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DocumentosISSN 1981 - 6103Dezembro, 2008 06
Métodos de Melhoramento Genético de Arroz Irrigado
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ISSN 1981 - 6103Dezembro, 2008
Empresa Brasileira de Pesquisa AgropecuáriaCentro de Pesquisa Agroflorestal de RoraimaMinistério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento
Documentos 06
Métodos de Melhoramento Genético de Arroz Irrigado
Antonio Carlos Centeno Cordeiro
Boa Vista, RR2008
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1ª edição1ª impressão (2008): 300
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação – CIP Embrapa Roraima
Cordeiro, Antonio Carlos Centeno. Métodos de Melhoramento Genético de Arroz Irrigado / Antonio Carlos Centeno Cordeiro. - Boa Vista: Embrapa Roraima, 2008. 65 p. ( Embrapa Roraima. Documentos, 06).
1. Arroz Irrigado . 2. Melhoramento genético. I. Título. II. Embrapa Roraima.
CDD: 633.18
Autor
Antonio Carlos Centeno CordeiroEng.Agr. Dr., Pesquisador Embrapa Roraima. BR-174, km 08, caixa
postal. 133., Boa Vista -RR / e-mail: acarlos@cpafrr.embrapa.br
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO...........................................................................................................05
BIOLOGIA FLORAL E REPRODUÇÃO DO ARROZ................................................05
HIBRIDAÇÃO DE ARROZ.........................................................................................18
BASE GENÉTICA DO ARROZ IRRIGADO...............................................................11
MÉTODOS E MELHORAMENTO..............................................................................14
ESTIMATIVAS DE PARÂMETROS GENÉTICOS E FENOTÍPICOS.......................39
INTERAÇÃO GENÓTIPOS POR AMBIENTES.........................................................45
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS..........................................................................46
Métodos de Melhoramento Genético de
Arroz Irrigado
Antonio Carlos Centeno Cordeiro
1. INTRODUÇÃO
Os programas de melhoramento de arroz irrigado no Brasil possuem algumas
prioridades básicas e dentre elas pode-se destacar o desenvolvimento de cultivares que
apresentem as seguintes características: tolerância à toxidez de ferro, resistência ao
acamamento; resistência à doenças, em especial brusone; alto perfilhamento; ótima
qualidade de grãos e alto potencial genético para produtividade de grãos (Soares, 2000).
Para tanto, são utilizados alguns métodos de melhoramento. Os mais comumente
utilizados são os de introdução de plantas, seleção em cultivares heterogêneas (seleção
massal e seleção de linhas puras) e o de hibridação, sendo as populações segregantes
conduzidas pelos processos genealógico, população (bulk), retrocruzamento ou
modificações nesses processos (Fehr, 1987; Soares, 2000). Mais recentemente,
métodos antes utilizados exclusivamente em espécies alógamas, também passaram a ser
viáveis para a cultura, destacando-se a seleção recorrente e o desenvolvimento de
híbridos F1 (Castro et al., 1999). Aliado a isso, o uso de marcadores moleculares vem
auxiliando esses métodos de forma freqüente, procurando melhorar ainda mais a
eficiência dos mesmos.
O objetivo desta publicação, é discutir na forma de revisão de literatura os
princípios, vantagens e desvantagens de cada método visando contribuir para o
aprimoramento do referencial teórico do assunto e concomitantemente servir de consulta
para pesquisadores, estudantes universitários, professores e técnicos interessados no
tema.
8 Métodos de Melhoramento Genético de Arroz Irrigado
2-BIOLOGIA FLORAL E REPRODUÇÃO DO ARROZ
As flores da planta de arroz são hermafroditas e estão reunidas em uma
inflorescência do tipo panícula que emerge da parte terminal do colmo. Essa
inflorescência é composta por um grupo de flores denominadas espiguetas, cujo número
pode variar de um, nas cultivares silvestres, até 500, sendo que cada espigueta contém
uma única flor (Guimarães, 1999; Soares, 2000). Pedroso (1985) relata que, em média,
uma panícula comercial possui de 100 a 150 espiguetas.
A flor de arroz é constituída de: pedicelo, glumelas rudimentares, lema estéril,
pistilo, estames e glumelas. O pedicelo é a estrutura de sustentação da flor e a conecta
ao restante da planta. O órgão reprodutivo feminino, o pistilo, é composto por ovário, um
estilete curto e dois estigmas plumosos, bifurcados e de coloração branca. O órgão
reprodutivo masculino, o androceu, é constituído de seis estames, formados cada um, de
um filete, conectivo, e, na sua extremidade, uma antera, que contém os grãos de pólen.
Cada antera pode conter de 500 a 1000 grãos de pólen com coloração geralmente
amarelada. As glumelas são as estruturas de suporte e proteção da semente, sendo a
maior denominada lema e a menor, pálea (Pedroso, 1985. Fornasieri Filho e Fornasieri,
1993; Silva, 1999; Guimarães, 1999; Soares, 2000).
A panícula jovem torna-se visível a olho nu como uma estrutura cônica, plumosa,
cerca de 10 dias após o início da sua diferenciação. Contudo, como essa estrutura em
desenvolvimento se encontra envolvida pela bainha das folhas, sua observação só é
possível mediante a dissecação do colmo. A emergência das panículas através da
bainha ocorre em cerca de três dias e alcançam o máximo da floração entre o segundo e
o quarto dia após a completa emergência. Durante o estádio de floração, os filetes se
alongam no interior das espiguetas e quando as anteras estão a ponto de tocar a parte
superior desta e de iniciar a antese, se abrem e deixam cair o pólen sobre os estigmas.
No máximo do alongamento dos filetes, as anteras são expostas para fora da espigueta.
Concomitantemente, o estigma que está ereto, começa a se abrir para ambos os lados e
também fica exposto. Esse ponto é considerado o climax da antese e ocorre entre 10 e
20 minutos depois que a espigueta se abre. Toda espigueta passa por esse processo,
entretanto, o momento varia de acordo com a posição que ocupa na panícula. O
processo inicia na extremidade apical da panícula e progride em direção à base. Toda a
panícula terá florescido em um período de cinco a sete dias. Cada espigueta permanece
aberta durante mais ou menos 45 minutos e os estigmas ficam receptivos por quatro a
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cinco dias. Por outro lado, os grãos de pólen sobrevivem fora das anteras somente alguns
minutos (Chatel e Guimarães, 1995; Guimarães, 1999).
Fig. 1- Flor do Arroz
Nas condições do Brasil Central, Guimarães (1999) relata que as espiguetas ficam
abertas por um período que varia de meia a duas horas, sendo essa característica
influenciada pelas condições ambientais, principalmente, temperatura, umidade e
luminosidade. Em dias chuvosos, todas as etapas do processo de reprodução do arroz
podem ocorrer sem que as espiguetas se abram, fenômeno conhecido como cleistogamia
(Chandaratna, 1964).
O arroz é, assim, uma espécie anual autógama, com taxa de cruzamento natural
variável, porém baixa. Guimarães (1999) cita que, na Índia, Kadan e Patil (1933)
encontraram valores entre 0,52% e 4,31%; no Japão, Shimoyama (1920) observou taxa
de 0,08%; na Austrália, Paggendorff (1932) reportou valor médio de 0,44% e nas Filipinas,
Rodrigo (1925) obteve 2,40%. Beachell et al. (1938), também citado por Guimarães
(1999), estudando a influência de fatores ambientais na taxa de cruzamento natural em
diferentes locais dos Estados Unidos, concluíram que a mesma variou de 0,45% a 3,39%,
conforme o ano, a cultivar e o espaçamento utilizados. De um modo geral, entretanto, a
Antera
estigma
Paleaa
Lema
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literatura relata para o arroz uma taxa de cruzamento natural inferior a 1% (Chatel e
Guimarães, 1995; Cutrim, 1994; Santos, 1996; Santos, 2000; Soares, 2000).
3-HIBRIDAÇÃO EM ARROZ
Cruzamentos são necessários quando as características desejáveis não se
encontram presentes no germoplasma disponível para um determinado programa de
melhoramento, ou caso estejam presentes, não se encontrarem combinadas da maneira
desejada. No caso do arroz, a hibridação pode ser realizada manualmente ou através do
uso da macho-esterilidade genética
3.1-Manual
O método de hibridação manual do arroz evoluiu muito a partir de descobertas feitas por
Taillebois e Castro (1986) de que para a produção de sementes híbridas, não há
necessidade de ser usada a planta inteira, mas somente o colmo principal ou perfilho com
a panícula, destacado da planta de origem. Isto possibilita a condução de parentais
masculinos e femininos no campo e, no momento da hibridação, escolher os melhores
perfilhos, destacá-los, eliminar suas folhas e levá-los ao local de hibridação onde devem
ser colocados em recipientes com água para posteriormente serem executadas a
emasculação e a polinização, deixando as sementes híbridas desenvolverem em local
protegido, que pode ser em casa-de-vegetação ou telado. A simplicidade do método
reduz mão-de-obra, aumenta a taxa de pegamento e viabiliza a realização de
cruzamentos em programas de melhoramento pequenos e com pouca estrutura de apoio
(Castro et al., 1999).
Escolhida a planta que será utilizada como genitor feminino na hibridação, a
primeira etapa é a emasculação dos órgãos reprodutivos masculinos, antes que os grãos
de pólen sejam derriçados. Guimarães (1999) cita que, no programa de melhoramento de
arroz da Embrapa Arroz e Feijão, a emasculação é realizada nas primeiras horas da
manhã (antes das oito horas) e no Centro Internacional de Agricultura Tropical (CIAT), na
Colômbia, depois das 15 horas.
A técnica mais comum de emasculação é a que utiliza o corte das espiguetas e a
remoção das anteras por meio de uma pinça ou de uma bomba a vácuo. As panículas do
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genitor feminino devem estar fora da bainha das folhas cerca de 70 a 80%, devendo ser
eliminadas as espiguetas do terço superior (autofecundadas) e inferior (imaturas). O terço
médio, com cerca de 50 a 60 espiguetas é o que deve ser escolhido para a emasculação.
Uma pessoa treinada pode emascular entre 15 a 20 panículas por dia, resultando em
cerca de 1000 espiguetas por dia de trabalho (aproximadamente três horas). Maiores
detalhes sobre o processo são encontrados em Chatel e Guimarães (1995) e Guimarães
(1999).
Realizada a emasculação, a polinização deve ser efetuada no dia seguinte,
podendo-se, entretanto, realizar essa etapa em até três ou quatro dias, período em que os
estigmas ainda estão receptivos. A polinização é realizada pelo método denominado
“chuva de pólen”, ou seja, derriçagem manual do pólen sobre a panícula do genitor
feminino, sendo desejável que esta ocorra entre as 11 horas e 30 minutos e as 12 horas e
30 minutos, que é o ponto de antese máxima do arroz em condições tropicais.
Aproximadamente três a quatro dias após a polinização, o ovário começa a intumescer e
durante os 25 dias seguintes, observa-se o crescimento da semente híbrida, inicialmente
de coloração esverdeada e ao final do processo, completamente branca. A porcentagem
de pegamento pode variar de 60 a 100%, no entanto, cruzamentos envolvendo genitores
geneticamente distantes, como os dos grupos índica e japônica apresentam maior
esterilidade e, conseqüentemente, menor taxa de pegamento (Guimarães, 1999).
A confirmação das plantas híbridas é feita através de genes marcadores. Khush
(1975) menciona uma série de genes marcadores e graus de dominância: altura da planta
(planta alta é dominante), precocidade (recessivo), presença de aristas (dominante),
folhas lisas (recessivo), apículo colorido (dominante) e casca dourada (recessivo).
3.2-Uso da macho-esterilidade genética
Paralelamente ao aprimoramento da técnica de hibridação, foi descoberto o gene
da macho-esterilidade genética, fazendo com que a exploração da variabilidade genética
em arroz deixasse seus limites de planta autógama. Métodos de melhoramento
populacionais, como a seleção recorrente, estão sendo utilizados manualmente
(Guimarães, Correa-Victoria e Tulande, 1995) ou empregando a macho-esterilidade
genética (Rangel e Neves, 1997).
12 Métodos de Melhoramento Genético de Arroz Irrigado
O gene da macho-esterilidade genética do arroz mais conhecido e utilizado é um
mutante da cultivar de arroz irrigado IR36, obtido através de mutagênico químico. Esse
mutante carrega um alelo recessivo (ms) que em homozigose (msms) induz à esterilidade
dos grãos de pólen (Singh e Ikehashi, 1981). Segundo Rangel, Zimmermann e Fagundes
(1999), a IR36, que foi desenvolvida pelo IRRI, é uma cultivar de tipo de planta moderno,
de alta produtividade que foi cultivada em mais de 11 milhões de hectares na Ásia. Além
disso, na obtenção desta cultivar, foram utilizados vários parentais incluindo cultivares
tradicionais e a espécie silvestre Oryza nivara, que doou resistência ao vírus tungro.
Conforme os mesmos autores, a alta performance da IR36, tem sido benéfica na
sintetização de populações de arroz de várzea em programa de seleção recorrente, já que
além do gene da macho-esterilidade outras características agronômicas favoráveis são
também introduzidas.
