Post on 15-Oct-2015
V.
I. L
N
IN O IMPERIALISMO
ETAPA SUPERIOR
DO CAPITALISMOAPRESENTAO
SRIE
POR QUE VOLTAR A LNIN?
IMPERIALISMO, BARBRIE
E REVOLUOPlnio de Arruda Sampaio Jnior
Coord. Jos Claudinei Lombardi
NAVEGANDOp u b l i c a e s
9 7 8 8 5 7 7 1 3 1 2 6 6
V. I. Lnin
O IMPERIALISMO, ETAPA O IMPERIALISMO, ETAPA O IMPERIALISMO, ETAPA O IMPERIALISMO, ETAPA SUPERIOR DO CAPITALISMOSUPERIOR DO CAPITALISMOSUPERIOR DO CAPITALISMOSUPERIOR DO CAPITALISMO
APRESENTAO
POR QUE VOLTAR A LNIN? IMPERIALISMO, BARBRIE E REVOLUO Plnio de Arruda Sampaio Jnior
OImperialismo,EtapaSuperiordoCapitalismoEdio Eletrnica (ebook) com apresentao de Plnio de ArrudaSampaioJnior.AutorVladimirIlitchLninApresentaoPorqueVoltaraLnin?Imperialismo,BarbrieeRevoluo.PlniodeArrudaSampaioJniorCapaCriao usando elementos do pster sovitico O Camarada LninVarre a Escria da Terra, de Mikhail Cheremnykh e Viktor Deni,novembrode1920.FtimaFerreiradaSilvaGustavoBolligerSimesDiagramaoeComposio
FtimaFerreiradaSilvafatima@letraseimagens.com.brGustavoBolligerSimesgustavo@letraseimagens.com.brSrie
CoordenadorJosClaudineiLombardiwww.navegandopublicacoes.netnavegandopubl@gmail.com
ProduoEditorial
CampinasBrasil2011
SUMRIOSUMRIOSUMRIOSUMRIO
Apresentao
Por que Voltar a Lnin? Imperialismo, Barbrie e Revoluo
1. Introduo ......................................................................................................................... 7
2. Em busca da totalidade ............................................................................................. 17
3. A teoria do imperialismo de Lnin ........................................................................ 30
4. O pensamento de Lnin em seu movimento concreto ................................... 49
Teoria da Revoluo Russa I
Desenvolvimento capitalista e as vias da revoluo burguesa .. 50
Os fundamentos tericos do partido bolchevique ........................... 55
Teoria da Revoluo Russa II
Imperialismo x Socialismo ......................................................................... 60
Revoluo socialista e os desafios da transio ..................................... 80
Lnin e as surpresas da Histria ................................................................... 88
5. Observaes Finais ....................................................................................................... 95
Bibliografia ....................................................................................................................... 102
O Imperialismo, Etapa Superior do Capitalismo
Prefcio de 1917 ............................................................................................................ 106
Prefcio s edies francesa e alem ................................................................... 108
Prlogo ............................................................................................................................... 116
I. A concentrao da produo e os monoplios ............................................... 118
II. Os bancos e seu novo papel ................................................................................... 138
III. O capital financeiro e a oligarquia financeira ............................................ 160
IV. A exportao de capital ........................................................................................ 180
V. A partilha do mundo entre os grupos capitalistas ...................................... 188
VI. A partilha do mundo entre as grandes potncias ...................................... 200
VII. O imperialismo fase particular do capitalismo ......................................... 216
VIII. O parasitismo e a decomposio do capitalismo .................................... 231
IX. Crtica do imperialismo ......................................................................................... 244
X. O lugar do imperialismo na histria ................................................................. 263
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APRESENTAO
PPPPOR QUE VOLTAR A OR QUE VOLTAR A OR QUE VOLTAR A OR QUE VOLTAR A LLLLNINNINNINNIN???? IIIIMPMPMPMPERIALISMOERIALISMOERIALISMOERIALISMO,,,, BARBRIE E BARBRIE E BARBRIE E BARBRIE E REVOLUOREVOLUOREVOLUOREVOLUO
Plnio de Arruda Sampaio Jnior1
1. Introduo
No poderia ser mais oportuna a reedio do estudo
seminal de Vladimir Ilich Lnin, O Imperialismo: Etapa Superior do
Capitalismo. Sua publicao atende a uma dupla necessidade:
resgatar a reflexo sobre o imperialismo como modo de
funcionamento do sistema capitalista mundial e recuperar o
pensamento de Lnin como rico manancial de conhecimento sobre a
cincia da luta de classes e a arte da revoluo na era do
imperialismo - dois assuntos tabus, banidos do debate pblico aps o
1 Plnio de Arruda Sampaio Jnior, professor do Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas IE/UNICAMP. Agradeo o generoso apoio de Marlene Petros Angelides na reviso da redao.
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longo ciclo de ditaduras militares, a derrocada do socialismo real e
a avassaladora ofensiva neoliberal.
A oportunidade de retomar o estudo sobre o
imperialismo decorre do fato de que, ao contrrio do propalado
pelas vises apologticas, que comemoraram o colapso da Unio
Sovitica, o fim da guerra fria e a crise do movimento socialista, a
supremacia ilimitada do capitalismo no inaugurou um perodo de
prosperidade, democracia e paz, mas uma poca marcada pela
instabilidade econmica, pela intensificao das tendncias
autocrticas do regime burgus, pela ausncia de qualquer limite
guerra econmica entre as megaempresas multinacionais que
disputam o controle do mercado mundial e pela revitalizao de
formas explcitas de colonialismo e neocolonialismo que
acompanham a terceira diviso do mundo pelas grandes potncias
imperialistas. O acirramento dos antagonismos do modo de
produo capitalista prenuncia um futuro de grandes turbulncias
sociais, dramticas comoes polticas e catastrficos desastres
ecolgicos. Em seu livro Socialismo o Barbarie, o filsofo Istvn
Mszros alertou para a gravidade do momento histrico gerado
pelo capitalismo sem travas: [...] no es exagerado decir [...] que
hemos entrado en la fase ms peligrosa del imperialismo en la
historia. Porque lo que est en juego ahora no es el control de una
parte del planeta, no importa cun grande, o poner en desventaja a
algunos rivales, aunque permitindoles acciones independientes,
sino el control de su totalidad por una superpotencia hegemnica,
econmica y militar, con todos los medios an los ms autoritarios
y, de ser necesario, los militares ms violentos a su disposicin.
Esto es lo que requiere la racionalidad esencial del capital
desarrollado globalmente, en su vano intento de poner bajo control
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sus irreconciliables antagonismos. El problema es que, sin embargo,
esta racionalidad [...] es al mismo tiempo la forma ms extrema
de irracionalidad de la historia, incluida la concepcin nazi de
dominacin mundial, en lo que atae a las condiciones necesarias
para la supervivencia de la humanidad.2
Para os povos que fazem parte da periferia do sistema
capitalista mundial, os novos tempos tornaram-se particularmente
sombrios. As janelas de oportunidades que seriam abertas pela
participao na ordem global revelaram-se verdadeiras armadilhas.
As polticas de liberalizao da economia desarticularam os centros
internos de decises, deixando a regio merc dos capitais
internacionais. As promessas de que as ondas de inovao
tecnolgica e os movimentos de internacionalizao de capital
permitiriam uma acelerao do crescimento e uma socializao dos
novos mtodos de produo e dos novos bens de consumo no foram
cumpridas. A difuso desigual do progresso tcnico acentuou as
assimetrias na diviso internacional do trabalho e exacerbou as
caractersticas predatrias do capital, revitalizando formas de
superexplorao do trabalho e de depredao do meio ambiente que
se imaginavam superadas. Submetidas ferocidade da concorrncia
global e ao despotismo das potncias imperialistas, as sociedades
que fazem parte da periferia do sistema capitalista tornaram-se
presas de um processo de reverso neocolonial que coloca em
questo a sua prpria sobrevivncia como Estado nacional capaz de
controlar minimamente as taras do capital. No que o Estado tenha
se enfraquecido. Quando para defender e impulsionar os interesses
do grande capital, o poder estatal se revela mais forte do que nunca.
2 Mszros,I. El Siglo XXI Socialismo o Barbarie?. Buenos Aires, Ediciones Herramienta, 2003, p. 45.
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O que ficou definitivamente comprometido o carter pblico do
Estado, sua atuao em funo de interesses que, de alguma forma,
contemplem as necessidades do conjunto da populao. Por essa
razo, na periferia da economia mundial o descontrole da sociedade
nacional sobre o desenvolvimento capitalista foi levado ao
paroxismo.
Campo de operao de conglomerados internacionais e
zona exclusiva de influncia dos Estados Unidos a potncia
plenipotenciria da era global -, o novo contexto histrico afetou a
Amrica Latina em todas as dimenses de sua vida econmica,
sociocultural e poltica. O verniz de modernidade decorrente da
incorporao das novas ondas de progresso tcnico veio
acompanhado de uma sistemtica deteriorao das condies de
vida da maioria da populao. O aumento assustador do desemprego,
a acelerada precarizao das relaes de trabalho, o surpreendente
retorno de formas de trabalho escravo que se imaginavam
superadas, a emigrao em massa da fora de trabalho em busca de
melhores condies de vida, a crise da industrializao nas
economias que haviam logrado avanar no processo de substituio
de importaes, o avano do agronegcio sobre as terras dos
pequenos e mdios agricultores e sobre as reas virgens do que
ainda sobrou de floresta, a falta de moradia e a deteriorao das
condies de vida nas grandes e mdias cidades, a escalada da
violncia urbana e rural que vitima milhares de pessoas todos os
anos e provoca grandes deslocamentos populacionais, a ausncia de
recursos para financiar servios pblicos mais elementares, ao
mesmo tempo em que volumes gigantescos da receita tributria so
canalizados para o pagamento da dvida pblica, o retorno de
epidemias e endemias que j eram dadas como erradicadas, o
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atropelo das populaes indgenas e de seu modo de vida, a escalada
sem precedentes da depredao do meio ambiente, a corrupo em
proporo amaznica que gangrena os aparelhos de Estado em todas
suas dimenses, a assinatura de pactos internacionais esprios que
violentam abertamente a soberania nacional, a chocante tutela da
comunidade econmica e financeira internacional sobre as decises
estratgicas do Estado Nacional, a proliferao de bases militares
norte-americanas em todos os pontos do Continente, a descrena nas
instituies e a crise poltica monumental - latente em algumas
regies, em franca ebulio em outras -, a profunda crise da
identidade nacional, que coloca em questo a prpria noo de
sociedade nacional, todos estes processos so fenmenos pura e
simplesmente incompreensveis sem uma reflexo sistemtica sobre
o imperialismo de nosso tempo e sua forma especfica de
funcionamento na Amrica Latina.
