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UNIVERSIDADE METODISTA DE SO PAULO
FACULDADE DE HUMANIDADES E DIREITO
PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM CINCIAS DA RELIGIO
ROBERTO DE JESUS SILVA
Perspectivas hermenuticas de Isaas 45,1-7: Uma
anlise do ttulo messinico atribudo a Ciro.
So Bernardo do Campo
2013
UNIVERSIDADE METODISTA DE SO PAULO
FACULDADE DE HUMANIDADES E DIREITO
PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM CINCIAS DA RELIGIO
ROBERTO DE JESUS SILVA
Perspectivas hermenuticas de Isaas 45,1-7: Uma
anlise do ttulo messinico atribudo a Ciro.
So Bernardo do Campo
2013
Orientador: Prof. Dr. Trcio Machado Siqueira
Dissertao de Mestrado apresentado em
cumprimento parcial s exigncias do Programa
de Ps-Graduao em Cincias da Religio, para
obteno do grau de Mestre.
FICHA CATALOGRFICA
Sil38p
Silva, Roberto de Jesus
Perspectivas hermenuticas de Isaas 45, 1-7: uma anlise do ttulo
messinico atribudo a Ciro / Roberto de Jesus Silva -- So Bernardo
do Campo, 2013.
93p.
Dissertao (Mestrado em Cincias da Religio) Faculdade de
Humanidades e Direito, Programa de Ps Cincias da Religio da
Universidade Metodista de So Paulo, So Bernardo do Campo
Bibliografia
Orientao de: Trcio Machado Siqueira
1. Bblia A.T. Isaas Crtica e interpretao I. Ttulo
CDD 224.107
A dissertao de mestrado sob o ttulo Perspectivas hermenuticas de Isaas 45,1-7:
Uma anlise do ttulo messinico atribudo a Ciro, elaborada por Roberto de Jesus
Silva foi apresentada e aprovada em 07 de Maro de 2013, perante banca composta por
Prof. Dr. Trcio Machado Siqueira (Presidente/Umesp), Dr. Jos Ademar Kaefer
(Titular/Umesp) e Prof. Dr. Jos Carlos Frizzo (Titular/Dehoniana).
__________________________________________________
Prof. Dr. Trcio Machado Siqueira
Orientador e Presidente da Banca Examinadora
__________________________________________________
Prof. Dr. Leonildo Silveira Campos
Coordenador do Programa de Ps-Graduao
Programa: Ps-Graduao em Cincias da Religio.
rea de Concentrao: Literatura e Religio no mundo Bblico.
Linha de Pesquisa: Estudos Histricos Literrios do mundo Bblico.
AGRADECIMENTOS
A Jesus Cristo, pela fora e inspirao.
Ao professor, orientador e amigo Dr. Trcio Machado Siqueira, por sua pacincia,
compreenso e amizade.
A minha querida esposa Marinalda e meus filhos Vitria e Filipe por seu apoiou.
A todos os funcionrios do curso de Ps-Graduao em Cincias da Religio, pela
gentileza.
Aos meus amigos, em especial SueHellen Monteiro de Matos, lcio Valmiro Sales
Mendona pelo incentivo e companheirismo neste perodo acadmico.
Esta dissertao contou com o apoio do CAPES
SILVA, Roberto de Jesus. Perspectivas hermenuticas de Isaas 45,1-7: Uma anlise do
ttulo messinico atribudo a Ciro. So Bernardo do Campo: Umesp, 2013. Dissertao
(Mestrado em Cincias da Religio) Faculdade de Humanidades e Direito,
Universidade Metodista de So Paulo (Umesp).
RESUMO
O livro do profeta Dutero-Isaas aborda que Jav vem consolar seu povo exilado na
Babilnia. O rei estrangeiro Ciro, no texto de Is 45,1-7 intitulado de Messias de Jav.
Portanto, esta pesquisa tem como objetivo refletir sobre o ttulo messinico atribudo ao
rei Ciro, no contexto do exlio babilnico. Para isto, analiso algumas contribuies de
diversos autores e autoras da rea bblica, explorando a diversidade de pesquisas sobre
este tema.
H muitas interpretaes sobre o significado do ttulo messinico atribudo ao rei
Ciro, entre elas, h quem define Ciro como o Messias de Jav, ou seja, Ciro como
libertador dos exilados e no como o substituto da esperana messinica em um Messias
proveniente da casa de Davi.
Neste trabalho, discuto ainda a esperana messinica, manifesta no perodo exlico e
ps-exlico, destacando a f que as comunidades messinicas exerciam nestes perodos.
Enfim, analiso o messianismo das comunidades ps-macabaicas e neo-testamentrias na
tentativa de descobrir se Ciro era uma figura messinica, nestes perodos.
Palavras Chaves: Orculo de Libertao, Ciro, Messias, Ungido de Jav, Esperana
Messinica.
SILVA, Robert de Jesus. Hermeneutic perspectives of Isaiah 45,1-7: An analysis of the
messianic heading attributed the Cyrus. So Bernardo do Campo: Umesp, 2013.
Dissertation (Masters degree in Sciences of Religion) Faculdade de humanidades e
Direito, Universidade Metodista de So Paulo (UMESP).
ABSTRACT
The book of the prophet Dutero-Isaiah approaches that Jav comes to console its
people exiled in Babylonia. Foreign king Cyrus, in the text of Is 45,1-7 is intitled of
Messiahs de Jav. Therefore, this research has as objective to reflect on the messianic
heading attribution to king Cyrus, in the context of the Babylonian exile. For this, I
analyze some contributions of diverse authors and authors of the Biblical area,
exploring the diversity of analyses on this subject.
It has many interpretations on the meaning of the messianic heading attributed to
the king Cyrus, between them, it has who defines Cyrus as the Messiahs de Jav, that is,
Cyrus as liberating of the exiled ones and not as the substitute of the messianic hope in a
Messiahs proceeding from the house of David. In this work, I still argue has messianic
hope, manifest in the exilic period and after-exilic, detaching the faith that the messianic
communities exerted in these periods. At last, I analyze the messianic of the neo-
testamentary communities after-macabaicas and in the attempt discovering if Cyrus was
one messianic figure, in these periods.
Keys - Words: Oracle of Release, Cyrus, Messiahs, Yahweh to his anointed, Messianic
Hope.
SUMRIO
Sinopse............................................................................................................................ 09
Abstract........................................................................................................................... 10
Introduo....................................................................................................................... 11
1 Contexto Histrico do Dutero-Isaas................................................................... 14
Consideraes introdutrias..................................................................................... 14
1.1 O Dutero-Isaas e o domnio babilnico........................................................... 15
1.2 Situao dos que ficaram em Jud...................................................................... 16
1.3 O Dutero-Isaas e o domnio persa................................................................... 17
1.4 Ciro na histria e no Dutero -Isaas.................................................................. 17
1.4.1 Ciro na historiografia de Herdoto......................................................... 17
1.4.2 Ciro no livro do Dutero-Isaas.............................................................. 18
1.5 O Dutero-Isaas e a f no Messias.................................................................... 20
1.5.1 A esperana messinica no Antigo Testamento..................................... 21
1.5.2 Ciro Messias e libertador dos exilados................................................... 22
1.5.3 As duas tradies messinicas do perodo do Antigo Testamento......... 23
1.5.4 O judasmo ps-exlico........................................................................... 26
1.5.5 Ciro no judasmo ps-exlico.................................................................. 26
1.5.6 A influncia da cultura e religiosidade persa no judasmo
ps-exlico.............................................................................................. 27
1.5.7 Ciro e a religiosidade dos povos conquistados....................................... 27
1.5.8 Consideraes conclusivas do captulo 1............................................... 28
2 Anlise Exegtica de Isaas 45,1-7........................................................................ 29
Consideraes introdutrias.................................................................................... 29
2.1 Percope de Isaas 45,1-7: Texto em hebraico................................................... 30
2.2 Traduo literal de Isaas 45,1-7........................................................................ 31
2.3 Crtica Textual.................................................................................................... 32
2.4 Caractersticas formais....................................................................................... 33
2.4.1 Delimitao do texto.................................................................................. 33
2.4.2 Coeso interna........................................................................................... 34
2.4.3 Estilo.......................................................................................................... 34
2.4.4 Gnero....................................................................................................... 35
2.5 Lugar................................................................................................................... 37
2.6 Contedo............................................................................................................. 40
2.6.1 Ciro o Messias de jav (v.1)...................................................................... 41
2.6.2 O decreto de Ciro....................................................................................... 41
2.5.3 Eu seguirei diante da tua face (v.2)........................................................... 41
2.6.4 Tesouros e riquezas ao Messias de Jav v. 3............................................. 43
2.6.5 Por causa do meu servo Jac e de Israel, meu escolhido, eu te chamei
(v. 4)..................................................................................................................... 43
2.6.6 Ciro, o cingido de Jav............................................................................... 44
2.6.7 A capacidade criativa de Jav (v.7)............................................................ 45
2.6.8 Consideraes conclusivas do segundo captulo..................................... 46
3 - Perspectivas Hermenuticas.............................................................................. 47
Consideraes introdutrias................................................................................. 47
3.1 Ciro e os Cnticos do Servo de Jav (Is 42,1-9; 49,1-6; 52,13-53,12)........... 47
3.2 Ciro, enviado de Marduk................................................................................ 51
3.3 Ciro e a restaurao da comunidade judaica na Palestina.............................. 52
3.3.1 A poltica de Ciro e o edito da restaurao............................................ 53
3.3.2 A primeira leva de retornantes............................................................... 54
3.3.3 A segunda leva de retornantes............................................................... 55
3.3.4 O fim da monarquia davdica................................................................ 56
3.3.5 A ideologia sacerdotal como uma raiz da expectativa messinica........ 57
3.3.5.1 As expectativas messinicas do judasmo ps-exlico................... 58
3.3.5.2 O Messias na literatura inter-testamentria.................................... 58
3.3.5.3 O Messias nos escritos de Qumran................................................. 60
3.3.5.4 Melquisedek como figura messinica de Qumran.......................... 61
3.3.5.5 O Messias de Efraim....................................................................... 64
3.3.5.6 O Messias efraimita na tradio crist............................................ 66
3.3.5.7 O messianismo a partir de grupos religiosos do perodo
ps-macabaico: Fariseus, saduceus, zelotes e herodianos............ 68
3.3.5.8 O messianismo na literatura neo-testamentria................................. 74
3.3.5.9 Consideraes conclusivas do terceiro captulo................................ 79
Concluso...................................................................................................... 80
Bibliografia.................................................................................................... 83
Anexo............................................................................................................. 91
INTRODUO
O livro de Isaas, mais especificamente os captulos 40-55, conhecidos como
Dutero-Isaas, uma obra prima da literatura bblica do Antigo Testamento1.
De acordo com Sotelo2, o mrito da leitura dos captulos 40-55, lidos separadamente
dos captulos 1-39, cabe ao telogo alemo Bernahard Duhm, em 1892, em seu
comentrio de Isaas.
