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MARISLEIDESOUSAESPNDULABRASILEIRO
REPRESENTAESSOCIAISSOBREAIDSDEIDOSOSINFECTADOSPELOVRUSDAIMUNODEFICINCIAADQUIRITA(HIV):
RISCOSERECONSTRUES
BELOHORIZONTE2004
Livros Grtis
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MARISLEIDESOUSAESPNDULABRASILEIRO
REPRESENTAESSOCIAISSOBREAIDSDEIDOSOSINFECTADOSPELOVRUSDAIMUNODEFICINCIAADQUIRITA(HIV):
RISCOSERECONSTRUES
DissertaoapresentadaaoCursodeMestradodaEscoladeEnfermagemdaUniversidadeFederaldeMinasGerais,comorequisitoparcialobtenodottulodeMestreemEnfermagem.
Orientadora:Prof(a).Dra.MARIAIMACULADADEFTIMAFREITAS
BELOHORIZONTE2004
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Brasileiro,MarisleideSousaEspndula,B823rRepresentaessociaissobreAidsdeidososinfectadospeloHIV:riscosereconstrues.MarisleideSousaEspndulaBrasileiro.BeloHorizonte,2004.137p.Dissertao.(Mestrado).Enfermagem.EscoladeEnfermagemdaUFMG.1.Sndromedeimunodeficinciaadquirida/sadecoletiva2.Idoso/psicologia3.Sexualidade4.Sadedoidoso5.PromoodasadeI.TtuloNLM:WC503CDU:616.988053.9
UNIVERSIDADEFEDERALDEMINASGERAIS
ESCOLADEENFERMAGEM
MESTRADOEMENFERMAGEM
REPRESENTAESSOCIAISSOBREAIDSDEIDOSOSINFECTADOSPELOVRUSDAIMUNODEFICINCIAADQUIRITA(HIV):
RISCOSERECONSTRUES
MARISLEIDESOUSAESPNDULABRASILEIRO
Dissertao defendida e aprovada em 28 de janeiro de 2004, pela Comisso
Examinadoraconstitudapelosprofessores:
___________________________________________________________
Dra.MARIAIMACULADADEFTIMAFREITASORIENTADORA
______________________________________________________________
Dra.AIDFERREIRAFERRAZ
______________________________________________________________
Dr.FRANCISCODEASSISACRCIO
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DEDICATRIA
AoamadoesposoEmdioBrasileiro,maiorestimuladorde
minhatrajetriaequemsempremefezacreditarquemeus
sonhosnoeramimpossveis.
AosnossosqueridosfilhinhosVinciuseJenucy,portodas
asalegriasquemefortalecemaexistncia.
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AGRADECIMENTOESPECIAL
Querotestemunharespecialmenteaminhagratidoereconhecimentoexemplarorientadora,
ProfessoraDraMariaImaculadadeFtimaFreitas(Peninha),
pelaconstantedisponibilidadeultrapassadanosvriosencontros;
peloprofissionalismoeamorosidade;
pelasliesprivilegiadasepresenacarinhosa;
peloconhecimentoehumildade;
pelasexpectativaspositivasqueenvolvemainvestigao;
pelapacinciamesmonaexaustodotrabalho;
pelasoportunas,pertinenteseestimulantesobservaes;
pelamaneiracomoestimulaaindependnciadequemorienta;
pelasinspiraesdecoragem,determinao,ousadia,humildadeedisciplina.
Exemploaserseguidocomoeducadoraemulher,semprelhesereigrata.
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AGRADECIMENTOS
PrimeiramenteagradeoaDeus,intelignciasuprema,causadetodasascoisas.
Aosmeuspais,IvaldoEspndulaeAnaRamos, responsveisporminhaformao afetiva,
intelectualemoralesminhasirmsMariaRita,NilamareNiusleypelafora.
DivinaClia,irm,companheiraincondicionalquesempremeestimuloueresguardou.
LciaPinho,pelasabedoriacomquesimplificaosproblemasmaiscomplexos.
IsolinaAssis,maiorestimuladoraedoadoradebonssentimentosnashorasdifceis.
SaletePontiere,pelamaneirasbriaeinspiradapelaqualconduztodasassuasaes.
s professoras Maria de Lourdes Corsino Peres e Ldia Milano, pelos inspiradores
momentosdeafastamentodoobjetodeestudo,eProf(a)BeatrizNeta,peloconstanteapoio.
Ao HDT(Hospital de Doenas Tropicais), nas pessoas de Clia Rita e Magnlia, pela
amizadeeseriedade.
AosilustresprofessoresdoMestrado: Dra.AidFerreiraFerraz,Dra.AndraGazzinelli
Corra de Oliveira, Dra. Anzia Moreira Faria Madeira, Dra. Dacl Vilma Carvalho, Dr.
Francisco Carlos Flix Lana, Dr. Jorge Gustavo Velsquez Melndez, Dra. Maria Flvia
Carvalho Gazzinelli, Dra. Marilia Alves, Dra. Marisa Antonini Ribeiro Bastos, Dra. Roseni
Rosngela de Sena, semos quais no seria possvel trilhar esse novo caminho comotimismo e
perseverana.Aoseficientesamigosdocolegiado:Silvia,LucileneeEduardo.
scolegasdoMestrado,semasquaisnoseriapossveloaprendizadoemequipeassociadoao
desejodesetrabalharcompersistncia.
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Universidade Paulista, em especial Sandra Lcia e Andr Vasconcelos pela
confianaeconstanteamizade.
UniversidadeCatlicadeGois eaoProfessor Dr.NicolauHeck, pelalutaconstantea
favordaeducaodequalidade.
SecretariaMunicipaldeEducaodaPrefeituradeGoinia,naspessoasdaDra.Walderez
Loureiro, Snia e ao Ncleo doEAJA, por suapermissoeautorizao paraa realizao deste
Mestrado.
AoProfessorPedroWilsonePinheiroSales,peloapoioaestapesquisa.AopessoaldoCentro
deApoioaoDoentedeAids,naspessoasde Sirlene e Rocha eaoCondomnioSolidariedade, na
pessoadeMrcia,peloauxlioemissoincondicional.
Agradeoprofundamenteaos sujeitosparticipantesdestapesquisa, deixoesteestudopara
futurasreflexes.Omeusinceroagradecimentopelaconfianaquetiveramemcompartilharcomigo
seussentimentos,suasemoesesuasexperinciasdevida.Atodos,omeusinceroagradecimento
comvotosdepazesade.
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CAMPANHADAFRATERNIDADE2003
Respeiteoidoso;
Aprendacomele;
Escuteassuashistrias;
Respeiteosseusdireitosemfilasedentrodosnibus;
Sejaeducadoeatenciosoaofalarcomele;
Abraceo;
Senteaoseulado;
Sorrialhesempre;
Pealheconselhos;
Respeiteseusvalores.
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LUZESDOENTARDECER
Conservacontigooscompanheirosidosos,comaalegriadequemrecebeudavidaohonroso
encargodereter,juntodocorao,asluzesremanescentesdoprpriogrupofamiliar.Refletenaqueles
quetepreservaramaexistnciaaindafrgil,nospanosdobero,nosqueteequilibraramospassos
primeiros,nosqueteafagaramossonhosdameniniceenaquelesoutrosqueteauxiliaramapronunciar
onomedeDeus.Jqueatravessaramocaminhodemuitosjaneiros,pensanoherosmosilenciosocom
queteensinamavalorizarostesourosdotempo,nasdificuldadesqueterovencidoparaseremquem
so,nosuorquelhesalterouaslinhasdafaceenaslgrimasquelhesalvejaramoscabelos.Equando,
porventura,temostremazedumeoudesencanto,escutalhesapalavracombondadeepacincia.No
estaro, decerto, a ferirte esimprovavelmentealgomurmurandocontra dolorosas recordaes de
ofensasrecebidas,desaudadesfiliais,quetrancamnopeito,afimdenocomplicaremosdiasdos
seresquelhessoespecialmentequeridos.Amaerespeitaoscompanheirosidosos!Soelesasvigas
queteescoramotetodaexperinciaeasbasesdequehojetelevantasparaseresquems...Auxiliaos,
quantopuderes,porquantopossvelque,nodiadaexistnciahumana,venhasigualmenteaconhecer
obrilhoeasombraqueassinalamnomundo,ahoradoentardecer(MEIMEI).
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SUMRIO
RESUMO...............................................................................................................................................13
ABSTRACT.............................................................................................................................................14
IINTRODUO................................................................................................................................15
1.Oproblemadepesquisa.................................................................................................................15
2.Justificativa....................................................................................................................................21
3.Objetivo.........................................................................................................................................22
IIMETODOLOGIA...........................................................................................................................23
1. Tipodeestudo............................................................................................................................23
2. Referencialtericometodolgico..............................................................................................23
3. Sujeitosdapesquisa...................................................................................................................29
4. Cenriodapesquisa...................................................................................................................30
5. Instrumentodacoletadeinformaes.......................................................................................31
6. Anlisedasinformaescoletadas............................................................................................32
IIIANLISEDASENTREVISTAS................................................................................................35
1. Aapresentaodosentrevistadosedosresultados...................................................................35
2. As representaes sociais de pessoas idosas em torno da infeco pelo
HIV............................................................................................................................................38
OsncleosperifricosdasrepresentaesemtornodainfecopeloHIV....................44
Aidsnocncer.................................................................................................45
DescrenanoSistemadeSade.............................................................................47
Tratamentodifcil..............................................................................................51
11
Depresso................................................................................................................54
Aexignciademudaremoshbitosdevida..........................................................57
A nopreveno antes e o uso do preservativo depois do
diagnstico..............................................................................................................60
Otrabalho................................................................................................................64
Disposioparafalarmais.....................................................................................67
Osncleosmaisprximosdocentro...............................................................................69
AAidsnoteriaqueacontecercomigo..............................................................69
normal:maisumadoenadevelho...............................................................71
OssintomascomoconscinciadaAids.................................................................74
Dupladiscriminao:servelhoeestarcomAids..................................................76
Aidsessetremnotemcura.................................................................................82
2.3.Oncleocentral.................................................................................................................87
2.3.1.Aidsameaaconstantedemorte......................................................................87
IV.CONSIDERAESFINAIS..........................................................................................................92
V.REFERNCIASBIBLIOGRFICAS............................................................................................96
VI.ANEXOS.........................................................................................................................................102
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REPRESENTAESSOCIAISSOBREAIDSDEPESSOASIDOSASINFECTADASPELOHIV:RISCOSERECONSTRUES
MARIAIMACULADADEFTIMAFREITASMARISLEIDESOUSAESPNDULABRASILEIRO
RESUMO
Esteestudosepropeadiscutirasrepresentaes sociais elaboradaspornovepessoascomidadeacimade60anos,soropositivasparaHIV/Aids.Apesquisafoirealizadanoperodode2002a2003,nomunicpiodeGoiniaGoisealgunsmunicpios prximos:AparecidadeGoinia, RioVerde,Piracanjuba,EdiaeSantaRosa.OestudofoipautadocombaseemAbric(2000),buscandoseacessaroscontedossignificativossobreaexperinciadadoena.Metodologicamentefoiutilizadaaanlise de discurso, atravs de entrevistas, proposta por Dubar (1998), que fez emergir blocostemticos,deacordocomatrajetriadogrupo.Aanlisedestesdiscursospermitiuaidentificaodevriosncleos,umdeles,bastantecentralergido,cujaimagemadequeaAidsameaaconstantedemortee,circundandoessencleo,houtrosmaisdistanteseflexveis,cadaumcomseusistemaperifrico:Aidsessetremnotemcura;Aidsnocncer;depresso,otratamentodifcil,dupladiscriminao:servelhoeestarcomAids.Osresultadosmostramqueavivnciadaspessoascomidadeacimade60anoscomHIV/Aidsdifcil,comaimagemquefazemdesimesmascomopessoasquevivememconstanteameaademorte,daosofrimentopsquico,aumentandoadepressoeagravandoossintomas. Podeseafirmar queopreparodosprofissionais para lidaremcomessaspessoascondiosinequanonparafavorecerahumanizaodocuidado,diminuindoonmerodeinjustiasemortes.
Palavraschave: Terceira idade HIVSndromedaImunodeficincia Humana RepresentaesSociais.
