Post on 27-Jul-2018
Hemofilias:
Desenvolvimento de inibidores
Margareth Castro Ozelo
Hemocentro UNICAMP
2013
Sumário
• Conceitos básicos e definições
• Fisiopatologia
• Fatores de risco
– Genéticos
– Não genéticos
• Diagnóstico
• Tratamento
Inibidores em Hemofilia
• Tratamento de reposição da hemofilia:
– fatores derivados de plasma (pdFVIII, pdFIX)
– recombinantes (rFVIII, rFIX)
INIBIDORES
Inibidores: Definição
• Anticorpos neutralizadores da atividade coagulante
dos fatores da coagulação
• IgG: subclasse IgG4 ou associação IgG1 e IgG4
• Anticorpos anti-FVIII ou anti-FIX:
– Inibitórios = inibem a função coagulante do FVIII ou FIX.
• Bethesda e ELISA
– Não inibitórios = não inibem a função FVIII ou FIX, podem
acelerar o clearance.
• ELISA
FVIII e Imunogenicidade
Oldenburg, et al. Haemophilia 8(2),23, 2002
FX FIXa FVW FIXa FVW/PL
_ _ _ _ _
Y Y Y Y Y
Inibidores: Classificação
• Título:
– Alto > 5 UB/mL
– Baixo ≤ 5 UB/mL
• Resposta:
– Alto respondedor > 5 UB/mL
– Baixo respondedor ≤ 5 UB/mL independente da
re-exposição
• Transitórios
1 unidade Bethesda UB/mL = quantidade Ac neutraliza
50% do FVIII ou FIX em 1mL plasma normal
Tipos de Inibidores na Hemofilia
5
Time
100
BU Alto respondedores
5
Time
100
BU
= infusão
Baixo respondedor
5
Time
100
BU Transitórios
5
Time
100
BU
White et al, Thromb Haemost 2001
Resposta Imune Primária ao FVIII
CD40
MHC II
CD80/86
FVIII
endocitose FVIII epitopo
APC
(DC)
TCR
CD40L
CD28
CD3
CD4+
cel T
FVIII epitopo
MHC II
CD30L
Diferenciação
Terminal
FVIII
CD40
cel B
TCR
CD30
CD40L
Plasmócito
CD3
CD4+
cel T
Resposta Imune ao FVIII
IL2 IL4
Inibidores: Impacto clínico
• Morbidade
- eficácia do tratamento hemostático
- risco em sangramentos graves
- artropatia hemofílica crônica
- Dificuldade para realização de cirurgias eletivas
- Problemas específicos relacionados aos inibidores FIX
(reações anafiláticas)