As plantas macho-estéreis (msms) são facilmente identificadas no campo. Elas
têm meiose normal e só produzem sementes quando fecundadas por pólen (Ms ou ms)
de plantas férteis (MsMs ou Msms), fazendo com que a população se comporte como
uma população alógama. As flores das plantas estéreis abrem-se normalmente na
antese, as anteras são opacas esbranquiçadas e os estigmas ficam totalmente expostos.
As panículas ficam parcialmente envolvidas pela folha bandeira e as plantas continuam a
emitir perfilhos que permanecem verdes mesmo após os primeiros perfilhos terem
chegado à maturação (Rangel e Neves, 1995; Chatel e Guimarães, 1995; Rangel e
Neves, 1997).
A taxa de produção de sementes por polinização cruzada das plantas estéreis
dentro de uma população situa-se em torno de 15%. Esta taxa tem sido satisfatória para
permitir a recombinação de populações em condições naturais no campo, com o auxílio
do vento (Rangel e Neves, 1995). Para conservar o gene da macho esterilidade
genética, são realizados cruzamentos entre o mutante (fêmea, msms) e a cultivar IR36,
macho-fértil (MsMs). A semente híbrida é geneticamente heterozigota (Msms) e produzirá
plantas férteis. Essas plantas são, então, autofecundadas produzindo sementes tanto
homozigotas (MsMs e msms) como heterozigotas (Msms). Essas sementes são
semeadas, originando plantas com genótipos MsMs e Msms (férteis) e de genótipo msms
(macho-estéreis) (Chatel e Guimarães, 1995).
Com esse advento facilitador de cruzamentos, alguns programas de melhoramento
de arroz na Colômbia, Brasil, Chile, Venezuela, Uruguai, Peru, e em alguns países da
África e Madagascar passaram a utilizar-se desse método para criar populações com
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ampla base genética e conduzi-las através da seleção recorrente (Guimarães, 1997;
Badan, 1999).
4-BASE GENÉTICA DO ARROZ IRRIGADO
O desenvolvimento de cultivares de arroz irrigado de porte baixo é considerado
como um dos maiores sucessos da história moderna do melhoramento genético. A
precursora da “revolução verde” foi a cultivar IR-8, lançada para cultivo em 1966 pelo
IRRI, que ficou conhecida como arroz milagroso e revolucionou a agricultura mundial.
Por apresentar características agronômicas como porte baixo, alto perfilhamento,
resposta à adubação nitrogenada e, principalmente, elevada produtividade de grãos, esta
cultivar causou profundas transformações não só a nível de agricultores que passaram a
usar melhor tecnologia nas lavouras, como também, na filosofia dos programas de
melhoramento genético que redirecionaram todo o seu esforço de pesquisa no sentido de
desenvolver cultivares com arquitetura de planta moderna. Para isto, os melhoristas
passaram a utilizar intensamente como genitores nos cruzamentos a cultivar IR-8 ou
linhagens dela derivada, restringindo a variabilidade genética das populações utilizadas
no melhoramento (Khush, 1995; Rangel et al., 1999).
Em meados da década de 70, o Brasil reorganizou a sua estrutura de pesquisa e
os pesquisadores envolvidos com arroz irrigado, de maneira competente, souberam tirar
proveito de todos os avanços conseguidos pelos grupos internacionais de pesquisa,
reduzindo os caminhos a percorrer para atingir as suas metas (Morais e Rangel, 1997).
Todo esforço foi compensado, no início da década de 80, quando cultivares tradicionais
de porte alto foram substituídas pelas modernas de porte baixo, praticamente dobrando a
produtividade do arroz irrigado em vários estados do país. No Rio Grande do Sul, a
produtividade das lavouras aumentou em 30% (Carmona et al., 1994) e, em Santa
Catarina, o aumento foi de 66% (Ishiy, 1985), devido às cultivares modernas e ao melhor
manejo da cultura. Após este grande avanço, Rangel, Guimarães e Rabelo (2000)
ressaltam que a produtividade do arroz irrigado mantém-se a mesma e esforços para
aumentar o potencial produtivo das cultivares não têm resultados em ganhos expressivos.
Morais (1992) e Rangel, Zimmermann e Neves (1992) citam que no Brasil, no decorrer de
toda a década de 80, não foi selecionada nenhuma linhagem que superasse
significativamente, em produtividade de grãos, as melhores cultivares testemunhas (BR
IRGA 409, no Rio Grande do Sul e CICA-8, nos demais estados), apesar de inúmeros
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cruzamentos realizados contemplando genitores de reconhecida diversidade genética.
Vergara et al. (1990) relatam que a produtividade do arroz irrigado tem aparentemente
alcançado um platô e os ganhos verificados para esta característica têm sido decorrência,
principalmente, da incorporação de resistência à patógenos e melhoria no manejo da
cultura.
Segundo Rangel et al. (2000), é provável que a reduzida base genética das
populações utilizadas no melhoramento do arroz irrigado venha contribuindo para o
estabelecimento de patamares de produtividade. Nesse sentido, alguns trabalhos foram
realizados.
Cuevas-Pérez et al. (1992) construíram as árvores genealógicas das cultivares de
arroz lançadas na América Latina e Caribe no período de 1971 a 1989, chegando a 101
ancestrais que são a base de todas as cultivares melhoradas. Apesar da aparente ampla
base genética, verificaram que os ancestrais contribuem de maneira bastante desigual
para o conjunto gênico e que 39% dos alelos são oriundos das cultivares Deo-Geo-Woo-
Gen, Cina e Lati Sail, que são os ancestrais da IR8. Morais (1997) cita que um número
aparentemente grande de linhagens pode representar um tamanho efetivo populacional
restrito quando elas são muito aparentadas.
O trabalho de Dilday (1990), realizado nos Estados Unidos, mostrou que a
proximidade genética das cultivares lançadas para aquele país é grande, sendo que
muitas delas têm entre 50 e 90% de alelos em comum, chamando a atenção para a
necessidade de ampliação da base genética do arroz irrigado. Neste sentido, Linscombe
(1992) descreve que algumas estratégias já foram implementadas. Como fonte de alelos
para maior produtividade, foram utilizadas algumas linhagens chinesas e para melhorar a
qualidade dos grãos, algumas cultivares introduzidas do sul do Brasil, entre elas a BR
IRGA 409, foram incluídas em cruzamento.
Analisando as genealogias de 42 cultivares de arroz irrigado, recomendadas para
cultivo no Brasil no período de 1980 a 1992, Rangel, Guimarães e Neves (1996)
verificaram que sete ancestrais (Deo-Geo-Woo-Gen, Cina, Lati Sail, I Geo Tze, Mong
Chin Vang A, Belle Patna e Tetep) são responsáveis por cerca de 70% do conjunto gênico
das cultivares lançadas no país; no Rio Grande do Sul, que é o maior produtor de arroz
irrigado do Brasil, apenas seis ancestrais contribuem com 86% dos alelos das cultivares
mais plantadas. Segundo dados do Instituto Rio Grandense do Arroz (IRGA), na safra
1998/99, as cultivares El Paso 144 (23%), IRGA 417 (21%), BR- IRGA 410 (13%) e BR-
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IRGA 409 (11%) ocuparam cerca de 68% da área semeada com arroz no Rio Grande do
Sul. Estas cultivares, para Rangel, Guimarães e Neves (1996) apresentam alto grau de
similaridade genética, sendo que a El Paso 144 é oriunda de seleção efetuada dentro da
cultivar BR-IRGA 410, que tem o mesmo pedigree da BR-IRGA 409. A cultivar IRGA 417
foi obtida de um cruzamento triplo onde a BR-IRGA 409 contribui com 50% dos alelos.
Essa situação, de alta uniformidade genética pode trazer sérias conseqüências não só a
orizicultura gaúcha, mas também, a produção brasileira de arroz (Rangel et al., 1999).
Outras cultivares, como BR-IRGA 412 e BR-IRGA 414 cultivadas em menor escala, são
seleções obtidas dentro da cultivar BR-IRGA 409 (Ferreira et al., 2000).
Breseghello, Rangel e Morais (1999), avaliando a base genética das linhagens
testadas na Região Nordeste do Brasil, no período de 1984 a 1993, concluíram que oito
ancestrais são responsáveis por cerca de 65% do conjunto gênico desses materiais,
sendo que, os ancestrais da cultivar IR 8 contribuem com a maior proporção, cerca de
35%.
O estreitamento da base genética das populações apresenta dois problemas para
os programas de melhoramento. O primeiro é a alta vulnerabilidade das cultivares aos
estresses bióticos, devido serem geneticamente relacionadas e, o segundo é a redução
de possibilidades de ganhos adicionais na seleção, principalmente para características
quantitativas como produtividade de grãos, devido o melhorista manejar um conjunto
gênico de tamanho limitado (Hanson, 1959; Rangel, Guimarães e Rabelo, 2000). Nesse
aspecto, Rangel, Guimarães e Neves (1996) advertem para a vulnerabilidade das
cultivares brasileiras de arroz irrigado à brusone, principal doença do arroz, causada pelo
fungo Pyricularia grisea Sacc. Apenas duas fontes de resistência, Tetep e Tadukan têm
sido utilizadas com mais freqüência nos programas de melhoramento genético.
São vários os trabalhos que mostram que a maioria das cultivares/linhagens de
arroz irrigado, utilizadas atualmente, são geneticamente muito aparentadas e que ao se
dar prioridade para o uso delas na formação de uma população base, pouco seria
acrescentado em termos de variabilidade disponível, ou seja, o estreitamento da base
genética pode comprometer futuros progressos com a cultura, principalmente para o
caráter produtividade de grãos. Entretanto, Rasmusson e Phillips (1997) e Phillips (1999)
fazem alguns questionamentos ou indagações a respeito do que tem ocorrido no
melhoramento de algumas culturas. Em cevada, por exemplo, os autores comentam que
a despeito da menor divergência no germoplasma em uso, tem havido considerável
ganho genético para características agronômicas e de qualidade, e que isso só foi
16 Métodos de Melhoramento Genético de Arroz Irrigado
possível considerando-se que o genoma é muito mais dinâmico do que o imaginado, isto
é, existem outros mecanismos que geram variabilidade, além daqueles explicados pelos
princípios mendelianos. Comentários a esse respeito são encontrados em Rasmusson e
Phillips (1997).
Uma outra evidência de que exaurir a variabilidade é mais difícil do que se pensa,
são as respostas a longo prazo. Um bom exemplo, segundo Ramalho, Gonçalves e
Souza Sobrinho (1999), é a seleção para teor de óleo e proteína em milho, que já vem
sendo realizada por, aproximadamente, 100 gerações, sem que a variabilidade tenha se
exaurido, conforme consta no trabalho de Dudley e Lambert (1992). Depreende-se assim,
que, a partir da experiência de outras espécies, pode-se esperar sucesso com a seleção
na cultura do arroz, mesmo com a utilização de material de base genética estreita.
5-MÉTODOS DE MELHORAMENTO
5.1-Introdução de plantas
A introdução de plantas pode ser dividida em duas categorias: a) introdução de
cultivares/linhagens e, b) introdução de populações segregantes. Na primeira, são
introduzidos materiais desenvolvidos em outras regiões ou país, seja para uso direto
pelos agricultores ou como fonte de alelos de interesse para utilização em cruzamentos.
Borém (1997) cita que em áreas não tradicionais, a introdução de cultivares ou linhagens
constitui uma alternativa importante para a expansão de uma nova cultura, pois é um
método rápido de recomendar uma cultivar. Todavia, com o aumento dos níveis de
produtividade, este procedimento nem sempre oferece vantagem em relação a outros
métodos específicos para o ambiente desejado, que envolvem hibridações entre genitores
mais adaptados.
A segunda consiste na introdução de material em gerações segregantes,
normalmente F2 a F4, tendo como principal vantagem a possibilidade de direcionar as
populações para uma determinada condição ambiental, uma vez que os alelos de
adaptação ainda podem ser encontrados. Apesar de ser muito utilizada nos programas
de melhoramento de arroz, deve sofrer restrições devido o advento da atual lei de
proteção de cultivares, que limita o intercâmbio de materiais entre as instituições.
17 Métodos de Melhoramento Genético de Arroz Irrigado
Em arroz, os exemplos mais comuns de introdução de plantas concentraram-se,
basicamente, para o sistema irrigado por inundação contínua, em que foram introduzidos
um grande número de materiais, provenientes, principalmente, dos Estados Unidos,
Colômbia, Filipinas, Japão e Itália (Pedroso, 1985; Cutrim, 1994). Pode ser destacada em
razão da produtividade, precocidade e especialmente, qualidade de grãos, a cultivar
americana Bluebelle, introduzida no Rio Grande do Sul pelo IRGA na década de 70.
Outras cultivares oriundas do CIAT, Colômbia, como CICA 4, CICA 8, CICA 9, do tipo
moderno, introduzidas na mesma década, apresentaram boa adaptação em diferentes
regiões brasileiras. As cultivares BR-IRGA 409 e BR-IRGA 410, lançadas pelo consórcio
Embrapa/IRGA, e que apresentaram ampla adaptação no país, foram selecionados dentro
de populações segregantes introduzidas também do CIAT (Pedroso, 1985).