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SOCIALREPRESENTATIONSABOUTAIDSFROMPEOPLEABOVE50YEARSINFECTBYHIV:RISKSANDRECONSTRUCTIONS
MARIAIMACULADADEFTIMAFREITASMARISLEIDESOUSAESPNDULABRASILEIRO
ABSTRACT
Thestudyproposesthediscussionofthesocialrepresentationselaboratedby9elderlypeopleabove50yearswhoaresoropositivesforHIV/Aids.Theresearchconductedfrom2002to2003inGoiniaGoisandsomesurroundingtowns:AparecidadeGoinia,RioVerde,Piracanjuba,EdiaandSantaRosa.ThestudywasbasedonAbric(1998),lookingformeaningfulcontentsaboutthediseaseexperience. Methodologically weusedsomeprinciples of discourseanalysis throughinterviews assuggestedbyDubar(1998)somethemeunitsderivedfromtheseinterviewsaccordingtotherouteofthegroup.Thespeechanalisyslallowedustoidentifymanynucleus,oneofthemrathercentralanrigid.ItsstatesthatAidsisaconstantdeathmenaceandsurroundingthisnucleos,therearothersmordistantandflexible,eachonewithitsperifericsystem:Aidsisuncurable;Aidsisnotcncer;depression;thetreatmentisdifficult;doubleprejudice:beingoldandhavingAids.TheresultsshowthatelderlypeoplelivingwithAidshaveadifficultlife.Theyportrayaselfimageasthosewholive under a constant death threat, hence the psychic suffering, raising depression and makingsymptomsworst.Wecanassuresthatthepreviousproffessionalskillstodealtodealwiththesepeopleconstitutesasinequanonconditiontofavourhumancare,cuttingdownthenumberofinjusticesandprepaturedeath.
Keywords:ThirdageHIVAcquiredImmunodeficiencySyndromeSocialRepresentations.
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I.INTRODUO
Fome, misria e Aids vodisputar as manchetes da imprensainternacionalsobreopas.Fomeemisriaporqueasproduzimosh muito tempo. Aids porque tem, aqui, a mesma cara damisria.Amaioriaricatratase,ospobressimplesmentemorrem.
HerbertdeSousa,oBetinho(1993)
1.Oproblemadepesquisa
Adiscussosobre a terceira idade complexa e deve ser investigada comoumconceito
historicamenteconstrudoporqueenvolve,deformadiretaouindireta,diversosaspectos,taiscomo:o
biolgico,oafetivo,opsicolgicoeprincipalmenteosocial.
A terceira idade apresentase como uma questo emevidncia no somente na realidade
brasileira, masprovavelmenteemtodoomundo. Preocupaodohomememtodosos tempos, a
velhicetemvencidoosdesafios,orasendodiscriminada,oravalorizada.Desdeapocadosgrandes
senadoresromanos,respeitadosporsuasabedoria,oenvelhecimentotemmerecidoespecialateno,
aindamaisapartirdosanosde1970,quandoaexpectativadevidadaespciehumanavemmostrando
umaumentosemprecedentesnotempomdiodevidadaspessoas.Ferrari(2000,p.98)afirmaqueo
serhumanojchegahojeaumamdiade75anosemaisempasesdesenvolvidos.
15
Assim,chegaraumaidadeavanadajnomaisprivilgiodepoucaspessoas.Masa
preocupao,deacordocomOliveira(1999,p.32),nocomalongevidadehojeexperimentada
pormuitos,mascomaboaqualidadedevida,sonhadaportodos,queprivilgiodealguns.
Nestabuscaporumamelhorqualidadedevida,quandoapolticanacionalparaoidosoatravs
doestatutodoidoso,surgecomopontodepartidaparaavalorizaodosmaisvelhos,questesdiversas
sobreaterceiraidadeso,cadavezmais,objetodeinteressedospesquisadoresdasreasdasade,da
educao,dodireitoedascinciassociais,incluindoseaasquestesligadasprevenoeaocontrole
doHIV/Aids1.
Certamente,estapreocupao,nocomaimortalidade,mascomamanutenodavida,torna
semaisevidente,quandosurgeemcenaobinmioenvelhecimentoxAids.Seaspessoaspassarama
vislumbrarumamaiorexpectativadevida,apartirdadcadade70,aAidssurgenadcadade80como
umasombraparatodasasidades.
Aspessoascomidadeacimade60anos,quandoinfectadascomoHIV,tendemamanifestaros
efeitosdaimunodepressodeformamaisaceleradaqueaspessoasjovens,porquetm,acrescidos
Aids, os efeitos de outras doenas que freqentemente aparecem com a idade. Alm disso, h
desinformao, preconceitos edificuldades deacessoaosServiosdeSade, oqueprovavelmente
contribuiparaoaumentodoscasos.
Quantodesinformao,mdicosdoHospitaldaUniversidadedeChicagorelatamquemuitos
profissionaisqueatendemidososnoconseguemassociarAidsepessoasidosas,poisaquestoda
percepodorisconoexisteaoseolharessapopulao"(DIXON,1997,p.53).
NoBrasil,emestudorealizadonaFaculdadedeCinciasMdicasdaSantaCasadeSoPaulo,
pesquisadoresverificaramque, emborapoucofreqentesemhospitais gerais, casosdeAidsesto
ocorrendoemidososecomaltondicedemortalidadedecorrente,muitasvezes,pornosecogitareste
diagnsticoduranteaavaliaoclnica(GORZONI,1997,p.67).Taiscomportamentosdecorrem,
provavelmente,dopreconceitoedeidiaserrneassobreainfecopeloHIV,tantodosprofissionais
comodepessoasmaisvelhas.Naprtica,asrepresentaesqueunseoutrostmsobreasdoenas,em
1 O agente etiolgico da AIDS (Sigla, em ingls: acquired immuno deficiency syndrome que significa Sndrome daImunodeficincia Adquirida) foi identificado por Luc Montagnier, em 1983, na Frana, que o denominouLAV(lymphoademopathtassociatedvrus)eporRobertGallo,nosEUA,quechamouodeHILVIII(HumanTcell lymphotropicvrustypeIII).Em1988,ocomitinternacionalparataxonomiadevrusatribuiuaosretrovrusisoladosnaFranaenosEUAadesignaocomum deHumanImmunodeficiencyVrus HIV,diantedaconclusodequeelestinhamcaractersticasbastantesemelhantes,naverdade,eramomesmovrus(MINISTRIODASADE,2002).
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geral, e, emespecial, sobre a Aids, parecemter grande importncia, tanto noquese refere
prevenocomonocontroledainfeco,dentretantosoutrosfatores.Aanlisedasrepresentaes
sociais sobre esses aspectos pode ser de imensa utilidade para a Gerontologia, pois possibilita a
identificaodemodoscompartilhadosdepensaredeatuaremrelaoaesseprocesso,aocaracterizar
osconhecimentosecrenasdosgrupossociaisarespeitodele.
AlmdoscitadosprofissionaisquenotmadevidapercepodoriscodaAidsemrelaoaos
idosos,haindaoutrosprofissionaisdasadequeestoutilizandoumdiscursopreventivoparaaAids,
masquesemostradistantedarealidadeespecficadessafaixaetria.Porfim,essequadrocompletase
comofatodequeaocultaododiagnsticospessoasmaisvelhasumaconstante,especialmente
quandosetratadeinfecopeloHIV.
CorroborandocomosdadosdoMinistriodaSade(BRASIL,2001,p.13)osquaisapontam
quecercade55%daspessoascomAidscomidadeacimade60anosforamcontaminadasporvia
sexual,umestudoquantitativo,transversaleretrospectivorealizadoporVasconcelosetal.(2001)a
respeitodoperfilepidemiolgicodosclientesHIV/Aidscomidadeacimade60anosmostrouqueos
parceirosnemsempretmsuasmulherescomoparceirassexuaisnicas,poisde15homenscasados,
participantesdapesquisa,cincoerambissexuais,sendoaviadeexposiomaiselevadaasexual.Nesse
estudoencontrousetambm:aumentononmerodecasosemmulheres,principalmenteascasadas;
aumentodonmerodeheterossexuais;predomniodebaixaescolaridade;aumentodonmerodecasos
nafaixaetriaemestudo;subregistronospronturioseviasexualcomomaiorfontedeexposio
(VASCONCELOS,2001,p.257).
UmoutroestudoquantitativosobreoperfilepidemiolgicodaAidsemindivduosacimade60
anosrevelouasuacomposio:homemidoso,patriarca,bissexualsemconhecimentodafamlia;a
idosa, fiel no casamento, que contraiu Aids do marido que mantinha relaes extraconjugais; o
homossexual masculino definido desdea juventude; o idosoquesecontaminouaps a viuvezou
separao(SANTOSetal.,1997,p.123).OestudodeSantos,concludoem1997,contribuiu,deuma
formageral,paraqueseconhecesseoperfildaspessoasinfectadaspeloHIVecomAidse,certamente,
paraadefiniodepolticasdepreveno.Noentanto,aspessoasaindacontinuamsendoinfectadas.
SegundoosdadosdoMinistriodaSade(BRASIL,2001,p.14),
o percentual de pessoas contaminadas na faixa etria entre 50 e 59 anoscresceu de 5,4% para 6,6% (no grupo feminino) e de 6% para 7% (no
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masculino), registrandoat agora15.263casosemumtotal de210.447notificaes,sendoque55%secontaminaramporviasexual.
At setembrode2003,segundoosdadosdoMinistriodaSade(BRASIL,2003,p.01)o
nmerodecasosaumentou:foramnotificados277.153casosdeAidse25.076napopulaoacimade
60anos.Diantedessecontexto,explicaseaimportnciadeselevaremconsideraoatradeidoso
sexualidadeAidscomoobjetodeestudosmaisaprofundados,tambmnoqueserefereainvestigaes
psicossociais,quevalorizemacompreensodarealidadesocial.
Muitos autores da rea da Psicologia e Sociologia, tais como Moura e Jacquemin (1991),
Barbosa (2002), Ferreira (1994), Joffe (2002), Loyola (1994), e do Direito, como Brasileiro &
Brasileiro(2000),Ferreira(1999),tmsevoltadoparaotemaAids,porm,poucoaindafoiestudado
sobreesseacontecimentonavidadepessoasidosas.Entreelesesto:Gorzoni(1997),queestudoua
Aidsempessoasacimade60anos,eNoritomi(1997),quedescreveuamortalidadedeidososcom
AidsnacidadedeSoPaulo.
AlgunsestudosquesevoltamparaaAidsemidososesto,porm,centradosnocarterobjetivo
doacontecimento.Emgeral,soestudosepidemiolgicos,comooscitadosanteriormente,almdode
Santosetal(1997),queretrataoPerfildaAidsemindivduosacimade60anos,eodeVasconcelos
(2001)sobreoPerfilepidemiolgicodosclientesHIV/Aidscomidadeacimade60anos.Essesso
estudosquetrazemadimensodaproblemticacoletiva,fundamentalparaoconhecimentoeparaa
definiodeaes,masfaltamoutrosquediscutamadimensodossignificadosedasrepresentaes
sobre a infeco pelo HIV, que ancoram as atitudes e os comportamentos das pessoas para se
preveniremesecuidarem.
NaausnciadevacinasedeumacuraefetivaparaaAids,apesardeonmerodepessoascom
idadeacimade60anoscomAidsestaraumentando,humvaziodeconhecimentosistematizadosobre
essegrupoquantossuasrepresentaessociaisrelacionadasinfecopeloHIV.
Dapartegovernamental,comoobjetivodeatenderestesegmentodapopulao,foiinstitudaa
PolticaNacionaldoIdoso,atravsdaLein.8.842,de04/11/94,regulamentadaatravsdodecreton.
1948,de03dejulhode1996.AlgumascampanhasdeprevenocontraaAidsemidososvmsendo
organizadasemcumprimentoaoArtigo10docaptuloIV,quevisaa
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garantiraoidosoaassistnciasade,nosdiversosnveisdeatendimentodo Sistema nico de Sade; alm de prevenir, promover, proteger erecuperar a sade do idoso, mediante programas e medidasprofilticas(BRASIL,2002).
Almdisso,oEstatutodoIdosolanadoemsetembrode2003visaassegurarosdireitosdas
pessoasidosas(BRASIL,2003).Nosepodeesquecerque,diantedosavanosdatecnologiaeda
atenosade,aspessoasdaterceiraidadevivemumanovarealidadenuncaantesexperimentadaem
outras pocas, nesse perodo da vida (CARVALHO & ALMEIDA, 2003, p.114). A reposio
hormonal,acolocaodeprtesepeniana,aofertademedicamentos,comooViagraeoUprima,
dentre o usodenovas tecnologias, melhoramaqualidade devidae prolongamavidasexual das
pessoas acima dos 50 anos, trazendo, indiretamente, o aumento das doenas sexualmente
transmissveis,incluindoseainfecopeloHIV.
