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NEGAÇÃO DA EDUCAÇÃO DO CAMPO NO MUNICÍPIO DE VITÓRIA DA
CONQUISTA-BA
Arlete Ramos dos Santos
Profª Adjunta da Universidade Estadual de Santa Cruz - UESC
arlerp@hotmail.com
RESUMO: Na trajetória da Educação do Campo existe o papel do Estado, dos
organismos internacionais, da sociedade civil organizada, no intuito de buscar uma
mudança paradigmática no cenário político-econômico-social, tendo como sujeitos
centrais os trabalhadores rurais, com suas diferenças culturais e identitárias, e a
necessidade de desenvolver conhecimentos educacionais críticos, cujos autores são os
próprios protagonistas. Assim, esse artigo aborda o resultado de uma pesquisa realizada
por Santos (2013), na rede municipal de educação de Vitória da Conquista - BA, com o
objetivo de investigar as políticas públicas educacionais implementadas pelo referido
município no ano de 2012. Porém, far-se-á um recorte, apenas, sobre a Educação do
Campo e o Programa Escola Ativa. A metodologia utilizada foi de caráter qualitativo,
com uso de entrevistas semiestruturadas e questionário de perguntas abertas e fechadas.
Participaram como sujeitos a equipe gestora da Secretaria Municipal de Educação -
SMED e das escolas municipais, além de professores e gestores. O espaço utilizado trata-
se de 8 escolas municipais, sendo 4 da zona urbana e 4 da zona rural, tendo como critério
de escolha as maiores escolas municipais. Para análise dos dados, utilizou-se como
método o materialismo histórico dialético, com base em Kosik (1997). As conclusões
evidenciaram que o município de Vitória da Conquista, vem enfrentando sérios
problemas com o trabalho nas escolas do campo. Desde a incompreensão dos
pressupostos teóricos e epistemológicos da Educação do Campo, bem como, na
implementação dos programas e políticas educacionais implementadas no contexto rural,
os quais não respeitam os direitos garantidos na legislação educacional brasileira para os
campesinos.
Palavras - chave: Educação do Campo. Programa Escola Ativa. Vitória da Conquista.
A educação brasileira, em todos os níveis e modalidades, desde a colonização até
a atualidade evidenciou um caráter dualista, privilegiando a classe dominante, e quando
se refere ao campo brasileiro, isso não é diferente. Nesse sentido, no processo
educacional, até o final do século XX, não havia uma proposta específica para o homem
camponês, pois a escolarização deste tinha como referência o que já vinha pronto da
cidade. De acordo com a literatura da área, foi criado um processo marginal, a ser
enfrentado pelo camponês, o qual deu origem a representações sociais de cunho
ideológico com o objetivo de inferiorizar as populações rurais. Para isso, “utilizaram
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sempre arquétipos onde a figura do homem e da mulher campesina era e ainda são os
atrasados, os ‘fora do lugar’, os ‘jeca tatus’.” (WANDERLEY, 1997).
Infelizmente, passando brevemente pela historiografia da Educação nas áreas
rurais brasileiras, percebe-se que com a crise do modelo agroexportador, coloca-se em
pauta a tentativa de modernização do campo, ainda na primeira metade do Século XX, e
a educação rural nesse período, que acontece ainda de forma incipiente, passa a privilegiar
um modelo de educação de movimento do capital para desestruturar a agricultura familiar,
buscando formar trabalhadores para lidar com insumos, máquinas e tecnologias para
aumentar a produção da lavoura, e, dessa forma, fortalecer os latifúndios.
Para Calazans (2005, p. 15), o ensino rural brasileiro, de forma regular, teve início
no fim do 2º Império. Com o Plano Nacional de Educação de 1812, D. João VI incluiu
um dispositivo que diz que “no 1º Grau da instrução pública se ensinariam todos os
conhecimentos que são essenciais aos agricultores, artistas e comerciantes”. Na reforma
de 1826, o Plano Nacional de Educação coloca no 2º Grau, “conhecimento dos terrenos,
dos produtos naturais da maior utilidade nos usos da vida”. Com o Decreto de nº 7247
(1870), foi colocado no ensino de 1º Grau, noções de lavoura e horticultura.
