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"FATORES DETERMINANTES DA OPINIÃO DO AUDITOR: ESTUDO EMPÍRICO DAS EMPRESAS PORTUGUESAS”
Maria Rosalina da Silva Costa, rosalina costa_88@hotmail.com
Sara Serra, sserra@ipca.pt
Patrícia Gomes, pgomes@ipca.pt
Área temática: Auditoria
Metodologia de investigação usada: Empirical archival
Palavras-Chave: Auditoria, relatórios de auditoria, determinantes da opinião do Auditor,
independência
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"FATORES DETERMINANTES DA OPINIÃO DO AUDITOR: ESTUDO EMPÍRICO DAS EMPRESAS PORTUGUESAS”
Resumo
As constantes mudanças que ocorrem no tecido empresarial instigam a instabilidade
e desconfiança dos utilizadores da informação financeira. Neste contexto, os stakeholders
procuram informação financeira fiável e clara para tomarem decisões ponderadas e com o
menor risco possível. No sentido de satisfazer estas necessidades, os organismos
profissionais de contabilidade têm manifestado grande preocupação em garantir a
qualidade da informação financeira.
A solução para o cumprimento dos objetivos anteriores deve passar pela realização
de uma auditoria uma vez que esta função desempenha um importante papel no seio das
empresas, quer no processo de prestação de contas, quer na redução das assimetrias de
informação. No entanto, o processo de auditoria apresenta limitações que nem sempre são
consideradas pelos utilizadores da informação financeira. Há, de facto, uma série de
determinantes que pretendemos estudar neste trabalho que são suscetíveis de influenciar a
opinião que o auditor irá emitir na certificação legal de contas (CLC). Para o efeito,
debruçamo-nos sobre os relatórios e contas, referentes ao ano de 2011, de 50 empresas
registadas na Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) para analisar a
influência dos seguintes fatores na opinião do auditor: (1) o tipo de Sociedade de Revisores
Oficiais de Contas (SROC) a que o auditor pertence, (2) o sexo, (3) a experiência
profissional do auditor, (4) os honorários recebidos pelo auditor pelos serviços de Revisão
Legal de Contas (RLC) e (5) extra RLC.
Os resultados revelaram que a opinião do auditor não é influenciada,
significativamente, por nenhum dos fatores estudados, o que pode indiciar grande
independência do auditor. Contudo, os sinais positivos e negativos das relações testadas
indicam que as variáveis “tipo de SROC”, “sexo do auditor” e “experiência profissional”
estão positivamente relacionadas com a opinião emitida pelo auditor, enquanto as variáveis
“honorários de RLC” e “honorários extra RLC” apresentam um sinal negativo.
Introdução
A opinião emitida pelo auditor resulta de decisões sobre a adequação e suficiência
da prova e das interpretações dos resultados obtidos nos seus procedimentos de auditoria.
Contudo, essas decisões podem ser influenciadas negativamente por fatores que estão
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relacionados com ameaças à sua independência. Neste sentido, o principal objetivo deste
estudo empírico consiste em analisar alguns fatores que podem constituir ameaças à
independência do auditor e consequentemente influenciar a opinião deste nos relatórios
que emite.
Para levar a cabo o teste de inferência estatística de associação entre as variáveis
definidas, formulamos um conjunto de hipóteses teóricas que determinarão o foco de
investigação. Com o intuito de obter evidência estatística, analisamos os relatórios e
contas, referentes a 2011, de 50 empresas do mercado secundário registadas na CMVM.
Entendemos que a pertinência deste estudo se deve, sobretudo, à ausência de
trabalhos sobre esta temática, aplicada à realidade portuguesa. Não obstante, pretendemos
também sublinhar a importância que a independência do auditor tem no contexto
empresarial, uma vez que grande parte das decisões são tomadas com base numa análise
das demonstrações financeiras. Portanto, a opinião que o auditor vai emitir na sequência do
trabalho de verificação dos elementos contabilísticos e financeiros, que são
responsabilidade da gestão, não deverá ser afetada por condicionalismos que
comprometam a sua independência.
Apesar dos resultados deste estudo terem revelado pouca significância estatística,
uma vez que nos levaram a concluir que nenhuma das variáveis exerce influência
significativa sobre a opinião do auditor, os sinais positivos e negativos das relações
indicam que as variáveis “tipo de SROC”, “sexo do auditor” e “experiência profissional”
estão positivamente relacionadas com a opinião emitida pelo auditor, enquanto as variáveis
“honorários de RLC” e “honorários extra RLC” apresentam um sinal negativo.
1. Determinantes da Opinião do Auditor
1.1 Tipo de SROC
Uma das variáveis mais estudadas pela literatura como representante da qualidade
da auditoria tem sido o tamanho da empresa de auditoria. Segundo DeAngelo (1981) e
Teoh e Wong (1993) os utilizadores confiam mais nas demonstrações financeiras auditadas
por empresas de auditoria de maior dimensão. Alguns autores apontam esta associação ao
facto de as grandes empresas possuírem mais recursos financeiros e humanos e melhores
recursos físicos, como meios tecnológicos avançados (Rodriguéz e Torres, 2005).
Adicionalmente, as grandes empresas de auditoria têm carteiras maiores de
clientes, o que lhes permite resistir à pressão dos clientes, ao passo que as empresas de
menor dimensão, devido à carteira de clientes mais reduzida, acabam por prestar serviços
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de forma, digamos que mais personalizada, mantendo relações de maior proximidade com
os clientes, levando-os a ceder mais facilmente às pressões dos clientes. Assim, empresas
de auditoria com grandes carteiras de clientes podem ter incentivos mais fortes para ser
diligentes nos seus exames às empresas clientes, para proteger a sua reputação e
independência (DeAngelo, 1981; Shwartz e Menon, 1985; Wallace, 1987; Chow et al.,
1988; Kothari et al., 1988; Palmrose, 1988; Lys e Watts, 1994, citados por Sori e Karbhari,
2006).