5.2-Seleção em Cultivares Heterogêneas
O melhoramento de qualquer população pressupõe a existência de variabilidade
genética para o caráter em questão. Esta variabilidade pode ser natural ou criada por
hibridações (Ramalho, Santos e Zimmermann, 1993). Apesar da pressuposta
homozigose dos indivíduos de uma população autógama, autofecundações sucessivas
não implicam em homogeneidade genética entre os indivíduos, principalmente após um
longo período de cultivo, devido a várias causas, como a metodologia de obtenção,
mutações, hibridações naturais e mistura de sementes (Fehr, 1987; Borém, 1997; Soares,
2000). Sendo assim, estas populações constituem-se de excelentes materiais para
serem submetidos à seleção, especialmente pelo fato de já serem adaptadas à região e
possuírem características desejadas pelo consumidor.
Algum sucesso utilizando esse procedimento tem sido obtido com a cultura do
arroz. As cultivares de arroz irrigado BR-IRGA 412 e BR-IRGA 413 são oriundas de
seleção efetuada dentro da cultivar BR-IRGA 409 (Cutrim, 1994).
5.3-Melhoramento por Hibridação
No melhoramento por hibridação, o objetivo principal é a associação em um
mesmo indivíduo, de dois ou mais fenótipos desejáveis que estão presentes em
cultivares/linhagens diferentes. Portanto, realizando cruzamento entre esses indivíduos é
gerada uma população com variabilidade genética suficiente na qual será praticada
seleção visando a obtenção de linhagens que reúnam os fenótipos de interesse (Allard,
1971; Fehr, 1987). Contudo, para atingir esse objetivo, o melhorista precisa tomar
18 Métodos de Melhoramento Genético de Arroz Irrigado
decisões quanto ao critério a ser utilizado na escolha dos genitores a serem utilizados,
como realizar as hibridações e, por último, qual o processo que deve ser empregado na
condução das populações segregantes (Machado, 1999).
A decisão mais importante é a escolha criteriosa dos genitores para realizar as
hibridações porque permite que os esforços dos melhoristas concentrem-se naquelas
populações segregantes potencialmente capazes de fornecer famílias superiores,
traduzindo-se em maior eficiência do programa (Fehr, 1987). Entre outros fatores, essa
escolha depende dos caracteres a serem melhorados, do tipo de herança e da fonte de
germoplasma disponível.
Se o caráter a ser melhorado for de herança qualitativa, isto é, controlado por
poucos genes e pouco influenciado pelo ambiente, a escolha dos genitores é mais fácil.
Nesse caso, normalmente é realizada a hibridação de uma cultivar portadora do alelo de
interesse com outra que apresente boas características agronômicas. Entretanto, quando
estão envolvidos caracteres cujo controle genético é mais complexo, a escolha dos
genitores, as hibridações e o modo de condução das populações segregantes, já não são
tão simples. Os genitores devem ser tais que possibilitem a obtenção de populações com
média alta associada a grande variabilidade para os caracteres sob seleção (Abreu,
1997).
No melhoramento de caracteres quantitativos, como produtividade de grãos,
Baezinger e Peterson (1991) classificam os métodos de escolha dos genitores em duas
categorias: a) os que incluem apenas as informações dos parentais, como,
comportamento “per se”, coeficiente de parentesco e análise multivariada para estimar
divergência genética; b) os que utilizam o comportamento de suas progênies, como, os
cruzamentos dialélicos, a estimativa de m+a e a metodologia de Jinks e Pooni (1976).
Descrição desses métodos é encontrada em Abreu (1997) e Santos (2000).
Na condução de uma população segregante de plantas autógamas, o objetivo é
selecionar no final do processo linhagens homozigóticas com alelos favoráveis no maior
número de locos. Para isso, existem vários métodos, como o genealógico, o da
população, retrocruzamento e os modificados (Fehr, 1987; Ramalho, Santos e
Zimmermann, 1993). A escolha do método é importante, principalmente em função do
tipo e da herança do caráter a ser melhorado, entretanto, se bem conduzidos, todos
levam a resultados positivos.
19 Métodos de Melhoramento Genético de Arroz Irrigado
1 Método Genealógico
O método genealógico também conhecido como pedigree, é muito utilizado na
cultura do arroz. Tem como princípio a seleção de plantas individuais a partir da geração
F2, as quais são mantidas individualmente e semeadas em linhas formando famílias na
geração F3. A partir dessa geração é efetuada a seleção das melhores famílias e das
melhores plantas dentro de cada família. Esse processo é repetido até a geração F5 ou F6
quando a maioria dos locos já está em homozigose, momento em que são identificadas
as melhores linhagens que irão participar de experimentos de avaliação de rendimento
(Ramalho, Santos e Zimmermann, 1993; Borém, 1997).
A variabilidade genética dentro das famílias diminui com o avanço das gerações e
isso é facilmente percebido quando se analisa o que ocorre com os componentes da
variância genética a partir do aumento do grau de endogamia.
Na geração F2, considerando a freqüência alélica igual a 0,5 e ausência de
epistasia, a variância genética entre famílias ( 2Gσ ) contém 22
DA σσ + , sendo 2Aσ a variância
genética aditiva e 2Dσ a variância de dominância. Com o decorrer das autofecundações,
devido ao aumento na freqüência dos locos em homozigose, a participação de 2Aσ
aumenta e da 2Dσ diminui. Assim, a variância genética entre famílias F2:3 contém
222 5,03:2 DAGF
σσσ += , enquanto na F3:4 ela é 222 25,05,14:3 DAGF
σσσ += . Na F4:5 estes valores são
222 125,075,15:4 DAGF
σσσ += e quando atinge a homozigose total na F a variância genética
entre famílias contém 22 2 AGFσσ =
∞ .
Outro aspecto a ser considerado é que na F2:3 a variância genética aditiva dentro
de famílias é 0,5 2Aσ e vai decrescendo com as autofecundações, atingindo 0,125 2
Aσ na
geração F4:5, até se anular na F. Depreende-se então que a seleção dentro de famílias
somente se justifica até a geração F5, pois a partir desta geração a variabilidade dentro
torna-se pouco significativa, com pequeno ganho com a seleção (Ramalho, Santos e
Zimmermann, 1993).
Esse método apresenta como principais vantagens o controle do grau de
parentesco entre os indivíduos selecionados e o descarte de indivíduos inferiores em
gerações precoces (Abreu, 1997). Por outro lado, Cutrim (1994) e Castro et al. (1999)
20 Métodos de Melhoramento Genético de Arroz Irrigado
apresentam as seguintes desvantagens: limitação imposta com relação a quantidade de
material genético que o melhorista pode conduzir, já que as avaliações são efetuadas a
nível de plantas individuais e de linhas e requer muitas anotações; a avaliação de plantas
espaçadas pode não correlacionar bem com as condições normais de densidade de
semeadura; o método privilegia a seleção visual de plantas, deixando a avaliação da
produtividade para depois que a linha já está fixada. Vários trabalhos mostram que a
seleção visual não é eficiente, especialmente para o caráter produtividade de grãos, como
relata Cutrim (1994), para o arroz irrigado. A grande maioria das cultivares de arroz
irrigado recomendadas para o Brasil foi obtida por este método (Castro et al., 1999).
Modificações no método genealógico tem sido utilizadas para facilitar a condução
de maior número de cruzamentos. Passou-se a realizar nas gerações F3 e F4 seleções
massais dentro de famílias, evitando assim o crescimento exagerado do número de
famílias segregantes em cada geração. Neste método, geralmente não se obtêm ganhos
significativos para produtividade, mas caracteres de mais alta herdabilidade, como altura,
tipo de grão e arquitetura da planta, respondem satisfatoriamente (Castro et al., 1999).
2. Método da População
O método da população ou “bulk” consiste no avanço de populações segregantes a
partir da geração F2, onde as plantas são colhidas em conjunto, sendo suas sementes
misturadas, para a semeadura visando à obtenção da geração seguinte. O processo se
repete até que a população alcance suficiente homozigose para a seleção de linhagens,
ou seja, em F5 e F6, a variância aditiva ( 2Aσ ) explorada passa a ser 1,88 e 1,94,
respectivamente. “Abre-se”, então, o “bulk”, isto é, as plantas são extraídas
individualmente da população, constituindo as famílias, que são avaliadas em
experimentos com repetição (Raposo, 1999). Em arroz, costuma-se selecionar panículas
ao invés de plantas, o que facilita o processo e permite a escolha de um grande número
de materiais para, posteriormente, serem submetidos a uma seleção preliminar mais
rigorosa, principalmente, para caracteres de alta herdabilidade (tipo de grão, altura,
arquitetura da planta, ciclo e resistência à patógenos). Após essa seleção é que os
materiais vão compor ensaios com repetição.
Uma vantagem deste método é que durante as gerações de endogamia, o material
sofre ação da seleção natural, onde o princípio básico é que os indivíduos que produzem
21 Métodos de Melhoramento Genético de Arroz Irrigado
maior número de sementes viáveis tendem a contribuir de forma expressiva para a
constituição da geração seguinte e que a capacidade de sobrevivência em competição
deve estar correlacionada positivamente com a adaptabilidade e a produtividade (Borém,
1997). Nesse enfoque, entretanto, é necessário salientar que já há algum tempo é
questionável se a ação da seleção natural é no sentido em que o melhorista deseja.
Nesse aspecto, o trabalho de maior duração foi realizado com cevada e vem sendo
conduzido desde 1929 (Allard, 1988; Soliman e Allard, 1991). Ele iniciou com um
composto denominado CCII, proveniente de um dialelo envolvendo 28 cultivares,
resultando em 387 híbridos F1, que foram misturados. Cerca de 15.000 sementes eram
semeadas a cada geração em bloco isolado. Em torno de 400.000 sementes eram
colhidas por geração, sendo uma parte armazenada e a outra parte misturada para ser
utilizada na semeadura do ciclo seguinte. O processo se repete até os dias atuais.
Visando verificar as trocas que ocorreram com a seleção natural, após alguns anos de
condução da população, foi avaliado o desempenho de todas as gerações até então
obtidas nos anos de 1960/66, 1965/69 e 1976/82. Os resultados referentes às avaliações
realizadas por mais de 50 gerações foram relatadas por Allard (1988), onde compara o
efeito das sucessivas gerações em vários caracteres, com uma cultivar testemunha.
Entre os caracteres quantitativos, a maior ênfase foi dada à produtividade de grãos, peso
de 1000 sementes e número de dias para o florescimento.
As produções de grãos das populações, nas gerações iniciais, foram quase 60% da
produção da testemunha, chegando a 95% já nas gerações F15 a F20. A alteração na
média populacional, devido a ação da seleção natural, variou entre os períodos,
entretanto, ela foi em média, de 2 a 3% por geração, com uma ligeira redução nas
gerações mais avançadas. No caso do peso de 1000 sementes, os resultados
acompanharam o da produtividade de grãos, principalmente até a 20ª geração, quando
então se estabilizaram. A partir daí, o aumento no número de sementes por planta foi o
que explicou os incrementos na produtividade de grãos. Com relação ao ciclo da planta,
o efeito não foi muito pronunciado. Foi detectado um aumento de apenas três dias no
número de dias do florescimento nas sucessivas gerações. Allard (1988) relata que a
seleção natural atuou preferencialmente sobre os indivíduos com maior estabilidade de
produção, isto é, aqueles indivíduos que mantiveram produtividade tanto em condições
favoráveis quanto em condições menos favoráveis.
Outros caracteres foram avaliados, entre eles o peso da espigueta, comprimento
da espigueta, densidade da espigueta, comprimento da arista, número de grãos por
22 Métodos de Melhoramento Genético de Arroz Irrigado
espigueta, tamanho do grão, altura da planta, largura, área da penúltima folha e diâmetro
do colmo. As características peso da espigueta e número de sementes por espigueta
foram os que mais sofreram a ação da seleção natural, especialmente até a geração F20.
Pequenos acréscimos foram observados nas características comprimento da arista,
largura e área da penúltima folha, diâmetro do colmo, decréscimo no comprimento da
espigueta e aumento na densidade da espigueta ocorreram lentamente. As espiguetas
foram quase 10% menores e mais compactas na média das duas últimas gerações do
que nas gerações iniciais. Mudanças na altura média das plantas foram pequenas até
quase a geração F25, quando então começou a aumentar, ocorrendo um acréscimo de 5%
até a geração F53.
Corte (1999), em feijão, avaliou os efeitos da seleção natural em seis populações
segregantes, após 16 gerações de endogamia, utilizando o método do bulk. Constatou-se
uma flutuação na produtividade média dos grãos, além de um ganho genético de 3,16%
por geração, considerado bastante satisfatório para a cultura. Gonçalves (2000)
corroborou com os resultados de Corte (1999) ao analisar o efeito da seleção natural em
vários caracteres do feijoeiro, durante as gerações F2 até F15 em seis populações
segregantes. Para o caráter hábito de crescimento, foi verificado que a seleção natural
atuou no sentido de deixar maior número de plantas de hábito indeterminado, menor peso
de 100 grãos e aumento da produtividade de grãos nos cruzamentos envolvendo um
genitor precoce (Manteigão Fosco 11), com um ganho médio estimado de 5,2% por
geração.