Este comentrio deu origem s descobertas sobre a composio da obra do livro de
Isaas. Duhm foi o primeiro a separar o livro do profeta Isaas em: Isaas de Jerusalm,
tambm conhecido como Isaas histrico, Proto-Isaas ou 1 Isaas.
Para Schwantes3, o profeta Dutero-Isaas, cujo nome desconhecido, no sabia
nada referente conquista persa sobre a Babilnia, em 539 a.C. Portanto, o profeta
escreveu os captulos 40-55 no final do exlio em meados do sculo IV a.C.
Segundo Jensen4, um dos temas enfatizados pelo profeta a libertao dos exilados,
para tanto, o profeta enderea aos cativos orculos de libertao e esperana no objetivo
de encoraj-los, pois Jav utilizar o rei persa Ciro como seu Messias (Isaas 45,1).
Ou seja, como seu instrumento para derrotar a Babilnia, e assim libertar Jud do
cativeiro.
A respeito do ttulo messinico atribudo a Ciro, Seybold5 ressalta que o autor
dutero-isainico no tinha inteno de substituir a esperana que os exilados tinham de
um Messias, proveniente da casa de Davi, descrito pela tradio messinica de
Jerusalm como um guerreiro e aludido pela tradio messinica dos interioranos de
Jud como um pastor, servo.
Seybold sugere que o ttulo messinico atribudo ao rei Ciro fora conferido em
momento de empolgao do profeta, como tambm dos exilados que enxergaram em
Ciro a possibilidade de regressar para Jerusalm.
1 Jos Severino Croatto, Isaas A palavra Proftica e sua releitura hermenutica: VolI. A libertao
possvel. 1 ed. Rio de Janeiro: Vozes, 1998, p. 9. 2 Daniel Sotelo. Teologia da Retribuio e da esperana no Exlio/Coleo Histria de Israel Vol. 4. 1
ed. So Paulo: Fonte Editorial, 2012, p. 41. 3 Milton Schwantes. Sofrimento e Esperana no Exlio: histria e teologia do povo de Deus no sculo Vl a.C. So Paulo: Paulinas. So Leopoldo: Sinodal, 1987, p. 92-94. 4 Jos Jensen. Dimenses ticas dos profetas. 1 ed. Edies Loyola: 2009, p. 199-201. 5 K. Seybold, mashah, Em: Theological Dictionary of the Old Testament. Vol. IX. Grand Rapids/
Cambridge: Willian B. Eerdmans Publishing Company, 2004, p. 43-54.
12
Tambm possvel constatar que nas tradies messinicas dos perodos vetero-
testamentrio, inter-testamentrio e neo-testamentrio no h meno de Ciro como
Messias de Jav.
Por tanto, esta dissertao se prope a apresentar novas perspectivas hermenuticas
sobre o messianismo de Ciro, a partir da percope de 45,1-7 que est inserida no livro do
profeta dutero-isainico.
Os relatos do Dutero-Isaas mostram claramente como a comunidade exilada foi
encorajada pelo profeta que no se cansou de enderear orculos de salvao e
libertao para os cativos que observaram os avanos militares de Ciro como uma ao
de Jav, a fim de abater a Babilnia e libertar seu povo do exlio.
Para tanto, foi trabalhado os encaminhamentos da exegese histrico-crtica e sua
contribuio para o estudo das caractersticas messinicas desenvolvidas nas tradies
decorrentes no Antigo Testamento, Novo Testamento, textos de Qumran e textos do
perodo Inter-Testamentrias.
Esta dissertao pretende discutir o tema proposto em trs captulos:
O primeiro captulo intitulado Contexto Histrico do Dutero-Isaas, trabalha o
cenrio histrico em que o profeta viveu, a conquista babilnica sobre o reino sulista, as
deportaes dos judeus bem como a situao dos remanescentes em uma Jud destruda,
desmilitarizada e desurbanizada.
Tambm discutiremos a dominao dos persas liderados pelo rei Ciro sobre os
Babilnicos em 539 a.C. Para tanto investigou-se na historiografia de Herdoto6 a
histria de Ciro bem como a importncia do imperador para a comunidade exilada e
para o Dutero-Isaas.
Ainda no primeiro captulo, foi discutido sobre a f e a esperana messinica
apresentada no Dutero-Isaas como tambm, a linguagem messinica utilizada pelas
duas tradies messinicas do perodo vetro-testamentrio, mais especificamente a de
Jud e Jerusalm. Isto porque existiram duas tradies teolgicas no Sul e cada uma
elaborava de forma diferente o messianismo.
6 Herdoto. O Relato Clssico da Guerra entre Gregos e Persas. 2 ed. So Paulo: Prestgio, 2001, p.
111-129.
13
Ainda no captulo 1 discutiu-se sobre a influncia de Ciro no judasmo ps-exlico
como tambm a influncia da cultura e da religiosidade persa no judasmo ps-exlico.
Por fim, investigamos a tolerncia de Ciro diante a religiosidade dos povos
conquistados.
O segundo captulo, denominado Anlise Exegtica de Isaas 45,1-7, utilizamos o
instrumental exegtico para anlise da percope de Isaas 45,1-7. Os encaminhamentos
exegticos so apresentados a partir dos seguintes passos:
Traduo literal da percope mantendo exatamente uma sequncia original do texto.
Aps a traduo, notificamos a crtica textual, demonstrando os acrscimos do texto da
LXX. Por fim, trabalhamos os aspectos formais do texto, a partir dos seguintes passos:
delimitao, coeso interna, gnero e lugar.
No terceiro passo da nossa exegese, trabalhamos o contedo, a fim de adequar a
traduo literal, retomar as perspectivas do estilo desenvolvidas na forma e a
contextualizao histrica da percope.
Estes passos so apresentados a fim de contribuir na interpretao do ttulo messinico
atribudo ao rei Ciro apresentando nesta sub-unidade.
No terceiro captulo, intitulado Perspectivas Hermenuticas, estudamos a relao
de Ciro e os cnticos do Servo de Jav no Dutero-Isaas (Is 42,1-9; 49,1-6; 52,13-
53,12), a importncia que Ciro e os babilnicos deram a Marduk, o amparo financeiro
que Ciro concedeu para a primeira remessa de Judeus que voltaram para Jerusalm, os
anos de dificuldade que os judatas passaram em Jerusalm, as expectativas messinicas
do judasmo ps-exlico, destacando o messianismo na literatura inter-testamentria,
especificamente nos escritos qumrnicos.
Tambm discutimos sobre o Messias Efraimita na Tradio Crist como tambm o
messianismo a partir de grupos religiosos do perodo ps-macabaico, a saber: Fariseus,
saduceus, zelotes e herodianos na de achar Ciro como figura messinica destes grupos
religiosos. Por fim, procuramos identificar a figura messinica de Ciro, nos escritos neo-
testamentrios e na anlise dos termos Filho do Homem e Filho de Deus, atribudos
ao Messias no Novo Testamento.
14
1. CONTEXTO HISTRICO DO DUTERO- ISAAS
Consideraes introdutrias
O termo Messias, no Antigo Testamento, passou por muitas transformaes at
chegar ao conceito predominante da atualidade, do O Messias Escatolgico, ou seja,
algum em que se projeta um futuro.
Neste sentido, o Messias um Salvador, que se dispe a salvar o povo da
situao em que se encontra.
Foram desenvolvidas tradies messinicas no perodo do Antigo Testamento e
estas tradio se tornaram motivo de esperana em meio a crises constantes,
principalmente entre o ano 550-540 a.C. onde situamos as profecias dutero-isainicas.
Portanto, apontaremos os acontecimentos que ocorreram no perodo em que a
Babilnia liderada pelo rei Nabucodonosor, conquistou a Judeia e a situao dos
remanescentes que ficaram em Jud.
Tambm notificaremos o perodo em que os persas, liderados pelo rei Ciro,
conquistaram a Babilnia e libertaram os exilados, especialmente, como o profeta
dutero-isainico anunciou Ciro para os exilados.
Tambm salientaremos sobre a f que os exilados portavam no Messias, e como
o rei estrangeiro Ciro foi intitulado de Messias pelo profeta (Is 45,1).
Enfim, estudaremos as tradies messinicas que percorriam o Antigo Testamento,
a influncia da religiosidade persa no judasmo ps-exlico, a tolerncia de Ciro no que
se refere religiosidade dos povos conquistados e a influncia da cultura e da
religiosidade dos persas no conceito de messianismo no perodo ps-exlico. Por fim,
encerramos o captulo com as consideraes conclusivas onde conclumos os principais
assuntos.
15
1.1 O Dutero-Isaas e o domnio babilnico
De acordo com Schmidt7 a produo do Dutero-Isaas aparece na poca tardia ao
exlio, aproximadamente entre 550-540 a.C. Schwantes8 notifica que o livro foi redigido
por um ou vrios profetas annimos que atuaram entre os judeus exilados na Babilnia.
Segundo Gottwald9, o Trito-Isaas (Is 56-66) foi o redator do Dutero-Isaas (Is 40-
55). No entanto, os escassos sinais de redao no Dutero-Isaas no favorecem esta
opinio.
O profeta dutero-isainico anuncia seus orculos de salvao para judeus exilados.
Donner10
menciona que o exlio se sucedeu aps 597 e 587 a.C. esta invaso babilnica
mencionada por Bright11
, o qual afirma que aps 597 a.C. os babilnicos invadiram
Jud e as cidades de Laquis e Dabir , onde as mesmas foram tomadas de assalto e
violncia de forma que os nobres e a elite da religio foram deportados para Babilnia.
Foi em 587 a.C. que Nabuzard, comandante da guarda de Nabucodonosor chegou
em Jerusalm e cumpriu ordens de incendiar a cidade e derrubar suas muralhas. Nesta
ocasio o templo, o palcio e as casas foram saqueados e queimadas (2 Rs 25,9).
Alguns oficiais civis e cidados eminentes foram levados diante de Nabucodonosor em
Rebla, e ali foram executados (2 Rs 25,18-21; Jr 52,24-27), enquanto outro grupo da
populao era deportada para Babilnia12
.
Segundo Provin13
, os babilnicos nomearam Godolias para governar os pobres
remanescentes de Jud (2 Rs22,12.14; Jr 26,24). O profeta Jeremias e o governador
Godolias se reuniram numa tentativa de salvar o povo (Jr 40,24).
7 Werner H. Schmidt. Introduo ao Antigo Testamento. So Leopoldo: Sinodal, 2009, p. 245.
8 Milton Schwantes, Sofrimento e Esperana no Exilo Histria e Teologia do Povo de Deus no sculo
VI A.C. 1 ed. So Leopoldo: Sinodal, 1987, p. 92. 9 Norman K. Gottwald. Introduo Socioliterria Bblia Hebraica. 1 ed. So Paulo: Paulus, 1998, p.