Muitos estudos têm vindo a demonstrar que a reputação do auditor tem associação
direta com a qualidade da auditoria. DeAngelo (1981) enunciou uma teoria económica,
sobre a qualidade de auditoria, segundo a qual as empresas de auditoria de maior dimensão
realizam auditorias de maior qualidade. Esta teoria é baseada nos custos em que as
empresas podem incorrer, caso realizem auditorias de baixa qualidade. Desta forma, o
autor sustenta que as grandes empresas de auditoria, por possuírem uma maior notoriedade
pública, teriam mais a perder se o seu nome fosse associado a escândalos financeiros e,
portanto, espera-se que os seus relatórios sejam mais confiáveis.
Rodriguéz (2007) apresenta alguns estudos que referem que a qualidade do serviço
prestado pelas grandes empresas de auditoria é mais visível quando o risco de incorrer em
litígios e perdas de reputação é elevado. Nestas situações, as empresas de auditoria tendem
a realizar um maior controlo das demonstrações financeiras dos seus clientes, com vista à
prestação de um serviço de maior qualidade. Por outro lado, existem estudos que referem
que esta diferenciação entre empresas de auditoria de maior ou menor dimensão
desaparece quando o risco de litígios e perda de reputação é inferior. A título de exemplo,
o autor refere que em países com baixo risco de litígio e baixo nível de proteção do
investidor, as diferenças entre grandes e pequenas empresas de auditoria são menos
visíveis, uma vez que as grandes empresas de auditoria tenderão a exercer um menor
controlo sobre os seus clientes. Os resultados destes estudos mostram que as empresas de
auditoria de maior dimensão encerram em si algum oportunismo, produzindo auditorias de
maior qualidade quando enfrentam situações de maior risco e auditorias de menor
qualidade quando o risco não é tão elevado.
Desta forma, será pertinente avaliar a relação existente entre o tipo de empresa de
auditoria e a opinião do auditor, definindo-se, para o efeito, a seguinte hipótese de
investigação:
H1 - A opinião emitida pelo auditor está diretamente relacionada com o
tipo de SROC a que o mesmo pertence.
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1.2 Sexo do Auditor
Ao longo dos anos, têm sido realizados estudos sobre a influência do género do
auditor na opinião emitida por estes nos relatórios de auditoria. Ittonen et al. (2012)
apresentam alguns estudos que sugerem que o sexo do auditor pode afetar o processo de
auditoria. Chung e Monroe (2001) documentam que os auditores do sexo feminino são
mais precisos e eficazes processadores de informação em tarefas de auditoria complexas.
O'Donnell e Johnson (2001) acrescentam que auditores do sexo feminino podem apresentar
maior eficiência nos julgamentos de auditoria e Gold et al. (2009) constataram que
auditores do sexo feminino são menos influenciados por explicações do cliente, podendo
desta forma ser vistos como mais independentes do que os auditores de sexo masculino.
Neste estudo realizado por Ittonen et al. (2012) os autores examinaram a relação entre os
auditores de sexo feminino e os honorários de auditoria num cenário empírico usando
dados de três países nórdicos. Os seus resultados indicam que as empresas onde os
auditores são de sexo feminino têm honorários de auditoria mais elevados, sugerindo que o
sexo do auditor pode afetar o esforço de auditoria. A este respeito, Fondas e Sassalos
(2000) argumentam que as mulheres tendem a ter maiores expetativas em relação às suas
responsabilidades, o que pode levá-las a um maior esforço nas suas tarefas e,
consequentemente, à existência de honorários mais elevados (Ittonen et al., 2012).
Hossain e Chapple (2012) elaboraram um estudo que consistiu na avaliação da
influência do sexo do auditor, especificamente no que respeita à opinião emitida. Assim, os
autores partiram de alguns estudos existentes para fomentarem as suas asserções, focando
dois dos estudos empíricos mais importantes sobre esta temática, formulados por Chin e
Chi (2008) e Hardies et al. (2010) que investigam a associação entre o sexo do auditor e a
emissão de um relatório de auditoria modificado. Os resultados destes estudos mostram
que os auditores de sexo feminino são menos suscetíveis de emitir pareceres modificados e
também menos propensos a emitir um parecer sobre a continuidade da atividade para as
empresas com maiores dificuldades financeiras. Esta descoberta fornece evidências de
diferencial de qualidade de auditoria quando o auditor é uma mulher, mas não atribui uma
causa para este resultado. Por exemplo, Hardies et al. (2010) referem que o facto de os
auditores de sexo feminino evitarem emitir opiniões modificadas é atribuído ao receio de
que o cliente rescinda o contrato de prestação de serviços caso a opinião de auditoria não
seja a que melhor lhe prouver. Alguns estudos acrescentam que os auditores do sexo
feminino podem considerar a não emissão de uma opinião modificada, porque são mais
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avessos ao risco do que os auditores do sexo masculino. A intuição predominante a partir
da literatura sobre esta temática é que os auditores do sexo feminino resistem a uma
opinião de auditoria modificada, porque isso irá influenciar a decisão do cliente de mudar
ou manter o auditor (Krishnan, 1994; Krishnan e Stephens, 1995; Lennox 2000; Gomez
Aguilar e Ruiz-Babadillo 2003; Ruiz- Babadillo et al., 2006 e Ruiz-Babadillo et al., 2006),
citados por Hossain e Chapple (2012). Inversamente, um estudo elaborado por Breesch e
Branson (2009), relata que não existe qualquer diferença na gravidade da opinião de
auditoria emitida por auditores do sexo feminino e masculino.
Com base nos resultados da investigação desenvolvida por Hardies et al. (2010), é
razoável supor que perceções sobre a competência e independência do auditor são de
preconceito de género, ou seja, o sexo funciona como um estímulo para anexar sentimento
diferente ou valor à informação. Indiscutivelmente, informações fornecidas pelos auditores
do sexo feminino e masculino não são vistas como sendo igualmente credíveis e, portanto
valiosas. No entanto, do acima exposto, não é, claro se o sexo do auditor pode ter ou não
influência sobre a qualidade da auditoria. Face ao exposto, formulamos a seguinte hipótese
de investigação:
H2 - A opinião emitida pelo auditor está diretamente relacionada com o
sexo do auditor.
