Post on 18-Nov-2018
Vicente Navarro1 disse que paraexistir uma política de saúde nacionalcompleta e funcional, as intervençõesde saúde pública que surgirem dessearranjo deveriam ter três eixos:intervenções estruturais que lidamcom determinantes políticos,econômicos, sociais e culturais daboa saúde; deveriam contemplardeterminantes de estilo de vida quefocam nas mudanças decomportamento de indivíduos; edeveriam incluir determinantes desocialização e empoderamento queencorajam indivíduos a se tornaremenvolvidos nos esforços coletivospara melhorar os determinantesestruturais de suas saúdes. Porempoderamento em saúde querodizer: enxergar a necessidade deconstruir condições reais paraautogestão, atacar as raízes dadesigualdade ao invés de somenteminimizar seus efeitos, lidar com as
1 Vicente Navarro é médico, sociólogo eteórico político espanhol. Crítico doneoliberalismo, neokeynesiano, foiconselheiro de diversos governos e daOrganização Mundial de Saúde, eescreve para o portal rebelion.org.
forças de mercado e normas decompetição que invadiram cadafaceta da vida social, e perceber queessas condições são sistematicamenteperpetuadas através de instituiçõesque criamos mas que não sãointrínsecas aos papéis sociais queessas instituições precisam cumprir(isso será explicado mais a frente). Selevarmos a importância doempoderamento à sua extensão lógicamais completa, em termos decuidados em saúde e políticas desaúde pública, então poderemos levara sério, de forma pragmática eracional, perspectivas mais utópicasde como as instituições de saúde (e asinstituições por toda a sociedade)podem ser restruturadas.
Uma teoria social radical éaquela que, como sugere o nome,busca chegar às raízes de váriosproblemas sociais com a intenção deerradicar suas causas fundamentais,ao invés de simplesmente administrarseus efeitos (por exemplo, atacar ocapitalismo ao invés de meramentesuas externalidades negativas). Nesse
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Fragmentos de uma saúde pública anarquista
caso, fica claro a necessidade debuscar uma prática de saúde públicasegura empregando o princípio daprecaução – um princípio moral epolítico que afirma que se uma açãoou política pode causar dano severoou irreversível ao público ou ao meioambiente, quando não houver umconsenso científico provando ocontrário, o ônus da prova recairiasobre quem defende que se tome talação – ao invés de aceitar asexternalidades negativas dosprocessos capitalistas industriais e amera gestão – no melhor dos casos –da precária saúde resultante dapopulação). É comum que, já quemuitas críticas dissonantes pedem pormudanças fundamentais nas formasbásicas com que fazemos muitascoisas, as ideias trazidas à tona sejam
frequentemente aquelas de umarevolução sensacionalizada: imagensromantizadas de um confronto final,de um reajuste social com um atritoextremo e embates sectários nas ruas(todos elementos característicospresentes, como Graeber lembrou,tanto nas interpretações equivocadasclássicas sobre democracia ativa,quanto nas interpretaçõesequivocadas atuais sobre oanarquismo ativo – essencialmente ocaos, nas duas formas). Já que muitoda teoria radical historicamente falade grandiosas e teatrais revoluções,empiricamente, no entanto, taisinterpretações equivocadas tornarama busca pela mudança ainda maisdifícil. Daí, quando a teoria radical étrazida para o debate, a quantidade debagagem que se deve tirar e ter de
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lidar é geralmente extenuante – aromantização da mudança social(qualquer uma) como rupturascataclísmicas; as incompatibilidadesde muitas teorias esquerdistas; apredominância da imagemrevolucionária estilizada; a falta devisão para além do confronto social –tudo isso leva muitas daquelaspessoas que de outra forma apoiariammudanças alcançáveis a acreditar quenão existem alternativas sociaisrealistas e práticas.
Felizmente, aprendendo com ahistória, muitas das ondas que sereconstituíram hoje no pensamentorevolucionário e esquerdista radicaltêm uma postura bastante crítica aosmovimentos esquerdistas do passado– consequentemente desenterrandoinformações e discussões muito maisfrutíferas sobre a natureza daconstrução de uma sociedadesaudável fundada na participação.
Unificando Teorias Sociais Radicais
As teorias radicais que lidamcom mudanças sociais têm sidoproblemáticas. Elas emergem degrupos que enfrentam certassituações opressivas que são tãodesfavoráveis a ponto de seremconsideradas não só importantes de
se falar a respeito delas, mas tambémde colocálas em questão e de seformular uma compreensão crítica arespeito. Não é de se espantar que, jáque surgem de experiênciasespecíficas e que todas elaspretendem explicar o mundo, aestreiteza das experiências do círculoonde cresceram se torna seucalcanhar de Aquiles à medida que asteorias são moldadas e evangelizadas.Isso não significa, no entanto, quenão sejam profundamente úteis, quedevam ser descartadas, ou até mesmoque estejam completamente erradas.E definitivamente não significa queMargaret Thatcher tinha razãoquando disse que "Não háalternativa". Apenas quer dizer queuma reconciliação atenciosa entreessas pessoas é necessária, e que ter aflexibilidade e abertura para levar emconta aquilo que faz uma boa teoria éuma ótima forma de juntar essespedaços.
Uma teoria é uma ferramentaque explica, prevê e/ou guiasituações. Quanto mais ela conseguirfazer isso de forma ampla, mais útilserá. Infelizmente, teorias sociaisradicais estiveram historicamenteconfinadas demais a experiênciasestritas. Em outras palavras, elaspodem servir para explicar, prever eguiar ações que acontecem dentrodesses enquadramentos sociaisespecíficos, mas falham em
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conceitualizar com precisão a açãohumana num sentido mais amplo. Sevocê observar como marxistas (parausar um exemplo) focam em classe eeconomia, há uma tendência emenquadrar as experiências comodecorrentes desse entendimento.Apesar de ser bem provável quesejam conscientes da opressão degênero e racial (por exemplo), nocentro de tudo, marxistas concordamque a economia e a luta de classesestão na base – e estãoacomodadas/replicadas em seuinterior – de todos os outros malessociais. Nesse sentido, marxistasprofessam que as lutas de classe sãotão poderosas que permeiam todas asoutras facetas da vida e daexperiência, e se for possível mudar aestrutura econômica, as relações deraça e gênero seriam, por fim,alteradas também. Uma feministapoderia dizer a mesma coisa, apenastrocando o classismo por noções desexismo: desapareça com o sexismo ea hierarquia de gênero nos círculos deconvivência da vida social (que lidamcom a socialização, educação, etc.) esubsequentemente isso irá dissolver odebilitante patriarcado que permeiaas esferas econômicas e políticas, etodos os males que dele emanam.Não é preciso dizer, os problemasnesse contexto são fáceis de seremvistos. O grau de utilidade de cadauma dessas teorias depende da
relevância dos conceitos com osquais são construídas. Conceitos –sendo meras fatias da realidadetomadas para chamar atençãointencionalmente – nascem deexperiências. Bons conceitos serãorelevantes para prioridades,preocupações e objetivos específicos;no entanto, quanto mais estreita for aexperiência da qual eles surgem,menos primordiais e aceitáveis elesserão para um conjunto mais diversode pessoas e situações. Isso tem sidouma incrível fonte de tensão naorganização esquerdista ao longo desua história.
A visão de uma sociedadeparticipativa e saudável teria de virde um entendimento robusto,unificador e diverso, que de algumaforma aglutinasse outras teoriassociais radicais e valorizasseimpecavelmente tudo em termos dapromoção de uma sociedadecompletamente participativa. Sendoassim, a teoria radical que emerge detal integração lida de formaconvincente com aquilo que é útilpara a democracia/participação(princípios anarquistas básicos numsentido socialistalibertário) e, ao darforma a esse processo, surgiria umentendimento empírico do que éantidemocrático. Como resultado,lidar com o que é e o que não é útilpara uma democracia serve pararessaltar o que é um agrupamento
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democrático, assim como para extrairconceitos relevantes que indiquem osaspectos básicos de uma sociedadedemocrática. Pela natureza daquiloque precisa ser proporcionado – umasociedade realmente participativa –, ateoria radical que ajudaria a construiressa visão seria uma perspectivamultitema, multifoco, multitática,revolucionária e orientada aocrescimento. O que decorre desseponto de partida é fundamentalmenteuma abordagem baseada em valores,voltada à construção de instituiçõescujo cerne é a participação.
É compreensível que remodelara sociedade dessa forma sejadesencorajador– apenas tentandodemarcar um agrupamento grande obastante em que se compartilhe osmesmo valores –, mas essa teoria nãoé dogmática. Todos os valores nãoprecisam estar intrincados, masexistem alguns poucos valoresabrangente que são endêmicos parauma sociedade democráticafuncional, e esses valores não devemser controversos se a democracia é ajoia que buscamos. Entre essesvalores fundamentais estão asolidariedade, diversidade,autogestão, liberdade, justiça,participação e tolerância.
1. As relações em uma sociedadedemocrática devem se basear nasolidariedade e na cooperação, já que
– deixando de lado todo o resto – acooperação seria preferível ao invésdas relações pessoais antissociaisinfectadas por valores abstratos demercado e baseadas na competição.
2. Valorizamos a diversidade nasescolhas e nos recursos, assim comonas ideias.
3. Valorizamos a autogestão na qualas pessoas devem ter voz nasdecisões na mesma medida em quesejam afetadas por elas.
4. Valorizamos a justiça em termosde um tratamento íntegro e igual.
5. Valorizamos a participação emque as pessoas se envolvam naconstrução das decisões semdistorções ou coerção (vejaautogestão), mas de jeitos queacomodem os diferentes níveis dedisposição política das pessoas.
6. Valorizamos a tolerância nosentido que aceitamos que existemoutras formas de fazer as coisas e asacomodamos quando possível.
Esses são princípiosfundamentais que recebem aceitaçãogeral uma vez que a maioria daspessoas concorda que têlos em umasociedade é preferível do que não oster. Mais do que preferência, noentanto, esses não são valores quemeramente soam bem, mas ao invésdisso, eles servem propósitos sociaisfuncionais e necessários. Em uma
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sociedade efetivamente democrática,onde as pessoas não teriamcomandantes, a lógica implica queteriam de existir certos mecanismosque constituem a situaçãodemocrática para que ela funcionecomo uma sociedade. Isto é, existemprincípios endêmicos a uma formapropriamente democrática deexistência que deverão estarcolocados (ou seja, infundidos emtodas as esferas da vida: economia,vínculos, governança, comunidade,etc.) para que tal situação continueenquanto organização social.
