Post on 10-Feb-2019
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA
CENTRO DE EDUCAÇÃO FÍSICA E DESPORTOS
LINHA DE ESTUDOS EPISTEMOLÓGICOS E DIDÁTICA EM EDUCAÇÃO
FÍSICA
GRUPO DE PESQUISA EM LAZER E FORMAÇÃO DE PROFESSORES
III SEMINÁRIO EMDEPISTEMOLOGIA E ETEORIAS DA EDUCAÇÃO
Epistemologias e teorias do conhecimento na pesquisa em Educação e Educação
Física: as reações aos pós-modernismos
PROPOSTAS PEDAGÓGICAS EM EDUCAÇÃO FÍSICA: DEBATENDO A
CONTEMPORANEIDADE EPISTEMOLOGICA
INTRODUÇÃO – Contextualizando o debate
“.....Será que se requer grande acuidade de espírito para
se compreender que idéias, noções, concepções, numa
palavra, a consciência do ser humano sofre modificações
em função das mudanças que se operam nas condições
concretas de sua existência material, em suas relações
sociais, em sua vida social” (MARX E ENGELS.
Manifesto do Partido Comunista. São Paulo, Global,
1984. p. 34)
O presente debate esta sendo travado no momento em que a humanidade,
perplexa, se depara com mais uma das profundas crises do capital, que busca se
recompor e obter, cada vez mais, exorbitantes taxas de lucro, baseado no roubo,
legalmente estabelecido pela propriedade privada dos meios de produção da vida e
pelo alienante trabalho assalariado subsumido ao capital - nova forma de escravidão -
, no contexto do parasitário complexo econômico especulativo, que está aniquilando a
humanidade (MARTINS, 1999). Portanto, não é pouca coisa situar o debate no
contexto conjuntural e estrutural da crise para justificarmos a relevância das reações
as teorias pós-modernas – ao irracionalismo, aos ―giros‖ ou ―viradas‖ idealistas -,
imposturas intelectuais e recuo teórico que vem desarmando a classe trabalhadora no
campo e na cidade, contribuindo para a alienação e a contra-revolução. Ocorre no
tempo histórico de levantes na América Latina - pátria mãe que já sofreu séculos de
violência e dor como demonstra Salazar (2006) e que não deixou, um dia sequer, de
lutar pela sua autonomia, independência e soberania perante os paises imperialistas.
Dá-se no momento em que no continente Latino Americano movem-se as forças que
querem ver suas reivindicações históricas atendidas, entre as quais, se destaca, o
rompimento com o neo-colonialismo e com o avanço do imperialismo1. Dá-se no
1 Sobre a América Latina e o colonialismo ver mais in: GALEANO; Eduardo. As veias Abertas da América Latina.
8º Rio de Janeiro. Paz e Terra, 1979. SALAZAR, Luis Suárez. Madre América: Un siglo de violencia y dolor
(1898-1998).2º Ed. Editorial de Ciencias Sociales. Habana/Cuba, 2006. GARCIA MARQUES; Gabriel. Cem anos
2
momento em que os balanços e avaliações da educação demonstram que apesar dos
esforços empreendidos, sob o marco das políticas neoliberais, compensatórias, focais,
assistencialista a educação fracassou (MELO 2004). A universalização e a qualidade
do ensino básico e superior não foi atingida, bem como, a formação de professores
não atende as demandas nacionais. O Público está a perder, a mercadorização da
educação, ciência & tecnologia avançam. O debate se trava no momento em que se
constata que o padrão cultural esportivo da população brasileira não foi elevado e, a
democratização do esporte para todos não foi atingida. O evento acontece no
momento em que, ainda ecoa a voz de Che Guevara no Plenário das Nações Unidas,
bradando ―Já soou a última hora do colonialismo e milhões de habitantes da África,
Ásia, e América Latina levantam-se, buscando uma nova vida e impondo seu direito
irrestrito à autodeterminação e ao desenvolvimento independente de suas nações‖
(CHE, Assembléia da ONU, 1964). Momento em que ainda ecoa a voz de Josué de
Casto declarando ao receber um prêmio internacional, ―Eu, que recebi um prêmio
internacional de paz, penso que, infelizmente, não há outra solução que a violência
para América Latina. Cento e vinte milhões de crianças se agitam no centro desta
tormenta.‖ (Eduardo Galeano. Veias Abertas da América Latina. 1979, p. 15).
O debate tem sua localização especifica no interior do III Seminário de
Epistemologia e Teoria da Educação – EPISTED e o IV Colóquio de epistemologia –
GTT do CBCE. Esses dois eventos visam ―...sistematizar, analisar e socializar a
produção científica da área, assim como manter um permanente debate sobre a
problemática que a identifica...‖
Segundo os organizadores ―a reunião desses dois eventos se deve aos
indicadores advindos das 378 pesquisas defendidas na Faculdade de Educação da
UNICAMP sendo: 192 teses de doutorado e 186 dissertações (dezembro de 2005).
Desses 45 pesquisas são dedicadas à problemática da Educação Física, seja na
tentativa da fundamentação de uma filosofia da área ou da reflexão sobre a história da
Educação Física. Portanto temos um evento conjunto entre a área da epistemologia da
Educação Física e a linha de epistemologia e teorias da educação do grupo Paidéia da
FE/UNICAMP.
As temáticas delimitadas resultaram da consideração do que foi desenvolvido
no evento anterior a saber: as problemáticas filosóficas da Educação e da Educação
Física e sobre o debate das tendências epistemológicas e pedagógicas das pesquisas
atuais desenvolvidas nesses campos do conhecimento, particularmente o debate sobre
os ―giros epistemológicos‖ e suas repercussões na pesquisa educacional que foi
aprofundado em mesas redondas durante o XV Congresso Brasileiro de Ciências do
Esporte, realizado em Recife em setembro de 2007 onde foi sugerido a ampliação do
debate, considerando a sua relação com as teorias do conhecimento e os
desdobramentos na controvérsia epistemológica contemporânea entre modernidade e
pós-modernidade, assim como as reações à denominada ―virada lingüística‖. Estarei
me valendo, no inicio, do debate, desse aprofundamento para acrescer com as reações
ao pós-modernismo.
de solidão. São Paulo, Record, 2000.
3
Os organizadores do evento apontam que ―As tentativas de aprofundamento
incluem um olhar crítico sobre as diversas ―viradas epistemológicas‖ (lingüística,
hermenêutica, pragmática e ontológica), uma retomada das teorias do conhecimento
que fundamentam as pesquisas em Educação e Educação Física, e uma atualização
das controvérsias em torno dos pós-modernismos‖, ponto que destacarei.
Abordarei a temática geral: “Epistemologias e teorias do conhecimento na
pesquisa em Educação e Educação Física: as reações aos pós-modernismos”
(conferência de abertura no dia 09/12/2008) considerando que existem estudos que
demonstram tendências hegemônicas claras ao idealismo na produção do
conhecimento na educação e na educação física (2007) e, considerando a ementa
proposta pela organização:
―A compreensão do debate sobre as novas correntes pós-
modernistas que vem influenciando a pesquisa em
Educação e Educação Física pode se orientar pelas reações
à ―virada linguística‖. Tais reações se expressam nas
viradas ―hermenêuticas‖, ―pragmática‖ e o resgate da
―ontologia‖ ou do real independente da consciência e da
linguagem. Tanto o debate como o sentido das diversas
reações devem ser ponderadas com as teorias de
conhecimento e as perspectivas histórico-sociais em
confronto. As ponderações e confrontos devem ser
explicitados, para os pesquisadores se apropriarem
criticamente de novas ferramentas de análise e/ou
superarem modismos, desvios e posturas ingênuas que
produzem dispersões e diluem a capacidade de
aprofundamento na compreensão das práticas pedagógicas
e os compromissos históricos dos educadores‖.
Apresento, portanto, uma delimitação do tema, para que não recaia sobre uma
única conferência, a grandiosidade das pretensões dos organizadores. Os
desdobramentos do tema central assumem, no conjunto a responsabilidade do
aprofundamento, destacando que os limites temporais e teóricos são muitos. Como
podemos verificar o tema central - Epistemologias e teorias do conhecimento na
pesquisa em Educação e Educação Física: as reações aos pós-modernismos serão
desdobradas durante o evento, no seguinte:
1. Pós-modernidade e teorias críticas (1a Mesa redonda dia 09/12/2008).
Ementa: Mesa que pretende discutir as reações aos pós-modernismos a partir das
teorias criticas. As teorias críticas, seus pressupostos e categorias (capacidade da
razão humana de compreender a realidade e a história, historicidade e totalidade)
são alvo do debate entre modernidade e pós-modernidade. Quais as contra-
argumentações em defesa da atualidade e vigência das concepções e categorias
dessas teorias críticas? De que forma essas controvérsias afetam os fundamentos
teóricos da pesquisa e das práticas pedagógicas em Educação e/ou em Educação
Física?
4
2. Produção científica em Educação e Educação Física e o atual debate teórico-
metodológico (2a mesa redonda, dia 10/12/2008).
Ementa: A pesquisa em Educação e/ou Educação Física vem sendo influenciada,
particularmente, desde o começo do século, por novas correntes denominadas
genericamente de pós-modernas (pós-estruturalistas, neo-pragmatistas, pós-
criticas). Tais correntes são apenas modismos ou se constituem como uma das
tendências teórico-metodológicas? Como se caracterizam as pesquisas que
pretendem se aproximar dessas perspectivas? Como os pesquisadores vinculados a
outras abordagens reagem às novidades e a denominada ―crise dos paradigmas?‖
As tensões geradas podem se caracterizar como um debate entre diversas
abordagens teórico-metodológicas? Quais os pontos centrais desse debate?
3. Teorias e práticas pedagógicas e as controvérsias epistemológicas
contemporâneas (3a mesa redonda, 11/12/2008).
Ementa: As práticas e teorias pedagógicas não são alheias às influências do debate
contemporâneo entre modernidade e pós-modernidade. Quais os desdobramentos
dessa controvérsia no campo da educação? Como esse debate se apresenta na
apropriação ou não de referenciais teóricos e a utilização de categorias para a
compreensão das práticas no campo amplo da educação? Quais as interfaces
desse debate com as políticas sociais e educativas?
Para organizar o debate sobre as correntes pós-modernistas que vem influenciando
a pesquisa em Educação e Educação Física vou inicialmente tratar de localizar o que
são os ―giros‖ ou as ―viradas lingüísticas‖, a saber, a virada ―hermenêutica‖,
―pragmática‖ e o resgate da ―ontologia‖ ou do real independente da consciência e da
linguagem e, qual o sentido das diversas reações, a partir da ponderação das teorias
de conhecimento e as perspectivas histórico-sociais em confronto.
Vou explicitar, também, de forma sucinta o que é o irracionalismo, o pós-
modernismo, os ―giros‖ ou ―viradas‖ idealistas e as reações daí advindas,
questionando conceitos, explicitando interesses subjacentes a defesa da
irracionalidade, do subjetivismo, dos particularismos, e do fragmentarismo (
LOMBARDI, 2003) e, levantando hipóteses sobre o status da teorização na educação
no Brasil.
Considerando que a concepção materialista dialética da história é extremamente
atual vamos nos valer de categorias analíticas que explicitam, desvelam, explicam e
permitem a ação em um contexto de relações, nexos e determinações, para reagir ao
pós-moderniso enquanto uma corrente contra-revolucionaria. Segundo LOMBARDI,
(2003, IX) a categoria que mais bem expressa o conjunto de relações implicadas na
atual produção e reprodução da existência dos homens é o modo capitalista de
produção; a melhor categoria para expressar a atual fase das relações capitalistas
entre diferentes povos e nações certamente não é globalização, mas imperialismo; as
melhores categorias que expressam a forma de organização capitalista nesta fase não
são mercado ou concorrência mas concentração da produção é monopolização.
Ademais, a melhor categoria para expressar a essência do próprio capital que nesta
5
atual fase domina e controla a própria acumulação é capital financeiro. Acrescento,
conforme Trotsky que a melhor categoria, decorrente da formação econômica atual, é
modo de vida,e por fim, a melhora categoria para discutir teoria do conhecimento é
organização do trabalho de produção da ciência.
As hipóteses a serem confrontadas no decorrer do texto são as seguintes:
1) prevalecem, hegemonicamente no Brasil, teorias reformistas, anti-
revolucionarias, tanto na produção do conhecimento quanto nos subsídios de
política pública nas áreas de educação, educação física e esporte o que pode
ser constatado nos aportes teóricos mencionados nos textos, relatórios,
projetos, programas e demais documentos, onde são silenciados os aspectos
referentes as leis gerais que regem o modo do capital organizar a vida; do
Estado burguês e da necessidade histórica de derrubá-lo, dos hábitos de vida
burguesa em família e a necessidade de destruí-los e, a estratégia e tática na
luta de classes para superação do capitalismo rumo ao comunismo.
2) é necessário avançar, reagir, resistir, por rupturas e saltos qualitativos, para
novas sínteses em patamares teórico-práticos mais elevados, superando os
desvios teóricos, rompendo ilusões, lutando contra o fitichismo, o
irracionalismo e o idealismo, buscando a referencia clássica marxista;
3) existem reações, sim, na luta concreta, que buscam construir e erguer outros
pilares para a produção do conhecimento científico e para a escolarização, e
esses pilares já podem ser reconhecidos e são: o combate ao irracionalismo,
ao pós-modernismo, aos ―giros‖ e ―viradas‖ idealistas, buscando consolidar
uma consistente base teórica marxista, avançar na consciência de classe, na
formação política e na organização revolucionária, como contra-ponto aos
pilares da educação defendidos pela UNESCO para o mundo.
4) ventos de esquerda ainda sopram na América Latina, contraditoriamente, e o
marxismo, enquanto filosofia, o materialismo histórico dialético enquanto
epistemologia e, o socialismo enquanto projeto histórico, estão recolocados
mais fortes do que nunca, pela sua aderência ao real, como referencia para
tratarmos da produção do conhecimento científico e das políticas públicas na
perspectiva do projeto histórico para além do capital.
As ponderações e confrontos entre correntes ―pós-modernistas‖ e as reações serão
explicitados, para que os pesquisadores não somente se apropriarem criticamente de
ferramentas de análise e/ou superarem modismos, desvios e posturas ingênuas que
produzem dispersões e diluem a capacidade de aprofundamento na compreensão das
práticas pedagógicas, como pretendem os organizadores dos eventos, mas, para que
sejam avaliadas as dramáticas conseqüências sociais de tais posições teóricas e mais,
para que se fortaleçam compromissos históricos dos pesquisadores e educadores com
a emancipação humana, a saber, com o projeto histórico comunista.
Enfim, a intenção pedagógica é contribuir reconhecendo onde estão se efetivando
6
reações e ajustes de contas com o irracionalismo, o pós-modernismo, os ―giros‖ ou
―viradas‖ idealistas, ou seja com a tradição pós-moderna, para ao conhecê-la, romper
com ela, porque esse é um dos pré-requisitos para uma renovação da teoria
educacional e da teoria pedagógica no Brasil e na América Latina, hoje, na
perspectiva de enfrentar e superar o modo do capital organizar a vida e, com isso
avançar na construção do projeto histórico comunista. Contribuir para que a história
não se separe da teleologia.
Nos últimos 30 anos os movimentos de luta social no Brasil, de caráter
confrontacional aos pilares do capital, vem gritando alto e de bom tom - o capitalismo,
forma hegemônica de produção da vida esgotou suas possibilidades civilizatórias. ‖O
REI ESTA NU―2. Os movimentos ecológicos, feministas, pacifistas, de resistência e
reivindicatórios dos últimos trinta anos gritam isto também, apesar de todas as
formulações teóricas que afirmam ser relativa a verdade e, que tudo é um ponto de vista
e que a história está no fim e o que nos resta e encontrar a terceira via, um outro mundo
possível, ou seja, humanizar o capital.
Consoante com o historiador Eric Hobsbawm (2008)3, reafirmo conforme suas
palavras que:
É tempo de restabelecer a coalizão daqueles que desejam
ver na história uma pesquisa racional sobre o curso das
transformações humanas, contra aqueles que a deformam
sistematicamente com fins políticos e simultaneamente, de
modo mais geral, contra os relativistas e os pós-modernos
que se recusam a admitir que a história oferece essa possibilidade.
Essa possibilidade histórica é que a ciência seja efetivamente colocada a
serviço da humanidade, das transformações sociais, o que implica a revolução na
formação econômica. Isto exige um radical enfrentamento às teorias contra-
revolucionárias – o irracionalismo, o pós-modernismo, os ―giros‖ idealistas.
Identificá-las, combatê-las, superá-las em uma época de crise estrutural global do
capital, uma época histórica de transição da ordem social existente para uma
qualitativamente diferente não é pouca coisa. Tais características definidoras do
espaço histórico e social em que vivemos indicam o espaço e tempo nos quais os
desafios e tarefas cotidianas e históricas (HELLER; 2008) 4 estão colocadas.
I. OS GIROS OU O EMBATE ENTRE IDEALISMO E
MATERIALISMO?
“Os homens fazem sua própria história, mas não a fazem
2 „ Aber er hat gar nichts an― sagte endlich ein Kleines kind....Aber er hat ja gar nichts an rief zuletz das ganze Volk.―
ANDERSEN; Hans Christian. „Der kaisers neue kleider― In: MÄRCHEN VON ANDERSEN.Belin:Germany
Droemersche Verlagsanstalt p. 89-93, 1934. 3 Ver mais In: http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=14924.
4 HELLER; Agnes. O Cotidiano e a História. São Paulo, Paz e Terra, 2008.
7
como querem; não a fazem sob circunstâncias de sua
escolha e sim sob aquelas com que se defrontam
diretamente, legadas e transmitidas pelo passado. A
tradição de todas as gerações mortas oprime como um
pesadelo o cérebro dos vivos.” MARX. In: O 18 Brumário
de Luís Bonaparte.
