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ESTRATÉGIA PARA CAPACITAR ESPAÇOS MARGINAIS NA ORGANIZAÇÃO DE SISTEMAS PRODUTIVOS EM REDE DE
PEQUENAS FIRMAS
Alcimar das Chagas Ribeiro
I
SUMÁRIO
Lista de figuras.......................................................................................x
Lista de quadros....................................................................................xi
Lista de diagramas................................................................................xii
Lista de gráficos...................................................................................xiii
Lista de tabelas....................................................................................xiv
CAPÍTULO I
INTRODUÇÃO........................................................................................1
1.1 Uma visão geral sobre os pilares da geração de riqueza.................1
1.2 A origem da riqueza em uma perspectiva histórica..........................4
1.3 A última grande transformação e a nova economia........................11
1.4 A competitividade numa perspectiva empresarial...........................12
1.5 A competitividade como fator de desenvolvimento regional...........16
1.6 Hipóteses centrais e objetivo do trabalho........................................22
1.6.1Hipóteses consideradas...........................................................25
1.6.2 Objetivo do trabalho................................................................26
1.7 O escopo teórico da pesquisa..........................................................26
1.8 Organização do trabalho..................................................................27
CAPÍTULO II
UMA REVISÃO DOS MODELOS DE CRESCIMENTO ECONÔMICO
NEOCLÁSSICO E ENDÓGENO..........................................................29
2.1 Uma aproximação aos postulados da teoria do crescimento
econômico neoclássico........................................................................29
2.2 Uma aproximação aos postulados da teoria do crescimento
endógeno..............................................................................................34
II
2.3 Uma avaliação dos fundamentos básicos das teorias
neoclássica e endógena frente ‘as estruturas econômicas
com níveis de crescimento insatisfatórios...........................................40
CAPÍTULO III
DISTRITOS INDUSTRIAIS COMO PARADIGMA DE ORGANIZAÇÃO
INDUSTRIAL: UMA AVALIAÇÃO CRÍTICA..........................................49
3.1 Introdução.......................................................................................49
3.2 Estagio inicial dos Distritos Industriais............................................50
3.3 Estagio atual dos Distritos Industriais.............................................54
3.4 Críticas aos Distritos Industriais......................................................65
3.5 A replicabilidade da experiência da Terceira Itália..........................67
CAPÍTULO IV
O PERFIL DA REGIÃO MARGINAL: A experiência da região
Norte Fluminense – RJ..........................................................................77
4.1 Considerações gerais......................................................................77
4.2 Características regionais: O Estado do RJ. E a Região NF............80
4.3 O espaço fundiário do Estado do Rio de Janeiro............................82
4.4 A região Norte Fluminense – características locais.........................89
4.5 Uma verificação empírica sobre a competitividade regional............94
4.5.1 metodologia da pesquisa...................................................94
4.5.2 resultado da pesquisa........................................................98
4.6 Objetivo e metodologia da pesquisa sobre a existência
dos elementos fundamentais dos Distritos Industrias na
Região Norte Fluminense......................................................................102
III
4.6.1 Objetivo e metodologia da pesquisa.................................102
4.6.2 Fundamentos importantes associados aos
Distritos Industrias......................................................................104
4.6.3 Uma investigação sobre a existência dos elementos dos
Distritos Industrias no setor agropecuário da Região Norte
Fluminense.................................................................................106
4.6.4 Resultado da pesquisa......................................................107
4.7 Uma avaliação das políticas institucionais......................................113
4.7.1 Uma avaliação sobre o programa FRUTIFICAR...............115
4.8 Uma análise final.............................................................................117
CAPÍTULO V
ESTRATÉGIA DE CAPACITAÇÃO EM TERRITÓRIOS MARGINAIS
NA BUSCA DE DESENVOOLVIMENTO ECONÔMICO.......................120
5.1 Introdução........................................................................................120
5.2 Composição da estratégia e suas justificativas...............................122
CAPÍTULO VI
CONSIDERAÇÕES FINAIS E PROPOSTAS PARA NOVAS
PESQUISAS.........................................................................................131
6.1 Considerações finais......................................................................131