Então, a que tipo de teoriaradical robusta poderia se reduzirtodas essas coisas? Primeiro, aocontrário das teorias que tomam otrabalho, as mulheres ou a identidadeétnica como centro, esta teoria põe apessoa no centro de uma formaampla. Ao recusar considerar aspessoas apenas como funções dostatus de classe econômica ou de seusexo biológico, a teoria sepersonaliza muito maisdinamicamente ao levar em contaesses fatores e ainda assim abrirespaço para necessidades pessoais,aspirações, capacidades,conhecimento, energia, etc., todascomo fatias importantes da realidade.Em seguida, na teoria, à volta dapessoa estão várias esferas sociais.Isso inclui economia, vínculos,comunidade e governança, mas
poderia perfeitamente incluir outrastambém. Essas esferas específicaspreenchem funções sociais comovárias outras, mas receberamdistinção e foram incluídas aqui pornecessidade devido ao fato deexistirem de uma forma ou outra emtodas as sociedades, e suas funçõesserem específicas a instituições, poisnão podem ser realizadas meramentede pessoa a pessoa.
Isso fica mais óbvio se vocêconsiderar as funções básicas dessasinstituições. A economia lida com aprodução, o consumo e a alocação decoisas; os vínculos dizem respeito aosaspectos de cuidado, de socialização,de reprodução, etc., da vida; agovernança lida com leis, execução ejulgamento; e a comunidade lida coma identidade cultural. Sendo assim,reduzidas a suas funções básicas,podemos começar a conceberlhesimagens redesenhadas de forma queainda completem suas funçõesbásicas mas que o façam seguindo aslinhas dos valores sociaisparticipativos. Essa abordagem édefinitivamente importante não sópara entender o mundo, mas paramudálo de forma a melhorar o queestá em piores condições e tornar asituação como um todoqualitativamente melhor para todas aspessoas envolvidas. Esses são osalvos em termos de mudança social.
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Tendo esse entendimento, oobjetivo agora é conceber umaeconomia que lide com produção,consumo e alocação; vínculos quedizem respeito ao cuidado,sociabilização, reprodução, etc;governança que lide com leis,execução e julgamento; ecomunidade que lide com identidadecultural de modo que assegurem osvalores de solidariedade, diversidade,autogestão, liberdade, justiça,participação e tolerância. Olhandopara os movimentos do passadovoltados à mudança social, se vocêpõe o foco em uma esfera abrangentepara colocar toda a sua energia sobreela (como o marxismo com aeconomia, o feminismo com ogênero, o anarquismo clássico com agovernança ou o nacionalismo com acomunidade), verá que cada esfera(levada ao limite lógico total de suaprópria teoria) é a base para todo oresto. Olhando o feminismo e o
marxismo, por exemplo, se verá queo classismo acomoda e reforça osexismo, assim como o sexismoacomoda e reforça o classismo, entãoem qual deles você irá mirar?Conceitualmente, a resposta é ambos.Por isso, a perspectiva revolucionáriamultiquestões, multifoco, multitática, orientada ao crescimento (ecomo Michael Albert notou, asociologia é muito mais difícil que afísica porque não dispõe do luxo daprecisão das fórmulas).
Considerando a Viabilidade
Tudo isso se constrói a partir deque há entendimento do que éinjustiça (ou ao menos de entenderque a injustiça é um elementochavedo objetivo mais amplo). Deveria serum entendimento relativamentebásico, mas isso tem ido contra uma
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sensação geral de que não háalternativa, e assim teve suasmanifestações limitadas. Por isso,desenvolver uma visão é crucial –dando nova força a ideias dealternativas para desencadear omomentum necessário àtransformação. A visão de que falodiz respeito a uma reconstrução,baseada em valores, de todas asinstituições relevantes de nossasociedade em torno de princípiosefetivamente democráticos. Aoolharmos a viabilidade de manifestála, começa a parecer desencorajadornovamente, mesmo quando nosdistanciamos das concepçõesequivocadas e comuns de viabilidade(os equívocos que servem aopatrimônio e que estão confinadosaos mecanismos das políticasgovernamentais,gerencialismo/paternalismo de classede coordenadores e a submissãohabitual e socializada à hierarquia e àautoridade).
Ao invés de focar já de cara todaa atenção na linha da reta final, pensecomo os movimentos emergem –qualquer movimento, especialmentedurante a época em que surgiram osdo feminismo, dos direitos civis e doVietnã [nos EUA]. Movimentossurgem por todo tipo de motivo. Adiferença aqui é que esse movimentopara uma sociedade participativa seunifica em torno de uma visão e não
apenas da raiva. Muitas pessoas daesquerda criticam "o sistema" porraiva, mas produzem pouco na formade visões para alternativas. No casode tornar reais tais visões, osprincípios democráticos quevalorizamos devem ser injetados emnossas organizações e instituiçõesagora. Muitos movimentos entraramem colapso no passado devido ao fatode que sua estrutura interna nãorefletia suas declarações externas e aspreocupações que diziam ter (porexemplo, organizações antiJimCrow2 tentando construir ummovimento enquanto mantinham asestruturas racistas internas intactas).
A essência de ser prefigurativo éque as organizações devem começara se estruturar agora de acordo com oque desejam para a sociedadeparticipativa que buscam criar. Comomuitas pessoas estão convencidas deque não há alternativa, se umaorganização enaltece o exato oposto eainda assim não age de acordo, issoirá no fim das contas reforçar essesentimento imobilizante. Em termosde trabalho e economia básica, o
2 As leis de Jim Crow foram leis estaduaise locais decretadas nos estados sulistas elimítrofes nos Estados Unidos, em vigorentre 1876 e 1965, e que afetaram afroamericanos, asiáticos e outros grupos. Asleis mais importantes exigiam que asescolas públicas e a maioria dos locaispúblicos (incluindo trens e ônibus)tivessem instalações separadas parabrancos e negros. wikipedia.org
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trabalho prefigurativo surgiria comoa construção de conselhos detrabalhadoras e a instituição decomplexos de trabalho balanceadosno presente (e não apenas porque issoparece mais justo, mas porque sem talestrutura, todas as principais decisõesseriam eventualmente feitas poraqueles em posições de poderenquanto todo o resto estaria cansadodemais e excluído pelo trabalhobraçal). Devese lutar pela autogestãoagora, mas esteja ou não dentro docomplexo de saúde pública lideradopor profissionais de saúde pública,cultivar condições antisistêmicascontinuará a dar forma à noção deuma participação real muito maiscentrada no diálogo da saúde pública.
Apontando o Conflito Inevitável
"A quase todo minuto vivemos umaconstante negociação entre o que
queremos e a comunidade, o coletivo, aoutra pessoa”
(Cindy Milstein)
Gostin3 dedicou parte do seutrabalho a isso, destacando esseconflito como uma busca peloequilíbrio entre o bem comum de um
3 Lawrence Oglethorpe Gostin é professorde direito norteamericano especializadoem Direito da Saúde Pública.
lado, e os fardos pessoais e interesseseconômicos de indivíduos e empresasdo outro, sendo negociadas pelas leisde saúde pública e o governo. CindyMilstein, uma organizadoraanarquista, escritora e editora delivros, se distancia das mitologiaspolíticas e de forma muito útil colocatal habilidade de manobrar no centroda práxis anarquista:
"é uma constante negociaçãoentre você e a sociedade – entrediferenças – mas também tem a vercom o compartilhamento de umvalor. De certa forma, ser anarquistasignifica apenas ser honesta com ofato de que é assim que agimos nomundo; é cheio de contradições e, decerta forma, o anarquismo tentadizer 'vamos tornar isso transparentee fazer tudo o que pudermos parachegar no melhor balanço possívelentre os dois', sabendo que vai seruma constante negociação."
Isso está em contraste gritantecom outras filosofias que dizem queou tudo diz respeito ao indivíduo outudo diz respeito à comunidade, evarre para longe aquelascontradições. Tais filosofias impõemuma correlação binária que não existede fato no mundo real ao invés detentar ver e trabalhar essascomplexidades da vida. Nessesentido, o anarquismo éconstantemente dinâmico, está
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evoluindo, mudando e aberto –tornandose livre e flexível, mastambém, frequentemente, difícil deentender.
O anarquismo apresenta um tipode projeto fundamentalmentediferente das propostas de Gostin, jáque não se trata de ter as respostascertas e as formulações corretas mas,ao contrário, de se engajar nacomplexidade do mundo de umaforma que alcance os resultados queanarquistas buscam, e que sustentemos valores pelos quais anarquistastêm profundo apreço. Milsteinoferece algumas característicascentrais do anarquismo que lançamluz sobre como buscamos esseengajamento.
A primeira característica deanarquistas é que são anticapitalistasbem como antiestatistas. Esses sãovalores fundamentais, mas suasmanifestações tomam diversasformas e têm aparências muitodistintas entre si, já que ambas sãooperações muito diferentes.Anarquistas trabalham a partir deuma crítica generalizada dadominação e da hierarquia. E não éapenas uma crítica, mas um desejo deabolir ambas. Sendo assim, uma dasinclinações naturais no projetoanarquista é a de que se está sempreatenta para localizar novas formas dedominação, já que se trata de umaperspectiva intrinsecamente orientada
ao crescimento. Isso pode ser irritantenas situações extremas, mas também(e mais comumente)inacreditavelmente proveitoso. Aorientação anarquista obviamente nãoé apenas um foco na economia, masum foco multidimensional nacompreensão política, social ecultural da liberdade e da nãoliberdade (apesar disso não ser algoexclusivamente do anarquismo).Somado a isso, Milstein destaca que
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o projeto anarquista está sempre numembate em como ser ético (ou o maisético possível no contexto destasociedade problemática). Nessesentido, as questões centrais acabamsendo "Aquilo é uma dominação?Estou fazendo a coisa certa? Estaqualidade de vida é boa? Estououvindo mesmo as outras pessoas?Estou falando demais?". A naturezada práxis anarquista é tal que oprojeto tenta ter uma estruturaoperacional onde se perguntaprimeiro "Isso é algo que é errado? Eo que seria certo?" antes de perguntar"Isso é possível? É pragmático? Éestratégico?" Dado que anarquistassão totalmente envolvidas emelaboradas construções pessoais egradações de falhas humanas(ninguém é perfeito, afinal decontas), a orientação fundamental e osentimento moral ainda tende agravitar em torno a "Isso édominação?" ao contrário do "Comoisso pode ser dominado?", o que(mesmo em todas suas imperfeições,e tomado como parte do todo doprojeto anarquista) ainda assim podedar resultados sociaisqualitativamente melhores.