1.3 Experiência do auditor
Mahdavi e Houshmand (2012) referem que as principais condicionantes da
qualidade da auditoria não são as normas de auditoria, mas antes os atributos pessoais dos
auditores, como o seu nível de formação e os padrões éticos. Os autores argumentam que
as qualidades pessoais dos sócios das empresas de auditoria e dos colaboradores das
equipas de auditoria, juntamente com a formação, são importantes fatores que determinam
a qualidade do serviço prestado pelo auditor.
Seguindo a mesma linha de pensamento, Carcello et al. (1992) apontam como
fatores importantes para a qualidade da auditoria as caraterísticas relacionadas com os
membros das equipas de auditoria. Neste sentido, são apontados como fatores a
experiência das equipas de auditoria, o conhecimento da indústria/setor, a capacidade de
resposta às necessidades do cliente e ainda a atuação em conformidade com as normas de
auditoria. Num estudo realizado pelos autores, o atributo que mais se destacou como
determinante na qualidade da auditoria foi a experiência dos membros das equipas de
auditoria.
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De acordo com Duff (2004), as empresas de auditoria precisam atrair colaboradores
com as necessárias competências técnicas e interpessoais para melhorar a qualidade do
serviço prestado. Esta mesma opinião é partilhada por Arruñada (2000), que salienta que a
qualidade da auditoria depende da competência técnica do auditor, ou seja, da sua
capacidade de detetar possíveis distorções materiais presentes nas demonstrações
financeiras e da independência para transmitir uma opinião objetiva sobre essas mesmas
demonstrações financeiras.
Knechel (2007) refere que a auditoria depende do julgamento do auditor e, por sua
vez, a qualidade do julgamento do auditor depende das caraterísticas deste. Assim, a
independência dos auditores está associada à liberdade no julgamento sobre os factos em
análise e na sua capacidade de formular uma opinião justa e isenta. No entendimento do
autor a probabilidade de descobrir uma distorção materialmente relevante depende, entre
outros fatores, da perícia técnica do auditor, da resolução de problemas, do perfil de risco e
experiência do auditor.
De acordo com Libby e Frederick (1990), os auditores mais experientes tendem a
detetar um maior número de erros do que os auditores com menos experiência profissional.
No entendimento dos autores, o conhecimento baseado na experiência potencia a qualidade
dos serviços prestados, podendo garantir uma auditoria de qualidade superior. Os estudos
salientam, ainda, que a experiência aumenta a probabilidade de emissão de uma opinião
positiva, o que nos leva a formular a seguinte hipótese de investigação:
H3 - A opinião emitida pelos auditores está diretamente relacionada com a
sua experiência profissional.
1.4 Valor dos Honorários
Os honorários dos auditores apresentam-se como um dos elementos que podem
colocar em causa a liberdade e capacidade de emitir uma opinião isenta, pelo que é sempre
uma questão muito delicada. Por um lado, porque não devem influenciar o esforço
depositado pelo auditor ao longo de toda a auditoria, por outro, porque se elevados
honorários podem conduzir a situações de dependência.
Em Portugal, esteve em vigor uma tabela de honorários mínimos, variável em
função da dimensão da entidade auditada. Porém, esta foi eliminada a partir de 1 de Janeiro
de 2005. Desta forma, o EOROC passou a dispor no seu artigo 60º que “os honorários são
fixados entre as partes, tendo em conta critérios de razoabilidade que atendam, em
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especial, à natureza, extensão, profundidade e tempo do trabalho necessário à execução
de um serviço de acordo com as normas de auditoria em vigor”.
Os honorários faturados pelos auditores mereceram, ainda, um destaque especial no
novo código de Ética da OROC que tece algumas considerações importantes sobre esta
problemática, clarificando alguns dos aspetos que poderão constituir ameaças à
independência dos auditores. Desde logo, tendo em conta o critério de razoabilidade
previsto no n.º 1 do artigo 60.º do EOROC e na Secção 4 do Código de Ética da OROC
clarifica-se que o facto de um auditor propor ou praticar honorários inferiores aos
praticados ou propostos por outro não é, por si só, uma falta de ética. No entanto, podem
existir ameaças ao cumprimento dos princípios fundamentais resultantes do nível de
honorários propostos ou praticados. Por exemplo, é criada uma ameaça de interesse pessoal
à competência e zelo profissional se os honorários praticados forem, excessivamente,
baixos ao ponto de constituírem uma fonte de pressão para a não execução do trabalho de
acordo com as normas técnicas e profissionais aplicáveis. Desta forma, a existência e
significado de quaisquer ameaças criadas dependerão de circunstâncias tais como o nível
dos honorários praticados e os serviços a que respeitem. Caberá ao auditor avaliar a
importância de qualquer ameaça e aplicar as salvaguardas necessárias para a eliminar ou
reduzir a um nível aceitável.
Segundo Gul et al. (1992), quando os honorários assumem um peso importante nas
receitas totais dos auditores, a perceção por parte de terceiros da capacidade destes
resistirem ao poder dos gestores é negativamente afetada, sugerindo uma ligação entre
reputação e independência. Neste contexto, parece-nos pertinente estudar a seguinte
hipótese:
H4 - A opinião emitida pelo auditor está diretamente relacionada com os
honorários recebidos pelo auditor decorrentes de serviços de RLC.
Seabrigh et al. (1992) acrescentam que perante a existência de uma forte relação
económica entre o auditor e o cliente, o auditor tem um incentivo para ignorar potenciais
problemas e emitir uma opinião limpa, violando assim um princípio genérico e inalienável
que é o princípio da independência. O facto de aumentar a probabilidade de um cliente
mudar de auditor na sequência de um relatório de auditoria desfavorável é suscetível de
reduzir a disposição do auditor para a emissão desse relatório. As evidências encontradas
por Farmer et al. (1987) vão nesse mesmo sentido, uma vez que pelos estudos realizados,
estes autores referem que os auditores tendem a concordar com as demonstrações
financeiras das suas empresas clientes se o risco de perderem esses mesmos clientes for
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maior. No entanto, autores como Reynolds e Francis (2001) e DeFond et al. (2002)
salientam que a proteção da reputação do auditor e o custo de litígios são suficientes para
superar a possível perda de objetividade resultante da dependência económica e, portanto,
prevalecem sobre os benefícios esperados com o comprometimento da independência.