Na cultura do arroz, a competição intergenotípica é um dos fatores mais críticos,
principalmente, entre plantas altas e baixas. É causada por taxas diferenciais no
crescimento e tamanho das plantas vizinhas. Plantas com menor altura em competição,
perfilham menos, apresentam colmos fracos, acumulam menos matéria seca e parecem
agronomicamente inferiores. A tendência é de essas plantas serem eliminadas pela
seleção natural. Segundo Castro et al. (1999), o número de sementes produzido por uma
planta em uma população heterogênea reflete mais sua capacidade de competição com
as plantas circundantes do que sua aptidão para alta produtividade quando em lavouras
homogêneas. Jennings, Coffmann e Kaufmann (1981) verificaram que plantas de arroz
mais altas e vigorosas eram geralmente pouco produtivas e as baixas, quando em
competição com as altas, apresentavam pequena produção de grãos em virtude de
sombreamento. Sakai (1955) citado por Chandaratna (1964) relata que cultivares
japônicas de arroz, normalmente mais produtivas que as índicas, são inferiores com
23 Métodos de Melhoramento Genético de Arroz Irrigado
relação a capacidade competitiva em uma população heterogênea e que essa competição
é muito mais complexa em “bulks” híbridos do que em misturas varietais, tendo em vista
a heterozigose contínua produzir novos genótipos, levando a um número final de
homozigotos extremamente heterogêneo.
A competição intergenotípica tem inviabilizado a utilização do método da população
na cultura do arroz por muitos anos. Entretanto, Santos (2000) relata que hoje, em virtude
da maior uniformidade no porte dos materiais de arroz, este não seja mais um argumento
que justifique a não utilização deste método.
3. Métodos Modificados
Os métodos modificados têm como referência o método genealógico e/ou o método
da população e foram desenvolvidos como novas alternativas, visando melhorar a
eficiência da seleção. Entre estes, os que têm sido mais utilizados são o descendente de
uma única semente, conhecido como SSD (Single Seed Descent) e o método do “bulk”
dentro de famílias (Abreu, 1997).
O método SSD consiste na colheita de uma semente de cada planta da geração F2,
processo que é repetido sucessivamente para as demais gerações, até que a população
alcance homozigose suficiente, quando são obtidas as famílias, em F5 ou F6. “Abre-se”
então o SSD, isto é, os indivíduos superiores são extraídos individualmente da população,
constituindo famílias, as quais são avaliadas em experimentos com repetição (Fehr,
1987). Na Embrapa Soja, este método é bastante utilizado, principalmente de forma
modificada cuja diferença é a coleta de uma vagem com duas a três sementes por planta
agronomicamente superior da população, ao invés de uma única semente. Com isto,
assegura-se melhor germinação dos materiais (Almeida, Kiihl e Abdelnoor, 1997).
O SSD apresenta como principais vantagens, a sua fácil condução, a necessidade
de pouca mão-de-obra e área, além de não necessitar que a população segregante seja
conduzida no ambiente similar ao qual a futura cultivar será recomendada, uma vez que a
fase de aumento da homozigose é separada da fase de seleção (Fouilloux e Bannerot,
1988). Praticamente não é utilizado na cultura do arroz, uma vez que sua principal
vantagem que é a rapidez na obtenção da homozigose, é reduzida para a cultura do
arroz, já que normalmente são possíveis duas gerações por ano no campo. Por outro
24 Métodos de Melhoramento Genético de Arroz Irrigado
lado, Abbud (1981) comprovou a eficiência desse método para o arroz de terras altas,
principalmente quando aplicado à populações segregantes oriundas de cruzamentos
envolvendo genitores superiores ou elites.
O método do “bulk” dentro de famílias derivadas de F2 associa os dois
procedimentos padrões da condução das famílias segregantes em plantas autógamas,
isto é, o genealógico e o “bulk”. Com isso, espera-se reduzir o efeito de amostragem que
é comum no método do “bulk” e o trabalho do genealógico (Rosal, 1999; Raposo, 1999).
Por esse procedimento, as plantas da geração F2 são colhidas individualmente e as
famílias F2:3 são semeadas em linhas isoladas. Cada família é colhida individualmente e
dará origem às famílias F2:4, as quais são novamente semeadas em linha. O processo se
repete até a geração F2:6, quando então são selecionadas visualmente os melhores
indivíduos dentro de cada família para continuar a seleção. Por esse procedimento, toda
a variação entre plantas presente na geração F2 é mantida. Somente as famílias que
apresentarem desempenho excessivamente abaixo das demais serão eliminadas. Dentro
das famílias, será mantida a variação advinda da segregação das plantas F2. Nesse
caso, a seleção natural poderá atuar apenas dentro das famílias, e a perda por
amostragem será restrita apenas à que ocorre dentro das famílias (Rosal, 1999).
Na Universidade Federal de Lavras (UFLA), o “bulk” dentro de famílias F2 é
conduzido com algumas modificações; a principal delas é que, a partir da geração F2:3, as
famílias são avaliadas em experimentos com repetição. Desse modo, a seleção a ser
efetuada nas gerações mais avançadas, por exemplo, na F2:6, será fundamentada no
desempenho médio das famílias por duas a três gerações, evidentemente atenuando o
efeito da interação genótipos x ambientes e dando maior segurança ao melhorista na
decisão de quais famílias deverão ser mantidas (Ramalho, Santos e Zimmermann, 1993;
Abreu, 1997; Raposo, 1999; Rosal, 1999; Santos, 2000).
A abertura do “bulk” pode, ainda, ser postergada para a geração F3. Desta forma a
magnitude de 2Aσ explorada que é de 21 Aσ em F2 passaria para 25,1 Aσ em F3, um
aumento de 50%, sendo este um dos principais argumentos apresentados para o início da
avaliação já a partir da geração F3 (Ramalho, Santos e Zimmermann, 1993).
Em arroz, este método tem sido utilizado mais recentemente na avaliação de
famílias derivadas do programa de seleção recorrente do arroz de terras altas, entretanto,
de maneira semelhante ao procedimento original. A seleção entre as famílias é baseada
na avaliação visual e somente após a seleção das melhores plantas dentro das famílias
25 Métodos de Melhoramento Genético de Arroz Irrigado
(S0:3 em diante) é que são realizados experimentos com repetições para avaliação mais
rigorosa da produtividade de grãos.
4. Método do Retrocruzamento
O objetivo do método do retrocruzamento é recuperar o genótipo do parental
(cultivar elite) exceto para uma ou poucas características consideradas desejáveis
presentes no parental doador (Borém, 1997). Descrição detalhada do método é
encontrada em Allard (1971), Fehr (1987), Ramalho, Santos e Zimmermann (1993),
Borém (1997) e Bueno, Mendes e Carvalho (1999), entre outros.
O uso de marcadores moleculares pode acelerar os programas de
retrocruzamentos, ao permitir a identificação precisa dos indivíduos com maior proporção
do parental recorrente em cada geração. Segundo Sakiyama, Pereira e Zambolim (1999),
os genitores recorrentes e doadores são molecularmente caracterizados (fingerprinting
com marcadores de DNA), e as plantas de cada geração de retrocruzamento são
selecionadas com base em sua similaridade genético-molecular com o recorrente e na
característica a ser melhorada. Sob o ponto de vista prático, Ramalho, Abreu e Santos
(2000) citam que três a quatro retrocruzamentos são suficientes para recuperar o genótipo
do parental recorrente, especialmente se em cada etapa é realizada a seleção visando
eliminar indivíduos com fenótipos indesejáveis. Assim, na primeira geração F1, há 50%
dos alelos de cada pai. No RC1 esse número passa a ser de 75% dos alelos do pai
recorrente. No RC2 é de 87,5%, no RC3 é de 93,75%, ou seja, no RCm espera-se (2m+1-1)/
2m+1, em que m refere-se ao número de retrocruzamentos com o pai recorrente. Por
outro lado, Borém (1997) comenta que se o parental doador não é adaptado,
normalmente, o número de retrocruzamentos tende a ser maior.
Com relação ao número de plantas que devem ser utilizadas em cada etapa do
retrocruzamento, Sedcale (1977) citado por Rangel, Morais e Castro (1998), desenvolveu
uma expressão que estima o número mínimo de plantas a serem cultivadas para se obter
pelo menos um indivíduo com o genótipo desejado, com uma determinada probabilidade
de ocorrência do evento:
k = log (1-p)/log (1-q)
Em que:
26 Métodos de Melhoramento Genético de Arroz Irrigado
k = número mínimo de plantas a serem cultivadas, onde pelo menos uma é do
genótipo desejado;
p = probabilidade de ocorrência do evento (95% ou 99%);
q = freqüência do genótipo desejado.
Baseado nesta expressão, o mesmo autor apresenta ainda uma tabela onde estão
contidos o número total de plantas necessárias para obter um determinado número de
plantas com os alelos de interesse. Esta tabela pode ser utilizada como base para a
maioria dos programas de melhoramento que utilizam retrocruzamentos.
O método do retrocruzamento tem sido bastante utilizado em plantas autógamas,
principalmente na cultura da soja, para incorporar resistência a patógenos em cultivares
cuja suscetibilidade compromete a estabilidade da produção (Almeida, Kiihl e Abdelnoor,
1997).
Em arroz, Rangel, Morais e Castro (1998) conduziram um trabalho na Embrapa
Arroz e Feijão visando incorporar a resistência ao patógeno Pyricularia grisea Sacc, nas
cultivares BR-IRGA 409 e Metica-1. Foram utilizadas cinco fontes doadoras de alelos de
resistência (5287, Carreon, Ramtulasi, Três Marias e Huan-sem-go), originando dez
populações. Após três retrocruzamentos, na geração F2 RC3, foram obtidas famílias com
as características das cultivares BR-IRGA 409 e Metica-1, todavia portadoras dos alelos
de resistência.
Borém (1997), por outro lado, cita que apesar do método do retrocruzamento ser
utilizado quase que exclusivamente para transferir alelos de genitores doadores para
recorrentes, a sua utilidade para introgressão de germoplasma exótico em germoplasma
elite, também tem sido comprovada por diversos autores. Segundo o mesmo autor,
Carpenter e Fehr (1986), em soja, concluíram que dois ou três retrocruzamentos são
suficientes para elevar o nível das populações sem perder demasiadamente as
características dos tipos silvestres. Em arroz irrigado, Rangel (1996) utilizou uma
combinação de retrocruzamentos com marcadores moleculares e mapa genético, na
transferência de alelos da espécie silvestre de arroz Oryza glumaepatula para a espécie
cultivada Oryza sativa. Verificou-se que com dois retrocruzamentos já foi possível
recuperar as características do parental recorrente de forma satisfatória.
27 Métodos de Melhoramento Genético de Arroz Irrigado
Por fim, alguns melhoristas questionam que o método do retrocruzamento é muito
conservador, pois há tendência de permanecer com uma cultivar apenas. Entretanto,
Ramalho, Santos e Zimmermann (1993) citam que é fácil visualizar que se durante o
processo for identificada uma linhagem superior ao pai recorrente, esse pode ser
substituído nos futuros retrocruzamentos. Assim procedendo, o processo torna-se muito
mais dinâmico.
5.4-Seleção Recorrente
A maioria dos programas de melhoramento genético de arroz utilizam métodos
convencionais de plantas autógamas, principalmente o genealógico, onde após a
sintetização da população base, geralmente formada por dois a quatro genitores, esta é
conduzida através de autofecundações e seleções até a obtenção de linhagens. Esses
métodos, segundo Morais e Rangel (1997) cumpriram o seu papel fornecendo nas
últimas décadas cerca de 78 novas cultivares, sendo 30 para o sistema de cultivo em
terras altas e 48 para o sistema de cultivo em várzea, resultando em um aumento na
produtividade média de grãos em torno de 30%. Apesar disto, no caso específico do
arroz irrigado por inundação contínua, vários trabalhos relatam que os ganhos genéticos
conseguidos para essa característica tem sido de baixa magnitude (Santos et al., 1999;
Rangel et al., 2000; Peng et al., 2000) e atribuídos, principalmente, à incorporação de
resistência à doenças e a melhoria do manejo cultural (Rangel et al., 1999).
Nesse contexto, os programas de melhoramento de arroz irrigado em todo o
mundo buscam alternativas para aumentar o potencial produtivo da cultura, seja com um
novo ideótipo de planta (Khush, 1995), ou com novas estratégias de melhoramento, como
é o caso da seleção recorrente (Rangel e Neves, 1997) e o desenvolvimento de híbridos
F1 (Neves, Rangel e Cutrim, 1997). Aqui, serão enfocados apenas os aspectos da
seleção recorrente. .
A seleção recorrente é um processo sistemático de seleção de indivíduos dentro de
uma população geneticamente heterogênea, seguido da recombinação dos indivíduos
selecionados para formar uma nova população; esta por sua vez é utilizada para iniciar
novo ciclo de seleção. Portanto, a seleção recorrente é um processo dinâmico e
contínuo, que envolve a obtenção de famílias, avaliação e o intercruzamento das
melhores, visando, desse modo, aumentar a freqüência de alelos favoráveis e, por
28 Métodos de Melhoramento Genético de Arroz Irrigado
conseqüência, melhorar a expressão fenotípica do caráter sob seleção (Ramalho, Santos
e Zimmermann, 1993; Geraldi, 1997).
