante muito tempo vai originar, ao longo
do tempo, alterações nos ombros e consequentemente uma postura curvada para frente que
terão de ser compensadas com exercícios para as costas.
21 Elisa de la Cruz é a responsável técnica pela metodologia e planeamento das aulas da KM360, é
licenciada em Ciencias de la Actividad Física y Deporte (INEF- Madrid), personal trainer, técnica especialista
na Metodologia Elements System, instrutora de crossfitt level 1, certificada pela NSCA (Nacional Strength and
Conditioning Association), instrutora de Krav Maga e de Jiu-Jitsu. 22 São estes puxar, empurrar, andar/avançar, agachar, baixar, girar e levantar.
42
Core é a habilidade neuromuscular para controlar a postura e o movimento dos
segmentos em atividades físicas. Este tem como objetivos evitar quedas e melhorar o uso
das extremidades, a manutenção do equilíbrio estático e dinâmico, a prevenção de lesões nos
membros inferiores e superiores, além de melhorar a recuperação de lesões nos membros
inferiores e superiores, prevenir a rutura do ligamento cruzado anterior, melhorar o
amortecimento nos saltos, a dor lombar e a postura corporal.
O aumento da intensidade visa preparar o sistema cardiovascular e respiratório para um
trabalho mais intenso.
O aquecimento específico visa a ativação musculo-articular e neuronal em função do
trabalho posterior que formos realizar de forma progressiva.
Passando ao grupo das técnicas ensinadas, estas devem ser novas e adequadas aos alunos
fazendo parte do planeamento (Microciclo, Mesociclo e Macrociclo).
O combate/treino físico, tem como objetivo trabalhar o cardio do praticante e estimular
o sistema cardiovascular e respiratório, sendo que, pode ser feita com base em combate com
luvas e proteções, trabalho de treino físico base (flexões, agachamento, burpees, etc.) e
trabalho de revisão com indução de stress ou aumento da velocidade de execução.
A segunda, técnica /técnicas, podem ser também elas novas ou de revisão (neste caso
podem ser induzidas dificuldades acrescidas e/ou aumento do stress de modo a promover a
automatização mais rápida do gesto).
O combate/treino físico seguinte é realizado nos mesmos moldes do anterior.
A revisão das técnicas realizadas na aula deve ser feita de modo a promover a memória
e automatização destas para que o praticante não esqueça, por exemplo, a primeira técnica
aprendida na aula.
Os alongamentos/retorno à calma devem ter a duração de cinco minutos, realizados em
duas séries de dez segundos para cada exercício, exceto quando é realizado trabalho de
flexibilidade (que não o mesmo dos alongamentos), cujo tempo de execução deve aumentar.
Os alongamentos aceleram a recuperação, previnem lesões (levando os músculos, tendões e
ligamentos à sua posição inicial depois de os termos usado, para evitar que fiquem mais
curtos) e diminuem o ritmo cardíaco e respiratório.
Relativamente à estrutura da aula, quando comparadas, é possível observar que são
todas semelhantes, sendo que a KM360 tem um método de planeamento a longo prazo, não
43
presente na FPKM e uma estrutura de treino físico/planeamento de aula mais estruturada e
pensada. Equiparando ao atual manual de CCC pode afirmar-se que este se encontra bem
organizado relativamente à estrutura da aula, podendo, no entanto, ser alvo de melhorias.
3.2. Fase de um processo de aprendizagem
O manual do IX curso de Instrutores da FPKM divide o processo de aprendizagem da
técnica-desportiva em três fases: a fase da generalização ou coordenação do movimento, a
fase de concentração do processo de aprendizagem do gesto técnico e a fase de
automatização ou da estabilização.
A fase da generalização ou coordenação do movimento divide-se em duas fases: a
compreensão da tarefa motora e a coordenação global do movimento.
A compreensão da tarefa motora engloba quatro aspetos metodológicos, a introdução
do gesto técnico, a sua explicação verbal, a exemplificação/demonstração do gesto e o
começo da prática. Esta fase tem como objetivos “a criação de um estado mental positivo
que relacione na memória dos praticantes, o nome da técnica (terminologia) a uma imagem
motora e uma experiência anterior”, “motivá-los para aprendizagem de um determinado
gesto técnico evidenciando a sua importância no referido contexto da modalidade” e
“direcionar a atenção dos praticantes através da explicação verbal clara e sucinta” (FPKM,
2011, p. 12).
A fase da coordenação global do movimento é realizada a seguir à compreensão da
tarefa motora, onde o praticante vai realizar as primeiras tentativas de execução do gesto
técnico. Esta fase origina muitos erros e instabilidades nas primeiras execuções, que podem
derivar por exemplo de erros na aplicação de força, pausas entre partes dos movimentos que
não as corretas, execuções demasiado rápidas ou lentas ou falta de precisão nos movimentos.
As principais causas para estes erros/instabilidades, de acordo com a FPKM, poderão
ser a fraca receção e elaboração das informações sobretudo por parte dos analisadores
cinestésicos, a imperfeição do programa de movimentos e a insuficiente regulação da
execução motora, ou seja, estes erros derivam da falta de treino do praticante.
Após as primeiras execuções o praticante vai rever a técnica de acordo com as suas
experiências passadas, do feedback que recebe em consequência dessas mesmas execuções
e do feedback que o instrutor providencia.
44
Esta fase termina quando o praticante conseguir executar o gesto técnico de forma
próxima à demonstração realizada pelo instrutor.
A fase de concentração do processo de aprendizagem do gesto técnico é posterior à fase
de coordenação global, dura mais tempo que a anterior e até à fase de coordenação fina, e
tem como objetivo aperfeiçoar o gesto técnico (através da sua prática) após a sua
compreensão e execução correta.
A terceira fase de automatização ou da estabilização situa-se entre a fase da coordenação
fina até à estabilização do movimento mesmo em condições difíceis, e é expressa pela
“grande exatidão e consciência do movimento”. É nesta fase que o praticante consegue
automatizar o gesto técnico e realizá-lo sob situações de stress de forma correta sem ter de
pensar neste.
Relativamente a estes conceitos, Zehr (2008), afirma que para se atingir um nível de
proficiência tal em que não é preciso pensar nos movimentos para os executar de forma
eficaz, correta em situações de elevado stress, e sem antecipar os movimentos esperando
com uma mente calma a ação do agressor, ao qual ele chama de Mushin ou mushin no shin23,
é necessário passar por três fases, tal como referido pela FPKM, as quais ele descreve como
cognitiva, associativa e automática.
A fase cognitiva é a aquela em que um praticante apenas está a apender a técnica. Neste
nível o praticante tem de pensar em como esta técnica tem de ser realizada para a poder
realizar, ou seja, esta fase envolve um grande esforço cognitivo direcionado para os
movimentos na sequência correta. Por exemplo, num pontapé frontal, esta sequência seria
levantar o joelho, puxar para cima o tornozelo, pontapear estendendo o joelho, puxar os
dedos do pé para cima e para trás ao bater no alvo, e os movimentos opostos para desfazer
o golpe. Um praticante nesta fase é incapaz de lidar com pequenos detalhes e realizar este
gesto técnico em diferentes contextos.