• Qualidade de vida
- Correlação com o grau de comprometimento articular
Scalone et al, Haemophilia, 2006
Inibidores não aumentam o risco de sangramento, mas
dificultam o controle da hemostasia
Inibidores: Epidemiologia
• Prevalência – Hemofilia A: 5-12%
– Hemofilia B: 1- 3%
• Incidência cumulativa – Hemofilia A grave: até 33%
– Hemofilia B grave: até 7,5 %
Wight and Paisley, Haemophilia, 2003
Risco de Inibidores: Fatores de risco
Gouw, et al., Blood, 2013
FVIII FVIII +
Sangramento
FVIII +
Tratamento intenso
Aumento do limiar para
desenvolvimento de inibidor
Mutação de baixo risco
Certos alelos HLA classe II
Polimorfismos do sistema
imune
Exposição prévia ao FVIII
Diminuição do limiar para
desenvolvimento de inibidor
Mutação de alto risco
Certos alelos HLA classe II
Polimorfismos do sistema
imune
Inibidores: fatores de risco
Inibidores
1. Viel et al. NEJM. 2009;360(16):1618-27. 2. Eckhardt et al. J Thromb Haemost. 2009;7(6):930-937.
3. Gouw et al. Blood. 2007;109(11):4648-4654. 4. Iorio et al. Blood. 2012;120(4):720-727.
5. Astermark et al. Blood. 2013;121(8):1446-58. 6.Gouw et al. NEJM. 2013;368(3):231-239.
• Tipo de concentrado de fator 4,6
• Regime terapêutico2-3
• Idade do primeiro tratamento
• Número de dias de exposição
Relacionados
ao tratamento
• Fatores sistema imune
(HLA, SNPs) 5
• Etnicidade
• Mutação FVIII ou FIX
• Polimorfismos FVIII 1
• História familiar
Fatores
Genéticos
• Tratamento intenso
- Sangramento grave
- Cirurgia
• Contexto do tratamento de reposição
(“sinal de perigo”)
- Vacinas
- Infecções
Fatores
extrínsecos
Risco de Inibidores: Fatores genéticos
Mutação do gene do FVIII
0%
20%
40%
60%
80%
100%
Pre
vale
nce
Type of mutation
Large deletion
Multi domain
Single domain
Nonsense
Heavy chain
Light chain
Intron-22 inversion
Small deletion/insertion
Non-A-run
A-run
Missense
Non-C1/C2
C1/C2
Splice site
Saint-Remy et al. Haemophilia 2004;10(Suppl 4):146–51
Risco de Inibidores: Fatores não genéticos
• Idade:
– Maior risco com início do tratamento < 6m ou até 11m idade
– Risco cumulativo
Lorenzo, BJH (113): 600, 2001
van der Bom, TH (89): 475, 2003
Wight and Paisley, Haemophilia, 2003
Até 6-10 anos
35
30
25
20
15
10
5
0
%
Idade (anos) 0 5 10 15 20 25
Ehrenforth
Rasi
Peerlink
Lorenzo
Até 20-50 d de exposição
Dias de exposição
0 50 100 150 200
%
45
40
35
30
25
20
15
10
5
0
Guerois
De Biasi
Lusher Bray Addiego
Risco de Inibidores: Fatores não genéticos
• Idade (dados UK sobre casos novos de inibidores):
– 50% casos novos inibidores apareceram antes 5 anos idade
– 10% após 60 anos de idade
Hay et al. Blood 2011;117:6367-70
Risco de Inibidores: Fatores não genéticos
• Tipo de fator:
– Derivados de plasma X recombinantes
Wight and Paisley, Haemophilia, 2003
% r
isco
%risco
30
25
20
15
10
5
0
45
40
35
30
25
20
15
10
5
0
Todos os inibidores Inibidores alto título
Derivados de plasma (múltiplos)
Derivados de plasma (único) Recombinantes (Único)
Risco de Inibidores
• 177 desenvolveram inibidor (32.4% incidência cumulativa)
- 116 alto título ( > 5 UB) (22.4% incidência cumulativa
• Estudo Multicêntrico RODIN (Europa, Israel e Canadá)
– 574 HAG consecutivos (nascidos 2000-2010) até 75 DE
Gouw et al. NEJM 2013;368:231–9
3
2
1
0
Ad
juste
d r
ela
tive
ris
k (
95
% C
I)
FVIII derivado de plama
vs.
FVIII recombinante
Inibidores: Diagnóstico
• Suspeita clínica
- ineficácia do tratamento de reposição
• Pesquisa sistemática
- a cada 5 a 10 DE, até os primeiros 50 DE
- a cada 3 a 6 meses, até os primeiros 100 DE
- a cada 6 a 12 meses
- antes de cirurgias ou infusão contínua
- após intensa exposição
• Testes
- Pesquisa de inibidor (teste de mistura incubado)
- Quantificação de inibidor
- Método Bethesda
- Método Bethesda modificado (Nijmegen)
Pesquisa do inibidor
Incubar a 37ºC por 2 horas
1 X Plasma paciente
1 X Plasma normal
Realizar TTPa
C
Incubar a 37ºC por 2 horas
Plasma normal
Realizar TTPa
A
Incubar a 37ºC por 2 horas
Plasma do paciente
Realizar TTPa
B
Kasper. Blood Coagulation and Fibrinolysis 2(1):7-10; 1991.