459. 10
Herbert Donner. Histria de Israel e dos povos vizinhos. 5 ed. So Leopoldo: Sinodal, 2005, p. 413-
414. 11
John Bright. Histria de Israel. 9. ed. So Paulo: Paulus, 2003, p. 394. 12
John Bright. Histria de Israel. 9. ed. So Paulo: Paulus, 2003, p. 397. 13
Genildo Provin. Libertao nas Trilhas da Justia: Estudo histrico e hermenutico de Isaas 42,1-4.
Dissertao de Mestrado Universidade Metodista: So Bernardo do Campo, 2008, p. 32.
16
Em 582 a.C., um grupo que pretendia restabelecer a monarquia assassinou Godolias
e com isto muitos ficaram com medo, deixaram a ptria e fugiram para o Egito, levando
consigo o profeta Jeremias (2 Rs 25,22-26; Jr 42-44).
1.2 Situao dos que ficaram em Jud
Provin14
menciona que os judeus deportados em 587 a.C. no tiveram o mesmo
tratamento dos exilados de 597 a.C., pois, muitos morreram de fome e outros espada.
J Colli15
notifica que os remanescentes que ficaram em Jud eram pobres,
camponeses , gente simples que no representava ameaas ao imprio, e se uma vez se
rebelassem seriam facilmente controlados.
De acordo com Schwantes16
, foram cercas de 15 mil pessoas exiladas, no entanto a
maioria das pessoas de Jud no foi deportada, mas permaneceram na terra.
Colli17
ainda ressalta que a Palestina foi completamente arrasada pelos babilnicos
no havia mais cidades inteiras e a estimativa dos que ficaram no territrio de Jud deve
se aproximar de 100 mil.
Pouco se sabe sobre os remanescentes que ficaram em Jud durante o exlio
babilnico. Nos poemas do livro de Lamentaes possvel identificar um estado de
misria em Jerusalm e Jud.
O povo havia perdido a maior parte de sua liderana poltica e religiosa, restaram
somente misria e problemas sociais.
Aps o assassinado do governador Godolias os babilnicos deixaram Jud
desmilitarizada e desurbanizada isto permitiu um processo de retribalizao de Jud,
onde os camponeses viviam conforme os costumes clnicos-tribais18
.
14
Genildo Provin. Libertao nas Trilhas da Justia: Estudo histrico e hermenutico de Isaas 42,1-4.
Dissertao de Mestrado Universidade Metodista: So Bernardo do Campo, 2008, p. 33. 15
Gelci Andr Colli. Dinmicas Profticas no Prlogo de Dutero-Isaas: Exegese de Isaas 40,1-11.
Dissertao de Mestrado Universidade Metodista: So Bernardo do Campo, 2006, p. 22. 16
Milton Schwantes, Sofrimento e Esperana no Exilo Histria e Teologia do Povo de Deus no sculo
VI A.C. 1 ed. So Leopoldo: Sinodal, 1987, p. 74. 17
Gelci Andr Colli. Dinmicas Profticas no Prlogo de Dutero-Isaas: Exegese de Isaas 40,1-11.
Dissertao de Mestrado Universidade Metodista: So Bernardo do Campo, 2006, p. 22. 18
Ildo Bohn Gass. Uma Introduo Bblia: Exlio Babilnico e Dominao Persa. 2 ed. So
Leopoldo/So Paulo: CEBI/Paulus, 2005, p. 21-23.
17
1.3 O Dutero-Isaas e o domnio persa
Schwantes19
chama a ateno, aludindo que os persas arrancaram dos babilnicos a
dominao da Mesopotmia e permaneceram no poder aproximadamente por 200 anos.
Segundo Herdoto20
em 539 a.C. o rei persa Ciro, conquistou a Babilnia,
desviando as guas do rio Eufrates para um lago previamente escavado.
As guas do rio escoaram-se e o leito do rio facilitou a passagem. Ciro e seu excito
entraram na cidade, com as guas na altura da coxa surpreenderam os babilnicos e
assim, conquistam a cidade.
1.4 Ciro na histria e no Dutero-Isaas
1.4.1 Ciro na historiografia de Herdoto
Segundo Herdoto21
, Ciro foi o fundador do Imprio Prsia, aquemnida, ele era
bisneto de Teispes, neto de Ciro I e filho de Cambises I, com a princesa Mandane a
filha do rei Astages. Ciro nasceu aproximadamente no ano 600 a.C., se casou com
Cassandane uma mulher aquemnida filha de Farnaspes e irm de Otanes.
Na morte de Cassandane, Ciro ordenou que todos os seus sditos fizessem um
grande pranto. H um relato na Crnica de Nabonido22
, rei da Babilnia, que quando a
esposa do rei morreu, houve luto oficial na Babilnia em 538 a.C. o que indica, muito
provavelmente, que foi a morte de Cassandane que estava sendo lamentada. Quando
Ciro conquistou a Mdia, casou-se com Amytis, filha do rei Astages, aps assassinar o
esposo desta para legitimar-se como rei da Mdia.
19
Milton Schwantes. Breve Histria de Israel. So Leopoldo: Oikos, 2008, p. 59. 20
Herdoto. O Relato Clssico da Guerra entre Gregos e Persas. 2 ed. So Paulo: Prestgio, 2001, p.
165-166. 21
Herdoto. O Relato Clssico da Guerra entre Gregos e Persas. 2 ed. So Paulo: Prestgio, 2001, p. 111-129. 22
Disponvel em: http://cronologiadabiblia.wordpress.com/2011/05/10/a-cronica-de-nabonido-de-556-
ac-a-554-ac/. Acesso dia 18/12/2012.
http://cronologiadabiblia.wordpress.com/2011/05/10/a-cronica-de-nabonido-de-556-ac-a-554-ac/http://cronologiadabiblia.wordpress.com/2011/05/10/a-cronica-de-nabonido-de-556-ac-a-554-ac/
18
Herdoto salienta que Astages comeou a perseguir o filho da princesa Mandane, o
pequeno Ciro, devido um sonho que ele teve com Mandane. Herdoto notifica que os
adivinhos do rei Astages interpletaram o sonho e afirmaram que Mandane, teria um
filho que acabaria com a disnastia dos medas. Astages ordenou que seu servo Harpargo
matasse o filho da princesa Mandane, isto Ciro.
Harpargo passou esta responsabilidade para seu servo Mitridade, que no cumpriu a
orderm e cuidou da criana como se fosse seu filho. De acordo com Herdoto com o
passar do tempo, o rei Astages descobriu que sua ordem no foi cumprida.
Astages pediu novo conselho a seus magos, e ele foi aconselhado a enviar a criana
para Prsia onde j estavam Cambises e Mandane. Ciro foi recepicionado por seus pais,
os quais o criaram e no ano 559 a.C., foi aclamado rei da Prsia.
Ciro lutou contra Astages, rei da Mdia em 550 a.C., e o venceu, poupou sua a
vida, mas marchou para a capital da Mdia, Ecbtana, e tomou o controle do vasto
territrio dos medas. A Mdia tinha vivido no auge do poder nos reinados de Ciaxares
em 625 a 585 e no reinado de Astages de 585 a 550 a.C. Ciro tambm venceu Greso rei
da Ldia em 546 a.C., mas sua grande conquista foi a vitria sobre Belsazar prncipe da
Babilnia em 539 a.C.
O prncipe Belsazar foi assassinado e Ciro conquistou a Babilnia, os Judeus
exilados na Babilnia estavam prestes a retornar para Jerusalm, esta informao pode
ser vista nos livros de (II Crnicas 36, 22-23) e (Esdras 1, 2-3).
1.4.2 Ciro no livro do Dutero-Isaas
Para Schwantes23
e Brueggemann24
, o autor do Dutero-Isaas atribui a Jav, os
avanos militarem de Ciro para que o rei persa viesse libertar seu povo do cativeiro.
Schwantes menciona que Ciro, desempenha um papel de destaque no Dutero-Isaas. A
ele diz respeito: Isaas 41,1-5; 41,25-26; 44,24-45,1-7.
O autor dutero-isainico sada Ciro, chamando-o de Ungido (Is 45,1) e notifica
que seus avanos militares ocorreram por amor do meu servo Jac (Is 45,4), ou seja,
por causa dos exilados. 23
Milton Schwantes, Sofrimento e Esperana no Exilo Histria e Teologia do Povo de Deus no sculo VI A.C. 1 ed. So Leopoldo: Sinodal, 1987, p. 99. 24
Walter Brueggemann, Isaiah 40-66. Louisville: Westminster Bible Companion, 1998, p. 75-76.
19
Afirma Croatto25
, que o Dutero-Isaas utiliza uma linguagem proveniente de uma
longa tradio Mesopotmica sobre o rei como pastor dos povos, pelo fato de o
profeta chamar Ciro de pastor de Jav, (Is 44,28). O prprio rei Nabucodonosor
chamava a si mesmo de teu (de Marduc) fiel pastor.
Croatto notifica que, a figura de Ciro muito importante no Dutero-Isaas, pois a
ele atribudo o orculo de salvao, visto na percope de Isaas 45,1-726
.
Em Esdras 1,1-4 o autor menciona que Ciro concedeu a liberdade para a primeira
remessa de exilados. Segundo Kaefer27
, os judeus que voltaram do exlio trabalharam na
reconstruo da cidade de Jerusalm e tambm do templo.
O fato dos judeus exilados esperarem que Ciro os libertasse do cativeiro babilnico
e ordenasse que eles regressassem a Jerusalm para reconstrurem a cidade e o Templo,
contribuiu para que o profeta dutero-isainico, intitulasse Ciro de Messias de Jav,
no sentido de libertador dos exilados (Is 451,1).
Seybold sugere que o ttulo de Messias, conferido a Ciro foi manifesto em
momento de grande empolgao dos judeus que estavam prestes a regressar a Jerusalm
e nada se refere substituio da esperana do Messias davdico guerreiro ou pastor28
.
Segundo Noth29
, o autor dutero-isainico anuncia que a restaurao de Israel est
ligada a figura de Ciro. North30
salienta que na Babilnia o rei Ciro foi chamado de
enviado de Marduk. De acordo com Westermann31
, os babilnicos acreditavam que
Marduk, senhor dos deuses, estava furioso com o governo do prncipe da Babilnia
Belsazar, e resolveu puni-lo, enviando Ciro para oprimi-lo.
Pode-se notar a semelhana da leitura que os judeus e os babilnicos fazem da
pessoa de Ciro. Para os Judeus Ciro foi enviado por Jav para libertar seu povo e para
os babilnicos o mesmo foi enviado por Marduk para punir, o tirano Belsazar.
