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INTRODUÇÃO
A presente pesquisa se insere no âmbito do meio ambiente cultural e da tutela
jurídica do patrimônio cultural e tem como tema - A Tutela Jurídica dos Sítios Arqueológicos
na Região Metropolitana de Manaus: Patrimônio Cultural versus Desenvolvimento Regional.
Inicia-se assim um conflito entre a proteção dos sítios arqueológicos e as obras
de desenvolvimento regional na área de estudo. De um lado o significado dos sítios
arqueológicos enquanto bem cultural, que nos remete a (pré) História Amazônica e faz
referência a memória e a identidade do povo brasileiro e amazonense, e do outro, as
necessidades atuais, moradia, saneamento básico, abastecimento de água, gasoduto, educação,
duplicação de estradas entre outros, por ocasião das grandes obras de desenvolvimento e seus
impactos ambientais.
Nesse contexto, a Administração Pública cria a Região Metropolitana de
Manaus visando interligar e desenvolver as cidades próximas da capital amazonense, entre as
quais: Careiro da Várzea, Iranduba, Itacoatiara, Manacapuru, Novo Airão, Presidente
Figueiredo e Rio Preto da Eva.
A proposta deste trabalho é verificar se há a proteção dos sítios arqueológicos
pré-históricos diante da execução das obras de desenvolvimento, uma vez que a cada dia sítios
importantes podem estar sendo destruídos, sem que possam ajudar a revelar a Histórias dos
nossos antepassados, traços do nosso patrimônio cultural de uma época anterior a escrita.
A tutela jurídica do meio ambiente está interligada à vida humana e o que a
cerca, desde seu bem-estar individual e coletivo, passando pela busca da sadia qualidade de
vida e da estrutura natural e artificial que a envolvem, os aspectos culturais que implicam na
dignidade da sua própria existência.
Diante disto, foi elaborado um sistema jurídico protetivo do meio ambiente.
Tal sistema está envolto em normas e princípios do direito ambiental, dentre os quais, a
Constituição da República, a Lei nº 6.905/98, que dispõe sobre as sanções penais e
administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, a Lei nº
3.924/61, que dispõe sobre os monumentos arqueológicos e pré-históricos, portarias e
resoluções que incorporam princípios ambientais, como o da Prevenção e o da Solidariedade
Intergeracional, entre outros, recepcionados pela Carta Magna.
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Uma das inspirações da pesquisa deu-se após a leitura da entrevista do
professor da Universidade de São Paulo, Eduardo Góes Neves ao Jornal A Crítica, na edição
do dia 17/12/20111, que tratou sobre a arqueologia e a falta de interesse do Poder Público.
Na entrevista o Prof. Eduardo Neves faz uma série de críticas e credita a falta
de interesse das autoridades, ao descaso com as pesquisas científicas pelas Universidades
locais e a falta de espaços para expor o acervo das descobertas arqueológicas. Além disso,
afirma que outros estados da Região Norte estão com perspectivas mais avançadas do que o
Amazonas e cita cursos de graduação em arqueologia no Acre, Rondônia e Pará, este último
com cursos de pós-graduação na área.
A pré-história amazônica é um tema que desperta curiosidade científica,
especialmente da Arqueologia, Antropologia e da História. Contudo, só se pode avançar no
conhecimento deste período histórico a partir dos achados e das pesquisas arqueológicas.
O Direito possui objeto de estudo e método específicos, que não se confundem
com as ciências descritas acima, contudo pode colaborar com aquelas ciências, por exemplo,
como instrumento de proteção e resguardo de sítios arqueológicos, bens culturais protegidos
pela Constituição da República no art. 20, que integram o Patrimônio Cultural Brasileiro art.
216 e que remontam nossa memória e integram nossa identidade amazônida e brasileira.
No primeiro capítulo faz-se uma síntese histórica e evolutiva do Direito
Ambiental e das concepções sobre o meio ambiente. Além disso, visando um melhor
entendimento e clareza sobre o assunto, apresenta-se uma divisão ou classificação do meio
ambiente, adotada por autores clássicos e especialistas do direito ambiental, para estudá-lo de
uma maneira didática. Em meio a esta divisão da doutrina foca-se no meio ambiente cultural e
passa-se ao patrimônio cultural brasileiro, a formação cultural amazônica e o patrimônio
cultural na região metropolitana de Manaus.
O último capítulo vai tratar da tutela arqueológica no Brasil, o conceito dos
sítios arqueológicos, os princípios relativos à tutela arqueológica no Brasil, os sítios
arqueológicos na região metropolitana de Manaus e por fim o estudo de um caso emblemático
envolvendo a destruição de sítio arqueológico em Manaus e o estudo de uma jurisprudência
envolvendo sítio arqueológico na cidade de Belém.
A metodologia aplicada foi bibliográfica, a investigação documental, com base
nas cópias de processos administrativos sobre sítios arqueológicos, obtidos através de ofício
1Pesquisador aponta que a arqueologia amazônica é ignorada pelo poder público - Disponível em:
<http://acritica.uol.com.br/amazonia/Pesquisador-arqueologia-amazonica-ignorada-publico_0_610739083.html>.
Acesso em 20 de março de 2012.
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via Coordenação do Programa de Pós-Graduação em Direito Ambiental da Universidade do
Estado do Amazonas junto ao Instituto do Patrimônio Artístico e Histórico Nacional (IPHAN)
e a consulta de sítios eletrônicos, visando assim criar o referencial teórico, a partir do qual se
baseia a presente pesquisa.
O objetivo geral desta pesquisa analisou a efetividade da legislação vigente
para a proteção dos sítios arqueológicos e a fiscalização dos órgãos competentes sobre as
obras de desenvolvimento e os impactos sobre os sítios arqueológicos na área de estudo.
Entre os objetivos específicos: a) Verificar em casos pontuais, a partir dos
processos administrativos obtidos junto ao IPHAN (Projeto Habitacional Nova Cidade, o
Paço da Liberdade, Sítio Lajes e o do resguardo do material da Usina de Balbina), a aplicação
da legislação pertinente e a fiscalização dos órgãos competentes, em particular do Instituto do
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional - IPHAN, na proteção dos sítios arqueológicos na
Região Metropolitana de Manaus e b) Identificar se após a descoberta e proteção dos sítios, há
de pronto pesquisa científica, que implica na interpretação desses achados e no desvelamento
da pré-história amazônica.
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1 SÍNTESE HISTÓRICA DO DIREITO AMBIENTAL, CONCEPÇÕES SOBRE
O MEIO AMBIENTE, SUA DIVISÃO OU CLASSIFICAÇÃO E O PATRIMÔNIO
CULTURAL BRASILEIRO
1.1 SINTESE HISTÓRICA DO DIREITO AMBIENTAL
O Direito Ambiental inicia-se de uma preocupação internacional, haja vista,
que o mundo após duas guerras mundiais, enfrentava a polarização das ideologias capitalista e
socialista e se via mergulhado na chamada “guerra fria” 2, na qual as duas potências mundiais
- os Estados Unidos da América e a então União Soviética, visavam impor suas convicções
aos demais países, uma vez que eram possuidores de arsenais nucleares, que poderiam
aniquilar a vida da face da terra.
Além disso, Soares (2003, p.45) aponta outros marcos teóricos importantes
para compreensão da matéria:
a) a abertura das discussões dos foros diplomáticos internacionais à opinião pública
internacional, por força da expressão dos meios de comunicação de massa e a
consequente valorização das teses científicas sobre os fatos relativos ao meio
ambiente;
b) a democratização das relações internacionais, com a exigência correlata da efetiva
participação da opinião pública na feitura e nos controles de aplicação dos grandes
tratados internacionais, por força da atuação dos parlamentos nacionais na
diplomacia dos Estados;
c) a situação catastrófica em que o mundo se encontra, pela possibilidade de uma
destruição maciça de grandes partes do universo, representada pela ameaça de
utilização dos engenhos bélicos fabricados por meio da utilização militar da energia
nuclear;
d) a ocorrência de catástrofes ambientais, como os acidentes de vazamentos de
grandes nuvens tóxicas ou grandes derramamentos de petróleo cru no mar,
fenômenos que fizeram recrudescer as letais experiências da poluição indiscriminada
e não localizada em um ponto geográfico, que poderia eventualmente ser controlada
por uma única autoridade estatal.
Para Soares as discussões em massa e a produção científica referente ao meio
ambiente, a democratização das relações internacionais e a participação da opinião pública na
elaboração e controle dos tratados internacionais, por força da diplomacia dos Estados o
perigo de uma guerra nuclear, aliado ao fato da ocorrência de catástrofes ambientais,
causaram preocupação com o meio ambiente no plano internacional.
2É a designação atribuída ao período histórico de disputas estratégicas e conflitos indiretos entre os Estados
Unidos e a União Soviética, disputando a hegemonia política, econômica e militar no mundo. É chamada "fria"
porque não houve uma guerra direta entre as superpotências, dada a inviabilidade da vitória em uma batalha
nuclear.
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Soares (2003, p.46) indica outros fatores tópicos que emergem o Direito
Internacional Ambiental em relação a outros ramos do Direito:
a) a questão da poluição transfronteiriça, que tomou uma dupla forma, a de águas
doces dos rios e lagos internacionais e a poluição atmosférica trazida pelas correntes
de ar, fenômenos esses que, por sua natureza, não conhecem fronteiras físicas e
políticas entre Estados; e
b) a questão da poluição crescente e desenfreada dos mares oceanos, por meio das
três formas detectadas: 1. alijamentos deliberados de refugos, em geral na forma de
óleos usados provenientes de navios (lavagens de navios e/ou seu deslastreamento)
ou de indústrias (o alijamento direto de resíduos tóxicos não recicláveis ou dos
rejeitos provenientes da mineração submarina programada, ou das plataformas de
exploração petrolífera), em níveis sem precedência na história; 2. deposição, em
suas águas, de cinzas provenientes de queima em alto-mar de rejeitos industriais; 3.
a denominada “poluição telúrica”, aquela carregada pelas águas doces, que servem
de desaguadouro dos rejeitos altamente tóxicos industriais não recicláveis (como as
ligações de emissários submarinos ou de interceptores oceânicos para esgotos
sanitários ou industriais).
A poluição transfronteiriça, a poluição atmosférica, a poluição telúrica, os
emissários submarinos entre outros, são alguns problemas apresentados por Soares e que não
conhecem limitação às fronteiras físicas e políticas entre Estados. Fatos que necessitavam de
uma imediata intervenção internacional e faz acelerar o desenvolvimento teórico e prático do
Direito Ambiental Internacional.
Segundo Bechara (2009, p.5):
[...] Prof. Guido Fernando Silva Soares assevera que desde 1960 os Estados estavam
se movimentando em favor de uma regulamentação global do meio ambiente, tendo
o Direito Internacional do Meio Ambiente conseguido sua “Certidão de Maturidade
Plena” em 1972, na Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente
Humano, realizada em Estocolmo, na Suécia, que resultou na Declaração sobre o
Meio Ambiente Humano e inspirou mais tarde a criação do Programa das Nações
Unidas para o Meio Ambiente – PNUMA.
O florescimento do Direito Internacional Ambiental está intimamente ligado
aos problemas que se manifestaram no planeta.
Soares (2003, p.53) afirma que a Declaração sobre o Meio Ambiente: “pode ser
comparada como um documento com a mesma relevância para o Direito Internacional e para
a Diplomacia dos Estados que teve a Declaração Universal dos Direitos do Homem”.
Ao aderir a uma Organização Internacional, um determinado Estado o faz
voluntariamente e por isso passa a aceitar certo número de obrigações decorrentes de seu
ingresso na entidade.
A Conferência de Estocolmo alertou para a necessidade da formulação de um
critério e princípios que pudessem ser comuns para a preservação e melhoria do meio
ambiente humano. Reuniu 113 representantes de países e centenas de organizações
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intergovernamentais e não governamentais interessadas na questão ambiental, contudo
compareceram apenas dois Chefes de Estado da Suécia e da Índia.
A Declaração concebida em Estocolmo é interessante em razão dos vários
princípios jurídicos que consagram a matéria ambiental, como por exemplo, o direito
soberano do Estado de explorar os seus próprios recursos de acordo com sua política
ambiental, a troca de informações, a cooperação internacional entre outros.
Não se pode negar a influência que as Declarações de Princípios exercem sobre
as normas jurídicas, tanto no plano internacional, quanto no plano da ordem jurídica interna.
Dentro de uma visão tradicional, a formulação jurídica comporta dois
momentos básicos: 1) aquele em que um determinado valor é reconhecido pela sociedade
como digno de proteção e 2) aquele em que as normas jurídicas intervêm para
instrumentalizar a proteção desse novo valor reconhecido.
Após 20 anos, ou seja, em junho de 1992, na cidade do Rio de Janeiro, com a
presença de representantes de 170 (cento e setenta) países, realizou-se a Conferência das
Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento, e segundo Barbieri (2005, p.13):
“a maior conferência realizada no âmbito da Organização das Nações Unidas até então”.
Da conferência do Rio 92 surgiram diversas Convenções, como a Convenção
da sobre a Diversidade Biológica3 e a Convenção sobre Mudanças Climáticas4, a Declaração
do Rio de Janeiro sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento5 e a Agenda 21.
Segundo Bechara (2005, p.6): “As declarações internacionais não tem força de
lei para os países signatários, como têm as convenções e tratados ratificados internamente.
Mesmo assim, têm força extraordinária na elaboração e aplicação das normas ambientais”.
Quanto a Agenda 21 são propostas de diretrizes, políticas e medidas a serem
realizadas pelos Estados no século XXI em prol do desenvolvimento sustentável.
Para Soares (2003, p. 66), trata-se de um instrumento de soft law: “cria
obrigações menos impositivas aos Estados (portanto, acompanhadas de sanções brandas, com
o objetivo de se tornar mais suscetíveis de adoção pelos estados).”
Segundo Varella (2004, p.60):
O direito internacional do meio ambiente é caracterizado pelo excesso de normas
não cogentes. Mesmo se um ator especial marca as suas negociações multilaterais,
3BRASIL, Decreto Legislativo nº 2, de 3 de fevereiro de 1994. Aprova o texto da Convenção sobre Diversidade
Biológica; assinada durante a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento
realizada na Cidade do Rio de Janeiro, no período de 5 a 14 de junho de 1992. Senado: 1994. 4BRASIL, Decreto Legislativo nº 1, de 3 de fevereiro de 1994. Aprova o texto da Convenção-Quadro das Nações
Unidas sobre Mudança do Clima, adotada em Nova Iorque, em 9 de maio de 1992. Senado: 1994. 5ONU. Declaração das Nações Unidas para o Meio Ambiente e Desenvolvimento. Disponível em < http://
www.onu.org.br/rio20/img/2012/01/rio92.pdf>. Acesso em 10 de março de 2014.
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as numerosas convenções internacionais são convenções-quadro, que mão criam
obrigações legais para as partes, mas apenas efeitos morais. As normas das
convenções internacionais mais importantes são apenas soft norms, que não
incorporam o jus cogens. A doutrina internacional diverge da eficiência destas
regras, sendo que uma parte da doutrina é segura do fato que a sociedade civil
organizada vai exigir o cumprimento das obrigações morais assumidas pelos
Estados. De toda a forma, não existem meios institucionais para que os outros
Estados contratantes exijam que os Estados cumpram as obrigações assumidas (...)
A construção de um direito baseado em soft norms também seus aspectos positivos.
Primeiramente, a produção dessas normas está mais assegurada, uma vez que o
consenso é mais fácil de alcançar.
Segundo Menezes (2005, p.144)
Documentos solenes derivados de foros internacionais que têm fundamento no
princípio da boa-fé, com conteúdo variável e não obrigatório, que não vinculam seus
signatários a sua observância mais que, por seu caráter e importância para o
ordenamento da sociedade global, por refletirem princípios e concepções éticas e
ideais, acabam por produzir repercussões no campo do Direito Internacional e
também para o Direito Interno dos Estados.
Varella e Menezes falam da flexibilidade das soft law ou soft norms e da não
obrigatoriedade de cumprimento, trazem conteúdos morais e éticos, embutidos em princípios
que vão aos poucos sendo adotados, gerando obrigações mais efetivas pelos países, tanto no
âmbito do Direito Internacional quanto internamente.
A partir de Estocolmo em 1972, tanto o Brasil, como a comunidade
internacional, as leis ambientais têm se tornado mais rigorosas, visando proteger o meio
ambiente e não apenas às presentes gerações, mas também para as futuras. Para Freitas (2005,
p. 239) trata-se do princípio da solidariedade intergeracional, que deve ser respeitado: “seja
porque a ética nos obriga a deixar aos nossos descendentes um mundo com os recursos
necessários a uma vida saudável, seja porque a Carta Magna o determina”.
As normas ambientais brasileiras tornaram-se mais rígidas e trouxeram
avanços legislativos. Um marco legal, isto é, uma norma que traz uma nova filosofia à defesa
do meio ambiente para o Direito Ambiental é a Lei 6.938/19816, que instituiu a Política
Nacional do Meio Ambiente, incorporando uma série de princípios reconhecidos na
Declaração de Estocolmo. Muito embora, existam leis precedentes que remontam a segunda
metade dos anos 60, tais como o Código Florestal, Lei 4.771/19657 (revogado pela Lei nº
6BRASIL, Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981. Dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins
e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras providências. 1981. 7BRASIL, Lei nº 4.771, de 15 de setembro de 1965. Institui o novo código florestal, 1965. 8BRASIL, Lei nº 12.651, 25 de maio de 2012, 2012. Dispõe sobre a proteção da vegetação nativa; altera as Leis
nos 6.938, de 31 de agosto de 1981, 9.393, de 19 de dezembro de 1996, e 11.428, de 22 de dezembro de 2006;
revoga as Leis nos 4.771, de 15 de setembro de 1965, e 7.754, de 14 de abril de 1989, e a Medida Provisória no
2.166-67, de 24 de agosto de 2001; e dá outras providências. 2012. 9BRASIL, Lei nº 5.197, de 3 de janeiro de 1967. Dispõe sobre a proteção à fauna e dá outras providências. 1967.
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12.651/20128) e a Lei de Proteção à Fauna nº 5.197/19679 e outra que precedeu a lei
considerada como marco a Lei do Zoneamento Industrial nº 6.803/198010.
Benjamin (2003, p. 17) enfatiza que foi a Lei nº 6.938/81 que deu início a fase
holística em que o meio ambiente passou a ser protegido de maneira integral: como sistema
ecológico integrado (resguardam-se as partes a partir do todo), com autonomia valorativa (é,
em si mesmo, bem jurídico) e com garantias de implementação(= facilitação do acesso a
justiça)”.
Assim, com o advento da Lei 6.938/81, segundo Benjamin (2005, p.17):
“verdadeiramente começa a proteção ambiental como tal no Brasil, indo o legislador além da
tutela dispersa, que caracterizava o modelo fragmentário até então vigente”.
Outro marco que vai influenciar todo o Sistema Jurídico Brasileiro é a Carta
Constitucional de 1988, no Capítulo VI do Meio Ambiente, com o art. 225, que inaugura e
trata o meio ambiente como direito fundamental, essencial à sadia qualidade de vida e que
deve ser mantido devidamente equilibrado, para as gerações presentes e futuras, in verbis:
Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de
uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder
Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e
futuras gerações.
§ 1º - Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público:
I - preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo
ecológico das espécies e ecossistemas;
II - preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País e
fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético;
III - definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus
componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão
permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a
integridade dos atributos que justifiquem sua proteção;
IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente
causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto
ambiental, a que se dará publicidade;
V - controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e
substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio
ambiente;
VI - promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a
conscientização pública para a preservação do meio ambiente;
10BRASIL, Lei nº 6.803, de 2 de julho de 1980. Dispõe sobre as diretrizes básicas para o zoneamento industrial
nas áreas críticas de poluição, e dá outras providências. 1980.
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VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem
em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os
animais a crueldade.
§ 2º - Aquele que explorar recursos minerais fica obrigado a recuperar o meio
ambiente degradado, de acordo com solução técnica exigida pelo órgão público
competente, na forma da lei.
§ 3º - As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os
infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas,
independentemente da obrigação de reparar os danos causados.
§ 4º - A Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o Pantanal
Mato-Grossense e a Zona Costeira são patrimônio nacional, e sua utilização far-se-á,
na forma da lei, dentro de condições que assegurem a preservação do meio
ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursos naturais.
§ 5º - São indisponíveis as terras devolutas ou arrecadadas pelos Estados, por ações
discriminatórias, necessárias à proteção dos ecossistemas naturais.
§ 6º - As usinas que operem com reator nuclear deverão ter sua localização definida
em lei federal, sem o que não poderão ser instaladas.
Além disso, o artigo 216 da Constituição da República trata sobre o Patrimônio
Cultural Brasileiro, da responsabilidade da sua proteção contra danos e ameaças, neles
incluídos como parte desse patrimônio, os sítios arqueológicos.
Destefenni (2005, p.134) relaciona meio ambiente e o princípio da dignidade
da pessoa humana: “Uma das mais evidentes e preocupantes ofensas à dignidade da pessoa
humana decorre da agressão ao meio em que o ser humano vive e em que se relaciona. Assim
sendo, o dano ambiental é uma das maiores afrontas à dignidade da pessoa humana”.
Rocha (2000, p.132) teoriza que o meio ambiente sadio é pressuposto dos
demais direitos fundamentais:
Só os que tiveram vida com qualidade e saúde poderão exercitar os demais direitos
da personalidade e políticos. Se não houver esse meio ambiente saudável, ficarão
prejudicados o direito à igualdade, à família, à moradia, ao trabalho, à intimidade e à
vida privada. E se formos a uma favela e virmos dez pessoas duma família morando
num barraco de um só cômodo, saberemos com certeza que não têm uma vida sadia,
e têm prejudicado todos os seus outros direitos. Onde está a sua saúde, sem esgoto
nem água? Que intimidade ou privacidade pode haver? Que família será esta?
A dignidade da pessoa humana está diretamente ligada com a preservação do
meio ambiente. Logo, a importância do meio ambiente equilibrado para a sadia qualidade de
vida, justifica a rigorosa legislação ambiental, que por vezes conflita com o desenvolvimento
econômico e suas atividades degradadoras, que não querem se submeter aos mecanismos de
proteção ambiental e aos princípios do desenvolvimento sustentável.
A proteção do meio ambiente passa por uma mudança de mentalidade que a
alcança todos, daí a necessidade de um novo modo de pensar, trabalhar, produzir e consumir,
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que tenha presente à conservação do equilíbrio e da qualidade ambiental, nesse sentido Nalini
(2001, p. 25) comenta:
Formar uma consciência ambiental ética, contudo, mostra-se como única alternativa
para viabilizar a vida num planeta sujeito a tantas degradações. Uma ética ambiental
que inverta a pretensiosa concepção de que a natureza é apenas meio e os objetivos
do homem o único fim. Mostra-se urgente a revitalização de valores éticos quais a
bondade e a solidariedade, com incidência também sobre a natureza.
[...] Uma ideia de felicidade fundada na posse de bens materiais e na exaltação do
próprio eu é a felicidade narcisista. Os outros apareceram numa consideração e
instrumental, possuindo valor enquanto sirvam para o desenvolvimento de minha
própria felicidade e bem-estar. Nessa visão nova, os outros são parceiros tripulantes
do planeta Terra. O ambiente é o bem comum a todos, não existindo apenas para me
satisfazer. Ele substituirá a razão narcisista pela razão ética.
Essa razão ética descrita por Nalini se contrapõe a ideia de que a natureza e o
que a rodeia servem apenas para satisfazer as necessidades humanas, que nossas ações mesmo
erradas não irão influenciar no equilíbrio e na qualidade dos bens da natureza.
É da harmonia de bens e valores, dentre eles o desenvolvimento econômico,
social e cultural e o meio ambiente ecologicamente equilibrado, que deve estar alicerçado o
modelo econômico atual.
Alguns empreendimentos, obras e atividades, contudo, não conseguem impedir
todos os impactos negativos decorrentes de sua implantação, porque esbarram principalmente
em limitações tecnológicas. Todavia, tamanha sua importância para o atendimento de
demandas básicas da coletividade, deverão ser realizados, independentes dos efeitos nocivos
gerados.
Nesse sentido, segundo Bechara (2009, p.1) a função do Direito, e mais
precisamente do Direito Ambiental, é criar e disponibilizar aos governos e à sociedade
instrumentos de mitigação e/ou eliminação dos efeitos lesivos da degradação ambiental.
Diante dos desafios gerados pelo desenvolvimento econômico e a manutenção
do equilíbrio ambiental, precisamos entender o significado do meio ambiente a partir da ótica
jurídica para da melhor forma protegê-lo.
1.2 CONCEPÇÕES SOBRE O MEIO AMBIENTE E SUA DIVISÃO OU
CLASSIFICAÇÃO
Para Fiorillo (1996, p.31) o termo “meio ambiente” continua, ainda hoje, como
sendo um conceito jurídico indeterminado e de difícil consenso entre os doutrinadores, tendo
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em vista a evolução histórica e o fato de que envolve as perspectivas teóricas daquele que o
conceitua, ou seja, sua visão de mundo e sua formação acadêmica.
Eros Roberto Grau define conceitos jurídicos indeterminados:
[...] aqueles cujos termos são ambíguos ou imprecisos – especialmente imprecisos –
razão pela qual necessitam ser completados por quem os aplique. Nesse sentido,
talvez pudéssemos referi-los como conceitos carentes de preenchimento com dados
extraídos da realidade. (GRAU, 1988, p. 72)
Para Machado (2013, p.51) a expressão “meio ambiente” seria um pleonasmo,
que os termos seriam sinônimos, embora tenha sido assim incorporada à legislação. Destoa
desse entendimento Marcelo Abelha Rodrigues (2005, p. 64), que entende ser o alcance da
expressão “mais largo e mais extenso do que o de simples ambiente”.
Silva (2007, p. 1) reconhece o pleonasmo da expressão “meio ambiente”, mas a
necessidade de reforçar o sentido significante de determinados termos, em expressões
compostas. É uma prática que deriva do fato de o termo reforçado ter sofrido enfraquecimento
no sentido de destacar, ou, então, porque sua expressividade é mais ampla ou mais difusa, de
sorte a não satisfazer mais psicologicamente a ideia que a linguagem quer expressar. Esse
fenômeno influencia o legislador, que sente a imperiosa necessidade de dar, aos textos
legislativos, a maior precisão significativa possível.
Segundo Mukai (1998, p. 3):
A expressão similar meio ambiente tem sido entendida como a interação de
elementos naturais, artificiais e culturais que propiciam o desenvolvimento
equilibrado da vida do homem, não obstante a expressão, como observam os autores
portugueses, contenha um pleonasmo, porque meio e ambiente são sinônimos.
Assim como Machado, Silva e Mukai também entende que a expressão meio
ambiente contém um pleonasmo.
No âmbito jurídico, é difícil definir meio ambiente, pois para Edis Milaré
(2003, p. 165), “o meio ambiente pertence a uma daquelas categorias cujo conteúdo é mais
facilmente intuído que definível, em virtude da riqueza e complexidade do que encerra”.
Para Mateo (1977, p. 80), a palavra ambiente corresponde à expressão inglesa
environment e à francesa environnement e que devem ser traduzidas por entorno e ainda
descreve o meio ambiente:
Una primera aproximación al concepto de ambiente nos remite a uma noción amplia
que incluye toda la problemática ecológica general y por supuesto el tema capital de
la utilización de los recursos, a disposición del hombre, en la biosfera. Esta
perspectiva globalista es a veces la adoptada en ciertos pronunciamientos realizados
en el seno de organismos internacionales. Así, en la Conferencia de Estocolmo de
1972, se afirma que ‘el hombre tiene el derecho fundamental a la libertad, la
igualdad y el disfrute de condiciones de vida adecuadas en un médio de calidad tal
que le permita llevar una vida digna y gozar de bienestar, y tiene la solemne
21
obligación de proteger y mejorar el medio para las generaciones presentes y futuras’.
(MATEO, 1977, p. 72-73).
A tradução livre da citação de Mateo:
Uma primeira abordagem do conceito de meio ambiente nos leva a uma noção
ampla, que inclui toda a problemática ecológica geral e, claro, à questão central do
uso de recursos disponíveis para o homem na biosfera. Esta perspectiva global é, às
vezes, adotada em certos pronunciamentos feitos no âmbito das organizações
internacionais. Assim, na Conferência de Estocolmo de 1972, afirma que ‘O homem
tem o direito fundamental à liberdade, à igualdade e ao desfrute de condições de
vida adequadas em um meio ambiente de qualidade tal que lhe permita levar uma
vida digna e gozar de bem-estar, tendo a solene obrigação de proteger e melhorar o
meio ambiente para as gerações presentes e futuras’. (MATEO, 1977, p. 72-73).