Porm,mesmocomaocorrnciadecasosecomastentativasgovernamentaisdeinformar
populaosobreosriscosdainfeco,parecequeasociedade,emgeral,aindaacreditaqueaspessoas
maisvelhasnocorremoriscodeseinfectarem.Provavelmente,hnoimaginriosocialumarelao
entresexualidade,riscoeAidseanegaodaatividadesexualdepessoasacimade60anos.Essa
relaofazcomquesejadifcilaceitaraidiadoriscoparaessaspessoas.Destartecorreseumgrande
risco,semimaginlocomopossvel.AsdiscussesdetemasreferentesAidssemprefazememergir
imagens,conceitosecategoriasqueremetemaoqueasociedadeconsideraperigoso.Comoento
representadooriscorealouimaginriodoperigodaAidspelaspessoascomidadesuperiora50anos
infectadaspeloHIV?
Assim,valeindagar:comovivemaspessoascomidadeacimade60anosinfectadaspeloHIV?
QuerepresentaessobreAidstmasmulheres,porexemplo,comidadeacimade60anos,casadas,
heterossexuaisequesecontaminaramporviasexual,quepodemestarcontribuindoparaoaumentoda
infeconessegrupodapopulao?
Dentrodestaperspectiva,asperguntasanteriormentelanadaslevaramaumaquestocentral
propostaparaopresentetrabalho:comoaumento,pelomenosvirtual,daspossibilidadesdemelhoria
daqualidadedevidadaspessoas idosase, conseqentemente, denovaspossibilidades derelaes
afetivas,sexuaisesociais,paraestaspessoasquejconhecemseu status sorolgico,aAidsaparece
comoimpedidoradessaspossibilidadesouelanoincorporadacomopreocupao,sendoconsiderada
comoinexistente?
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Afinal,onmerodepessoascomidadeacimade60anosinfectadascomHIV/Aidsest
aumentandonoBrasilenoseconsideradeformaefetivaasubjetividadedessaspessoas.Que
representaessobreHIV/Aidsexistemnessegrupo?
Aquisurgeoutraquesto:comodelimitarasfaixasetriasdosindivduoscomAids,parase
saberapartirdequeidadeelessoconsideradosidosos?
Simes(1994,p.19)esclareceque,empasesconsideradosdeprimeiromundo,aOrganizao
MundialdaSadeconsideracomomeiaidade:de45a59anos;idosos:de60a74anos;ancio:de75
a90anos;evelhiceextrema:de90anosemdiante.
JnoBrasil,oInstitutoBrasileirodeGeografiaeEstatsticadefinecomolimitedivisrioentre
adultoeidosoaidadede60anos(IBGE,2000),independentementedaqualidadedevidaoudos
desgastesfsicos(enfermidades,acidentes)ementais(viuvez,divrcio,estresse)doindivduo.
Noentanto, estabeleceroinciodaterceiraidade,quecorresponderiasfaixasacimade60
anos, tornase complexo, devido necessidade de se considerar a individualidade de cada um.
comumencontrarpessoasqueaos50anosjapresentamsintomasdevelhiceeoutrasque,aos80anos,
ainda atuamvigorosamente na profisso, no esporte e na vida afetiva, de formaativa, livres dos
problemasassociadosaoenvelhecimento. EmGoinia,porexemplo,pessoascommaisdesessenta
anosj somaioria emalgumasacademias deginstica, eemalgumasaulas, elaschegama90%
(IDOSOS.DiriodaManh,Goinia,2002,p.8).
Dessemodo,diantedanecessidadedaescolhadeparmetrosparaoestabelecimentodasfaixas
etrias,esteestudoutilizaroconceitodeHazzard(1990),umautoramericanoqueconsideraaterceira
idadedavidaassimsubdividida:osjovens(Youngold),de54a65anos;osadultos(middleold),de
66a74anos;osvelhos(oldold)de75a84anos,eosmuitovelhos(veryold),de85anosparacima.
Assim,paraesteestudo,optouseporconsideraraspessoasacimade60anosdeidadequeestose
aproximandodafasedevidarelacionadaterceiraidade.
Estabelecidostaisparmetros,retornaseaquestodoaumentodopercentualdeidososcom50
anosoumais,contaminadospeloHIV,paraosquaisimprescindvelumaatenoespecialrelativa
promoodasade,nosseusaspectosobjetivosesubjetivos.Nessesentido,aprincipalcontribuio
pretendidacomestetrabalhoaprofundaroconhecimentoarespeitodasrepresentaessociaissobrea
Aids,considerandoascomopartefundamentaldasformasdeagiredesecuidardaspessoas.
20
AprticanotrabalhoquotidianodestapesquisadoraaolidarcomquestesrelativasSade
do Adulto e Idoso mostra, emgeral, umanegao do risco, tanto por parte dos usurios dos
serviosdesade,quantodosprofissionaisqueatendemosidosos.Esteumassuntonoabordadoou
abordadocomoinformaogeneralizada,quesecentranaprescriodecondutas,semconsideraro
contextodevidadessaspessoas.Paraosprofissionaisdesade,umaabordagemcoletivaouindividual
que extrapole a informao tcnica e biologizante dasadeainda difcil. Eles tendema prestar
assistncia, fundamentados embases biolgicas e de interveno teraputica medicamentosa, sem
incluremumaabordagemmaisampla,contextualizadaeinterdisciplinaraessegrupodepacientes.
2.Justificativa
Oliveira(1999),Ferreira(1999)eDuarte(1996)alertamparaaimportnciaeaurgnciados
estudosligadosaoenvelhecimento/Aids.Sendoescassaaliteratura,emgeral,sobrecuidadosdesade
centradosnaespecificidadedessafaixaetria,tornasepertinenteesteestudo,principalmentenoque
tangeaocuidadocomasade,tantonaprevenoquantonocontroledainfecopeloHIV.
Para discutir estas questes, parece fundamental ouvir pessoas dessa faixa etria que esto
vivenciandoainfecopeloHIVparacompreendersuasrepresentaessobreadoena,antesedepois
de sua prpria infeco. Pressupese assim, teoricamente, conforme Jodelet (1989), que
representaessociaisembasamasprticassociaise,aomesmotempo,vosendotransformadaspor
essasprticas.
No que se refere a uma doena infectocontagiosa, que tem como uma das formas de
transmissoocontatosexual,valelembraraimportnciadeseconstruirumaportedeconhecimentos
que fundamentem aes de promoo, preveno e controle, o qual inclua aspectos psicossociais
relativosaosacontecimentosnavidadepessoascommaisde50anosdeidade.
Oaprofundamentodasquestesquerelacionamidias,crenas,imagensevaloressprticas
sociais, sobressaicomoumeixofundamentalquepoder subsidiarodesenvolvimentodeaesde
prevenodoHIV/Aidse,aomesmotempo,contribuirparaadiscussodosdireitosdaspessoasna
terceira idadeeparaseuacessoaosserviosdesade.Esperase,tambm,contribuir, mesmoque
indiretamente,paraadiscussodemodelosdepromoosadevoltadosparaosidosos,quepossam
21
serrealizadosemparceriasentreacomunidade,asuniversidades,osserviosdeatenobsica
sade,especialmenteosdoProgramadeSadedaFamlia(PSF)queestsendoimplantadono
Pas.
Esperaseainda,comestudosdessanatureza,participardaconstruodareflexosistematizada
naEnfermagemqueatuanosdiversosnveisdeatenosade,buscandoseincluiraintegralidade
dasaesdeprevenoecontroledoHIV/Aidscomoeixocentraldessaatuao.
3.Objetivo
Analisarasrepresentaessociaisdepessoascomidadeacimade60anosportadorasdo
HIV/Aids,compreendendocomoaexistnciadessainfecoestrepresentadapelosujeitoquesofre
adoena,parabuscarapoiarformasnovasdepromoo,prevenoecontroledainfeco.
II.METODOLOGIA
No verdade que a mente humana no tenha passado porqualquerdesenvolvimentodesdeostemposprimitivoseque,emcontrastecomosavanosdacinciaedatecnologia,sejahojeamesmaqueeranosprimrdiosdahistria(FREUD,1974).
1.Tipodeestudo
Oestudofoideabordagemqualitativa, centradonaexpressodasubjetividadedossujeitos,
utilizandoseateoria dasrepresentaes sociais. Naanlise foramaplicadasaspropostasdeAbric
(2000,p.35)paraquemasrepresentaessociaissoelementosqueseestruturamemtornodeum
22
ncleo central e de ncleos perifricos para a sistematizao do conhecimento na busca do
aprofundamentodoobjeto.
Napesquisaqualitativa, soextradosos resultados, comoopinies, atitudes, sentimentos e
expectativas, itens que no podem ser quantificados, por seremdiferentes de pessoa para pessoa
(SEVERINO, 2000). A pesquisa qualitativa possibilita essa viso, uma vez que o objetivo dos
investigadoresqualitativostentarcompreendermelhorocomportamento,asexperinciashumanase
oprocessomedianteoqualaspessoasconstroemsignificados,representaes,imagensesmbolos.
2.Referencialtericometodolgico
Todo indivduo se desenvolve em uma realidade social, com necessidades e significados
culturais que moldam os prprios valores e que se expressam no quotidiano, por meio de
representaessociaisconstrudas,nosensocomum,nasinteraes,nasideologiasenosmodosde
viverdaspessoas.
Seja teoria, conceito, categoria analtica ou explicativa, o importante que a expresso
representao social vem sendo de importncia primordial para se compreender a relao
sujeito/objeto,principalmentequandosetratadasubjetividade,dasingularidadeedosensocomumdo
cotidianodaspessoas.
Estudos de Spink (1996) revelam que as representaes sociais podem ser includas em
diferentes camposdeestudos, comoosociofilosfico, odapsicologia cognitiva eodapsicologia
social. Noprimeiro, destacase o contexto ideolgico emque os fatos se passam; no segundo, o
processocognitivodeapreensoeconceituaodosobjetos;noterceiro,osconceitoseimagensque
constituemcategoriasexplicativasdeobjetos,elaboradas, veiculadaseconsolidadasnocursodas
comunicaes(conversaes)cotidianas,passandoainteragircomoconhecimentoprticodosenso
comum.
Depois de Durkheim, que buscava explicaes para os fatos sociais, utilizouse do termo
representaes,masnoaprofundouoconceitonemasuautilizaonasociologia,SergeMoscovicifoi
oprimeiroautorautilizaraexpressorepresentaessociais,delimitandoseucampodeestudoao
mbitodaPsicologiaSocial.Forgas(1981)afirmaqueMoscovicinoconceitua,masassinalaquea
nooderepresentaosocialremetea:
23
um conjunto de conceitos, afirmaes e explicaes originadas noquotidiano, no curso de comunicaes interindividuais. Elas soequivalentes, em nossa sociedade, aos mitos e sistemas de crenas dassociedades tradicionais; elas podem ser vistas como uma versocontemporneadosensocomum(FORGAS,1981,p.27).
Osindivduosparecemelaborarumraciocniocomum,pelofatodepartilharemosmesmos
problemas sociais. A psicologia social possui como enfoque a construo social da realidade,
valorizandoosaspectoscognitivoseoutrosquebuscamacentuarasdimensessociais.Assim,valoriza
eacreditaqueosfatoresinternosdopensamento,bemcomoapercepo,aassimilao,aelaboraoe
aorganizaodeidiasexercemumafunorelevantenaformaodeconceitos.Estesresultam,pois,
darepresentaoemrelaoafatoresexternosmediadapelalinguagem,isto,pelafala,atravsdas
interaessociaisqueseestabelecementreindivduosemseusdilogosformaiseinformais:
As prticas cotidianas, revestidas das conversas do diaadia, esto semprefirmadas em observaes que transformam as pessoas em autodidatas ouenciclopdicosinterlocutores.Naverdade,asobservaeseostestemunhosdodiaadia originamse dos relatos de decises polticas ou de operaesmilitares,deexperinciascientficasoudeinvenestcnicas,dedescobertas,deinvenes,enfim,detodaaredederealizaeshumanas,anunciadasporjornalistas, cientistas, tcnicos e polticos. Estes relatos, cuidadosamenteelaborados,fazempartedomundododiscursoeparecemmuitodistantesdodomniocomum,entretanto,aosereminteriorizadospassamafazerpartedomundodasconversaes,comoocasodosgenesoudostomos,quetantocirculamemnossasimagens,nossasfalasenossoraciocnios(MOSCOVICI,1978,p.52).