25
Jos Severino Croatto, Isaas A palavra Proftica e sua releitura hermenutica: VolI. A libertao possvel. 1 ed. Rio de Janeiro: Vozes, 1998, p. 229-230. 26
Jos Severino Croatto, Isaas A palavra Proftica e sua releitura hermenutica: VolI. A libertao possvel. 1 ed. Rio de Janeiro: Vozes, 1998, p. 130-133. 27
Jos Ademar Kaefer. Arqueologia das Terras da Bblia. 1 ed. So Paulo: Paulus, 2012, p. 11. 28 K. Seybold, mashah, Em: Theological Dictionary of the Old Testament. Vol. IX. Grand Rapids/Cambridge: Willian B. Eerdmans Publishing Company, 2004, p. 43-54. 29
Martin Noth. Historia de Israel. Barcelona: Ediciones Garriga, 1966, p. 275-276. 30
Christopher R. North. Isaiah 40-55 Introction and Commentary. 1 Ed. SCM Press LTD: Grent Britain, 1952, p. 87-88. 31
Claus Westermann. Isaiah 40-66 A Commentary. The Westminster Press: Philadelphia, 1969, p. 158.
20
Para G. von Rad32
, o autor do livro Dutero-Isaas, usa uma linguagem no estilo da
corte do Antigo Oriente, ao se referir a Ciro, a quem tomo pela mo direita, ( Is 45,
1b).
Esta linguagem utilizada pelo profeta refere-se a sua condio de deportado na
Babilnia33
. Segundo Schwantes34
, o autor dutero-isainico na verdade, os cantores
do templo, sendo assim, o Dutero-Isaas, no foi compilado por um nico autor, mas
por vrios cantores do templo que foram deportados para Babilnia e produziram o
Dutero-Isaas sobre uma linguagens hnica e no estilo da corte do Antigo Oriente.
1.5 O Dutero-Isaas e a f no Messias
Segundo Silva35
, a expresso (Messias), tem sua origem no hebraico (mashiah) e
significa "Ungido". O termo messias, no Antigo Testamento "indica um ritual de uno
atestado para reis, sumos sacerdotes e profetas. O mesmo afirma que Davi foi o
primeiro rei a ser ungido na perspectiva de uma aliana eterna (2Sm 23.1-5) declarado
como "filho de Deus.
Desenvolveu-se, assim, em Israel a concepo de que a monarquia era uma
concesso divina no somente para a pessoa de Davi, mas era extensiva sua dinastia.
Os profetas denunciaram o desagrado de Jav para com a monarquia. Eles
alimentaram a esperana na interveno de Jav na histria de seu povo, aludindo que
Jav enviaria um Messias para restaurar a monarquia e governar seu povo com direito
e justia. Desse modo, a partir da figura do rei, especificamente, do rei Davi projetada
a figura do Messias.
Schmidt36
chama a ateno, quando mencionou que em Is 11.1-5, o autor proto-
isainico, descreve metaforicamente a vinda de um soberano (v.1) e fala das habilidades
que o esprito lhe concede (v.2) e das tarefas do governante (vv.3 - 4), a partir da justia
e fidelidade (v.5).
32
Gerhard Von Rad. Teologia do Antigo Testamento. 2 ed. So Paulo: ASTE/TARGUMIM, 2006, p. 665-667. 33
Martin Noth. Historia de Israel. Barcelona: Ediciones Garriga, 1966, p. 276. 34
Milton Schwantes, Sofrimento e Esperana no Exilo Histria e Teologia do Povo de Deus no sculo
VI A.C. 3 ed. So Leopoldo: Oikos, 2009, p. 89. 35
Sydney Farias da Silva. Autoconscincia Messinica de Jesus. Dissertao de Mestrado Escola
Superior de Teologia: So Leopoldo, Janeiro de 2006, p. 10-16. 36
Werner H. Schmidt. A f do Antigo Testamento. So Leopoldo: Sinodal, 2004, p. 295-303.
21
Portanto, a f messinica no Antigo Testamento se manifesta pela esperana no
advento de um Ungido de Jav, ancestral de Davi, que restauraria a monarquia de Israel.
1.5.1 A esperana messinica no Antigo Testamento
A queda do Reino de Jud, em 587 a.C., sob o poder dos babilnicos, com a
consequente perda da autonomia poltica, obrigou os judeus a repensarem a monarquia.
Conquanto ela tenha desempenhado um papel importante na formao do Estado em
Israel, garantindo-lhe maior estabilidade econmica e poltica, ela no soube oferecer ao
povo duas coisas fundamentais tica da f javista: justia e paz! Essa omisso foi
descrita nos escritos profticos como decorrncia de que a monarquia perdeu a
conscincia de que seus reis eram "ungidos" (Messias) para servirem causa da justia
e da paz. O exerccio do poder levou os reis idolatria, e graves consequncias. Ela
comprometia os fundamentos ticos essenciais ao culto javista: a misericrdia, a justia
e humildade diante de Deus (Mq 6.8). A monarquia deveria ter um compromisso com
os pobres, para quem Jav exige justia.
Do rei espera-se que "julgue os aflitos do povo, salve os filhos dos necessitados e
esmague o opressor" (Sl 72.4). Seu reinado ser subsidiado pelas naes "porque ele
acode ao necessitado que clama e tambm ao aflito e desvalido. Ele tem piedade do
fraco e salva alma dos indigentes. Redime as suas almas da opresso e da violncia, e
precioso lhe o sangue deles" (Sl 72.12-14). Com o retorno dos exilados e a
reconstruo do templo e da cidade, Israel viveu um novo momento. Neste contexto no
existia mais a monarquia para mediar relao poltica do povo. Assim, os judeus que
retornaram da Babilnia no tinham mais um rei que governasse em nome de Deus, mas
os sacerdotes governam em nome de Jav.
Neste perodo de hierocracia a esperana messinica, muda de foco, pois no
momento em que o sumo sacerdote ocupou o "lugar do rei", ele se tornou o Ungido de
Jav, (Ex 29.7; Lv 8.12; Sl 133.2; Zc 4.14).
Portanto, no perodo ps-exlio a esperana messinica passa por modificaes, em
que, se acreditava que um reino trar consigo um rei cujo domnio se estender por
todas as naes, criando uma nova era de paz universal anunciada por Zacarias 9,9-10.
22
Nesta viso messinica, a justia faz parceria com a paz e as inmeras realidades
internas e externas que fizeram a histria de glria e de desgraa da monarquia, so
mantidas por uma continua esperana no Messias.
1.5.2 Ciro Messias e libertador dos exilados
De acordo com Webler37
, o autor dutero-isainico anuncia para os exilados uma
profecia de consolao ao mencionar que Ciro o Messias de Jav (Is 45,1), ou seja, o
escolhido de Jav, para libertar os cativos.
Schkel38
menciona que, pela primeira vez na histria, o ttulo de Messias
atribudo a um rei estrangeiro. O mesmo ressalta que alguns judeus reagiram contra o
ttulo de Messias, atribudo a Ciro, pelo fato do rei ser estrangeiro e no fazer parte da
dinastia davdica39
.
Segundo Seybold40
, o profeta aceita conscientemente que Ciro no sabia, nem
queria saber qualquer coisa sobre o ttulo messinico que o profeta Dutero-Isaas lhe
concedeu.
Donner41
, Noth42
e Westermann43
sugerem que Ciro nunca se apresentou como
servo de Jav, mas como servo de Marduk.
Schwantes44
e Brueggemann45
afirmam que para o autor dutero-isainico, os
avanos militares do rei Ciro estavam corelacionados libertao dos judeus exilados.
37
Jacinta Webler. Eu te Desenhei na Palma das Mos (Is 49,16): A misericrdia e a compaixo no
Dutero Isaas, na Teologia latino-americana e na espiritualidade crist - um estudo integro. Dissertao
de Mestrado Centro de Estudos Superiores da Companhia de Jesus Faculdade de Teologia: So Belo
Horizonte, 2006, p. 17-18. 38
Lus Alonso Schkel. Profetas I: Isaas e Jeremias. 2. ed. So Paulo: Paulus, 2004, p. 309. 39
Luis Alonso Schkel, Profetas I: Isaas, Jeremias. 2 ed. So Paulo: Paulus, 2004, p. 310. 40
K. Seybold, mashah, Em: Theological Dictionary of the Old Testament. Vol. IX. Grand
Rapids/Cambridge: Willian B. Eerdmans Publishing Company, 2004, p. 52-53. 41
Herbert Donner, Histria de Israel e dos povos vizinhos. 5 Ed. So Leopoldo: Sinodal, 2005, p. 447. 42
Christopher R. North, Isaiah 40-55 Introduction and Commentary. 1 Ed. SCM Press LTD: Grent
Britain, 1952, p. 87-88. 43
Claus Westermann, Isaiah 40-66 A Commentary. Philadelphia: The Westminster Press, 1969, p. 158. 44
Milton Schwantes, Sofrimento e Esperana no Exilo Histria e Teologia do Povo de Deus no sculo
VI A.C. 1 ed. So Leopoldo: Sinodal, 1987, p. 99. 45
Walter Brueggemann, Isaiah 40-66. Louisville: Westminster Bible Companion, 1998, p. 75-76.
23
Enfim, a esperana que o profeta Dutero-Isaas, tinha em Jav, fez com que ele
enxergasse Ciro como libertar dos judeus exilados, afim de estes, reconstrurem o
Templo que havia sido destrudo pelos babilnicos, como tambm a cidade de
Jerusalm. Portanto, o profeta estando em momento de empolgao atribuiu o ttulo de
Messias, ao rei estrangeiro Ciro (Is 451,1), sem ter nenhuma pretenso de substituir a
esperana em um Messias davdico guerreiro ou pastor.
1.5. 3 As duas tradies messinicas do perodo do Antigo Testamento
De acordo com Siqueira e Santos46
, as duas tradies messinicas tm como figura
central o grande guerreiro Davi, que na tradio do Messias pastor, Davi apresentado
como aquele que vem de Belm de Jud de um meio pastoril. A tradio do Messias
Guerreiro parte da histria de Davi no palcio em Jerusalm e o que legitima essa
tradio era a histria na qual Davi vence o gigante Golias (1 Sm 17,1-58). A partir
destes relatos possvel constatar que h, pelo menos, duas tradies profticas que
conservam e anunciam o messianismo no Antigo Testamento, um de origem
hierosolimita, e o outro judata47
. Estas tradies tambm nos apresentam alguns
aspectos semelhantes. Tendo em vista que o Sul marcado por memrias importantes,
como por exemplo: Sara, Abrao, as guerras santas, o davidismo, a presena de Jav em
Sio, onde pode-se destacar Sio e Davi, como principais caractersticas das tradies
religiosas do sul.
Embora se trate de memrias diferentes, Sio e Davi se completam. Davi transporta
a arca da aliana (2 Sm 6) e em Sio junto a arca, recebe de Nat a promessa de eterna
dinastia (2 Sm7).
Outra questo que o templo e o palcio estavam situados no mesmo espao
territorial de Jerusalm. Portanto, o templo e o santurio eram propriedade do soberano,
assim o sacerdote era um funcionrio que podia ser instalado e destitudo pelo rei48
.
46
Trcio Machado Siqueira; Sueli Xavier Santos. O messias desde o Antigo Testamento at Jesus Cristo.