Para compreensão básica dos ―Giros‖ ou ―viradas‖ vou me valer de sínteses
apresentadas por Gamboa (2007)5 ressaltando que existem duas grandes
possibilidades históricas do ser humano conhecer o real, ou é pela via do idealismo,
que pressupõe a consciência, acima do real, pressupõe a existência de seres acima do
ser humano que criaram a natureza e os seres, que pressupõe o Absoluto ou, o
materialismo que pressupões as relações entre matéria e consciência, em tempos,
espaços e movimentos segundo leis e relações, nexos e determinações recíprocas,
concretas, da existência, no intercâmbio do ser humano com a natureza para manter a
vida, conhecer e constituir assim a história. Portanto, se fomos enquanto seres
humanos subsumidos por leis físicas e biológicas, a linha do tempo e da luta pela vida
permitiu saltos qualitativos e hoje prevalecem as leis sócio-históricas. Ressalto, ainda,
que esse embate que perpassa a história desde os pré-socráticos está recolocado no
momento em que verificamos o recuo da teoria (MORAES, 2003), no momento em
que constatamos o fracasso da Educação no Brasil (NEVES, 2005) e, no momento
em que a soberania da nação brasileira está ameaçada e a existência da própria
humanidade está em questão.
Vale ressaltar, ainda, que as formulações em torno dos ―giros‖, ou seja,
formulações para superar contradições teóricas localizadas em paradigmas e
abordagens anteriores, se dão durante o breve século vinte, um dos mais devastadores
e mortais séculos que a humanidade viveu comprovado nas duas grandes guerras
mundiais e seus mortíferos aparatos, entre os quais constam como política os regimes
fascista e nazista e as ditaduras de Estado e militar e, como arma, a bomba atômica
capaz de destruir o planeta, mas incapaz de reconstruí-lo uma única vez
(HOBSBAWM, 1995). 6 Nunca a ciência e a tecnologia evoluíram tanto e, nunca se
perdeu tanto a esperança e a perspectiva. Nunca a ciência e a tecnologia evoluíram
tanto, mas nunca foram tantos os que passam fome e sofrem de desnutrição, ou
morrem de doenças plenamente evitáveis, embora seja possível aumentar colheitas,
multiplicar alimentos e desenvolver novas vacinas, medicamentos e equipamentos
médicos. Nunca a ciência e a tecnologia evoluíram tanto, mas nunca a humanidade
5 Ver mais In:
http://www.cbce.org.br/cd/mesas/GTT%204%20Epistemologia%20MESA%20REDONDA%204%20Silvio%20Ga
mboa.pdf. Acesso 08 de dezembro as 15 horas. 6. Eric Hobsbawm no livro ―A Era dos extremos. O breve século XX: 194-1991‖ explica a trajetória da sociedade no
período compreendido entre os anos 1914 e 1991, marcado pela Primeira Guerra Mundial (1914-1918), seguida pela
Revolução Russa (1917), e pelos momento mais marcantes do capitalismo mundial, a quebra da bolsa de Nova
Iorque (1929), culminando na Segunda Guerra Mundial (1939-1945), conflito que envolveu diretamente a quase
totalidade dos países. Período em que foram detonadas as duas primeiras bombas atômicas sobre Hiroxima e
Nagasaki.
8
sofreu tanto os impactos das catástrofes da natureza – terremotos, maremotos,
furacões, e outras manifestações da natureza – apesar de existirem meios possíveis
tanto de prever, como de prevenir, quanto de enfrentar as adversidades. Não é de hoje
que o homem enfrenta o que é próprio do planeta terra, no entanto, a tecnologia para
a defesa das populações serve somente para poucos. Nunca a humanidade esteve tão
vulnerável a sofrer os impactos do sistema econômico, especulativo, parasitário, que
não poupa povos e nações. Nunca tivemos tantos conflitos bélicos em nosso planeta.
São mais de 75 conflitos bélicos. São aproximadamente mil bases militares instaladas
no mundo pelo império Norte Americano e seus aliados. E para nosso desassossego,
os Estados Unidos da América do Norte, além de sua profunda crise no setor
imobiliário que levou o governo a empregar, aproximadamente, 850 bilhões de
dólares, em um rombo financeiro de aproximadamente 3 trilhões, para ―salvar‖
especuladores, reativou a sua 4º Frota Naval que estava desativada há 58 anos, desde
a Segunda Guerra Mundial, com a alegação de monitorar os governos de esquerda da
América Latina, monitorar as riquezas da região.
No momento em que estão sendo levantadas as principais hipóteses do
esgotamento das teorias educacionais e pedagógicas nos encontramos para debater as
reações aos pós-modernismos. Uma teoria se esgota quando não explica e atua no
real (SOUZA, 1987). E entre as hipóteses do esgotamento da teoria constam às
formulações e explicações dos pós-modernos que silenciam sobre as leis gerais de
desenvolvimento da natureza e da sociedade, as leis gerais do capital, a natureza e o
combate aos Estado burguês e, silenciam sobre as táticas e estratégias da luta de
classes para transformar a atual formação econômica em uma nova e superior forma
de organizar os meios de produzir e reproduzir a vida.
Portanto, para criticarmos as teorias, fruto do trabalho humano no processo
sistemático e rigoroso de produção do conhecimento, é necessário resgatar o caráter
ontológico da produção do conhecimento e distinguir as formas em que se apresenta a
atividade produtiva do homem, para compreendermos o grau de alienação do
trabalho: trabalho em sua acepção geral - como ‗atividade produtiva‘: a
determinação ontológica fundamental da ‗humanidade‘[...]; e em sua acepção
particular, na forma de ‗divisão do trabalho‘ capitalista. É nesta última forma, que o
‗trabalho‘ é a base de toda a alienação. (MÉSZÁROS, 2006, p.78). (Grifos do
autor).
Mas afinal, o que impede o homem de realizar sua atividade produtiva de
forma não alienada, ou seja, o impede de satisfazer suas necessidades de forma
emancipada? Marx demonstrou em ―O Capital‖ que é a propriedade privada dos
meios de produção – o intercâmbio – e a divisão do trabalho. O homem, a partir
destas mediações, se aliena do próprio trabalho, de sua própria atividade
teleologicamente guiada; da matéria a que se aplica o trabalho, o objeto de trabalho;
bem como, dos instrumentos do trabalho (componentes do processo de trabalho).
Ocorre aqui uma ‗mediação da mediação‘, uma mediação historicamente específica,
no modo de produção do capital; mediação de segunda ordem - forma específica,
alienada, da mediação de primeira ordem, da automediação ontologicamente
fundamental do homem com a natureza (mediação de primeira ordem).
(MÉSZÁROS, 2006, p.78).
9
Como referência para a elaboração do conhecimento científico partimos da
mediação de primeira ordem, o que implica considerar a forma com a qual os homens
produzem os bens necessários à vida, ou seja, considerar o trabalho enquanto a
atividade humana que transforma a natureza nos bens necessários à reprodução
social.
Portanto, o processo de que participam o homem e a natureza, Marx (1980)
denomina trabalho, isto é, o:
[...] processo em que o ser humano com sua própria
ação impulsiona, regula e controla seu intercâmbio
material com a natureza. Defronta-se com a natureza
como uma de suas forças. Põe em movimento as forças
naturais de seu corpo, braços e pernas, cabeça e mãos,
a fim de apropriar-se dos recursos da natureza,
imprimindo-lhes forma útil à vida humana. Atuando
assim sobre a natureza externa e modificando-a, ao
mesmo tempo modifica sua própria natureza.
Desenvolve as potencialidades nela adormecidas e
submete ao seu domínio o jogo das forças naturais.
Não se trata aqui das formas instintivas, animais de
trabalho. [...] (MARX, 1980, p. 202).
Para compreendermos, portanto, como se dão as mediações de segunda ordem
na produção científica, devemos considerar suas manifestações concretas: as
condições de vida da classe trabalhadora, que é a única capaz de produzir a riqueza
(material e espiritual), e que enfrenta, em sua atividade produtiva, dificuldades
extremas que a vem impedindo de garantir a produção e reprodução da vida, isto
porque os trabalhadores produzem através de técnicas rudimentares, sem os meios de
produção adequados, sem financiamento, sem acesso às tecnologias, produzindo
pouco e se desgastando muito e ainda, porque as tecnologias disponíveis foram
desenvolvidas para uma produção na lógica capitalista, e portanto são destrutivas da
natureza. Os trabalhadores necessitam produzir sem se auto-destruir, destruindo a
natureza. No contexto da lógica do capital, o conhecimento cientifico que deveria ser
força produtiva, ideológica e política, converte-se em força destrutiva.
Diante desta situação, podemos identificar as fragilidades do modo de
produção em que estamos inseridos: a destruição e/ou a precarização da força
humana que trabalha e a degradação crescente do meio ambiente, na relação
metabólica entre homem, tecnologia e natureza7, e neste contexto, derrubar a tese de
que o que está alavancando a reestruturação produtiva é a ciência e a tecnologia. Isto
é uma ilusão. Bonotto (2005) contribui neste debate, apontando que, o fator real que
está alavancando a chamada reestruturação produtiva é o controle do trabalho por
parte do capital. Enquanto isso, os idealistas argumentam que vivemos na ―sociedade
do conhecimento‖, e que o simples acesso ao conhecimento garantiria o progresso, o
desenvolvimento, a empregabilidade. Segundo o autor, o que ocorre é a apropriação
7 MÉSZÁROS, 2002.
10
privada do conhecimento cientifico e tecnológico e que as novas tecnologias não são
difundidas pelo fato de serem substancialmente novas, ou boas para as pessoas, e sim,
por permitir um controle ainda maior do processo produtivo pelo capital. Diante desta
problemática, nos coloca o seguinte desafio: há a possibilidade de implementação de
novos métodos produtivos a partir da dialética? A resposta dada pelo autor é a de
chamar a responsabilidade para os pesquisadores, ressaltando que o desenvolvimento
da dialética, a generalização dialética das lógicas não-clássicas e o acúmulo
científico dos trabalhadores indicam caminhos para a implementação de melhores
métodos produtivos. (Idem, p.72).
É preciso, portanto, compreender por que se nega o conhecimento e as
ferramentas, os instrumentos, para a produção do conhecimento cientifico? Porque
são necessários ao capital os desvios teóricos, as ilusões, os giros e viradas idealistas?
Entendemos que esses problemas, identificados na realidade, são produtos da
materialização das estratégias que o capital se vale para manter sua determinação
mais profunda8 que é a sua expansão e a acumulação, através da extração e
acumulação de trabalho excedente9, e o faz através da mediação do Estado e suas
medidas que aprofundam o acirramento da luta entre as classes. As mediações do
Estado se expressam nas reformas e nas novas leis decorrentes destas primeiras. Entre
elas destacamos a questão da educação via escolarização da classe trabalhadora e as
estratégias do capital para educar o consenso. Lucia Neves (2005)10
, demonstrou que
a ampliação do Estado Brasileiro a partir dos anos 1980, no contexto de
implementação e aprofundamento do modelo societário neoliberal, vem se dando por
meio de um programa político especifico – a Terceira Via que visa educar para o
consenso sobre os sentidos de democracia, cidadania, ética, participação adequados
aos interesses privados do grande capital nacional e internacional.
Estas mediações visam adequar, ideologicamente11
, as condições da produção
do conhecimento, desde os financiamentos concedidos, quanto ao tratamento dos
fenômenos da realidade, a partir de abordagens epistemológicas, que os isolam,
confundem, esvaziam o conteúdo do real concreto.
A ciência atrelada à tecnologia ocupa um importante papel no processo de
auto-reprodução do capital. Em um projeto societário de economia globalizada, onde
se reúne o grupo dos oito países mais desenvolvidos do mundo, de onde saem os
8 Mészáros, I. Para além do capital: rumo a uma teoria da transição. Campinas-SP: Boitempo Editorial & Editora da
Unicamp, 2002. p.100. 9 Sobre os conceitos de trabalho necessário e trabalho excedente, verificar capítulo V (Processo de trabalho e processo
de produzir mais valia) de Marx, Karl. O capital. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1980. 10
Lúcia Neves organizou um livro sobre a ―Nova Pedagogia da Hegemonia:estratégia do capital para educar o
consenso‖, após três anos de investigações do Coletivo de Estudos de Política Educacional da Universidade Federal
Fluminense (UFF). 11
Segundo Mészáros, as diferentes formas ideológicas de consciência social têm implicações práticas de longo alcance
em todas as suas variedades, na arte e na literatura, assim como na filosofia e na teoria social, independentemente de
sua vinculação sociopolítica a posições progressitas ou conservadoras. [...] . Como resultado de tais determinações
inerentemente práticas, as principais ideologias levam a marca muito importante da formação social cujas práticas
produtivas dominantes (como por exemplo, o horizonte de valores da empresa privada capitalista) elas adotam como
definitivo quadro de referência. (Mészáros, I. O Poder da Ideologia. São Paulo: Boitempo Editorial, 2004). Ao
apontarmos esta compreensão, entendemos que o quadro de referência, no caso da ciência e tecnologia, vem sendo
cada vez mais a solução dos problemas da crise estrutural do capital (os quais, a princípio, não tem resolução), o que
vem significando, nas últimas décadas de forma intensa, a exploração e expropriação do trabalho e do trabalhador.
11
marcos regulatórios sob os quais os demais países deverão organizar suas produções
deixam muito evidentes as relações, nexos e determinações. O historiador Osvaldo
Coggiola, denomina este fenômeno de alienação capitalista da ciência. Citando Paul
Forman, um dos principais historiadores da Física, aponta:
A ciência é cada vez mais ―uma empresa política e econômica‖.
Atualmente ―a ciência é valorizada simplesmente como um
componente da tecnologia, e esta não como um meio para fazer
ciência. A tecnologia se transforma no propósito da ciência,
estabelece seus objetivos e orienta sua atividade, não mais
concebida como dotada de seus próprios fins ou objetivos
intrínsecos, porque carente de uma concepção hierárquica de
conhecimento: a ciência é incapaz de criar seus próprios fins, a
tecnologia se converte no instrumento e objetivo indispensável
da atividade científica. (FORMAN apud COGGIOLA, 2005,
p.7).
A ciência voltada para o desenvolvimento das tecnologias, está cada vez mais
deixando de lado as necessidades humanas. Disso decorrem graves conseqüências, ou
seja, a relação que hominiza o homo sapiens sapiens – o trabalho -, vem sendo
destruída, precarizada, e junto a ela todos os bens construídos historicamente.
Assim, o conhecimento, na sociedade do capital, adquire força produtiva –
quando, o conhecimento produzido, incorporado aos processos produtivos, aumenta a
produtividade, o rendimento, a mais-valia, assegurando a acumulação do capital e as
condições que o perpetuam, contraditoriamente, também enquanto força destrutiva;
proporciona dominação política – quando incorporado à sociedade industrial, a
modernidade e a pós-modernidade, por uma política de racionalidade científico-
tecnológica assumida pelo Estado, determina condições de vida, processos de
trabalho, de acesso a bens culturais como educação, saúde, seguridade; e força
ideológica – quando se submete aos interesses da classe dominante, mediatizados
pelo Estado e expressos em leis, planos, diretrizes governamentais e administrativos.
(SOBRAL, 1986, p.287-305).
É, portanto, sob essa base concreta, real, do conhecimento científico, enquanto
necessidade humana vital que vamos enfrentar o desafio de estudar os giros ou a
virada lingüística para desmistificar as crenças e as ilusões na neutralidade cientifica
e sua expressão atual expressa na morte da razão.
O QUE SÃO OS “GIROS” OU A “VIRADA LINGUISTICA?”
“A finalidade científica e política que perseguimos nos
proíbe de dar uma definição acabada de um processo
inacabado. Ela nos impõe observar todas as fases do
fenômeno, de fazer aparecer as tendências progressistas e
12
reacionárias, de revelar sua interação, de prever as
diversas variantes do desenvolvimento ulterior e de
encontrar nesta precisão um ponto de apoio para a ação”
(TROTSKY,1995) .12
O que são, portanto, os ―Giros‖ ou a ―virada lingüística?‖ São explicações
científicas sobre a ciência e a produção do conhecimento científico que implicam em
uma cosmovisões, em uma filosofia e estão ancorados em pressupostos ontológicos e
gnosiológicos.
Segundo Ghiraldelli (2008)13
A "virada linguística" ou linguistic turn é o nome adotado
para um novo rumo que a filosofia ganhou no século XX..
Segundo Paulo, com a filosofia, os gregos antigos
perguntavam sobre a realidade, os modernos, com
Descartes, passaram a perguntar sobre o conhecimento da
realidade e, assim, criaram a dualidade sujeito-objeto,
transformaram a filosofia em epistemologia (subjugando a
metafísica, a ontologia e a cosmologia (e a ética, estética
etc.) à teoria do conhecimento) e, enfim, criaram o
"método". Assim, a característica da história da filosofia,
guiada pelo pensamento moderno, é a de tomar a filosofia a
partir de dois núcleos: texto de epistemologia seguido de
texto de método. Os textos de epistemologia e de método
avançaram a ponto de ampliarem, em muito, o que hoje
chamamos de filosofia da mente. Tentando explicar o
funcionamento do aparato cognitivo e a verdade, os
filósofos chegaram a dois pontos: 1) o sujeito não é uma
unidade e, talvez, nem seja sujeito, talvez tenhamos de
manter a noção de mente e de individualidade, mas não
associá-la, mais, imediatamente, à noção de sujeito
moderno - ou abandonamos tal noção ou a reconstruímos;
2) a mente não consegue apontar para o real e explorar o
real sem a linguagem, pois esta não é apenas a expressão
de pensamentos e, sim, a maquinaria do próprio
pensamento e a única forma pela qual acessamos o
pensamento, nosso e de outrem. Este segundo ponto é o
centro da linguistic turn: os filósofos tenderam, então, a
centrar atenção na linguagem, em vários sentidos. A
filosofia da linguagem ganhou um impulso muito grande no
12 TROTSKY, Programa de Transição. São Paulo, Comissão de Formação, 1995. 55 ª Aniversário do assassinato de Trotsky e 100 ª Aniversário da
Morte de F. Engels. 13
http://ghiraldelli.multiply.com/journal/item/112 ver mais in:
http://portal.filosofia.pro.br/fotos/File/virada.pdf
13
século XX e tende a chamar a atenção, ainda, como ponto
central, no século XXI.Essas duas conclusões fizeram a
ponte da filosofia moderna para a filosofia contemporânea.