Nesse período, percebe-se uma educação rural, ainda sem muitas iniciativas,
acomodada a uma metodologia tradicional, com ideias educacionais trazidas da Europa
pelos colonizadores. Esse contexto começa a mudar somente a partir de 1930, quando se
consolida a ideia dos pioneiros do “ruralismo pedagógico” que se constituíram como uma
busca de respostas ao impacto social provocado pelo inchaço das cidades e incapacidade
de absorção de mão de obra disponível pelo mercado urbano, ocorrido devido à mudança
na política econômica brasileira em consequência da crise cafeeira, quando as pessoas do
campo começam a migrar para a cidade.
A essa ameaça permanente, sentida pelos grupos dominantes, políticos
e educadores tentavam responder com uma educação que levasse o
homem do campo a compreender o “sentido rural da civilização
brasileira” e a reforçar os seus valores, a fim de fixá-lo à terra, o que
acarretaria a necessidade de adaptar programas e currículos ao meio
físico e à cultura rural (CALAZANS, 2005, p. 25).
Essas preocupações são expressivas no meio intelectual da época e podem ser
percebidas nos anais do XVIII Congresso Brasileiro de Educação, onde as ideias do
ruralismo pedagógico aparecem como substituição de uma escola rural desintegradora
por uma escola que ajudasse a fixar o indivíduo no meio rural por meio da produção. A
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educação nesse contexto está embasada na concepção evolucionista que considera
atrasado o modo como vivem e trabalham as populações rurais. Para dar contas de
efetivar esse ideário pedagógico, surgem nas décadas de 1940 e 1950, agências
internacionais para desenvolver o meio rural brasileiro, por meio de parceria do Brasil
com os Estados Unidos. Essa parceria no campo educacional é implementada por meio
das Missões Rurais, através de “pacotes” prontos e acabados, elaborados na língua
inglesa, por pessoas que não conheciam a realidade brasileira, cujo público a ser aplicado
era os professores leigos brasileiros.
Durante as décadas de 1960 e 1970, como o Banco Mundial tinha grande interesse
de investir na América Latina, aproveitou a oportunidade para se envolver em programas
brasileiros junto à “Aliança para o Progresso”, implantados, principalmente, na Região
Nordeste por meio da Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE)
para o meio rural, com objetivos de estabilizar a produção de alimentos, a colonização
das áreas, melhorar a utilização da terra.
O reordenamento educacional se direciona para a organização curricular e para a
política da educação escolar pública. De acordo com pesquisas realizadas, os projetos e
programas surgidos apontam uma inadaptação dos agricultores para continuarem
trabalhando na agricultura, a partir dos cursos oferecidos pela CNER, a qual propunha
“uma educação fundamental para a recuperação total do homem rural” (RIBEIRO, 2010,
p. 168)). Justificou-se assim, a necessidade dos camponeses mudarem para as cidades.
Outro argumento observado pela autora, que também fora utilizado pelo capital, por meio
das agências instaladas no campo foi o de que o trabalhador do campo era “carente”,
sendo desnutrido, ignorante, doente, isolado e avesso à solidariedade social. Assim, o
diagnóstico era de uma educação de subsistência, considerada atrasada, sendo, portanto,
necessária uma educação rural por meio dos programas, com predominância do
econômico sobre o cultural.