Segundo Édis Milaré:
Apresentam-se, para o meio ambiente, definições acadêmicas e legais, algumas de
escopo limitado, abrangendo apenas os componentes naturais, outras refletindo a
concepção mais recente, que considera o meio ambiente um sistema no qual
interagem fatores de ordem física, biológica e socioeconômica. Conjunto de todas as
condições e influências externas que afetam a vida e o desenvolvimento de um
organismo. (MILARÉ, 2011, p. 16-17).
Para Feitoza (2012, p. 32):
É destacado que não se podem conceber no conceito de meio ambiente apenas
produtos naturais, mas deve ser definido como o conjunto das condições de
existência humana, que integra e influencia o relacionamento entre os homens, sua
saúde e seu desenvolvimento.
Ou, ainda, ter-se-á como o conjunto de elementos da natureza terra, água, ar, flora, e
fauna ou criações humanas essenciais à vida de todos os seres e ao bem-estar do
homem na comunidade.
Tanto para Mateo, quanto para Milaré e Feitoza, ao se referirem ao meio
ambiente, trazem elementos que vão além da visão natural e biológica, e, chegam a uma visão
socioeconômica, em que a qualidade de vida e o bem-estar são partes integrantes deste
conceito.
Para Figueiredo (2008, p. 39) o meio ambiente é mais abrangente que a ideia
de ambiente natural/físico e artificial:
São comuns na literatura do direito ambiental as expressões meio ambiente natural e
meio ambiente artificial. Com efeito, o meio ambiente não é constituído apenas pela
biota (solo, água, ar atmosférico, fauna e flora) – o aspecto que se convencionou
chamar de meio ambiente natural – mas, também, pelo meio ambiente cultural (os
bens de natureza material e imaterial – patrimônio histórico, cultural, turístico e
paisagístico – tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à
identidade, à ação e à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade), pelo
meio ambiente construído (urbano ou rural) e pelo meio ambiente do trabalho –
aspectos do meio que poderiam ser classificados de artificiais.
Na concepção de meio ambiente deve se ter presente aspectos de outras
ciências, que levam a um conceito transdiciplinar, haja vista, as limitações e o objeto da
ciência do direito.
A definição de transdisciplinaridade segundo Leff (2001, p. 83):
22
A transdisciplinaridade pode ser definida como um processo de intercâmbio entre
diversos campos e ramos do conhecimento científico, nos quais uns transferem
métodos, conceitos, termos e inclusive corpos teóricos inteiros para outros, que são
incorporados e assimilados pela disciplina importadora, induzindo um processo
contraditório de avanço retrocesso do conhecimento, característico do
desenvolvimento das ciências.
Para Silva (2004, p. 20), o conceito de meio ambiente deve ser globalizante,
“abrangente de toda a natureza, o artificial e original, bem como os bens culturais correlatos,
compreendendo, portanto, o solo, a água, o ar, a flora, as belezas naturais, o patrimônio
histórico, artístico, turístico, paisagístico e arquitetônico”.
Para Souza Filho (2011, p.15):
O meio ambiente, entendido em toda sua plenitude e de um ponto de vista
humanista, compreende a natureza e as modificações que nela vem introduzindo o
ser humano. Assim, o meio ambiente é composto pela terra, a água, o ar, a flora e a
fauna, as edificações, as obras de arte e os elementos subjetivos e evocativos, como
a beleza da paisagem ou da passagem de seres humanos.
Souza Filho e Silva procuram, com seus conceitos, alargar e ampliar a ideia
sobre o meio ambiente, acrescentando o patrimônio histórico, artístico, turístico, paisagístico e
arquitetônico, as edificações, obras de arte e elementos subjetivos como a beleza, a memória
entre outros.
Tanto para Rodrigues, quanto para Fiorillo (2007, p.20) pode-se dividir ou
classificar o meio ambiente de maneira didática, em meio ambiente natural; meio ambiente
artificial; meio ambiente cultural e meio ambiente do trabalho:
A divisão do meio ambiente em aspectos que o compõem busca facilitar a
identificação da atividade degradante e do bem imediatamente agredido. Não se
pode perder de vista que o direito ambiental tem como objeto maior tutelar a vida
saudável, de modo que a classificação apenas identifica o aspecto do meio ambiente
em que valores maiores foram aviltados. E com isso encontramos pelo menos quatro
significativos aspectos: meio ambiente natural, artificial, cultural e do trabalho.
O Supremo Tribunal Federal adotou esta mesma classificação, como se verifica
no voto do Relator Ministro Celso de Mello, em matéria de cunho ambiental abordada no
acórdão proferido nos autos da Ação Direta de Inconstitucionalidade, Medida Cautelar nº
3540/Distrito Federal:
A incolumidade do meio ambiente não pode ser comprometida por interesses
empresariais nem ficar dependente de motivações de índole meramente econômica,
ainda mais se se tiver presente que a atividade econômica, considerada a disciplina
constitucional que a rege, está subordinada, dentre outros princípios gerais, àquele
que privilegia a ‘defesa do meio ambiente’ (CF, art. 170, VI), que traduz conceito
amplo e abrangente das noções de meio ambiente natural, de meio ambiente cultural,
de meio ambiente artificial (espaço urbano) e de meio ambiente laboral [...]
(BRASIL, 2005).
A decisão invoca princípios constitucionais positivados que devem estar
presentes no ramo da atividade econômica para defender e proteger o meio ambiente.
23
Segundo Silva (2007, p.28):
[...] a ação humana destruidora do meio ambiente natural manifesta-se de várias
maneiras entre as quais: a) o desmatamento; b) a poluição; c) a degradação do solo e
d) o poluidor e poluente. Contudo, na contramão desses eventos, fez-se despertar
uma consciência ecológica ou ambientalista por toda a parte, às vezes até com certo
exagero, nascendo assim à necessidade da proteção jurídica do meio ambiente,
visando equilíbrio e a tentativa de se compatibilizar o desenvolvimento econômico e
a sadia qualidade de vida de uma maneira que não haja uma modificação importante
dos elementos básicos da Natureza, nela inclusa, quase imperceptível, os bens e
elementos culturais.
Silva não inclui expressamente que os impactos das obras de desenvolvimento
de uma região, como obras de infraestrutura, sejam elementos de destruição do meio
ambiente. Sabe-se que toda obra deveria passar por um processo de Licenciamento Ambiental
e ser precedida pelo estudo prévio de impacto ambiental (EIA) e o seu relatório de impacto
ambiental (RIMA) nos termos da Constituição.
O interesse coletivo, comunitário tem graduações e especificidades que variam
com o tempo e no espaço. Na preservação do meio ambiente e do patrimônio cultural, esse
choque de interesses é constante, tendo em vista a existência de um interesse público local,
municipal, estadual, regional, federal e por fim internacional, assim como a possibilidade de
ocorrência de contradições no seio de uma mesma comunidade.
Segundo Souza Filho (2005, p.33):
É claro que o interesse coletivo, comunitário, fica dividido entre a necessidade de
preservação e a possibilidade de melhoria do nível econômico, quando este se torna
uma promessa de muitas vantagens, nem sempre realizáveis, e, na maioria das vezes,
apenas estimulada por interesses econômicos individuais e inconfessáveis.
O conflito entre as necessidades de preservação do meio ambiente e a
necessidade de melhorias para a comunidade, são superadas pela oferta em curto prazo de
benfeitorias que nem sempre trazem os benefícios oferecidos e desejados.
1.3 O PATRIMÔNIO CULTURAL BRASILEIRO
A Constituição da República11 de 1988 define patrimônio cultural brasileiro
como: "os bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto,
portadores de referencia à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da
sociedade brasileira...", incluindo-se entre outros, "os conjuntos urbanos e sítios de valor
histórico, artístico, paisagístico, arqueológico, paleontológico, ecológico e científico",
conforme o art. 216 da Constituição Federal, in verbis:
11BRASIL, Constituição da República Federativa do. Brasília: Senado, 1988.
24
Art. 216. Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material e
imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à
identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade
brasileira, nos quais se incluem:
I - as formas de expressão;
II - os modos de criar, fazer e viver;
III - as criações científicas, artísticas e tecnológicas;
IV - as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados às
manifestações artístico-culturais;
V - os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico,
arqueológico, paleontológico, ecológico e científico.
§ 1º - O Poder Público, com a colaboração da comunidade, promoverá e protegerá o
patrimônio cultural brasileiro, por meio de inventários, registros, vigilância,
tombamento e desapropriação, e de outras formas de acautelamento e preservação.
§ 2º - Cabem à administração pública, na forma da lei, a gestão da documentação
governamental e as providências para franquear sua consulta a quantos dela
necessitem
§ 3º - A lei estabelecerá incentivos para a produção e o conhecimento de bens e
valores culturais.
§ 4º - Os danos e ameaças ao patrimônio cultural serão punidos, na forma da lei.
§ 5º - Ficam tombados todos os documentos e os sítios detentores de reminiscências
históricas dos antigos quilombos.
§ 6 º É facultado aos Estados e ao Distrito Federal vincular a fundo estadual de
fomento à cultura até cinco décimos por cento de sua receita tributária líquida, para
o financiamento de programas e projetos culturais, vedada a aplicação desses
recursos no pagamento de:
I - despesas com pessoal e encargos sociais;
II - serviço da dívida;
III - qualquer outra despesa corrente não vinculada diretamente aos investimentos ou
ações apoiados.
Na Constituição Federal de 1988 percebe-se a intenção do legislador
constituinte em ressaltar a importância da proteção do patrimônio cultural nacional, indicando
a obrigação estatal em garantir o pleno exercício dos direitos culturais, bem como, garantir o
acesso às fontes da cultura nacional.
Pelo disposto no artigo 216, parágrafo 1º da Constituição Federal, pode-se
compreender que o Poder Público levará em consideração o entendimento comunitário do que
seja importante para a preservação do patrimônio cultural. O referido artigo indica que a
política de preservação do patrimônio cultural deve ser democrática, participativa e aberta a
25
todos os setores sociais que através de mecanismos de proteção terá a sua memória individual
protegida pela preservação da memória plural.
A participação da comunidade nos atos de proteção do patrimônio cultural
pode ocorrer por duas formas: a) a primeira, pela participação da comunidade organizada nos
conselhos de cultura e nos organismos que decidem os objetos material ou imaterial a serem
preservados e b) a segunda é traduzida pela utilização de mecanismos legais, tais como a ação
popular para coibir os atos políticos que ponham em riscos os valores de importância cultural
definido pela coletividade.
Já o art. 216, inciso V da Constituição Federal trata entre outros assuntos dos
sítios arqueológicos que compõem o patrimônio cultural brasileiro, sendo em si elementos
que mostram os vestígios dos grupos formadores da sociedade brasileira e que evocam um
período pretérito, pré-histórico, haja vista a ausência de escrita ou pré-colonial, posto que
trazem à memória um período que antecede a chegada do colonizador europeu.
São demonstrações desse patrimônio a produção de cerâmicas, de artefatos de
pedra, depósitos de restos de comidas, urnas funerárias, que mesmo sem a escrita podem
relatar maneiras de fazer, cerimônias, o modo de vida, cuja interpretação arqueológica pode
trazer muitas informações sobre este período.
Segundo Souza Filho (2011, p. 15):
A cultura, no amplo conceito antropológico, é o elemento identificador das
sociedades humanas e engloba tanto a língua na qual o povo se comunica, conta suas
história e faz poemas, como a forma prepara seus alimentos, o modo como se veste e
as edificações que lhe servem de teto, como as suas crenças, sua religião, o saber e o
saber fazer as coisas, seu direito. Os instrumentos de trabalho, as armas e as técnicas
agrícolas são resultado da cultura de um povo, tanto quanto lendas, adornos e
canções.
Segundo Souza Filho a cultura é elemento de identificação das sociedades
humanas e envolve sua vida, suas crenças, lendas, religião entre outros.
A Lei nº 3.924 de 26 de julho de 1961, determina que todos os tipos de
vestígios arqueológicos (sítios, restos da cultura material, estrutura de alteração da paisagem),
representam indícios de culturas passadas devem ser protegidos através do tombamento.
Decreto-lei nº 25, de 30 de novembro de 1937, que entre outras medidas
institui o instrumento do tombamento, define em seu artigo 1º o conceito de Patrimônio
Histórico e Artístico Nacional:
Art. 1º Constitui o patrimônio histórico e artístico nacional o conjunto dos bens
móveis e imóveis existentes no País e cuja conservação seja de interesse público,
quer por sua vinculação a fatos memoráveis da história do Brasil, quer por seu
excepcional valor arqueológico ou etnográfico, bibliográfico ou artístico.
26
§ 1º Os bens a que se refere o presente artigo só serão considerados parte integrante
do patrimônio histórico o artístico nacional, depois de inscritos separada ou
agrupadamente num dos quatro Livros do Tombo, de que trata o art. 4º desta lei.
De 1937 a 1988, são passados 51 anos, período em que o País sofreu intensas e
velozes mudanças, transformando-se de uma estrutura rural para uma estrutura urbana. A
denominação Patrimônio Histórico e Artístico é substituída por Patrimônio Cultural. O
conceito é assim ampliado de maneira a incluir as contribuições dos diferentes grupos
formadores da sociedade brasileira. Essa mudança incorpora o conceito de referência cultural
e significa uma ampliação importante dos bens passíveis de reconhecimento.
Segundo Primo (1999, p. 207), a Declaração de Caracas de 1992, definiu
patrimônio cultural: “O Patrimônio Cultural de uma nação, de uma região ou de uma
comunidade é composto de todas as expressões materiais e espirituais que lhe constituem,
incluindo o meio ambiente natural".
A ideia de Patrimônio não existe isolada, ela só existe em relação a alguma
coisa. O Patrimônio Histórico é importante para a compreensão da identidade histórica, para
que os seus bens não se desarmonizem ou desequilibrem, e para manter vivos os usos e
costumes populares de uma determinada sociedade.
A principal característica de um patrimônio é que a sua conservação seja de
interesse público, quer por sua vinculação a fatos memoráveis da história do lugar e de seu
povo, quer por seu excepcional valor arqueológico, etnográfico, bibliográfico ou artístico.
Quando se analisa de maneira geral o Patrimônio Cultural do Brasil, leva-se em
consideração a influência Européia com predominância portuguesa, mas com influências
holandesa, francesa, espanhola entre outras, que estão, por exemplo, presentes na arquitetura
(igrejas, fortes, pontes, casas e prédios), religião, comidas, costumes; a influência africana
trazida pelos escravos que nos trouxeram sua força de trabalho, religião, comidas, costumes,
danças entre outras e por fim a influência indígena com seus valores, hábitos, comidas etc.
A miscigenação do português com o índio e depois com o negro, as invasões
holandesas e francesas, o domínio da Coroa espanhola e, mais tarde, a imigração,
principalmente italiana, alemã e japonesa, caldeiam culturas diversas para a formação da etnia
brasileira. Em conjunção com as diferentes condições ambientais, essa mistura cultural resulta
na diversidade de técnicas e agenciamento dos espaços, tanto urbanos como edificados, o que
lhe confere, em todos os períodos, uma identidade própria e um tratamento original, que a
distingue.
27
A ocupação do território se deu ao longo da costa, pela extração da madeira e o
cultivo da cana-de-açúcar, e de acordo com as limitações impostas pelo Tratado de
Tordesilhas. Em direção ao interior, a penetração foi motivada principalmente pelo
aprisionamento de índios, em São Paulo, pela criação de gado, na Bahia, pela mineração, em
São Paulo, Minas Gerais, Goiás, Mato Grosso e Bahia (Serra de Jacobina e Chapada
Diamantina), pela catequese e ação "civilizatória" dos missionários e pela intenção de
conquista de território, tanto ao Sul como ao Norte. Deste processo resultaram grandes
núcleos ilhados, divorciados entre si, no Norte, Nordeste, Centro-Oeste, Centro-Sul e Sul, que
somente irão se integrar efetivamente, física e culturalmente, no século XX, com a construção
de Brasília, a política de abertura de estradas e o desenvolvimento dos meios de comunicação.
No período colonial, este isolamento potencializou a identidade regional,
marcando todas as manifestações culturais. De modo geral, apesar de manterem uma matriz
cultural comum, quanto mais afastadas da costa e, portanto, menos diretamente afetadas pela
influência européia, maior originalidade estas manifestações apresentam. Por outro lado, o
descompasso na ocupação e desenvolvimento das regiões ocasionou a concomitância de
estilos e técnicas primitivas com outros da mais atualizada contemporaneidade.
1.3.1 Bens Culturais
Segundo a Constituição da República do Brasil de 1988 no seu Art. 216, caput
e incisos, temos de maneira clara a definição de Patrimônio Cultural como sendo constituído
pelos bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto,
portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da
sociedade brasileira, nos quais se incluem: I – formas de expressão; II – os modos de criar,
fazer e viver; III – as criações científicas, artísticas e tecnológicas; IV – as obras objetos,
documentos edificações e demais espaços destinados às manifestações artístico-culturais e V
– os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico, arqueológico,
paleontológico, ecológico e científico.
Souza Filho (2011, p. 21) referindo-se aos bens culturais:
A preservação do meio ambiente, natural e cultural, não pode ser global, porque isto
implicaria impedir qualquer intervenção antrópica modificativa do meio ambiente e
manteria estático o processo cultural. Preservar toda intervenção cultural humana na
natureza ou toda manifestação cultural é um absurdo e uma contradição, porque a
guisa de proteger as manifestações passadas, se estaria impedindo que a cultura
continuasse a se manifestar. Implicaria não admitir qualquer possibilidade de
mudança, processo ou desenvolvimento. Assim como preservar intocado o meio
ambiente natural, seria matar a vida. Se fossem preservadas intactas todas as
28
intervenções humanas, não haveria possibilidade de evolução ou desenvolvimento
social
O processo cultural é dinâmico e segundo Souza Filho não é possível proteger
todas as manifestações culturais, pois isto impediria o processo cultural, que é dinâmico e está
em constante evolução.
Para Souza Filho (2011, p. 35) dentre os bens socioambientais destacam-se os
culturais, ou históricos, artísticos, arqueológicos, etnográficos, paisagísticos, bibliográficos.
Segundo o autor esses bens individualizados formam um conjunto que é o patrimônio
cultural, do Município, do Estado, da Nação ou da Humanidade.
A proteção de um bem cultural inicia-se por sua individualização, para que ele
possa ser exatamente localizado, conhecido e reconhecido como bem cultural preservável. Ao
ser individualizado o bem jurídico, ganha status de cultural, ou históricos, artísticos,
arqueológicos, etnográficos, paisagísticos, bibliográficos. É modificada sua essência jurídica
que passa a ter relevância.
Nos termos da Constituição Federal, bem cultural é aquele bem jurídico, que é
objeto de direito e está protegido por ser representativo ou evocativo de uma expressão
cultural relevante. Embora seja agregada uma qualidade jurídica modificadora, sua
propriedade não é alterada. Esses bens são gravados por um especial interesse público.
1.3.1.1 Bens culturais públicos e privados
Para Souza Filho (2011, p. 36) os bens culturais podem ser públicos ou
privados, quer dizer, a qualidade de cultural agregada a um bem jurídico não altera a sua
dominialidade.
A qualidade de bem cultural está na sua essência e não na sua propriedade,
logo a divisão entre bem público ou privado é irrelevante para o conceito de em cultural
No sistema jurídico brasileiro os bens podem ser públicos e privados, o sistema
considera esta uma dicotomia perfeita, pois a duas categorias opostas juntas, compreendem
todos os bens e nenhum bem é ao mesmo tempo público e privado. Daí estarem surgindo uma
nova categoria de bens, que alguns autores chamam de bens de interesse público, ao mesmo
tempo em que a cidadania passa a ter direitos em relação ao bem cultural, como a
visualização, a informação e o direito a exigir da Administração a sua manutenção e
conservação, também tem obrigações de proteção em relação a tais bens, sob pena de crime
quaisquer agressões ao bem cometidas.
29
1.3.1.2 Bens culturais tangíveis e intangíveis
São bens culturais tangíveis aqueles que por terem materialidade podem ser
tocados. São os elementos mais visíveis do patrimônio cultural. Compostos dos bens imóveis
os monumentos, edifícios, casarões, lugares arqueológicos, conjuntos históricos, paisagísticos,
e elementos naturais com árvores, espeleológico como as grutas, lagos, montanhas e outros
que podem encarnar tradições culturais. A esses podemos acrescentar bens móveis que
englobam obras de artes de qualquer tipo e qualquer material, objetos de interesse
arqueológico, os que refletem técnicas talvez desaparecidas e os objetos da vida cotidiana,
como utensílios e o vestuário.
São bens culturais intangíveis, por sua vez, aqueles que têm uma existência
imaterial. Exemplos: literatura, teorias cientificas e filosóficas, os ritos e as músicas, assim
como os padrões de comportamento e culturais, que se expressam nas técnicas, na história
oral, na música e na dança.
1.3.1.3 Bens culturais móveis e imóveis
Os bens culturais podem ser móveis ou imóveis. Os órgãos e as políticas de
preservação dos bens culturais têm tido forte tendência à proteção de bens imóveis.
Para Souza Filho o Decreto Lei nº 2512, de 30 de novembro de 1937, que
organiza a proteção do patrimônio histórico e artístico nacional, tem uma percepção de
proteção ambiental urbanística, do ponto de vista arquitetônico. Tal visão, talvez tenha
influenciado a maior parte dos trabalhos teóricos sobre preservação de bens culturais se
encontre no Direito Urbanístico.
Os bens culturais móveis que são testemunhos de valor histórico, como
documentos; de valor estético, como obras de arte, que representam, evocam ou identificam
uma cultura, tanto quanto os bens imóveis.
Segundo Souza Filho (2011, p. 37) [...] É recente a preocupação do Poder
Público com os bens culturais móveis, sendo que a legislação brasileira pouco aduz e a
estrangeira não é farta em dispositivos protetores a estes bens.
12Decreto-Lei nº 25 de 30 de novembro de 1937, organiza a proteção do patrimônio histórico e artístico nacional,
publicado no D.O.U. 6 de dezembro de 1937.
30
Sabe-se que o controle sobre os bens móveis é muito mais difícil do que sobre
os imóveis. O Poder Público deve ter muita cautela ao tombar esta categoria de bens, pois não
somente deve ficar assegurada sua incolumidade, como também sua localização.
Ao contrário de outros bens ambientais e culturais passíveis de recuperação, os
danos ao patrimônio arqueológico são irreversíveis. Uma das únicas alternativas para a
preservação e proteção desses bens é a efetividade da legislação.
Para Souza Filho (2011, p. 38) um problema de monta
é o tombamento de bens móveis pelos Municípios e Estados, principalmente Municípios,
porque, por serem móveis, os bens de propriedade particular podem sair do município sem
conhecimento das autoridades locais.
A saída de bens tombados do município pode gerar ação judicial, desde que o
Município de origem saiba o destino final do bem, e assim mesmo, para ser comunicado de
sua localização
1.3.1.4 Bens Culturais materiais e imateriais
A preocupação com os bens materiais advém de um contexto de necessidades
econômicas e interesses sociais, que se mostravam necessários a sobrevivência dos meios
urbano e rural.
Apesar de constar no texto constitucional desde a década de 30, através do
instrumento de sua proteção (o tombamento), até hoje a tutela desses bens carece de
efetividade, devido aos instrumentos protetivos pouco rígidos e eficazes, assim como se
mostram os mecanismos de proteção. Nesse sentido, critica a autora Soares ao acrescentar um
problema na efetividade na proteção desses bens na enumeração constitucional dos bens
materiais inclusos no rol de bens do patrimônio cultural, que não fornece clara indicação da
vinculação destes bens à identidade, à ação ou à memória dos grupos formadores da sociedade
brasileira, de importância evidente, uma vez que a referencialidade é condição para indicação
dos bens que merecem tutela.
Os bens culturais imateriais integram o patrimônio intangível, são aqueles
responsáveis por uma compreensão mais ampla e completa de patrimônio cultural, uma vez
que não basta o suporte material, tendo que haver o sentido, ou seja, o valor que caracteriza
justamente o bem como cultural.
31
É por esse motivo que o bem imaterial está ligado aos direitos culturais que
possuem esses valores que fazem referência à identidade, à memória, e a formação da
sociedade brasileira. Valor este intertemporal e unificador uma vez que penetrados no
cotidiano daquela sociedade merecem proteção por incluírem elementos qualificados para sua
fruição e compreensão da via humana.
1.3.1.5 Bens culturais fungíveis e infungíveis
Segundo o Código Civil Brasileiro, artigo 85, são fungíveis “os móveis que
podem substituir-se por outros da mesma espécie, quantidade e qualidade”, logo os bens
infungíveis são os que não podem.
Os bens culturais adquirem a natureza infungível. O conceito de fungibilidade
é antagônico ao conceito de preservação. Se a lei exige a preservação dos bens culturais, eles
se tornam, intangíveis.
1.3.1.6 Bens Socioambientais
Segundo Souza Filho (2005, p. 21-23) esses bens também podem ser chamados
de bens de interesse público, e nos diz que quando uma coisa, um bem, entra no mundo
jurídico, passa a ter relevância jurídica e adquire a natureza jurídica de público ou privado. Os
bens ambientais, porém, independentemente de serem públicos ou privados, revestem-se de
um interesse que os faz terem uma caráter público diferente. O interesse público é, neste caso,
o reconhecimento coletivo de que o bem cultural deve ser preservado e não transforma estes
bens em bens públicos, porque grande parte do patrimônio cultural e natural do Brasil se
encontra sob a propriedade privada, não havendo nem interesse, nem condições financeiras
de, a cada declaração do valor cultural, o Poder Público promover a desapropriação para
transformá-lo em públicos.
Esta nova relação de direito entre os bens de interesse cultural ou natural com o
Estado e os particulares gera uma nova categoria de bens que o citado autor denomina de bens
de interesse público ou socioambientais, que não se reduz apenas a uma especial vigilância,
controle ou exercício do poder de polícia da administração sobre o bem, mas é algo muito
mais profundo e incide no seu núcleo ou essência.
32
Ao tempo em que a cidadania passa a ter direitos em relação ao bem cultural,
como a visualização, a informação e o direito a exigir da administração a sua manutenção e
conservação, passa a ter obrigação em relação a ele, que estão ligadas a sua proteção,
constituindo crime qualquer agressão cometida.
Sobre esses bens nasce um novo direito, que se sobrepõe ao antigo direito
individual já existente.
1.4- A Formação Cultural da Pré-História Amazônica
O patrimônio cultural amazônico é rico em biodiversidade e sociodiversidade.
Segundo Callado (1999, p.15) no entendimento da maioria dos historiadores o
homem americano não é autóctone, isto é, não é nativo do nosso continente.
Partindo da teoria mais aceita entre os historiadores sobre a presença humana
na Amazônia, segundo Fonseca (2011, p.57) a ocupação da Amazônia se deu por volta de 12
mil anos, vindo da América do Norte, aonde chegou após cruzar o estreito de Behring. As
migrações vieram da América do Norte em direção ao sul e passaram pelo Istmo do Panamá e
entraram na América do Sul pelo território da atual Colômbia.
A Arqueologia tradicional, segundo Callado (1999, p.15) levanta a hipótese do
homem americano ter migrado há 13 mil anos, vindo da Ásia via América do Norte, contudo
estudos liderados pela arqueóloga Niède Guidon no Nordeste brasileiro, na região de São
Raimundo Nonato, no Piauí, foram encontrados os vestígios (fragmentos cerâmicos,
instrumentos de pedra como machado, facas e raspadores) mais antigos da presença humana
no continente americano, que remontam 48 mil anos.
Para Meggers (1979, p.23):
[…] Quer tenha chegado há 12.000 ou há 40.000 anos atrás, o fato é que o homem
entrou no Novo Mundo enquanto estava ainda subsistindo à base de plantas e
animais selvagens. É tido como certo que ele entrou a pé, provavelmente numa
época em que a água do mar, retida nos glaciares, deixava uma conexão terrestre
entre a Sibéria e o Alasca. Essa situação ocorreu sempre que o nível baixava cerca
de 50 metros, situação que prevaleceu durante, pelo menos dois longos intervalos
nos últimos 50.000 anos.
Segundo Meggers, um evento glacial que congelou a água do mar, com seu
nível baixando cerca de 50 (cinquenta) metros e criou uma passagem entre a Sibéria e o
Alasca, permitindo a chegada do homem ao Novo Mundo, numa data ainda imprecisa entre
12 mil e 40 mil anos.
33
Esses grupos já trouxeram consigo uma cultura e aqui chegando a
enriqueceram com a exuberância de fauna e flora desta região dos rios caudalosos, isto é,
criaram uma nova cultura a partir da biodiversidade. Além disso, por sua característica
nômade de caçador/coletor diversos grupos humanos se formaram ao longo do estado do
Amazonas, indo além das fronteiras nacionais, tendo o Estado do Amazonas até hoje a maior
concentração de tribos indígenas do Brasil.