Três são as principais frentes onde se deu o giro lingüístico:
1) O neopositivismo lógico ou empirismo lógico – Círculo de Viena – década de
20 do séc. XX – São representantes: Schlick, Carnap, Nagel, Morris, Quine,
Pierce, Frege e Wittgenstein (Tratactus). Sustentavam a idéia de que o
conhecimento pode ser obscurecido por perplexidades lingüísticas. Reduziam a
filosofia à epistemologia e esta à semiótica. A missão mais importante da
filosofia deveria ser realizada à margem de especulações metafísicas. Admite-
se três tipos de relações entre os signos: sintática, semântica e pragmática.
Buscam-se a construção de linguagens idéias.
2) A Filosofia de Wittgenstein – que em sua ―segunda fase‖ – a partir da obra
―Investigações Filosóficas‖ – rompe com sua obra anterior ―Tratactus14
‖.
Propunha a reformulação da teoria tradicional da semelhança entre linguagem
e mundo. Não existe o mundo em si, independente da linguagem, pois somente
temos o mundo na linguagem. Esta deixa de ser um instrumento de
comunicação do conhecimento e passa a ser condição de possibilidade para a
constituição do conhecimento. Não há essências. É impossível determinar a
significação das palavras sem uma consideração do contexto socioprático em
que são usadas. Tal contexto é contexto de ação.
3) O Desenvolvimento da filosofia da linguagem ordinária – Principais
representantes, Wittgenstein, Austin e Searle. A linguagem é vista como
instrumento de comunicação e dominação social. Consideração da dimensão
pragmática do discurso ligado a ações coletivas, intersubjetivas, mesclando
atos de linguagem e práticas. A linguagem é essencialmente ação social e
horizonte a partir de onde os indivíduos exprimem a realidade.
O giro lingüístico, segundo Gamboa (2007), generalizou-se no conjunto das
demais tradições filosóficas do século XX, tornando o tema da Linguagem comum à
reflexão de diferentes linhas das ciências humanas. Ainda segundo Gamboa (2007), o
debate epistemológico contemporâneo pode ser organizado com base nos ―giros‖ que
permite centralizar a controvérsia sobre as formas do conhecimento e do discurso
científico-filosófico, reconhecendo a importância das chamas abordagens pós-
modernas e as respostas que essas perspectivas vem gerando em outras abordagens
mais tradicionais como a hermenêutica15
, a pragmática16
e a dialética17
.
14
Inspirador central da teoria do positivismo lógico - a teoria verificacionista do significado.
15 O termo "hermenêutica" provém do verbo grego "hermēneuein" e significa "declarar", "anunciar", "interpretar",
"esclarecer" e, por último, "traduzir". Significa que alguma coisa é "tornada compreensível" ou "levada à compreensão".
Desde o os séculos XVII e XVIII o termo é utilizado no sentido de uma interpretação correta e objetiva da bíblia. Para
outros o termo "hermenêutica" deriva do grego "ermēneutikē" que significa "ciência", "técnica" que tem por objeto a
interpretação de textos religiosos ou filosóficos, especialmente das Sagradas Escrituras; "interpretação" do sentido das
palavras dos textos; "teoria", ciência voltada à interpretação dos signos de seu valor simbólico. Wilhelm Dilthey é o
primeiro a formular a dualidade de "ciências da natureza e ciências do espírito", que se distinguem por meio de um
método analítico esclarecedor e um procedimento de compreensão descritiva. Compreensão é apreensão de um sentido,
14
A localização do debate dos ―Giros‖ ou ―Viradas‖ pode ser localizada na
fundamentação das tendências pós-modernas e pós-estruturalistas que incluem
correntes expressivas do meio educacional como as teorias pós-criticas e o neo-
pragmatismo.
Ainda segundo Gamboa (2007), o ―giro lingüístico‖ (linguistic turn) que se
fundamenta em autores como Saussure, Barthes, Derridá, Deleuze, White e LaCapra,
Foucault sustenta as seguintes teses entre outras:
•A linguagem carece de toda referência à realidade (Saussure); •Não existe
nada fora do texto (Barthes);
•O texto não guarda relação com o mundo exterior, não faz referência à
realidade, nem depende de seu autor. O texto também deve ser liberado do autor
(Foucault);
•Não existe unidade entre a palavra e a coisa à qual se refere. Existe um
infinito leque de significados sem um sentido claro (Derrida).;
•No texto as intenções do autor carecem de importância (White e La Capra);
e sentido é o que se apresenta à compreensão como conteúdo. Só podemos determinar a compreensão pelo sentido e o
sentido apenas pela compreensão. sentido bíblico. Para Heidegger, em sua análise da compreensão, diz que toda
compreensão apresenta uma "estrutura circular". "Toda interpretação, para produzir compreensão, deve já ter
compreendido o que vai interpretar. Para Paulo Ricoeur compreender um texto é encadear um novo discurso no
discurso do texto. Isto supõe que o texto seja aberto. Ler é apropriar-se do sentido do texto. De um lado não há reflexão
sem meditação sobre os signos; do outro, não há explicação sem a compreensão do mundo e de si mesmo.
16 Enquanto escola filosófica o pragmatismo tens suas origens nos Estados unidos da América, caracterizada pela
descrença no fatalismo pela certeza de que só a ação humana, movida pela inteligência e pela energia, pode alterar os
limites da condição humana. Inspirada em Ralph Waldo Emerson, seus fundadores foram Charles Sanders Peirce, com
seu artigo How to make our ideas clear, e Wiliam James, que retomou as idéias de Peirce, popularizando-as em sua
coletânea "O Pragmatismo". Segundo James e Francis Schaeffer, o Pragmatismo aborda o conceito de que o sentido de
tudo está na utilidade - ou efeito prático - que qualquer ato, objeto ou proposição possa ser capaz de gerar -
componentes vitais da verdade. Uma pessoa pragmática vive pela lógica de que as idéias e atos de qualquer pessoa
somente são verdadeiros se servem à solução imediata de seus problemas. Um dos expoentes dessa corrente é Richard
Rorty. Ver mais in: http://portal.filosofia.pro.br/fotos/File/virada.pdf e ainda, no texto de Paulo Ghiraldelli Jr. "Rorty: a
Andorinha Solitária que Faz Verão." Cult (Especial Filosofia), ano 8, número 97, novembro de 2005, páginas 58-61.
17 O conceito de dialética pode ser localizado em diferentes doutrinas filosóficas. Para Platão, a dialética é sinônimo de
filosofia, o método mais eficaz de aproximação entre as idéias particulares e as idéias universais ou puras. É a técnica
de perguntar, responder e refutar (Sócrates 470ª.C. – 399 a. C. Platão considera que apenas através do diálogo o filósofo
deve procurar atingir o verdadeiro conhecimento, partindo do mundo sensível e chegando ao mundo das idéias. Pela
decomposição e investigação racional de um conceito, chega-se a uma síntese, que também deve ser examinada, num
processo infinito que busca a verdade. Para Aristóteles a dialética é a lógica do provável, do processo racional que não
pode ser demonstrado. Para Immanuel Kant retomando a noção aristotélica define a dialética como a "lógica da
aparência". Para ele, a dialética é uma ilusão, pois baseia-se em princípios que são subjetivos. A dialética idealista e
materialista se distinguem a partir das contribuições de Hegel, Marx e Engels. Diferentemente do método causal, no
qual se estabelecem relações de causa e efeito entre os fatos o modo dialético busca elementos conflitantes entre dois ou
mais fatos para explicar uma nova situação decorrente desse conflito. Os elementos do esquema básico do método
dialético são a tese, antítese e a síntese. A tese é uma afirmação ou situação inicialmente dada. A antítese é uma
oposição à tese. Do conflito entre tese e antítese surge a síntese, que é uma situação nova que carrega dentro de si
elementos resultantes desse embate. A síntese, então, torna-se uma nova tese, que contrasta com uma nova antítese
gerando uma nova síntese, em um processo em cadeia infinito. A dialética hegeliana é idealista, aborda o movimento
do espírito. A dialética marxista é um método de análise da realidade, que vai do concreto ao abstrato e que oferece um
papel fundamental para o processo de abstração. Segundo Engels e Marx a dialética tem leis que se expressam na
natureza, na sociedade e no conhecimento e portanto, lógica, teoria do conhecimento e materialismo histórico dialético
são uma única coisa. Resumidamente estas leis são: ação recíproca, unidade polar ou "tudo se relaciona"; mudança
dialética, negação da negação ou "tudo se transforma"; passagem da quantidade à qualidade ou mudança qualitativa;
interpenetração dos contrários, contradição ou luta dos contrários.
15
•A linguagem constitui em si mesma a única realidade existente, fundamentos
de todos os fenômenos sociais;
•Sujeito: Homem desaparece como fator ativo e com ele a intencionalidade
humana como elemento criador de significado (pós-humano);
•Objeto: o texto literário, histórico, científico (em si mesmo, sem o seu
referente original).
Muitas polêmicas foram levantadas a partir do ―giro lingüístico‖, que podem
ser identificadas segundo Gamboa (2006) como: ―giro hermenêutico‖ (Gadamer);
―giro pragmático‖ (Habermas); ―giro ontológico‖ (Escola de Budapeste). O ―giro
hermenéutico‖ defendido por Gadamer (1995) debate particularmente as teses de
Derrida e contra argumenta que ―a obra, literária, artística‖ nos diz algo atendendo a
sua própria intenção‖. ―a palavra, a frase, o discurso nos remete ao autor e a suas
intenções.(GADAMER, el giro hermenéutico, Madrid: Cátedra, 1995, p. 69) .
Ainda segundo Gamboa, a polêmica sobre os ―giros‖ continua com Habermas
que entra no debate de forma explicita nas obras como, ―Verdad e justificación‖
.(Madrid: Trotta, 2002), e La ética del discurso y la cuestión de la verdad (Buenos
Aires: Paidos, 2006). Habermas defende o ―Giro pragmático‖ apresentando a tradição
hermenêutica que vai desde Humboldt e Schleiermacher até Heidegger e Gadamer
(defensores do giro hermenêutico) como outra versão do giro lingüístico
(Wittgenstein, Derrida, Rorty). Tanto um como outro giro pretendem superar a
filosofia mentalista (o significado está na mente) com a filosofia lingüística (o
significado está na linguagem) e focalizando a linguagem desde perspectivas opostas
e utilizam meios distintos, ―por um lado, os instrumentos da análise lógica (semântica
formal) e por outro da semântica orientada ao conteúdo (holística)... mas, ignoram os
aspectos pragmáticos do diálogo... lócus da racionalidade comunicativa‖ (2006, p.
70) ―tais enfoques estão compromissados, de um modo ou outro com a prioridade da
semântica sobre a pragmática‖ (p. 71). Habermas, junto com Karl-Otto Apel propõem
uma ―pragmática do significado‖, entretanto assumem como desafio, a questão da
defesa do realismo (giro ontológico) depois do giro pragmático, já que ―...o giro
pragmático não deixa espaço para duvidar da existência de um mundo, que se
percebe independente das nossa descrições e como o mesmo para todos nós‖. (p. 74).
―E dependendo das linguagens teóricas que escolhamos, obteremos diferentes
descrições, as quais podem se referir, entretanto, as mesmas coisas. Em
conseqüência, o mundo deveria se conceber como a totalidade dos objetos, não dos
fatos, os quais dependem da linguagem. A este conceito semântico de mundo como
um sistema de referencias possíveis corresponde um conceito epistemológico de
mundo como a totalidade das coações implícitas impostas sobre nossas diversas
formas de conhecer o que sucede no mundo‖(P. 78).
Em seus estudos Gamboa (2006) demonstra ainda que ―além do desafio
assumido por Habermas e Apel, o giro ontológico também tem mais três outras
vertentes‖ a saber:
a) ―Ontologia do ser social‖ de Lukács e defendido pela escola de
Budapeste que prioriza o entender o mundo a explicá-lo ou
compreendê-lo. Conhecida como a teoria do reflexo Lukács defende
16
que tanto o reflexo, científico, estético o literário, refletem a mesma
realidade objetiva (ontológica), independente da consciência situada
na base de toda obra (literária, científica, filosófica ou estética)
acentuando a unidade de identidade e diversidade nas categorias tanto
científica, filosóficas e estéticas. Gamboa demonstra também que
Mészáros (1993) reafirma o método dialético que considera a
existência de uma realidade (ontológica) passível de ser conhecida
através de diversas mediações determinadas pelo desenvolvimento das
forças produtivas e as condições materiais históricas que os sujeitos
sociais se apropriam para conhecer essa realidade.
b) ―giro ontológico‖ atribuído à escola de Ilya Prigogine (1917-2003),
ganhador do prêmio Nobel de química pelos estudos com a
termodinâmica a sua teoria sobre estruturas dissipativas. Prigogine
busca superar os relativismos fundados na concepção subjetiva de
tempo como duração (matemática quântica de Borh) ou de tempo sem
direção (Eistein). A inclusão do tempo como realidade cosmológica
(ontológica), além das nossas medidas (subjetivas), e integrando o
devir ao ser caracteriza uma nova perspectiva da ciência
contemporânea e recoloca a ontologia como base da epistemologia
(Prigogine e Stengers, 1998). Stengers integrante da escola de
Prigogine debate na Invenção das ciências modernas (São Paulo: Ed
34, 2002) a tensão entre duas abordagens das ciências, a da
objetividade científica das ciências exatas e das crenças científicas dos
estudos culturais (pós-estrutralismo). A superação dessa tensão se da
através da ―ontologia‖. A identidade da ciência está em discutir o quê
é a realidade, o quê é o mundo.
c) ―giro ontológico‖ atribuído a Maturana (1999) quando pretende
provar através da neurobiologia os problemas da percepção e se depara
com uma ―objetividade-entre-parênteses‖ e com a necessidade de
discutir: a ontologia da explicação como condição para a constituição
da observação, a ontologia da realidade, a ontologia da cognição e a
ontologia do social e da ética. (Ontologia da realidade, Belo
Horizonte: Ed UFMG, 1999)
Gamboa conclui que ―essa controvérsia vem se apresentando na pesquisa em
Educação Física com os desafios das teorias pós-estruturalistas e pós-criticas, e que é
pertinente aprofundar nessas polêmicas que ajudam a revelar os limites e as
implicações das diferentes perspectivas epistemológicas‖.
O DESTAQUE PARA OS GIROS NA PERSPECTIVA DA “”ONTOLOGIA
REALISTA”
Vou me valer, novamente, no debate sobre ―giros na perspectiva da ontologia
realista‖, da contribuição de Gamboa (2007) apresentada inclusive no II Seminário e
III Colóquio sobre epistemologia e teorias da educação. Segundo ele uma das reações
17
ao denominado ―giro lingüístico‖ vem das teorias do conhecimento que superando os
conceitos originais do ―mentalismo‖ (a representação dos objetos ou coisas na mente)
reafirmam a necessidade de considerar a realidade (ontos) independente da
consciência e da linguagem. O discurso e a linguagem deverão se referir a alguma
realidade (objeto) ou referente empírico, construído social e historicamente, ou
mesmo virtual, mas independente do sujeito, da sua percepção, da consciência e das
palavras utilizadas para se referir a ele. São três reações, segundo Gamboa, na
perspectiva da ―ontologia realista‖ que vem se destacando no contexto do debate: a
denominada Escola de Budapeste (Luckács, Mészáros, Bhaskar), Escola de Prigogine
e a Escola de Maturana.
Além da polêmica sobre o ―giro pragmático‖, ainda segundo Gamboa, tanto os
giros lingüísticos, como o hermenêutico, pretendem superar a filosofia mentalista (o
significado está na mente) propondo como alternativa a filosofia lingüística (o
significado está na linguagem). Tanto o ―giro lingüístico‖ como o ―giro
hermenêutico‖ focalizam a linguagem desde perspectivas opostas e utilizam meios
distintos, ―por um lado, os instrumentos da análise lógica (semântica formal) e, por
outro, a semântica orientada ao conteúdo (holística)... mas, ignoram os aspectos
pragmáticos do diálogo... lócus da racionalidade comunicativa‖ (2006, p. 70) e ―tais
enfoques estão compromissados, de um modo ou outro com a prioridade da
semântica sobre a pragmática‖ (p. 71). Habermas e Apel propõem uma ―pragmática
do significado‖, entretanto, assumem como desafio, a questão da defesa do realismo
(giro ontológico) depois do giro pragmático, já que ―...o giro pragmático não deixa
espaço para duvidar da existência de um mundo, que se percebe independente das
nossa descrições e como o mesmo para todos nós‖. (p. 74). ―E dependendo das
linguagens teóricas que escolhamos, obteremos diferentes descrições, as quais podem
se referir, entretanto, as mesmas coisas. Em conseqüência, o mundo deveria se
conceber como a totalidade dos objetos, não dos fatos, os quais dependem da
linguagem. A este conceito semântico de mundo como um sistema de referências
possíveis corresponde um conceito epistemológico de mundo como a totalidade das
coações implícitas impostas sobre nossas diversas formas de conhecer o que sucede
no mundo‖ (p. 78).