Nesse contexto, surgiram várias iniciativas populares de educação popular como
o Movimento de Educação de Base (MEB), o método Paulo Freire, dentre outros, com o
objetivo de efetivar uma educação política, formação de lideranças, alfabetização de
jovens e adultos, formação sindical e comunitária. Esse panorama surgiu como uma
reação ao autoritarismo e à repressão da ditadura militar, quando os movimentos sociais
e intelectuais orgânicos da classe trabalhadora lutavam pela redemocratização da
sociedade, tendo conseguido conquistas importantes e espaços de participação nas
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políticas públicas e na legislação do país, expressada por meio da Constituição Federal
de 1988.
No que se refere à educação, a Lei de Diretrizes e Bases (9.394/96) contém artigos
que trazem adequações curriculares às especificidades do meio rural. Com essa abertura
política e legal, os movimentos sociais passaram a discutir a mudança na nomenclatura
da educação rural, propondo a mudança do termo de ‘educação rural’ para ‘Educação do
Campo’. Segundo Fernandes, Cerioli e Caldart (2004, p. 25),
a utilização da expressão campo tem o intuito de propiciar uma
reflexão sobre o sentido do atual trabalho camponês e das lutas sociais
e culturais dos grupos que hoje tentam garantir a sobrevivência deste
trabalho. No final dos anos de 1990, a proposta educativa construída
pelo Movimento Sem Terra (MST) passa a ser discutida no âmbito das
reflexões sobre a Educação do Campo com o propósito de conceber
uma educação básica do campo, voltada aos interesses e ao
desenvolvimento sociocultural e econômico dos povos que habitam e
trabalham no campo, atendendo às suas diferenças históricas e culturais.
A gênese das discussões sobre a Educação do Campo foi o I ENERA (Encontro
Nacional de Educadores da Reforma Agrária), que aconteceu em 1997, e, posteriormente,
nas Conferências para Educação Básica do Campo, realizadas respectivamente em 1997,
1998, 2004, dentre outras, com a participação de entidades internacionais, da sociedade
civil e de órgãos do Governo. O eixo principal do contexto de surgimento desta nova
prática social foi a necessidade de lutas unitárias feitas pelos próprios trabalhadores e suas
organizações por uma política pública de Educação do Campo que garantisse o direito
das populações do campo à educação e que as experiências político-pedagógicas
acumuladas por estes sujeitos fossem reconhecidas e legitimadas pelo sistema
público nas suas esferas correspondentes (FONEC, 2012, p. 4).
Dessas lutas pela Educação do Campo, até a atualidade, como saldo positivo pode-
se verificar a existência de uma legislação que versa sobre as conquistas para a educação
dos povos do campo, e que reconhecem e legitimam as lutas levando em consideração as
suas especificidades: Diretrizes Operacionais para Educação Básica nas Escolas do
Campo: Resolução CNE/CEB n° 1/2002 e Resolução CNE/CEB n° 2/2008. Parecer
CNE/CEB n° 1/2006 que reconhece os Dias Letivos da Alternância; Resolução
CNE/CEB n° 4/2010 que reconhece a Educação do Campo como modalidade específica
e define a identidade da escola do campo; Decreto n° 7.352, de 4 de novembro de 2010,
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que dispõe sobre a Política Nacional de Educação do Campo e sobre o Programa Nacional
de Educação na Reforma Agrária (Pronera).
Em 2002, foram aprovadas as Diretrizes Operacionais para a Educação Básica do
Campo, observando que
A Educação do Campo, tratada como Educação Rural na legislação
brasileira, tem um significado que incorpora os espaços da floresta, da
pecuária, das minas e da agricultura, mas ultrapassa ao acolher os
espaços pesqueiros, caiçaras, ribeirinhos e extrativistas. O campo, nesse
sentido, mas do que um perímetro não-urbano é um campo de
possibilidades que dinamizam a ligação dos seres humanos com a
própria produção das condições da existência social e com as
realizações da sociedade humana (BRASIL, 2002, p. 1).