Desta forma, as representaes sociais ocorrem de maneira dinmica, interagindo com as
condiessociaisconcretas,asformasorganizacionaisdasociedade,osatoresesuasprticassociais,
que produzem formas especficas de conhecimento. So assim determinadas e determinantes das
condiessociais,sendoafalasuareveladoraprimordial.Adescontraodasconversas,aforados
argumentosencontradosnocalordasdiscussesdefimdetarde,vodandoaosfaladores,aomesmo
tempo,umacompetnciaenciclopdicasobreostemasdadiscusso,assimexplicadaporMoscovici:
medida que a conversa coletiva progride a elocuo regularizase, asexpressesganhamempreciso.Ecadaumficavidoportransmitir oseusabereconservarumlugarnocrculodeatenoquerodeiaaquelesqueestoaocorrente,cadaumdocumentaseealicontinuanopreo(MOSCOVICI,1978,p.52).
24
ParaJodelet (1989),quearriscouafazeroqueMoscovici recusou(GUARESCHI,1996,
p.16), isto , definir as representaes sociais, elas so umsaber prtico, isto , uma formade
conhecimentosocialmenteelaboradaepartilhada.Moscovici,nessesentido,diz:
Cada um de ns, enquanto homem comum fora de sua profisso comportasedamesmamaneiradiantedetodosesses documentosquesoparansosartigosdeumjornal,umacidentenarua,umadiscussonumcafounumclube,umlivrolido,umareportagemtelevisada,etc.Nadanosimpeaprudnciadoespecialistaounosprobedereuniroselementosmaisdsparesquenossotransmitidos,deinclulosoudeexclulosdeumaclasselgicadeacordo com as regras sociais, cientficas e prticas de que dispomos. Afinalidade no ampliar o conhecimento, estar ao corrente, no serignorante, nem ficar fora do circuito coletivo. Desse trabalho mil vezescomeado, repetido e deslocado de um ponto para outro da esfera, osacontecimentos e as surpresas que captama ateno doorigems nossasrepresentaessociais(MOSCOVICI,1978,p.55).
Goffman(1999)revelaqueaexpressividadedoindivduoenvolveaexpressoqueeletransmite
e a expressoque emite para a sociedade. Essa expressose transmite atravs de palavras e a
linguagemocanaldecomunicaoedeinteraoentre oshomens,constituindosenamaneira de
familiarizarsecomonovo.
Sobopontode vista dadinmicadafamiliarizao comonofamiliar, Moscovici (1986)
esclarece que as representaes sociais envolvemdois processos: a objetivao (transformao do
abstratoemalgoquasefsico)eaancoragem(amarrao).
A objetivao consiste na classificao, nomeao e na integrao do nofamiliarquiloquejfazpartedanossacompreensodomundo.Aproduodeesquemas,quesooriundosdanaturalizaodoconceito,eaancoragemestoinscritosnaconversa,nousodaspalavras,esobretudo,naquiloqueelasrepresentam:seusreferentes(objetosfsicosousimblicos).Aspalavraseaestruturaoqueasmesmastmentre si, nassituaes decompreensodomundo pelo pensador amador, so um indicador importante dasrepresentaes,namedidaemqueexprimemsistemasdeasseresmoraisedesaberprticodosensocomum(MOSCOVICI,1986,p.17).
BergereLuckmann(1998),enfatizandoaimportnciadasconversasdodiaadia,consideramnas
oveculomaisimportantedaconservaodarealidade.Paraeles:
25
Podese considerar a vida cotidiana do indivduo em termos dofuncionamentodeumaparelhodeconversa,quecontinuamentemantm,modifica e reconstri sua realidade subjetiva. A conversa significaprincipalmente,semdvida,queaspessoasfalamumascomasoutras.Istononegaoricohalodecomunicaonoverbalqueenvolveafala.Entretanto,afala conserva uma posio privilegiada no aparelho total da conversa. importanteacentuarcontudo,queamaiorpartedaconservaodarealidadenaconversaimplcita,noexplcita.Amaiorpartedaconversanodefineemmuitaspalavrasanaturezadomundo.Aocontrrio,ocorretendoporpanodefundoummundoquetacitamenteaceitocomoverdadeiro.Assimumatrocadepalavras, comoporexemplo, bem,est nahoradeir paraaestao etimo,querido,passeumbomdianoescritrio,implicaummundointeirodentrodoqualestasproposies, aparentemente simples, adquiremsentido.Emvirtudedestaimplicao,atrocadepalavrasconfirmaarealidadesubjetivadessemundo(BERGERELUCKMANN,1998,p.2023).
Assimsendo,podeseafirmarqueasinteraesancoramasrepresentaes,objetivamnaspor
meiodossignos,quesoaspalavrasparaestesautores.Nopresenteestudo,asrepresentaessociais,
socompreendidascomouminstrumentoparamelhorapreenderasubjetividadedaspessoascomidade
acimade60anoscomHIV/Aids,apoiandosenanecessidadedeserecuperaronvelsimblicodas
prticasdosatoressociaisenvolvidoscomoobjetodeestudo.
As representaes sociais permitem no somente compreender e explicar a realidade, mas
tambmguiamoscomportamentoseasprticas.Masqualamelhormaneiraparaseconheceroobjeto
darepresentao?
OpesquisadorfrancsJeanClaudeAbricpropeateoriadoncleocentral:
A Teoria do Ncleo Central foi elaborada a partir da hiptese onde aorganizaodeumarepresentaoapresentaumacaractersticaparticular:noapenasoselementosdarepresentaosohierarquizados,mas,almdisso,todarepresentaoorganizadaemtornodeumncleocentral,constitudodeumoudealgunselementosquedo representaooseusignificado(ABRIC,2000,p.31).
Essateoriasugerequesepodeconhecercommaisparticularidadeocarteressencialdeuma
determinadarepresentao.Istopossveldescobrindosuaestrutura,definindoaposioquecadaum
dosatributosdeimagemocupaeidentificandoaquelesqueconstituemoncleocentraleosquefazem
partedosistemaperifrico. Essaidentificaopropiciaconhecerosatributosdeimagemquefazem
partedessencleoequesoresponsveispeloprprioreconhecimentodoobjetorepresentado.
26
ONcleoCentralumsubconjuntodaimagem,compostoporalgunsdoselementosconstituintesdessaimagem(atributos).Essesatributoscentraisgarantemimagemoseupoderderepresentaodoobjeto,comoummodelo.Seoselementoscentraisestoausentesdarepresentao(imagem)oobjetonomaisreconhecido(ABRIC,2000,p.31).
Asimagenscriadaspodemsemoverouficarimveisepodem,tambm,tornaremsergidasou
flexveis,dependendodasdiferenasdesujeitoparasujeito.
Moscoviciconcordaquetodarepresentaocompostadefigurasedeexpressessocializadas:
Conjuntamente, uma representao social a organizao de imagens elinguagens, porqueela reala e simboliza atos e situaes que nos tornamcomuns.Encaradadeummodopassivo,elaapreendidaattulodereflexo,naconscinciaindividualoucoletiva,deumobjeto,deumfeixedeidiasquelhesoexteriores.Aanalogiacomumafotografiacaptadaealojadanocrebrofascinante,adelicadezadeumarepresentao,porconseguinte,comparadaaograudedefinioenitidezticadeumaimagem.nessesentidoquenosreferimos,freqentemente,representao(imagem)doespao,dacidade,damulher,dacrianadacincia,docientista,eassimpordiante.Abemdizer,devemosencarladeummodoativo,poisseupapelconsisteemmodelaroque dado do exterior, na medida em que os indivduos e os grupos serelacionamdeprefernciacomosobjetos,osatoseasituaesconstitudospormiradesdeinteraessociais(MOSCOVICI,1978,p.2526).
CelsoPereiradeS,outroestudiosodasrepresentaessociais,assimfalasobreestasociedade
pensante:
Naperspectivadapsicossociologiadeumasociedadepensante,osindivduosno so apenas pensadores de informaes, nem meros portadores deideologias ou crenas coletivas, mas pensadores ativos que, medianteinumerveisepisdioscotidianosdeinteraosocial,produzemecomunicamincessantemente suas prprias representaes e solues especficas paraasquestes que se colocam a si mesmos. Da mesma forma que se trata asociedade como um sistema econmico ou um sistema poltico, cabeconsiderlatambmumsistemadepensamento(S,1996,p.28).
ValiososestudossobrerepresentaessociaiseAidstmcontribudoparaoconhecimentoda
relao sujeito/objeto. Entre eles, estudos realizados por Joffe (2002, p. 300) sobrerepresentaes
transculturaisdaAids,emcomunidadessulafricanasebritnicasnafrica,revelaramanegaodos
sujeitoscomumfortesentimentodeeuno,noomeugruposobreofatoquedeaAidstenhase
originadonocontinenteafricano.Opensamentobastantefreqentedequeadoenanuncairme
atingir,semdvida,umfatorrelevante.Aoutilizarasrepresentaessociaisnareadapsicologia
socialemrelaoaoHIVnumestudocomjovenssulafricanos,aautorapercebeuque:
27
aoescolherpesquisaroprocessodeelaboraoderepresentaes(aoinvsdo contedo das representaes) a partir de estudos de caso emprofundidade(aoinvsdosmuitoscasosqueseriamnecessriosparaacessaronveldeconscinciacoletiva)focalizouamicroescaladasinteraes,ondeasrepresentaesassumemocarterderepertrios(JOFFE,2002,p.299).
OutrotrabalhobastantesignificativofoiodaantroplogaSniaBarbosa,quefezumestudode
casosobrearepresentaodasexualidadedasidosasdeOlinda/PEeconstatouqueagrandemaioria
dasmulheresentrevistadasjouviufalardasDST,noentanto,porterempoucafreqncianaatividade
sexual,nosepreocupammuitocomaprevenoaelas(BARBOSA,2002,p.7).
Destaforma,asrepresentaesdirecionamaao,ouseja,omodopeloqualosindivduos
vemarealidadedeterminaasuaformadeestarnomundo.Assim,pressupesequeasmaneirasdese
preveniremoudesecuidaremapsainfeco,estonocernedasubjetividadedaspessoasquevivema
experinciadeterHIV/Aidscomidadeacimade60anos.Talexperinciavemcarregadadecrenase
valoresquedefinemoseucomportamentodiantedaenfermidade.
Muitas vezes, no cotidiano, as pessoas somente percebem o risco e a gravidade de uma
enfermidadequandosoporelaacometidaseseantesnohaviarisco,nemdeadoecimento,coma
doena,oriscovisualizadocomosendodemorte(SILVA,2000,p72).Destaforma,asatitudesdas
pessoasfrenteaumaenfermidadegrave,mesmoquesejaumapandemia,nemsemprevmcomuma
percepodequepodem,umdia,seinfectar,levando,porvezes,neglignciaquantoaosmodosde
preveno.
Assimsendo,acreditasequeateoriadasrepresentaessociaistornaseadequadaaoestudodo
objetodestainvestigao,porconsiderarapeculiaridadeeasubjetividadedossujeitosportadoresdo
HIV/Aidscomidadeacimade60anos.
3.Sujeitosdapesquisa
Comoobjetivodeseobtermaterialverbalqueindiqueasrepresentaessociaisdepessoas
comidadeacimade60anoscomHIV/Aidsforamentrevistadoscincohomensequatromulheres,que
obedeceramatrscritrios:primeiro,teridadesuperioracinqentaanos;segundo,sersoropositivo
paraHIV/Aidseterceiro,concordaramemparticipardoestudo.Umformulriodeconsentimentolivre
eesclarecido(ANEXOD),contendoasinformaessobreoestudoeascondiesdeparticipao,foi
apresentado aos participantes para ser assinado. No houve nenhuma resistncia por parte dos
28
entrevistados,quesedispuseramafalarsobresimesmos,salvaguardandosuasidentidades,com
usodecdigosparaaanliseeapresentaodosresultados.
