Post on 10-Mar-2016
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ESTE PEQUENO LIVRETO BINÁRIO
TRATA DA ALFORRIA DOS REJEITADOS
TODAS AS POESIAS PRESENTES AQUI
FORAM DESCARTADAS PELO AUTOR
E PERMANECERAM ASSIM, AMASSADAS
NO FUNDO DAS GAVETAS ESQUECIDAS
ELE AINDA AS CONSIDERA
O PIOR DE SUA BREVE OBRA
POR ISSO SUA CONDENAÇÃO
IMPRESCINDÍVEL
AO CHAMADO NECESSÁRIO
DE RODOLFO FOGWILL
Daquilo que já foi
Um dia
nossa noite já foi dia
nossa prosa, poesia
nosso samba, rockstar.
Lupicinio
por meus lábios assovia
inda longe do mar
pampeano
aos pobres moços intangível judiaria
mas na camiseta sandinista
look here
what d’you think you’re
gonna be doing next year.
Sabina
da nossa distorção el mediodía
inssurecto grito nas jovens tardes de rebeldia
um refrão que era nosso
e ninguém sabia
cantar.
me dê a mão
vamos dançar na beira do penhasco
não precisamos mais chorar
o que foi
e o futuro está no próximo passo
nosso cadafalso para todo
sempre
lá embaixo
as incertezas e os medos
perdem as cores nas lentes do ar
pousa seus dedos em meus ombros e sente
os meus
firmes
na sua cintura
rodopiamos de olhos fechados e sussurro
em nossa história
a canção da morte
eu só quero beijar seus lábios quando cair
O que há do outro lado da tragada?
têm olhos de jornal
obviamente familiar
enxerga manchetes andando vivas e queimando
dúvidas e desesperanças
de pedra rolada do concreto da cidade de concreto
cimento e aço duro
reerguerão um novo futuro
segundo havia lido ontem
ficaria no lugar que desabito
onde se esconde o homem perdido
pela chama em plástico de açoite
e cicatriz de tinta negra
espreita entre todas as escolhas de merda
existência de nada
uma geração e meia na mesma calçada
para agora seguir como manada a fuga
dos derrotados que somos
esquecidos pelo caminho
que dizia felicidade
e já não importa
para alguns ódio
para outros piedade
Haverá um depois depois de nós
nascemos estrela e morreremos buraco negro
e então
já bastante humano
confundirá gravidade com egoísmo
e solitário esfriará conosco
no maior de todos os invernos
se não soubesse o sentido da vida – a existência da
palavra vida – se não houvesse a palavra sentido – o
sentido da palavra vida – se nem imaginasse a
existência da palavra existência – se não fizesse
sentido a palavra sentido – nem a existência no
sentido da palavra vida – este é o dilema do átomo
É muito louco
sentir como ela sai
sem medo
pela ponta dos meus dedos
a pior poesia que já escrevi
justo eu que sempre disse
de peito estufado e otimista
que se apaixonar é fácil
instinto simples
como estava enganado
percebo agora
profundamente triste
quando te espero
às vezes te busco
noutras te escuto
num sussurro te sonho
meu amor
seria nosso o romance do desencontro?
sempre imaginei-a
revelando-se
arrebatadora e surpreendente
mas de repente
tudo isso se tornou somente
ensejo rápido
de um verso patético, infeliz e inocente
acordo com sono discordo como um amanhã
em nosso amanhã
acendo o cigarro e sinto o gosto louco dos porquês
peco pouco e escarro na sorte da noite
era dia quando ela me fez
esquecer de te levar
pro céu da minha história
atrita agora essas duas rochas vadias
que palpitam e sangram
e nas faíscas dessas horas
dessas fodas
nessa brasa
esquenta teu peito
no fogo alto de nossos corpos
queima a última fogueira
do depois
O Amor em Dois Atos
O Primeiro Amor: fodeu, amor, fodeu, tu e eu, deu,
amor, deu, tu e eu, amor, fodeu.
Amor Segundo o Amor: me dá carinho, caralho,
latejando, eu to carente, daqueles lábios, sugando,
teu carinho, meu caralho.