Quem observa a histria recente da Amrica Latina
constata facilmente que no faltaram energia nem disposio de luta
para resistir nova onda de saque e pilhagem que se abateu sobre o
Continente. Nos sombrios anos noventa, os ares de rebelio
sopraram por todos os lados. A intensidade e a diversidade das lutas
polticas que marcaram o passado recente transformaram a Amrica
Latina em um verdadeiro laboratrio de luta de classes. Visto em
conjunto, o panorama das lutas sociais d a impresso de que a
regio um vulco preste a entrar em erupo. No aqui o lugar de
fazer um balano crtico das experincias de luta das ltimas
dcadas, mas no exagero afirmar que, no desespero de enfrentar
uma situao particularmente adversa, as classes subalternas
dispararam para todos os lados. Houve iniciativas radicais,
ultrarradicais, moderadas e ultra moderadas; aes que ficaram
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circunscritas aos marcos institucionais, as que recorreram ao
expediente da desobedincia civil e ainda as que desafiaram
abertamente a ordem legal; movimentos de massa, que mobilizaram
milhes de pessoas, processos que priorizaram a ocupao dos
aparelhos de Estado e a conquista do poder institucional pela via
eleitoral e operaes vanguardistas protagonizadas por pequenos
grupos armados; processos polticos que colocaram explicitamente o
objetivo da conquista do poder do Estado e outros que procuraram
mudar a situao pela construo de um difuso contrapoder popular;
aes de carter meramente defensivo e as que desafiaram
abertamente a ordem estabelecida; organizaes polticas de
inspirao desenvolvimentista, nacionalista, comunista, anarquista e
indigenista; movimentos imediatistas e outros com perspectivas
milenaristas; processos polticos que eclodiram de maneira
espontnea e outros que resultaram de um longo acmulo de foras;
aes ousadas e convencionais, atitudes intransigentes e rendies
incondicionais; sacrifcios heroicos e vergonhosas traies.
A ordem burguesa mobilizou todos os expedientes
imaginveis para neutralizar a reao popular. O que no pde ser
isolado ou cooptado foi pura e simplesmente esmagado. O inventrio
das vtimas daria uma histria sem fim. O incomensurvel sacrifcio
humano despendido na luta contra a nova investida do imperialismo
no foi suficiente, no entanto, para deter o avano da barbrie e abrir
novos horizontes para a Amrica Latina. O estado de rebelio
permanente no se traduziu em transformaes efetivas que
mudassem qualitativamente o curso dos acontecimentos. O caso
argentino emblemtico. Aps derrubar quatro presidentes em
poucas semanas, a insurreio popular que comeou com a palavra
de ordem ultrarradical de negao absoluta do poder institudo -
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que se vallan todos - terminou com a retomada de polticas
neoliberais muito bem comportadas e a restaurao dos mtodos e
dos personagens do velho peronismo. Nesse contexto, a Venezuela
a situao mais radicalizada da Amrica Latina aparece como uma
exceo. A fora tectnica que move a revoluo bolivariana abre
brechas que, se bem aproveitadas, podem quebrar os obstculos que
bloqueiam a mudana e desencadear uma dinmica de
transformao irreversvel. At o momento, entretanto, o desfecho
do processo encontra-se indeterminado, pois as foras
contrarrevolucionrias, ainda que desarticuladas e desmoralizadas,
no foram liquidadas. Ainda incipientes e, em certo sentido,
indefinidas, as situaes da Bolvia e do Equador se aproximam da
situao venezuelana. A tragdia colombiana, em que as formas mais
radicalizadas de revoluo e contrarrevoluo se manifestam em sua
plenitude, um caso parte que, paradoxalmente, sintetiza todo o
terrvel impasse latino-americano e parece prefigurar o seu destino.
Ainda que todo o sacrifcio humano para barrar a
ofensiva imperialista no Continente no tenha sido em vo, pois foi
indispensvel para diminuir o impacto destrutivo das polticas
neoliberais e alimentar um precioso aprendizado poltico que, se
devidamente digerido, poder ser fundamental em embates futuros,
a verdade que o imperialismo demonstrou uma surpreendente
capacidade de contornar os obstculos que se lhe antepunham,
neutralizar as iniciativas que pudessem subverter a ordem e impor o
desiderato do padro de acumulao neoliberal-perifrico s
sociedades latino-americanas. Quando posta em perspectiva de
longa durao, a impotncia para deter a nova ofensiva do
imperialismo reproduz uma sequncia de oportunidades perdidas
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que mantm a Amrica Latina presa ao crculo de ferro do
capitalismo dependente e do subdesenvolvimento.
Como no faltaram momentos de crises polticas
profundas, que abriam oportunidades reais para a mudana, nem
disposio de luta e sacrifcio para enfrentar a nova ofensiva contra a
dignidade dos povos, talvez o impasse latino-americano esteja
associado falta de instrumentos polticos adequados para enfrentar
a situao, carncia que fez com que os esforos despendidos
ficassem aqum do necessrio para fazer face fora do adversrio,
perdendo-se em processos estreis ou, pior, em equvocos
recorrentes que redundaram em graves derrotas. Esta a hiptese
de um dos maiores socilogos latino-americanos Florestan
Fernandes. Infelizmente, ao que parece, seu balano sobre o estado
da luta de classes na regio no final da dcada de setenta no foi
ultrapassado: O diagnstico correto, embora terrvel para todos ns,
que nunca fizemos o que deveramos ter feito. E mais: [...] ainda
no sabemos quais so os caminhos que nos levaro desagregao
do nosso capitalismo selvagem e a solues socialistas apropriadas
presente situao histrica.3
o abismo entre a evidente necessidade de profundas
transformaes econmicas, sociais, polticas e culturais e a patente
incapacidade para realiz-las que reclama o pensamento de Lnin a
principal referncia terica do marxismo revolucionrio do sculo
XX. Aps a falncia do chamado socialismo real, pode parecer
extemporneo insistir na reivindicao de ideias que se imaginavam
despedidas pela Histria. E, no entanto, poucas reflexes podem ser
mais providenciais para oxigenar o debate poltico de uma gerao
3 Fernandes, F., Apresentao do livro de V. I. Lnin, Que Fazer?, So Paulo, Hucitec, 1978, pp. XII e XIV.
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de militantes criados na tradio do anarquismo, do basismo, do
corporativismo, do parlamentarismo, bem como na escola de um
stalinismo mais ou menos dissimulado. No se trata de imaginar o
pensamento de Lnin como uma panaceia capaz de dar respostas aos
complexos problemas da luta de classes contempornea, mas de
recuperar uma reflexo que constitui patrimnio inestimvel do
movimento socialista revolucionrio.4
Esta introduo foi escrita para os militantes socialistas
que esto conscientes da insuficincia de seus instrumentos
polticos, que no conhecem o pensamento de Lnin e que sentem
curiosidade de conhec-lo. No se pretende ir alm do prprio Lnin
e, muito menos, ditar a essncia de sua verdade, iniciativa que seria
destituda de qualquer sentido construtivo e que contrariaria todos
os princpios de seu mtodo de trabalho. Que cada um faa sua
prpria leitura de Lnin e a discuta no local apropriado - as
organizaes de luta dos trabalhadores. Nossa finalidade se restringe
a sistematizar os elementos fundamentais do sistema terico que
organiza a reflexo de Lnin sobre os dilemas da revoluo na era do
imperialismo. O objetivo oferecer uma viso de conjunto da relao
entre o seu pensamento e a sua teoria do imperialismo. Ao explicitar
as questes fundamentais levantadas por Lnin, pr em evidncia a
coerncia de seu mtodo e explicitar a sua extraordinria
4 A propsito da infalibilidade de Lnin, um mito construdo pelo stalinismo, que, na realidade, tinha a finalidade de defender a infalibilidade do prprio Stlin, supostamente o verdadeiro portador das verdades do leninismo, convm lembrar as palavras do prprio Lnin: O homem inteligente no aquele que no comete falta alguma. Tais indivduos no existem nem podem existir. O homem inteligente aquele que no comete faltas demasiado graves e sabe corrigi-las rapidamente, com facilidade, apud, Lukcs, G., O Pensamento de Lnin, p. 130.
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importncia prtica, pretendemos apenas instigar o estudo de um
gigante do socialismo revolucionrio que precisa ser conhecido.
O estudo introdutrio foi organizado de forma a
evidenciar como Lnin combina mtodo, teoria e investigao
histrica para desnudar os vnculos entre imperialismo, barbrie e
revoluo. A exposio ser desdobrada em trs movimentos. Na
prxima seo, Em busca da totalidade, apresentaremos um
resumo sinttico do pensamento dialtico de Lnin, enfatizando a
importncia central da noo de totalidade como elemento-chave
de seu mtodo de anlise concreta de uma situao concreta. Na
terceira parte, A teoria do imperialismo de Lnin, explicitaremos o
mtodo e a teoria utilizados por Lnin para analisar a economia
mundial em seu conjunto, mostrando as razes que o levaram a
definir o capitalismo monopolista como um regime de transio do
capitalismo ao socialismo. Na quarta seo, O pensamento de Lnin
em seu movimento concreto, examinaremos a evoluo de seu
pensamento, sistematizando os principais aspectos de sua teoria da
revoluo, de sua teoria do partido e de sua teoria da transio.