6.2 Propostas para novas pesquisas...................................................133
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS...................................................135
IV
ANEXO I REGIÕES DE GOVERNO E MICROREGIÕES GEOGRÁFICAS
ESTADO DO RIO DE JANEIRO........................................................147
ANEXO II
VERIFICAÇÃO EMPÍRICA DA COMPETITIVIDADE REGIONAL....149
ANEXO III MEMÓRIA ESTATÍSTICA E INSTITUIÇÕES PESQUISADAS.........154
Memória estatística da ponderação efetuada....................................155
Instituições pesquisadas....................................................................156
V
LISTA DE FIGURAS Figura 1- Os cinco objetivos de desempenho de manufatura
Figura 2- A estrutura do diamante para inovar
Figura 3- Visão gráfica dos modelos de crescimento neoclássico
Figura 4- O ambiente sócio cultural endógeno
Figura 5- Processo organizacional no sistema denominado municipalismo
Figura 6- Do fordismo ao sistema flexível de produção
Figura 7- Além das competências essenciais
Figura 8- População residente, segundo Estado e municípios no ano de 2000
Figura 9- Estrutura agroindustrial da região norte fluminense
Figura 10- Produtividade e ambiente microeconômico
Figura 11- Modelo de rede do tipo “top-down” ou japonesa
Figura 12- Modelo de rede flexível de pequenas empresas
Figura 13- Sistema de produção e elementos para estratégia de capacitação do
espaço local
VI
LISTA DE QUADROS
Quadro 1- Os principais elementos da teoria neoclássica do crescimento
econômico
Quadro 2- os principais elementos da teoria endógena do crescimento
econômico
Quadro 3- Fundamentos básicos do crescimento econômico
VII
LISTA DE DIGRAMAS
Diagrama 1 – uma visão geral do pensamento econômico
Diagrama 2- Os principais elementos da teoria neoclássica do crescimento
econômico
Diagrama 3- Os principais elementos da teoria endógena do crescimento
econômico
VIII
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 1- Variações do PIB e renda per capita dos países latino-americanos
Gráfico 2- Evolução da área de lavoura temporária
Gráfico 3- Evolução do valor da produção da micro região Campos, em termos
reais, para o período de 1997 a 2001
Gráfico 4- Índice percentual de variação da produção em termos reais
IX
LISTA DE TABELAS
Tabela 1- Censos agropecuários do Rio de Janeiro
Tabela 2- Produção, área colhida e produtividade obtida
Tabela 3- Valor da produção, área colhida e rendimento médio na micro região
Campos
Tabela 4- Coeficientes de competitividade regional
Tabela 5- Resultados das ponderações
X
Resumo da tese apresentada
Estratégia para capacitar espaços marginais na organização de sistemas produtivos em
rede de pequenas firmas
Alcimar das Chagas Ribeiro
Considerando uma perspectiva própria de regiões periféricas com baixo índice de
crescimento econômico, baixo nível de renda per capita, altas taxas de desemprego e,
sobretudo, um processo de aprofundamento da desigualdade social, o presente
trabalho objetiva a investigação dos principais pilares incrementais da geração de
riqueza, tendo como foco a historia do pensamento econômico. Complementarmente, a
analise evolui até o sistema de acumulação fordista-taylorista e os conseqüentes
modelos de crescimento econômico, chegando aos modernos sistemas flexíveis de
organização produtiva.
Posterior ao processo de verificação geral, o trabalho desenvolve uma avaliação crítica
sobre as reais possibilidades relacionadas à importação integral desses modernos
sistemas flexíveis, ou mesmo de seus elementos mais gerais, tendo em vista as
ineficientes condições ambientais encontradas em regiões marginais.
Em sua seqüência, o trabalho verifica, empiricamente, as condições ambientais
apresentadas pela Região Norte Fluminense-RJ; desenvolvendo uma analise
comparativa em condições ideais próprias dos sistemas flexíveis de produção.
Numa visão conclusiva, o trabalho consolida a condição de inexistência de um
ambiente apropriado a implementação de sistemas de produção flexíveis nessas
regiões, o que leva, tal fato, a dirigir a análise para uma proposta de intervenção no
sistema através da indicação de elementos interdependentes que, se bem articulados,
podem contribuir na capacitação local, de forma que pequenas empresas e
trabalhadores com baixo nível de capacitação possam ser incluídos no processo de
desenvolvimento local.
XI
Abstract
Strategy to enable marginal spaces as productive systems organization of small firms
network
Alcimar das Chagas Ribeiro
Considerering the proper perspective of peripheral regions with low index of economical
growth, low level of per capita income, high levels of unemployment and, above of all, a
process of deepen social unequality, the present work aim research the developing main
pillars of wealth generation, having focus on the economical thinking history.
Additionally, the analysis evolves up to the taylorist-fordist accumulation system and
appropriate economical increasing models towards to flexible modern systems of
productive organization.
After the general verification process, the work develops a critical evaluation about the
real possibilities related to the complete import of these flexible modern systems, or their
own elements in general, having in mind the inefficient environmental conditions found
in marginal regions.
