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UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA
CENTRO DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL
INDICADORES DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL, APLICADOS EM SISTEMA DE INFORMAÇÃO GEOGRÁFICA (SIG),
PARA O LITORAL NORTE DA BAHIA.
Cristina Guerreiro
Orientador: Dr. François-Michel Le Tourneau
Dissertação de Mestrado
Brasília–DF: 25 de Novembro/2004
UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA
CENTRO DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL
INDICADORES DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL, APLICADOS EM SISTEMA DE INFORMAÇÃO GEOGRÁFICA (SIG), PARA O
LITORAL NORTE DA BAHIA.
Cristina Guerreiro
Dissertação de Mestrado submetida ao Centro de Desenvolvimento Sustentável da Universidade de Brasília, como parte dos requisitos necessários para a obtenção do Grau de Mestre em Desenvolvimento Sustentável, área de concentração em Política e Gestão Ambiental, opção Profissionalizante.
Aprovada por:
François-Michel Le Tourneau, Dr. (CDS/UnB)
(Orientador)
Magda Eva Soares de Faria Wehrmann, Dr. (CDS/UnB)
(Examinador Interno)
José Maria Landim Dominguez, Dr. (Instituto de Geociências/UFBA)
(Examinador Externo)
Brasília-DF, 25 de Novembro de 2004
É concedida à Universidade de Brasília permissão para reproduzir cópias desta dissertação e emprestar ou vender tais cópias somente para propósitos acadêmicos e científicos. O autor reserva outros direitos de publicação e nenhuma parte desta dissertação de mestrado pode ser reproduzida sem a autorização por escrito do autor.
Cristina Guerreiro
GUERREIRO, CRISTINA
Indicadores de desenvolvimento sustentável, aplicados em Sistema de Informação Geográfica (SIG), para o Litoral Norte da Bahia. 134p., 228m, (UnB-CDS, Mestre, Política e Gestão Ambiental, 2004).
Dissertação de Mestrado - Universidade de Brasília. Centro de Desenvolvimento Sustentável.
1. Indicadores de Desenvolvimento Sustentável 2. Desenvolvimento Sustentável;
3. Litoral Norte da Bahia 4. Sistema de Informação Geográfica
I. UnB – CDS II. Título (série)
A minha amada filha Hanna, e aos que mais possam chegar... A Letícia, Priscila, Júlia, Bruno, Ane, Junior e Carolina....
que possam viver em uma sociedade mais sustentável. &
Ao Projeto Geobahia, que faça bom uso desse estudo contribuindo
para uma efetiva gestão ambiental no Estado da Bahia.
AGRADECIMENTOS1
A Deus que foi minha força motriz nesse grande desafio de conciliar o desenvolvimento desse trabalho, com a rotina do CRA, uma gestação e cuidados com um bebê em seu primeiro ano de vida e a distância do marido transferido para outra cidade.
Ao CRA, na pessoa de sua diretora geral Lúcia Cardoso, que investiu e acreditou nesse processo, ao NEAMA (Teresa, Lana, Júlia, Juliana, Tiago, Jackie) pelo suporte ás atividades, com infra-estrutura e apoio, à DIRNA e ao querido diretor Ronaldo Martins pela compreensão e provisão dos meios de execução dessa pesquisa, ao meu coordenador Ademário Vilas Bôas pelo apoio e compreensão das ausências, à Margareth e toda a equipe GEOBAHIA pela amizade, interesse e participação, à Fátima Vinhas – GERCO, pela sessão de dados e parceria nos trabalhos sobre o litoral norte e aos demais colegas do CRA (Rosemar, Carla Fabíola, Ana Cordeiro e Antônio motorista) pelos dados cedidos, interesse e colaboração ao longo do trabalho;
Ao Centro de Desenvolvimento Sustentável (CDS)/UnB por todo o conhecimento passado e em especial aos professores Marcel Burstyn e Laura Duarte pela inspiração brotada em suas aulas;
Aos colaboradores desse processo, o amigo Ronaldo Lyrio, aos entrevistados, entre eles, D. Iva da Pousada Porto da Lua e Adson do Albergue Praia do Forte, às Instituições cedentes dos dados: CRA, CONDER, IBGE, SUINVEST, Prefeitura e sub-prefeitura de Mata de São João e Secretaria de Saúde de Mata de São João;
À François-Michel, meu orientador, pela disponibilidade, parceria e busca de soluções à cada dificuldade encontrada;
À minha família pelo apoio e à meus pais pelo exemplo de vidas dedicadas à pesquisa;
À Elvinha pela presença, incentivo e apoio com Hanna e a Cristina pela boa vontade e ajuda;
E em especial agradeço a Ricardo por compreender a importância desse trabalho e sua longa espera por minha mudança.
1 Os significados das siglas mencionadas aqui se encontram explicitados na lista de siglas e abreviaturas.
RESUMO
Este trabalho consistiu da proposição conceitual e aplicação prática de um conjunto de indicadores sociais, econômicos e ambientais que, dentro de uma visão sistêmica, viessem a caracterizar os três aspectos mensurados e expressar em um único índice, o grau de sustentabilidade de uma dada região. Tendo como base as experiências de indicadores de desenvolvimento sustentável no Brasil e no mundo, foi elaborado um conjunto parâmetros, compostos por dados secundários, cuja principal fonte foi o Censo 2000 – Resultados do universo agregados por setor censitário. A área escolhida para essa experiência foi o Litoral Norte da Bahia, mais especificamente a área litorânea dos municípios de Mata de São João e Entre Rios, onde a dinâmica recente gerada pelas atividades turísticas de escala internacional, vem modificando as relações sociais, econômicas e ambientais da região. Para melhor acompanhar esse processo, os indicadores espacializados se mostram ferramentas valiosas de controle e gestão governamental. Inicialmente idealizado para o Projeto GEOBAHIA desenvolvido no âmbito do CRA, os indicadores de sustentabilidade devem ultrapassar suas fronteiras e agregar os demais órgãos gestores da região, instituições privadas, organizações não-governamentais e a população em geral.
Palavras Chave: Indicadores de Desenvolvimento Sustentável, Desenvolvimento Sustentável, Litoral Norte da Bahia, Sistema de Informação Geográfica.
ABSTRACT
This work consists on a conceptual proposition and practical application of social, economic and environmental indicators that in a systemic approach could measure and show the level of sustainability of a specific place in a single index. Having as background the conceptual methodology and practical experience in Brazil and all over the world, a group of indicators was created. These indicators were composed of secondary data whose main source was the 2000 Census. The area chosen for this experience was the north coast of Bahia, more specifically the cities Mata de São João and Entre Rios, where the recent dynamic originated by tourism activities at an international level has been changing social, economic and environmental relationships. Therefore, in a way to follow up on this dynamic, spatial indicators became a precious tool to control and manage all this process. Initially idealized for the GEOBAHIA project, these indicators may also be useful to governmental agencies, private institutions, non-governmental organizations and local communities.
Key Words: Indicators of Sustainable Development, Sustainable Development, North Coast of Bahia, Geographic Information System
SUMÁRIO
RESUMO
ABSTRAT
LISTA DE MAPAS
LISTA DE FIGURAS
LISTA DE TABELAS
LISTA DE ABREVEVIATURAS E SIGLAS
INTRODUÇÃO 17
1. CONTEXTUALIZAÇÃO DO LITORAL NORTE 32
1.1 HISTÓRIA E DINÂMICA DE OCUPAÇÃO 32
1.2 CARACTERIZAÇÃO SOCIAL, ECONÔMICA E AMBIENTAL 35
1.2.1 Sociais 35
1.2.2 Econômicas 37
1.2.3 Ambientais 38
1.2.4 Instrumentos da política ambiental 42
1.3 PROGRAMAS E PROJETOS 43
1.3.1 Pólo de Desenvolvimento Turístico Costa dos Coqueiros 43
1.3.2 Programa de Desenvolvimento Sustentável 46
1.3.3 Programa de Gerenciamento Costeiro 48
1.4 OS MUNICÍPIOS DE MATA DE SÃO JOÃO E ENTRE RIOS 50
1.4.1 Configuração espacial e aspectos políticos-administrativos 52
1.4.2 Aspectos ecológicos e atrativos naturais, culturais e históricos 54
1.4.3 Vilas e povoados 56
1.4.4 Formas de turismo e perspectivas futuras 67
2. INDICADORES DE SUSTENTABILIDADE 74
2.1 ABORDAGEM CONCEITUAL 74
2.1.1 Da visão setorial à integrada: primeiras iniciativas 75
2.1.2 Sustentabilidade e visão sistêmica 76
2.1.3 SIG e dados espacializados 78
2.2 MENSURANDO O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL: A DEFINIÇÃO DE INDICADORES 79
2.2.1 Critérios na definição de indicadores 82
2.3 EXPERIÊNCIAS DE INDICADORES DE SUSTENTABILIDADE 83
2.3.1 No mundo 83
2.3.2 No Brasil 94
3. OS INDICADORES E A METODOLOGIA DE ANÁLISE 97
3.1 SELEÇÃO DOS INDICADORES E CRITÉRIOS DE DESEMPENHO 101
3.2 INDICADORES PARA O LITORAL 106
3.2.1 Subsistema pessoas 106
3.2.2 Subsistema ambiente 115
3.3 AGREGAÇÃO DOS INDICADORES 123
3.4 BARÔMETRO DE SUSTENTABILIDADE 125
CONCLUSÕES 128
REFERÊNCIAS 132
LISTA DE MAPAS
MAPA 0.1 Setores censitários segundo o número de domicílios 29
MAPA 1.1 Zoneamento ecológico-econômico da APA Litoral Norte 41
MAPA 1.2 Municípios do Litoral Norte 48
MAPA 1.3 Região metropolitana e os principais acessos ao Litoral Norte 50
MAPA 3.1 Densidade populacional 108
MAPA 3.2 Rendimento familiar per capita 110
MAPA 3.3 Percentual de pessoas alfabetizadas 111
MAPA 3.4 Percentual da população com água potável 112
MAPA 3.5 Relação entre os salários de homens e mulheres 114
MAPA 3.6 Cobertura vegetal e uso do solo 116
MAPA 3.7 Assentamentos humanos 117
MAPA 3.8 Coleta de lixo 119
MAPA 3.9 Esgotamento sanitário 120
MAPA 3.10 Áreas protegidas 122
MAPA 3.11 Subsistema Pessoas 124
MAPA 3.12 Subsistema Ambiente 125
MAPA 3.13 Barômetro da Sustentabilidade 128
LISTA DE TABELAS
TABELA 1.1 Relação dos Indicadores Básicos de Desenvolvimento Sustentável
propostos pela CDS – ONU.
87
TABELA 3.1 Lista de dimensões, tópicos e indicadores 101
TABELA 3.2 Indicadores de Desenvolvimento Sustentável aplicados aos Municípios 104
LISTA DE FIGURAS
FIGURA 0.1 Imagem de satélite, 2000. Litoral de Mata de São João e Entre Rios 27
FIGURA 1.1 Castelo Garcia D’ávila 55
FIGURA 1.2 Empreendimento turístico Ecoresort. Praia do Forte, Mata de São João 55
FIGURA 1.3 Praia de Imbassaí. Mata de São João-BA, 2004. 56
FIGURA 1.4 Praia de Porto Sauípe. Entre Rios-BA, 2004. 56
FIGURA 1.5 Artesanato de palha Praia do Forte, Mata de São João-BA, 2004. 58
FIGURA 1.6 Rua principal, Praia do Forte. Mata de São João-BA, 2004. 58
FIGURA 1.7 Padrão de ruas Povoado Imbassaí, Mata de São João-BA. 59
FIGURA 1.8 Padrão de casas no povoado de Imbassaí, Mata de São João-BA. 59
FIGURA 1.9 Pousada da Aldeia. Costa do Sauípe, Mata de São João-BA, 2004. 62
FIGURA 1.10 Centro eqüestre. Costa do Sauípe, Mata de São João-BA. 62
FIGURA 1.11 Foto aérea do Complexo Turístico Costa do Sauípe, Mata de São João 63
FIGURA 1.12 Alojamento para funcionários do Complexo Turístico Costa do Sauípe 63
FIGURA 1.13 Estação de Tratamento de Água do Complexo Costa do Sauípe 63
FIGURA 1.14 Vila Sauípe, Mata de São João-BA. 65
FIGURA 1.15 ArtesanatoVila Sauípe 65
FIGURA 1.16 Padrão construtivo. Porto Sauípe, Entre Rios-BA. 66
FIGURA 1.17 Barracas de praia. Porto Sauípe, Entre Rios-BA. 66
FIGURA 1.18 Exemplo de pesca artesanal praticada em Porto Sauípe 67
FIGURA 1.19 Vista panorâmica da região da Praia do Forte.Mata de São João-BA. 68
FIGURA 2.1 Gráfico da hierarquia e seqüência de passos do Método SAM. 92
FIGURA 2.2 Ciclo de avaliação dos seis estágios do Método SAM. 93
FIGURA 2.3 Barômetro da sustentabilidade do Método SAM. 94
FIGURA 3.1 Adaptação do barômetro da sustentabilidade 105
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
ANA – Agência Nacional de Água
Aneel – Agência Nacional de Energia Elétrica
APA – Área de Proteção Ambiental
APP – Área de Preservação Permanente
APSA – Artesãs Porto Sauípe Associadas
Bahiatursa – Empresa de Turismo da Bahia S/A
BID – Banco Interamericano de Desenvolvimento
C3ED – Centro de Economia e Ética pelo Desenvolvimento Sustentável
CDS – Comissão de Desenvolvimento Sustentável
CMMAD – Comissão Mundial Sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento
Cepram – Conselho Estadual de Meio Ambiente
CNO – Construtora Norberto Odebrecht
Coind – Coordenação de Informação Ambiental
Conama – Conselho Nacional de Meio Ambiente
Conder – Companhia de Desenvolvimento Urbano do Estado da Bahia
CRA – Centro de Recursos Ambientais
DBO – Demanda Bioquímica de Oxigênio
DDF – Departamento de defesa florestal
DS – Desenvolvimento Sustentável
Ecoplam – Empresa de Consultoria e Planejamento Ambiental
EIA – Estudo de Impacto Ambiental
Embrapa – Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária
Embratur – Instituto Brasileiro de Turismo
EPA – Agência de Proteção Ambiental
ER – Entre Rios
ESDI – Iniciativa de Indicadores ambientais e de Desenvolvimento Sustentável
ETA – Estação de Tratamento de Água
ETE – Estação de Tratamento de Efluentes
Faema – Fundação Municipal de Meio Ambiente
Furb – Universidade de Blumenau
Geobahia – Sistema de Informação Geográfica da Bahia
Gerco – Programa de Gerenciamento Costeiro
Iapar – Instituto Agronômico do Paraná
Ibama – Instituto Brasileiro dos Recursos Naturais Renováveis
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
ICMS – Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços
ICSU – Conselho Internacional de Uniões Científicas
IDH – Índice de Desenvolvimento Humano
IH – Instituto de Hospitalidade
IPTU – Imposto Predial de Propriedade Territorial Urbana
IQA – Índice de Qualidade das Águas
ISB – Índice de Sustentabilidade de Blumenau
ISS – Imposto Sobre Serviços
IUCN – União Internacional para Conservação da Natureza
MMA – Ministério do Meio Ambiente
Monitore – Programa Nacional Integrado de Monitoramento Ambiental
MSJ – Mata de São João
Neama – Núcleo de Estudos Avançado do Meio Ambiente
NRC – Conselho Nacional de Pesquisa
NRTEE – Mesa Redonda Nacional de Meio Ambiente e Economia
OCDE – Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico
ONG – Organização Não Governamental
ONU – Organização das Nações Unidas
Pedits – Plano Estrátegico de Desenvolvimento Integrado Turístico Sustentado
PER – Pressão-Estado-Resposta
Petrobrás – Petróleo Brasileiro S/A
PIB – Produto Interno Bruto
PNIS – Programa Nacional de Indicadores de Sustentabilidade
PNMA II – Programa Nacional de Meio Ambiente
PPGA – Programa de Planejamento e Gerenciamento Ambiental
Previ – Previdência dos Funcionários do Banco do Brasil
Prodetur – Programa de Desenvolvimento Turístico
Proes – Programa de Educação Supletiva
RIMA – Relatório de Impacto Ambiental
RPPN – Reserva Particular do Patrimônio Natural
SAD 69 – Datum América do Sul
SAM – Método de Avaliação de Sistema
Scope – Comitê Científico para Problemas do Meio Ambiente
Seagri – Secretaria de Agricultura do Estado
Sebrae – Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas
SEIA – Sistema Estadual de Informação Ambiental
Semarh – Secretaria de Meio Ambiente e Recursos Hídricos
Senac – Serviço Nacional de aprendizagem Comercial
Sesab – Secretaria de Saúde do Estado da Bahia
SIG – Sistema de Informação Geográfica
Sisnama – Sistema Nacional de Meio Ambiente.
SNUC – Sistema Nacional de Unidades de Conservação
SRH – Superintendência de Recursos Hídricos
Sudene – Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste
Suinvest – Superintendência de Investimentos em Pólos Turísticos
SUS – Sistema Único de Saúde
UFBA – Universidade Federal da Bahia
UFRJ – Universidade Federal do Rio de Janeiro
UnB – Universidade de Brasília
UTM – Universal Transvesa de Mercator
WRI – Instituto de Pesquisa Mundial
ZAG – Zona de Agricultura
ZCA – Zona de Comprometimento Ambiental
ZCS – Zona de Comércio e Serviço
ZEE – Zoneamento Ecológico Econômico
ZEP – Zona de Expansão
ZME – Zona de Manejo Especial
ZOM – Zona de Orla Marítma
ZOR – Zona de Ocupação Rarefeita
ZOR E – Zona de Ocupação Rarefeita Especial
ZPR – Zona de Proteção Rigorosa
ZPV – Zona de Proteção Visual
ZRE – Zona de Reserva Extrativista
ZT – Zona Turística
ZUD – Zona de Uso Diversificado
ZUP – Zona de Urbanização Prioritária
ZUR – Zona de Urbanização Restrita
17
INTRODUÇÃO
A QUESTÃO DA SUSTENTABILIDADE E O PAPEL DO ESTADO
Segundo a definição enunciada em 1987, no relatório de Brundtland (Nosso Futuro
Comum), Desenvolvimento Sustentável (DS) é aquele que atende às necessidades do presente
sem comprometer a possibilidade de as gerações futuras atenderem às suas próprias
necessidades. Esse mesmo relatório o define como um “processo de transformação no qual o
uso dos recursos, a direção dos investimentos, a orientação do desenvolvimento tecnológico e
a mudança institucional se harmonizam e reforçam o potencial presente e futuro, a fim de
atender às necessidades e aspirações humanas” (CMMAD, 1988:46).
Compreender o conceito de desenvolvimento sustentável é fundamental para se ter
clareza do que estará sendo analisado e proposto neste trabalho, ele é o alicerce de uma nova
forma de pensar, planejar e atuar sobre o território. Essa definição do relatório de Brundtland
é a mais difundida e amplamente adotada por tratar a questão de uma maneira geral e de
forma branda, porém não menos ambiciosa e de certa forma, utópica. Há variações quanto a
definição de DS, no entanto essa remete à uma idéia de planejamento estratégico, de
harmonização das diferentes esferas de intervenção e investimento, com o conhecimento do
homem e suas necessidades, sem descriminação de raça, cultura, classe social ou poder
aquisitivo.
Segundo Sachs (2000) o desenvolvimento sustentável deve se compor de cinco eixos
estrututrantes: viabilidade econômica, equilíbrio social, ecologia sustentável, diversidade
cultural e territorialidade. É interessante pensar que não se pode privilegiar um eixo sem
comprometer o outro. Quando ele fala em viabilidade, ele ressalta o pragmatismo, é preciso
ter dinheiro circulando, no entanto de maneira mais eqüitativa, respeitando as diferenças, os
domínios, não impondo valores de uma cultura sobre outras e sem consumir todos os recursos
naturais. Essa preocupação de Sachs alerta para o consumo exacerbado dos recursos naturais,
pressionados por todos lados: ocupação, extração, impermeabilização, queimadas e remonta à
experiência da ilha de Páscoa, no Oceano Pacífico, que extinguiu sua vegetação com o uso
intensivo das madeiras, tornou infértil o solo vulcânico e desequilibrou todo o ecossistema,
devido às suas práticas culturais e religiosas, como as construções das grandes estátuas, os
Moais e a incapacidade de perceber e reverter a situação antes do colapso. Essa é a
preocupação de Fritjof Capra para nossa sociedade capitalista e consumidora. Nos seus
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escritos ele questiona se a humanidade fará a opção de mudança dos hábitos, padrão
econômico, estrutura social antes que seja irreversível o resgate da capacidade de suporte da
Terra.
Para que haja uma mudança em direção à sustentabilidade pressupõe de alguns critérios
preconizados por Sachs (2000):
no social é preciso homogeneidade, distribuição justa de renda, qualidade de vida,
acesso aos recursos e aos serviços sociais;
no cultural, a busca do equilíbrio entre tradição e inovação, projeto nacional,
manutenção (autoconfiança) na abertura para o mundo;
para o ecológico, a preservação do capital natural, limitar o uso dos recursos não-
renováveis, respeitar e realçar a capacidade de autodepuração dos ecossistemas naturais;
para o territorial, uma configuração urbana e rural balanceada, melhoria do ambiente
urbano, superação das disparidades inter-regionais, estratégias de desenvolvimento
ambientalmente seguras para áreas ecologicamente frágeis, o ecodesenvolvimento;
na economia, desenvolvimento equilibrado, segurança alimentar, modernização
contínua dos instrumentos de produção, autonomia de pesquisa científica e tecnológica,
inserção soberana na economia internacional;
para a política nacional, a apropriação universal dos direitos humanos, desenvolvimento
da capacidade do Estado para implementar um projeto nacional, bom nível de coesão social;
no político internacional, a cooperação e eficácia em prevenção à guerra, investimento
do hemisfério norte no desenvolvimento do hemisfério sul, controle institucional do sistema
financeiro e dos negócios, aplicação do princípio de precaução na gestão do meio ambiente e
mudanças climáticas globais, sistema efetivo de cooperação científica e tecnológica.
Essa concepção é bem abrangente, pois além dos três principais setores da sociedade,
ela abre o campo de visão e engloba as relações políticas internas e externas, sem as quais é
impossível equilibrar os orçamentos de um país. Dois aspectos interessantes são: o cuidado
com o equilíbrio das populações rurais visando o fortalecimento dessas comunidades a fim de
desestimular o êxodo rural, uma vez que a situação das cidades fica cada vez mais grave
(violência, engarrafamentos, transportes entre outros) com problemas que se agigantam. O
outro aspecto que chama a atenção é o incentivo à pesquisa científica e tecnológica, pois o
modelo de desenvolvimento do Brasil requer novas soluções, conhecimento das riquezas
nacionais, aprofundamento na biodiversidade.
Esses elementos econômicos, sociais, políticos e ambientais, estão, atualmente, sendo
tratados isoladamente, segundo uma visão ainda desenvolvimentista e a evolução do
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pensamento sustentável reside na integração de propósitos, orientados para a qualidade de
vida.
No caminho de uma mudança paradigmática, os grandes fóruns de discussão mundial
têm constituído marcos importantes na solidificação de um novo pensamento, ao agregar
pesquisadores, lideranças e governos de muitos países para interagir e buscar soluções para o
quadro atual de desequíbrio ecológico e social. A Conferência Mundial Rio-92 teve grande
importância na consolidação do conceito de DS e foi com a proposta de formulação de
compromissos de diversas escalas, do nacional ao individual, que a Agenda 21 promoveu
iniciativas valiosas ao redor do mundo em direção à sustentabilidade.
Infelizmente, e apesar dos esforços depreendidos, ainda não se viu grande repercussão
no Brasil, das propostas formuladas no encontro do Rio de Janeiro. Em Joannesburgo, no
encontro Rio+10, agendado para a avaliação dos avanços obtidos nos dez anos que se
seguiram à Cúpula Mundial, verificou-se o frágil e incipiente compromisso brasileiro, assim
como de diversos outros países.
Percebe-se claramente que o caminhar em direção ao DS é uma decisão política,
contemplado por políticas públicas. A atuação começa na escala macro, no planejamento, no
direcionamento das ações, como fala o relatório de Brundtland.
No documento ‘Estratégia Mundial para a Conservação’ (1980) a preocupação com a
conservação do meio ambiente é traduzida como: “os seres humanos, em busca do
desenvolvimento econômico e do gozo das riquezas naturais, deverão enfrentar a realidade de
que os recursos naturais e a capacidade dos ecossistemas são limitados e, conseqüentemente
deverão ajustar-se às necessidades das gerações futuras” (IUCN, 2004). Embora a finalidade
do desenvolvimento consista em proporcionar o bem-estar econômico e social, o objetivo da
conservação consiste, por sua vez, em manter a capacidade da terra para sustentar esse
desenvolvimento e garantir a vida.
Em outras áreas, como a social já se incorpora a transversalidade da questão ambiental.
Na segunda Conferência das Nações Unidas para Assentamentos Humanos, o Habitat II, que
aconteceu em Istambul em junho de 1996, que pode ser considerado um marco mundial para
o enfrentamento dos problemas habitacionais e urbanos e na construção de novos horizontes
para as políticas públicas, a discussão abordou novos enfoques como a descentralização e
fortalecimento do poder local, co-gestão e parcerias com entidades sociais, participação da
sociedade, sustentabilidade e qualidade ambiental, combate à pobreza e ao desemprego. Os
temas, autonomia, autogoverno, democracia participativa são alguns dos valores que marcam
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esse movimento social que alguns vêem como terceira via, ou como alternativa ao Estado e ao
mercado.
Essa nova abordagem ambiental-participativa deve gerar diretrizes e parâmetros para
que ela seja adotada nas diversas instâncias de tomada de decisão. Em alguns projetos
fomentados por instituições financeiras internacionais como o Banco Interamericano de
Desenvolvimento (BID), obriga-se o uso de metodologias de construção de propostas, a
exemplo do método Marco-lógico, que contempla a participação de todos os grupos sociais,
que de alguma forma são atingidos pela intervenção. Outra característica forte desses modelos
de construção de projetos é a grande flexibilidade e criatividade no atendimento a situações
específicas locais, justamente para dar liberdade de construção de soluções que atendam às
necessidades e aspirações de cada comunidade.
Graças à pressão externa de instituições como o Banco Mundial, essas iniciativas já têm
ocorrido no Brasil, mas para a sua internalização é preciso a adoção pelo próprio Estado. No
entanto para sua atuação na esfera ambiental, o Estado encontra sérias dificuldades como a
novidade da questão e a incerteza de como agir, o que demanda tempo para avaliação de
políticas e programas favoráveis a gestão ambiental.
Para Bursztyn (2001) a reformulação do papel do Estado pressupõe cinco imperativos:
fazer mais com menos (informação), o envolvimento da sociedade nas decisões públicas
(stakeholders), globalização sem exclusão, mudanças de atitude (solidariedade, ética,
precaução) e ambientalização da educação e da economia.
Mas a demanda por respostas, controle e fiscalização ambiental é urgente e apesar da
grande retração do Estado em diversos setores, como privatização de serviços básicos de luz,
água, entre outros, o planejamento ambiental não pode ser delegado, os interesses são muitos
e conflitantes. Para atrelar o crescimento econômico ao desenvolvimento social e conservação
ambiental é preciso política pública, esse papel é exclusivo do poder público, para fazer valer
o interesse da nação.
Castells (2000) faz uma proposta de Estado-Rede, onde este deve ser o mais
descentralizado possível, com a sociedade e empresas privadas assumindo funções; ele deve
ter flexibilidade para negociar, ter também uma estrutura hierárquica lógica com a definição
clara das regras e ainda haver uma participação cidadã. Essa proposta busca a democracia e
representatividade via instrumentos e instâncias como internet, audiências públicas e
conselhos, máxima transparência administrativa, modernização tecnológica, investimento na
profissionalização do seu quadro funcional, com equipes qualificadas e bem remuneradas,
garantindo assim a eficiência e lisura e por fim autonomia e flexibilidade de regras.