Outras características da açãoanarquista, de acordo com Milstein,envolvem buscar tanto a libertaçãodas amarras quanto a liberdade paraexplorar novas vias de interesse.Preocupase com a igualdade
substancial: um entendimento de quenão somos iguais em todos osaspectos, mas que devemos ser"iguais em nossas diferenças". Nessesentido, devemos ser capazes dereconhecer nossos valores comunsem respeito às nossas diferençascomuns, e a partir disso tudo, sermoscapazes de formar relações orgânicas(ao contrário de mecânicas). Essa éuma abordagem diferente da dosmovimentos de justiça que pedem poruma fatia igual do bolo para todomundo – a igualdade substancialpermitiria às pessoas compartilhareme receberem diferentes tamanhos dobolo de acordo com suasnecessidades e desejos já que nãosomos todas do mesmo jeito. Damesma forma, anarquistascompartilham um entendimento deque as pessoas precisam de coisasassim como desejam coisas. Marxhavia dito: "para cada um de acordocom suas necessidades", mas paraanarquistas: "para cada um de acordocom seu desejo" também vale.Necessidades e desejos são parte doprojeto a ser desvendado, que sópoderá acontecer através da tentativae erro. Anarquistas tambémvalorizam espontaneidade,brincadeiras, prazer e felicidade, eassociação voluntária. Para umapessoa anarquista, a associaçãovoluntária deve estar em conjuntocom a ajuda mútua, no sentido de que
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não se trata apenas de fazer o que sequer quando se quer, mas aceitar umsenso de comprometimento esolidariedade. O projeto anarquista étal que tende a buscardescentralização e interdependênciasimultaneamente; o local esimultaneamente o global; a simesma e simultaneamente asociedade. Para isso, o projetoanarquista afirma que nunca se tratade "um lado ou o outro" mas ao invésdisso, de "como podemos fazerambos juntos?". Nesse sentido,anarquistas costumam ser utópicos evisionários. Isso é significativo jáque, ao contrário de outras filosofiase teorias radicais, o anarquismo não éapenas uma crítica constante (não ésó raiva, como mencionado antes). Éum projeto constante sobre o presentee uma tentativa de moldar o mundode acordo com tais ideais utópicos –que é a própria essência da açãoprefigurativa.
O momento político central paraanarquistas é a negociação de algoaceitável para todas as pessoas, comum profundo respeito peladiversidade. O conceitookanaganiano4 de en'owkin cabeperfeitamente aqui: "eu lhe desafio ame dar sua perspectiva maisantagônica possível à minha – dessaforma vou saber como mudar meu
4 Okanagan é uma região do Canadá ondeviviam diversas etnias indígenas.
pensamento para que possa acomodarsuas preocupações e problemas."
Essa forma é bastantecontrastante com a política em geralque, como Audre Lorde5 colocou, nãotem jamais sido capaz de existir demaneira funcional com a diferença.Sempre que algo diferente éapresentado, é tratado ou de formaindiferente ou ignorado, dominado sepossível, ou, caso contrário,assimilado. Em contraste, o projetoanarquista não busca converter outrasformas de pensar aos seus pontos devista. Ao invés disso, valoriza adiversidade e discussões focadas nasquestões concretas da ação, e em"apresentar um plano com o qualtodo mundo possa viver e ondeninguém sinta que seus princípiosestejam sendo fundamentalmenteviolados." (David Graeber6)
[Em configurações de grupo, amaioria das pessoas anarquistas]operam através de um processo deconsenso que foi desenvolvido, emmuitos casos, para ser exatamenteoposto ao estilo arrogante, divisivo esectário tão comum entre outrosgrupos radicais.
5 Audrey Geraldine Lorde (1934 1992)foi uma escritora caribenhaamericana,feminista radical, mulherista, lésbica eativista dos direitos civis.
6 David Graeber é anarquista, antropólogoe professor de antropologia social emLondres.
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Aplicado à teoria, issosignificaria aceitar a necessidade deuma diversidade de perspectivasaltamente teóricas, unidas apenaspor certos compromissos eentendimentos.
No processo de consenso, todasconcordam desde o início com certosprincípios mais amplos de união epropósito de ser do grupo; mas paraalém disso, aceitam como pontopacífico que ninguém jamais iráconverter outra pessoacompletamente ao seu ponto de vista,e que provavelmente não deverianem tentálo. (Graeber)
É importante entender que,dentro da práxis anarquista, não hárespostas genéricas e não há medidaspolíticas genéricas para o conflito.Opiniões menos radicais podem olharpara o projeto e concluir que seuutopismo excede demais suaviabilidade, e por sua vez sugerir abusca por um meio termo maisrealizável (essa foi amplamente aposição do capitalismo natural queveio sendo promovida por PaulHawken e outros). O problema nisso,no entanto, é de duas vias. Primeiro,Marx há muito tempo atrás apontou otruísmo de que não se pode negociarcom o capital por uma nova forma deorganização social; você tem dedesmantelálo. Marx via ocapitalismo como um sistema de
organização social com premissasfundamentadas na exploração,portanto não se pode ter umcapitalismo "mais gentil", ou umcapitalismo "menor", ou um"pouquinho de" capitalismo, porque,em seu cerne, ele é uma forma deorganização social baseada nadominação e na exploração. Segundo,a noção de comprometimento tem suapremissa num mal entendimentofundamental do projeto anarquista. Odesafio aqui não se trata,explicitamente, de elaborar uma visãode mundo específica para a qual aspessoas têm de se converter. Issoseria quase impossível e iria contraquase tudo aquilo que o anarquismodefende. Ao invés disso, o objetivo éprefigurativo. Esse é um projetocompletamente diferente, construídointeiramente em torno de processos ede ver as mudanças como umexperimento em andamento, aocontrário de ser predicado emmisticismos clássicos de um grande erepentino cataclismo revolucionário.Tratase de uma perspectivarevolucionária multiquestões, multifoco, multitática, orientada aocrescimento, que diz que o projetofoca naquilo que funciona, e foca semcoerção.
Graeber apresentou seguinteinteração teatral esquemática entreum cético e uma anarquista queacredito ilustrar o tipo de projeto que
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buscamos e o tipo de barreirasideológicas que confrontamno:
Cético: Bem, talvez eu leve essaideia anarquista mais seriamente sevocê puder me dar alguma razão parapensar que ela funcionaria. Vocêpode nomear um único exemploviável de sociedade que existiu semgoverno?
Anarquista: Claro. Existirammilhares. Posso nomear uma dúzia sóde cabeça: os Bororo, os Baining, osOnondaga, os Wintu, os Ema, osTallensi, os Vezo...
Cético: Mas esses todos são umbando de primitivos! Estou falandode anarquismo em uma sociedadetecnológica moderna.
Anarquista: Ok, pois houvevários tipos de experimentos desucesso com autogestão detrabalhadores, como Mondragon;projetos econômicos baseados naideia da economia da dádiva, como oLinux; vários tipos de organizaçõespolíticas baseadas no consenso e nademocracia direta...
Cético: Claro, claro, mas essessão exemplos pequenos e isolados.Estou falando de sociedades inteiras.
Anarquista: Bem, não é que aspessoas não tenham tentado. Veja aComuna de Paris, a revolução naEspanha republicana...
Cético: É, e olhe o queaconteceu com esses caras! Elesforam todos mortos!
E Graeber explica:
Os dados estão viciados. Vocênão tem como vencer. Quando umcético diz "sociedade" o que elerealmente quer dizer é "Estado", eaté mesmo "Estadonação". Já queninguém vai produzir um exemplo deum Estado anarquista – isso seriauma contradição em termos – o queestão realmente nos pedindo é porum exemplo de um Estadonaçãomoderno com o governo de algumamaneira ausente: para dar umexemplo aleatório, se o governo doCanadá fosse derrubado, ou poralguma razão derrubou a si próprio,e ninguém novo tomasse o seu lugar,mas, ao contrário, todos os excidadãos canadenses começassem ase organizar em coletivos libertários.Obviamente, nunca permitiriam queisso acontecesse.
Há uma saída, que seria aceitarque as formas de organizaçãoanarquistas não se pareceriam emnada com um Estado. Elasenvolveriam uma infinita variedadede comunidades, associações, redes,projetos, em toda escala concebível,sobrepondose e conectandose detodas as formas que conseguimosimaginar, e possivelmente de váriasque não conseguimos. Algumas
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seriam bem locais, outras globais.Talvez tudo o que elas teriam emcomum seria que nenhumaenvolveria alguém aparecendo comarmas e dizendo para todo o resto secalar e fazer o que lhe é mandando.
À luz disso, faz muito maissentido focar na conexão dos projetosentre si em federações para que sereforcem mutuamente do que tentarexpandilas como bolhas queenglobam tudo – os poucos exemplosque darei a seguir estão devidamenteencaminhados ao invés de seremexcessivamente pequenos, locais oude base.
Imaginando uma Sociedade Saudável
Uma das premissas do presentetexto foi que movimentosantissistêmicos, antineoliberais,radicais e anarquistas vêm crescendono mundo todo e estão buscando deforma prefigurativa construiralternativas às instituiçõesdominantes, nãoparticipativas ehierárquicas por toda a sociedade.Em termos de cuidados em saúde epolíticas de saúde pública,movimentos continuam a florescer ea desafiar as correntes de cuidadosem saúde que visam lucro e que sãogerenciadas pelas indústrias, tanto
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nos EUA como em vários outroslugares. Apesar de nãonecessariamente se dizeremanarquista, esses movimentos seguemos princípios mencionados acima, eao fazerem isso, vêm abrindoalternativas ao sistema de saúde e àspolíticas públicas geridas pelocomércio. Entre o sistema de saúdecubano, os cuidados de saúdeindígenas mantidos por Zapatistas emChiapas, no México, o movimento deDemocracia da Saúde de Paul Glovere o Instituto Gesundheit! de PatchAdams, a seguir estão algumaspoucas observações que gostaria decompartilhar.