Nesta oportunidade, apresentaremos a interpretao de Lnin sobre
o imperialismo de seu tempo, definindo as relaes concretas entre
imperialismo, barbrie e revoluo no incio do sculo XX. Por fim, na
ltima seo, Observaes finais, realizaremos um resumo sinttico
do mtodo de Lnin e de suas principais concluses, destacando a
importncia de sua contribuio para a compreenso da fase
superior do imperialismo e para a luta pelo socialismo em nosso
tempo.
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2. Em busca da totalidade
O pensamento de Lnin fruto de um esforo
sistemtico para tirar concluses prticas da mxima de Marx,
segundo a qual os filsofos at agora interpretaram o mundo, mas
se trata de transform-lo, e de seu necessrio corolrio: a teoria
converte-se em fora material quando penetra nas massas. Sua
inteno levar a ruptura com a atitude contemplativa do mundo s
ltimas consequncias, fundindo materialismo histrico e luta
revolucionria. O desafio consiste em converter a fora potencial do
proletariado a classe social que representa a anttese da burguesia
em fora poltica real com poder de impulsionar a revoluo
socialista. O n da questo reside em constituir a classe operria
como sujeito histrico capaz de negar o capitalismo e afirmar o seu
contrrio o comunismo.
No mbito do pensamento marxista, a reflexo de Lnin
representa uma ruptura com o materialismo evolucionista,
determinista e mecanicista que dominava a social-democracia
europeia no incio do sculo XX e que tinha em Bernstein, Kautsky e
Plekhanov suas principais referncias. Preocupado em recuperar o
papel estratgico da ao poltica como elemento decisivo da
Histria, Lnin retoma o problema clssico do materialismo dialtico
sobre a necessria unidade entre Teoria e Prtica, cuja essncia
consiste em colocar a poltica como elo entre a reflexo e a ao. Com
tal procedimento, Lnin integra organicamente a luta de classes
como elemento vital do materialismo histrico e restitui o papel
central da classe operria como alfa e mega da prxis
revolucionria. Sua viso pode ser sintetizada na ideia de que, assim
como no existe movimento revolucionrio sem teoria
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revolucionria sua mxima clssica -, no existe teoria
revolucionria sem movimento revolucionrio a premissa
fundamental de sua epistemologia.5
O esforo para converter o materialismo histrico em
uma lgebra da revoluo, que equaciona os desafios da revoluo
socialista e o modo de enfrent-los, consubstancializou-se na
operacionalizao de um mtodo de interpretao da realidade
voltado para a obteno de conhecimentos reais sobre as tendncias
efetivas da luta de classes e seus possveis desdobramentos. Lnin
sintetizou a quinta-essncia de sua metodologia da seguinte
maneira: a anlise concreta de uma situao concreta a alma viva,
a essncia do marxismo. A impressionante consistncia de seu
pensamento e a inabalvel coerncia de sua ao poltica foram
determinadas pela fidelidade ao mtodo, cuja essncia reside em
subordinar toda a interpretao do movimento histrico aos ditames
da luta de classes. No se pode compreender a vitalidade desse
pensamento, diretamente inserido na histria em processo, afirma
Florestan Fernandes - se no se tem em mente que ele no existiria
como tal sem o movimento socialista, que lhe deu ao mesmo tempo
realidade histrica e sentido poltico revolucionrio. Ele definiu o seu
mdulo poltico, determinando tanto o seu contedo quanto sua
5 A questo da relao entre a teoria e a prtica um tema permanente de debate entre os discpulos de Marx. A posio de Lnin pode ser aprofundada em Lukcs, L., O pensamento de Lnin. Lisboa. Publicaes Dom Quixote,1975; Lefebvre, H., Pour Connatre la Pense de Lnine. Paris, Bordas, 1957; Liebman M., Le Lninisme sous Lnine, 2V., Paris, ditions du Seuil, 1967; Vzquez, A.S., Filosofia da Prxis. So Paulo, Expresso Popular/Clacso,2007; Arato, A., A Antinomia do Marxismo Clssico: Marxismo e Filosofia, in Hobsbawm, E.J., Histria do Marxismo, Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1989; e Gruppi, L., O pensamento de Lnin. Rio de Janeiro, Graal,1979.
19
orientao revolucionrios, e explicando simultaneamente seja sua
continuidade e oscilaes, seja suas debilidades e sua fora terrvel.6
A compreenso da realidade como sntese de mltiplas
determinaes leva Lnin a recuperar as consequncias
revolucionrias da totalidade como categoria basilar do legado de
Marx e Engels. esta perspectiva que lhe permite integrar os
problemas da acumulao de capital e da luta de classes como
fenmenos que se condicionam reciprocamente. A viso do
movimento histrico como um todo contraditrio em permanente
transformao implica a concepo da transio do capitalismo para
o socialismo como resultado de uma luta de vida ou morte entre o
proletariado e a burguesia. O papel estratgico da classe operria
como sujeito histrico resulta de sua capacidade mpar de desnudar
a natureza antagnica da relao capital-trabalho e de conscientizar-
se da necessidade inescapvel de sua superao. Nisto, Lnin segue o
que havia sido estabelecido por Marx: Se os autores socialistas
atribuem ao proletariado esse papel histrico mundial, no [...]
porque tenham os proletrios por deuses, antes pelo contrrio,
porque a abstrao de toda a humanidade, mesmo da aparncia de
humanidade, est praticamente consumada no proletariado
plenamente desenvolvido, uma vez que nas condies de vida do
proletariado esto resumidas ao seu paroxismo mais desumano
todas as condies de vida da sociedade atual, uma vez que nele o
homem se perdeu a si prprio, mas ao mesmo tempo no s adquiriu
a conscincia terica desta perda como foi imediatamente
constrangido pela misria inelutvel j desvelada, absolutamente
imperiosa expresso prtica da necessidade revolta contra esta
6 Fernandes, F. Introduo. In: Lenin, V.I., Lnin: Poltica. So Paulo. tica, 1978, p. 34.
20
desumanidade; e por isso que o proletariado pode e deve
emancipar-se. No pode, contudo, emancipar-se sem suprimir as
suas prprias condies de vida. No pode, contudo, suprimir as suas
prprias condies de vida sem suprimir todas as condies de vida
da sociedade atual, que se condensam na sua situao.7
Refratrio a concepes fatalistas, que derivam o curso
dos acontecimentos de leis inflexveis que ditam a trajetria
inexorvel da histria, tornando-a uma sequncia predeterminada
de etapas, e contrrio a todas as formas de voluntarismo poltico, que
descolam o futuro da sociedade das contradies do presente,
deixando-o totalmente indeterminado, Lnin resgata a dialtica
como categoria que aponta o devir da sociedade, vinculando o campo
de oportunidades de cada formao social s contradies que
impulsionam seu movimento histrico. Ao identificar nos fatos
concretos as evidncias que apontam o germe do novo no ventre do
velho, definindo os desajustes estruturais que abrem espao para a
acelerao histrica e as rupturas cruciais que superam as
contradies, Lnin transforma o materialismo histrico em uma
poderosa arma de interpretao da realidade que indica os passos
decisivos que levam revoluo socialista. Se considerarmos o
conjunto do pensamento de Lnin, afirma Gruppi - veremos que a
ateno se volta sempre para a dialtica: dialtica dos processos
reais, modo pelo qual se manifesta neles a contradio, relao entre
todos os elementos que a constituem, conexo entre situao
objetiva e iniciativa poltica. A poltica s plenamente tal, s atinge
uma fundamentao cientfica prpria, se for guiada pela teoria, pelo
conhecimento das leis que governam o desenvolvimento histrico e
das categorias que devem ser aplicadas anlise das situaes
7 Marx, K.; Engels, F. Sagrada Famlia. Centauro Ed., 2001.
21
concretas. Mas, precisamente por isso, a poltica fundada pela
teoria por sua vez funda essa teoria, a verifica, exige seu
desenvolvimento, num constante reexame crtico. A poltica
representa a unidade entre a teoria e a ao, a mediao entre elas.8
Fundador do partido bolchevique, arquiteto da
revoluo russa e lder mximo do primeiro Estado operrio, Lnin
condiciona o aproveitamento das oportunidades histricas
presena efetiva do proletariado como sujeito histrico dotado de
conscincia de classe, tirocnio poltico e poder de ao para
enfrentar a burguesia. Seu raciocnio prtico. Sem fora e
inteligncia para disputar o poder, a classe operria simplesmente
no tem meios objetivos e subjetivos para vencer a burguesia. No seu
dizer: Sera errneo creer que las clases revolucionarias siempre
tienen la fuerza suficiente para realizar la transformacin en el
momento en que las condiciones del desarrollo socioeconmico han
hecho que la necesidad de esa transformacin ste totalmente
madura. Esto no es as; la sociedad no est arreglada de una manera
tan racional y tan conveniente para sus elementos progresistas. La
necesidad de una transformacin puede estar madura, pero la fuerza
de los creadores revolucionarios de dicha transformacin puede
resultar inadecuada para lograrla. En estas condiciones, la sociedad
se pudre y su putrefaccin puede durar dcadas enteras.9
O pensamento de Lnin sobre a constituio do
proletariado como sujeito histrico destaca fundamentalmente dois
aspectos do processo de formao da conscincia de classe. De um
lado, o proletariado tem de superar o estado de fragmentao
poltica e alienao ideolgica - condio inerente situao do
8 Gruppi,L., O pensamento de Lnin. Rio de Janeiro, Graal, 1979, p. 300. 9 Lnin, V. I., Obras, Moscou, 1947, vol. 9, p. 338.
22
trabalho no modo de produo capitalista - que compromete sua
possibilidade de atuao como fora poltica independente. De outro,
tem de desenvolver uma subjetividade revolucionria capaz de, nos
momentos crticos da luta de classes, tomar as decises cruciais que
impulsionam o processo revolucionrio para a vitria, questo
particularmente decisiva nas conjunturas de crises revolucionrias,
quando a debilidade do regime burgus coloca na ordem do dia a
conquista do poder.