Na elaboração do Plano Plurianual em 2003, os movimentos sociais retomam as
discussões sobre o campo brasileiro e garantem a implementação de políticas para a
reforma agrária, desenvolvimento da agricultura familiar, estímulo à economia solidária
de forma cooperativa e, no aspecto educacional, a Educação do Campo é entendida como
ação estratégica do governo para a emancipação da cidadania.
Dessa forma, é possível observar que na trajetória da Educação do Campo existe
o papel do Estado, dos organismos internacionais, da sociedade civil organizada,
experimentando uma mudança paradigmática no cenário político-econômico-social,
tendo como sujeitos centrais os trabalhadores rurais, com suas diferenças culturais e
identitárias, e a necessidade de desenvolver conhecimentos educacionais críticos, cujos
autores são os próprios protagonistas. Por força dessa luta é que ocorreram conquistas
como a criação em 2004 da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e
Diversidade (SECAD), atualmente Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização,
Diversidade e Inclusão (SECADI) a qual, dentro das suas especificidades estão às
questões relacionadas à Educação do Campo.
Todas as políticas educacionais obtidas por meio da luta da Educação do Campo
são de extrema importância. Entretanto, destaca-se o Decreto 7.352/2010, assinado pelo
governo Lula, o qual elevou a Educação do Campo à condição de política de Estado,
conforme explicita o seu Art. 1º:
A política de educação do campo destina-se à ampliação e qualificação
da oferta de educação básica e superior às populações do campo, e será
desenvolvida pela União em regime de colaboração com os Estados, o
Distrito Federal e os Municípios, de acordo com as diretrizes e metas
estabelecidas no Plano Nacional de Educação e o disposto neste
Decreto (BRASIL, 2010).
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Outro ganho importante no tocante ao reconhecimento das especificidades dos
povos do campo é que o referido Decreto recupera o que traz no texto das Diretrizes
Operacionais da Educação do Campo, além de elevar a Educação do Campo como
modalidade de ensino a ser oferecida, não somente no campo, mas onde tenham pessoas
do campo, mesmo que seja no perímetro urbano, demonstrando, assim, o reconhecimento
das especificidades sociais, culturais, ambientais, políticas e econômicas do modo de
produzir a vida no campo, como se verifica nesse texto da Lei, ainda no Artigo 1º:
Para os efeitos deste Decreto, entende-se por: I – populações do campo:
os agricultores familiares, os extrativistas, os pescadores artesanais, os
ribeirinhos, os assentados e acampados da reforma agrária, os
trabalhadores assalariados rurais, os quilombolas, os caiçaras, os povos
da floresta, os caboclos e outros que produzam suas condições materiais
de existência a partir do trabalho no meio rural. II – escola do campo:
aquela situada em área rural, conforme definida pela Fundação Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística-IBGE, ou aquela situada em área
urbana, desde que atenda predominantemente a populações do campo
(BRASIL, 2010).
Essa legitimação tem se constituído num importante instrumento de pressão e
negociação junto aos poderes públicos, especialmente nas instâncias municipais,
geralmente mais refratárias à presença e ao protagonismo dos movimentos sociais do
campo nas ações de escolarização formal, sendo também relevante força material para a
ampliação das experiências inovadoras em curso (RIBEIRO, 2010).
Para o MEC, o Pronacampo deverá atender escolas do campo e quilombolas, a
partir de quatro eixos de ação: gestão e práticas pedagógicas, formação de professores,
educação profissional e tecnológica e infraestrutura. Porém, de acordo com a avaliação
do Fonec (2012), esta política foi elaborada de forma que muitas discussões foram
realizadas pelo governo sem a presença dos representantes dos movimentos sociais e de
organizações que representam os povos do campo e da CONEC/MEC (Comissão
Nacional da Educação do Campo).
Como contraposição à essa lógica, a Educação do Campo visa a superação desse
modo de produção que subordina os trabalhadores à lógica do capital, na qual basta
conhecer apenas os aspectos técnicos. Na Educação do Campo, é igualmente necessário
também conhecer os processos para superar a alienação na qual o trabalho do agricultor,
mesmo tendo a terra como propriedade, não tem o controle dos seus meios de produção.