Cuba oferece um exemplo deum sistema de saúde nãocapitalistanacional, mas ainda assim centradona comunidade, notavelmentefuncional, com indicadores de saúdecomparáveis aos dos EUA. Aexpectativa de vida em Cuba é de77,5 anos; nos EUA é de 78. Amortalidade infantil em Cuba é 5,3mortes a cada 1000 nascimentos noprimeiro ano de vida, enquanto nosEUA é de 6,9 (de acordo com dadosde 2003). No Mississípi, amortalidade infantil é de 11,4 e chegaaté 17 entre negras, e está crescendo.Em Washington, a mortalidadeinfantil é de 14,4 entre pessoas afroamericanas. Em Cuba, ao contrário,só 5,3 crianças morrem a cada 1000nascimentos, no primeiro ano de
vida, e basicamente a mesma taxabaixa é verificada em todas regiões esetores da população, e continua acair ano após ano…
A variação no intervalo entre amelhor e a pior taxa de mortalidadeinfantil e as disparidades de saúdegerais dentro de uma dada populaçãosão reveladoras da qualidade de umasociedade como um todo. RichardLevins – observando a saúde socialmais ampla – debruçouse sobre essasvariações dentro dos EUA. Compararnúmeros estado a estado dentro dosEUA revelou pouca informação sobrea variabilidade, mas pondo sob a lupae olhando entre os condados doKansas, a variação era alarmante.Estar ciente de variações em escalamenor como essas é tremendamenterelevante para saber que sempre asestatísticas de saúdes sãogeneralizadas nas grandespopulações.
Citando Levins: “Observamosas taxas médias [de mortalidadeinfantil] assim como as disparidades;dividimos a variação, a diferençaentre a melhor e a pior taxa, pelamédia. No Kansas, a faixa divididapela média é de 0,85, mas em Cubaera de 0,34. Vimos que as taxas decâncer no Kansas e em Cuba sãocomparáveis, mas a variabilidade émais alta no Kansas do que emCuba." Na edição de 2001 dos"Indicadores do Desenvolvimento
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Mundial" (WDI) do Banco Mundial,Cuba figurava ultrapassandovirtualmente todos os outros paísespobres nas estatísticas de saúde eeducação. Interessante que,imediatamente após o furacãoKatrina atingir Nova Orleans em2005, Cuba ofereceu enviar algo emtorno de mil médicos para ajudar asvítimas. Em uma das várias formascom que um governo pode agir comrespeito à saúde pública, aadministração Bush ignorou a oferta.
Isso obviamente levanta aindagação de como isso é possíveldada a situação de Cuba. Como umpaís pobre que carece das tecnologiasmédicas sofisticadas que existem nosEUA, e tem dificuldade em conseguirequipamentos e remédios básicosdevido ao bloqueio estadunidense, écapaz de ter tão bom cuidado dasaúde de sua população? Umaresposta é profissionais de saúde.Cuba tem 5,3 profissionais médicaspor cada 1000 pessoas – a maiorproporção no mundo e quase o dobroda dos EUA. As 60.000 profissionaismédicas dedicadas e outrasprofissionais de saúde trabalhamdentro de um sistema baseado noprincípio de que "o cuidado em saúdeé um direito e não um produto àvenda".
No que diz respeito ao esforçoposto nisso e na construção deinfraestrutura prefigurativa, a
situação médica de Cuba não foimero acaso. Após sua revolução em1959, metade dos médicos da naçãoseguiu seus pacientes ricos atéMiami. Assim, desde o começo, ogoverno teve de fazer grandesesforços para educar novasprofissionais em medicina. Hoje emdia, há uma grande escola médica emcada província. O país agora gradua3.500 doutores por ano, bem mais doque o exigido para sua população de13 milhões de pessoas.
Falando prefigurativamente, ainfraestrutura de saúde de Cuba foiinacreditavelmente visionária. O paístem mais médicas servindo noexterior do que a OrganizaçãoMundial da Saúde. Desde 1963,100.000 médicas serviram em 101países. Também está treinando20.000 profissionais de saúde de 26países e executando iniciativasespeciais como a Operação Milagre7.Criou a Escola LatinoAmericana deMedicina (ELAM) que oferece apessoas jovens das regiões maispobres da América Latina e África achance de tornaremse profissionaisem medicina. O comprometimentonãofirmado de cada uma das pessoas
7 A Operação Milagre é um projetohumanitário que começou em 2004liderado pelos governos de Cuba eVenezuela. Tem o propósito de ajudaraquelas pessoas com poucos recursospara que possam ser operadas dedistintos problemas oculares.
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estudantes é retornar ao seu país epraticar suas habilidades por umperíodo de dez anos nas comunidadesmais pobres e necessitadas,substituindo assim os médicoscubanos. Desde a época em que CliffDuRand escreveu seu artigo, aELAM recebeu estudantes de 29nações diferentes e 67 grupos étnicose culturais diferentes para tornaremse médicas, técnicas médicas ououtras especialistas em saúde (cercade 10.200 estudantes atualmente).Entre elas estão 91 estudantes debaixa renda dos EUA. O curso de seisanos disponibiliza tudo: abrigo,roupa, comida, livros e uma pequenaquantia de dinheiro para gastar.
Cuba também iniciou oCompromisso de Sandino com a
Venezuela, que busca treinar 200.000médicas da América Latina ao longodessa década8. Como as estudantes daELAM, mais do que serem treinadasem medicina, essas médicas serãopreparadas com alto senso decomprometimento social –motivandoas a cuidar das pessoas daregião sempre que forem necessárias,diz Hugo Chavez.
Entendendo como os princípiosbásicos de empoderamento pessoal ecomunitários são aspectos essenciaisde um panorama efetivo de saúdepública, Cuba desenvolveu uma novapedagogia para alfabetizaçãochamada Yo Si Puedo (Eu PossoSim). Em 2006, a UNESCO deu denovo a Cuba seu prêmio dealfabetização por esse novo método.
8 Provavelmente o autor esteja falando dosanos 2000.
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Está sendo usado em 16 países paraensinar mais de 580.000 pessoas a lere escrever em apenas 7 semanas.
Zapatistas oferecem umexemplo de ação prefigurativa debase. O cuidado em saúde nascomunidades indígenas de Chiapas éhá muito tempo negligenciado pelogoverno mexicano. Durante umasessão sobre saúde, os conselhosparticipantes do Bom Governo("Juntas de Buen Gobierno")discutiram questões relativas àescassez de suprimentos médicos etransporte, a perda de conhecimentomédico tradicional, às barreiras àeducação sexual e aos danoscausados pela dependência de ajudaexterna. Após a discussão, ascomunidades zapatistas organizaramsua própria rede de cuidado em saúdee pediram ajuda e recursos paraoutras organizações em solidariedadeao redor do México e do mundo.Recursos vindos de foraimpulsionaram projetos autônomosde saúde. O hospital zapatista (ohospital de Guadalupe em Oventic,Chiapas, no México, construído em1991 pelas comunidades locaiszapatistas) funciona com ajuda dedoações estrangeiras sem nenhumauxílio governamental, e buscaprover serviço àquelas que estãosofrendo discriminação nasinstituições geridas pelo Estado.
O sistema zapatista de cuidadoem saúde foi amplamentereconhecido tanto nacional quantointernacionalmente como tendofornecido tratamento e medicamentospara mais homens, mulheres, criançase idosos indígenas rurais do quequalquer governo ou setor privadojamais conseguiu. Ao treinar pessoaslocais como "promotoras de saúde",do seio das comunidades, esseesforço se sobressaiu em termos demedicina preventiva, educação desaúde e da preservação de ervas eoutras formas de medicinatradicional. A solidariedadeinternacional permitiu àscomunidades construir clínicas eadquirir equipamentos e ambulâncias.
No entanto, à medida que foiadotado um foco mais voltado àsaúde, a dependência em ajudaexterna se tornou um tema quepressionava cada vez mais. A falta deacompanhamento por algumasorganizações frearam oususpenderam importantes projetosapós estes terem começado.Consequentemente, o conhecimentomédico tradicional foi promovido deforma mais intensa como uma formadas comunidades indígenasrecuperarem o controle de seucuidado em saúde.
Nas questões das mulheres, aLei das Mulheres Zapatistas tornouse pública em 1994 com a declaração
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dos direitos das mulheres. Isso surgede uma crescente preocupação danecessidade de focar nas questões deempoderamento das mulhereszapatistas, com um foco particular nasaúde feminina e seus vínculos com asaúde da comunidade como um todo.A sessão sobre saúde durante asJuntas de Buen Gobiernoapresentaram uma plataforma desaúde progressiva, mas apesar dofoco, era claro que "alguns dosmaiores entraves para a saúde dasmulheres continuam postos por umsistema patriarcal herdado daconquista espanhola" (GinnaVillarreal9).
Consequentemente, "muitosparticipantes concordaram que aeducação e a participação demulheres nessa questão sãoessenciais para a saúde geral dacomunidade" ("Vivenciando oEncuentro de Mulheres").
9 Sem referência.
Tal sentimento em torno danecessidade de empoderamentofinalmente se transformou noprimeiro Encuentro para mulheresque ocorreu em 1º de janeiro de 2008.O Encuentro deu às mulheres espaçopara lidarem, nos seus própriostermos, com as questões deautodeterminação, liberdade,democracia, saúde e justiça dentro desuas próprias comunidades. Aomesmo tempo que explicitamentepunham para fora as relaçõespatriarcais (os homens durante oencontro eram responsáveis porcozinhar, cuidar das crianças, limparos banheiros e trazer lenha), asmulheres zapatistas deixaram claroque isso não era uma divisão em ummovimento separado de mulheres,que é algo muito diferente da maioriados movimentos de libertação dasmulheres. Ao invés disso, asmulheres zapatistas enfatizaram queseu movimento ainda inclui "seusirmãos, maridos, crianças, idosos etodos na comunidade". Em termos deespalhar o modelo zapatista, quandoperguntadas o que as comunidadesnãozapatistas poderiam fazer paraapoiar seu trabalho, as mulhereszapatistas responderam, "organizemse".
O ethos do movimento de saúdezapatista foi captado por uma meninade 8 anos durante as plenárias doEncuentro. Ela disse, "Sem a
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organização, eu não estaria viva. Euteria morrido de uma doençacurável".