Segundo Meggers (1979, p. 19):
[…] Mas se penetrarmos além das aparências, torna-se claro que a civilização
moderna seria diferente sem as descobertas dos índios americanos. A borracha, um
ingrediente crucial em milhares de inventos, desde os aviões supersônicos até os
pneus, é uma planta do Novo Mundo. O fumo, que traz satisfação para pessoas de
quase todas as partes, foi domesticado nas Américas. O chocolate, um dos doces mais
populares do mundo, era uma bebida Asteca. O milho (cereal), em centenas de
variedades, é a base econômica de milhões de pessoas e a fonte alimentar de outros
milhões, desde os fabricantes de cereais e produtores de ração animal, até os
vendedores de pipoca no circo. A batata tornou-se tão importante na Inglaterra que se
chama “batata inglesa”, embora fosse domesticada nos Andes. Castanhas e
amendoins, abacates e abacaxis, feijões, abóboras, batas-doce, mandiocas, tomates e
pimentões estão entre algumas das plantas americanas incorporadas à dieta alimentar
em todas as partes do mundo. Milhares devem sua saúde e mesmo suas vidas à
quinina e à cocaína, que foram descobertas pelo indígena sul-americano. A lista
poderia ser ampliada para incluir fibras, jogos, peças do mobiliário e vestimentas,
todos os quais foram tão completamente integrados à civilização moderna que
chegamos a esquecer de que não fazem parte da nossa herança do Velho Mundo.
A autora destaca a influência positiva da cultura dos povos americanos na
civilização moderna com os diversos produtos por eles descobertos, entre os quais: a
borracha, o fumo, tomates, feijões, batatas, pimentões, milhos, chocolate entre outros.
Na sua obra Pontes Filho (2011, p.39) relata as dificuldades de datar o
surgimento das culturas pré-históricas na América do Sul, especialmente na Amazônia, pela
escassez de pesquisas científicas sobre a pré-história na região: “[...] deve-se considerar a
situação crítica dos vestígios em nossa região, uma vez que, sendo a maioria constituídos de
pedras, madeiras, ossos, penas entre outros, foram se decompondo ao longo do tempo”.
Para Meggers (1979, p. 18):
[…] O novo mundo é um laboratório antropológico único, pois o processo de
desenvolvimento cultural aborígene processou-se num quase isolamento, antes que
ocorresse uma parada repentina com o fluxo de soldados europeus, sacerdotes,
exploradores e colonizadores, após 1492.
Meggers trata o continente americano como um laboratório antropológico
único, pois o desenvolvimento cultural dos povos indígenas só foi interrompido, com a
chegada do explorador e colonizador europeus.
34
Pontes Filho (2011, p.39) a complexidade e interdisciplinaridade dos: “[...]
vários ramos do saber científico, tais como: a Antropologia, a História, a Arqueologia, a
Etnologia, a Etnolinguística e outros”. Ainda segundo Pontes Filho (2011, p.39):
[...] em face das descobertas arqueológicas foi possível registrar 8.562 sítios
arqueológicos no Brasil, de acordo com dados do Instituto do Patrimônio Histórico e
Artístico Nacional (IPHAN), dentre os quais destaca-se o da Pedra Furada (PI) e o
da Pedra Pintada (PA).
No sítio arqueológico de Pedra Furada (PI), localizado em 1981 pela arqueóloga
brasileira Niéde Guidon, encontrou-se restos de alimentos e carvão com datação de
48 mil anos .
Na caverna da Pedra Pintada (PA), a arqueóloga americana Anna Roosevelt
descobriu, em 1991, pinturas rupestres datadas com mais de 11 mil anos e, em 1995,
expôs sítios cerâmicos na Amazônia com mais de 9 mil anos.
Esses achados possibilitaram aos cientistas sustentar que, desde o final do
pleistoceno, por volta de 12 mil anos, a bacia amazônica já era ocupada por grupos
de caçadores coletores e, com isso, tentar reconstituir, hipoteticamente, fases da
ocupação desta região.
Estes achados levaram a arqueóloga Anna Roosevelt a traçar hipoteticamente
uma sequência de desenvolvimento da ocupação humana pré-histórica da Amazônia, segundo
Pontes Filho (2011, p. 39-40) nas seguintes fases:
Paleoindígena no Pleistoceno (11.200 a 8.500 a.C.): os caçadores-coletores - No
final dessa época geológica, que coincide com o gradual desfecho das glaciações, a
região teria sido ocupada por caçadores-coletores nômades, em adaptação ao
ambiente americano, dispersos pelas áreas de várzea e de terra firme. Esses grupos
viviam de coleta de moluscos, de plantas e da caça de pequenas espécies da fauna
amazônica. Habitavam em grutas e cavernas. Vestígios dessa fase cultural são
artefatos em pedra lascada.
Arcaica no Holoceno (7.500 a 1.000 a.C): horticultores e pré-ceramistas - Nas
várzeas, há vestígios de ocupação semi-sedentária e sedentária, evidenciada na
prática de horticultura de raízes e na produção de uma cerâmica simples. Houve
especialização da caça e da pesca, bem como domesticação de plantas e de animais.
Sambaquis e artefatos de pedra lascada são evidencias dessa fase de ocupação pré-
histórica da Amazônia. Verifique-se ainda, que há um período de mil anos de
transição entre esta fase e a fase anterior (Paleoindígena).
Pré-História Tardia (1.000 a.C a 1.000 d.C) ou Período Formativo: os cacicados
complexos - Formam-se populosas sociedades de culturas mais complexas,
hierarquizadas com chefias e cacicados, nas quais se verifica a construção de
grandes aterros para instalar aldeias, seja para se proteger de enchentes seja para
enterrar os mortos, e a produção de cerâmicas cerimoniais e funerárias,
policromáticas e ricamente decoradas. Economia estruturada na agricultura com
produção em larga escala (mandioca, milho, sementes), sendo a caça e a pesca
atividades complementares.
Nesse período que vai de 11.200 anos a.C. até 1.000 d.C. as populações que
ocupavam a Amazônia, segundo os dados da Arqueóloga Anna Roosevelt passaram por três
períodos. Inicialmente nômades, eram caçadores-coletores, habitavam grutas e cavernas e
utilizavam artefatos de pedra lascada; em seguida houve uma transição de nômades para
sedentários, tornaram-se horticultores e começaram a produzir uma cerâmica mais simples e
artefatos de pedra lascada, sambaquis também marcam essa fase e por fim os cacicados
35
complexos hierarquizados, organização social e política, marcados pela produção de
cerâmicas mais elaboradas e cerimoniais e com uma economia baseada na agricultura
ocupando grandes áreas.
Para Pontes Filho (2011, p. 40):
Segundo Anna Roosevelt, o ápice da ocupação nativa na região deu-se entre os
séculos V e XV estando às várzeas, na maior parte de sua extensão, inteiramente
tomadas por assentamentos humanos, o que contradiz a ideia de pobreza ambiental.
Nesse contexto a partir do século XV, processou-se o encontro entre o velho
(Europa) e o novo mundo (América), que resultou na extinção dos cacicados
complexos do ocidente amazônico.
Pontes Filho (2011, p. 40-41) apresenta outra hipótese baseada nos estudos da
professora Adélia Engrácia, que sustenta que no vale amazônico, os vestígios de ocupação por
caçadores-coletores e povos especializados em coletas de mariscos e pescas até a chegada do
europeu, datam-se entre 10.000 a.C. a 1.500 d.C.:
Há 8.000 a.C. ou mais - A Amazônia é fria e seca, após o degelo da era glacial,
possuindo grande volume de água represada e vegetação rasteira. Os homens vivem
da caça de animais e da coleta de frutos e raízes, morando no relento ou em
cavernas.
Entre 8.000 e 3.000 a.C. - Com o aquecimento do clima, as chuvas e a umidade
tornam-se freqüentes, permitindo que a floresta se desenvolva. O homem transfere-
se das cavernas para a mata, gradualmente, e alimenta-se de animais menores e de
vegetais.
Entre 3.000 e 1.000 a.C. - Aparecem povos ceramistas, pescadores e coletores de
frutos silvestres e de mariscos. Esses povos, provindos da Colômbia, passaram a
ocupar a beira dos rios e do litoral do Pará.
Entre 1.000 e 200 a.C. - Provindos do noroeste da América do Sul, grupos
ceramistas chegaram à Amazônia e ocuparam o centro da ilha de Marajó. Além da
caça, da pesca e da coleta, esses povos já conheciam a agricultura e usavam-na ainda
que de maneira incipiente.
Entre os séculos I e XII - Os povos ocuparam a Amazônia por meio da agricultura
itinerante, com queimadas e derrubadas das árvores, deslocando-se periodicamente
dos locais de cultivo para que a área utilizada pudesse recompor-se. O milho e a
mandioca eram seus principais produtos. Erguiam suas aldeias nas margens dos rios
produziam cerâmicas.
Entre os séculos XIII e XV - Os povos, dentre os mais destacados estavam os
marajoaras e os tapajós, dominavam habilmente a horticultura na floresta tropical,
erguiam casas sobre terrenos artificiais, produziam cerâmicas decoradas e coloridas
e também sepultavam seus mortos.
Nessa hipótese que vai de 10.000 anos a.C. a 1.500 d.C., dividida em 6 (seis)
fases, as populações que ocupavam a Amazônia, segundo a hipótese da professora Adélia
Engrácia ficam assim destacadas: a) as populações vivem em cavernas ou ao relento são
nômades; b) as populações gradualmente transferem-se das cavernas para a mata; c) surgem
os primeiros povos ceramistas que começam a ocupar as margens dos rios e do litoral; d)
36
povos migrantes do noroeste da América da Sul de perfil caçador-coletor, já tinham
conhecimento da agricultura e a faziam de maneira inicial; e) tinham a consciência do manejo
das áreas de plantio, milho e mandioca eram seus produtos principais, produziam cerâmicas e
erguiam suas habitações às margens dos rios e f) destacavam-se marajoaras e tapajós pela
agricultura, cerâmica e por práticas de sepultamento.
Para Callado (1999, p. 23) a produção cultural indígena é vasta:
Destaca-se a cultura marajoara (séc. V ao séc. XII), a partir da sua sofisticada
cerâmica pintada com motivos geométricos. Em Teso de Bichos, na ilha de Marajó,
havia uma população pertencente a uma sociedade que alcançou um grande
desenvolvimento tecnológico e cuja organização social era bem definida.
Produção cultural é algo mais vasto do que a maioria dos autores registra. As
referências que se encontram nos livros são essencialmente registros das produções
materiais que sobreviveram até os nossos dias e que se encontram disponíveis nos
museus pelo mundo afora. No caso específico da Amazônia, a maior riqueza
arqueológica é a cerâmica.
A sociedade marajoara influenciou em muitos hábitos e costumes de
populações indígenas e caboclas posteriores, principalmente com relação à alimentação,
baseada em peixes, como o pirarucu, e refrescos fermentados, como o aluá.
Para Meggers (1979, p. 18):
[…] O novo mundo é um laboratório antropológico único, pois o processo de
desenvolvimento cultural aborígene processou-se num quase isolamento, antes que
ocorresse uma parada repentina com o fluxo de soldados europeus, sacerdotes,
exploradores e colonizadores, após 1492.
A chegada dos europeus na América vai estabelecer um marco delimitador que
segundo a autora, interrompeu de modo repentino, o desenvolvimento cultural dos povos
americanos sem as influências deste contato.
Segundo Callado (1999, p.22):
Apesar de que o médio Amazonas ainda não revelou, pelas poucas explorações
sistemáticas realizadas, a complexidade cultural que encontramos na fase Marajoara,
o que se sabe até agora já sugere outras interpretações da Pré-História amazônica. O
quadro que começa a se delinear não é o da transitória presença de um grupo
alienígena de alta cultura na foz do Amazonas, mas uma longa tradição de povos
estabelecidos ao longo de todo o rio, desde 1.000 a.C. até 1.500 d.C. A continuidade
do povoamento organizado em grandes aldeias pressupõe uma economia
diversificada e plenamente adaptada ao meio ambiente.
As interpretações sobre a pré-história amazônica, segundo Callado, apresentam
uma cultura milenar, de povos que viveram ao longo do rio Amazonas, um povoamento
organizado e com uma economia desenvolvida e adaptada a floresta e ao rio.
Para Lehmann (1990, p. 115/116) tratando das civilizações amazonenses o
desenvolvimento da cerâmica indica parentesco, organização e desenvolvimento dos grupos
que habitavam a Amazônia:
37
As civilizações amazonenses, a despeito de seu parentesco com alguns dos grupos
culturais anteriormente descritos, devem ser tratadas à parte. No estado atual das
pesquisas, destinguem-se quatro estilos, cada qual acantonado numa região
diferente. Todavia, parece que o gênero de vida de todas as populações era idêntico,
quer fosse na ilha de Marajó, nas regiões do sudeste, em Santarém ou no Médio-
Amazonas. Principalmente agricultores, os amazonenses viviam igualmente da caça
e da pesca.
A cerâmica era particularmente desenvolvida. Sua alta qualidade, ao mesmo tempo
que a quantidade de objetos encontrados, fazem pensar que as comunidades eram
importantes.
A cronologia não foi ainda estabelecida. Entretanto, a olaria marajoara foi fabricada
até o século XVII, de acordo com os cronistas. A duração dessa civilização, sem
dúvida, a mais importante da Amazônia, foi relativamente longa. Subsistem mais de
uma centena de montículos, dos quais alguns foram escavados, revelando urnas
funerárias belíssimas e de tamanho às vezes imponente, e fragmentos de olaria
decorada.
Esta decoração é muito rica e característica. As superfícies são inteiramente cobertas
com motivos gravados, incisos, pintados, ou em relevo pleno.
Dentre as formas, muito variadas, pode-se citar urnas muito abertas ou uma espécie
de ânfora ou então tigelas e vasos antropomórficos. De acordo com alguns
especialistas. O adorno evoca algumas vezes motivos centro-americanos.
Para Callado (1999, p. 24):
As várias nações indígenas, portadoras das mais diferentes culturas, diferenciavam-
se na organização social e política. Com o aparecimento da divisão social do
trabalho em algumas nações, houve a especialização das funções determinadas,
como a cerâmica, considerada por Carvajal de alta qualidade. Em termos políticos, o
cronista o mesmo cronista, observa que entre os Omáguas o chefe superior tinha a
sua autoridade subordinada ao conjunto da tribo.
Segundo Callado as expedições espanholas pelo rio Amazonas observaram e
descreveram vários povos, cada qual com sua cultura própria e com diferentes modos de
organização social e política, e na divisão do trabalho a especialização de funções, o qual
destaca a qualidade da cerâmica descrita pelo cronista Carvajal.
Segundo Meggers (1979, p.21):
É lamentável que a importância da investigação arqueológica do Novo Mundo se
torne flagrante, no momento em que as evidências vêm sendo eliminadas em ritmo
acelerado. Em poucas décadas, a expansão das cidades, a agricultura, as barragens e
as estradas terão destruído muitos sítios importantes. À medida que este processo
avançar, diminuirão as oportunidades de se reconstruir os detalhes da pré-história do
Novo Mundo. Se os dados não forem coletados antes do registro se tornar muito
fragmentário para ser lido com segurança, a humanidade terá perdido uma das
chaves mais preciosas de sua auto-compreensão.
A autora lamenta a destruição das evidências dos sítios arqueológicos, em
função das obras de desenvolvimento como estradas, barragens, a agricultura, a expansão das
cidades, fato que vai diminuir as oportunidades de se reconstruir os detalhes da pré-história do
Novo Mundo e no caso desta pesquisa da pré-história do Amazonas e da Região
Metropolitana de Manaus.
38
2. A TUTELA ARQUEOLÓGICA NO BRASIL
2.1 O PATRIMÔNIO ARQUEOLÓGICO NACIONAL
A arqueologia pode ser definida como o estudo da cultura material, produzida
pelos diversos povos em todos os tempos e lugares e em constante interação com o meio
ambiente, constituindo-se este em suporte para o desenvolvimento da(s) cultura(s). As ideias e
pensamentos desenvolvidos pelo homem implicam na transformação da natureza, os quais se
cristalizaram no conjunto de objetos e artefatos que denominamos cultura material,
constituindo-se esta na natureza socialmente transformada.
Para Franco (1996, p. 2):
O patrimônio arqueológico pode ser dividido em pré-histórico e histórico. Para o
Brasil, estabelece-se o ano de 1.500, como marco divisório entre a Pré-História e a
História, isto é, períodos anteriores e posteriores à chegada dos colonizadores
europeus que introduziram o modo de produção colonial extrativista, baseado na
exploração da mão-de-obra escrava de negros oriundos do continente africano e
indígena. Assim, a cultura brasileira é formada, basicamente, pela interação dos
traços culturais advindos das diferentes etnias indígenas aqui já existentes, das
africanas e das européias.
Segundo Franco, o marco divisório do patrimônio arqueológico no Brasil é o
ano de 1.500, que o divide em Pré-Histórico, o período que antecede a chegada dos
colonizadores e Histórico, o período posterior a colonização até os dias atuais.
Segundo Barreto (1999, p.33):
A maior parte do conhecimento arqueológico produzido no Brasil trata do período
pré-cabralino. A arqueologia feita no Brasil é essencialmente uma arqueologia de
sociedades indígenas extintas que viveram em um passado distante, deixando como
testemunho de sua existência somente restos materiais. Há 500 anos que estes restos
materiais têm sido encontrados, estudados e interpretados. Há 500 anos que estes
restos têm sido a matéria-prima para a construção de um passado pré-colonial
brasileiro.
Para Barreto o conhecimento produzido pela arqueologia brasileira em sua
grande maioria trata das sociedades indígenas extintas, cujos sítios arqueológicos são o
testemunho de sua existência e a matéria-prima para a interpretação da pré-história brasileira.
É a partir da pesquisa arqueológica que se pode reconstituir aspectos da nossa
pré-história e história, estudando-se a cultura material, recuperada em campo através das
escavações em sítios arqueológicos, testemunhos de ocupações humanas passadas e suas
atividades, constituidoras da nossa história. Portanto, a consciência e a identificação de um
povo com a sua História são os elementos transformadores do indivíduo em cidadão,
instrumentos necessários ao exercício da cidadania e conformadores de uma nação.
39
2.2 CONCEITO, IMPORTÂNCIA E EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA ARQUEOLOGIA
A Arqueologia inserida no campo das ciências humanas, é uma ciência em
construção e que após a segunda grande guerra, vem delineando seu campo teórico-científico.
Embora não apresente conceito fechado, destacam-se três pontos centrais para sua
conceituação: a) a realização do estudo do homem por meio da análise de um conjunto de
fatores que resulta da soma da cultura material (artefatos) com o estudo do contexto no qual a
matéria é apropriada; b) a busca de uma construção textual do passado voltada para o
presente, essa construção aproxima-se da diversidade cultural e pode ser importante para a
identidade nacional, e, por fim, c) seu caráter interdisciplinar.
A atuação dos arqueólogos no Brasil está concentrada em duas áreas de
interesse: a) a Pré-História e b) Arqueologia Histórica. Na primeira as principais discussões
referem-se à antiguidade do homem da América, mas já há muitas reflexões sobre arte
rupestre, sobre as características das sociedades pré-históricas amazônicas, sobre os
amontoados de conchas (sambaquis) produzidos pelo homem num passado remoto,
sepultamentos primários, secundários e sua organização social, ao lado da indústria lítica e
cerâmica. Na segunda destacam-se as pesquisas que tratam da diversidade étnica e cultural do
Brasil, como exemplo as Missões Jesuíticas e dos Quilombos.
Segundo Barreto (1999, p. 33/34):
Rever a história da arqueologia no Brasil é acompanhar o confronto do brasileiro ao
longo destes anos com um passado pouco conhecido, que traduz as diversas formas
de identificação ou rejeição das raízes indígenas por parte da sociedade nacional, e
que nem sempre corresponde a ideais de uma (pré)história nacional. A perspectiva
colonial, do europeu branco explorando um passado exótico e distante, predominou
até a institucionalização da arqueologia dentro de museus e centros de pesquisa
científica, a partir do século XIX. Ironicamente, movimentos que valorizaram a
cultura indígena, como os movimentos nativistas, o romantismo, e mesmo o
modernismo, pouco influíram no desenvolvimento de uma arqueologia mais
científica e menos eurocêntrica. Ao contrário, o crescimento científico da
arqueologia foi promovido inicialmente por naturalistas europeus trazidos pela Corte
portuguesa, mais tarde pelo próprio imperador Pedro II, e finalmente pelos
professores estrangeiros trazidos ao Brasil para a construção de centros de pesquisas
e universidades. Nesse sentido, a arqueologia brasileira, ao longo de sua história,
tem sido muito pouco brasileira.
As pesquisas arqueológicas no Brasil datam do final do século XIX. Mas
existem dificuldades materiais de conservação dos vestígios arqueológicos nacionais. Para
Prous (1999, p.251-252) “as condições peculiares do Brasil levaram a sete grandes tipos de
sítios arqueológicos: a) os sambaquis; b) as aldeias, acampamentos e paradeiros; c) as
sinalizações rupestres; d) os sítios líticos; e) os sítios históricos; f) as casas subterrâneas e g)
os abrigos sob rocha.”
40
Para Prous (1999, p.25) foi durante o Segundo Império (1832-1889) “que
através das ações de D. Pedro II começou o fomento pelo desenvolvimento, criação e amparo
a instituições de pesquisas e contratação de profissionais para apoiar as pesquisas
arqueológicas, com auxílio do Museu Nacional”.
Posteriormente com a queda do Império, despontaram três instituições, Museu
Nacional, Museu Paulista e o Museu Emílio Goeldi. Durante o período que compreende o
final do Século XIX e até a segunda metade do Século XX, a Arqueologia foi feita por
profissionais de diversas aéreas.
Segundo Prous ((1999, p.25):
O primeiro arqueólogo contratado foi austríaco o J.A Padberg-Drenkpohl pelo
Museu Nacional na década de 20; na década posterior, publicou-se o primeiro
manual de arqueologia brasileira de Angyone Costa em 1934, sendo considerado
um dos pais da arqueológica brasileira.
A partir da década de 1960 começa a se desenvolver uma profissionalização
da arqueologia brasileira, anteriormente as pesquisas arqueológicas eram feitas por amadores
e profissionais de outras aéreas, acarretando muitas perdas e destruições do patrimônio
cultural; com a promulgação da Lei nº 3.924/61 que protege os registros pré-históricos,
colocando-o sob a tutela do Governo Federal, mais especificamente, a Secretaria de
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, buscou-se meios para se resolver muitos dos
problemas que se acarretavam devido às dificuldades de fiscalização e aplicação da
legislação.
Segundo Prous (1999, p.28)
A arqueologia brasileira começa a se desenvolver com a missão de cooperação
entre Brasil e Estados Unidos, missão americano-brasileira com Wesley Hurt para
escavar em Lagoa Santa na década de 50 do Século XX. Num segundo momento,
aportou por estas paragens a segunda missão que ficou conhecida como
PRONAPA, tendo sido desenvolvida sob a direção de Betty Meggers e Clifford
Evans durante o período 1965/71 com o intuito de fornecer uma visão geral da pré-
história brasileira, desenvolvendo pesquisas em um espaço de tempo curto.
Outros fatos importantes, como a criação do Instituto de Pré-História da
Universidade de São Paulo, a criação do Centro de Pesquisa Arqueológica da Universidade
Federal do Paraná foi a vinda de profissionais do exterior como Annette Laming-Emperaire e
Joseph Emperaire na década de 50. Posteriormente, na década de 70 através de convênios
entre Brasil e França, com as instituições, UFMG, Museu Nacional e Centre de La Recherche
Scientifique da França houve a possibilidade de ampliação de estudos metodológicos.
41
2.3 - SÍTIOS ARQUEOLÓGICOS
Adotou-se para esta pesquisa a conceituação, contida na obra Normas e
Gerenciamento do Patrimônio Arqueológico, elaborada por Rossano Lopes Bastos e Marise
Campos de Souza, da Superintendência do IPHAN em São Paulo, de modo a esclarecer os
diferentes tipos de vestígios e sítios arqueológicos:
Sambaquis – São sítios arqueológicos encontrados em regiões costeiras nas
proximidades do mar, mangue e desembocadura dos rios. Construídos por
populações de caçadores, coletores e pescadores que interagiam com paisagens
litorâneas e estaurinas. Caracterizam-se pelo acúmulo intencional de conchas de
moluscos e restos alimentares. São encontrados vestígios de fogões (circulares e
feitos de pedra), artefatos líticos, sepultamentos, além de adornos e zoólitos
(esculturas em pedra, representando animais).
Cerritos – São sítios arqueológicos caracterizados por estruturas monticulares
produzidas em terra, elaborados por populações pré-históricas comumente
encontradas na região meridional da América do Sul. Estes sítios são compostos na
sua estrutura interior de material lito-cerâmico e em alguns casos apresentam
também enterramentos.
Mounds – São sítios arqueológicos caracterizados por montes ou tesos associados a
um determinado tipo de cerâmica denominada marajoara, comumente encontrada na
região amazônica.
Casas subterrâneas – São sítios arqueológicos peculiares de grandes altitudes.
Apresentam-se como sulcos abertos no solo, variando de 2 a 20 metros de diâmetro
e podendo alcançar 6 metros de profundidade. Serviram de habitação às populações
pré-históricas e são encontradas nas cotas mais altas dos estados de Santa Catarina,
Paraná e São Paulo, salvo rara exceção reservada ao município litorâneo de
Jaguaruna/SC, onde na década de 60 do século passado, registraram-se algumas
evidências deste tipo de sítio.
Sinalizações rupestres/pinturas – São sítios arqueológicos encontrados com
relativa frequência em todos os continentes.
Definidos por gravuras ou pinturas feitos nas rochas em solo ou paredes. Em relação
à técnica empregada na confecção, chamam-se petróglifos quando gravadas e
pictoglifos quando desenhadas ou pintadas. São normalmente instalados em costões,
rochedos, maciços e serras.
Geoglifos – São sítios arqueológicos encontrados na Amazônia acreana e também
nas planícies altas da região catarinense. São caracterizados por estruturas circulares
em média com 1 a 2 metros acima do nível do solo, com raios que variam de 50 a
200 metros em Santa Catarina e de 200 a 1.000 metros na região amazônica.
Megálítos – São sítios comumente encontrados na Europa, tem como características
sua formação rochosa para sepultamentos e moradia. Seu alinhamento de pedras
muitas vezes gigantescas faz pensar em domínio de estruturas de roldanas e rodas
para esse tipo de arquitetura pré-histórica. No Brasil esses estudos ainda são recentes
e muitas vezes são confundidos por amadores e caçadores de tesouro. Exemplo
dessa confusão, são encontrados na Ilha de Santa Catarina, onde no cristalino da
costa leste junto às praias Mole, Gravatá e da Barra, existe uma tentativa de
considerar algumas pedras como sítios megalíticos.
Abrigos sob rocha – Os abrigos sob rocha são formados por paredões rochosos que
apresentam uma parte alta saliente, projetada para fora, formando uma espécie de
42
telhado natural, capaz de oferecer abrigo contra chuvas, vento, animais, répteis
venenosos e outras intempéries da natureza. Com estas características foram usados
como habitação pelas populações pré-históricas. No seu interior encontramos
vestígios desta ocupação: fogueiras, fogões, restos de alimentação, sepultamentos e,
às vezes, sinalizações rupestres.
Sítios líticos – São lugares onde as populações pré-históricas preparavam e
aperfeiçoavam suas ferramentas e instrumentos de caça, pesca e coleta. As estações
ou oficinas líticas são encontradas com freqüência no litoral e confeccionadas
normalmente em rocha muito dura. São formações de depressões na rocha: sulcos,
frisos, pratos, bacias que serviam para amolar, afiar e polir as ferramentas e
instrumentos. Encontramos também oficinas de lascamento em que a maior parte do
material se constitui de lascas, estilhas e núcleos de rocha abandonados ou mal
formados.
Sítios litocerâmicos – São sítios arqueológicos normalmente em áreas abertas e que
na composição dos vestígios arqueológicos existentes encontram-se quantidades
variadas de artefatos produzidos em material feito em pedra (lítico) e feitos em barro
(cerâmica).
Aldeias – São sítios arqueológicos que se caracterizam por manchas escuras no solo
como carvão, objetos de pedra e cerâmica, restos de construções, existência de
postes. O solo costuma estar muito firme e compacto. São elevações no solo de
forma circular e variam de 20 a 100 metros de diâmetro.