Como alternativa, é proposta a agricultura familiar. Nesse sentido, faz-se necessário um
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reencontro dos agricultores com a natureza, a reconstrução da lógica de coprodução e não
de dominação da natureza. Exige uma formação que permita a reapropriação do processo
de produção (controle, conhecimento científico e tecnológico) pelos trabalhadores
camponeses, sem a perda (ou pela recuperação, no caso dos sem-terra) da apropriação
dos meios de produção (FONEC, 2012), cuja matriz tecnológica está assentada na
agroecologia, como projeto de agricultura familiar.
Aspectos metodológicos
A metodologia utilizada foi de caráter qualitativo. Inicialmente, foi feita uma
revisão bibliográfica e documental das políticas públicas educacionais implementadas no
município de vitória da Conquista, em 2012, observando quais os objetivos, os
pressupostos teóricos que as fundamentam, e como estão estruturadas nas instâncias
Federal, Estadual e Municipal. A análise documental “pode se constituir de uma técnica
valiosa de abordagem de dados qualitativos, seja complementando as informações obtidas
por outras técnicas, seja desvelando aspectos novos de um tema ou problema” (LUDKE
& ANDRÉ, 1986, p. 38). Para análise dos dados, estes tiveram como referência a
metodologia dialética visto que “a dialética é o pensamento crítico que se propõe a
compreender a ‘coisa em si’ e sistematicamente se pergunta como é possível chegar à
compreensão da realidade” (KOSIK, 1997, p. 20). Para verificar se os objetivos propostos
foram alcançados, tanto do ponto de vista da SMED como na visão dos sujeitos da
comunidade escolar, foram realizadas entrevistas semiestruturadas para coletar dados
sobre o funcionamento das políticas públicas nas escolas municipais.
No total foram realizadas trinta e três (33) entrevistas, sendo seis (6) com pessoas
que trabalham dentro da SMED, nos setores pedagógico e administrativo, e vinte e sete
(27) nas escolas municipais, com membros da equipe gestora e os professores. Outro
instrumento utilizado para coletar dados foi a aplicação de um questionários composto de
perguntas fechadas e abertas para a equipe da gestão das escolas municipais, incluindo
coordenadores, diretores e vice-diretores. Ao todo foram aplicados 100 questionários e,
para a aplicação deste instrumento, a pesquisadora compareceu em três reuniões de
diretores e duas reuniões de coordenadores realizadas pela SMED, sendo convidados a
preencher o questionário, todos os sujeitos presentes que faziam parte da gestão escolar
naquele ano.
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A Educação do Campo em Vitória da Conquista
Em Vitória da Conquista, de acordo com os resultados dessa pesquisa, não existe
um planejamento específico voltado para as realidades do homem do campo, que leve em
consideração a educação agroecológica. Para os entrevistados, conforme pode verificar
abaixo, o planejamento é trabalhado da mesma forma que a zona urbana. Ou seja, pode-
se afirmar, com base nos dados da pesquisa, que a perspectiva de educação pensada para
o campo neste município, está no perfil da educação rural.
A política de educação no campo, por exemplo, tem que resgatar o olhar
para o homem do campo, sua valorização e identidade enquanto pessoa.
O município tem que avançar muito em determinadas políticas que na
minha compreensão estão um pouco adormecidas. Conseguimos
identificar que algumas não estão sendo efetivadas como deveriam, isso
é um indício de que temos que buscar alternativas e soluções
conjuntamente com os profissionais da educação para que possamos
avançar e fazer com que elas atendam as necessidades de cada educando
esteja ele onde estiver, na zona rural ou urbana (SECRETÁRIA DE
EDUCAÇÃO, 19/09/2012).