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No Brasil, a reestruturação do Estado e da sociedade deve estar orientada para um
desenvolvimento econômico de maneira integrada e de acordo com as especificidades
regionais, procurando integrar-se mundialmente. Deve, ainda, estar orientada para a inclusão
da maioria da população brasileira não-cidadã (aquela parcela que não tem acesso à educação,
emprego, saúde, saneamento, moradia e segurança pública), de uma maneira que preserve o
patrimônio ambiental brasileiro. Este modelo, em síntese, deve ser essencialmente
democrático, social e ambientalmente defensável (OLIVEIRA, 1996).
Um outro desafio das esferas públicas, quanto à questão ambiental, é da divulgação e
disponibilização das informações relativas ao tema, pois o direito de obter informação
ambiental encontra respaldo em vários instrumentos legais. Atuais interpretações da
Constituição Federal Brasileira ressaltam o dever do Estado de atuar na divulgação das
informações ambientais, como uma forma de garantir o acesso à informação das condições do
meio ambiente, aprovações e localização de atividades impactantes, visando incentivar a
atuação do cidadão no controle e gestão ambiental.
Outros instrumentos legais também prevêem a garantia do acesso aos dados pela
sociedade, a exemplo do Sistema de Informação de Recursos Hídricos (Lei 7.804/89) que
destina ao poder público a produção de informações relativas ao meio ambiente, a Resolução
do Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama) 01/86 que estabelece a disponibilização
pública do Relatório de Impacto Ambiental (RIMA). Encontra-se ainda a Lei de Ação Civil
Pública e a mais recente aprovada pelo Congresso Nacional, a Lei 10.650/2003, permite o
acesso a dados e informações ambientais, sendo essa disponibilização um dever do poder
público e órgãos integrantes do Sistema Nacional de Meio Ambiente (Sisnama)
(GONÇALVES, 2004).
Na Bahia o seu Sistema Estadual de Informação Ambiental (SEIA), a Lei 7.799/00
prevê ampla divulgação de informações para a sociedade, utilizando a Internet como principal
meio de divulgação. O Portal www.seia.ba.gov.br diariamente publica matérias ambientais,
com as principais ações e eventos dos órgãos da Secretaria de Meio Ambiente e Recursos
Hídricos (Semarh), além de disponibilizar documentos como teses e dissertação possui
ferramentas para consultas espaciais dos Zoneamento Ecológico Econômico (ZEE’s) das
Áreas de Proteção Ambiental (APA’s).
Inserem-se nesse contexto os Sistemas de Informação Geográfica (SIG), como
mecanismo de consulta a dados diversos sobre uma mesma base territorial. O sistema é capaz
de subsidiar análises conjuntas da realidade física, biótica e socioeconômica com a expressão
eficiente de medidas diretas ou estimativas indiretas dos seus temas constituintes, podendo
22
também prestar serviços valiosos para o planejamento, a proteção ambiental e análises
geopolíticas, ou seja, interagir diretamente com o cidadão (por exemplo via Internet) com uma
pesquisa simplificada ou elaborar resultados mais complexos para os tomadores de decisão
(SILVA, 2001).
ESTRUTURA DA DISSERTAÇÃO
Esta dissertação está estruturada em três capítulos de desenvolvimento além de sua
introdução e conclusão. A introdução contempla a apresentação do conceito de
desenvolvimento sustentável e a base conceitual utilizada para essa pesquisa; em seguida são
apresentados os objetivos, as justificativas, as hipóteses, além dos materiais e métodos
utilizados para se chegar aos resultados.
No primeiro capítulo é apresentada a contextualização da região de estudo, contendo um
histórico e suas principais características, sociais, econômicas e ambientais, além dos
principais projetos desenvolvidos ou em desenvolvimento como o Programa de
Desenvolvimento Sustentável (Prodesu), Programa de Desenvolvimento Turístico (Prodetur)
e o Programa de Gerenciamento Costeiro (Gerco). Por fim, um detalhamento sobre os temas
mais relevantes e as especificidades da área de recorte para a aplicação dos indicadores que
ficou delimitada ao litoral dos municípios de Mata de São João e Entre Rios, dada a dinâmica
envolvendo os empreendimentos turísticos para esse trecho da APA Litoral Norte.
No segundo capítulo é desenvolvido o referencial teórico, pois se entende que toda a
conceituação do trabalho deveria ser apresentada já direcionada para a realidade a ser
mensurada e avaliada. Nesse momento são apresentados os conceitos de indicadores e índices,
as aplicações mais usuais, o componente sistêmico do trabalho, a dimensão espacial com a
estrutura de SIG e os cuidados com a entrada de dados, os critérios na escolha dos indicadores
e por fim as principais experiências internacionais e nacionais dos indicadores de
sustentabilidade.
No terceiro capítulo são apresentados os mapas e temas que compuseram os
indicadores, os parâmetros de valoração e a matriz de cálculo do grau de sustentabilidade, a
elaboração do índice final e os resultados alcançados. No encerramento das conclusões são
extraídas as principais análises, percepções e recomendações identificadas ao longo do
desenvolvimento deste trabalho.
23
OBJETIVOS
Objetivo Geral
Constitui o objetivo geral deste trabalho a aplicação de indicadores de desenvolvimento
sustentável em um Sistema Informação Geográfica (SIG) para avaliação integrada dos
aspectos sociais, econômicos e ambientais na área litorânea dos municípios de Mata de São
João e Entre Rios, Bahia.
Experiências de aplicação de indicadores, em sua maioria, trazem as variáveis
ambientais, sociais e econômicas individualmente, sem buscar os fatos e conseqüências da
interação dos três aspectos. Uma proposta de valoração dessas três dimensões da vida
contemporânea, sob o olhar sistêmico (CAPRA, 1995), é o desafio deste trabalho e ele se
desenvolve no Litoral Norte da Bahia, uma área de muitos atrativos e beleza cênicos, que vem
recebendo fortes investimentos públicos e privados e foi lançada como pólo turístico para
diferentes perfis e padrões de turistas nacionais e internacionais.
Objetivos Específicos
1. Estruturação de um SIG para a área de estudo com cartografia básica, mapas
temáticos, imagens de satélite, fotografias aéreas e banco de dados com informações
ambientais, sociais e econômicas;
2. Exploração do referencial teórico para a proposição dos indicadores de
desenvolvimento sustentável;
3. Aplicação de um conjunto de indicadores de sustentabilidade na área de estudo;
JUSTIFICATIVAS
O desenvolvimento desta pesquisa se dá no contexto do Centro de Recursos Ambientais
(CRA), órgão integrante do Seia, no intuito de compreender melhor a amplitude de sua
atuação, para planejar e executar com maior eficiência o controle ambiental do Estado da
Bahia. O órgão, mais recentemente, definiu como uma das prioridades de seu plano de
trabalho, o desenvolvimento de um SIG, composto por cartografia básica, temas ambientais e
monitoramento por satélite, que permitam mapear os diferentes ecossistemas e principais
impactos causados ao meio ambiente na implantação dos empreendimentos por ele
licenciados.
Esse Sistema de Informação Geográfica, denominado Geobahia prevê também a
inclusão das informações geradas diariamente pelo corpo técnico do CRA, na aprovação de
24
licenças para empreendimentos de pequeno, médio, grande e excepcional porte, na
fiscalização ambiental de eventos emergenciais ou no trabalho de rotina e no monitoramento
das águas superficiais do Estado. Esse aporte de informação ao ser mapeado permitirá uma
melhor visão de conjunto, detectando-se áreas de concentração das atividades potencialmente
poluidoras, locais onde há maior incidência de acidentes ecológicos, estações de
monitoramento cuja água está perdendo a qualidade entre inúmeras possibilidades de uso e
interpretação.
Concebido como ferramenta de apoio à decisão, esse projeto tem como parte integrante
o desenvolvimento de um conjunto de indicadores que sintetizem a grande massa de
informação agregada e sirvam de parâmetro de comparação entre as diferentes unidades
espaciais. É a partir da necessidade de elaboração e definição desse conjunto de indicadores,
que sejam adequados às necessidades do órgão e representativos da realidade baiana, que esse
trabalho surge como uma oportunidade de aprofundamento teórico e conceitual das questões
ambientais a eles relacionadas e de pesquisa e experimentação de uma proposta prática do uso
de SIG como ferramenta da gestão ambiental.
Mas seguindo o conceito de DS, mesmo um órgão explicitamente ambiental não pode
mais pensar de forma segmentada, pois, ao tratar da aprovação de empreendimentos ligados
aos diferentes setores da economia e intervir no tipo e forma de uso da terra, suas ações têm
repercussão direta no meio social. Ao internalizar esse pensamento complexo em suas ações
cotidianas, o CRA, mais do que o controle ambiental estará fomentando o desenvolvimento
sustentável da Bahia.
Vale também destacar a escolha da região do litoral norte do Estado da Bahia para a
aplicação dos indicadores. Por sua projeção turística e paisagística no cenário baiano, ela tem
sido repetidamente escolhida como área para o desenvolvimento de projetos piloto de
geoprocessamento. Como uma primeira iniciativa institucional de tratamento de dados
cartográficos e criação de banco de dados, o Gisapa é um sistema criado para armazenar as
informações de campo levantadas nas ações de licenciamento, fiscalização e monitoramento,
sistematicamente realizados na região de estudo, cujo enfoque é a gestão das áreas de
proteção ambiemtal, teve a APA Litoral Norte utilizada para os testes do sistema. O segundo
projeto também desenvolvido para essa área, o Gisweb consiste na disponibilização via
internet, no portal SEIA – www.seia.ba.gov.br, opção geolocalização em APA, das bases e
informações relativas ao ZEE da APA Litoral Norte.
Ainda internamente ao órgão, foi desenvolvida a segunda etapa do Gerco, financiado
pelo Governo Federal via Ministério do Meio Ambiente (MMA) que visa preservar os
25
ecossistemas costeiros, evitar a degradação dos recursos naturais, compatibilizar as atividades
socioeconômicas, turísticas e a expansão urbana, acesso e uso das praias a toda população
permanente e visitante e disponibilização de um sistema de informações com mapas temáticos
do grau de qualidade e regeneração da vegetação, a influência marítima sobre os ambientes
costeiros, batimetria2 da costa e outras informações importantes para a caracterização da
ocupação costeira.
Por fim, foram identificados estudos desenvolvidos por outros órgãos, como o Prodesu,
publicado em 2001 pela Companhia de Desenvolvimento Urbano do Estado da Bahia Conder,
realizado em parceria com instituições britânicas, que fez um estudo sobre temas sociais,
econômicos, históricos, patrimoniais e também ambientais para toda a extensão do litoral
norte e o Plano Estrátegico de Desenvolvimento Integrado Turístico Sustentado (Pedits) Costa
dos Coqueiros realizado pelo Prodetur-BA que consta de um planejamento do
desenvolvimento turístico, prevendo uma série de investimentos e incentivo à implantação de
grandes empresas ligadas ao ramo turístico.
Graças a essa multiplicidade de informações e dados já disponíveis a região foi
escolhida para esta pesquisa, uma vez que o cálculo de indicadores depende de dados
consistentes e espacializados com qualidade, precisão e em escalas apropriadas ao estudo.
HIPÓTESES
É possível integrar dados sociais, econômicos e ambientais para, em forma de
indicadores, representar o grau de sustentabilidade de uma determinada área?
Indicadores de desenvolvimento sustentável podem configurar além da visão
instantânea, as tendências de determinados regiões quanto à sustentabilidade?
Os indicadores de desenvolvimento sustentável espacializados testados podem
constituir ferramentas importantes para a tomada de desisão?
MATERIAIS E MÉTODOS
Levantamento Bibliográfico
O levantamento bibliográfico foi inicialmente direcionado para a identificação de
abordagens teóricas e práticas das experiências com indicadores de desenvolvimento
sustentável. A maior parte das experiências e bibliografia sobre o tema é produzida no
2 Batimetria é a topografia do fundo imerso, ou seja, a medida de profundidade de uma massa de água como os mares, lagos e rios.
26
exterior (IUCN 2002; OCDE 2002 entre outros) raras são as experiências nacionais como a
proposta do IBGE ou a experiência de Belo Horizonte.
Ao longo do processo outros temas foram aprofundados, como a leitura de documentos
oficiais sobre Desenvolvimento Sustentável, teoria sistêmica, SIG e a avaliação de impactos
sociais e econômicos sobre o meio ambiente. Sobre a área de estudo muitos documentos
foram encontrados como BAHIA 2003; PRODESU 2001 e LYRIO 2004 referentes aos
programas Prodetur Prodesu e Gerco, além dos artigos e trabalhos que pesquisadores locais.
Por fim, foram adicionados textos sobre a atividade turística em si, com suas peculiaridades,
tipologias, classificação, tendências, benefícios e impactos.
TRATAMENTO DOS DADOS E ARQUIVOS DIGITAIS
Bases Cartográficas
Base cartográfica digital 1:100.00, cartas originais 1976 e publicação em meio digital
2004, projeção Universal Transvesa de Mercator (UTM), formato original dgn, fonte SEI;
Todas as cartas da base cartográfica foram convertidas para o formato shape (ArcView
3.2) e selecionados os níveis de informação pertinentes à escala de apresentação, tais como
hidrografia principal e secundária, sistema viário principal e secundário, curvas de nível
mestras e intermediárias com a extração do nível altimétrico e pontos cotados quando
existentes, localidades pontuais, manchas de ocupação ou edificações, linha de costa, oceano
e posteriormente as cartas foram agregadas por nível de informação, compondo arquivo único
para toda a área.
Foram também adicionados o limite da APA Litoral Norte e APA Plataforma
continental originalmente em formato shape e a delimitação da área de estudo, digitalizada em
tela com base nas fotografias aéreas na escala 1: 5.000.3
Imagens de Satelite
Landsat ETM7, sem tratamento da banda pancromática, com 30 (trinta) metros
resolução espacial, oito faixas espectrais, ano 2003, fonte CRA/Gerco.
A imagem utilizada já se encontrava georreferenciada e serviu de apoio à análise e
classificação do uso do solo dos trechos não contemplados pelos estudos anteriores. (figura
0.1).
3 Superintendência de Desenvolvimento Turístico (SUDETUR). Fotos aéreas. Bahia, 2003.
27
Dados do IBGE
Apenas os dados do Censo Demográfico 2000, (IBGE, 2000) foram passíveis de
desagregação no nível de setor censitário, sendo possível espacializar os dados para a área de
estudo e por isso adotados neste trabalho. Os polígonos dos setores acabaram por servir de
limite, o que acabou ampliando a área de estudo, a princípio limitada à via BA-099 e
posteriormente ampliada para o interior do continente.
Estes dados foram então adquiridos pelo CRA, em CD-ROM, em formato de planilha
Excel, estruturada em códigos relacionados aos parâmetros pesquisados. Para uso desses
dados foi feita a leitura do texto explicativo e seleção das tabelas aplicáveis ao trabalho
(básico_ba, domicílios, pessoa 1, pessoa 2, pessoa 3 e a tabela de descrição dos setores). As
linhas (duplas) relativas aos setores censitários da área de estudo foram então exportadas de
cada tabela selecionada, para o formato DBF, compatível com o programa Arcview 3.2.
Dentro do Arcview foi gerado o mapa com os setores censitários da área composta de setores
urbanos e rurais. Essas feições foram convertidas de coordenadas geográficas (latitude e
longitude) para a projeção métrica UTM, datum SAD 69. Para a ligação entre a tabela de
dados e o mapa usou-se um campo identificador comum aos dois arquivos. De cada tema foi
elaborado um mapa temático e identificado o código com sua respectiva variável (mapa 0.1).
28
Dada a pertinência e o grau de representação das condições socioambientais foram
gerados os primeiros mapas com os seguintes temas: condição de propriedade do domicílio,
composto pelas variáveis: domicílios próprios quitados, domicílios próprios em aquisição,
domicílios alugados, domicílios cedidos por empregador ou domicílios cedidos de outra
forma; Grau de instrução do responsável pelo domicílio: com zero ano de estudo, hum ano de
estudo, dois anos de estudo ou oito anos de estudo; Rendimento do responsável pelo
domicílio em reais, para esse mapa foi depois identificado erro no uso dos parâmetros
tornando-se mais seguro gerar os dados de renda do responsável relacionado ao tempo de
estudo; Abastecimento de água: rede geral, poço ou nascente, outra forma; Esgotamento
sanitário: rede geral ou pluvial, fossa séptica, fossa rudimentar, vala e rio, lago ou mar; Coleta
de lixo: lixo coletado, queimado na propriedade, enterrado na propriedade, jogado em
logradouro, jogado em rio, lago ou mar ou outro destino.
30
Demais dados temáticos
Dados Socioambientais
Quatro documentos de diferentes períodos (1995, 1999, 2000 e 2002) foram produzidos
pela professora e pesquisadora Raquel Mattedi, o que incluíu levantamentos primários via
pesquisa rápida participativa. Também foram utilizados os dados temáticos do Prodesu e do
diagnóstico sócio-econômico produzido pela Empresa de Consultoria e Planejamento
Ambiental (Ecoplam), empresa responsável pela elaboração do Estudo de Impacto Ambiental
(EIA) / Relatório de Impacto Ambiental (Rima) do Complexo turístico Costa de Sauípe.
Classificação da Vegetação Prodesu
A classificação da vegetação foi realizada pelo projeto Prodesu em sua variável
ecológica, com base nas imagens de satélite Spot do ano 2000, sendo compatível com a escala
1:25.000. Para esta pesquisa foi feito um recorte nos limites da área de estudo e gerados os
mapas temáticos de classificação da cobertura vegetal e uso do solo. O mapa de valor
ecológico foi incorporado à análise dos indicadores, neste mapa foram originalmente aferidos
valores para o grau de naturalidade (quando as tipologias vegetais aproximan-se de seu estado
climácico), biodiversidade (variedade de espécies por área) e grau de importância sobre
funções particulares do sistema na manutenção de seu equilíbrio dinâmico, ele consta no
relatório Análise Ecológica elaborado por Lyrio (2001).
Zoneamento ecológico-econômico APA Litoral Norte
O zoneamento original foi elaborado pela Conder logo após a criação da APA em 1992,
sofreu porém a última modificação em 2003, já na administação do CRA.
Proposta de Gestão e macro zoneamento, Gerco 2004
A proposta para os 13 (treze) municípios integrantes do programa de Gerenciamento
Costeiro foi elaborada na escala 1:100.000, com um maior detalhamento na escala 1: 25.000
para a área da APA Liotral Norte. Os arquivos são bastante atuais, tendo sido concluídos e
entregues ao CRA em 2004.
Qualidade das águas – CRA
São monitorados pelo CRA alguns pontos dos principais rios do Estado, que são
subdivididos em bacias hidrográficas. Para os pontos monitorados dos rios Pojuca e Sauípe
componentes da bacia Recôncavo Norte, foram analisados nove parâmetros e agregados para
o cálculo do Índice de Qualidade da Água (IQA). Apenas os dados do ano de 2000 e 2001
foram incluídos.
31
De posse dos dados secundários foi programado o trabalho de campo para avaliação das
condições locais e grau de representatividade das informações mapeadas. Como inicialmente
a área se limitava ao município de Mata de São João , o trabalho de campo foi direcionado
para esta área tendo somente a localidade de Porto Sauípe do município de Entre Rios
incluída no roteiro. Em Mata de São João foram visitados: Praia do Forte (Reserva da
Sapiranga, Castelo Garcia D’ávila, Ecoresort e a vila dos pescadores), Imbassaí, Diogo, Santo
Antônio, Costa do Sauípe, Porto Sauípe, Vila Sauípe e a sede do município de Mata de São
João .
Foram feitos contatos com grupos representativos da sociedade como donos ou
administradores de pousadas em Praia do Forte e Imbassaí, representante da Fundação Garcia
D’ávila, representante da associação comercial de Praia do Forte, sub-prefeita da área
litorânea de Mata de São João , donos de bares e bancas de artesanato em Santo Antônio e
Diogo, moradores de Vila Sauípe, técnicos de estações de tratamento de água e esgoto, equipe
de vendas imobiliárias do grupo Odebrecht, secretarias de saúde, cultura e turismo,
planejamento e meio ambiente e chefe de gabinete da prefeitura de Mata de São João . Além
das entrevistas e demais dados e materiais coletados como mapas e revistas, foram feitos
registros fotográficos das principais localidades e pontos de conflito.
32
1. COTEXTUALIZAÇÃO DO LITORAL NORTE
1.1 HISTÓRIA E DINÂMICA DE OCUPAÇÃO
A ocupação da região econômica Litoral Norte teve início na segunda metade do século
XVI, pois foi só após a chegada de Tomé de Souza e a fundação da cidade da Bahia, que
Garcia D’ávila, um ‘creado’4 do Governador Geral começa a se estabelecer na região. Tendo
chegado ao Brasil como almoxarife dos armazéns reais, Garcia D’ávila foi um dos principais
responsáveis pela expulsão dos índios Tupinambá de todo o litoral, datando de 1549 os
primeiros conflitos entre brancos e índios especificamente no litoral norte. Em 1560, Tomé de
Souza, ao voltar para a Europa, doou então à Garcia D’ávila uma propriedade que havia
recebido do Rei de Portugal, cujos limites iam dos campos do rio Pojuca até perto da foz do
rio Real (ECOPLAM, 1995a).
Em torno do ano 1600, foi construída a primeira casa da torre com função de proteção e
defesa do local, onde posteriormente ficou denominado de Praia do Forte. Com a instalação
de olarias, engenhos de açúcar, fazendas de gado e da atividade extrativista, deu-se início à
formação dos pequenos núcleos, vilas e povoados como até hoje são conhecidos e ao processo
de submissão e dizimação dos índios Massarandupió, bem como supressão significativa dos
ecossistemas costeiros (MATTEDI, 2002).
Em 1695 morre o mais famoso e rico descendente de Garcia D’Ávila, Francisco Dias
D’Ávila, que aumentou os domínios herdados, chegando a possuir terras no Piauí e todo o
sertão norte da Bahia. Tendo se iniciado em 1650 a decadência da economia açucareira,
devido à introdução da cultura da cana-de-açúcar nas Antilhas, toda a estrutura econômica da
região foi abalada. Também data dessa mesma época o início da decadência da pecuária
extensiva que foi lentamente perdendo toda a sua importância. Dá-se início à plantação de
coco e a região passa a fornecer, além de lenha, carvão, carne, produtos de couro, o coco e as
frutas, feijão, derivados de leite e objetos de palha (ECOPLAM, 1995b).
“A região segue seu ritmo nos séculos seguintes, havendo lacunas nos registros
encontrados sobre o período compreendido entre meados do século XVII e final do XIX”
(MATTEDI, 1999a:5). Ao final do século XIX, o norte-americano Sigismundo Schindler
compra parte das terras dos descendentes de Garcia D’Ávila, estabelecendo sua propriedade
4 Pessoa sem nascimento nobre que era levada ao convívio e aos privilégios da classe dominante (ECOPLAM, 1995a)
33
da costa da Praia do Forte até a Vila do Conde e inicia o comércio dos produtos naturais e
manufaturados, construindo um porto próximo à foz do rio Sauípe, onde futuramente se
instalaria o povoado Porto Sauípe, facilitando a articulação da região com Salvador e Europa.
A notícia de inauguração deste porto em 1898 foi resgatada por Stifelman (1997), que fazendo
alusão á força, perseverança, inteligência e dispêndio de Schindler, menciona a obstrução de
20 metros de cordilheira de pedras que interceptava a navegação de barcos, o que veio a
possibilitar um escoamento mais ágil das mercadorias que antes viajavam a cavalo até a
estação ferroviária de Alagoinhas para então seguir para Salvador mas após a criação do porto
chegava-se em 10 horas a capital.
Em 1920, parte das terras, aproximadamente 80.000 ha, com 20 km de praia e 40 km de
profundidade, foram vendidas à companhia inglesa British and Brazilian Rubber Planters &
Manufaturados LTDA., que deu continuidade à exportação em especial ao látex da
mangabeira, mantendo o extrativismo como principal atividade econômica, tendo sido
introduzido o plantio de sisal, seringueira e algodão. A companhia arrendava as terras aos
moradores que lá viviam das atividades de subsistência e extrativismo e por um período de
ausência de seu administrador, moradores locais (de vila Sauípe) se responsabilizaram pela
arrecadação dos tributos e envio do dinheiro. Com a falência da companhia Inglesa em 1940 a
área é passada para o Banco de Londres que passa a responder por sua administração e, nove
anos depois, é vendida por um preço simbólico à empresa Construtora Norberto Odebrecht
(CNO), dona das terras até hoje e que, por quase 50 anos, não deu um uso específico à área
(STIFELMAN, 1997). Dos 80.000 ha originais a CNO titulou apenas 2.500 ha e desses
conservou apenas 1.700 ha, calculando-se que na época já havia três mil posseiros. Esse
período é lembrado pelos moradores locais como um tempo bom e de abundância dos
recursos naturais (ECOPLAM, 1995a). Só em 2000 foi implantado por essa construtora o
complexo turístico Costa de Sauípe em parceria com o grupo de Previdência dos Funcionários
do Banco do Brasil (Previ).
Nas décadas de 1950 e 1960 a região é incorporada à Região de Produção na Bahia da
Petróleo Brasileiro S/A (PETROBRÁS) que implanta campos de exploração de petróleo nos
municípios de Pojuca, Mata de São João , Entre Rios, Itanagra e Cardeal da Silva, gerando
empregos e alterando a composição social tradicional da região.
Já a área da antiga fazenda Praia do Forte é vendida pelo ex-governador Régis Pacheco,
descendente de Garcia D’Ávila, em 1922 para o Coronel Otacílio Nunes de Souza, que
desenvolveu um programa de mudas de coco associado à pecuária extensiva. Com a morte do
proprietário em 1939, inicia-se um período de conflitos acirrados entre os donos da terra e
34
posseiros. Somente em 1970 as terras são vendidas a Klaus Peter, que inicialmente tenta
recompor a empresa agropecuária mas termina construindo no local o primeiro resort das
redondezas.
A região do litoral norte manteve-se sobre as mesmas bases
econômicas e sociais até praticamente a década de 1970, desempenhando um
papel secundário na economia colonial. Uma região pouco povoada e com
uma composição social simples, polarizada entre o grande proprietário
fundiário, aí se incluindo família, agregados, empregados livres e escravos.
Articulados à casa grande do açúcar e da pecuária, fixaram-se diversos
extratos sociais, o escravo e os colonos que eventualmente recebiam parcelas
de terras para o plantio de subsistência. Essas propriedades deram origem a
pequenos núcleos populacionais (MATTEDI, 2002 p. 38).
Ao longo de décadas o grande latifúndio e a agricultura de subsistência coexistiram,
com uma população pouco expressiva concentrada nos pequenos núcleos. O isolamento foi
mantido pelas dificuldades de acesso que a área ainda apresentava em sua face litorânea.
O principal eixo de ligação, a BA-099, só foi construído na década de 1970,
estendendo-se a princípio do rio Ipitanga, no município de Lauro de Freitas até pouco depois
da ponte sobre o rio Pojuca, no município de Mata de São João . Ao longo desse eixo ocorreu
forte especulação imobiliária e conjuntamente com a implantação do Complexo industrial de
Camaçari impulsionou a expansão urbana sobre ecossistemas de grande relevância ambiental.
Quando foi ampliada em 1993, até o limite do estado com Sergipe, a estrada foi denominada
de Linha Verde por ter a área de sua implantação recuada em alguns metros, levando em
conta a preocupação com o ambiente frágil do seu entorno. Dentro dessa mesma lógica, foi
simultaneamente instituída uma unidade de conservação (APA) na tentativa de promover o
uso mais adequado do solo.
A rodovia e sua área de influência imediata propiciaram novas relações sociais e
econômicas, com uma comunicação direta de toda a região com a capital, em contraponto às
dinâmicas que, até então, só aconteciam em torno do sistema viário mais interiorizado, onde
se localizam, em geral, as sedes dos cinco municípios costeiros, à exceção de Conde, cuja
sede é localizada no litoral, a poucos quilômetros da linha de costa.
Com o crescimento de Salvador, a população metropolitana foi ocupando áreas cada vez
mais distantes do grande centro e tomando o litoral norte como seu principal vetor dessa
expansão, que se caracterizou como espaço de veraneio e lazer das elites.