O movimento Democracia daSaúde de Paul Glover – a Aliança daSaúde de Ithaca (no inglês, IHA),com base em Ithaca, Nova Iorque – éum modelo de saúde cooperativofundamentado na ajuda mútua e foidesenvolvido com a ideia de criar ummodelo sustentável de soluçõesvoltadas à comunidade e guiadas porela para a atual crise nacional dosistema de saúde. De acordo com osite principal da organização, aAliança da Saúde de Ithaca foi criadacomo um modelo cooperativo quetem sido continuamente moldado esustentado pelos membros da aliança.A ideia é de que através do poder deconstrução da comunidade, membrosdo IHA possam se ajudarmutuamente com as despesasmédicas – financeiramente através daorganização e através dos serviçosque ela promove, e diretamenteatravés de benefícios membroamembro, como descontos emcuidados em saúde que os MembrosProvedores oferecem a outrosmembros. A IHA funciona em trêsníveis principais: o Fundo de SaúdeIthaca, a Clínica Gratuita de Ithaca ea educação geral.
O Fundo de Saúde de Ithaca foiestabelecido para fornecerassistência financeira para os custosem cuidado em saúde. Através dofundo, a IHA oferece concessões amembros da IHA para auxiliálos emcategorias específicas de custospreventivo e de cuidado médicoemergencial. O Fundo tambémoferece a membros empréstimos semjuros para procedimentos dentários,cuidado dos olhos ou para melhoriados serviços profissionais de saúde(apenas para membros provedoresde cuidado em saúde). Peloprograma de ConcessõesComunitárias da IHA, pequenasconcessões são oferecidas a outrosgrupos que fazem trabalhorelacionado à saúde... A Aliança daSaúde abriu uma clínica de saúdegratuita no centro de Ithaca em 23de Janeiro de 2006. A ClínicaGratuita de Ithaca (IFC) ofereceserviços de cuidado em saúde 100%gratuitos para residentes que nãotenham seguro ou tenham baixacobertura de serviços médicos nocondado de Tompkins e nas áreas aoredor. A IFC é uma instalaçãomédica integrada, onde profissionaisvoluntários de saúde oferecem tantoserviços médicos convencionaisquanto holísticos para as visitantesda clínica, assim comoaconselhamento sobre o sistema deseguridade do sistema de saúde,
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entre outros serviços... A Aliançaoferece uma programaçãoeducacional aos nossos membros eao público em geral. Aulasinformais, palestras e falas deconvidadas são oferecidas ao longodo ano; outros eventos sãoagendados quando vão aparecendo.Nós oferecemos materiais na área deespera de nossos escritórios e daClínica Gratuita, os quais qualquerpessoa é bem vinda a explorar. Nosrelacionamos em rede comespecialistas em todos os campos dasaúde para conseguirmos ajudarnossas vizinhas a teremconhecimento da riqueza de opçõesde saúde disponíveis. Nosso jornaltrimestral oferece informação sobre
diferentes assuntos de saúde, eoutros materiais educacionais, alémde notícias sobre a organização.
A última observação quegostaria de oferecer aqui é sobre oInstituto Gesundheit!10 – a criação delonga data de Patch Adams. Apremissa do projeto tem sido umatentativa completamenteprefigurativa daquilo que o Institutose refere como "projetar o sistemacomo um todo". A abordagem dadapelo Gesundheit!, em outras palavras,tem sido a de redesenhar o sistema de
10 Expressão alemã que se diz quando umapessoa espirra: “saúde!”
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Instituto Gesundheit!
cuidado em saúde como um todo, nãosó como acessálo:
Queremos enfrentar aspectosnegligenciados do fornecimento decuidado em saúde fora do controlede mercado, e dentro do projeto debolsões de cuidado. Esses bolsõeslocais de variedades correriam emparalelo ao mercado de saúdeconvencional e estariam conectadosde forma frouxa uns aos outros paraagir como perturbações ao sistema.
Essa teoria conceitualiza osistema como se fosse um Golias emrelação ao seu Davi: reconhece que osistema é (1) controlado porpessoas/instituições que têm certopoder sobre a população; (2) "osistema como está – sem mudanças –beneficialhes enormemente"; e (3)essas pessoas/instituições não têmintenção de permitir que este sistemamude – não importa quão razoáveis eéticos sejam os argumentos, quãopersuasiva seja a evidência desofrimento e perda humanos, ouquantas concessões as ativistas estãodispostas a fazer.
Por mais inarredável que esseângulo pareça, a janela deoportunidade sobre a qual oGesundheit! cria sua estratégia vemdo entendimento de que "o sistema desaúde nos EUA é tão grande, tãocomplicado, tão burocrático, compartes que não conseguem se
conectar com as outras, tão insensívelao humor do seu ambiente, tãoincapaz de ver suas consequências –que é possível que desmorone devidoao seu próprio peso".Consequentemente, enquadra suasações ao redor da noção deperturbação – visando abalar essespontos fracos dentro do sistema.Alvos específicos surgem através doconceito de projetar o sistema comoum todo, que começa demarcandoque aspectos do cuidado em saúdepodem ser mudados por mera decisãoe design de políticas, visando assimaspectos problemáticos que não sãointrínsecos à presença e aofuncionamento mais amplos dosistema de saúde.
Existem numerosos aspectos nocuidado em saúde contemporâneoque o Instituto busca mudar eredesenhar. Nota que as relaçõeshierárquicas no cuidado em saúde sãoherdadas de uma cultura dehierarquia, abuso de poder epresunção. Consequentemente, aspessoas, ao moldarem suasinstalações de cuidado em saúde deacordo com o que querem, têm aopção de apoiar, se opor, mudar oualterar tais maneiras de se relacionar.Muitos estudos mostram que umapessoa tem melhores resultados emsaúde se ela sente que seu bem estarestá integrado no interior de umgrupo maior. Seguindo essas linhas, o
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Gesundheit! acredita que curadoras/projetistas podem chegar a umalinguagem – recortes e metáforas –que se opõe às tendênciasisolacionistas e consumistas(particularmente da saúde e dadoença serem identificadas comopropriedades individuais), e ao invésdisso situar a saúde do indivíduodentro da saúde de um grupo.Seguindo essa lógica, o Gesundheit!faz notar que a saúde de sua equipe étão prioritária quanto a saúde de umapaciente: assim como a pacienteprecisa sentir que seu bem estar estáaninhado dentro do bem estar de umgrupo mais amplo, a equipe tambémprecisará.
Em termos de tornar o cuidadoem saúde uma experiência muitomais participativa, o Gesundheit!reconhece que a atual culturacomercial do cuidado em saúde serefere ao paciente como consumidore ao médico/enfermeiro comofornecedor, de tal forma que asinterações são experimentadas comouma forma de compra – completadacom informações significativas sobreo fluxo, motivos de lucro,disparidades socioeconômicas entreconsumidores em poder debarganha/compra, escolhas limitadase comumente não participativas, etc.Projetistas, ao contrário, podem seopor a esse modelo de interação einventar elementos em suas
instalações (através da linguagem,imagens e estrutura) que permitam aparticipação popular em todos osaspectos da saúde, cuidado em saúdee construção de um sistema de saúde.Apesar do cuidado em saúde nacionalestar atualmente alojado nasinstituições financeiras burocráticas eprivadas, é na verdade dentro degrupos sociais beneficiados maioresque as interações de cuidadoprecisam ser aninhadas e protegidas.A solidariedade precisa ser renovadae redesenhada entre as pessoas cujosinteresses forem fundamentalmenteem comum. As decisões precisam serrealizadas na base da participação, eo processo de decisão sobre osdilemas do sistema de saúdecomunicado pelas/para as pessoascomo uma prioridade. Comunicaçãoe visibilidade do cuidado em saúdepodem ser também muito maisproeminentes em meio à sociedadecomo um aspecto do desenho dosistema, e em termos de visibilidade,as curas não devem necessariamenteser valorizadas como superiores aocuidado de qualidade. O próprioespaço físico do cuidado em saúdedeve ser desenhado para refletir essesvalores, e – já que não existe a tal dainteração neutra – as ações ao longoda vida cotidiana entre curadoras,equipe e paciente devem refletir ofato de que a vida em si é umaescolha. Tal perspectiva pode ser
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uma fonte de informaçãotremendamente valiosa para asinterações que se deseja no cuidadoem saúde. O Gesundheit! consideratodos esses aspectos passíveis deserem (re)desenhados.
Central a tudo isso é o fato deque o projeto do sistema como umtodo se assenta na criatividade:"Necessitamos de uma variedade denovas ideias, projetos, desenhos,configurações, propostas –alternativas para voltarmos o olhar epesarmos. Existem alguns problemaspara os quais as soluções ainda nãochegaram. Temos que construirsoluções." E enquanto isso, estámirando a cultura de cuidado emsaúde e opondo e expondo o "quãoindesejável é um cuidado em saúdecontrolado pelo mercado".
Montando um possível quadrosocial para organizações anarquistas focadas em saúde.
A questão gritante que aindapermanece é como definir o quadrosocial no qual as organizaçõesanarquistas podem prosperar einfluenciar a formulação da políticade saúde pública. Em torno de quaisestruturas sociais grupos anarquistaspodem se aglutinar para articular vozcoletiva, e como?
As duas preocupações principaiscom os exemplos mencionados acimasão de que eles (1) se aglutinam emtorno de uma identidade preexistente(portanto, ficam aquém do querepresenta a grande maioria de umapopulação mais diversa tornandoassim difícil ampla aplicação), e (2)são efetivamente isolados. Oszapatistas se aglutinaram em torno daidentidade partilhada dascomunidades indígenas politicamentemarginalizadas e fortementelocalizadas. O Instituto Gesundheit!foi (e continua sendo) muitolocalizado e em grande parte isoladoem suas próprias operações (apesarde seus esforços de divulgação).Dessa forma, as questõespermanecem: o que essas operaçõestêm a dizer para a grande maioria dapopulação que não está em umacomunidade vulnerável, que não estáagrupada e organizada localmente,para a qual não queremos usar adesignação guardachuva "opúblico"? Como é que umaorganização anarquista poderia seestabelecer, sendo mais eficaz eeficiente do que as coisas comoestão?