Tendo como base a histria do movimento operrio
europeu, Lnin concebe a formao da classe operria como um
complexo processo histrico que combina lutas econmicas - que
envolvem a relao dos trabalhadores com os capitalistas nas
fbricas - e lutas polticas - que colocam em questo as relaes de
poder entre as classes; lutas que reivindicam mudanas dentro da
ordem a reforma do capitalismo e lutas que pleiteiam mudanas
contra a ordem a revoluo socialista; movimentos espontneos
- que brotam naturalmente da insatisfao das massas com as
pssimas condies de vida - e movimentos organizados - que
exigem a presena de um centro de comando que possa aglutinar,
catalisar e direcionar a energia da classe operria para objetivos
polticos predefinidos.
A originalidade de sua contribuio encontra-se na
fundamentao da necessidade de organizaes revolucionrias
como elemento indispensvel para a constituio do proletariado
como sujeito histrico que pode negar o modo de produo
capitalista. O desafio fundamental consiste em criar as condies
para que as lutas destinadas a enfrentar os problemas concretos e
imediatos da classe operria se transformem em lutas que
impulsionem seus interesses estratgicos e de longo prazo. O n da
23
questo est na capacidade de levar a unidade existente entre a luta
por reformas e a luta pela revoluo momentos constitutivos de um
mesmo processo histrico a seu ponto de ebulio, quando as
mudanas graduais se convertem em saltos qualitativos. A funo
estratgica da organizao revolucionria deriva de seu papel
decisivo na viabilizao da fuso entre teoria revolucionria e
movimento revolucionrio condio sem a qual a revoluo
socialista no pode ser levada s suas ltimas consequncias.
A defesa da organizao revolucionria como
elemento catalisador indispensvel para elevar o grau de conscincia
de classe do proletariado apoiava-se na tradio do movimento
social-democrata europeu e tinha em Kautsky sua referncia terica
fundamental. O raciocnio o seguinte: a incapacidade do
movimento operrio de impor luta de classes, por conta prpria,
um radicalismo que transcenda os marcos do regime capitalista
atribuda natureza fetichista das relaes de produo capitalistas
e ao carter alienante do processo de trabalho. No contexto de uma
situao concreta que camufla os elementos essenciais da realidade,
a viso crtica depende de um elemento externo s relaes
imediatas do proletariado com o capital. Somente quando exposto
reflexo crtica da realidade, que desnuda as foras motrizes que
determinam a luta de classes, o proletariado tem condies de
realizar um salto de qualidade no seu grau de conscincia de classe e
adquirir a clareza poltica e a consistncia ideolgica necessrias
para impulsionar a luta revolucionria.
Dentro dessa perspectiva, a luta econmica por
aumentos salariais e melhores condies de trabalho produto
espontneo da contradio capital-trabalho um momento
importante no processo de formao da classe como fora poltica.
24
neste embate que o trabalhador desperta para a luta de classes e se
conscientiza de que precisa se organizar em torno de seus interesses
comuns ante o capital. Trata-se, contudo, de um passo insuficiente.
Somente quando o proletariado avana para a luta poltica,
disputando o poder do Estado, que se criam as condies para que
ele possa se organizar como classe social portadora de um projeto de
sociedade. Ainda assim, o salto de qualidade na conscincia de classe
no automtico. Enquanto a conscincia de classe permanecer
circunscrita ao horizonte sindical, limitando-se a reivindicar
melhorias nas condies de vida, a luta poltica atua sobre os efeitos
do desenvolvimento capitalista e no sobre suas causas estruturais,
sendo, portanto, estril como fator de negao do modo de produo
capitalista.
Como a classe operria no possui uma inteligncia
nata de sua situao social e de suas potencialidades polticas e como
tal inteligncia no brota naturalmente das lutas operrias, o salto da
forma embrionria de conscincia de classe circunscrita aos
parmetros da ordem burguesa - para a forma revolucionria
propriamente dita que nega o regime do capital e prope o
comunismo - requer o acesso a uma reflexo crtica que est muito
alm das possibilidades de quem est submetido a um regime de
trabalho e de vida que massacra e embrutece o ser humano.10 a
10 A conscincia revolucionria no nasce espontaneamente das lutas operrias porque requer uma elaborao crtica que supere os limites da conscincia burguesa a respeito do modo de funcionamento da economia e da sociedade capitalista. Em O Conceito de Hegemonia em Gramsci (Rio de Janeiro, Edies Graal, 1980), Luciano Gruppi resumiu a questo nos seguintes termos: Deve-se verificar um esforo de pensamento e uma capacidade de elaborao conceitual que pressupem a presena e a assimilao de uma srie de categorias cientficas, que podem ser atingidas to-somente num altssimo nvel de cultura, precisamente naquele nvel a que chegou Marx, p. 36.
25
constatao de que o proletariado incapaz de alcanar
espontaneamente o grau necessrio de conscincia ideolgica e
coeso poltica para impulsionar a revoluo socialista que leva
Lnin a atribuir um papel estratgico organizao revolucionria
como nexo indispensvel entre a teoria revolucionria e o
movimento revolucionrio. A superao da alienao pressupe a
luta do trabalho contra o capital que cria a necessidade de um
conhecimento crtico da realidade , mas requer um elemento
adicional que transcende a luta propriamente dita: a reflexo que
permite ir alm das aparncias dos fenmenos e, ao recompor a
totalidade de uma realidade que aparece fragmentada e catica,
desnudar o carter contraditrio do capitalismo. A importncia
estratgica deste ltimo elemento insubstituvel para que o
proletariado possa transcender sua experincia imediata. No dizer
de Lnin: Os operrios, [...], no podiam ter ainda a conscincia
social-democrata. Esta s podia chegar at eles a partir de fora. A
histria de todos os pases atesta que, pelas prprias foras, a classe
operria no pode chegar seno conscincia sindical, isto ,
convico de que preciso unir-se em sindicatos, conduzir a luta
contra os patres, exigir do governo essas ou aquelas leis necessrias
aos operrios [...].11
11 Lnin, V.I., Que Fazer? Apresentao de Florestan Fernandes. So Paulo, Hucitec, 1978, pp. 24-25. [Obras Escogidas, v.1., p.142].Cabe lembrar que o intelectual de que fala Lnin est ele prprio imerso na luta poltica, pois, na tradio de Marx, a meditao desvinculada da luta poltica fica reduzida a uma mera escolstica. A propsito, cabe registrar a observao de Gruppi, em O conceito de hegemonia em Gramsci: Devemos estar atentos, todavia, para um equvoco bastante difundido na interpretao de Lnin. Para Lnin, afirma-se, o partido revolucionrio seria exterior classe operria. Lnin jamais disse coisa do gnero. Ele afirma que a teoria vem de fora, do exterior, mas que o partido a organizao que liga a teoria revolucionria com o movimento; e, portanto, colocando a teoria revolucionria em contato com o
26
Na viso de Lnin, a formao da conscincia de classe
do proletariado como classe em si e classe para si um processo
histrico condicionado pela possibilidade de uma fuso entre a luta
por reformas e a luta pela revoluo. A importncia estratgica da
organizao revolucionria como fator de centralizao da fora
poltica da classe operria e de elevao de seu esprito
revolucionrio decorre de seu papel crucial na mediao entre a luta
econmica, que brota espontaneamente do conflito entre o capital e
o trabalho, e a luta poltica revolucionria, que requer uma
perspectiva que transcenda a ordem burguesa.12 Cabe ao partido
revolucionrio a tarefa insubstituvel de submeter a sociedade
burguesa a uma crtica implacvel, mostrando, em cada embate
concreto, os elos dialticos entre o imediato e o porvir, o inicial e o
final, o particular e o geral, o sintoma e o diagnstico, o efeito e a
causa, o paliativo e a cura, o gradual e o concentrado, o contnuo e o
descontnuo, o institucional e o extra institucional, a luta por
movimento, permite um ulterior enriquecimento e desenvolvimento deste ltimo, Op. cit., p. 37. 12 A necessria unidade entre reforma e revoluo fica patente na seguinte afirmao de Lnin: Criticamos com a mxima severidade a velha II Internacional [...] declaramos que ela est morta [...] mas no dizemos jamais [...] que at agora se tenha dado peso excessivo s chamadas reivindicaes imediatas, nem que isso possa levar emasculao do socialismo. Afirmamos e demonstramos que todos os partidos burgueses, todos os partidos, com exceo do partido revolucionrio da classe operria, mentem e so hipcritas quando falam de reformas. Buscamos ajudar a classe operria a obter uma melhoria real (econmica e poltica), ainda que mnima, da sua situao; e acrescentamos sempre que nenhuma reforma pode ser estvel, autntica e sria se no for apoiada por mtodos revolucionrios de luta de massas. Ensinamos continuamente que um partido socialista que no una essa luta pelas reformas com os mtodos revolucionrios do movimento operrio pode se transformar numa seita, pode distanciar-se das massas, e esse o perigo mais srio para o sucesso do verdadeiro socialismo revolucionrio. Lnin, V. I., Obras, v.21, pp. 387-388, apud Gruppi, L., O Pensamento de Lnin, pp. 120-121.
27
reformas e a luta pela revoluo. a partir deste processo
pedaggico que, no seu movimento de fluxos e refluxos, avanos e
recuos, vitrias e derrotas, a classe operria chega conscincia da
necessidade e da possibilidade da revoluo social como nica
resposta positiva para as contradies e antagonismos que a afligem.