Na fase associativa o praticante já se vai concentrar numa abordagem mais refinada para
a sua técnica. Nesta fase, em vez de se preocupar só com os movimentos da técnica como
por exemplo levantar o pé corretamente para executar um pontapé, já se vai preocupar com
outros fatores como o timing do movimento e em aperfeiçoar a sua técnica. Por exemplo, no
caso do pontapé frontal, nesta fase o praticante já vai ter em atenção o timing certo para
23 Este termo é originário das Artes Marciais Japonesas, e significa “no mind” ou “mind of no mind”,
o que se traduz em se ser capaz de realizar as tarefas em mão sem distrações.
45
levantar os dedos do pé, o timing correto par estender o joelho, ou seja, vai tentar tornar o
seu pontapé o mais eficiente possível. Um praticante permanece nesta fase até desenvolver
a sua técnica corretamente, independentemente do tempo que demore.
Na fase automática, o praticante já não vai ter em atenção os movimentos a executar em
cada técnica, a sua performance vai ser sempre muito consistente e pode ser adaptada a
diferentes contextos, sendo assim possível para este executar a técnica corretamente, sem
pensar na sua execução em várias situações diferentes.
3.3. A importância da automatização e do OODA loop
OODA loop ou tempo de reação humano, segundo Johnson (2014) e McKay (2014), é
um acrónimo criado pelo Coronel John Boyd nos anos 1950. John Boyd foi um piloto na
força aérea americana durante a guerra da Correia, que usou este conceito para treinar outros
pilotos. Este treino resultou numa média de 10:1 kill ratio para os seus alunos, sendo que
este acreditava que, mesmo em desvantagem, um piloto competente conseguia vencer o seu
oponente atacando o processo mental deste.
O OODA loop é um conceito muito complexo, como pode ser observado no anexo C, o
qual era explanado por Boyd em seminários de quarenta horas, pelo que neste trabalho se
explica uma versão mais simplificada e focada na defesa pessoal.
OODA loop significa Observe, Orient, Decide and Act, e pode ser usado para fornecer
uma vantagem ao defensor ou ao atacante através da quebra do processo de decisão.
Na primeira fase – observação – o nosso cérebro vai processar a informação recebida,
ou seja, esta fase centra-se em receber informação de inputs externos, o que se traduz no
facto de que, para efetivamente conseguirmos reduzir o tempo de reação, devemos estar
atentos ao nosso meio envolvente e conseguir perceber a ameaça antes de esta acontecer.
Existem dois problemas decorrentes desta fase que são: nunca conseguimos captar toda a
informação, apenas uma parte desta, o que nos deixa com informação incompleta ou até
mesmo incorreta (Heisenberg’s Uncertainty Principle24), e, por outro lado, podemos ser
inundados por tanta informação que não vamos conseguir distinguir a importante da menos
24 Este princípio demonstra que não é possível determinar em simultâneo a velocidade e posição de
uma partícula ou corpo, apenas uma das duas, pois ao observar uma das duas os valores da outra tornam-se
mais incertos. Aplicado este princípio para o OODA loop, Boyd explica que à medida que nos focamos a
observar um determinado acontecimento, maior é a probabilidade de não observarmos bem outro, logo a
incerteza desse acontecimento.
46
importante. Na defesa pessoal um exemplo disto é tomar atenção ao nosso meio ambiente
de modo a nos apercebermos de quando um agressor se aproxima e nos aponta uma pistola.
A segunda fase – orientação – pode ser descrita basicamente como orientar a mente para
o que está a acontecer e é composta por diversos fatores que vão afetar a forma como nos
vamos aperceber da situação, tais como hereditariedade e experiências passadas, etc. Nesta
fase criamos um modelo mental do que se está a passar e de como vamos reagir.
Esta fase é influenciada principalmente por dois filtros, a negação e o filtro emocional.
Voltando ao exemplo do agressor com a pistola, a negação manifesta-se quando uma pessoa
se depara com o agressor e não conseguindo acreditar no que lhe está a acontecer, negando
a realidade, bloqueia. O filtro emocional exprime-se quando uma pessoa recorre a emoções
para lidar com a realidade, por exemplo “Porque é que isto me está a acontecer? É o meu
aniversário!” ou “Por favor não deixes que isto aconteça à minha família!”, bloqueando e
perdendo segundo preciosos.
Algo que ajuda bastante nesta fase é uma pessoa já ter experimentado situações
semelhantes antes, seja na vida real como no treino, por isso é que é importante criar no
treino situações reais.
A terceira fase – decisão – a nossa mente vai examinar todo o leque de opções, de modo
a escolher a mais correta com a informação disponível. Aqui verifica-se a lei de Hick, que
defende que, quantas mais opções se tiver, mais tempo vamos demorar a decidir. Nesta fase
é importante definir que não existe nenhuma resposta correta pois o mais certo é não termos
obtido a informação completa ou correta na fase de observação. Por exemplo, no caso do
agressor com pistola, se tivermos treinado várias defesas contra arma de fogo diferentes para
o mesmo estímulo, a nossa mente vai levar mais tempo a escolher a correta (a menos que a
resposta esteja automatizada/ Operant conditioning).
Na última fase – ação – é a aplicação da decisão tomada na fase anterior.
Com este ciclo, podemos explicar o porquê do tempo de reação humana ser tão
demorada e a importância da automatização dos gestos técnicos. Quando um praticante
atinge a fase de automatização, já não irá realizar as fases de orientação e decisão, pois estas
são processos internos do OODA loop porque, segundo o processo chamado “operant
conditioning”25, em que um determinado estímulo é ligado a uma determinada resposta, ou
25 “Training method for bringing a simple response to a stimulus to near-reflex speed” (Miller, 2016,
p. 208).
47
seja, para um determinado ataque é realizada uma determinada defesa sem se pensar nela,
evitando assim a segunda e terceira fase do OODA loop.
Um método para usar este ciclo como vantagem do defensor é, no caso do agressor com
a pistola, em que este vai estar à espera de uma determinada resposta e, se essa resposta não
corresponder ao pretendido, este vai reiniciar o OODA loop, ou seja, se um agressor apontar
uma pistola à nossa cabeça e nos pedir a carteira, vai estar à espera de uma resposta, mas se
essa resposta for muito diferente daquilo que ele espera, por exemplo “Eu só tenho sumo de
tomate!” ou “Porque é que os meus pés são azuis?” ele vai pensar no assunto e reiniciar o
ciclo, dando assim tempo para reagirmos, retirar a cabeça da linha de fogo e agarrar a arma
sem que ele consiga ter tempo de reagir.