Nos últimos anos têm-se multiplicado as preocupações relativamente às ameaças à
independência do auditor, com destaque para a intensidade crescente da concorrência no
setor da auditoria, em especial, no que diz respeito às grandes empresas de prestígio. Pese
embora, a concorrência permita uma maior dinamização do mercado, deverão ser
salvaguardados os princípios da transparência e concorrência de modo a que os auditores
não proponham uma remuneração que não lhes permita exercer a sua função de acordo
com as normas profissionais. Alguns observadores põem a hipótese de, nestas
circunstâncias, os vencedores dos concursos esperarem recuperar o diferencial face ao
custo da auditoria, através da prestação de serviços extra auditoria. Segundo Coffee (2002),
uma das principais causas das fraudes nos Estados Unidos da América (EUA), ao longo
dos anos 90, foi o aumento exponencial dos incentivos dos auditores para colaborar com os
seus clientes, à medida que as principais sociedades de auditoria (as chamadas Big Five1)
se aperceberam do quanto podiam beneficiar com a prestação simultânea de serviços de
auditoria e extra auditoria. Com efeito, muitos viam a prestação de serviços de auditoria
como uma ferramenta para atrair clientes lucrativos, a quem vendiam serviços extra
auditoria. Esta questão conduz a outro problema, isto é, o da prestação de serviços
diferentes dos da auditoria.
A questão do auditor ser autorizado a efetuar, junto de um cliente, outras funções
para além das de auditoria tem sido objeto de numerosas discussões. No entendimento de
Arruñada (1999), a prestação de serviços extra auditoria, junto de um cliente ao qual se
presta serviços de auditoria, permite ao auditor aprofundar o seu conhecimento acerca da
entidade e das atividades do seu cliente e, portanto, permite-lhe exercer melhor a sua
função de auditor. O autor acrescenta que, nada prova que a existência de outras
remunerações em relação às remunerações ligadas à missão de auditoria constitua uma
ameaça para a objetividade do auditor. Todavia, existe, também, uma convicção muito
forte de que a prestação de uma gama importante de serviços para além dos de auditoria
pode prejudicar a objetividade do auditor em relação ao seu cliente. Daqui surge uma nova
hipótese de investigação:
1 Arthur Andersen, Deloitte & Touche, Ernst & Young, KPMG e PW Coopers.
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H5 - A opinião emitida pelo auditor está diretamente relacionada com os
honorários recebidos pelo auditor decorrentes de serviços de extra RLC.
Desde o início dos anos 90, e até à entrada em vigor do Sarbanes Oxley Act,
assistia-se a uma tendência crescente para as entidades pagarem muito mais por serviços
extra auditoria do que por serviços de auditoria. Coffee (2002) refere que esta situação
gerou dois problemas. Em primeiro lugar, criou um incentivo para os auditores quererem
agradar aos seus clientes e, em segundo, permitiu aos clientes pressionar os seus auditores,
ameaçando dispensar os seus serviços extra auditoria. O primeiro problema afetava não
apenas as sociedades de auditoria, mas também o sócio responsável pela auditoria, por dois
motivos: (1) porque a remuneração deste era indexada ao valor dos serviços extra auditoria
que conseguisse vender ao seu cliente de auditoria; (2) porque os demais sócios o
pressionavam para vender esses serviços.
Na senda deste pensamento, Santos (2009) apresenta alguns estudos onde os
autores sumariam argumentos a favor e contra a prestação de serviços extra auditoria pelos
auditores aos seus clientes de auditoria. Na opinião de Carmichael e Swieringa (1968), a
prestação de serviços extra auditoria por parte dos auditores, aos seus clientes de auditoria,
inclui o facto de estes poderem estar a auditar o seu próprio trabalho. Adicionalmente
sugere que o fornecimento de serviços extra pode levar os auditores a desenvolver
interesses mútuos com as gestões das sociedades que requerem estes tipos de serviços. O
terceiro argumento contra refere que os auditores poderão sofrer conflitos de interesses
fiduciários, já que os seus clientes de auditoria seriam os acionistas da sociedade, mas o
cliente dos serviços de não auditoria seria a gestão da empresa. Craswell (1988) refere que
a evidência empírica quanto ao facto de os serviços extra auditoria deteriorarem ou não a
independência é inconclusiva, apresentando as conclusões contraditórias de estudos
australianos sobre o impacto das retribuições dos honorários dos serviços extra auditoria
nas decisões dos pareceres dos auditores, levados a cabo por Barkess e Simnett (1994) e
Wines (1994). Craswell (1988) acrescenta que enquanto os primeiros autores não
conseguiram encontrar qualquer relação, Wines (1994) conseguiu fazê-lo. Por seu turno,
Firth (2002) estudou no Reino Unido a relação existente entre os honorários dos serviços
extra auditoria e os honorários dos serviços de auditoria e a associação dos serviços extra
auditoria e a incidência nos pareceres dos auditores. Relativamente à primeira relação,
Firth (2002) concluiu pela existência de uma associação significativa entre os honorários
dos serviços de auditoria e serviços extra auditoria. Quanto à associação dos serviços extra
auditoria e a incidência nos pareceres dos auditores concluiu que, quanto mais elevados
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forem os honorários dos serviços extra auditoria pagos ao auditor maior probabilidade
existe de o parecer do auditor ser “limpo”. Também Li et al. (2003) chegaram a esta
conclusão num estudo realizado nas 200 maiores sociedades da Nova Zelândia, durante
três anos (1999, 2000 e 2001).