Esse método foi proposto por Hull (1945) e tem sido extensivamente utilizado no
melhoramento de plantas alógamas (Hallauer, 1992; Lima Neto, 1998). No caso das
plantas autógamas, apesar do seu emprego ser mais recente, são vários os relatos de
seu sucesso no melhoramento das espécies envolvidas, como soja (Werner e Wicoox,
1990; Uphoft, Fehr e Cianzio, 1997), trigo (Wang et al., 1996), aveia (De Koeyer et al.,
1993; De Koeyer, Phillips e Stuthman, 1999), feijão (Ranalli, 1996; Singh et al., 1999) e
arroz (Rangel e Neves, 1997; Morais, Castro e Sant’ana, 1997; Martinez et al., 1997;
Solano, 1999; Marassi et al., 1999; Guimarães, 1999).
Existem na literatura alguns argumentos que justificam o emprego da seleção
recorrente em plantas autógamas (Fouilloux e Bannerot, 1988; Ramalho, 1997; Geraldi,
1997). Um argumento bem convincente foi apresentado por Fouilloux e Bannerot (1988),
citados por Ramalho (1997). “Eles consideraram o avanço das gerações utilizando o
método dos descendentes de uma semente (SSD), herdabilidade do caráter igual a 100%,
n locos segregando e Q o número de famílias sendo avaliadas. Contudo, o que será
comentado vale para qualquer situação. Seja uma planta F1, proveniente do cruzamento
de duas linhagens. Nessa condição, nos locos segregantes a freqüência dos alelos
favoráveis (B=p) e desfavoráveis (b=1-p) é igual a 0,5, e nas sucessivas gerações tem-se
uma distribuição binomial para esses alelos. Na distribuição binomial, a média (m) é
fornecida por m=np, uma vez que p=1/2, m=n/2 e a variância (σ2 ) é igual a σ2=np(1-p) = n/
4. Quando n é grande, a distribuição binomial tende para a normal. Assim, o número de
alelos favoráveis presente em uma linhagem qualquer (Li) pode ser predito, utilizando as
propriedades da distribuição normal, isto é, Li=m+zσ, uma vez que em uma distribuição
normal padronizada σ)( mLiz −= . Substituindo a média e a variância nessa expressão,
tem-se 42nzLi n += . A partir dessa expressão, os autores fizeram a predição do número
de alelos favoráveis que a melhor linhagem irá conter, considerando diferentes números
de locos segregando pela expressão 42nzLnLi Q+= , em que LQ é referente a
distribuição de máximo e corresponde ao desvio esperado do melhor indivíduo em relação
à média de uma amostra de tamanho Q com distribuição normal.
29 Métodos de Melhoramento Genético de Arroz Irrigado
Utilizando a expressão já mencionada, pode-se predizer o número de alelos
favoráveis na melhor linhagem (L1), na segunda melhor (L2), terceira melhor e assim por
diante. Supondo que em um ciclo seletivo sejam identificadas as duas melhores
linhagens, sendo que em L1 ocorre r1 alelos favoráveis e em L2, r2 alelos favoráveis. Na
seleção recorrente, essas duas melhores linhagens são intercruzadas para obter o ciclo
seguinte podendo ocorrer então três situações:
*0) locos homozigóticos para os alelos favoráveis nas duas linhagens. Eles não mais
segregam e representam os alelos favoráveis fixados com a seleção. A freqüência
esperada deles é: a = (r1r2)/n.
*1) locos homozigóticos para alelos desfavoráveis nas duas linhagens. Nesse caso a
fixação ocorreu em sentido contrário e não há possibilidade de se obter alelos favoráveis,
para esses locos, no segundo ciclo de seleção. Sua freqüência é: c = (n-r1)(n-r2)/n.
*2) locos em que as duas linhagens se complementam. A freqüência será b = r1+r2 –
(2r1r2)/n, onde r1+r2 é a freqüência dos homozigotos favoráveis e (2r1r2)/n é a freqüência
dos homozigotos desfavoráveis.
Usando o conhecimento anterior, pode-se ter o número de alelos favoráveis nas
linhagens L1 e L2 e também após o segundo ciclo seletivo, considerando o mesmo número
de famílias sendo avaliadas em ambos os casos (Tabela 1). Pode-se agora estimar o
número de famílias a serem avaliadas em um ciclo seletivo para se ter o mesmo resultado
de dois ciclos seletivos. Na Tabela 2, são apresentados esses números considerando
n=40 locos segregando. Quando nos dois ciclos seletivos foram avaliadas 100 famílias
de cada vez, a melhor linhagem deverá conter 32,6 alelos favoráveis. Para se ter essa
mesma linhagem com um ciclo seletivo, é necessário avaliar 18.800 famílias, ou seja, um
número 94 vezes superior. Conclui-se então, que dois ciclos seletivos foram muito mais
eficientes que um ciclo para acumular alelos favoráveis e desta forma, a chance de
sucesso do melhorista é ampliada em muito com o emprego da seleção recorrente”.
Tabela 1 – Número de alelos favoráveis presente nas duas melhores linhagens
selecionadas (L1=r1, L2=r2) após um ciclo seletivo e na melhor linhagem (L) após o
segundo ciclo seletivo, considerando diferentes números de locos segregando e de
famílias avaliadas (Adaptado de Fouilloux e Bannerot, 1988)
Número de locosSegregando (n)
Número de famíliasAvaliadas (Q=Q’)1/
r12/ r2
2/ a b L
20 50 15,0 14,1 10,6 8,0 17,7100 15,6 14,8 11,5 7,3 18,6
30 Métodos de Melhoramento Genético de Arroz Irrigado
200 16,1 15,4 12,4 6,7 19,3400 16,6 15,9 13,2 6,1 19,9
40 50 27,1 25,9 17,5 17,9 31,3100 27,9 26,8 18,7 17,3 32,6200 28,7 27,6 19,8 16,7 33,8400 29,4 28,4 20,9 16,1 34,8
1/ Q=Q’ indica que o mesmo número de famílias foi considerado nos dois ciclos.2/ r1r2: número de locos com alelos favoráveis na melhor e na segunda melhor linhagem,
respectivamente, após o 1º ciclo seletivoa = (r1xr2)/n e b = r1+r2 – (2r1r2)/nL: número de locos com alelos favoráveis na melhor linhagem após o segundo ciclo seletivo.
Um outro argumento é o de Ramalho (1997), que foi adaptado para ser
exemplificado com a cultura do arroz. Considere uma situação em que se tenha um
caráter controlado por doze genes (número básico de cromossomos da espécie), com
distribuição independente e que os alelos favoráveis (letras maiúsculas) estejam
distribuídos em quatro linhagens (L1, L2, L3, L4) com as seguintes constituições
genotípicas:
L1 = AA BB cc dd EE ff gg hh ii jj LL mm
L2 = aa bb CC DD ee ff gg hh ii JJ ll mm
L3 = aa bb cc dd EE FF gg hh ii jj ll mm
L4 = aa bb cc dd ee ff GG HH II jj ll MM
Tabela 2 – Número de indivíduos a serem avaliados em um ciclo seletivo para se obter
uma linhagem com o mesmo número de alelos favoráveis de dois ciclos seletivos,
considerando 40 locos segregantes e diferentes números de famílias (Q) sendo avaliadas
(Fouilloux e Bannerot, 1988)
Número de famílias a serem avaliadasNúmero desejado Dois ciclos seletivos Um ciclo seletivo Q1/Q2
de alelos favoráveis
Q=Q’11/ Q1
31,3 50 3500 3532,6 100 18800 9433,8 200 116400 29134,8 400 543200 679
1/ Q=Q’ indica que o mesmo número de famílias foi considerado nos dois ciclos
31 Métodos de Melhoramento Genético de Arroz Irrigado
Se o objetivo é obter um indivíduo que possua todos os alelos favoráveis, uma das
estratégias é proceder um cruzamento múltiplo. Do cruzamento entre as linhagens L1 x L2
é obtido o híbrido F12 (Aa Bb Cc Dd Ee ff gg hh ii Jj Ll mm) e das linhagens L3 x L4, o
híbrido F34 (aa bb cc dd Ee Ff Gg Hh jj ll Mm). Posteriormente será obtido o híbrido duplo
F12 x F34, com o objetivo de se ter pelo menos um indivíduo segregando para todos os
locos, ou seja, Aa Bb Cc Dd Ee Ff Gg Hh Ii Jj Ll Mm. Nessa situação, esse indivíduo é
esperado na freqüência de 1 em 4096, ou seja, (1/2)12, e como a possibilidade de
identificar esse indivíduo nessa geração é muito baixa, a seleção deverá ser postergada.
Se a população for conduzida pelo método do “bulk”, na geração S0 que corresponde a F2,
para se ter pelo menos um indivíduo de genótipo A_B_C_D_E_F_G_H_I_J_L_M_, a
freqüência do mesmo será de 1/4096 x (3/4)12 = 1/129308. Na geração S1, que
corresponde a F3 a freqüência do mesmo genótipo seria de 1/4096 x (5/8)12 = 1/1.150.976,
e nas gerações S2 (F4) e S3 (F5), as freqüências seriam de 1 indivíduo em 4.082.156 e 1
em 8.105.366, respectivamente. Assim, com o decorrer das gerações de autofecundação
a probabilidade de ser obtida a planta desejada é praticamente nula.
O autor comenta ainda que, para aumentar a probabilidade de ser obtido o
indivíduo desejado, a seleção poderia ser realizada já nas primeiras gerações, contudo, a
eficiência dessa seleção é baixa (Cutrim, 1994; Silva et al., 1994; Vargas, 1996). Além do
mais, com o decorrer das gerações de autofecundações sucessivas, se um alelo favorável
não está presente, ele nunca irá ocorrer junto com os demais. Se forem considerados
dois genes ligados, sendo um favorável e outro desfavorável, a probabilidade que ocorra
recombinação entre eles em sistema de autofecundações sucessivas é muito pequena.
Depreende-se, então, que é praticamente impossível acumular todos os alelos favoráveis
de uma só vez, isso só pode ser realizado por etapas, através de ciclos sucessivos de
seleção e recombinação, que é o princípio da seleção recorrente.
Um último argumento é o citado por Geraldi (1997), que mostra que a melhor
estratégia para reunir alelos favoráveis é primeiramente aumentar a freqüência destes na
população para posteriormente proceder a extração de linhagens. O autor apresenta o
seguinte exemplo:
Supondo um caráter controlado por 20 genes e considerando-se cinco populações
diferentes quanto à freqüência dos alelos, isto é:
População 1 (p = 0,3) – população ruim
32 Métodos de Melhoramento Genético de Arroz Irrigado
População 2 (p = 0,4)
População 3 (p = 0,5)
População 4 (p = 0,6)
População 5 (p = 0,7) – população melhorada
Admitindo que uma linhagem favorável deve ter pelo menos 80% dos alelos
favoráveis (16 no caso), a probabilidade de ocorrência de tal linhagem é:
P(16F) = P(16F) + P(17F) + P(18F) + P(19F) + P(20F)
Na homozigose, tais freqüências podem ser calculadas pelo
desenvolvimento da seguinte expressão:
[ ] [ ] [ ] [ ] [ ] [ ] [ ] 44201620
11201920
0202020
20 ... qpCqpCqpCqp −− +++=+
Aplicando a expressão às cinco populações mencionadas anteriormente, tem-se os
seguintes resultados:
P Prob (no mínimo 16 alelos favoráveis)0,3 0,00055% ou 1 em 180.0000,4 0,032% ou 1 em 3.1500,5 0,59% ou 1 em 1700,6 5,09% ou 1 em 200,7 23,75% ou 1 em 5
Com p=0,3 a freqüência de linhagens favoráveis (80% dos alelos favoráveis) é de
aproximadamente 1 em 180.000, de tal forma que é praticamente impossível recuperar
uma linhagem do tipo favorável. Por outro lado, com p=0,5 esta freqüência é de
aproximadamente 1 em 170, enquanto que para p=0,7 esta freqüência é de 1 em 5. Em
outras palavras, em populações muito ruins é muito difícil de se obter linhagens com alta
concentração de alelos favoráveis pelos processos clássicos de endogamia e seleção.
Em tais casos, fica claro novamente a importância da seleção recorrente, ou seja, através
de ciclos sucessivos de seleção e recombinação, aumentar a freqüência de alelos
favoráveis na população, conforme exemplificado de forma muito simples a seguir:
Considere inicialmente os parentais P1 e P2, onde um dos parentais (P1) contém um
dos alelos favoráveis (A) e o outro parental (P2) contém o outro alelo favorável (B).
Considerando que os genes segregam independentemente, tem o seguinte resultado:
33 Métodos de Melhoramento Genético de Arroz Irrigado
P1: AAbb x P2: aaBB
F1: AaBb
F2 – C0 F
AABB: AABb: AAbb: AaBB: AaBb:
1/162/161/162/164/16
AABB: 1/4
Aabb: 1/4
Aabb: 2/16 aaBB: 1/4aaBB: 1/16aaBb: 2/16 aabb: 1/4Aabb: 1/16
f(A) = f(B) = 0,50
Se forem selecionados e recombinados os genótipos: AABB (1/9); AABb (2/9); AaBB
(2/9); AaBb (4/9), tem-se:
F2 – C1 F
AABB: 16/81AABb: 16/81 AABB: 0,45AaBB: 16/81AaBb: 16/81 AAbb: 0,22AAbb: 4/81aaBB: 4/81 aaBB: 0,22Aabb: 4/81aaBb: 4/81 aabb: 0,11aabb: 1/81
f(A) = f(B) = 0,67Fonte: Geraldi (1997).