No caso dos agressores, também estes usam este método, por exemplo, uma técnica
comum é um agressor perguntar as horas à vítima, iniciando assim o OODA loop desta e,
quando estamos na fase de Act e vamos ver as horas, ele aponta uma faca sem que nos
tenhamos apercebido da sua intenção; outro exemplo é quando fazem diversas questões a
uma vítima de modo a reiniciar o seu OODA loop a cada questão, permitindo a aproximação
sem que esta se aperceba.
3.4. Métodos a utilizar pelo instrutor para promover a automatização
Relativamente à metodologia de ensino das técnicas, o manual de CCC (nível 1) não
refere nenhum método de ensino, mas de acordo com a FPKM, “o ensino da técnica, ou do
gesto desportivo implica uma metodologia adequada em que é necessário conhecer e
reconhecer no praticante as características das várias fases” (FPKM, 2011, p. 12).
Relativamente aos métodos a utilizar para que um praticante atinja a fase de
automatização, tanto a KM360 como a FPKM utilizam métodos semelhantes ou idênticos e
afirmam que, para que o praticante consiga atingir a fase de automatização, é imperativo que
o instrutor utilize uma “série de meios iniciais de ensino” que segundo FPKM (2011), são
introdução do gesto técnico, exemplificação/demonstração do gesto técnico, explicação
verbal do gesto, construção do gesto em espelho, prática do gesto técnico entre praticante,
correção do gesto e repetição do gesto.
Para proporcionar um melhor ensino para que o praticante atinja a fase de
automatização, é necessário que o instrutor siga a ordem destes “meios de ensino” e que os
use de forma correta.
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Na introdução do gesto técnico é necessário atrair a atenção de todos os praticantes,
posicionar o grupo de praticantes e adotar de uma terminologia correta do gesto técnico que
se pretende ensinar.
Na exemplificação/demonstração do gesto técnico deve ter-se em atenção
primeiramente a execução correta do gesto técnico e a velocidade correta de execução numa
situação real para captar a atenção dos praticantes, esta deve ser realizada várias vezes (duas
ou três) e em diversos ângulos (dependendo da técnica), sempre do mesmo lado (por
exemplo sempre com o braço direito em todos os ângulos), e de seguida deve voltar a ser
realizada a uma velocidade mais reduzida também várias vezes, em diversos ângulos e
sempre do mesmo lado.
A explicação verbal deve ser realizada em simultâneo com a demonstração lenta, e
evidenciar um conjunto restrito de instruções sobre o gesto, não devendo, no entanto, ser
muito rica em pormenores, apenas apresentando os mais relevantes, objetivar um estado
mental positivo e se possível deve ser relacionada com aprendizagens anteriores.
Na construção do gesto técnico em espelho, esta deve ser realizada pelo instrutor em
espelho de frente para os alunos de modo a que estes o vejam como se ele fosse um reflexo
deles num espelho, ou seja, se a técnica foi demonstrada com o braço direito, os praticantes
no espelho vão utilizar o braço direito e o instrutor o esquerdo, de modo a que este seja o
espelho dos praticantes. Ao realizar o espelho, deve-se fracionar a técnica pelos seus tempos,
executar os tempos, repetindo um determinado número de vezes e adicionar o próximo
tempo repetindo o processo. No final deve-se realizar a técnica num só tempo, sem pausas.
Neste “meio de ensino” a KM360 afirma que não utiliza tantas vezes porque é mais útil para
o praticante treinar com um parceiro e tentar fazer por si, com um alvo. Sendo que apenas,
se utiliza esta metodologia para técnicas difíceis em que o grosso da classe não está a
acompanhar bem os movimentos na fase cognitiva.
Na prática do gesto técnico entre praticantes deve-se ter em atenção a velocidade de
execução e a formação de um ritmo padrão da execução do gesto.
Na correção, o instrutor deve ter um profundo conhecimento do gesto técnico, deve
conseguir estabelecer objetivos realistas, hierarquizar os erros do praticante de modo a que
este corrija apenas um de cada vez do pior para o menor erro. Deve igualmente ter uma
atitude correta e positiva de modo a que o praticante não se sinta incapaz e inferiorizado (por
exemplo em vez de dizer que o praticante está a fazer algo mal, pode apenas apontar os
49
aspetos a melhorar), após uma correção individual e a execução correta por parte do
praticante, deve incentivá-lo (por exemplo “está melhor”, “boa, isso mesmo”, “agora sim”,
“perfeito”, “correto”) e, se existir um erro comum a toda a turma, deve interromper a prática
e corrigir a turma como um só.
Durante a repetição do gesto técnico, o instrutor deve procurar criar condições
favoráveis para o sucesso do praticante sem erros na técnica para uma gradual aproximação
dos valores padrão (demonstração). Deve também, à medida que o praticante melhora o
gesto técnico, adaptar as aptidões técnicas deste a situações mais realistas, introduzindo
situações mais stressantes psicologicamente, dificuldades adicionais e prática
competitiva/combate ou ataques reais.
Relativamente ao método para “proporcionar um bom ensino”, o manual do curso de
instrutor da FPKM afirma que, para se ser um bom instrutor/treinador, é necessário conhecer
a “técnica e tática da modalidade”, os “princípios básicos da teoria e metodologia de treino”
e as “regras fundamentais do comportamento humano”. Para além disso uma das “tarefas
fundamentais prende-se com a forma como ensinamos, ou seja, saber ensinar e transmitir
corretamente todas estas informações, tais como:” a necessidade de “ter conhecimento (do
que se ensina, dos erros mais frequentes e das correções mais adequadas)” e de “como
comunicamos (fornecer aos praticantes a informação de que precisam, no momento oportuno
e de forma a que entendam o que lhes transmitimos)” (FPKM, 2011, p. 19).
3.5. Tempo necessário para atingir a proficiência
Sobre o tempo necessário para atingir a fase de automatização para uma determinada
técnica, é muito difícil conseguir afirmar com exatidão o tempo necessário, pois varia de
praticante para praticante, da dificuldade da técnica em si, da proficiência do instrutor e do
método de ensino. No entanto, existe um estudo feito por (David T. Burke, 2011), com o
objetivo de medir o tempo necessário para ensinar uma série de técnicas de artes marciais
até à proficiência, onde foram recrutados quinze voluntários, sem qualquer experiência
prévia de artes marciais ou defesa pessoal, para aprenderem vinte e uma técnicas diferentes
incluindo posições defensivas, bloqueios, ataques com os cotovelos, golpes com as palmas
das mãos, golpes com dedos nos olhos, golpes com as pernas e um estrangulamento na
carótida (mata-leão). As aulas foram ministradas por dois cintos negros, com um histórico
de Aikido, Tae Kwon Do, Shotokan e Combate Corpo a Corpo militar, num total de quarenta
50
e cinco sessões de quarenta e cinco minutos, onde os praticantes eram filmados
semanalmente e avaliados por investigadores na sua proficiência para cada técnica. As
técnicas eram avaliadas pelo número médio de sessões de treino necessárias para atingir a
proficiência numa técnica específica.