2. Metodologia
Neste artigo pretendemos, em primeiro lugar, estudar a relação existente entre a
opinião emitida pelo auditor e o tipo de SROC a que este pertence. De facto, será de
esperar que uma empresa de auditoria multinacional, quer pela sua dimensão quer pelos
recursos que possui, tenha uma atuação diferente de uma empresa representada apenas a
nível nacional e, por conseguinte, com menos reputação. Não obstante, será também
pertinente estudar algumas características intrínsecas ao próprio auditor. Assim, decidimos
estudar a relação existente entre a opinião emitida pelo auditor e o seu sexo e experiência
profissional. Pretendemos de igual modo, estudar a associação entre a opinião emitida
pelos auditores nos relatórios de auditoria e os honorários recebidos, quer pelos serviços de
RLC como pelos serviços extra RLC.
Considerando a natureza da investigação e o tipo de informação a recolher, que
deverá permitir medir os atributos que exercem influência sobre a opinião emitida pelos
auditores, pareceu-nos mais adequado recorrer ao método da análise documental. A opção
por este método deveu-se, essencialmente, ao facto deste se apresentar como um meio
flexível de obtenção de informações e útil para analisar as tendências e padrões dos
documentos, tal como assevera Stemler (2001). Lee e Guthrie (2010) consideram que este
método é uma ferramenta poderosa por ser das poucas técnicas disponíveis para a análise
de repositórios de texto, que constituem a maioria das comunicações de negócios.
Tendo por base a supracitada metodologia, esta investigação foi ministrada através
da recolha dos relatórios e contas e dos relatórios sobre o Governo das Sociedades,
referentes a 2011, das empresas com ações cotadas no mercado secundário da Euronext
Lisbon. A opção pela análise a relatórios anuais (e não outro tipo de publicação,
nomeadamente relatórios trimestrais e semestrais) justifica-se pela inserção de informações
mais completas nos relatórios publicados com informações anuais.
O período de recolha dos dados decorreu entre setembro e novembro de 2012 e
abrangeu 50 empresas, das quais 41 pertencem ao setor não financeiro e 9 ao setor
financeiro.
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Após a recolha dos dados no site da CMVM, e em alguns casos nos sites das
empresas estudadas, por não se encontrar a informação publicada no site da CMVM, estes
foram tratados com recurso ao programa informático Statiscal Package for Social Science
(SPSS), de forma a tratar e analisar os dados e testar as hipóteses formuladas.
O tratamento dos dados consistiu essencialmente numa análise univariada, cujos.
resultados serão apresentados em tabelas nos pontos seguintes. Posteriormente, para testar
as hipóteses de investigação propostas foi efetuada uma análise bivariada utilizando-se
para tal o coeficiente de correlação não paramétrico Ró de Spearman. Por fim, com o
intuito de verificar o poder preditivo das variáveis independentes sobre a nossa variável
dependente (opinião), procedeu-se à análise multivariada com a estimação do modelo de
regressão logística. A opção por este modelo, deveu-se ao facto da nossa variável
dependente ser do tipo nominal dicotómico.
3 Apresentação do Modelo
Tendo em conta estes pressupostos teóricos, a variável dependente desta
investigação é a opinião emitida pelos auditores nos relatórios de auditoria, o qual pode ser
modificado ou não modificado. Por sua vez, as variáveis independentes definidas foram, o
tipo de SROC a que o auditor pertence, o perfil do auditor, onde estudamos o sexo do
auditor e a experiência profissional como determinantes da opinião emitida por estes, os
honorários recebidos pelos auditores quer pelos serviços RLC quer por serviços extra RLC
prestados ao cliente, nomeadamente a prestação de serviços de consultoria.
A tabela seguinte apresenta uma síntese com a descrição das variáveis incluídas no modelo.
Tabela 1: Descrição das Variáveis
Descrição da variável Medida da Variável Sigla da Variável Estísticas DEPENDENTE
Opinião emitida pelo auditor
0: Opinião sem reservas nem ênfases; 1: Opinião com reservas
e/ou ênfases
OEA 0: 66% 1: 34%
INDEPENDENTE
Tipo de SROC 0: Multinacional; 1: Nacional SROC 0: 88% 1: 12%
Sexo do Auditor 0: Masculino; 1: Feminino SxAudit 0: 84% 1: 16%
Experiência Profissional 1: <10 Anos; 2: de 11-20 Anos; 3: de 21-30 Anos; 4: de 31-40 Anos ExProf
1: 20% 2: 42% 3: 32% 4: 6%
Honorários RLC 1: até 30%; 2: de 31%-50%; 3: de 51%-70%; 4: de 71%-90%; 5:>
91% HonRLC
1: 4% 2: 12% 3: 22%
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4: 30% 5: 32%
Honorários Extra RLC 1: até 30%; 2: de 31%-50%; 3: de 51%-70%; 4: de 71%-90%; HonExtraRLC
1: 62% 2: 22% 3: 12% 4: 4%
Do exposto, a equação que representa o modelo estimado é a seguinte:
Onde: OEA – opinião emitida pelo auditor no relatório de auditoria; SROC – tipo de sociedade de
revisores oficiais de contas; SxAudit – sexo do auditor; ExProf – experiência profissional do
auditor; HonRLC – honorários de revisão legal de contas; HonExtraRLC – honorários extra
revisão legal de contas; β0 a β7 – coeficientes estimados; ε – termo de erro.
4. Análise e discussão dos resultados 4.1. Análise Univariada
Concluído o tratamento dos dados recolhidos, apresentamos os resultados da
análise univariada, que constam na tabela seguinte:
Tabela 2: Estatísticas descritivas
Variável N Média Desvio Padrão Min. Máx.
