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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM ENGENHARIA DE
PRODUO
Doutorado
AMLIA LEITE DE ALMEIDA
INTERAO DE CRIANAS AUTISTAS COM O MUNDO DIGITAL: UMA TRAVESSIA DE EMOO E PRAZER
FLORIANPOLIS-SC 2005
II
AMLIA LEITE DE ALMEIDA
INTERAO DE CRIANAS AUTISTAS COM O MUNDO DIGITAL: UMA TRAVESSIA DE EMOO E PRAZER
Tese submetida ao Programa de Ps-Graduao em Engenharia de Produo da Universidade Federal de Santa Catarina como requisito para obteno do ttulo de Doutora em Engenharia de Produo.
Orientador: Prof. Francisco A. P. Fialho, Dr.
Florianpolis, 2005.
III
Ficha Catalogrfica
Almeida, Amlia Leite de. Interao de Crianas Autistas com o Mundo Digital: uma travessia de emoo e prazer/ Amlia Leite de Almeida. Florianpolis, UFSC/PPGEP. 2005.
X - 263 p. Orientador: Prof. Dr. Francisco Antnio Pereira Fialho. Tese-Universidade Federal de Santa Catarina. 1. Autismo. 2. Cognio-Emoo-Afetividade. 3. Computador I. Titulo.
IV
AMLIA LEITE DE ALMEIDA
INTERAO DE CRIANAS AUTISTAS COM O MUNDO DIGITAL: UMA TRAVESSIA DE EMOO E PRAZER
Esta Tese foi julgada adequada para a obteno do Ttulo de Doutor em Engenharia de Produo e aprovada em sua forma final pelo
Programa de Ps-Graduao em Engenharia de Produo da Universidade Federal de Santa Catarina
Florianpolis, 2005.
___________________________________ Prof. Edson Pacheco Paladini, Dr.
Coordenador do Programa
BANCA EXAMINADORA
_____________________________ Prof. Francisco A. P. Fialho, Dr.
Universidade Federal de Santa Catarina Orientador
______________________________ ________________________________ Prof. Fbio Edir dos Santos Costa, Dr. Prof. Llian M. Ribeiro Conde, Dr. Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul Faculdade Cenecista de Varginha ______________________________ ________________________________ Prof. Ana Maria B. Franzoni, Dr. Prof. Christianne C. de S. R. Coelho, Dr. Universidade Federal de Santa Catarina Universidade Federal de Santa Catarina
V
Dedico esta tese memria de meus pais, Maria Luiza Farias Leite, que por mim sonhou, mas que nos deixou antes que o sonho se concretizasse, e Jlio Pires Leite, cujos ensinamentos, exemplos e ternura acompanham minha vida e com ela seguiro para o sempre. Saudades, lembranas e acima de tudo, necessidade da companhia e da presena dessas pessoas que me amaram muito. Tambm dedico esta tese: Ao meu orientador, Prof. Fialho, pelo osis de tranqilidade, serenidade e amizade sempre presente em todas as minhas travessias e angstias; Ao meu neto, Pedro Henrique, pela emoo, vivacidade e alegria com que colore a minha vida. O seu sorriso, carinho e ternura motivaram a minha caminhada; E, especialmente, s crianas protagonistas deste trabalho, que mesmo sem perceberem, tornaram possvel a realizao deste estudo deixando marcas profundas em meu corao e fazendo com que me tornasse uma pessoa mais humana e serena.
VI
O autismo no algo que uma pessoa tenha, ou uma concha na qual ela esteja presa. No h nenhuma criana normal escondida por trs do Autismo. O Autismo um jeito de ser, pervasivo; colore toda a experincia, toda sensao, percepo, pensamento, emoo e encontro, todos os aspectos da existncia. No possvel separar o autismo da pessoa. E se o fosse, a pessoa que voc deixaria no seria a mesma com a qual voc comeou. Os autistas so estrangeiros em quaisquer sociedades.
(Jim Sinclair, 1993)
VII
AGRADECIMENTOS
Ao chegar ao final da trilha, desbravando caminhos desconhecidos, superando
obstculos, o momento de agradecer a todos que me ajudaram nessa viagem, dando-
me pistas maravilhosas para que eu pudesse chegar ao tesouro.
Primeiro, a Deus, por ter me proporcionado a oportunidade de abrir caminhos para
poder agregar conhecimentos e conviver com pessoas que me fizeram sentir que poderia
chegar at o fim da travessia;
Aos mestres e aos mentores espirituais que me iluminam, me acompanham, me
orientam, me protegem e me mantm alinhada ao meu propsito de vida, cumprindo uma
misso muito especial;
Ao Programa de Ps-Graduao da UFSC, pelo inestimvel crescimento intelectual e
pessoal possibilitado pelas interaes com os professores, colegas e funcionrios,
dando-me a oportunidade de vivenciar uma moderna e avanada experincia educativa;
Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS), por me desafiar para a
busca de meu fazer pedaggico, principalmente por ter promovido esta oportunidade de
promoo de conhecimento;
Aos meus colegas de trabalho da UEMS, principalmente ao Prof. Dr. Fbio Edir, pelo
crdito e tambm pelo descrdito que me apontaram o rumo a seguir;
Aos meus amigos e s minhas amigas, que ao meu lado ou distante, me alimentam
com o alento de no estar s, nem fazer nada sozinha, nesta caminhada de necessrio
isolamento e reflexo, especialmente a Eleuza, a Cida, a Cidinha, a Gilberto, o Joo, a
Elaininha, a Vanessa, a Lcia, a Ana, o Ednei e a Maria Peixoto;
Agradeo a todas as acolhidas: de teto, de trabalho-pesquisa e acima de tudo, de
companhias-afeto e aqui incluo pessoas muito especiais: Profa. Dra. Ana Franzoni,
Profa. Dra. Christianne Coelho, Profa. Dra. Llian Conde, Isabelle, Marta, Sandra, Val,
Rose e Juliana, pessoas que me ajudaram a vivenciar a magia da vida nesta bela Ilha da
Magia, minimizando a saudade da famlia que deixei em Mato Grosso do Sul;
Elaine, que me auxiliou com muita dedicao na formatao;
Prof. Dr. Rosana Zanellato Santos, pela correo final do texto.
Ao Christiano, pelos momentos animados em que passamos discutindo a arte;
Ao Prof. Fialho, pelo olhar atento durante todo o trabalho e, em especial, pela partilha,
humildade e disponibilidade, prprias dos grandes mestres. Ele fez a diferena;
VIII
Direo e aos funcionrios do Centro de Educao Especial Brisa, pelo
acolhimento, disponibilidade de informaes, respeito e confiana depositados neste
trabalho e tambm pelo pronto atendimento a todas as solicitaes e discusses,
tornando-nos uma equipe multidisciplinar e principalmente, s professoras Mary,
Marielza e Roseli, pela dedicao e carinho com suas crianas;
Direo e aos funcionrios da Escola de Educao Especial Maria Jlia Ribeiro,
pelo acolhimento, disponibilidade de informaes, respeito e confiana depositados neste
trabalho, principalmente a Profa. Edinalva, que nos proporcionou momentos de reflexo;
Direo e aos funcionrios da Escola Erasmo Braga, que aceitou o desafio de
matricular uma criana com autismo na Educao Infantil, oferecendo todas as
condies para sua incluso total, principalmente a Coordenadora Maria, a Profa. Nia e
o Prof. Anderson, do Laboratrio de Informtica, pela disponibilidade e troca de
experincias;
Associao Amigos dos Autistas/AMA, pelo acolhimento, disponibilidade de
informaes, respeito e confiana depositados neste trabalho;
Um agradecimento muito especial s famlias das crianas, com quem tive o privilgio
de conviver ao longo da pesquisa, pela qualidade do elo construdo, acreditando neste
trabalho, aceitando que desenvolvssemos a pesquisa com seus filhos;
Cilene, pela amizade, motivao, troca de experincias e pacincia, sempre
disposta a me ouvir;
A toda minha famlia, em especial ao meu esposo, aos meus filhos e minha nora,
por me apoiarem sempre! Mesmo distantes estiveram presentes, compartilhando os
meus sentimentos e meus fazeres; o amor, o respeito e a compreenso dessas
pessoas possibilitaram-me trilhar caminhos desconhecidos sem temer o novo;
A todos que, direta ou indiretamente, contriburam para a elaborao desta tese.
E, por fim, agradeo minha egrgia Banca, que sacramenta institucionalmente este
trabalho, estudo, pesquisa e empenho de vida.
IX
RESUMO
ALMEIDA, Amlia Leite de. INTERAO DE CRIANAS AUTISTAS COM O MUNDO DIGITAL: Uma travessia de emoo e prazer. Florianpolis, 2005. 262 p. Tese (Doutorado em Engenharia de Produo) Programa de Engenharia de Produo Universidade Federal de Santa Catarina, UFSC.
Nesta tese analisa-se o uso da Informtica como recurso pedaggico no processo de interao e de desenvolvimento cognitivo de crianas com autismo. Foram realizados cinco estudos de caso, focalizando a Informtica como suporte sociocognitivo para essas pessoas, a partir de um referencial terico construtivista, construcionista, contextualizado e significativo, que pudesse apontar para um fazer pedaggico inclusivo, numa perspectiva inter e transdisciplinar. Adotou-se um enfoque qualitativo, compondo um caleidoscpio de informaes e de impresses, fazendo com que diferentes mtodos e a comunicao socioafetiva com os atores convergissem, produzindo uma relevante troca de experincias, propondo uma metodologia que privilegia as interaes e o desenvolvimento cognitivo no processo de comunicao entre autista-mundo exterior, a partir do mundo digital virtual. Como sujeitos da pesquisa, pde-se contar com crianas autistas com idades de quatro a 15 anos de idade, da Escola de Educao Especial Maria Jlia Ribeiro (Dourados/MS), do Centro de Educao Especial Brisa (Itapor/MS) e da Escola Erasmo Braga (Dourados/MS). Os dados foram coletados entre familiares, portadores da sndrome, gestores, professores e equipe tcnica, por meio de entrevistas abertas, questionrios e observao participante. Como recursos para coleta de dados, utilizaram-se: gravador, mquina fotogrfica e um caderno de campo (Dirio de Bordo). As condutas dos alunos diante das aulas de Informtica educativa foram analisadas luz das categorias conceituais eleitas para observar as interaes dos alunos em meio informtico. Os resultados alcanados mostraram que o uso da Informtica educativa mediada pelo professor traz benefcios visveis no desenvolvimento cognitivo, afetivo-emocional e coordenao viso-motora dos educandos.
Palavras-chave: Autismo; Cognio-Emoo-Afetividade; Computador.