Como aqui é Segmento I e II eles são divididos por módulos ( I ao V)
que vai até o Ensino Fundamental. Tem ainda os módulos I ao IV (do
6º ao 9º ano). Eles têm trabalhado dentro da proposta do município dos
segmentos que são voltados à Educação no Campo. Às vezes, eles
queixam muito em relação aos livros que são utilizados. Como se trata
de uma proposta do campo o material recebido do governo federal (livro
didático) é um pouco distante do foco, da proposta de trabalho da
Educação no Campo. [...]. (DIRETORA DA ESCOLA LILÁS,
19/09/2012).
A diferença é só de nomenclatura, mas de estrutura não mudou,
pedagogicamente não mudou, em hipótese alguma. [...] Só mudou a
nomenclatura, o Segmento, pedagógico, no sentido de você trabalhar
que o aluno consiga avançar os conteúdos que são necessários naquela
modalidade dele avançar pra o segundo Segmento, isso não modificou
coisa alguma, que é uma questão mais específica do professor e do
trabalho interno da escola (COORDENADOR DA ESCOLA
AMARELA, 12/09/2012).
A secretária de educação observa a necessidade de avanços nessa modalidade de ensino,
para que valorize o camponês. Já a diretora da Escola Lilás observa que o livro didático utilizado
pelos alunos do campo é o mesmo utilizado na zona urbana. Segundo pesquisas da área, essa
ainda é uma realidade de grande parte do Brasil. Nessa mesma direção observa o coordenador da
escola Amarela, deixando subentendido que não existe diferença entre o ensino do campo e da
cidade, bem como um acompanhamento diferenciado.
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Portanto, torna-se necessário que a SMED procure levar em consideração as conquistas
dos trabalhadores do campo no que se refere à garantia de uma educação que valorize os saberes
campesinos, cumprindo, assim, o que propõe as Diretrizes Operacionais para a Educação do
Campo e o Decreto 7.352/2010, a qual reconhece a importância de uma educação específica para
os povos do campo, incluindo indígenas, ribeirinhos, quilombolas e outros.
Destaca-se ainda que foi evidenciado na pesquisa que a rede municipal vem
oferecendo o Segmento II da Educação do Campo (anos finais do ensino fundamental),
quando necessário, em turmas multimodulares, devido à falta de alunos para montar as
turmas modulares, conforme o relato abaixo da diretora que foi questionada se na unidade
de ensino que está sob sua gestão trabalha com a proposta de educação do campo.
A proposta era fazer um diferencial, mas a gente vê que não funciona,
acaba trabalhando usando a mesma forma, nós estamos aqui agora
apenas com duas turmas, quinta e sexta série juntas, sétima e oitava
juntas, por conta da quantidade de alunos, aí a secretaria disponibilizou
os módulos que o professor trabalha com os temas, mas eu acho que
acaba fugindo pra trabalhar da mesma forma que ele trabalha no diurno,
ele não consegue ainda desvencilhar até porque o apoio também pra
esse pessoal do pessoal do Segmento é muito pouco, muito pouco
mesmo (ENTREVISTA COM A DIRETORA DA ESCOLA
VERMELHA, 17/09/2012).
Nos anos iniciais do ensino fundamental também a forma de organização do
trabalho pedagógico em várias escolas é multisseriada, mediante a implementação do
Programa Escola Ativa, o qual, no Brasil, é oriundo do Programa Escuela Nueva, criado
para atender as classes multisseriadas na Colômbia, sob a orientação do Banco Mundial.
