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EXPERIÊNCIAS NO FUNDAMENTAL: O TEATRO DE SOMBRAS E A
ANIMAÇÃO STOP MOTION COMO RECURSO PARA EXPLORAÇÃO DO
IMAGINÁRIO BRASILEIRO.
Resumo
A intenção desta apresentação é – além de relatar a experiência realizada através do recurso do teatro de Sombras, numa das escolas conveniadas ao Programa PIBID do Curso Licenciatura em Belas Artes da UFRRJ – enfatizar o potencial da animação, em especial, da animação stop motion com recortes bidimensionais – cujo processo se assemelha à experiência com o teatro de Sombras que realizamos –, como meio de envolvimento dos alunos da educação básica por referenciais da arte e do imaginário cultural brasileiro. Inserindo-se numa importante corrente da arte-educação contemporânea, a utilização dos recursos audiovisuais nos parece hoje um potencial a ser explorado, sobretudo, uma vez que permite um trabalho de síntese, com várias linguagens diferenciadas, numa proposta de pesquisa e convergência de elementos culturais, históricos, literários, poéticos, visuais, musicais, de modo que cada um possa trabalhar de acordo com motivação e natureza particular. Trata-se assim de uma abordagem sobre as potencialidades destas novas tecnologias como um meio eficaz nodespertar interesses por aspectos do imaginário cultural e artístico brasileiro, baseado no caráter atual e de encantamento que produz em jovens e adultos. No caso das experiências aqui apresentadas, viemos refletindo a animação stop motion como meio de envolvimento e repercussão de referências culturais diversificadas, em especial,relacionadas ao imaginário brasileiro, de maneira a propor um processo de criação a partir do observado e vivenciado. Consideramos como função da educação este trabalho de construção cultural e do imaginário do educando, na intenção de ampliação dos referenciais do mundo interno do indivíduo e no despertar o interesse pelo conhecimento. Visa-se afirmar os recursos utilizados como meios que têm possibilidades de propor dinâmicas criativas de motivação para o aprendizado e para o enriquecimento cultural e artístico dos educandos, contribuindo com propostas que possam “despertar” novos interesses e perspectivas.
Palavras-Chaves: Arte-Educação, Animação, Cultura brasileira
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Apresentação
Este trabalho se originou de propostas dentro do Programa de Iniciação à
Docência – PIBID – do curso de Licenciatura em Belas Artes da Universidade Federal
Rural do Rio de Janeiro – UFRRJ, sendo também vinculado ao projeto Laboratório da
Imagem Audiovisual: Experiências Didáticas do Ensino Artístico a partir da Inclusão
dos meios Audiovisuais, do mesmo curso, que, trabalhando em conjunto com o referido
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Luciana Diláscio Neves
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Programa de Iniciação à Docência, vem refletindo sobre as possibilidades didáticas com
os recursos audiovisuais, em especial, da animação stop motion.
O objetivo deste texto é – além de apresentar a experiência que realizamos
através do recurso do teatro de Sombras, numa das escolas conveniadas ao Programa
PIBID – enfatizar o potencial da animação, em especial, da animação stop motion com
recortes bidimensionais, como meio de envolvimento dos alunos da educação básica por
referenciais da arte e do imaginário cultural brasileiro.
O trabalho do PIBID Licenciatura em Belas Artes da UFRRJ vem se
desenvolvendo na proposta de valorização da arte e cultura nacional, em especial, do
folclore e da cultura popular, pesquisando sobre as raízes culturais brasileiras, e
propondo nas escolas da educação básica conveniadas ao Programa, atividades artísticas
a partir do imaginário repercutido. Nosso objetivo, no âmbito da licenciatura, tem sido o
de afirmar a valorização da pesquisa sobre tão precioso e complexo tema, considerando
que este tema, relacionado às nossas origens culturais, envolve o tema da imaginação
humana, do mítico; sondagens sobre as origens do nosso modo de ver, pensar, sentir,
imaginar. Acreditamos que a pesquisa e o contato com tais fontes, podem contribuir
para soluções que venham a fazer com que este tema, humano e artístico, possa ser
melhor vivenciado entre os alunos da educação básica, não como algo inerte, exemplos
estereotipados e ultrapassados de algo que não nos pertence mais, mas como algo que
pode ser “sentida” como nossa, encontro com secretas fantasias, pensamentos e
imaginações que, de certo modo, também são nossas; priorizando assim, o folclore e a
cultura popular, não como algo setorizado, pertencente a uma classe específica a qual
pouco temos contato, mas sim, como algo que faz parte de nossa formação.
