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Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação 41º Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – Joinville - SC – 2 a 8/09/2018
Cibernética da Semântica na Manutenção da Fé dos Cristãos Católicos: A Materialidade
da Vela Virtual 1
Juliana Simões BOLFE
2
Universidade Tuiuti do Paraná, PR
RESUMO
Este artigo tem por objetivo investigar como é apresentada, ao católico, a vela virtual, símbolo
da materialidade de encontro com Deus, bem como sua apropriação no aerópago digital. A
partir de pesquisa bibliográfica foram analisados os sites dos Santuários de Nossa Senhora
Aparecida e o Santuário de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, como estes apresentam para o
fiel o passo a passo para a efetivação do ato de acender a vela virtual. Indicar a influência da
Cibernética da Semântica, por meio da mensagem utilizada na máquina com o intuito de
induzir o fiel à mudança de comportamento. Os resultados mostraram que muitos fieis
católicos já acreditam no poder da materialidade da vela virtual, pois no site do Santuário de
Nossa Senhora Aparecida, até a data da pesquisa, totalizavam 2797359 velas acesas.
PALAVRAS-CHAVE: Igreja Católica. Fé. Vela Virtual. Materialidade. Cibernética da
Semântica.
INTRODUÇÃO
Jesus disse assim: “ Quando acendemos uma vela, colocamo-la, não debaixo
da mesa, mas sobre o castiçal, para que ela ilumine a todos que estão em casa.
Assim também deve brilhar vossa luz diante dos homens, para que eles vejam
vossas boas obras e glorifiquem vosso pai que está nos céus.” (MT, 5,14).
A epígrafe que abre este texto é um dos muitos exemplos contidos na Bíblia de que para
um fiel se aproximar do Divino faz-se necessária a Luz. A Luz na sua, materialidade terrena, é
representada, para os católicos, pelo objeto vela, chama acesa que possibilita um diálogo com a
imaterialidade Deus.
A vela é tida como símbolo do cristão católico desde seu nascimento, apresentada no
Sacramento do Batismo, até a morte, simbolizando que aquele católico cumpriu sua missão na
Terra e que Deus o receba para a vida eterna.
1 Trabalho apresentado no GP Comunicação e Cultura Digital, XVIII Encontro dos Grupos de Pesquisas em Comunicação,
evento componente do 41º Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação.
2 Doutoranda do Curso de Comunicação e Linguagens da UTP - PR, e-mail: juliana.bolfe@gmail.com.
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O ritual de acender a vela, nas mais diferentes manifestações religiosas e também para
rogar intenções e/ou agradecimentos, faz com que a posse deste objeto seja imprescindível na
vida dos católicos, seja para estes acenderem, em casa, diante de um suposto, altar com artigos
religiosos, seja para acenderem na Igreja, templo Sagrado, e nos cemitérios, nos túmulos, para
a alma de entes queridos.
Porém, com os avanços tecnológicos propiciando ambientes virtuais, tem-se
presenciado muitas formas diferentes de manifestações sociais e religiosas que antes eram
comuns somente em certos ambientes físicos, (acender avela) e hoje, dispõe-se do e no
ambiente virtual de velas, também virtuais. Já afirmava o Papa Bento XVI, na mensagem
elaborada para o 45º Dia Mundial das Comunicações Sociais, em 5 de junho de 2011– que
trata sobre o areópago digital que emoldura a vida contemporânea:
A cultura digital, provoca mudança de paradigmas da comunicação e isto
requer mudança de mentalidade, pois o sujeito navega, interage e consome
informações de forma extraordinária, pois “conseguimos transitar
informações, bens simbólicos, não materiais, de uma maneira inédita na
história da humanidade”. (LEMOS, 2009, p. 136)
O processo de comunicação como atividade histórico-cultural no século XXI exige do
sujeito conhecimento e autonomia, pois as novas tecnologias proporcionam mudanças não
somente nas formas de comunicação, mas a própria comunicação em si mesma, podendo-se
afirmar que estamos perante uma ampla transformação cultural. Tal transformação coloca o fiel
numa nova ambiência, na qual as interações comunicacionais exigem mudança na forma de
produzir e receber a mensagem transmitida pela máquina, mas tal mensagem elaborada por um
ser humano.