35
Toda essa região viu iniciar uma nova dinâmica implementada por programas e
investimentos para o desenvolvimento de atividade turística, que será mais bem detalhado ao
longo deste capítulo, cujo início foi a experiência de Praia do Forte e se ratificou com a
implantação do Complexo Costa de Sauípe.
1.2 CARACTERIZAÇÕES SOCIAIS, ECONÔMICAS E AMBIENTAIS
1.2.1 Sociais
A população dos municípios da região econômica do Litoral Norte foi até a década de
1970 predominantemente rural, mas, sobretudo na década de 1980 as áreas urbanas tiveram
crescimento acentuado, chegando em 1991 com 65% da população domiciliada na zona
urbana e 35% na zona rural5. Em Mata de São João esses índices foram maiores do que a
média, contando com 79% da população em zona urbana e apenas 21% na zona rural devido à
precoce busca dessas áreas, se comparado aos municípios vizinhos6. Em área, a região
econômica do Litoral Norte é uma das menores do Estado, porém apresentava em 1991 uma
densidade populacional de 37,63 hab/km2, considerada alta se comparada à média estadual no
mesmo período de 21 hab/km2, mas que se explica pela tendência nacional e até mesmo
mundial de ocupar mais densamente as áreas litorâneas.
Do ponto de vista social, pode-se considerar que a população residente na região é na
sua maioria, jovem, pobre e com baixo nível de escolaridade, segundo relatório
socioeconômico do Prodesu (2001a), mais da metade da população (53%) tem idade inferior a
20 anos. O índice de analfabetismo é de 16% no município de Mata de São João , sendo a
maior incidência no meio rural e considera-se também que, mesmo entre a população
alfabetizada, o grau de escolarização é baixo.
5 O IBGE classifica os domicílios segundo sua localização que podem ser urbanos ou rurais, esse conceito foi definido por lei municipal em vigor em 1o de agosto de 2000. Em situação urbana consideram-se as áreas urbanizadas ou não, correspondentes às cidades (sedes municipais), às vilas (sedes distritais) ou às áreas urbanas isoladas. A situação rural abrange toda a área situada fora do perímetro urbano, inclusive os aglomerados rurais de extensão urbana, os povoados e os núcleos. Por aglomerado rural entende-se como localidade situada em área legalmente definida rural caracterizada por um conjunto de edificações permanentes e adjacentes, formando área continuamente construída, com arruamentos reconhecíveis ou dispostos ao longo de uma via de comunicação e podem ser subdivididos em: aglomerado rural de extensão urbana, aglomerado rural isolado – povoado ou aglomerado rural isolado – núcleo. 6 Censos Demográficos, IBGE dos anos de 1970, 1980 e 1991 apud ECOPLAM, 1995b.
36
Segundo o relatório Ecoplam (1995b), em algumas localidades em que a totalidade das
crianças em idade escolar está matriculada, a freqüência às aulas é bastante irregular,
sobretudo na alfabetização, primeira e segunda séries. A principal causa de desistências, no
entanto, é relacionada à necessidade de trabalhar, seguida por motivos de saúde. A solução
encontrada pelos estudantes de maior poder aquisitivo é o deslocamento em busca de melhor
qualidade de ensino. Os de primeiro e segundo grau vão para as escolas do município de
Alagoinhas, e os que querem cursar o terceiro grau procuram Salvador. Já para aqueles jovens
que migram em busca de trabalho, o destino mais comum é São Paulo.
A maior parte dos moradores nativos sobrevive de atividades tradicionais como o
roçado, a pesca e mariscagem ou o artesanato de piaçava, sendo pequeno o número de
assalariados. A sazonalidade do turismo cria instabilidade tanto no mercado formal como no
informal de emprego e a grande parte da população, sem atividade regular, acaba exercendo
diferentes funções ao longo do ano. O percentual dos que não recebem remuneração alguma é
mínimo, mas 14% da população recebem menos de um salário mínimo e 38% recebem menos
de dois salários mínimos, o que representa um baixo poder aquisitivo, especialmente após a
abertura da estrada e da chegada do capital estrangeiro à região, fato que tem encarecido o
custo de vida local.
De cada dez habitantes, oito são originários da própria região, a permanência da
população externa se verifica mais intensamente nos meses de verão, quando pessoas das
cidades próximas ocupam a segunda residência, além do grande afluxo de turistas brasileiros
e estrangeiros que se hospedam em pousadas nas vilas ou nos grandes empreendimentos
turísticos. Apesar do incentivo dado ao turismo nas últimas três décadas, surpreende a
permanência e o peso das atividades tradicionais que funcionam como alternativa de
ocupação e renda nos períodos de baixa estação (PRODESU, 2001a).
Os assentamentos urbanos são esparsos e pequenos, estimava-se em 1991 que na APA-
LN não havia mais do que 25.000 pessoas e apenas 16 povoados possuíam mais de 100
moradias e destas apenas três tinham mais de 500 moradias.
Com relação a saúde, a maior infra-estrutura oferecida é ligada a rede pública, apenas na
rede hospitalar as unidades são em sua maioria da iniciativa privada. O atendimento básico
nos postos de saúde se resume a curativos, aplicação de injeção, sutura, drenagem de abcessos
e acompanhamento pré-natal. Eventualmente se realiza um parto se este for normal e não for
possível a remoção da paciente. O Hospital Geral de Mata de São João conta com 30 leitos e
uma situação bastante precária, mas é devido ao difícil acesso à sede que leva os moradores
litorâneos a buscar socorro nas unidades de Pojuca ou Dias D’ávila, e nos casos mais graves
37
em Salvador. Nos atendimentos ambulatoriais, as doenças mais recorrentes são: pneumonia,
bronquite e crise asmática, desnutrição, desidratação e anemia, hepatite e escabiose. Nas
crianças os casos mais comuns são de desnutrição, verminose, varíola, dengue e meningite.
1.2.2 Econômicas
Com uma economia historicamente estruturada a partir da agricultura e à pecuária, a
região abastece a área metropolitana de Salvador e ainda desenvolve avicultura e suinocultura
destacando-se como uma das principais regiões produtoras do Estado.
Dentre as atividades agrícolas destacam-se àquelas realizadas em fazendas de coco e nas
empresas de plantação de eucalipto e pinho. A fruticultura só mais recentemente se
desenvolveu e ganhou representatividade com as culturas da banana, abacaxi, maracujá,
melancia e mamão. As culturas domésticas e de subsistência, como o pequeno roçado, se
baseiam nas culturas da mandioca, aimpim, feijão, mangaba, milho, manga, tomate, caju,
coco e na extração do palmito da piaçava, que têm os pequenos excedentes, vendidos nas
feiras locais. Dentre as atividades tradicionais estão inseridos também, a pesca, a construção
civil, o comércio simples e o artesanato de piaçava. Esse artesanato é responsável pela
ocupação, sobretudo das mulheres, chamadas tranceiras que coletam e beneficiam a palha da
piaçava criando bolsas, chapéus, esteiras, conjunto americano para refeição de diversas cores
e formatos, como faziam os índios Massarandupió.
Outra atividade econômica que se tornou representativa na região litorânea foi a de
‘reflorestamento’. Devido às condições propícias como concentração fundiária, baixo preço
das terras, disponibilidade de mão-de-obra barata já fixada nas proximidades, clima e
abundância de recursos hídricos, a região foi escolhida para sede de um distrito florestal que,
devido ao preço favorável da celulose e carvão vegetal, no mercado internacional, a Bahia
ganhou representatividade na atividade para a substituição energética.
Entrecortando vários municípios e com uma área de 763.000 há, esse distrito florestal
do Litoral Norte gerou um processo contínuo de desmatamento ao substituir a vegetação
nativa pela monocultura de eucalipto e pinus. E apesar das fábricas de celulose nunca terem
sido implantadas, a atividade exercida por empresas locais como as empresas Copener e
Sibra, gerou forte impacto ambiental e social, com maior concentração fundiária e
desalojamento de pequenos proprietários e posseiros há muito instalados na área.
Na década de 1980, por causa do aumento da demanda mundial houve nova tentativa de
implantação de uma unidade de produção de papel e celulose química branqueada pela
empresa Norcell. Ela acabou não sendo instalada, dentre outros fatores, por causa da forte
38
rejeição popular configurada por grupos ambientalistas, pequenos e médios proprietários de
terra além fato de vir de encontro aos interesses de grupos econômicos que já planejavam
implantar atividades ligadas ao turismo.
A área das propriedades rurais da região era em média de 32 ha, estando 33% da área
das terras nas mãos de menos de 1% do total de proprietários, os dados do censo demográfico
1995-1996, refletem a desigualdade na estrutura fundiária. Para a área litorânea, a média sobe
para 300 ha em geral fazendas de gado e coco. Com o avanço da especulação imobiliária, os
pequenos produtores vêm perdendo suas posses ou vendendo suas propriedades para a
silvicultura ou grandes proprietários de terra.
A construção civil aparece na estrutura produtiva, ao longo de todo o litoral, atribuída à
construção de casas de veraneio, mas especialmente de Mata de São João tem ocupado 20%
da população por somar a demanda das construções ligadas diretamente ao turismo. E no grau
de importância econômica vem, em seguida, a atividade relacionada à hospedagem e
alimentação. O turismo, apesar do incremento de empregos, destina à população local, em
geral, funções menos qualificadas de limpeza e segurança (MATTEDI, 2002).
A atividade turística se apresenta em duas escalas diferentes, de pequeno e médio porte
encontram-se as pousadas e pequenos hotéis, freqüentes em toda a extensão litorânea e no
turismo de grande porte encontramos os empreendimentos como o Complexo Costa de Sauípe
e Ecoresort Praia do Forte e novos empreendimentos a caminho, que alteram e impactam em
grande medida a dinâmica local ao incentivar o fluxo de turistas internacionais, fomentar a
melhoria de infra-estrutura viária, duplicação da estrada do Coco e provocar reflexos na
própria capital como a ampliação do aeroporto, divulgando esse litoral para todo o mundo.
1.2.3 Ambientais
Fruto do trabalho de consultores em parceria com a Conder, no início dos anos 1990, o
Zoneamento Ecológico da APA do Litoral Norte foi sem dúvida alguma, um marco
referencial na história dos zoneamentos de unidades de conservação no estado da Bahia.
Desenvolvido numa época onde não havia uma cultura ambiental nos órgãos governamentais,
esse trabalho representou um esforço de montagem de uma equipe interdisciplinar de
consultores, que interagindo com a equipe de técnicos da Conder, buscou produzir um
zoneamento onde aspectos ambientais fossem efetivamente incorporados ao planejamento.
Apesar do caráter inovador para a época que foi produzido, numa revisão dos conceitos
utilizados para a elaboração do mesmo, ele revela alguns problemas fundamentais que são
comentados por Lyrio (2004:15):
39
A proposta do zoneamento é essencialmente normativa, fundamentada em
conceitos dos antigos planos diretores urbanos, onde se acreditava que a pura
e simples definição de parâmetros restritivos por si só garantiriam o controle
do uso do solo. Portanto o zoneamento preocupa-se muito mais com o
controle, do que com a indução de um desenvolvimento compatível com as
possibilidades de desenvolvimento sustentável do território. Há uma
excessiva preocupação com a definição de parâmetros urbanísticos, em áreas
onde não existe nenhuma tendência real de crescimento urbano.
Uma questão importante a ser considerada é a compatibilidade dos produtos com a
escala do trabalho. Se for considerado que os levantamentos foram feitos na escala 1:25.000 e
que a maioria dos povoados estão inclusos em um raio de 250 m, dificilmente poderiam ser
definidos parâmetros urbanístico para estes povoados nessa escala de análise.
O zoneamento vigente é basicamente a mesma proposta de 1992 com pequenas
alterações aprovadas pelo Conselho Estadual de Meio Ambiente (Cepram) ao longo desses
anos. Ele contém 18 zonas classificadas como: Zona de Agricultura (ZAG), Zona de
Comprometimento Ambiental (ZCA), Zona de Comércio e Serviço (ZCS), Zona de Expansão
(ZEP I, II e III), Zona de Manejo Especial (ZME), Zona de Orla Marítma (ZOM), Zona de
Ocupação Rarefeita (ZOR), Zona de Ocupação Rarefeita Especial (ZORE), Zona de Proteção
Rigorosa (ZPR), Zona de Proteção Visual (ZPV), Zona de Reserva Extrativista (ZRE), Zona
Turística (ZT), Zona Turística Especial (ZTE), Zona de Uso Diversificado (ZUD), Zona de
Urbanização Prioritária (ZUP) e Zona de Urbanização Restrita (ZUR).
A tendência dos zoneamentos é de um menor número de subdivisões, que na medida do
possível, assemelhem-se às zonas das outras unidades de conservação, para que, quando se
falar em ZPR as pessoas saibam do que se trata e não apenas aqueles que trabalham
diretamente com a APA em questão (mapa 1.1).
Além do instrumento APA, a região, que é conhecida mundialmente, detém
ecossistemas ainda bem preservados graças a um processo lento de expansão e uma ocupação,
que ainda hoje e apesar dos investimentos governamentais, têm baixa taxa de crescimento
populacional graças a seu histórico de uso do solo e isolamento até a construção da rodovia.
A variedade de ecossistemas e paisagens encontradas é elevada, a exemplo de áreas
remanescentes de florestais, restingas, dunas, coqueirais, brejos, lagoas e manguezais,
sistemas ecologicamente frágeis e protegidos pela legislação ambiental. Uma das principais
características regionais, alardeada nos diagnósticos ambientais é a seqüência
40
oceano/praia/dunas/lagoas, que entremeada por rios e manguezais, confere grande beleza
cênica à área. Seus ecossistemas singularizam-se, também, pela expressiva variedade de
espécies animais, principalmente de aves raras e ameaçadas de extinção (LYRIO, 2001).
Ao sul da região, a leste da estrada Ba-099, a constituição ambiental se configura por
formações dunas, terraços marinhos baixos e altos, áreas úmidas, lagoas e mangues. Ao norte,
há presença de leques aluviais, embasamento cristalino e formação barreiras, tanto a leste
como a oeste da Linha Verde. A cobertura vegetal é entremeada por remanescentes de Mata
Atlântica, ocorrências de cerrado, predominância de restinga, além das áreas úmidas. A área
da praia aparece de dois tipos, a maioria é arenosa e sem obstáculos, mas dentre o total de
dezesseis, há aquelas com ocorrências de rochas de praia, afloramentos do embasamento
cristalino e recifes de corais e em geral o mar é bravio com correntezas fortes. Já a zona
submersa é rica em habitat, conforme caracteriza o relatório da zona marinha do Prodesu
(TESTA, 2001).
As águas da zona costeira em geral apresentam-se límpidas e transparentes, na zona
próxima à praia variando com a presença de sólidos em suspensão ou matéria orgânica
particulada. As águas turvas são mais facilmente encontradas a centenas de metros da costa e
sua extensão varia com a intensidade, direção dos ventos e correntes marinhas, em especial no
inverno quando chuvas e tempestades são freqüentes.
42
1.2.4 Instrumentos da política ambiental
A determinação política de investir em meio ambiente permitiu a criação e revisão de
muitas outras unidades de conservação da década de 1990 em diante. Conta-se hoje em todo o
estado um total de 28 APA’s sendo a maior parte localizada na região costeira. Só na região
econômica do Litoral Norte inicia-se ainda em Salvador a APA do Abaeté, que visa proteger
um complexo de lagoas e dunas; em seguida tem-se a APA Joanes-Ipitanga que visa preservar
os mananciais de água doce das represas de Ipitanga e o rio Joanes; contígua a ela, a APA Rio
Capivara que além de ordenar a ocupação às margens do rio de mesmo nome, conta com vilas
e lugarejos de importância cultural como é o caso da aldeia hippie em Arembepe. Na
seqüência tem-se a APA Lagoas de Guarajuba, a do Litoral Norte, que foi criada em 1992
(Decreto Estadual no 1.046/1992) e conta com uma faixa litorânea de 140 Km de extensão e
10 Km de largura, a partir da linha de costa somando um total de 1.384 km2, que se confunde
com a APA de Mangue Seco, famosa por seus areais, situada no limite do estado com
Sergipe. A última APA criada, já em 2003, foi a Plataforma Continental constituindo a única
Unidade de conservação em ambiente aquático de todo o litoral norte.
Apesar de todo o investimento, as atividades econômicas têm gerado impactos
negativos sobre o meio ambiente. Um reflorestamento não ocorreu na região e sim uma
monocultura de pinus ou eucalipto, com o uso descontrolado de fogo e sem respeitar as áreas
de APP’s7 ao longo de rios e vales exterminando a vegetação nativa. A pecuária extensiva
provocou o desmatamento de morros e matas ciliares, resultando em erosão e assoreamento
dos recursos hídricos. As áreas urbanas, em sua maioria, são carentes em infra-estrutura
urbana, como um adequado sistema de esgotamento sanitário, tratamento dos efluentes e
depósito de resíduos sólidos, o que acaba por contaminar o lençol freático e as águas
superficiais. A própria construção da linha verde continua gerando impactos com fortes
processos de erosão e assoreamento de riachos, colocando em risco a segurança dos
transeuntes (PEDREIRA NETO, 2001).
A pesca industrial destrói os estoques pesqueiros afugentando ou capturando em redes
de arrasto, peixes pequenos e médios que são constantemente encontrados mortos na costa e
não geram riquezas ao lugar por ser realizada por pessoas de outras localidades como Sergipe,
Salvador e sul da Bahia. A pesca artesanal e a mariscagem ocorrem muitas vezes sem
respeitar os períodos de defeso ou utilizando malha fina e que é altamente prejudicial à vida
7 Áreas de Preservação Permanente (APP’s) são áreas de florestas e demais formas de vegetação natural situadas ao longo dos rios e cursos d’água, lagoas e reservatórios, nascentes, topo de montes, montanhas ou serras,
43
marinha. Também a atividade turística, com a perenização ou aterro de lagoas e demais obras
civis, a retirada da vegetação dos manguezais, vem comprometendo a atividade pesqueira e
ameaçando seus estoques, via destruição de áreas de desova e de reprodução e de
comunidades vegetais e faunísticas, podendo resultar na extinção de espécies, especialmente
de peixes e insetos de lagoas (VIANA, REITERMAJER, 2000).
1.3 PROGRAMAS E PROJETOS
Nesta parte serão apresentados os três principais estudos que serviram de subsídio à
elaboração da análise e aplicação dos indicadores de sustentabilidade. O primeiro qualifica a
área para o uso turístico dentro da lógica do Programa de desenvolvimento turístico para a
Bahia, o segundo desenvolveu estudos temáticos e setoriais visando uma proposta de
rezoneamento dos recursos naturais e desenvolvimento de negócios na área turística e o
terceiro foi elaborado mais recentemente na esfera do Programa de Gerenciamento Costeiro e
consiste em uma proposta de macro-zoneamento territorial e estudos marinhos que inclui a
área da plataforma continental.
1.3.1 Pólo de Desenvolvimento Turístico Costa dos Coqueiros (PRODETUR)
A crise econômica ocorrida nos anos de 1980 se constituiu, segundo o Diagnóstico
sócio-ambiental dos municípios de Mata de São João e Entre Rios (versão preliminar), um
dos fatores que influenciaram o Governo do estado da Bahia a reacender a idéia de ter no
turismo uma alternativa econômica de desenvolvimento. Em sintonia com as estratégias
federais de descentralização das atividades turísticas do Sudeste, em especial o Rio de Janeiro
(cartão postal do Brasil), tendo em vista o grande potencial do Nordeste, é criado o programa
Prodetur- NE e como um detalhamento dele surge o Prodetur-BA.
O programa federal foi instituído em 1991 envolvendo a Superintendência do
Desenvolvimento do Nordeste (Sudene), a Empresa Brasileira de Turismo (Embratur),
Governos Estaduais, Banco Interamericano de Desenvolvimento e o Banco do Nordeste,
contemplando nove estados nordestinos.
Segundo Silva (2004) esse programa contempla um horizonte de vinte anos para
consolidação plena dos efeitos pretendidos, ou seja, um planejamento em longo prazo para
balizamento e estruturação da atividade, que tem como objetivos estratégicos o crescimento
encostas acima de 450, restingas, bordas de tabuleiros ou altitudes superiores a 1.888 m como definido pelo Código Florestal Lei no 4.771/65.
44
do turismo interno, aumento do fluxo turístico internacional, difusão de novos pontos
turísticos, aumento da permanência de turistas estrangeiros em território nacional e o
aproveitamento dos atrativos naturais em conciliação com a conservação da natureza e
preservação do patrimônio histórico e cultural.
Essa proposta de um planejamento integrado de turismo, dentro das diferentes esferas
de Governo, visando o controle e incentivo para uma prática mais sustentável, teve amplo
respaldo na Bahia que já contabilizava danos ecológicos resultantes da adoção desordenada
das atividades turísticas.
Em sua estratégia de expansão da indústria do turismo, o Governo da Bahia buscou a
instituição de parcerias, diálogo com segmentos da sociedade civil e dar incentivo aos
investimentos privados nacionais e estrangeiros, com foco no aprimoramento de infra-
estrutura básica e de transportes, na associação do turismo com a cultura e a ecologia e na
captação de eventos nacionais e internacionais.
O delineamento de um programa dessa magnitude mostrou-se
vantajoso do ponto de vista da competição internacional por destinos
turísticos, se comparado ao Caribe, México e Polinésia, haja vista a
disponibilidade de extensas áreas naturais, não-densamente povoadas,
dispostas ao longo do litoral e próximas a centros urbanos de pequeno e
médio porte (MATTEDI, 2001:16).
Visando promover o desenvolvimento sustentado e equilibrado das regiões foi proposto
em 1992, em seu relatório final, a abertura de novos espaços turísticos, privilegiando áreas
com atrativos naturais e culturais, com baixa densidade demográfica e infra-estrutura urbana e
de transporte. E foi devido ao grande potencial turístico do estado que sete diferentes regiões
turísticas foram criadas, com características peculiares a cada uma. A Costa dos Coqueiros,
cuja marca é plantação de coco ao longo de toda a orla, localiza-se no litoral norte, onde se dá
este estudo. Além dela encontra-se a zona turística da Baía de Todos os Santos (Região
Metropolitana e Recôncavo Baiano), a Costa do Dendê (área do Baixo Sul incluindo Morro de
São Paulo e Camamu), Costa do Cacau (região de Ilhéus), Costa do Descobrimento (região de
Porto Seguro e Cabrália), Costa da Baleias (área do Extremo Sul que contempla o Parque
Marinho de Abrolhos) e a Chapada Diamantina.
O modelo Prodetur parte então dessas grandes divisões territoriais, as sete regiões
turísticas, e dentro delas define divisões cada vez menores e mais específicas. As zonas
turísticas, por exemplo, englobam áreas urbanas e rurais, atrativos ecológicos e culturais que
45
mantenham uma identidade entre si e são compostas por centros turísticos que por sua vez,
são delimitados de acordo com a oferta de atrativos naturais e culturais e presença de infra-
estrutura urbana.
Para os menores elementos dessa proposta, foram definidos dois modelos de ocupação,
os complexos turísticos e os circuitos turísticos. Como exemplo do primeiro, há o complexo
turístico Costa de Sauípe instalado na Costa dos Coqueiros e que será visto com mais detalhe
ao longo deste trabalho, e como exemplo do segundo, foram criados na Chapada Diamantina
o Circuito do Ouro e o Circuito do Diamante, baseados nas diferentes trajetórias de
exploração dos recursos naturais não-renováveis, visando distribuir melhor a atividade
turística de acordo com a capacidade de carga máxima de visitação e a carga mínima
necessária para manutenção econômica dos estabelecimentos (GUERREIRO&BRITO, 1999).
Em ambos os casos, complexos ou circuitos se configuram por espaços estruturados
com equipamentos de suporte e serviço, estabelecimentos hoteleiros e infra-estrutura
compatível com o uso e ocupação do solo, estabelecidos no zoneamento ecológico-
econômico.
No caso da Costa dos Coqueiros as belas paisagens, a disponibilidade dos recursos
naturais e o pequeno grau de urbanização a tornaram atrativa aos investimentos turísticos.
Tendo sido destinado pelo Prodetur-BA em 1992 a soma de US$ 150 milhões para
aprimoramento da infra-estrutura básica a região (SILVA, 2004). São 193 km de extensão de
praia iniciados em Ipitanga no município de Lauro de Freitas até Mangue Seco em Jandaíra,
por onde um cordão duna acompanha o litoral de praias de água morna, margeando sistemas
lagunares e restingas que abrigam bromélias, orquídeas e cactáceas. Os grandes rios como
Joanes, Jacuípe, Pojuca, Imbassaí, Sauípe, Inhambupe e Real, além dos inúmeros riachos,
configuram uma área bem servida de recursos naturais, aliados às localidades pitorescas que
mantêm a história e tradição de tempos passados ou adotam práticas inovadoras como é o
caso da praia de naturismo em Massarandupió ou da aldeia hippie em Arembepe (BAHIA,
2003)
O aeroporto internacional Luís Eduardo Magalhães, em Salvador, é o principal portal de
entrada, tendo em vista o público brasileiros, especialmente, paulistas e cariocas, e os turistas
estrangeiros, provenientes da própria América do Sul como argentinos e chilenos, dos Estados
Unidos, Canadá e Europa, notadamente de Portugal, Espanha, França, Itália, Alemanha e
Inglaterra (McEWEN, 2001). Também por via marítima, em especial no período de novembro
a março, navios provenientes da costa brasileira e do exterior têm acesso às principais
localidades dessa zona turística. (mapa 1.2)
46
Os empreendimentos turísticos que se instalaram nesse litoral encontram-se ainda em
fase de expansão, mas já contam com 11.611 leitos distribuídos por resorts, hotéis e pousadas,
de acordo com BAHIA (2003) e vão buscar competir no mercado internacional com preços e
qualidade de serviço.
Os altos investimentos realizados não só na própria Costa dos Coqueiros, mas os
projetos de melhoria da infra-estrutura e pontos turísticos na região metropolitana e demais
zonas turísticas, como a ampliação do aeroporto e a restauração do Pelourinho, denotam a
determinação do Governo do Estado em fazer do turismo uma indústria ainda mais forte e
ampliam os focos e opções de lazer do turista, que pode se deslocar do Litoral Norte para
Salvador em busca de atividades culturais ou para o Litoral Sul em busca de atividades
ecológicas e esportivas, como já está previsto a integração de um circuito de campos de golfe
de 18 buracos, incluindo o novo Cub Med em Porto Seguro.
1.3.2 Programa de Desenvolvimento Sustentável (Prodesu)
O programa tem como área de aplicação a APA Litoral Norte, criada em Decreto
Estadual no 1.046/92, considerada então, a maneira mais adequada de assegurar o uso, já
direcionado para turismo, com a conservação da biodiversidade. Essa modalidade de unidade
de conservação é prevista na Lei 6.902 de 1981 do Sistema Nacional de Unidades de
Conservação (SNUC), que delega ao poder público nas suas três diferentes esferas, federal,
estadual e municipal, a declaração de áreas de preservação ambiental, de acordo com o
interesse público, a fim de preservar o bem-estar social e condições ecológicas de um
determinado local.
Tendo sido criada em 1992, a APA Litoral Norte teve a aprovação do seu primeiro
zoneamento e plano de manejo em 1995, definindo diretrizes e parâmetros de ocupação de
acordo com as perspectivas e projeções da época. Como a dinâmica que se instalou no local
foi um pouco diversa, com áreas cuja progressão da população não foi atingida e o aumento
de demandas não previstas, a APA que já teve seu zoneamento revisado e alterado, ganhou
mais recentemente nova proposta de zoneamento ecológico-econômico com o Prodesu, que
apesar de ter entrado em processo de discussão junto às instituições e grupos atuantes na área
para amadurecimento e legitimação, não teve seu processo concluído e nem aprovado.
Intitulado de Programa de Desenvolvimento Sustentável para a Área de Proteção
Ambiental do Litoral Norte da Bahia, o relatório publicado pelo Prodesu foi o resultado de
uma cooperação bilateral entre Brasil e Reino Unido que reuniu técnicos da Conder e as
47
empresas WsAtkins e NRI do Reino Unido, além da parceria com outros órgãos estaduais e
prefeituras municipais.