O que constatamos, a partir dos estudos de Gamboa é que o giro ontológico
tem outras vertentes, tais como a da ―Ontologia do ser social‖ de Lukács e defendido
pela escola de Budapeste que prioriza o entender o mundo a explicá-lo ou
compreendê-lo (Introdução a uma estética marxista, Rio de Janeiro: Civilização
Brasileira, 1978). Segundo Lukács que defende a teoria do reflexo, afirma que tanto o
reflexo, científico, estético ou literário, reflete a mesma realidade objetiva
(ontológica), independente da consciência, situada na base de toda obra (literária,
científica, filosófica ou estética) acentuando a unidade de identidade e a diversidade
nas categorias tanto científica, filosóficas e estéticas. Mészáros (Filosofia, ideologia e
ciência social), São Paulo: Ensaio, 1993), reafirma o método dialético que considera
a existência de uma realidade (ontológica) passível de ser conhecida através de
diversas mediações determinadas pelo desenvolvimento das forças produtivas e as
condições materiais históricas que os sujeitos sociais se apropriam para conhecer essa
realidade. A Escola de Budapeste se apóia na teoria do conhecimento marxista. Os
18
trechos a seguir explicitam a prioridade das condições reais do homem concreto sobre
as representações, a linguagem e a interpretação. São os homens que produzem as
suas representações, suas idéias, etc., mas, os homens reais atuantes, tais como são
condicionados por um determinado desenvolvimento de suas forças produtivas e das
relações que a elas correspondem; (...) A consciência nunca pode ser mais que o ser
consciente; e o ser dos homens é o seu processo de vida real... Não é a consciência
que determina a vida, mas sim a vida que determina a consciência. (...) Não partimos
do que os homens dizem, imaginam ou representam, tampouco não do que eles são
nas palavras, no pensamento, na imaginação e na representação dos outros, para
depois se chegar aos homens de carne e osso; mas, partimos dos homens em sua
atividade real, é a partir de seu processo de vida real que representamos também o
desenvolvimento dos reflexos e das repercussões ideológicas desse processo real.
(Marx & Engels. Ideologia Alemã, Lisboa: Avante, 1981, p. 19). Com base nessa
teoria do conhecimento, Gamboa defende que é mais apropriado denominar esse
―giro ontológico‖ de ―re-virada‖, ―inflexão ou reação ontológica‖, uma vez que se
pretende, colocar o homem com os pés na terra e a cabeça sobre um corpo fincado na
realidade. Ou, de defender a tese de que ―os homens pensam como vivem‖ e não o
contrário, ―os homens vivem, segundo seus pensamentos ou representações‖ (tese
idealista). Isto é, os homens vivem, têm experiências concretas e a partir dessas
condições concreta, eles criam seu imaginário.
Outra linha do ―giro ontológico‖, segundo Gamboa é atribuída à escola de
Prigogine que busca superar os relativismos fundados na concepção subjetiva de
tempo como duração (matemática quântica de Borh) ou de tempo sem direção
(Eistein). A inclusão do tempo como realidade cosmológica (ontológica), além das
nossas medidas (subjetivas), e a integração do ―devir‖ (tempo irreversível) ao ―ser‖
caracteriza uma nova perspectiva da ciência contemporânea e recoloca a ontologia
como base da epistemologia (Prigogine e Stengers, Entre el tiempo y la eternidad.
Buenos Aires: Alianza, 1998). Também, Stengers, integrante da escola de Prigogine
debate na Invenção das ciências modernas (A Invenção das ciências modernas. São
Paulo: Ed 34, 2002) a tensão entre duas abordagens das ciências, a da objetividade
científica das ciências exatas e das crenças científicas dos estudos culturais (pós-
estrutralismo). A superação dessa tensão se dá através da ―ontologia‖. A identidade
da ciência está em discutir o quê é a realidade, o quê é o mundo (ser ontológico). A
base da ciência está no conhecimento dos fenômenos, como eles são, se apresentam e
se revelam e não nas formas como o homem representa ou atua sobre o mundo. O
conhecimento dos fenômenos (ciência) antecede a sua intervenção sobre eles
(técnica).
A terceira linha do ―giro ontológico‖, segundo Gamboa, é atribuída a Maturana
(Ontologia da realidade, Belo Horizonte: Ed UFMG, 1999) quando pretende provar
através da neurobiologia os problemas da percepção e se depara com uma
―objetividade-entreparênteses‖ e com a necessidade de discutir: a ontologia da
explicação como condição para a constituição da observação, a ontologia da
realidade, a ontologia da cognição e a ontologia do social e da ética.
Gamboa demonstra, portanto, que nessas três linhas de pensamento, o ―giro
linguístico‖ vem gerando amplas e profundas reações, não apenas no âmbito das
19
filosofias da linguagem (hermenêutica de Gadamer e Pragmatismo dialógico de
Habermas), mas, também no âmbito das teorias do conhecimento fundadas no
realismo (ontologia).
AS REAÇÕES AO IDEALISMO E AO PÓS-MODERNISMO
“Fora precisamente Marx quem primeiro descobrira a
grande lei da marcha da história, a lei segundo a qual
todas as lutas históricas, quer se processem no domínio
político, religioso, filosófico, ou qualquer outro campo
ideológico, são na realidade apenas a expressão mais ou
menos clara de lutas entre classes sociais, e que a
existência e, portanto, também os conflitos entre essas
classes são, por seu turno, condicionados pelo grau de
desenvolvimento de sua situação econômica, pelo seu
modo de produção e pelo seu modo de troca, este
determinado pelo precedente.” ENGELS In: Prefácio a
terceira edição do 18 Brumário de Luis Bonaparte de Karl
Marx, Hamburg, 1885.
As contribuições que apresento nesse III Seminário de Epistemologia e Teorias
da Educação e IV Colóquio de Epistemologia são reações ao irracionalismo, ao pós-
modernismo. Conto para tal com obras como a de Evangelista (1992) que ao
responder, com suas investigações a determinadas questões ataca o cerne de
concepções teóricas veiculadas a exaustão e cuja aceitação, à primeira vista, beira a
unanimidade. As três questões que Evangelista busca responder e que o levam a
questionar as referencias bibliográficas são: a) como o capital articula a coersão e
consenso visando o controle e a dominação do trabalho; b) como os trabalhadores,
em uma resposta ativa à exploração do trabalho, encetam a sua resistência através de
diversas modalidades de práxis social; c) como a consciência apreende as
contradições existentes entre capital e trabalho. Conto ainda para reconhecer reações
ao irracionalismo pós-moderno com as evidentes denuncias sobre ―Mercandilização
da sociedade‖ (FREI BETTO; 2008), as ―imposturas intelectuais‖ (SOKAL &
BRICMONT, 1999), a ―lógica cultural do capitalismo tardio‖, (JAMESON, 1997) o
―recuo da teoria‖, (MORAES, 2003) o ―iluminismo às avessas‖ (MORAES; 2003),
―os desvios teóricos‖ (ANDERSON, 2004); de ―como não ler Marx de Souza Santos
(PAULO NETTO, 2004), a ―sobreposição de conceitos‖ (BOGO, 2008); ―a educação
contra o capital‖ (TONET; 2007), e por fim, ―a defesa do marxismo‖ (TROTSKY,
S/D), a atualidade extrema da concepção materialista dialética da história
(LOMBARDI, 2003) que são algumas, mas não as únicas, ―reações aos pós-
modernismos‖, reações essas que, não de maneira hegemônica, aparecem nas 378
pesquisas defendidas na Faculdade de Educação da UNICAMP sendo: 192 teses de
doutorado e 186 dissertações (dezembro de 2005) e nas 45 pesquisas dedicadas à
20
problemática da Educação Física.
Inicialmente vou me valer de uma crônica de Frei Betto (2008) 18
para
descrever o que é mesmo pós-moderno? Somos todos pós-modernos? Frei Betto em
recente resenha publicada no Correio da Cidadania, questionou se somos todos pós-
modernos? Conclui dizendo que a resposta é sim se comungamos essa angústia, essa
frustração frente aos sonhos idílicos da modernidade. Argumenta que
....nenhum sistema filosófico resiste, hoje, à mercantilização
da sociedade: a arte virou moda; a moda, improviso; o
improviso, esperteza. As transgressões já não são exceções,
e sim regras. O avanço da tecnologia, da informatização,
da robótica, a gloogletização da cultura, a
telecelularização das relações humanas, a banalização da
violência, são fatores que nos mergulham em atitudes e
formas de pensar pessimistas e provocadoras, anárquicas e
conservadoras. Na pós-modernidade, o sistemático cede
lugar ao fragmentário, o homogêneo ao plural, a teoria ao
experimental. A razão delira, fantasia-se de cínica, baila
ao ritmo dos jogos de linguagem. Nesse mar revolto,
muitos se apegam às "irracionalidades" do passado, à
religiosidade sem teologia, à xenofobia, ao consumismo
desenfreado, às emoções sem perspectivas. Para os pós-
modernos a história findou, o lazer se reduz ao
hedonismo, a filosofia a um conjunto de perguntas sem
respostas. O que importa é a novidade. Já não se percebe a
distinção entre urgente e importante, acidental e essencial,
valores e oportunidades, efêmero e permanente. A estética
se faz esteticismo; importa o adorno, a moldura, e não a
profundidade ou o conteúdo. O pós-moderno é refém da
exteriorização e dos estereótipos. Para ele, o agora é mais
importante que o depois. Para o pós-moderno, a razão vira
racionalização, já não há pensamento crítico; ele prefere,
neste mundo conflitivo, ser espectador e não protagonista,
observador e não participante, público e não ator. O pós-
moderno duvida de tudo. É cartesianamente ortodoxo. Por
isso não crê em algo ou em alguém. Distancia-se da razão
crítica criticando-a. Como a serpente Uroboros, ele morde
a própria cauda. E se refugia no individualismo narcísico.
Basta-se a si mesmo, indiferente à dimensão social da
existência. O pós-moderno tudo desconstrói. Seus
postulados são ambíguos, desprovidos de raízes,
invertebrados, sensitivos e apáticos. Ao jornalismo, prefere
o shownalismo.O discurso pós-moderno é labiríntico,
18
http://www.correiocidadania.com.br/content/view/2314/55/ Acesso em 08/12/08 às 07:14h.
21
descarta paradigmas e grandes narrativas, e em sua
bagagem cultural coloca no mesmo patamar Portinari e
Felipe Massa; Guimarães Rosa e Paulo Coelho; Chico
Buarque e Zeca Pagodinho. O pós-modernismo não tem
memória, abomina o ritual, o litúrgico, o mistério. Como
considera toda paixão inútil, nem ri nem chora. Não há
amor, há empatias. Sua visão de mundo deriva de cada
subjetividade. A ética da pós-modernidade detesta
princípios universais. É a ética de ocasião, oportunidade,
conveniência. Camaleônica, adapta-se a cada situação. A
pós-modernidade transforma a realidade em ficção e nos
remete à caverna de Platão, onde nossas sombras têm mais
importância que o nosso ser e as nossas imagens que a
existência real.
Segundo ANDERSON (2004), a primeira abordagem filosófica do termo pós-
modernidade foi realizada por Lyotard19
em seu livro ―A condição pós-moderna‖
datada de 1979. A Condição Pós-Moderna(1979), utiliza o conceito de "jogos de
linguagem" , originalmente desenvolvido por Ludwig Witgenstein, e refere-se a uma
agonística entre esses jogos - característica da experiência da pós-modernidade, assim
como a fragmentação e multiplicação de centros e a complexidade das relações
sociais dos sujeitos.Lyotard considera que a chegada da pós-modernidade ligava-se
ao surgimento a uma sociedade pós-industrial, na qual o conhecimento tornara-se a
principal força econômica de produção, embora perdendo a sua legitimidade
tradicional porque atrelado ao capital, ao estado sendo a verdade reduzida ao
desempenho à eficácia. A Ciência tornara-se um jogo de linguagem que já não podia
mais reivindicar o privilegio sobre outras formas de conhecimento visto ter ocultado
sua base, a saber, as duas grandes narrativas da modernidade: a primeira herdada da
Revolução Francesa, materialista, que colocava a humanidade como agente histórico
de sua própria libertação por meio do avanço do conhecimento e, a segunda,
descendente do idealismo alemão que via o espírito como progressiva revelação da
verdade, mitos que justificaram a modernidade.
Segundo Santos (2006), convencionou-se que o modernismo teria chegado ao
fim na década de 40, mas especificamente no dia 6 de agosto de 1945, as 8 horas e 15
minutos, quando a bomba atômica foi lancada sobre Hiroxima, iniciando o pós-
modernismo20
, visível na tecnologia eletrônica que invadiu o cotidiano, na era da
informática; na avidez de consumo, na sedução do individuo, na moral hedonista, com
os valores colocados no prazer, expressando-se na arquitetura, na pintura, na escultura.
19
Jean-François Lyotard (Versalhes, 10 de agosto de 1924 – Paris, 21 de a bril de 1998) filosofo francês, importantes
pensadores na discussão sobre a pós-modernidade. Autor dos livros a Fenomenologia, A Condição Pós-Moderna e O
Inumano.
20 Historicamente, segundo Santos (2006, p.20), o pós-modernismo foi gerado por volta de 1955, para vir a luz lá pelos
anos 60. Sociologos americanos batizaram o período de realizacoes decisivas que irropmeram nas artes, ciência e na
sociedade como a época pós-moderna, empregando termo empregado pelo historiador Toynbee em 1947.
22
Os signos e codigos representam a realidade. É o quarto poder e existem ciências para
estuda-los – Seniologia (ciência dos signos) e a Teoria da Comunicacao. O modelo de
signo criado pelos semiologos ingleses Ogdon e Richards, segundo Santos (2006, p 15)
, explica o central do pós-modernismo e tem a ver com a Lingustica, a Cibernética, a
Estética e até a filosofia. É um tripe que tem em um de seus apices o Signo, a
Linguagem, o Simulacro, o Espetáculo(pós-modernismo), de outro o Espirito a razao, a
idéia o sujeito a referencia. Por fim no terveiro apice o Referente O objeto, a realidade,
a materia.A pós-modernidade é um mundo super criado pelos signos. Materia e espirito
se esfumam em imagens, em digitos, num fluxo acelerado. A isso, Segundo Santos
(2006, p. 16 os filosofos denominam de desreferencializacao do real e
dessubstancializacao do sujeito, ou seja a realidade se degrada em fantasmagoria e o
sujeito (individuo) perde a substancia interior, sente-se vazio. O filho do modernismo
diz Santos, mobilizava as massas para a luta politica. Na sociedade pós-industrial
dedica-se as minorias. Tuando na micrologia do cotidiano. O Pós-modernismo é um
ecletismo, isso é a mistura de várias tendências. Prevalece o circuito informacoa-
estetizacao-erotizacao-personalizacao do cotidiano. Só há revolucao no cotidiano.Enfim
o pós-modernismo encarna estilos de vida, filosofia na qual viceja a idéia niilista do
nada, do vazio, da ausência de valores e sentidos para a vida. Afirma Santos (2006, p.
11) o pós-modernismo é coisa típica das sociedades pós-industriais baseadas na
informação. Paira, portanto, um irracionalismo próprio do modo do capital determinar,
em última instância, os rumos da economia.
Para Eagleton (1998), que realiza criticas contundentes à força do pós-
modernismo e a seus equívocos, o pós-modernismo refere-se em geral a uma forma
de cultura contemporânea e o termo pós-modernidade alude a um período histórico
especifico. Pós-Modernidade segundo o autor, é uma linha de pensamento que
questiona as noções clássicas de verdade, razão, identidade e objetividade, a idéia de
progresso ou emancipação universal, os sistemas únicos, as grandes narrativas ou os
fundamentos definitivos da explicação. Vê o mundo como contingente, gratuito,
diverso, instável, imprevisível. Emerge de uma nova forma do capitalismo. Para
Mészaros (2003) o que emerge do sociometabolismo do capital é a barbárie. É
taxativo quanto ao que nos espera para o próximo período de recomposição
hegemônica do modo do capital organizar a produção dos bens materiais e imateriais
– é a barbárie se as forças socialistas não avançarem.
Para demonstrar as fálacias, o simulacro da pós-modernidade forjada por
imposturas intelectuais podemos apontar a sangrenta e cruel batalha travada, por
exemplo, na América Latina contra a violencia dos paises colonialistas e
imperialistas, que durante séculos vem oprimindo os povos com um padrao de
relacoes que se carcaterizam, segundo Florestan Fernandes como de exploracao e
explotacao dos seres humanos e da natureza. Salazar (2006) nos apresenta dados
históricos sobre a violencia que carcaterizam bem um processo de revolucao
permanente (Trotsky,2007) que coloca por terra a tese pós-modernista de que a
revolucao se dá somente no cotidiano. O esquema por ele abordado demonstra com
dados concretos o periodo da colonizacao, da independencia parcial das nacoes e dos
paises, a era da industrializacao, das politicas neo-liberais, de seu esgotamento e
23
agora, da busca dos povos latino americanos pela soberania das nacoes. A revolucao
está em curso, para superar a fase pré-historica da relacoes sociais possiveis a
humanidade (MARX, 1986) e aponta para uma formcao economica, um modo de
organizar a producao e reproducao da vida qualitativamente superior. O pós-moderno
ou a contemporaneidade não é uma forma de superação do moderno, segundo Freitas,
mas, sim o aprofundamento, sob outras bases, das formas de exploração do homem .
Vejamos o quadro abaixo exposto por Salazar (2006) em recente curso ministrado na
UFBA (2008).
RevoluçãoRevolução RevoluçãoRevolução Comuna Comuna Revoluções Unidade Rev. Revoluções Unidade Rev. SocialismoSocialismo
Francesa Haitiana Francesa Haitiana de Paris frustradas? de Paris frustradas? Popular Popular BolivarianaBolivariana do séc.do séc.
1789 1804 1848 1849 1857 1789 1804 1848 1849 1857 1871 1930 Chilena 1871 1930 Chilena 1999/2002 1999/2002 XXI?XXI?