Neste artigo procura-se evidenciar como a Igreja, Católica, vem utilizando a tecnologia
digital para a manutenção e expressão da fé de seus fiéis. O presente trabalho é organizado em
três seções, além desta Introdução e das Considerações Finais. Em Manutenção da Fé no
aerópago digital: O encontro com o Divino (imaterialidade) por meio da Materialidade (vela
digital) são apresentados os conceitos de materialidade e imaterialidade, na visão de Daniel
Miller (2013), relacionando tais conceitos com os costumes dos católicos na utilização da vela,
desde seu surgimento na Igreja, até a utilização da vela no ambiente (aerópago) digital. A seção
Aerópago Digital - Análise dos sites dos Santuários, Santuário de Nossa Senhora Aparecida e o
Santuário de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro expõe uma análise de como cada um dos
Santuários apresenta o ícone Vela Virtual e as orientações para que o fiel acenda a vela, bem
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como, também apresenta o número de velas acesas no dia e horário da pesquisa. Por fim, a
seção Cibernética da semântica- tradução das experiências culturais do indivíduo evidencia
como a mensagem irá influenciar a mudança de comportamento do fiel diante do que lhe é
apresentado, pela máquina, no ambiente virtual.
Manutenção da Fé no aerópago digital: o encontro com o Divino (imaterialidade) por
meio da Materialidade (vela digital)
“Eu sou a luz do mundo; quem me segue não andará nas trevas; pelo contrário, terá a
luz da vida.” (João 8:12)
Em várias passagens bíblicas os discípulos valiam-se de metáforas para afirmar que
Deus é a luz e tal representatividade se dá, entre os cristãos, pelo uso da vela em diferentes
rituais religiosos. Ela simboliza a fé da vida cristã. A vela acesa remete a uma proximidade
com o Divino, um diálogo, uma intercessão de Deus por nós, na terra. Para Miller “há um
princípio básico encontrado na maioria das religiões que dominaram a história registrada. A
sabedoria foi atribuída àqueles que afirmam que a materialidade o meramente aparente, sob o
qual jaz o real.” (MILLER, 2013, p. 105)
Para elucidar tal afirmação faz-se necessário expor a partir de quando a vela passou a
ser considerada o símbolo da materialidade para o cristão católico para o encontro com a
imaterialidade Divina.
A vela caracterizada como objeto na vida de qualquer pessoa servia para iluminar as
casas antes da chegada da eletricidade, porém na Igreja Cristã, em especial, na Igreja Católica,
tal objeto é carregado de significados divinos, imateriais.
No século VIII, era costume que a igreja permanecesse no escuro depois de terminada a
celebração vespertina da Quinta-Feira da Paixão, ou seja, não era permitido nenhum tipo de luz
dentro da Igreja, pois esta data cristã representa a crucificação e a morte de Jesus. Somente era
trazida a luz para dentro da Igreja no Sábado da Paixão, no período noturno.
A luz voltava a reinar dentro da Igreja por meio do Círio Pascal, grande vela acesa,
durante a vigília, que representa, até os dias atuais, a Ressurreição de Jesus Cristo. Tal objeto,
na representação material de uma grande vela decorada e disposta num requintado e luxuoso
candelabro, era acesa e conduzida pelo diácono para dentro da Igreja e este vai proferindo a
seguinte frase “A luz de Cristo” e os fiéis o acompanham em procissão e, em seguida vão
acendendo suas velas e toda a Igreja fica iluminada.
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O Círio Pascal em sua representatividade material, a vela, traz uma cruz desenhada no
centro e um lema inscrito que são as letras do alfabeto grego Alfa e Ômega, respectivamente
primeira e última letras do alfabeto que significam princípio e fim do tempo, também está
inscrita a data do ano vigente para representar a presença imaterial, mas viva de Jesus Cristo
ontem, hoje e sempre.
Numa entrevista cedida a acadêmicas no Departamento de Antropologia da University
College London, Miller define materialidade como: “àquilo que não significa, necessariamente,
apenas coisas físicas, pode ser sobre finanças, sobre sonhos, ou sobre a imaterialidade da
Internet e dos mundos digitais, ou seja, não se trata daquilo que foi criado, convencionalmente,
como coisas” (MILLER, 2009, p. 30).