Rente a palavras busco estrelas
entre estrelas busco palavras
junto palavras busco estrelas
junto estrelas e não leio palavras
voo em palavras entre estrelas
condeno estrelas ao contorno das palavras
curiosamente palavras e estrelas
têm algo em comum: nós
Amiga
Para Natália Palhares
estou com vontade de lembrar de você
você que ama: mas não a mim
você que é: de vez em quando
porém triste, muito triste
com leminski num copo de vodca
dois dedos amargos de nossos idos de escola
bons tempos, me diz
os piores, contesto
você: admirada pelos padres
a mocidade cristã
entre os mais populares
eu: discos do nirvana
legião urbana
poetas malditos
os primeiros porres
e gramas de maconha
os anos e a distância borraram-nos muito
mas quando penso naquele começo de milênio
só me sobra a vontade
dos seus olhos verdes de amizade
nos meus platônicos e selvagens
que hoje em mim já não reconheço
15/06/2004 – 0h14
queria voar por entrelinhas, ambígua, caretas. não
poesia retilínea, estúpida pretensão que obriga à
rima, imperfeita, suburbana, subversiva – ah,
profana. a cafonice é tão bela quando se está
apaixonado, loucuras parecem escritas em diários,
tudo devidamente assinado, para contrariar-nos por
aquilo que parece deliciosamente oficioso. no sono
que vem vindo, pela noite que só espera pra passar,
o dia de ponto insiste, teimoso em retornar. de pé
cedo amanhã, pois poesia também se faz de amanhã
as livres possibilidades do amor
ele ela ele ela ele ela
ele ela ela ele ele ela
ele ele ele ela ele ela
ele ela ela ela ele ela
eleelaelaeleeleeleelaela
ela ele ele ela ela ela
[confesso:não me basto]
[há algo em alguém que preciso]
[e só pode ser-me dado]
[há algo em alguém:insisto]
[que deseja ser conquistado]
o sol insurge contra as fronteiras dos incontinentes
rompem das sombras das serras os seres
que compartilham escuridão à ribeira
dos montes de terra arrasada onde
é preciso ensolarar-se!
poeta de baixo
de libertários dedos
e proletárias penas
mirada molenga de nega faceira
que dengosa se achega
com cheiros no pescoço
estala nos beiços o som do beijo que é só nosso
choramos juntos
imigrante e escrava
numa bárbara terra miscigenada por tantos
deuses, macumbas, santos
e os mesmos malditos senhores do engenho
de antes
de logo há pouco
… e as únicas réstias
que suas retinas capturavam
eram os pingos suados que despencavam
salgados do suor das paredes de seu mundo.
Mirava alguém sem cheiro
o cheiro de alguém sem nome
o nome de alguém sem lágrimas.
O Sindicato dos Egoístas.
A instituição
que perpetuou
tamanha obliquidade
agora parte de suas entranhas
o tórrido envolvia seu tronco
ora sentido nublado que se refestela suave
pelas vísceras solitárias de outrem e outrora.
:Um som familiar:
:O apito anuncia a ração:
.Meio copo de sêmen ainda morno e um colhão crú.
Já distinguia entre os bagos dos bravos
e dos covardes. De jovens, crianças e adultos.
Tudo depende da temperatura do sangue
e a coagulação quando envolve a língua.
O esperma, sente da mesma forma
Colheita de bestas raivosas
em tom aperolado de creme azedo
durante a florada de cinzas
escorrendo nas bordas da garganta
dos entes e dos idos breves
quando não se agarra aos dentes
cemitérios entre os frontes
como tudo que lhe saboreia a alma
da contenda dos contentes
no desjejum de orifícios e de carne quente.
ao longo de disparos cegos e solidários.
Primeiro fora uma sutil sensação de formigamento
que veio sugando-lhe os ossos e emaranhando as
ideias.
Foi lançado à mordaça nas cavernas cindidas
pelos canhões de angustia e desilusão...