Consequently, the work verifies, in a empiric way, the environmental conditions
presented by Norte-Fluminense Region – RJ, developing a comparative with analysis
the appropriate conditions of the flexible production systems.
In a conclusive point of view, the work consolidates the absence of an appropriate
environment for implementing flexible production systems in those regions, conducting
the analysis to a system intervention through an indication of interdependents elements
that, when well articulated, can contribute to a local capacitation, in a way that small
firms and workers with low level capacitation be included in the local development
process.
XII
CAPÍTULO I
INTRODUÇÃO
1.1 Uma visão geral sobre os pilares da geração de riqueza
Neste capítulo desenvolve-se, à luz da história do pensamento econômico, uma breve
discussão sobre os pilares incrementais da geração de riqueza e, sobretudo, a sua
passagem para o contexto de uma nova ordem econômica que surge na esteira do
processo de globalização1. Apresenta-se ainda, o significado da terminologia
“competitividade” 2 , a sua importância na economia moderna e, fundamentalmente, os
parâmetros que devem ser percorridos e absorvidos por regiões que buscam a
formação de novas riquezas visando o desenvolvimento econômico 3.
1- Segundo Wedekin e Castro (1999), em Pinazza e Alimandro (1999), “A globalização, como fenômeno sociológico de expansão dos horizontes de interesses das sociedades, não é um fenômeno novo na história. Ela tem surgido em alguns períodos como resultado de difusão cultural, ampliação de fronteiras políticas, desenvolvimento de atividades econômicas ou de propagação religiosa. A globalização atual ultrapassa todas as experiências anteriores: é mais ampla, diversificada e, sobretudo, mais profunda, pois é um produto da revolução das comunicações. As comunicações emergem do intercâmbio: de produtos, de serviços, de dados, de imagens, até de sentimentos”. Uma segunda visão apresentada por Malecki (1997), define globalização como a abrangência e profundidade das operações das firmas para produzir e vender bens e serviços em mais mercados. Para o autor, operações incluem relações comerciais além de investimentos diretos e novas formas de investimento. Assim, a característica principal da globalização é a integração funcional de atividades econômicas internacionalmente dispersas. 2- No trabalho de Porter, “A vantagem competitiva das nações” (1990), o autor afirma que o único conceito de competitividade em nível nacional é a produtividade. A principal meta de uma nação é produzir um alto e crescente padrão de vida para seus cidadãos. A capacidade de o fazer depende da produtividade com que a mão-de-obra e o capital são empregados. A produtividade é o valor do que é produzido por uma unidade de mão-de-obra ou de capital. A produtividade depende da qualidade das qualificações do produto (que determinam os preços que eles podem impor) e da eficiência com que eles são produzidos. A produtividade é o determinante básico de vida a longo prazo de uma nação; é a causa primordial da renda per capita nacional. A produtividade com a qual o capital é empregado, determina o retorno que ele aufere para seus proprietários.
Capítulo I – Introdução 2
A segunda metade do século XX, definitivamente, deu a partida para o atual processo
de transformação, responsável pelas mudanças nos paradigmas associados ao
aumento da riqueza das nações. De acordo com Drucker (1993), a cada dois ou três
séculos ocorre uma mudança sem precedente na história ocidental. Foi assim no século
XIII, com a emergência das guildas municipais como grupos dominantes, o
renascimento do comércio a grandes distâncias, com as novas ordens religiosas
urbanas, etc. A próxima grande revolução veio ocorrer duzentos anos depois, com a
invenção da imprensa, a reforma protestante e a ascensão do renascimento.
Posteriormente, no século XVIII, a Revolução Industrial se instalou para consolidar esta
trajetória histórica.
Assim, a presente transformação, cujo início se questiona se foi pela elevação do Japão
à categoria de grande potência mundial nos anos sessenta ou pelo advento do
computador, se diferencia das anteriores, cuja abrangência restringia-se à Europa. O
atual processo de transformação, ao contrário, tem seu escopo de atuação voltado para
toda a humanidade (Drucker, op. cit.).
Desta forma, a grande questão, segundo esta realidade, é saber quais são os
parâmetros capazes de conduzir um país ou uma região a um certo estágio de
desenvolvimento, cujo conceito, estabelecido por Schumpeter (1934), se baseia na
mudança espontânea e descontínua nos canais do fluxo, ou seja, deve caracterizar-se
por perturbações do equilíbrio que alteram e deslocam para sempre o estado presente
existente.