1817 1817 1955 1970 19901955 1970 1990
1810 1810 1890 19171890 1917
1824 1824 1942 19591942 1959
Ind. Ind. ImcompletaImcompleta 1895 1895 Rev. Cubana 1979Rev. Cubana 1979
da América Latina da América Latina Liberalismo Liberalismo Rev. SandinistaRev. Sandinista
Popular Popular e Granada e Granada
Reformas Rev. Revolução C.R. Neoliberal
México Revoluções Liberais Mexicana Cubana
FEUDALISMO CAPITALISMO SOCIALISMO/COMUNISMO
Ciclo revoluções burguesas Ciclo revoluções socialistas
17831783
Independência Independência
dos USAdos USA
1775 1775
Salazar expôs que a América Latina não deixou de lutar um dia sequer na
busca de completar o ciclo das revoluções em curso, datadas desde a primeira
revolução reconhecida na América Latina, a Revolução Haitiana de 1804 que seguiu
no rastro das revoluções em curso na Europa, onde as bandeiras da Igualdade,
Liberdade, Fraternidade estavam erguidas. Primeira republica a libertar os escravos o
Haiti hoje luta para retirar de seu solo tropas de ocupação imperialista, lideradas,
lamentavelmente, pelo Brasil. Entre brutais repressões militares até a atua
manifestação continental contra o imperialismo norte-americano, em defesa da
soberania das nações, lutam os povos. Por mais que nos seja difícil reconhecer a
revolução e permanente Esta práxis social que eleva sim a consciência de classe dos
trabalhadores, se não de maneira célere e linear, como seria necessária, mas, sim, por
contradições, idas e voltas, refluxos e avanços significa as formas de resistência da
classe trabalhadora, muitas vezes derrubada, freada, assegurada, por formas de
governança e políticas compensatórias, focais, assistencialistas. Neste lastro histórico
asseguram-se, forjam-se, elaboram-se teorias, explicações cientificas sobre a
natureza, o homem, a sociedade e o conhecimento. Wood (1999, p. 7) e Foster (1999,
p 196) ao investigarem sobre a agenda ―pós-moderna‖ e defenderem a história
demonstram as pretensões dos pós-modernistas com suas concepções sobre o
24
conhecimento cientifico e seu relativismo e solipsismo21
. O fio principal que perpassa
os princípios pós-modernos é a ênfase na natureza fragmentada do mundo e do
conhecimento. As implicações políticas disso tudo são não existe base para
solidariedade e ação coletiva fundamentada nos interesses dos produtores livremente
associados. É, portanto, neste movimento onde se expressam a luta de classes que é
possível reconhecer a que servem certas teorias? O que significa decretar o marxismo
como morto? O que são os giros? Por que negar a capacidade do ser humano
compreender e agir no real para transformá-lo com radicalidade. Assim como os
trabalhadores reagem e resistem as forças que os oprimem na formação econômica
em geral, são esboçadas as resistências e reações aos desvios teóricos, enfim ao pós-
modernismo.
As reações ao pós-modernismo aparecem tanto na crônica de Frei Betto quanto
na produção acadêmica quanto em outros espaços da vida. As reações ao pós-
modernismo, que se infiltram, com suas explicações, posições e posturas, todos os
âmbitos da vida humana e do Estado, não aparecem somente no campo da produção
do conhecimento científico, no embate entre o idealismo e o materialismo. Aparecem
também nos enfrentamentos para além do debate na academia e se expressam no
interior dos partidos políticos, quando está em jogo a direção do projeto histórico em
disputa, quando estão em confronto as reformas e as contra-reformas, a revolução e a
contra-revolução (NETTO; J. P.; 2005). Nos movimentos de luta social contra o
capital, quando está em jogo o papel e as relações a serem estabelecidas entre o
público e o privado, entre o Estado burguês e o rumo que devem assumir as políticas
públicas, por exemplo, a formação humana – alienação X emancipação humana -.
Presentes na luta dos contrários e no enfrentamento da grande contradição do capital
educar/alienar. Aparece na luta pela definição de políticas públicas no campo do
esporte entre o projeto para elevar o padrão cultural esportivo da população brasileira
e o projeto de transformar o Brasil em um país Olímpico. Aparece no âmbito sindical
quando está em confronto o papel a ser assumido pelas direções na luta de classes e,
fundamentalmente, nas nossas vidas cotidianas, em nossas famílias, quando temos
que nos situar perante a história e nos reconhecermos enquanto gênero humano,
enquanto humanidade, que necessita se emancipar, que está em franco processo de
degeneração e destruição e que deve encontrar um outro modo de organizar a
produção e reprodução da vida qualitativamente superior. Aparece no enfrentamento
ao plano mundial de educação sustentado pelas formulações encontradas em
Relatórios de agentes internacionais como a UNESCO que preconiza, conforme
podemos constatar no relatório da comissão internacional da Organização das Nações
Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) conhecido como Relatório
Jacques Delors, presidente da Comissão (1998), como pilares para a educação o
―aprender a aprender‖, ―aprender a ser‖, "aprender a fazer‖, ―aprender a conviver‖,
etc. Duarte (2003) refere-se a 4 pilares, 7 saberes e 10 competências. 21
O solipsismo é a consequência extrema de se acreditar que o conhecimento deve estar fundado em estados de
experiência interiores e pessoais, não se conseguindo estabelecer uma relação direta entre esses estados e o
conhecimento cientifico objetivo de algo para além deles. O solipsismo do momento presente estende este ceticismo aos
nossos próprios estados passados, de tal modo que tudo o que resta é o eu presente.
25
A reação pode ser verificada no contra-ponto a isso tudo quando se levantam
sólidas proposições pedagógicas nas lutas dos movimentos que enfrentam os pilares
mais gerais do capital, a saber, a propriedade privada dos meios de produção, a super-
exploração do trabalho assalariado e articulam-se as lutas imediatas com as mediatas
e históricas, quando se defende para a formação escolar uma consistente base teórica
materialista dialética histórica, a consciência de classe forjada na inserção concreta na
luta de classes, a formação política na defesa da classe trabalhadora e a organização
revolucionária, como pilares centrais do projeto de escolarização. Quando defende-se
como fundamentos da educação, a escola do trabalho socialmente útil como
principio educativo, o sistema de complexos temáticos para organizar o
conhecimento no programa escolar e, a auto-organização dos sujeitos, elementos
centrais para a escolarização da população de uma nação que se quer soberana, digna
e com seu povo feliz, conforme localizamos em proposições para a Educação do
Campo do MST – Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra.
Apesar das evidencias e da necessidade vital histórica da superação do modo
do capital organizar a vida, existem os que defendem a tese da condição pós-moderna
(HARVEY, 2006) como sendo uma mudança abissal nas praticas culturais, bem
como, político-econômicas, desde mais ou menos 1972. Segundo HARVEY
Essa mudança abissal está vinculada à emergência de
novas maneiras dominantes pelas quais experimentamos o
tempo e o espaço. Embora a simultaneidade nas dimensões
mutantes do tempo e espaço não seja prova de conexão
necessária ou causal, podem-se aduzir bases a priori em
favor da proposição de que há algum tipo de relação
necessária entre a ascensão de formas culturais pós-
modernas, a emergência de modos mais flexíveis de
acumulação do capital e um novo ciclo de ―compressão do
tempo-espaço‖ na organização do capitalismo. .Mas essas
mudanças, quando confrontadas comas regras básicas de
acumulação capitalista, mostram-se mais como
transformação da aparência superficial do que com sinais
do surgimento de alguma sociedade pós-capitalista ou
mesmo pós-industrial inteiramente nova.
A batalha de enfrentamento do pós-modernismo e sua definição de padrões de
ciência, crítica social e de prática política não tem sido nada fácil. Trata-se de
enfrentar a ―lógica cultural‖ do capitalismo segundo Jameson (1997). O combate é
diuturno e pode ser verificado, por exemplo, na obra de Alan Sokal e Jean Bricmont
(1999) que vem denunciando o relativismo pós-moderno, que sustenta a tese de que a
verdade objetiva não passa de uma convenção social. São analisados textos que
demonstram as mistificações físico-matemáticas perpetradas por Lacan, Kristeva,
Irigaray, Latour, Baudrillard, Deleuze, Guatteri, Virilio. Eles demonstram que ―o rei
está nu‖, demonstram o abuso da terminologia científica e a irresponsável
extrapolação de idéias das ciências naturais para as ciências sociais.
26
Segundo o historiador Hobsbawm (2008)
...o relativismo exerce atração sobre a história dos grupos
identitários. Por diferentes razões, a invenção massiva de
contra-verdades históricas e de mitos, outras tantas
tergiversações ditadas pela emoção, alcançou uma
verdadeira época de ouro nos últimos trinta anos. Alguns
desses mitos representam um perigo público —em países
como a Índia durante o governo hinduísta, nos Estados
Unidos e na Itália de Silvio Berlusconi, para não mencionar
muitos outros dos novos nacionalismos, acompanhados ou
não de manifestações de integrismo religioso.
Admite Hobsbawm (2008) que esse fenômeno deu lugar a muito palavrório e
bobagens nas margens mais longínquas da história de grupos específicos —
nacionalistas, feministas, gays, negros e outros— por outro, gerou desenvolvimentos
históricos inéditos e extremamente interessantes no campo dos estudos culturais,
como o "boom da memória nos estudos históricos contemporâneos" , como Jay
Winter o denomina.
Duarte (2003) para quebrar a ilusão pós-moderna da ―sociedade do
conhecimento‖ ressalta que não pactua com o fetichismo de que vivemos na
―sociedade do conhecimento‖, das ―tecnologias de informação e de comunicação
(TIC)‖, nem com a idéia de que o conhecimento, por si só, será capaz de, em todas as
esferas da vida social contemporânea, rearticular experiências sociais possibilitando
novas formas de interação social e transformando as normas e os valores. Não pactua
com o fetiche da ―ética‖ que oculta, nega e desconsidera a luta de classes e ignora o
movimento mais geral do capital, suas leis e sua estrutura e organiza o poder da
burguesia através do Estado definindo os rumos da economia política. Ressalta que
assim como no século XX tivemos os avanços decorrentes de descobertas nas
ciências básicas do século XIX, nas áreas de ciências naturais e exatas, visíveis em
tecnologias aplicadas que possibilitaram entre outros fatos a chegada a outros
planetas, o século XXI deverá avançar a partir das descobertas básicas dos séculos
XIX e XX nas áreas das ciências biológicas e humanas. Os exemplos do uso dessas
tecnologias no modo de vida são muitos e de grande impacto, atingindo todas as
esferas de experiência e de atividade públicas e privadas. Os impactos sócio-políticos
dessa presença maciça das tecnologias não são dados de antemão, mas sabe-se que
uma das características centrais é o processo de produção social e apropriação
privada das tecnologias, como todos os bens produzidos pelo sistema capitalista. Seus
resultados são apropriados privadamente, mantendo relações que subsumem o
trabalho ao capital. Elas não são capazes de engendrar novas formas de sociabilidade,
novas formas de ação social e novas formas de atuação política. Duarte (2003)
destaca, ainda, que não devemos nos iludir com o enfoque da sociedade da
informação e do conhecimento, nem acreditar que as transformações nas relações
sociais, políticas e econômicas, sobretudo a partir das TIC, ocorrerão por si só. Não
nos iludimos com a emergência de um campo conhecido como ―NBIC‖ –
27
Nanotecnologia, Biotecnologia, Informática e Ciências Cognitivas ou Ciências da
Mente. Essa área do conhecimento, por si só, não pode mudar o relacionamento
milenar construído entre os seres humanos e a natureza, que apresenta um padrão
hegemônico – a exploração da natureza e a exploração do homem pelo homem.
Exemplos clássicos são as novas tecnologias na agricultura, a biotecnologia em geral
como os transgênicos, a nanociência e a nanotecnologia e suas implicações na gestão
pública e no modo de vida. As potencialidades sociais e ambientais dessas conquistas
em uma sociedade de classes já foram evidenciadas nos últimos três séculos, as
forças produtivas estão em franca degeneração e decomposição.
O que constatamos, tanto na literatura consultada, bem como, na análise das
bases teóricas da política educacional no Brasil, é o evidente e progressivo recuo da
teoria em pesquisas educacionais, um processo que traz implicações epistemológicas,
éticas e políticas, segundo Moraes (2003) na própria produção de conhecimentos na
área. Ainda segundo Moraes (2003) as possíveis determinações desse processo são:
a) a emergência de um ethos neodarwinista nas universidades, com a consequente
degradação da vida acadêmica e, b) por outro lado, o ceticismo epistemológico
corrente que trivializa a questão do conhecimento e da verdade e procede a um sutil
exercício linguístico criando um novo e pragmático vocabulário destinado a assegurar
a obediência e a resignação públicas. Ao tratar do recuo da teoria Moraes (2003, p.
151) parte da consideração dos efeitos desestabilizadores da reestruturação
socioeconômica em escala planetária. Parte dos espraiamento dos imperativos
capitalistas em todas as esferas da vida humana estado de coisa que tem efeitos
profundos sobre as várias práticas sociais, de modo particular, na educação. A isso
corresponde uma educação, dos ―pactos prontos‖, aprendizagens configurada nos
discursos políticos educacionais como verdadeira panacéia. A discussão teórica
afirma Moares (2003, p. 153) tem sido ―gradativamente suprimida ou relegada a
segundo plano nas pesquisas educacionais, com implicações que podem repercutir, a
curto e médio prazo, na própria produção do conhecimento da área.‖ E o fim da teoria
acompanhada da promessa de uma utopia educacional alimentada por um indigesto
pragmatismo, uma utopia praticista. Uma verdadeira ―marcha a ré intelectual‖.
Segundo Moraes (2003, p. 154) o que está direcionando o movimento que
marginaliza o debate teórico é a efetivação das próprias políticas educacionais em
nível nacional e internacional, por exemplo, as exigências das agencias financiadoras,
a CAPES, e outras.
Outra razão é que no plano teorético as propostas que desqualificam a teoria
têm origem na convicção da falência de uma determinada concepção de razão: a
chamada razão moderna de corte iluminista. Uma vez perdidos os tradicionais
instrumentos de legitimação instaura-se o mal estar epistemológico, o cetisismo,
ético, político e, o desencanto, abrindo-se a agenda que abrigou os ―pós‖, os ―neo‖, os
―anti‖ que infestam a intelectualidade. Inaugura-se a era cética e pragmática.A
negação da objetividade aparece associada a idéia de desintegração do espaço
público, do fetichismo da diversidade, da compreensão de que o poder e a opressão
estão pulverizados em todos os lugares. . Daí a impossibilidade de uma base de
resistência e de enfrentamento da realidade. . frente a ela o sujeito estético,
fragmentário reconhece mas revela-se impotente.Nessa inflexão teórica o sutil
28
exercício linguistico põe em pratica a pragmática retórica de ressignificação de
conceitos. Alcançar o consenso é o fundamental, substituir sentidos e significados e a
precisão de conceitos por termos vagos que diluem principalmente seu caráter
rigoroso. São exemplos a substituição dos termos como ―luta de classes‖ por
―identidade‖, a ressignificação de ―sociedade civil‖, sujeitos histórico por atores,
condições objetivas da existência – formações econômicas por cenários, etc., etc.
Negam-se articulações, nexos determinações entre economia e poder político,
proclama-se a autonomia do político e do discurso. No horizonte ideológico
apaziguado constrange-se o agir consciente, dilui-se valores e fins, esvazia-se
diferenças, reduzi-se tudo a diversidade cultural. Denotam-se conforme Moares
(2003, 164), o silêncio e o esquecimento.
Moraes defende que a realidade da escola nos dias de hoje, a política de
conhecimento que envolve e a matriz cognitiva que se põe em jogo não podem
abdicar de uma teoria e de uma crítica que as apreendam em suas determinações
concretas. Só a teoria, associada a uma intensa renovação pedagógica é capaz de
impedir a redução de ―novos objetos‖ em ―microobjetos‖, na pesquisa educacional.
Defende que deve ser recolocado um grande debate filosófico e científico a respeito.
José Paulo Netto (2004) em seu livro ―Marxismo Impenitente‖ discute as idéias
marxistas e ressalta que para ―purgar-se do desastre em que se saldou a experiência
do chamado ―socialismo real‖, pretendem superar a ―ortodoxia metodológica‖, pela
via do pluralismo, transitar a modernidade do socialismo cientifico pra a criatividade
pós-moderna da reinvenção das utopias, substituir as exigências da supressão da
propriedade privada dos meios fundamentais de produção e controle social do
mercado, deslocar as velhas concepções das lutas de classes pelas ―novas‖ lutas
sociais moleculares, enfim, propor, em lugar do ―ultrapassado‖ projeto
revolucionário, a constituição de um novo contrato social. Trata-se de capitulação
intelectual que tem contribuído para as derrotas que a classe trabalhadora vem
amargando. Faz-se necessário a quebra do cerco ideológico , com a descoberta dos
―clássicos‖ da tradição marxista.
José Paulo Netto reage também a leitura ―simplória‖ e incompetente de
Boaventura de Souza Santos sobre a obra de Marx e sua contribuição para a
sociologia. Netto critica a ―sinopse crítica do desenvolvimento do marxismo, do final
do século XIX à década de 80 do século XX, organizada em quatro períodos com
tratamento bem diferenciado‖, pelo seu caráter tosco e insuficiente que culmina com
conclusões reducionistas e com o desprezo as reiteradas e enfáticas notações
marxianas sobre o caráter tendencial e histórico das leis histórico-sociais. Souza
Santos, a partir de sua ―avaliação do marxismo enquanto tradição teórica da
sociologia‖ admite que, para o enfrentamento da ―transição paradigmática‖ Marx não
tem serventia. As determinações complexas, bem como os complexos sistemas de
mediações, que articulam a totalidade concreta que é a sociedade burguesa são
neglicenciadas nas análises, admitindo-se assim, pós-modernismos, que não suportam
o rigor da teoria marxista.
Ademar Bogo (2008), em seu livro ―Identidade e luta de classes‖, critica os
pós-modernos que ―induzidos pelo processo de individualização humana‖, cada vez
mais crescente no capitalismo, apegam-se aos conceitos de identidade com a clara
29
intenção de colocá-lo em destaque, sobrepondo-o ao conceito de luta de classes. E
esta erosão do conceito e das referencias afeta profundamente as possibilidades de
avançar em direção a emancipação humana. Defende as leis da dialética materialista
histórica para ultrapassar as limitações das identidades e para compreender as
contradições do capital, expressas no Estado-nação, na capacidade de percepção das
diferenças, na perda dos direitos, na exaustão da natureza e o extermínio das espécies.