Enfatizando a importncia de fundir a teoria revolucionria com o
movimento revolucionrio como elemento central para elevar a
conscincia de classe do operariado, Lnin afirma: Desde el
momento en que el planteamiento de los objetivos era justo, desde el
momento en que haba suficiente energa para intentar reiteradas
veces lograr esos objetivos, los reveses temporales representaban
una desgracia a medias. La experiencia revolucionaria y la habilidad
de organizacin son cosas que se adquieren con el tiempo. Lo nico
que hace falta es querer desarrollar en uno mismo las cualidades
necesarias! Lo nico que hace falta es tener conciencia de los
defectos, cosa que en la labor revolucionaria equivale a ms de la
mitad de la correccin de los mismos!.13
Para cumprir sua tarefa, o partido revolucionrio deve
mostrar as contradies s massas e indicar-lhes o caminho que
representa o avano da revoluo, mas nunca fabular sobre seu
estado de esprito, colocando-lhes objetivos que estejam alm de sua
compreenso e de sua capacidade de luta. Separada da ao
revolucionria, a reforma atua sobre os efeitos do problema e no
sobre suas causas. Ao negar a possibilidade de mudanas
qualitativas, o reformismo naturaliza o status quo e converte-se em
uma fora poltica conservadora. De modo inverso, isolada da luta
por reformas tangveis, a luta revolucionria desvincula-se da
realidade concreta da luta de classes, tornando-se uma agitao
13 Lenin, V.I., Qu Hacer? Qu Hacer?, In? Obras Escogidas, v.1. p. 144.
28
estril, sem efeitos prticos para a classe operria. Ao propor
solues abstratas, descoladas do dia-a-dia das massas e inatingveis
no curto prazo, o esquerdismo ignora a necessidade de mediaes
entre as lutas econmicas e polticas, entre a reforma e a revoluo,
substituindo a definio de objetivos consequentes por palavras de
ordem vazias que no encontram eco nas massas. Convertendo o
socialismo em objetivo imediato, o esquerdismo perde o dialogo com
as massas e desconecta-se do movimento operrio. Entre reformistas
e esquerdistas, Lnin identifica um elemento comum: a profunda
desconfiana de ambos quanto ao poderio revolucionrio da classe
operria. La socialdemocracia revolucionaria siempre ha incluido y
sigue incluyendo en la rbita de sus actividades la lucha por las
reformas. Pero utiliza la agitacin econmica no slo para reclamar
del gobierno toda clase de medidas, sino tambin (y en primer
trmino) para exigir que deje de ser un gobierno autocrtico.
Adems, considera su deber presentar al gobierno esta exigencia no
slo sobre el terreno de la lucha econmica, sino tambin sobre el
terreno de todas las manifestaciones en general de la vida social y
poltica. En una palabra, como la parte al todo, subordina la lucha por
las reformas a la lucha revolucionaria por la libertad y el
socialismo.14
Em suma, a importncia crucial da organizao
revolucionria na constituio do operariado como sujeito histrico
decorre de sua importncia estratgica para fecundar a classe com o
germe da revoluo, transformando o instinto de autodefesa da
classe em conscincia revolucionria de classe, dotando-a, assim, dos
conhecimentos indispensveis e dos dispositivos operacionais
bsicos para que ela possa armar-se dos fins e dos meios
14 Lenin, V.I., Qu Hacer?. In: Obras Escogidas, v.1, p. 169.
29
indispensveis para vencer a burguesia e construir o socialismo. Ao
condensar a energia revolucionria e direcion-la para os objetivos
estratgicos e tticos da revoluo socialista, a organizao
revolucionria torna-se um dispositivo essencial da classe operria,
permitindo o seu acesso conscincia socialista, a concentrao de
sua fora poltica num organismo disciplinado que funciona como
um todo monoltico, bem como a indispensvel socializao de suas
experincias de luta, condio necessria para que ela possa ganhar
autoconfiana e acumular fora para a conquista do poder. Na
concluso de Un Paso Adelante, Dos Pasos Atrs, Lnin sintetizou a
questo nos seguintes termos: El proletariado no dispone, en su
lucha por el poder, de ms arma que la organizacin. El proletariado,
desunido por el imperio de la anrquica competencia dentro del
mundo burgus, aplastado por los trabajos forzados al servicio del
capital, lanzado constantemente al abismo de la miseria ms
completa, del embrutecimiento y de la degeneracin, slo puede
hacerse y se har inevitablemente una fuerza invencible siempre y
cuando que su unin ideolgica por medio de los principios del
marxismo se afiance mediante la unidad material de la organizacin,
que cohesiona a los millones de trabajadores en el ejrcito de la clase
obrera.15
Na concepo de Lnin, a estratgia e a ttica da
revoluo socialista devem ser definidas levando-se em considerao
as condies objetivas e subjetivas da luta de classes, isto , a
especificidade que assume a relao dialtica entre reforma e
revoluo, derivada da interpretao histrica sobre o sentido das
mudanas sociais, as foras motrizes que as impulsionam e as
15 Lenin, V.I., Un Paso Adelante, Dos Pasos Atrs. In: Obras Escogidas, v.1, p. 465.
30
relaes de poder real presentes em cada momento histrico, que
definem o efetivo poder de fogo das classes sociais em luta. Os
imperativos da organizao resultam de tais condicionantes. O
carter do partido revolucionrio no pode, portanto, ser concebido
de modo arbitrrio, sem conexo com as necessidades concretas do
movimento revolucionrio. A estrutura e a forma de funcionamento
do partido dependem da natureza dos desafios histricos que ele
deve enfrentar para dirigir o movimento revolucionrio para a
conquista do poder. A organizao revolucionria deve se ajustar
permanentemente s exigncias da luta revolucionria. nesse
sentido que Lukcs enfatiza a slida consistncia de sua
personalidade poltica: Sangue e juzo misturam-se em Lnin com
equidade, porque o seu conhecimento da sociedade visava em cada
instante a ao necessria para este ou aquele momento do ponto de
vista social, porque a sua prtica era sempre a consequncia
necessria da soma e do sistema dos conhecimentos verdadeiros
acumulados at esse momento.16
3. A teoria do imperialismo de Lnin
Movido pela exigncia de compreender a situao
gerada pelas crescentes rivalidades entre as grandes potncias
capitalistas, que empurravam o mundo para uma guerra
generalizada, e pela urgncia de encontrar uma resposta terica e
prtica para o fortalecimento das tendncias oportunistas no interior
da social-democracia, a partir de 1912 Lnin voltou sua ateno para
o estudo do imperialismo. A importncia crucial que ele dava ao
16 Gruppi, L., O pensamento de Lnin, op. cit., p. 130.
31
entendimento do imperialismo pode ser aquilatada nas suas
prprias palavras: O problema do imperialismo escreve em 1915
no somente um dos problemas essenciais, mas provavelmente
o mais essencial na esfera da cincia econmica que estuda a
mudana de forma do capitalismo nos tempos modernos. Conhecer
os fatos relacionados a esta esfera, [...], absolutamente
indispensvel para quem se interessa, no s pela economia, mas por
qualquer aspecto da vida social contempornea.17
Produto de uma exaustiva pesquisa factual, que tinha
os trabalhos de Hobson e Hilferding como principais referncias,
bem como de uma reelaborao do modo de aplicar o mtodo de
Marx, que levou Lnin a aprimorar a sua concepo dialtica da
Histria, O Imperialismo: etapa superior do capitalismo apresenta um
quadro de conjunto da economia mundial capitalista no incio do
sculo XX que desmascara as ideias que apregoavam a possibilidade
de conciliar imperialismo e democracia mundial.18 O fio da meada
que articula a argumentao dado pela caracterizao dos
mltiplos processos que relacionam as leis de movimento do
capitalismo monopolista ao fenmeno do imperialismo. A
preocupao de no desvincular o conhecimento da ao faz o foco
da interpretao recair nos impactos das estruturas e dinamismos do
17 Lnin, V. L., Prefcio ao Folheto de N. Bukhrin, A economia mundial e o imperialismo in Obras Completas, vol. XXIII, Madri: Akal Editor, 1977, p. 184. 18 Para preparar seu trabalho, entre 1912 e 1916 Lnin examina 148 livros e 232 artigos sobre o tema. Percebendo que o desafio de encontrar os nexos existentes entre a multiplicidade de processos que condicionavam a nova configurao do capitalismo exigia um reforo de sua capacidade de utilizar o mtodo do materialismo dialtico, a partir de 1914 ele rel O Capital de Marx e retoma Hegel. Os resultados de seus estudos econmicos e polticos mais de vinte brochuras de anotaes - encontram-se compilados nos Cadernos sobre o Imperialismo. As anotaes de seus estudos sobre a dialtica encontram-se reunidas nos Cadernos sobre Filosofia.
32
capitalismo monopolista sobre a luta de classes em escala mundial e
nas suas formas especficas de manifestao nos pases
desenvolvidos, atrasados e no desenvolvidos. O livro desvenda os
nexos econmicos que determinam a necessidade inexorvel do
imperialismo na era dos monoplios. Sua finalidade ltima
desnudar as contradies do capitalismo monopolista e apontar a
necessidade inelutvel da revoluo socialista como nica soluo
civilizada que pode superar os horrores que acompanham o
progresso capitalista.
Para definir os condicionantes objetivos e subjetivos da
luta de classes na era do capitalismo monopolista, a teoria do
imperialismo de Lnin combina dois movimentos. Por um lado, o
capitalismo monopolista compreendido como uma unidade
dialtica, que contempla no apenas todas as dimenses da
economia e da sociedade - as foras produtivas, as relaes de
produo, a superestrutura jurdica e ideolgica - em suas relaes
de mtua determinao no interior de cada formao social, como
tambm os nexos inextrincveis de explorao econmica e
dominao poltica que condicionam a relao entre as diferentes
formaes econmicas e sociais que conformam o sistema capitalista
mundial. Por outro lado, a tendncia efetiva da luta de classes
relacionada aos condicionantes subjetivos que a determinam: os
efeitos das novas contradies sobre o comportamento das classes
sociais; a possibilidade de o acirramento dos antagonismos gerar
uma crise revolucionria que abra espao para saltos histricos; a
polarizao da luta de classes entre revoluo e contrarrevoluo; o
risco de o proletariado desperdiar a oportunidade histrica de
superar o capitalismo pela ausncia de uma teoria revolucionria
que unifique a classe para enfrentar a burguesia.