Lírios ou Rosas
quando abrir sua cortina
e mostrar ao mundo seu jardim de lírios
antes tenras rosas ruivas
chama no encosto da janela
os segundos largos
mergulhados na sutileza
a sós
e silenciosa
uma gota
antes geada
tateia a pétala
de
li
za
e
s
c
o
r
r
e
IBIS REDIBIS NON PERIBIS IN ARMIS
algo de errado está errado nalgum lugar estranho
em todas as partes em todos os mitos
as espadas brandem as pedras partem
marés em gritos
os olhares se cruzam como lanças no escuro
dementes rogam diferentes lutos
o sangue se espalha a mente se engaja
tribulam-se almas em neblina e sal
surpresas esperam presentes rotineiros
bocas aflitas emudecem ainda mais
a dor aloja-se nas gerações com medo
talvez sonhos ainda busquem cais
procurando farelos entre migalhas
desvendado cinzas queimadas
e o que foi nada um dia de repente corrompeu
tateio nos passos do deserto
entre tatos batalhões e exércitos
os vestígios do que ainda resta
das estátuas deportadas a força
esculpidas em carne e osso
movimentos perdidos alertam
há um presente que chega de longe
de um tempo biologicamente estéreo
ruflam asas historicamente espessas
não se contempla o cronômetro
que nos tornamos
como abstrato que passa
se por si
só
não passa
igual aqui
e a um metro de mim
preciso saber qual foi meu erro
talvez eu erre tanto assim
disputando espaço com meu passos
no escuro da solidão que acalma
meu oceano procura algum mar
ou qualquer estrela que por tristeza
desaprendeu a brilhar
não é imaturidade essa minha irresponsabilidade
é desânimo
pois o dono da verdade tem certeza que a teimosia
não compensa
e sequer tentou me convencer
vivo preocupado em não me preocupar
me pego pensando e faço o que vai dando
sem reclamar
por enquanto
manchei os anéis de saturno
espalhei todos no chão
olhei marte pelo avesso
tomei banhos de sol de plutão
lobos camuflados rosnam ao meu lado e vão
misteriosos sem avisar sobre o alinhamento
caótico de cada posição e aquele silêncio mórbido e
a sua ingratidão que então revida pelo ontem o que
lamento integro era antes mártir e não tardaria
incrédulo aos que lhe tentam quando piso entediado
em teu nome e resgato indecisão em piedade num
insulto que aqui deixastes qual a benção que
veneras tarde mas não tarda pois inquietos gritam
por deslumbre já chega arbitrária em teus contrastes
que reges em orquestras quando regas mortalhas e
repudia a ânsia promiscua que vai sepultar no penão
de serpente a gritar rijo e ardente suas sombras a
clamar horrores estalando cedo as mágoas
arrastadas a correntes de pó que silencia teu pranto
pois não honrastes tua corja amada e nem agora
ouve os ecos de tua história soar
no nosso peito bate um órgão muito falso
e no nosso corpo a defesa é tão frágil
pele corada mas doentia
sorriso mordo de rotina
rosto e fadiga já se completam
é tal a lonjura de seu olhar
o infinito é só uma esperança
estúpida o suficiente para confortar
.um fantasma ronda a poesia.
Minha mão está seca
e meus lábios também
nada adianta
sequer sêmen de desdém
vou tirar meus bagos
e te dar pra adubo
ser popular com cereal de hormônio
tomando laxante pra cagar o coração
debaixo da sua cama
adiantando a pulsação
Teoria Antropocêntrica das Imagens Enluaradas
bocas movidas à pilha
esperanças queimando em velas de sétimo dia
espirros de suor e peitos de aço
cartas em latim arcaico
sobre castelos de papel líquido
e seus filósofos-reis analfabetos
para-raios no chão e espelhos em espadas
o ar sente-se livre embriagado
a venda de indulgências está novamente na moda
mas agora com passaporte e carimbo
a democracia burguesa é a nova simonia da plebe
sempre foi assim
poeira e deserto flutuando no concreto
religiões complexas e seus lençóis de histeria
estaca aberta no braço
alcança
arde e repudia
está no pântano
no pântano de estranhos
e também na arca
na arca incendiada
parece câncer crescendo em prantos
parece unha calejada
está chorando
vê!
mas não sente nada
enlouquece!
segue lenta e embalsamada
a alma que enfim
bateu em retirada
precisa-se urgentemente de água potável, telhas,
fraudas, madeira, roupas e alimentos não-
perecíveis como arroz, feijão, fubá, amor...
das rupturas distorcidas desta realidade morta
os devaneios sinceros do absurdo
elementos distintos conjugados contraditórios
convergem num horizonte comum
necrosado nos traços ideais
controversos e putrefatos
como a memória
espada que retalha
e o sonho
doença mal curada
então a lágrima é o grito de resistência
ou de esperança
nunca
nunca ambas
olhos lameados
insistentes no olhar
sob o prisma um tanto aquoso
num lacrimejar nebuloso
pelas ambições de antes
e de jamais
só, curtindo minha estratégia estúpida do flerte
frente à melancolia, o sabor doce da decepção, eu
sei, é uma paixão por dia, daquela que desafia a
constância fria, e má, da vida, desavisada, vazia e
regrada, marca rasgada na alma, negativa vazão na
carne, pletora das minhas veias, pulsa a cor
pessimista, que parte de sua vista, até o mórbido
anseio insistente, quer tornar-se novamente, ato da
vida matando a vida, e das letras, cantando mortes
ARTE DA CAPA POR BIBI MONTEIRO
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