A proposta desse trabalho surgiu da necessidade de entender melhor o conjunto de
transformações e as dinâmicas ocorridas no final da década de 1990 e início de 2000, na faixa
litorânea norte do estado, bem como acompanhar, na área da APA LN, a relação da atividade
turística com os meios social e ambiental.
O Programa de Planejamento e Gerenciamento Ambiental (PPGA), que resultou no
relatório do Prodesu, foi iniciado em 1997 e finalizado em setembro de 2001, tendo como
premissas básicas a redução das desigualdades sociais com ênfase nas situações de maior
pobreza, diversificação das bases econômicas, com geração de maiores oportunidades de
emprego e renda, proteção e conservação dos recursos naturais e o estabelecimento de
mecanismos de participação social visando a gestão integrada e pactuada da região.
Como sub produtos desse trabalho foram elaborados relatórios temáticos tais como: o
social, que privilegiou conhecer o modo de vida e as relações estabelecidas pelas
comunidades tradicionais; o ambiental, com levantamentos dos ecossistemas terrestres e
marinhos; o econômico que detalhou os três setores de produção e mais as atividades
econômicas de peso como o turismo e ecoturismo, a pesca e a agropecuária e ainda foi
incluído um levantamento dos grupos e instituições interessados na região e as melhores
oportunidades de negócios.
Além das análises temáticas, configuraram também como produto uma proposta de
rezoneamento ecológico-econômico da APA LN, um guia urbanístico e um plano de
monitoramento e manejo do solo.
49
.3.3 Programa de Gerenciamento Costeiro (Gerco)
Incide sobre o litoral baiano o Gerco, visando o planejamento e uso sustentável de toda
a zona costeira. Segundo Mattedi (2001) o planejamento do litoral é estratégico para o uso
sustentável dos recursos naturais, já que as maiores densidades demográficas do Brasil
encontram-se na sua faixa litorânea e o país ainda apresenta altas taxas de crescimento
populacional.
A intensa ocupação costeira é um fenômeno identificado ao longo de toda a costa
brasileira que acabou por destruir grande parte da Mata Atlântica, restando apenas um
pequeno percentual da área de recobrimento original. É na distância máxima de 200 Km da
linha de costa onde se tem instalado mais de 80 milhões de pessoas, com uma densidade
média de 87 hab/km2, cinco vezes superior à média nacional, conforme alerta Lyrio (2004) no
relatório do Gerenciamento Costeiro. É por apresentarem graves problemas de saneamento
básico e altos índices de doenças endêmicas, mortalidade infantil e desnutrição, que o
planejamento deve voltar-se para as áreas litorâneas mais adensadas.
O Gerco, que tem como área focal o Litoral Norte da Bahia, foi aprovado no âmbito do
Programa Nacional de Meio Ambiente (PNMA II), componente Desenvolvimento
Institucional e sub-componente Gerenciamento Costeiro e é um programa desenvolvido pelo
CRA. Os recursos são assegurados por meio de convênio entre o Ministério do Meio
Ambiente (MMA) e o Governo do estado, com a finalidade de promover o fortalecimento da
capacidade gerencial do estado e dos municípios para a gestão costeira do Litoral Norte de
forma ordenada a fim de compatibilizar o desenvolvimento sócio-econômico com a
preservação dos recursos naturais da região. O programa abrange 13 municípios que totalizam
uma área de 7.760 Km2 e uma extensão de 200 Km (LYRIO, 2004).
O Programa visa a definição de uma estratégia de gestão, articulando instrumentos de
suporte normativo para a implantação de um Plano de Ação, associado a mecanismos de
monitoramento do Litoral Norte, tendo como foco principal os setores de desenvolvimento
urbano, turismo e unidade de conservação. Como benefício é previsto também proporcionar
ao estado e aos municípios da região o aprimoramento da gestão costeira e dar acesso, aos
principais segmentos, às informações geradas, servindo de apoio à tomada de decisão, tanto
na esfera pública quanto privada, gerando uma melhoria da qualidade ambiental e dos
serviços da atividade turística e de desenvolvimento urbano.
São beneficiários do Gerco: o poder público estadual e municipal do Litoral Norte, os
moradores, veranistas, turistas e empreendedores, para estes, o programa definirá regras mais
claras para a implantação dos empreendimentos e atividades nos diversos setores. Dentro dos
50
resultados esperados encontram-se: uma definição de estratégia de ordenamento
territorial/ambiental para todo o Litoral Norte, em especial para a área de abrangência da
APA; a instituição do plano estadual de gerenciamento costeiro através de instrumento legal;
a descentralização da Gestão Ambiental nos cinco municípios da APA do Litoral Norte, com
ênfase nos segmentos de desenvolvimento urbano e turístico; o aprimoramento da gestão
regional através do Plano de Gestão do Litoral Norte, levando em conta as diretrizes do ZEE;
o fortalecimento de diretrizes de disciplinamento do uso do solo de acordo com as diretrizes
do ZEE em associação com as atividades turísticas e das atividades de ecoturismo dos
municípios pertencentes a APA do Litoral Norte; além da melhoria da qualidade dos serviços
prestados pelas prefeituras para gestão da Zona Costeira em especial da orla do município de
Conde por meios do Plano de Intervenção de Orla.
1.4 OS MUNICÍPIOS DE MATA DE SÃO JOÃO E ENTRE RIOS
Dos cinco municípios constituintes da APA Litoral Norte, Mata de São João e Entre
Rios (mapa 1.3) são os localizados a sul e mais próximos da região metropolitana, nos quais
se percebe uma dinâmica mais intensa de transformação e mais claramente os impactos e
alterações provocados pela atividade turística. Já os demais municípios Esplanada, Conde e
Jandaíra continuam mantendo sua economia baseada na silvicultura, agropecuária e pesca.
A influência do turismo é especialmente sentida no litoral de Mata de São João , área
inicialmente escolhida para o detalhamento desse estudo, aonde vem ocorrendo
prioritariamente os reflexos do uso turístico e que concentra a maior parte das vilas e
povoados da região. Porém, na primeira tentativa de aplicação dos indicadores foi identificada
a incompatibilidade da área e escala adotadas neste trabalho com o nível de desagregação e
detalhamento dos dados disponíveis. Os primeiros mapas construídos com os dados do IBGE
não traduziam bem a realidade encontrada em campo pois os polígonos dos setores censitários
eram muito grandes e genéricas para o trecho delimitado a exemplo de não ter segmentado
localidades como Santo Antônio e Diogo enquadrados em um grande setor rural.
Na caracterização a seguir o município Mata de São João será tomado como principal
elemento de análise, com um maior detalhamento, e o município de Entre Rios, servirá de
parâmetro de comparação dos fenômenos que vêm ocorrendo no primeiro. Alguns dados da
região econômica Litoral Norte e Bahia serão também incluídos para uma melhor
compreensão das dinâmicas locais no contexto regional e estadual.
52
1.4.1 Configuração espacial e aspectos políticos-administrativos
As configurações espaciais, aqui entendidas como: formas, distâncias, relações de
proximidade ou pertença, desses dois municípios sofrem reflexos do histórico de uso e
ocupação do solo, ao mesmo tempo em que interferem nas dinâmicas atuais.
O município de Mata de São João criado em 1846, dista 56 km de Salvador e possui
uma área de 698 km2. Já o município de Entre Rios foi criado poucos anos depois, em 1872 e
está a uma distância de 134 km da capital, com uma superfície de 1.301 km2. Graças à
proximidade do aeroporto Luís Eduardo Magalhães, de porte internacional, é que se tornou
viável o deslocamento dos turistas para os principais atrativos da região.
Os dois municípios têm suas sedes localizadas em áreas mais interioranas que distam
em média 55 km do litoral de seu respectivo município, como reflexo da ocupação humana.
Essa situação prejudica bastante a integração entre as sedes das prefeituras e suas localidades
litorâneas, onde há grande necessidade de planejamento, controle e gestão. Os acessos entre
elas são bastante dificultados, bastando dizer que da Praia do Forte não existe estrada que
ligue à sua sede, sendo preciso passar por outro município (Camaçari) para se ter acesso à
cidade de Mata de São João, e ainda assim a condição das estradas é bastante precária. Fala-se
que se trata de estratégia política dificultar os acessos na tentativa de manter o litoral
inacessível para a população mais carente.
Ao se conhecer o perfil dos empreendimentos turísticos previstos para a área,
apresentados ainda neste capítulo, que são voltados a um consumidor de alto poder aquisitivo,
entende-se o porquê dessa diretriz de exclusão social.
Apesar das reclamações por parte dos donos de pousadas e comunidade local, da falta
de assistência e agilidade da prefeitura, também do lado institucional não se vê benefícios em
ser administrador das áreas onde mais circula dinheiro em toda a região, pois não há retorno
em impostos ou a associação dos nomes dos municípios às suas famosas praias. Apesar da
instituição de uma sub-prefeitura na orla, o que minimizou alguns problemas, as diferenças
entre o litoral e as sedes são imensas. Seria interessante que a política local fosse reestruturada
e fortalecida, começando a controlar e estruturar a ocupação litorânea, tomando as rédeas
desse processo.
A questão orçamentária é bastante séria e não condiz com a prosperidade da região. Em
termos tributários as principais fontes de recurso são os repasses do governo federal, do
Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) do governo estadual e os
royalties pagos pela Petrobrás (PRODESU, 2001a). De acordo com os dados do Ministério da
53
Fazenda, divulgados pela SEI, em 19988 a receita orçamentária de Mata de São João era da
ordem de R$ 9.386.612,00, a receita de transferência de R$ 7.544.493,00, enquanto sua
receita própria era de apenas R$ 1.842.119,00. A situação de Entre Rios é muito similar e de
mesma ordem de grandeza.
Apesar do quadro crítico de desestruturação das prefeituras municipais da
APA, o município de Mata de São João encontra-se melhor estruturado para
arrecadação de impostos, contando com o Cadastro Técnico e Imobiliário
para sua sede e outra estrutura de cobrança do IPTU para o litoral
(PRODESU, 2001:71).
A análise territorial desenvolvida no Prodesu qualifica a participação do Imposto Sobre
Serviços (ISS) e o Imposto Predial de Propriedade Territorial Urbana (IPTU) como ‘reduzida’
no total das fontes de recursos e alerta para a ‘fragilidade financeira das administrações’,
sinalizando o grau de dependência e limitação política, pois chega a haver um decréscimo de
arrecadação entre 1997 e 1998 (PRODESU, 2001b).
A fraca arrecadação tem alguns motivos claros, em primeiro lugar, constatam-se baixos
valores de faturamento declarados pelas pousadas, o que levanta a possibilidade de
sonegação; segundo, os grandes empreendimentos, como é o caso do Complexo Sauípe, ficam
isentos de impostos territoriais por dez anos podendo ser ampliado, uma única vez, por igual
período, como forma de incentivo à sua instalação na região; em terceiro, encontra-se a
desestruturação e frágil controle municipal, potencializado pelas distâncias, recursos escassos,
limitação de equipamentos e infra-estrutura, além do baixo número de funcionários
qualificados. Com esse cenário, o que se vê é que a área litorânea fica praticamente
independente da administração municipal, porém sob a tutela do estado, identificada nas
intervenções físicas da Conder (calçamento, iluminação, coleta de lixo, construção de aterro e
estações de tratamento) e nos esforços dos demais órgãos estaduais como o Superintendência
de Recursos Hídricos (SRH) e o CRA, que atuam prioritariamente nessa região.
Quanto à dinâmica populacional da região percebe-se que houve um pequeno
decréscimo nos períodos de 1980 a 2000. Segundo o Censo demográfico em 1980 Entre Rios
estava em terceiro com 22.545 pessoas e Mata de São João em quinto na escala de municípios
mais populosos da região econômica do Litoral Norte. Já em 2000, Entre Rios passou a
ocupar o quarto lugar, sendo ultrapassado por Conde, e Mata de São João desce para o sétimo
lugar, com 32.568 pessoas (CEI, 1994 apud ECOPLAM, 1995b).
8 Dados obtidos no portal da SEI: http://www.ba.gov.br
54
Para o trecho litorâneo essas populações decaem para 5.666 pessoas ou 17,5% em Mata
de São João, e 3.578 pessoas, o equivalente à 11% em Entre Rios. (PNAD/IBGE,1996 apud
PRODESU 2001b) Por falta de dados mais recentes, fica difícil avaliar estatisticamente o
reflexo do turismo, que foi incrementado a partir de 2000, sobre a região, no entanto, em
visita ao local é fácil identificar as áreas de ampliação da ocupação com a construção de
novas residências e implantação de projetos turísticos.
Em 2000, a população urbana já era bastante expressiva, em Mata de São João quase
25.000 pessoas morando em áreas urbanas enquanto apenas 7 mil permaneceram no campo.
Com taxas urbanas ainda um pouco menores, Entre Rios. segue o mesmo perfil. Nesse sentido
a atividade turística vem reforçar a tendência de concentração nas áreas urbanas já existentes
ou criando novos locais (não-urbanos) de concentração de pessoas, como é o caso da Costa do
Sauípe.
1.4.2 Aspectos ecológicos e atrativos naturais, culturais e históricos
Todo o trecho litorâneo norte do estado da Bahia é recheado de belas paisagens, águas
mornas e praias extensas. Nem sempre o mar é apropriado ao banho, mas apresenta outras
opções de lazer e diversão como o surf e esportes radicais, caminhadas e contemplação da
natureza.
Além de oferecer todas as opções mencionadas os dois municípios em foco apresentam
outras peculiaridades. Em Mata de São João , para quem vai de Salvador, logo de início tem-
se a Praia do Forte com os encantos do Castelo Garcia D’Ávila (figura 1.1), importante
patrimônio brasileiro, cujas ruínas são consideradas como a primeira grande obra residencial-
militar dos portugueses no Brasil (BAHIA, 2003). A antiga vila de pescadores, transformada
em um núcleo urbano local, possui muitos atrativos, em destaque o Projeto Tamar se
consolidou mesclando sua atuação à imagem da Praia do Forte, cujo símbolo é uma tartaruga
marinha. A missão de recuperar as quatro espécies de tartarugas ameaçadas de extinção:
Careta careta (cabeçuda), Eretmochelys imbricata (tartaruga-de-pente), Chelonia midas
(tartaruga verde) e a espécie Lepidochelys olivacea (tartaruga oliva), sensibiliza e atrai turistas
e comunidade local, constituindo um elemento diferencial e de grande aceitação
mercadológica.
Outro grande chamariz da região é o empreendimento Ecoresort (figura 1.2), primeiro
empreendimento turístico a divulgar no exterior a Praia do Forte. Muitos passeios, trilhas e
entretenimento são colocados à disposição dos hóspedes graças a seu cunho ecológico que vai
desde a concepção do projeto arquitetônico à administração dos resíduos sólidos. A iniciativa
55
de maior representatividade ambiental é a manutenção da Sapiranga, uma Reserva Particular
do Patrimônio Natural (RPPN) de mata atlântica, administrada pela fundação Garcia D’ávila,
grupo fundado pelo proprietário da grande fazenda, Klaus Peter.
Forte atrativo natural da região é a baleiada. No período de julho a novembro, quando as
baleias Jubarte (Megaptera novaeangliae) migram para acasalar e parir seus filhotes, é
possível avistá-las a umas 6 ou 10 milhas da costa. Eventos como este reforçam a importância
da manutenção da qualidade ambiental e conseqüentemente da fauna local e migratória
(BAHIA, 2003).
Na praia de Imbassaí (figura 1.3), ainda não se tem um grande empreendimento
dominante, mas uma profusão de pequenas hospedarias que atendem ao público que busca o
que essa praia tem de melhor: muito sol, dunas, coqueiral e lagoas que proporcionam banhos
de água doce e salgada com o encontro do rio e do mar.
Na pequena vila de Santo Antônio a comunidade nativa produz com o artesanato de
palha de piaçava, bolsas, chapéus, tapetes, conjunto americano para mesa em diversas cores e
formatos, que atraem turistas locais que se hospedam em Diogo e os visitantes do Complexo
turístico Costa do Sauípe.
No município de Entre Rios, logo na divisa encontra-se Porto Sauípe, um povoado de
pescadores, marisqueiras e artesãs, beneficiado com um porto natural e infra-estruturas
turísticas básica com bares, restaurantes e hotéis. A praia não é adequada ao banho devido às
ondas fortes e plataforma de pedras na linha da preamar (figura 1.4).
Aliado ao banho de mar, nessa região é possível enveredar em aventuras esportivas.
Essas opções são cada vez mais procuradas pelos turistas e atrai um público diferenciado que
gosta de muita atividade. O rio Sauípe, por exemplo, é um atrativo natural que pode ser
Figura 1.1. Castelo Garcia D’ Ávila. Praia do Forte, Mata de São João -BA, 2004. Fonte: Arquivo da autora.
Figura 1.2. Empreendimento turístico Ecoresort. Praia do Forte, Mata de São João -BA, 2004. Fonte: Arquivo da autora.
56
percorrido pelas margens, com carro tracionado ou a pé, mas a maior parte é realizada em
canoas de madeira ou botes de alumínio. A vegetação ao longo do rio encontra-se em bom
estágio de conservação e ao longo do passeio é possível avistar espécies da avifauna local.
Grande peculiaridade da região é a praia de naturismo, a primeira oficialmente
decretada no estado, em 1999, localizada no povoado de Massarandupió.
Última localidade, no sentido norte, do município de entre Rios, Subaúma é atualmente
um povoado de pescadores já compartilhado com os veranistas. Sua praia é urbanizada, com
muitas barracas e restaurantes e na maior parte conta com a presença de recifes costeiros que
provoca ondas fortes, especialmente na maré alta, sendo o melhor trecho para banho próximo
à foz do rio Subaúma, na divisa do município com Esplanada.
1.4.3 Vilas e povoados
Face às novas mudanças, o processo de urbanização do litoral acelera e aumenta o
contraste entre o desenvolvimento das povoações costeiras e as interioranas localizadas à
oeste da Linha Verde. Para os povoados costeiros, as especulações imobiliária e fundiária
impulsionadas pela dinâmica do turismo refletem-se na intensificação do crescimento,
destacando os locais de veraneio com o crescente número de hotéis, pousadas e restaurantes
para atender a demanda de visitantes. Essa situação é classificada como uma grave
decorrência do desenvolvimento da atividade turística
[...] que lançou em um espaço de isolamento as comunidades que, com a
abertura da BR-099, ficaram do lado oeste. Essas comunidades, antes
localizadas em território contíguo às demais, foram seccionadas pela
rodovia, encontrando-se hoje em situação de grande desvantagem em relação
Figura 1.3. Presença intensa de veranistas na praia de Imbassaí. Mata de São João -BA, 2004. Fonte: Arquivo da autora.
Figura 1.4. Praia de Porto Sauípe. Entre Rios BA, 2004. Foto: François Michel.
57
às outras localidades praianas. Os maiores focos de pobreza encontram-se,
não por acaso, a oeste da linha verde, bem longe do mar e dos olhos daqueles
que passam pela estrada (MATTEDI, 2002 :120).
As comunidades situadas a oeste da pista como Açu da Torre, Açuzinho, Malhadas e
Barro Branco são pouco estudadas ou documentadas pelos inúmeros trabalhos desenvolvidos
sobre região. No caso de Barro Branço é interessante ressaltar que ela foi notoriamente
desconectada de Imbassaí e colocada à margem de todo o processo de investimento e
requalificação urbana com a implantação da estrada do Coco. Devido ao porte e importância
das comunidades situadas à leste da pista, elas serão apresentadas com um maior
detalhamento, para compreensão das dinâmicas regionais. As principais localidades costeiras
são: Praia do Forte, Imbassaí, Costa do Sauípe em Mata de São João e Porto Sauípe em Entre
Rios, incluindo apenas a Vila Sauípe, situada a oeste da pista, por ter se tornado uma
referência de projeto social bem sucedido localizado às margens de um mega projeto turístico.
PRAIA DO FORTE
Originariamente uma vila de pescadores, que viviam também da produção agrícola, de
frutas, artesanato da palha da piaçava (figura 1.5), teve suas terras compradas pelo paulista
Klaus Peter ainda na década de 1970. Em 1979 foi aprovado o loteamento que destinava a
maior parte das terras para lotes residenciais, áreas verdes, arruamentos, área de lazer e
turismo visando a implantação do complexo turístico e do parque Garcia D’Ávila. O primeiro
projeto turístico de envergadura nasceu aí, afetando a sociedade e o meio ambiente, o turismo
até então estritamente regional, passa a ser concebido em novos moldes, voltado para o
mercado nacional e internacional (GONÇALVES, 1998).
A localidade possui calçamento e infra-estrutura urbana recente (figura 1.6), realizada
pela Conder e suas principais ruas são fechadas para circulação de automóvel, o que acaba por
priorizar o pedestre e manter um ambiente mais tranqüilo. Há padronização das placas dos
estabelecimentos comerciais e na avenida principal ficam localizadas as lojas mais caras, com
grifes internacionais.
58
O crescimento da ocupação foi desordenado e grande parte dos antigos moradores se
mudou para as regiões vizinhas como Sapiranga e Açuzinho. Atualmente a legislação criada
pelo proprietário das terras procura inibir a saída dos nativos, como medida para manter os
traços de uma vila bucólica. Ao contrário da maior parte das vilas litorâneas que não possuem
estratificação social bem demarcada, em Praia do Forte essas diferenças são marcantes. Têm-
se os ‘novos’ moradores, constituídos de estrangeiros ou sulistas que trabalham com o
turismo, donos de lojas, pousadas e restaurantes e do outro lado os nativos, que desenvolvem
atividades tradicionais ou são incorporados como mão-de-obra barata por causa da não
qualificação profissional. Alguns habitantes locais possuem também seus negócios, porém
com uma lucratividade bem inferior. Essa diferença pode também ser claramente percebida no
padrão construtivo das moradias ou nos locais freqüentados por um e por outro grupo e
servem como ilustração de como uma atividade econômica, quando não direcionada para
beneficiar o seu entorno, gera enclaves sociais.
Encontram-se aí três modalidades de pesca: artesanal, industrial e esportiva. Entende-se
por esportiva a pesca realizada por veranistas em época de temporada, a industrial é realizada
principalmente por barcos provenientes de outras localidades, que aportam na Praia do Forte
para escoamento da produção, graças à qualidade e disponibilidade de dois portos Tatuapara e
Do Farol, um dos melhores de todo o Litoral Norte. Quanto às embarcações locais, essas não
possuem as características e a qualidade necessária para esse tipo de uso, sendo construídas
ainda de maneira rudimentar A pesca artesanal que ocorre no mar e no rio, representa ainda
importante fonte de renda e costuma se aliar a outras atividades tradicionais tais como o
roçado, coleta de frutas, artesanato, prestação de serviço nas fazendas de coco ou mesmo com
o turismo (VIANA& REITERMAJER, 2000).
Figura 1.6. Rua principal, Praia do Forte. Mata de São João -BA, 2004. Foto: François Michel.
Figura 1.5. Artesanato de palha Praia do Forte, Mata de São João -BA, 2004. Fonte: Arquivo da autora.
59
O turismo da Praia do Forte é direcionado para um público de elite pois oferece serviços
de hotel, pousadas e restaurantes de excelente qualidade (a exemplo do Ecoresort), com
preços inviáveis à maior parte da população, o que não inviabiliza o turismo de massa que
ocorre aos finais de semana e se hospeda em locais menos honerosos como o Albergue ou o
camping.
Grande empreendimento turístico, o Praia do Forte Ecoresort está numa área de 250 mil
metros quadrados, com 90 mil de área construída e bem integrada a natureza. Sua arquitetura
é harmoniosa e usa muita matéria-prima local como as escadas de madeira e bambu e o teto
de piaçava. São 247 apartamentos de padrão internacional e diversos serviços prestados. Há
restaurantes, quadras de tênis, academia de ginástica, atividades náuticas, entretenimento
infantil, serviço de babá, lojas e boutiques, salão de beleza e centro de convenções, além das
opções de pesca oceânica, curso de mergulho, trilhas e caminhadas ecológicas, visita a locais
históricos abrindo o leque para quem procura lazer, aventura, esporte, descanso ou trabalho.
IMBASSAÍ
Sua ocupação se iniciou como um loteamento desordenado e sem coerência urbanística,
realizado por agentes imobiliários locais (GONÇALVES, 1998), acabando por se tornar um
amontoado de ruas (figura 1.7) e casas distribuídas caoticamente sem qualquer infra-estrutura
urbana ou preocupação estética A ausência clara de diretrizes de controle da ocupação do solo
aliada à falta de infra-estrutura compromete a beleza natural do lugar.
Próximo ao rio Imbassaí existe maior concentração de pousadas, casas de veraneio e de
moradores, poucas edificações comerciais. O local conta atualmente com 38 pousadas em
funcionamento, as quais oferecem 1.372 leitos, além do camping que tem capacidade para 30
barracas. As residências também apresentam padrão construtivo simples, não ultrapassando
dois pavimentos (figura 1. 8).
Figura 1.8. Padrão construtivo de Imbassaí, Mata de São João -BA. Foto: François Michel.
Figura 1.7. Padrão de ruas Povoado Imbassaí, Mata de São João -BA. Foto: François Michel.
60
A estratificação social também é clara e pode-se observar quatro grupos distintos: os
barraqueiros locais, que sobrevivem exclusivamente dessa atividade, os moradores nativos
cuja renda familiar é proveniente dos serviços prestados nas pousadas, da pesca, da
mariscagem e das construções, os veranistas cujas residências possuem um melhor padrão
construtivo do que dos nativos e os pousadeiros que usufruem de condições sociais
privilegiadas possuindo o nível de escolaridade superior, sendo em sua maioria oriundos de
outras regiões (MATTEDI, 2002).
A pesca sofreu muita modificação com a intensificação da atividade turística.
Atualmente nenhum pescador sobrevive exclusivamente da pesca ou mariscagem que vem
associada a outras atividades econômicas, pois esta já não sustenta mais uma família. A pesca
é artesanal e ocorre no mar com o uso de jangadas, que é cada vez menos freqüente, na linha
da praia com linha ou rede de espera ou no próprio rio, onde se dá a mariscagem com rede de
arrasto (VIANA& REITERMAJER, 2001).
A procura do local se dá por um turista menos abonado (veranistas ou visitantes) que
procuram também um local menos badalado que a Praia do Forte. As pousadas possuem
instalações bem simples e agradáveis, que exploram o potencial estético das áreas verdes para
colocar o turista em contato com a natureza. A maioria destas pousadas possuem tipologia
arquitetônica rústica, dispostas em forma de chalés, quiosques, cabanas e bangalôs e oferecem
em média 12 dormitórios por pousada.
Está tramitando na Conder, a proposta de requalificação urbanística e recuperação
ambiental de Imbassaí, que deve ser avaliada conjuntamente com outras instituições parceiras.
Essa proposta tem como objetivos específicos melhorar o acesso à área; ampliar e dotar de
pavimentação as vias internas; implantar passarela de pedestres sobre o Rio Imbassaí; criar
infraestrutura para os visitantes e áreas de lazer e contemplação. Como medidas de
recuperação e reordenamento estão previstas a proteção e recuperação das áreas de
preservação permanente ao longo dos rios (APP’s); padronizar e reorganizar barracas de
praia; estabelecer plano de manejo para a revegetação aliado a um programa de educação
ambiental. Essas medidas visam resgatar a beleza natural da praia de Imbassaí ao mesmo
tempo que incentiva um maior desenvolvimento do turismo com a implantação de projetos e
programas sempre prevendo a utilização de mão-de-obra local.
Os estudos sócio-ambientais realizados para este Projeto de recuperação
ambiental e de requalificação urbana da Vila de Imbassaí demonstraram que
esta localidade, apesar de suas notáveis belezas naturais e de seu
extraordinário potencial turístico, encontra-se, guardada as devidas
61
proporções, em uma situação semelhante à maioria das comunidades
também situadas ao longo da costa da APA-Litoral Norte, onde o baixo nível
de renda da população original, a especulação imobiliária, a falta de oferta
de trabalho e a carência de equipamentos sociais, de infraestrutura e de
serviços urbanos, estão contribuindo para uma degradação crescente dos
seus recursos naturais, que representam justamente o principal produto da
economia local (BAHIA, 2004 p. 20).