Acampamentos e paradeiros – Acampamentos são pequenas áreas de ocupação
temporária, caracterizadas por formas circulares menores que 20 metros de diâmetro
e de pouca profundidade. Normalmente com pouca ou ausência de material
litocerâmico. Outra variação são os acampamentos conchíferos, que são sítios de
formação reduzida de restos alimentares ou de uso diverso, onde predominam as
conchas. São menores que os sambaquis e com formação biogeomorfológica de
características de ocupação marinha ou lagunar e de ocupação mais recente.
Os lugares notáveis ou paisagens notáveis – os lugares notáveis, ou chamados
sítios mistos, são as realizações humanas e as ações da natureza. São também
denominados bens mistos, culturais e naturais ainda paisagens culturais. Trata-se
ainda de categoria com pequena representatividade na lista do patrimônio nacional e
mundial. Entre os sítios mistos, onde podemos identificar o patrimônio cultural
arqueológico e natural, podemos destacar as paisagens rurais, detentoras fazeres,
saberes, sabores e vestígios arqueológicos de grande magnitude e destacada
significância. Pode-se destacar o exemplo do Parque Nacional da Serra da Capivara
localizado em São Raimundo Nonato, Estado do Piauí, Brasil. (BASTOS; SOUZA,
2010, P. 33-48)
A partir dessas definições, que adotaremos nesta pesquisa, vamos identificar os
sítios arqueológicos, sobretudo urnas funerárias utilizadas em sepultamentos secundários e
outros vestígios da presença humana pré-colonial.
Segundo Silva (p. 36):
Uma definição bem objetiva muito utilizada hoje é: a Paleontologia é a ciência que
estuda os fósseis. Então, pergunta-se: O que é um fóssil? A palavra Fóssil deriva do
termo latino “fossilis”, referido pela primeira vez por Plínio no século I antes de
Cristo. A sua raiz, “fossus”, particípio passado de “fodere” (ou seja, cavar), significa
literalmente “o que se extrai cavando”. Com o tempo, o termo fóssil foi perdendo seu
conteúdo mineralógico, de modo a apenas incluir os vestígios de estruturas somáticas
(relativo ao corpo) de paleorganismos ou traços e marcas de atividade orgânica,
preservados por processos geológicos. Os fósseis são subdivididos em duas
categorias:
43
1. Somatofósseis: são os restos ou vestígios de estruturas somáticas, isto é, do corpo
de organismos pretéritos; por exemplo, uma escama de peixe ou uma ossada;
2. Icnofósseis: são as marcas de atividade orgânica, tais como: pegadas, ovos, fezes
fossilizadas (chamadas de coprólitos), marcas de alimentação e habitação.
Enquanto a arqueologia busca evidências de civilizações passadas, artefatos e
vestígios desses grupos humanos a paleontologia busca vestígios de fósseis, isto é, evidencias
de animais pré-históricos.
2.4 A REGIÃO METROPOLITANA DE MANAUS E OS IMPACTOS DAS GRANDES
OBRAS NOS SÍTIOS ARQUEOLÓGICOS
Baseado no art. 25, § 3º da Constituição da República de 1988 que autoriza os
estado à criação de Regiões Metropolitanas, por meio de Lei complementar, senão vejamos:
Art. 25. Os Estados organizam-se e regem-se pelas Constituições e leis que
adotarem, observados os princípios desta Constituição.
§ 3º - Os Estados poderão, mediante lei complementar, instituir regiões
metropolitanas, aglomerações urbanas e microrregiões, constituídas por
agrupamentos de municípios limítrofes, para integrar a organização, o planejamento
e a execução de funções públicas de interesse comum.
O processo de metropolitanização, apesar de não mais constituir um fenômeno
estranho e desconhecido no território brasileiro, ainda suscita diversas dúvidas,
principalmente quando o tema refere-se à competência para tratar dos assuntos de interesse
comum entre os municípios envolvidos.
O agravamento dos problemas ambientais das cidades, decorrentes do
crescimento urbano desordenado, é constantemente evidenciado nos diagnósticos disponíveis,
entre outros fatores, pela escassez de recursos suficientes, ausência ou ineficiência de serviços
urbanos e pelos atrasados padrões ambientais de infraestrutura urbana e dos espaços
construídos.
A questão relacionada à criação e organização das chamadas regiões
metropolitanas merece especial atenção, não só porque estas possuem peculiaridades inerentes
à sua condição diferenciada, mas, também, porque as dimensões - populacional e financeira
abrangidas por essas áreas representam números potencialmente relevantes para o país.
As características peculiares que envolvem a formação e o desenvolvimento
das regiões metropolitanas ensejam complexas problemáticas associadas a sua gestão, além de
indefinições à identificação das competências entre os entes federativos envolvidos.
O fato de que o amadurecimento político e o trabalho em conjunto são os
principais responsáveis pela existência de uma região metropolitana capaz de garantir a
44
correta aplicação do princípio da dignidade da pessoa humana, oferecendo qualidade de vida
aos seus habitantes.
O agravamento dos problemas ambientais das cidades, decorrentes do
crescimento urbano desordenado, é constantemente evidenciado nos diagnósticos disponíveis,
entre outros fatores, pela escassez de recursos suficientes, ausência ou ineficiência de serviços
urbanos e pelos atrasados padrões ambientais de infraestrutura urbana e dos espaços
construídos.
Sendo assim, há que se concordar que nas regiões metropolitanas, cujos
problemas ambientais são obviamente mais profundos e perceptíveis, a atuação do poder
público no controle das atividades consideradas potencialmente causadoras de degradação
demonstra-se ainda mais relevante, destacando-se, dessa forma, um dos mais importantes
instrumentos de gestão do meio ambiente: o licenciamento ambiental.
No entanto, no procedimento de licenciamento ambiental de empreendimentos
localizados em regiões metropolitanas, apresentam-se certas dificuldades, especialmente
relacionadas à repartição de competências. Neste capítulo pretende-se observar alguns
aspectos jurídicos referentes às regras de uso e ocupação do solo, emanadas pelos municípios
e pelos organismos gestores das regiões metropolitanas, a serem observadas no procedimento
de licenciamento ambiental. A questão que se pretende analisar é: o que prevalece, na
eventualidade de ocorrência de conflito, o ordenamento municipal ou as regras da região
metropolitana sobre a ocupação do solo?
Importa lembrar que as regiões metropolitanas encontram-se previstas na
ordem jurídica brasileira desde a Constituição da República de 1967, tendo sido promulgadas,
já com fulcro na Emenda Constitucional de 1969, as Leis Complementares 14/73 e 20/74, que
instituíram, primeiramente, as regiões metropolitanas de São Paulo, Belo Horizonte, Porto
Alegre, Recife, Salvador, Curitiba, Belém, Fortaleza e Rio de Janeiro.
Com o advento da Lei Complementar nº 52, de 30 de maio de 2007 foi criada a
Região Metropolitana de Manaus com 7 (sete) municípios entre os quais: Manaus, Iranduba,
Novo Airão, Presidente Figueiredo, Rio Preto da Eva, Itacoatiara e Careiro da Várzea,
visando o planejamento, organização e execução das funções públicas de interesse comum à
região metropolitana.
45
A Lei complementar nº 59, de 27 de dezembro de 2007, modificou os artigos
1º caput, e 4º, I, alínea b, da Lei Complementar nº 52, e adicionou o município de
Manacapuru à Região Metropolitana.
Com a Lei Complementar nº 60, de 29 de fevereiro de 2008, foi criada a
Secretaria Executiva do Conselho de Desenvolvimento Sustentável da Região Metropolitana
de Manaus a SRMM e instituído o Fundo Especial da Região Metropolitana de Manaus -
FERMM.
Com a Lei Promulgada nº 64, de 30 de abril de 2009, a Assembleia Legislativa
do Amazonas aprovou a inclusão de 5(cinco) novos municípios à Região Metropolitana de
Manaus a saber: Itapiranga, Silves, Careiro, Manaquiri e Autazes, elevando de 8 (oito) para
13 (treze) o número de membros da área metropolitana. Contudo, o Ministério Público
Estadual ajuizou Ação Direta de Inconstitucionalidade para requerer que fosse declarada a
inconstitucionalidade da referida lei, o que foi acolhido pelo Tribunal de Justiça do Amazonas
decidiu que a Assembleia não teria competência para aprovar a ampliação do número de
municípios na referida região. O Tribunal considerou inconstitucional a lei complementar
aprovada e promulgada pela Assembleia do Estado, sob a tese de que a iniciativa de propor
qualquer alteração é do Estado do Amazonas, ocorrendo “vício de iniciativa” ao aprovar a
mudança.
No recurso apresentado o Procurador-geral da ALE/AM, Vander Góes,
compara a iniciativa da Assembleia do Amazonas com caso semelhante ocorrido em Porto
Alegre, e entende que no Artigo 25 da Constituição Federal está expresso que compete ao
Estado criar regiões metropolitanas, não há previsão de que alterar as já existentes seja
competência exclusiva do Executivo.
A RMM possui uma área com 101.475,37 Km², fazendo uma comparação sua
área é maior do que a de três países juntos Holanda (41.526 Km²), Suíça (41.285 Km²) e
Montenegro (13.812 Km²).
Criada com os seguintes interesses metropolitanos:
Planejamento integrado do desenvolvimento econômico e social;
Habitação;
Saneamento básico, abastecimento e produção de água;
Distribuição de energia elétrica;
Educação (Cidade universitária);
Segurança Pública;
46
Proteção e utilização racional e integrada dos recursos hídricos;
Desenvolvimento sustentável;
Distribuição de gás canalizado;
Regularização fundiária;
Saúde.
Segundo dados da SEFAZ/AM de 2006 a RMM representa 93% (noventa e três
por cento) da arrecadação do Estado do Amazonas e os demais 54 municípios correspondem a
7% (sete por cento) do total.
Ressalte-se que as regiões metropolitanas não são entes político-
administrativos, nem ao menos detêm parcela da competência constitucional (AGUIAR,
1995, p.14). Constituem-se tão somente como entes públicos regionais dotados de certa
autonomia para a edição de normas meramente administrativas, relacionadas ao planejamento,
à organização e à execução das funções públicas de interesse comum (op. cit., p.16-19).
A partir da Constituição de 1988, os municípios adquiriram status de entes
federativos, dotados, portanto, de autonomia. Pela primeira vez no constitucionalismo
brasileiro, “os Estados, Municípios e Distrito Federal são sujeitos ativos da União, isto é, são
atores do pacto federativo” (MILARÉ, 2001, p.265).
E matéria de proteção do meio ambiente, a preocupação central da tutela
jurídica é com a prevenção ou máxima mitigação de quaisquer danos ambientais. Trata-se do
respeito ao princípio da prevenção, mandamento nuclear do Direito Ambiental, segundo o
qual se deve sempre tentar prevenir a degradação ambiental. O objetivo principal é evitar que
o desequilíbrio ambiental se concretize.
Consultou-se o sítio eletrônico do IPHAN que está vinculado ao Ministério da
Cultura, especialmente o link referente ao Cadastro Nacional de Sítios Arqueológicos
(CNSA)13 e verificou-se que no Brasil existiam registrados, até a data de consulta, no Brasil
20.487 (vinte mil, quatrocentos e oitenta e sete) sítios arqueológicos. No Estado do Amazonas
317 (trezentos e dezessete) sítios arqueológicos e nos municípios que compõem a Região
Metropolitana de Manaus, indica que estão catalogados oficialmente 143 (cento e quarenta e
três).
Entre as cidades que compõem a Região Metropolitana de Manaus os registros
dos sítios arqueológicos estão assim distribuídos: Manaus (20); Novo Airão (3); Iranduba
13Cadastro nacional de sítios arqueológicos. Disponível em: < http://www.iphan.gov.br/sgpa/?consulta=cnsa>.
Acessado em 17 de fevereiro de 2014.
47
(16); Rio Preto da Eva (2); Careiro da Várzea (0); Itacoatiara (27); Manacapuru (0) e
Presidente Figueiredo (75).
Entre os Estados da Região Norte o Pará é o que possui o maior número de
registros de sítios arqueológicos, segundo CNSA, com 1.421 (um mil, quatrocentos e vinte e
um) sítios; seguido por Tocantins que possui 862 (oitocentos e sessenta e dois); Rondônia que
possui 403 (quatrocentos e três); Acre com 253 (duzentos e cinquenta e três); Amapá com 251
(duzentos e cinquenta e um) e por fim Roraima com 87 (oitenta e sete) sítios registrados.
O universo de sítios arqueológicos registrados no Amazonas em relação ao
Brasil equivale a pouco mais de 1,5% (um e meio por cento), já em relação à Região
Metropolitana de Manaus o percentual é de aproximadamente 0,7% (sete décimos por cento)
do total nacional. Como o Estado Amazonas é o maior da federação brasileira, presume-se
que existam muitos sítios arqueológicos ainda desconhecidos
Verificou-se que as fichas de cada sítio e observou-se que a maioria da
localização dos dados informa que eles estão no acervo do Museu Emílio Goeldi, em
Belém/PA, são sítios na sua maioria encontrados a céu aberto, em áreas públicas de média a
baixa relevância arqueológica.
Nas diligências ao IPHAN, verificaram-se que os dados estão desatualizados, e
que, ainda não foram cadastrados por volta de 300 (trezentos) sítios arqueológicos
encontrados na construção do gasoduto Coari-Manaus. O material arqueológico está sob a
guarda do Museu Amazônico da Universidade Federal do Amazonas que está construindo em
seu campus um local definitivo para guarda, estudo e exposição destes bens.
Outro dado relevante, é que a pesquisa para encontrar de sítios arqueológicos
se dá na maioria das vezes, quando da execução de grandes obras que necessitam das licenças
para a execução das obras, que somente são concedidas as licenças, após o estudo prévio de
impacto ambiental e arqueológico, que deve ser custeado pelas empresas construtoras. Essas
empresas contratam escritórios de arqueologia que fazem a varredura do local, descartando
possíveis ocorrências de bens arqueológicos ou encontrando sítios de valor histórico.
Relevante foi verificar que a pesquisa na maioria das vezes é financiada pela
autarquia, através de projetos que são custeados via pagamento de multas e condenações
pecuniárias de empresas por outras obras e que descumpriram a legislação. Sendo assim,
havendo locais a estudar, são feitos projetos para o levantamento e estudo desses sítios
isolados e onde não existem obras a serem executadas.
48
2.4.1 Sítios arqueológicos em Iranduba/AM
A construção da ponte sobre o Rio Negro ligando Manaus a Iranduba reduziu a
distância e o tempo de deslocamento entre as cidades, entretanto vai trazer um avanço na
dinâmica da ocupação urbana que tende a destruir muitos sítios ainda não catalogados.
A necessidade do estudo prévio de impacto ambiental se dá apenas para as
grandes obras. Nas obras menores, há uma recomendação de qualquer achado arqueológico o
IPHAN deverá ser notificado. Cabe ao IPAAM a liberação das licenças ambientais nestes
casos específicos.
Segundo os dados do Cadastro Nacional de Sítios Arqueológicos o município
de Iranduba possui 16 (dezesseis) registros de achados arqueológicos.
2.4.2 Sítios Arqueológicos em Manaus/AM Conj. Habitacional Nova Cidade
A situação do Projeto Habitacional Nova Cidade será objeto de estudo de caso,
ao final desta pesquisa.
Nesse caso específico, o conflito gerado foi à construção de moradias
populares pela Secretaria de Habitação do Estado do Amazonas sobre um sítio arqueológico,
avaliado pelos técnicos do IPHAN, como sendo de grande importância arqueológica.
A denúncia de um morador das proximidades da obra ao IPHAN foi um ponto
importante na apuração de responsabilidades. O Ministério Público Federal ajuizou Ação
Civil Publica, cujos autos receberam o nº 2003.32.00.008189-1 (novo nº 8184-
75.2003.4.01.3200) e culminaram na assinatura de Termo de Ajustamento de Conduta,
estabelecendo obrigações a serem cumpridas visando mitigar os efeitos nocivos das obras
sobre o sítio arqueológico.
2.4.3 Sítios Arqueológicos em Manaus/AM – Sítio Lages
O sítio Lages foi o primeiro sítio arqueológico do município de Manaus a ser
registrado no Cadastro Nacional de Sítios Arqueológicos (CNSA) vinculado ao IPHAN
identificado com a sigla (AM-MA-01), e foi impactado por conta das obras do Programa de
Ampliação do Abastecimento de Água de Manaus (PROAMA), visando resolver o problema
do abastecimento de água para a Zona Leste de Manaus.
49
Com base nos dados do processo administrativo nº 01490.000091/2009-18 do
IPHAN.
Houve vistoria ao local do IPHAN/AM em 09 de julho de 2009, constataram-
se os danos causados no sítio arqueológico pela construção da obra. O laudo atesta que as
escavações para passagem dos dutos de água provocaram a remoção de fragmentos cerâmicos
e urnas mortuárias indígenas, além da alteração da composição do solo, que possuía uma
camada de Terra Preta de Índio, característica dos sítios arqueológicos indígenas da
Amazônia. A constatação das irregularidades levou o IPHAN a embargar as obras no local.
Foi firmado Termo de Ajustamento de Conduta Ambiental, entre o Ministério
Publico Federal no Amazonas, o IPHAN e as empresas do Consórcio executante da obra, a
Secretaria de Estado de Infraestrutura (SEINFRA) e o Instituto de Proteção Ambiental do
Amazonas (IPAAM), gerando medidas compensatórias e responsabilidades.
Entre as medidas compensatórias coube a SEINFRA e ao IPAAM divulgar no
diário oficial do Estado extrato do termo de ajustamento de conduta em que a SEINFRA e as
empresas do consórcio irão compensar integralmente os danos ao meio ambiente natural e ao
sítio arqueológico Lages.
Repasse do valor de R$ 268.073,63 (duzentos e sessenta e oito mil, setenta e
três reais e sessenta e três centavos) a Fundação Universidade do Amazonas (FUA), para
guarda do material resgatado no sítio Lages, para custear o programa de Valorização do
Patrimônio Cultural e Preservação Arqueológica na Zona Leste de Manaus/AM, no prazo de 2
(dois) anos. Ao final a FUA deverá entregar relatório final no prazo de 35 (trinta e cinco) dias
a contar do término de execução deste.
Assinado o termo de ajustamento de conduta a obra seguiu em bom termo,
visando atender uma população de mais de 600.000 (seiscentas mil) pessoas.
2.4.4 Sítio Arqueológico Manaus/AM - Paço Municipal
O Paço da Liberdade, também conhecido como Paço Municipal é um monumento
arquitetônico projetado em 1874, pelo Engenheiro João Carlos Antony, com a finalidade de
sediar a Câmara Municipal de Manaus. Mais tarde por ocasião da Proclamação da República
passou a ser sede do Governo Municipal de Manaus.
Através da Lei Municipal nº 565 de 26 de maio de 1956, o Paço da Liberdade e o seu
entorno, passaram a integrar o patrimônio histórico e arquitetônico do município.
50
As obras de restauração do conjunto arquitetônico, isto é o prédio e seu entorno
iniciaram-se em 2004, pela execução do Programa Monumenta, decorrente do convênio
firmado entre o Ministério da Cultura e o Banco Interamericano de Desenvolvimento – BID.
Entre as obras estavam previstas intervenções no subsolo e no reforço das estruturas do
prédio. No momento das escavações foi encontrado material arqueológico, necessitando assim
do acompanhamento arqueológico em obediência da legislação.
Após diligência, da 1ª Superintendência do IPHAN, no prédio e seu entorno,
verificou-se que estes foram construídos sobre o Sítio arqueológico registrado como Sítio
Manaus, conhecido desde a década de 1950, por Peter Paul Hilbert e Mário Monteiro, embora
a existência de um cemitério indígena no local seja conhecida desde a segunda metade do
século XIX. Este sítio continha inúmeras urnas funerárias, com sepultamentos secundários,
associada à fase arqueológica Paredão.
Os achados arqueológicos paralisaram a obra de restauração durante o reforço das
colunas, fato que quase culminou com o desabamento das estruturas do prédio e a sua ruína.
O período de paralisação das obras deu-se no inverno amazônico, marcado por chuvas
torrenciais, além da vibração provocada pelos carros que trafegavam na área próxima das
obras de restauração.
O processo de restauração levou 8 (oito) anos para ser concluído e hoje está aberto à
visitação pública.
2.4.5 Sítios Arqueológicos em Presidente Figueiredo/AM
Com a maior incidência de sítios arqueológicos registrados no Cadastro
Nacional de Sítios Arqueológicos, vinculados ao IPHAN, com 75 (setenta e cinco) sítios o
município e um dos poucos com gruta, como a Gruta do Maroaga.
A grande incidência dos achados de sítios deu-se com a construção da
Hidrelétrica de Balbina, sobretudo na área que foi alagada. Nesse caso, por obrigação legal, o
consórcio responsável pela obra teve que contratar empresa que fez todo o levantamento
arqueológico da área e encontrou diversos vestígios e elementos arqueológicos.
Os dados decorrem do processo administrativo nº 01490.000106/2004-33 do
IPHAN, que informa que o material arqueológico está sob a guarda da empresa Manaus
Energia no Centro de Proteção Ambiental (CPA) que fica na Vila de Balbina em Presidente
51
Figueiredo/AM. Segundo os dados do processo as fls. 165, o CPA está interditado, pois
algumas vigas de sustentação do telhado do centro estão deterioradas por ataques de cupins.
Segundo as fls. 166 do processo IPHAN, o material arqueológico está
devidamente acondicionado em 1.250 (um mil e duzentos e cinquenta) sacos, ainda não
dispensado o tratamento científico deste material.
2.4.6 Sítios arqueológicos em Itacoatiara/AM
Estão catalogados oficialmente 27 (vinte e sete) sítios arqueológicos, no
município de Itacoatiara/AM.
O nome do município pode fazer referência a possíveis sítios arqueológicos, a
palavra Itacoatiara que dizer na língua Tupi Guarani Pedra Pintada.
Em geral as informações dos sítios estão disponíveis no CNSA, os dados estão
no Museu Emilio Goeldi em Belém/PA, os sítios em sua maioria são de média a baixa
importância, do período pré-colonial, como cerâmica, refugo e terra preta.
2.4.7 Sítios arqueológicos no Rio Preto da Eva/AM
Foram encontrados sítios arqueológicos em locais de plantação e na construção
de ramal que dava a acesso a Linha de Transmissão (LT) da Usina Hidroelétrica de Balbina
(UHE).
Pelo Cadastro Nacional de Sítios Arqueológicos foram catalogados apenas 2
(dois) sítios arqueológicos no município de Rio Preto da Eva/AM, o que não significa que não
possam existir outros bens arqueológicos.
2.4.8 Sítios arqueológicos em Manacapuru/AM
No Cadastro Nacional de Sítios Arqueológicos não existem registros desses
bens arqueológicos, isso não significa que não possam existir. O que falta é a busca pelo
material arqueológico através de pesquisas científicas.
52
Como se tratou anteriormente, em diligências realizadas ao IPHAN obteve-se
informação de que há por volta de 300 (trezentos) sítios por se registrar. Tal fato pode indicar
os primeiros sítios do Município de Manacapuru/AM.
2.4.9 Sítios arqueológicos no Careiro da Várzea/AM
O nome do Município chama-se Careiro da Várzea. Várzea quer dizer que está
localizado numa área que fica submersa por períodos do ano. Muitos vestígios já podem estar
destruídos pela ação química da água e do tempo.
Este fato não quer dizer que não possam existir evidências arqueológicos, daí a
necessidade de pesquisas nessa cidade.
Uma obra que aguarda a licença ambiental para iniciar as atividades é a
reconstrução da BR-319, que liga Manaus/AM a Porto Velho/RO. Talvez esta obra possa
revelar sítios arqueológicos na cidade de Careiro da Várzea/AM e no percurso da citada
rodovia federal.
2.4.10 Sítios arqueológicos em Novo Airão/AM
Quanto ao Município de Novo Airão o cadastro nacional de sítios
arqueológicos aponta a existência de ao menos 3 (três): São João I, II e Tanaaú. Todos foram
encontrados numa área alta de plantio de mandioca, onde se destacava a terra preta de índio,
material cerâmico e nas proximidades de um igarapé que dá acesso a um rio maior.
Os dados destes sítios estão guardados no Museu Emílio Goeldi, que está
localizado em Belém do Pará. Podem indicar que existem outras evidências que ainda não
foram pesquisadas.
2.5 PRINCÍPIOS DA TUTELA ARQUEOLÓGICA NO BRASIL
No Direito Ambiental os princípios não possuem uma uniformidade doutrinária
na sua identificação e nem no conteúdo jurídico de muitos deles, estão consagrados na
Constituição da República e por isso, fazem parte de todo o sistema jurídico brasileiro
positivado em leis, resoluções, portarias entre outros. Diante disso, iremos elencar e descrever
53
de maneira sucinta alguns princípios que devem ser utilizados na proteção dos sítios
arqueológicos.
2.5.1 Princípio da Prevenção
O princípio está implícito no art. 225 da Constituição Federal.
No preâmbulo da Convenção da Diversidade Biológica, ratificada pelo Brasil,
é possível verificar este princípio: é vital prever, prevenir e combater na origem as causas da
sensível redução ou perda da diversidade biológica.
Nestes casos já se tem base científica para prever os impactos ambientais
negativos decorrentes de determinada atividade lesiva ao meio ambiente, devendo-se impor
aos empreendedores condicionantes no licenciamento ambiental para reduzir ou suprimir os
prejuízos.
Utiliza-se este princípio nas atividades em que já se tem vasto conhecimento,
isto é, nos casos em que o risco é sabido, conhecido ou concreto, em que se sabe a extensão e
a natureza dos males ambientais, em que se tenha uma boa margem de segurança para o
trabalho.
Em regra, busca-se sempre a prevenção dos danos ambientais, pois na grande
maioria das vezes não é possível remediar seus impactos, face sua condição de
irreversibilidade. Um ótimo exemplo é a exigência contida do art. 225, § 1º, IV da
Constituição da República, do estudo de impacto ambiental para que seja concedido o
licenciamento da atividade, de modo mitigar ou elidir danos ambientais.
Como exemplos concretos da utilização deste princípio, descrevem-se duas
obras na Região Metropolitana de Manaus - o gasoduto Coari-Manaus (que passou pelas
cidades de Manacapuru e Iranduba) e a Cidade Universitária (Iranduba), em que antes das
obras se iniciarem foi necessário que um grupo de arqueólogos contratados pelas empresas
que conduziam estes empreendimentos, fizessem uma varredura na área, de modo a
identificar previamente possíveis sítios arqueológicos, antecipando as escavações para
colocação dos tubos de gás e das fundações dos prédios da UEA.
54
2.5.2 Princípio do Desenvolvimento Sustentável
Com previsão implícita na combinação dos Art. 225 e 170, IV, ambos da
Constituição e expressamente contido no Princípio 04 da Declaração do Rio de Janeiro, in
verbis:
Para se alcançar um desenvolvimento sustentável, a proteção ambiental deve
constituir parte integrante do processo de desenvolvimento e não pode ser
considerada separadamente.
Por esse princípio busca-se um equilíbrio entre desenvolvimento e preservação
ambiental, uma vez que é sabido que toda obra gera impactos, seu objetivo é aperfeiçoar o
desenvolvimento e minimizar o degradação do meio ambiente.
O tema deste trabalho reflete este princípio. Sabe-se da necessidade de se
buscar o crescimento econômico de nossa região, ao mesmo tempo sabe-se da necessidade
urgente de preservação de nossa sociobiodiversidade.
Os sítios arqueológicos podem representar pistas para desvelarmos a história
dos nossos antepassados e também podem representar um potencial turístico importante,
contudo sem o devido cuidado e a pressa para a realização de obras de desenvolvimento pode-
se destruir essa riqueza e sepultá-la de modo definitivo.
2.5.3 Princípio Da Solidariedade Intergeracional Ou Equidade Geracional
Este princípio inspirou a parte final do art. 225, caput, da Constituição da
República, quando impõe que a presente geração deve preservar o meio ambiente e adotar
políticas ambientais, utilizando os recursos ambientais de maneira racional evitando assim
privar os seus descendentes de desfrutá-los.
O princípio 03, da Declaração do Rio de 1992 expressa tal entendimento: O
direito ao desenvolvimento deve ser exercido de modo a permitir que sejam atendidas
equitativamente às necessidades de desenvolvimento e de meio ambiente das gerações
presentes e futuras.
Relaciona-se a este o princípio do Desenvolvimento Sustentável que busca
justamente isto, a preservação para as demais gerações. Segundo Amado (2011, p.44):
Há um pacto tácito, fictício entre a presente e as futuras gerações, visando a
preservação e o acesso aos recursos ambientais, a uma vida digna e sadia, razão pela
qual as nações devem proteger com intensidade os animais e vegetais que estão
ameaçados de extinção.