X
ABSTRACT
ALMEIDA, Amlia Leite de. AUTIST CHILDREN AND THEIR INTERACTION WITH THE DIGITAL WORLD: a journey of emotion and pleasure. Florianpolis, 2005. 262 p. Thesis (Doctorate in Production Engineering) Program of Masters degree in Production Engineering, Federal University of Santa Catarina, UFSC.
In this dissertation the use of computer techniques as learning tools is analyzed in the process of the interaction and development of cognitive knowledge in autistic children. Five case studies were undertaken focusing computer use as a socio-cognitive support for these children, starting from a theoretical referential based on constructivism and constructionism which are both seen within a context of significance which could indicate a pedagogical procedure of an inclusive, inter and trans-disciplinary perspective. A qualitative approach was adopted, composed of a kaleidoscope of information and impressions, forcing a convergence of differing methods within the socio-affective communication of players; thus producing a relevant exchange of experiences and proposing a methodology which stresses interactions and cognitive development in the communication process between the autistic subject and the outside world, starting from the virtual and digital world. Children from four to fifteen years of age, from the Special Education School Brisa (Itapor/State of Mato Grosso do Sul, Brazil) and from the Centre of Special Education of the Erasmo Braga School (Dourados/ State of Mato Grosso do Sul, Brazil) were the research subjects. Data was collected amongst family members, syndrome bearers, managers, teaching and technical staff, by open interviews, questionnaires and participatory observation. Cassette recorders, photographic camera and field notebook (field log book) were used as data collection resources. Student behaviour during educational computer sessions was analyzed in the light of the conceptual categories elected to observe student interaction in the computing media. Results showed that the use of the computer as an educational tool, mediated by the teacher, brings visible benefits in the cognitive, affective-emotional, and visual and motor development of the pupils.
Key words: Autism; Cognition-emotion-affectivity; Computer.
XI
Sumrio
Resumo p. IX
Abstract p. X
Lista de Figuras p. XV
Lista de Quadros p. XVII
Lista de Tabelas p. XVIII
1 INTRODUO p. 02
1.1 Apresentao p. 02
1.2 Justificativa p. 09
1.3 Relevncia do Estudo p. 13
1.4 Apresentao do Problema p. 14
1.5 Delimitao do Tema p. 17
1.6 Objetivos p. 18
1.6.1 Objetivo Geral p. 18
1.6.2 Objetivos Especficos p. 18
1.7 Hiptese p. 19
1.8 Limitaes p. 21
1.9 Plano Metodolgico p. 22
1.10 A Estrutura da Tese p. 24
2 EDUCAO ESPECIAL p. 27
2.1 A Educao Especial: Contextualizao p. 27
2.2 Reabilitao p. 33
2.3 O Uso da Informtica na Educao Especial p. 34
2.4 Declarao de Salamanca e suas implicaes na Educao
Especial
p. 35
2.5 Deficincia Mental: Conceitos e Pressupostos Tericos p. 40
2.6 Contribuies de Vigotsky na Concepo da Deficincia p. 49
2.7 Contribuies de Feurstein a respeito da Educao Especial
de forma mediatizada
p. 52
2.8 Contribuies de Piaget na questo do desenvolvimento e
na formao das estruturas lgicas
p. 56
XII
3 AUTISMO p. 62
3.1 Autismo: Breve Histrico p. 62
3.2 Definio, Caracterizao e Diagnstico do Transtorno
Autista
p. 68
3.3 Probabilidade e Prevalncia p. 74
3.4 Condies Mdicas Associadas ao Autismo p. 77
3.5 Caractersticas Comportamentais p. 78
3.5.1 Distrbios do Relacionamento p. 78
3.5.2 Distrbios da Fala e Linguagem p. 79
3.5.3 Distrbios do Ritmo do Desenvolvimento p. 79
3.5.4 Distrbios da Motilidade p. 79
3.5.5 Distrbios da Percepo p. 80
3.6 Prognstico e Intervenes p. 80
3.7 Utilizando o Computador como Recurso de Interveno no
Autismo
p. 87
3.8 Autismo: Papel da Famlia, da Escola e da Sociedade p. 89
4 A Contextualizao da Informtica na Educao p. 93
4.1 Abordagens do Uso da Informtica na Educao p. 95
4.1.1 Abordagem Construcionista p. 96
4.1.2 Abordagem Instrucionista p. 101
4.2 Informtica na Educao Especial p. 102
4.3 Informtica na Educao dos Autistas p. 103
5 Metodologia p. 107
5.1 Primeiros Passos p. 107
5.2 Especificao da Metodologia p. 107
5.3 Contexto da Investigao p. 111
5.3.1 Amostra p. 111
5.3.2 Instrumentos Utilizados p. 112
5.3.3 Os Cuidados ticos p. 113
5.4 Caracterizando as Instituies de Ensino p. 114
5.4.1 Apresentando a Escola Especial Maria Jlia Ribeiro
Dourados/MS
p. 114
5.4.2 Apresentando o Centro de Educao Especial Brisa p. 117
XIII
Itapor/MS
5.4.3 Apresentando a Escola Presbiteriana Erasmo Braga
Dourados/MS
p. 121
5.4.4 Proposta Pedaggica das Instituies p. 123
5.5 Caracterizando os alunos p. 123
5.5.1 Contextualizando as Crianas p. 124
5.6 Proposta de Trabalho junto Aos Alunos p. 130
5.7 Softwares Educativos Utilizados p. 131
5.8 Procedimentos Metodolgicos p. 136
6 Anlise dos Resultados p. 140
6.1 Das Instituies p. 140
6.2 Das Entrevistas com Professores, Gestoras, Coordenadoras,
Psiclogas e Pais
p. 143
6.3 Das Observaes e da Anlise dos Dados no Ambiente
Informatizado
p. 151
6.3.1 Fragmentos dos Dirios de Bordo p. 157
7 Consideraes Finais p. 194
7.1 Sugestes para Trabalhos Futuros p. 202
8 Referncias Bibliogrficas p. 206
APNDICES p. 226
APNDICE A Ofcio aos Dirigentes p. 226
APNDICE B Termo de Esclarecimento p. 227
APNDICE C Termo de Consentimento Livre Aps
Esclarecimento
p. 228
APNDICE D Termo de Autorizao dos Pais p. 229
APNDICE E Formulrio para Entrevista com os Pais p. 230
APNDICE F Formulrio para Entrevista com as Psiclogas p. 232
APNDICE G Formulrio para Entrevista com as Professoras p. 233
APNDICE H Formulrio para Entrevista com Professores da
Rede Regular
p. 234
APNDICE I Formulrio para Professores de Informtica p. 235
APNDICE J Formulrio para Entrevista com as Coordenadoras
Pedaggicas (Ensino Especial)
p. 236
XIV
APNDICE L Formulrio para Entrevista com Coordenadora e
Diretora da Escola Regular
p. 237
APNDICE M Formulrio para Entrevista com Dirigentes
(Educao Especial)
p. 238
APNDICE N Ficha de Acompanhamento na Sala de Aula p. 239
APNDICE O Ficha de Acompanhamento Laboratrio de
Informtica (Professores)
p. 240
APNDICE P Protocolo de Registro (Pesquisadora) p. 241
ANEXOS p. 242
ANEXO A Autorizao da Direo da Escola Especial Maria Jlia
Ribeiro Dourados
p. 243
ANEXO B Autorizao da Direo do Centro de Educao
Especial Brisa Itapor
p. 244
ANEXO C Autorizao da Direo da Escola Presbiteriana
Erasmo Braga Dourados
p. 245
XV
Lista de Figuras Figura 1. Atendimento da Educao Especial nos nveis de ensino p. 28 Figura 2. Alternativas de Atendimento Educacional dos Portadores
de Necessidades Educativas Especiais
p. 28
Figura 3. Nmero por Tipo de Deficincias Detectadas p. 31 Figura 4. TEACCH Ensino Estruturante p. 83 Figura 5. Fachada da Escola de Educao Especial Maria Jlia
Ribeiro
p. 114
Figura 6. Servios Prestados Comunidade pela APAE/Dourados p. 115 Figura 7. Fluxograma de Atendimento APAE/Dourados p. 116 Figura 8. Fachada do Centro de Educao Especial Brisa p. 117 Figura 9. rea de Abrangncia dos Servios Prestados pela
APAE/Itapor
p. 119
Figura 10. Fluxograma de Atendimento APAE/Itapor p. 120 Figura 11. Fachada da Escola de Presbiteriana Erasmo Braga p. 121 Figura 12. Caracterizao das Crianas Investigadas p. 124 Figura 13. Tela Principal do MicroMundos p. 133 Figura 14. Centro de Comandos do MicroMundos p. 133 Figura 15. Passos da Tartaruga Obedecendo a uma Seqncia de
Comandos
p. 133
Figura 16. Centro de Figuras do MicroMundos p. 134 Figura 17. Centro de Desenhos do MicroMundos p. 134 Figura 18. Ferramentas de Criao de Objetos do MicroMundos p. 135 Figura 19. Ferramentas de Edio de Objetos do MicroMundos p. 135 Figura 20. Trade da Vida p. 142 Figura 21. Desenho do Paint (20 Abr. 2004) p. 160 Figura 22. Desenho do MicroMundos (18 Jun. 2004) p. 161 Figura 23. Desenho do Paint (13 Ago. 2004) p. 163 Figura 24. Desenho do Paint (17 Set. 2004) p. 164 Figura 25. Desenho do Paint (17 Set. 2004) p. 164 Figura 26. Desenho do MicroMundos (01 Out. 2004) p. 164 Figura 27. Desenho do MicroMundos (08 Jun. 2004) p. 166 Figura 28. Desenho do MicroMundos (08 Jun. 2004) p. 166
XVI
Figura 29. Letras Digitadas Aleatoriamente pelo Aluno (25 Jun. 2004)
p. 167
Figura 30. Desenho do MicroMundos (29 Jun. 2004) p. 168 Figura 31. Desenho no Paint (03 Ago. 2004) p. 168 Figura 32. Desenho do MicroMundos (103 Ago. 2004) p. 169 Figura 33. Desenho do MicroMundos (24 Ago 2004) p. 169 Figura 34. Desenho do MicroMundos (29 Set. 2004) p. 170 Figura 35. Desenho do MicroMundos (27 Out. 2004) p. 170 Figura 36. Desenho do MicroMundos (03 Nov. 2004) p. 171 Figura 37. Desenho no Paint (18 Mai. 2004) p. 173 Figura 38. Desenho no Paint (18 Jun. 2004) p. 174 Figura 39. Desenho no Paint (18 Jun. 2004) p. 174 Figura 40. Desenho do MicroMundos (15 Jun. 2004) p. 175 Figura 41. Desenho no Paint (03 Ago. 2004) p. 179 Figura 42. Desenho no Paint (07 Ago. 2004) p. 179 Figura 43. Desenho no Paint (24 Ago. 2004) p. 179 Figura 44. Desenho no Paint (06 Out. 2004) p. 180 Figura 45. Desenho no Paint (19 Abr. 2004) p. 183 Figura 46. Desenho no Paint (03 Mai 2004) p. 184 Figura 47. Desenho do MicroMundos (17 Mai. 2004) p. 184 Figura 48. Desenho no MicroMundos t (24 Mai 2004) p. 185 Figura 49. Desenho no MicroMundos (24 Mai. 2004) p. 185 Figura 50. Desenho no Paint (14 Jul. 2004) p. 186 Figura 51. Pintura no MicroMundos (14 Jul. 2004) p. 186 Figura 52. Obra de Alfredo Volp (21 Jun. 2004) p. 186 Figura 53. Trabalho a Partir da Obra Paint (21 Jun. 2004) p. 186 Figura 54. Partes do Corpo - Desenho no Paint (26 Jun. 2004) p. 187 Figura 55. Desenho no Paint (16 Ago. 2004) p. 187 Figura 56. Desenho no Paint (13 Set. 2004) p. 188 Figura 57. Desenho no Paint (18 Out. 2004) p. 188 Figura 58. Desenho no MicroMundos (25 Out. 2004) p. 189 Figura 59. Desenho no MicroMundos (01 Nov. 2004) p. 190