Neste sentido, destacamos a importância da sensibilidade, da imaginação, e da
poesia para a educação; empenhando-nos em salientar o valor da educação poética, do
lúdico, do mítico, de modo que, no caso da proposta deste trabalho, esta educação
poética tem procurado se realizar pela vivência e pelo contato com o imaginário de
nossas origens culturais.
Por outro lado, a utilização dos recursos audiovisuais, em especial da animação,
nos parece hoje um potencial a ser explorado, sobretudo, uma vez que permite um
trabalho de síntese, com várias linguagens diferenciadas, abrangendo diversas
motivações e inclinações pessoais.
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O projeto Laboratório da Imagem Audiovisual que vem sendo desenvolvido
dentro do referido curso, compreende que a perspectiva que se abre a partir do uso dos
meios audiovisuais tem se caracterizado por uma ampliação do vínculo entre a
experiência do ensino artístico e as relações de trabalho, ajudando na pertinência e
valorização do ensino artístico na atualidade. Cria também motivação e estímulo à
pesquisa por parte dos licenciandos, envolvendo, de igual maneira, alunos da educação
básica, colaborando para o interesse sobre vários aspectos da criação e da arte e, de
modo que, estas artes novas, por assim dizer, corroborem na valorização de artes antigas
e/ou diversificadas, promovendo intercâmbio e re-significação. Compreende-se ainda
que a utilização dos procedimentos próprios da linguagem audiovisual propicia uma
contribuição didática na área de Artes, na facilitação para a compreensão de
determinadas instâncias do conhecimento sensível e/ou intuitivo. O instrumental
audiovisual permite, de forma clara e didática, a reconstrução de qualquer fato ou
experiência humana através de inúmeras formas de combinação, em contraste com a
percepção de uma lógica única. Esta propriedade, esta capacidade de fragmentação e
recombinação de material significativo com uma clareza particular, facilita a
compreensão de processos de construção de sentido que são inerentes a qualquer arte. O
raciocínio poético, as articulações sobre material de significação humana são próprias
de toda arte, mas ressaltamos o potencial didático que este meio predispõe,
considerando também a inter-relação com outras artes.
Em especial, no caso das propostas de realização de animação na educação
básica ou do teatro de sombras filmado, experimentações que viemos realizando,
salienta-se que toda proposta nesta direção tem sido a de convergir habilidades e
motivações pessoais diferenciadas, integrando os alunos em torno de uma atividade
coletiva que envolve enredo, literatura, poesia, música, desenho, pintura, dramatização
e, de modo que cada um possa trabalhar de acordo com sua tendência e natureza
particulares. Isto contribui para o maior envolvimento dos alunos da educação básica
pela disciplina de Artes, ajudando no despertar interesses por contextos culturais
diversificados, por literatura, músicas, poesias, referências visuais diversas; ampliando o
universo cultural destes alunos e também dos licenciandos, na medida em que os
mesmos se envolvem com a pesquisa de tais elementos, pesquisando e coletando estes
materiais que deverão ser utilizados na educação básica para a criação sintética de uma
animação ou do teatro de sombras filmado.