Para Robert Kurz22
(2008), sociólogo alemão, autor de "Os Últimos
Combates", afirma no Caderno Mais, da Folha de São Paulo, que a pós-modernidade
está no fim. De qualquer modo, o conceito foi desde sempre um embrulho enganador:
deveria sugerir algo historicamente novo e, no entanto, não podia indicar um
conteúdo próprio. A vacuidade das autodenominações remete ao fato de a pós-
modernidade não ser nada senão o capitalismo moderno em estado de carência
conceitual e em uma forma tardia de auto-espelhamento fútil.
Para Evangelista (1992) certos setores intelectuais das Ciências Sociais
afirmam que atravessamos uma crise teórica sem precedentes em toda a história e
estamos diante de uma verdadeira crise ―de paradigma‖. Dentro dessa crise das
grandes teorias sociais estaria situada a crise do marxismo. A critica recai sobre o
marxismo e a necessidade de um novo paradigma capaz de dar visibilidade a ―novos
fenômenos‖, ―novas dimensões da realidade‖, ―novos atores‖, ―novos movimentos
sociais‖, ―novos espaços políticos‖, ―novas práticas sociais‖, ―novas representações
simbólicas‖ e a uma ―nova teorização social‖. Os índices dessa crise do marxismo
estariam:
...no fracasso das experiências históricas de construção do
socialismo – o chamado socialismo real - e na estagnação
política dos partidos operários que optaram ou foram
levados a pautar as suas ações no interior dos mecanismos
institucionais da democracia representativa, nas sociedades
capitalistas ocidentais. (EVANGELISTA, 1992, p. 13-14).
Os inspiradores ou seja, os fundamentos teóricos da critica ao marxismo vem
de Castoriadis e se expressam na obra de SADER ( 1986; 1988). Em síntese, para
estes autores ―o marxismo não é mais a expressão do caráter revolucionário do
proletariado ou quaisquer camadas sociais‖ (Evangelista, 1992, p. 18).
Outro vinculo identificado por Evangelista vêm do pós-estruturalismo francês,
principalmente sua vertente Foucaultiana. Os vínculos são com,
...o pós-estruturalismo francês e, com seu último subtrato
teórico, com o pensamento ―pós-moderno‖, que resulta da
critica à modernidade e à razão moderna, inaugurando um
novo irracionalismo profundamente influente nos dias de
hoje, no Brasil. (EVANGELISTA, 1992, p. 20)
22
http://obeco.no.sapo.pt/livro_razao_sangrenta.htm. http://www.krisis.org. http://resistir.info
30
Segundo Evangelista (idem,21):
O estruturalismo e o pós-estruturalismo podem ser reunidos
dentro de um campo comum de operações lógicas. A
primeira delas é a ―exorbitação da linguagem‖, através da
generalização das categorias da lingüística para o domínio
antropológico, com Levi-Strauss, e, em seguida, para
―todas as principais estruturas sociais‖, com Foucault
(Anderson, 1984, p. 46-47). A segunda, que é seu efeito
imediato mais importante, é a atenuação da verdade‖, pela
separação entre ―significante‖ e ― significado‖, até a sua
autonomização frente ao significado. Assim, corta-se
―qualquer possibilidade de verdade como correspondência
entre as proposições e a realidade‖. A verdade e a fixidez
do sentido não passam de ilusões. A distinção entre o
verdadeiro e o falso é, em si mesmo, uma falsificação
primária. E ―sem falsidade a verdade deixa de existir‖.
Como é através da evidência que podemos distinguir entre
o verdadeiro e o falso, ―premissa ineliminável de qualquer
conhecimento racional‖, ela é simplesmente desdenhada: o
―jogo das significações‖ está acima da verdade e da
falsidade. É aqui que o ―discurso‖ ganha um novo status
teórico, com a eliminação de todas as referências a um
centro, a um sujeito ou a uma origem. E terceira, e última,
dessas operações lógicas é a ―descauzualização da história.
O estruturalismo e o pós-estruturalismo podem ser situados como integrantes
de um diversificado movimento intelectual de critica à modernidade e à razão
moderna.É a ―apologia orgiástica ao sem-sentido e da desrazão‖ segundo Zaidam
Filho, (1989, p. 25). Para Evangelista (ibidem, p. 31)
Se é impossível a descoberta de um sentido no processo
histórico-social, que posa ser racionalmente apreendido,
instaura-se o império da incognoscibilidade com a
relativização de todo o conhecimento, permitindo uma
multipliscidade inesgotável de interpretações, todas válidas.
A realidade teria como característica essencial o seu
caráter fragmentário, que impede qualquer possibilidade de
síntese ou totalização, que apreenda o real. É daí que
advém o jogo da crítica ao marxismo.
Para Evangelista estas teorias estruturalistas e pós-estruturalistas levam a
desvios teóricos que enfraquecem a práxis social de resistência, a elevação da
consciência de classe.
31
Para consubstanciar a critica no campo da educação e dar-lhe consistência vou
me valer de uma resenha do livro do professor FREITAS, Luiz Carlos de. Uma pós-
modernidade de libertação: reconstruindo as esperanças. Campinas-SP: Autores
Associados, 2005, realizada por Joelma Albuquerque, doutoranda da UNICAMP, e
bolsista do projeto Educação do Campo da LEPEL/FACED/UFBA.
FREITAS (2005) expressa sua preocupação com a problemática da pós-
modernidade e a teoria pedagógica recuperando dois significados para o fim das
certezas: um no mundo científico e outro no mundo político. Para discutir essas
―proposições‖ de incertezas, discute o fato da queda do Leste Europeu como uma das
principais justificativas para o combate à metanarrativa socialista (cap. 1); a origem
das incertezas analisando a pós-modernidade como uma expressão da fase de
financeirização do capitalismo somada a tese do esgotamento do sistema capitalista
histórico (cap. 2); a naturalização das incertezas ao longo da escala evolutiva, e o
risco positivista e pragmatista das idéias pós-modernas (cap. 3); e ainda, a partir da
análise do cenário da sociedade atual, nos convida à construção de uma pós-
modernidade que seja comprometida com a libertação, pelo caminho da crítica
marxiana à modernidade, ou seja, um esforço coletivo de criação de uma nova ordem
mundial (cap. 4). Para o autor, pós-modernidade ―designa um movimento que
compartilha do fim das metanarrativas, o qual acha que o pronome ―nós‖ é sinônimo
de opressão entende que o ―eu‖ é a única instância que governa a relação com as
coisas e com as pessoas‖ (p.7). Busca situar o entendimento da expressão
recuperando alguns autores como Lyotard (2002), Sanfelice (2001) Anderson (1999),
Norris, (1998), Wood (1999) e Magda e Vidal (1998). Destaca-se deste debate, a
compreensão da globalização econômica como a base material da pós-modernidade,
o que reforça a controvérsia de que os pós-modernos criticam racionalmente a
modernidade ao mesmo tempo em que defendem o irracionalismo. Expõe elementos
que justificam seu interesse em discutir a temática, que passam por dar visibilidade a
um contraponto às conseqüências da virada do capitalismo em direção à globalização
e, a partir daí, a organização do movimento pós-modernista, que resultaram em dois
impactos de alto poder destrutivo no campo da educação: 1) o impacto das políticas
neoliberais; e 2) e, somado ao primeiro (predominantemente no campo da economia e
das políticas públicas), o impacto das teses pós-modernistas no campo da ciência e
da cultura. Para o autor, ―prestam um serviço inestimável à causa liberal-
conservadora, à medida que deixam o campo econômico e político inteiramente à
mercê da interpretação neoliberal, sem falar do seu impacto negativo na mobilização
social‖ (p.13), pois para os pós-modernos, a organização se dá pelo discenso, pois os
consensos restringem e oprimem. (p.16). Sua indicação para a superação das teses
pós-modernas, é que, diante do debate educacional, evitemos as desqualificações e
que busquemos ―superar por inclusão‖, utilizando o instrumental conceitual da
dialética considerado adequado para uma rica compreensão, por parte de um
educador, das questões levantadas para análise e discussão no texto.
No capítulo 1 ―O que nos impede de pensar?‖, o autor descreve as incertezas
humanas de nosso tempo, desde o desemprego estrutural e suas conseqüências para as
famílias, passando pelo conjunto de incertezas da burguesia (falências, vendas,
fusões, oscilações na bolsa), até as incertezas da juventude, que forma sua
32
personalidade em meio à incerteza e ao caos.
A partir da visão dos capitalistas acerca do mundo atual, caracterizado como
―momento em que nada é previsível (...).‖ onde ―(...) ninguém mais está seguro de
nada‖. Ainda, ―muitas das idéias que foram sólidas como rocha para gerações e
gerações se desmancham no ar como fumaça‖, (Peters, 2003 apud Freitas, 2005),
seria necessário aceitar e incentivar a destruição para a recriação de novos modelos,
ou seja, é necessário se adequar – destruindo e recriando – às ordens incertas do
capital. Freitas analisa a experiência do socialismo real, já que os pós-modernos
costumam fazer referência a esta experiência para justificar sua opção pela recusa às
metanarrativas. Neste sentido, se valendo de Wallerstein e recupera as três grandes
ideologias ou projetos políticos dos últimos 200 anos - o conservadorismo; o
liberalismo; e o socialismo – destacando como importante o papel do Estado nestas
três ideologias políticas: para os socialistas, o Estado exercitava a vontade geral. Para
os conservadores, protegia os direitos tradicionais contra a vontade geral. Para os
liberais, criava as condições adequadas ao florescimento dos direitos individuais. Esta
é uma questão importante, segundo Freitas, porque nos leva a entender qual foi a
filosofia política que, de fato, foi derrotada com o desaparecimento do socialismo no
Leste Europeu. A tese central é a de que, 1989 foi a continuação de 1968, período no
qual assistiu-se o colapso do liberalismo e a derrota política para os que sustentavam
a economia internacional capitalista, e portanto, o que estaria sendo derrotado nas
portas dos anos de 1990 com o desaparecimento da União Soviética seria o
liberalismo e não o socialismo.
Diante deste quadro, os pós-modernos quando fazem a crítica aos metarrelatos,
tomam ao pé da letra a experiência russa como expressão de uma metanarrativa
socialista, quando o que vimos é que ‗o socialismo real se tornou vítima do próprio
liberalismo, ou seja, da concepção de mudança por dentro do próprio Estado, e com
isso foi descaracterizado enquanto portador de uma modernidade da libertação‘.
(Freitas, p.37, Grifos do autor). Essas observações são importantes porque nos
permitem distinguir entre a proposta ideológica em si e o projeto político implantado
de fato em nome dessa ideologia. Desta forma, ainda recorrendo à Wallerstein,
aponta as crítica vazias à obra de Marx, questiona a quem interessaria ignorar sua
obra por completo, e reafirma a importância da crítica marxiana à modernidade, a
qual, ao seu ver, permanece como uma das mais abrangentes e aprofundadas, não
sendo possível ignorar o exame crítico marxiano da modernidade, independente das
soluções de superação que venhamos a encontrar no futuro. Desta forma, a queda do
Leste Europeu e do Socialismo real tem tido um efeito nefasto, e um deles é que
clichês relacionados a este fato, tem tido mais a função de bloquear nosso
pensamento do que nos estimular a novos desafios.
No capítulo 2, intitulado de ―A crise do capitalismo real e as incertezas‖
aprofunda a compreensão das incertezas na fase mais atual do capitalismo, buscando
explicar a crise da hegemonia, recuperando a partir de Arrighi (1996), a interpretação
das relações capitalistas em torno da fórmula D-M-D‘ de Marx. A partir da análise do
que significa a ênfase na relação M-D‘, caracteriza a fase em que se encontra o
capitalismo norte-americano, uma fase de instabilidades de um final de hegemonia
que cria as condições necessárias para a fuga do capital da sua forma mercadoria para
33
sua forma monetária. Nesta predomina uma ética do consumo, em uma sociedade de
consumidores, o que antes, na relação D-M, predominava a ética do trabalho, numa
sociedade do trabalho. Os pós-modernos estariam, portanto, ―detectando uma
mudança nesse esquema geral do processo de acumulação de riquezas, por um lado,
e, por outro, nos termos de Jamerson (2002), formam a própria expressão cultural
desse ciclo de acumulação do capitalismo tardio‖. (Freitas, p.53).
No que diz respeito ás metanarrativas em disputa, Freitas aponta que as teses
pós-modernas esvaziam a importância das metanarrativas e ao fazê-lo retiram a
possibilidade de uma nova ordem e favorecem a visão liberal, quando nega a
possibilidade de um consenso em torno de um projeto coletivo e insiste na diferença
individual, desarticulando os movimentos sociais contestatórios e dificulta sua
organização e crescimento. Isso significa que os indivíduos tinham um ponto de
referência coletivo para atuarem em razão dele.
(...) era a genericidade, o gênero humano em uma relação
dialética com a particularidade frágil e temporária do indivíduo.
Com o predomínio das incertezas, o rompimento dessa relação
deixa, agora, os indivíduos à mercê de sua finitude, sem
perspectivas, restrito aos limites de seu próprio eu, restrito à
duração de sua própria vida‖. (Freitas, 2005, p.55-56).
Diante da negação das metanarrativas (socialismo, liberalismo e
conservadorismo), questiona se o pós–moderno seria ideologicamente neutro.
Recupera novamente em Wallerstein o sentido de pós-moderno, que é tido como um
―estado de presciência, um movimento que tem a sensibilidade para perceber o
esgotamento das práticas exercitadas nos últimos 200 anos em relação às
metanarrativas disponíveis, incluindo o próprio ciclo de acumulação sistêmica do
capital (...). (Freitas, p.58). A partir de análises acerca do esgotamento da hegemonia,
o autor considera que nas próximas décadas abrem-se perspectivas positivas para a
humanidade, onde o desafio seria converter esse momento de aparente fragilidade do
capitalismo histórico em algo mais que uma simples troca de hegemonia.
No capítulo 3, ―A tentativa de naturalizar as incertezas‖, Freitas alerta sobre os
riscos do neopragmatismo e do subjetivismo, e o faz caracterizando-os. Uma dessas
características é a insatisfação com os modelos de produção do conhecimento. Em
relação ao sujeito, que para os materialistas históricos compõem uma relação
dialética com o objeto, os pós-modernos adotam uma postura subjetivista, isolando o
sujeito e colocando-o no papel de um ―leitor‖ cuidadoso do mundo; não tem
preocupação coma verdade, já que não há um discurso geral, pois estes devem ser
locais e múltiplos; os conceitos são apenas enunciados que nos fazem pensar, e não a
representação da essência de um fenômeno. Disso decorre que, a verdade passa a ser
simplesmente o que se ajusta a um dado sistema de crença em vez daquilo que
descreve objetivamente um mundo existente independentemente do sujeito; que sem
nenhum padrão exógeno de verdade, é difícil entender como qualquer opinião possa
ser errada ou qualquer prática injusta; (Nanda, 1999); e que, ao combater a idéia de
totalidade, tudo em nome do antiessencialismo, o pós-moderno abala sua própria
34
capacidade de explicar historicamente fatos sociais e termina caindo no empirismo
radical dos positivistas, já que os fatos são arrancados de seu contexto vivo para
serem compreendidos apenas em isolamento (Malik, 1999). Freitas (2005) ainda se
vale de Habermas para analisar a questão, quando este último faz uma crítica a
Foucault ao concluir: (...) Foucault é íntegro o suficiente para confessar essas
inconseqüências – mas não tira delas nenhuma conseqüência. (Habermas, 2002,
pp.387-388, apud Freitas, 2005, p.64).
Em relação aos riscos do neopositivismo, o outor aborda a questão se valendo
do físico Prigogine, avaliando o que está por trás da ―teoria do caos‖, que vem sendo
apropriada inadvertidamente pelos pós-modernos para justificar suas posturas. O fato
é que nossa cultura não gosta de crises, teme o conflito e não gosta da contradição.
Frente a isto, a física dos ‗processos de não-equilíbrio‘ proposta por Prigogine, caiu
como uma luva para os pós-modernos. Esta estabelece que os períodos de equilíbrio
são seguidos de desequilíbrio, e nesse processo não se gera um caos permanente, mas
gera-se uma nova ordem. Isso significa que a desordem conduz a uma nova ordem,
através de um processo de ―auto-organização‖, que no mundo das partículas depende
de ―probabilidades‖. Freitas (2005) explicita diversas questões sobre esta teoria, mas
uma das mais importantes é a da transposição direta para os assuntos humanos das
descobertas do mundo físico, o que significa que é um equívoco desconsiderar que a
auto-organização (probabilística) em nível de matéria não pode ser automaticamente
transferida para o sujeito humano, pois assim retiramos deste a sua dimensão de
sujeito da história, ou seja não se leva em conta a diferença entre matéria bruta, as
formigas e os seres humanos pensantes.
Outros aspectos dentre os que Freitas aponta, são a questão da diferença e da
particularidade, e da razão. Busca em Malik (1999) a análise de que a diferença é
elevada a uma posição absoluta na história pelos pós-estruturalistas e pós-
modernistas, a tal ponto que passa a ter o mesmo papel ‗essencialista‘ que a
‗natureza‘ representou no positivismo do século XIX; e faz isso contraditoriamente,
no mesmo momento em que a crítica pós-moderna tenta livrar-se do essencialismo
em seu método. (apud Freitas, p.78). Sobre a razão, afirma que ―Os pós-modernos
não conseguem livrar-se da ‗razão‘ que tanto criticam e não dispensam uma boa
justificativa científica para sua causa. É como se o termo ‗teoria do caos‘ os livrasse
de uma racionalidade e ocultasse a ‗razão‘‖. E termina questionando: ―Mas o que
fazer com os algoritmos matemáticos de Prigogine que explicam a racionalidade do
caos?‖ (Freitas, 2005, p. 80).