Como mencionadoanteriormente, organizaçõesanarquistas vão contra o modelo da"bolha em expansão", que procura terum único espaço subcultural eexpandilo para incluir cada vez mais
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pessoas, tentando ser o modelo paratodo mundo. É isso que tambémacontece quando a diversidadeprospera ao mesmo tempo que anoção de "o público" é despedaçada.O que nos resta então, nos termosdeste projeto anarquista, seria, naminha opinião, um processo em duaspartes.
A primeira parte diz respeito aolhar a identidade coletiva como basepara se organizar. Comunidadeslocais de saúde surgem de um grupolocal e dos seus interesses comuns.Comunidades vulneráveis* (ou seja,identidades compartilhadas em tornode condições particularescompartilhadas de saúde) surgemgeralmente em uma escala maisnacional. Afigurase aqui um terrenocomum que poderia ser descobertoonde se valorizaria o aspectoparticipativo da localidade, enquantofortaleceria os recursos mútuos emuma escala muito mais abrangente.Afinal, os grupos locais estão ligadosentre si de forma mais ampla. Issosustenta diretamente a ideia de nãopromover a "bolha em expansão",mas sim promover diversosagrupamentos que persigam osinteresses particulares dedeterminados grupos, enquantotrabalham coletivamente como umtodo federado e se mobilizam em
* Em inglês: diseaseidentified communities.
torno da ideia geral de saúde (afinalde contas, obviamente alguém nãoprecisa ter um interesse particular emuma determinada condição ou doençapara ter um interesse em saúde oupara ser capaz de reconhecer asdimensões de sua saúde que estão emjogo). Então, como tal, umafederação de comunidades se assentana expansão da ideia de marcaridentidades coletivas, que iriam dedoenças e condições específicas parainteresses muito mais amplos na áreada saúde, nos quais todo mundoparticipa na sua saúde de formas bemvariadas.
O segundo aspecto desteprocesso referese às unidadesfundamentais que compõem talfederação (ou federação defederações). Estas são basicamente aspráticas alternativas (o trabalho doGesundheit! ou das zapatistas, porexemplo), descritos na seção anterior.Depois que a noção de "o público" édesmantelada, o que sobra éessencialmente uma matriz de corpose grupos dinâmicos e variados quecompõem o mundo real. O problemaé que eles são em grande parteisolados. Os zapatistas e o InstitutoGesundheit! são efetivamente nósdesconectados do que poderia ser umsistema mais amplo e mais eficaz.Faltam conexões onde esses nósdeveriam estar ligando o conjunto,onde estas comunidades estariam
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agindo em conjunto para fazeralgumas coisas e se reorganizandopara outras – um projeto para oprojeto. Os zapatistas são clarossobre a construção de uma redeinternacional quando semprerespondem à pergunta "Comopodemos ajudar?" com "Organizemse" – refletindo a necessidade de criare vincular os nós de ação.Essencialmente isso quer dizer, nocontexto da prestação de saúde,conselhos e federações de saúde (queligam as cooperativas de saúdelocais às organizações mais amplas)em torno do interesse comum na boasaúde.
O que o anarquismo oferecenesse sentido em muitos aspectos seapresenta como uma derivação doque é conhecido como o anarcosindicalismo. Esse é um arranjoorientado para o trabalho onde ostrabalhadores se veem como umaclasse específica e formam conselhosde trabalhadores autogeridos paraarticular coletivamente suas vozes einteresses. Rudolph Rocker, em seutrabalho AnarcoSindicalismo, apontadois objetivos centrais da prática: (1)salvaguardar as exigências dostrabalhadores, ao mesmo tempo queeleva seus padrões de vida; e (2)servir como uma escola paraformação dos trabalhadores efamiliarizálos com a gestão técnicada produção e da vida econômica em
geral para que, quando surja umasituação revolucionária, eles sejamcapazes de tomar o organismosocioeconômico em suas própriasmãos e refazêlo de acordo com osprincípios socialistas. É bem difícilimaginar a construção de algosemelhante relacionadoespecificamente aos gruposorientados para a saúde: trabalharpara salvaguardar os interessesrelacionados à saúde, vendose comoparte de um todo, todos cominvestimentos em suas saúdes, eprocurando aumentar a participaçãonas decisões que afetam suas saúdes,e ao mesmo tempo trabalhar paracapacitar as pessoas para aparticipação, servindo como basepara a revitalização da capacidade deação popular para reconstruir asociedade como um todo de modoparticipativo.
Essa ideia de conselhos porinteresse tem sido contemplada pormuitos mais recentemente eprofundamente. Michael Albertdescreve os conselhos e as federaçõestanto de trabalhadores quanto deconsumidores como componentescentrais de uma visão funcional parauma economia participativa. Umavantagem discutível (entre muitaspessoas) que estes acordos têm sobreo convencional é que eles sãoinerentemente mais participativos eigualitários. Isso vem desses acordos
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para implementação de complexos detrabalho mais justos, ou, em termosmais relevantes para o que estamosbuscando, das formas de organizaçãoque não inerentemente empoderamalguns e desempoderam outros. Éimportante que todos possamparticipar igualmente se assimdesejarem. Como tal, os conselhosseriam baseados em autogestão (aspessoas podem participar se assimdesejarem ou criar novos conselhosmais relevantes para as suasnecessidades e interesses); seriambaseados em dispersão adequada deinformação, meios adequados deexpressar preferências, e processos detomada de decisão que funcionariampara garantir (o melhor possível) quecada indivíduo tenha influênciaproporcional aos resultadosrelacionados aos efeitos que lhecausarão. Em termos de eficiência –de não desperdiçar as coisas quevalorizamos quando perseguimosnossos objetivos –, a participaçãodireta em termos de conselhos desaúde fornece um arranjo muito maiságil, corta a burocracia atual que setornou cada vez mais onerosafinanceiramente e contraproducente,proporciona um ambiente nãocompetitivo onde conselhosconectamse uns aos outros paratratar dos seus interesses, e como talsão guiados pelo interesse dos grupose não por fins lucrativos, tendências
de expansão ou indústriasinsustentáveis.
Há obviamente muito mais adizer sobre isso para fazer justiça àideia de conselhos de saúde. Deveriaser mencionada ainda que já existemalgumas formas de conselhos desaúde em funcionamento. A visãodesejada é que deveriam se conectaruns aos outros em federaçõesdedicadas a salvaguardar a saúde doscidadãos, elevar os padrões de saúdee continuar a educação e capacitaçãodesses cidadãos em termos de seremcapazes de se envolver e gerir osfatores que afetam sua saúde, emsentido lato.
Interagindo com a infraestrutura convencional
Na medida em que osdeterminantes sociais da saúde sedefinem no âmbito dos sistemasinstitucionais mais amplos, comopode a organização anarquistafuncionar bem quando precisainteragir com estas infraestruturasmais convencionais? O que pode serfeito imediatamente?
A resposta a estas questõesbaseiase principalmente na visão: oque é que estamos tentando criar? Aseção anterior discutiu a construçãode estruturas alternativas para as
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instituições de saúde. Esta seção dizrespeito à forma de interação(resistência e reconstrução) dentrodas instituições existentes, posto quea resistência e a construção do novosão necessárias.
Em termos de criação de novasformas de prestação de cuidados emsaúde, é difícil para as instituiçõesalternativas simplesmenteaparecerem e serem altamentecompetitivas com os modosconvencionais de fazer as coisas. Ascomunidades devem estarfamiliarizadas com as alternativas. Eem um sistema de mercado, novasinstituições baseadas na autogestão eem valores participativos tendem a secorromper quando tentam ter sucessono mercado e ao mesmo tempo seremparticipativas (já que decisões demercado levam à alienação e aorompimento de práticasparticipativas). Não é que as
alternativas não podem ter sucesso,mas é quase impossível ter sucessono mercado e ter sucesso comosistemas verdadeiramenteautogestionados.
A chave é reconhecer estaincongruência e combatêla. A lutavem na forma de encontrar maneirasde aumentar os custos das formasconvencionais de fazer as coisas demodo que mudanças ereconsiderações vão (terão que) serfeitas. Em termos econômicos, issopode acontecer como umareorganização da força de trabalho namedida em que tanto custa mais àestrutura combatêla quanto a mesmaobriga a estrutura a permitir que aforça de trabalho se reorganize. Atrajetória geral de desenvolvimentoaqui envolve ganhar reformasmaiores que continuem a fortalecer omovimento para que vá mais adiante– trabalhando na construção de
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relevantes conselhos de interesse e,eventualmente, em direção aestruturas institucionaiscompletamente novas.
A filosofia por trás do InstitutoGesundheit! de Patch Adams serefere a esta maneira de aumentar oscustos do sistema como a criação de“perturbações” – ideias/ações queponham o sistema na berlinda com oobjetivo de desestabilizálo e fazêlotropeçar em si mesmo. Os pontosiniciais para aumentar os custos daprestação convencional de cuidadosem saúde envolvem desafiar asrelações hierárquicas, ver a saúdemais como uma condição coletiva emoposição a apenas a qualidade de umindivíduo, focar na importânciacomplementar do pessoal/profissionalde saúde, compreender a saúde comoum movimento popular de pessoas,promover a solidariedade, a tomadade decisões participativa, etc ...
À medida que os custos sobem,as lutas em curso no seio dasinstituições particulares podem ajudare apoiar instituições alternativas,mesmo quando o mercado e aconcorrência convencional aindaexistem. O Instituto Gesundheit!serve aqui como um bom exemploassim como a sua busca por um"projeto de sistema total" é aalternativa/projeto prefigurativo quetrabalha ao lado de outros projetos deinfraestrutura que confrontam a
infraestrutura convencional, ou seja,aqueles com foco em quem pagaindividualmente/coberturasuniversais. Como o Instituto pretendeser uma alternativa prefigurativa emseu trabalho, aquelas pessoas quefocam em questões definanciamento/acesso servem maiscomo um desafio direto (perturbação)à infraestrutura convencional doscuidados em saúde dominada pelosnegócios dos planos de saúde.
Destinada a trabalhar lado a ladocom “quem paga individualmente”/“esforços de cobertura universal”, oprojeto de sistema total é umachamada a pensar universalmente,agir localmente: para projetar oscontextos locais que protegem onúcleo distintivo da relação decuidados em saúde... entremédica/enfermeiro e paciente.