Pesquisa do inibidor
• A correção em C (tubo da mistura) deve ser maior que 50% da diferença entre o TTPa do paciente (B) e o TTPa de um pool de plasma normal (A)
Pool de plasma normal (A) 35 s
Plasma Teste (paciente) (B) 90 s (R=2,57)
Plasma teste após mistura (C) 50 s (R=1,42)
Correção em segundos B – C 90-50=40
Diferença entre B e A Análise: correção em segundos (18s) deve
ser maior que 50% da diferença entre B e A
(“correção” teórica de 100%)
90-35=55
40 > (55/2 = 27,5)
Conclusão: correção eficaz
Teste deve ser realizado preferencialmente após 3 dias da última infusão
Quantificação de inibidor
Método Bethesda-Nijmegen
– Determinação da atividade FVIII:C ou FIX:C após incubação por 2 h a 37°C das diluições
BSA 4% + Pool de plasma normal tamponado CONTROLE
Plasma paciente puro 1:2 + Pool de plasma normal tamponado
Plasma paciente 1:5 + Pool de plasma normal tamponado
Plasma paciente 1:10 + Pool de plasma normal tamponado
Plasma paciente 1:20 + Pool de plasma normal tamponado
Plasma paciente 1:40 + Pool de plasma normal tamponado
Atividade residual fator (%) = atividade fator de cada mistura X 100 atividade do fator do CONTROLE
Verbruggen et al, 1995; Verbruggen et al, 2002
Método Bethesda
• Determinar as diluições com atividade
residual entre 25% - 75%
• Utilizando de gráfico mono-log, traçar
uma curva para encontrar o ponto
correspondente a 50 % de atividade
residual
• Título do inibidor (UB/mL) será
correspondente a diluição utilizada para
se obter 50% da atividade residual do
fator
50%
205 UB
1:64 1:128 1:256
Inibidores: Tratamento
• Objetivos do tratamento:
– Curto prazo: controle do sangramento
• Tratamento de reposição
– Longo prazo: erradicação do inibidor
• Imunotolerância
Controle dos sangramentos: opções
• Concentrados de FVIII ou FIX
– Reposição dos fatores deficientes é a forma mais eficaz restaurar a hemostasia em pacientes sem inibidores
– Monitoramento pode ser realizado de forma simples
– Reposição não é eficaz se títulos > 5 UB
– Resposta anamnésica limita tempo de tratamento em pacientes com alta resposta
Não deve ser utilizado se risco de reação anafilática (FIX)
Controle dos sangramentos: opções
• Agentes de “bypass” – Eficácia não depende do título do inibidor
– Monitoramento do tratamento é feito apenas por parâmetros clínicos
• Complexos protrombínico ativado (CCPa): FEIBA®
• Fator VII ativado recombinante (aFVII-r): NovoSeven®
CCPa Concentrado de complexo protombínico ativado
• FEIBA® : factor eight inhibitor bypassing activity
(Baxter)
– Produto derivado do plasma humano
• Fracionamento das proteínas após a separação do
crioprecipitado
– Contém quantidades variáveis de fatores dependentes
da vitamina K (II, VII, IX, X), manipulado para possuir
ativação parcial dos fatores VII, IX e X.
Turecek et al. Haemophilia 2004; 10 (suppl. 2): 3-9.
Berntorp. Haemophilia 2009; 15, 3-10.
CCPa Concentrado de complexo protombínico ativado
• Posologia
– 75 a 100 UI/kg cada 12-24 hs, dependendo clínica
Dose máxima: 100 UI/kg/dose e 200 IU/kg/dia
• Indicações
– Hemofilia A ou B com inibidor
– Hemofilia adquirida (inibidor adquirido)
Não deve ser utilizado em pacientes com hemofilia B e história
de reação anafilática
FEIBA VH Anti-Inhibitor Coagulant Complex [package insert]:Baxter.
aFVII-r Fator VII ativado recombinante
• NovoSeven® (Novo Nordisk)
– Produto recombinante
• Menor volume de infusão
– Não há resposta anamnésica ao FVIII ou FIX
• Pode ser usado para inibidores ao FIX
Berntorp. Haemophilia 2009; 15, 3-10.
aFVII-r Fator VII ativado recombinante
• Posologia recomendada
– Hemofilia com inibidores
• 90 μg/kg (90-120 μg/kg) cada 2-3 hs
– Hemofilia adquirida
• 90 μg/kg cada 2-3 hs
– Def. FVII
• 15-30 μg/kg cada 4-6 hs
– Trombastenia de Glanzmann
• 90 μg/kg (80-120 μg/kg) cada 2-3 hs
NovoSeven [package insert]: Novo Nordisk 1 mg = 50 KUI
Tratamento:
Inibidores de Baixa Resposta
• Sangramentos Leves
– Reposição de fator deficiente é o tratamento de escolha
– Em geral 1-3 dias de tratamento
• Sangramentos moderados e graves
– Reposição do fator deficiente é o tratamento de escolha
(maior eficácia)
– Fator deficiente deve ser usado em doses elevadas
– Dosagem do fator deficiente e titulação periódica do inibidor
são fundamentais nestes casos.