DEPENDENTE
Opinião 50 0,34 0,479 0 1
INDEPENDENTE
Tipo de SROC 50 0,12 0,328 0 1
Sexo do Auditor 50 0,16 0,37 0 1
Experiência Profissional 50 2,24 0,847 1 4
Honorários RLC 50 3,74 1,157 1 5
Honorários Extra RLC 50 1,58 0,859 1 4
No que concerne à variável “Opinião”, verificou-se que 66% dos relatórios das
empresas auditadas são não modificados. Não obstante, embora sem afetar a opinião do
auditor, 30% das empresas receberam relatórios de auditoria com ênfases, ao passo que
apenas 4% receberam relatórios de auditoria com ênfases e com reservas, ou seja, 34% dos
OEA = �0 + �1SROC+ �2 SxAudit + �3 ExProf + �5 HonRLC + �6 HonExtraRLC + �,
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relatórios são modificados. A predominância de relatórios de auditoria não modificados
pode dever-se ao facto de se tratarem de empresas cotadas com maiores obrigações de
relato financeiro. Estas empresas são, geralmente, mais diligentes na preparação da
informação financeira, não só porque são alvo de mais exigências legais e contabilísticas,
mas porque visam atrair investidores. Por conseguinte, a receção de relatórios de auditoria
modificados poderá tornar a empresa menos atrativa aos olhos dos investidores, uma vez
que indiciará falta de fiabilidade ou transparência nas demonstrações financeiras ou
problemas de outra índole. A título de exemplo podemos referir os estudos empíricos de
Chow e Rice (1982), Choi e Jeter (1992), Cabal (2001), assim como Lin, Tang e Xiao
(2003) que concluíram que os relatórios de auditoria, principalmente com reservas, têm um
impacto significativo e negativo na cotação das ações, ou seja, a presença de relatórios de
auditoria modificados implica uma descida do valor das ações.
Relativamente à variável “Tipo de Sociedade de Revisores” (SROC) aferimos que
88% das SROC, responsáveis pela auditoria das empresas em estudo, são multinacionais,
enquanto que, apenas, 12% exercem atividade somente a nível nacional. À semelhança do
que foi referido anteriormente, este resultado pode estar relacionado com o desejo de
aumentar a reputação da entidade auditada, pois tal como refere Teoh e Wong (1993), os
stakeholders confiam mais nas demonstrações financeiras auditadas por este tipo empresas,
uma vez que nas mesmas os custos de perda de reputação são superiores. Deste modo, para
manter a sua reputação, estas empresas de auditoria tenderão a ser mais independentes.
Contrariamente, uma investigação levada a cabo por Gonçalves (2009) verificou que os
relatórios de auditoria emitidos pelas empresas de auditoria multinacionais são geralmente
mais “brandos” que os emitidos por auditores nacionais. Ou seja, tendencialmente as
empresas de auditoria multinacionais apresentam menos relatórios modificados, o que
pode explicar o facto de a maior parte das empresas estudadas optarem por SROC
multinacionais.
Em segundo lugar, apresentamos os aspetos relacionados com o perfil do auditor.
Os dados analisados indicam que num universo de 50 empresas auditadas, 42 dos sócios
responsáveis pela auditoria são de sexo masculino, os quais representam 84% da amostra
total, ao passo que apenas 8 auditores são do sexo feminino, representando 16%.
Relativamente à experiência profissional, 20% dos auditores têm menos de 10 anos
de experiência, 42% tem entre 11 e 20 anos de experiência, 32% tem entre 21 e 30 anos de
experiência, sendo que apenas 6% tem mais de 31 anos de experiência.
15
Quanto à variável honorários de RLC, pela análise dos dados obtidos verificamos
que, em 16 das empresas auditadas, os honorários de RLC representam mais de 91% do
total de honorários pagos ao auditor e em 15 das empresas a percentagem de honorários
pagos aos auditores pelos serviços de RLC situa-se entre 71% e 90%. Em 11 empresas os
honorários de RLC representam uma percentagem entre 51% e 70%, ao passo que em 6
das empresas estudadas o valor dos honorários de RLC encontra-se entre 31% e 50% do
total de honorários pagos ao auditor. Apenas em 2 das empresas este tipo de honorários
representa uma percentagem igual ou inferior a 30% do total de honorários pagos pelos
serviços de RLC.
No que respeita a honorários de serviços extra RLC, os dados apontam que os
honorários pagos por este tipo de serviços em 31 das empresas estudadas representam uma
percentagem inferior a 30%. Em 11 das empresas estudadas verifica-se que a percentagem
de honorários pagos por serviços extra RLC se situa entre 30% e 50% ao passo que 6
empresas referem situar-se entre 51% e 70% do total de honorários pagos. Apenas em 2
empresas os honorários extra RLC representam uma percentagem entre 71% e 90% do
total de honorários pagos ao auditor.
De um modo geral, verificamos que a percentagem de honorários pagos aos
auditores pelo serviço de RLC é superior aos honorários pagos por serviços extra RLC. A
este propósito salientamos os resultados de alguns estudos que referem que a prestação de
uma gama importante de serviços para além dos de auditoria pode prejudicar a
objetividade do auditor em relação ao seu cliente. Autores, como Coffee (2002), referem
que se os honorários de serviços extra RLC forem superiores aos honorários pagos pelos
serviços de auditoria cria-se, não só um incentivo para os auditores quererem agradar aos
seus clientes, como permite aos clientes pressionar os auditores, ameaçando dispensar os
seus serviços de auditoria. Por isso, os resultados obtidos na nossa investigação levam-nos,
desde logo, a considerar que as empresas estão atentas e cumprem as exigências legais para
salvaguardar a independência.
4.2. Análise Bivariada e Multivariada
Na análise à intensidade de associação entre as variáveis usamos o coeficiente não
paramétrico Ró de Spearman e interpretamos a associação linear entre as variáveis como
sendo: associação linear muito baixa para Ró menor que 0,2. Para valores situados entre
0,2 e 0,39 a associação linear é baixa, sendo uma associação linear moderada para valores
16
de Ró entre 0,40 e 0,69. Entre 0,7 e 0,89 a associação linear é alta e entre 0,9 e 1 é muito
alta. O sinal negativo da correlação significa uma variação em sentido contrário nas
variáveis, isto é, as categorias mais elevadas de uma variável estão associadas a categorias
mais baixas de outra variável (Pestana e Gageiro, 2008). Os resultados desta análise estão
apresentados em forma de síntese na tabela 3.
