Hetero Side o

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PLANTAS COM HETEROSÍDEOS CARDIOTÔNICOS

 

1 - DEFINIÇÃO

Estes princípios ativos tem em comum uma estrutura química esteroidal (esqueleto tetracíclico do tipo (esqueleto tetracíclico do tipo ciclopentanoperidrofenantreno)ciclopentanoperidrofenantreno) e são utilizados como principais medicamentos na insuficiência cardíaca.

Todos os heterosídeos cardiotônicos são de origem natural.

 Segundo a natureza da lactona cíclica, podemos distinguir dois tipos de geninas: 

a) os cardenolídeos que possuem uma unidade butanolídica (lactona ciclo pentagonal com 4 carbonos e uma dupla ligação) são mais difundidos na natureza, por exemplo em Digitalis;

b) os bufanolídeos ou bufadienolídeos com uma unidade pentadienólida (lactona ciclo hexagonal, com 5 carbonos e duas duplas ligações) que são pouco difundidos na natureza (a scilarina). O nome bufanolídeo deriva do nome genérico do sapo, Bufo. O composto bufalina foi isolado da pele do sapo.

uma lactona cíclica insaturada em C-17 ; uma hidroxila alcoólica secundária sobre a qual se fixa a cadeia glucídica em C-3 ; uma hidroxila alcoólica terciária em C-14 ; e anéis A/B e C/D em posição cis.

Algumas hidroxilas suplementares podem ser encontradas (em C-1, C-5, C-11, C-12 ou C-16), as vezes uma metila em C-10 que pode ser oxidada em álcool primário ou em aldeído.

As oses são fixadas na hidroxila alcoólica em C-3 da genina. Podemos citar: hexoses, como D-glicose; desoxioses, como desoxi-6-hexoses ou metilpentoses (L-ramnose, D-digitalose, L-tevetose), desoxi-2-metilpentose (D-digitoxose, D-cimarose, L-oleandrose).

Os cardenolídeos possuem:

OOH

OHOH

HO

CH3

CH3

OH

OOH

O

HO

CH3

CH3

O

OH

HO

CH3

O

OH

L-ramnose L-tevetose

2 - 2 - ESTADO NATURAL E DISTRIBUIÇÃO

Sòmente algumas famílias vegetais encerram as plantas com heterosídeos cardiotônicos. Podemos citar: Liliáceas (cila), Ranunculáceas (Adonis), Apocináceas (Estrofanto, Thevetia, Espirradeira) e Scrofulariáceas (Digitalis).

O número de oses da cadeia glucídica pode variar de 1 a 4. Na planta fresca existem os heterosídeos primários ricos em oses, muito solúveis em água. Na planta seca existem os heterosídeos secundários proveniente da hidrólise enzimática de uma ose dos heterosídeos primários.

3- PROPRIEDADES FÍSICO – QUÍMICA

São produtos geralmente bem cristalizáveis. São mais ou menos solúveis em água (esta solubilidade é função do número de oses e de hidroxilas ligadas as geninas) e em álcool. Geralmente muito solúveis em clorofórmio (principalmente a digitalina), mas insolúveis em hexano e éter de petróleo. São moléculas frágeis que em meio alcalino ocorre a abertura do anel lactônico e epimerização em C-17 (17 --> 17 ). A extração dos heterosídeos cardiotônicos se faz de uma maneira geral por etanol ou clorofórmio.

4- CARACTERIZAÇÃO E DOSAGEM

A caracterização é feita a partir dos extratos hidroalcoólicos purificados e concentrados da droga pulverizada. Após filtração a solução parcialmente concentrada é tratada pelo acetato de chumbo e o filtrado obtido é então extraído pelo clorofórmio.

A presença de heterosídeos cardiotônicos é evidenciada por meio de reações coloridas, fluorescentes e em cromatografia de camada delgada. As reações podem ser feitas com a parte glucídica (desoxi-2-ose) e com a genina.

Reações coloridas na parte osídica:

Reação com as desoxi-2-ose de Keller-Kiliane: a reação é feita em presença de ácido acético, ácido sulfúrico concentrado e traços de sais férricos formando um anel castanho na interface e uma coloração azul na camada acética.

Reação de Baljet: a reação é feita em presença de ácido pícrico, NaOH formando uma coloração alaranjada.

Reações coloridas com a genina: são feitas após hidrólise dos heterosídeos e extração da genina com clorofórmio.

Reação geral do núcleo esteroidal de Liebermann-Burchard: O extrato clorofórmico é adicionado de anidrido acético e ácido sulfúrico concentrado, dando origem a uma coloração violeta que passa a azul e depois a verde.

Reação do anel lactônico pentagonal insaturado de Kedde: o extrato clorofórmico depois de concentrado é adicionado do ácido 3,5-dinitrobenzóico e KOH dando uma coloração rósea passando para violeta.

A dosagem dos heterosídeos cardiotônicos pode ser feita após hidrólise ácida e extração das geninas, com a reação de Kedde e visualização da coloração pelo espectrofotômetro. Este tipo de dosagem estima o teor de heterosídeos totais.