1 ed. So Paulo: Cedro, 2008, p. 18. 47
Suely Xavier Santos. Para uma Paz Sem Fim: Um estudo, scio-poltico e teolgico da tipologia
messinica nas percopes de Isaas 7,10-17 e 8,23-9,6. Dissertao de Mestrado Universidade
Metodista de So Paulo: So Bernardo do Campo, 2005. 48
Werner H. Schmidt. A f no Antigo Testamento. 1 ed. So Leopoldo, RS: Sinodal, 2004, p. 22.
24
H uma diferena bem marcante entre Sio/Davi e Davi/Belm. Em Sio, Davi
enaltecido como rei, e lembrado por suas incurses blicas (2 Sm 5 a 1 Rs 2), na
tradio Davi/Belm, a concepo da sua fragilidade, e de um homem do campo ( Mq
5,1-50).
Assim, observamos que a figura messinica de Davi perpassa por ambos os grupos,
Jud e Jerusalm, mas com diferentes enfoques.
A tradio de Jud conservou a histria traditiva de um messianismo anti-palaciano
e anti-sionita. No entanto, a tradio de Jerusalm marcada pela funo de Salm
como cidade da justia e do trono de Jav.
Portanto, os judeus libertados por Ciro, adeptos da tradio messinica jerosolimita
em que aguardava um Messias como rei guerreiro, viram em Ciro, caractersticas
semelhantes a do seu Messias. Em fim, o ttulo messinico atribudo a Ciro, pelo autor
do Dutero-Isaas (Is 451,1), no tinha o objetivo de substituir a esperana no Messias
davdico, poltico e guerreiro.
Segundo Schkel49
, o messianato de Ciro est ligado figura do Messias violento
identificado no livro dos Salmos 2,1-2. Para Kraus50
, o Salmo 2 descreve um Messias
violento ao lado de Jav, preparado para lutar contra os reis inimigos.
De acordo com Winer e Croatto, a linguagem messinica no Dutero-Isaas no
somente jerusalemita, pois os Cnticos do Servo (Is 42,1-4; 49,1-6; 50,4-9; 52,13-
53,12)51
, apresentam uma linguagem messinica judata onde o Messias descrito como
um Servo que sofre52
.
Croatto53
salienta que os captulos 49-1-9 se referem misso do Servo de Jav, o
captulo 50, 4-11 fala da misso e o sofrimento do Servo e por fim os captulos 52 e 53
demonstram uma metfora sobre o Servo sofredor.
A linguagem messinica destes Cnticos do Servo no caracteriza a tradio
messinica de Jerusalm, onde o Messias interpretado como um rei/guerreiro, mas do
Messias de Jud, que identificado como pastor que apascenta seu rebanho, (Mq 5,2-4).
49
Luis Alonso Schkel, Profetas I: Isaas, Jeremias. 2 ed. So Paulo: Paulus, 2004, p. 309. 50
Hans Joachim Kraus. Los Salmos 60-150. 1 ed. Salamanca: Ediciones Sigueme, 1995, p. 174. 51
Claude Winer. O Profeta do Novo xodo: O Dutero-Isaas. So Paulo: Paulinas, 1980, p. 69-77. 52
Jos Severino Croatto, Isaas A palavra Proftica e sua releitura hermenutica: VolI. A libertao
possvel. 1 ed. Rio de Janeiro: Vozes, 1998, p. 201-210. 53
Jos Severino Croatto, Isaas A palavra Proftica e sua releitura hermenutica: VolI. A libertao
possvel. 1 ed. Rio de Janeiro: Vozes, 1998, p. 201-210.
25
De acordo com Siqueira e Santos54
, a literatura proftica do Antigo Testamento
ressalta a esperana no Messias salvador de Israel. Em Miquias 5,2-6 o profeta
esclarece que o Messias esperado no tinha as caractersticas de Ciro, mas era um
pastor, este Messias no era guerreiro como Davi ou Ciro, mas, um Messias pastor,
vindo de Belm.
O profeta Jeremias salienta a promessa em um Messias da casa de Davi, que
governasse com justia e inteligncia, tendo em vista que, Jeremias estava insatisfeito
com o governo de Zedequias, (Jr 23,5-6; 33,14-16).
No perodo exlico, o profeta Ezequiel anunciou o advento do Messias, (Ez 17,22-
23). Ezequiel, semelhante ao profeta Ageu, mencionou que o Messias era um pastor
vindo da casa de Davi (Ag 2,23).
No perodo ps-exlico, o profeta Zacarias anunciou aos judeus que voltaram para
Jud. Neste contexto, Zacarias anuncia o Messias para este povo que estava
reconstruindo sua vida e no podiam deixar de lado a esperana no Ungido. Por volta do
ano 520 a.C. Zacarias anunciou, em alto e bom som, a esperana da chegada do Messias
Salvador (Zc 9,9-10). Zacarias anuncia a vinda de um rei humilde que no trazia
artefatos para guerrear, tendo em vista que seu anuncio a paz para as naes e seu
plano de governo a justia.
O Messias predito por Zacarias diferente de todos os reis de Israel inclusive Davi
e Josias, pois estes possuam poder e exrcito. No entanto, o Messias de Zacarias est
destitudo do poder das armas de guerra e da riqueza, pelo contrario Zacarias anuncia
um Messias pobre assentado sobre um jumentinho.
Este novo conceito de Messias, caracterizado como salvador, justo, pobre e montado
sobre uma cria de jumenta surgiu no exlio babilnico, contemporneo literatura
dutero-isainica que retrata o Messias pobre de Zacarias como um Servo sofredor que
no se assemelha a Ciro.
54
Trcio Machado Siqueira; Sueli Xavier Santos. O messias desde o Antigo Testamento at Jesus Cristo.
1 ed. So Paulo: Cedro, 2008, p. 55-58.
26
1.5.4 O judasmo ps-exlico
Segundo Soares55
, o contato que o judasmo teve com a cultura persa e mais tarde a
helnica, contribuiu para que novos elementos fossem anexados no imaginrio
religiosos judaico, como veremos em seguida.
1.5.5 Ciro no judasmo ps-exlico
De acordo com Soares56
, quando os persas liderados por Ciro (559-530 a.C.),
dominaram Jud a partir de 539 a.C., os dominados sofreram um processo de revoluo
cultural e religiosa. Tendo em vista que, os reis aquemnidas Dario (522-486 a.C.),
Xerxes I (486-465 a.C) e Artaxerxes II (404-359), sucessores de Ciro, deixaram
inscries que revelam o Zoroastrismo57
, como religio oficial do imprio. Assim,
pode-se constatar que a religio persa influenciou povos conquistados, os quais
aderiram ao dualismo persa sobre o bem e o mal, associados a uma crena de um Deus
supremo.
O prprio Dutero-Isaas faz meno ao bem e mal, atribuindo este dualismo a ao
criadora de Jav (Is 45,7).
Nota-se que as ideias persas de vida ps-morte58
so mencionadas em Isaas 26,19.
Portanto, a influncia persa na cultura e religiosidade dos povos dominados contribuiu
para que eles recebessem a poltica pacfica dos persas com bons olhos.
Portanto, os babilnicos receberam Ciro como Pastor de Marduk, os egpcios o
aceitavam como Encarnao de Hrus, e o autor dutero-isainico intitulou-o de
Messias de Jav (Is 45,1).
O Cilindro de Ciro possui texto redigido por sacerdotes babilnicos, no qual Bel,
Nabu e Marduk deuses da Babilnia, favorecem Ciro. Neste texto Marduk profere o
nome de Ciro e o chama para dominar toda terra.
55
Elizangela A. Soares. Variaes sobre a Vida Aps a Morte: Desenvolvimento de uma crena no Judasmo do segundo Templo. Dissertao de Mestrado Universidade Metodista de So Paulo: So
Bernardo do Campo, 2006, p. 40-51. 56
Dionsio Oliveira Sores. As influncias persas no chamado judasmo ps-exlico. Disponvel Em:
http://www.revistatheos.com.br/Artigos/Artigo_06_2_02.pdf. Acesso em 29/09/2012. 57
Religio fundado na Antiga Prsia, pelo profeta Zoroastro, entre 1750 a 1000 a.C. 58
O conceito persa de vida ps-morte identificado no Gathas, que se refere a 17 cnticos que se
acreditava terem sido compostos por Zoroastro. Os cnticos so considerados os textos mais sagrados no
zoroastrismo.
http://www.revistatheos.com.br/Artigos/Artigo_06_2_02.pdf
27
1.5.6 A influncia da cultura e religiosidade persa no judasmo ps-exlico
De acordo com Andrade e Leal59
, os persas mais sofreram influncias dos
dominados do que os influenciaram.
Tendo em vista que, seus palcios e monumentos lembram, quase sempre, as obras
dos assrios e babilnicos. Sua escrita era derivada da cuneiforme mesopotmica.
Executaram grandes obras da engenharia, como o canal que ligava o mar vermelho ao
Mediterrneo.
No entanto, foi na religio que os persas demonstraram certa originalidade.
Primitivamente adoravam o Sol, a Lua e a Terra; at que Zoroastro (ou Zaratustra), que
reorganizou a religio, sofisticando-a. Nesta religio o deus maior era Ormuz, deus do
bem, que se opunha a Arim, deus do mal.
A luta entre o bem e o mal era a essncia da religio de Zoroastro, que ficou
conhecida como masdesmo, fuso entre as crenas populares e os ensinamentos de
Zoroastro. Essa religio baseava-se na sinceridade entre as pessoas e foi transcrita no
livro sagrado Avesta. O imperador era quase um deus, pois, segundo a crena,
governava por ordem de deus.
1.5.7 Ciro e a religiosidade dos povos conquistados
Em 537 a.C. Ciro assina um edito (Ed 1,2-4) permitindo o regresso dos judeus
exilados Jerusalm, bem como a reconstruo do templo. O mesmo saliente que os
sentimentos e prticas religiosos dos povos conquistados eram tolerados pelo soberano
que viu neste comportamento a forma para conseguir a lealdade dos vassalos.
Aps a tomada da Babilnia, Ciro decretou a devoluo das esttuas de culto,
levadas de povos conquistados por Nabonido para as capitais de seus respectivos
templos.
Ciro baixou um edito permitindo a volta dos judeus a Jerusalm, a fim de,
reconstrurem a cidade como tambm o templo (2 Cr 36,22-23; Ed 1,1-5).
59
David Andrade e Daniel Leal. O imprio Persa. Disponvel Em: http://www. portalsaofrancisco.com.
br/alfa/imperio-persa-historia-4.php Acesso em 01/10/2012.
28
Ciro tinha um gigantesco imprio, exerceu domnio sobre muitos povos, mas foi no
campo religioso que ele foi tido como Messias, com a finalidade de beneficiar, um
respectivo povo.
1.5.8 Consideraes conclusivas do primeiro captulo
Conclumos que Ciro libertou os exilados por fins polticos, pois ele tinha em mente
a conquista do Egito, e enviar os exilados para sua ptria era permitir que novamente os
judeus se fortalecessem para servir aos seus propsitos de utiliz-los nas guerras.