55
Os bens arqueológicos portam os elementos que permitem conhecer, eleger e
interpretar as referências identificadoras da formação da sociedade brasileira e constituem o
legado das gerações passadas às gerações futuras. Assim, destruí-los significa subtrair a
herança de seus legítimos herdeiros.
Pelo princípio da equidade geracional, o Estado tem a obrigação de
manutenção de um determinado número de sítios arqueológicos, de diversas épocas, intactos,
total ou parcialmente, para que sua exploração possa ser beneficiada pelos progressos da
técnica e pelo avanço dos conhecimentos arqueológicos, de acordo como processo decisório
que envolva o contexto de seleção da geração futura.
Esse princípio é um princípio ambiental já fortemente desenvolvido, mas pela
estreita ligação que guarda com os princípios arqueológicos da Conservação in situ e da
Matriz Finita será analisado sob o enfoque do patrimônio arqueológico. Se o estoque
patrimonial não comporta renovação e pode simplesmente desaparecer no tempo presente, o
acesso das gerações futuras aos bens arqueológicos somente será garantido pelo Poder
Público atuar no sentido de possibilitar que todos os elementos necessários à pesquisa
arqueológica e à realização de interpretações estejam seguros. Desse modo, a aplicação do
princípio da conservação in situ.
A prioridade do uso dos bens ambientais não implica exclusividade de uso. Os
usuários prováveis ou simplesmente os que desejam usar os bens e não os usam precisam
provar suas necessidades atuais. Os usuários só poderão usar os bens ambientais na proporção
de suas necessidades presentes, e não futuras.
Para Machado (2013, p.57):
O princípio arqueológico da equidade geracional direciona a atuação do Estado e da
sociedade no sentido de reserva parte do patrimônio arqueológico já identificado
para a geração futura, que exercerá sobre este, parcela decisória acerca de sua
destinação, podendo, inclusive, decidir novamente pela reserva para as vindouras
gerações. É, nesse enfoque, um princípio indica um caminho de resguardo para a
humanidade da memória materializada.
A transtemporariedade está intrinsecamente ligada com as características dos
bens arqueológicos, especialmente com a de ter uma base de dados finita e não renovável, a
de depender da produção de conhecimentos de diversas disciplinas, a de ter a metodologia
arqueológica com método principal de investigação (metodologia esta que se modifica a partir
das construções doutrinárias sobre a matéria) e a de portar um valor social (essencialmente
dinâmico e mutante), o qual justifica sua investigação, preservação e desfrute.
Os dados para a ponderação acerca da reserva do material arqueológico, seja
pela conservação in situ, seja pela guarda adequada do material em laboratório sem a
56
descontextualização de seu conjunto, para uma fruição futura (produção científica, utilização
com finalidades sociais, dentre outros) são fornecidos pela Constitucional tanto pela previsão
de garantia do acesso às fontes da cultura nacional (art. 215), bem como entendimento
expresso em vários dispositivos de que a produção do saber cultural, o desenvolvimento
científico e a capacitação tecnológica ainda estão em construção em nosso país, em um
processo de evolução contínua, que depende do Poder Público, da sociedade e do
fortalecimento dos processos decisórios públicos e participativos, (MACHADO, 2013, p.47):
Sem dúvida, será sábio que, na era da precaução, as comunidades científicas
cheguem a estruturar ou a reforçar instância coletivas de expertise, situadas a uma
distância suficiente, tanto das administrações públicas como dos meios industriais e
financeiros ou de organizações militantes. Ao mesmo tempo, certos papéis, como
aqueles que tocam à definição dos problemas e das soluções aceitáveis, abrem-se,
principalmente, ao cidadão através do debate público. É da interação entre o
especialista e o cidadão, que se poderá esperar a formulação mais razoável das
normas de comportamento face aos riscos, aos quais se pretende aplicar o princípio
da precaução.
Cabe ao Estado proporcionar previsão de lei para estabelecer incentivos para a
produção e conhecimento de bens e valores culturais (§3º do art. 216), promover e incentivar
o desenvolvimento científico, a pesquisa e a capacitação tecnológica (art. 218, caput), dar
tratamento prioritário à pesquisa científica básica, nesta incluída a pesquisa com metodologia
arqueológica (§3º do art. 218), apoiar a formação de recursos humanos nas áreas de ciência,
pesquisa e tecnologia e conceder aos que dela se ocupem, meios e condições especiais de
trabalho (§3º do art. 218).
Art. 218. O Estado promoverá e incentivará o desenvolvimento científico, a
pesquisa e a capacitação tecnológicas.
§ 1º - A pesquisa científica básica receberá tratamento prioritário do Estado, tendo
em vista o bem público e o progresso das ciências.
§ 2º - A pesquisa tecnológica voltar-se-á preponderantemente para a solução dos
problemas brasileiros e para o desenvolvimento do sistema produtivo nacional e
regional.
§ 3º - O Estado apoiará a formação de recursos humanos nas áreas de ciência,
pesquisa e tecnologia, e concederá aos que delas se ocupem meios e condições
especiais de trabalho.
§ 4º - A lei apoiará e estimulará as empresas que invistam em pesquisa, criação de
tecnologia adequada ao País, formação e aperfeiçoamento de seus recursos humanos
e que pratiquem sistemas de remuneração que assegurem ao empregado,
desvinculada do salário, participação nos ganhos econômicos resultantes da
produtividade de seu trabalho.
§ 5º - É facultado aos Estados e ao Distrito Federal vincular parcela de sua receita
orçamentária a entidades públicas de fomento ao ensino e à pesquisa científica e
tecnológica.
57
O conhecimento e a interpretação do patrimônio arqueológico, com
questionamentos e interpretações pela próxima geração deve, ao mesmo tempo, possibilitar a
produção e utilização dos dados colhidos de acordo com os fatores políticos, sociais,
econômicos, culturais e tecnológicos disponíveis e importantes para o momento e a
ponderação acerca da decisão de reservar, integral ou parcialmente, o estoque arqueológico
pronto para ser explorado ou adiar o próprio processo decisório sobre tal exploração para o
futuro:
A democracia ambiental insere assim na teoria constitucional contemporânea, em
caráter inovador, a participação de interesses não atuais como elemento pertinente e
relevante a se considerado e efetivamente integrante dos processos de decisão.
A democracia ambiental deve permitir que também os interesses e direitos das
gerações futuras não sejam lesados, não apenas através da fiscalização da idoneidade
da representação de seus interesses, mas, sobretudo, mediante a reserva da decisão à
participação de seus legítimos interessados.
Essa reserva de decisão mostra-se possível graças à proteção de condições e
garantias de que, sempre que se identifique potencial referência a seus interesses, o
processo democrático atual deve limitar sua atuação, reservando tais problemas
pontuais para a apreciação futura e pertinente de seus interessados, protegendo em
um novo sentido republicano a participação de titulares não atuais, e sobretudo a
autonomia política desses titulares(...) (MORATO LEITE, 2000, p. 251).
A Declaração sobre as Responsabilidades das Gerações Atuais para as
Gerações Futuras, Paris, UNESCO, 1997, estabelece que a liberdade de escolha deve se
equânime entre as gerações e que é importante que sejam tomadas todas as providências
necessárias para que as gerações presentes e futuras possam preservar sua diversidade
cultural. Nesse sentido, vale trazer outra vertente igualmente importante do princípio a
equidade intergeracional, que é o direcionamento das políticas públicas e das ações
afirmativas para valorização dos grupos formadores da sociedade brasileira menos favorecida:
as comunidades indígenas e as remanescentes de quilombos.
A Constituição, para demonstrar a importância da comunidade afro-brasileira
com grupo participante do processo civilizatório nacional e a necessidade de possibilitar a
manutenção dos elementos culturais para as gerações futuras, determinou a conservação in
situ das áreas remanescentes de quilombo, com o tombamento constitucional dos sítios
detentores de reminiscências históricas dos antigos quilombos (§5º do art. 216), com o
reconhecimento da propriedade da terra (art. 68 do ADCT). No mesmo sentido, de
conservação dos elementos culturais significativos para as próximas gerações no espaço
geográfico tradicionalmente ocupado, o art. 231 estabelece que "são reconhecidos aos índios
sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre
as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer
respeitar todos os seus bens".
58
2.5.4 Princípio da participação comunitária ou participação cidadã
Segundo Didier Júnior (2010, p.23) na Roma antiga já existia uma concepção
de responsabilidade e cuidado do cidadão em relação à República que dizia:
Ao cidadão era atribuído o poder de agir em defesa da coisa pública em razão do
sentimento, do forte vínculo natural que o ligava aos bens públicos lato sensu, não
só em razão da relação cidadão/bem público, mas também pela profunda noção de
que a República pertencia ao cidadão romano, era seu dever defendê-la. Daí o
brocardo Reipublicae interest quan plurimus ad defendam suam causa (interessa à
República que sejam muitos os defensores de sua causa)”.
Todavia, para Mancuso (1998, p.37), tal concepção tem origem grega e foi
adotada pelos romanos.
Quanto ao princípio ambiental, ele nos indica que toda e qualquer pessoa, tem
o direito de participar ativamente das decisões políticas ambientais, em decorrência do
sistema democrático, uma vez que os danos ambientais são transindividuais, estando
implicitamente consagrado no art. 225 da Constituição da República.
Exemplo deste princípio é a necessidade da realização de Audiências Públicas
em licenciamentos ambientais mais complexos (EIA-RIMA), nas hipóteses previstas pela
Resolução do CONAMA 09/1987; na qual esta exigência e imprescindível na criação de
Unidades de Conservação (consulta popular); na legitimação para propositura de ação popular
ou mesmo no tradicional direito fundamental de petição ao Poder Público.
A declaração do Rio/92 seguiu essa tendência ao cristalizá-lo no Princípio 1014:
A melhor maneira de tratar questões ambientais é assegurar a participação, no nível
apropriado, de todos os cidadãos interessados. No nível nacional, cada individuo
deve ter acesso adequado as informações relativas ao meio ambiente de que
disponham as autoridades públicas, inclusive informações sobre materiais e
atividades perigosas em suas comunidades, bem como a oportunidade de participar
em processos de tomada de decisões. Os Estados devem facilitar e estimular a
conscientização e a participação pública, colocando a informação à disposição de
todos. Deve ser propiciado acesso efetivo a mecanismos judiciais e administrativos,
inclusive no que diz respeito à compensação e reparação de danos.
Nesta pesquisa verificou-se que no caso do Projeto Habitacional Nova Cidade
houve uma denúncia de moradores sobre a destruição do sítio arqueológico, o que foi
comprovado pela fiscalização do IPHAN e culminou com a adequação da obra, mas
infelizmente os danos ao bem arqueológico são irreversíveis.
14Disponível em: http://www.onu.org.br/rio20/img/2012/01/rio92.pdf> acesso em: 15 de fevereiro de 2014.
59
2.5.5 Princípio da função socioambiental da propriedade
É comum hoje abordar o tema da função socioambiental da propriedade, uma
vez que um dos requisitos para que a propriedade rural alcance a sua função social é o
respeito à legislação ambiental (art. 186, II, da CF/88), assim como a propriedade urbana, haja
vista, que o plano diretor deverá necessariamente considerar a prevenção ambiental, a
exemplo da instituição de áreas verdes.
Um ponto importante previsto no art. 1.228, § 1º do Código Civil, um caso de
norma ambiental transversal inserida neste diploma legal e que permeia todos os ramos do
Direito, “o direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as suas finalidades
econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade com o estabelecido
em lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio
histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas”.
2.5.6 Princípio da Conservação pelo Registro Científico
Pelo princípio da conservação pelo registro científico (ou princípio da
publicidade da pesquisa arqueológica) os dados colhidos pelos pesquisadores/arqueólogos, em
razão de pesquisa programada e autorizada ou, em virtude de descobertas fortuitas de bens
arqueológicos, devem ser publicados, com análises e interpretações que venham a público e
possam ser conhecidas e debatidas por todos, para tornar o trabalho científico acessível à
comunidade, especialmente aos grupos formadores da sociedade brasileira, que tenham ou
possam ter ligação com os objetos ou sítios estudados.
Esse princípio está amparado constitucionalmente nas disposições do art. 215,
caput, art.218,§ 2º, e no art. 225, §1º, VI, e tem duas vertentes extremamente importantes para
promoção, proteção e preservação dos bens arqueológicos, as quais interagem
constitucionalmente: a)a do fortalecimento da pesquisa e produção arqueológica; b)a
educação arqueológica, com informação arqueológica básica para a comunidade, advinda dos
resultados da produção acadêmica, com fim de proporcionar participação ampla.
As Portarias IPHAN nº 007/88 e 230/02 estabelecem as informações e dados
que devem ser apresentados tanto para obtenção das permissões e autorizações como ao final
das pesquisas. A Portaria IPHAN nº 007/88, impõe com obrigação para o coordenador, a
apresentação ao término da pesquisa, de relatório final, redigido em língua portuguesa, com
60
os seguintes dados: a)meios utilizados durante os trabalhos, medidas adotadas para a proteção
e conservação e descrição do material arqueológico, indicando a instituição responsável, pela
guarda e com será assegurado o desenvolvimento da proposta de valorização do potencial
científico, cultural e educacional; b) planta(s) e fotos pormenorizados do sítio arqueológico
com indicação dos locais afetados pelas pesquisas e dos testemunhos deixados no local;
c)fotos do material arqueológico relevante; d) planta(s), desenhos e fotos das estruturas
descobertas e das estratigrafias reconhecidas; e) planta(s) com indicação dos locais onde se
pretende o prosseguimento das pesquisas em novas etapas; f)indicação dos meios de
divulgação dos resultados; g) listagem dos sítios arqueológicos cadastrados durante o
desenvolvimento do projeto; h) relação definitiva do material arqueológico recolhido em
campo e informações sobre seu acondicionamento e estocagem, assim como indicação precisa
do responsável pela guarda e manutenção desse material.15
O fortalecimento da pesquisa e produção arqueológica traz aos pesquisadores
e aos centros de produção de conhecimento (no Brasil, quase sempre ligados a Universidade
Públicas) a obrigação de manter reunidos os dados ou os artefatos para outros estudos no
futuro, bem como divulgar, contemporaneamente, os resultados dos trabalhos, como forma de
interação com a sociedade. Assim, a conservação pelo registro é um princípio que direciona a
comunidade entre a academia e a comunidade.
Segundo Funari (2003, p.109):
Um arqueólogo precisa estar convicto de que qualquer escavação deve resultar em
uma publicação, acessível à comunidade científica. Portanto, artefatos descobertos
não podem ficar abarrotando dos depósitos, inéditos; análises e interpretações têm
de vir a público e ser debatidas. Para tanto, em diversos países, há regulamentos
públicos que só permitem que os arqueólogos desenvolvam projetos se publicarem
tanto o relato da escavação quanto o material arqueológico recolhido. E finalmente,
ser arqueólogo implica no cotidiano das pessoas, de forma a torná-los significativos
para a sociedade geral.
Para Funari (2006, p.32):
O aparato tecnológico atual permite que a autoridade competente exija, quando da
autorização da pesquisa, a divulgação por meio digital do resultado, bem como
estabelece as obrigações aos pesquisadores para a divulgação imediata de dados não
sensíveis e que não prejudiquem seu direito de propriedade científica ou mesmo a
transmissão de imagens em tempo real.
Além disso, a importância do registro supera as discussões acadêmicas acerca
da prevalência de uma ou outra metodologia ou corrente arqueológica, com ressalva Pardi
(2002, p.56):
"[...]sem interferir na liberdade de pesquisa e produção de conhecimento, a GPA
[Gestão Patrimonial Arqueológica] necessita que os registros físicos sejam
15Cf. art. 11, incisos II a VII, e art.12, incisos I, II e III da Portaria IPHAN nº 007/88.
61
respeitados em todo o potencial que representam. Dessa forma, interferências nos
sítios devem ser efetivados apenas quando se tiver garantias de registro integral dos
materiais e dados. Nesse sentido, mesmo que os pesquisadores não possam oferecer
maior alcance teórico as suas interpretações, podem ser importantes para a GPA,
desde que escavem e registrem o bem, face ao quadro de acelerada destruição de
nosso patrimônio [...]
Dessa forma, entendemos que acima dos interesses científicos vigentes na época,
para onde quer que o pêndulo esteja apontado, temos os compromissos e
responsabilidade com a preservação do patrimônio, com parâmetros muito mais
estáveis e passíveis de consenso, inclusive porque regulados por legislação.
Portanto, cabe-nos um trabalho de detalhar estas condições e uniformizar
procedimentos básicos de coleta e escavação, inclusive para podermos permitir que
o conhecimento teórico avance e os sítios possam ser revisitados por diferentes
interesses."
A destinação de recursos e incentivos para programas de pesquisa e programas
educacionais devem se dar paralelamente pois, de nada adianta a obrigatoriedade da
conservação dos dados produzidos, se não há apoio às pesquisas e à produção científica, com
aporte de recursos materiais para que se desenvolvam a longo prazo:
Não há política adequada de gestão, tanto no que se refere ao patrimônio
monumental como ao não monumental, que não decorra de uma avaliação, a qual, por sua
vez, depende de um estado de conhecimento. Neste último, se baseará, por sua vez, a
definição de prioridades de investimento ou de conservação.
Deste modo, a gestão do patrimônio arqueológico em todas as suas vertentes é
indissociável do apoio à investigação científica, apoio tanto mais necessário quanto, hoje em
dia, a exploração adequada da informação arqueológica exige crescentemente o recurso a
método derivados da física e das ciências naturais, competindo à administração central, na
situação presente, desempenhar um forte papel impulsionador do respectivo desenvolvimento.
Ainda no que tange ao direito de informação e acesso da sociedade ao teor das
pesquisas, a Carta de Nova Delhi16 fornece a fundamentação para o princípio da publicidade
da pesquisa arqueológica indicando, inclusive, a necessidade de fixação de prazos temporais
razoáveis para a publicação de relatórios preliminares e para apresentação do conjunto de
objetos provenientes da pesquisa. Ressalta a competência da autoridade administrativa para
controle da pesquisa e do produto desta, bem como o respeito pelo pesquisador e a garantia da
propriedade científica de suas descobertas por um determinado período. Daí, destaca ser
prescindível a sua autorização quando a disponibilização do material se der em prazo inferior
ao previsto em norma.
16Este documento foi produzido pela Conferência Geral da ONU para a Educação, a Ciência e a Cultura, em
Nova Delhi de 5 de novembro de 1956, é Recomendação que define os princípios internacionais a serem
aplicados em matéria de pesquisa arqueológicas.
62
Desse modo, o princípio da conservação pelo registro traz o aspecto
importantíssimo do envolvimento da comunidade local para a proteção do patrimônio
arqueológico. Direciona não somente a atuação do pesquisador, mas também o Poder Público
na elaboração de políticas patrimoniais que contemplem a obrigatoriedade de publicidade do
objeto das pesquisas com a finalidade de despertar a comunidade para a importância dos bens
arqueológicos, Soares (2007, p.109):
A pesquisa das representações sociais sobre o entendimento dos sítios arqueológicos
mostrou alguns indicativos que merecem atenção na formulação das políticas
públicas de preservação do patrimônio arqueológico.
Nas questões relacionadas com o conhecimento do objeto, fica claro que a maioria
das comunidades que vivem no entorno dos sítios arqueológicos têm conhecimento
da sua existência e mais que isso atribui valor simbólico e importância aos sítios,
chegando em alguns casos a reconhecer o sentimento de pertencimento. Isso remete
necessariamente a um repensar o aporte de intervenção dos arqueólogos junto às
comunidades, corroborando a idéia até aqui defendida por nós de possibilitar o
engajamento da comunidade no processo da pesquisa arqueológico desde o começo,
reservando parte das energias da equipe de pesquisa na interlocução constante com
os membros da população local, no sentido de perenizar o sentimento de pertença
destas populações.
Esse princípio pode embasar a participação social na escolha de investimentos
públicos (por via do orçamento participativo, por exemplo) ou de aporte de recursos privados
para a proteção dos bens arqueológicos. Essas descobertas e sua divulgação devem
proporcionar a inclusão dos sítios ou artefatos arqueológicos no cotidiano da comunidade (de
preferência, da comunidade local), a qual deve ter prioridade no acesso e fruição dos
conhecimentos advindo desses bens. Paulo Affonso Leme Machado aponta, porém, que:
Uma ordem hierárquica no acesso aos bens ambientais observará a proximidade ou
vizinhança dos usuários com relação aos bens. Podemos dizer que a propriedade no
uso dos bens deve percorrer uma escala que vai do local ao planetário, passando pela
região, pelo país e pela comunidade de países. (MACHADO, 2013, p.57).
A participação pelo acesso às fontes culturais é direito de todos, prevista no art.
215 da Constituição. Mas, além de direito é também dever, vez que a Constituição Federal, no
art. 216, §1º, e na parte final do caput do art. 225 impõe à coletividade o dever de defender e
preservar o meio ambiente. Para ser efetiva, a participação necessita da veiculação da
informação e do acesso aos dados técnicos pela comunidade. Para isso, faz-se necessária a
publicação especializada, bem como a divulgação das pesquisas em linguagem acessível.
Esse princípio guarda estreita relação com o princípio da educação patrimonial,
tendo reflexo direto na proteção e na gestão do patrimônio arqueológico de forma
participativa e integrada.
É um princípio direcionador das políticas públicas para valorização do patrimônio
arqueológico, já que sem conhecimento da matéria, não existe possibilidade de que
os bens arqueológicos sejam reconhecidos com depositários de referências
63
identificadoras da formação histórica e dinâmica sociocultural da comunidade e do
povo brasileiro. (PARDI, 2002, p.58).
A educação ambiental pode ajudar a divulgar achados arqueológicos e a sua
importância como bens identificadores da formação histórica do povo brasileiro.
2.5.7 Princípio da conservação in situ
O princípio da conservação in situ atribui ao Estado à obrigação de manutenção de
um determinado número de sítios arqueológicos, de diversas épocas, intactos, total ou
parcialmente, para que sua exploração possa ser beneficiada pelos progressos da técnica e
pelo avanço dos conhecimentos arqueológicos . Esse princípio decorre da concepção de que o
conhecimento de nossa pré-história (e história) depende da disponibilidade de uma base
representativa de recursos para as futuras gerações, necessitando periodicamente de releitura
sob a ótica do avanço teórico, metodológico e tecnológico, ou mesmo em decorrência da
sensibilidade interpretativa e criativa do ser humano em face de tais avanços.
A base constitucional desse princípio está no art. 215, que prevê a garantia pelo
Estado, a todos, do acesso às fontes da cultura nacional e, no art. 225, caput, que estabelece
como dever do Poder Público e da coletividade a preservação do meio ambiente para as
futuras gerações. Está baseado também no art. 3º da Lei nº 3.924/61 que exige a conservação
in situ dos sítios arqueológicos ou pré-históricos até realização de todas as pesquisas
necessárias, para posteriormente, se for o caso, autorizar a exploração dos recursos
arqueológicos.
2.6 LEGISLAÇÃO APLICADA
Segundo Soares (2007, p.7) A tutela do patrimônio arqueológico inicia-se na
primeira metade do século XX e mesmo assim não foi suficiente para superar o
distanciamento da sociedade brasileira em relação à matéria arqueológica. Com o advento de
lei federal específica no início dos anos 60, que trata dos bens arqueológicos (reflexo das
normas internacionais produzidas), e a criação de uma estrutura administrativa normativa apta
para proteção desses bens também não cumpriu a finalidade da tutela efetiva.
A produção acadêmica e científica de material arqueológico, bem como a sua
divulgação ficam restritos a grupos de pesquisadores e estudiosos, sem repercussão
socialmente relevante, inclusive no plano jurídico, apesar da enorme importância do
64
patrimônio arqueológico para a compreensão dos elementos que integram a memória e a
identidade dos brasileiros e dos possíveis reflexos socioeconômicos (positivos e negativos)
que podem advir da tutela desse patrimônio.
A ausência de civilizações pré-históricas empreendedoras de sítios
arqueológicos monumentais (altas civilizações) tenha contribuído sobremaneira para o
aludido distanciamento da comunidade e para a falta de atenção da sociedade e do Poder
Público, o que também se reflete na escassa produção jurídica relativas ao tema. Adiciona-se
ao comentado distanciamento, o fato da completa desvalorização da cultura (material e
imaterial) e do cotidiano dos grupos formadores da sociedade brasileira, com ênfase aos
grupos dominados e da camada mais pobre da sociedade.
Para Soares a tutela do patrimônio arqueológico se fortaleceu com o avanço do
movimento socioambiental no Brasil, que integrou a visão dos aspectos ecológicos, culturais e
econômicos e a previsão de instrumentos judiciais e extrajudiciais específicos para a proteção
ambiental.
Além de questões ligadas a desvalorização dos bens culturais, outros
problemas vem afetando a tutela do patrimônio arqueológico: como os impactos decorrentes
do crescimento populacional, da expansão dos grandes centros urbanos, da remoção de terra
para realização de grandes obras de engenharia e da ampliação de atividades poluidoras
economicamente rentáveis e socialmente importantes, especificamente para a geração de
empregos.
A Constituição da República de nosso país, promulgada em 1988, trouxe de
modo claro tanto na Ordem Social, especialmente pelos dispositivos que tratam sobre os bens
culturais, patrimônio cultural e meio ambiente, como na Ordem Econômica. Sob a ótica
relacionada ao patrimônio cultural arqueológico, apresentam-se duas vertentes protetivas: a) a
tutela como bem ambiental cultural e b) a tutela como bem cultural instrumental, pelo valor
per se dos bens arqueológicos.
Soares nos explica que as obras ou atividades potencialmente lesivas ao
patrimônio arqueológico se submetem a ambas vertentes relatadas. Todavia, na ótica do bem,
como bem ambiental cultural, existem inúmeros princípios e instrumentos jurídicos
adequados e amplamente utilizados, os quais atendem à finalidade protetiva, baseados no
direito ambiental. O que não acontece com o enfoque tutelar do bem arqueológico como bem
cultural instrumental, quando há carência de fundamentação jurídica adequada para a matéria,
65
a começar pela falta de princípios ou instrumentos jurídicos que atendam às especificidades
dos bens arqueológicos dentro da realidade brasileira.
A Constituição recepcionou a noção contemporânea de patrimônio cultural e,
sem conceituá-lo adaptou os elementos imprescindíveis para o tratamento desta matéria à
nossa realidade social, econômica e cultural. Os artigos 215, 216 e 225 da Constituição
indicam as bases estruturantes para o tratamento jurídico da matéria: a) a concepção de direito
ao patrimônio cultural como direito fundamental; b) a concepção unitária do meio ambiente;
c) a concepção dos bens culturais como bens de interesse público; d) a função social da
propriedade; e) a concepção de referencialidade como forma de valorização e fortalecimento
da identidade cultural dos grupos vulneráveis e das minorias étnicas; f) a consideração do
patrimônio intangível como elemento do patrimônio cultural brasileiro; g) a concepção da
diversidade cultural fundada na valorização dos grupos formadores da sociedade brasileira; h)
a previsão do dever de atuação democrática do Poder Público na proteção e promoção de bens
culturais; i) o dever de participação da sociedade na tutela dos bens culturais; j) a previsão da
equidade no acesso e na fruição dos bens culturais; e l) a submissão das atividades lesivas ao
patrimônio ao controle do Estado.
O art. 216, § 1º da Constituição estabelece nominalmente como instrumentos
de proteção do patrimônio cultural brasileiro os inventários, registros, vigilância, tombamento
e desapropriação. Os citados instrumentos são meramente exemplificativos já que, em
seguida, no próprio dispositivo, há referência a “outras formas de acautelamento”, juntos
trazem três conseqüências jurídicas: a) a ampliação dos modos de tutela dos bens culturais no
Brasil; b) a extensão dos titulares para a tutela dos bens culturais no Brasil; e c) a abertura da
formação do patrimônio cultural brasileiro por instrumentos não regulamentados.
Entre os instrumentos previstos na legislação podemos citar os seguintes:
Inventário - mais que um instrumento de proteção dos bens culturais, é uma
forma de organização das informações acerca do patrimônio cultural, que permite
conhecimento e planejamento das ações do Poder Público para tutela dos bens.
O inventário assume importância especial em decorrência de sua previsão
constitucional. Não existe norma específica que trate do inventário como instrumento de
proteção do patrimônio cultural em nosso país, o que leva os juristas a destacarem a
necessidade dessa produção normativa para o seu uso. Porém, neste trabalho defende-se
posicionamento diferente.