Este estudo partiu do pressuposto que o tempo necessário para treinar alguém em artes
marciais varia de duas semanas para vários anos, dependendo do curso, do que se ensina e
do nível de proficiência desejado.
As aulas começavam com cinco minutos de aquecimento e alongamentos, e
posteriormente um dos cintos negros ensinava a classe toda e o outro circulava pela turma e
tirava dúvidas ou corrigia algo que necessitasse de correção. Durante as aulas, quando um
praticante fizesse o papel de agressor era-lhe dito para atacar primeiro devagar, e aumentar
a intensidade aos poucos. Nas técnicas de bloqueio os instrutores atacavam os praticantes de
modo a tornar o treino mais realista.
Nos pontapés, golpes de cotovelos, mãos, estrangulamentos e golpes aos genitais os
praticantes tiveram acesso a bonecos de treino específicos e realistas. Todas as semanas os
praticantes eram filmados a executar as técnicas e estes vídeos eram avaliados por um cinto
negro que não conhecia esta experiência.
Neste estudo foram necessárias vinte e nove horas para treinar os alunos em vinte e um
movimentos de artes marciais e defesa pessoal, sendo os golpes mais difíceis de aprender a
cotovelada à retaguarda, os golpes com dedos nos olhos e os bloqueios.
No final da experiência, concluiu-se que são necessárias em média vinte e sete a trinta
e oito ponto três sessões para obter proficiência numa técnica, conforme o anexo D, sendo
que nenhum praticante obteve proficiência em todas as técnicas, nem existiu nenhuma
técnica em que todos tenham atingido a proficiência.
Um fator importante de referir neste estudo foi o facto de as técnicas mais fáceis como
a posição defensiva e a libertação de um agressor sentado, ministradas no início da
experiência e nas quais os alunos obtiveram proficiência mais rápido, foram menos treinadas
nas sessões seguintes, de modo a utilizar o tempo para treinar aquelas onde estes tinham
mais dificuldades. No entanto, no teste final da experiência, estas técnicas obtiveram uma
percentagem de falha de 60% e de 50% respetivamente, o que demonstra a importância de
rever as técnicas, para que estas não sejam esquecidas e que, apesar dos alunos terem obtido
51
proficiência na execução destas técnicas, ainda não deveriam ter chegado à fase de
automatização, encontrando-se assim na fase de concentração.
Com este estudo é possível afirmar que são necessárias aproximadas trinca e oito horas
de treino para se atingir a proficiência em vinte e uma técnicas.
Comparando este estudo ao manual de CCC nível 1 (e sem considerar a dificuldade
acrescida de algumas técnicas deste manual quando comparadas às da experiência, o que irá
aumentar em muito o tempo de prática necessário, especialmente em defesas contra armas,
onde uma falha significa a morte do praticante), sendo o nível 1A composto por dezasseis
sessões com cerca de cem técnicas, que terão de ser aprendidas em dezasseis horas, e o nível
1B com quarenta e sete técnicas para aprender em sete horas, verifica-se que não é possível
atingir a proficiência. Face ao exposto, podemos concluir que, para aprender cem técnicas
com o tempo médio para se atingir a proficiência (e não a automatização), seriam necessárias
aproximadamente cento e oitenta horas para o nível 1A e mais oitenta e cinco horas para o
nível 1B, com um total aproximadamente de duzentas e sessenta e cinco horas, muito longe
das vinte e três horas propostas no programa.
Outro exemplo disto é a semelhança deste manual com programa técnico civil e militar
de Krav Maga da FPKM e da KM360 (mais extenso que o da FPKM), sendo que este manual
(nível 1) engloba técnicas de cinto negro, e que o tempo mínimo para se atingir o cinto negro,
apesar de variar, são necessários em média oito anos de treino contínuo. Neste sentido, se
um praticante treinar duas horas por semana (o que é insuficiente) para atingir as duzentas e
sessenta e cinco horas são necessários cerca de dois anos e meio de treino, o que irá
corresponder ao cinto laranja ou verde, pois um cinto negro deverá de ter no mínimo
oitocentas e trinta e duas horas de treino.
Transpondo isto à Academia Militar, como já foi referido, a adoção de uma modalidade
diferente por ano não traz vantagens para o militar e muito menos o torna apto a usá-las de
forma automatizada num caso real, devido ao tempo necessário para se atingir esta fase.
Se o objetivo for dar a conhecer ao militar as várias modalidades existentes então está
correto, mas se a intenção for torná-lo capaz de se defender e aos seus camaradas não é o
método mais adequado, pois este não vai ser capaz de o fazer de forma correta, com o tempo
disponível para treino. Zehr, (2008) adressa este problema, comparando o ensino de vários
idiomas ao ensino de artes marcias, onde afirma que aprender um língua nova, requer tempo
e dedicação, pelo que, apesar de ser possível aprender muitas línguas em simultâneo, o mais
52
comum seria não ser capaz de ter uma conversação decente em nenhuma das línguas mas,
caso se dedicasse só a uma conseguiria falá-la corretamente. O mesmo se passa com as artes
marcias ou deportos de combate/defesa pessoal, em que um praticante que estude muitas
delas em simultâneo, não será capaz de ser hábil em nenhuma, a menos que dedique muito
tempo a cada uma, e muito menos conseguirá chegar à fase de automatização.
Como o tempo para o ensino dos militares é limitado, é imperativo optar por uma só
disciplina e melhorar a disciplina de CCC, realizando um estudo das técnicas mais adequadas
para o ensino ao Exército e à GNR.
Atualmente na AM só se pratica CCC durante um ano letivo com uma sessão semanal
de uma hora e quarenta minutos, o que não será o indicado pois, como afirmado por Elisa
de la Cruz e KM360 a duração das aulas deve ser de uma hora a uma hora e quinze minutos
nunca excedendo uma hora e trinta minutos (FPKM), e sendo que num ano letivo, de acordo
com o plano curricular de DP/CCC na Academia Militar, só existem aproximadamente trinta
e uma aulas de uma hora e quarenta minutos cada. Contabilizando o total das aulas, equivale
a um total de aproximadamente cinquenta e duas horas que, apesar de muito superior às vinte
e três horas propostas no manual de CCC, ainda se encontra muito longe das duzentas e
sessenta e cinco necessárias para se obter proficiência.
Por estes motivos, conclui-se que apenas um ano de uma disciplina de combate não é
suficiente para atingir a proficiência necessária e muito menos a automatização.
Observando agora a doutrina Americana, o manual MCRP 3-02B, divide o seu
programa em cintos, sendo que, para o cinto tan são necessárias no mínimo vinte e sete ponto
cinco horas, para o grey são necessárias no mínimo vinte horas de treino mais cinco de
revisão, no cinto green são necessárias no mínimo dezassete ponto sessenta e cinco mais
oito horas, no cinto brown são necessárias no mínimo dezoito ponto cinco mais quinze horas,
no cinto negro são necessárias no mínimo vinte ponto sete mais vinte horas o que perfaz um
total de cento e cinquenta e duas horas mínimas de treino, também muito longe das vinte e
três horas do nosso manual e de um ano letivo na AM (cinquenta e duas horas) (USMC,
2011).