Tabela 3: Resultados da Análise Bivariada
Variáveis Rho de Spearman
Coeficiente de Correlação P-Value Tipo de SROC 0,255 0,074
Sexo do Auditor 0,032 0,824
Experiência Profissional 0,185 0,198
Honorários RLC 0,146 0,312
Honorários Extra RLC -0,120 0,407
Com vista a complementar as análises univariada e bivariada, apresentamos na
tabela 4 os resultados do modelo de regressão estimado. De referir que o coeficiente de
determinação apresenta um valor baixo (R2 = 6,532) significando um reduzido ajustamento
do modelo. Apesar da falta de significância das relações testadas neste modelo, o sinal
verificado confirma os estudos apresentados na revisão de literatura, tal como se analisa de
seguida.
Tabela 4: Resultados da Análise Multivariada
Variáveis Independentes
Hipóteses Coeficientes estimados
Significância
SROC H1(+) 1.216
0,346
SEXO H2(+) 0,598 0,542 EXPROF H3(+) 0,376 0,444 HONRLC H5(-) -0,107 0,903 HONEXTRARLC H6(-) -0,205 0,857 Constante -0,816 0,873 N 50 -2Log likelihood 60.157 R2 6.532 Nagelkerke R2 0.105
17
De seguida, apresentamos os resultados das análises bivariada e multivariada
para cada uma das hipóteses formuladas, retirando as principais conclusões.
H1 - A opinião emitida pelo auditor está diretamente relacionada com o tipo de SROC a
que o mesmo pertence.
Na amostra usada nesta investigação 88% das SROC são multinacionais. São,
portanto, empresas de considerável dimensão, onde as Big Four2 representam uma
poderosa percentagem, o que, desde logo, poderá ser um indício de que as empresas
auditadas atribuem maior credibilidade às empresas de auditoria de maior dimensão, o que
pode ser traduzido pela objetividade e independência da opinião emitida no âmbito da
CLC. Os estudos de DeAngelo (1981) e Teoh e Wong (1993) comprovam que os próprios
utilizadores conferem mais credibilidade às empresas de auditoria multinacionais, o que
pode motivar as empresas sujeitas a auditoria a contratar este tipo de empresa. No entanto,
neste estudo não conseguimos provar que a opinião emitida pelos auditores está associada
ao tipo de SROC a que o mesmo pertence. Esta constatação deve-se ao facto do valor da
correlação de Spearman ser baixo (0,255), levando-nos a reter a hipótese nula (H0) e,
consequentemente, concluir que não há associação entre a opinião emitida pelos auditores
e o tipo de SROC a que pertencem. Não obstante, e apesar de estarmos perante um
resultado estatisticamente não significativo, este está muito próximo do ponto de corte de
0,05 (p-value = 0,074) e portanto é designado de resultado marginalmente significativo3.
Cumpre referir que, o resultado da análise multivariada com recurso ao modelo de
regressão logística reforça esta mesma conclusão (p-value = 0,346), sendo que o sinal
positivo indica que a probabilidade da opinião ser modificada é maior quando a SROC é
nacional, corroborando os resultados do estudo elaborado por Gonçalves (2009) que
conclui que as empresas de auditoria multinacionais emitem menos relatórios modificados
que as empresas de auditoria nacionais.
H2 - A opinião emitida pelo auditor está diretamente relacionada com o sexo do auditor.
2 Deloitte & Associados, SROC, S.A; PricewaterhouseCoopers & Associados, SROC, Lda.; KPMG & Associados, SROC, S.A e Ernst & Young Audit & Associados, SROC, S.A.
3 Recentemente a comunidade científica optou por distinguir, de entre os resultados não significativos, aqueles que são inferiores a 0.10, ou seja, cuja probabilidade de ocorrência devida ao acaso ser 10 em 100 vezes. Ou seja, apesar de não serem estatisticamente significativos devem ser tratados como resultados marginalmente significativos (Martins, 2011), o que acontece neste caso.
18
Pela revisão da bibliografia verificamos a falta de uniformidade em relação à
variável sexo, uma vez que os estudos apresentados não são concordantes e, como tal, não
é claro se o sexo do auditor pode ter ou não influência sobre a qualidade da auditoria. Se
por um lado, autores como Chin e Chi (2008), citados por Hossain e Chapple (2012), e
Hardies et al. (2010) associam a opinião emitida ao sexo do auditor por outro lado, um
estudo elaborado por Breesch e Branson (2009) relata que não existe qualquer diferença na
gravidade da opinião de auditoria emitida por auditores do sexo feminino e masculino.
Na nossa investigação, a correlação encontrada entre a opinião emitida pelos
auditores e o sexo do auditor é de 0,032 com uma probabilidade associada de p = 0,824.
Estes resultados vão de encontro com os resultados obtidos por Breesch e Branson (2009),
levando-nos a verificar que estamos perante a ausência de correlação entre as variáveis em
estudo, pelo que poderemos concluir que a opinião emitida pelo auditor não está
diretamente relacionada com o sexo do auditor. Contudo, os resultados do modelo de
regressão logística revelam uma relação positiva entre estas duas variáveis (p-value =
0,542). Apesar de não ser uma relação significativa, o sinal positivo indica que a
probabilidade de emissão de um relatório de auditoria modificado pode ser maior quando o
responsável pela auditoria é do sexo feminino, contrariando, assim, os resultados obtidos
por Chin e Chi (2008) e Hardies et al. (2010).
H3 - A opinião emitida pelos auditores está diretamente relacionada com a sua
experiência profissional.
Neste caso, a correlação encontrada entre estas duas variáveis é de 0,185 (rs
=0,20)4 com uma probabilidade associada de p = 0,198. Como p-value é superior a 0,05
não rejeitamos a hipótese nula (H0), concluindo, desta forma, que não existe associação
entre a opinião emitida pelos auditores e a sua experiência profissional. Estes resultados
contrariam as ilações dos estudos empíricos efetuados pela generalidade dos autores
referidos na revisão da bibliografia. Contudo, o sinal positivo revela que há uma tendência
para que os auditores com mais experiência apresentem relatórios modificados com maior
frequência, o que contraria os estudos apresentados por Libby e Frederick (1990) que
salientam que a experiencia aumenta a probabilidade de emissão de uma opinião positiva.
4 Os resultados de testes inferenciais devem ser arredondados à segunda casa decimal. No caso do valor de p (ou significância estatística), deve ser apresentado o seu valor exato, arredondando-se à segunda ou terceira casa decimal (Martins, 2011).