66
A produção dos dados, a catalogação dos bens culturais, a manutenção dos
recursos humanos e financeiros para produção dos inventários, dentre outros, passa a ser uma
obrigação do Poder Pública em um direito subjetivo do indivíduo e da comunidade. A visão
constitucional valoriza a informação, já que, somente por meio desta, a participação da
comunidade pode ser efetiva. Por isso os efeitos jurídicos do inventário para o proprietário do
bem inventariado não são o enfoque principal do instrumento, que possui um caráter
eminentemente preventivo e sistematizador. Além de ocasionar o afastamento dos inventários
de seu objetivo que é a formação da memória coletiva para o acesso do patrimônio pela
coletividade.
A definição do regime jurídico a que estão sujeitos os bens inventariados é
necessário para que os proprietários do bem inventariado e o Poder Público tenham clara a
necessidade de sua preservação. Porém, os inventários dos bens culturais são, muitas vezes,
instrumentos de trabalho fundamentais para a elaboração de estratégias de proteção do
patrimônio cultural, ao mesmo tempo em que constituem fontes primárias de dados para
pesquisa e estudo científico.
O inventário é, portanto, um processo que envolve várias etapas na produção
de conhecimento sobre determinados bens culturais com a finalidade de fornecer a
identificação do patrimônio cultural. É, antes de tudo, um instrumento de precaução ou
prevenção que pode ser exigido pela comunidade ou pelo Poder Público no caso de realização
de obras ou serviços que possam causar impacto ao patrimônio cultural material ou imaterial.
É também um instrumento que possibilita a constituição da importância do bem cultural para
a região.
Os inventários gerais de potencial arqueológico constituem instrumentos de
trabalho essenciais para elaborar estratégias de proteção ao patrimônio arqueológico. Ao
mesmo tempo, constituem fontes primarias de dados para pesquisa e estudos científicos. A
compilação de inventários deve ser considerada como um processo dinâmico permanente.
Resulta disso também que os inventários devem integrar a informação em diferentes níveis de
precisão e de fiabilidade, uma vez que o conhecimento, mesmo superficial, pode fornecer um
ponto de partida de proteção.
A Vigilância é um instrumento mencionado na Constituição, mas que também
ainda não está regulado na legislação ordinária. Assim como quanto ao inventário, a posição
defendida nesta tese é de não haver necessidade de uma legislação, ou mesmo uma norma
administrativa específica para regular este instrumento. A vigilância é puro exercício das
67
atribuições que são inerentes aos órgãos diretamente responsáveis pela proteção de bens
culturais e pelo zelo dos interesses públicos. Significa o afastamento constitucional de uma
conduta estatal omissa em relação ao patrimônio cultural. Indica ao mesmo tempo o exercício
do poder de polícia na tutela dos bens culturais.
Celso Antônio Bandeira de Mello (2000, p. 733) define polícia administrativa
como:
Atividade da Administração Pública, expressa em atos normativos ou concretos, de
condicionar, com fundamento em sua supremacia geral e na forma da lei, a liberdade
e a propriedade dos indivíduos, mediante ação ora fiscalizadora, ora preventiva, ora
repressiva, impondo coercitivamente aos particulares em dever de abstenção (‘non
facere’) a fim de conformar-lhes os comportamentos aos interesses sociais
consagrados no sistema normativo.
A vigilância, para o Poder Público, tem um duplo aspecto: o dever de agir e o
dever de não se omitir. As expressões sejam próximas, trazem sentidos diferentes. O dever de
se omitir exige que o Poder Público invista em recursos humanos e financeiros para tutelar os
bens culturais. Além de estabelecer e aprimorar os mecanismos administrativos com a
finalidade de atender num prazo razoável as demandas da sociedade em relação a esses bens.
Desse modo, a vigilância refuta a morosidade e a indica que a proteção do patrimônio cultural
deve ser com agilidade.
A comissão tem o teor de ação, de atuação, de empreender atos para a proteção
do patrimônio cultural, condicionando os que estão de posse de um bem cultural ou que
exercerão atividade potencialmente causadora de dano ao patrimônio cultural a um
comportamento de cuidado com o bem cultural. A vigilância se revela por atos normativos e
atos fiscalizadores.
Assim, pode se indicar como formas de realização do instrumento: a delegação
de tarefas; a produção de informações, inclusive com um banco de dados informatizados; a
coordenação entre os poderes públicos; e articulação de tarefas entre os poderes públicos e
setor privado. O instrumento de vigilância também guarda estreita ligação com o princípio da
precaução. Portanto, conduz ao dever de ação perante o risco e a obrigação de atuar para a
produção de informações sobre o risco. A ação imediata dos Poderes Públicos quanto a esses
riscos se apresentam concretamente indica a utilização dos instrumentos do inventário e da
vigilância.
A vigilância é um instrumento de gestão do patrimônio cultural e engloba
aspectos ligados à prevenção, à restauração e à segurança. A União, os Estados, o Distrito
Federal e os Municípios podem exercer a Vigilância já quem têm competência comum para
proteção do patrimônio cultural (art.23, III e IV). Os municípios podem também utilizar esse
68
instrumento no que tange aos aspectos de seu peculiar interesse (art. 30, IX, da CF). Mais do
que competência legislativa sobre o patrimônio cultural, incube aos municípios a efetiva
proteção, por meio de ações concretas de todos os bens culturais existentes em seu território.
Os municípios devem impedir a evasão, a destruição e a descaracterização dos bens culturais,
fazendo uso de seu poder de polícia.
O instrumento de vigilância é instrumentalizado nas portarias do IPHAN que
estabelecem o modo de atuação dos pesquisadores e dos empreendedores e exigem prévia
autorização do órgão para que as atividades possam ser realizadas. A participação do IPHAN
deve-se dar em todas as fases de autorização de atividade que cause impacto no patrimônio
arqueológico (Portaria IPHAN 007/88 E 230/02).
No mesmo sentido vale ressaltar as Portarias IPHAN que autorizam a guarda
provisória do material arqueológico por instituições privadas ou públicas destinadas à
pesquisa ou aproveitamento do material para fins científicos ou sociais. As Portarias são
temporárias e cabe ao IPHAN uma vigilância permanente, para que os bens sejam
acondicionados e conservados sem perderem suas características essenciais. Ainda, no que
tange à vigilância cabe ao IPHAN autorizar a saída do país de bens de interesse arqueológico
ou pré-histórico, nos termos dos arts. 20 e 21 da Lei nº 3.924/86, in verbis:
Art 20. Nenhum objeto que apresente interêsse arqueológico ou pré-histórico,
numismático ou artístico poderá ser transferido para o exterior, sem licença expressa
da Diretoria do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, constante de uma "guia"
de liberação na qual serão devidamente especificados os objetos a serem
transferidos.
Art 21. A inobservância da prescrição do artigo anterior implicará na apreensão
sumária do objeto a ser transferido, sem prejuízo das demais cominações legais a
que estiver sujeito o responsável. Parágrafo único. O objeto apreendido, razão dêste artigo, será entregue à Diretoria
do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional.
Porém, a vigilância não implica apenas no cumprimento das obrigações legais
pelo Poder Público, mas principalmente no dever de não se omitir. Desse modo, o IPHAN
deve buscar constantemente a atualização das normas de controle de transito de bens
culturais, evitando o comércio ilegal de bens arqueológicos, que hoje se desenvolve não
apenas pelos meios tradicionais, mas também pela internet.
O Tombamento é o instrumento tradicionalmente vinculado à tutela do
patrimônio cultural brasileiro. A proteção por esse instrumento é possível desde os anos trinta
do século passado, com a sua previsão no Decreto-Lei nº 25/37. Essa norma relaciona, no art.
1º, os bens que integram o patrimônio histórico e artístico nacional e ressalva n § 1º que “os
bens relacionados só serão considerados parte do patrimônio histórico e artístico nacional,
69
depois de inscrito separada ou agrupadamente num dos quatro livros do Tombo”. Nas
palavras de Pires (1994, p.85):
O referido documento, ao traçar as diretrizes básicas de proteção à cultura no Brasil,
considera como objeto de tombamento, pelo seu interesse público, os bens móveis
ou imóveis, privados ou públicos, e ainda eclesiásticos, quer por sua vinculação a
fatos memoráveis da história, quer por seu excepcional valor arqueológico,
etnográfico, bibliográfico ou artístico, bem como os monumentos naturais, os sítios
e paisagens particularmente dotados pela natureza. O Decreto-Lei n. 25/37 sobrevive
no tempo sem alterações substanciais no que se refere ao objeto.
Com o tombamento há uma nova situação jurídica na qual se submetem o bem
e os que com ele se relacionam. Por isso, a quase unanimidade da doutrina entende que o
instrumento tem natureza constitutiva na maioria das situações de tombamento.
Pires (1994, p.123) destaca:
Não é o Decreto-Lei nº 25 que confere proteção especial a este ou àquele bem. O
surgimento de direitos e deveres para o Estado, o proprietário e o cidadão em geral,
nesse caso, coincide com a edição do ato administrativo que concretiza a hipótese
legal.
Em sentido semelhante Souza Filho (2011, p.29) entende que:
a proteção de um bem cultural começa por sua individualização, para que ele possa
ser exatamente localizado, público e reconhecido como bem cultural preservável. Ao
ser individuado, o bem jurídico ganha status de cultural – ou histórico ou artístico
etc., é modificada em profundidade sua essência jurídica, e por isso não só o
conceito de bem cultural como processo de sua constituição estão expressos na lei,
quer dizer, tem relevância jurídica.
No mesmo sentido, Silva (2007, p.160) nos diz:
[...] o tombamento é que constitui o bem tombado em patrimônio cultural nacional,
estadual ou do Distrito Federal e municipal. Ele produz efeitos sobre a esfera
jurídica dos proprietários, privados ou públicos, dos bens tombados, impondo
restrições ao direito de propriedade, e cria para eles um regime jurídico especial,
transformando-os em bens de interesse público.
Todos os bens culturais arqueológico já são integrantes do patrimônio cultural
brasileiro, o que não impede que estes sejam tombados na medida em que seja descoberto e
avaliado seu potencial arqueológico, etnográfico ou paleontológico. Neste caso o tombamento
é declaratório, porque torna pública uma qualidade já existente no bem.
A Desapropriação é um instrumento, destinado aos bens culturais materiais,
que deve ser utilizado como último recurso administrativo para tutela do bem. Isso porque, de
acordo com o princípio da função social da propriedade, cabe ao detentor do bem portador de
valor cultural suportar o ônus que dele decorre. Ao mesmo tempo somente a excepcionalidade
justifica que o Estado se torne proprietário de bens culturais como nos ensina Miranda (2006,
p.159):
Uma das características do novo modelo preservacionista adotado pelo ordenamento
jurídico brasileiro é de mínimo intervencionismo estatal no que diz respeito às
propriedades privadas que abrigam valores de interesse cultural. A experiência
70
mostrou que o Estado é muito mais eficiente quando atua como fiscalizador do que
como proprietário ou administrador, pelo que a intervenção obtusa (como no caso da
desapropriação) em assuntos dessa natureza mostra-se como a última alternativa.
A desapropriação tem por objeto qualquer bem, móvel ou imóvel, corpóreo ou
incorpóreo que seja objeto de propriedade privada. E podem ser beneficiadas pela
desapropriação pessoas de direito público ou privadas. Mas o importante é que a
desapropriação seja feita em favor de um interesse público.
Segundo o Decreto-lei nº 3.365/41, no seu artigo 5º, estabelece como
desapropriação por utilidade pública: a reedição ou divulgação de obras de invento de
natureza científica, artística ou literária; e a preservação e conservação dos monumentos
históricos e artísticos. Lembrando que os prazos para caducidade da desapropriação com
fundamento em interesse social é de dois anos e por fundamento utilidade pública é de cinco
anos.
Já a Lei 3.924/61, em seu artigo 15, dispõe que é possível desapropriar imóvel
em que se encontrem vestígios arqueológicos. Essa situação é excepcional e deve ser
justificada pela significância do sítio; pela necessidade de conservação in situ e pela
impossibilidade compatibilização da tutela do bem com o uso da propriedade, in verbis:
Art 15. Em casos especiais e em face do significado arqueológico excepcional das
jazidas, poderá ser promovida a desapropriação do imóvel, ou parte dele, por
utilidade pública, com fundamento no art. 5º, alíneas K e L do Decreto-lei nº 3.365,
de 21 de junho de 1941.
O Registro é um instrumento de gestão do patrimônio cultural que pode ser
utilizado tanto pela sociedade como pelo Poder Público. Porém, com regulamentação, por
decreto, da inscrição de bem intangível como patrimônio cultural brasileiro, o registro passou
a ser entendido como instrumento administrativo específico para tutela do patrimônio
imaterial. A conotação de registro como ato de prevenção e de guarda da memória individual
ou coletiva, dos elementos históricos, afetivos, econômicos, culturais ou sociais em um
suporte material ainda é amplamente utilizada, já que é um termo que expressa a
materialidade do patrimônio.
Sem ênfase nos direitos de natureza patrimonial e afastando o bem imaterial da
possibilidade de apropriação indevida por um grupo ou comunidade no momento de sua
fruição, o instrumento do registro busca valorizar e promover o bem cultural sem suporte
material, harmonizando, com sua inscrição, os deveres interesses para que esta possa servir de
recurso cultural a ser compartilhado por toda a sociedade brasileira.
Com advento do Decreto nº 3.551/2000 foi criado o Programa Nacional do
Patrimônio Imaterial e instituído o registro de bens culturais que constituem o patrimônio
71
cultural brasileiro. O registro pode se dar em um dos quatro Livros de registros: 1) Livro de
Registro dos Saberes; 2) Livro de Registro das Celebrações; 3) Livro do Registro das Formas
de Expressão e do 4) Livro de Registro de Lugares. Com o procedimento estabelecido no
Decreto, o bem aprovado administrativamente é inscrito em um dos quatro Livros de
Registros. Com a inscrição, o bem recebe o título de “Patrimônio Cultural do Brasil”.
Entre os bens registrados como Patrimônio Imaterial brasileiros estão: Arte
Kusiwa dos Índios Wajãpi; Ofício das Paneleiras de Goiabeiras; Samba de Roda no
Recôncavo Baiano; Círio de Nossa Senhora de Nazaré; Ofício das Baianas de Acarajé; Viola-
de-cocho e o Jongo.
O sistema normativo interno para a proteção do patrimônio arqueológico é
integrado pela Constituição Federal, pela legislação específica sobre o patrimônio
arqueológico (Decreto-Lei nº 25/37, Lei nº 3.294/61, Lei nº 7.542/86 e Portarias do IPHAN),
por todo sistema jurídico ambiental, especialmente a Lei de Política Nacional de Meio
Ambiente e a Lei de Crimes Ambientais, as Resoluções CONAMA (de modo especial, as
Resoluções 001/86 e 237/97) e pelo sistema processual que ampara a defesa dos direitos
difusos e coletivos.
Os traços mais importantes e específicos sobre o patrimônio arqueológico, no
nosso sistema normativo pátrio são: a) a propriedade pública do bem arqueológico; b) a
proteção conferida diretamente da Constituição e normas infraconstitucionais, sem a
necessidade da submissão dos bens arqueológicos a um instrumento protetivo específico
(tombamento, registro etc.); c) necessidade de permissão ou autorização do IPHAN para a
realização de pesquisas e escavações arqueológicas sejam as mesmas realizadas por
particulares ou pelo Poder Público; d) a previsão de responsabilidade civil, administrativa e
penal para o causador de dano ao patrimônio arqueológico; e) a proibição de aproveitamento
econômico, de destruição ou mutilação de sítio arqueológico antes de serem devidamente
pesquisados e f) a obrigação de implementação de programas de educação patrimonial.
2.6.1 A Constituição e o patrimônio arqueológico
Muito embora, desde a Carta Constitucional de 1934, o patrimônio
arqueológico já tivesse guarida nas expressões que se referiam aos monumentos históricos,
Art. 10, III, da Constituição de 1934, art. 134 da Carta de 1937, art. 175 da Constituição de 1946. a
menção expressa no texto constitucional se deu na Constituição de 1967, que em seu art. 172,
72
parágrafo único, destacou que as jazidas arqueológicas ficavam sob a proteção especial da
União.
A Carta de 1988 faz referência ao patrimônio arqueológico em seus
dispositivos e deixa subentender a natureza difusa desses bens, com a indicação que o Poder
Público deve atuar na sua proteção, proporcionando à sociedade o acesso a estes bens.
Estabelece no art. 20, X, que são bens da União as cavidades naturais
subterrâneas e os sítios arqueológicos e pré-históricos. Dispõe ainda, nos termos do art. 23,
III, que é competência comum da União, dos Estados e dos Municípios proteger os sítios
arqueológicos. Por isso, no exercício da competência comum, devem impedir a evasão, a
destruição e a descaracterização dos sítios ou de artefatos arqueológicos (art. 23, IV), além de
proporcionar meios de acesso à educação e à ciência que sejam revertidos em conhecimento
na matéria arqueológica (art. 23, V) e proteger o meio ambiente e combater a poluição em
quaisquer de suas formas (art. 23, VI).
Os instrumentos de intervenção e controle indicados na Constituição e as
normas de proteção ambiental não se restringem à regulamentação da utilização dos
elementos que integram o meio ambiente. Nem tampouco servem apenas para impor limites
para o desenvolvimento de atividades ou a realização de obras que provoquem ou possam
provocar impactos. O principal objetivo da tutela ambiental é o de garantir a existência, a
proteção do meio ambiente, com a consideração de todos os elementos e bens que o integram,
no tempo e no espaço presente e futuro.
2.6.2 A Lei nº 3.294/61 como norma matriz do sistema protetivo dos monumentos
arqueológicos e pré-históricos
A Lei nº 3.294/61 dispõe sobre monumentos arqueológicos e pré-históricos em
seu art. 1º estabelece que estes sejam de qualquer natureza existente no país e todos os
elementos que os constituem ficam sob a guarda e proteção do Poder Público, de acordo com
a previsão do art. 175 da Constituição de 1946.
A citada Lei deu um tratamento autônomo ao patrimônio arqueológico nacional
e estabeleceu restrições e parâmetros para atividades econômicas que de algum modo
possibilitassem a mutilação ou a destruição de bens arqueológicos. Esta é a norma
direcionadora da proteção do patrimônio arqueológico no país, traz um conteúdo específico,
estabelece os conceitos próprios da matéria e atribui ao IPHAN a competência para o
exercício do seu poder de polícia administrativa para proteção do patrimônio arqueológico. O
73
art. 3º da mesma lei assevera serem “proibidos em todo o território nacional o aproveitamento
econômico, a destruição ou a mutilação, para qualquer fim, das jazidas arqueológicas ou pré-
históricas (…) antes de serem devidamente pesquisados, respeitadas as concessões anteriores
e não caducas.
A característica de bem público é dada ao patrimônio arqueológico no primeiro
artigo da Lei, que coloca a questão da dominialidade dos bens arqueológicos é em segundo
plano. A finalidade dos bens justifica a sua proteção e sua valoração. A exploração econômica
também sofre as limitações em decorrência da finalidade pública, de interesse público cravado
nos bens arqueológicos e pré-históricos (art. 3º).
O art. 8º e seguintes (Capítulos II e III) tratam da competência do IPHAN e do
Ministério da Cultura para as questões administrativas e procedimentais para a realização de
escavações e pesquisas, inclusive as realizadas por particulares, bem como da dominialidade
dos bens arqueológicos. O art. 17 e seguintes (Capitulo IV) versam sobre as descobertas
fortuitas. As descobertas ao acaso encontram igual proteção do Estado e acentua que a posse e
a salvaguarda dos bens arqueológicos não poderá ser de pessoas, mas sim de todos, na figura
do Estado. Qualquer outra forma de guarda de bens arqueológicos deve ser obrigatoriamente
designada através de Portaria específica editada pelo IPHAN para esse fim. Os bens
arqueológicos a serem descobertos em princípio já estão protegidos pelo poder público e
constituem direito imanente ao Estado.
A Lei nº 3.294/61 não diferencia bens imersos e submersos, nem bens de
natureza material ou imaterial. Todas as atividades, como ou sem fins lucrativos, que
envolvam a exploração desses bens ou que de alguma maneira lhes apresentem risco, mesmo
potencial, de dano, devem passar pelo crivo do IPHAN, que detém o Poder de Polícia
administrativo nesse âmbito.
Esse conhecimento específico da matéria arqueológica e a proteção autônoma
desses bens cabe precipuamente ao IPHAN, autarquia federal vinculada ao Ministério da
Cultura, o órgão de tutela e gestão do patrimônio cultural brasileiro, responsável pela tomada
de decisões sobre os recursos arqueológicos. Suas ações são voltadas à identificação, registro,
proteção, conservação, preservação, fiscalização e difusão do patrimônio arqueológico
encontram-se embasados, sobretudo, na Lei nº 3.924/61, Decreto-lei nº 25/37 e nas Portarias
SPHAN nº 07/88, IPHAN nº 230/03.
Como bem ambiental, o patrimônio arqueológico insere-se em outro sistema
protetivo, e, por isso, os princípios orientadores e instrumentos estabelecidos na Lei de
74
Política Nacional de Meio Ambiente somam-se a todas as técnicas, procedimentos e normas
específicas da arqueologia ou advindas de outras áreas. A portaria IPHAN 230/02 assume
uma importância especial dentro do sistema normativo de tutela dos bens, por buscar a
compatibilização as fases do licenciamento ambiental às necessidades protetivas dos bens
arqueológicos.
2.6.3. A Portaria IPHAN nº 230 de 2002
Instrumento que efetivamente pode minimizar os danos arqueológicos
decorrentes das obras e serviços potencialmente lesivos. Essa Portaria tem por finalidade
compatibilizar as fases de obtenção de licenças ambientais com os estudos preventivos de
arqueologia. Para isso, estabelece os procedimentos necessários nas fases de licença prévia
(LP), licença de instalação (LI) e licença de operação (LO).
Dos arts. 1º ao 4º estão estabelecidos os trabalhos arqueológicos a serem
adotados para a composição do EIA/RIMA, e a conseqüente obtenção da Licença Prévia.
Entre a finalização do EIA/RIMA e a expedição da Licença Prévia há o momento da
audiência pública, no qual todos os estudos ambientais, dentre os quais estão os estudos
arqueológicos, serão apresentados e debatidos com a sociedade. Por isso, desde esse momento
é cabível a tratativa da questão da educação patrimonial, a ser trabalhada junto como Poder
Público local, a comunidade leiga e a comunidade arqueológica, num projeto que deve ser
financiado, por força legal, pelo empreendedor, in verbis:
Art. 1 - Nesta fase, dever-se-á proceder à contextualização arqueológica e
etnohistórica da área de influência do empreendimento, por meio de levantamento
exaustivo de dados secundários e levantamento arqueológico de campo.
Art. 2 - No caso de projetos afetando áreas arqueologicamente desconhecidas, pouco
ou mal conhecidas que não permitam inferências sobre a área de intervenção do
empreendimento, deverá ser providenciado levantamento arqueológico de campo
pelo menos em sua área de influência direta. Este levantamento deverá contemplar
todos os compartimentos ambientais significativos no contexto geral da área a ser
implantada e deverá prever levantamento prospectivo de sub-superfície.
I - O resultado final esperado é um relatório de caracterização e avaliação da
situação atual do patrimônio arqueológico da área de estudo, sob a rubrica
Diagnóstico.
Art. 3 - A avaliação dos impactos do empreendimento do patrimônio arqueológico
regional será realizada com base no diagnóstico elaborado, na análise das cartas
ambientais temáticas (geologia, geomorfologia, hidrografia, declividade e
vegetação) e nas particularidades técnicas das obras.
Art. 4 - A partir do diagnóstico e avaliação de impactos, deverão ser elaborados os
Programas de Prospecção e de Resgate compatíveis com o cronograma das obras e
75
com as fases de licenciamento ambiental do empreendimento de forma a garantir a
integridade do patrimônio cultural da área.
A importância, para a proteção do patrimônio arqueológico, dos estudos
arqueológicos serem sincronizados com as expedições de licenças, especialmente da Licença
Prévia, assume maior destaque na consideração da decisão acerca da alternativa locacional e,
dependendo do tipo de obra, nas discussões sobre as mudanças de traçado com a finalidade de
melhor se atender à tutela dos bens arqueológicos.
Nessa fase inicial, vale destacar ainda a relevância do detalhamento do Termo
de Referência para elaboração do Estudo de Impacto Ambiental. A menção genérica que deve
ser feita por levantamento do potencial histórico, cultural e arqueológico deve ser substituída
por termos mais precisos e detalhados que sejam aplicáveis ao caso concreto e que atendam à
proteção do patrimônio arqueológico. Quanto mais claro, objetivo e detalhado o Termo de
Referência, maiores serão as chances de sucesso na utilização dos instrumentos judiciais
(tutela antecipada ou ação civil pública, por exemplo) e extrajudiciais (assinatura de Termo de
Ajustamento de Conduta).
Os artigos 5º e 6º da Portaria 230/02 apresentam os procedimentos a serem
adotados nas fases antecedentes às licenças de instalação (LI) e de operação (LO). A
indicação do art. 5º é de que o Programa de Prospecção preveja também prospecções
intensivas nos locais que sofrerão impactos indiretos potencialmente lesivos ao patrimônio
arqueológico, tais como as áreas de reassentamento de população, expansão urbana o agrícola,
serviços e obras de infraestrutura, in verbis:
Art. 5º - Nesta fase, dever-se-á implantar o Programa de Prospecção proposto na
fase anterior, o qual deverão prever prospecções intensivas (aprimorando a fase
anterior de intervenções no subsolo) nos compartimentos ambientais de maior
potencial arqueológico da área de influência direta do empreendimento e nos locais
que sofrerão impactos indiretos potencialmente lesivos ao patrimônio arqueológico,
tais como áreas de reassentamento de população, expansão urbana ou agrícola,
serviços e obras de infra-estrutura.
§ 1º - Os objetivos, nesta fase, são estimar a quantidade de sítios arqueológicos
existentes nas áreas a serem afetadas direta ou indiretamente pelo empreendimento
e a extensão, profundidade, diversidade cultural e grau de preservação nos
depósitos arqueológicos para fins de detalhamento do Programa de Resgate
Arqueológico proposto pelo EIA, o qual deverá ser implantado na próxima fase.
§ 2º - O resultado final esperado é um Programa de Resgate Arqueológico
fundamentado em critérios precisos de significância científica dos sítios
arqueológicos ameaçados que justifique a seleção dos sítios a serem objeto de estudo
em detalhe, em detrimento de outros, e a metodologia a ser empregada nos estudos.
Art. 6º - Nesta fase, que corresponde ao período de implantação do
empreendimento, quando acorrem as obras de engenharia, deverá ser executado o
Programa de Resgate Arqueológico proposto no EIA e detalhado na fase anterior.
76
§ 1º - É nesta fase que deverão ser realizados os trabalhos de salvamento
arqueológico nos sítios selecionados na fase anterior, por meio de escavações
exaustivas, registro detalhado de cada sítio e de seu entorno e coleta de exemplares
estatisticamente significativos da cultura material contida em cada sítio
arqueológico.
§ 2º - O resultado esperado é um relatório detalhado que especifique as atividades
desenvolvidas em campo e em laboratório e apresente os resultados científicos dos
esforços despendidos em termos de produção de conhecimento sobre arqueologia da
área de estudo. Assim, a perda física dos sítios arqueológicos poderá ser
efetivamente compensada pela incorporação dos conhecimentos produzidos à
Memória Nacional.
§ 7º - O desenvolvimento dos estudos arqueológicos acima descritos, em todas as
suas fases, implica trabalhos de laboratório e gabinete (limpeza, triagem, registro,
análise, interpretação, acondicionamento adequado do material coletado em
campo, bem como programa de Educação Patrimonial), os quais deverão estar
previstos nos contratos entre os empreendedores e os arqueólogos responsáveis
pelos estudos, tanto em termos de orçamento quanto de cronograma.
§ 8º - No caso da destinação da guarda do material arqueológico retirado nas áreas,
regiões ou municípios onde foram realizadas pesquisas arqueológicas, a guarda
destes vestígios arqueológicos deverá ser garantida pelo empreendedor, seja na
modernização, na ampliação, no fortalecimento de unidades existentes, ou mesmo
na construção de unidades museológicas específicas para o caso.
Os incisos 7º e 8º abordam a temática da educação patrimonial, imputando ao
empreendedor a obrigação de arcar com os custos financeiros de programas destinados à
gestão do material arqueológico resgatado. Esses artigos apresentam um diferencial em
relação às diretrizes internas utilizadas pelo IPHAN.
A portaria IPHAN nº 28/03 apresenta novidades que contribuem para a tutela
efetiva do patrimônio arqueológico atingido por grandes obras. Nesse sentido, com o objetivo
de minimizar os efeitos dos empreendimentos licenciados, os quais não contemplaram
patrimônio, o artigo 1º estabelece que os empreendimentos hidrelétricos de qualquer tamanho
ou dimensão dentro do território nacional, deverão ser estudados, resgatados e salvos, quando
da renovação da licença ambiental de operação.