O US Army com o manual FM 3-24.150 divide o seu treino em duas fases, a primeira
em cinco sessões de duas horas por semana, num total de dez horas, e a segunda em onze
horas de treino semanal num total de dez semanas com posterior treino de cinco horas
semanais para manutenção e revisão, o que perfaz um total de cento e vinte horas mínimas
53
de treino (sem contabilizar as horas semanais posteriores de manutenção e revisão), também
este valor muito longe das vinte e três ou cinquenta e duas horas.
Observando agora as entrevistas feitas ao Mestre João Louzeiro e ao Treinador Pedro
Silva, quando deparados com a questão “Quanto tempo (horas) acha que seriam necessárias
para um instruendo militar automatizar de forma correta uma técnica e conseguir utilizá-la
em contexto real? E para se tornar proficiente numa disciplina de defesa pessoal de modo a
se consiga defender da maioria dos ataques?”, o Mestre João Louzeiro afirma “Acho que em
6 meses de formação, com aulas 3x por semana de 2 horas cada, seria suficiente para
automatizar o básico. Depois continuar o treino pelo menos em 1 aula por semana de 2 horas
cada”, o que traduzido em horas são aproximadamente cento e cinquenta e duas horas para
o treino base e continuando depois a treinar, sendo que este treino base será semelhante ao
programa 1A do nosso manual, que segundo o estudo iria demorar aproximadamente cento
e oitenta horas.
Pedro Silva afirma que “com o nosso método, entre 30 a 40 horas de prática seriam o
tempo suficiente para o treino base, levando em conta um sujeito dito normal. Para se tornar
proficiente numa das nossas áreas de treino cerca de 100 horas de prática (mas claro,
dependendo do tipo de área de treino)”, sendo que as cem horas seriam apenas para uma das
três áreas, uso de faca e armas semelhantes, bastão e armas semelhantes ou mãos vazias.
Ao observarmos estes números e com as entrevistas realizadas por (Silva J. A., 2013) é
possível afirmar com certeza que as cinquenta e duas horas de CCC na Academia Militar e
as vinte e três propostas no manual não chegam para obter proficiência no gesto técnico e
muito menos para atingir a fase de automatização. Não obstante, o trabalho realizado na
elaboração deste manual e pelo nosso Major Moura com alunos da Academia Militar não
deve ser menosprezado, pois está muito bem realizado para o tempo disponível de vinte e
três e cinquenta e duas horas, respetivamente.
Uma possível solução para este problema seria aumentar o número de sessões no manual
e ao adotar um modelo de ensino na Academia Militar com um planeamento estruturado e
composto por Macrociclo, Mesociclo e Microciclo, sendo que com duas sessões de cerca de
uma hora e quarenta minutos por semana, perfazendo um total de cento e quatro horas num
ano, e introduzindo apenas uma disciplina de CCC durante todo o percurso de um aluno na
AM com uma sessão semanal de cerca de uma hora e quarenta minutos, totalizando duzentas
e oito horas em quatro anos, um número mais próximo do pretendido. Se em vez de uma
sessão se fizessem duas, em cerca dois anos e meio atingiríamos o número pretendido, em
54
três anos teríamos cerca de trezentas e doze horas e em quatro anos cerca de quatrocentas e
dezasseis horas.
3.6. Como planear um possível modelo para o ensino de CCC ao longo dos anos
Sobre um planeamento possível para AM, a primeira coisa a saber é o número de anos
disponíveis para o ensino, se é um ou quatro, pois como provado um ano não chega.
Posteriormente é necessário definir as avaliações a realizar, podendo definir um Macrociclo
até uma avaliação, assumindo que realizamos duas avaliações num ano podemos então criar
dois Macrociclos por ano.
Os Macrociclos aprendidos anteriormente devem ser revistos e colocados na parte de
revisão das aulas dos Macrociclos seguintes, ou seja, o primeiro Macrociclo deverá ser
repetido no segundo Macrociclo, no terceiro Macrociclo, etc. e o segundo Macrociclo deve
ser repetido no terceiro Macrociclo, etc., sendo que, o nível de dificuldade das técnicas do
primeiro Macrociclo ao ser realizado como revisão no segundo Macrociclo deve conter um
aumento stress e dificuldade de modo a promover a automatização. Outra particularidade
dos Macrociclo nos desportos de combate, é que estes constituem bases para os restantes,
sendo que, ao realizar uma defesa contra faca ou um agarre noutro Macrociclo também se
está a realizar e rever golpes aprendidos nos Macrociclo anteriores.
Os Mesociclos serão compostos normalmente por um mês, mas pode ser mais ou menos
consoante o número de técnicas do Macrociclo, tendo em atenção que este não deve
ultrapassar seis semanas. Um método utilizado para promover a automatização e rever as
técnicas, no caso de cursos onde o tempo disponível é reduzido, passa por fazer revisões,
onde se deve rever tudo o que foi dado nesse Mesociclo, na última semana do Mesociclo
antes da avaliação.
Os Microciclos vão depender do número de aulas por semana, sendo que uma sessão
pode constituir um Microciclo, no caso de só existir uma sessão por semana, ou um
microciclo ser composto por várias sessões. Nas sessões deve-se optar por ensinar técnicas
novas numa primeira fase, e posteriormente deve-se introduzir técnicas de revisão com
dificuldades acrescidas.
Uma hipótese para ganhar tempo de prática nas aulas e motivar os cadetes na AM poderá
ser na estrutura da aula, onde numa aula civil se realiza treino físico, não se realizar nas aulas
de CCC na AM uma vez que os cadetes já têm treino físico obrigatório noutra disciplina,
55
promovendo assim a parte técnica e a motivação dos cadetes, pois estes já poderão estar com
um desgaste físico e mental não produtivo para a aprendizagem, sendo que o foco das aulas
de CCC deverá ser a técnica e não a parte física. O que se poderá fazer será trocar o tempo
de treino físico por combate, revisões com dificuldades acrescidas ou situações de stress
numa fase mais avançada, o que também faz aumentar o ritmo cardíaco e respiratório, com
treino específico.
Outra hipótese é realizar também um aquecimento mais ligeiro sem movimentos de
treino físico base, como flexões, agachamentos, saltos, etc., e realizar logo cardio/cardio
coordenativo e aquecimento específico e sem realizar a ativação dinâmica que já é trabalhada
em outras disciplinas de treino físico. O cardio pode ser realizado com atividades/jogos
específicos dos desportos de combate.