XVII
Lista de Quadros Quadro 01. Categorias da Deficincia Mental p. 43 Quadro 02. Condies Mdicas Associadas p. 77 Quadro 03. Infeces Associadas ao Autismo Infantil p. 77 Quadro 04. Tipos de Anormalidades Orgnicas p. 78
XVIII
Lista de Tabela Tabela 01. Nmero por Tipo de Deficincias Detectadas p. 31
SSee aass ccooiissaass ssoo iinnaattiinnggvveeiiss oorraa!! nnoo mmoottiivvoo ppaarraa nnoo qquueerr--llaass...... QQuuee ttrriisstteess ooss ccaammiinnhhooss,, nnoo ffoorraa aa mmggiiccaa pprreesseennaa ddaass eessttrreellaass!! MMrriioo QQuuiinnttaannaa
2
1. INTRODUO O INCIO DA TRAVESSIA
No h nenhuma criana normal, escondida por trs do autismo. (Jim Sinclair)
1.1 Apresentao
A vida acadmica permeada por eventos formais que lhe do contornos
peculiares. Um deles o desenvolvimento de teses de Doutorado, comparveis a
caminhos longos e acidentados, com reforadores escassos e remotos em demasia
para seus viajantes. E quem so estes viajantes? So os alunos de Ps-graduao,
seus professores, seus orientadores, seus companheiros de turma e de profisso, ou
cooperadores, confidentes e amigos de todas as horas e principalmente, o objeto de
pesquisa, no caso deste estudo, a criana portadora de Autismo. Ela nos conduzir
por entre as pedras do caminho e as prolas da emoo e do prazer de aprender,
ensinando-nos a trilha desta travessia: como (trans) passar as dificuldades
enfrentadas, chegando ao crescimento, que muitas vezes representa para os
envolvidos uma rdua travessia, mas como diz a melodia cantada por Almir Sater e
Renato Teixeira: [...] Todo mundo ama um dia, todo mundo chora. Cada um de ns
compe a sua prpria histria, e cada ser em si carrega o dom de ser capaz de ser
feliz.
Por mais cpticos ou crdulos, certos ou dogmticos que sejam os homens, eles
tm a companhia permanente das dvidas, que o fazem um inquiridor nato. No
entanto, se aes falam mais alto do que palavras, como afirma o conhecido ditado,
ento as primeiras e mais importantes palavras caminham rumo ao reconhecimento
das pesquisas disponveis e que desde os anos de 1940 tm-se efetuado sobre o
autismo. Por outro lado, a sensibilidade quanto s questes ticas, a capacidade de
raciocnio e de deliberao moral, a descentrao, a empatia, a coragem em
defender posies, so competncias requeridas pelo exerccio profissional de quem
convive com essa e outras patologias, e que integram necessariamente a
3
competncia profissional, permitindo, nos dias de hoje, falar da evoluo da sndrome
com mais convico.
Muitos so os estudiosos que se tm dedicado ao estudo dessa sndrome.
Entretanto, ela se apresenta como um grande quebra-cabea que, aos poucos, se vai
construindo e entendendo.
A patogenia do autismo ainda obscura. Ela alimenta grandes foras dialticas no
discurso de especialistas, em detrimento da experincia da famlia em face desse
problema. Com efeito, as estruturas relacionadas dentro da famlia da criana autista
encontram-se perturbadas, distorcidas e dramaticamente desorganizadas diante do
contexto da sndrome.
O tema ora em questo toca particularmente os profissionais de educao, uma
vez que, ao longo de nossa atividade profissional, constatamos que apesar de todas
as modificaes verificadas no ensino e a diversidade de mtodos utilizados, a falta
de recursos humanos, fsicos e pedaggicos adequados continua a marcar de forma
estigmatizante as crianas com Necessidades Educativas Especiais.
Conscientes de que para o encaminhamento de todo trabalho, necessrio
satisfao e um ambiente favorvel para a troca de saberes, julgamos no poder
continuar a vestir casaces de profissionais de educao, em conformidade com
regras estabelecidas. preciso, isto sim, mostrar, sem vergonha, a cor da pele que
cada um tem, exibindo nossas preocupaes e nossas limitaes em face do
desconhecido, nunca esquecendo que tudo depende de como somos, como vivemos
e como descobrimos o mundo do entorno.
Assim, este trabalho, alm de ser fruto de um processo de investigao cientfica
desencadeado nos Cursos de Mestrado e de Doutorado, tambm o resultado de
uma srie de impresses sistematizadas a partir de nossa experincia profissional.
Foi em classes de educao infantil e de ensino fundamental que iniciamos a
trajetria como educadora, em 1970, alfabetizando crianas em escolas pblicas.
Muitas foram as percepes que se transformaram em problemas de investigao
nesta caminhada. Este trabalho produto do aprofundamento sobre um objeto de
estudo especfico dessa trajetria.
Toda nossa vida profissional esteve muito ligada necessidade da busca terica,
de como se ensina e como se aprende. Essa preocupao nos conduziu ao Mestrado
em Engenharia de Produo, na rea de Mdia e Conhecimento, e nosso foco de
4
estudo passou a ser, ento, a pessoa com histria de deficincia1, especificamente
aquela que apresentava, entre outras atipicidades, dificuldades no que se refere
aprendizagem.
Assim, vislumbramos a possibilidade de acesso de pessoas com Transtornos
Invasivos do Desenvolvimento, em um ambiente de aprendizagem informatizado e
um olhar mais aprofundado sobre essas pessoas, nos conduziu a outras reas, tais
como a Tecnologia aplicada Educao e o estudo da pessoa autista.
Trata-se, pois, de um estudo sobre as lutas cotidianas de pessoas com histria de
deficincia, no caso, o autismo, contra os preconceitos e as discriminaes. Para
desenvolv-lo, foi realizado um estudo da histria de vida desses sujeitos. Essas
histrias, mediadas pelo referencial terico, serviram de aprofundamento para a
construo do presente texto.
Neste trabalho, propositadamente, utilizamos algumas metforas para caracterizar
os passos da pesquisa realizada.
Assim, cada captulo uma prola importante que conduziu os nossos passos
nesta travessia, e as prolas esto interligadas umas s outras por um fio muito
especial. A ausncia de uma s prola far com que nos percamos na trilha a trilha
da aprendizagem da pessoa autista, que pode ser gerada pela prtica educativa que
aqui se encontra descrita.
Esta pesquisa resultado de uma preocupao histrica com a fragmentao do
conhecimento no ensino e que nos acompanha desde a formao profissional como
professora, at o trabalho como docente e tcnica da Secretaria de Educao, e
tambm como membro do Conselho Estadual de Educao/CEE/MS, no qual era
responsvel pelas normas da Educao Especial, tendo participado das discusses
no Ministrio de Educao e Cultura/MEC, representando o CEE/MS. A pesquisa
tambm foi motivada pela oportunidade de repensar nossa prpria prtica como
educadora, contribuindo assim para que outras pessoas tambm possam refletir
sobre o tema.
1 No h um consenso em torno da nomenclatura ideal para designar as pessoas com histria de deficincia. Durante todo o trabalho, utilizamos essa nomenclatura por acreditar ser ela menos estigmatizante que as at ento empregadas. Eventualmente podero aparecer outros termos como: pessoas portadoras de deficincia e pessoas com necessidades educativas especiais. Essa variao acontecer quando no for possvel empregar a primeira opo e, assim, sero utilizadas como sinnimos.
5
Um outro motivo significativo foi o envolvimento com este trabalho, que nos levou
a desenvolver uma prtica educativa com a pessoa com autismo, utilizando o
computador como instrumento mediador na aprendizagem dessa pessoa.
Segundo os Parmetros Curriculares, a Educao Especial uma modalidade da
educao escolar voltada para a formao do indivduo, com vistas ao exerccio da
cidadania (PCN, 1998, p.21). destinada a crianas, jovens e adultos portadores de
necessidades especiais e deve ser oferecida em todos os nveis de escolaridade; da
educao infantil ao ensino superior, de preferncia na rede regular de ensino.
Pesquisas mostram que entre 1999 e 2000, esse tipo de atendimento cresceu
27,1%, e dados do Censo Escolar de 2001 apontam 7,5 % de crescimento da
educao especial no Pas em escolas e em classes especiais. Segundo o Censo, o
nmero de matrculas de pessoas com necessidades especiais chegou a 323.073 em
2002, enquanto em 2000 foram 300.520 matrculas (BRASIL, 2002).
No entanto, a realidade nos tem apontado que a incluso do aluno com
necessidades especiais em algumas escolas de ensino regular dificultada pela
infra-estrutura inadequada, pela falta de professores capacitados e pela insuficincia
de materiais e de equipamentos.
Em geral, segundo Mazzotta (1982), a sociedade ainda desacredita que a pessoa
com histria de deficincia possa realizar atividades desafiantes e desenvolver-se
intelectualmente, da o motivo da sociedade, muitas vezes, se omitir em relao
organizao de servios para atender s necessidades individuais especficas dessa
populao. Essa realidade caracterstica marcante da sociedade capitalista, que
cultua a produtividade, a eficincia e a competio, porque para a lgica capitalista
do lucro, suficiente para justificar a excluso de investimento na educao do
portador de necessidades educativas especiais, pois seu retorno no se manifesta de
maneira imediata (BRASIL, 1999:31), mostrando a no valorizao do potencial
produtivo das pessoas com deficincia.