No capítulo 4 ―A necessidade de reconstruir as esperanças‖, Freitas (2005)
inicia retomando a ética do consumo. Conforme a explicação da ênfase na fase M-D‘,
fase de financeirização, ao ler Bauman (2003), explica como esta característica afeta
um tema muito discutido pelo pós-modernismo que é o ‗indivíduo‘. Na sociedade do
trabalho, os produtores só cumprem sua função coletivamente, através da cooperação
entre os mesmos. Na sociedade do consumo, com os consumidores acontece
exatamente o contrário, pois este é uma atividade privada, individual e solitária. A
ética da sociedade de consumidores é aquela em que o que confere status a este é o
consumo e não o trabalho, onde é possível subir ou descer no conceito das pessoas a
depender do que você consome. Ainda relacionando as defesas pós-modernas com a
35
fase de financeirização do capitalismo, Freitas, analisando as colocações de Deleuze
& Guattari (2000) demonstra como a estética rizomática contribui para a manutenção
das incertezas, na medida em que esta considera que nunca se deve plantar, fincar
raiz e sim fazer rizomas; que devemos ser rápidos, e que perguntas como para onde
você vai, de onde vem e aonde quer chegar, são inúteis. Esta compreensão que aponta
para o fugaz, elimina a visão de totalidade, e contribui para a naturalização e
ocultação das reais causas das incertezas.
Analisando a atual fase do capitalismo e a suas conseqüências do ponto de
vista da flexibilização, da insegurança, da ausência de previsibilidade, da competição,
nas quais se encontram os indivíduos, tece uma crítica ao pós-moderno que não ajuda
na crítica a esta ética, e questiona até que ponto o subjetivismo não constitui uma
maneira de ocultar o real, transferir a crise do capitalismo real para o âmbito
pessoal e isentá-lo de suas responsabilidades pelas incertezas em que jogou boa
parte da população mundial?. E prossegue com a reflexão que neste contexto a
teoria do caos é utilizada para referendar esse jogo de incertezas. (Freitas, 2005,
p.92). O indivíduo isolado e fragmentado é ocultado no ―indivíduo diferente‖. Esta
concepção individualista, atrelada à noção de rizoma, vai se refletir na educação,
com as redes curriculares e de ensino, sem começo e sem fim, como se o aluno fosse
um cliente a escolher o seu produto final. Assim, fazer rizomas está na base de uma
justificativa cultural para o ensino no capitalismo tardio. Do ponto de vista da
chamada ―classe média‖, Freitas (2005) analisa que o pós-modernismo nos coloca em
uma posição mais confortável, já que não há mais metanarrativas que venham nos
incomodar assinalando nossos compromissos com as classes menos favorecidas.
Recuperando as concepções de modernidade tecnológica e modernidade de
libertação, Freitas caminha para a conclusão apontando que somente devemos
compreender o período atual como ―pós-moderno‖ se este for entendido como o
processo pelo qual iremos gerar uma nova ordem social que retome as bandeiras da
modernidade da libertação, na qual o ser humano deixa de ser uma mercadoria. Neste
sentido aponta como tarefa para as próximas décadas superar o capitalismo para
instaurarmos uma nova ordem social e nos organizar para intervir nessa construção,
já que enquanto seres humanos nos distanciamos das meras probabilidades, e
projetamos, temos intenção na nossa intervenção. (Freitas, 2005, 106).
O autor apresenta algumas possibilidades para enfrentarmos o nosso tempo e
reconstruirmos as esperanças, o que é necessário para construir uma pós-modernidade
de libertação. Neste sentido, ―será necessário recuperar valores universais de
libertação e emancipação humanas que nos unam e nos dêem horizontes e forças para
lutar por uma outra ordem social.‖ (Freitas, 2005, p.106-107).
Após realizar uma análise da conjuntura e demonstrar como está a situação
atual do modo de produção capitalista, ressalta que a grande questão do século XX é
como conciliar o indivíduo com o coletivo e vice-versa, onde o indivíduo constrói-se
na relação da particularidade com a genericidade. Outra questão é sobre as
metanarrativas,. Que possamos examinar seriamente os caminhos históricos trilhados
e projetar alternativas. Ainda, aponta como possibilidade de bifurcação (contrapondo-
se ao facismo e à dispersão cultural), a retomada do socialismo, corrigindo-se os
devidos equívocos. Sendo assim, nos chama a atenção para o dilema: socialismo ou
36
barbárie, apontando que será necessário conquistarmos a oportunidade de uma nova
tentativa socialista, e ressalta apoiado em Wallerstein que se Marx não definiu muito
bem os contornos da ordem social superadora do capitalismo, cabe a nós fazê-lo.
Diante das questões colocadas acerca das conseqüências da abordagem pós-
moderna de mundo para a ciência, para o indivíduo, para o gênero humano, para a
sociedade, é necessário reagir, resistir com estudos rigorosos cuidadosos, e
intensificar o debate em torno das questões colocadas e das teses levantadas em
contraponto às mesmas, para que possamos cada vez mais aprofundar a compreensão
acerca da pós-modernidade e combatê-la com propriedade
OS DESVIOS TEÓRICOS E O ATRASO DA TEORIA E DA POLÍTICA.
Perry Anderson, em seu livro Considerações
sobre o marxismo ocidental, apresenta, entre as
principais características do marxismo ocidental
as seguintes: a) o divórcio estrutural do
marxismo com a prática política, da teoria com a
práxis; b) o silencio premeditado do marxismo
ocidental em áreas fundamentais para as
tradições clássicas do materialismo histórico: as
leis econômicas do funcionamento do
capitalismo como um modo de produção, a
análise da máquina política do estado burguês, a
estratégia da luta de classes necessária para
derrubá-la; c) deslocamento do eixo
gravitacional do marxismo europeu no sentido
da filosofia, de estudos da superestrutura, com
sua conseqüente” academização“. Para
Anderson, ajustar as contas com esta tradição,
isto é, conhecê-la e romper com ela, é assim um
dos pré-requisitos para uma renovação da teoria
marxista hoje.” (PUCCI, Bruno. Teoria critica e
Educação. Rio de Janeiro, Vozes, 1995. P. 13).
Com base na sistematização aqui exposta sobre os giros, as viradas, o pós-
modernismo e as reações a ele, podemos nos perguntar sobre teorias educacionais e
pedagógicas que prevalecem no Brasil. Qual a nova pedagogia da hegemonia? Quais
as estratégias do capital para educar o consenso? (NEVES, 2005) Quais os giros da
teoria? Como penetram, com que argumento, na organização do trabalho do professor
na sala de aula e na escola? Como sustentam políticas educacionais de estado e de
Governos? Para exemplificar, vamos mencionar seis nomes que ganharam especial
destaque no Brasil e que compõe a hegemonia no campo teórico educacional: o
francês Edgar Morin, o suíço Philippe Perrenoud, os espanhóis César Coll e Fernando
Hernández, o português António Nóvoa e o colombiano Bernardo Toro. O que
37
defendem esses teóricos? São ―autores de sucesso‖ porque vendem muitos livros, são
citados e elegidos como suporte teórico de teses e dissertações. Seu prestígio reside,
em boa parte, nos livros publicados sobre temas pontuais e na influencia nas políticas
públicas educacionais no Brasil. Diferentemente dos grandes nomes da educação,
como Vigotsky, Jean Piaget, Paulo Freire ou Emilia Ferreiro, esses autores de
vanguarda não têm a pretensão de fazer descobertas geniais. O ―negócio‖ deles é
reprocessar idéias já largamente difundidas (e aceitas) e apresentá-las numa
linguagem fácil, objetiva e coerente com as necessidades atuais diz a imprensa que os
divulga. Coll, por exemplo, partiu das idéias de Piaget para escrever sobre currículo.
Perrenoud desenvolveu o conceito de competências – que o tornou um fenômeno
editorial – depois de estudar, entre outros, os ensinamentos de Freire. Toro ganhou
fama ao definir as sete bases sobre as quais todo estudante deve construir não só o
aprendizado, mas a vida. Morin, o mais idoso, vem há algumas décadas aprimorando
a chamada teoria da complexidade e influenciou a política educacional do Brasil com
sua teoria dos sete saberes - Morin escreve o livro Os sete saberes necessários à
educação do futuro, apresentando o que ele mesmo chama de inspirações para o
educador e que é comumente chamado de " Os 7 saberes", onde se refere aos saberes
necessários para uma boa prática educacional :1º Saber: Erro e ilusão - Não afastar o
erro do processo de aprendizagem, íntegrar o erro ao processo, para que o
conhecimento avance; 2º Saber: O conhecimento pertinente. Juntar as mais variadas
áreas de conhecimento, contra a fragmentação; 3º Saber: Ensinar a condição humana.
Não somos um algo só. Somos indivíduos mais que culturais, somos psíquicos,
físicos, míticos, biológicos, etc.; 4º Saber: Identidade terrena. Saber que a Terra é um
pequeno planeta, que precisa ser sustentado a qualquer custo. Idéia da
sustentabilidade terra-pátria. 5º Saber: Enfrentar as incertezas. Princípio da incerteza.
Ensinar que a ciência deve trabalhar com a idéia de que existe coisas incertas; 6º
Saber: Ensinar à compreensão. A comunicação humana deve ser voltada para a
compreensão. Introduzir a compreensão; compreensão entre departamentos de uma
escola, entre alunos e professores, etc.. 7º Saber: Ética do gênero humano. É a
antropo-ética. Não desejar para os outros, aquilo que não quer para você. A antropo-
ética está ancorada em três elementos: Indivíduo; Sociedade; Espécie . Edgar Morin
influenciou também nas medidas para a reforma universitária no Brasil no inicio do
Governo Lula, através de sua ONG (OUROS). O português Nóvoa, dedica-se a
formação profissional e defende a formação do professor reflexivo. O espanhol
Hernández mesclou várias teorias para difundir os benefícios de se trabalhar com
projetos didáticos. ―Eles têm enorme capacidade de síntese‖, diz Sérgio Antonio da
Silva Leite, pesquisador da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). ―E têm
também o mérito de expor suas idéias no momento de redefinição do papel da
escola‖, completa Ana Rosa Abreu, consultora do Ministério da Educação. Conhecer
esses seis autores é fundamental, diz a imprensa, para manter-se atualizado e,
sobretudo, refletir sobre os problemas de sala de aula. ―Não espere encontrar, nos
livros, soluções prontas para o dia-a-dia. Elas só surgem com uma interpretação da
leitura apoiada na experiência pessoal‖, explica Ana Rosa . A professora Luciola
Licínio de Castro Paixão Santos, doutora em Formação de Professores pela
Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), destaca outra característica comum
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aos novos pensadores: textos de fácil compreensão. ―Talvez esse seja um dos motivos
para o enorme sucesso deles no Brasil.‖ A imprensa estimula os professores a
buscarem as inovações didática. Dizem, ―Agora é a sua vez. Afinal, como você já
cansou de ouvir, as novidades tecnológicas surgem a toda hora, o mercado de
trabalho anda exigente (com os professores e com os alunos), a sociedade reavalia
seus valores dia após dia, então é imperativo aperfeiçoar a didática‖. Asseguram que
conhecendo as propostas de Morin, Coll, Hernández, Perrenoud, Nóvoa e Toro o
professor estaria mais preparado para superar o desafio das inovações didáticas. Nada
de critica, nada de localização dessa tendência teórica com o avanço do neo-
tecnicsmo. Por isso, é vital, é imprescindível, ajustar as contas com tal tradição, que
perde a referencia teleológica, histórica, não se sustenta com consistência e aderência
a prática concreta nas escolas brasileiras e se apresenta acritica e a-histórica.
NEVES (2005) organizou o resultado de três anos de pesquisa do Coletivo de
Estudos de Política Educacional da Universidade federal Fluminense (UFF) e
demonstrou como o Estado brasileiro vem difundindo, na sociedade brasileira, novos
ideais, idéias e práticas voltadas para a construção de uma nova pedagogia da
hegemonia: uma educação para o consenso dos sentidos de democracia, cidadania,
ética e participação adequados aos interesses privados do capital. Demonstra como a
nova pedagogia atua no sentido de restringir o nível de consciência política coletiva
dos organismos da classe trabalhadora que ainda atuam no nível ético-politico para o
nível econômico corporativo. A Nova hegemonia estimula a pequena política em
detrimento da grande política proporcionando a grande política da
conservação.Apresenta elementos sobre o Estado educador que através de novas
estratégias nas relações Estado e sociedade civil consolida e aprofunda, no espaço
brasileiro, o projeto neoliberal de sociabilidade, o projeto da burguesia mundial para
a atualidade – a Terceira Via, com uma nova interpretação do mundo, uma nova
ideologia, sintonizando o ―novo estado democrático‖ com os organismos da
sociedade civil, ou seja a articulação entre a esfera estatal e a esfera privada,
incorporando e superando a concepção de individualismo do pensamento
(neo)liberal. Esta concepção, segundo Lima e Martins, (2005, p. 42-67) tem como
objetivo prático: a) construir consciência política que não permita ao individuo
compreender seu real papel sócio-político a partir de sua posição nas relações de
produção; b) induzir a percepção de que seu valores são decorrentes de sua
capacidade de se autogovernar e que metas e objetivos são independentes das
condições concretas; c) estimular possibilidades de associações para participação em
processo isolados sem que isto signifique incentivar a consciência política de
pertencer a uma dada classe social que não detém meios de produção e que é super
explorada. Segundo Melo (2005, p. 69-82) isto constitui tática de uma frente de
defesa dos interesses sociais do capitalismo mundial representada nos organismos
internacionais de condução de um novo bloco histórico. Essas mudanças se
materialisam na inserção da ciência e tecnologia na produção social, na reprodução
ampliada do capital e do trabalho, bem como no delineamento das transformações nas
relações de poder do Estado. Harmonia social e realização intensa de estratégias de
conformação social são importantes nesta governança mundial do capital. Para isso é
preciso educar/deseducar a classe trabalhadora. Não é portanto pouca coisa nos
39
perguntarmos como é tratado no interior da escola a teoria do conhecimento que
contribua não para a acomodação e harmonia no capitalismo, mas, sim, para
revolucionar o modo de produção e reprodução da vida na perspectiva teleológica da
superação do capital rumo ao projeto histórico socialista?
Provavelmente, poderemos constatar, analisando a produção do conhecimento na
área da educação e da educação física, bem como, as referências teóricas na política
pública, o atraso da teoria, os desvios teóricos os ―giros prevalecendo‖, ou seja,
quando nos perguntamos, na educação e na educação física, sobre a epistemologia e a
teoria do conhecimento constatamos o atraso e os desvios, ou seja, a predominância
de teorias contra-revolucionárias e reformistas.
Não são hegemônicas na atualidade, proposições superadoras. Esse ciclo
encerrou-se na década de 80 inicio dos anos 90. Provavelmente esse atraso e os
desvios decorrem da prevalência no Brasil e na América Latina, de teorias
reacionárias, anti-revolucionárias, que mantêm a internalização da alienação humana
(Mészáros 2005). Levanto a hipótese de que estas teorias podem ser reconhecidas
como reacionárias e anti-revolucionárias, também, pelos seguinte:
• a) separam a teoria da prática política, as premissas teóricas das premissas
programáticas – Trotsky (1995); Lessa (2007); Coggiola (1995); Saviani e
Lombardi (2005).
• b) se valem da praxis utilitária em detrimento da práxis revolucionária - Kosik
(1976); Kopnin (1972) Cheptulin (1982);
• c) deslocam o eixo gravitacional da filosofia materialista dialética para ―giros‖
idealistas, que subsidiam estudos da superestrutura, com a conseqüente
―academização‖ e a fixação de intelectuais institucionais em retirada, que
enfatizam abordagens individualistas e idealistas – Anderson (2004), Petras
(2002); Duarte (2001; 2003; 2004)
• d) adesão acrítica ao projeto de mundialização da educação subsidiado pelo
liberalismo, por teorias pós-modernas e financiado pelas agencias multilaterais
de investimento – Petras (2002, 1996a, 1996b); Tommasi, ; Warde; Haddad
(1996); Leher (Melo (2004); Lombardi & Sanfelice (2007)
• e) total ou parcial abandono do materialismo dialético e histórico como lógica
e teoria do conhecimento para orientar o currículo e o não enfrentamento dos
limites apontados pela critica – Frigotto (1996, 1998ª, 1998b); Kuenzer (1996)
– Duarte (2003)
• f) silêncio da teoria sobre: - as leis econômicas do funcionamento do
capitalismo como um modo de produção da vida – Marx (1983) e Engels
(1990) em franca decomposição, degeneração, destruição; - da máquina
política do estado burguês - Lênin (2007; 2007) e; - da estratégia da luta de
classes necessária para derrubá-la (Trotsky, 1995);
• g) a dissociação entre história e teleologia (Lombardi & Saviani ;2005),
Segundo Emir Sader (2004, p. 12) é necessário conhecer como o marxismo
ocidental chega ao Brasil, em que contexto ele se desenvolve e o que representou o
confronto e os embates com as influências e adesões ao liberalismo e ao
neoliberalismo da ―nova esquerda‖, especialmente no Partido dos Trabalhadores, mas
40
não só. No interior de todos os âmbitos da vida, da academia aos movimentos
sindicais, estudantil, populares, favoreceu-se um desprezo pela elaboração teórica o
que acabou refletindo na prática e nas novas temáticas, cada vez mais diluídas,
dispersas e sem assegurar a totalidade, o conjunto e a radicalidade nas elaborações,
logo, não são propositivas na linha da superação dos limites teóricos e, muito menos,
do projeto histórico.
Com base no presente instrumental, podemos agora nos debruçar na produção
cientifica que circula no campo da educação e da educação física, seja em anais de
eventos, nos periódicos, nas dissertações e teses, quanto nas pesquisas independentes,
nos ensaios, nas produções monográficas nos relatos de experiência. Podemos nos
debruçar nas referencias teóricas que sustentam as políticas públicas de educação e
educação física no Brasil e veremos que são evidentes, o recuo da teoria, as
imposturas intelectuais, a capitulação intelectual, enfim a retirada da intelectualidade
da frente de batalha pela revolução socialista.