56
CAPÍTULO 4. METODOLOGIA
O presente trabalho foi realizado de acordo a com a norma de execução permanente
(NEP) da AM 522/1ª de 20 de janeiro de 2016, com a publicação “Orientações
Metodológicas para a elaboração de trabalhos de investigação” do Instituto de Estudos
Superiores Militares, de novembro de 2014, bem como de diversa documentação específica
referida na bibliografia e ao longo deste Trabalho.
Esta investigação científica teve por base o modelo de raciocino hipotético-dedutivo,
com uma abordagem mista.
A abordagem mista corresponde ao facto de neste trabalho se ter usado técnicas de uma
abordagem qualitativa, por existirem conceitos subjetivos não passiveis de ser traduzidos em
números, sendo então numa primeira fase através do enquadramento teórico, análise
documental e revisão da bibliografia, e entrevistas realizadas de modo a responder a questões
mais sensíveis e específicas, uma ao Mestre João Louzeiro e outro ao Treinador Pedro Silva,
para se “alcançar um entendimento mais profundo e subjetivo do objeto de estudo, sem se
preocupar com medições e análises estatísticas” (Vilelas, 2009 citado em Instituto de estudos
superiores militares, 2014, p. 18).
Numa segunda fase foi usada uma abordagem quantitativa, pois foi tomado como ponto
de partida um estudo quantitativo de (David T. Burke, 2011), comparando os resultados
desse estudo com as entrevistas aos dois Mestres, com os dados concretos e numéricos do
atual manual de CCC (nivel 1) e com o estado atual do ensino de CCC na AM, pelo qual
este trabalho foi “…baseado na observação de factos, acontecimentos e fenómenos
objetivos, que existem independentemente do investigador.” (Freixo, 2014 citado em
Instituto de estudos superiores militares, 2014, p. 18). Outro motivo para o uso desta
abordagem foi a formulação de hipóteses e a tentativa de generalizar os dados obtidos para
todo o Exército.
Este TIA iniciou-se com a Questão Central (QC) “Que alterações poderão ser
implementadas no atual modelo de ensino de Combate Corpo a Corpo ministrado na
Academia Militar para proporcionar uma formação sustentada e contínua para os futuros
Oficiais dos Quadros Permanentes do Exército e da GNR?”
Para sintetizar, e de forma a delimitar e estruturar o estudo por forma a responder à
questão acima referida, foram colocadas as seguintes Questões Derivadas:
57
QD1: “O método atual de ensino de Combate Corpo a Corpo na Academia Militar é
adequado às necessidades dos alunos?”
QD2: “Será relevante o ensino das disciplinas de Judo e de Boxe aos alunos da
Academia Militar nos moldes atuais?”
QD3: “Qual o tempo necessário para um praticante de Combate Corpo a Corpo obter
um nível de proficiência adequado às possíveis necessidades de aplicação no desempenho
das suas funções como futuro Oficial dos Quadros Permanentes?”
QD4: “Será relevante existir uma diferenciação no ensino de Combate Corpo a Corpo
consoante o ensino seja para um aluno do Exército ou da GNR?”
QD5: “Como deverá ser estruturado o programa de ensino de Combate Corpo a Corpo
ao longo dos diferentes anos do curso de um aluno da Academia?”
Na realização desde trabalho foram então colocadas duas hipóteses26 que constituem
possíveis respostas às questões acima referidas, tendo estas de ser testadas e verificadas
como verdadeiras ou falsas, de modo a dar resposta à questão central. As hipóteses colocadas
foram as seguintes:
H1- É necessária uma formação contínua e adequada ao longo dos anos do percurso
escolar de um aluno da Academia Militar para que as técnicas e princípios ensinados possam
ser devidamente mecanizados pelos alunos.
H2- O atual modelo de ensino de Artes Marciais e de Combate Corpo a Corpo na
Academia Militar não consegue transmitir aos alunos as técnicas e princípios desejados, nem
se adequa às necessidades do desempenho das suas funções ou no seu quotidiano.
26 Segundo Huot, 2002, p. 53, citado em Instituto de Estudos Superiores Militares, 2014, “a hipótese
de investigação é a resposta temporária, provisória, que o investigador propõe perante uma interrogação
formulada a partir de um problema de investigação”.
58
CAPÍTULO 5. MÉTODOS E MATERIAIS
Na realização deste trabalho foram usados dois métodos de recolha de informação o
primeiro foi através da análise documental e o segundo foi através de entrevistas.
A análise documental constitui-se “…como uma técnica de investigação em que o
trabalho se centra na recolha de fontes documentais onde se encontram registados princípios,
objetivos e metas” (Sousa e Baptista, 2011 citado em Instituto de estudos superiores
militares, 2014, p. 20).
O tipo de entrevista escolhido foi a entrevista estruturada, pois esta “consiste na
abordagem de assuntos previamente determinados, de interesse para o trabalho, onde as
perguntas são mais estruturadas e ordenadas.” (Sousa e Baptista, 2011 citado em Instituto
de estudos superiores militares, 2014, p. 19). Este tipo de entrevista foi escolhido devido à
existência de perguntas específicas, para as quais eram necessárias respostas por parte de
especialistas da área devido à reduzida existência de fontes bibliográficas que pudessem
servir de resposta para estas.
59
CONCLUSÕES
Após término deste trabalho, é fornecida resposta às questões colocadas no início do
trabalho, primeiramente às questões derivadas, confirmando ou não a veracidade das
hipóteses, respondendo por fim à questão central.
Relativamente à primeira questão derivada: “O método atual de ensino de Combate
Corpo a Corpo na Academia Militar é adequado às necessidades dos alunos?” Podemos
afirmar que este não se encontra adequado às necessidades dos alunos, tal como concluído
também por Silva (2013).
Passando à segunda questão derivada: “Será relevante o ensino das disciplinas de Judo
e de Boxe aos alunos da Academia Militar nos moldes atuais?” Podemos concluir que, se o
objetivo for fornecer aos alunos uma formação sustentada, onde estes sejam capazes de
automatizar o gesto técnico para a sua defesa e para a defesa de terceiros, no desempenho
das suas funções como Oficiais do Exército da GNR, a resposta é não.
Relativamente à terceira questão derivada: “Qual o tempo necessário para um praticante
de Combate Corpo a Corpo atingir um nível de proficiência adequado às possíveis
necessidades de aplicação no desempenho das suas funções como futuro Oficial dos Quadros
Permanentes?” Verifica-se que o número de horas varia conforme o aluno, a modalidade, o
instrutor e o método de ensino. No entanto, tendo por base o atual manual de CCC do
Exército e o programa disciplinar da cadeira de Defesa Pessoal e Combate Corpo a Corpo
ministrada na Academia Militar, quando comparado com o estudo feito por (David T. Burke,
2011), pode-se afirmar que o tempo médio será de cento e oitenta horas para o programa 1A,
e duzentas e sessenta e cinco horas para o manual completo e programa disciplinar da AM.
Para a quarta questão derivada “Será relevante existir uma diferenciação no ensino de
Combate Corpo a Corpo consoante o ensino seja para um aluno do Exército ou da GNR?”