Da teoria à prática
A abordagem que gostaria depropor brevemente aqui tem duasfrentes, destinase à (re)criação e aodesmantelamento simultaneamente.O primeiro foco visa a (re)criaçãoatravés da geração de solidariedadena comunidade local, que se expandena direção da federação decomunidades – criando modoseficazes de participação na política
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comunitária, que por sua vezinfluenciam a sociedade em geral (emvez da política de cima para baixoinfluenciando o tecido dacomunidade local). Entre osbenefícios de tal solidariedade, há umaspecto inegável de recuperaçãodentro dela que alimenta diretamenteos movimentos de reforma maisamplos, visando (entre outras coisas)tanto a terra, a propriedade, a políticalaboral, e, é claro, a saúde. Como ofoco central é baseado nacomunidade, mas também fala de umimportante foco ambiental ebiorregional11 que mais uma vezcentraliza a saúde da terra comoessencial para o bemestar de todos.
A (re)criação, neste sentido,orbita em torno da ideia dereformulação comunitária de todo osistema nas formas mais amplas,recuperando o que deveriam seriniciativas comunitárias internas emrelação ao que foi definidoexternamente e de serviçosfornecidos (ou vendidos)burocraticamente de cima pra baixo.Do ponto de vista da saúde públicaradical construída ao longo desteartigo, o pano de fundo de interesse
11 O biorregionalismo “observa um localespecífico em termos de seus sistemasnaturais e sociais, cujas relaçõesdinâmicas ajudam a criar um ‘senso delugar’, enraizado na história natural ecultural” (Nozick, 1992:7576)wikipedia.org
por trás de tal foco visa amplamentetudo o que é necessário paracomunidades saudáveis (proponhousar o termo "saúde comunitária" deagora em diante em vez de "saúdepública", já que "o público" é tratadocomo uma entidade homogênea evaga, enquanto "comunidade"reconhece interesses distintos,personalidades, relacionamentos, etc.Isso pode cheirar a mera semântica,mas aproximarse de uma saúdedefinida pela comunidade ao invés deusar um “cobertor de tamanho único”que tenta satisfazer a totalidade dopúblico pode conduzir a grandesdiferenças).
O esforço conjunto para(re)criação emerge da percepção deque novos modos de construção decomunidades foram surgindo em todoo país (e no mundo) em diferentesformas: jardinagem comunitária,compostagem, projetos debiorreparação; cozinhas comunitáriase iniciativas "slow food"; lojas debicicleta coletivas da comunidade,programas de bicicletas gratuitas,corridas informais de bicicleta ebicicletadas da massa crítica; maisprojetos vanguardistas improvisados(brigas coletivas de travesseiro,projeção de grafite em edifícios,teatro de rua improvisado eespontâneo, encontros massivos demúsica no iPod, etc.); projetosescolares gratuitos; mercados de
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pulga de base comunitáriainteiramente gratuitos (o que tem sidochamado de "o mercado realmentelivre"); ocupação de casasabandonadas e movimentos squatt; eassim por diante. O que ainda tem deser suficientemente articulado, bemorientado e perseguido dentro dessesprojetos é a sua conectividade maisampla.
A conectividade está no queeventos populares de espectadores(meros espectros de "comunidade"),como "visitas à galeria" ou"caminhadas artísticas” mensais,fundamentalmente não têm. Visitas àgaleria são eventos onde galerias dearte ficam abertas até tarde numanoite do mês para as pessoascaminharem e olharem, talvezouvirem música, e comerem.Enquanto eventos como esse vêmocorrendo em mais cidades(largamente gentrificadas) em todo opaís, eles não são necessariamentebaseados no trabalho conjunto demembros da comunidade e portantonão necessariamente constroemsolidariedade. Esta é em grande partea diferença funcional entreconstrução de capital social (que étantas vezes elogiada na literaturasociológica e nas discussões sobreconstrução de comunidade) econstrução de solidariedade social. Aprimeira pode ser feita apenas deexperiências compartilhadas que de
modo algum se correlacionamautomaticamente com asolidariedade, enquanto a segundavem do trabalho compartilhado, doinvestimento partilhado, e de umaconsciência quanto ao interessecomum.
Assim, as abordagens que vãoem direção à (re)criação poderiam sefocar em garantir que essascomunidades definam as coisas queas tornam comunidades saudáveis.Um exemplo imediato de interessepara se considerar seria adisponibilidade de alimentos dequalidade para todos. Em termos de(re)criação, soluções que reconhecemo interesse comum podempotencialmente ser qualquer coisadesde ferramentas ecompartilhamento de pesquisas parajardins pessoais até jardins ecompostagem comunitárias emcomunidades de pequena escala,alcançando até mesmo projetos degrande escala fora da rede elétrica ouobtendo alimentos cultivadoslocalmente servidos exclusivamentenas escolas comunitárias. Isso podefazer surgir mais afrente um enfoqueamplo da agricultura radicalmentesustentável, levando a: garantir umaproibição regional sobre alimentosgeneticamente modificados, trabalharem direção à promoção de umaredução significativa deenergia/formação/compartilhamento
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de recursos, lutar por terrascomunitárias e aquisição de imóveis,movendose em direção à reparaçãode sua territorialidade, etc. Taispreocupações e atividadeslogicamente alimentam outrasdimensões de saúde da comunidade,tais como o amplo acesso a um meioambiente saudável, o acesso aoscuidados em saúde de qualidade,educação de qualidade, etc., definidascomo pontos de interesses pelascomunidades. Isto segue a abordagemradical de saúde pública de que asaúde individual não pode serseparada da saúde da comunidade,que por sua vez não pode serseparada da saúde ecológica.
Com o tempo, isso poderiacomeçar a se parecer com umacomunidade que tomou de volta ocontrole sobre sua territorialidade erecuperou a autonomia na tomada dedecisões sobre as coisas que a afetam.Construída através de projetos querevigoram a solidariedade, essa tornase uma comunidade que realmenteexperimentou algumas verdadeirassensações de comunidade, em vez dese contentar com a farsa da"comunidade", pintada nassuperfícies polidas dos novosedifícios dos urbanistas que vêmsendo salpicandos em tantos centrosurbanos e áreas comerciais. Ao falarde solidariedade, no entanto, asociedade real não pode existir entre
grupos desiguais. Assim, projetos desolidariedade são necessariamentehorizontais nas diretivas deabordagem, não mais com umahierarquia de cima a baixo, mas simcom iniciativas coletivas voltadaspara a comunidade que não sãoditadas por chefes, mas em vez dissoestruturadas para capacitar todomundo a trabalhar junto.
Olhando para a paisagemnacional [dos EUA], essas iniciativasde solidariedade da comunidadeparecem bem atrasadas com tantascidades sendo submetidas a estasrecentes renovações urbanísticas –"revitalização," "embelezamento","gentrificação geral" vestida deambientalismo corporativo "verde" –,tudo ainda sendo alimentado por umaagricultura industrial insustentável edestrutiva e oleodutos de recursosglobais carregados de violência.Assim, com tantas cidades sendoapresentadas à falsa comunidade dos"embelezamentos urbanos" eespetáculos mensais de dança emgalerias, tornase mais evidente queesses eventos só podem fazer apenasisso para reunir (algumas classes de)pessoas. Poderia muito bem parecerque como os projetos desolidariedade comunitária começamlocalmente, preenchem necessidades,e conseguem alguns sucessos, essasiniciativas ressoariam por outrascomunidades (embora criadas sob
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medida para os interesses locais) emsituações semelhantes. Nesse sentido,o foco global na (re)criação começa ater a cara de um potencial real paramodelos de comunidade autênticos eque se perpetuam. Assim, com otempo, eles podem surgir como umafederação (ou uma federação defederações) de comunidades quetrabalham em conjunto, partilhandorecursos, e se engajando ao mesmotempo em projetos deempoderamento político em nívellocal e de maneira ampla.
Com um simples olhar aoque isso pode vir a ser, esse foco seabre para uma ampla gama depotencial revolucionário. À medidaque as comunidades se reúnem paraencontrar uma voz coletiva, poderiampotencialmente atingir qualqueraspecto da criação de um ambientemais saudável e fortalecedor. Eisalgumas possibilidades imediatas: umfoco na discussão e nodesenvolvimento de uma políticacomunitária eficaz e prefigurativa(desenvolvendo métodos de tomadade decisões equitativas, fomentandoao mesmo tempo a solidariedadeinterna e ampla, etc.); um enfoqueeducativo em conhecer aterritorialidade (tanto em nível geralquanto específico para a região); umfoco em iniciativas de educaçãoinfantil de acordo com questões einteresses locais tornando assim a
educação o mais relevante possívelpara as estudantes (por exemplo,durante algum tempo houve umdebate em muitos distritos escolaressobre transportar crianças paraescolas distantes versus aderirprincipalmente a escolas de bairro,em resposta a questões de segregaçãode bairro, desigualdades econômicase desigualdades em recursosacadêmicos: fomentarapropriadamente o diálogo para queestudantes e pais sejam capazes delidar com questões reais – como ostatus quo – pode ir mais direto aoponto); um foco real na juventude(além de dimensões apenasrelacionadas à escola); um foco emfinanças dos cuidados em saúde –cuidados em saúde universais pagospor uma única pessoa ou mesmo oque poderia ser ao nível dacomunidade/federação e não comoum outro serviço do governo; foco naprestação de cuidados em saúde e emlevar à comunidade uma discussãosobre a forma como os hospitaislocais são gerenciados, sobre asrelações paciente/médico, sobre adispersão de informação, etc …
O segundo foco crítico daabordagem que estou defendendoaqui diz respeito ao desmantelamentocomo o corolário necessário para a(re)criação e a ação prefigurativas. Apartir de uma perspectiva anarquista,que acredita que o atributo essencial
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do indivíduo é a liberdade de aomesmo tempo indagar e criar, asforças opressivas que vão contraesses fins devem ser desmanteladas.Ao memso tempo, novas formassociais serão criadas para permitirque essas essências floresçam. Asestruturas opressivas que serãoatingidas são aquelas que vão contraa solidariedade, diversidade,autogestão, justiça e participação.Deve ser entendido, contudo, queesse não é um movimento dogmático– não se pretende coagir qualquerpessoa a pensar de um determinadomodo. Afinal de contas, existempessoas nas quais tais esforços podemressoar e outras em que essesesforços serão perdidos. Dito isso,nãocoercitivo não é o mesmo quepacifista. A liberdade que talmovimento busca não visa cercear aliberdade dos outros, mas sim mantercomo princípio que ninguém tem odireito de restringir a liberdade dosoprimidos.