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Teatro de Sombras: Uma Experiência no Fundamental
Um exemplo que, a nosso ver, foi muito bem sucedido, foi realizado no Centro
de Atenção Integral à Criança, CAIC- Paulo Dacorso Filho, escola de Seropédica, RJ,
em que trabalhamos com o ensino fundamental – 6º ao 9º ano. Segundo o resumo do
aluno Lucas Moratteli, bolsista do PIBID Belas Artes, realizado para a XXI Jornada de
Iniciação Científica da UFRRJ, em 2011, tratou-se de uma adaptação de um trecho do
livro Martim-Cererê do poeta modernista Cassiano Ricardo, realizada através do
recurso do teatro de sombras, tendo sido, tal material, filmado e editado. O texto conta
de forma mítica e poética o descobrimento do Brasil, e foi escolhido em função de um
evento escolar – A Feira Cultural – dedicado à compreensão sobre o Folclore e Cultura
Popular. Tal referência, Martim Cererê (1928) é uma narrativa em versos, inspirada nas
lendas do folclore brasileiro, contando uma espécie de mito da formação do Brasil: Na
história, Uiara, Aimberê, o marinheiro português e o africano são componentes da
narrativa, remetendo as três raças que foram essenciais para a formação do Brasil e do
povo. Este tema permitiu uma série de desdobramentos a respeito da formação étnica e
cultural do Brasil, ajudando certamente na compreensão sobre o que é o folclore e a
cultura popular. Aproveitou-se a situação para explicitar que muitos artistas
consagrados produziram suas obras inspirando-se e bebendo desta fonte – que é o
folclore e a cultura popular –, tal como ocorreu com artistas, músicos e poetas do
modernismo, a exemplo de Cassiano Ricardo, Mário de Andrade, Cândido Portinari,
Heitor Villa-Lobos, entre outros.
Este trabalho fazia parte de uma série de atividades relacionadas ao folclore e
cultura popular a ser apresentada neste evento específico do CAIC Paulo Dacorso Filho,
A Feira Cultural. Dentro do PIBID Licenciatura Belas Artes foi planejada a elaboração
de três encenações dirigidas à educação fundamental, sendo organizadas e orientadas
pelos bolsistas do Programa, com as devidas supervisões e coordenação, tanto da escola,
quanto da coordenadora do PIBID Belas Artes, e sendo realizadas e dramatizadas pelos
alunos do CAIC. A temática, assim, girou em torno da mítica popular e de alguns
folguedos brasileiros. Após um mês e meio de trabalho dos bolsistas junto aos alunos do
CAIC, fossem nas aulas de Artes, com supervisão da professora da escola, fossem em
tempos extras devidamente marcados, o resultado deste “projeto” culminou com as
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encenações realizadas pelos alunos do CAIC, no referido dia de evento pré-estabelecido
pela escola. Aqui, nossa abordagem se concentra apenas na encenação do Martim-
Cererê com o recurso do teatro de Sombras.
Embora o livro de Cassiano Ricardo não fosse fonte direta do folclore brasileiro,
nosso objetivo foi utilizar tal adaptação no sentido de valorizar a estima sobre o
folclore, mostrando ser o mesmo, fonte de inspiração para muitos artistas consagrados.
Como afirma Lélia Coelho Frota:
A geração modernista partirá para a “descoberta do Brasil” sem discriminar sobre o popular e o culto, fator que contribuirá fortemente para a abordagem da vida e do saber das camadas populares. Aumentava a consciência da circularidade, do vaivém permanente de dados culturais entre as diversas classes, do permanente movimento de “subida” e “descida” de elementos entre os níveis da cultura alta e do povo comum, tão enfatizados mais tarde pelos estudos de história das mentalidades (2005, p. 27).
Nossa intenção na educação fundamental não era intelectualizar questões que
possuem certa complexidade, mas sim, fazer vivenciar esta realidade, apresentando o
imaginário a ela associado através do contato com diversos tipos de formas e imagens.
Já com relação à licenciatura, nosso objetivo era o aprofundamento destas questões, de
maneira que pudessem ser refletidos processos didáticos para a educação básica que
abordem complexo e profundo tema sobre a imaginação e vivência humana – que é o
folclore – respeitando um nível de aprendizado apropriado.