O Círio Pascal é uma grande vela (objeto), antigamente produzida com a cera das
abelhas, atualmente, com a parafina pode ser considerado, então, símbolo da materialidade,
pois este fica aceso na Igreja até a conclusão do cognominado Tempo Pascal, depois é apagado
e devidamente guardado na sacristia e sua chama só será novamente acesa em dias muito
representativos para os cristãos, o batismo e as exéquias, sacramentos que indicam o princípio
e o fim da vida temporal. O sacramento do batismo significa que durante a vida o cristão
participa da vida de Cristo e que após a morte garantirá a integração à Luz eterna. Miller afirma
que a “cultura material teve consequências consideráveis como meio de expressar certas
convicções” (MILLER, 2013, p.105). Esse cenário religioso ratifica que uma das
manifestações de fé somente é evidenciada pela materialidade da vela acesa, cuja chama
representa o diálogo, o encontro com o Divino, ou seja, a imaterialidade da Luz, presença de
Deus, na terra entre os cristãos.
Comumente as igrejas católicas do mundo todo no momento da celebração das missas
têm as velas dispostas e acesas no altar, no velório a vela acesa simboliza que a pessoa morta
era cristã, nos cemitérios, os túmulos que são iluminados pela luz da vela indica que jaz um
cristão. Corroboram-se tais afirmações pelos salmos “Porque o Senhor vela pelo caminho dos
justos…” (Sl 1, 6). “O Senhor vela pela vida dos íntegros, e a herança deles será eterna” (Sl 36,
18).
Como a utilização da vela, dentro da Igreja, é considerada, pelo cristão, a luz, o
caminho para se chegar ao Divino, esta também passou a ser utilizada para implorar as mais
diversas graças, como: saúde, paz, emprego, conversão, entre outras. O ritual de acender uma
vela para pedir ou agradecer a intercessão de Deus era habitualmente realizado em determinado
espaço da casa, juntamente a uma espécie de altar, com imagens e artigos religiosos, também
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esse ato era muito comum nas igrejas junto ao altar do Santíssimo e por fim, no cemitério, em
especial no túmulo de entes queridos pela alma destes.
A cultura material explora por meio da idiossincrasia de objetos materiais para,
basicamente criar uma compreensão mais profunda da especificidade de seres humanos, em
especial alguns cristãos católicos, que são inseparáveis de sua materialidade.
Em tempos de tecnologia digital surgiram os modernos aerópagos e estes têm
influenciado o ritual cristão de acender, pois hoje nos deparamos não somente com a vela real
(parafina), mas também a vela virtual disponibilizada aos cristãos no aerópago digital.
Para Miller:
A cultura material direciona sua atenção aos elementos fundamentais sobre o
que queremos dizer quando falamos sobre seres humanos, essa é uma das
razões pela qual ela se torna tão influente. Algumas pessoas, que
simplesmente lidam com o mundo das coisas, centram-se na antropologia do
consumo e estão satisfeitas com estas definições, mas acredito que fazemos
outra coisa aqui: mantemos uma espécie de equilíbrio entre questões teóricas
profundas e essa grande variedade de literaturas. (MILLER, 2009, p.430)
Para os cristãos católicos a vela não está relacionada à palavra consumo, mas sim pela
representatividade simbólica que este objeto carrega, ou seja, sua materialidade ligada à fé, ao
equilíbrio entre a materialidade e a imaterialidade.
Aerópago Digital - Análise dos sites dos Santuários: Santuário de Nossa Senhora
Aparecida e o Santuário de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro.
Numa pesquisa realizada de forma aleatória em alguns sites de santuários religiosos
buscou-se a forma com que a representatividade material da vela virtual é apresentada a seus
fiéis. Os sites dos Santuários analisados foram: Santuário de Nossa Senhora Aparecida,
localizado em Aparecida do Norte (SP); e o Santuário de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro
(PR). As duas basílicas citadas apresentam disponível no aerópago digital para o cristão
acender sua vela virtual.
A análise tem por intuito entender como a igreja, em especial, a católica vem utilizando
recursos da tecnologia digital para a manutenção da fé, pois para a religião o principal
propósito do material, neste estudo priorizando a (vela) é aproximar o fiel do imaterial
Divino).