Tal programa foi orientado com base nos pressupostos teóricos da Escola Nova, teve
como objetivo o atendimento das regiões com baixa densidade demográfica e que
apresentava pouca qualidade educacional. No Brasil, foi criado em 1996, no Governo de
Fernando Henrique Cardoso, sendo denominado de Escola Ativa, atendendo,
inicialmente, os estados do Nordeste, por meio do FUNDESCOLA, com financiamento
do Banco Mundial, e continuou nos Governos do Presidente Lula e da Presidente Dilma,
como uma política educacional, cuja metodologia tem como objetivo atender escolas
multisseriadas e escolas de pequeno porte que apresentam dificuldades de acesso,
localizadas na zona rural. A característica dessas turmas é que concentram todas as
séries/anos num único espaço, com o mesmo professor. Atualmente, ele foi substituído
pelo Programa Escola da Terra, porém, este último ainda não está sendo implementado
em Vitória da Conquista.
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Teoricamente, o Programa Escola Ativa surgiu fundamentado no liberalismo, na
Escola Nova (John Dewey), no construtivismo (Piaget), subjacentes aos ideais da
UNESCO que embasam as teses pós-modernas com os quatro pilares da educação:
aprender a conviver, aprender a aprender, aprender a ser, aprender a fazer. Tal referencial
teórico tem sofrido muitas críticas no país pelos autores progressistas, que estudam a
Educação do Campo, tendo sofrido uma revisão mais tarde, cujo referencial teórico foi
mudado para Vigotsky.
O município de Vitória da Conquista fez a adesão ao Programa Escola Ativa em
dezembro de 2009, mas o seu funcionamento começou em fevereiro de 2011. Até o
momento de realização dessa pesquisa, a equipe responsável pela formação estadual só
havia realizado a 1ª etapa, e outro aspecto observado é que os materiais chegaram aos
poucos dificultando o atendimento às escolas que aderiram ao programa em âmbito
municipal.
De acordo com a coordenadora do referido programa na SMED,
Os kit’s para a montagem dos cantinhos começaram a chegar em
setembro de 2011 e foram entregues de fevereiro até junho de 2012,
pois os mesmos foram chegando aos poucos. Lembramos que tivemos
uma única formação com a equipe de salvador (Módulo I). As
formações dos demais módulos do programa não aconteceram para o
município de Vitória da Conquista até o momento. O kit 1 (com
bússola, esqueleto, material de geometria e globo terrestre) veio em
quantidade insuficiente. Recebemos 25 kit’s e contemplamos 24
escolas porque um kit veio danificado. Já os kit’s 2 e 3 vieram em
quantidade suficiente para todas as escolas envolvidas no Programa
(COORDENAÇÃO - SMED).
Segundo a Assessoria da SMED, as atividades do Programa Escola Ativa foram
desenvolvidas no município. Porém, até o final de 2012, estava aguardando a orientação
do governo federal devido às mudanças na estrutura do Programa:
O programa Escola Ativa na Rede começou em 2011. Durante o ano
fizemos a formação que era desejada. Tinha uma segunda etapa para
ser feita, mas não foi realizada porque no âmbito federal o programa foi
reformulado, deixou de ser Escola Ativa para se tornar Escola da Terra.
A Secretaria está esperando a formação do Escola da Terra que está
prevista para este final de ano para darmos início em 2013. Estamos
trabalhando com o material e fazendo o acompanhamento desse
programa. Recebemos todo o material: livros e laboratórios. Um
material muito bom. O que faltou um pouco foi a formação nesse
período de transição (ASSESSORIA – SMED, 03/09/2012).
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Ainda segundo à assessora a nova roupagem do programa ampliará o atendimento
também de uma forma mais inclusiva, abarcando outras diversidades.
Quando trabalhávamos com o Escola Ativa, o programa via apenas a
ideia do menino do campo. O Escola da Terra vê o menino do campo
que é quilombola, negro, ribeirinho, alcança uma diversidade maior.
Quando falamos em Escola do Campo no Brasil, é muito complicado
porque colocamos o menino do Sertão na mesma situação do menino
do campo ribeirinho. O programa Escola da Terra traz a diversidade e
aborda esse leque de possibilidades (ASSESSORIA – SMED,
03/09/2012).