A tolerncia religiosa de Ciro diante dos povos conquistados tambm no esta
ligada a um carter bondoso do monarca, mas, a seus interesses polticos. Pois, desta
forma Ciro teria a admirao de todos babilnicos, egpcios e judeus. Seus vassalos os
serviria de bom grato, por entender que ele foi algum enviado pela divindade. Para os
babilnicos o deus Marduk e para os judeus, Jav.
Tambm conclumos que o nico rei ligado figura messinica das tradies de
Belm de Jud e na tradio de Jerusalm, foi o rei Davi. Este monarca foi figura central
da esperana messinica das duas tradies do perodo do Antigo Testamento.
Portanto, o ttulo messinico atribudo a Ciro pelo profeta duteo-isainico em (Is
45,1), no est ligado s tradies messinicas do perodo do Antigo Testamento. Pois,
o profeta dutero-isainico chama o rei Ciro de Messias de Jav, em momento de
grande empolgao dos judeus exilados. Estes judeus foram alcanados pelos boatos do
vasto crescimento do imprio da Prsia, e como o rei Ciro conquistou fortemente a
Mdia e a Ldia. Assim, os exilados depositaram f em Jav, acreditando que ele usaria
o rei estrangeiro Ciro para abater os babilnicos e cessar o cativeiro, permitindo o
regresso dos exilados.
Observa-se que no judasmo ps-exlico, Ciro no lembrado como Messias,
mas, ele visto no livro de Esdras como o libertador dos exilados, o rei que teve seu
esprito despertado por Jav, para baixar um decreto que permitisse aos exilados o
regresso Jerusalm, a fim de reconstrurem o templo, (Ed 1,1-11).
29
2 ANLISE EXEGTICA DE ISAAS 45,1-7
Consideraes introdutrias
Neste captulo analisaremos o ttulo messinico atribudo ao rei Ciro, visto na
percope de Isaas 45,1-7, tendo em vista que no perodo pr-exlico as tradies
messinicas esperavam um Messias proveniente da casa de Davi e no um estrangeiro.
Portanto, neste captulo estudaremos sobre o ttulo messinico atribudo ao rei
Ciro, comparando com as tradies messinicas que percorreram o Antigo Testamento,
especificamente o perodo pr-exlico.
A partir deste captulo tentaremos mostrar como o autor dutero-isainico
interpreta o messiado de Ciro. Para tanto, utilizar-se- a exegese a partir dos seguintes
encaminhamentos:
Primeiro analisaremos a traduo literal do texto, mantendo a sequncia do texto
original, em segundo notificaremos a acrtica textual, a fim de comparar as variantes
entre o texto massortico e a LXX. Em terceiro, demonstraremos as caractersticas
formais do texto, onde se destacar os seguintes pontos: Delimitao, a fim de
apontarmos a unidade da percope. Coeso para identificarmos uma clara sequncia de
contedo.
O estilo da percope, e as repeties de frases. Por fim, o gnero, onde
destacaremos a percope como um orculo de salvao, identificada pela libertao dos
exilados.
O quarto passo do nosso encaminhamento exegtico ser situar o lugar da nossa
percope. Neste ponto, notificaremos o cenrio histrico-social do texto fazendo
apontamentos de datas e acontecimentos histricos.
Por fim, o quinto passo ser a apresentao do contedo, enfocando a
interpretao das palavras, estrofes e pargrafos da percope. Finalizamos o captulo
com as consideraes conclusivas onde conclumos os principais assuntos.
30
2.1 Percope de Isaas 45,1-7: Texto em hebraico
31
2.2 Traduo literal de Isaas 45,1-7
1. Assim disse60 Jav ao seu Ungido, a Ciro que agarrou61 em sua destra, para
subjugar as naes diante da tua face; eu desamarrarei62
os lombos dos reis, para abrir63
diante deles (as) portas e (os) portes no (se) fecharam64
.
2. Eu seguirei65 diante da tua face e aplainarei66, endireitarei67 os caminhos
tortuosos, despedaarei68
(as) portas de bronze e (as) trancas de ferro destruirei69
.
3. E darei70 para ti, tesouros obscuros, e riquezas escondidas, a fim de que saibas71
que Eu (sou) Jav o que te chama72
pelo teu nome, o Deus de Israel.
4. Por causa do meu servo Jac, e Israel, meu escolhido, eu te chamei73 pelo teu
nome, e te dou um nome de honra, embora no me conhecesses74
.
5. Eu (sou) Jav, e no h nenhum outro, com exceo de mim no h Deus, eu te
cinjo75
, embora no me conhecestes76
.
6. Para que se saiba77 que desde o nascer do sol at o poente que, fora de mim, no.
H ningum: eu (sou) Jav e no h outro!
7. Formo78 luz e crio79 escurido, fao80 paz e crio81 mal: eu (sou) Jav fao82 todas
estas coisas.
60
mr, Verbo Qal, perfeito, 3 pessoa, masculino, singular disse. 61
rzq, Verbo Hifil, perfeito, 1 pesso,a comum singular agarrou. 62
ptr, Verbo Piel, imperfeito, 1 pessoa, comum singular desamarrar. 63
ptr, Verbo Qal, infinitivo construto abrir. 64
sgr, Verbo Nifal, Imperfeito, 3 pessoa, masculino plural (se) fecharam. 65
hlk, Verbo Qal, imperfeito, 1 pessoa, comum, singular seguirei. 66
yxr, Verbo Hifil imperfeito, 1 pessoa, comum, singular aplainarei. 67
yxr, Verbo Piel imperfeito, 1 pessoa, comum, singular endireitarei. 68
Xbr, Verbo Piel imperfeito, 1 pessoa, comum, singular despedaarei. 69
gd, Verbo Piel imperfeito, 1 pessoa, comum, singular destruirei. 70
ntn, Verbo Qal com vav consecutivo, 1 pessoa comum, singular darei. 71
yd, Verbo Qal imperfeito, 2 pessoa masculino, singular saibas. 72
qr, Verbo Qal particpio, masculino,singular, chama. 73
qr,Verbo Qal vav consecutivo imperfeito, chamei. 74
Yd, Verbo Qal perfeito, 2 pessoa masculino singular, com sufixo da 1 pessoa comum singular
conhecesses. 75
zr, Verbo Piel imperfeito, 1 pessoa comum singular, com sufixo 2 pessoa masculino singular
cinjo. 76
yd, Verbo Qal perfeito, 2 pessoa masculino singular, com sufixo 2 pessoa masculino singular
conhecestes. 77
yd, Verbo Qal imperfeito, 3 pessoa masculino singular saiba. 78
ytr, Verbo Qal particpio, masculino singular formo. 79
br particpio masculi, singular, 80
sh, Verbo Qal particpio, masculino singular. crio. 81
br, Verbo Qal, particpio masculino, singular, crio. 82
sh, Verbo Qal, particpio masculino, singular, fao.
32
2.3 Crtica textual
Observa-se que no v.1 a LXX83
, mantm o ttulo messinico atribudo a Ciro
-
Assim diz o Senhor [o Deus] ao seu ungido Ciro. No entanto a LXX, acrescenta no
texto um artigo masculino singular antecedendo outro acrscimo, um substantivo
nominativo masculino singular o Deus. Estes acrscimos na LXX foram
introduzidos no texto da LXX pelo Pentateuco de Damasco. Texto que surgiu por volta
do sculo X84
. Nota-se que no texto da Vulgata85
o v. 1 Haec dicit Dominus cristo meo
Cyro, no acrescenta o substantivo Deus, mas mantm uma traduo semelhante a do
texto massortico.
A Bblia de Jerusalm traduz o v. 1 a partir do texto massortico Assim diz YHWH ao
seu Ungindo, semelhante Bblia TEB, Assim fala o Senhor ao seu messias. Ambas
verses portuguesas traduzem o v.1 a partir do texto massortico.
Nota-se que no v. 3 a LXX novamente acrescenta um artigo masculino singular
antecedendo um substantivo nominativo masculino singular,
Por que eu (sou) Senhor [o Deus]
que te chama pelo teu nome. A mesma coisa se repete no v. 5, pois o texto massortico
inicia apresentando Jav - Eu (sou) Jav, e no h
nenhum outro. No entanto na LXX o texto esta anexado a seguinte forma
. Observa-se que aps o termo Senhor, LXX
acrescenta o Deus. Os esforos da LXX em afirmar que o
, nesta percope ainda so identificados no v. 6 quando o texto massortico
conclui o v. 6 dizendo que no h outro alm de Jav -
eu (sou) Jav e no h
83
Septuaginta. 84
Edson de Faria Francisco. Manual da Bblia Hebraica: Introduo ao Texto Massortico. Guia
introdutrio para a Bblia Hebraica Stuttgartensia. 2 Ed. So Paulo: Vida Nova, 2005, 209. 85 Traduo para o latim da Bblia, escrita entre fins do sculo IV incio do sculo V, por So Jernimo, a
pedido do Papa Dmaso I.
http://pt.wikipedia.org/wiki/Latimhttp://pt.wikipedia.org/wiki/B%C3%ADbliahttp://pt.wikipedia.org/wiki/S%C3%A9culo_IVhttp://pt.wikipedia.org/wiki/S%C3%A9culo_Vhttp://pt.wikipedia.org/wiki/Jer%C3%B4nimo_de_Str%C3%ADdonhttp://pt.wikipedia.org/wiki/Papa_D%C3%A2maso_I
33
outro. Mas, a LXX continua a acrescentar o [ ] aps o [].
, - eu (sou) (o) Senhor [ o
Deus] e no existe outro!. Possivelmente, o Pentateuco de Damasco acrescentou na
LXX o [ ], aps o substantivo nominativo masculino singular
[], na tentativa de enfatizar que o Krios como Deus.
2.4 Caractersticas formais
Prxima etapa de nossa exegese observaremos sua forma. Neste ponto,
abordaremos os seguintes pontos: Delimitao, coeso interna, estilo e gnero.
2.4.1 Delimitao do texto
O texto de Isaas 45,1-7 chamado de orculo de salvao para Israel86
. Quanto
unidade desta percope sugere-se que o v. 1 est ligado redacionalmente a (Is 44,28),
em forma de quiasmo (Ciro/pastor/ ungido/Ciro).
Segundo Croatto87
, os sete versculos podem ser divididos em duas unidades
literrias. vv 1-3 e 4-7. Isto se faz pela compreenso de que em vv1-3 h uma espcie de
relado de vocao, onde Ciro intitulado de Messias v. 1, e chamado por Jav pelo
nome. Os vv 4-7 notificam a exclusividade de Jav.
A expresso Assim diz Jav, indica o incio da percope.
Nesta expresso temos o incio da fala do autor dutero-isainico, onde Ciro
apresentado como o Messias, de Jav.
Os restantes dos versos 1b-3 expressam a proteo de Jav a Ciro em suas
campanhas militares vitoriosas. O verso 4-7 propriamente, expressa a eleio de Ciro,
por Jav aquele que forma, cria e faz.