O IPHAN tem competência para exigir, a qualquer tempo, os estudos
arqueológicos que não foram feitos durante o licenciamento, já que a responsabilidade do
empreendedor é objetiva e não está elidida pela omissão do órgão licenciador ou por
quaisquer outros motivos que tenham suscitado a omissão injustificada da tutela dos bens
arqueológicos.
77
2.6.4. A tutela do patrimônio arqueológico: os dispositivos da Lei nº 9.605 de 1998
A Lei de Crimes Ambientais (Lei nº 9.605/98) que dispõe sobre crimes
ambientais, estabelece em sua seção dedicada aos crimes contra o ordenamento urbano e
patrimônio cultural (Seção IV do Capítulo V) tipos penais para proteção do patrimônio
cultural, que logicamente se aplicam ao patrimônio arqueológico. A tipificação de condutas
criminosas contra o patrimônio cultural como crime ambiental e a responsabilização penal de
tais condutas decorre da previsão do art. 216,§ 4º e do §3º, do art. 225 da Constituição.
Segundo a doutrina penal, o conceito material de bem jurídico reside na
realidade ou experiência social, sobre a qual incidem juízos de valor, primeiro do constituinte,
depois do legislador ordinário. A ordem de valores constitucionalmente relevantes e inerentes
ao Estado de Direito constitui o paradigma do legislador penal infraconstitucional. Nessa
ordem de valores, os bens essenciais à sadia qualidade de vida e para o desenvolvimento
humano em seus diversos aspectos, e dentre estes, os bens que integram o patrimônio cultural,
assumem importância e se revelam como bens ambientais merecedores de tutela penal.
Desse modo, a tutela dos bens ambientais, no plano penal, depende de normas
estruturadas para atender a quatro finalidades primordiais: a) ser uma resposta social, já que a
exposição de perigo ou a ofensa ao meio ambiente apresentam-se como danosidade
macrossocial; b) ser um instrumento de pressão à solução do conflito; c) ser um meio para
atingir a efetividade das normas gerais protetoras do meio ambiente; e, principalmente, d) ser
um instrumento de prevenção de dano ou perigo ao meio ambiente.
A Lei nº 9.605/98 representou um enorme avanço em relação aos dispositivos
do Código Penal. Seus dispositivos buscam, claramente, atingir os objetivos das normas
penais ambientais acima mencionados e expressam o valor jurídico que os bens culturais
possuem e que as lesões em tais bens representam conduta reprovável socialmente. Nesse
enfoque, vale a pena destacar, a utilização dos conceitos preservacionistas para a proteção
ambiental lançados na Constituição, a adoção da concepção do meio ambiente como
macrobem (composto por elementos naturais e culturais), a previsão da responsabilidade
penal da pessoal jurídica, a desvinculação da proteção do bem cultural ao instituto do
tombamento e a adequação da tutela penal à tratativa da questão cultural pela Constituição,
com a possibilidade do conhecimento do valor cultural do bem se dar por lei, ato
administrativo ou por decisão judicial.
78
Os elementos culturais que integram o meio ambiente são portadores de
memória e outros valores imateriais e materiais essenciais para que a sociedade estabeleça
relações harmônicas e conquiste ou consolide outros valores sócio-econômicos estabelecidos
na Constituição. Pelas características próprias dos bens culturais, especialmente pela
fragilidade de seu estoque, geralmente não renovável, os dispositivos penais revelem-se úteis
na instrumentalização da proteção do patrimônio cultural.
Os artigos que versam sobre os crimes contra o patrimônio cultural,
acompanhando a concepção constitucional, centralizam sua atenção na função social dos bens
culturais, desvinculam a proteção criminal dos critérios de excepcionalidade e
monumentalidade dos bens, para atingir a característica de uma imaterialidade. Nesse sentido,
vale transcrever Miranda (2006, p.206):
Ressalta-se que a legitimação da tutela penal dos bens que integram o patrimônio
cultural não se baseia na defesa de sua propriedade, mas fundamentalmente na
função social de tais bens, uma vez que se busca a proteção do patrimônio cultural
sob seu aspecto material, que é suprapatrimonial, ou seja, é desvinculado da idéia de
titularidade sobre as coisas corpóreas que ostentam valor protegido.
Nos tempos modernos, há que ressaltar que, se quisermos alcançar a efetiva proteção
do patrimônio cultural brasileiro – mormente através dos instrumentos penais –
temos que romper velhos paradigmas que informavam o direito penal tradicional e
abrir os olhos para a triste realidade de preservação de nosso bens culturais,
buscando a máxima eficiência dos novos (e às vezes desafiadores) instrumentos
existentes no atual ordenamento jurídico brasileiro.
O art. 62 da referida lei prevê como crime, na figura culposa e dolosa, a
destruição, inutilização ou deteriorização de bem protegido por lei, ato administrativo ou
decisão judicial (inc. I), bem como arquivo, registro, museu, biblioteca, pinacoteca, instalação
científica ou similar protegido por lei, ato administrativo ou decisão judicial (inc. II). Nesse
tipo penal, a proteção incide nos elementos materiais ou imateriais, móveis ou imóveis, que
integram o patrimônio cultual, individualmente ou em conjunto (art. 216, caput, e incisos, da
CF). A única exigência para enquadramento no tipo é a consideração do bem como bem
cultural protegido por lei, ato administrativo ou decisão judicial. Assim, importância dos
contextos de seleção dos bens culturais é destacada na tutela penal.
Art. 62. Destruir, inutilizar ou deteriorar:
I - bem especialmente protegido por lei, ato administrativo ou decisão judicial;
II - arquivo, registro, museu, biblioteca, pinacoteca, instalação científica ou similar
protegido por lei, ato administrativo ou decisão judicial:
Pena - reclusão, de um a três anos, e multa.
Parágrafo único. Se o crime for culposo, a pena é de seis meses a um ano de
detenção, sem prejuízo da multa.
79
Pela distribuição de competência para a tutela dos bens culturais prevista na
Constituição, tanto a União, como os Estados, o Distrito Federal e os Municípios podem
produzir leis ou atos administrativos para a proteção dos bens que possuam valor de
referência para a sua comunidade. Por outro lado, o que o tipo penal exige é tratamento por
lei, ato administrativo ou por decisão judicial do bem como bem cultural, não havendo
necessidade de que o ato do Poder Público descreva todos os elementos protegidos nem
declare formalmente que se trata de um bem cultural, se materialmente o bem assim é
reconhecido, especialmente em atenção aos bens relacionados no art. 62, inc.II. Como atenta
Rodrigues (2012, p.215):
Parece-nos que quando as instituições mencionadas no inciso II forem criadas pelo
Poder Público, por lei ou por outro ato administrativo, já deverão ser consideradas
protegidas para fins penais, pelo simples fato de existirem. Pois se o Poder Público
decidiu criar um arquivo, museu, biblioteca ou similar, presume-se que já
reconheceu o valor cultural de um determinado acervo que se pretende ver
preservado.
O art. 63 protege apenas os bens imóveis, (em seus valores materiais e
imateriais) e o tipo penal é previsto apenas em sua forma dolosa. O dispositivo faz referencia
à alteração do aspecto ou da estrutura de edificação ou local protegido por lei, ato
administrativo ou decisão judicial em razão de seu valor paisagístico, ecológico, turístico,
histórico, cultural, religioso, arqueológico, etnográfico ou monumental, sem autorização da
autoridade competente ou em desacordo com a concedida. Além dos bens mencionados
expressamente, vale dizer dentre os bens de valor cultural estão os bens de valor
peleontológico (art.216, V, da CF) e entre os de valor ecológico, os bens que integram o
patrimônio espeleológico.
Art. 63. Alterar o aspecto ou estrutura de edificação ou local especialmente
protegido por lei, ato administrativo ou decisão judicial, em razão de seu valor
paisagístico, ecológico, turístico, artístico, histórico, cultural, religioso,
arqueológico, etnográfico ou monumental, sem autorização da autoridade
competente ou em desacordo com a concedida:
Pena - reclusão, de um a três anos, e multa.
Na emissão das licenças ambientais, que são “os atos autorizativos” utilizados
no curso do procedimento de licenciamento ambiental, são colocados aos empreendedores
condicionantes e compensações para que a atividade continue a se desenvolver sem causar
com o menor impacto possível ao meio ambiente, natural e cultural. Desse modo, pode-se
afirmar, nos termos do art. 63 ou em comento, que constitui crime a não observância, pela
pessoa física ou jurídica, das condicionantes e das compensações estabelecidas no curso do
procedimento de licenciamento ambiental para a realização de obre serviço, desde que tal
80
inobservância cause alteração do aspecto ou da estrutura do local protegido em razão dos
valores existentes nestes imóveis.
O art. 64 estabelece como tipo penal a construção em solo não edificável ou no
seu entorno sem autorização da autoridade competente ou em desacordo com a autorização
concedida. A caracterização do solo não edificável e seu entorno é dada pela presença de um
ou mais dos valores estabelecidos no artigo em comento: paisagístico, ecológico, artístico,
histórico, cultural, religioso, arqueológico, etnográfico ou monumental. Assim, a tutela do
patrimônio cultural se dá, nesse caso, a partir dos valores culturais presente no entorno ou no
solo a ser edificado.
Art. 64. Promover construção em solo não edificável, ou no seu entorno, assim
considerado em razão de seu valor paisagístico, ecológico, artístico, turístico,
histórico, cultural, religioso, arqueológico, etnográfico ou monumental, sem
autorização da autoridade competente ou em desacordo com a concedida: Pena - detenção, de seis meses a um ano, e multa.
Embora esse tipo penal guarde relação com o disposto no art. 18 do Decreto-lei
nº 25/37, que estabelece a proibição de construção que impeça ou reduza a visibilidade da
coisa tombada sem a prévia autorização do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico
Nacional (atualmente IPHAN), seu alcance ganhou contornos muito mais amplos em razão da
tratativa constitucional do patrimônio cultural (art.216), tanto por causa das formas de
acautelamento que possam ser utilizadas para tutela dos bens culturais, como, ou
principalmente, pela própria concepção de bem cultural como bem imaterial. Sobre as formas
de acautelamento.
Art. 18. Sem prévia autorização do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico
Nacional, não se poderá, na vizinhança da coisa tombada, fazer construção que lhe
impeça ou reduza a visibílidade, nem nela colocar anúncios ou cartazes, sob pena de
ser mandada destruir a obra ou retirar o objéto, impondo-se nêste caso a multa de
cincoenta por cento do valor do mesmo objéto.
Segundo Rodrigues (2012, p.219):
Embora o texto do artigo seja omisso, parece-nos que a determinação do valor que
justifique e não edificabilidade de um imóvel deve resultar de lei, ato administrativo
ou decisão judicial, por analogia com os artigos 62 e 63. Por outro lado, igualmente,
ato administrativo ou decisão judicial devem demarcar o seu entorno e as restrições
que sobre ele recaiam.
Com a possibilidade constitucional instrumentalizada no Decreto que
estabelece o registro dos bens imateriais, pode-se passar e considerar o solo não edificável ou
o seu entorno em razão da manifestação cultural ali realizada, desde que conste claramente no
registro do bem como patrimônio cultural a base material e a restrição de não edificação.
O art. 65 tem por objetivo proteger aspectos estéticos da geografia humana, a
beleza da paisagem urbana representada por suas construções e monumentos contra o seu
81
desfiguramento ou poluição visual. Seu tipo penal é pichar, grafitar ou por outro meio
conspurcar edificação ou monumento urbano. A pena inicial aumenta se o ato for realizado
em monumento ou coisa tombada em virtude de seu valor artístico, arqueológico ou histórico.
A proteção estabelecida neste artigo é para as edificações comuns e monumentos situados a
céu aberto. É considerado delito tanto desenhar quanto escrever inscrições de conteúdo
político, eleitoral ou propagandístico, quando efetuadas em edificações.
Art. 65. Pichar ou por outro meio conspurcar edificação ou monumento urbano:
Pena - detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, e multa.
§ 1o Se o ato for realizado em monumento ou coisa tombada em virtude do seu
valor artístico, arqueológico ou histórico, a pena é de 6 (seis) meses a 1 (um) ano de
detenção e multa.
§ 2o Não constitui crime a prática de grafite realizada com o objetivo de valorizar o
patrimônio público ou privado mediante manifestação artística, desde que
consentida pelo proprietário e, quando couber, pelo locatário ou arrendatário do bem
privado e, no caso de bem público, com a autorização do órgão competente e a
observância das posturas municipais e das normas editadas pelos órgãos
governamentais responsáveis pela preservação e conservação do patrimônio
histórico e artístico nacional.
O crime é punido apenas a título de dolo e qualquer pessoa, inclusive o
proprietário quando o bem for particular, pode ser sujeito ativo. Os sujeitos passivos são a
coletividade, a pessoa jurídica de direito público (União, Estado, Município) ou o
proprietário, se este não for sujeito ativo do crime. A tentativa é admissível.
Embora o conceito legal de monumento possa atingir bens naturais, edificações
majestosas e até cidades inteiras, este artigo protege as edificações comuns e os monumentos
situados a céu aberto em logradouros públicos, tais como bustos, esculturas, estátuas,
obeliscos, arcos, chafarizes, marcos e outros, da ação desfiguradora de pichadores ou
grafiteiros. Danos contra monumentos naturais são criminalizados na Seção II da Lei nº
9.605/98 (Dos Crimes contra a Flora) e o crime de dano contra edificações monumentos e
cidades-monumentos é o do art.62.
A doutrina diverge quanto à subsunção da pintura de painéis e grafites de
conteúdo artístico à norma do art. 65. José Eduardo Ramos Rodrigues entende que “a pintura
de painéis e grafites de conteúdo efetivamente artístico, muitas vezes realizados por artistas de
qualidade até mesmo com incentivos do Poder Público e que se constituem legítimas
manifestações culturais que não podem ser confundidas com traços estereotipados, grotescos
e sem sentido utilizados pelos pichadores, nem com propaganda política ou inscrições
publicitárias. Não existe aqui o ato de sujar ou macular a edificação.
82
Castro (2004, p. 261) destaca a tênue linha que pode distinguir a conduta
típica:
Em alguns casos, a intenção do grafiteiro ou pichador é manifestar sua arte, através
de desenhos e gráficos bastante interessantes, caso não tivessem sido feitos em
paredes de edificações e monumentos. Outros, simplesmente sujar. Algumas
autoridades, em função do reconhecimento da importância artística de alguns
grafiteiros, ou ante a constatação de impossibilidade de combate à prática,
resolveram incentivá-la, desde que as inscrições sejam feitas em muros e locais pré-
determinados e que não prejudiquem a paisagem e os edifícios e monumentos.
As argumentações transcritas apesar de parecerem favoráveis à não tipificação
dessa conduta, mencionam a necessidade de uma dicção acerca da manifestação expressa nas
edificações. Como as questões ligadas à estética e à consideração, do que é arte e do que pode
ou não ser feito em edificações passam por avaliações subjetivas e geralmente de difícil
consenso, a imprecisão na caracterização do tipo conduz ao entendimento de que a
manifestação por pinturas e grafites deve estar ligada a qualquer ato emanado pelo Poder
Público, mesmo que não revestido de todas as formalidades necessárias à permissão ou
autorização da prática.
A pena inicial para esse tipo penal é de detenção de três meses a um ano e
multa, aumentada para 6 (seis) meses de detenção e multa se o ato for realizado em
monumento ou coisa tombada em virtude de seu valor artístico, arqueológico ou histórico.
Essa previsão é criticável por causa do objeto muito restrito da ação: apenas os bens tombados
é que são tutelados por esse parágrafo, e apenas aqueles em virtude de valor artístico,
arqueológico ou histórico. Sendo assim, se a pichação atingir um monumento protegido por
lei de uso do solo municipal ou decisão judicial, porém não inscrito em Livro de Tombo, a
punição será a prevista para o caput e incisos do art. 62. Como as penas de delito doloso do
art. 62 são maiores e mais graves (reclusão de seis meses a um ano e multa), conclui-se que o
legislador, equivocadamente, premiou o pichador de coisa tombada com pena inferior ao do
pichador de coisa protegida por lei, ato administrativo diverso de tombamento ou decisão
judicial, o que constitui uma grande incoerência.
Dispõe o art. 67, in verbis:
Art. 67. Conceder o funcionário público licença, autorização ou permissão em
desacordo com as normas ambientais, para as atividades, obras ou serviços cuja
realização depende de ato autorizativo do Poder Público:
Pena - detenção, de um a três anos, e multa.
Parágrafo único. Se o crime é culposo, a pena é de três meses a um ano de detenção,
sem prejuízo da multa.
83
Em seu artigo 67, incrimina a concessão, pelo funcionário público, de licença,
autorização ou permissão em desacordo com as normas ambientais, para as atividades, obras
ou serviços cuja realização dependa de ato autorizativo o IPHAN acerca do patrimônio
arqueológico afetado, quando da expedição de licença, autorização ou permissão ambientais,
configura crime praticado pelo funcionário público do órgão emissor da autorização,
permissão ou licença.
2.7 ANÁLISE DE CASO: O PROJETO HABITACIONAL NOVA CIDADE
Entre os flagrantes de destruição de sítios arqueológicos em função de obras de
desenvolvimento regional no Estado do Amazonas, especificamente na cidade de Manaus,
apresentamos o Caso do Projeto Habitacional Nova Cidade.
Visando a construção de casas populares e aumentar a oferta de moradia, de
modo ordenado e com infraestrutura redes de água, luz, telefonia, esgoto, ruas, calçadas, meio
fio, o Governo do Estado do Amazonas através de sua Superintendência de Habitação e
Assuntos Fundiários – SUHAB iniciou todo o processo de licitação (Concorrência Pública
nº023/97) para a escolha do grupo de empresas, com fulcro à execução da construção das
unidades habitacionais populares e as licenças ambientais decorrentes da referida obra.
As empresas vencedoras foram: Baukraft Engenharia e Construções Ltda.;
Construtora Capital Ltda.; Construtora Rayol Ltda.; Construtora Soafil Ltda.; Construtora
Soma Ltda.; Contec Construções e Tecnologia Ltda.; Engeplan Engenharia e Planejamento
Ltda. e J. Nasser Engenharia LTDA.
Os documentos repassados pelo IPHAN, referentes ao processo nº
01450.001139/2004-77 oriundos do Departamento de Patrimônio Material e Fiscalização do
IPHAN-DEPAM, não esclarece, por exemplo, quais as licenças que as empresas tinham para
o início das obras, nem quais as licenças foram dadas pelo IPAAM e se havia alguma ressalva
sobre os estudos de impacto ambiental, a necessidade do levantamento arqueológico e das
licenças a serem dadas pelo IPHAN/AM. De qualquer modo os trabalhos de terraplenagem
iniciaram-se no final de 2000 e início de 2001, quando um fato chama a atenção.
Que no dia 08 de janeiro de 2001, o IPHAN/AM recebeu a reclamação de
moradores da vizinhança da obra sobre a destruição de material supostamente arqueológico.
Constata-se a importância da participação popular que deu relevância e importância a
materiais que desconheciam, mas julgaram tratar-se de vestígios arqueológicos.
84
Diante deste fato notório o IPHAN/AM no dia 22/01/2001 realizou vistoria no
local e constatou que a obra localizada na zona norte de Manaus, causou danos irreversíveis
aos vestígios arqueológicos promovido por ações de terraplenagem que destruíram artefatos
cerâmicos, urnas e revolvida a camada de terra antropogênica, contudo, a época ainda existia,
pacotes de sedimento soterrados e vestígios arqueológicos não perturbados passíveis de
fornecer informações para contextualizar o sítio e os vestígios destruídos.
O tratorista que fez a terraplenagem relatou aos arqueólogos que pensava estar
em local de fabricação de potes tal quantidade de vasilhames que encontrava; chegou a avisar
o engenheiro encarregado da obra, que lhe ordenou que prosseguisse com o trabalho.
A referida área atingida era utilizada para agricultura, mas se encontrava na
época da terraplenagem coberta por capoeira, semelhante a que pode ser observada em um
outro platô ainda íntegro e no topo de um remanescente onde se encontra fixado marco
topográfico.
Concluíram os técnicos do IPHAN/AM que se tratava de sítio arqueológico de
alta relevância científica devido à situação geográfica em terra firme, a quase 20 Km de rio de
maior porte, à espessura do refugo e características culturais que permitem filá-lo, segundo o
arqueólogo incumbido da ação emergencial, a pelo menos duas tradições culturais. Suas
dimensões foram estimadas em 500m x 500m, com camada arqueológica de mais de 1m de
espessura, sobreposta à camada arenosa.
Concluíram ainda, que se configurava a situação de destruição intencional de
sítio arqueológico, declarado patrimônio cultural brasileiro pela Constituição Federal de 1988
e protegido pela Lei Federal nº 3.924/61, que impede seu “aproveitamento econômico” antes
de devidamente pesquisado e formalmente liberado pelo IPHAN.
Por fim, concluíram que se as obras tivessem sido precedidas pelo
EIA/RIMA, como determina a lei, a situação seria outra: o sítio e seu entorno não estariam
completamente destruídos e seria possível obter dados mais detalhados produzidos a partir de
pesquisas sistemáticas de longo prazo.
Todos estes documentos culminaram com o processo administrativo nº
01450.001139/2004-77, cujo interessado era o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico
Nacional – IPHAN / Superintendência do IPHAN no Amazonas. Cujo assunto/descrição:
concessão de liminar da justiça federal de 1ª instância movida pelo Ministério Público Federal
no Amazonas com objetivo de amenizar os impactos ao sítio arqueológico - Nova Cidade,
Manaus-AM.
85
2.7.1 A Ação Civil Pública com pedido de liminar
Os documentos do IPHAN subsidiaram a Ação Civil Pública – ACP, fls 55/91
do processo administrativo do IPHAN, com pedido de Liminar proposta pelo Ministério
Público Federal, no dia 04/12/2003, cujos autos receberam o nº 2003.32.00.008189-1 (novo nº
8184-75.2003.4.01.3200), contra IPAAM; SUHAB; Baukraft Engenharia e Construções
Ltda.; Construtora Capital Ltda.; Construtora Rayol Ltda.; Construtora Soafil Ltda.;
Construtora Soma Ltda.; Contec Construções e Tecnologia Ltda.; Engeplan Engenharia e
Planejamento Ltda. e J. Nasser Engenharia Ltda., todas nas pessoas de seus representantes
legais, nominados na referida ACP.
Para o Ministério Público Federal a responsabilidade de cada ator foi assim
definida:
DA RESPONSABILIDADE DA SUHAB – Como entidade pública
gerenciadora dos trabalhos de engenharia que estavam sendo realizados no local, não poderia
ter iniciado as obras sem o devido estudo prévio de impacto ambiental. Tampouco poderia ter
admitido o prosseguimento dos trabalhos de terraplenagem do terreno, especialmente após já
haverem sido descobertos os inúmeros, valiosos e delicados exemplares dos potes cerâmicos,
muitos dos quais estavam à flor do solo. A existência desses artefatos “dificultando” ou
“atrapalhando” o desenrolar das obras são a maior prova de que a destruição, na forma e na
escala em que se deu, não foi meramente acidental, antes, porém, consciente e deliberada.
Logo, compete-lhe, por meio de imposição do Poder Judiciário, cessar, de imediato, toda e
qualquer atividade empreendida no local, bem como contribuir com a integral recuperação do
local agredido.
DA RESPONSABILIDADE DO IPAAM – Como entidade pública de
fiscalização ambiental, em 1999 expediu licença ambiental para o início das obras, não tendo
adotado os critérios técnicos indispensáveis para a verificação prévia da presença de eventual
sítio arqueológico na área.
Depois, porque não fiscalizou o desenrolar das atividades de construção,
especialmente de terraplenagem, medida que, aliás, já poderia ter sido suficiente para evitar
que houvesse a sistemática e intencional depredação dos artefatos arqueológicos. Segundo
declarações, à época, da Diretora Técnica do órgão, Sra. Maria do Carmo dos Santos, quanto
ao assoreamento dos igarapés existentes no local como conseqüência dos trabalhos das
construtoras, na ocasião da vistoria para emissão da licença, os fiscais verificaram que as
86
margens dos igarapés estavam protegidas. Assim o IPAAM omitiu-se ao não acompanhar o
desenvolvimento das obras do empreendimento, conduta que ocorreu tanto para a produção de
danos ao meio ambiente natural (soterramento de igarapés), quanto ao meio ambiente cultural
(ofensa ao sítio arqueológico).
DA RESPONSABILIDADE DAS CONSTRUTORAS – Todas as empresas
integrantes do empreendimento são co-responsáveis por todos os danos causados ao sítio
arqueológico e ao meio ambiente natural. O empreendimento voltado à construção das
unidades habitacionais populares (projeto habitacional Nova Cidade) consistia no
gerenciamento pelo governo do Estado do Amazonas (SUHAB) de inúmeras obras que
deveriam ser executadas por um consórcio de empresas de construção; desmatamento e
limpeza do terreno; infra-estrutura e construção das casas, de ruas e das redes de esgoto, água,
eletricidade e telefonia. Dessa forma, afigura-se patente que todas as empresas participantes
do consórcio concorreram, direta ou indiretamente, para a prática dos ilícitos perpetrados
contra o meio ambiente natural e o meio ambiente cultural (sítio arqueológico).
DA RESPONSABILIDADE CIVIL AMBIENTAL – O princípio da
responsabilidade objetiva, no que respeita aos danos contra o meio ambiente, está
consubstanciado em diversos textos legais e na própria Constituição Federal de 1988, em seu
Art. 225: “§ 3º. As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os
infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independente da
obrigação de reparar os danos causados.”
No mesmo sentido a Lei nº 6.938/81, que estabelece a Política Nacional do
Meio Ambiente, a qual, no seu artigo 14, caput, e no seu § 1º, determina:
Art. 14 - Sem prejuízo das penalidades definidas pela legislação federal, estadual e
municipal, o não cumprimento das medidas necessárias à preservação ou correção
dos inconvenientes e danos causados pela degradação da qualidade ambiental
sujeitará os transgressores:
§ 1º - Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor
obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos
causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade. O Ministério
Público da União e dos Estados terá legitimidade para propor ação de
responsabilidade civil e criminal, por danos causados ao meio ambiente.
Logo, para se estabelecer a responsabilidade objetiva, basta se comprovarem a
ocorrência dos atos e omissões dos demandados, os danos causados ao meio ambiente e ao
patrimônio público e, finalmente o nexo causal, isto é, a comprovação de que condutas foram
causas necessária e suficiente para que esses danos fossem provocados.
87
2.7.2 Da decisão liminar na Ação Civil Pública proposta pelo MPF
A magistrada federal plantonista, em 22/12/2003, verificando a presença do
fumus boni júris com base no Art. 20, X, (bens da União os sítios arqueológicos) c/c artigos
2º, “c” (consideram-se sítios arqueológicos – cemitérios, sepulturas ou locais de pouso
prolongado ou de aldeamento “estações” e “cerâmios” nos quais encontram vestígios
humanos de interesse arqueológico) e 3º (são proibidos em todo território nacional, a
destruição ou mutilação das jazidas arqueológicas... antes de serem devidamente
pesquisadas...) da Lei 3.924/61 e do periculum in mora pela descrição dos danos causados
pela realização da obra, concedeu a liminar determinando:
1) Cessação das obras na área do sítio e de seu entorno pelos réus. As únicas
ações sejam aquelas determinadas pelo Juízo; 2) Que os réus cerquem, no prazo de 30 dias,
toda a área do sítio arqueológico e de seu entorno, retirando o muro de concreto do local,
consultado o IPHAN que acompanhará e fiscalizará toda a execução e o resultado das tarefas;
3) Os réus providenciarão vigilância permanente na área do sítio e seu entorno, impedindo o
acesso e o trânsito de pessoas não autorizadas na área, em conformidade com as exigências do
IPHAN e da Polícia Federal; 4) Que os réus providenciem e afixem sinalização ampla e
visível nos limites do sítio e entorno, com anuência do IPHAN; 5) Os réus custearão, na
integralidade, todas as medidas necessárias para conter o avançado processo de erosão, do
sítio e entorno, cumprindo exigência do IPHAN e IBAMA para recuperação da área, somente
aquelas urgentes e indispensáveis ao agravamento do dano ocasionado, que poderão ser
melhor discriminadas no curso da ação; 6) Os réus deverão custear as providências
indispensáveis ao salvamento emergencial das peças arqueológicas ainda existentes no sítio e
na área de entorno, cumprindo os requisitos do IPHAN; 7) Os réus e o IPHAN deverão
apresentar ao MPF e a Justiça Federal relatórios a cada 30 dias, com fotos e videotape sobre a
evolução do cumprimento das determinações judiciais e por fim 8) Os réus estão cientes que o
não atendimento ou mal-cumprimento de qualquer das determinações judiciais, implicará e
multas cominatórias no valor de R$ 50.000,00, sem afastar as sanções penais, administrativas
e civis aplicadas à espécie.