A partir da adaptação do trecho do livro Martim-Cererê, os bolsistas-
licenciandos do curso desenvolveram um processo de trabalho junto ao oitavo ano do
CAIC, utilizando recortes bidimensionais e convergindo encenação, desenhos e
músicas. O trabalho de criação dos personagens, que apareceriam apenas como o recorte
da “silhueta” das figuras, foi baseado em estudo das formas e das qualidades plásticas
envolvidas na técnica. Os personagens são silhuetas recortadas de papel grosso que
quando são postas entre a luz e o tecido criam a sombra desejada. Na terceira etapa, com
todo o material cênico já criado, foi feito ensaio da apresentação somado à definição das
músicas em conjuntos com as falas (ensaiadas e declamadas pelos alunos do CAIC).
Neste trabalho, uma vez que toda a proposta estava voltada para a compreensão e
abordagem sobre o folclore e a cultura popular, nos referenciamos também em imagens
de xilogravura e literatura de cordel para a concepção dos desenhos dos cenários e das
configurações dos personagens da história.
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Foi interessante observar como atividades diversas puderam ser trabalhadas
numa única proposta. A partir da idéia do enredo com apresentação e contextualização
do tema, é possível trabalhar todas as etapas de confecção necessária à encenação,
abrindo espaço para tratar de questões do desenho e do estudo sobre a configuração
através da silhueta das figuras, e prosseguindo, com estudo das dramatizações, dos tipos
de músicas a serem utilizadas, com seus ritmos, e a relação da tonalidade de cada cena
com a melodia e o ritmo musical escolhido, entre inúmeras maneiras de abordagem e
desdobramento do processo de trabalho.
Na prática, no caso deste projeto, grande parte das confecções – devido ao curto
prazo de tempo, já que tínhamos como propósito a apresentação do resultado num
evento com data já fixada – acabaram não sendo feitas pelos alunos do CAIC, tendo os
bolsistas, no entanto, mostrado e demonstrado tudo que fora feito fora da escola. Foi a
partir desta experiência que começamos a refletir sobre como seria um processo de
trabalho que pudéssemos levar em conta todas as etapas de execução, assim como as
variadas inclinações, afinidades e motivações pessoais.
Com relação à encenação do Martim-Cererê foram utilizadas músicas do
Quinteto Armorial, cujos integrantes fizeram parte do Movimento Armorial, iniciado
oficialmente em 1970; o Movimento destacou-se na música erudita de raízes populares,
inspirada nos cantares dos nossos Romanceiros, dos toques de pífano, das violas e
rabecas dos cantadores populares. A intenção na utilização destas músicas era, mais
uma vez, apontar exemplos que buscaram resgatar nossas origens culturais, numa união
entre o erudito e o popular. Além destas, outra referência musical utilizada foi um
trecho da Bachiana brasileira nº 5, do músico brasileiro Heitor Villa-Lobos. Compositor
do século XX, vinculado aos ideais modernistas, Villa-Lobos é outro exemplo de quem
bebeu amplamente dos temas populares e folclóricos, das cirandas e cantigas anônimas,
exemplificando aos alunos do fundamental, mais uma vez, o que nos diz Lélia Coelho
Frota a respeito deste movimento de circularidade entre o popular e o erudito. Todas
estas referências foram apresentadas aos alunos do fundamental na medida em que iam
sendo contextualizadas e incorporadas à encenação.
Este exemplo, a nosso ver, ilustra bem a proposta de pesquisa e convergência de
vários elementos culturais, históricos, literários, poéticos, visuais, musicais, conjugando
conteúdos e motivações diversas. Utilizamos o teatro de sombras filmado como um
produto desta experiência que estamos tentando desenvolver nas escolas da educação
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básica através dos recursos do Audiovisual. O teatro de sombras foi uma opção em
desenvolver tal proposta de trabalho com um recurso mais simples, sendo simplesmente
filmado e editado no final.