ApsaautorizaodoComitdeticadoHospitaldeDoenasTropicaisHDT2deGoinia,
Gois,paraarealizaodapesquisa,(ANEXOAeB)edoComitdeticadaUFMG(ANEXOC),
foi feita umabusca aonomedas pessoas no livro de registro do servio, segundoos critrios j
estabelecidosanteriormente(ANEXOG).Localizadososendereosregistradosnolivro,foimarcada
umavisitaaessaspessoas,quandoforamconvidadasaseincluremespontaneamentenoestudo,aps
consentimentolivreeoesclarecimentosobreoobjetivoeocarterticodapesquisa.Ossujeitosforam
entrevistados comdata, horrio e local definidos previamente pelos participantes, cabendolhes o
direitodenoseexporanenhumtipodeconstrangimento.
4.Cenriodapesquisa
EmGoinia,capitaldoEstadodeGois,deacordocomosdadosdoSistemadeInformaode
AgravosdeNotificaoemGois(SINAN/GO),atagostode2002,eram136oscasosnotificadosde
pessoasacimade60anoscontaminadas(GOIS,2002,p.6),numapopulaode1.073.490habitantes,
e o Hospital de Doenas Tropicais a principal instituio que atende portadores de doenas
infectocontagiosas(ANEXOI).
MuitosdospacientesqueestoregistradosnoHDTalichegaramcomodiagnsticopositivo
paraHIV(feitonocentrodereferncia/Goinia)e,quandonoestointernados,retornamparal,
periodicamente,parareceberemassistncia,medicamentosepreservativos.Ospacientesaliatendidos
sopessoasdediferentesnveissociaiseeconmicos,ealgunsdelesmoramemcidadesdointerior,
prximasCapital,taisso:AparecidadeGoinia,RioVerde,Piracanjuba,EdiaeSantaRosa.Seno
possuemparentes e no tmcondies de se hospedarem, ficampor alguns dias no Condomnio
Solidariedade,umainstituiogovernamentaldeapoioaosportadoresdeHIV/Aids.Htambmem
2 HDT Sigla do Hospital de Doenas Tropicais Dr. Anuar Auad, que atende portadores de HIV/Aids, hansenase,tuberculose,ttanoereferncianacionalemdoenasinfectocontagiosas.Fundadoemjaneirode1977noespaofsicodoantigoHospitaldoPnfigo.SeantesafunobsicadoHDTeraretirardoconvviosocialosdoentesdevarolaesfilis,hojecontacomUTIeatendeemmdiaseismilpacientes/mserealizacercadesetemilexameslaboratoriais/msempacientesinternosouatendidosambulatorialmente(RELATRIODEGESTO,2001).
29
GoiniaoCentrodeApoioaoDoentedeAids(CADA)umainstituiofilantrpicaquefornece
cestasdealimentos,auxliojurdicoeacomodaes.
5.Instrumentodecoletadeinformaes
Asinformaesforamobtidasemdiscursooral,faceaface,medianteentrevistaabertaeem
profundidade,comousodegravadorefitacassete.
Realizouse, inicialmente um levantamento dos dados disponveis no HDT apenas para
identificarosnomesdaspessoascomdiagnsticoparaHIV/Aidsquepudessemsercontactadaspara
participardapesquisa.Considerandoseafalacomoreveladoradasconstruesefetivadasnarealidade
social,utilizouseaentrevistacomoinstrumentoparaacoletadeinformaes,demodoagarantira
compreenso das representaes sociais de pessoas com idade acima de 60 anos sobre Aids. A
entrevistaviabilizouoacessosinformaesqueconsubstanciaramoobjetodesteestudo.
DeacordocomopensamentodeMinayo(1996,p.109),oquetornaaentrevistainstrumento
privilegiadodecoletadeinformaesparaascinciassociaisapossibilidadedeafalaserreveladora
decondiesestruturais,desistemasdevalores,normasesmbolos(sendoelamesmaumdeles)e,ao
mesmo tempo, ter a magia de transmitir, atravs de um portavoz, as representaes de grupos
determinados,emcondieshistricas,scioeconmicaseculturaisespecficas.
Antes de ligar o gravador, foi pedido o consentimento ao entrevistado, comomencionado.
Todososparticipantesdapesquisaforaminformadossobreosobjetivosesobreoaspectovoluntrioda
participao, compreservaodoanonimato, eaindasobreodireitodeseretiraremdoestudoem
qualquermomentosemsofreremnenhumapressoouprejuzo,emcumprimentoPortaria196/96e
tambmreconhecendoqueapesquisadecunhosociolgico,antesdetudo,umaformadeexpressara
visoeahistriadevidadaspessoas,sendonecessriomanterorespeitoprofundoporelas,dacoleta
anlise.
Lakatos e Marconi (1990) afirmamqueaentrevista deveser entendida comoumdilogo
livre. Para isso, foi elaborado o seguinte roteiro preliminar de memorizao (RPM) para o
pesquisador, comquestes referentes ao modo comoo sujeito pensa e sente o acontecimento do
HIV/Aids:
30
1. Eu gostaria que o(a) senhor(a) me falasse sobre a Aids. Comoo(a) senhor(a) est
vivendo?
Foramutilizadospontosdememorizao:
2. Quantotemposabedodiagnstico?
3. Comoestvivendodepoisdodiagnstico?
4. Comoestotratamento?
5. Ecomosoasrelaescomafamlia,comosamigos,como(a)companheiro(a)oucomo
(a)namorado(a)?Easrelaesnotrabalho?
6. Queperspectivaso(a)senhor(a)temparaaprpriavida?
Dasreflexescolhidasnodiscursoforamidentificadasasrepresentaesqueossujeitostmem
tornodainfecopeloHIVoudaAids.
Aconfidencialidadefoigarantidapelautilizaodeumcdigo;e,paramanteroanonimatoe
sigilo dos sujeitos participantes doestudo, conformeoque dispea Portaria 196/96doConselho
NacionaldeSade(BRASIL,1996),estesforamrebatizadosde:Entrevistado1,2ou3...ouE1,E2,
E3...)eossegmentosdefalaforamnumeradossucessivamentecomoS1,S2,S3...,parapublicaodos
resultados.
Em mdia, foi feita uma entrevista por dia, com o tempo de aproximadamente cinqenta
minutoscada,procedendoseimediatamenteescutadetodaaentrevista,seguidadatranscrioliteral
decadauma,emseparado,pelaprpriapesquisadora,jnumprocessodeanlisebuscandoosentido
global do relato de cada entrevistado. Foi feita uma entrevista com cada sujeito e a interao
pesquisadora/sujeitosedeudeformatranqila.
Aquantidade deentrevistas foi estabelecida pelocritrio desaturaoqueexigiu queuma
anlisepreliminarfosserealizadaduranteacoleta:asuspensosedeuquandohouverepetiodasfalas
dossujeitos.
31
6.Anlisedasinformaescoletadas
Aanlisedocontedodosrelatosrefleteumavisodemundo.Essavisodemundoedesi
mesmosednaentrevistaemformadetrajetria.
ApalavratrajetriatemsuaorigemdoLatim(trajectoreoqueatravessa+ia)esignifica
linhadescritaoupercorridaporumcorpoemmovimento,oquenodiferedetrajeto,tambmdo
Latim(trajectupassagem)esignificaespaoquealgumoualgotemdepercorrerparairdeum
lugaraoutro,trajetria,percurso(TRAJETRIA,In:FERREIRA,1999,p.1698).Destaforma,para
compreenderanoosociolgicadetrajetriabuscouseasidiasdosocilogofrancsClaudeDubar
(1998).
Para Dubar (1998, p.5) apud Silva (2000, p. 32), a trajetria diferenciada em duasabordagens:
umachamadadetrajetriaobjetivadefinidacomoseqnciadas posies sociais ocupadas durante a vida, medida porcategorias estatsticas comtendncia a umageneralizao eoutra,trajetriasubjetivaquedizrespeitoaoenredopostoempalavraspelaentrevistabiogrficaeformalizadopeloesquemalgico, reconstrudo pelo pesquisador por meio da anlisesemntica.
Assim,quandoosujeitoexpe,atravsdodiscurso,suavidaoubiografia,estrelatandoseu
prprio trajectu, isto o seu percurso. Para compreender como esse percurso acontece, o qual
compreendepassadoepresente,Dubar(1998)sugereessareconstruopelopesquisadorpormeiode
anlisedesignificaoedarepresentaodosentidodosenunciados:
Tratasedadisposioparticular,numdiscurso,dascategoriasestruturantes do relato, segundo as regras de disjuno econjunoquesupremaproduodesentido...umaformaderesumo da argumentao, extrado da anlise do relato e dadescobertadeumoumaisenredos,edosmotivospelosquaisosujeitoestnumasituaoemqueelemesmoestsedefinindo,a partir de acontecimentos passados, aberto para umdeterminadocampodepossveis,maisoumenosdesejveisemaisoumenosacessveis(DUBAR,1998,p.5).
Assim,pelorelatopossvelextrairoenredoeajustificativaqueosujeitoforneceemseu
discursoenquantoeleaindaestemprocessodedefinio.
Fundamentandosenalgicadatrajetriasubjetiva,buscouse,atravsdaanlisedanarrativa,
umadesconstruoeumareconstruodosdiscursos,extraindo,destaformaascategoriasdeanlise.
32
Apsatranscrioliteraldosdepoimentosdosparticipantes,foramrealizadas,combasena
teoria das representaes sociais, a leitura e a releitura deles, atentandoseparao processode
leiturahorizontaldecadaentrevista,procurandosenocontedodotextoasinformaesrelativass
representaesparaumaprimeiracategorizaoemprica,medianteostemasabordadospeloprprio
sujeito.
Destaforma,foipossvelelaboraraanlisedosrelatos.Assim,otextofoidivididoemfrases,
porcontedoespecfico,representadasporsegmentosouseqnciasdefala(S1,S2...),osfatos(F1,
F2...)easjustificativas/explicaesquedoparaestes(J1,J2...)queforamnumeradosemseguida.
Cadaentrevistadofoiidentificadoconformejfoidescrito(E1,E2...).Logoaps,todosossegmentos
coincidentes em torno de um mesmo objeto do discurso foram agrupados, nomeandose
provisoriamentecadagrupodesegmentos,quandosebuscouasegundacategorizaoemprica.
Com base na categorizao emprica, foi feita uma leitura transversal do conjunto de
entrevistas, mediante a organizao do contedo em blocos temticos, sendo considerados os
reagrupamentos de cada entrevista e comparados s conjunes e as disjunes do conjunto de
entrevistas.
NessesentidoFreitas(2003)2orientaosseguintespassos:
Primeiropasso:atranscrioliteraldaentrevistagravada,atentandoseparaafidelidadedas
expressesdosujeito.
Segundopasso:aleituraverticaldecadaentrevistatranscritaparaumaprimeiraaproximao
docontedodesta.
Terceiropasso:aelaboraodeumpargrafoquesintetizeocontedodafaladosujeito.
Quarto passo: o retorno entrevista para uma primeira anlise horizontal buscando as
seqnciasdefala,colocandoentreparntesesaofinaldecadaassuntoanumeraocorrespondente,
S1,S2,S3...paraseqncias;P1,P2,P3paraaspersonagens;F1,F2,F3paraosfatoseJ1,J2,J3para
justificativas.Cadaseqnciacorrespondeumtematratado,naordemcomquesofalados.Issoquer
dizer que a pessoa pode voltar a um determinado tema/assunto e a numerao em ordem de
aparecimento.
2 FREITAS, Maria Imaculada de Ftima. Anlise de Trajetria. Faculdade de Enfermagem, UCG, GoiniaGO:Comunicaopessoal:junhode2003.
33
Quintopasso:anomeaodecadaseqnciacomocontedomaisimportantedela.Ao
finalseterosttulosprovisriosdasseqncias,podendocomparar,apsteranalisadotambmas
outrasentrevistasseestotratandodetemascomuns(ANEXOE),reagrupandoos.
Sexto passo: aps a primeira categorizao (anlise da estrutura das falas) proceder a
identificaodosncleoscentraiseperifricosdasrepresentaes(ANEXOL).Nessemomentobuscar
as etapas sugeridas por Abric (1997): busca da estrutura e do ncleo central; identificao das
ligaes;evidencializaodoselementoscentrais;verificaodacentralidadeeanlisedaorganizao
(ABRIC,1997,p.26).