33
a sua capacidade de chegar a uma sntese explicativa
sobre o carter do novo momento histrico a definio do
imperialismo como regime de transio do capitalismo para o
socialismo - e a contradio que o preside o crescente
antagonismo entre a socializao das foras produtivas em
escala mundial e a apropriao privada dos meios de produo
por uma oligarquia financeira - que lhe permite definir as tendncias
em luta socialismo ou barbrie - e os desafios imediatos que
devem ser enfrentados pela classe operria para impulsionar a
revoluo socialista internacional transformar a guerra
imperialista em guerra civil. Nesse sentido, afirma Gruppi -
Lnin continua a obra de Marx acrescentando-lhe um novo e
essencial captulo e coloca o marxismo em condies de enfrentar,
no plano da teoria e da ao revolucionria, a nova poca histrica
com que se defronta o proletariado. [...] A conquista terica de Lnin
est na lcida viso de como a estratgia do proletariado deve ser
posta no quadro do desenvolvimento imperialista.19
Ao qualificar o imperialismo como superestrutura do
capitalismo monopolista, forma poltica de dominao do capital
financeiro sobre a sociedade burguesa, a interpretao de Lnin
contraps-se ao revisionismo de Bernstein, que previa uma evoluo
lenta e pacfica do capitalismo ao socialismo, e ao reformismo de
Kautsky, cuja viso parcial e abstrata do imperialismo contemplava a
possibilidade ora de um capitalismo sem imperialismo, ora de um
ultra imperialismo sem guerras. Em relao aos alentados tratados
tericos e histricos de seus contemporneos social-democratas,
como Rosa Luxemburgo, Bukarin e o prprio Hilferding, o diferencial
de sua teoria reside na sua definio dos nexos orgnicos de mtua
19 Gruppi,L., O pensamento de Lnin, op. cit., pp. 138 e 139.
34
determinao entre o padro de acumulao e o padro da luta de
classes. A concepo leninista do imperialismo diz Lukcs , de
modo aparentemente paradoxal, por um lado uma proeza terica
considervel, e por outro contm sob o ngulo de uma teoria
puramente econmica bem poucas novidades reais. [...] A
superioridade de Lenine consiste nisto: ter sabido [...] ligar
concreta e completamente a teoria econmica do imperialismo a todos
os problemas polticos da atualidade e fazer do contedo da
economia, nesta nova fase, o fio condutor de todas as aes concretas
no mundo assim organizado.20
Concludo na primavera de 1916, s vsperas dos
acontecimentos que levariam Revoluo de Outubro, O
Imperialismo muitas vezes interpretado como um documento
conjuntural, sem maior valor terico, um panfleto que sistematiza e
divulga o conhecimento j estabelecido pela literatura liberal e
socialista sobre as mudanas econmicas e polticas que
transformavam o padro de desenvolvimento capitalista. uma
interpretao equivocada. A linguagem simples utilizada por Lnin
para tornar suas ideias acessveis aos militantes socialistas
revolucionrios no deve iludir o leitor. O estilo direto do texto
camufla a complexidade de sua trama. Seu ensaio uma sofisticada
construo intelectual, onde todos os elos do raciocnio esto
cuidadosamente conectados por vnculos dialticos que definem uma
totalidade concreta. Alm de estabelecer a forma especfica assumida
pelo imperialismo no incio do sculo XX e os desafios histricos da
decorrentes, anlise que fundamentou os passos de Lnin como
referncia mxima da primeira revoluo socialista, O Imperialismo
contm uma elaborada metodologia de anlise das leis de
20 Lukcs, G., O pensamento de Lnin, op. cit., p. 56.
35
movimento do capitalismo e da luta de classes na era dos
monoplios, bem como uma interpretao, de carter estrutural,
sobre o significado histrico do imperialismo como regime de
transio do capitalismo para o socialismo conquistas do
pensamento revolucionrio que tm um valor mais geral e
preservam sua vitalidade como referncia terica e metodolgica
para a compreenso do capitalismo contemporneo. Posto em
perspectiva histrica, o livro extrapola largamente sua importncia
conjuntural para se transformar no que Tom Kemp classificou de
[...] a major document of twentieth-century Marxism.21
Tendo como fundamento as formulaes de Marx na
Introduo de 1857 do livro Contribuio Crtica da Economia
Poltica, a teoria do imperialismo de Lnin atualiza a interpretao
sobre as leis de movimento do capitalismo e tira suas consequncias
prticas para a luta revolucionria da classe operria.22 A sua
estrutura lgica organiza-se seguindo o procedimento clssico do
mtodo dialtico, que se desdobra do abstrato o capital financeiro
ao concreto uma poca histrica marcada por conflitos radicais e
grandes comoes sociais que polarizam a luta de classes entre a
revoluo e a contrarrevoluo; das categorias mais simples o
21 Kemp, T., Theories of Imperialism. London, Dobson Books, 1967, p. 67. Quite apart from differences about the validity of Lenins analysis, the immense influence of the book is admitted on all sides; there can be no doubt that it filled a theoretical vacuum in a way which none of the preceding works on the same theme could have done, p. 67. 22 Lefebvre destaca que o pensamento de Lnin um esforo de atualizar a crtica terica e prtica de Marx ao capitalismo: [...] chaque oeuvre importante comporte-t-elle cette double procupation et ce double mouvement interne: revenir aux principes thoriques et metodologiques du marxisme, les rependre, les restituer dans toute leur force et les appliquer aux realits et problmes nouveaux revls par la pratique, par la vie, de faon rsoudre ces problmes, Lefebvre, H. Pour Connatre la Pense de Lnine. Op. cit., p. 130.
36
monoplio s categorias mais complexas o imperialismo como
superestrutura do capitalismo monopolista; da aparncia do
fenmeno a guerra como a defesa do interesse nacional sua
essncia o imperialismo como a fora motriz que explica a
necessidade inexorvel da fora militar como arma de conquista
na era do capitalismo monopolista. A argumentao desenrola-se
buscando determinar os mltiplos aspectos que definem o
imperialismo como a superestrutura do capitalismo monopolista; a
sua lgica de funcionamento; o desenvolvimento de suas estruturas e
as tendncias que da decorrem; o choque de opostos que determina
as contradies que impulsionam o movimento histrico; os nexos
fundamentais que condicionam a sua unidade sinttica como
fenmeno histrico; o devir que delimita o campo de oportunidades
que se coloca no horizonte histrico.
Adepto do princpio da objetividade da dialtica, Lnin
associa seus movimentos tericos s evidncias empricas que os
fundamentam, combinando uma complexa estrutura analtica com
uma densa base emprica, caractersticas que imprimem a seu
trabalho um elevadssimo poder de persuaso.23 A relao explcita
23 Sobre os fundamentos da dialtica de Lnin, ver Lefebvre, H. Pour Connatre la Pense de Lnine. Paris. Bordas, 1957, captulo 3, La Pense Philosophique de Lnine. O poder de persuaso de O imperialismo mereceu o seguinte comentrio de Tom Kemp: The impact of its facts and figures and condensed theoretical point is powerful. It shows Lenins pedagogical skill and his characteristic ability to generalize and to make arresting characterization. It is within the grasp of large numbers of educated people and not merely those who have studied the writings of Marx in some detail. For all its Aesopian language destinada a despistar a censura czarista it was more a political tract than an economic study: it was designed to educate the working class and make its members conscious both of the nature of the epoch through which they were living and of the causes of what he regarded as the betrayal of the major part of its leaders. Kemp, Tom. Theories of Imperialism. London, Dobson Books, 1967, p. 67.
37
entre as categorias abstratas e as relaes sociais de produo que
lhe so correspondentes pe em evidncia as bases sociais do
capitalismo monopolista, afastando Lnin de qualquer reducionismo
economicista que pudesse comprometer seu objetivo maior de
mostrar os nexos entre acumulao de capital, mudana social e luta
de classes. O entendimento do conceito abstrato como expresso
pensada do real leva a investigao a se desenvolver como um
processo contnuo, de sucessiva aproximao realidade histrica. A
recusa em cristalizar os conceitos e transformar as anlises em
verdades absolutas faz com que sua interpretao assuma a forma de
um corpo de conhecimento permanentemente permevel s
mudanas da realidade histrica. Portanto, mais do que uma
explicao definitiva, sua teoria do imperialismo deve ser concebida
como um ponto de partida para novas investigaes. Da o carter
necessariamente inconcluso de sua reflexo. Pode-se dizer afirma
Gruppi que possvel extrair de Lnin uma indicao
metodolgica do seguinte tipo: deve-se ir da categoria (abstrata) at
a investigao do concreto, inferir daqui novas categorias cientficas,
sempre abstratas enquanto tais, porm mais complexas e mais
prximas ao concreto para com elas levar a investigao a um novo
nvel e assim por diante.24
A fim de explicitar as concluses da teoria do
imperialismo que tm um carter estrutural e permanecem vigentes
como determinantes gerais do imperialismo contemporneo,
separando-as das formulaes de carter conjuntural, determinadas
pelas condies histricas especficas do incio do sculo XX,
24 Gruppi, L., O pensamento de Lnin. Op. cit., p. 138. Sobre a teoria do reflexo de Lnin ver, Lefebvre, H. Pour Connatre la Pense de Lnine. Op. cit., especialmente captulo 3.
38
importante reconstituir o movimento metodolgico e terico que
leva Lnin a caracterizar o imperialismo como clmax do
desenvolvimento capitalista. Seguindo o procedimento de uma
aproximao paulatina ao objeto, que avana atravs de crculos
sucessivos, do mais simples e abstrato ao mais complexo e concreto,
em que cada crculo incorpora as determinaes do crculo anterior
at a conformao da totalidade concreta, que define as bases
fundamentais do processo histrico, o raciocnio desenvolvido em O
Imperialismo evolui associando: o desenvolvimento do capitalismo
gnese do capitalismo monopolista; a gnese do capitalismo
monopolista dominao de uma oligarquia financeira e ao
aparecimento de uma aristocracia operria; as leis de movimento do
capitalismo monopolista ao aparecimento do imperialismo como
padro de relacionamento que preside a economia mundial; a
caracterizao do imperialismo como regime de transio
formao das bases objetivas para a construo do socialismo; o
znite do mundo burgus ao avano da barbrie; a impossibilidade
de reformar o imperialismo revoluo socialista como nica
alternativa que pode barrar o avano da barbrie capitalista. esta
linha de raciocnio que ser explicitada abaixo - que levou Lnin
concluso de que o acirramento das contradies e dos
antagonismos do capitalismo tendia a polarizar a luta de classes
entre revoluo e contrarrevoluo.