Uma proposta como essa virá intensificar o potencial turístico e mexer na configuração
social da comunidade. Apesar dos cuidados com o meio ambiente, a densificação do uso
pressionará mais ainda os recursos naturais e como se registrou na Praia do Forte, acentuará
as diferenças culturais, econômicas e sociais.
Embora Imbassaí possua atualmente uma população esparsa existe forte tendência de
crescimento em face da previsão de loteamentos no seu entorno e equipamentos de porte
ligados ao lazer.
COSTA DO SAUÍPE
A proposta do complexo turístico nasceu de um estudo de viabilidade, realizado por
especialistas em desenvolvimento e implantação de empreendimentos turísticos. Esse grupo
incluiu a Arthur Consulting Group, Howarth International, Edward Stone Jr. & Associates,
André Sá & Francisco Mota arquitetos e Wimberley Allison Tong & Go foi elaborada uma
proposta condizente com as tendências de mercado para ser capaz de competir com os
principais pólos turísticos do mundo (ODEBRECHT, 1999 apud SILVA, 2004). O grupo de
Previdência dos Funcionários do Banco do Brasil (Previ) que possui 96,7% das ações,
investiu cerca de R$ 450 milhões no projeto e sua administradora é a Sauípe S.A, empresa
criada exclusivamente para este fim. Todo o planejamento dessa obra foi consolidado em
estreita comunicação e incentivo do poder público estadual (MOLLICONE-FILHO, 2001).
O plano diretor do empreendimento subdividiu os 1.754,92 hectares da fazenda Sauípe
em 5 macro áreas, com temáticas e públicos diferenciados, são elas: Vila Nova da Praia, Vila
da Colina, Vila Ecológica, Vila do Porto e Vila Agrícola A proposta inicial previa a
construção de 62 hotéis, sendo dois hotéis-fazenda, e os demais no padrão entre 3 e 5 estrelas,
60 pousadas com no máximo 50 quartos, quatro campings, totalizando 65.366 opções de
hospedagem, além das opções de lazer, trabalho e serviços, para um horizonte de 20 anos de
obra (ECOPLAM, 1995a). Um projeto audacioso que propunha um adensamento
62
populacional similar às áreas urbanas de grande porte. Na primeira etapa, apenas a Vila da
Praia (um décimo de projeto original) foi construída, com cinco hotéis de escala internacional
(Marriot Resort & SPA, Renaissance Resort, Super Clubs Breezes, Sofitel Costa do Sauípe e
o Sofitel Suites & Resort) e seis pousadas temáticas (Aldeia, figura 1.9, Da Torre, Carnaval,
Pelourinho, Agreste e Gabriela) fora o centro equestre (figura 1.10), o centro náutico, centro
de golfe, o SPA, centro poliesportivo, centro de tênis e as áreas de comércio e serviço da Vila,
com a inauguração datada de outubro de 2000. A figura 1.11 mostra uma visão geral deste
Complexo.
Com o lema ‘educar pelo lazer’ esse mega empreendimento tem como diferencial a
catalização e investimento em eventos de grande porte. Só no primeiro ano sediou a Copa
latina e o VII Mundial de Beach Soccer, o Desafio Espetacular de Volei de Praia, o Aberto de
Tênis Costa do Sauípe e o Open Brasil que contou com a presença do tenista Gustavo Kurten;
a Primeira Gincana de Pesca, o Campeonato Brasileiro de Amazonas e continua a sediar
shows com grandes nomes da música brasileira a exemplo de Ana Carolina e Rita Lee.
Atividades inovadoras incluem o rol oferecido pelo empreendimento como o circuito
internacional de golfe (Projeto conheça o Brasil jogando golfe) e as competições de enduro
eqüestre do Circuito Brasil, modalidade recente que vem ganhando muitos adeptos. Esse
perfil globalizado do Complexo (para os incluídos financeiramente) se distancia da realidade
local, até mesmo as riquezas naturais, como as praias, são pouco valorizadas. A idéia é criar
um ambiente que usa temas folclóricos do local mas, de uma maneira estilizada e
cuidadosamente construída.
Figura 1.9. Pousada da Aldeia. No detalhe vê-se o Hotel Renaissance Resort. Complexo Turístico Costa do Sauípe - BA, 2004. Fonte: Arquivo da autora.
Figura 1.10. Centro eqüestre. Complexo Turístico Costa do Sauípe, - BA. Foto: François Michel, 2004.
63
As instalações e equipamentos de apoio foram instalados fora da área do
empreendimento, tanto os financiados pela iniciativa privada (lavanderia, alojamento para
empregados, figura 1.12), quanto os da contra-partida do Estado como a Estação de
Tratamento de Água (ETA), foram construídos em Vila Sauípe, do outro lado da estrada,
gerando conflitos sociais e impactos ambientais. (figura 1.13)
O projeto Sauípe passou por um longo processo de licenciamento ambiental, um total de
15 licenças entre autorizações, licença de localização, licença de implantação, operação e
outras de atividades específicas do projeto, por se enquadrar como empreendimento com
Figura 1.11. Foto aérea do Complexo Turístico Costa do Sauípe, Mata de São João -BA. Foto: Ronaldo Lyrio, 2000.
Figura 1.12. Alojamento para funcionários do Complexo Turístico Costa do Sauípe, BA.Fonte: Arquivo da autora.
Figura 1.13. Estação de Tratamento de Água (ETA) do Complexo Turístico Costa do Sauípe, Mata de São João -BA. Fonte: Arquivo da autora.
64
potencial de impacto sobre o meio ambiente e ainda estar inserido em APA. Para ele foi então
elaborado um EIA, o que inclui a discussão com a sociedade e instituições governamentais e
de ensino, em fóruns abertos para debate. Esse processo de audiências públicas mobilizou
bastante a comunidade local que se manisfetou plenamente favorável à implantação do
projeto na expectativa de incremento de emprego e renda. Os pareceres técnicos emitidos pelo
CRA incluíram 42 condicionantes na sua fase de operação dos quais somente 38 foram
atendidos. Para as áreas de desmate, foi solicitada licença ao Instituto Brasileiro dos Recursos
Naturais Renovaveis (Ibama) que permitiu a supressão de 18 hectares porém na prática está
área foi em muito superada. Constam também erros de projeto no sistema de tratamento de
efluentes ainda não corrigidos. Devido a todos os problemas ambientais ainda pendentes, a
Sauípe S.A, preocupada com sua imagem de poluidora formalizou junto ao Ministério Público
Federal a solicitação de uma inspeção conjunta, com o CRA, prefeitura locais e demais
representantes das comunidades interessadas para acordo entre as partes e resolução das
pendências. Dessa inspeção foi elaborado um Termo de Ajuste de Conduta, mas as
reinvindicações continuam, especialmente quanto à Estação de Tratamento de Efluentes
(ETE) do empreendimento denominada popularmente de ‘pinicão’ (SILVA, 2004).
Constam como iniciativas sociais e ambientais o Projeto Berimbau, uma parceria da
Previ com a Universidade Federal da Bahia (UFBA), a Sauípe S.A. e Odebrecht, que
desenvolve ações de fortalecimento e integração de cadeias produtivas, como a estruturação
do artesanato e mais recentemente a usina de compostagem que pretende reciclar os resíduos
do complexo gerando adubo para os pequenos agricultores da região. Também o Instituto de
Hospitalidade (IH), uma organização não-governamental que promove a educação e cultura
da hospitalidade no Brasil, realiza cursos, oficinas e intercâmbio de técnicas entre artesãos
que visam à estruturação de uma cadeia de produção dentro dos moldes aceitos pelo mercado
formal. O programa desenvolvido na Costa dos Coqueiros conta com a parceria das
comunidades, diferentes instâncias de governo (destaque para as prefeituras de Mata de São
João e Entre Rios), operadoras hoteleiras como o Marriot, Breezes, Accor, a própria
Odebrecht e Sauípe S.A além do Serviço Nacional de aprendizagem Comercial (Senac),
Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae)-BA, Fundação Banco do
Brasil e o Instituto Souza Cruz9.
9 Informações disponíveis na Internet em .http://www.hospitalidade.org.br, acessado em dezembro de 2004.
65
VILA SAUIPE
Vila inicialmente composta por pescadores e lavradores, de arruamento irregular, casas
pequenas e áreas verdes, foi até bem recentemente uma pacata vila do interior, mas hoje tem
quase toda a sua população ativa assimilada pelo complexo turístico, tendo se tornando uma
extensão do empreendimento já no período de obras e continua a receber influência direta do
empreendimento (figura 1.14).
Com a economia baseada no plantio de mandioca e pequeno fabrico de farinha somado
ao plantio de coco, produção do artesanato de palha de piaçava, pesca e mariscagem, a
comunidade que viveu desde os tempos coloniais basicamente das atividades tradicionais que
podiam ser exercidas livremente em terras de terceiros (STIFELMAN, 1997), passa
desenvolver atividades ligadas à construção civil, comércio e serviços de apoio ao turismo e
tem a sua relação com os recursos naturais (acesso, disponibilidade e qualidade) alteradas.
O artesanato na vila tem sido objeto de projetos para a profissionalização, formação e
transmissão de tradição e cultura, recebendo incentivos do Projeto Berimbau, do IH, Sebrae e
diretamento da Sauípe S.A. Atualmente o grupo de artesãs conta com uma oficina de
artesanato e realiza seus trabalhos seguindo tamanhos e padronagens procurando dar
qualidade ao produto final. Nessa parceria, o artesanato local ganhou destaque em uma lojinha
exclusiva na área comercial da Vila da Praia, Costa do Sauípe e já é comercializada para o
exterior (figura 1.15).
Figura 1.14. Vila Sauípe, Mata de São João -BA. Fonte: Arquivo da autora.
Figura 1.15. ArtesanatoVila Sauípe, Mata de São João -BA. Fonte: Arquivo da autora.
66
PORTO SAUÍPE
Apresentando uma estrutura urbana similar aos demais povoados do LN, iniciada como
uma aldeia de pescadores, a comunidade registrou, durante a implantação da Linha Verde, um
crescimento urbano intenso. No seu entorno acontece forte especulação imobiliária sendo que
no final da década de 1990 já contava com 10.000 lotes aprovados pela prefeitura, porém
desprovidos de infra-estrutura urbana adequada (GONÇALVES, 1998).
Localizada às margens do rio Sauípe, no município de Entre Rios, a localidade é a
maior e melhor estruturada das redondezas e apesar disso ainda registra casas de taipa e
residências sem banheiros ou sistema de esgotamento adequado (SILVA, 2004). Desprovida
de um planejamento urbanístico, as edificações são construídas aleatoriamente sobre áreas de
fragilidade ambiental, como mangues e dunas (figura 1.16). Com ruas de barro e casas de
tijolo a localidade não tem harmonia e beleza, especialmente na proximidade da foz do rio; a
ocupação espontânea e apinhamento das barracas de praia favorecem o aspecto negativo e
nada vendável em termos turísticos (figura 1.17).
Segundo o Censo 2000 (IBGE, 2003) o núcleo urbano contava com 191 domicílios e
786 pessoas, e essa comunidade tem poder de organização e associativismo. São ao todo seis
entidades associativas formalisadas, entre elas a Associação de Moradores de Porto Sauípe e a
Artesãs Porto Sauípe Associadas (APSA) formam um grupo bastante mobilizado. As
principais atividades econômicas estão voltadas para hospedagem e alimentação, mas também
subsiste as atividades tradicionais como artesanato, coleta de frutas, pesca e mariscagem
(MATTEDI, 1999a; MATTEDI, 2002).
Figura 1.16. Exemplo da ocupação em Porto Sauípe, Mata de São João -BA. Foto: François Michel, 2004.
Figura 1.17. Exemplo da má organização das barracas de praia. Porto Sauípe, Mata de São João -BA. Foto: François Michel, 2004.
67
A pesca é quase que exclusivamente artesanal, com eventual pesca esportiva nas épocas
de veraneio (figura 1.18). A atividade vem sofrendo pressão em todos os ambientes: no mar
por causa da sobre-pesca e mortandade das espécies menores; nas lagoas, pelo impedimento
de acesso por parte dos grandes proprietários das terras e nos rios e manguezais, pela poluição
e contaminação atribuídos ao sistema de esgotamento sanitário da Costa do Sauípe e
comunidades vizinhas (VIANA& REITERMAJER, 2000).
1.4.4 Formas de turismo e perspectivas futuras
São perceptíveis as diferenças quanto à organização do turismo e sua articulação com o
modo de vida e cultura locais nas principais localidades desse estudo e cada uma terá graus
diversos de repercussão sobre o social e o ambiental.
Na Praia do Forte observa-se um turismo seletivo direcionado aos hotéis, mas também o
turismo de massa que se dá nas pousadas e camping, que além de sol e mar o ano inteiro,
oferece conforto, comodidade, cultura, lazer e meio ambiente preservado. O Projeto do
Ecoresort, cujo lema é usufruir sem destruir, conseguiu conciliar atividade ecológica (Reserva
da Sapiranga e Projeto Tamar), proteção de elementos históricos (Castelo Garcia D’Ávila) e
procura criar condições de incentivo à educação formal como o Programa de Educação
Supletiva (Proes) voltado para os adultos que em 5 anos formou 329 pessoas na faixa de 17 a
75 anos; treinamentos informais como o Projeto Semente, desenvolvido como reforço escolar
para crianças entre 8 e 14 anos, para que a comunidade tradicional possa se inserir no
mercado de trabalho e o Programa menor aprendiz, que associa a educação formal ao trabalho
Figura 1.18. Exemplo de pesca artesanal praticada em Porto Sauípe, Mata de São João -BA. Fonte: Arquivo da autora.
68
remunerado. Atualmente dos seus 415 funcionários, 70 são pessoas originárias do local que
recebem treinamento para as atividades desenvolvidas.
O planejamento urbanístico elaborado pelo arquiteto Wilson Reis Netto denominado de
Masterplan (figura 1.19), é implementado e fiscalizado pelo grupo do Klaus Peter
(Imobiliária Land & CO, Fundação Garcia D’Ávila e Ecoresort) que assegura critérios
rigorosos para manter as características da pequena vila e impede, por cláusula contratual, a
venda dos imóveis por parte da comunidade nativa. Por isso o local, mais do que beleza
natural e conforto, vende a concepção do socialmente comprometido e ecologicamente
correto (REVISTA DA PRAIA DO FORTE, [2003?]). No entanto, vale ressaltar que os
cuidados ecológicos estão diretamente relacionados com os ganhos financeiros, terra que tem
valor econômico é loteada e assim todo o trecho da fazenda a leste da estrada, será parcelado
e ocupado, com previsão de rápido incremento da população e um novo mega
empreendimento, o IBEROSTAR. A alta densidade ocupacional compromete o já frágil
equilíbrio ecológico. Na área da reserva da Sapiranga, com todos os seus conflitos sociais,
está situada à oeste da pista, em terras de baixo valor econômico e que ainda serve para gerar
receita com o ecoturismo.
O planejamento ‘perfeito’ é mais a imagem que se vende da Praia do Forte, que
realmente se tornou um lugar agradável de visitar e é certo que há um cuidado mercadológico
com o ambiental e o social, mas para alguns grupos, leia-se comunidade local, a sensação de
Figura 1.19. Vista panoramica da região da Praia do Forte onde se procurou preservar as caracteristicas da pequena Vila de Pescadores, permitindo um aumento gradual do tamanho dos loteamentos mais luxuosos Mata de São João -BA. Foto: Ronaldo Lyrio, 2000.
69
perda é constante (acesso aos recursos, locais de moradia, cultivo de roças, exploração de
barracas de praia, entre outras perdas), pois os que ficaram na vila têm que seguir a cartilha do
proprietário, e hoje se sentem desprotegidos, descriminados em seu próprio lugar de origem e
passaram a fazer parte dos “extratos inferiores desse novo arranjo social criado pela
implantação turística” (STIFELMAN, 1997, p. 161).
O perfil do turista que freqüenta o local, segundo os dados da Bahiatursa, é
predominantemente nacional, com predominância da região sudeste. No grupo dos
estrangeiros a maior representatividade é de argentinos. Dos entrevistados em 1998, 30% já
haviam estado no local e dos que estavam visitando pela primeira vez, mais de 80% disseram
ter intenção de retornar por causa dos atrativos naturais e tranqüilidade para relaxar. A maior
parte dos turistas não chegou à Praia do Forte por meio de agências de viagens e a melhor
propaganda declarada foi a indicação de amigos e parentes (MOLLICONE FILHO, 2001).
Do grupo de brasileiros, a acomodação mais procurada foram as pousadas, que somam
um total de 32 opções, com diária média de R$ 200,00 na alta estação. Em geral esses
estabelecimentos têm uma taxa de ocupação anual de 50%, sendo a maior procura nos
períodos de alta estação, ou seja, de 22 de dezembro até o carnaval, em feriados prolongados e
finais de semana durante o ano inteiro. Já o grupo de estrangeiros, que tem em média um
período de permanência maior (entorno de seis dias), o gasto diário gira entorno de R$ 260,22
costuma optar por hotéis (são apenas quatro, segundo a relação da Prefeitura Municipal de
Mata de São João). No padrão Ecoresort a tarifa varia de R$ 680,00 a R$ 820,00 na alta
temporada por casal e vende possivelmente 55.000 diárias por ano10.
Em Imbassaí o turismo se caracteriza como espontâneo e segundo Mattedi (2002), foi
implementado por pequenos empresários do interior da Bahia e sul do país, com articulação
mais direta com a comunidade. Hoje conta com uma profusão de pousadas (no total de 47 e
três hotéis), as tarifas praticadas na alta estação variam de R$100,00 a R$200,00, período que
mantém um maior número de funcionários. A frágil infra-estrutura urbana tem propiciado
impactos ambientais relacionados à destinação dos resíduos sólidos e tratamento de efluentes.
A associação comercial tem se organizado para definir regras que harmonizem mais a
paisagem, como a padronização de placas com os nomes da pousadas todas em madeira.
A Costa do Sauípe, mega empreendimento estruturado no modelo hegemônico do
turismo, exigiu grandes investimentos públicos e privados para operar. Para a infra-strutura
básica: abastecimento de água, esgotamento sanitário e energia elétrica foram gastos pelo
10 Valores obtidos em entrevistas com a Coordenadora ambiental do Projeto Ecoresort, ago. 2004.
70
Governo do Estado R$ 16 milhões. Referentes à primeira etapa do projeto, Vila da Praia, são
1.600 quartos somados hotéis e pousadas onde tudo é personalizado ou tematizado. Cada
hotel atende a um perfil de cliente, que pode procurar o padrão luxo, convenções, grupos ou
all includes11, já as pousadas lembram peculiaridades da Bahia e foram construídas e
decoradas seguindo estilo próprio. As diárias das pousadas em período de alta estação ficam
em torno de R$ 200,00 e uma suíte de hotel em média é de R$300,0012.
No primeiro ano de funcionamento do Costa do Sauípe foram contabilizados 70 mil
hóspedes com 375 mil pernoites, o que reflete uma ocupação de 52%, média acima da
prevista. Só no primeiro semestre de 2001 o faturamento foi de R$ 62 milhões e no primeiro
ano de funcionamento o lucro foi de cinco milhões de reais. Segundo o levantamento do
próprio empreendimento, em parceria com a Bahiatursa, do total de freqüentadores no
primeiro ano de sua inauguração, 94,3% são brasileiros e desse grupo 41,9% são paulistas, a
maioria chegou ao empreendimento por meio de agências de viagem com uma média de
permanência de cinco dias e média de gasto diário individual em torno de R$ 177,00, a maior
parte desta quantia é gasta com hospedagem seguido de compras, alimentação, outros e
diversão (MOLLICONE FILHO, 2001).
Não é necessário mencionar como um empreendimento desse porte e demais
localidades turísticas alteraram o cotidiano da população local. Segundo Mattedi (1999b) o
turismo vem provocando mudanças significativas no modo de vida das populações do litoral,
transformando-o rapidamente, de tradicionalmente rural, baseado numa agricultura familiar e
no extrativismo, em citadino, baseado em serviços, especialmente aqueles relacionados ao
turismo. Nos municípios de Mata de São João e Entre Rios essa influência é mais visível
porém pode se prolongar por todo o Litoral Norte. Dentre as principais mudanças ambientais
e sociais vê-se a perenização de lagoas e demais alterações nos corpos hídricos em
consequência da construção de obras civis via assoreamento ou aterro; a retirada de vegetação
dos manguezais; deposição de resíduos sólidos em locais de fragilidade ambiental e repercute
sobre a população o aumento do custo de vida, além especulação imobiliária, nas áreas
centrais dos povoados que acaba por expulsar a comunidade local para a periferia; as
modificações comportamentais como prostituição, uso de drogas e padrão de consumo
alterado na interação com turistas e veranistas o que atinge principalmente os jovens. São
impactos econômicos, sociais e ambientais que ocorrem sem o devido controle institucional e
comprometimento empresarial (VIANA& REITERMAJER, 2000). E em outro documento
11 onde toda a alimentação é incluída na diária 12 Valores obtidos na Central de Atendimento das Pousadas do Complexo Sauípe, em jul. 2004.
71
Mattedi (2002) ainda diz que estudos sobre a atividade turística na zona costeira da Bahia
evidenciam que a apropriação dos benefícios gerados pela atividade se dá de maneira
desigual, com forte prejuízo para a população nativa, como a desestruturação das economias
locais e modos de vida tradicionais, mudanças rápidas nas relações de trabalho e avanço do
assalariamento onde predominava a pequena propriedade rural ou trabalho autônomo,
mudança na relação com os recursos naturais e surgimento de problemas tipicamente urbanos
como escassez ou falta de abastecimento de água, poluição dos recursos hídricos, violência,
prostituição infanto-juvenil, favelização, entre outros.
Fora essa realidade encontrada hoje, a tendência de toda a região é aumentar o fluxo de
turismo. Todas as localidades têm seus projetos de ampliação em andamento. As densidades
devem aumentar, a demanda por infra-estrutura e pressão sobre os ecossistemas também e
apesar dos muitos estudos desenvolvidos sobre a região e conceitualmente todos concordarem
que o desenvolvimento social e a conservação ambiental são fundamentais para a manutenção
do turismo, parece não haver nada que freie o poderio econômico e a densificação da
atividade turística no Litoral Norte.
Dentre os projetos de ampliação já em andamento, encontra-se na Praia do Forte um
espaço de 2 mil hectares previstos para loteamentos residenciais, hotéis e complexos turísticos
definidos, ainda na década de 1970, pelo Masterplan. Quanto mais distante da vila, maiores os
tamanhos do lotes, o que diminui a densidade e evita grandes contrastes com as simples casas
da população local (REVISTA DA PRAIA DO FORTE, [2003?]). Atualmente muitas casas
desses loteamentos vizinhos já estão construídas e ocupadas e um novo condomínio de luxo
está com seu stand de vendas no local, são mais de 100 novas residências que vão contar com
uma completa infra-estrutura de segurança, áreas verdes e lazer.
Ainda nas proximidades da Praia do Forte outro mega empreendimento está em vias de
instalação. Tendo negociado as terras de Klaus Peter em janeiro de 2003 num valor 35
milhões, o grupo espanhol Iberostar só concretizará a compra depois de terminado o processo
de licenciamento e assegurado o direito de uso e construção do projeto. O empreendimento
que inicialmente se instalaria em uma das áreas de maior desova de tartaruga marinha teve seu
projeto recuado em uns poucos quilômetros a norte, livrando uma importante área para a
perpetuação das quatro espécies de tartarugas que desovam no Litoral Norte da Bahia. Faz
parte das compensações solicitadas ao empreendimento a viabilização de luz elétrica para as
comunidades residentes da Reserva da Sapiranga, que luta há anos pelo benefício.
72
O Iberostar é um projeto misto de hotelaria, residência e entretenimento e consta de 4
hotéis de 5 estrelas e 137 lotes residenciais, centro comercial e de convenções, campo de golfe
com 27 buracos e uma área para esportes náuticos.
Contíguo a ele e já próximo a Imbassaí, um outro grande empreendimento está em vias
de instalação. O grupo RetaAtlântico também já possui licença de localização e está em
andamento a licença de implantação, fase em que se avalia o projeto arquitetônico.
Similiar ao projeto anterior, este também tem um perfil misto. Com uma área de 132 ha,
está prevista a instalação de três unidades hoteleiras e quatro residenciais com chalés e
apartamentos, sendo a população estimada em 7.231 ocupantes. Compõe ainda o projeto duas
unidades de comércio e serviço, campo e clube de golfe, centro eqüestre, pólo de
entretenimento, quadras poliesportivas, academias de ginástica, centro de esportes náuticos,
clube recreativo, trilhas ecológicas e posto de observação de pássaros. O diferencial desse
projeto é o acesso ao vilarejo e praia de Imbassaí.
Em Costa do Sauípe o projeto original foi revisto logo após a inauguração da Vila da
Praia, ficando a oferta hoteleira em 1.600 leitos, pois seria insustentável economicamente a
ocupação dos 65.000 previstos inicialmente. Com a reformulação das demais áreas, novos
usos foram propostos. A nova etapa, já em andamento, consiste num loteamento de luxo, cujo
público-alvo são os estrangeiros. Em quatro meses de vendas 75% dos lotes já foram
comercializados para franceses, portugueses e espanhóis. O loteamento Casas de Sauípe
Grande Laguna conta com uma área de 362.000 m2 e 116 lotes que são comercializados com
o projeto e execução da obra. São três projetos arquitetônicos (com 12 variações) exclusivos
do empreendimento a serem construídos em terrenos que variam de 1.200 a 2.000 m2, com
um preço mínimo de R$ 500 mil e máximo R$ 1,2 milhão. Voltado para proprietários que
moram distante do local a administradora do condomínio fornecerá serviços de segurança 24
horas, governança, jardinagem, supermercado com entregas residenciais, deslocamento e
transporte, além da possibilidade de administração de locação do imóvel, assessoria jurídica
entre outros, direcionado a um grupo seleto, de alto poder aquisitivo. Percebe-se que toda a
concepção da proposta é de alto nível, visando atender a um mercado que procura conforto e
facilidade sem a preocupação com custos.
Os próximos projetos na área são: bangalôs aos moldes da Polinésia Francesa, às
margens da lagoa, casas a serem construídas dentro do campo de golfe e uma pista de pouso,
já licenciada, que aliada a uma ampliação do campo de golfe de 18 buracos para 27 (só
existem cinco campos de golfe no mundo com 27 buracos), espera integrar os jogadores do
Litoral Norte com os freqüentadores do Club Med no Litoral Sul. Para as demais áreas da
73
Fazenda Sauípe ainda não há proposta fechada de uso, mas possivelmente serão novos
condomínios residenciais.
Segundo a diretoria de controle ambiental do CRA, em torno de 10 novos projetos
sondam a possibilidade de instalação no Litoral Norte, o que é cenário assustador, pois se hoje
já se encontram fortes impactos em todos os segmentos da sociedade, qual será a capacidade
de suporte dessa região? E ainda, se apenas o trecho litorâneo do município de Mata de São
João for usado para fins turísticos dentro do perfil de grandes empreendimentos, altas taxas de
impermeabilização do solo e alteração da cobertura vegetal, será que as demais áreas da APA
podem equilibrar esse ecossistema?
É na tentativa de acompanhar esse processo e avaliar em que direção ele caminha
(desenvolvimento com ou sem equilíbrio) que serão testados alguns indicadores de
sustentabilidade.
74
2. INDICADORES DE SUSTENTABILIDADE
2.1 ABORDAGEM CONCEITUAL
Antes de dar início ao uso de indicadores é preciso saber o que de fato se entende e se
espera deles. Segundo Furtado (2001) os indicadores são elementos informativos, compostos
de termo ou expressão, que podem ser medidos a fim de caracterizar ou expressar efeitos e
tendências interativas, de natureza ambiental, econômica e social.
Diferentemente do que alguns trabalhos adotam como indicadores de desenvolvimento
sustentável, estes não são simplesmente dados mensurados da realidade, por exemplo, uma
medida de Demanda Bioquímica de Oxigênio (DBO) na água ou o número de espécies da
avifauna. Um indicador de desenvolvimento sustentável requer a adição de um conteúdo
informativo, nele já se percebe uma visão, um conceito subjacente e também um grau de
elaboração que indique o estado ou tendência de um fenômeno, ambiente ou área com um
significado que vai além daquele que é medido diretamente.