Stimopasso:aelaboraodeumesquemaquepermitaidentificarquaissoosncleoscentrais
equaisosperifricos, bemcomoosistemaperifricoqueossustentam.Assim possvelanalisar
profundamentecadancleoeseusistemajuntoaostericos,isto,desenvolveratemtica,citando
autores,fundamentando,apresentandoasfalasdaspessoassobreotema,dialogandocomosautores.
Essaanlisepermitiuumadesconstruoeumareconstruododiscurso,apartirdoqualfoi
possvelextrairascategoriasempricasetericasdeanlise(ABRIC,2000,p.30),queexpressamas
representaessobreosdiferentesobjetosdosdiscursoselaboradospelosindivduos,isto,sobreseus
valores,sentimentos,(ANEXOF),significadosejulgamentos,enfim,sobreasrepresentaessociais
emtornodainfecopeloHIVdepessoascomidadeacimade60anoscomAids.
IIIANLISEDASENTREVISTAS
Nosetenhapordifcilescaparmorte,porquemuitomaisdifcil escapar maldade; ela corre mais ligeira que a morte(SCRATES,1969,p.49).
Nestecaptulo,propeseaapresentarosresultadosdapesquisadecampo,comadiscussodas
representaes sociais elaboradas por pessoas com idade acima de 60 anos soropositivas para
HIV/Aids.Noprimeiromomento,foifeitaumadescriodascondiesmateriaisdosentrevistados
34
(ANEXOH);nosegundomomentosoapresentadaseanalisadasasrepresentaes sociais em
tornodainfecopeloHIV,isto,osncleoscentraiseseussistemasperifricos.
1.Apresentaodosentrevistadosedosresultados
AsentrevistasforamrealizadascompessoassoropositivasparaHIV/Aids,internadasemum
hospitalpblicodeGoinia,noperodode2002a2003.Osentrevistadossoemnmerode09(nove),
queoptaramemconcederaentrevistanoprpriohospitalemqueestavaminternados,noCADA3eno
CondomnioSolidariedade4.
a)Idade/Escolaridade/AtividadeProfissionalAfaixaetriadosentrevistados,pocado
estudo,variavaentre62(cinqentaedois)e65(sessentaecinco)anos,todoscomoprimeirograu
incompleto,oquenodiferedoqueapresentadonaliteratura,principalmenteemrelaosmulheres.
Vermelho,BarbosaeNogueira(1999,p.8)afirmamemseuestudoqueagrandemaioriadasmulheres
(75%)exibiunveldeescolaridadebaixoesomente8%atingiunvelsuperior.
Quantosmulheres,todasquatroentrevistadassodonasdecasa.Entretanto,emrelaoaos
homens,hosquemantmrelaessexuaiscomoutroshomens,osquaisrepresentavamnopassadoo
maiornmerodeinfectadosecomnveldeescolaridadesuperior,eagoraseapresentamcomnvelde
escolaridadeprimrio. Dentreeles, um cabeleireiro, ooutro lavradoreo terceiro auxiliar de
serviosgerais.Doshomensheterossexuais,umlavradoreooutronotemprofissodefinida.
Tais informaes mostram que, no grupo de pessoas participantes desta pesquisa, h o
predomniodonvelprimriodeescolaridade,comdiferentesidades,apontandoparaumacoerncia
comoquadroatualdaepidemiologiadaAidsnoBrasil,isto,tmapenasescolaridadeprimria,
baixopoderaquisitivo,vivememcidadespequenas(BRASIL,2001).
b)SexoecategoriasdetransmissosexualDogrupoestudadoparticiparamnovepessoas:
quatromulheresheterossexuaisecincopessoasdosexomasculino,sendoquedoisapresentaramse
comoheterossexuaisetrsdizemfazersexocomhomens.
3CentrodeApoioaoDoentedeAids/GoiniaGOONG4UmainstituiogovernamentaldeapoioaosportadoresdeHIVcarentesquevmdointeriorenotmondesehospedar.
35
Levantamentos estatsticos do Ministrio da Sade (BRASIL, 2001) indicam maior
crescimentodenotificaodeinfecoentremulheresdoquedeoutrosgrupossexuais.Essedado
mudouosrumosdasestratgiasdecampanhas,assimcomoaslinguagensadotadas.
Empesquisadivulgadaemmaiode2002peloProgramaNacionaldeDSTeAidsdoMinistrio
daSade(BRASIL,2002),aAidscresceentreosheterossexuaisediminuientreosusuriosdedrogas.
OsdadosrevelamqueatransmissodeAidsporrelaesheterossexuaisrespondepor80,8%doscasos
dadoenaentreasmulheresepor40%doscasosentreoshomens.Em2000,asrelaesentrepessoas
desexodiferenteforamresponsveispor79,3%doscasosentreasmulheresepor35,2%entreos
homens.Nogrupoparticipantedopresenteestudo,ascategoriasdeexposio,hetero,homo,paraos
homenseheteroparaasmulheresestorepresentadas,mostrandoastendnciasjconfirmadaspelo
MinistriodaSade,nosestudoscitados.Chamaaateno,sobretudo,aexpansodainfecoem
mulheresnafaixaetriaacimados50anos.
c)EstadoCivileformadecontgioOgrupodeentrevistadosdapresentepesquisacomposto
desolteiros,vivosoudesquitados,isto,semvnculocomumparceiroestvelecompredominncia
deinfecoporviasexual. ExatamentecomonasexpectativasdoMinistriodaSade,encontrouse
umnmeromaiordepacientescontaminadospelaviasexual(oitodeles)eumapessoaqueacredita
tambmtersidoporestavia,masnotemcertezaportersidousuriadedrogas.
Quantoaousodopreservativo,amaioriarevelaquenofaziausodepreservativoequese
infectouporviasexual.AinfecopeloHIV(VrusdaImunodeficinciaHumana)passveldeatingir
homens e mulheres de qualquer idade, cor e condio social, religio e nacionalidade, sendo o
comportamentosexualaprincipalviadetransmisso(PARKERetal.1994a).
Aformadecontgiodivididaporcomportamentosexual,nestainvestigao,estapresentada
noquadroaseguir:
QuadroIOESTADOCIVILEAFORMADECONTGIOPart. Pormeioderelaesheterossexuais PormeioderelaeshomossexuaisdesprotegidasE1 Pormeioderelaeshomossexuais, masnosabe
exatamente de quem se infectou, porque tevemltiplosparceiros.
E2 Acredita que foi por transfusodesangue,mas o marido faleceu com Aids, no tem
36
certezadaorigemdainfeco.Infereseafonterelaosexual.
E3 Por meio de relaes homossexuais com umparceiroetemcertezadisso.
E4 Acredita que foi por relaes sexuais. Afamlia lida com drogas e diz no saberexatamenteafontedecontgio.Infereseafonterelaosexual.
E5 Por meio de relaes homossexuais, mas noexplicitaisso,apenasdizquetemumparceirocomquem se relaciona, que no soropositivo edesconhecesuacondio.
E6 Acreditaquefoiporrelaessexuaiscomosegundomarido,maserausuriadedrogas.Infereseafonterelaosexual.
E7 Por meio de relaes sexuais com outrasmulheres que no a sua esposa, mas noexplicitaisso,deformaclara.
E8 Pormeioderelaescomparceirosdomesmosexo,apesardeterrelaescommulheres.Nosabedequem se infectou, mas insiste que teve relaessexuaiscommltiplosparceiros.
E9 Acreditaqueseinfectoudeumparceiromaisjovem, mas tem dvidas a esse respeitoporqueserelacionoucomoutrohomemqueserecusavaausarpreservativo.
Diantedoexposto,arelaocommaisdeumoucommltiplosparceirosestpresenteem
E1,E3,E4,E7,E8,E9.DestesapenasE3temcertezadecomoecomquemsecontaminou;os
outrosdizemnosaberexatamentecomosecontaminaram.Todoselestiveramrelaessexuais
desprotegidas,ouseja,semousodopreservativo.
SegundooBoletimEpidemiolgicodoMinistriodaSade(BRASIL,2001),dosvintemil
novoscasosporano,trsmilsodepessoasacimade60anos,sendo27,4%doscasosportransmisso
heterossexual;17,0%homossexual;9,7%bissexual;18,1%porusodedrogasinjetveis.
Amaioriadosentrevistadosconfirma,assim,situaesdeexposioaovrusHIV,sobretudo
aquelasrelacionadascomrelaessexuaiscommltiplosparceiros.
d) Tempo decorrido da Infeco relevante destacar que todos os participantes, ao
adoecerem, em algum momento, viveram a experincia da internao hospitalar, entretanto, os
entrevistadosforamunnimesemdizerquenotinhamcertezaquantoaotempodecorridodainfeco.
37
Lembramsedadatadodiagnstico,masnoexatamentequandoseinfectaram,oquedificulta
identificarseelesseinfectaramhpoucotempoelogoadoeceramouseestocomovrushmais
tempo.Seaprimeirahipteseforverdadeira,podesignificarqueosujeitocomidadeacimade60anos
maissuscetveleporissoadoecerapidamente;seasegundapremissaforreal,podesignificarque
essaspessoasestocomovrushmuitotempoetmsobrevividoaeleathoje.
2.Asrepresentaessociaisdepessoascomidadeacimade60anosemtornodainfeco
peloHIV
NesteestudobuscasediscutircomoaexistnciadoHIV/Aidsestrepresentadanosujeito
que sofre a doena. A opo pela Teoria das Representaes Sociais (MOSCOVICI, 1978) e,
basicamente,abuscadoncleocentraledosistemaperifrico(ABRIC,2000,p.35),isto,oque
fixo,duro,masnoimutvel,eoquemveleflexvelnasrepresentaesemtornodaexperincia
dadoena,permitiuaidentificaodasrepresentaesdosportadoresdeHIV/Aidscomidadeacima
de60anos. Assim, foi possvel compreender comoas representaes sociais estorefletindoo
cotidianodessessujeitos.
As representaes dos sujeitos a respeito da Aids provavelmente tm origem nas
informaes oriundas das vises cientfica (profissionais da Sade, Por meio de palestras e
campanhas),religiosa(naigrejaetemplos)emiditica(campanhaspublicitrias)(ANEXOJ).
DeacordocomHerzlich&Pierret(1992),porexemplo,aAids,comofenmeno,remete
maneira como esta doena identificada na mdia e como a mesma classifica os seus
acontecimentos.Atravsdessamesmamdia,aAidssetornouumobjetodetomadadeposio,de
enfrentamentoedeclivagens,tantocoletivas,quantoindividuais.Parker(1994b)tambmevidencia
queopapeldasrepresentaesnotrajetodaepidemianoBrasilfoitantooumaisimportantequea
Aids,poisapareceuprimeirocomofenmenonamdia.Noentanto,necessriosalientarquetais
representaesestonocernedetodasasquestesreferentesaoprocessosadedoena,institudos
culturalmente. Os costumes religiosos, as informaes cientficas, alm do constante
bombardeamento de idias atravs da mdia precisam ser repensados para que o trabalho de
prevenoultrapasseoslimitesdamerainformao.Asbarreirasculturais,arraigadasnosncleos
duros das representaes, esto repletas de significados e merecemdiscusso a fimde que os
38
conceitoseosprconceitossejamquestionadosnasinteraesentreprofissionaiseclientes,no
interiordafamlia,nosveculosdecomunicaodemassaetc.
Aseguir,apresentamseasrepresentaessociaisdepessoascomidadeacimade60anosa
respeitodainfecopeloHIV/Aids,encontradasnosdiscursosdossujeitos.
Esquema1RepresentaesdossujeitosemtornodaAids
Essesncleosnosoestticosepodem,atravsdeumsinergismomultifatorial,semoveRde
formacentrpeta(deforaparadentro)oudeformacentrfuga(dedentroparafora).
39
normal:maisumadoenadevelho
OssintomascomoconscinciadaAids
Noteriaqueacontecercomigo
Ameaaconstantede
morte
Aexignciademudaremoshbitosdevida Trabalho
Depresso
Disposioparafalarmais
Aidsnocncer
DescrenanoSistemadeSade
Tratamentodifcil
Aids:essetremnotemcura
Prevenoantesdedepois
Dupladiscriminao
Ao receber o diagnstico, o sujeito com idade superior a 50 anos, em processo de
envelhecimentoeportador,podeexpressartodasessasrepresentaesouelaspodemestarfixas
nomeioemquevive,atravsdalinguagemcientfica,religiosaoumditicaesocompartilhadas
nasatitudes,nasfalasdocotidianoenossilncios.