Planejamento e Processo de trabalho a partir da Animação Stop Motion
A partir desta experiência realizada com o teatro de Sombras, viemos refletindo
a proposta de um processo de trabalho semelhante, porém, tendo suas etapas mais
definidas, com tempo adequado a cada uma delas, e utilizando o recurso da animação
stop motion – a partir de recortes bidimensionais – um procedimento de animação de
silhuetas bastante semelhante ao teatro de sombras. Um exemplo o qual, na licenciatura,
viemos refletindo, é o trabalho da animadora alemã Lotte Reiniger (1889-1981). A
animadora desenhava e recortava em pedaços de papéis que utilizava como silhuetas
com movimentos articulados, e que animava, fotografando quadro a quadro.
Neste sentido, a proposta que vem sendo refletida é a da organização de como
estas etapas podem ocorrer dentro do processo de aprendizagem da experiência como
um todo; ou seja, dentro da proposta de uma animação, resultaria um trabalho de
síntese, abarcadas várias questões e aptidões, e devendo ser pensadas como estas
estariam encadeadas e planejadas.
De acordo com nossa experiência, após apresentação de um enredo, com
contextualização de um tema e dos conteúdos relacionados, assim como do imaginário
que estamos querendo fazer repercutir (neste sentido, podemos nos utilizar de histórias,
contos literários, poesias, filmes, músicas e imagens variadas); temos iniciado
trabalhando com a parte do desenho e das artes visuais. Deste modo, temos partido da
apresentação e observação de variadas referências visuais, sejam estas, objetos naturais
ou imagens de referências culturais, sejam imagens impressas de pintura, escultura,
gravura e demais manifestações artísticas.
O objetivo desta intenção é o enriquecimento do imaginário visual
proporcionado com a observação de formas variadas de expressão. É notório que, em
considerável parte dos casos, os alunos passam a desenhar com as referências mentais
que trazem consigo e, muitas vezes, estas referências se tornam formas estereotipadas e
repetitivas pela falta de contato com referências diferenciadas e mesmo pela falta do
exercício propiciado pela observação concentrada do mundo ao redor. É comum o fato
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de “olharmos” as coisas genericamente, mais com o conceito mental que carregamos
das mesmas, do que as “vendo” realmente, por isso, a observação concentrada em
formas ricas em expressão, possibilitam um espaço distendido desta experiência em que
a assimilação de novas formas se fundem na percepção e expressão particular de cada
aluno. Segundo Ana Mae Barbosa (2002, pp. 79-82) a respeito de algumas idéias sobre
arte-educação de John Dewey, o trabalho combinado da observação e da imaginação,
aprofunda a capacidade de expressão do indivíduo, na medida em que amplia os
significados da experiência. Para o pensador, o potencial da expressão criativa não
ocorre nem na interpretação como descarga emocional, nem como imitação ou cópia do
real, mas na tensão entre o sujeito e o mundo, entre o subjetivo e o objetivo. Dewey
criticou a livre expressão como pura subjetividade (como prática-teórica exercida na
década de 40), acreditando se tratar de uma experiência não integrativa da relação
homem-mundo, e, portanto, pobre de significação; por outro lado, a subordinação da
imaginação a uma prática mecânica de representação, resultaria igualmente numa
experiência pouco significativa. Segundo Barbosa, colocando a imaginação como
operação central da educação e da experiência estética, na teoria de Dewey:
A imaginação projeta o significado além da experiência comum, e é uma característica humana gravada na textura da experiência da criança e do adulto. A subordinação da imaginação à racionalização não é um indício de maturidade, mas sim de mecanização (2002, p. 85).
De certo, ao abordarmos este campo, estaríamos tratando mais da prática do
desenho. Esta parte da atividade, por exemplo, poderia ser proposta a todo o grupo de
alunos ou somente a um grupo específico, mais propenso a esta aptidão, assim como
outros teriam maiores vocações para outras. O importante é observar que todas as
inclinações e etapas estariam vinculadas a síntese de um resultado, no caso, a animação.
Isto cria motivação e interesse por cada etapa que terá seu valor na apreensão do
conjunto. Desta maneira, acreditamos que uma atividade como esta, aliada ao
encantamento que exerce em jovens e adultos, se apresenta como um recurso capaz de
despertar interesses por diversificadas práticas, aptidões, conhecimentos.