Levando em consideração que o Programa Escola Ativa deve atender às turmas
multisseriadas, observa-se que esse objetivo não tem sido atendido no município, como
ressalta uma das professoras entrevistadas que trabalha com a multisseriação:
Esperamos e até hoje não temos o programa aqui. Nunca participei
dessa proposta. [...] Eu fiquei com a 3ª e 4ª. Quando cheguei aqui tinha
os livros do Escola Ativa, mas não conseguimos trabalhar porque não
vieram todos os livros do programa. São poucos livros, pesquisamos
algumas coisas neles. [...] Aqui é série de 1ª à 4ª. No município é
chamado de módulos, I ao IV. Pegamos os livros das séries para fazer
o planejamento (ENTREVISTA COM A PROFESSORA DA
ESCOLA ROSA, 17/09/2012)
Assim, observamos que a avaliação sobre o referido Programa, não difere da
avaliação da própria SECADI/MEC (2009), quando esta analisa que os objetivos de
melhoria na qualidade da educação em classes multisseriadas em escolas do campo não
foram atingidos, devido a alguns problemas, como: estruturas precárias, professores leigos,
sem formação continuada, desestimulados e resistentes ao novo, atraso do material didático e kits
pedagógicos para o desenvolvimento metodológico do programa.
Portanto, observamos, com base nesse contexto, que o município de Vitória da Conquista,
vem enfrentando sérios problemas com o trabalho nas escolas do campo. Desde a incompreensão
dos pressupostos teóricos e epistemológicos da Educação do Campo, bem como, na
implementação dos programas e políticas educacionais implementadas no contexto rural, os quais
não respeitam os direitos garantidos na legislação educacional brasileira para os campesinos do
país.
Referências:
Didática e Prática de Ensino na relação com a Sociedade
EdUECE - Livro 302763
BRASIL, Ministério da Educação. Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e
Diversidade. Programa Escola Ativa: orientações pedagógicas para formação de
educadoras e educadores. Brasília: SECAD/MEC, 2009.
________. Senado Federal. Lei das Diretrizes e Bases da Educação Nacional. 1996.
________. Decreto nº 7.352/2010. Diário Oficial da União de 4/11/2010. Dispõe sobre
a política de educação do campo e o Programa Nacional de Educação na Reforma
Agrária – PRONERA.
_______RESOLUÇÃO Nº 2, DE 28 DE ABRIL DE 2008(*) Estabelece diretrizes
complementares, normas e princípios para o desenvolvimento de políticas públicas de
atendimento da Educação Básica do Campo.
________, Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação. Comissão de
Educação Básica. Resolução n.1 de 03 de abril de 2002, estabelece Diretrizes para a
Educação Básica nas escolas do campo, publicada no Diário Oficial da União. Brasília-
DF: Gráfica do Senado, em 09 de Abril de2002.
CALAZANS, M.J.C. Para compreender a educação do Estado no meio rural. In:
TERRIEN, J. DAMASCENO, M.N. Educação e Escola no Campo. Campinas:
Papirus, 2005
FERNANDES, B. M., CERIOLI, P. R. e CALDART, R. S. Primeira
ConferênciaNacional “Por Uma Educação Básica do Campo”: texto preparatório. In:
ARROYO, M.Gonzalez, CALDART, R. S. MOLINA, M. C. Por uma educação do
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KOSIK, Karel. Dialética do concreto. 6. ed. Paz e Terra: Paz e Terra, 1997.
LUDKE, M. & ANDRÉ, M. E. D. A. Pesquisa em Educação: Abordagens qualitativas.
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RIBEIRO, M. Movimento camponês, trabalho e educação: liberdade, autonomia e
emancipação. São Paulo: Expressão Popular, 2010.
SANTOS, Arlete Ramos dos. Análise das políticas públicas educacionais
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Didática e Prática de Ensino na relação com a Sociedade
EdUECE - Livro 302764