SegundoAbric,(1994),citadoporSouzaFilho,(2000,p.147),noafreqnciacomque
umdadoelemento aparece que ir definir sua posio em termos de centralidade ouenquanto
elemento perifrico, mas sim o fato desse elemento dar significado a outros elementos mais
freqentes.Talconsideraosetornaparticularmenteimportantequandoselevaemcontaqueas
representaessociais podemsertransformadascombaseemnovasprticas oueventossociais,
impostospelomeioexterior.
DeacordocomAbric(1994),apudCostaeAlmeida(2000,p.259),precisoconhecerno
apenas o contedo de uma representao social, mas, sobretudo, como ele est organizado e
estruturado,ouseja,quelugarcadaelementoocupanaestruturadarepresentao.Istoporqueo
conhecimentodoselementosmaisestveis,rgidosecentraisdarepresentaoedoselementosmais
flexveisquepermitircompreenderainteraoentreofuncionamentoindividualeascondies
sociais nasquais osatoressociais evolueme, conseqentemente, oferecer pistassobrequala
melhor forma de intervir, no sentido de provocar mudanas das representaes. No caso das
representaessociaisdepessoassoropositivasarespeitodoHIV/Aids,foramencontradosncleos
maiscentraiseoutrosmenoscentrais,cadaumcomseusistemaperifrico,osquaisserodivididos
didaticamenteemtrsgrandescategorias,aseguir:
a) Asrepresentaesemtornododiagnstico: ameaaconstantedemorte;ossintomascomo
conscinciadaAids;descrenanoSistemadeSade;Aidsnocncer;noteriaqueacontecer
comigo(negao,aAidsestnooutro).
b) As representaes em torno do tratamento: tratamento difcil, convivncia com a Aids;
depresso; Aids: esse trem no tem cura; o distanciamento/renomeao da Aids; a no
prevenoanteseousodopreservativodepois;aexignciadesemudaremoshbitosdevida.
c) Asrepresentaesemtornodasinteraessociais:duplopreconceitoservelhoeestarcom
Aids;otrabalho;normal,maisumadoenadevelho;ossentimentosdesvelados,disposio
parafalarmais.
40
Aanlise dasrepresentaes sociais complexa. No suficientereunilas, umaapsa
outra, ediscutir cadaumateoricamentedeformavertical ouhorizontal, mastridimensionalou
espiralar.OprprioMoscovici(1978)refereseaTeoriadasRepresentaesSociaiscomoelsticae
complexa,porqueresultantedemiradesdeinteraessociais.Assim,fazsenecessrioesclarecer
queaestruturadarepresentaonohorizontal,osncleosnosoformadosparalelamente,masde
formadinmicaenolinear.
Numa primeira fase de anlise emergiram das falas dos sujeitos trs grandes categorias
(diagnstico,tratamentoeinteraessociais).Entretanto,numasegundafasedecompreenso,percebe
seque,parasecompreenderaestruturadasrepresentaesprecisoanalislasdosncleosperifricos
paraocentral,oquemuitasvezesaparentafaltadeconexodiretacomascategorias.Todavia,issono
significa dizer que elas noestejam ligadas entre si, comonuma teia (ANEXOL) emaranhada e
multifacetada,numadimensodeprofundidade.
SegundoosestudosdasRepresentaesSociais(MOSCOVICI,1978;ABRIC,2000,SPINK,
1996), os ncleos perifricos so passveis de mudana, so menos rgidos, ou seja, podem ser
alcanados, modificados oumesmoseremextintos comotempo, comotrabalhodeeducaoem
sade.Osncleosmaisprximosdocentrosomaisinflexveis,menosacessveisscampanhasde
preveno e conscientizao, mas, no decorrer do tempo, atravs de constantes interaes e
acompanhamentodequemconheabemasrepresentaessociaisdessaspessoas,essasrepresentaes
podemserrompidas.Oncleomaiscentraldetodosaameaaconstantedemorteprovavelmentes
sereliminadodoimaginriodossujeitosquandosedescobriremacuraouavacinacontraaAids.
Aanlisedasfalasdoconjuntodasrepresentaessociais,atravsdosncleosmaisperifricos
paraomaiscentral,permitiuevidenciar,demaneirahierarquizada,aseguinteseqnciacentrpeta:
Osncleosmaisperifricos:a)Aidsnocncerb)descrenanoSistemadeSadec)
tratamento difcil d) depressoe) Aexigncia de semudaremos hbitos de vida f) no
prevenoanteseprevenodepoisg)trabalhoh)convivnciacomaAids,i)disposioparafalar
mais.
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Osncleosmaisprximosdocentroa)noteriaqueacontecercomigob)normal,
maisumadoenadevelhoc)ossintomascomoconscinciadaAidsd)dupladiscriminao:ser
velhoeestarcomAidse)Aidsessetremnotemcura.
Oncleomaiscentrala)Aidsameaaconstantedemorte.
A anlise do material discursivo possibilitou acessar informaes acerca do contedo das
representaessociaisdaAids.Dessaforma,podeseafirmarquehimagensnegativasepositivasa
respeitodaAidseconstituemelementosqueestruturamessarepresentaoerefletemumcontedo
maisnegativoquepositivo,noqualaAidsrepresentadacomoumaameaaconstantedemortees
nopiorporquenoumcncer.
AsimagensnegativasemtornodainfecopeloHIV/Aidsforam:Aidsameaaconstantede
morte;Aidsessetremnotemcura;descrenanoSistemadeSade;tratamentodifcil;depresso;
noteriaqueacontecercomigo;ossintomascomoconscinciadaAids;dupladescriminao:servelho
eestarcomAids.
Jaspositivasforam:Aidsnocncer;aexignciadesemudaremoshbitosdevida;no
prevenoanteseprevenodepois;convivnciacomaAids;disposioparafalarmais;normal,
maisumadoenadevelho.
Quandoossujeitos revelaram, emsuasfalas, teremseinfectadocomovrusHIVequea
maioriadelespassoupelodiagnstico,tratamentodifcile,nasinteraessociaissofreramomedo,
inclusivedamorte,opreconceito,adepressoeaprenderamaconvivercomaAids,provavelmente
essasrepresentaes sedoaolongodotempodeformamodificada, porque, nodecorrer desuas
vivncias, novasinformaes, conhecimentos, opinies,teorias,experinciasforampartilhadascom
outrossujeitosportadoresdeHIV/Aids, comosprofissionais,comamigoseoutraspessoasdoseu
crculosocial. Essasexperinciasmaisremotas(conhecimentoj estruturado),aoseremlembradas,
associamseecombinamseanovasinformaesrecebidasdomeioexteriorquevooriginarnovas
experincias e novas representaes sociais. A esse processo de integrao cognitiva do objeto
conhecidodenominaseancoragem(MOSCOVICI,1978).Parecequearevelaodasrepresentaes
sociaisdessessujeitossobreasexperinciasadquiriramtraosnegativosepositivos,quesetornam
conflitos interiores, podendosersalutares paraquepossahavermudanasdeconcepes, atitudes,
opinies,enfim,dasprpriasrepresentaes,asquaisserodiscutidasaseguir,emseusncleosmais
perifricos.
42
2.1.Osncleosperifricosdasrepresentaesemtornodainfecopelo
HIV
Os ncleos considerados perifricos so mais acessveis s argumentaes das outras
pessoas,scampanhaseducativas,porquenosotorgidos.Aseguirserpossvelperceberque,a
representaodequeaAidsnotemcura,apesardeserumarepresentaoforte,podesereliminada
quandoacurafordescobertaouquandoaAidsnomaissignificarmorteiminente.
2.1.1. Aidsnocncer
Esquema2Aidsnocncer
Osegundoncleo central encontradonaanlise referese idia de que a Aids no
cncer.
43
Aidstemconsolo
Poderiaserpior Jvimuitagentecomcncer,mascomAidsno
Aidstemtratamento
Aidsnocncer
Cncerpiorporquemutila,tirapedao
AidstemsadaAidsnotirapedao
Oselementosperifricosquecirculamessencleocentralso:Cncerpior,porque
mutila,tirapedao;Aidspelomenostemsada;temconsolo;notirapedao;Aidstem
tratamento,poderiaserpior;jvimuitagentecomcncer,comAidsno.
ArepresentaoqueossujeitosdapesquisafazemdaAidsseconstruiusocialmentepela
comparaoaocncer,considerandoaumaimagempositiva.Deummodogeral,asrepresentaes
dossujeitosacercadaAidsengloba,nessecontexto, imagensmiditicasecientficas.Suasfalas
revelam:
Ctemquelevantaracabeaecontinuar,porqueissonoofimdomundo,piorumCncerquetematadeumahoraproutra,n?(E1)
Euachoqueapiordoenaqueexisteocncer.(E6)
Pelomenosnumumcncer.Porqueessetremoseguinte,adoutorafalouqueseeutomarosremdiosdireitinhos,ocoquetel, eunumsaro,maistemcura.Possoviverdedezavinteanos,agorasefosseumCncer,cmexeuacabou,ocncerfatal.(E7)
Euvoufalarproc:ela(aAids)umadoenadiferente,numigualaumcncer.(E8)
Ocncervistocomoumadoenadegenerativa,quedesfiguraseusportadoresequemata,
semapelo.Mesmoemseconsiderandoque,namdiaenashistriascontadasentreaspessoas,de
quetambmaAidsmutilante,ossujeitosconhecedoresdoseudiagnstico,vivendocomAids,j
agregaraminformaeseexperinciasqueasfizeramreconstruirasimagenssobreaprpriadoena.
Porm, com relao ao cncer, mantmrepresentaes mais rgidas, negativas, que servemde
comparaocomaAids,resultandoemumaformadereconfortoparaaprpriasituao.Aliadoa
isto, h, aindauma imagemreforada, inicialmente pela mdia, dequea Aids era umadoena
estrangeira,deartistas,pessoasfamosas,dehomossexuais.Oqueestranhopertenceaooutro,que
noseparececomigo,quenoviveigualamim.Essasrepresentaeslevaramaoscomportamentos
deriscoeaopreconceitoreforadocontraoshomossexuaiseportadoresdeAids.
Aesserespeito,Costa(1992)afirmaque
j no se ouve mais dizer que a Aids um cncer gay. No entanto, opreconceito sexualpermanece. Continuaseadescreveraspossibilidades derealizao afetivosexual homoerticas como doena, anomalia, neurose,
44
perverso,incidncia,etc.Comisso,querendoouno,criamseproblemasmoraisgravesparamuitosindivduoscomessetipodeinclinaosexual,quevorefletirsenaformacomoreagemdiantedoriscodeinfecopeloHIV(COSTA,1992,p.20).
Destaforma,podeseafirmarqueossujeitosrelacionamocncercomaAids,colocandoas
numaescaladerepresentaodegravidadedasdoenas,provavelmentedevidoaofatodequea
Aidsumadoenanovaeocncerumadoenaconcretizadacomoperigosa,quemata.Assim,a
Aidssetorna,paraeles,maisaceitvelqueocncer,quetirapedaoefatal.Poroutrolado,o
cncernoenfrentaproblemascomodesvelamento,mashsempreumoutromaisdoentequeele.
Ossujeitosexpressam,destaforma,asuareaofrenteinfeco,expressandooseumecanismode
defesaaofalarquehsituaespioresqueaAids,nocaso,ocncer.
2.1.2.DescrenanoSistemadeSade
Esquema3DescrenanoSistemadeSade
45
Mdicoexaminaenoachanada
NodassistnciaadequadaNopedemexame
deHIV
DescrenanoSistemadeSade
Parareceberbenefciotemqueestaraleijado
NingumdesconfiaquevelhopodeterAids
OatoderepresentaradescrenanoSistemadeSadefoiapoiadonoseguintesistema
perifrico:mdicoexaminaenoachanada;nopedemexamedeHIV;ningumdesconfia
que velho pode ter Aids; para receber benefcio temque estar aleijado; no d assistncia
adequada.