Observa-se que a freqüência dos alelos A e B, que inicialmente era de 0,5 passou
para 0,67 e, conseqüentemente, aumentou a freqüência do genótipo favorável (AABB)
nas gerações avançadas, bem como diminuiu a freqüência do genótipo desfavorável
34 Métodos de Melhoramento Genético de Arroz Irrigado
(aabb) de maneira bastante acentuada. A medida do progresso genético nesse caso é
dada pela alteração na freqüência dos alelos favoráveis, isto é: ∆ p(A) = ∆ p(B) = 0,67 –
0,5 = 0,17.
Formação da População Base
Para Ramalho, Gonçalves e Souza Sobrinho (1999), a formação da população
base é uma fase crítica, pois dela dependerá todo o sucesso futuro. A população base
deve apresentar média alta para o caráter de interesse e suficiente variabilidade genética
para possibilitar a seleção. No que se refere a média alta, está implícito, em se tratando
de produtividade de grãos, que na sua formação devem estar presentes
cultivares/linhagens adaptadas. A inclusão de material exótico, com pouca adaptação,
resultará em redução da média populacional. Conforme os mesmos autores, se houver
necessidade de utilização de linhagens exóticas para solução de problemas, como por
exemplo, a resistência à pragas e doenças, elas deverão ser incluídas, primeiro, em
programa separado de retrocruzamento, e só depois que existir um bom nível de
produtividade é que os descendentes das linhagens deverão ser incluídos no
intercruzamento. Paterniani e Miranda Filho (1987), citados por Morais (1992), relatam
que a média da população original constitui um parâmetro digno de atenção por ocasião
da seleção dos parentais. Com esse cuidado, pode-se iniciar um programa de seleção
em uma população que apresenta a média em um nível tal que demandaria vários ciclos
de seleção para uma população inferior atingir o mesmo nível.
A decisão sobre o número de parentais envolvidos na formação da população base
é um outro questionamento importante. Ramalho, Gonçalves e Souza Sobrinho (1999)
citam que se o número de parentais for muito grande, a probabilidade de encontrar todos
os genitores com boa expressão para o caráter é muito pequena e mesmo que isso fosse
possível, a contribuição dos alelos de cada parental seria tão pequena que a maioria seria
perdida após os primeiros ciclos seletivos. Por outro lado, se o número for muito
pequeno, a chance de associar a maioria dos alelos favoráveis para o caráter em questão
é também pequena. Em princípio, os autores citam que 10 a 20 parentais é um número
satisfatório.
Um outro ponto que surge é como intercruzar os parentais para formar a população
base. Na cultura do arroz, são utilizados dois procedimentos: macho-esterilidade genética
35 Métodos de Melhoramento Genético de Arroz Irrigado
e hibridações artificiais dirigidas em esquema de dialelos circulantes (Rangel e Neves,
1995; Morais, Castro e Sant’ana, 1997).
O processo de sintetização da população base com o uso da macho-esterilidade
genética caracteriza-se por uma série de cruzamentos manuais entre os genitores e a
fonte do alelo ms, seguido de retrocruzamentos com os genitores, ou cruzamento dos F1’s
com os genitores de número subseqüente para adiantar a recombinação. O resultado
desta fase são F1’s férteis heterozigotos (Msms), que necessitam de uma geração de
autofecundação para restabelecer os genótipos macho-estéreis (msms). Esses genótipos
que são de fácil identificação na floração, são essenciais para a recombinação no campo.
As sementes obtidas das autofecundações devem ser misturadas para compor a nova
população. O semeio destas sementes no campo permitirá a polinização cruzada das
plantas macho-estéreis (msms) pelas férteis (Msms ou MsMs), o que caracteriza o
primeiro ciclo de intercruzamento ou recombinação. Após três intercruzamentos,
considera-se pronta a população base, cuja constituição final deverá ser estabelecida em
função da participação percentual de cada cultivar utilizada (Fujimaki, 1979; Rangel e
Neves, 1995). Uma das dúvidas que existia neste processo, é se realmente seriam
necessários três intercruzamentos. Cordeiro(2001), verificando o efeito de
intercruzamentos na formação da população de arroz irrigado CNA 5, concluiu que
intercruzamentos da população base não mostraram ser vantajosos na condução do
programa de seleção recorrente de arroz irrigado. Maiores detalhes quanto ao esquema
empregado para os intercruzamentos podem ser encontrados em Cordeiro(2001) e
Cordeiro et. al(2003).
Uma outra maneira de formar a população base é por meio de cruzamentos
manuais, utilizando um esquema de dialelo circulante, como por exemplo, o proposto por
Bearzotti (1996), citado por Ramalho (1997). Neste esquema, cada parental é sempre
cruzado com outros dois, de modo que nos sucessivos intercruzamentos a contribuição
de cada genitor seja a mesma. Esse procedimento de intercruzamento tem algumas
vantagens: a recombinação é dirigida e assim a probabilidade de perda de alelos dos pais
originais é menor; há um menor número de cruzamentos em relação ao dialelo completo
ou até mesmo o parcial; facilidade de identificação dos cruzamentos, pois em cada caso,
o mesmo pai é cruzado com apenas dois outros. Maiores detalhes sobre este esquema
serão comentados no item de recombinação das famílias.
No melhoramento populacional do arroz irrigado, conduzido no Brasil pela Embrapa
Arroz e Feijão, foram sintetizadas cinco populações, todas elas com o gene da macho-
36 Métodos de Melhoramento Genético de Arroz Irrigado
esterilidade genética. Maiores detalhamentos sobre a formação dessas populações
podem ser encontrados em Rangel, Zimmermann e Fagundes (1999) e Cordeiro (2001).
Avaliação e Seleção das famílias
Na avaliação dos indivíduos ou famílias, a seleção na população base pode ser
fenotípica-massal ou através de teste de famílias. A primeira opção é aconselhável
quando o caráter apresenta herdabilidade alta e pode ser selecionado visualmente com
eficiência. Para os caracteres com menor herdabilidade, a seleção deve ser efetuada a
partir de famílias em experimentos com repetição. Em qualquer dos casos, é considerada
a fase mais importante, visto que, se as melhores famílias ou indivíduos forem
identificados, certamente a recombinação contribuirá para aumentar a freqüência de
alelos favoráveis na população (Ramalho, 1997). As famílias, na maioria dos casos, são
avaliadas nas gerações S0:1 e/ou S0:2.
Com relação ao número de famílias a serem avaliadas, Ferreira (1998),
trabalhando com diferentes populações de feijoeiro concluiu que devem ser usadas, no
mínimo, 100 famílias para representar a variabilidade das populações. Fouilloux e
Bannerot (1988) recomendam de 50 a 200 famílias por população para o feijoeiro,
enquanto Cooper (1988) utilizou somente 30 famílias por população em um programa de
melhoramento de soja nos Estados Unidos. Ramalho (1997) sugere avaliar 20 famílias de
feijoeiro, por cruzamento, em um esquema de dialelo circulante com 20 parentais, o que
corresponde a avaliação de 400 famílias por ciclo de seleção. Geraldi e Souza Júnior
(2000), estudando amostragem genética para programas de seleção recorrente com arroz
que utilizam a macho-esterilidade genética, concluíram que o tamanho ideal da amostra
para preservar as propriedades genéticas de uma população, correspondeu a um
tamanho efetivo mínimo (Ne) de 200. Esse tamanho efetivo corresponde a 200 plantas
aleatórias ou 200 famílias S1. Na cultura do milho, Pinto, Lima Neto e Souza Júnior
(2000) relatam que 200 progênies S1 seria o tamanho adequado para avaliação em
programas de seleção recorrente.
No melhoramento genético do arroz irrigado, tem-se empregado o método da
seleção recorrente em famílias S0:2, onde são avaliadas entre 200 a 300 famílias, a cada
ciclo de recombinação (Rangel e Neves, 1995; Rangel e Neves, 1997).
37 Métodos de Melhoramento Genético de Arroz Irrigado
Os passos deste método, utilizados pela Embrapa Arroz e Feijão, conforme Rangel
e Neves (1997), são:
Ano 1 (safra) – Obtenção das famílias. As populações originais (S0) segregando 50%
de plantas macho-férteis (Msms) para 50% de plantas macho-estéreis (msms), são
semeadas para a seleção de plantas S0:1 macho-férteis. São colhidas cerca de 250
plantas por população.
Ano 1 (entressafra) – Multiplicação das famílias. Parte das sementes S0:1 são
armazenadas e parte são semeadas com o objetivo de aumentar a quantidade de
sementes para os ensaios de avaliação de rendimento. Simultaneamente com a
multiplicação, é feita a seleção das 200 melhores famílias, considerando-se
principalmente resistência às doenças e tipo de grão. Sementes das plantas de cada
família são colhidas em “bulk” constituindo as famílias S0:2. As famílias S0:1 segregam
na proporção de 75% de plantas macho-férteis (Ms_) para 25% de plantas macho-
estéreis (msms).
Ano 2 (safra) – Avaliação das famílias S0:2. As 200 famílias S0:2 são avaliadas em
ensaios com delineamento experimental de Blocos Aumentados de Federer. As
parcelas são constituídas de três linhas de cinco metros de comprimento. A seleção
das famílias superiores é feita baseando-se na produtividade média, resistência às
doenças e tipo de grão. A intensidade de seleção utilizada é de 25% garantindo um
tamanho efetivo de Ne=50. Os ensaios são conduzidos dentro de sistema em rede
formado por várias instituições em todo o país. Das famílias superiores selecionadas
com base na média dos vários locais, são misturadas sementes remanescentes S0:1
em quantidades iguais para a próxima etapa que é a recombinação. As famílias S0:2
selecionadas em cada local são utilizadas para extração de linhagens para aquele
local específico, por meio dos métodos convencionais de melhoramento de
autógamas. Maiores detalhes sobre o esquema de extração de linhagens são
encontrados em Rangel e Neves (1995).
Recombinação das Famílias Superiores
A terceira etapa ocorre com a recombinação das famílias selecionadas formando
uma nova população, a partir da qual pode-se iniciar outro ciclo para posterior
recombinação e assim por diante.
38 Métodos de Melhoramento Genético de Arroz Irrigado
Nesta fase, o uso de um número adequado de indivíduos que irão formar a
população melhorada é de grande importância no melhoramento populacional para evitar
a diminuição da variabilidade genética. Assim, o melhorista deve levar em consideração
não só a seleção de indivíduos superiores baseando-se nos objetivos do seu programa,
como também, deve evitar a perda de alelos que contribuem positivamente para um
melhor comportamento geral da população. Para a seleção de uma determinada
característica, deve-se utilizar uma amostra da população cujo tamanho efetivo seja
suficientemente grande para garantir os progressos na direção que se deseja, como
também para assegurar a presença de alelos favoráveis para todas as demais
características de interesse (Rangel, Zimmermann e Fagundes, 1999). Por outro lado,
Ramalho (comunicação pessoal) questiona se em plantas autógamas, tamanho efetivo é
realmente muito importante, já que pela dinâmica do processo de seleção recorrente é
possível fazer introgressões de novos alelos sempre que for necessário aumentar a
variabilidade genética da população trabalhada.
A fórmula básica, que se pode utilizar para se determinar o tamanho efetivo, em
qualquer caso de organismos bissexuais, quando a autofecundação também pode
ocorrer, de acordo com Morais (1997) é a seguinte:
Ne = N/2rii
em que,
Ne – é o tamanho efetivo;
N – é o número de indivíduos que serão recombinados;
rii – é o coeficiente de parentesco do indivíduo com ele mesmo.
Considerando N plantas S0 (S0:0), famílias S1 (S0:1) ou generalizando, S0:m, como
unidades de recombinação, o tamanho efetivo da população melhorada será: Ne =
N/2(1/2) = N.
Pereira (1980), considerando um modelo genético aditivo, concluiu que o tamanho
efetivo necessário para garantir êxito em um processo seletivo depende da estrutura da
39 Métodos de Melhoramento Genético de Arroz Irrigado
população, porém o seu valor mínimo deve ser, aproximadamente, 40 para populações de
base genética ampla, 25 para populações melhoradas, 50 para populações pouco
melhoradas. Hallauer e Miranda Filho (1981), citados por Morais (1997), sugerem utilizar,
no mínimo, 20 a 30 famílias nas recombinações. Em esquema de dialelo circulante com
20 parentais, Ramalho (1997) sugere utilizar na recombinação, a melhor família por
população avaliada, que neste caso, constituem 20 famílias. Para o arroz, Morais (1997)
recomenda para programas de seleção recorrente com o uso da macho-esterilidade
genética, um tamanho efetivo nunca inferior a 50. Neste sentido, Rangel, Zimmermann e
Fagundes (1999) relatam que no programa de melhoramento populacional conduzido pela
Embrapa Arroz e Feijão tem-se utilizado na formação da população melhorada, no
mínimo 50 famílias S0:1, cuja recombinação no campo é feita da maneira como segue:
Ano 2 (entressafra) – A recombinação das famílias selecionadas é feita utilizando-
se 2.400 plantas oriundas das sementes remanescentes S0:1 que são misturadas e
semeadas em lote isolado. Para que se tenha um bom nível de recombinação, as plantas
são transplantadas em três épocas (800 plantas/época) espaçadas uma da outra de sete
dias. Na floração as plantas macho-estéreis são identificadas e na maturação as
sementes destas plantas são colhidas individualmente. Quantidades iguais de sementes
de cada planta macho-estéril são misturadas para formar a população de ciclo 1.