A resposta é sim. Considerando que a GNR trabalha de acordo com a Lei e o código penal
e não pode usar como primeiro recurso técnicas letais, o ensino deveria privilegiar o controlo
e algemagem uma vez que o seu “…objetivo é deter, imobilizar, e conduzir”, pelo que
“…deveria haver uma separação entre o Exército e GNR”, e eventuais “ligações com os
EESM e policial e naturalmente com a GNR”, de acordo com os entrevistados de Silva
(2013).
60
Relativamente à quinta questão derivada: “Como deverá ser estruturado o programa de
ensino de Combate Corpo a Corpo ao longo dos diferentes anos do curso de um aluno da
Academia?” Podemos afirmar que, para um aluno da Academia, conseguir obter proficiência
em todo o programa ministrado na AM, são necessárias em média duzentas e sessenta e
cinco horas. Sendo assim, com duas sessões de cerca de uma hora e quarenta minutos por
semana, perfazendo um total de cento e quatro horas num ano, e introduzindo apenas uma
disciplina de CCC durante todo o percurso de um aluno na AM com uma sessão semanal de
cerca de uma hora e quarenta minutos, totalizando duzentas horas em quatro anos, um
número mais próximo do pretendido. Se em vez de uma sessão se fizerem duas, em cerca de
dois anos e meio atingiremos o número pretendido, em três anos teremos cerca de trezentas
e doze horas e em quatro anos um total de cerca de quatrocentas e dezasseis horas. Para além
disto a divisão em macro, meso e microciclos irá promover um melhor planeamento das
aulas e permitir ao aluno atingir a fase de automatização mais rapidamente.
Para se poder fornecer uma resposta à questão central falta ainda verificar ou não a
veracidade das hipóteses.
A primeira hipótese colocada: “É necessária uma formação contínua e adequada ao
longo dos anos do percurso escolar de um aluno da Academia Militar para que as técnicas e
princípios ensinados possam ser devidamente mecanizados pelos alunos.”
Podemos concluir que a hipótese é válida pois, tal como referido, para um aluno atingir
a fase de automatização tem de passar pelas duas fases anteriores que pode despender de
muito tempo e envolvem um planeamento estruturado e temporal por parte do instrutor.
Quanto à segunda hipótese: “O atual modelo de ensino de Artes Marciais e de Combate
Corpo a Corpo na Academia Militar não consegue transmitir aos alunos as técnicas e
princípios desejados, nem se adequa às necessidades do desempenho das suas funções ou no
seu quotidiano.”
A hipótese é valida, pois o atual modelo de ensino de Artes Marciais e de Combate
Corpo a Corpo na Academia Militar está estruturado com boxe, judo e CCC, com a intenção
de dar a conhecer ao aluno diferentes modalidades ao longo dos anos, o que não promove a
automatização devido ao pouco tempo de treino de cada arte (cerca de vinte e seis horas para
judo e boxe e de cinquenta e duas horas para CCC).
Relativamente à questão central: “Que alterações poderão ser implementadas no atual
modelo de ensino de Combate Corpo a Corpo ministrado na Academia Militar para
61
proporcionar uma formação sustentada e contínua aos futuros Oficiais dos Quadros
Permanentes do Exército e da GNR?”
Podemos afirmar que o atual modelo requere uma revisão das técnicas de modo a
colmatar as lacunas, nomeadamente no trabalho de solo e de armas e estruturado ao longo
dos anos com uma continuidade e evolução através de macro, meso e microciclos. Deveria
igualmente ser diferenciado para a GNR e para o Exército, com a introdução de mais horas
de treino semanais e durante mais anos, apostando apenas numa modalidade de Combate
Corpo a Corpo para todos os anos.
62
RECOMENDAÇÕES
Relativamente a recomendações ou propostas para investigações futuras, propõem-se as
seguintes possibilidades:
1. Realizar uma parceria com a KM360 e/ou FMA-P, adequada às necessidades
explanadas neste trabalho, de modo a aperfeiçoar o atual manual de CCC do Exército e o
programa disciplinar da AM para o Exército e para a GNR.
2. Realizar uma parceria com a KM360 e/ou FMA-P, adequada às necessidades
explanadas neste trabalho, para a realização de cursos e/ou seminários específicos,
fornecendo aos instruendos uma formação e certificação oficial, para colmatar as lacunas
dos atuais modelos de ensino.
3. Realizar uma escolha estudada e testada para a introdução de novas técnicas e
possivelmente remoção de outras, em específico no trabalho de solo e com armas, no manual
do Exército e na AM.
4. Criação de um modelo estruturado e contínuo ao longo dos anos para o ensino na
AM, no Exército e na GNR.
5. Realizar uma revisão e/ou elaboração de novos manuais de CCC para o Exército e
para a GNR.
63
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I
Anexo A - Escalar da força
Fonte: Thompson, G. (2011). Hand to Hand Combat. United States: H2H.
II
Anexo B - Estrutura das aulas da FPKM
Estrutura das aulas
Aquecimento
De 15´a 25´de acordo com o tempo da aula – 1h a 1h30m respetivamente
Pré-aquecimento – 5’ Aquecimento – 10’ Condição Física – 10’
Aquecimento articular
Saltos
Sombra
Espelho (golpes no vazio)
Rotinas
Defesa contra qualquer ataque
Combate
Flexões/abdominais
Queda/rolamentos
Endurecimento
Paos (série seguidas)
Sombra de pernas
Tema – Nova técnica – 20 min
Seguindo rigorosamente o planeamento por programa de cinto
Trabalho lento
Defesa Pessoal Defesa contra ataques de
punhos e pernas
Trabalho ofensivo
1 Um a defender Um a defender Em espelho
10x lento, 10x rápido
2 Um ataque e outro defende
– alternado
(sem tempos mortos)
Um ataque e outro defende
– alternado
(sem tempos mortos)
Em plastrons/almofadas
10x lento, 10x rápido
3 Igual mas com movimento Igual mas com movimento Um executa a sequência e
outro defende/bloqueia
10x lento, 10x rápido
4 Em posição com os olhos
fechados
Em combate ligeiro: ou
com sinal
Em deslocação + com
trabalho de bloqueio
10x lento, 10x rápido
Revisão – 20 min
Seguindo rigorosamente o planeamento por programa de cinto
Trabalho os próximos 4 pontos da seguinte forma: 4x lento + 1x rápido
Defesa Pessoal Defesa contra ataques de
punhos e pernas
Trabalho ofensivo
5 Um a defender Um a defender Em espelho
10x lento, 10x rápido
III
6 Um ataque e outro defende
– alternado
(sem tempos mortos)
Um ataque e outro defende
– alternado
(sem tempos mortos)
Em plastrons/almofadas
0x lento, 10x rápido
7 Igual mas com movimento Igual mas com movimento Um executa a sequência e outro defende/bloqueia
10x lento, 10x rápido
8 Em posição com os olhos
fechados
Em combate ligeiro: ou
com sinal
Em deslocação + com
trabalho de bloqueio
10x lento, 10x rápido
Retorno à calma – 10 min
5 min para aulas de 1 hora
Estiramentos ou relaxamentos
Fonte: FPKM. (2011). IX curso de instrutores de Krav Maga Portugal 2011. Lisboa.