5- AÇÃO FISIOLÓGICAOs heterosídeos cardiotônicos agem sobre o coração

doente reforçando, acalmando, e regularizando os movimentos cardíacos.

 Distinguem-se vários efeitos:

ação inotrópica (+) - aumentam a força de contração sistólica do miocárdio, o que constitui a ação tonicardíaca propriamente dita. O aumento da contratilidade do coração provoca o esvaziamento mais completo do ventrículo e o encurtamento do período de sístole. Assim o coração tem mais tempo para repousar entre as contrações.

provocam uma modificação da permeabilidade iônica da membrana; a bomba de sódio é inibida pelos digitálicos. Isto tem como resultado uma diminuição de potássio e um aumento da concentração de sódio no interior da célula. Este acréscimo da concentração de sódio dentro da célula provoca um aumento de cálcio ionizado o que promove um reforço da concentração miocárdica.

ação cronotrópica (-) diminuem a frequência cardíaca por um efeito vagotônico depressivo sobre o nodo sinusal e por uma ação indireta antiadrenérgica devido a melhoria do débito cardíaco.  ação ao nível dos rins - exercem uma ação diurética indireta pelo melhoramento do débito sanguíneo, levando a um aumento da filtração glomerular e da eliminação urinária.

Farmacocinética

A farmacocinética dos três tipos de cardiotônicos pode ser vista no quadro abaixo. Farmacologia comparativa de três heterosídeos cardiotônicos---------------------------------------------------------------------------------- DIGITOXINA DIGOXINA OUABAINA---------------------------------------------------------------------------------Origem D. purpúrea D.lanata S. gratus----------------------------------------------------------------------------------N de OH 2 3 6----------------------------------------------------------------------------------Lipossolubilidade +++ + 0----------------------------------------------------------------------------------Assimilação digestiva 100% 60-80% 0---------------------------------------------------------------------------------Fixação sobre albuminas plasmáticas 90% 25-50% 0---------------------------------------------------------------------------------Demora da ação 2 horas 20 min. 5 min.----------------------------------------------------------------------------------Degradação hepática +++ + 0---------------------------------------------------------------------------------

Eliminação lenta rápida muito rápida ----------------------------------------------------------------------------------Taxa de inativação 70% 18 -20% 40%----------------------------------------------------------------------------------Duração do efeito 2 a 3 dias 12 a 24 h 12 h-----------------------------------------------------------------------------------Semi-vida fisiológica 110 h 33 h 6 h-----------------------------------------------------------------------------------Persistência noorganismo 2 a 3 sem. 1 sem. 1-2 dias -----------------------------------------------------------------------------------8 – TOXICIDADE

A margem entre a dose terapêutica e a dose tóxica é estreita. Numerosos fatores aumentam a toxicidade como por exemplo a isquemia do miocárdio, a hipopotassemia e a hipercalcemia. A intoxicação provoca distúrbios no ritmo com extrasístoles ventriculares e a morte ocorre pela parada cardíaca com fibrilação ventricular.

Mesmo nas doses terapêuticas, são observadas as reações de intolerância digestiva (náuseas, vômitos, diarréias).

Ação sobre o sistema nervoso central - observa-se, particularmente, uma estimulação dos centros do vômito e dos centros visuais. Estes são indesejáveis e traduzem uma dosagem excessiva.

A escolha do cardiotônico é função da urgência do tratamento; a posologia não é geral, mas individual. O tratamento comporta duas etapas: • o tratamento do ataque cardíaco com uma dose da ordem de 0,5 mg administrada por via oral ou intravenosa.• o tratamento de manutenção com uma dose diária de 0,1 mg calculada em função da eliminação urinária e do estado clínico do doente.

6- EMPREGO

Os heterosídeos cardiotônicos são prescritos em todos os casos de insuficiência cardíaca grave e nas alterações do rítmo (taquicardia, arritmias ventriculares, fibrilações auriculares).

Precauções no emprego

A digitalina deve ser evitada na insuficiência hepática e a digoxina na insuficiência renal.

O equilíbrio iônico (K+, Na+, Mg2+) deve ser mantido.A administração deverá ser acompanhada pela dosagem

das taxas plasmáticas do doente.

Plantas que contém heterosídeos cardiotônicos:

os digitalícos: Digitalis purpurea e Digitalis lanata os estrofantos: Strophantus gratus as cilas: Urginea scilla

A maioria das drogas serve para extração dos heterosídeos como por exemplo digitoxina (D. purpurea e D. lanata), digoxina (D. lanata), scilarenos (U. scilla) e ouabaína (S. gratus).

10 - DROGAS COM HETEROSÍDEOS CARDENOLÍDEOS

a) Digitalis ou dedaleira-Digitalis purpurea, Scrofulariácea

Droga: folhas secas

É uma planta herbácea, bianual, muito abundante na Europa Ocidental, em terrenos arenosos. Possui uma roseta de folhas ovais e oblongas, um ramo com a inflorescência terminal, formada de um cacho unilateral de flores pendentes, com corola tubular (em forma de dedo de luva) de cor vermelha.