O que fazer, quais seriam os desafios a enfrentar para sintonizar uma busca
constante da perspectiva teleológica de construção do comunismo enquanto modo de
organizar a produção e reprodução da vida e a perspectiva epistemológica marxista
na produção do conhecimento cientifico da educação e da educação física.
Ivo Tonet (2007) em seu livro ―A educação contra o capital‖ ressalta que temos
que combater a atual forma de sociabilidade no marco do capital, e que toda a
atividade educativa deve ter em seu horizonte norteador a emancipação humana que
consiste em homem livres, senhores de seu destino, sujeitos da história em outra
forma de sociabilidade com base no trabalho associado, onde produtores associados
de forma livre, consciente e coletiva controlam o processo de produção e distribuição
da riqueza., forma ampla e profunda onde os homens terão a regência – na forma
mais ampla e profunda humanamente possível – o processo histórico. Formar,
portanto, pessoas comprometidas com a transformação radical da sociedade.
Contraditoriamente, vivemos em um tempo histórico de enormes desafios,
principalmente na América Latina. Enormes desafios locais, regionais, nacionais e
internacionais no campo educacional, nas relações de trabalho, frente aos avanços do
imperialismo, fase superior do capitalismo, com suas conseqüências parasitárias
nefastas, destrutivas e nos cabe estabelecer referências de rupturas, de quebra de
ilusões e de combate ao fetichismo. Ruptura com paradigmas teóricos que iludem
mais do que apóiam a elaboração de conhecimentos científicos (Duarte, 2003),
quebra de ilusões nas idéias de igualdade, fraternidade e democracia burguêsa
(Chomsky, 1999), do fetichismo do Estado-de-Bem-Estar-Social, que em tempos de
ditadura do capital em sua fase superior, o imperialismo (Lênin, 2007), tem servido
muito mais para transferir obrigações a sociedade civil do que garantir direitos
constitucionais. Combate ao fetichismo da técnica e da tecnologia (Lessa, 2007) que,
por si só, em uma sociedade de classes, não resolve os problemas de fundo a respeito
da subsunção do trabalho ao capital, das guerras imperialistas (Coggiola, 1996,
Petras, 2002)) e da garantia do direito à educação e ao esporte socialmente
referenciados para todos. A estes se agregam o combate ao individualismo (Duarte,
2004), ao primado do mérito pessoal, ao competitivismo, ao produtivismo, ao
pragmatismo do pós-modernismo e do subjetivismo, para reconstruir esperanças
41
(Freitas, 2005). Estas rupturas necessárias não se darão sem enfrentamentos, sem
disputas, sem embates, porque a educação e a educação física, pelo impacto do
neoliberalismo (Boron, 2004) é alvo dos interesses de acordos comerciais
internacionais que entram na escola sim e fazem dela mais um fator de rendimento ao
capital. Referências políticas se fazem necessárias para trabalhar na educação e na
educação física, enfim, um projeto histórico socialista que enfrente as táticas
ultrapassadas e esgarçadas do pacto social liberal, dos consensos de classe, estratégia
do capital para manter a hegemonia (Neves, 2005). Nesse sentido reafirmamos o
marxismo e o socialismo revolucionário (Engels, s/d) porque não perderam qualquer
atualidade, apesar da necessidade histórica de compreendermos o conteúdo da luta
entre as classes sociais nesse início de milênio, para distinguirmos as ditas esquerdas
que continuam a se afastar, cada vez mais, da teoria que deveria alimentar as suas
práticas, do que realmente são medidas de esquerda (Petras, 2008). Reafirmamos a
teoria marxista, a pedagogia socialista, ou seja, a teoria pedagógica critica da prática
da escola capitalista, que surge dentro dos limites das correlações de força existentes
numa determinada formação social, a partir das próprias categorias que representam o
movimento real dessa prática, incluídas suas contradições e formas de superação.
CONCLUSÃO PROVISÓRIA - O DESAFIO DA RAZÃO: MANIFESTO PARA A
RENOVAÇÃO TEÓRICA DA EDUCAÇÃO E EDUCAÇÃO FISICA BASEADO
NO MARXISMO.
“...A terceira fase, potencialmente a mais mortal, do
imperialismo hegemônico global, que corresponde à
profunda crise estrutural do sistema do capital no plano
militar e político, não nos deixa espaço para tranquilidade
ou certeza. Pelo contrário, lança uma nuvem escura sobre
o futuro, caso os desafios históricos postos diante do
movimento socialista não sejam enfrentados com sucesso
enquanto ainda há tempo. Por isso, o século à nossa
frente será o século do “socialismo ou barbárie”. (
MÉSZÁROS, István. O século XXI: socialismo ou
barbárie?. São Paulo, Boitempo, 2003, p. 13)
Provavelmente, poderemos constatar na área da educação e educação física,
assim como em outras áreas das ciências sociais e humanas, que continua
hegemônica a interpretação do mundo, a luz de um relativismo absoluta, do niilismo,
diluindo-se e despoltizando-se a força ideológica, política e produtiva do
conhecimento científico, em beneficio da classe capitalista. Reafirmamos, continua
sendo necessário reverter a sentença constatativa de Mrax nas Teses Contra
Feuerbach, "Até agora, os filósofos não fizeram mais do que interpretar o mundo;
trata-se de mudá-lo‖. Provavelmente, a maioria dos intelectuais não querem mais
42
mudar o mundo. Os que queriam mudar o mundo o fizeram com base na referencia
marxista e queriam mudar o mundo junto com os movimentos operários e socialistas;
movimentos que se transformariam, em grande medida devido à influência do
marxismo, em forças políticas de massas.
Provavelmente, no Brasil, somos capazes, também, de verificar pelos fatos
como os intelectuais deixaram de ser revolucionários sociais e, nunca foram ou
deixaram de ser marxistas. Essa reação tem, provavelmente, na área de educação e
educação física o aniquilamento da idéia de que é possível predizer, apoiados na
análise histórica, o sucesso de uma forma particular de organizar a sociedade
humana. Compromete-se assim a teleologia, o vir-a-ser. Também na educação e na
educação física prevalecem, apoiadas por teorias que se colocam na perspectiva pós-
moderna a dissociação entre educação e educação física e a teleologia.
Diante de todos esses desvios, nos alerta Hobsbawm (2008) que ―É tempo de
restabelecer a coalizão daqueles que desejam ver na história uma pesquisa racional
sobre o curso das transformações humanas, contra aqueles que a deformam
sistematicamente com fins políticos e simultaneamente, de modo mais geral, contra
os relativistas e os pós-modernos que se recusam a admitir que a história oferece essa
possibilidade‖. Está em curso a transição do capitalismo ao socialismo (TROTSKY.
Programa de Transição, São Paulo S/D) o que deverá influenciar a virada teórica, não
para ―pós‖, ou ―neo‖, mas, sim, para os clássicos, da qual o marxismo constituiu um
elemento importante, apesar de que isso nem sempre foi totalmente reconhecido.
Marx influenciou a história principalmente através dos historiadores e dos
pesquisadores em ciências sociais que retomaram as questões que ele colocava,
tenham eles trazido, ou não, outras respostas. Portanto, o ponto de vista marxista é
um elemento necessário para a reconstrução da frente da razão, como foi nas décadas
de 1950 e 1960.
Neste momento em que o imperialismo – fase superior do capitalismo (LENIN,
2007) – assume seu teor mais dramático, é inaceitável, por exemplo, que a academia
continue a negar as categorias e leis da dialética materialista histórica, continue a se
valer de concepções teóricas idealistas e do relativismo epistêmico, que
desestimulam, enfraquecem e desmobilizam a força e a unidade da luta de classes,
atrasando a revolução proletária que deverá ―livrar a humanidade de um sistema de
produção condenado‖ (SOKOL, 2007, p. 186). A passagem do imperialismo à
revolução socialista continua encontrando como obstáculo os que defendem a
―transformação social‖ somente nas palavras, afastando de fato a possibilidade de
conquista do poder político por parte dos trabalhadores e do avanço no enfrentamento
das contradições, visíveis nos espaços e tempos onde as contingências podem indicar
possibilidades qualitativamente superiores, como, por exemplo no trabalho
pedagógico de produção do conhecimento cientifico. Mais do que ontem, faz-se hoje
premente a necessidade de combater o simplismo, as imposturas intelectuais – o ―uso
abusivo dos conceitos da ciência pelos filósofos pós-modernos‖ (SOKAL e
BRICMONT, 1999) –, o desenraizamento do conhecimento de suas bases
ontológicas; combater o idealismo progressista da neutralidade científica, da
convivência pacífica entre antagônicos, do pluralismo em uma sociedade onde
43
existem e são ocultadas as classes antagônicas, da eternidade do capitalismo, da
naturalidade dos fenômenos sociais, da falência do socialismo, do fim do proletariado
(LESSA, 2007), do fim da luta de classes, da perda de referências históricas
(MÉSZÁROS, 2003), conforme sustentam as teses do fim da história (ANDERSON,
1992) e as teses da pós-modernidade (ANDERSON, 1999). Teses estas que se
expressam de maneira hegemônica nas explicações sobre a educação. Neste sentido
recolocamos conceitos históricos sem os quais não é possível refletir com
radicalidade, no conjunto e na totalidade (SAVIANI, 1985) a problemática da
Educação para além do capital.
Por fim, o conhecimento especial, denominado ―científico‖, dentro do qual
reconhecemos as teorias pedagógicas, surge da atividade prática humana – o trabalho
– e se desenvolve baseado nela. O motor principal desse desenvolvimento é
constituído pelas necessidades materiais de produção; portanto, pode-se afirmar que o
desenvolvimento da ciência subordina-se ao Projeto Histórico e às relações
econômicas predominantes por ele estabelecidas. É dessas relações que depende o
ritmo do desenvolvimento científico e o aproveitamento das conquistas científicas
inclusive nos campos da educação e da educação física. É preciso, portanto, avançar,
superar dicotomias entre as quais a dicotomia entre ciências humanas e sociais como
nos explica Mészáros em sua sitese sobre a concepção de ciência em Marx, assim,
[...] o homem, enquanto parte específica da natureza (um
ser com necessidades físicas historicamente anteriores a
todas as outras), precisa produzir para se manter. Para
tanto, ele cria, necessariamente, neste processo, uma
complexa hierarquia de necessidades ‗não- físicas‘, que se
tornam igualmente necessárias à satisfação de suas
necessidades físicas originais. (MÉSZÁROS, 2006,p.79).
Essas explicações nos permitem superar a falsa dicotomia entre ciências
humanas e ciências naturais, bem como, nos apropriarmos da defesa de Marx de uma
ciência humana, uma ciência de síntese concreta integrada com a vida real. O ponto
de vista dela é o ideal do homem não-alienado, cujas necessidades ‗reais humanas‘–
em oposição às necessidades ‗inventadas especulativamente‘ como às necessidades
‗abstratamente materiais‘, praticamente desumanizadas – determinam a linha de
pesquisa em cada campo particular. As realizações dos campos particulares –guiadas
desde o início pela estrutura referencial comum de uma ‗ciência humana‘ não-
fragmentada – são, então, reunidas numa síntese superior, que por sua vez determina
as linhas subseqüentes de investigações nos vários campos. (Ibdem, p.98).
Mas não vamos avançar com uma educação rebaixada, com atraso teórico e se
continuarmos a destruir o pensamento e a atitude critica na escola. A destruição do
pensamento crítico é um fruto dessa educação alienada. O pensamento crítico
constitui uma prova das ações, resoluções, criações e idéias à luz de determinadas
teorias, leis, regras, princípios ou normas e, também, da sua correspondência com a
realidade. Shardakov (1968), assinala cinco condições para que se desenvolva essa
mentalidade crítica: Possuir os conhecimentos necessários na esfera em que a
44
atividade mental crítica deverá ser desenvolvida. Não se pode analisar criticamente
aquilo sobre o qual não se possuem dados suficientes; Estar acostumado a comprovar
qualquer resolução, ação ou juízo emitido antes de considerá-los acertados;
Relacionar com a realidade as regras, leis, normas ou teorias correspondentes, o
processo e o resultado da solução, a ação ou juízo emitido; Possuir o suficiente nível
de desenvolvimento no que diz respeito à construção dos raciocínios lógicos; Ter
suficientemente desenvolvida a personalidade: as opiniões, as convicções, os ideais e
a independência na forma de atuar.
Constatamos, por fim, que em oposição às teorias pedagógicas idealistas,
reacionárias e anti-revolucionárias que sustentam como pilares para a educação o
―aprender a aprender‖, ―aprender a ser‖, "aprender a fazer‖, ―aprender a conviver‖,
etc., levantam-se sólidas proposições pedagógicas nas lutas dos movimentos, com
destaque para o movimento campesino, que enfrentam os pilares mais gerais do
capital a propriedade privada dos meios de produção, a superexploração do trabalho
assalariado. Portanto, podemos concluir que uma consistente base teórica materialista
dialética histórica, a consciência de classe, a formação política e a organização
revolucionária são elementos centrais para a escolarização de uma nação que se quer
soberana, digna e com seu povo feliz. Isto passa necessariamente pelo domínio dos
meios e do produto do processo de produção do conhecimento científico.Daí a
necessidade vital da escola pública laica, de qualidade socialmente referenciada em
todos os graus e níveis de ensino. Da educação infantil a pós-graduação.
Destacamos, portanto, para os estudos e debates os conceitos básicos para
compreendermos e propormos o materialismo histórico dialético enquanto
possibilidade epistemológica, o marxismo como filosofia e o comunismo como
projeto histórico, enquanto base e fundamentação de propostas educacionais e de
proposição pedagógica. Segundo Kopnin (1978), na ciência, enquanto sistema de
conhecimento, a relação entre os conceitos se estabelece com base nos princípios
aprovados pela prática, conceitos basilares e axiomas que expressam a idéia de uma
dada ciência. A ciência é a unidade orgânica do conhecimento, unidade que surgiu
por efeito de lei. Seu princípio unificador é o método, que absorveu toda a história
antecedente do conhecimento do objeto. O ideal contido no conhecimento, nos indica
Kopnin (1978), é uma forma especial de atividade do sujeito. E se sob a linguagem da
teoria científica não conseguimos descobrir esse conteúdo, então a nossa análise não
atingiu sua meta. Vale destacar, para enfrentar o idealismo teórico, que a chamada
interpretação epistemológica, com o concurso do dispositivo categorial, inclui a
linguagem da teoria científica no processo geral de movimento do conhecimento, no
desenvolvimento intelectual da humanidade. Enquanto linguagem, nenhuma teoria
pode ser exposta ou entendida como sistema de conhecimento humano se ao
interpretá-la for aplicado apenas seu próprio dispositivo categorial. Por isto,
concomitantemente com a linguagem de uma dada teoria e o dispositivo lógico
formal da análise, as categorias filosóficas constituem, indiscutivelmente, um acervo
indispensável de meios de interpretação da linguagem da teoria científica, situada na
crítica a práxis da humanidade, ou seja, do real concreto apreendido pelo pensamento
– o concreto pensado. Ao fragmentar a filosofia, a lógica, a ciência e a teoria do
conhecimento, para formular explicações, os idealistas negam com isto a
45
coincidência entre dialética, lógica e teoria do conhecimento, negam o movimento do
pensamento como reflexo subjetivo e objetivo do real, negam a natureza social da
filosofia, da lógica da ciência, negam com isto os fundamentos lógico-gnosiológicos
da realização prática do conhecimento (KOPNIN, 1978). Separam com isto as
premissas teóricas das programáticas e tornam-se obstáculos à revolução das relações
entre trabalho-capital, trabalho-educação. Vale destacar que esta subsunção e sua
manutenção, pela alienação (MÉSZÁROS, 2005, 2006), aprende-se na escola,
inclusive nas aulas na pós-graduação. Enfrentar a alienação com o estudo sistemático
e rigoroso na base do materialismo histórico dialético justifica, portanto, a própria
pós-graduação e seus grupos de pesquisa.
Enfim, com base no real, nos fatos, nos argumentos reafirmamos nossas
hipóteses:
a) prevalecem, hegemonicamente no Brasil, teorias reformistas, anti-
revolucionarias, tanto na produção do conhecimento quanto nos subsídios de
política pública nas áreas de educação, educação física e esporte o que pode ser
constatado nos aportes teóricos mencionados nos textos, relatórios, projetos,
programas e demais documentos, onde são silenciados os aspectos referentes
as leis gerais que regem o modo do capital organizar a vida; do Estado burguês
e da necessidade histórica de derrubá-lo, dos hábitos de vida burguesa em
família e a necessidade de destruí-los e, a estratégia e tática na luta de classes
para superação do capitalismo rumo ao comunismo.
b) é necessário avançar, reagir, resistir, por rupturas e saltos qualitativos, para
novas sínteses em patamares teórico-práticos mais elevados, superando os
desvios teóricos, rompendo ilusões, lutando contra o fitichismo, o
irracionalismo e o idealismo, e isto passa sim pelo domínio da lógica e teoria
do conhecimento materialista histórica dialética, passa pelo marxismo;
c) existem reações, sim, na luta concreta, que buscam construir e erguer outros
pilares para a produção do conhecimento científico e para a escolarização, e
esses pilares já podem ser reconhecidos e são: o combate ao irracionalismo, ao
pós-modernismo, aos ―giros‖ e ―viradas‖ idealistas, buscando consolidar uma
consistente base teórica marxista, avançar na consciência de classe, na
formação política e na organização revolucionária, como contra-ponto aos
pilares da educação defendidos pela UNESCO para o mundo.
d) ventos de esquerda ainda sopram na América Latina, contraditoriamente, e o
marxismo, enquanto filosofia, o materialismo histórico dialético enquanto
epistemologia e, o socialismo enquanto projeto histórico, estão recolocados,
mais fortes do que nunca, pela sua aderência ao real, como referencia para
tratarmos da produção do conhecimento científico e das políticas públicas na
perspectiva do projeto histórico para além do capital
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