A freqüência de plantas macho-estéreis nas famílias é de grande importância para
que se tenha uma boa recombinação. Assim, ao se recombinar famílias S0:1, tem-se uma
proporção de três plantas macho-férteis para uma macho-estéril, o que fornece no campo
uma boa freqüência de plantas estéreis. A recombinação das famílias em gerações de
autofecundação mais avançada, por exemplo S0:2, acarretará em uma redução da
freqüência de plantas macho-estéreis, implicando no aumento do número de plantas da
população para que a recombinação não seja prejudicada. Além do mais, na geração
S0:2, o tamanho efetivo é menor, uma vez que na S0:1, existe uma maior variabilidade em
decorrência de um maior número de plantas geneticamente diferentes, e assim, com
maior tamanho efetivo populacional.
No ano 3 (safra) é iniciado novo ciclo de seleção que é conduzido da mesma forma
que o descrito anteriormente. Desta forma, cada ciclo de seleção é completado em dois
anos.
Rangel, Zimmermann e Neves (1999) comentam ainda que, se durante os
sucessivos ciclos de seleção recorrente for detectado a necessidade de serem feitas
40 Métodos de Melhoramento Genético de Arroz Irrigado
novas introgressões de alelos nas populações, para as características objeto de seleção,
essas poderão ser feitas durante o processo de recombinação. Para avaliar as
conseqüências destas introgressões sobre as características em seleção, cada nova fonte
de alelos será cruzada com uma amostra de indivíduos da população. As famílias de
meio-irmãos, resultantes destes cruzamentos, serão avaliadas juntamente com as
famílias S0:2 nos ensaios regionais. Com isto, será possível avaliar a capacidade geral de
combinação (CGC) destes indivíduos que poderão participar da população. Se a CGC for
significativa no sentido desejado, então, a nova fonte de variabilidade apresenta
divergência genética em relação a população e pode contribuir com alelos favoráveis para
o melhor desempenho desta. Na recombinação seguinte, os novos alelos seriam então,
definitivamente incorporados na população.
No caso da recombinação ser realizada sem o uso da macho-esterilidade genética,
uma das opções relatadas na literatura como já comentado anteriormente é a proposta de
Bearzotti (1996), citado por Ramalho (1997).
Suponha que estejam envolvidos 20 genitores, que serão cruzados segundo um
esquema de dialelo circulante, em que cada um deles é cruzado com dois outros. Esses
cruzamentos são escolhidos de modo que nos sucessivos intercruzamentos a
contribuição de cada genitor seja a mesma. Nesse caso, só após a quarta geração, é que
duas famílias aparentadas voltam a ser cruzadas (ver esquema). Em cada
intercruzamento, são obtidas 20 populações híbridas. De cada uma delas são obtidas
separadamente as sementes das gerações F1 e F2 (S0) e geradas, por exemplo, 23
famílias F2:3 de cada população para serem avaliadas em experimentos com repetição.
Nesses experimentos são incluídas as 23 famílias e mais duas testemunhas, podendo-se
adotar o delineamento de látice 5x5. A melhor família, em cada um dos 20 experimentos,
é utilizada na recombinação para a obtenção do ciclo seguinte. Nesse caso, a
recombinação é novamente efetuada utilizando-se um dialelo circulante em que cada
família é cruzada com duas outras, seguindo o esquema proposto.
É importante salientar que a cada ciclo seletivo o processo de seleção das famílias
é continuado, avaliando-se as gerações seguintes (F4, F5), utilizando os métodos
convencionais de condução de populações segregantes. Desse modo, a cada ciclo
seletivo, novas e melhores linhagens são disponibilizadas para avaliação e recomendação
aos produtores. Salienta-se, ainda, que se uma determinada combinação não produziu
famílias com bom desempenho, os dois genitores ou apenas um deles, pode ser
substituído por uma outra linhagem recém obtida (ou introduzida) de interesse. De modo
41 Métodos de Melhoramento Genético de Arroz Irrigado
análogo, se no processo de avaliação das famílias até a homozigose se destacar alguma
não envolvida na recombinação, essa poderá ser incluída na recombinação seguinte e
com isto o processo de melhoramento torna-se muito dinâmico.
Esquema de cruzamento em dialelo circulante utilizado na recombinação em cada ciclo
Ciclo 01 x 6 4 x 9 7 x 12 10 x 15 13 x 18 16 x 1 19 x 42 x 7 5 x 10 8 x 13 11 x 16 14 x 19 17 x 2 20 x 53 x 8 6 x 11 9 x 14 12 x 17 15 x 20 18 x 3
Ciclo 1(1, 6) x (9, 14) (5, 10) x (13, 18) (9, 14) x (17, 2) (13,18) x (1, 6) (5, 10) x (17, 2)
(2, 7) x (10, 15) (6, 11) x (14, 19) (10, 15) x (18, 3) (14, 19) x (2, 7) (6, 11) x (18, 3)(3, 8) x (11, 16) (7, 12) x (15, 20) (11, 16) x (19, 4) (15, 20) x (3, 8) (7, 12) x (19, 4)(4, 9) x (12, 17) (8, 13) x (16, 1) (12, 17) x (20, 5) (16, 1) x (4, 9) (8, 13) x (20, 5)
Ciclo 2(1, 6, 9, 14) x (5, 10, 13, 18) (12, 17, 20, 5) x (16, 1, 4, 9) (7, 12, 15, 20) x (11, 16, 19, 4)(2, 7, 10, 15)x(6, 11, 14, 19) (5, 10, 17, 2) x (1, 6, 9, 14) (8, 13, 15, 1) x (12, 17, 20, 5)(3, 8, 11, 16)x(7, 12, 15, 20) (6, 11, 18, 3) x (2, 7, 10, 15) (13, 18, 1, 6) x (5, 10, 17, 2)(4, 9, 12, 17)x(8, 13, 16, 1) (7, 12, 19, 4) x (3, 8, 11, 16) (14, 19, 2, 7) x (6, 11, 18, 3)(9, 14, 17, 2) x (13, 18, 1, 6) (4, 9, 12, 17) x (8, 13, 20, 5) (15, 20, 3, 8) x (7, 12, 19, 4)(10, 15, 18, 3)x(14, 19, 2, 7) (5, 10, 13, 18) x (9, 14, 17, 2) (16, 1, 4, 9) x (8, 13, 20, 5)(11, 16, 19, 4)x(15, 20, 3, 8) (6, 11, 14, 19) x (10, 15, 18, 3)
Ciclo 3(1, 6, 9, 14, 5, 10, 13, 18) x (11, 16, 19, 4, 15, 20, 3,
8)
(5, 10, 13, 18, 9, 14, 17, 2) x (7, 12, 15, 20, 11, 16,
19, 4)(1, 6, 9, 14, 5, 10, 13, 18) x (7, 12, 19, 4, 3, 8, 11, 16) (5, 10, 17, 2, 1, 6, 9, 14) x (15, 20, 3, 8, 7, 12, 19, 4)(11, 16, 19, 4, 15, 20, 3, 8) x (9, 14, 17, 2, 13, 18, 1,
6)
(7, 12, 15, 20, 11, 16, 19, 4) x (13, 18, 1, 6, 5, 10, 17,
2)(7, 12, 19, 4, 3, 8, 11, 16) x (9, 14, 17, 2, 13, 18, 1, 6) (13, 18, 1, 6, 5, 10, 17, 2) x (15, 20, 3, 8, 7, 12, 19, 4)(2, 7, 10, 15, 6, 11, 14, 19) x (4, 9, 12, 17, 8, 13, 16,
1)
(6, 11, 18, 3, 2, 7, 10, 15) x (4, 9, 12, 17, 8, 13, 20, 5)
(2, 7, 10, 15, 6, 11, 14, 19) x (12, 17, 20, 5, 16, 1, 4,
9)
(14, 19, 2, 7, 5, 11, 18, 3) x (8, 13, 16, 1, 12, 17, 20,
5)(4, 9, 12, 17, 8, 13, 16, 1) x (10, 15, 18, 3, 14, 19, 2,
7)
(4, 9, 12, 17, 8, 13, 20, 5) x (6, 11, 14, 19, 10, 15, 18,
3)(12, 17, 20, 5, 16, 1, 4, 9) x (10, 15, 18, 3, 14, 19, 2,
7)
(6, 11, 14, 19, 10, 15, 18, 3) x (8, 13, 16, 1, 12, 17,
20, 5)(3, 8, 11, 16, 7, 12, 15, 20) x (5, 10, 17, 2, 1, 6, 9, 14) (14, 19, 2, 7, 6, 11, 18, 3) x (16, 1, 4, 9, 8, 13, 20, 5)(3, 8, 11, 16, 7, 12, 15, 20) x (5, 10, 13, 18, 9, 14, 17,
2)
(6, 11, 18, 3, 2, 7, 10, 15) x (16, 1, 4, 9, 8, 13, 20, 5)
Fonte: Ramalho, Gonçalves e Souza Sobrinho (1999)
6-ESTIMATIVAS DE PARÂMETROS GENÉTICOS E FENOTÍPICOS
Uma população adequada para determinado programa de melhoramento deve
apresentar, em relação às características de interesse, média alta e ampla variabilidade
genética. Assim, estimativas de parâmetros genéticos e fenotípicos são informações úteis
que ajudam os melhoristas na tomada de decisão.
A variabilidade genética em gerações segregantes de espécies autógamas segue
um modelo preciso com o decorrer das gerações de endogamia, e esta variabilidade
genética é função do coeficiente de endogamia da geração. Souza Júnior (1989) faz a
42 Métodos de Melhoramento Genético de Arroz Irrigado
decomposição da variância genética total ( )2ˆGσ em função do coeficiente de endogamia
(F), ou seja:
( ) ( ) ( )HFFFDFDFF DAG
−+++−++= 1411 21
222 σσσ
Em que,2Aσ : variância genética aditiva, associada aos efeitos médios dos genes;2Dσ : variância genética devido aos efeitos de dominância, isto é, associada aos efeitos de
interação intra-alélicas;
D1: covariância genética entre os efeitos médios dos genes e os efeitos de dominância
dos homozigotos;
D2: variância genética associada aos efeitos de dominância dos homozigotos;
H: quadrado da depressão por endogamia.
Assim, para F=0, 222DAG σσσ += e para F=1, 21
22 42 DDAG ++= σσ . Segundo o
mesmo autor, este é um modelo geral. Para situações em que a variabilidade é gerada a
partir de cruzamentos entre apenas duas linhagens sendo a freqüência dos alelos
segregantes igual a 0,5, tem-se que, D1 = D2 = 0, e 2DH σ=
, e a variância genética é
reduzida a:
( ) ( ) 2222 11 DAG FF σσσ −+−=
sendo que,
para F=0: 222DAG σσσ +=
e para F=1: 22 2 AG σσ =
Quando a freqüência alélica for diferente de 0,5, D1 e D2 serão diferentes de zero,
que é o que ocorre no caso da seleção recorrente, onde são envolvidos vários genitores.
Os coeficientes dos componentes da variância genética aproveitáveis na seleção ( 2ˆ Aσ , D1
e D2) aumentam com o aumento da endogamia da população segregante, e é, máxima
quando a endogamia completa é atingida. Como D1 é uma covariância, ela pode ser
negativa e, nesse caso, é preciso ponderar a vantagem advinda do aumento do número
de gerações de autofecundação para o aumento de 2ˆ Aσ , com o decorrente aumento,
43 Métodos de Melhoramento Genético de Arroz Irrigado
também, no coeficiente de D1. Entretanto, são poucas as estimativas de D1 disponíveis
para que a decisão possa ser melhor tomada (Ramalho, Santos e Zimmermann, 1993).
A Tabela 5 apresenta os coeficientes dos componentes da variância genética total
para diferentes gerações de endogamia, via autofecundações sucessivas (Souza Júnior,
1989).
Tabela 5 – Coeficientes dos componentes da variância genética total para diferentes
gerações de endogamia (F).
Geraçõe
s
F 2ˆ Aσ 2ˆ Dσ D1 D2 H
S0 0 1,00 1,00 0,00 0,00 0,00S1 1/2 1,50 0,50 2,00 0,50 0,25S2 3/4 1,75 0,25 3,00 0,75 0,19S3 7/8 1,88 0,13 3,50 0,88 0,11S4 15/16 1,94 0,06 3,75 0,94 0,06S5 31/32 1,97 0,03 3,88 0,97 0,03S6 63/64 1,98 0,02 3,98 0,98 0,02. . . . . . .. . . . . . .. . . . . . .