Além da compreensão do potencial de uso e aplicação de indicadores, é preciso saber se
há disponibilidade de dados adequados para sua elaboração, assim se o território em estudo
for um município, não adianta ter dados apenas para o estado ou país, serão necessários dados
mais detalhados para a área em questão. Constitui também um pré-requesito a disponibilidade
de dados de diferentes aspectos; como dados sociais, econômicos, ambientais e a ausência de
qualquer um deles invalidaria a aplicação e os resultados da pesquisa.
Na estruturação de indicadores é possível registrar uma visão instantânea da realidade
ou documentar mudanças ao longo do tempo. Também é comum relacionar indicadores de
causa e efeito para um determinado fenômeno estudado, como os de Pressão-Estado-Resposta
(PER), que são modelados para mensurar as principais fontes de degradação, a qualidade
ecológica e as formas de respostas sociais, institucionais ou políticas.
Outra questão que se precisa buscar é o pleno atendimento aos objetivos definidos pelos
dirigentes e atender às perguntas dos especialistas e da sociedade, modelando os indicadores
para dar respostas e retornos rápidos como um sistema de apoio à decisão.
É fundamental saber ‘o quê’ e como medir para poder tomar decisões. No momento de
organização dos dados levantados é possível optar pela adoção de um conjunto amplo de
indicadores, visando retratar mais fielmente um fenômeno ou optar pela síntese de um índice
75
que, ao agregar informação, se torna uma ferramenta mais eficaz na tomada de decisão
(MOUSINHO, 2001).
Segundo a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), um
índice nada mais é do que um conjunto de parâmetros ou indicadores agregados ou
ponderados (OCDE, 2002). Em sua adoção, no entanto, deve haver um cuidado redobrado
para não mascarar a realidade ao se distanciar dos fenômenos em si e ao atribuir pesos e
valores aos parâmetros mensurados. O Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), por
exemplo, mede o nível de desenvolvimento humano, dos países, utilizando como medida os
indicadores de educação (alfabetização e taxa de matrícula), longevidade (esperança de vida
ao nascer) e renda [Produto Interno Bruto (PIB) per capita]. Seus parâmetros podem ser
questionáveis, porém, dada a sua ampla adoção, ele é extremamente importante na
comparação e acompanhamento de todas as nações do mundo.
Uma limitação para a adoção dessa valiosa ferramenta de análise, é a dificuldade de
acesso a levantamentos sistemáticos de dados em escalas apropriadas. Para um país de
terceiro mundo, que enfrenta problemas primários como fome, miséria, falta de acesso a terra,
desemprego e analfabetismo, é difícil convencer da necessidade de investimento em
levantamento dados e bases de informação. Por esse motivo, quando se planeja a adoção de
um sistema de informação, é preciso levar em conta o que já existe disponível e buscar uma
construção simples mas que tenha porém, efetividade.
2.1.1 Da visão setorial à integrada: primeiras iniciativas
Indicadores e índices já fazem parte da sociedade, na economia acompanha-se a
tendência da bolsa de valores, os índices de inflação, PIB, renda per capita e o tão propalado
risco Brasil; na vertente social são números os indicadores de analfabetismo, densidade
populacional ou qualidade de vida urbana. Esses dados setorizados são bastante usuais, mas
quando se pensa em sustentabilidade, percebe-se a falta de consenso sobre o significado de
desenvolvimento sustentável, a não definição de limites claros para os interesses econômicos,
que se sobrepõem ao equilíbrio ambiental e ao desenvolvimento social, ou seja, falta
compreensão das influências de uma dimensão sobre a outra.
A adoção de indicadores exclusivamente sociais, econômicos ou ambientais não é
condição suficiente para se entender a correlação entre eles e nem chegar a uma compreensão
integrada da realidade (SATO, 2001). Para esse tipo de resposta adota-se um conjunto de
indicadores que levam em conta as diferentes dimensões da realidade e suas interações, para a
avaliação do grau de sustentabilidade de uma determinada área.
76
Dentre as primeiras iniciativas de formulação desses indicadores, que serão mais
detalhadas adiante, encontra-se a seleção e pesquisa de indicadores do Seattle Sustentável
(ATKISSON, 1999), nos Estados Unidos, seguidos de uma publicação canadense com um
conjunto preliminar de indicadores (ENVIRONMENT CANADA, 1998). Em 1995 a
Comissão de Desenvolvimento Sustentável (CDS), uma organização das Nações Unidas
(ONU), aprova o programa para a construção de indicadores e no ano seguinte distribui a
países-teste um conjunto de 134 parâmetros (UNCSD, 1999). A partir daí diversas iniciativas
são publicadas a exemplo do Banco Mundial com o relatório ‘Expanding the measure of
wealth: indicators of environmentally sustainable development’ (WORLD BANK, 2001) , o
documento ‘Valuation for sustainable development: methods and policy indicators’
(FAUCHEUX & O´CONNOR, 1998 apud MOUSINHO, 2001), pelo Centre d’ Economie et
d’ Ethique pour I’Environnement et le Développeremer (C3ED), a Comissão Européia lança o
‘Towards a local sustainability profile – european common indicators’ (EC, 1999). Neste
mesmo ano a National Research Council (NRC, 2000 apud MOUSINHO, 2001.) publica o
‘Our common journey: a transition toward sustainability’ que analisa um sistema de
indicadores. Só em 2000 o CDS finaliza sua fase de testes e adota uma abordagem temática e
reduz para 57, o número de indicadores de sustentabilidade (MOUSINHO, 2001).
2.1.2 Sustentabilidade e visão sistêmica
A proposta de formulação de indicadores de sustentabilidade que incorporasse as três
(ou mais) dimensões, começa a surgir na década de 1990. No Encontro Mundial Rio-92 ouve-
se falar na composição dos três aspectos, mas é na formulação da Agenda 21 que o conceito
se afirma (MOUSINHO, 2001). As três dimensões (social, ambiental e econômica)
aparentemente conflitantes, apresentam estreita interdependência e devem ter os mesmos
graus de importância para que a sustentabilidade seja alcançada. Mas em que sentido o todo é
mais que a soma de suas partes? Como se pode assegurar que não se estará medindo apenas os
aspectos individualmente, sem se chegar perto da totalidade dos sistemas naturais? Os
biólogos organísmicos13 afirmam que o ingrediente adicional é o entendimento da
‘organização’ ou das ‘relações organizadoras’ (CAPRA, 1995).
Por isso, no trabalho para a construção de um desenvolvimento sustentável é
fundamental a incorporação da visão sistêmica de mundo (MARZALL, 1999). Com o
enfoque nas relações e interações, esse novo paradigma pode ser chamado de visão holística,
13 Grupo de biólogos, do início do século XX, que se opunha tanto ao mecanicismo como ao vitalismo e abordou o problema dos sistemas de forma biológica.
77
pois concebe o mundo como um todo integrado e não como uma coleção de partes
dissociadas. (PESSOA et al, 2003). Na ciência do século XX, a perspectiva holística tornou-
se conhecida como sistêmica. Pioneiro no uso do termo ‘sistema’ para denotar tanto
organismos vivos como sistemas sociais, foi a partir do bioquímico Lawrence Henderson que
se passou a adotar o pensamento sistêmico, ou a seja, a compreensão do todo integrado cujas
propriedades essenciais surgem das relações entre suas partes e as propriedades das partes não
são propriedades intrínsecas, mas só podem ser entendidas dentro do contexto do todo mais
amplo. Desse modo, a relação entre as partes e o todo foi revertida. Entender as coisas
sistemicamente significa, literalmente, colocá-las dentro de um contexto, estabelecer a
natureza de suas relações (CAPRA, 1995).
Nesse contexto, Capra (1995) também entende que o termo ‘ecológico’ pode ser
empregado num sentido muito mais amplo e mais profundo que o usual. Pois ele faz uma
distinção entre a percepção ecológica profunda e a ecológica rasa. A primeira então,
reconhece a interdependência fundamental de todos os fenômenos, e o fato de que, enquanto
indivíduos e sociedades, estão todos encaixados em processos da natureza e a segunda
mantém a visão antropocêntrica de mundo e vê a natureza como recursos naturais à
disposição do homem.
Essa nova abordagem da ciência levanta de imediato uma importante
questão. Se tudo está conectado com tudo o mais, como podemos esperar
entender alguma coisa? Uma vez que todos os fenômenos naturais estão, em
última análise, interconectados, para explicar qualquer um deles precisamos
entender todos os outros, o que é obviamente impossível (CAPRA, 1995 p.
49).
Mas o próprio Capra (1995) responde que a possibilidade de converter a abordagem
sistêmica numa ciência é a descoberta de que há conhecimento aproximado. No novo
paradigma, se reconhece que todas as concepções e todas as teorias científicas são limitadas e
aproximadas, a ciência nunca pode fornecer uma compreensão completa e definitiva. O fato
de que se pode obter um conhecimento aproximado a respeito de uma teia infinita de padrões
interconexos é uma fonte de confiança e de força.
Uma nova visão de mundo, de acordo Jara (1998), passa por uma mudança de postura e
resposta política que adote um novo modelo de desenvolvimento sustentável, atingindo as
esferas ecológicas, econômicas e sociais. Além disso, ele menciona a necessidade de uma
modernização institucional, mobilização da sociedade civil, redefinição dos papéis da mídia,
78
formação de recursos humanos, novos instrumentos técnicos e sistemas de informação
(CMMAD, 1988).
2.1.3 SIG e dados espacializados
Na adoção dos indicadores é preciso ter claramente definida uma base territorial, pois é
sobre ela que serão superpostos os dados. Tendo-se definido lugar, área, território e de posse
dos dados econômicos, sociais e ambientais que precisarão se interrelacionar, a ferramenta
que possibilita a agregação de todos esses elementos é o SIG. O grande mérito desse tipo de
programa provém de sua habilidade em integrar grandes quantidades de informação sobre o
ambiente e disponibilizar um repertório poderoso de ferramentas analíticas para explorar esses
dados, pois o que tem revolucionado os processos tradicionais de utilização da informação é a
maneira como ela pode ser rapidamente processada e utilizada para diferentes objetivos com
fácil visualização.
Um SIG ou Sistema de Informação Geográfica é uma solução computacional composta
por programas e equipamentos, que permite a integração entre bancos de dados alfanuméricos
(tabelas) e a parte gráfica (bases cartográficas e mapas temáticos), para o processamento,
análise e saída de dados georreferenciados. Agregam-se ainda os aspectos institucionais
(perfil e objetivos), de recursos humanos (procedimentos e metodologias) e principalmente a
aplicação específica a que se destina (modelagem) (MENEGUETTE, 2004).
Esse conjunto de ferramentas integra dados, pessoas e instituições de forma a tornar
possível a coleta, o armazenamento, o processamento, a análise e a disponibilização, a partir
dos dados espacializados e da informação produzida por meio das aplicações disponíveis,
visando maior facilidade, segurança e agilidade nas atividades humanas referentes ao
monitoramento, planejamento e tomada de decisão relativas ao espaço geográfico
(BURROUGH, 1986).
Um SIG por si só não garante a eficiência nem a eficácia de sua aplicação, a fim de
assegurar o seu bom desempenho, é necessário definir métodos e procedimentos de entrada,
processamento e saída de dados, de tal forma que os dados inseridos atendam aos padrões
previamente estabelecidos e seja evitada a redundância de informações, que o uso dos
equipamentos seja otimizado, que a segurança seja garantida, que os trabalhos apresentem
organização interna e, principalmente, que os produtos de informação decorrentes do processo
sejam condizentes com as necessidades de informação dos usuários (KIMERLING, 2004).
Os dados que são introduzidos no sistema constituem sua matéria prima, pois é a partir
deles que se pode gerar informação. Sendo observados alguns cuidados com a entrada dos
79
dados ter-se-á garantia da qualidade da informação gerada. A primeira etapa do processo
consiste na aquisição e armazenamento, quando se define os tipos de dados necessários para
satisfazer as exigências do usuário. Comumente os dados são extraídos de bancos de dados já
existentes, digitalizados e convertidos do meio analógico para digital ou via aquisição direta
por levantamento de campo ou observações científicas.
A segunda etapa é de estruturação e compatibilização dos dados pois sendo estes
provenientes de diferentes fontes, encontra-se uma diversidade de limites, escalas, projeções e
datum14. Estes diversos conjuntos de dados devem ser transformados num mesmo sistema de
coordenadas geográficas, como por exemplo, latitude e longitude ou coordenadas UTM e
transformados preferencialmente para o datum vigente no país, o South American Datum
(SAD 69). Eles também devem ser ajustados à mesma área de abrangência, e se possível, para
o mesmo nível de generalização e período de tempo.
Cumprida as duas primeiras etapas referentes aos dados e de posse da infra-estrutura
para geração das análises e dos mapas o sistema está pronto. Nesse momento, o arcabouço dos
indicadores entra para responder às perguntas formuladas. No capítulo 3 será apresentado o
conjunto de arquivos e temas incorporados ao SIG do Litoral Norte com os atributos,
conversões e tratamentos necessários para interpolação dos dados.
2.2 MENSURANDO O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL: USO DE
INDICADORES
Segundo o relatório de Brundtland, documento produzido pela Comissão Mundial sobre
Meio Ambiente e Desenvolvimento, a sustentabilidade do desenvolvimento está diretamente
ligada à dinâmica do crescimento populacional: saneamento, destino de resíduos sólidos,
abastecimento de água, padrão habitacional e pode-se incluir também o tipo de atividade
econômica e mais, a maneira como se realizam essas atividades. No caso desse estudo essa
‘maneira’ faz toda a diferença. O Litoral Norte, que foi adotado pelo turismo, pode encontrar
soluções que busquem um desenvolvimento sustentável ou fazer prevalecer apenas uma
dessas vertentes, caminhando para um desequilíbrio econômico, social e ambiental.
Mas como saber se as ações estão em equilíbrio? Como mensurar? Em primeiro lugar é
preciso que alguns conceitos estejam disseminados, parâmetros sejam acordados entre os
14 Modelo matemático que utiliza uma superfície de referência posicionada em relação à Terra real, planificando-a para as aplicações cartográficas.
80
diferentes grupos de interessados e o objetivo seja comum à todos, ou seja a sustentabilidade
para os de hoje sem detrimento dos de amanhã.
Como esse é um conceito muito subjetivo, em que é impossível saber ao certo as
necessidades de amanhã, pode-se começar pelo atendimento das necessidades de hoje, ou
seja, adotar primeiramente o respeito intrageracional para depois buscar atender o
intergeracional. As regulagens para equilibrar os diferentes aspectos da sociedade devem
buscar atender às necessidades humanas, sanando o problema da fome, da falta de acesso aos
recursos naturais e demais serviços como educação, saúde, infra-estrutura urbana, cultura,
lazer que se traduzem em qualidade de vida. Mas qual é o padrão de atendimento à essas
necessidades? O mínimo, o suficiente ou o padrão de consumo norte americano? O relatório
de Brundtland delimita em: atender as necessidades das pessoas e o uso dos recursos naturais
dentro do limite de regeneração e reposição natural. E mais uma vez o planejamento com a
necessidade de informação precisa. Qual é o limite de regeneração e reposição natural?
Nesse período de transição paradigmática, faz-se necessário a criação de instrumentos
que possibilitem a avaliação dos progressos em direção ao desenvolvimento sustentável. Esse
novo modelo de desenvolvimento requer uma perspectiva de planejamento de longo prazo e
exige a integração de todo um conjunto de dimensões na tomada de decisão, que deve ser
orientada e respaldada por informações confiáveis, atualizadas e de fácil interpretação.
Para cumprir seu papel no suporte à decisão, a informação precisa estar adequadamente
representada. Os indicadores, ao permitirem organizar e sintetizar dados, eles despontam
como ferramentas capazes de produzir informação importante para o planejamento,
constituindo-se em elementos por meio dos quais os progressos em direção a sustentabilidade
do desenvolvimento podem ser aferidos.
Em todo o mundo multiplicam-se as iniciativas de formulação de indicadores de
sustentabilidade a exemplo da OCDE (2002), IUCN (1999), NTREE (2001), World Research
Institute (WRI, 2000), sendo bastante atual a discussão dos modelos adotados para sua
construção. Do global para o local, as tendências mundiais na elaboração dos indicadores
podem otimizar esforços empreendidos no Brasil em gerar subsídio para o desenvolvimento
de iniciativas locais bem informadas, que levem em consideração um conjunto de aspectos
eleitos como chave para a construção de indicadores e estejam atentas às especificidades
regionais e locais na adequação dos modelos para as suas realidades.
O caráter global da questão ambiental fez a maioria das nações reconhecer sua parcela
de responsabilidade em relação às atividades que envolvem a coleta, organização,
disseminação e uso da informação ambiental. A análise do caráter complexo e dinâmico da
81
informação ambiental, porém, revela algumas dificuldades. Algumas delas elencadas por
Sommerville (1976 apud MOUSINHO, 2001), evidenciam a dificuldade de acesso e
recuperação da informação ambiental, que não está adequadamente organizada, o
questionamento da qualidade e confiabilidade dessa informação, os riscos de manipulação e a
necessidade de informação que possa subsidiar ações dos diversos grupos de usuários.
Em função dessas características da informação ambiental, vem à tona a importância de
um arcabouço conceitual que sirva como base para a organização dessa informação,
evidenciando o caráter complexo das dimensões envolvidas e as inter-relações entre os
diversos elementos que a compõem. Há necessidade de discernir quais as relações entre os
diferentes fatores que compõem a questão ambiental e as demais dimensões do
desenvolvimento sustentável, já que conceitos complexos não são bem atendidos por séries
estatísticas convencionais por elas não estarem articuladas no âmbito de um modelo
conceitual abrangente (SY; ROBBIN, 1990 apud MOUSINHO, 2001). Assinala-se, então, a
necessidade de estruturas conceituais integradoras para a coleta e análise dos dados, que
favoreçam a compreensão do gerenciamento integrado dos recursos naturais.
Um investimento conceitual sobre o qual repousa a informação ambiental, desde sua
produção até sua adequada representação e utilização, permite que se otimize a integração
entre o processo de geração de informações e demandas políticas e gerenciais.
Apesar de não representarem a realidade perfeitamente e serem passíveis de muitos
questionamentos e leituras diferenciadas, os indicadores são ferramentas importantes para
comunicar e tornar acessível para grupos não técnicos, informações estatísticas, científicas e
especializadas. Eles servem de suporte para uma tomada de decisão, ao simplificar massas de
dados técnicos, comunicar condições –chave e tendências, além de fornecer instrumentos para
medição do progresso em direção ao desenvolvimento sustentável.
Conforme a IUCN (1999), na impossibilidade de medição direta do bem-estar e da
capacidade de auto-sustentabilidade de uma comunidade, tornam-se necessários elementos
que os representem e mensurem: os indicadores.
Vive-se hoje num contra-senso, pois há um dilúvio de informação mas a população está
totalmente desinformada. O desafio é encontrar formas de organização da informação e fazê-
la chegar às pessoas.
82
2.2.1 Critérios na definição de indicadores
Para a escolha dos indicadores no Litoral Norte, foram considerados critérios, cuidados
e especificidades levantados pela pesquisa bibliográfica. PESSOA et al (2003) definem como
importante a objetividade, credibilidade, facilidade de integração com os demais indicadores,
sensibilidade no tempo, aplicabilidade para outros locais, facilidade de reconhecimento,
mensuração e clareza. Para Ferraz (2003) um critério geral na seleção de indicadores é que
estes devem ser capazes não apenas de sinalizar a existência de uma degradação no sistema,
mas também de advertir sobre eventuais perturbações potenciais. Já Toews (1987 apud
FERRAZ, 2003) ressalta que estes devem possuir as seguintes características: aplicabilidade
em um grande número de sistemas ecológicos, sociais e econômicos, mensuráveis e de fácil
medição, sensíveis a mudanças do sistema e indicar tendências, permitir cruzamento com
outros indicadores e serem concebidos de tal forma que a população local possa participar de
suas medições.
Mousinho (2001) alerta ainda que não se deve ignorar um indicador por falta de dados,
mas ter em mente o conjunto ideal de indicadores e na hora da aplicação eliminar os que se
mostraram impossíveis de levantar. A falta de valores de referência que expressem o grau de
sustentabilidade de um local, para Ferraz (2003) é considerado ainda como ponto fraco na
aplicação dos indicadores.
Uma importante classificação feita por Hamblin (1992 apud PESSOA et al, 2003) é o
enquadramento quanto à escala hierárquica. Os indicadores podem ser locais quando
apresentam uso localizado em pequenas áreas ou cidades, regionais a exemplo dos usados por
órgãos governamentais responsáveis por políticas de planejamento e fomento regional ou
nacionais, como os utilizados por órgãos do governo federal no âmbito ministerial ( meio
ambiente, saúde, economia). Outro recorte interessante foi expresso por Ferraz (2003) quanto
à possibilidade de utilizá-los para comparar o grau de sustentabilidade entre sistemas de
produção, micro-bacias e regiões, bem como para avaliar sua evolução ao longo do tempo.
Uma vez que a função do indicador é a de caracterizar uma situação, algum aspecto da
realidade pode ser perdido, mas se este é projetado corretamente, a perda não produz uma
distorção em relação às variáveis resposta. O que se deve fazer é cuidar para que o indicador
seja aplicado para os fins aos quais ele foi criado, analisando-o detalhadamente e
interpretando adequadamente seus resultados (BOLLMAN& MARQUES, 2000).
83
2.3 EXPERIÊNCIAS DE INDICADORES DE SUSTENTABILIDADE
2.3.1 No mundo
Pioneiro na elaboração de indicadores, o Canadá, lançou pela National Round table of
the Environment and the Economy (NRTEE, 2001) o programa Environment and Sustainable
Development Indicators Initiative (ESDI) para desenvolver e promover um conjunto de
indicadores nacionais que tivessem credibilidade, relevância e boa aceitação. O programa
previu três fases distintas: primeiramente a definição da abordagem para a elaboração dos
indicadores, o segundo momento era o desenvolvimento propriamente dito e em terceiro os
testes e a disseminação do conjunto proposto (MOUSINHO, 2001). O programa examinou a
escala de aproximações dos indicadores de desenvolvimento sustentável via consulta a grupos
de peritos e organizações que trabalham com indicadores no Canadá. Os primeiros esforços
destacaram o fato que muitas comunidades, governos, negócios, agências internacionais e
organizações não-governamentais estão tentando desenvolver novos meios de mensurar vários
aspectos do DS, no entanto os diferentes indicadores foram projetados para conseguir
objetivos específicos de cada instituição, dificultando a replicação em para outros fins.
A WRI abordou a questão da sustentabilidade com base na relação dos fluxos materiais
e o ambiente e dentro dessa perspectiva elaborou seus indicadores. Também criou o Earth
Trends, que são informações sobre os ecossistemas costeiros, florestas, recursos hídricos,
clima, população, saúde, economia, áreas protegidas entre muitos outros agregados em um
banco de dados com mais de 400 variáveis acerca de 200 países, disponibilizados via Internet
em forma de artigo, tabela ou mapa.
A OCDE, apostando nos indicadores como ferramenta para traçar e mensurar os
caminhos de um futuro sustentável, definiu três premissas para seus indicadores: que eles
sirvam para medir o desempenho ambiental; integrar as questões ambientais às políticas
setoriais; e, em especial, propiciar a integração com as políticas econômicas via contabilidade
ambiental. Os trabalhos levaram a um acordo entre os países-membros de utilização do
modelo pressão/estado/resposta (PER)15 e à seleção de indicadores que tivessem pertinência
política, precisão de análise e mensurabilidade, de modo que fosse adotado por seus membros
e servisse de parâmetro de comparação e análise. Inicialmente foram lançados os 134 itens
15 O modelo PER retrata a relação de causalidade entre as atividades humanas, o estado do meio ambiente e a reação social decorrente das transformações havidas. Essa metodologia foi iniciada em 1990 pela OCDE mediante demanda do G-7 em 1989, tendo a publicação do Core Set of environment indicators em 1993 como marco referencial do PER que motivou sua aplicação em diversos países, incluindo o Brasil. Esse modelo passou também a ser recomendado pela SCOPE e por agências internacionais como Unstat e Eurostat.
84
que após um período de experimentação limitou-se a 57, com vistas a facilitar o
gerenciamento e análise de tendências, monitorar progressos e avaliar a eficiência de políticas
de promoção do DS (OCDE, 2002).
Nessa mesma linha e como resposta à demanda da Agenda 21 de que métodos
integrados de contabilidade econômica para o ambiente fossem amplamente disseminados, a
ONU lançou em 1993 o manual de contas nacionais, a contabilidade ambiental e econômica
integrada, como subsídio às políticas sociais, econômicas e ambientais integradas por
intermédio de indicadores de riqueza nacional, PIB, consumo e formação de capital (UNSD,
2000 apud MOUSINHO, 2001 p. 92).
Idealizado durante a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e
Desenvolvimento, realizada no Rio de Janeiro, em 1992, a Comissão de Desenvolvimento
Sustentável (CDS) formulou um conjunto inicial de 134 Indicadores de Desenvolvimento
Sustentável, mais conhecido como livro azul, foi testado por diversos países voluntários,
inclusive o Brasil. Da listagem inicial permaneceram apenas 59 indicadores sendo: 20 sociais,
19 ambientais, 14 econômicos e 6 institucionais, que enfocam os seguintes temas: Saúde,
Educação, Habitação, Segurança, População, Atmosfera, Terra, Oceanos/Mares e Costas,
Água, Biodiversidade, Estrutura Econômica, Padrões de Consumo e Produção, Capacidade e
Estrutura Institucional. Eles foram publicados em 1996 com a apresentação dos seus
propósitos, características relevantes, sendo ressaltada a relação com o Desenvolvimento
Sunstentável, aliado a uma descrição metodológica, avaliação de disponibilidade de dados e
orientação para leituras complementares. Após três anos de testes chegou-se em 1999 ao
conjunto de indicadores listados na tabela 2.1 e à constatação da importância deles como
apoio a processos de tomada de decisão a nível nacional.
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A Comunidade Européia lançou em 1999 uma iniciativa de monitoramento da
sustentabilidade denominada de “Um perfil de sustentabilidade local: Indicadores comuns
europeus” que optou por uma abordagem do micro para o macro, ou seja, fomentar a nível
municipal a adoção dos indicadores tendo em vista a complementaridade destes com os
aplicados nacionalmente. De um primeiro encontro ocorrido em Sevilha, Espanha em 2000, a
iniciativa, em um ano, agregou 90 autoridades locais e regionais que para a fase de testes
(MOUSINHO, 2001).
Com o Projeto ‘Indicadores de Desenvolvimento Sustentável’, a Scientific Committe on
Problems of the Environment (SCOPE) comitê criado pelo Conselho Internacional de Uniões
Científicas (ICSU), lançou, em 1994, o desafio do diálogo internacional sobre o tema
procurando difundir recomendações sobre indicadores de desempenho nacional para assegurar
que estes fossem politicamente relevantes, cientificamente válidos, tecnicamente possíveis de
obter, além de estimular a que fosse formulado para servir de suporte à decisão, de orientação
na formulação de políticas e facilitador na comunicação e visualização de tendências.
Sob o olhar conceitual, os indicadores evoluíram de uma visão inicial de medição direta
da poluição e do esgotamento dos recursos naturais para uma visão sistêmica da realidade.
Para percorrer o caminho entre um extremo e outro foram testados vários modelos conceituais
como o Pressão-Estado-Resposta (PER) mais largamente utilizado em escalas nacionais e
globais e que consiste em avaliar a pressão que as atividades humanas exercem sobre o meio,
modificando sua qualidade e comprometendo a quantidade, e ainda detectando as reações da
sociedade quanto às mudanças ocorridas. Diferentemente desse modelo, a ESDI procurou
formular indicadores direcionados às atividades econômicas e seus efeitos sobre o meio
ambiente, posteriormente adotou um enfoque nos capitais produzido, natural e humano. Para
o modelo da WRI, Environmental Protection Agency (EPA) todos os impactos ambientais são
resultantes de fluxos de materiais, portanto eles se propuseram a mensurar os diversos fluxos
de saída do ecossistema ao longo do ciclo de vida de um material e sua relação com o
ambiental, o econômico e o social. Três fatores foram considerados: primeiro, a mobilidade
de um determinado material pelo ambiente que dá a noção de escala de abrangência dos
impactos a ele relacionados; segundo, a qualidade, toxidade e o comportamento ambiental dos
materiais e terceiro, a velocidade ou tempo em que cada um permanece na economia sem
alterar o ambiente. (MOUSINHO, 2001).