Não nos deteremos aqui nas inúmeras possibilidades de atividades que podem
ser solicitadas a partir da proposta de uma animação: introduzindo e contextualizando
repertórios novos de músicas a partir dos contextos sugeridos, trabalhando com o
tempo, com pausas e intensidades, com os aspectos sugestivos dos sons, ritmos e
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melodias na relação com formas, cores, movimentos e os sentidos relacionados ao
imaginário repercutido e aos sentimentos despertados. Realmente há um leque enorme
de possibilidade de trabalho, levando-se em conta os aspectos das referências culturais
que podem ser levantadas, das construções do enredo, das dramatizações, das
tonalidades interiores e, em suma, o trabalho com o imaginário e o processo de criação.
No caso das experiências aqui apresentadas, viemos refletindo a animação stop
motion como meio de envolvimento e repercussão de referências culturais
diversificadas, em especial, relacionadas ao imaginário brasileiro, de maneira a propor
um processo de criação a partir do observado e vivenciado. Após esta breve exposição,
nos limitamos a enfatizar a importância que consideramos tal possibilidade de trabalho.
Conclusão
Segundo a grande poeta, professora e pensadora da educação brasileira, Cecília
Meireles: “Se a obra da educação consiste na formação humana, parece que a sua maior
dificuldade reside no despertar do indivíduo para o conhecimento ou sentimento dessa
necessidade” (2001, v.1, p. 59). Segundo Leodegário A. de Azevedo Filho, na
apresentação do livro Crônicas de Educação de Cecília, na raiz do pensamento da
educadora pode-se depreender sua convicção humanística, sempre preocupada com a
formação (não apenas a informação) do educando. Tal como nos fala a poeta,
acreditamos ser função de uma real educação, para além da instrução, esta formação em
sentido amplo e humanístico. Este sentido pode ser encontrado também nas palavras da
artista e educadora Fayga Ostrower:
Não me refiro à instrução na escola, que pode ser boa ou má. Refiro-me à educação no sentido mais amplo, à formação de nossa mente pelo mundo sensível em nossa volta: pelas formas de trabalho, pelas formas de diversão e lazer – hoje, a própria cultura parece reduzida a um mero momento de lazer –pelos meios de comunicação e pelas palavras e imagens utilizadas, pelas ruas que atravessamos todos os dias, as casas em que moramos, as lojas em que compramos e os próprios objetos que devemos comprar [...] (2004, p. 47).
A citação de Fayga é bem clara ao enunciar, tal como entendemos, que a
formação de nossa mente não é estruturada apenas pelo que é cognoscível ou por aquilo
que conseguimos intelectualizar ou racionalizar, mas também pela experiência sensível,
por tudo aquilo que somos atingidos diariamente e, que, no entanto, fazem parte de uma
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apreensão num nível pré-verbal, que, embora não verbalizável, age na estrutura de nossa
sensibilidade, motivações, impulsos interiores e na formação do pensamento.
Consideramos com isto que o trabalho da educação neste sentido é
fundamentalmente um trabalho de construção cultural e do imaginário do educando, na
intenção de ampliação dos referenciais do mundo interno do indivíduo. Acreditamos
que, de modo geral, tal como sugere Dewey, “não há germinação espontânea na vida
mental. Se ela [a criança] não receber a sugestão do professor, irá recebê-la de alguém
ou de alguma coisa, em casa ou na rua [...]” (apud BARBOSA, 2002, p. 82), e tal como
sugere Fayga na citação acima, já recebemos diariamente inúmeros estímulos e
impulsos pré-verbais, em casa, na rua, na escola, que atuam em nossa estrutura mental.
A questão, tal como para nós se apresenta no que tange à função da educação é a
de cuidar e preservar as potencialidades do indivíduo para uma crescente e contínua
apreensão de conteúdos e significados revelados na relação sujeito-mundo. Tal como
pode ser extraído na citação de Fayga, a sociedade política e econômica, com seus
impulsos para o consumo, para a competição e finalidades particulares têm funções
distintas e nem sempre caminha no mesmo sentido de uma educação proposta pelas
educadoras citadas; em grande parte, caminha no sentido oposto, e os impulsos e
estímulos gerados, imersos em ideologias, mais fecham e limitam nossas experiências e
significados sobre o mundo do que ampliam, gerando apatia por um mundo vasto de
conhecimento que está para além da órbita do que já é conhecido pelo indivíduo ou que
é, de modo consensual, instituído.