19
H4 - A opinião emitida pelo auditor está diretamente relacionada com os honorários
recebidos pelo auditor decorrentes de serviços de RLC.
A correlação encontrada entre a opinião emitida pelo auditor e os honorários
recebidos pelos serviços de RLC é 0,146 (rs =0,15) com uma probabilidade associada de p
= 0,312. Por conseguinte, não existe associação significativa entre a opinião emitida pelos
auditores e os honorários que este recebe pelos serviços de RLC. Adicionalmente, os
resultados da análise multivariada permitem-nos verificar que estas duas variáveis se
encontram negativamente relacionadas. Esta relação negativa significa que a probabilidade
de emitir relatórios modificados diminui à medida que os honorários aumentam, embora
esta relação não tenha significância estatística. Esta conclusão reforça os resultados de
autores como Farmer et al. (1987) e Seabrigh et al. (1992) que referem que quanto mais
dependente, financeiramente, estiver o auditor do cliente maior é a probabilidade deste
emitir uma opinião limpa, para não desagradar o seu cliente. Inversamente, Reynolds e
Francis (2001) e DeFond et al. (2002) defendem que a proteção da reputação do auditor e o
custo de litígios se sobrepõem aos benefícios esperados com o comprometimento da
independência.
H5 - A opinião emitida pelo auditor está diretamente relacionada com os honorários
recebidos pelo auditor decorrentes de serviços de extra RLC.
Os resultados desta investigação, ainda que revelem a inexistência de uma relação
significativa entre os honorários pagos pela prestação de serviços extra RLC e os pareceres
emitidos pelos auditores, indicam uma relação inversa entre as variáveis. Isto significa que
quanto maiores os honorários extra RLC pagos à SROC, maior a probabilidade deste emitir
um relatório não modificado. Este resultado vai de encontro ao do estudo de Firth (2002),
realizado nos Estados Unidos, que concluiu que quanto mais elevados forem os honorários
dos serviços extra auditoria pagos ao auditor, maior a probabilidade deste emitir um
parecer não modificado (Santos, 2009).
Este resultado vem, ainda, reforçar os indicadores obtidos na hipótese anterior,
onde se verificou que a probabilidade de emitir relatórios modificados diminui à medida
que os honorários aumentam. Desta forma, e tal como referem Gul et al. (1992) e Seabrigh
et al. (1992) a dependência financeira face ao cliente apresenta-se como um fator
potenciador de perda de independência do auditor, podendo influenciar a sua opinião.
20
Conclusões
Pretendeu-se com este estudo analisar alguns fatores que podem constituir ameaças
à independência do auditor e, consequentemente, influenciar a opinião deste nos relatórios
que emite. No entanto, após a análise dos resultados obtidos, todas as hipóteses testadas
apresentaram resultados não significativos, o que nos levou a reter a hipótese nula (H0) em
todas as hipóteses que determinaram o foco da investigação, e consequentemente a
concluir que, não há associação significativa entre a opinião emitida pelos auditores e as
diferentes variáveis independentes que se pretendiam testar, o que indicia a independência
do auditor. Não obstante, os resultados revelam que as variáveis “tipo de SROC”, “sexo do
auditor” e “experiência profissional” estão positivamente relacionadas com a opinião
emitida pelo auditor, enquanto as variáveis “honorários de RLC” e “honorários extra RLC”
apresentam uma relação inversa. Desta forma, salientamos que embora os resultados não se
tenham revelado estatisticamente significativos, na maior parte das nossas conclusões os
sinais obtidos vão de encontro à literatura. Assim, tal como comprovamos na revisão da
literatura a probabilidade de emissão de relatórios modificados é maior quando a SROC é
nacional (Gonçalves 2009), diminuindo à medida que os honorários aumentam devido à
maior dependência financeira perante o cliente (Farmer et al., 1987 e Seabrigh et al. 1992).
De modo semelhante, tal como concluiu Firth (2002), comprovamos que quanto maiores os
honorários extra RLC pagos à SROC maior a probabilidade deste emitir um relatório não
modificado.
Entendemos que estes resultados se devem sobretudo ao facto de grande parte das
opiniões emitidas pelos auditores nos relatórios de CLC serem não modificadas, o que
indicia que as variáveis em estudo não exercem influência significativa sobre a opinião do
auditor. Estes resultados não deixam de ser curiosos, uma vez que nenhuma das empresas
estudadas apresenta relatórios com opiniões mais gravosas, como o caso de opinião
adversa e impossibilidade de opinião. O facto do estudo ter sido aplicado em empresas
cotadas na bolsa de valores mobiliários poderá ter sido também um importante
determinante uma vez que à partida são entidades que, por estarem sujeitas a regras mais
exigentes, estarão mais atentas às imposições legais e contabilísticas e as próprias SROC
que as auditam serão mais exigentes.
Apesar da falta de significância estatística, este estudo contribuiu para reforçar a
importância da independência do auditor, no exercício das suas funções, uma vez que o seu
papel no contexto empresarial é fundamental para conferir credibilidade às informações
21
que servirão de suporte à tomada de decisões, por parte dos vários utentes. Por essa razão,
a opinião emitida pelo auditor deverá ser objetiva e verdadeira, sendo para tal, essencial
que este profissional não se deixe manipular pelos clientes. Adicionalmente, esperamos ter
contribuído para enriquecer a literatura académica e estimular a investigação nesta área.
Em trabalhos de investigação futura pretende-se evoluir no sentido de melhorar o
ajustamento do modelo com vista a uma melhor compreensão dos determinantes da
opinião do auditor. Para tal propõe-se alargar a amostra do estudo a outras empresas não
cotadas em bolsa, sujeitas a diferentes obrigações em termos de relato financeiro. Este
alargamento da amostra permitir-nos-ia testar o efeito da cotação em bolsa das empresas
nos relatórios de auditoria. Por outro lado, outras variáveis poderão ser introduzidas no
modelo com vista à melhoria do ajustamento do modelo e aumentar assim o contributo do
estudo para o conhecimento nesta área.
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