No Instituto Internacional para o Desenvolvimento Sustentável (IISD), o seu grupo
consultor , para a elaboração dos indicadores, desenvolveu quatro índices altamente agregados
em modelos gráficos. Três deles foram desenvolvidos para acesso à informação via Internet,
89
com dados mais detalhados. O quarto índice, no entanto, tem a forma de um painel de
controle (como os de carro ou avião) que sinaliza o desempenho do sistema. Nessa proposta é
preciso um “piloto” que conheça os instrumentos e controles para identificar o que vai de
errado e assim poder adotar ações corretivas. Pelo painel é possível analisar os pontos fortes e
fracos da área em análise, visualizar os indicadores por graduação de cor e comparar com os
dados de outras áreas constantes no banco de dados e ainda possibilita a identificação de
sinergias e conflitos potenciais baseados na distribuição espacial dos indicadores. Nessa
estrutura o painel de controle foi projetado para informar aos tomadores de decisão, à mídia e
ao público em geral sobre a situação e progressos de uma nação em direção a
sustentabilidade.
Para os Indicadores de Transição para a Sustentabilidade (EPA) identificou-se que estes
não conseguem caracterizar o que seja um período de transição, porém são indispensáveis
para traçar os progressos em direção ao bem-estar humano e aos sistemas de suporte à vida e
são avaliados de acordo com cinco tipos de informação:
1. atendimento às necessidades humanas e redução da fome e da pobreza;
2. monitoramento dos sistemas circulatórios do planeta;
3. identificação das regiões críticas,
4. conservação das terras produtivas;
5. preservação dos ecossistemas.
No Projeto Seattle Sustentável uma característica marcante é a participação da
sociedade na definição dos indicadores, que teve o número reduzido por falta de dados
disponíveis e confiáveis para realizar análise temporal. Na seleção dos indicadores
procuraram os que:
1. refletissem tendências fundamentais da saúde cultural, econômica e ambiental;
2. fossem estatisticamente mensuráveis ao longo do tempo;
3. fossem atraentes para a mídia;
4. fossem de fácil compreensão para o público em geral. Como indicador ambiental o
projeto adotou: volta dos salmões para desova nos rios da Comarca de King; saúde
de áreas inundadas; biodiversidade; erosão do solo; porcentagem das ruas de Seattle
que atingem critérios de ‘atenção ao pedestre’; superfície impermeabilizada na
cidade de Seattle; qualidade do ar (medida de acordo com as Normas da EPA para
Poluentes: em alta desde 1980) e áreas abertas.
Como indicador econômico usou-se: porcentagem de emprego concentrado nos dez
maiores empregadores; desemprego real; distribuição da renda pessoal; despesas com
90
assistência médica; horas de trabalho pelo salário médio da Comarca de King, necessário para
atender as necessidades mais básicas de vida; recursos para crianças vivendo na pobreza; uso
de sala de emergência para outros fins e capital comunitário.
Para as questões sociais foram incluídas três subdivisões: Juventude e Educação;
População e Recursos; Saúde e Comunidade. Como exemplo de indicadores deste último tem-
se: equidade na justiça; recém-natos de baixo peso; taxa de hospitalização infantil por asma;
qualidade de vida perceptível (medida da felicidade pessoal, avaliada por levantamentos da
sensação individual de bem-estar das pessoas), entre outros (ATKISSON, 2004).
Esse modelo não mensura o grau de sustentabilidade, mas opta por determinar a direção
de cada um e então fazer uma análise das tendências e a velocidade das mudanças.
A IUCN desenvolveu três métodos de avaliação dos progressos em direção a
sustentabilidade, dentre eles está o System Assessment Method (SAM), que foi feito com a
preocupação de ser simples de usar e assegurar o controle aos usuários do processo de
avaliação.
Este método, dentre os acima mencionados, foi o que apresentou maior grau de
adaptabilidade para a escala nacional como local, faz uso de indicadores palpáveis e de
simples mensuração, ao mesmo tempo adota agregações que possibilita uma visão geral da
sustentabilidade. Tem uma abordagem direcionada ao usuário pressupondo participação e
atendimento dos objetivos para suporte à tomada de decisão16.
O método é composto de 5 passos: Diagnóstico, quando é feito o levantamento dos
atores envolvidos e de suas relações com a área de estudo; Narrativa, constitui uma descrição
do contexto com ênfase nos pontos fortes e fracos e a seleção dos tópicos e indicadores a
serem medidos; Medição, é a elaboração de um conjunto central de informações
sistematizadas, sem a qual a avaliação não teria respaldo ou seriedade; Julgamentos, é feita a
classificação dos resultados obtidos, em bons, ruins ou neutros para cada grupo de pessoas
envolvidas no processo; Plotagem em mapas, forma eficaz de registrar, analisar e comunicar
indicadores espaciais utilizados na avaliação.
Preocupados com a administração e qualidade do conjunto de indicadores elencados a
IUCN enumerou 7 pré-requisitos na sua escolha:
relevância – estar relacionado a um objetivo explícito;
representatividade – cobrir os aspectos mais importantes;
precisão – refletir o grau de alcance de um dado objetivo;
16 Dados retirados do site: www.iisd.org/measure/compendium - 24k Acesso em: 11 out. 2004.
91
mensurabilidade – ser medido sem custo ou esforço excessivo;
Exeqüibilidade – depender de dados que estão disponíveis ou obtidos a um custo
razoável;
Adequação analítica – ser bem fundamentado e utilizar medidas padronizadas para
permitir comparações;
Sensibilidade – mostrar tendências ao longo do tempo
Capacidade de resposta – refletir mudanças nas condições e diferenças entre lugares
e grupos de pessoas.
O método SAM se preocupou em dar tratamento igual a pessoas e ao meio ambiente
subdividindo o levantamento e as análises em três grupos: pessoas (sociedade, economia e
artefatos), meio ambiente (ecossistemas, processos e recursos) e as interações entre os dois
universos (fluxos, benefícios e estresses). Esta divisão permite que o bem-estar de ambos seja
considerado em conjunto, porém medidos separadamente, permitindo assim a comparação dos
estágios de sustentabilidade (MOUSINHO, 2001).
Outra característica do SAM é a estruturação hierárquica da organização das
informações, para ajudar os usuários na identificação dos aspectos mais relevantes da
condição e interação das pessoas e o meio ambiente. Essa hierarquia de objetivos permite uma
seqüência de passos que auxilia na tradução do conceito de Desenvolvimento Sustentável em
melhorias concretas na qualidade de vida das pessoas e nas condições ambientais (figura 2.1).
No total são dez as dimensões humanas e ambientais avaliadas e dentre estas os
envolvidos selecionam tópicos e indicadores relevantes. Uma estrutura de organização
comum permite o ajuste às necessidades locais sem perder a possibilidade de comparação
com outros lugares ou escalas de aplicação. Para o grupo pessoas estão conectadas as
dimensões: saúde e população, riqueza, educação e cultura, comunidade e equidade. No grupo
meio ambiente estão: terra, água, ar, espécies e populações e uso dos recursos.
“As dimensões são amplas o suficiente para acomodar a maior parte das preocupações
da maioria das sociedades: qualquer tópico considerado como significativo para o bem-estar e
para o desenvolvimento sustentável tem lugar em alguma dimensão” (MOUSINHO, 2001
p.187).
Cada avaliação das dimensões segue um ciclo de seis etapas (figura 2.2):
definição do sistema e das metas;
identificação dos tópicos e objetivos;
92
seleção dos indicadores e dos critérios de desempenho;
mensuração e plotagem dos indicadores em mapas;
agregação dos indicadores;
plotagem dos índices em mapas e revisão dos resultados.
Figura 2.1. Esquema demonstrando a hierarquia e seqüência de passos que auxilia na tradução do conceito de DS em melhorias concretas na qualidade de vida das pessoas e nas condições ambientais. Fonte: IUCN (apud MOUSINHO, 2001).
SISTEMASE METAS
Melhoria e manutenção do bem-estar humano e do
ambiente Pessoas:
Melhoria e manutenção do bem-estar
humano
Ecossistema: restauração e manutenção do bem-estar do ambiente
Ex: riqueza – economia doméstica e nacional forte
Ex: economia doméstica –um padrão de vida descente
Ex: serviços básicos – água e saneamento adequado para todos
Ex: % da população com água tratada e saneamento básico – nível Bom = 100-95% OK = 95-91% Médio = 90-76% Fraco = 75-51% Ruim = 50-1% Basal = 0%
SUBSISTEMASE METAS
Ex: água – ecossistemas aquáticos com diversidade e alta qualidade
Ex: águas interiores – estresse mínimo por uso humano
Ex: nenhum (nem sempre é necessário)
Ex: coliformes fecais por 100ml de água – nível Bom = 100-95% OK = 95-91% Médio = 90-76% Fraco = 75-51% Ruim = 50-1% Basal = 0%
DIMENSÕES E OBJETIVOS
TÓPICOS E OBJETIVOS
Subtópicos esub-objetivos
Indicadores e Critérios de desempenho
93
Um diferencial do SAM é barômetro da sustentabilidade. O barômetro é uma escala de
valoração da sustentabilidade onde são cruzados os somatórios dos indicadores, pessoas e
meio ambiente, sem a interferência de uma dimensão na outra, de onde se retira os índice de
bem-estar humano e ambiental e também o do bem-estar geral (ou de sustentabilidade). Ele
exibe o desempenho das duas dimensões para evidenciar os aspectos importantes de cada
aplicação e assim, além da avaliação geral ele indica as áreas críticas e potenciais
identificadas na análise (FIGURA 2.3).
Dentre os métodos avaliados um fator comum é a escala de análise, pois a maioria é
direcionada para indicadores nacionais, onde são incluídos parâmetros que medem as
mudanças climáticas, destruição da camada de ozônio, área de desertificação, balança
comercial ou ratificação de acordos globais, como os propostos pela OCDE ou o padrão
adotado pelo PER, têm sido amplamente adotados. No entanto, esse tipo de informação não é
possível ser avaliada em pequenas áreas, por isso o modelo SAM foi estudado com mais
detalhe, por ser possível adotá-lo nas diferentes escalas.
Outra vantagem do SAM é a simplicidade das mensurações propostas, mas que estão
estruturadas na direção da sustentabilidade, diferentemente dos modelos focados no capital ou
Figura 2.2. Ciclo de avaliação dos seis estágios. Fonte: IUCN (1999 apud MOUSINHO, 2001).
1. Definição do sistema e das metas Ecossistemas
Pessoas
TÓPICOS
2. Identificação dos tópicos e objetivos
3. Seleção dos indicadores e dos
critérios de desempenho
5. Agregação dos indicadores
SUBTÓPICOS
DIMENSÕES
INDICADORES
4. Mensuração e plotagem dos
indicadores em mapas
6. Plotagem dos índices em mapas e revisão
das resultados
94
nos impactos ambientais ou fluxos materiais. Já o Projeto Seattle Sustentável traz como
principal contribuição o alto grau de participação da sociedade na definição dos indicadores e
os pressupostos para a eleição destes. Também o modelo SAM adota critérios importantes
para seus indicadores: relevância, representatividade, precisão, mensurabilidade,
exeqüibilidade, adequação analítica, sensibilidade e capacidade de resposta. Esses cuidados
fazem grande diferença na concretização da proposta ao direcionar ao que é exeqüível e não
direcionar para o intangível, por todas essas vantagens esse modelo será aplicado no próximo
capítulo.
2.3.2 No Brasil
Em um breve histórico pontua-se as seguintes iniciativas: o Programa Nacional de
Indicadores de Sustentabilidade (PNIS) que foi criado 1995 e no ano seguinte um grupo da
Coppe/ da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) encaminhou ao Ministério do Meio
Ambiente (MMA) uma proposta conceitual de elaboração de indicadores de sustentabilidade
ambiental. Em 1998, no âmbito ministerial ocorre o desenvolvimento do Programa Nacional
Integrado de Monitoramento Ambiental (Monitore) com o objetivo de coordenar, articular e
disseminar práticas de monitoramento ambiental, promover o intercâmbio de informações
sobre a qualidade ambiental e assim possibilitar uma análise integrada no Brasil buscando a
inter-relação com os principais fatores de pressão, tendo sido adotado o modelo Pressão-
Estado-Resposta da OCDE. O Programa não foi adiante e em 2000 foi interrompido em
Figura 2.3. Barômetro de sustentabilidade. Fonte: IUCN (apud MOUSINHO, 2001).
ruim fraco médio OK bom
0 20 40 60 80 100
Sustentável
Quase Sustentável
Intermediário
Quase Insustentável
Insustentável
bom
OK
médio
fraco
ruim
20
40
60
80
100
Bem
estar
humano
0
95
decorrência das restrições orçamentárias, mas algumas das iniciativas prosseguiram
internamente no MMA, que buscou uma parceria com o IBGE na tentativa de dar um retorno
ao CDS/ONU uma vez que o Brasil havia se prontificado a fazer parte do grupo dos países-
teste.
Os indicadores básicos de DS (CDS/ONU) foram avaliados pela Comissão Consultiva
de Estatísticas Ambientais, formada por especialistas de diversas instituições, sob a liderança
do IBGE, que lançou em 2002 (dez anos depois da RIO-92) o livro "Indicadores de
Desenvolvimento Sustentável" apresentando 50 indicadores contemplando as dimensões
social, ambiental, econômico e institucional.
Outras experiências de menor envergadura vêm ocorrendo no Brasil como a experiência
em Belo Horizonte, onde se propôs a adoção de onze variáveis (abastecimento, assistência
social, educação, esportes, cultura, habitação, infra-estrutura urbana, meio ambiente, saúde,
serviços urbanos e segurança urbana) que foram decompostas em 29 componentes que por sua
vez se desdobram em 75 indicadores. A estes 75 indicadores foram atribuídos valores (0 a 1) e
agregados pelos componentes em um índice de oferta local que, tratados, resultam em índices
setoriais e por fim no índice de qualidade de vida urbana. Mas o modelo, que encontrou
dificuldades na disponibilidade de dados, encontra-se ainda em fase de teste (MOUSINHO,
2001).
Elaborado pela Fundação Municipal de Meio Ambiente (Faema), em parceria com a
Universidade de Blumenau (FURB), o Índice de Sustentabilidade de Blumenau (ISB) lançado
1997, teve como desafio a sistematização e agregação de dados antes dispersos, para servir de
subsídio à tomada de decisão. O modelo avalia quatro elementos fundamentais da natureza, o
ar, a água, os solos e a cobertura florestal quanto a estado e pressão. No cálculo dos
indicadores são atribuídos pelos que podem variar de zero a um, onde os que se aproximam
do zero indicam situações mais insustentáveis ou potencialmente insustentável e os próximos
do um denotam situações mais sustentáveis ou potencialmente sustentável. Após o cálculo de
todos os indicadores estes são representados graficamente em um sustentômetro, que é uma
adaptação do barômetro da sustentabilidade do método SAM proposto pela IUCN. Esse
mecanismo de avaliação possui faixas coloridas que representam o grau de sustentabilidade
de uma dada situação, onde se lança o valor encontrado nos indicadores de pressão (eixo Y) e
indicadores de estado (eixo X). Do cruzamento tem-se o ponto numa faixa graduada de níveis
de sustentabilidade. Já existem estudos para a incorporação de indicadores sociais ao cálculo
do ISB, que comporá o índice de bem-estar social.
96
Uma outra iniciativa foi a de estruturação do modelo conceitual de indicadores de
sustentabilidade para a micro-bacia do Córrego Taquara Branca, Sumaré (SP), fruto da
parceria Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) com a Universidade Federal
de Uberlândia e o Instituto Agronômico do Paraná (IAPAR), que consiste numa proposta de
desenvolvimento de metodologias para a definição e monitoramento de agrossistemas.
Constituíram como etapas do projeto a delimitação do espaço geográfico, um diagnóstico
rural rápido participativo, a definição dos elementos, descritores e indicadores a serem
mensurados.
O modelo conceitual contemplou 18 indicadores abordando os temas: solos, uso da
terra, água e socioeconomia, apresentando um conjunto de compartimentos representativos da
escolha de indicadores, o detalhamento desses compartimentos, especificando-os em forma de
variáveis, empiricamente observáveis e objetivamente identificadas e ligando-os de acordo
com o nível de influência a outros compartimentos. Foram também identificados os impactos
negativos e sua influência nos compartimentos iniciais (PESSOA et al, 2003).
Como diferencial esse trabalho incorporou a estruturação de um banco de dados e um
sistema integrado para avaliação dos impactos ambientais de atividades agropecuárias
denominado de Erosys. Por esse sistema é possível trabalhar com as informações
espacializadas e gerar mapas temáticos e interpretativos da sustentabilidade.
Com iniciativas individuais para medições locais e a lista do 50 indicadores do IBGE
para medições nacionais, o Brasil ainda carece de uma linha-mestra que contemple as
diferentes escalas de atuação e permita o acompanhamento temporal e comparativo das
diversas aplicações.
97
3. OS INDICADORES E A METODOLOGIA DE ANÁLISE
Das experiências e modelos conceituais de uso de indicadores no Brasil e no mundo
apresentados no capítulo anterior, as etapas sugeridas pelo SAM serão adotadas no Litoral
Norte para o início da análise e posteriormente as metodologias e indicadores propostos por
outros modelos serão também incorporadas.
A primeira etapa se trata da identificação dos principais grupos de atores sociais e os
focos de interesse e conflito. Para as áreas litorâneas dos municípios de Mata de São João e
Entre Rios foram identificados os seguintes grupos:
Governo: dentro desse grupo pode se distinguir as instituições de fomento ao
turismo e infra-estrutura, o que inclui as esferas federal e estadual e as
instituições de proteção, regulação e controle ambiental, urbano e turístico nas
esferas estadual e municipal. O subgrupo de fomento ao turismo busca atrair
investidores e turistas, para isso tem investido em infra-estrutura e feito a
divulgação dessa área para o Brasil e o exterior buscando grandes parcerias. O
grupo de regulação e controle, menos articulado, tem desenvolvido estudos e
projetos para a região, porém sua atuação tem sido branda para as atuais
necessidades e demandas do Litoral Norte;
Grandes investidores do turismo: já instalados e atuantes encontram-se o grupo
Klaus Peter e a Previ do Costa do Sauípe, mas, logo em breve, novos
investidores irão aderir a esse grupo. De forma mais homogênea esse grupo tem
uma preocupação ambiental superficial, pois sabe que é a natureza que atrai seu
público, mas não quer deixar de ocupar, aterrar ou consumir os recursos naturais
em prol da preservação local;
Pequenos empresários locais: é constituído de um grande grupo de proprietários
de pousadas, comércio e prestadores de serviço que dão suporte às atividades
turísticas. Menos consciente ambientalmente, porém com uma atividade
individual menos impactante, esse grupo tem obtido grandes benefícios
econômicos graças aos investimentos públicos e à publicidade dos grandes
empreendimentos turísticos. Desejam atrair novos turistas e veranistas para a
região.
Proprietários de terras: esse grupo é formado pelos agricultores e pecuaristas,
representantes das atividades econômicas mais antigas da região. Esse grupo está
98
mais consolidado graças ao tempo de exercício da atividade econômica, porém
tiveram um ganho com a valorização das terras, principalmente as mais
litorâneas que não tinham utilidade para o plantio ou a pastagem e usufruem as
melhorias da infra-estrutura como a facilidade de deslocamento pelas estradas ou
na comunicação com o serviço de telefonia fixa e móvel;
Comunidades tradicionais: esse grupo é formado pelos nativos da região que na
sua maioria, mantém como fonte de renda as atividades como pesca e
mariscagem, o pequeno roçado e o artesanato. Sofrendo as maiores interferências
por conta da atividade turística, esse grupo teve tanto prejuízos como benefícios.
Alteração do cotidiano, a simplicidade, o custo de vida, os valores morais e
culturais foram mais sentidos nos locais de maior freqüência turística. As
atividades tradicionais foram fortemente impactadas com a especulação,
desvalorização e as agressões ao meio ambiente. Empobrecimento e
marginalização em algumas comunidades. Aumento do assalariamento e da
renda, geração de novos empregos sazonais.
Turistas e veranistas: esse grupo é constituído por uma população sazonal e
flutuante que aquece a economia local e aumenta consideravelmente a densidade
demográfica nos meses de verão e finais de semana do ano todo. O uso
temporário e descompromissado do local fragiliza o meio ambiente. Estes
esperam ter água abundante, praias limpas, opções de passeios e aventuras,
oferta de peixes, hospedagem e serviços de primeira qualidade.
A segunda etapa consiste de uma rápida narrativa dos pontos fracos e fortes já
identificados na região (baseado na descrição de contexto apresentada no capítulo 1) que irá
nortear a seleção dos tópicos mais relevantes a serem mensurados.
Principais pontos fortes:
Importância dos ecossistemas costeiros e sua resguardada qualidade ambiental;
Beleza visual e paisagística da região;
Atrativos históricos e culturais;
Opções de lazer como as praias e passeios ecológicos;
Áreas protegidas pelo zoneamento da APA Litoral Norte;
Proximidade da capital do Estado
Fácil acesso viário e qualidade das vias principais;
Permanência de atividades tradicionais como pesca, mariscagem e artesanato;
Cultivo do coco, a fruticultura e a pecuária como fortes atividades econômicas;
99
Investimentos financeiros públicos e privados em infra-estrutura e turismo;
Incremento da economia e da oferta de empregos pelo turismo;
Baixas taxas de crescimento populacional.
Principais pontos fracos:
Baixo nível de renda e escolaridade da população nativa;
Crescente urbanização da população tradicionalmente rural;
Migração dos jovens por falta de oportunidade de estudo e emprego;
Progressiva desvalorização da cultura local;
Aumento da produção de resíduos sólidos sem destino adequado;
Alteração e supressão da cobertura vegetal e corpos hídricos;
Segregação das comunidades situadas à oeste da Linha Verde;
Distanciamento das sedes municipais;
Falta de controle, cobrança e regulação municipal sobre a área litorânea;
Má qualidade do sistema viário para o interior dos municípios;
Grande concentração de terras em mãos de poucos proprietários;
Fraca participação e mobilização social.
Da listagem acima se percebe o potencial natural para o desenvolvimento das atividades
agrícolas e turísticas que vêm se dando de maneira concentradora e desigual, não favorecendo
o fortalecimento social. Da integração das duas primeiras etapas identifica-se três grupos
fortes: os grandes proprietários de terras, os grandes grupos de investidores do turismo e os
pequenos empresários. A população local tem se colocado à margem do desenvolvimento e o
poder público não tem atuado suficientemente na administração dos conflitos na região.
Traçado o perfil de cada um desses grupos é possível identificar os principais cuidados ou
incentivos para que suas atividades se direcionem ao desenvolvimento sustentável, caberá no
entanto, ao conjunto de indicadores confirmar ou quantificar os fenômenos sociais,
econômicos e ambientais quanto a sustentabilidade.
A terceira etapa se iniciará com a apresentação de três diferentes listagens de
indicadores de desenvolvimento sustentável (modelo SAM, CDS / ONU e o IBGE) dentre as
quais serão selecionados os tópicos e parâmetros que apresentarem mensurabilidade e
exeqüibilidade para a região estudada.
O modelo SAM distinguiu o bem-estar social do ambiental, para o primeiro conjunto ele
propõe mensurar as dimensões saúde, população, riqueza, educação, cultura, comunidade e
equidade. No conjunto ambiental a proposta é mensurar os aspectos terra, água, ar, espécies
100
biológicas, populações humanas e o uso dos recursos naturais. No entanto, ele não apresenta o
indicador final, o que vai depender da adequação à escala e local estudado.
A proposta do CDS da ONU, conforme apresentada na tabela 1.1 do capítulo dois,
consta da proposição de 59 indicadores, porém levando-se em conta a exeqüibilidade foram
identificados 19 tópicos e seus indicadores:
Sociais: pobreza (taxa de pobreza e taxa de desemprego), igualdade de gênero
(relação entre o salário médio dos homens e das mulheres), mortalidade (taxa de
mortalidade infantil), saneamento (percentagem da população com condições
adequadas de esgoto), abastecimento de água (população com acesso a água
potável), nível educacional (taxa de conclusão do primeiro grau), alfabetização
(taxa de alfabetização de adultos), dinâmica populacional (taxa de crescimento
populacional), condições de habitação (área de moradia per capita);
Ambientais: agricultura (áreas de culturas permanentes e temporárias), florestas
(área de remanescentes florestais), urbanização (áreas de assentamentos formais
e informais), pesca (captura anual de espécies pesqueiras), qualidade da água
(DBO e concentração de coliformes fecais nas águas doces), ecossistemas
(percentual de áreas protegidas);
Econômicos: desempenho da economia (PIB per capita), comércio (balança
comercial de produtos e serviços), energia (consumo de energia anual per
capita), comunicação (número de acessos a Internet e telefones fixos ou
celulares).
Do universo dos indicadores de desenvolvimento sustentável publicados pelo IBGE
(2001) foram identificados como relevantes para a área de estudo, os listados a seguir:
Social : taxa de crescimento populacional, concentração de renda, taxa de
desemprego aberto, rendimento familiar per capita, taxa de mortalidade infantil
para menores de 1 ano, imunização contra doenças infecciosas, acesso a saúde,
escolaridade, taxa de escolarização, taxa de alfabetização.
Ambiental : concentração de poluentes em áreas urbanas, uso de fertilizantes /
por área, uso de agrotóxico / por área, queimadas e incêndios florestais, área de
remanescente / desmatamento da mata atlântica e formações vegetais litorâneas :
florestas ombrófilas, restingas e manguezais, produção de pesca marítima e
continental, população residente em áreas costeiras, espécies extintas e
ameaçadas de extinção, áreas protegidas, acesso ao serviço de coleta de lixo
101
doméstico, destinação final do lixo, acesso a sistema de abastecimento de água,
acesso a esgotamento sanitário, tratamento de esgoto.
Econômico : produto interno bruto per capita, taxa de investimento, consumo
de energia per capita.
Institucional: gasto público com proteção ao meio ambiente, acesso ao serviço
de telefonia, acesso à Internet.
Muitos dos indicadores selecionados são comuns às duas propostas, porém o grupo
proposto pelo IBGE segue o modelo pressão-estado-resposta (PER) enquanto o do CDS se
assemelha ao modelo SAM com a preocupação de medição dos aspectos relevantes para
análise, como a desigualdade de gênero ou criminalidade. Em ambos os casos foram extraídos
os parâmetros direcionados à grandes áreas como estados e países como emissão de gases de
efeito estufa ou investimento em ciência e tecnologia.
Partindo desse universo de tópicos e indicadores, e tendo como meta a melhoria e
manutenção do bem-estar social e do ambiente, os indicadores foram selecionados segundo os
demais critérios propostos pelo SAM como relevância e representatividade, sensibilidade e
capacidade de resposta, precisão e adequação analítica.
3.1 SELEÇÃO DOS INDICADORES E CRITÉRIOS DE DESEMPENHO
A listagem dos dois subsistemas, pessoas e meio ambiente, foi dividida nas dimensões a
serem avaliadas que por sua vez foram detalhadas nos tópicos e definidas pelos indicadores.
Essa proposição consta de indicadores subdivididos nos aspectos ambiental e
socioeconômico, para posterior integração e análise quanto a sustentabilidade.