Alm disso, no raro as crianas com deficincia crescerem com excessivas
restries de interao com o meio que as cerca, no se valorizando suas
potencialidades e tornando-as passivas diante da realidade e dos problemas dirios,
por conta de suas limitaes motoras e sociais e do tratamento dados a elas, muitas
vezes paternalista. Tais crianas acabam sendo objetos de seus prprios processos
(GALVO, 2001a).
6
Com a remoo destes rtulos e preconceitos que a sociedade lhes impe,
torna-se possvel o atendimento s pessoas com deficincias, tanto em servios
educacionais quanto em servios de reabilitao. Trata-se de um processo complexo
que tem como meta a integrao de todos os elementos que constituem a escola:
professores, alunos, pessoal administrativo e, especialmente, os pais, buscando um
ambiente rico e variado que possibilite uma melhor aprendizagem para a pessoa com
deficincia. O primeiro passo a aceitao da deficincia apresentada pela pessoa e
no a busca de uma tentativa de normalizao (Manzini, 1999).
Porm, a incluso das pessoas com deficincias nas escolas regulares um
desafio para o ensino brasileiro. O modelo inclusivo segue a resoluo n 45/91 da
Organizao das Naes Unidas (ONU), que prope a construo de uma sociedade
para todos. O incio dessa construo foi em 1990 e a meta para finalizar este
processo o ano de 2010 (BRASIL, 1999, p.83).
No Brasil, cerca de 3% das crianas e adolescentes com deficincia tm acesso e
permanncia na escola, e acredita-se que isto se deve, como mencionado
anteriormente, formao econmico-social brasileira, na qual essas pessoas so
vistas como no eficientes perante a produtividade, a eficincia e a competio que a
sociedade exige.
Nesse sentido, a escola tem o papel de facilitar a integrao dos alunos com
necessidades especiais, promovendo seu ingresso no meio social como membros
ativos, afinal, a educao o principal meio para que esses indivduos exeram suas
funes sociais. Ademais, a escola deve facilitar a aprendizagem, permitindo ao
prprio aluno com necessidades especiais adquirir e buscar o conhecimento,
aprender a aprender, participar em sala de aula e no apenas ser um mero receptor
de informaes transmitidas pelo professor (Valente, 1991, 1993, 1996, 1999, 2001).
Mudanas na prtica docente, portanto, so importantes e necessrias. E tais
mudanas esto sendo auxiliadas pela Informtica, por intermdio do
desenvolvimento e da adequao de softwares para a aprendizagem de alunos com
deficincia, bem como equipamentos para a interao dessas pessoas com o
computador. Desenvolve-se assim a coordenao motora, integrando-se essa
ferramenta ao processo de aprendizagem, oferecendo aos alunos a alternativa de
adquirir conhecimento e sobrepujar suas deficincias motoras e intelectuais.
As crianas com deficincia mental, em particular as consideradas mais
comprometidas, no caso, as autistas, ainda so vistas como incapazes de obter
7
aprendizagens formais. Por isto, sua ateno, em muitos casos, est restrita ao
tratamento de suas dificuldades. Por consider-las deficientes, sem inteligncia
para aprender, so submetidas a um processo de ensino baseado em mtodos
repetitivos, cujo objetivo a automatizao de alguns desempenhos que possam
torn-los um pouco mais independentes na realizao de suas habilidades bsicas,
como comer, vestir-se, pentear-se. Como define a Associao Americana para
Deficincia Mental, o retardo mental faz referncia a limitaes substanciais no
desenvolvimento do indivduo. Caracteriza-se por um funcionamento intelectual
inferior mdia, que se manifesta em duas ou mais reas de habilidades cognitivas:
comunicao, cuidado pessoal, vida diria, adaptao social e autonomia, sade e
segurana, habilidades funcionais, lazer e trabalho.
Observa-se, nessa definio, que a pessoa valorizada, considerada
importante em seu processo e que a deficincia um aspecto que faz parte de sua
da vida. Do ponto de vista educativo e considerando-se suas caractersticas, o aluno/
a pessoa com autismo apresenta um ritmo muito lento na aprendizagem, assim
sendo faz-se necessria uma proposta pedaggica adequada s suas condies.
Para essas pessoas, a literatura referente ao tema, ao considerar a lentido com
que aprendem e as dificuldades de abstrao que apresentam, orienta um ensino a
partir de atividades concretas, diversificadas e funcionais, para despertar o interesse
e a motivao para aprender. importante tambm considerar o carter dispersivo
que elas demonstram, para que possam selecionar atividades de curta durao,
variando o tempo gradualmente, de acordo com suas possibilidades, maximizando
seus pontos fortes e minimizando os pontos de dificuldades, buscando progresso da
aprendizagem, independentemente do nvel de desenvolvimento cognitivo que
apresentam.
Isto posto, as aes propostas apontam para a busca de mudanas na qualidade
do ensino, apoiadas pela integrao do computador s atividades educacionais, com
o desenvolvimento de ambientes de aprendizagem para pessoas com autismo.
Acreditamos que o computador pode ajudar os autistas a se destacarem, pois
apresentam enorme afinidade para atividades concretas. a que se insere o
computador, ferramenta que se mostra extremamente amigvel aos olhos dos
autistas, pelo fato de apresentar uma lgica rgida. A resoluo de um problema em
determinado programa de computador aparece quase sempre igual, como uma
equao matemtica. Alguns autistas chegam, inclusive, a se definir como
8
computadores que simulam o ser humano, decodificando o mundo exterior como a
mquina faria, o que facilita o processo, porque se trata de um instrumento adaptvel
forma como essas pessoas vem e compreendem o mundo.
Por contarem com um pensamento estritamente visual e uma tima memria, os
autistas podem fazer do computador um meio de expresso e at mesmo de
sustento; tambm podem utilizar a Internet para travar relaes com o que lhes
mais apavorante: o mundo exterior. O trabalho no computador se caracteriza por ser
essencialmente solitrio, da a afinidade do autista. Alm disso, pela dificuldade em
manter contato interpessoal, muitos autistas estabelecem relaes sociais via correio
eletrnico.
Isto pode ser verificado por meio das palavras de Temple Grandin (Phd do
Department of Animal Science, Colorado State University), que autista com uma
carreira internacional bem sucedida. Seu trabalho projetar equipamento para
animais (especialmente gado) de fazendas. Ela descreve sua memria em forma de
imagens e diz poder visualiz-las como se estivesse em uma pgina da Web. O
pensamento dessas pessoas puramente visual, tal qual uma tela do windows ou
uma pgina da Internet. Qualquer informao muito grfica, ou seja, que tenha
muitas imagens, rapidamente guardada por eles (SEGATTO, 2002).
A motivao para iniciar esta investigao, entre outras preocupaes, foi a de
saber como se d o processo de interao do autista no uso do computador,
considerando os aspectos afetivos, emocionais e cognitivos.
Acreditamos que nunca haver cansao de saber, por isso somos o que somos,
seres humanos. No entanto, tempo vir em que a investigao diligente, cobrindo
longos perodos, esclarecer questes que hoje no esto codificadas; tempo vir em
que os nossos descendentes se surpreendero por no sabermos coisas que sero
to bvias para eles. O universo seria uma coisa insignificante se no houvesse
sempre algo a ser investigado por todas as geraes que surgem. A natureza no
revela os seus mistrios de uma s vez; h sempre um mais alm escondido nos
bastidores do mundo. (PENNINGTON, 1997, p.65). Essa a promessa da natureza:
ser sempre mais complexa do que a imaginao e ao mesmo tempo, to simples que
a todos surpreende.
9
1.2 Justificativa
Segundo Paulo Renato de Souza, A educao principal alicerce da vida social. Ela transmite e amplia a cultura, estende a cidadania, constri saberes para o trabalho. Mais do que isso, ela capaz de ampliar as margens da liberdade humana, medida que a relao pedaggica adote, como compromisso e horizonte tico-poltico, a solidariedade e a emancipao. No desempenho dessa funo social transformadora, que visa construo de um mundo melhor para todos, a educao escolar tem uma tarefa clara em relao diversidade humana: Trabalh-la como fator de crescimento de todos no processo educativo. Se nosso sonho e o nosso empenho so por sociedade mais justa e livre, precisamos trabalhar desde a escola o convvio e valorizao das diferenas, bases para uma verdadeira cultura da paz (SOUZA, 2001, p.7).
As palavras de Souza (2001) nos levam a refletir sobre a problemtica da
sndrome do autismo, sendo que poucas patologias mobilizam mais o ser humano do
que o autismo. Neste temos uma criana normalmente bonita, sem sinais de uma
leso, que mostra uma falta de receptividade e de interesse pelas pessoas,
incapacidade na comunicao interacional e nas atividades imaginativa e um
repertrio de atividades e interesses restritos.
Os autistas apresentam dificuldades que limitam sua capacidade de interagir com
o mundo exterior, impedindo que desenvolvam certas habilidades que formam o
processo de aprendizagem. A pertinncia da nossa temtica considera a igualdade
de oportunidades e as perspectivas de educao que levam em conta o
desenvolvimento integral da pessoa, aceitando e valorizando o direito diferena,
crescente a presena dos computadores nos diversos setores da sociedade,
facilitando a vida de todos, principalmente dos portadores de deficincias. Na
educao especial, eles tambm passaram a ser vistos e utilizados como excelentes
ferramentas, auxiliando na incluso social e na reabilitao de pessoas com
deficincia. Entretanto, pouco se fala de Informtica na educao dos autistas,
indivduos com dificuldades de se relacionarem e de se comunicarem, muitas vezes
analfabetos, porm com uma excelente memria e capazes de compreender
procedimentos lgicos.
10
Nas falas do cotidiano, identificamos a presena marcante de um discurso
preconceituoso que, ao pensar a deficincia como sinnimo de insuficincia, traa um
esteretipo de quem o deficiente. Dessa forma, a descrena e o descrdito tm
provocado inquietaes que nos levam a pensar sobre o porqu de centrarmos nossa
ateno na incapacidade e destacarmos apenas a deficincia. O discurso que centra-
se no quadro patolgico e na a-historicidade do sujeito, faz prevalecer o indivduo em
si como portador de uma deficincia e que se realiza como indivduo por ser portador
de. Assim, ao ser um indivduo em si, na condio de deficiente, seu entorno
parece no existir, a no ser para e atravs do estigma reafirmar essa condio.
Diante da inquietao gerada por esses e outros discursos, esta pesquisa surgiu
do desejo de dialogar com a pessoa autista, buscando enfocar a questo da
eficincia e da capacidade a partir do seu olhar com o histrico de deficincia sobre
sua prpria vida, sobre a construo de sua prpria histria.