34
86
Jos Severino Croatto, Isaas A palavra proftica e sua releitura hermenutica: VolI. A libertao
possvel. 1 ed. Rio de Janeiro: Vozes, 1998, p. 130. 87
Jos Severino Croatto, Isaas A palavra Proftica e sua releitura hermenutica: VolI. A libertao possvel. 1 ed. Rio de Janeiro: Vozes, 1998, p. 134.
O verso 7 encerra a unidade notificando a exclusividade histrica de Jav. Neste
verso o autor dutero-isainico deixa claro, os trs termos preferidos para indicar a
capacidade criativa de Jav. Pois Jav forma luz, cria
escurido, como tambm faz paz e cria mal fao paz e
crio mal.
2.4.2 Coeso interna
O texto apresenta coeso interna, pois o incio da percope consiste na afirmao de
que Ciro foi chamado por Jav para subjugar a face das naes para depois desarmar os
reis v.1, ainda no v. 1 o messiado de Ciro consiste em libertar diante da sua face (as)
portas para que os portes no se fechassem.
No v. 2, h uma promessa de Jav seguir diante da face de Ciro e depois aplainar,
endireitar e conduzi-lo em linha reta.
No verso 3 a promessa se remete a Ciro atravs de tesouros e riquezas. No verso 5
h outra meno a Jav. Aqui ele aparece como o soberano sem igual, que cingiu a Ciro,
semelhante ao verso 1, que menciona que Jav agarrou Ciro em sua destra.
Os versos 5-6 esto estreitamente coesos, pois neles o autor notifica a soberania
de Jav, afirmando que Eu (sou) Jav, e no h
nenhum outro.
O verso 7 apresenta Jav como o formador da luz criador da
escurido fazedor da paz e criador do mal
.
2.4.3 Estilo
Claramente se observa que esta percope uma poesia, visto que h repeties de
frases. Por exemplo, no verso 1, libertar diante da sua face (as) portas e (os) portes no
(se) fecharam.
Dividimos nosso texto em quatro estrofes (v.1-3; 4; 5-6;7), sendo que a primeira
estrofe (v.1-3), temos um orculo de libertao para Israel, onde Jav diz que Ungiu a
Ciro Assim disse Jav ao seu
Ungido, a Ciro.
35
A segunda estrofe (v.4) semelhante a esta, pois nela Jav identificado como o
que chamou Ciro pelo nome eu te chamei pelo teu nome.
Na terceira estrofe (vv. 5-6) se refere soberania de Jav,
Eu (sou) Jav, e no h
nenhum outro, com exceo de mim no h Deus.
Nesta estrofe Jav cingi Ciro cingi a ti, e
no me conhecestes
A quarta estrofe, notifica a capacidade criativa de Jav, pois na primeira frase, Jav
forma luz e tambm cria escurido, na segunda frase
Jav faz paz como tambm Cria o mal.
Na terceira frase o autor encerra a percope, demonstrando que Jav quem faz
todos estas coisas eu sou Jav fao todas
estas Coisas.
Por fim, esta diviso de estrofes e de algumas frases de nossa percope nos ajudar
para a compreenso do contedo que analisaremos posteriormente.
2.4.4 Gnero
Segundo Croatto88
, o gnero se fere a um orculo de salvao para Israel. Para
Matos89
, os orculos de salvao no Dutero-Isaas se referem a composies poticas
que trazem palavras de salvao e esperana ao povo exilado na Babilnia.
De acordo com Westermam90
, um orculo de salvao, em geral possui as seguintes
cinco caractersticas:
1) Endereamento
2) Confiana
88
Jos Severino Croatto, Isaas A palavra Proftica e sua releitura hermenutica: VolI. A libertao
possvel. 1 ed. Rio de Janeiro: Vozes, 1998, p. 130. 89
Sue Hellen Monteiro de Matos. No Temas! Eis que derramarei meu esprito! Anlise Exegtica de
Isaas 44,1-5. Disponvel Em: www.revistaancora.com.br. ncora: Revista digital de estudantes de
religio. Acesso em 10/10/2012.
Claus Westermann. apud LEE. Stephen. Creation and Remption in Isaiah 40-55. Hong Kong: Alliance
Bible Seminary, 1995, p. 96.
http://www.revistaancora.com.br/
3) Comprovao
36
a. Nominal (Eu sou o seu Deus)
b. Verbal (Eu te ajudo)
4) Resultado: para o suplicante e contra seu inimigo
5) Alvo
O autor dutero-isainico utiliza a imagem de Ciro para anunciar a libertao dos
exilados, por isto Ciro recebe o ttulo de Messias, ou seja, o libertador de Israel v.1.
Em nossa percope observa-se que o Dutero-Isaas, notifica que Ciro foi chamado
por causa do Servo Jac e tambm do Escolhido Israel v.4. Schkel91
salienta que o
autor dutero-isainico interpreta Ciro como o eleito de Jav, para beneficiar Israel, o
povo escolhido de Jav.
Em Is 45,1-7 encontram-se as caractersticas de um orculo de salvao. Pode-se
estruturar o texto do seguinte modo.
1) Endereamento: Ciro o Messias de Jav (V.1)
2) Confiana da salvao apresentada pela expresso: Eu seguirei diante da tua
Face (v. 2).
3) Comprovao: Ela apenas verbal. Jav dar tesouros obscuros e riquezas
escondidas. (v. 3)
4) Alvo/Finalidade: Esta expressa no v. 4
por causa do
meu Servo Jac e de Israel meu escolhido.
A partir disso, conclu-se que o gnero do texto um orculo de salvao. No
entanto, este orculo um tanto quanto diferente, pois o salvador no um homem da
casa de Davi, mas um estrangeiro que recebe o ttulo de Messias de Jav92
,
Assim disse Jav ao seu Ungido, a
Ciro v.1.
91
Lus Alonso Schkel. Profetas I: Isaas e Jeremias. 2. ed. So Paulo: Paulus, 2004, p. 309. 92
Lus Alonso Schkel. Profetas I: Isaas e Jeremias. 2. ed. So Paulo: Paulus, 2004, p. 309.
37
2.5. Lugar
Para compreenso da poca e do lugar vivencial de nosso texto, importante trazer
uma breve discusso sobre a autoria dos captulos 40-55 do livro de Isaas, denominado
Dutero-Isaas pela pesquisa bblica. A grande discusso gira em torno de seu autor
ser um nico profeta, ou texto de autoria coletiva da comunidade exilada.
Schwantes93
apresenta uma proposta interessante para a resoluo desta questo. Ele
notifica que os textos de Isaas 40-55 seriam textos da comunidade, cantores do templo
no meio dos exilados. Portanto, trata-se de uma profecia comunitria, fato que
explicaria melhor o carter annimo da profecia. Alm de explicar a semelhana e
divergncia dos cantos do Servo com o restante do livro do Dutero-Isaas.
Quanto data, o texto no traz grandes discusses, visto que pertence a uma
unidade literria maior (caps 40-55). Sabe-se que estes so textos do perodo exlico
babilnico.
Para ser mais exato, o texto do Dutero-Isaas do perodo final do exlio, por volta
de 550-540, pois a rpida vitria de Ciro sobre o rei ldio Creso 546 a.C., possivelmente
se reflita nos textos profticos de Isaas 41,2s; 45,1s, mas, no reflete a tomada da
Babilnia em 539 a.C.
O profeta esperava que Ciro libertasse os deportados judatas e permitisse que eles
retornassem a Jerusalm e reconstrussem o Templo.
Portanto, o Dutero-isaas apresenta Ciro como o Messias de Jav, ou seja, o
ajudador e libertador de Israel94
. Segundo Matos95
, a profecia de Dutero-Isaas
posterior profecia de Ezequiel, que atuou por volta de 570 a.C. Portanto, Dutero-
Isaas pertence segunda gerao de exilados96
.
93
Milton Schwantes, Sofrimento e Esperana no Exilo Histria e Teologia do Povo de Deus no sculo
VI A.C. 1 ed. So Leopoldo: Sinodal, 1987, p. 89.
94
Georg Fohrer. Histria da Religio de Israel. So Paulo: Paulinas, 1982, p. 400. 95
Sue Hellen Monteiro de Matos. No Temas! Eis que derramarei meu esprito! Anlise Exegtica de Isaas 44,1-5. Disponvel Em: www.revistaancora.com.br. ncora: Revista digital de estudantes de
religio. Acesso em 10/10/2012. 96
Milton Schwantes. Sofrimento e Esperana no Exlio: Histria e Teologia do povo de Deus no sculo
VI a.C. So Leopoldo: Oikos, 2009, p. 93.
http://www.revistaancora.com.br/
O perodo babilnico marcado pelo enfraquecimento do imprio neo-assrio
(aproximadamente entre 630-612 a.C.) e a conquista da Babilnia por Ciro, rei persa em
38
539 a.C. O imprio neobabilnico, sob a dinastia dos caldeus assumiu a herana da
Assria em vrias partes do Antigo Oriente Prximo.
A estrutura de poder desse imprio colocou outros imprios grandes em segundo
plano, como foi o caso do Egito97
.
As aes de Nabopolassar (625-605 a.C.) marcam o incio dinastia neobabilnica.
Sua poltica externa estava baseada na diplomacia, isto , atravs de acordos ia
conquistando seu espao no oriente.
Quanto sua poltica interna, ele reconstruiu todos os templos babilnicos para os
deuses Shamash e Marduk. Com Nabucodonosor II (605-562 a.C.) o imprio babilnico
teve seu grande pice.
Ele conquista o corredor siro-palestinense, retirando assim o Egito desse domnio,
visto que ambos lutavam pela conquista deste corredor. Alm disso, Nabucodonor II
continuou a poltica do pai quanto reconstruo dos antigos templos de Marduk98
.
A retirada do Egito do corredor siro-palestinense significou ao povo de Jud a
libertao do poder egpcio. Agora, o rei imposto pelo imprio babilnico era Sedecias.
No entanto, no duraria muito essa liberdade. Sedecias se revolta contra o imprio
babilnico (cf. 2 Rs 24,20b). Diante disso, Nabucodonosor sitia a cidade de Jerusalm, a
qual ser destruda em 587 a.C., e deporta os jerosolamitas para a Babilnia.
A primeira deportao, ocorrida em 597 a.C., foram levados o rei e a sua corte,
gesto que visava exercer presso sobre os que ficaram. Foram como refns que
permaneceram junto corte babilnica.
A segunda deportao ocorre em 587 a.C., em que foram levados mais habitantes da
capital e, dessa vez, alguns pobres tambm foram deportados (cf. Jr 52,15). Esses
deportados se juntaram aos exilados de 597 a.C. Aps 587 a.C. parece ter ocorrido outra
deportao, conforme Jr 52,30. No entanto, uma deportao menor. Somando as trs
deportaes, teriam sido levadas cerca de 15 mil pessoas, oriundas basicamente da
populao de Jerusalm que representavam a nata poltica, eclesistica e intelectual de
97
Hebert Donner. Histria de Israel e dos povos vizinhos. v. 2. 4ed., So Leopoldo: Sinodal, 2006, p.