Santuário Nacional de Nossa Senhora Aparecida – Aparecida do Norte (SP)
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Com início em 1946, o Santuário, na cidade de Aparecida do Norte, localiza-se no Vale
do Paraíba, local onde corre um rio em que foi palco do aparecimento da estátua de Nossa
Senhora Aparecida. É considerado o maior Santuário do mundo dedicado à Santa Mãe Maria.
No caso do Santuário de Nossa Senhora Aparecida se o devoto entrar diretamente no
site, não encontrará o ícone que remeta à Vela Virtual, neste caso em específico, o fiel deverá
digitar no site de busca Google – Santuário Nossa Senhora Aparecida – acender vela virtual.
Assim aparecerá a imagem exposta na figura 01.
FIGURA 01 – PÁGINA INICIAL
FONTE: http://www.a12.com/reze-no-santuario/vela-virtual
Ao clicar em acender vela aparecerão as informações expostas na figura 02, em que o
fiel deverá preencher o formulário contendo: Nome, e-mail, país, estado, cidade e digite aqui
suas intenções.
FIGURA 02 – MODELO DE FORMULÁRIO A SER PREENCHIDO
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FONTE: http://www.a12.com/reze-no-santuario/vela-virtual
O que chama a atenção neste formulário exposto são as informações que constam na
parte inferior e que o fiel poderá assinalá-las ou não, são elas:
- as informações preenchidas poderão ser visualizadas por todos os fieis internautas;
- deseja receber novidades e informações do A-12 em seu e-mail;
- e-mail comunicativo (envie essa vela para um amigo).
Após o preenchimento do formulário, basta o fiel internauta clicar em acender vela e
esta acenderá automaticamente.
Ao clicar no ícone Buscar Vela, o fiel se deparará com a seguinte tela representada pela
figura 03, que o orienta a buscar por sua vela. Este deverá digitar o código da vela, que fora
gerado após o preenchimento do formulário, digitar o e-mail que fora cadastrado e, por fim,
clicar em buscar vela.
FIGURA 03 – BUSCAR VELA
FONTE: http://www.a12.com/reze-no-santuario/vela-virtual
FIGURA 04 – VELAS ACESAS
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FONTE: http://www.a12.com/reze-no-santuario/vela-virtual
Caso o fiel deseje visualizar sua vela virtual, este poderá clicar no ícone Velas Acesas,
que aparece na figura 04, que consta no canto superior direito da tela e, imediatamente
aparecerá a vela acesa por ele e as demais que foram acendidas, simultaneamente, por outros
fieis.
Uma informação, muito relevante, do site do Santuário de Nossa Senhora Aparecida e
que consta na figura 04 é que são computados números relacionados ao total de velas acesas
até o momento, bem como o total de velas acesas referentes ao dia e horário que o fiel acendeu
sua vela. Até o momento da pesquisa o total de velas acesas era de: 2797359 e o Total de Velas
hoje: 610.
Santuário Nossa Senhora do Perpétuo Socorro - Curitiba (PR)
O Santuário de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro surgiu no ano de 1960 e hoje é
considerado um dos principais e mais tradicionais da Igreja Católica em Curitiba, recebendo
muitos devotos do interior do Paraná e também de outros estados brasileiros.
FIGURA 05 – PÁGINA INICIAL
FONTE: http://www.santuarioperpetuosocorro.org.br/velas.php
No caso do site do Santuário de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro se o devoto entrar
diretamente pelo endereço https://www.perpetuosocorro.org.br/sobre-o-santuario/ não
encontrará ícone que remeta à Vela Virtual, neste caso em específico, o fiel deverá digitar no
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site de busca Google – Santuário Nossa Senhora do Perpétuo Socorro – acender vela virtual.
Assim aparecerá a imagem exposta na figura 05.
Ao descer a barra de rolagem apresentada na figura 05, o fiel se deparará com as
primeiras orientações expostas na parte superior em Acender Velas e Velas Acesas,
informações estas expostas na figura 06.
FIGURA 06 – SELECIONE UMA VELA
FONTE: http://www.santuarioperpetuosocorro.org.br/velas.php
Logo abaixo, consta a seguinte mensagem: “As velas nos lembram a luz de Deus que
vem ao mundo para iluminar nossa existência. Se você deseja acender uma vela por você ou
por alguma outra intenção particular, clique na aba (Acenda uma vela). A sua vela terá duração
de 9 dias.”