IV
Anexo C - OODA Loop
Fonte: Johnson, N. J. (2014). Boyd’s Real OODA Loop and Fencing.
V
Anexo D - Número médio de sessões para se atingir a proficiência
Fonte: David T. Burke, e. a. (Março de 2011). Martial Arts: Time Needed for Training. Asian Journal of Sports
Medicine, Volume 2 (Number 1), 31-36.
Apêndice A - Entrevista a Pedro Silva
Entrevista a Pedro Silva, Treinador de FMA, licenciatura em Psicologia Clínica,
Treinador desportivo grau 2 pela Federação Portuguesa de Lohan Tao (FLT) e grau 1 pela
Federação Portuguesa de Lutas Amadoras (FPLA).
1. Qual é a arte marcial ou disciplina de defesa pessoal que ensina?
FMA – Artes marciais Filipinas.
2. Valoriza outras artes? O que o levou a optar por esta em particular?
VI
Valorizo todas as artes marciais tradicionais. Esta em particular porque tem combate
armado, ou seja, treino com armas de impacto e de corte/perfuração.
3. Acha que o seu estilo poderá estar adequado a situações reais que possam ocorrer
nos dias de hoje? Porquê?
Bom, creio que o que treino só tem transferência para situações “reais”, desde que se
verifiquem as condições e contextos abordados no treino. Ou seja, a realidade é algo de
futuro e, por definição, o futuro é inacessível a conhecimento prévio. O que acontece com
tudo o que é inesperado e novo é uma necessidade de adaptação à situação e para essa
adaptação ter sucesso são levados em conta vários fatores: preparação prévia de contextos,
os métodos utilizados, o treino de capacidades/habilidades e a atitude mental adequada,
fazem aumentar a taxa de sucesso do fator «adaptação». E adaptação é nada mais nada menos
que a capacidade de decisão.
4. Acha que o seu estilo poderá ser adequado para as necessidades dos militares?
Porquê?
Creio que os militares procuram sempre ter a vantagem de forma a correr menos riscos
e ao mesmo tempo dominar. Por isso, o uso de informações privilegiadas e prévias, o
conhecimento do campo de batalha e do inimigo e o uso de armamento superior são, na
minha opinião, o mais importante na área militar (algo que já fazem e é sua característica).
Logo, o treino e estrutura militar em si, encerram todas as soluções.
No entanto, certos exercícios de agressividade, de sobrevivência em contexto de
inferioridade, de trabalho de equipa e de atitude mental pode ser transportado do nosso treino
para a área militar, mas com armas que não as de fogo (porque isso não treinamos).
5. De que forma o seu estilo poderá contribuir para a formação dos militares em
situações de Combate Corpo a Corpo onde o uso da arma de fogo não se torna possível?
Nestes casos:
No caso de o militar participar em missões civis, o uso de bastão pode ser necessário (e
aí podemos ajudar com a nossa especialidade);
VII
No caso de missões em que o corpo-a-corpo é um risco possível, o uso de habilidades
de mãos-vazias e o uso de habilidades com a faca (procurando proteger ou criar espaço para
utilizar a arma de fogo, ou mesmo substituí-la).
6. Recomendaria o ensino do seu estilo aos militares? De que forma e como?
Já respondido no ponto 4.
7. Quanto tempo (horas) acha que seriam necessárias para um instruendo militar
automatizar de forma correta uma técnica e conseguir utilizá-la em contexto real? E para se
tornar proficiente numa disciplina de defesa pessoal de modo a que se consiga defender da
maioria dos ataques?
Com o nosso método, entre 30 a 40 horas de prática seriam o tempo suficiente para o
treino base, levando em conta um sujeito dito normal.
Para se tornar proficiente numa das nossas áreas de treino cerca de 100 horas de prática
(mas claro, dependendo do tipo de área de treino).
VIII
Apêndice B - Entrevista a João Louzeiro
Entrevista a João Louzeiro, Mestre de Krav Maga e Presidente da KM360
1. Qual é a arte marcial ou disciplina de defesa pessoal que ensina?
Krav Maga.
2. Valoriza outras artes? O que o levou a optar por esta em particular?
Sim claro, acho que todas as artes Marciais são válidas de acordo com o objetivo de
cada uma. Optei pelo Krav Maga pela sua vertente prática e multidisciplinar.
3. Acha que o seu estilo poderá estar adequado a situações reais que possam ocorrer
nos dias de hoje? Porquê?
Sim. Isto porque é esse o propósito do Krav Maga, o objetivo deste sistema é preparar
os praticantes para qualquer agressão a que possam estar sujeitos no seu dia-a-dia.
4. Acha que o seu estilo poderá ser adequado para as necessidades dos militares?
Porquê?
Sim, em primeiro lugar porque foi desenvolvido para militares e em contexto específico
de guerra, teatro de guerra. Em segundo lugar pela grande capacidade que este sistema tem
em se adequar a cada situação específica.
5. De que forma o seu estilo poderá contribuir para a formação dos militares em
situações de Combate Corpo a Corpo onde o uso da arma de fogo não se torna possível?
Na sua génese o KM surge como sistema de mãos nuas, ou seja, todos os seus princípios
foram construídos para que o seu praticante se possa defender não tendo a possibilidade de
utilizar qualquer arma. No entanto defende também que qualquer objeto pode ser uma arma
e que deve ser utilizado se aumentar a capacidade de defesa ou ataque da vítima podemos
então assumir vários patamares do sistema e dar ao praticante também a capacidade e os
IX
instrumentos para utilizar uma arma, mas sempre partindo do pressuposto que inicialmente
não temos acesso a qualquer arma.
6. Recomendaria o ensino do seu estilo aos militares? De que forma e como?
Recomendaria com toda a certeza, para mim a melhor forma é pelo carácter, como já
mencionado, de fácil adaptação do KM, seria perceber em primeiro lugar quais as
necessidades e lacunas dos próprios militares. Analisar situações reais, onde os mesmos
sentiram dificuldades. A partir daí elaborar um plano com as técnicas adequadas, feitas à
medida para o próprio exército ou equipa.
7. Quanto tempo (horas) acha que seriam necessárias para um instruendo militar
automatizar de forma correta uma técnica e conseguir utilizá-la em contexto real? E para se
tornar proficiente numa disciplina de defesa pessoal de modo a se consiga defender da
maioria dos ataques?
Acho que em 6 meses de formação, com aulas 3x por semana de 2 horas cada, seria
suficiente para automatizar o básico. Depois continuar o treino pelo menos em 1 aula por
semana de 2 horas cada.