3- Segundo American Economic Development Council - AEDC (1984), em Malizia e Feser (1999), desenvolvimento econômico é um processo de criação de riqueza através da mobilização dos recursos humano, financeiro, capital, físico e natural para gerar bons produtos e serviços no mercado. O desenvolvimento econômico tem o papel de influenciar o processo de benefícios à comunidade, através da expansão das oportunidades de trabalho e manutenção de suas taxas.
Capítulo I – Introdução 3
Assim, torna-se vital e urgente a necessidade de se buscar respostas mais concretas
para o questionamento do que provoca o aumento da riqueza. Tais descobertas,
entretanto, exigem um esforço adicional no sentido de entender historicamente tal fato.
Drucker (1992) observa que nos últimos 450 anos os economistas deixaram de lado
essa pergunta, ou quem sabe, buscaram respostas fáceis ou rejeitaram as respostas
anteriores, apesar das mesmas terem deixado importantes lições.
Como é propósito deste trabalho também discutir o processo de geração de riqueza
numa perspectiva histórica, em alguns momentos serão utilizadas tanto as
terminologias crescimento econômicas, quanto desenvolvimento econômico. Dessa
maneira é conveniente elucidar as diferenças básicas entre esses conceitos.
O conceito de desenvolvimento econômico tem raízes teóricas e empíricas. No que diz
respeito às suas raízes teóricas destaca-se o trabalho de Schumpeter publicado em
1911. Em sua análise, o autor explica o processo de crescimento a partir do
funcionamento da economia na forma de um sistema de fluxo circular de equilíbrio,
cujas variáveis econômicas aumentam apenas em função da expansão demográfica.
Quanto ao desenvolvimento, o autor afirma que a sua ocorrência depende de inovações
tecnológicas implementadas por empresas que se financiam pelo crédito bancário.
Em relação as raízes empíricas, cujos postulados consideram crescimento como
condição indispensável para o desenvolvimento, destacam-se importantes economistas
como Nurkse (1957), Myrdal (1968), Lewis (1969) e Hirschman (1974), além dos
estudos de economistas dos países da América Latina no contexto da CEPAL4 no final
dos anos 40 e início dos anos 50, cujos trabalhos tinham como objetivo captar recursos
dos países desenvolvidos e implementar planos de desenvolvimento a partir dos
diagnósticos elaborados sobre a realidade de seus países.
4- CEPAL (Comissão Econômica para a América Latina): Os economistas cepalinos partiram da crítica acirrada à Doutrina das Vantagens Comparativas do economista Inglês David Ricardo (1772 / 1823), que dava um fundamento econômico à dominação política e que prolongava o estado de “subdesenvolvimento” dos países “pobres” (Souza, 1999).
Capítulo I – Introdução 4
Para esses autores, desenvolvimento caracteriza-se pela transformação de uma
economia arcaica em uma economia moderna, eficiente, juntamente com a melhoria do
nível de vida do conjunto da população. Na América Latina, dentre outros, destacam-se
Prebisch (1949), Furtado (1961), Singer (1977) e demais autores dos chamados
economistas do desenvolvimento.
1.2 A origem da riqueza em uma perspectiva histórica
Como precursores do pensamento econômico, os mercantilistas entendiam que a
riqueza das nações dependia do afluxo de metais preciosos, os quais seriam oriundos
da expansão do comércio internacional (Souza, 1999).
Posteriormente, a escola fisiocrata, combatendo a visão mercantilista, ignorou as
atividades comerciais e industriais por serem estéreis, passando a reconhecer a
agricultura como a única atividade capaz de gerar um produto líquido, justificado por ser
a terra uma dádiva da natureza (Hugon, 1988).
Conforme Thweat (1971), os fisiocratas entendiam que somente a atividade agrícola
poderia gerar um produto líquido capaz de possibilitar o desenvolvimento econômico. A
crítica dessa corrente ao sistema mercantilista levou à conclusão de que o Estado devia
ter uma conduta liberal na economia, de forma que o cidadão pudesse decidir
livremente as suas ações.
Todavia, segundo a visão de Hugon (op. cit.), os fisiocratas entendiam que os
fenômenos econômicos processavam-se de forma livre e independente de qualquer
coação exterior, segundo uma ordem imposta pela natureza e regida por leis naturais.
Desta forma, conhecer essas leis naturais e deixá-las atuar seria o mais importante.
Assim, a concepção dos fisiocratas era de que a atenção deveria ser transferida da
órbita do comércio para a produção, enquanto que o Estado deveria induzir o
Capítulo I – Introdução 5
desenvolvimento. Nesse contexto, as principais propostas dessa corrente estariam
estabelecidas da seguinte forma: • Capitalização da agricultura, visando maior produtividade;
• Redução da carga tributária e da evasão fiscal;
• Estímulo ao comércio exterior;
• Imposto único para a atividade agrícola, determinante para o aumento da renda do
consumidor;
• Redução do excesso de regulamentação oficial;
• Eliminação de barreiras ao comércio interno;
• Promoção das exportações.