O que chama a atenção neste site do Santuário de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro é
que são apresentadas 8 velas coloridas e cada cor simboliza um tipo de pedido ou de intenção,
conforme elucida a tabela 01 (mas esta questão é tema para pesquisa posterior).
TABELA 01 – INTENÇÕES RELACIONADAS ÀS CORES DAS VELAS
VELA
AMARELA
VELA AZUL VELA
BRANCA
VELA
CINZA
VELA
ROSA
VELA ROXA VELA
VERDE
VELA
VERMELHA
LUZ que
traz
FORÇA
para minha
vida e
BÊNÇÃO
para o
LUZ que
traz
HARMONIA
para minha
Família
LUZ que
traz PAZ
para
minha
vida
LUZ que
traz
conversão
LUZ que
traz
BÊNÇÃO
para as
Grávidas!
LUZ que traz
CONVERSÃO
para minha
Vida!
LUZ que
traz
PROTEÇÃO
para as
Crianças!
LUZ que traz
VIDA para meus
Relacionamentos
Afetivos
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trabalho
FONTE: http://www.santuarioperpetuosocorro.org.br/velas.php
Além da especificação das cores das velas estarem relacionadas a cada pedido ou
intenção, observa-se que em todas as descrições apresentadas a palavra LUZ está grafada com
letra maiúscula. O que nos faz refletir sobre a importância do sentido do vocábulo LUZ para os
cristãos no encontro da imaterialidade com Deus por meio da materialidade da vela acesa.
FIGURA 07 – PREENCHIMENTO DO FORMULÁRIO
FONTE: http://www.santuarioperpetuosocorro.org.br/velas.php
Após o fiel selecionar a cor da vela referente ao seu pedido é o momento de preencher
o questionário exposto na figura 07. Neste constam: nome, e-mail, telefone, cidade, país, idade,
se o fiel deseja exibir no site, em seguida deve-se digitar a intenção no local destinado, digitar
o código de segurança e por fim, clicar em enviar.
Conforme elucidado na parte superior da figura 06 pode-se clicar no ícone Velas Acesas.
Porém, ao clicar o fiel se depara com um campo de preenchimento para localizar uma
vela, porém não são explicitadas as informações que devem ser digitadas no campo indicado,
ficando o fiel impossibilitado de visualizar a vela acesa e a quantidade de velas acesas pelos
fieis devotos.
Após a análise dos dois sites dos Santuários constata-se que a utilização de velas
virtuais pelos fiéis católicos tem sido uma prática comum, pois de acordo com as orientações
dispostas no ambiente digital, as velas virtuais podem ser utilizadas sem prejuízo à fé, e
mantendo seu principal objetivo que é de manter um contato com o Divino, porém, valendo-se
da materialidade da vela virtual. Tais ações podem ser compartilhadas com as ideias do
antropólogo Miller, que salienta que “quanto mais a humanidade busca alcançar a
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conceitualização do imaterial, mas importante é a forma específica de sua materialização”
(MILLER, 2013, p.114).
Cibernética da semântica- tradução das experiências culturais do indivíduo
(...) coloquei na mesma classe comunicação e controle, pois quando me
comunico com outra pessoa, transmito-lhe uma mensagem, e quando ela, por
sua vez, se comunica comigo, replica com uma mensagem conexa, que
contém informação que lhe é originalmente acessível, e não a mim. Quando
comando as ações de outra pessoa, comunico-lhe uma mensagem, e embora
tal mensagem esteja no modo imperativo, a técnica de comunicação não difere
da de uma mensagem de fato (...). (WIENER, 1954, p.16)
Essas foram palavras do matemático e fundador da cibernética, Norbert Wiener. Como
trabalhava na programação de máquinas computadoras e tinha como objetivo criar um sistema
artificial capaz de desenvolver na máquina funções, até então, exclusivas de humano, como executar
cálculos e prever trajetórias, este passa a se interessar não somente pelo estudo da linguagem, mas
também, pelo estudo das mensagens como meio de dirigir a maquinaria e a sociedade. Mensagem
entre o homem e as máquinas, entre as máquinas e o homem, e entre a máquina e a máquina.