S ∞ 1 2,00 0,00 4,00 1,00 0,00
A herdabilidade permite antever a possibilidade de sucesso com a seleção, uma
vez que ela reflete a proporção da variação fenotípica que pode ser herdada, ou seja,
mede a confiabilidade do valor fenotípico como indicador do valor reprodutivo. Pode ser
expressa no sentido amplo ( 2ah ), e no sentido restrito ( 2
rh ), sendo que a primeira tem como
numerador a variância genética total e a segunda, apenas a variância aditiva. Desta
forma, a herdabilidade no sentido restrito reflete a proporção da variação total presente
que é herdável. Ela é importante para a predição do ganho esperado com a seleção. Se
a seleção for entre as médias de famílias, a estimativa de h2 deve ser ao nível de médias,
contudo, se for realizada uma seleção dentro das famílias, isto é, uma seleção massal,
utiliza-se herdabilidade ao nível de indivíduos (Ramalho, Santos e Zimmermann, 1993).
Badan (1999) ressalta que é usual existir uma associação entre os valores de alta
herdabilidade com a expressão de caracteres controlados por poucos genes e a de baixa
herdabilidade com a expressão de caracteres controlados por muitos genes, por isso os
caracteres variam imensamente quanto a herdabilidade. Um caráter com alta
herdabilidade deve ser selecionado na fase inicial dos avanços de geração..
44 Métodos de Melhoramento Genético de Arroz Irrigado
A seleção só pode atuar efetivamente se recair sobre diferenças herdáveis, uma
vez que não cria variabilidade, atuando apenas sobre as existentes. O coeficiente de
variação genética (CVg) representa a razão, expressa em porcentagem, entre o desvio
padrão genético e a média da população. Indica a quantidade de variabilidade genética
entre famílias em relação às médias populacionais respectivas. Em milho, para as
condições brasileiras, diversos autores consideram valores para este coeficiente acima de
7%, como um bom indicador do potencial genético das populações (Rodriguez, 1995).
Existem várias metodologias que podem ser utilizadas na estimativa dos
parâmetros genéticos. Uma das mais utilizadas, são os cruzamentos dialélicos (Lopes,
1984). Pode-se utilizar também de delineamentos especiais como os propostos por
Comstock e Robinson (1952), citados por Santos (1996), que permitem estimar a
variância genética e os seus componentes. É comum ainda aproveitar os experimentos
de melhoramento onde as famílias de diferentes gerações são avaliadas (Morais, 1992).
No caso da cultura do arroz, estimativas de parâmetros genéticos e fenotípicos ainda são
incipientes se comparados a outras espécies, principalmente, com a do milho, mas,
mesmo assim, já existem resultados que permitem fazer algumas inferências (Santos,
1996).
Poucos são os trabalhos feitos no Brasil usando cruzamentos dialélicos na cultura
do arroz, podendo-se citar Lopes (1984) que estudou a natureza e a magnitude dos
parâmetros genéticos dos componentes de rendimento de grãos de arroz, em dois
ambientes (seco e úmido). A análise dialélica mostrou que a variância genética das
características, número de panículas por planta, número de espiguetas por panícula,
percentagem de grãos cheios e peso de 1000 grãos foi devida aos efeitos aditivos e de
dominância. Entretanto, a componente aditiva foi maior que a componente de
dominância, sugerindo que a média de cada cultivar é uma boa indicação do seu
potencial, como parental, num programa de melhoramento.
Avaliando o potencial de uma população de arroz irrigado, utilizando as estimativas
de parâmetros genéticos e fenotípicos, onde foram obtidas as estimativas de 2Aσ , 2
Dσ , D1,
D2 e H
, Morais (1992) observou que para produção de grãos e número de panículas por
planta, a variância devido a dominância mostrou-se, juntamente com a variância aditiva,
importante como componente da variância genética. Quanto as demais características
(altura da planta, comprimento da panícula e peso de 100 grãos), a variância genética
observada era explicada pelo modelo contendo apenas a variância genética aditiva ( 2Aσ ).
45 Métodos de Melhoramento Genético de Arroz Irrigado
Os coeficientes de herdabilidade podem variar conforme a população, a
característica estudada, o método de estimação, a diversidade na população, o nível de
endogamia da população, o tamanho da amostra avaliada, o número e tipo de ambientes
considerados, precisão na condução experimental, entre outros (Badan, 1999). Na
Tabela 6, são apresentadas algumas estimativas de h2 para alguns caracteres da cultura
do arroz. Analisando as estimativas de herdabilidade para produtividade de grãos,
observa-se que há variação, onde são encontrados valores altos, mesmo sendo um
caráter controlado por vários genes, o que indica a possibilidade de sucesso com a
seleção. Para o caráter altura das plantas, as estimativas de h2 também foram altas e
para os demais caracteres os valores variaram de médio a alto, indicando também
possibilidade de sucesso com a seleção.
Vários estudos com populações de arroz irrigado foram conduzidos com o objetivo
de avaliar o potencial genético delas para fins de melhoramento. O primeiro estudo desta
natureza foi conduzido por Morais (1992) na população CNA-IRAT 4/0/3, onde foram
obtidos ganhos de 7,24% por ciclo de seleção recorrente, para produtividade de grãos.
Através das estimativas de outros parâmetros (herdabilidade, coeficiente de variação
genética e índice de variação), o autor concluiu que a população possui potencial genético
para fins de melhoramento, desde que manejada adequadamente.
Posteriormente, Rangel, Zimmermann e Neves (1998) avaliaram 162 famílias S0:2,
precoces e de ciclo médio, extraídas respectivamente, das populações CNA-IRAT 4PR e
CNA-IRAT 4 ME. As estimativas dos coeficientes de variação genética, para
produtividade de grãos (10,40 a 10,90%) floração (2,50 a 2,92%), brusone na panícula
(9,07 a 12,01%) e mancha parda (6,28 a 9,59%) e herdabilidade para produtividade de
grãos (51,9 a 54,8%) evidenciaram a presença de suficiente variabilidade genética e a
possibilidade de serem obtidos ganhos expressivos. As respostas à seleção, para a
característica produtividade de grãos, foi de 4,9% e 6,0% nas populações precoce e de
ciclo médio, respectivamente.
Rodriguez, Rangel e Morais (1998) avaliaram o potencial da população CNA 1 para
fins de melhoramento, por meio das estimativas de seus parâmetros genéticos e das
respostas diretas e indiretas à seleção, como também pelo índice clássico de Smith
(1936) e Hazel (1943). As características produtividade de grãos (20,50%), brusone na
folha (11,71%), altura de plantas (13,20%), número de espiguetas por panícula (11,09%)
e percentagem de grãos cheios (9,33%), mostraram alta variabilidade, evidenciada pelas
estimativas dos coeficientes de variação genética. Os ganhos por seleção direta ou pelo
46 Métodos de Melhoramento Genético de Arroz Irrigado
índice clássico quanto à produtividade de grãos foram de mesma magnitude, cerca de
24%, dando um ganho por ciclo de seleção de 12%. Entretanto, segundo os autores, na
seleção baseada no índice obteve-se resposta favorável em relação à brusone na folha,
evidenciando a possibilidade de se aumentar simultaneamente a produtividade e a
resistência a esta doença, na população melhorada.
Tabela 6 – Estimativas de herdabilidade (%) para alguns caracteres da cultura do arroz,
obtidas por diferentes métodos e populações
Método CaracterísticaUtilizado PROD AP NDF P100 NPP NEP FonteDialelo( 2rh ) - - - -
41,54a
60,26
61,18 a66,56 Lopes (1984)
Famílias de MI( 2rh ) 27,85 70,28 - 64,53 17,25 - Morais (1992)
Famílias de S1
( 2rh ) 68,73 95,10 - 95,52 47,30 - Morais (1992)
Componente deVariância ( 2
ah )51,9
a54,8
-48,93
a59,31
- - -Rangel, Zimmermann e
Neves (1995)
Dialelo circulante 24,0 62,9 - 54,9 44,3 - Morais, Castro e Sant’ana (1995)
Componente deVariância ( 2
rh )69,0
a85,0
- - - - - Vieira (1996)
Componente deVariância ( 2
ah ) 54,9 91,2 - - - - Mehtre et al. (1996)
Componente deVariância ( 2
ah ) 85,2 95,6 62,2 31,3 - 49,3Rodriguez, Rangel e
Morais (1998)
Componente deVariância ( 2
ah )51,9
a54,8
- - - - -Rangel, Zimmermann e
Neves (1998)
Componente deVariância ( 2
ah ) - 88,0 95,0 87,2 - -Almeida, Pereira e Gomes
(1998)
Componente deVariância ( 2
ah )59,54
a63,77
81,41a
82,48
70,35a
82,15
69,29a
73,67- - Badan (1999)
Componente deVariância ( 2
ah )40,3
a59,4
70,665,5
a69,0
- - - Santos (1996)
PROD – produtividade de grãos; AP – altura das plantas; NDF – número de dias para o florescimento; P100 – peso de 100 grãos. NPP – nº de panículas por planta; NEP – nº de espiguetas por panícula.
47 Métodos de Melhoramento Genético de Arroz Irrigado
7. INTERAÇÃO GENÓTIPOS POR AMBIENTE
Para um caráter qualquer, o fenótipo (F) a ser obtido é função do genótipo (G), do
ambiente (A) e da interação genótipos por ambientes (GA). Esse último componente
ocorre, porque o desenvolvimento dos genótipos não é consistente nos vários ambientes,
isto é, reflete as diferentes sensibilidades às mudanças do ambiente. Desta maneira, a
interação genótipos por ambientes pode ser entendida como a resposta diferenciada de
genótipos em um determinado ambiente que pode não ser coincidente em outros
(Ramalho, Santos e Zimmermann, 1993).
Estas interações, quando presentes em experimentos de rendimento, são um
desafio para os melhoristas de plantas, causando redução no progresso com a seleção
(Falconer, 1987; Vencovsky e Barriga, 1992; Ramalho, Santos e Zimmermann, 1993;
Cruz e Regazzi, 1997). Por outro lado, o termo ambiente é designado como um termo
geral que envolve uma série de condições sob as quais as plantas são cultivadas como,
locais, anos, gerações segregantes, épocas de plantio, sistemas de plantio, nível de
fertilizantes e densidade de plantas (Santos, 2000).
As variações ambientais que contribuem para a interação com os genótipos,
segundo Allard e Bradshaw (1964) e Fehr (1987), são classificadas em dois tipos:
previsíveis e imprevisíveis. As variáveis previsíveis são aquelas que ocorrem de uma
maneira sistemática, como características gerais de clima e solo e aquelas que podem ser
influenciadas pelo homem como data de plantio, densidade de semeadura, métodos de
colheita, doses e fórmulas de adubação e outras práticas agronômicas. As variáveis
imprevisíveis são aquelas que flutuam inconsistentemente tais como, precipitação pluvial,
temperatura e umidade relativa.
Para a detecção da interação genótipos por ambientes é preciso que diferentes
genótipos sejam avaliados em dois ou mais ambientes contrastantes, pois a avaliação em
apenas um ambiente não permite que o componente da interação seja isolado,
ocasionando estimativas da variância genética superestimada. Isto pode trazer algumas
implicações relevantes ao programa de melhoramento, uma vez que parâmetros
genéticos importantes, como a herdabilidade, podem também ser superestimados e, em
conseqüência, comprometer o ganho esperado, o qual é diretamente proporcional à
herdabilidade.
48 Métodos de Melhoramento Genético de Arroz Irrigado
O comportamento relativo dos genótipos entre os ambientes é que determina a
importância da interação. Ramalho, Santos e Zimmermann (1993) descrevem três
situações que podem ocorrer quando duas cultivares, que diferem geneticamente quanto
à produtividade de grãos, forem avaliadas em dois ambientes: a) as cultivares apresentam
comportamentos concordantes nos dois ambientes, não existindo interação. Nesse caso,
é possível recomendar a cultivar superior para os dois ambientes; b) quando o
comportamento das cultivares não é semelhante nos dois ambientes e uma delas
responde mais acentuadamente à melhoria do ambiente do que a outra, neste caso,
existe interação genótipos por ambientes, entretanto ela não ocasiona maiores
problemas, porque a classificação das cultivares não é alterada nos diferentes ambientes.
Por essa razão é denominada de interação simples, e, c) quando o comportamento dos
genótipos é inverso nos dois ambientes, a interação genótipos por ambientes está
presente e é denominada de complexa; neste caso, o trabalho do melhorista é bastante
dificultado pois a recomendação da cultivar só pode ser feita para um ambiente
específico.
A maioria dos estudos que comprova a ocorrência de interação na cultura do arroz
foram realizados com ênfase na identificação de materiais mais estáveis a partir de
ensaios de linhagens e cultivares, podendo ser citados os trabalhos de Rangel (1979),
Soares (1987), Soares (1992) e Atroch (1999), Soares et. al (2007). Outros estudos
realizados por Rangel (1990), Soares (1993), Santos (1996) e Santos (2000) envolveram
não só cultivares/linhagens, mas também populações segregantes.
Do exposto, torna-se necessário que estudos envolvendo locais, gerações de
avaliações e anos sejam realizados com o intuito de estudar os efeitos da interação
genótipos x ambientes com vistas a melhorar a eficiência do processo seletivo.
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MINISTÉRIO DA AGRICULTURA, PECUÁRIA E ABASTECIMENTO