Além desses pontos determinou a intimação dos requeridos da referida decisão
e a citação dos demandados, conforme a petição inicial, além determinar as intimações do
IPHAN e do DNPM para se manifestarem sobre o interesse de interagir no pólo ativo do feito,
88
com cópia da citada decisão. Por fim, determinou que fosse oficiado ao IBAMA para a
adoção de providências a seu cargo, com ênfase ao item 5).
Houve 3 Agravos de Instrumento atacando a decisão proferida e buscando
anular os efeitos da liminar pelos réus, contudo todos os recursos foram denegados pelas
instâncias superiores.
No dia 11/02/2004, as fls. 49/50 do processo administrativo do IPHAN
constataram-se o descumprimento pelo IPAAM, pela SUHAB e demais réus de pontos dos
termos da Liminar concedida. Tomadas as providências cabíveis os réus cumpriram a referida
medida.
A Procuradoria Geral do Estado do Amazonas – PGE/AM de posse de um
laudo com a assinatura do Dr. Eduardo Góes Neves, prof. da USP, interpôs pedido par a
continuação das obras, as fls. 155/59 do processo interno do IPHAN faz a seguinte análise:
[...] Nas outras áreas do empreendimento já se construíram casas ou já se iniciaram
as obras, conforme indicação na planta. Nesses locais, os eventuais vestígios
arqueológicos foram destruídos ou estão bastante fragmentados, o que os torna com
pouco valor científico ou educativo. Sendo assim, não há nada que os impeça a
continuação das obras ou a ocupação das casas nesses locais, pelo menos sob o
ponto de vista da arqueologia.
É no entanto, necessário, que se vistorie em detalhes as áreas a norte e noroeste
do empreendimento (indicadas em verde no mapa), ainda pouco perturbadas,
para que se possa contextualizar melhor as dimensões e cronologia de ocupação do
sítio Nova Cidade (destacamos).
Ressalte-se que os destaques foram feitos no pedido da ALE o qual
reproduzimos. Além disso, a PGE/AM, chamando o arqueólogo, de antropólogo, as fls. 157,
alegou que não faz qualquer objeção à continuação das obras ou a ocupação das casas
próximas ao sítio arqueológico. Sendo que a única ressalva diz respeito as áreas norte e
nordeste, da qual alega que a SUHAB, não pretende implementar qualquer obra neste
perímetro.
Alegou também que o IPAAM exigiu a assinatura de termo de ajustamento de
conduta onde a SUHAB se obriga a tomar medidas para minimizar os efeitos negativos sobre
o meio ambiente e apresentar o Projeto de Recuperação de Áreas Degradas – PRAD e
apresentar um Projeto de Tratamento dos Esgotamentos Hidro-Sanitários, dentre outras
obrigações.
Alega por fim, que as obras paralisadas têm interesse social que objetivam
atender os cidadãos de baixa renda e pede a autorização para conclusão das casas e da estrada.
O IPHAN devidamente notificado pela 3ª Vara Federal no Amazonas
manifestar-se sobre o pedido em 48h, as fls. 154, apresentou informação técnica 145/146
concordando com o pedido e o submeteu ao MPF. Tais informações fizeram o processo se
89
voltar para uma tentativa de composição civil dos danos com a audiência de Conciliação
designada entre as partes.
Para Meirelles (2003, p. 561) a atual MP 2.163-41, de 23/08/2001, cujo texto
reedita medidas provisórias anteriores, acrescentou à Lei 9.605/98, dispositivo de grande
relevância para o combate à poluição, autorizando as autoridades do Sistema Nacional de
Meio Ambiente – SISNAMA a celebrar com pessoas físicas e jurídicas, com força do título
executivo extrajudicial, termo de compromisso para correção de atividades consideradas
efetiva ou potencialmente poluidoras, art. 79-A da referida Lei.
2.7.3 Do Termo de Audiência de Conciliação/Sentença Homologatória
Em 6 de novembro de 2013, o Juízo Federal da 7ª Vara Especializada em
Matéria Ambiental e Agrária do Estado do Amazonas fizeram audiência na qual as partes
manifestaram interesse na realização da conciliação. A MM Juíza do feito proferiu decisão
determinando que ficasse o IPHAN intimado para em 30 dias, apresente um laudo técnico da
situação atual da área objeto do processo, o que se faz necessário para regularização da área,
com o recolhimento do patrimônio arqueológico, bem como o valor que entenda adequado à
título de compensação pelo patrimônio arqueológico degradado. Após a apresentação da
documentação pelo IPHAN, determinou que fossem os autos suspensos pelo prazo de 60 dias,
a fim de que as partes buscassem uma composição acerca do objeto do processo.
A minuta do Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta Ambiental -
TACA nº 003/2010, incidental na ACP nº 2003.32.00.008189-1, sugeria entre outras medidas
compensatórias:
a) Que IPAAM, SUHAB e construtoras fiquem obrigados a custearem a
contratação de uma equipe multidisciplinar, composta por arqueólogos, pedagogos e
historiadores, para elaborar e executar um amplo Programa de Educação Patrimonial, sob a
supervisão do IPHAN, com período de 5 anos, junto as escolas públicas e particulares do
Estado do Amazonas, além de espaços públicos em geral sobre a importância da preservação
do patrimônio cultural;
b) Que o Estado do Amazonas, através da SUHAB, seja obrigado a
colocar painel de aço que deverá permanecer por um ano em lugar bem visível a qualquer do
povo, à frente do terreno do sítio arqueológico em que ocorreram os danos ambientais.
90
Entre outras medidas o IPAAM, por sua omissão em sua função fiscalizadora,
face ao assoreamento dos igarapés e o grave processo erosivo, por conta das obras, deverá
apresentar um Plano de Recuperação de Área Degradada – PRAD que será submetido ao
IBAMA.
A SUHAB e as construtoras deverão, solidariamente, providenciar a integração
do sítio arqueológico Nova Cidade e seu entorno, a socialização do espaço, a implantação de
um projeto que alie a preservação e contemplação informativa do patrimônio arqueológico,
expondo in loco os artefatos que ainda estão presentes no local, aliados a prática de exercícios
físicos, tudo isso sob a fiscalização do IPHAN.
Entre as responsabilidades em caso de inadimplemento, multa pessoal dos
envolvidos de R$ 1.000,00 até o trigésimo dia, a partir daí multa de R$ 2.000,00. Os valores a
título de multa serão recolhidos ao Fundo de Defesa dos Direitos Difusos definido pelo Art.
13 da Lei 7.347/85.
Segundo informações do IPHAN a minuta passou pelo crivo do Procurador-
Chefe do órgão em Brasília, pela Procuradoria do Estado do Amazonas e pelo Ministério
Público Federal e ainda não foi homologada. Entre os pontos retificados da minuta original
(fls. 256/268 do proc. Adm. IPHAN vol. II), constava multa ao Governador do Estado,
solidariamente responsável com os demais agentes públicos e responsáveis legais pelas
empresas construtoras, após o 31º dia em caso de descumprimento do TACA nº 003/2010
Por fim, após a assinatura do citado termo pelas partes e a homologação
judicial, houve a suspensão do processo nº 2003.32.00.008189-1, nos termos do Art. 265, II e
§ 3º do CPC e se encerrará o processo que já tramita há mais de uma década.
2.8 JURISPRUDÊNCIA
É importante ressaltar que o tema possui poucas jurisprudências, dentre elas
apresentamos o Agravo de Instrumento nº 130131 PA 2000.01.00.130131-7 cuja ementa é a
seguinte:
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO DECISÃO
LIMINAR QUE SUSPENDEU A EXECUÇÃO DE OBRAS DE
CONSTRUÇÃO CIVIL QUE ATINGEM TERRENOS DE
MARINHA, SÍTIOS ARQUEOLÓGICOS E PARQUE
AMBIENTAL. INEXISTÊNCIA DE PRÉVIA AUDIÊNCIA DO
RÉU (ESTADO DO PARÁ). COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA
FEDERAL. OBJEÇÕES DO IPHAN E DO IBAMA SUPERADAS
NO CURSO DO PROCESSO, MEDIANTE ENTENDIMENTOS
91
DESSAS ENTIDADES COM O ESTADO CONSTRUTOR DA
OBRA. APLICAÇÃO DO ART. 462 DO CPC.
1 - É competente a Justiça Federal para julgar ação popular proposta
com o objetivo de sustar a execução de obra de construção civil que
atinge terreno de marinha, parque ambiental e sítios arqueológicos, na
qual foi determinada a citação do Instituto do Patrimônio Histórico e
Artístico Nacional - IPHAN como litisconsorte passivo.
2 - É inexigível prévia audiência do Poder Público para concessão de
liminar em ação cautelar, não se aplicando ao caso o disposto no art.
2º da Lei nº 8.437, de 30/06/1992.
3 - Constatado que, no curso da ação popular em que foi proferida a
decisão concessória da liminar, para sustar o prosseguimento de obras
de construção civil, face às objeções opostas pelo Instituto do
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional - IPHAN e pelo Instituto
Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis -
IBAMA, essas entidades, após entendimentos mantidos com o Estado
réu, manifestaram-se pelo prosseguimento das obras, deve ser cassada
a liminar, com aplicação do art. 462, do Código de Processo Civil.
4 - Agravo de instrumento provido.
5 - Agravo regimental que se julga prejudicado.
Relatório do Exmo. Sr. Juiz Antônio Ezequiel (Relator): Trata-se de agravo de
instrumento interposto pelo ESTADO DO PARÁ da decisão proferida pelo MM Juiz Federal
Substituto da 5ª Vara da Seção Judiciária do Pará que, em ação popular, proposta por
ROBERTO DOS SANTOS PANTOJA, com o objetivo de sustar ato que entende lesivo ao
patrimônio público, ao meio ambiente, à moralidade administrativa e ao patrimônio histórico
nacional, atribuído ao Exmo. Sr. Governador do Estado do Pará, deferiu a liminar, para
determinar a suspensão das obras da denominada “Alça Viária”, vedando a instalação dos
respectivos canteiros de obras até ulterior deliberação (fls. 40 a 42).
A ação foi ajuizada em razão da expedição do Decreto Estadual nº 6.378/90
que, sem observância das disposições normativas a respeito do Estudo Prévio de Impacto
Ambiental – EPIA e respectivo Relatório de Impacto Ambiental – RIMA, declarou como de
utilidade pública, para fins de desapropriação, a área destinada à construção denominada
“Alça Viária”, obra componente do “Projeto de Integração do Estado do Pará”, que atinge
terrenos de marinha, um parque ambiental e dois sítios arqueológicos, integrantes do
patrimônio da União.
Sustenta o agravante a inexistência dos requisitos autorizadores da liminar, a
impossibilidade de seu deferimento sem que seja dada oportunidade para o Poder Público se
manifestar e a incompetência absoluta da Justiça Federal para processar e julgar o feito, por
não existir obrigatoriedade de autorização do IBAMA para o desmatamento da área de
92
abrangência da obra, tendo a decisão recorrida impedido a execução de obras em perfeita
harmonia com as exigências legais de proteção ambiental a ao patrimônio arqueológico da
nação.
Assevera, ainda, que a implantação da Alça Viária ocupará papel de destaque
na viabilização do sistema de transporte terrestre, na medida em que se constituirá no elo de
ligação de duas sub-regiões do Leste Paraense com o Sul daquele Estado, razão pela qual
requer a reforma da decisão agravada.
Em decisão de fls. 211/213, foi concedido o efeito suspensivo requerido e
determinada a intimação do agravado para os fins do art. 527, III, do CPC.
Irresignado, o agravado interpôs agravo regimental (fls. 216/226), pugnando
pela reforma imediata da decisão concessiva do efeito suspensivo, sob pena de restar
perpetuada a lesão ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural do povo paraense.
Em sucessivas manifestações e com a juntada de documentos novos (fls.
307/320, 331/332, 334/339 e 365/550), o Estado do Pará insiste na tese inicial de inexistência
de obrigatoriedade de autorização do IBAMA para o desmatamento da área em questão, e de
que o projeto estaria em perfeita harmonia com as exigências legais de proteção ambiental e
ao patrimônio arqueológico da nação.
Manifestou-se, também, o agravado (fls. 227/305 e 553/576), reiterando a
necessidade de reforma da decisão agravada.
Parecer do Ministério Público Federal (fls. 341/364), opinando pelo
improvimento do agravo.
Em Ofício de fls. 582/595, a MM. Juíza que ora preside ao feito em que foi
proferida a decisão agravada encaminha cópias da decisão proferida nos autos da ação
principal, de atas de audiências e de manifestações do Ministério Público e do autor-agravado,
decisão essa na qual a MM. Magistrada reconhece “que os argumentos que respaldaram a
liminar concedida anteriormente, conforme consta na ata das três audiências efetuadas entre
os Autores, foram esvaziados pela ocorrência de fatos supervenientes, acordos de fiscalização
de sítios arqueológicos firmados entre o Estado e o IPHAN, visando à proteção dos sítios
arqueológicos e também pela manifestação do IBAMA, concedendo autorização para o
desmatamento da área do Projeto, fls. 2229” (grifos no original), afirmando, contudo, que não
tem poderes para revogar a decisão agravada, face à decisão desta Corte que lhe suspendeu os
efeitos.
93
À fl. 597 foi dada vista ao agravado, por 10 (dez) dias, para dizer sobre os
documentos de fls. 582/595, tendo decorrido o prazo sem que nada fosse argüido (certidão de
fl. 597v).
À fl. 598, tornei sem efeito o despacho de fl. 597v., in fine, que dava nova vista
ao Ministério Público Federal, em face da manifestação anterior dessa instituição (fls.
579/580), onde afirma “não haver lugar para novas e sucessivas manifestações no agravo de
instrumento. Assim, se modificações fáticas ocorrem devem ser levadas ao conhecimento do
douto magistrado de primeiro grau para que o mesmo, à luz dos novos acontecimentos, possa
eventualmente retratar a decisão agravada.” É o relatório.
As obras ocorreram dentro de um terreno de propriedade da Marinha, ora por
força do Art. 109, I da Constituição de 1988 a Justiça Federal tem a competência legal para
atuar nessa hipótese. Além disso, são citados um Parque Ambiental e áreas com sítios
arqueológicos que são considerados bens da União.
O capítulo 1 do referido acórdão trata o IPHAN como litisconsorte passivo e
não define a situação do IBAMA. Contudo veremos que houve entendimento entre o Estado
do Pará e as autarquias federais.
Em casos em que há sítios arqueológicos o IPHAN e a destruição de um
Parque Ambiental IBAMA, atuam na condição de litisconsórcios ativos, como vimos na
análise de caso apresentada no item anterior deste trabalho.
Mais uma vez destaca-se a participação popular utilizando os meios jurídicos e
democráticos para a defesa do meio ambiente natural e cultural Ação Popular, mas, sobretudo
questionando obra com possível prática pelo gestor público de improbidade administrativa.
É ainda oportuno o esclarecimento (TEMER, 2007, p.206) “ Se é coisa do
povo, a este cabe o direito de fiscalizar aquilo que é seu. Pertence-lhe o patrimônio do Estado.
Por isso é público”. Verifica-se que há um sistema de fiscalização efetivado por meio de uma
representação popular.
A legitimidade da ação parte do princípio de que a Carta Magna assegura, em
seu texto, a qualquer cidadão a possibilidade de propor ação popular contra atos lesivos ao
patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao
meio ambiente e ao patrimônio histórico cultural. Para propor ação popular se requer, antes de
mais nada, que o autor seja cidadão brasileiro no exercício de seus direitos cívicos e políticos.
94
A prova de cidadania, segundo o § 3º do art. 1º da Lei n.º 4.717, de 29 de junho de 1965, será
feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
O art. Citado dispõe o seguinte:
Art. 2º No mandado de segurança coletivo e na ação civil pública, a liminar será
concedida, quando cabível, após a audiência do representante judicial da pessoa
jurídica de direito público, que deverá se pronunciar no prazo de setenta e duas
horas.
A concessão de medidas cautelares contra o poder público tem tratamento
especial em razão do evidente interesse público e supremacia da atividade administrativa, que
exige cautela nas decisões de âmbito coletivo. Além do sistema especial de execução a que
está adstrita à administração pública, em razão da emissão de precatórios, consoante a
disposição do artigo 100 da Constituição Federal.
Neste diapasão a lei impôs restrições a concessões de liminares ou outras
medidas cautelares. A matéria é tratada pela Lei n°8.437, de 30 de junho de 1992, Lei
n°5.021, de 09 de junho de 1966, Lei n°4.348, de 26 de junho de 1964 e Lei n°2770/56.
Ressalta-se a impossibilidade de concessão de medida liminar contra atos do
Poder Público no procedimento cautelar ou em quaisquer outras ações de caráter cautelar ou
preventiva, toda vez que providência semelhante não puder ser concedida em mandado de
segurança, em virtude de vedação legal.
A concessão de liminar enseja a interposição do recurso de agravo de
instrumento, considerando a natureza interlocutória do ato judicial. Sendo cabível ainda o
pedido de suspensão dirigido ao Presidente do Tribunal, ao qual couber o conhecimento do
respectivo recurso, suspender, em despacho fundamentado, a execução da liminar nas ações
movidas contra o poder público ou seus agentes, a requerimento do Ministério Público ou da
pessoa jurídica de direito público interessada, em caso de manifesto interesse público ou de
flagrante ilegitimidade, e para evitar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia
pública.
Por pessoa de direito público, devemos compreender não só os entes federados,
União, Estados, Municípios, Distrito Federal, mas suas autarquias e fundações públicas.
Quanto à legitimidade para a realização do pedido de suspensão este pertence
somente ao poder público e ao Ministério Publico, sendo defeso o requerimento de pessoa
jurídica de direito privado. Neste sentido, colacionamos a seguinte jurisprudência:
Pessoa Jurídica de Direito Público. O pedido de suspensão da liminar concedida
pelo Juiz na ação civil pública somente pode ser feito por pessoa jurídica de direito
público ou pelo Ministério Público, mas não por particular ou órgão
despersonalizado” (TFR, Pleno, SS 8123-DF-Ag.Reg.rel. Ministro Gueiros Leite.
J.23.02.1989, v.u., DJU 15.05.1989, p.7899)
95
Vale salientar que o pedido de suspensão não representa um novo recurso,
sendo juridicamente considerado como um sucedâneo recursal, criado para a aplicação em
casos excepcionalíssimos de potencial risco grave à saúde, ordem, segurança ou economia
públicas.
O pedido de suspensão e o recurso de agravo de instrumento são
independentes, determinando a lei que o julgamento deste não prejudica nem condiciona o
julgamento do pedido de suspensão.
Do despacho que conceder ou negar a suspensão, caberá agravo, no prazo de
cinco dias, que será levado a julgamento na sessão seguinte a sua interposição. Se do
julgamento deste agravo resultar a manutenção ou o restabelecimento da decisão que se
pretende suspender, caberá novo pedido de suspensão ao Presidente do Tribunal competente
para conhecer de eventual recurso especial ou extraordinário. É cabível também o pedido de
suspensão dirigido a autoridade competente para o conhecimento do recurso especial ou
extraordinário, quando negado provimento a agravo de instrumento interposto contra a
liminar a que se refere este artigo.
O Presidente do Tribunal poderá conferir ao pedido efeito suspensivo liminar,
se constatar, em juízo prévio, a plausibilidade do direito invocado e a urgência na concessão
da medida.
As liminares cujo objeto sejam idênticos poderão ser suspensas em uma única
decisão, facultando ao Presidente do Tribunal estender os efeitos da suspensão a liminares
supervenientes, mediante simples aditamento do pedido original.
A suspensão deferida pelo Presidente do Tribunal vigorará até o trânsito em
julgado da decisão de mérito na ação principal.
Verifica-se ainda argumentação da doutrina contrária à oitiva prévia no caso de
ação cautelar preparatória para evitar dano ao meio ambiente, ao consumidor, à ordem
urbanística ou aos bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico
(art.4º da Lei 7.347/1985), pois a restrição da Lei n°8.437/92 refere-se a ação civil pública e
não ao provimento mencionado. Utilizando o artigo 804 do Código de Processo Civil, o qual
prevê que a medida cautelar pleiteada pode ser concedida liminarmente sem a oitiva prévia do
requerido. O que faz sentido no caso concreto apresentado, analisando a respectiva
jurisprudência.
As medidas liminares em mandado de segurança, habeas corpus, ação popular,
ação civil pública, ação direta de inconstitucionalidade ou como “antecipações provisórias de
96
medidas cautelares nominadas (típicas) e inominadas (atípicas – derivadas do denominado
poder cautelar geral)”, têm expressa previsão em leis especiais: art. 7º, inc. II, da Lei 1.533/51
(no caso do mandado de segurança), “por integração analógica e construção jurisprudencial
(no caso do habeas corpus); art. 5.º, § 4º, da Lei 4.717/65 (no caso da ação popular); art. 12 da
Lei n. 7.347/85 (no caso da ação civil pública); no art. 102, inc. I, p, da CF/88 (no caso da
ação direta de inconstitucionalidade); e no próprio Código de Processo Civil de 1973 (art.
804) no caso das cautelares - preparatórias ou incidentais (FRIEDE, 2007, p. 163-164).
O legislador brasileiro inspirou-se, uma vez mais, na Carta Constitucional para
se permitir as liminares, visto que em seu artigo 5º, inciso XXXV, prevê que - a lei não
excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito.
Assim, ao contrário das Constituições pretéritas, a de 1988 prevê,
expressamente, em seu texto, a possibilidade de o judiciário se manifestar acerca da ameaça
ao direito da parte, tanto para proteção de direitos individuais, coletivos e difusos, não sendo
necessário, portanto, aguardar a ocorrência do dano para que a parte se socorra ao Poder
Judiciário.
Talvez a audiência prévia pudesse ter resolvido todas as situações descritas na
inicial, daí uma tendência atual pela conciliação. De fato, após tratativas sobre o caso tanto o
IBAMA quanto o IPHAN e as empresas executoras da obra, conseguiram garantir ao Juízo a
ausência de prejudicialidade ao meio ambiente natural e cultural e sua a importância para a
sociedade.
De qualquer sorte, sobre questões ambientais não se pode descuidar, pois
depois da destruição não há o que se fazer, além disso, a participação popular é fator
democrático e faz valer direitos garantidos pela Constituição.
O agravo de instrumento foi provido por força do art. 462 do CPC, uma vez
que houve fato superveniente, que modificou o objeto da ação, vez que houve o entendimento
dos órgãos ambientais e culturais com o governo do Estado do Pará.
Irresignado, o agravado interpôs agravo regimental (fls. 216/226), pugnando
pela reforma imediata da decisão concessiva do efeito suspensivo, sob pena de restar
perpetuada a lesão ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural do povo paraense,
contudo não obteve êxito. Uma das peculiaridades da Ação Popular verificada a solução da
questão em desfavor do autor, salvo comprovada má-fé, este fica isento de custas judiciais e
do ônus da sucumbência.
97
CONCLUSÕES
Verificou-se na presente dissertação que as grandes obras de desenvolvimento
regional podem ser fatores que contribuem para a destruição dos sítios arqueológicos na
Região Metropolitana de Manaus, sobretudo, quando estas são executadas sem as cautelas
necessárias e em desacordo com a legislação pertinente, que exigem o estudo de impacto
ambiental e o levantamento arqueológico prévio. Casos citados no decurso deste trabalho
como o Sítio Nova Cidade (Manaus/AM), o Sítio das Lajes (Manaus/AM) e as descobertas no
Paço Municipal (Manaus/AM) e por ocasião das obras de construção da Usina Hidrelétrica de
Balbina (Presidente Figueiredo/AM)
Verificou-se também que graças a estas obras, durante a fase de estudo prévio
de impacto ambiental, novos sítios foram encontrados especialmente no Município de
Manacapuru por ocasião do gasoduto Coari-Manaus.
A ideia da criação da Região Metropolitana de Manaus se deu com objetivo de
expandir os benefícios de desenvolvimento sustentável nas áreas: social, econômica e
ambiental. Quanto ao desenvolvimento social destaca-se a interligação terrestre de no mínimo
três municípios (Iranduba, Manacapuru e Novo Airão) separados pelo Rio Negro com a
capital e os demais municípios, exceto o Carreiro da Várzea, ampliando políticas de
mobilidade urbana, moradia e financiamentos habitacionais, intercâmbio da produção local e
acesso a educação especialmente na capital. No desenvolvimento econômico destaca-se a
possibilidade de ampliação dos benefícios da Zona Franca de Manaus, que pode se estender
ao longo desta região contribuindo com indústrias, empregos e produtos gerando riqueza para
a Região de estudo. No desenvolvimento ambiental destacam toda a proteção que vai
alcançando a área com a educação ambiental, preservação de áreas, proteção de lagos e rios,
acesso ao lazer e paisagens preservadas, com o acesso dos órgãos fiscalizadores e a
implantação de escritórios permanentes nos municípios abrangidos, sem contar com a
Construção da Cidade Universitária, deslocando o centro da universitária no Estado da capital
para o interior.
Dentre os 143 (cento e quarenta e três) sítios catalogados e registrados
oficialmente na pagina do Instituto do Patrimônio Histórico e Arquitetônico Nacional
(IPHAN) no Cadastro Nacional de Sítios Arqueológicos (CNSA), localizados na área desta
pesquisa. A pesquisa verificou que o homem amazônico é milenar, e constituiu até a chegada
dos europeus na Amazônia, sociedades auto-sustentáveis, numerosas e complexas, de acordo
98
com os historiadores. Não há registros de escrita, mas nem por isso, as populações ancestrais
não deixaram sua marca, sua presença nesta terra, com cerâmicas, pinturas rupestres,
utensílios, urnas funerárias entre outros.
Os motivos da falta de pesquisa talvez sejam por falta de publicidade dos
editais da CAPES e da FAPEAM ou pela falta de profissionais na área de arqueologia.
A escassez de profissionais da área da arqueologia, que chegam ao nosso
mercado de trabalho, formados pelas primeiras turmas do curso na Universidade do Estado do
Amazonas (UEA), assim como o IPHAN/AM que dispõe de apenas uma profissional da
arqueologia para cuidar de projetos de todo o Estado do Amazonas, são dificuldades que não
se pode deixar de considerar como entrave
O único laboratório para as pesquisas dos sítios arqueológicos na Região
Metropolitana de Manaus e o da Universidade Federal do Amazonas o Museu Amazônico. O
Palacete Provincial que possui um andar dedicado aos achados arqueológicos, além do Centro
Cultural dos Povos da Amazônia são espaços utilizados para exposição do material
arqueológico.
As grandes obras de desenvolvimento regional devem ser encaradas não como
problemas ou obstáculos, mas como oportunidades de se ampliar as pesquisas científicas e
ampliar os achados arqueológicos. É necessário aliar o desenvolvimento regional ao respeito
de nossas riquezas sejam naturais, como culturais.
A destruição de sítios arqueológicos é irreversível, por isso, não se pode
descuidar da fiscalização, tantos dos órgãos públicos e quanto pela sociedade, através da
educação arqueológica e da busca por recursos para o financiamento de mais pesquisas e a
construção de museus que possam ter a guarda dessa desses bens culturais. Por outro lado,
grandes empresas possuem capacidade econômica de financiar projetos, seja como
colaboração a proteção arqueológica, seja como medida mitigadora decorrente dos termos de
ajustamento de conduta ambiental.
Por fim, verifica-se que se sabe pouco sobre a pré História Amazônica, mas
deve-se deixar para as futuras gerações um legado de conhecimento e respeito ao nosso
patrimônio cultural. A legislação é adequada à proteção dos bens culturais, mas ainda está
distante da realidade social, e não tem o condão de explicar e conscientizar o cidadão sobre o
significado do tema.
Vimos no estudo de caso apresentado e no estudo da jurisprudência que a
participação e fiscalização popular foi extremamente importante, quer através de mecanismos
99
simples como uma denúncia ao IPHAN ou manejando Ação Popular gerou-se discussões
importantes que ajudaram a clarear situações do nosso dia-a-dia, reforçando o interesse
democrático pela defesa do meio ambiente cultural.
Atrelar o patrimônio arqueológico às políticas públicas de cultura e educação,
pode ajudar a incrementar o turismo, gerar empregos, incentivar mais as pesquisas dos sítios
arqueológicos que antecedem as grandes obras de desenvolvimento, talvez sejam alternativas
que possam garantir a proteção dos sítios arqueológicos na Região Metropolitana de Manaus.
100
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