Manual Hemofilia Congênita e Inibidor – Ministério da Saúde, 2008
Treatment of Hemophilia Monograph series 10, WFH, 2000
Tratamento:
Inibidores de Alta Resposta
• Sangramentos Leves
– Deve-se evitar uso dos fatores deficientes, mesmo que títulos
baixos, pela resposta anamnésica
– Tratamento com agentes de bypass
– Em geral 1- 4 doses
• Sangramentos moderados e graves
– Tratamento com agentes de bypass
– Se títulos < 5 UB, pode-se utilizar reposição do fator deficiente
em altas doses com monitoramento rigoroso
– Duração conforme gravidade e resposta clínica
– Importância de reavaliações periódicas
Manual Hemofilia Congênita e Inibidor – Ministério da Saúde, 2008
Treatment of Hemophilia Monograph series 10, WFH, 2000
Proposta de abordagem de sangramentos Inibidores de Alta Resposta
Teitel, et al. Haemophilia 2007; 13:256-63
CCPa (até 200 UI/kg/dia dividido em 2-3 doses) ou
rFVIIa (90g/kg 2/2h) adequados para início
Reavaliação em 2-4 horas (sgto SNC) ou 8-12h (psoas)
Em sangramentos de SNC pode haver necessidade precoce de modificação do
tratamento (aumento de dose ou mudança de produto)
melhorando
pio
ran
do
Iniciar “bypass” ASAP
dose
Trocar agente
dose
Combinada
Outros tratamentos
manter
continue
continue
continue
reduzir
decrease
decrease
decrease
1
2
3
4
5
manter
manter
manter
manter
reduzir
reduzir
reduzir
Conclusões (1)
• O mecanismo de desenvolvimento de inibidores em hemofilia é complexo e ainda não totalmente esclarecido
• O entendimento desses fatores de risco ajudará no
futuro a determinar um tratamento diferenciado para o
controle e sobretudo prevenção do desenvolvimento
de inibidores
• O diagnóstico correto da presença de inibidor
(quantificação) é essencial para o tratamento
adequado
Conclusões (2)
• Importância do tratamento individualizado:
– Grande variação da resposta hemostática entre
pacientes e individualmente durante o uso de
produtos de bypass
– Necessidade de escolha do produto ideal para
cada paciente em cada situação
• A erradicação do inibidor pode ser obtida em cerca
de 70% submetidos à imunotolerância
Referências
• Srivastava A, et al. Treatment Guidelines Working Group on Behalf of The
World Federation Of Hemophilia. Guidelines for the management of hemophilia.
Haemophilia. 2013 Jan;19(1):e1-47.
• Gouw SC, van der Bom JG, Ljung R, et al; PedNet and RODIN Study Group.
Factor VIII products and inhibitor development in severe hemophilia A. N Engl J
Med. 2013 Jan 17;368(3):231-9.
• Astermark J, Donfield SM, Gomperts ED, et al.; Hemophilia Inhibitor Genetics
Study (HIGS) Combined Cohort. The polygenic nature of inhibitors in hemophilia
A: results from the Hemophilia Inhibitor Genetics Study (HIGS) Combined
Cohort. Blood. 2013 Feb 21;121(8):1446-54.
• Makris M, Hay CR, Gringeri A, D'Oiron R. How I treat inhibitors in haemophilia.
Haemophilia. 2012 Jul;18 Suppl 4:48-53.
• Waters B, Lillicrap D. The molecular mechanisms of immunomodulation and
tolerance induction to factor VIII. J Thromb Haemost. 2009 Sep;7(9):1446-56.
• Hemofilia Congênita e Inibidor: Manual de Diagnóstico e Tratamento de Eventos
Hemorrágico http://bvsms.saude.gov.br/