Nas ltimas dcadas do sculo XX, observamos uma preocupao crescente,
sobretudo no meio psicolgico, psiquitrico e psicanaltico, com a Psicologia infantil
de forma geral e em particular, com a psicose da criana. So conhecidos e fecundos
os estudos desenvolvidos simultaneamente em vrios pases.
O autismo tem sido objeto de hipteses formuladas por psicanalistas, educadores,
bilogos, geneticistas e cognitivistas. Permanece, no entanto, como um mistrio
quanto a sua origem e sua evoluo. difcil determinar se a oposio ao mundo que
as crianas autistas manifestam ativa e voluntria, sendo lhes imposta por
deficincias biogenticas cujas origens ignoramos, ou se o inato e o adquirido se
articulam entre si para criar desordem no universo interno dessas crianas. em face
dessa impenetrabilidade que oscila nossa interrogao, entre um ele no quer e um
ele no pode. Uma e outra hiptese sucedem-se e revelam-se igualmente
inquietantes. Nesse contexto, bastante comum que o desejo e a vontade de saber
vacilem.
Esperana e decepo so partes permanentes de um trabalho cujos resultados
se mede ao microscpio, em que a noo de tempo se congela em um universo
esttico e fechado e em que, dia aps dia, o mesmo cerimonial se repete com seus
rituais e suas estereotipias. O melhor aparece quando esperamos o pior, e o
progresso pode ser seguido de regresses desanimadoras.
Assim, a educao de pessoas autistas, em razo das dificuldades e das
limitaes que abrangem desde aspectos relativos at recursos materiais e humanos,
11
passando por questes de poltica pblica, tem sido freqente alvo de pesquisas e de
reflexes. Entretanto, o cotidiano escolar revela, ainda hoje, uma grande discrepncia
entre o que proposto em lei, o desenvolvimento do conhecimento produzido nas
universidades e a realidade das escolas brasileiras no que se refere educao de
pessoas autistas.
No limiar deste novo sculo, estamos imersos no contexto global da informao.
Podemos dizer que as tecnologias fazem parte de nosso dia-a-dia, embora com
ritmos diferenciados para cada pessoa.
A reflexo que precisamos fazer sobre como o autista pode se apropriar dessas
inovaes e seu benefcio em relao cognio.
A partir do Mestrado, passamos a refletir sobre o uso do computador no cotidiano
escolar de pessoas portadoras de deficincia mental, e como pode redimensionar a
prtica pedaggica, e tambm sobre como possvel criar um ambiente de
aprendizagem baseado nessa ferramenta, para propiciar criana a oportunidade de
desenvolver atividades interessantes, desafiadoras e que viabilizem propsitos
educacionais.
A escolha do universo da pesquisa pessoa autista e Informtica justifica-se
pelos grandes comprometimentos que a pessoa autista apresenta na aprendizagem e
pelo fato de no manter um contato mais prximo afetivamente e s vezes, no
manter nenhum tipo de comunicao com o mundo exterior. Assim sendo, o processo
de estigmatizao social cria situaes que reforam o esteretipo da deficincia.
Neste sentido, buscamos unir nossa prtica pedaggica tecnologia, a fim de
enfrentar o desafio de percorrer o caminho, criando um ambiente de aprendizagem
que abrisse possibilidade para a pessoa autista atingir uma melhor qualidade de vida,
atendendo diversidade, procurando romper com os destinos previamente
determinados, procurando dar igualdade de oportunidades, ou seja, oferecer a cada
um aquilo de que necessita para construir seu projeto de vida. necessrio que no
se aceitem modelos assentados em uma concorrncia feroz e que se comprometa a
dar cotidianamente a todas as pessoas uma experincia de vida solidria.
Trata-se, portanto, de um tema desafiador que busca essencialmente vivenciar e
fomentar um processo de aprendizagem no qual a tecnologia e o autista, como
poesias em versos, sejam elementos estruturantes de um outro modo de
aprendizagem, mais aberto, flexvel e condizente com as inovaes cientficas e
tecnolgicas.
12
Experincias em vrios pases, inclusive no Brasil, tm demonstrado benefcios
oriundos da introduo da Informtica na educao especial e com pessoas autistas.
O programa de softwares que possibilita a manipulao de objetos cria uma nova
metodologia na educao, que favorece o desenvolvimento da criatividade e da
iniciativa do aluno. Dentro da relao criana/computador possvel estabelecer uma
metodologia que favorea o desenvolvimento cognitivo por meio da resoluo de
problemas.
Existem diversas metodologias de ensino que so usadas na educao especial,
e so vrias as maneiras de se usar o computador nessa situao de aprendizagem
educacional.
Seymour Papert (1986) prope o ambiente LOGO2, que uma linguagem de
computador que permite o desenvolvimento de ensino-aprendizagem e que segue a
abordagem construcionista, em que o computador tem uma funo especfica no
processo de construo do pensamento. A sua principal caracterstica est no fato de
ser uma linguagem de fcil assimilao, que permite a explorao de atividades
espaciais, tem uma fcil terminologia e possibilita a criao de novos termos ou
procedimentos.
O objetivo do LOGO est na filosofia de seu uso, que a facilitao e a
assimilao de conceitos que envolvem as atividades, sendo formado por uma parte
de textos e outra grfica. A parte grfica composta por um conjunto de comandos.
Os conceitos espaciais so utilizados em atividades para comandar uma Tartaruga
que se move no cho (tartaruga solo) ou na tela do computador, em atividades
grficas. Isto se deve ao fato dessas atividades envolverem conceitos espaciais que
so adquiridos nos primrdios da infncia, quando se comea a engatinhar.
Entretanto, estes conceitos permanecem em nvel intuitivo. No processo de
comandar a Tartaruga para ir de um lado para o outro, esses conceitos devem ser
explicitados.
Sabe-se que atualmente h inmeros softwares, especialmente alguns
especficos para autistas, como: Labeling Tutor, Baldi, Saca e o Hrcules e Feij
(produzido pelo Ministrio de Educao e Cultura MEC para a Educao
Especial), A Festa do Ursinho de Pijama, Alfabeto, Boardmaker, Brincando no Sto LOGO o nome de uma filosofia de educao que possvel graas a uma famlia sempre crescente de linguagens de computao que acompanha essa filosofia. uma linguagem interpretativa, o que significa que pode ser usada de forma interativa (Papert, 1986, p.21).
13
da Vov, Casa da Matemtica da Millie, Cebolinha e Floquinho, Jardim da Infncia, O
Menino que aprendeu a ler, Betsy, dentre outros.
Esses programas tm em comum a apresentao das interfaces que utilizando os
recursos tecnolgicos, exploram o visual com atividades interativas, recursos de som,
uso de imagens e animao adequadas aprendizagem da pessoa autista.
1.3 Relevncia do Estudo
No Brasil, 10 % da populao possui algum tipo de deficincia fsica, auditiva,
visual, mental ou mltipla (BRASIL, 1999), o que corresponde a cerca de 18 milhes
de pessoas. Destas, o autismo atinge aproximadamente, 20 de cada 10.000 crianas
que nascem vivas, sendo que ocorre quatro vezes mais em meninos que em
meninas.Ou seja: existem no Brasil mais de 10 mil crianas menores de cinco anos
atingidas pela sndrome. Segundo a Associao dos Amigos Autistas (AMA), s no
municpio de So Paulo nascem mais de 200 crianas autistas a cada ano. No Cear,
por exemplo, segundo a AMA, estima-se a existncia de 6 a 19 mil autistas.
Fora do Brasil, a situao similar e h ainda estatsticas que apontam para um
aumento da incidncia do autismo nos ltimos anos. Segundo Nash, de forma
aparentemente repentina, casos de autismo e desordens relacionadas, como a
sndrome de Asperger3, esto crescendo significativamente na Amrica do Norte e
nenhum estudo conseguiu respostas satisfatrias para sua explicao. Na Califrnia,
por exemplo, o nmero de crianas autistas que buscam servios sociais, mais do
que quadruplicou nos ltimos 15 anos, passando de menos de 4.000 em 1987, para
quase 18 mil em 2002. O problema cinco vezes mais comum que a sndrome de
Down e trs vezes mais comum que a diabete juvenil (NASH, 2002).
Pelo quadro supracitado, podemos destacar que a relevncia deste estudo
expressa pela pluralidade do campo semntico de desafios propostos ao processo de
ensino-aprendizagem das pessoas com histrias de deficincias, no caso, os
autistas. Busca-se sua interao e integrao ao meio exterior, bem como a
Tipo de Autismo mais sutil em que a pessoa afetada apresenta perfil inteligente e empreendedor, falta de empatia e determinao na busca de interesses pessoais (MARVEL, 2003).
14
promoo de um processo de enfrentamento e de aceitao da necessidade especial
apresentada por essas pessoas, sem o risco de serem encaradas como um meio de
superao e normalizao do quadro apresentado pelos educandos.
O desenvolvimento de novas tecnologias, as exigncias de qualidade no
atendimento dessas pessoas so fatores que levam reflexo sobre a necessidade
de repensar a prtica educacional e assim propor um ambiente favorvel para a
aprendizagem do autista, promovendo a Incluso social desse sujeito por meio do
computador.
Portanto, a importncia terica deste estudo, considerando a complexidade do
assunto, a falta de mais pesquisas e de bibliografia especficas na rea, tambm se
reflete na exigncia de qualidade no ensino da Educao Especial, que deve buscar
melhoria no processo ensino-aprendizagem. Deste trabalho dever resultar material
de apoio aos professores, pais e demais profissionais que trabalham com pessoas
autistas, alm de provocar reflexes que requerem uma ntima conexo entre a
pesquisa e a prtica para que se atinja o sucesso educativo.
1.4 Apresentao do Problema
Pessoas com histria de deficincia apresentam caractersticas significativamente
distintas das demais, uma vez que necessitam de uma mediao considervel para
perceberem as informaes que recebem, na manuteno da ateno, na
memorizao, na conceitualizao e no desenvolvimento do raciocnio lgico e da
linguagem.
Alguma dessas necessidades tornam a aprendizagem dessas pessoas uma
grande problemtica para a maioria daqueles que no conseguem ignorar os mitos
da incapacidade e tentam desenvolver a habilidade de olhar o outro, especial, como
um ser distinto, que possui pensamentos, estruturas cognitivas e emoes
diferenciadas.
Assim, o problema de pesquisa consubstanciou-se nas seguintes interrogaes:
Como o computador pode auxiliar a pessoa autista a descobrir um mundo
diferente, rompendo com o esteretipo da deficincia, e podendo constitu-
15
la em sujeito que resiste ao processo de estigmatizao social em sua vida
cotidiana?
Como se d a interao e a cognio do autista por meio do computador?