Apoiando-se em uma ampla base de evidncias
empricas sobre o processo de monopolizao da indstria e dos
bancos, Lnin recorre lei da tendncia concentrao e
centralizao do capital, que condiciona a reproduo ampliada do
capital, para explicar o processo histrico de transformao do
capitalismo competitivo em capitalismo monopolista a mudana
39
fundamental que carateriza o esgotamento definitivo do papel
progressista do capitalismo como modo de produo. Atendo-se ao
plano das foras produtivas e das relaes de produo, sua
investigao mostra como as transformaes quantitativas na
composio tcnica e na composio orgnica do capital se
convertem em transformaes qualitativas, dando origem ao capital
financeiro uma fuso do monoplio industrial com o monoplio
bancrio. Independentemente da forma histrica que assume o
processo de formao do capital financeiro (que, baseando-se na
experincia alem, Lnin atribua ao papel estratgico dos bancos), o
capitalismo monopolista carateriza-se pela extraordinria ampliao
das bases tcnicas e financeiras do capital. A formao de uma
espcie de capitalista coletivo, que aglutina grandes massas de
capitais industriais e bancrios, representa uma forma mais
avanada de organizao do capital que modifica as leis de
movimento do capitalismo. A ampliao da escala das foras
produtivas e o aumento das massas de capitais monetrios que ficam
sob o comando do capital financeiro implicam um salto de qualidade
no poder destas fraes de capital de mobilizar todos os meios
imaginveis econmicos e polticos - para potencializar o processo
de valorizao do capital. Ao diminuir radicalmente as barreiras
temporais e espaciais acumulao de capital, a elevao na
mobilidade espacial do capital, o incremento na sua capacidade de
mutao de forma, a intensificao do ritmo de rotao do capital
fazem crescer exponencialmente a sua faculdade de comandar
trabalho e disputar as oportunidades de negcio em escala mundial.
A expanso do capital internacional, o aumento na liquidez do
capital, a intensificao de sua fluidez intersetorial, a hipertrofia da
rbita financeira e dos circuitos de valorizao fictcia do capital so
40
fenmenos associados profunda redefinio da relao do capital
com o espao e com o tempo.
O aparecimento do capital financeiro provoca
importantes mudanas no comportamento das classes sociais,
gerando o substrato social e ideolgico do capitalismo monopolista e
de sua superestrutura imperialista.
Por um lado, a expanso e a centralizao do capital
financeiro do origem a uma oligarquia financeira, com uma
complexa rede de interesses internacionais, que prepondera sobre o
conjunto dos capitalistas. A sua ramificao, na forma de unio
pessoal, pelas altas esferas da indstria, das finanas e do Estado,
potencializa ainda mais seu poder econmico e poltico. O controle
da economia, das finanas e dos assuntos do Estado transforma a
luta pelo controle territorial da economia mundial e a violncia como
mtodo de acumulao - o imperialismo - em razo de Estado. A
necessria correspondncia entre os interesses econmicos da
oligarquia financeira e sua ideologia encontra-se na raiz das
ideologias colonialistas e chauvinistas que caraterizam a etapa
superior do capitalismo.25 A impossibilidade de conciliar
internacionalizao de capital e autodeterminao dos povos,
capitalismo e paz, , portanto, uma determinao estrutural da
hegemonia do capital financeiro. Lo caracterstico del imperialismo
es precisamente la tendencia a la anexin no slo de las regiones
agrarias, sino incluso de las ms industriales [...] pues, en primer
25 No incio do sculo XX, esta ideologia assumia cores particularmente fortes. El signo de nuestro tiempo es el entusiasmo por las perspectivas del imperialismo, la defensa rabiosa del mismo, su embellecimiento por todos los medios. La ideologa imperialista penetra incluso en el seno de la clase obrera, que no est separada de las dems clases por una muralla china, Lenin, V.I., El Imperialismo. In: Obras Escogidas, v.1., p. 782.
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lugar, la divisin ya terminada del globo obliga, al proceder a un
nuevo reparto, a alargar la mano hacia toda clase de territorios; en
segundo lugar, para el imperialismo es sustancial la rivalidad de
varias grandes potencias en sus aspiraciones a la hegemona, esto es,
a apoderarse de territorios no tanto directamente para s, como para
debilitar al adversario y quebrantar su hegemona [...].26
Por outro lado, a emergncia do capitalismo
monopolista promove uma profunda diferenciao entre las capas
superiores de los obreros y la capa inferior, proletaria propiamente
dicha, criando uma aristocracia operria que tende a se
identificar com os valores da pequena burguesia.27 A base real de
existncia desta aristocracia operria os grandes monoplios
aproxima seus interesses corporativos imediatos da poltica do
imperialismo. O oportunismo poltico que compromete a unidade
da classe operria em torno de seus objetivos estratgicos de longo
prazo surge, assim, como um fenmeno que se enraza na realidade
histrica. La obtencin de elevadas ganancias monopolistas por los
capitalistas de unas tantas ramas de la industria, de uno o de tantos
pases, etc., les brinda la posibilidad econmica de sobornar a ciertos
sectores obreros, y, temporariamente, a una minoria bastante
considerable de estos ltimos, atraindolos al lado de la burguesa de
26 Lenin, V.I., El Imperialismo, Ibid., p. 767. 27 Esa capa de obreros aburguesados o de aristocracia obrera, enteramente pequeo burgueses por su gnero de vida, por sus emolumentos y por toda su concepcin del mundo, es el principal apoyo de la II Internacional, y, hoy da, el principal apoyo social (no militar) de la burguesa. Porque son verdaderos agentes de la burguesa en el seno del movimiento obrero, lugartenientes obreros de la clase de los capitalistas, verdaderos vehculos del reformismo y del chovinismo. En la guerra civil entre el proletariado y la burguesia se colocan inevitablemente, en nmero considerable, al lado de la burguesa, al lado de los versalleses contra los comuneros. Prologo a las ediciones francesa y alemana. Ibid., p. 699.
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dicha rama o de dicha nacin, contra todos los dems. El acentuado
antagonismo de las naciones imperialistas en torno al reparto del
mundo ahonda esa tendencia.28
A caracterizao do imperialismo como superestrutura
necessria do capitalismo monopolista, que tem sua base de
sustentao social na hegemonia do capital financeiro e na
emergncia de uma aristocracia operria, decorre da lgica de
conquista econmica e territorial que se impe como padro de
relacionamento entre os cartis internacionais e as potncias
capitalistas que disputam o controle da economia mundial. Em
relao s formas de conquista e dominao de outras pocas, a
especificidade do imperialismo moderno est associada s foras
motrizes que o impulsionam, isto , forma que assume a disputa
entre os cartis internacionais e entre os Estados rentistas pelo
controle das oportunidades de negcios no mundo. Citando Hobson,
Lnin explicita a questo: El nuevo imperialismo se distingue del
viejo, primero en que, en vez de la aspiracin de un solo imperio
creciente, sostiene la teora y la actuacin prctica de imperios
rivales, guiando-se cada uno de ellos por idnticos apetitos de
expansin poltica y de beneficio comercial; segundo, en que los
intereses financieros o relativos a la inversin del capital
predominan sobre los comerciales.29
O vnculo inexorvel entre o aparecimento de uma
oligarquia financeira e os processos econmicos e polticos que
levam formao de uma economia mundial, marcada por uma
complexa teia de relaes de dependncia e dominao, enfatiza os
nexos entre uma multiplicidade de fenmenos que so tpicos do
28 Lenin, V.I., El Imperialismo, Ibid., p. 796. 29 Lenin, V.I., El Imperialismo, Ibid., p. 767.
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capitalismo avanado: o processo de monopolizao do capital
financeiro; a gerao de excedentes que transbordam a possibilidade
de aplicao na economia nacional e do lugar a um processo de
exportao de capitais; a formao de cartis internacionais que
disputam o controle da economia mundial; o impacto desigual do
desenvolvimento capitalista sobre as diferentes formaes sociais; o
envolvimento do Estado na disputa pelo controle dos territrios; a
configurao de uma economia mundial extremamente assimtrica,
composta de pases desenvolvidos em ascenso e em decadncia,
bem como de pases atrasados que so envolvidos nas teias do
imperialismo e, de alguma maneira, combinam avano das foras
produtivas, expanso das relaes de produo capitalistas e gerao
de relaes de dependncia externa. A conexo necessria entre
capitalismo monopolista, rivalidades nacionais e o ressurgimento de
novas formas de explorao e dominao das sociedades atrasadas
foi sintetizada por Lnin nos seguintes termos: El imperialismo es el
capitalismo en la fase de desarrollo en que ha tomado cuerpo la
dominacin de los monopolios y del capital financiero, ha adquirido
sealada importancia la exportacin de capitales, ha empezado el
reparto del mundo por los trustes internacionales y ha terminado el
reparto de toda la tierra entre los pases capitalistas ms
importantes.30
O carter especfico que assume o imperialismo ao
longo do tempo e a sua forma concreta de manifestao em cada
formao econmica e social dependem do modo pelo qual se
combinam as tendncias concentrao e centralizao de capitais
com a lei do desenvolvimento desigual em cada conjuntura histrica.
No entanto, qualquer que seja a estratgia que orienta a poltica do
30 Lenin, V.I., El Imperialismo, Ibid., p.765.
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imperialismo o controle dos mercados, o acesso privilegiado
fora de trabalho, o monoplio sobre as fontes de matrias-primas, o
aambarcamento das oportunidades de negcios, o domnio das vias
de transporte e comunicao, o controle do territrio e qualquer
que seja a forma assumida da disputa pelo controle da economia
mundial econmica ou poltica, lcita ou ilcita, pacfica ou
violenta -, a luta entre os grandes trustes internacionais impe uma
lgica de dominao que coloca o mundo sob permanente tenso.