102
Tabela 3.1 Dimensões, tópicos e indicadores, seguindo o modelo SAM
Subsistemas Dimensões Tópicos Indicadores
População dinâmica populacional taxa de crescimento populacional
Riqueza Pobreza
desempenho da economia
comércio
taxa de desemprego
rendimento familiar per capita
PIB per capita
balança comercial de produtos e
serviços
Saúde Mortalidade
acesso à saúde
taxa de mortalidade infantil
taxa de imunização contra doenças
infecciosas
Educação nível educacional
alfabetização
taxa de conclusão do primeiro grau
taxa de alfabetização de adultos
Habitação abastecimento de água
condições de habitação
energia
comunicação
população com água potável
área de moradia per capita
consumo de energia anual per
capita
número de acessos a Internet e
telefones fixos ou celulares
Pessoas
Equidade igualdade de gênero relação entre o salário médio dos
homens e das mulheres
Cobertura vegetal florestas área de remanescentes florestais
Uso da terra agricultura
urbanização
áreas de plantio
áreas de assentamentos humanos
Água qualidade da água DBO e concentração de coliformes
fecais nas águas doces
Espécies da fauna e
flora
Pesca
Espécies raras ou
ameaçadas de extinção
captura anual de espécies
pesqueiras
listagem do Ibama
Potenciais de
poluição
Lixo
Esgoto
Percentual de pessoas com acesso
ao serviço de coleta de lixo
doméstico
percentagem da população com
condições adequadas de esgoto
Ambiente
Instrumentos de
proteção
Áreas protegidas percentual de áreas de preservação
ambiental
103
A experiência proposta inicialmente se resumia a mapear os indicadores na pequena área
de estudo, ou seja o litoral dos municípios de mata de São João e Entre Rios. No entanto foi
constatada a limitação dos temas mapeáveis para a escala de trabalho adotada. Uma primeira
tentativa de construção dos indicadores comprovou a limitação dos itens que integrariam o
índice final. Após a primeira experiência foram descartados temas pontuais que não se
refletiam para toda a área pois distorciam o resultado, como exemplo, descartamos os dois
pontos de coleta da qualidade da água situados apenas no município de mata de São João.
Como os dados municipais eram mais fartos e mais facilmente levantados, foi
construída uma tabela com indicadores municipais no intuito de experimentar melhor o
modelo SAM, mas sem desistir de avaliar a área litorânea, apenas para utilizar a avaliação
municipal como de parâmetro de análise dos resultados finais, tentando evitar as distorções ou
más interpretações, que a pequena variedade de dados disponíveis poderia causar.
Na tabela a seguir (Tabela 3.2) foram incluídos os valores referentes ao município de
Salvador e também os do estado da Bahia para servirem de referência na pontuação e
avaliação quanto ao desenvolvimento sustentável. Um grande diferencial dessa experiência
foi adoção dos valores 1, 0 , -1 como indicadores. Não é comum se encontrar valores
negativos, porém a presença deles permite reforçar os pontos fracos de uma sociedade.
Quando não se tem esgotamento sanitário, levar uma nota baixa não refletirá nos outros
parâmetros como uma nota negativa pode influenciar no seu resultado final. Pode-se pensar
que esse valor negativo irá descontar um ponto positivo, por exemplo, do indicador de
qualidade da água ou de saúde, já que de fato a ausência de esgotamento prejudicará a
sociedade em diversos aspectos.
Infelizmente a bibliografia sobre as experiências práticas de adoção de indicadores de
desenvolvimento sustentável não trazia detalhes dos parâmetros e valores que influenciavam
na pontuação do ambiente natural e da condição social, principalmente por se tratar de uma
avaliação subjetiva, que varia com as características do grupo de especialistas envolvidos,
como formação profissional, cultura e as metas desejadas. Sem dúvida alguma, nos países
desenvolvidos o padrão da economia ou o nível de equidade social é mais alto, por esse
motivo estaremos utilizando referências locais (Salvador e Bahia) na hora de julgar se o litoral
norte está caminhando para um desenvolvimento sustentável, segundo as possibilidades da
realidade local e anseios de sua comunidade.
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105
Para cada parâmetro foi atribuída uma nota (-1, 0, 1) de acordo com a proximidade ou
direcionamento para o pleno desenvolvimento sustentável do ambiente e das pessoas. Cada
item mensurado foi comparado aos valores encontrados para o Estado da Bahia e pontuado de
acordo com o seguinte critério:
Nota 1 quando os valores dos municípios foram melhores do que a média da Bahia;
Nota 0 quando os valores dos municípios foram semelhantes à média da Bahia;
Nota - 1 quando os valores dos municípios foram piores do que a média da Bahia.
Os valores dos 7 indicadores somados resultaram na pontuação final de cada subsistema
e marcados no barômetro da sustentabilidade, que foi adaptado a este sistema de notas.
Se o somatório dos indicadores der (7) em ambos os aspectos caracterizará uma forte e
eqüitativa estrutura social, a proteção e conservação do meio ambiente e um pleno
desenvolvimento econômico e em seu oposto o (-7) demonstra um total desequilíbrio
econômico, social e ambiental.
Na prática essa experiência revelou uma grande diferença entre os dois municípios
analisados, classificando Mata de São João como em estágio intermediário de sustentabilidade
e Entre Rios numa situação de insustentabilidade, caracterizado especialmente pela condição
social precária. Tendo em vista esta avaliação partiremos para o estudo em detalhe do trecho
litorâneo.
Figura 3.1 Adaptação do barômetro da sustentabilidade
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106
3.2 INDICADORES PARA O LITORAL
Para essa etapa da experiência de aplicação dos indicadores, o diferencial está na
componente espacial, pois todos os aspectos avaliados, foram mapeados e sobrepostos para
uma leitura integrada do território. Prioritariamente no campo social os dados utilizados foram
do censo 2000 (IBGE, 2000) e no campo ambiental os dados foram, em sua maioria,
produzidos pelos órgãos estaduais da área ambiental.
A metodologia utilizada no geoprocessamento das informações foi criada para essa
experiência, valendo-se dos softwares Arcview 3.2 e Mapinfo 7.0, para os cálculos dos
indicadores e geração dos mapas. Inicialmente o banco de dados proveniente do Censo 2000
foi associado aos setores censitários espacializados, porém, como a forma e tamanho dos
setores não era similar aos demais dados como vegetação, ocupação humana e áreas de
preservação, foi criada uma grade, com células de 1x1 km, para que se pudesse associar os
valores de cada tema às células dessa grade, tornando possível a comparação e integração dos
dados de diferentes fontes e formatos.
3.2.1 Subsistema pessoas
O aspecto socioeconômico dos indicadores de desenvolvimento sustentável busca
configurar a qualidade de vida, quantificando o nível de renda familiar, o grau de
escolaridade, acesso à infra-estrutura urbana, entre outros.
Dimensão: população
Indicador: densidade demográfica
Graças à dinâmica recente do uso turístico de maior envergadura, preferiu-se configurar
a espacialização da densidade populacional, identificando as áreas mais intensamente
ocupadas no ano de 2000.
Esse item reflete as áreas que vem sofrendo maior pressão sobre os seus recursos
naturais e os locais onde as ações para o fortalecimento social devem ser.
Os dados utilizados foram os publicados pelo IBGE no Censo 2000 – Resultados do
universo. Da planilha de informações básicas foi retirada a informação do total de pessoas
residentes, divididas pela área de 1km2. A pontuação foi:
1 = células com 0 a 50 pessoas/ km2,
0 = células com 50 a 350 pessoas/ km2
-1 = células com 350 a 1.100 pessoas/ km2 (mapa 3.1)
108
As áreas mais densas são também aquelas ainda em fase de expansão como a Praia do
Forte, Imbassaí e Porto Sauípe, onde é preciso controlar não só o crescimento mas também a
forma como este vem se dando, o que deve incluir uma melhor infra-estrutura urbana e a
preservação das áreas ambientalmente mais frágeis.
Dimensão: Riqueza
Indicador: rendimento familiar per capita
A distribuição dos recursos materiais por domicílio, implica no reconhecimento que os
rendimentos dos responsáveis são repartidos no âmbito familiar e possibilita o estudo da
pobreza como subsídio a programas de combate a fome ou incremento da renda.
O dados foram retirados do Censo 2000 no nível de setor censitário, da planilha com
informações sobre os responsáveis por domicílios particulares permanentes. O cálculo foi
feito sobre o somatório dos rendimentos dividido pelo total de residentes, chegando-se ao que
seria o valor médio que cada pessoa de uma família teria por mês. As faixas encontradas
foram pontuadas assim:
1 = R$ 100,00 a R$ 155,00
0 = R$ 70,00 a R$ 100,00
-1 = R$ 41,00 a R$ 70,00
Para se chegar ao rendimento familiar mensal seria necessário multiplicar o valor
encontrado pelo numero de moradores de cada residência. De maneira geral esses valores
foram todos baixos e bastante homogêneos, no entanto, a pontuação aplicada foi para
identificar dentro desse universo quem está em melhores condições, o que não significa que
seja a ideal, porém, é a melhor situação para essa realidade. Dessa forma identificaram-se as
localidades litorâneas de Praia do Forte a Santo Antônio como, pontualmente, melhores
remuneradas, mas na média, o município de Entre Rios apresentou melhores indicadores.
(mapa 3.2).
110
Dimensão: Educação
Indicador: Percentual de pessoas alfabetizados
Domínio da língua escrita e falada coloca o cidadão em contato com o mundo exterior, a
informação e as oportunidades, indicando também o acesso à educação e às oportunidades de
emprego. O cálculo desse tema feito foi do total de pessoas alfabetizados com 5 ou mais anos
de idade, dividido pelo total de pessoas dessa mesma faixa etária e multiplicado por 100.
Foram atribuídos os seguintes pesos:
1 = 65 a 100% de pessoas alfabetizadas
0 = 45 a 65% de pessoas alfabetizadas
-1 = 25 a 45% de pessoas alfabetizadas
O município de Mata de São João obteve melhores notas com destaque para o trecho
litorâneo da Praia do Forte a Imbassaí (mapa 3.3).
Dimensão: Habitação
Indicador: Percentual da população com água potável
O indicador expressa a parcela da população que tem acesso aos serviços de
abastecimento de água via rede geral, um elemento importante na análise da qualidade de vida
e infra-estrutura de uma comunidade. Esses dados foram obtidos na planilha sobre os
moradores e o resultado foi calculado pela divisão entre o número de moradores com
abastecimento de água regular e o total de moradores, multiplicado por 100. A pontuação foi
da seguinte forma:
1 = 35 a 81% de pessoas com abastecimento
0 = 15 a 35% de pessoas com abastecimento
-1 = 0 a 15% de pessoas com abastecimento
Nesse mapa houve equilíbrio entre os dois municípios estudados, dando-se mais uma
vez destaque para as áreas litorâneas da Praia do Forte a Imbassaí em Mata de São João e
incluindo a localidade de Porto Sauípe, no município de Entre Rios. (mapa 3.4).
113
Dimensão: Equidade
Indicador: relação entre o salário médio dos homens e das mulheres
Esse indicador se propõe a caracterizar o grau de equidade entre os gêneros, o que pode
mostrar grande disparidade por se tratar de uma comunidade tradicional que começa a receber
mais fortemente as influências externas. O quesito mensurado é também importante, pois cada
vez mais as mulheres se tornam chefes de família e seus salários sustentam a casa, portanto
devem ter seu trabalho valorizado e remunerado como o dos homens.
Os dados retirados das planilhas sobre os responsáveis por domicílios particulares
permanentes foram calculados do somatório dos rendimentos mensais dos homens e das
mulheres divididos respectivamente pelo total de homens e mulheres responsáveis por
domicílios particulares e permanentes. A relação então ficou expressa assim: (R1- R2) / R1,
sendo (R1) = rendimento dos homens e (R2) = rendimento das mulheres e a pontuação foi:
1 = -10 a 5% de diferença entre as médias dos salários de homens e mulheres
0 = 5 a 15% a mais na média de salários dos homens
-1 = 15 a 35% a mais na média de salários dos homens
Com a elaboração desse mapa foi possível verificar que na maior parte do território os
homens recebem de 5 a 15% a mais de remuneração do que as mulheres. Apenas o trecho
litorâneo da Praia do Forte a Santo Antônio a discrepância dos salários é maior, beneficiando
mais os homens e a surpresa foi identificar na área da Reserva da Sapiranga uma melhor
remuneração entre as mulheres (mapa 3.5).
Alguns indicadores sociais não foram incorporados por ausência de dados desagregados
aos setores censitários como a taxa de desemprego e índice de GINI para renda. Na área da
saúde, apesar dos esforços e da existência de dados do Sistema Único de Saúde (SUS), para
todo o Brasil, não foi possível o acesso devido a problemas técnicos e de infra-estrutura dos
municípios envolvidos.
115
3.2.2 Subsistema ambiente
A dimensão ambiental dos indicadores de desenvolvimento sustentável incorpora o
estado e a qualidade dos recursos naturais, os aspectos de maior pressão antrópica e
mecanismos que visam assegurar a perpetuidade das áreas de maior riqueza e fragilidade
ambiental.
Dimensão: Cobertura vegetal e Uso da terra
Indicador: Área de remanescentes florestais e áreas de agropecuária
Neste item foram associados duas dimensões e dois indicadores que formaram um mapa
único de áreas naturais e antropizadas. A fonte da informação foi do Programa Gerco (Lyrio,
2004) de onde foi retirado o mapeamento da cobertura vegetal cuja legenda era: floresta com
vegetação primária que ficou com nota 2 por se tratar de áreas com alto valor ecológico,
floresta em estágio médio e avançado de regeneração, manguezal, restinga, brejo, cerrado e
mata ciliar que receberam nota 1 pela sua importância ecológica, floresta em estágio inicial de
regeneração, campo cerrado e cultura de côco receberam a nota zero por não terem tanta
importância ambiental e nem representarem grandes alterações da cobertura e por fim as áreas
de reflorestamento e agropecuária receberam a nota -1 pelos impactos ambientais que as
atividades costumam gerar. Para o cálculo da pontuação de cada célula foi feita uma relação
entre as áreas ocupadas e os pesos da legenda, assim uma célula (1km2) pode ser coberta por
50% de floresta inicial, nota zero e 50% de agropecuária, nota -0,5. A partir da soma de cada
célula foram criadas faixas negativas, intermediárias e positivas para análise dos resultados.
No mapa resultante houve um grande equilíbrio entre os municípios e as áreas que sofrem
maior e menor impacto ambiental, porém as áreas mais litorâneas apresentaram um melhor
resultado ao longo de todo o trecho (mapa 3.6).
Indicador: Áreas de assentamento humano
As áreas reservadas ao assentamento humano são de fundamental importância para a
sociedade, porém devem ser ocupadas com certos cuidados como a implantação de infra-
estrutura urbana e degradarem os locais de grande fragilidade ambiental. Também mapeadas
por Lyrio (2004) essas foram analisadas quanto ao risco que oferecem ao meio ambiente e sua
legenda as classificavam em: áreas de turismo em massa (nota -2), loteamentos em grande
expansão (nota -1), assentamentos de baixa densidade mas com urbanização incipiente (nota
zero) e as áreas sem risco aparente. Para calcular o valor de cada célula da grade foi feito o
procedimento similar ao da cobertura vegetal, ou seja, a soma das notas multiplicadas pelo
percentual de área ocupada na célula (mapa 3.7).
118
Desse mapa pode-se perceber que as áreas do Complexo Sauípe e das principais praias
utilizadas pela atividade turística ficaram com a pior pontuação do tema, no entanto a
realidade local é bastante homogênea e apresenta áreas com baixas taxas de ocupação.
Dimensão: Infra-estrutura urbana
Indicador: percentual da população com acesso a coleta de lixo
O cálculo do percentual de lixo coletado é expresso pela relação de moradores com
coleta de lixo dividido pelo número total de moradores por setor censitário multiplicados por
100. Esse dado é de extrema relevância uma vez que os resíduos sólidos quando não coletados
ou dispostos em locais apropriados acarretam proliferação de vetores de doenças e podem vir
a contaminar o solo e os recursos hídricos superficiais e subterrâneos.
A nota 1 foi atribuída às células da grade com percentual entre de 40 e 80%, a nota zero
para os locais entre 20 e 40% de pessoas com coleta de lixo e a nota –1 para os locais com
menos de 20 % cem coleta de lixo.
Nesse mapa verificou-se que as áreas interiores obtiveram melhor pontuação do que a
litorânea que apesar de oferecer o serviço, não consegue atender a grande parcela da
população (mapa 3.8).
Indicador: percentual da população com esgotamento sanitário
Expresso pela relação dos moradores de domicílios ligados à rede geral de esgotamento
sanitário e o total de moradores por setor censitário, multiplicado por 100. Foi atribuída a nota
1 para os locais com até 30 a 65% da população beneficiada pelo serviço, a nota zero para as
áreas entre 0,5 e 30% e a nota -1 para os locais com menos de 0,5 % da população atendida.
Esse indicador é de extrema importância pela sua repercussão na qualidade da saúde
populacional e dos recursos naturais.
Toda a área obteve baixa pontuação pela ausência da rede coletora, com exceção de
áreas bem pontuais no seu litoral. (mapa 3.9).
121
Dimensão: Instrumentos de proteção
Indicador: percentual de áreas de preservação ambiental
Importante mecanismo de gestão e participação institucional para a manutenção do
equilíbrio ambiental da região, o Zoneamento ecológico-econômico da APA define zonas de
proteção, conservação e uso. Dentro dessa lógica foi atribuída a nota 1 às seguintes zonas :
Zona de proteção rigorosa (ZPR), Zona de proteção visual (ZPV) e Zona de manejo especial
(ZME), a nota zero para as zonas de uso com baixa densidade: Zona de urbanização restrita
(ZUR), Zona de reserva extrativista (ZRE), Zona de orla marítima (ZOM), Zona turística
especial (ZTE) e Zonas de ocupação rarefeita (ZOR), a nota -1 para as zonas designadas para
as atividades econômicas e sociais de maior impacto ambiental tais como : Zona de
urbanização prioritária (ZUP), Zona de uso diversificado (ZUD), Zona turística (ZT), Zonas
de Expansão (ZEP´s) I, II e III, Zona de comércio e serviços (ZCS), Zona de
comprometimento ambiental (ZCA), Zona de agricultura (ZAG). As áreas fora do limite da
APA ficaram com a nota zero.
Nesse mapa houve equilíbrio entre a pontuação dos dois municípios em análise, senda a
área litorânea melhor pontuada, uma vez que seus ecossistemas frágeis requisitaram um
zoneamento que visasse protegê-los da ocupação desordenada e mais intensa da orla (mapa
3.10).
Como indicadores ambientais que ficaram faltando à essa análise pode-se citar o uso de
agrotóxicos ou fertilizantes por ausência da informação, emissão de gases de feito estufa por
não se adequar à escala de análise, queimadas e incêndios florestais por não se encontrar
registros mapeados na área (disponível em www.embrapa.gov.br) e a produção de pesca
marítima ou continental e demais dados marinhos, uma vez que o trabalho foi direcionado
para as questões territoriais nos limites traçados pela poligonal de estudo.
123
3.3 AGREGAÇÃO DOS INDICADORES
Para a avaliação dos indicadores, os temas mensurados foram agregados de acordo com
o subsistema ao qual estavam associados (pessoa ou ambiente). Desse modo foi possível
integrar informações que vinham de bases territoriais diferenciadas e fazer uma análise
temática.
As notas foram somadas segundo o subsistema ao qual estavam associadas,
determinando grau sustentabilidade da célula, segundo a metodologia do barômetro da
sustentabilidade que as qualifica em ruim, fraco, médio, ok e bom.
No mapa do subsistema pessoas como já era de se esperar os resultados foram em
grande parte qualificados como ruim ou fraco com exceção do trecho litorâneo próximo à
Praia do Forte que obteve uma classificação entre OK e bom. Esse mapa poderia apresentar
melhores resultados se os dados de saúde fossem incorporados os houvesse maior
detalhamento dos setores censitários que não contemplaram localidades como o Complexo
Sauípe e Vila Sauípe englobando-os nos grandes setores rurais. Apesar das limitações
identifica-se com facilidade a fragilidade social local, fato que foi percebido nas visitas de
campo e pela avaliação dos indicadores municipais (mapa 3.11).
No mapa do subsistema ambiente obteve um resultado mais homogêneo não chegando a
notas pontuais tão altas como no subsistema pessoas, mas por outro lado não apresentou
tantas áreas com a avaliação ruim. Percebe-se claramente que as áreas mais litorâneas
apresentaram as melhores notas, o que pode ser atribuído aos ecossistemas mais frágeis e de
maior importância ambiental, ali localizados e pelas comunidades litorâneas que, apesar do
impactam que geram com as ocupações mais densas também apresentam melhores infra-
estrutura. Mas de uma maneira geral todos os indicadores podem ser percebidos na
composição do mapa do subsistema ambiente. Não há grande diferenciação entre os dois
municípios, já que os parâmetros mensurados não levam em conta limites políticos e sim os
ambientais. Esse mapa apresentou muito bom resultado, graças ao acesso a dados detalhados
da área já com ponderações da qualidade dos recursos naturais e à inclusão de um parâmetro
institucional com o zoneamento da APA como instrumento de gestão (mapa 3.12).
126
3.4 BARÔMETRO DE SUSTENTABILIDADE
Para a composição do mapa final foi gerada uma terceira grade na qual foram inseridos
os valores encontrados para os dois subsistemas e analisados segundo os critérios do
barômetro, ou seja quando o resultado de um aspecto for menor que -5 o outro aspecto, por
melhor que seja, nunca obterá um resultado superior à faixa qualificada como ruim. Essa
característica do barômetro conferiu uma maior coerência na análise quanto a sustentabilidade
da região.
O mapa final demonstrou um grande equilíbrio entre os dois municípios, diferentemente
do resultado alcançado pelos indicadores municipais, porém, obteve uma classificação
igualmente ruim, pois com exceção de uma única célula, próxima a Porto Sauípe, que ficou na
faixa quase sustentável, a média geral foi de intermediário e quase insustentável, com
manchas intercaladas de áreas insustentáveis (mapa 3.13). Com base nesse resultado pode-se
dizer que o desenvolvimento no Litoral Norte, mais especificamente nos municípios de Mata
de São João e Entre Rio, vem se dando de maneira desigual, beneficiando a pequenos grupos
sociais como os dos investidores na área turística ou os grandes proprietários de terras, e que
apesar dos esforços de iniciativas pontuais de inclusão das comunidades e fortalecimento da
cultura local, de fato essas comunidades continuam em uma frágil situação de moradia, com
pouco acesso aos serviços de saúde ou oportunidades de estudo e emprego. Essa fragilidade
da região na esfera social precisa ser urgentemente fortalecida ou sucumbirá ao aumento do
fluxo turístico perdendo sua área de domínio, cultura e tradição.
No aspecto ambiental pode-se dizer que a atual prática das atividades econômicas tem
comprometido a qualidade dos recursos ambientais com as grandes retiradas de vegetação
nativa ou contaminação e alteração dos recursos hídricos e sem o devido cuidado com os
ecossistemas mais frágeis como os manguezais ou as matas ciliares. O tipo de ocupação dos
povoados costeiros, que apresentam uma incipiente infra-estrutura urbana, em especial no
quesito esgotamento sanitário e coleta de lixo, também devem ser mais intensamente
controlados e orientados pelo poder público, de forma a não se perder o controle desse
movimento, e tendência cada vez maior, de ocupação e exploração do litoral. Pode-se também
avaliar que, apesar da dificuldade de dados mais detalhados para alguns parâmetros sociais e
econômicos, foi possível a identificação das fragilidades locais no sentido de direcionar ações,
programas e projetos futuros, sendo recomendado que os próximos grandes empreendimentos,
já a caminho, incluam ações mais efetivas de fortalecimento da população local e preservação
do meio ambiente, a fim de reverter o quadro de insustentabilidade demonstrado, além de
maiores investimentos públicos nas áreas da saúde, escolaridade e renda familiar.
128
CONCLUSÕES
No esforço de construção de uma sustentabilidade é preciso que seu conceito seja
apreendido pelos atores e agentes: governo, empresariado, turistas, comunidades tradicionais
e sociedade em geral.
Uma ferramenta eficaz para a mensuração do direcionamento da sustentabilidade
são os indicadores espacializados, por sua capacidade de agregação de informação e
sensibilidade a mudanças nos diferentes aspectos avaliados, conforme enunciado nas
hipóteses iniciais dessa pesquisa.
O embasamento conceitual na construção do conjunto de indicadores é crucial,
pois é preciso ter clareza de onde se quer chegar e a pertinência de cada item mensurado, pois
as possibilidades são inúmeras, no caso dessa experiência foi interessante a adoção, mesmo
que parcial de uma metodologia já experimentada com o método SAM.
Apesar das inúmeras iniciativas de uso de indicadores de sustentabilidade no
mundo, não é fácil ter acesso aos dados, metodologias e resultados, portanto, é preciso
fortalecer as iniciativas brasileiras de construção de modelos e testar quais apresentam
melhores resultados.
Para a construção de uma proposta nacional é importante ultrapassar as fronteiras
do IBGE e MMA e chamar outros segmentos como os ministérios das áreas econômicas e
sociais e as agências de fomento como a Agência Nacional de Água (ANA) e Agência
Nacional de Energia Elétrica (Aneel), além da sociedade civil organizada, bem representada
por Organizações Não Governamentais (ONG´s) que tenham atuação em locais ou aspectos
relevantes da sustentabilidade.
Os melhores indicadores além de servirem de parâmetro de comparação entre
nações, devem poder ser aplicados a escalas maiores como estados e municípios, mesmo que
para cada situação sejam necessários ajustes e adaptações. No entanto, a falta de dados
sistematicamente publicados no Brasil dificulta a ampla adoção de indicadores.
Tendo em vista uma certa difusão do uso de indicadores, é fundamental que estes
sejam exeqüíveis, facilmente mensurados e racionais, com uma lógica simples de análise.
Para a realidade do Brasil, os dados oficiais como os do IBGE, SUS ou
Ministérios, se mostraram seguros e confiáveis, de forma que se vê garantida a análise
temporal e perpetuidade da aplicação.
Indicadores podem ser modelados para diferentes situações (elemento territorial)
conservando-se uma base comum. Áreas urbanas, Unidades de conservação, bacia
hidrográfica, município, bioma, ou voltado para um empreendimento específico: turístico,
129
complexo industrial, cultivo agrícola, reflorestamento. No entanto o nível de detalhamento se
diferencia bastante, para a escala nacional recomenda-se o uso dos limites estaduais como
menor unidade territorial, para análises estaduais ou regionais, os limites municipais estão
bem adequados, já para análises micro-regionais, recomenda-se a adoção dos setores
censitários como unidade territorial e para análises locais dados primários precisariam ser
coletados direcionados a um empreendimento ou comunidade.
Além dos dados socioeconômicos disponibilizados pelo IBGE, se faz necessária a
inclusão de informações como cobertura vegetal e uso do solo, em escalas de maior detalhe
como 1 / 50.000 ou 100.00 que deveriam ser realizados, de forma sistemática, por
imageamento de satélite.
É recomendado o acompanhamento dos indicadores de desenvolvimento
sustentável em períodos iguais ou superiores a um ano, pois os fenômenos mensurados não se
alteram tão rapidamente a ponto de se perceber nas estatísticas, mudanças em qualquer um
dos aspectos avaliados.
Com relação à área estudada percebe-se ainda uma conservada qualidade
ambiental, porém uma frágil situação social e grande concentração econômica que são
potencializadas pela forma que o turismo vem ocorrendo e apesar das pequenas iniciativas de
inclusão e fortalecimento social de empreendimentos como o Ecoresort e Costa de Sauípe.
Quanto às relações político-administrativas, podem-se traçar dois caminhos
possíveis, o primeiro seria aproximar as sedes municipais da área litorânea, com a construção
de acessos e fortalecendo as ações de controle, cobrança e gestão efetiva dos processos
dinâmicos da orla. O segundo caminho, e esse parece estar mais na linha da política estadual,
seria a tornar independente toda a região criando novos municípios com sedes administrativas
locais.
Apesar da situação de baixa sustentabilidade da área estudada, e tendo em vista que
alguns usos são realmente insustentáveis por essência, mas que não serão evitados, pode-se
pensar que dentro do contexto da APA Litoral Norte, as outras áreas poderiam minimizar ou
equilibrar as tendências, se asseguradas as condições de proteção ambiental, fortalecimento
social e incremento econômico eqüitativo.
Vale ressaltar que uma experiência como esta deveria contar com um grupo
multidisciplinar e especialmente com a participação da comunidade, porém como se trata de
um trabalho acadêmico (apesar do seu caráter profissionalizante) não foi possível incluir a
participação de outros profissionais e uma interlocução maior com os representantes e
população local.
130
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