Com base nessas interrogaes, cotejadas com os dados coletados da histria
cotidiana das pessoas autistas em ambiente informatizado, procuramos compreender
os movimentos de resistncia como expresses de um coletivo e como
enfrentamento, por ter dado sua vida rumos diferentes daqueles comuns s
histrias de deficincia, ou seja, os de passividade e de resignao.
Baseamo-nos para tanto numa concepo de deficincia que entende que, para
alm das caractersticas individuais, o sucesso desses sujeitos determinado pelas
condies concretas de vida, pelas relaes estabelecidas por eles e com eles. Uma
concepo de deficincia como construo histrica e social pautada nos estudos de
Vigotsky (1997). Em consonncia com os estudos desse autor, pode-se afirmar que
as conseqncias sociais de uma deficincia podem alimentar, acentuar e consolidar
a limitao, de maneira que o que decide o destino da pessoa, em ltima instncia,
no est no defeito em si, sim nas suas conseqncias sociais, sua realizao
sociopsicolgica (VIGOTSKY, 1997, p.44).
Segundo Lunardi:
Esta forma de compreender a pessoa com histria de deficincia fundamental para pensar o quanto dinmico o seu processo de desenvolvimento. Percebe-se que no cotidiano das relaes sociais que vo estabelecer intersubjetividade em interaes, capaz de aniquilar o sujeito ou de contribuir com a superao do defeito. Portanto, intersubjetividades que reafirmam a sua prpria condio, mas que tambm o colocam como sujeito do devir (2000, p.20).
No caso do processo de estigmatizao social, o sujeito tem o seu
desenvolvimento regulado pelos esteretipos sociais construdos a respeito de sua
deficincia. Isso gera no indivduo uma desorganizao que o faz agir conforme a
audincia social. As estratgias defensivas podem surgir como uma forma de lidar
com esse circuito perverso e possibilitar outras aes para esses indivduos. Isso s
acontece, porm, quando essas estratgias defensivas individuais e coletivas
16
transformam-se em resistncia ou em compensao do defeito4, conforme Vigotsky
(1997) caracterizaria. Ou seja, o sujeito no incorpora o esteretipo da deficincia
porque, de certa forma, luta para resistir a ele.
No se trata de negar a deficincia ou de consider-la em si. Fsica ou orgnica,
ela existe e no agradvel conviver com ela. Buscamos perceber nas diferentes
histrias dos sujeitos autistas, a construo social da resistncia como um elemento
de relao com o mundo e com os demais indivduos.
Nesse contexto, importante destacar que os processos constitutivos do sujeito
so entendidos aqui como tendo dimenses indicotomizveis: coletivo e individual,
interno e externo, objetivo e subjetivo. Os sujeitos so compreendidos como produtos
histricos, sociais e tambm produtores do social/histrico.
O desenvolvimento desta pesquisa concernente com as novas tendncias
educacionais, que encaram o professor como mediador do desenvolvimento do
sujeito cognitivo no seu sentido pleno. Tem como objeto de estudo a pessoa autista e
as implicaes metodolgicas de uma abordagem que toma como foco a sua
interao com o computador. indispensvel, portanto, que o mediador do processo
de aprendizagem desenvolva, alm de seu conhecimento terico, cognitivo, a
competncia profissional. Quanto s emoes envolvidas nessa interao, elas
precisam ser valorizadas, pois permeiam todo o processo ensino-aprendizagem e
so de primordial importncia para o alcance de bons resultados.
As pessoas com autismo apresentam problemas no desenvolvimento das
habilidades sociais, ou seja, na interao social, no desenvolvimento da linguagem,
mais precisamente a comunicao, e no repertrio comportamental. Na rea da
comunicao um sintoma precoce o entendimento sobre compartilhar experincias
com outras pessoas.
A pessoa com autismo apresenta dificuldade em iniciar um dilogo, pois na
linguagem e na comunicao que se concentra o maior obstculo para elas. Poucos
autistas desenvolvem habilidades para a conversao, muitos desenvolvem
habilidades verbais e grande parte desenvolve somente habilidades no verbais de
comunicao. O dilogo, que pressupe o compartilhamento de emoes, quase
4A expresso defeito empregada, aqui, como sinnimo de deficincia, conforme utilizado por Vigotsky (1997).
17
impossvel, em face da dificuldade de interpretar expresses emocionais e tambm
expor as prprias emoes.
Isto posto, acreditamos que o computador permite melhorar a qualidade de vida
da pessoa autista, oferecendo-lhe um ambiente adequado ao desenvolvimento das
suas potencialidades. Nesses ambientes possvel criar situaes que contribuem
para o desenvolvimento intelectual, social e afetivo do sujeito autista, buscando
estratgias que contribuam de fato para a reabilitao e a incluso social dessa
parcela significativa na sociedade com dignidade. Dessa forma, a Informtica
aplicada educao especial inserida no processo como um instrumento de
mediao5, no processo sociocognitivo de desenvolvimento dos sujeitos
participantes.
1.5 Delimitao do Estudo
Este trabalho est baseado num estudo de caso em trs instituies, sendo duas
de ensino especial e outra de ensino regular, que atendem crianas com autismo. Os
trabalhos e as observaes foram feitos com 05 (cinco) crianas dessas trs escolas.
Foram usados os mesmos programas, com as mesmas atividades, com o principal
objetivo de observar como se d a interao dessas crianas por meio do uso do
computador, considerando o grau das limitaes de cada uma. Conseqentemente,
foram direcionadas aes prticas no laboratrio e na sala de aula, de modo que as
atividades propostas pudessem desencadear o desenvolvimento de suas
potencialidades no campo cognitivo, afetivo e social.
O estudo envolveu professores, equipe tcnica pedaggica, pais, alunos e outros
profissionais da sociedade, como: musicoterapeuta, psiquiatra e psicloga que
trabalham com crianas autistas.
5 Aqui utilizamos o sentido vygotskyano do termo, que considera a mediao uma caracterstica da cognio humana e que se refere internalizao de atividades e comportamentos scio-histricos e culturais. A mediao inclui o uso de ferramentas e de signos dentro de contexto social. A combinao do uso desses instrumentos, chamados de mediao ou mediadores, possibilita o desenvolvimento dos Processos Psicolgicos Superiores num processo que passa do social (inter) para o individual (intra) atravs da internalizao (Vygotsky, 1998).
18
A observao em campo se realizou no perodo fevereiro a novembro do ano de
2004.No incio, o encontro acontecia uma vez na semana e no segundo semestre,
duas vezes na semana,perfazendo um total de 70 (setenta)sesses, sendo que os
registros das observaes foi feito durante as aulas assistidas e no laboratrio de
informtica, posteriormente organizado em forma de relato no protocolo.
1.6 Objetivos
1.6.1 Objetivo Geral
Para o desenvolvimento deste trabalho definiu-se como objetivo geral desenvolver
um trabalho pedaggico que visasse a uma interao em meio informtico, auxiliando
o desenvolvimento do autista, estimulando sua interao com o meio fsico e social e
suas relaes interpessoais, aumentando assim sua tolerncia s mudanas e s
frustraes, privilegiando as situaes de interaes e de desenvolvimento cognitivo,
afetivo e social e o processo de comunicao entre autista-mundo exterior a partir do
mundo digital virtual.
1.6.2 Objetivos Especficos
Para alcanar o objetivo geral foi estabelecido um conjunto de sub-objetivos
especficos:
Identificar como ocorre o processo de interao da criana autista e o
computador;
Propiciar, atravs de ambientes informatizados construtivistas adequados,
novas oportunidades de interao da criana autista;
19
Favorecer a apropriao das ferramentas informticas pelo indivduo
atravs de estratgias pedaggicas, envolvendo as reas cognitivas do
desenvolvimento socioafetivo;
Propiciar a vivncia em ambientes de aprendizagens digitais que
oportunizam a descoberta das suas potencialidades individuais e que
favoream a interao social com vistas construo do conhecimento,
atravs da reflexo sobre suas prprias aes e da participao do outro
como agente mediador;
Analisar se existem benefcios para os alunos com autismo com o uso do
computador nas suas atividades escolares;
Avaliar qualitativamente o desenvolvimento da criana autista em relao
ao processo de comunicao mundo interior- mundo exterior- tecnologia;
Analisar o uso da imagem e o impacto que ela provoca como elo de ligao
entre usurio-computador;
Verificar se ocorrem mudanas no processo comportamental da criana
autista, com caractersticas de hiperatividade e ausncia da fala,
introduzindo-a num ambiente tecnolgico;
Analisar os dados coletados luz da epistemologia gentica, no que se
refere construo do conhecimento, e da teoria sociointeracionista quanto
zona do desenvolvimento proximal, nas observaes realizadas na
pesquisa;
Analisar a interao da criana no ambiente computadorizado utilizando o
software MicroMundo6 e outros softwares educativos que possam atender
s necessidades das crianas com autismo.
1.7 Hipteses
6 Termo cunhado pelo educador e pesquisador Seymour Papert no final da dcada de 1970, para definir um ambiente de aprendizagem em computador para crianas. Gradualmente passou a significar qualquer simulao, geralmente em computador. Portanto, MicroMundos so considerados espaos virtuais, fora do cotidiano, destinados aprendizagem (Sinzato,1998).
20
Para a formulao das hipteses foram considerados os aspectos da
complexidade do tema e tambm das relaes que se estabelecem na Instituio
como Sistema Complexo, quando se est atendendo a alunos afetados por
deficincia, no caso, as crianas autistas. Associados a isso se encontram os
pressupostos filosficos das leis em vigor, tais como o envolvimento das famlias, das
equipes tcnico-pedaggicas e a utilizao de recursos e aparatos tcnicos.
Entendendo como as crianas autistas se comunicam e como o mundo pode se
comunicar com ela, possvel construir propostas de trabalhos mais prximas das
necessidades dessas crianas.
Este trabalho poder contribuir cientificamente com todos os profissionais que
lidam com crianas autistas, permitindo-lhes uma melhor compreenso sobre essa
sndrome e todos os aspectos do desenvolvimento envolvidos, possibilitando uma
deteco e interveno precoce. O estudo desses aspectos constitui-se em fator
determinante para a elaborao das hipteses para a pesquisa.
Uma proposta metodolgica com nfase no trabalho para desenvolver a
capacidade de expresso, de criao e de aprendizagem de pessoas autistas,
atravs do uso de um software pedaggico, promove significativamente o
desenvolvimento integrado, tornando possvel a interao entre contexto virtual e
contexto real.