A Comunicação e controle são palavras de ordem numa sociedade regulada pela
informação em que os meios de produção e de transmissão do conhecimento exigem cada vez
mais compreensão para desvendar as mais complexas relações de sentido que são anunciadas
na elaboração das mensagens, e o homem, imerso nesse mundo, somente o percebe pelos
órgãos dos sentidos, e estes o possibilitam a capacidade de ajustar-se a condutas futuras
valendo-se de experiências do passado, é o que (Wiener, 1945) denomina de realimentação ou
(feedback). A capacidade do ser humano ajustar-se a diferentes ambientes pelos órgãos dos
sentidos em uma rede de comunicações, pode segundo Wiener (1945) ser considerada em três
níveis distintos:
Para a linguagem falada comum, o principal nível humano consiste no ouvido
e naquela parte do mecanismo cerebral que está em ligação permanente com o
ouvido interno. (...) Representa a máquina relacionada com o aspecto fonético
da linguagem, com o próprio som. O semântico, que é o segundo aspecto da
linguagem, se relaciona com o significado e se torna manisfesto, por exemplo,
nas dificuldades de traduzir de uma para outra língua em que a
correspondência imperfeita entre os significados das palavras restringe o fluxo
de informação de uma para outra. O terceiro nível é a tradução das
experiências do indivíduo, quer conscientes quer inconscientes, em ações que
podem ser observadas externamente. Chamamos a isso o nível de
comportamento. (WIENER, 1954, p.77 a 80)
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Todos os níveis apresentados têm sua representatividade no momento em que o ser
humano recebe determinada informação. Ao ouvi-la, tal informação somente será processada
significativamente pelo cérebro, se tiver sentido (valor semântico), ou seja, venha agregar algo
ou algum conhecimento ao indivíduo. Para nosso estudo é de extrema relevância o nível de
traduções das experiências, pois estas somente podem ser medidas a partir do nível de
comportamento.
A contextualização, do segundo e terceiro níveis, pode ser explicitada a partir do objeto
de estudo desta pesquisa, a materialização da vela (real e virtual) para cristãos, em especial, os
católicos. Para os católicos, o ato de acender a vela (em casa, na igreja, no cemitério) é uma
forma de aproximação e diálogo com o Divino, porém com a cultura digital, são apresentados
diferentes aerópagos de manifestação da fé, bem como diferentes formas de materialização
(velas).
O acesso à internet pode ser realizado por qualquer pessoa, porém cada pessoa busca
por conteúdos que lhe interessam, por exemplo, um cristão Protestante não terá interesse em
pesquisar sites relacionados a Santos, pois para este cristão Deus não tem intercessor, ou seja,
não acreditam em santos, nos quais, o católico acredita.
Por este motivo, os sites dos Santuários de Nossa Senhora Aparecida e Nossa Senhora
do Perpétuo Socorro somente terão significação semântica para os fiéis católicos, os demais
cristãos podem até acessá-lo por curiosidade, porém, não terão a mesma relação de sentido,
pois não se traduz experiências significativas para estes indivíduos.
Para o católico que acessa o site do Santuário de Nossa Senhora Aparecida, e que já
tenha recebido alguma graça por intercessão desta, provavelmente encontrará muitas
informações, as quais serão processadas pelo cérebro, pois, estas podem ser informações que os
remetam a determinadas experiências religiosas vividas anteriormente. Este ato de troca de
interesses refere-se à linguagem semântica.
Já para elucidar o terceiro nível, que se refere a ações do indivíduo que podem ser
observadas externamente, torna-se mais complexo, explicitar, pois, indica uma mudança de
comportamento e, sabe-se que comportamento está intimamente ligado a questões culturais.
A palavra cultura traz diferentes definições, dentre elas: tradição de um determinado
grupo, significados comuns. Para Geertz, ela significa “um padrão historicamente transmitido
de significados incorporados em símbolos” (GEERTZ, 2008, p .03). Já para o filósofo
Raymond Williams
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a cultura é de todos: este é o fato primordial. Toda sociedade humana tem
sua própria forma, seus próprios propósitos, seus próprios significados.