Los capitalistas no se reparten el mundo llevados de una particular
perversidad, sino porque el grado de concentracin a que se ha
llegado les obliga a seguir este camino para obtener beneficios y se lo
reparten segn el capital, segn la fuerza; otro procedimiento de
reparto es imposible en el sistema de la produccin mercantil y del
capitalismo. La fuerza vara a su vez en consonancia con el desarrollo
econmico y poltico. Para comprender lo que est aconteciendo hay
que saber cules son los problemas que se solucionan con los
cambios de la fuerza, pero saber si dichos cambios son puramente
econmicos o extraeconmicos (por ejemplo, militares) es un asunto
secundario que no puede hacer variar en nada la concepcin
fundamental sobre la poca actual del capitalismo. Suplantar el
contenido de la lucha y de las transacciones entre los grupos
capitalistas por la forma de esta lucha y de las transacciones (hoy
pacfica, maana no pacfica, pasado maana, otra vez no pacfica)
significa descender hasta el papel de sofista.31
A definio do imperialismo como regime de transio
que prepara as bases objetivas do socialismo est determinada pela
substituio do capitalismo baseado na livre concorrncia pelo
capitalismo fundado no monoplio. Lnin atribui a exacerbao das
31 Lenin, V.I., El Imperialismo, Ibid., p. 753.
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contradies do modo de produo capitalista metamorfose da
livre concorrncia na sua anttese: o monoplio. A progressiva
monopolizao da produo agua a contradio entre a crescente
socializao das foras produtivas e a continuidade de um regime
social baseado na apropriao privada dos meios de produo. O
contraste entre o crescimento exponencial da produo social e o
aumento da desigualdade na distribuio do excedente social
exacerba os antagonismos sociais. O controle centralizado dos meios
de produo pela oligarquia financeira, que cria as bases gerenciais
para uma economia baseada no planejamento central, leva ao limite
a irracionalidade na utilizao dos recursos produtivos da sociedade.
Tal irracionalidade ainda reforada pelo esvaziamento da
capacidade do poder pblico de impor limites atuao do capital
financeiro. Por fim, a integrao dos pases atrasados na rede de
dependncia e dominao do capital financeiro acelera a penetrao
de relaes de produo tipicamente capitalistas e estimula a
expanso de suas foras produtivas, transformando em antagonismo
insupervel a contradio entre a lgica de conquista do
imperialismo e a aspirao de autodeterminao dos povos que
fazem parte do elo fraco do sistema capitalista mundial. O
imperialismo amadurece, assim, as condies que determinam a
necessidade e a possibilidade do socialismo: [...] las relaciones de
economa y propiedad privada constituyen una envoltura que no
corresponde ya al contenido, que esa envoltura debe
inevitablemente descomponerse si se aplaza artificialmente su
supresin, que puede permanecer en estado de decomposicin
durante un perodo relativamente largo (en el peor de los casos, si la
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curacin del tumor oportunista se prolonga demasiado), pero que,
con todo y con eso, ser ineluctablemente suprimida.32
Lnin atribui as tendncias que levam o
desenvolvimento do capitalismo monopolista a provocar a agonia do
modo de produo capitalista ao carter particularmente agressivo e
predatrio assumido pela lgica de acumulao do capital financeiro.
As novas caractersticas do desenvolvimento capitalista - a crescente
importncia de formas parasitrias de acumulao, a inevitvel
ecloso de crises econmicas agudas e recorrentes, a desconexo
radical entre o progresso subordinado lgica dos lucros e as
necessidades sociais da grande maioria da populao, o
aparecimento de Estados rentistas que exploram os pases coloniais
e neocoloniais, o carter estrutural das rivalidades entre as grandes
potncias que disputam o controle da economia mundial resultam,
a seu ver, de um padro de concorrncia inter capitalista que
combina as relaes de dominao tpicas dos monoplios com as
relaes mercantis tpicas do capitalismo. Desse modo, Lnin vincula
a exacerbao das taras do capital s formas de acumulao de
capital que caraterizam o capitalismo monopolista, isto , ao
rentismo, especulao financeira, comercial e imobiliria,
corrupo e a fraude, gesto temerria dos negcios, sabotagem
dos concorrentes, s presses esprias sobre fornecedores, ao lucro
extorsivo, superexplorao do trabalho nos pases colnias e
semicoloniais, guerra como negcio. Las relaciones de dominacin
y la violencia ligada a dicha dominacin: he ah lo tpico en la fase
contempornea de desarrollo del capitalismo, he ah lo que
inevitablemente tena que derivarse y se ha derivado de la
32 Lenin, V.I., El Imperialismo, Ibid., pp. 797-798.
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constitucin de los todos-poderosos monopolios econmicos,
resume Lnin.33
Ao contrrio dos tericos marxistas que identificavam o
fim do capitalismo com o seu desmoronamento econmico,
provocado pela tendncia decrescente da taxa de lucro, na teoria do
imperialismo de Lnin a agonia do capitalismo no decorre de sua
inviabilidade econmica, mas, paradoxalmente, exatamente de seu
oposto: a impossibilidade de impor limites reproduo ampliada
do capital e atenuar seus efeitos perversos sobre a sociedade.34 A
degenerao do capitalismo o resultado de seu desenvolvimento. A
necessidade de sua superao determinada por sua inviabilidade
poltica. Os mtodos violentos e predatrios do capital financeiro
levam os antagonismos sociais a tal ponto que as tenses e os
conflitos que da decorrem tendem a comprometer as bases sociais e
polticas de sustentao da sociedade burguesa. Nos pases
capitalistas desenvolvidos, a supremacia do capital financeiro vem
acompanhada da deteriorao das condies de vida da grande
maioria da populao. Nas regies coloniais e semicoloniais, o
imperialismo significa crescente explorao e opresso. Los
monopolios, la oligarqua, la tendencia a la dominacin en vez de la
tendencia a la libertad, la explotacin de un nmero cada vez mayor
de naciones pequeas o dbiles por un puado de naciones
33 Lenin, V.I., El Imperialismo, Ibid., p. 711. 34 No h na teoria do imperialismo de Lnin qualquer vestgio de determinismo economicista que associa, de maneira abstrata e mecnica, o fim do capitalismo ao seu desmoronamento econmico, provocado pela tendncia decrescente da taxa de lucro. Na sua viso, os diferentes setores, regies e pases que compem a economia mundial sofrem de maneira diferenciada os impactos dinmicos do capitalismo monopolista, alternando e combinando momentos de crise e estagnao com perodos de expanso e crescimento, conjunturas de decadncia e letargia tecnolgica com fases de intenso progresso e inovaes revolucionrias.
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riqusimas o muy fuertes: todo esto ha originado los rasgos
distintivos del imperialismo que obligan a calificarlo de capitalismo
parasitario o en estado de decomposicin.35
A avaliao de que os gravssimos problemas do
imperialismo tm razes profundas, determinadas pelas leis de
movimento do capitalismo monopolista, leva Lnin a descartar a
viabilidade de reformas que possam atenuar os aspectos mais
deletrios do imperialismo. A impossibilidade de voltar livre
concorrncia e a inviabilidade de domar o imperialismo, tornando-o
compatvel com a democracia e a autodeterminao dos povos,
alternativas romnticas que alimentavam as esperanas das
oposies pequeno-burguesas que procuravam uma soluo por
dentro da ordem estabelecida, deixavam como nica sada a
revoluo socialista. Recorrendo a uma citao de Hilferding, Lnin
conclui: No incumbe al proletariado oponer a la poltica capitalista
ms progresiva la poltica pasada de la poca del libre cambio y la
actitud hostil frente al Estado. La respuesta del proletariado no
puede ser actualmente la restauracin de la libre competencia que
se ha convertido ahora en un ideal reaccionario -, sino nicamente la
destruccin completa de la competencia mediante la supresin del
capitalismo.36
35. Lenin, V.I., El Imperialismo, Op. cit., p. 795. 36 Hilferding, R., El Capital Financiero. Madrid, Editorial Tecnos, 1963, p. 567, apud Lenin, V.I., El Imperialismo, Op. cit., p. 785.
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4. O pensamento de Lnin em seu movimento concreto
Preocupado em transformar o materialismo histrico
em fora revolucionria viva, Lnin dedica-se ao estudo dos desafios
da revoluo russa. Forjadas no calor dos acontecimentos, como
respostas aos desafios concretos da luta de classes, as suas ideias
surgem e amadurecem como crticas s teses utpicas do movimento
Narodnaya Volya a principal fora poltica de oposio ao Tzar - e
estratgia poltica etapista dos mencheviques corrente que
polarizava com os bolcheviques a liderana do movimento operrio
russo. Em relao aos populistas, Lnin questiona a viabilidade
histrica do projeto de transio para o socialismo baseado na
comuna camponesa, de acordo com o qual caberia aos camponeses e
pequenos agricultores um papel estratgico na revoluo russa. No
que diz respeito aos mencheviques, rejeita a tese de que a ausncia
de bases objetivas para um regime socialista colocava a aliana
operria com as fraes mais progressistas da burguesia como nico
meio de vencer as permanncias do regime feudal. Quando postas
em perspectiva histrica, suas formulaes insistiro no papel
fundamental da classe operria como dnamo da revoluo russa, na
necessidade de sua aliana estratgica com os camponeses pobres e,
finalmente, aps uma srie de consideraes, no desdobramento sui
generis do processo revolucionrio, o qual tende a encadear a
revoluo democrtica com a revoluo operria, vista como um
momento decisivo da revoluo socialista em escala internacional.
Coerente com a metodologia de anlise concreta de
uma situao concreta, a interpretao de Lnin sobre o carter da
revoluo russa destaca-se pela formidvel consistncia dos nexos
que ligam as diferentes dimenses da realidade. No amplo espectro
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das questes econmicas, sociais e polticas tratadas na sua vasta
obra sobre os dilemas da revoluo russa e os desafios da luta pelo
socialismo, cabe destacar a originalidade de sua contribuio em
pelo menos quatro direes: a teoria da revoluo, a teoria do
partido, a teoria do imperialismo e a teoria da transio. Resultado
de um processo de reflexo permanente, a evoluo de seu
pensamento marcada por momentos que se completam e se
superam, cujos pontos culminantes podem ser sintetizados de
maneira muito esquemtica e sumria nas concluses de seus
trabalhos de maior envergadura.37
Teoria da Revoluo Russa I
Desenvolvimento capitalista e as vias da revoluo burguesa
A viso de Lnin sobre a especificidade da formao
econmica e