Todas as travessias tm como objetivo possibilitar a sada. E exatamente sobre
isto que esta pesquisa se debruou: no esforo tipicamente humano de constituir-nos
em sujeitos capazes de superar, adaptar, modificar e sermos modificados pelas
adversidades presentes em nosso entorno, buscando estratgias que possibilitam
nossa emancipao, a transposio dos sonhos para o mundo digital. Sem frmulas
prontas, sem verdades estabelecidas a defender, mas com um ponto de encontro,
um espao de aprendizagem compartilhada desafiando-nos a transformar
experincias vivenciadas na busca de interao, comunicao e aprendizagem da
pessoa autista.
O estudo dos aspectos supracitados constitui-se em fator determinante para a
elaborao das hipteses para a pesquisa:
O computador permite a criao de ambientes de aprendizagens adequados
ao desenvolvimento das potencialidades das crianas autistas. Nesses
ambientes possvel criar condies que favoream a interao e o
21
desenvolvimento cognitivo, social e afetivo dessas pessoas, facilitando sua
integrao na sociedade;
O computador favorece a participao ativa da pessoa e, portanto, uma
aprendizagem com maior autonomia;
O computador favorece a interao do autista com o outro, ou seja, com o
mundo exterior, por meio de e-mails, chats e Internet.
1.8 Limitaes
Considerando a natureza deste estudo, alguns fatores limitantes devem ser
mencionados. Dentre esses fatores, est o fato de a pesquisadora ter que buscar
uma das crianas em sua residncia. Expliquemos melhor: a criana freqenta a
APAE uma vez por semana e sua residncia no fica em local acessvel s linhas de
transporte urbano de Dourados/MS. Assim, a criana faltava muito, pois a famlia no
possui condies financeiras de pagar uma conduo at a APAE.
O olhar da pesquisadora, muitas vezes ofuscado pela paixo destinada a este
trabalho, traduzida em momentos de euforia, sonho e entusiasmo exagerados, pode
em alguns momentos ter se desviado do foco da objetividade, dificultando a anlise e
descrio dos dados, mas o compromisso e tica profissional no permitiram que o
sentimento estivesse acima dos princpios ticos.
Barreiras subjetivas foram encontradas em alguns momentos, fazendo com que
esta pesquisadora se deparasse com algumas dificuldades para o desenvolvimento
do trabalho, tornando muito difcil sua concluso em uma das instituies de ensino
pesquisadas. Porm, a determinao e a objetividade na elaborao de hipteses
factveis superaram essas barreiras. Conseguimos romper a concha com serenidade
e pacincia, envolvendo-nos aos acontecimentos no dia a dia: Lembremos aqui uma
frase de Jean Piaget: Os fenmenos humanos so biolgicos em suas razes,
sociais em seus fins e mentais em seus meios. Dessa forma a pesquisadora,
percebendo a complexidade humana, deu nfase s percepes gerando
sentimentos e emoes, quebrando as barreiras existentes.
22
O fato de a pesquisa ter sido feita em trs ambientes diferentes em todos os
aspectos, sendo que uma ficava em outro municpio (Itapor), a 15 quilmetros de
Dourados/MS, tornou mais difcil o desenvolvimento do trabalho, o que, no entanto,
no impediu que ele fosse realizado dentro do prazo previsto.
Porm, o que mais dificultou a pesquisa que nenhuma das instituies de ensino
pesquisada estava organizada para atender a crianas autistas, isto , nenhuma
delas possua uma proposta adequada para tanto. Da necessidade de a
pesquisadora proceder a algumas modificaes em sua pesquisa e desenvolver uma
proposta metodolgica adaptada ao mtodo TEACCH7 Treatment and Educacion of
Autistic and Comunication Handicaped Children , um projeto experimental de cinco
anos, visando educar, com a ajuda dos pais, as crianas autistas e orientar as
professoras no trabalho pedaggico em sala de aula. A aplicao de nossa proposta
contou com a disposio de todas as professoras em fazer o melhor para essas
crianas, colaborando para a concretizao deste estudo.
1.9 Plano Metodolgico
Toda viagem pode ter vrios destinos e deve ser planejada para que no nos
percamos nos caminhos e possamos chegar ao nosso destino. Todo estudo cientfico
pressupe uma metodologia para sua realizao, o que, segundo Minayo (2000,
p.16), inclui as concepes tericas de abordagem, o conjunto de tcnicas que
possibilitam a construo da realidade e o sopro divino do potencial criativo do
investigador.
A investigao desenvolveu-se com base no Mtodo Qualitativo, Estudo de Caso
do tipo Pesquisa-Ao, num exerccio dinmico de construo terico conceitual e
prtico, com nfase no uso do ambiente informatizado como apoio aprendizagem, o
que nos permitiu assumir nossa subjetividade e organizar dados da realidade, sem
perder de vista a objetividade da pesquisa cientfica.
7 Eric Schopler professor de psicologia na Universidade da Carolina do Norte, em Chapel Hill, com o professor Gary Mesibov, da unidade A&R, que coordena os centros regionais TEACCH (Amy, 2001, p.52).
23
Ao usar os recursos do estudo de caso, entramos em contato direto com as
crianas autistas, protagonistas da investigao, permitindo-nos um olhar crtico
sobre o objeto da pesquisa.
Partindo do princpio que o estudo de caso busca retratar o particular para ento
transp-lo para uma anlise entre o estabelecimento de relaes sociais amplas
relacionadas a um determinado objeto de estudo, que buscamos desenvolver esta
pesquisa. Para tanto fez-se necessrio compreender sua instncia singular, o que
significa que o objeto de estudo retratado como nico, uma representao singular
da realidade que multidimensional e historicamente situada (LDKLE; ANDR,
1986, p.21).
Ao optar por este tema, decidimos realizar uma pesquisa que trouxesse
elementos para elucidar e compreender questes relacionadas aprendizagem da
pessoa autista e sua interao com a tecnologia. Propomos analisar as
possibilidades que a tecnologia pode oferecer pessoa autista, ampliando
sobremaneira as possibilidades de um processo educativo que se paute por maior
flexibilidade, fluidez e interatividade do aprendente, constituindo-se num instrumento
de qualidade capaz de modificar percepes, diluir fronteiras e ressignificar valores
num contexto sempre atual.
Costa considera que aquilo que identificamos genericamente como uma
metodologia qualitativa a nica forma de ao que possibilita
[...] o arcabouo terico de uma cincia em educao, numa era de incertezas, pois, apenas no mbito dessa concepo de cincia possvel pesquisar, tendo conscincia da transitoriedade, das rupturas, do esfacelamento dos grandes sistemas de sustentao do presente e da perda do futuro (COSTA, 1994, p.20).
Assim sendo, procuramos articular a fundamentao terica desta pesquisa com a
prtica pedaggica, por meio da reviso bibliogrfica e posteriormente, com a
realizao de observaes e de investigaes sistemticas e empricas.
As entrevistas foram realizadas com os familiares das pessoas autistas, tendo
como propsito a obteno de informaes relevantes sob diversas pticas, alm de
entrevistas abertas com profissionais envolvidos no processo ensino-aprendizagem
dessas pessoas.
24
Para a pesquisa, a observao sistematizada foi realizada pelo procedimento de
registro de protocolo (Apndice P). Trata-se de registrar em protocolo cada fato
descritivamente, por observao direta, evitando o pr-julgamento.
Foi feita a proposta de trabalho do estudo e o esclarecimento quanto natureza
da pesquisa e seus objetivos, junto direo e aos profissionais das instituies de
ensino onde as crianas esto matriculadas, e principalmente, famlia das crianas
objetos do estudo, para obter o consentimento para a aplicao da pesquisa e a
disposio em colaborar com o trabalho.
A metodologia escolhida reflete a concepo terica e o conjunto de atividades e
aes que envolveram a pesquisadora e os pesquisados no dinmico exerccio das
vivncias educativas ocorridas nas salas de aula e no Laboratrio de Informtica
junto a cinco crianas autistas e na anlise e na avaliao quanto ao processo de
interao das crianas com o computador.
Para a realizao da pesquisa empregamos aparatos tecnolgicos tais como:
filmadora que se ocupou do registro documental oral e visual das atividades
desenvolvidas; gravadores para que no se perdesse nada da fala dos atores;
computadores que atuaram como o coletivo de no humanos, mediador do fazer
coletivo de humanos que, na produo de aplicativos pedaggicos, interagia numa
dimenso flexvel e aberta polifonia de sentidos.
As etapas da pesquisa tramaram-se de modo intenso e harmnico, enlaando
pesquisa bibliogrfica na qual se ancora o lastro terico-conceitual com as atividades
desenvolvidas com as pessoas com Autismo, objetivando atingir a confirmao de
nossa hiptese e consecuo de nossos objetivos explicitados no decorrer desta
seo.
1.10 A Estrutura da Tese
O presente trabalho caracteriza-se como um estudo qualitativo em situao de
estudo de caso e est sistematizado de forma que a reviso da literatura permita ao
leitor manter contato com a extenso do problema e o contexto em que a pesquisa
25
est inserida. A reviso da literatura est distribuda em trs captulos. Quanto
estrutura geral da pesquisa, encontra-se distribuda em sete captulos.
O Captulo I traz a apresentao do trabalho, a justificativa e a relevncia do
estudo; a apresentao do tema e o problema de pesquisa; os objetivos (geral e
especficos); os pressupostos bsicos; as limitaes encontradas e o plano
metodolgico.
O Captulo II trata da Educao Especial, com enfoque em definies, correntes
tericas, paradigmas, tendncias e barreiras incluso.
O Captulo III trata do autismo, apresentando um breve histrico, enfocando as
definies, diagnstico e prognsticos, das diferentes abordagens; formulaes de
algumas hipteses; discusso sobre o papel da famlia, da escola e da sociedade em
relao ao indivduo autista.
O Captulo IV versa sobre a Informtica na Educao, com uma breve reviso de
conceitos e teorias, discutindo o papel do professor diante das novas tecnologias, e
as abordagens do uso da Informtica na interao da criana autista.
O Captulo V trata dos Aspectos Metodolgicos, contextualizando as instituies
de ensino pesquisadas, apresentando a postura e a perspectiva de estudo, a
especificao da metodologia, seu delineamento, caracterizao da populao,
definio de instrumentos e de procedimentos de campo.
O Captulo VI destinado apresentao, anlise e interpretao dos dados
coletados.
O Captulo VII contm as Consideraes Finais, com recomendaes e sugestes
para futuros trabalhos.
Para entrar no mundo Autista preciso saber amar sem esperar troca. O amor verdadeiro a maior lio que eles podem nos dar.
(Fundao Vernica Bird-Rede Saci)
OO mmeeddoo ddooss oollhhooss ddooss oouuttrrooss sseennttiimmeennttoo uunniivveerrssaall.. TTooddooss ggoossttaarraammooss ddee oollhhooss mmaannssooss.. [[......]] AA ddiiffeerreennaa nnoo
rreessoollvviiddaa ddee ffoorrmmaa ttrriiuunnffaannttee,, ccoommoo nnaa hhiissttrriiaa ddoo PPaattiinnhhoo FFeeiioo.. OO qquuee mmuuddaa nnoo aa ddiiffeerreennaa.. SSoo ooss
oollhhooss.. RRuubbeemm AAllvveess..