Portanto, acreditamos neste papel fundamental da educação de fomentar e fazer
despertar o interesse pelo conhecimento e pelo vasto universo cultural e artístico, não só
no que se refere a nossa experiência intelectual sobre o mundo, mas também, na
formação de nossa sensibilidade e do enriquecimento amplo de nosso imaginário.
Consideramos fundamental este papel da educação em trabalhar para uma
abertura constante do interesse do individuo pelo mundo, seja pela realidade natural
com todas as suas implicações, seja pela realidade cultural e artística que guardam
consigo um inesgotável arsenal da vivência e do confabular humano. Acreditamos que
esta função é o meio que a educação tem de construir este complexo “artefato chamado
liberdade”, pois como acrescenta Ana Mae Barbosa, liberdade ou individualidade “não
é ausência de controle, mas implica um longo trabalho de construção” (2002, p.83).
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Despertar, eis uma função que consideramos grande tarefa da educação,
encontrando meios e recursos que possam trabalhar neste sentido, pois tal como no
dizer poético de Cecília Meireles:
Para os que se detêm a observar o mundo, uma grande parte da humanidade caminha do nascimento à morte como em pleno sonambulismo, agindo e reagindo movida quase automaticamente, apenas com vibrações maiores quando sobre ela pesa alguma fatalidade mais exorbitante.A tendência geral é para a acomodação da rotina, para a quietude quase desumanizada do hábito. Uma espécie de sufocação da vida, esquecida de seu próprio valor.[...] E há, nesta ação de despertar, uma beleza criadora, luminosa e forte. Fazer o homem contemplar-se e querer alguma coisa para o seu destino, e trabalhar para ele, e ganhar ou perder com uma superior compreensão é, afinal, fazê-lo colaborar com os próprios ritmos divinos a que tanto se atribuíram os resultados bons ou maus da vida.[...] Acorda-se, e o universo precipita-se nessa limitada vida, lança-lhe para longe todos os limites, integra-se nela, e, só por isso, tudo se põe diverso, e uma nova luz colore com interpretações novas cada acontecimento que poderia existir sem a mais superficial definição (2001, v.1, pp. 59-60)
Nossa intenção aqui foi apresentar nossa experiência e afirmar os recursos
utilizados como meios que têm possibilidades de propor dinâmicas criativas de
motivação para o aprendizado e para o enriquecimento cultural e artístico dos
educandos, contribuindo com propostas que possam “despertar” novos interesses e
perspectivas; e inserindo-se nesta tendência da arte-educação contemporânea que vem
ampliando as abordagens da disciplina de Artes, incorporando à realidade escolar, estas
novas mídias e tecnologias associado às práticas artísticas.
Bibliografia
BARBOSA, Ana Mae. Jonh Dewey e o ensino de Arte no Brasil. São Paulo: Cortez,
2002.
FAYGA, Ostrower. Universos da arte. Rio de Janeiro: Elsevier, 24ª edição, 2004.
FROTA, Lélia Coelho. Pequeno Dicionário da Arte do Povo Brasileiro. Séc. XX. Rio
de Janeiro: Aeroplano, 2005
MEIRELES, Cecília. Crônicas de Educação, 5 volumes. Rio de Janeiro: Nova Fronteira,
2001.
REINIGER, Lotte. Shadow Theatres and Shadow Films. London: BT Batsford Ltd,
1970.
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RICARDO, Cassiano. Martim-Cererê. O Brasil dos Meninos, dos Poetas e dos Heróis.
Rio de Janeiro: José Olímpio, 2001.
Anexos
Imagens da experiência com o Teatro de Sombras (Martim-Cererê)
Fotos de Lotte Reiniger trabalhando
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