As plantas cultivadas, na grande maioria, são selecionadas e melhoradas visando obtenção de raças químicas ricas em heterosídeos cardiotônicos. A secagem deve ser feita a 50°C de forma delicada devido a fragilidade dos princípios ativos.

a.2) Composição QuímicaPossui heterosídeos flavônicos (luteolina), saponinas

esteroidais (digitonina), heterosídeos com um núcleo esteroidal, sem anel lactônico (digitanol), inativos fisiologicamente.

Os princípios ativos são constituídos pelos heterosídeos cardiotônicos cardenolídeos 0,1-0,4% da droga seca.

Distinguem-se dois grupos:

o grupo A onde a genina é a digitoxigenina (OH em C-3, C-14); o heterosídeo primário é o purpúreoglicosídeo A constituído pela união de 4 oses (uma glicose e três digitoxoses). Pela hidrólise enzimática (perde uma glicose), obtém-se um heterosídeo secundário, a digitoxina ou digitalina.

o grupo B que divide-se em dois subgrupos: o subgrupo da gitoxigenina (OH em C-3, C-14 e C-16) que compreende o heterosídeo primário ou purpúreo glicosídeo B (glicose + 3 digitoxoses + gitoxigenina) e o produto de hidrólise enzimática, a gitoxina.

o sub-grupo da 16-formilgitoxigenina (OH em C-3 e C-14 livres e OH em C-16 esterificado pelo ácido fórmico) que compreende o heterosídeo primário glucogitaloxóside que por hidrólise enzimática perde uma glicose produzindo gitaloxina.

b) Digitalis lanata, ScrofulariáceaDroga: folhas secas

BotânicaAs inflorescências em cachos terminais são flores tubulares

com corola branco-acinzentada.

Composição químicaOs princípios ativos são entre 0,5 e 1% da droga seca.Distinguem-se vários grupos:O grupo A, onde a genina é a digitoxigenina e o heterosídeo

primário é o lanatosídeo A. O lanatosídeo A difere do purpúreo glicosídeo A pela presença de um grupamento acetil sobre a digitoxose mais distante da genina. Sob ação de uma -glicosidase o cardiotônico perde uma glicose terminal e forma a acetildigitoxina. Em seguida, sob a ação de uma esterase, há perda de um grupamento acetil e obtenção do purpúreo-glicosídeo A conduzindo a digitoxina.

O grupo C representa 30 a 40% dos cardiotônicos totais. A genina é digoxigenina que possui 3 hidroxilas C-3, C-12 e C-14; o heterosídeo primário correspondente é o lanatosídeo C acompanhado pelo acetildigoxina.

A digoxina é o heterosídeo cardiotônico mais usado porque tem ação rápida e é mais rapidamente eliminado do organismo que a digitoxina.

Estrofanto - Strophantus gratus e S. kombe, Apocináceas

Droga: semente madura

São arbustos ou trepadeiras originárias da África tropical, com folhas opostas e lanceoladas; flores de corola que vai do branco ao róseo. Os frutos são constituídos por dois folículos que contém numerosos grãos possuidores de um penacho característico.

Composição química

O S. gratus contém 3 a 7% de heterosídeos cardiotônicos dos quais o principal é a ouabaína ou g-estrofantina. Este heterosídeo é formado pela união de uma genina, a ouabaigenina, muito hidroxilada, e um açucar, o L-ramnose. É solúvel na água.

Ação fisiológicaOs estrofantos são conhecidos desde a antiguidade

como veneno de flechas de índios por sua ação cardiotóxica. Em pequenas doses, seus princípios ativos são tônicos cardíacos, apresentando um efeito cromotrópico (-) pouco marcante e um efeito inotrópico (+) muito acentuado.

A ouabaína praticamente não é absorvida por via digestiva devido sua grande polaridade, mas é eliminada por via urinária. Ela não fixa sobre as proteínas plasmáticas e sua ação é de curta duração. É um medicamento de urgência administrado por via intravenosa.

A K-estrofantina possui uma ação análoga a da ouabaína, mas de intensidade mais fraca e de duração mais longa.

                     

Espirradeira - Nerium oleander, Apocinaceae

 Droga: folhas

Acetil-16gitoxigenina + oleandrose em 3 = oleandrina

DROGAS COM HETEROSÍDEOS CARDIOTÔNICOS BUFANOLÍDEOS

a) Cila - Urginea scilla (= U. maritima), Liliácea

Droga: escamas do bulbo

Urginea scilla

U. maritima

Bibliografia

DEWICK, P. M. Medicinal Natural Products. A biossynthetic approach. John Wiley & Sons, 2002.

CUNHA, A. P. Farmacognosia e fitoquímica. Lisboa: Fundação Calouste Gubenkian, 2005.

SIMÕES, C.M.O.; SCHENKEL, E.P.; GOSMANN, G.; MELLO, J.C.P.; MENTZ, L.A.; PETROVICK, P.R. Farmacognosia da planta ao Medicamento. Porto Alegre: Editora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 5a. ed., 2003. 1102 p.