410. 98
IDEM, 413-414.
sua terra. O exlio babilnico , principalmente, um exlio dos cidados da capital.
Levando em considerao a primeira deportao em 597 a.C., o incio da pregao do
Dutero-Isaas, por volta de 550, passou-se quase 50 anos.
39
Os exilados no admitem mais esperana de retorno Palestina. Entretanto, o
imprio babilnico comea a ficar instvel. A poltica religiosa de Nabnides (556-539)
trouxe grande discrdia para Babilnia, pois ele adorava a deusa da lua Sin e procurou
elev-la suprema posio de panteo babilnico, o que atraiu inimizades com os
sacerdotes de Marduk. Nesse mesmo perodo o poder de Ciro aumentava
vertiginosamente. Conquistara Ecbtana em 553 a.C. e a Ldia em 547 a.C.99
.
A comunidade exilada estava no campo, num lugar chamado Nipur. A plantavam.
Eram escravos, isto , eram trabalhadores forados pelo imprio, produzindo para sua
prpria sobrevivncia e pagando pesados tributos aos babilnicos100
. Possuam
liberdade para fazer reunies e assim manter uma espcie de vida comunitria (cf. Ez
8,1; 14,1; 33,30ss)101
.
Entretanto, com o exlio houve uma crise teolgica. O prprio status do Deus de
Israel foi colocado em dvida. A nao monotesta de Israel havia sido subjugada por
uma nao pag. Desse modo, havia uma grande tentao por abandonar a religio
ancestral (cf. Jr 44,15-19; Ez 33,10). Havia uma ameaa geral de perda da f. A religio
de Israel estava sendo provada numa situao de vida ou morte. Precisava esclarecer sua
posio diante das grandes naes e de seus deuses, diante da tragdia nacional e de sua
significao ou ento perecer102
.
A pregao do Dutero-Isaas , portanto, de esperana, e no de julgamento, como
os profetas anteriores, embora possa repetir determinadas acusaes. Todavia, essas
acusaes so para mostrar que o culpado o povo e no Jav103
.
Nesse sentido, surgem os orculos de salvao. Como todo gnero literrio, os
orculos de salvao tambm possuem seu Sitz im Leben. O lugar vivencial o culto104
.
Mas como falar de culto no exlio sem Templo? Esses orculos de salvao tm como
lugar vivencial as reunies comunitrias entre os exilados, uma vez que os deportados
99
Lus Alonso Schkel. Profetas I: Isaas e Jeremias. 2. ed. So Paulo: Paulus, 2004, p. 270. 100
Milton Schwantes. Breve Histria de Israel. So Leopoldo: Oikos, 2008, p. 55. 101
John Bright. Histria de Israel. So Paulo: Paulus, 2003, p. 432. 102
IDEM, pp. 416-417. 103
Werner H. Schimidt. Introduo ao Antigo Testamento. So Leopoldo: Sinodal, 2004, p. 246. 104
Claus Westermann. Isaiah 40-66: A Commentary. Philadelphia: The Westminster Press, 1969, p 11.
ficaram juntos e puderam preservar sua lngua, seus ritos, seus costumes, sua religio.
Em outros termos, mantiveram sua identidade105
.
40
2.6 Contedo
2.6.1 Ciro o Messias de Jav (v.1)
Segundo Schkel106
, pela primeira vez na histria do povo escolhido, um orculo
favorvel de Deus, se dirige a um rei estrangeiro, outorgando-lhe o ttulo de Messias de
Jav. No entanto, K. Seybold107
menciona que o autor dutero-isainico atribui o ttulo
de Messias ao rei Ciro, empolgado, entusiasmado e no auge da alegria, pelo fato de o
profeta esperar que Ciro libertasse os deportados judatas e permitiria que eles
retornassem a Jerusalm e reconstrussem o Templo.
Portanto, o ttulo messinico atribudo a Ciro no se referia ao Messias rei da
tradio jerosolimitana, ou o Messias pobre, servo, justo, pastor, promotor da justia e
da paz, da tradio judata j mencionados. O autor dutero-isainico enxerga em Ciro,
caractersticas da tradio de Jerusalm que se referem ao Messias guerreiro e violento
representado pelo cedro e no pelo cajado, mas, ao intitular Ciro de Messias, ele no
pretendeu substituir a esperana no Messias vindo da casa de Davi, mas apresent-lo
como libertador dos judeus exilados.
Croatto108
menciona Ciro como aquele que Jav tomou pela mo direita, com a
finalidade de abater as naes e libertar os judatas exilados.
2.6.2 O decreto de Ciro
De acordo com Schwantes109
, o decreto de Ciro se tornou muito importante, pois a
histria do cronista o reproduz trs vezes: 2 Crnicas 36,22-23; Esdras 1,1-5; 6,3-5. Os
105
Milton Schwantes. Sofrimento e Esperana no Exlio: Histria e Teologia do povo de Deus no sculo
VI a.C. So Leopoldo: Oikos, 2009, p.24. 106 Lus Alonso Schkel. Profetas I: Isaas e Jeremias. 2. ed. So Paulo: Paulus, 2004, p. 309. 107 K. Seybold, mashah, Em: Theological Dictionary of the Old Testament. Vol. IX. Grand Rapids/Cambridge: Willian B. Eerdmans Publishing Company, 2004, p. 43-54. 108
Jos Severino Croatto, Isaas A palavra Proftica e sua releitura hermenutica: VolI. A libertao possvel. 1 ed. Rio de Janeiro: Vozes, 1998, p. 131-132. 109
Milton Schwantes. Sofrimento e Esperana no Exlio: Histria e Teologia do povo de Deus no sculo VI a.C. So Leopoldo: Oikos, 2009, p.126-127.
textos no conferem exatamente. Schwantes compreende que os textos so de edies
diferentes e considera o texto de Esdras 6,3-5 como o mais autntico.
41
Esdras 6,3-5
Este decreto enfoca somente o templo, determinando sua reconstruo, definindo
sua funo, seu tamanho, seu financiamento e a devoluo de seus utenslios. Esta
restaurao apresentada especificamente como um projeto persa.
Os exilados no aparecem, no entanto, isto no significa que eles no tivessem
estado por trs da edio da Tor. Isto explica por que o rei Ciro, um ano aps ter
assumido o poder da Babilnia, tenha se preocupado com a distante e destruda
Jerusalm. Ser que os exilados se reuniro para a obteno deste decreto? Bem, o
profeta dutero-isainico anos antes j havia aclamado Ciro como o Messias de Jav,
ou seja, o libertador de Israel (Is 45,1).
Foi na administrao persa e com seu apoio que os exilados passaram a definir o
futuro do templo, de Jerusalm e de Jud. A pergunta que nos acabe por que Ciro
beneficiou os exilados com a liberdade e estabeleceu um decreto para a reconstruo do
templo e das cidades de Jerusalm e Jud?
Schwantes menciona que esta atitude do rei Ciro pode estar ligada aos seus
interesses polticos110
. Tendo em vista que, em 538 a.C. o Egito ainda no estava sobre
o controle dos persas e contar com o apoio de Jerusalm e Jud estar porta das
entradas das terras do Nilo. Portanto, Schwantes sugere que o decreto de Ciro tem a ver
com a pretendida invaso do Egito, efetuada em 525 a.C.
110
IDEM, 127.
3No primeiro ano do rei Ciro, o rei Ciro ordenou: Templo de Deus
em Jerusalm. O Templo ser reconstrudo para ser um lugar onde se
ofeream sacrifcios, e seus alicerces devem ser restaurados. Sua
altura ser de sessenta cvados e sua largura de sessenta cvados . 4Ter trs fileiras de pedras talhadas e uma fileira de madeira. A
despesa correr por conta da casa do rei. 5Alm disso, sero
restitudos os utenslios de ouro e de prata do Templo de Deus que
Nabucodonosor retirou do santurio de Jerusalm para lev-los para
Babilnia; de modo que tudo retome seu lugar no santurio de
Jerusalm e seja deposto no Templo de Deus."
(Esdras 6,3-5)
Os persas conquistam o Egito na Batalha de Pelsio, no mais pelas mos de Ciro,
pois Ciro morreu em 530 a.C., na batalha contra os Massgetas sob o reinado de
42
Tmiris. A narrativa herodotiana notifica que a rainha Tmiris profanou o corpo de
Ciro, pois o rei persa tinha matado seu filho em uma batalha111
.
O conquistador do Egito foi Cambises, filho de Ciro. Ele venceu o fara Psamtico
III, filho de Ahms, poucos egpcios conseguiram fugir para Mnfes e permanecerem
vivos.
O governo de Ciro era evidenciado pela generosidade com os povos conquistados,
no entanto seus sucessores no seguiram seu exemplo. O reinado de Cambises
evidenciado por pouca diplomacia e muitas guerras, no entanto, Cambises semelhana
de Ciro adotou alguns costumes e traos da religiosidade faranica, mas esta sua atitude
dura pouco tempo, pois Cambises mata bois sagrados, ridiculariza e queima alguns
deuses do Egito. No entanto para com seus sditos judias e jerosolimitas no h meno
de violncia e agressividade.
2.6.3 Eu seguirei diante da tua face (v.2)
Croatto112
menciona como o Dutero-Isaas demonstra Ciro sob a conduta de Jav,
Eu seguirei diante da tua face. Schwantes salienta que o
Dutero-Isaas, interpreta os avanos militares de Ciro como estando dentro do
propsito de Jav113
. Portanto, Jav seguia diante de Ciro, e por isto a Babilnia foi
conquistada.
Os muros da Babilnia com seus portes no intimidam a esperana dos exilados,
pois o autor dutero-isainico enfatiza que Jav despedaa as portas de bronze e destruir
as trancas de ferro
(as) portas de
bronze despedaarei e (as) trancas de ferro destruirei v. 2. Portanto, os judatas esto
111
Herdoto. O Relato Clssico da Guerra entre Gregos e Persas. 2 ed. So Paulo: Prestgio, 2001, p.
181. 112
Jos Severino Croatto, Isaas A palavra Proftica e sua releitura hermenutica: VolI. A libertao possvel. 1 ed. Rio de Janeiro: Vozes, 1998, p. 131. 113
Milton Schawantes. Sofrimento e Esperana no Exlio: Histria e Teologia do povo de Deus no sculo VI a.C. So Leopoldo: Oikos, 2009, p. 99.
confiantes que Ciro os libertar, pois ele o Messias de Jav, ou seja, o libertador de
Israel. Knight114
ressalta que o Dutero-Isaas diz que Jav est prestes a nivelar as
montanhas ante, os ps de Ciro, ou seja, nada poder impedir o Messias de Jav, de
conquistar a Babilnia e libertar os exilados.
43
2.6.4 Tesouros e riquezas ao Messias de Jav (v. 3)
Segundo Knight115
, o autor dutero-isainico ao mencionar os tesouros obscuros e
a