Ainternei,depoissadohospitalecontinuavaamesmadiarriaeperdadeapetite[...]omdiconoachavanada[...]nopedianada.(E1)
Eutavadoente,doente,tododiafaziaumexamediferente,enada.(E2)
Eutivequelevartantodocumentoaquidohospital,ajuntamdicamuitorigorosa,eufiqueiumanoencostado[...] eutavamuitofraco,agoraeuestouaquipratomarsangueeesperaroresultado[...]ajuntamdicanoajuda,ssetivermorrendo.(E3)
Euestouruimfazdias,mascadqueelesresolveram?.(E4)
Precisariadarmaisassistncia.(E5)
Meuirmoficouruim,deutoxoplasmose,meningite,tuberculose,elefoienopassoulnapercia.difcil.Eutenteiarrumarumbenefcio,maspransque portadors se tiver morrendoemcimadeumacama, temqueestardeficiente.(E6)
Fuinummdico,fuinoutro,eletirouradiografia.Oremdioqueeuestavatomandoparecequeeraerrado[...]Disseramqueeraherpesequeprecisavadeotorrino.Afoiqueeufuinootorrinoeelemeindicouparaodoutorquepediuoexamedessetremqueoceisfala.Eufiqueinohospitalonzedias,eunovioexame,adotorasfalou,nomemostrou.(E7)
Sevocnocorreratrs,vocvaiadoecerevaimorrer.Igualela(amdica)explicou:avocvaichegarnumpontoquevocnovaiescapar,porqueadoenaamonta,tomaconta.Euqueriaqueamdicapassasselogo,porqueelafalou que quando eu comeasse a tomar os remdios ia melhorar tudo, iamudartudo.(E8)
Do ponto de vista da teoria das representaes sociais, no so todas as experincias
(pessoaiseprofissionais)queascompem,masaquelasqueforamganhandosentidoeimportncia
para os indivduos conforme as suas necessidades e interesses. Os sujeitos, ao narrarem suas
dificuldadesparaseremtratadosecuidados,mesmoquandonoestimuladosatal,provavelmente
expressamcontedosquepassaramporumprocessodetriagem,deorganizao,seleoecriao
deimagemarespeitodoatendimentodosprofissionaisedosServiosdeSadequeso,sobretudo,
46
negativas.Porm,considerandoqueaAidsvemsepopularizandohquaseduasdcadas,nose
justificaadesatenodestes,mesmoporque
em1997, a Coordenao Nacional das DST/Aids explicita formalmente asdiretrizes bsicas para a assistncia ao portador, publicando o manualAconselhamentoemDST,HIVeAidsDiretrizeseProcedimentosBsicosque, atentoaosdireitoshumanos,asseguraqueatestagemdevesersemprevoluntria,confidencialesigilosa.Comaexpansodaepidemia,tornaramsefundamentaistantoaampliaodaofertadatestagem(comaconselhamento)no sentido da preveno, quanto da assistncia, favorecendo o tratamentoprecoce, adiminuiodehospitalizaeseoaumentodaqualidadedevida(FERREIRA,1999,p.57).
Arepresentaodossujeitosdequeomdiconosabeoqueeletemenemoencaminha
corretamente paraa definio dodiagnstico. Formase, dessemodoumciclo vicioso, noqual
pareceseincluirofatodequeomdiconoacreditaqueoidosopossaestarinfectadocomoHIVe,
porisso,nopedeoexameimediatamentediantedosprimeirossintomas.Opacientetambmno
acreditanomdico,porquenoatendidocomogostariaounegaodaprpriacondio.Desta
forma, semseuproblemaresolvido, semcondies e nemconhecimento para resolver sozinho,
caminhaparaoagravamentodossintomas,culminando,muitasvezesnamortedosujeito.Criamse,
destamaneira,representaesdedescrenanoSistemadeSade.
Nasfalasdossujeitos,explicitamseodescasoeofatodenosecogitarodiagnsticode
HIVemidosos,almdoexcessoderigordajuntamdicaparaaliberaodaaposentadoria.
Nessesentido,valerefletirsobreaafirmaodeRamos(1992,p.84):
ArespostasocialAidsreconhecidamentederejeio,atravsdopnicoedopreconceito.Emboraodebatesobreotemajestejaamplamentedifundidopelos meios de comunicao, o que se observa nos servios de sade adesinformaoeodespreparodeseusprofissionaisparalidarcomoproblema.Estefato,associadocriseexistentenosetor,agravaasituao.
Aanlisedasfalasdosentrevistadosapontaparaasseguintesrepresentaesnoatendimento
spessoascomidadeacimade60anos,comosesegue:
a)Mdicooprofissionalquenodescobreoqueeletem,masdremdio.
Omdiconopediuexame,fuimesmopelaminhacabea,osmdicosnopedianada,fiztodotipodeexame,fuinummdico,fuinoutro.(E1)
47
Ajuntamdicanoajuda,ssetivermorrendo.(E6)
b)Psiclogoaparecesemprecomoalgumqueorienta,defende,explicaeacalma.
Apsiclogaexplicoutudo.(E1)
Eu tomoos medicamentos direitinho, s vezes eu peoajuda a psicloga
tambm.(E5)
c)Assistentesocialalgumqueouveeexplica,nafaladeumdosentrevistados:
EufuinoCais.Chegueil, falei tudocomaassistentesocial. [...] Queeuachavaqueeutavacomessetrema.Aeladisse:venhaamanhcedoquevocvaiassistirumapalestra.A,fuidemanhcedinhoassistirapalestraequandoeuviapalestrafalei:ah!tudooqueelafalounapalestraeutenhotudinho.(E1)
d)Enfermeiroeoutrosprofissionaisdaequipedeenfermagemnoaparecemnasfalasde
formaexplcita, mas relacionados aocumprimento dehorrio de mediao, na fala de umdos
entrevistados:
Eutinhaquetomaroremdiooitohoras,ontemfuitomareranovehoras.(E2)
Assim, nas falas nasquais emergiramrepresentaes sobreosprofissionais desadeno
atendimentospessoascommaisde50anosinfectadaspeloHIV,podeseafirmarqueh uma
distnciaentreoesperadopeloclienteeorealizadoporalgunsprofissionais,oquereforaoncleo
centraldedescrenanoSistemadeSade.
Nessesentido,valeriaperguntaracercadasrepresentaesquetmosprofissionaisdesade
sobreaAidsna3aidade,aprofundandooconhecimento.Aqui,podesepressupor,porexemplo,que
estestrazemavelharepresentaonaqualosidososnoseriamincludos,umarepresentaoque
correntenasociedade.Osprpriosidososacreditamqueissonoiriaacontecercomigo,porque
provavelmentealgodooutro,sobretudodosmaisjovens. Essedesacreditardoriscocomidade
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acima de 60 anos, de ambas as partes, parece ser um elemento de peso no processo de
constituiodasrepresentaessociaistantodopacientequantodoprofissionaldasade.
SegundoMagalhes (2002), oprofissional dasade temarepresentaodequeoidoso
poderterarteriosclerose,masnoAids,reforadapelavisodequeoidosonopraticasexo:
As pessoas j possuemessas informaes e h umconsenso que o idosopassardeformanaturalportodosessesprocessosatqueamortechegue.Noentanto,oquenoseesperaqueessaseqnciasejaquebradaviolentamentepelainfecodeumvrus,tipoHIV,quetrazemsuahistriaamensagemdefatalidaderpida.Almdisso,podecarregarconsigoaimagemdepuniopelaassociao ao sexo. Esperase reumatismo, arteriosclerose e no Aids(MAGALHES,2002,p.47).
Assim,fazsenecessrioreelaborarcontinuamenteotrabalhodepreveno,quetambm
da ordemde repensar o que est constitudo culturalmente, buscando ultrapassar os limites da
simples informao, construindo atividades de educao em sade que sejam eficazes para
profissionaisepopulao.
SegundoABRIC(2000),oprocessodemudanadeumarepresentaosocialpodeocorrer,
entreoutrasformas,pelaintegraoprogressivanoncleocentraldeesquemasativadospornovas
prticasparaformarumnovoncleocentral(transformaoprogressiva).Nosetrata,portanto,de
meramudanadecomportamento,masderevisaroscostumes,osconceitoseasprticasalienadas
deconscientizao.Tratasedeaesdemdioelongoprazovoltadasparaorespeitoeabuscada
sadeparaessaspessoaseasoutrastambm.
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2.1.3. Otratamentodifcil
Esquema4Otratamentodifcil
Sustentandoestencleoaparecemosseguinteselementosperifricosarespeitodotratamento:
cansativo; enjoativo; faz mal; muitos remdios; causamdepresso; dependncia; solta o
intestino.Porm,mesmosendodifcil,melhoratudo;mudatudo;aumentaotempodevida;d
paraesperaracura.
Esseparadoxovividopelosentrevistados,natentativa,semprefrgil,demanteraadesoao
tratamentomedicamentoso.Osrelatosexplicitamessasrepresentaes:
Mesmoquetomeoremdio,vaidecaindo...Seeufossemaisnovoseriaoutracoisa.(E1)
Eutrateicincoanostomandoremdiosemfalharumdia(ocoquetel).Masaelemuitoforte,temquetomarcomleite.Omiracepeumazulcompridoassim,tomeielemaisdeano.Eleseguraoestmago,maissoltaointestino.Eu
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Enjoativo
Dependncia
Soltaointestino
Melhoratudo
Aumentaotempodevida
Muitosremdios
Dparaesperaracura
Mudatudo
Causadepresso
Cansativo
Fazmal
Otratamentodifcil
tenhoumproblemamuitosrio.Eutenhoquetomarosremdioscomleite,masaquinotemleite.Omdicofalouquetenhoquetomaroitohorasdamanheoitodanoite.Ontemeufuitomaroremdioeranovehoras.(E2)
s vezes a gente temdesdedepresso, porqueoprprio medicamento, ocoquetelqueagentetomacausaessadepresso.Todososdiasterquetomarummontederemdio,ummontedecomprimidos.muitodifcil,inclusivetemmuitosportadoresquemorremporquedesistemdotratamentoporquecansativo,enjoativo,dnuseas.Agentetemqueinsistir,issooquetdandocerto.Eutomoosmedicamentosdireitinho,svezeseupeoajudaapsiclogatambm.Atqueumdiatenhacura,umavacinadetantosemtantosmeses,oualgumacoisaquecontroleessadoena,porqueassimosofrimentomenor.(E5)
svezeseuficofraca,quandoeuprodetomarosremdios.Tomomeusremdiosdireitim,maistemveizquemeddepresso.svezestlnofundodopooesubodenovo.(E6)
Esseremdionomepertence.Adoutorafalouqueseeutomarosremdiodireitinho,ocoquetel,eunumsaro,maistemcura.(E7)
Amdicadissequequandoeucomearatomaroremdiovaimelhorartudo,vaimudartudo.(E8)
Eupretendotomarosremdiosdireitinho,euqueroficarcurada.(E9)
Semundialmenteestimasequeapenas1%dototal daspessoasinfectadaspeloHIVtem
acessoaotratamentoeaosmedicamentos(TORRES,1997),mesmoessaspessoasvivemdemaneira
difcil o quotidiano do tratamento, com todos os efeitos colaterais, mesmo sabendo que os
medicamentostrouxerammelhoriaparasuasvidas,livrandoosdadecadncia.
Apesardenoaparecercommuitafreqncianafaladosentrevistados,adecadnciaum
fator importante e que est implcito na vida dos sujeitos pesquisados. A dependncia do
medicamento aparece nas falas deles pois, a Aids, acimade tudo, representa adependncia do
medicamento que dever ser tomado at o fim da vida. A idade como um complicador, a
persistnciadeefeitoscolaterais,osentimentodeimpotncia,fazemcomqueeles,muitasvezes,
queiramdesistir. Entretanto, vivemo dilema de saber que os antiretrovirais representam uma
chancedesobrevivncia.Osprpriosprofissionaisdasadecuidamdepassaressarepresentaoa
respeitodomedicamento,queasalvaoparatudo.Adoutorafalouqueseeutomarosremdio
direitinho,ocoquetel,eunumsaro,maistemcura,afirmaE7.achancedemelhoraroudeno
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morrertorpido.Destaforma,ocoquetelvistocomoumaformademelhorareprolongara
vida,fazendotolerarotratamento.
Com a chegada dos antiretrovirais, a infeco pelo HIV passou a ser encarada pelos
profissionaiscomoumadoenacrnica,emqueoinfectadotemquesesubmeteratratamentose
tomarosmedicamentostodososdias.Comisso,odiagnsticodeinfecopeloHIVdeixoudeser
consideradouma"sentenademorte".
No entanto, de acordo com o Ministrio da Sade, assim como se constatam estudos
cientficos sobre o tema, umdos maiores obstculos enfrentados pelos portadores de HIV o
preconceito;muitaspessoasdeixemdefazerosexamesparasabersetmovrus,impedindoo
comeodotratamentooumesmo