27
2. EDUCAO ESPECIAL
CONTINUANDO A TRAVESSIA ENTRE AS PROLAS... E CONSTITUINDO-SE COMO SUJEITO NA E PELA TRAVESSIA
Todo mundo ama um dia, todo mundo chora. Um dia a gente chega e no outro vai embora. Cada um de ns compe a sua prpria histria, e cada ser em si carrega o dom de ser capaz e ser feliz. (Renato Teixeira e Almir Sater. Tocando em Frente)
2.1 A Educao Especial: Contextualizao
Dando incio a metfora das travessias deste trabalho, comeamos a percorrer as
trilhas em busca de um porto seguro. Ao longo deste captulo trataremos do
referencial terico que busca discutir e alimentar um determinado entendimento sobre
a Educao Especial, o processo de reabilitao, o uso da Informtica na Educao
Especial, a Declarao de Salamanca e suas implicaes educacionais, a Deficincia
Mental e as contribuies de Vigotsky, Feurstein e Piaget sobre as discusses sobre
os pontos ora em questo.
A atual Lei de Diretrizes e Bases para a Educao Nacional (LDB), Lei N 9.394,
de 20 de dezembro de 1996, trata, especificamente no captulo V, da Educao
Especial. Define-a como modalidade de educao escolar, oferecida
preferencialmente na rede regular do ensino, para pessoas portadoras de
necessidades educativas educacionais com necessidades educacionais especficas.
Conforme a Figura 1, ela perpassa transversalmente todos os nveis de ensino,
desde a educao infantil at o ensino superior, bem como as demais modalidades
de educao, de jovens e adultos e educao profissional.
28
Figura 1 Atendimento da Educao Especial nos nveis de ensino. Fonte: www.mec.gov.br/seesp/oquee.shtm
De acordo com o site do Ministrio de Educao e Cultura (MEC), na pgina
intitulada O que Educao Especial?, encontramos o seguinte: Esta modalidade
de educao considerada um conjunto de recursos educacionais e de estratgias
de apoio que estejam a disposio de todos os alunos, oferecendo diferentes
alternativas de atendimento.
Figura 2 Alternativas de Atendimento Educacional aos Portadores de Necessidades Educativas Especiais.
Fonte: MEC/UNESCO, 1995. www.mec.gov.br.
http://www.mec.gov.br/seesp/oquee.shtmhttp://www.mec.gov.br/
29
Segundo a LDB (1996), a Educao especial tem os mesmos objetivos que a
geral, sendo dever da famlia e do Estado, inspirada nos princpios de liberdade e nos
ideais de solidariedade humana. Tem por finalidade o pleno desenvolvimento do
educando, seu preparo para o exerccio da cidadania e sua qualificao para o
trabalho.
Ainda segundo a LDB (1996), entende-se por Educao especial, para os efeitos
da Lei, a modalidade de educao escolar oferecida preferencialmente na rede
regular de ensino, para educandos portadores de necessidades especiais.
A diferena bsica entre a educao geral e a especial dada em termos de local
de atendimento, tipo de material pedaggico, currculo trabalhado, profissional
envolvido e individualizao no atendimento.
A Educao Especial definida como modalidade de ensino que se caracteriza
por um conjunto de recursos e servios educacionais especiais, organizados para
apoiar, suplementar e, em alguns casos, substituir os servios educacionais comuns,
de modo que se garanta a educao formal dos educandos que apresentem
necessidades educacionais muito diferentes das da maioria das crianas e jovens.
preciso no se perder de vista a importante observao de que nem todo
portador de deficincia requer ou requerer servios de Educao Especial, ainda
que possa necessitar de tratamento de interveno teraputica (habilitao ou
reabilitao) em razo de suas condies fsicas ou mentais.
Uma questo levantada por muitos estudiosos: quem so as pessoas
deficientes? Uma pessoa deficiente no pertence a uma categoria ou classe de
profissionais. O termo serve para caracterizar pessoas que diferem das demais, em
virtude de suas disfunes fsicas, sensoriais, orgnicas ou mentais. So pessoas
que nasceram com ou adquiriram algum dficits intelectuais, fsicos ou orgnicos, o
que no as impede de serem respeitadas enquanto cidados com direitos e deveres.
O Centro de Informaes Multieducao define que Portadores de Necessidades
Educativas Especiais (PNEE) so portadores de deficincia fsica, mental, auditiva e
visual, portadores de altas habilidades, e os portadores de condutas tpicas de
sndrome.
Segundo Cruz, PNEE so aquelas pessoas com deficincia mental, visual,
auditiva, fsica, paralisia cerebral, autismo, distrbios de comportamentos severos,
distrbios de aprendizagem e deficincias mltiplas, ou seja, que englobam mais de
uma deficincia (2002, p.30).
30
Para a International Classification of Impairments, Disabilities and Handicaps
(AZEVEDO, 1995), uma pessoa com uma necessidade especial uma pessoa com
falta ou restrio de capacidades para executar atividades, tarefas, habilidades e
comportamentos, na forma ou mbito considerado normal para o ser humano.
Com base nas definies supracitadas, muitos podem questionar: mas qual ,
afinal, a diferena entre os termos deficincia e PNEE? Os estudos mais recentes
tm demonstrado que o termo PNEE, por ser mais amplo, alm de nomear a prpria
deficincia em si, tambm se preocupa com as metodologias e os recursos
educacionais para atender s necessidades especiais. Assim, pode-se classificar
meninos de rua como PNEE.
Atualmente as transformaes socioculturais esto atropelando as transformaes
educacionais nas escolas de ensino regular. Quando se trata de Educao Especial
ou do trato da educao de Pessoas Portadoras de Necessidades Educativas
Especiais (PPNEE), elas soam mais contundentes, pois se destinam a uma fatia
significativa da populao brasileira.
H uma estimativa de que 10% da populao ou em ento, uma em cada dez
pessoas portadora de necessidades especiais no Brasil. Em documento elaborado
por Sassaki (1998), so enumerados diversos dados de pesquisas reconhecidas
mundialmente. Os dados compilados fazem meno a essa estimativa, fato que levou
a Organizao Mundial de Sade (OMS) a adotar esta porcentagem. Algumas
citaes de Sassaki reafirmam a aceitao pela OMS: Calcula-se que havia no
mundo cerca de 500 milhes de pessoas deficientes, o que equivaleria a 10% de
toda a populao mundial (SASSAKI, 1998, p.14).
Sassaki ainda destaca:
A proclamao da Dcada das Naes Unidas para pessoas com deficincia uma clara indicao da preocupao da comunidade internacional para com o destino dos 500 milhes de pessoas deficientes no mundo. As estatsticas indicam que uma em cada 10 pessoas no mundo tem deficincia (1998, p.14).
O dado mais recente obtido refere-se ao Censo 2000 do IBGE. Em reportagem da
Folha de S. Paulo, mostra-se um nmero maior de portadores de deficincia do que o
esperado: 24,5 milhes de pessoas, ou seja, cerca de 14,5% da populao brasileira.
31
O jornal O Globo informa que foram includas na pesquisa todas as pessoas que
apresentam alguma dificuldade: de enxergar, de ouvir, de locomover-se ou que tem
alguma deficincia mental. O conceito utilizado no Censo 2000, de limitao de
atividades, seguiu recomendaes recentes da ONU, segundo Alicia Bercovich,
pesquisadora do IBGE (cf. tabela 1).
Tabela 1 Nmero por tipo de Deficincias Detectadas.
TIPO NMERO Visual 16.573.937 Motora 7.879.601 Auditiva 5.750.809 Mental 2.848.684 Fsica 1.422.224
Fonte: IBGE Censo 2000.
De acordo com a tabela 1, a porcentagem estimada por rea de deficincia fica
assim distribuda: Deficincia Visual 48,1%; Deficincia Motora 22.9%; Deficincia
Auditiva 16,7%; Deficincia Mental 8,3%; Deficincia Fsica 4,1% (cf. grfico 1).
.
Porcentagem por rea de deficincia
Visual48%
Fsica4%
Mental8%
Auditiva17%
Motora23%
VisualMotoraAuditivaMentalFsica
.
Figura 3 Porcentagem por rea de deficincia Fonte: IBGE Censo 2000.
Para atender a essa populao com dignidade, a Educao Especial procura
fundamentar-se em referenciais terico-metodolgicos compatveis com as
necessidades especficas de seus alunos.
32
O sistema vigente define uma metodologia de ensino intitulada Educao
Especial. A Educao Especial no uma modalidade educacional alijada e diferente
da Educao Geral, mas sim uma forma diversificada de organizao e de
funcionamento educacional, incorporando atitudes e providncias de acordo com sua
finalidade, que a de formar cidados conscientes e participativos. Esta modalidade
intervm desde a estimulao essencial at os graus superiores de ensino. Ela
apresenta como princpio filosfico que todo ser humano capaz de aprender. Visa
tambm promoo do desenvolvimento das potencialidades de PPNEE,
reconhecidas como aquelas pessoas portadoras de condutas tpicas, altas
habilidades e de deficincias em diversos modos e nveis.
Em tempos passados, as escolas especiais tinham cunho clnico, porm, hoje so
consideradas instituies educacionais com princpios educativos vigentes na
Educao Nacional, contando com um currculo dinmico e flexvel e uma
metodologia adequada e diversificada; a renovao do fazer pedaggico nas Escolas
Especiais visa uma atuao eficiente e pautada na realidade brasileira.
Os critrios de avaliao utilizados para identificar quem realmente necessita de
Educao Especial so extremamente rigorosos e responsveis e, sendo assim,
quando um indivduo apresenta dificuldade no desenvolvimento cognitivo, realizada
uma avaliao diagnstica (no caso do Deficiente Mental DM a avaliao a
psicoeducacional) para detectar suas potencialidades e suas necessidades
educativas especiais.
Mediante os resultados obtidos nessa avaliao, o aluno encaminhado a uma
das alternativas de atendimento educacional que melhor lhe convier. A programao
desenvolvida para esses alunos procurar atender s suas necessidades individuais,
efetuando um trabalho sistematizado das reas do desenvolvimento, quais sejam: a
cognitiva, a psicomotora e a afetivo-emocional.
Na Educao Especial so integradas as reas sociais, de sade e de trabalho.
Os contedos trabalhados so similares aos do ensino regular, e apenas so
adaptados s necessidades dos alunos.
Os profissionais que atuam na rea so especial