Toda sociedade humana expressa tudo isso nas instituições, nas artes e no
conhecimento. A formação de uma sociedade é a descoberta de significados
e direções comuns e seu desenvolvimento se dá no debate ativo e no seu
aperfeiçoamento, sob a pressão da experiência, do contato e das invenções,
inscrevendo-se na própria terra. A sociedade em desenvolvimento é um
dado, e, no entanto, ela se constrói e reconstrói em cada modo de pensar
individual. (WILLIAMS, 1958, p. 01 e 02)
Ao afirmar que cada sociedade tem seu significado e que esta o manifesta nas
instituições, pode-se novamente trazer à tona o objeto de pesquisa, pois o ato de acender
velas entre os católicos é um ritual, porém com a sociedade em desenvolvimento, este ato se
constrói e se reconstrói. Até alguns anos atrás o católico dispunha somente do ambiente
físico e da vela física (parafina), para efetivar sua manifestação de fé, atualmente com o
contato com as invenções tecnológicas a sociedade passa a experienciar os meios oriundos da
tecnologia, os meios virtuais. O ambiente virtual dispõe para o católico alguns rituais que
antes aconteciam somente em lugares tidos como sagrados. Acender uma vela e fazer a
intenção virtualmente é um exemplo disto.
Após a breve reflexão sobre cultura, cabe apresentar o exemplo que pretende ilustrar o
terceiro nível, exposto por Wiener, que se refere a ações do indivíduo e que só podem ser
observadas externamente, ou seja, para se atingir o terceiro nível trata-se de uma mudança de
comportamento cultural, ou seja, os meios digitais passam a ser utilizados pelos católicos para
realizar um ritual, antes realizado somente em ambiente físico.
O ato de visitar diferentes sites com temas religiosos não configura mudança de
comportamento, o que configura tal mudança é a passagem do ato de acender uma vela na
igreja ou mudar o comportamento e acendê-la virtualmente.
No momento em que o fiel utiliza-se tanto do ambiente físico quanto do virtual e a
consumação de acender a vela virtual, mostra uma mudança de comportamento cultural, isto
não quer dizer que o fiel abandone a tradição do ambiente físico, mas o virtual passa, também,
a fazer parte da cultura do fiel católico no século XXI para a manutenção da fé.
Quando por intermédio da máquina, em especial, da mensagem transmitida pela
máquina, o ser humano efetivamente muda de comportamento, tem-se, para Weiner, (1954) a
definição de cibernética da semântica.
Para finalizar esta seção segue uma reflexão de Wiener sobre a função social de uma
informação semântica e significativamente elaborada:
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Informação semanticamente significativa, na máquina, como no homem, é a
informação que chega a um mecanismo ativador no sistema que a recebe, a
despeito dos esforços do homem e/ou da Natureza para corrompê-la. Do ponto
de vista da Cibernética, a semântica define a extensão do significado e lhe
controla a perda num sistema de comunicações. (WIENER, 1954, p.93)
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A participação de fiéis católicos no ambiente virtual para a realização de certos rituais
religiosos, antes realizados somente em ambientes físicos e, em especial ambientes Sagrados,
como a Igreja, já é uma realidade. Tal afirmação comprova-se pelo acesso de fieis a sites com
conteúdos religiosos em que estes direcionam os usuários à efetivação virtual do ato religioso,
no caso do objeto de pesquisa, acender uma vela.
O Papa Francisco já alertava os cristãos no Evangelii Gaudium (2103) para uma nova
forma de ser Igreja hoje, situando-se na história: “é preciso ter a coragem de encontrar os
novos sinais, os novos símbolos, uma nova carne para a transmissão da Palavra”.
Diante do apresentado comprovou-se a importância de como a mensagem veiculada no
ambiente virtual, na máquina, precisa ser muito bem elaborada, pois no momento em que esta é
transmitida aos usuários da rede precisa apresentar uma relação semântica, bem como uma
relação com as experiências de vida do indivíduo, fato apresentado no site do Santuário Nossa
Senhora Aparecida em que o número de velas acesas, por fiéis católicos, até a data da pesquisa
era de 2797359.
O ato de acender a vela virtual mostra que o católico apresenta mudança de
comportamento, porém vale destacar que o principal objetivo do ato de acender a vela em sua
materialidade continua o mesmo, uma forma de aproximar-se do Divino, a imaterialidade.
Miller (2013, p.108) Em essência, foi sua fé no potencial da vela (grifos meus) para expressar a
imaterialidade que criou seu legado como presença.
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