A importância dodesmantelamento e daimplementação de novas formas emaneiras de fazer as coisas vem deuma abordagem situacionista quereconhece que se vamos agir comuma certa distância do Estado (e deprocessos capitalistas e outras formasde exploração/opressão que estão nacultura dominante), outros assumirãoa tarefa de execução dessa
maquinaria (seja intencionalmente ougravitacionalmente). A isto, SlavojŽižek apontou que o Estado (ouqualquer outro poder que équestionado) garante um desafiodireto pois se operamos à distância(para aqueles que podem se dar a esseluxo, de qualquer maneira)"abandonamos o poder muitofacilmente para o inimigo", levando,assim, à pergunta: Não seria crucial aforma que tem o poder do Estado? Oprocesso de desmantelamentoacontece simultaneamente aoprocesso prefigurativo. Há váriasrazões pelas quais odesmantelamento é tão central quantoa (re)criação nesta abordagem. Umadelas é que certos aspectos (emborapossam parecer muito distantes darelevância imediata na vida de muitaspessoas) não podem esperar pelalenta mudança reformista. Desmontara maquinaria na qual as pessoas nãoapenas estão sendo oprimidas, masestão ativamente perdendo suas vidasé uma categoria situacional que nãopode esperar pela lenta mudançareformista.
Movimentos ecológicosradicais, como a Frente de LibertaçãoAnimal (ALF), a Frente deLibertação da Terra (ELF), e outrosecoativistas radicais tambémreconhecem o imediatismo econcentram muitos dos seus esforçosem desmantelar as capacidades
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ecologicamente destrutivas daindústria tão imediatamente quantopossível. Por mais que este seja umaevidência do estado desesperado domeio ambiente, também é umaevidência dos efeitos sociais docapitalismo. Já que o capitalismo éimperfeito e insustentável, umambiente palpável de revolução podeaparecer muito lentamente sob suascondições. Isso ocorre principalmenteporque as economias capitalistaspodem manter (por um tempo)padrões de vida relativamente altospara uma minoria da população,impotência e privação de direitospara o resto, e alienação para todos.Como resultado, criar a revolução apartir de argumentos morais emeramente reconhecendo a injustiçanão é suficiente. As pessoas que emgrande parte se identificam com acultura dominante são muitoalienadas para ver (e muito menospara perseguir) alternativas. Amaioria está lutando pelas coisas
mais essenciais sob o peso derealidades opressivas, e outros aindaestão muito distantes e confortáveispara considerar a necessidade demudanças radicais. A desmontagemvisa diretamente a infraestrutura queperpetua a alienação, a privação dedireitos, a falta de poder e aexploração, e busca empurrar osentido da mudança do dever moralpara a necessidade real.
O ato de desmantelamento(independentemente da forma comomuitas vezes é negativado) é um atode afirmação. Herbert Marcusedestacou isso quando falou domovimento socialista libertário –dizendo "não" para a sociedade quetemos ao buscar por "uma sociedadesem guerra, sem violênciaorganizada, sem exploração... umamaneira qualitativamente diferente devida [e] uma cultura essencialmentenova gerada por homens e mulherescujas sensibilidades, instintos einteligência não são mais mutilados
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pelas necessidades e exigências deuma sociedade exploradora". Žižek –ao promover o papel afirmativo de talmovimento – falou de forma análogasobre a diferença filosófica entreagressividade passiva (capturado nafrase "Eu preferiria não") epassividade agressiva (capturado nafrase "Eu não ligo em"). A distinção
– em como o primeiro não nega opredicado, mas afirma um nãopredicado – é que a agressividadepassiva do "eu prefiro não" se afasta"de uma política de‘resistência’ ou ‘protesto’,que parasita sobre o queela nega, em direção auma política que abre umnovo espaço fora daoposição hegemônica e desua negação". Ter comofoco central adesmontagem (versus protesto ou"resistência") nos leva em direção à
abertura de novos espaços para alémdo par opressão hegemônica e suanegação.
Nesse sentido, o trabalho doprocesso de desmantelamento deve irmuito além da dissidência sancionada– para além dos limites da concessãode licenças, doações de caridade, etodas as corriqueiras pseudo
atividades de resistência. Isto não éser dogmática ou menosprezar certastáticas categoricamente. Táticasdevem ser situacionais, com as
melhores trabalhando paraatingir as metas de forma tãoeficiente quanto possível, aoinvés de meramente perseguira ação pela própria ação. Issoem grande parte tem a vercom a compreensão dadistinção entre açõessimbólicas e não simbólicas
em termos de como as táticas sãoempregadas. Derrick Jensen destacou
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bruxaria distrowww.bruxariadistro.com
we.riseup.net/subt
essa distinção: a ação simbólica éaquela cuja principal intenção étransmitir uma mensagem, enquantouma ação não simbólica é destinadaprincipalmente a criar algumamudança tangível por si mesma (eonde seu simbolismo pode ser, nomáximo, secundário). Essa distinçãoé importante porque, como umaabordagem pode sersignificativamente melhor que outra,dada a situação, ativistas que lutampor mudanças sociais muitas vezesnão conseguem ver isso, confundemos dois, e "fingem que as vitóriassimbólicas traduzemse em resultadostangíveis." A realidade muitofrequentemente é que todo esforço éexercido enviando mensagenssimbólicas, enquanto quase nenhumamudança tangível significativaacontece – que é o que realmenteimporta.
Jensen não aponta isso paradizer que as ações simbólicas não sãoimportantes: afinal de contas, elasajudam a mostrar solidariedade, sãoindispensáveis para o recrutamento eajudam a moldar o discurso público.E elas podem causar uma mudançareal, mas primeiro pelo menos duascondições precisam ser satisfeitas: (1)o destinatário tem de estar dentro doalcance da mensagem, e (2) que apessoa deve estar disposta e ser capazde realizar a mudança. Isso é raro.Mais frequentemente do que o
contrário, as pessoas com poder detrazer mudanças não estão ao nossoalcance, e quando estão, elas ocupamposições institucionais, o que querdizer que podem ser facilmentesubstituídas pela estrutura e alguémvai continuar fazendo o seu trabalho.
O resultado de todos os esforçosestarem sendo direcionados paraações exclusivamente simbólicas éque o recrutamento que elasconseguem não será sustentado pormuito tempo sem vitórias tangíveis, esentimentos de desespero, frustraçãoe 'colapso nervoso' irão ocorrerdesenfreadamente. Jensen propõe queo desespero possa ser umacompreensão corporificada nãoreconhecida de que as táticas usadassimplesmente não estão realizando oque é desejado e que as metasperseguidas são insuficientes para ascrises que estão sendo enfrentadas.Portanto, outros caminhos maisdiretos podem não apenas ser boasideias para a causa, mas essenciais.
Uma abordagem convincenteestaria, sem dúvida, organizando umaorquestrada revolta regional,apontada o mais diretamente possívelao seu alvo, amplamente ligada comoutras comunidades, e concentrandose, ao mesmo tempo, em comunicarmensagens persuasivas – essasmensagens sendo não apenasreconhecimentos insurrecionais dailegitimidade, mirando tudo o que
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está em oposição a sociedades livrese nãoexploradoras (os levantesgregos que começaram no final dedezembro de 2008 são uma referênciaútil aqui), mas também mensagensque transmitam ideias para(re)criação prefigurativa (visão deuma sociedade participativa). Naessência, isto seria pensar de maneiraglobal e agir localmente e tãodiretamente quanto possível. UsandoMilton Friedman12 um poucomodificado: "quando [a crise épercebida], as ações que são tomadasdependem das ideias que estão por aí.Eis, creio eu, ser a nossa funçãobásica: desenvolver alternativas àspolíticas existentes para mantêlasvivas e disponíveis até que opoliticamente impossível se tornepoliticamente inevitável ".
Isto não significa um convite àviolência, mas prevejo táticas quevão desde campanhas de propagandade ensino à destruição direta depropriedades com, quem sabe, táticasadaptadas das operações da ALF e daELF, dos levantes gregos e de outrosmovimentos insurrecionais. Qualquerviolência real que ocorra apenas seria
12 Milton Friedman foi um economista eestatístico estadunidense que promoveuuma política macroeconômica chamada“monetarismo”, e exaltava as “virtudes”de um sistema econômico de livremercado com intervenção mínima. Éconsiderado um dos “pais” dolibertarianismo.
aquela resultante do status quotentando desesperadamente semanter.
Ao tornar tudo isso realizável etão eficaz quanto possível, odesmantelamento deve ser bempensado e suas mensagens bemconectadas para que a destruição emsi e de si não seja considerada comosendo o fim, mas sim o meio pararealizar as visões de algo melhor, epara fomentar o entendimento de queambos, (re)criação edesmantelamento, são cíclicos,reflexivos, e sempre precisam estarlivremente sendo trabalhadas emqualquer sociedade. A desmontagempode começar imediatamente e visõese ideias para uma sociedadeparticipativa precisam estar à mão eprontas. Muito parecido com as açõesmassivas dos Comitês de boasvindasa DNC e RNC13 em 2008, da Grécia,dos protestos contra a OMC, dasZapatistas – ondas similares de açãocoordenada regional podem vir a seformar. Há uma abundância de alvoslocais que merecem mensagenssemelhantes.
Breves Observações Finais
Tentei destacar o que acreditoser um caminho lógico da saúde à
13 Convenções Nacionais Democrática(DNC) e Republicana (RNC) nos EUA.
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revolução, ligando o que está nocerne do que perpassa o discurso dasaúde pública com movimentosglobais radicalmente participativosque já estão em ação. Como deveestar bem compreendido nestemomento na história, a saúde pessoalnão pode ser separada da saúdecomunitária, que por sua vez nãopode ser separada da saúde ecológica:um compromisso sincero com o bemestar naturalmente alimenta umdiscurso revolucionário chamandopara uma mudança fundamental emnossas estruturas política eeconômica, e na cultura como umtodo. A progressão a partir daquidepende da comunicação e dacompreensão de que esta é umaabordagem multiproblema, multifoco, multitática, orientada aocrescimento, e revolucionária.Existem inúmeras táticas e projetosque trabalham para a construção deuma sociedade participativa – tantoatravés da (re)criação quanto dodesmantelamento, e tanto simbólicaquanto não simbolicamente. A chaveé desenvolver e comunicar a visão econstruir um mundo de acordo comela.
Federação Anarquista de Luisville
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