O principal economista desse movimento foi François Quesnay (1694/1774) e seus
principais seguidores foram: Anne Robert Jacques Turgot (1727/1781); Pierre Paul
Mercier de La Riviére (1720/1794) e Marquês Victor Riquetti de Mirabeau (1715/1789).
Entretanto, em contraposição aos sistemas mercantilista e fisiocrata, Adam Smith
(1723/1790), identificou no trabalho produtivo o elemento fundamental do aumento da
riqueza. Desta forma, o volume de produto obtido por trabalhador, segundo Smith, seria
função do capital, da tecnologia e da divisão do trabalho, que passou a ser um
elemento fundamental do processo de formação de riqueza das nações.
Smith (1988) entende que a divisão do trabalho permite um maior aprimoramento das
forças produtivas, maior habilidade, maior destreza e bom senso em relação ao trabalho
executado.
“Essa divisão do trabalho, da qual derivam tantas vantagens, não é, em sua origem, o
efeito de uma sabedoria humana qualquer, que preveria e visaria essa riqueza geral à
qual dá origem. Ela é a conseqüência necessária, embora muito lenta e gradual, de
uma certa tendência ou propensão existente na natureza humana que não tem em vista
essa utilidade extensa, ou seja: a propensão a intercambiar, permutar ou trocar uma
coisa pela outra” (Smith, op. cit.).
Capítulo I – Introdução 6
O autor ainda considera que no longo prazo, havendo taxa de lucro positiva em função
da ampliação dos mercados e da divisão do trabalho, os rendimentos crescentes
possibilitarão o aumento das poupanças que se transformarão em investimentos
provocando, conseqüentemente, a demanda por trabalhadores produtivos.
Entretanto, este fato não inibe a possibilidade do estado estacionário sem que a
sociedade tenha alcançado um certo nível de bem-estar. Esta situação seria
conseqüência de uma acirrada concorrência entre os produtores pelos recursos
disponíveis, culminando com a elevação dos salários e a redução dos preços e lucros.
Com relação ao Estado, Smith (op. cit.), entendia que suas funções deveriam limitar-se
à regulamentação da concorrência, à manutenção de sistemas de educação, à saúde e
à segurança pública.
No processo de evolução da história econômica, surge a abordagem Ricardiana que
passa a se preocupar tanto com a formação da riqueza, quanto com a distribuição entre
capitalistas, trabalhadores e proprietários de terra. Para ele, o grande problema do
desenvolvimento econômico é a agricultura, que apresenta incapacidade de produzir
alimentos baratos para o consumo dos trabalhadores.
De acordo com Ricardo (1982), considerando um processo organizacional de uma
região com um estoque definido de capital e trabalho, as terras mais férteis são
ocupadas e a demanda por alimento é atendida. Nesse caso os lucros são positivos e
a terra não gera renda, já que tem a mesma fertilidade. Entretanto, com o aumento
demográfico, terras menos férteis começam a ser demandadas para atender um
consumo adicional de alimentos. A busca por melhores terras dá inicio a um processo
de transferência de renda da atividade produtiva para os proprietários de terra.
Conseqüentemente, o deslocamento da margem extensiva para terras de menor
fertilidade acaba implicando no aumento dos preços, aumento dos salários e diminuição
dos lucros. Considerando os fatores fixos, o produto total cresce a taxas decrescentes.
Capítulo I – Introdução 7
A solução apontada por Ricardo (op. cit.), para o problema dos rendimentos
decrescentes compreendia o controle da natalidade, a livre importação de alimentos e a
abolição gradual da lei dos pobres (compromisso dos Estado com a alimentação dos
pobres).
Ricardo considerava que a liberdade na negociação dos contratos de trabalho entre
patrões e empregados era fundamentalmente importante para a manutenção do
equilíbrio entre a oferta e a demanda por trabalho.
Posteriormente, surge a abordagem do desenvolvimento econômico Marxista, cujo pilar
se concentra na visão de que, no longo prazo, a economia tenderia a caminhar para um
conflito distributivo com taxa de lucro declinante.
Marx (1988), estruturou o seu modelo concebendo no capital total empregado no
processo produtivo, duas diferentes parcelas conforme descritas a seguir:
• Uma parcela composta pelo capital fixo, representada pela depreciação e matérias
primas;
• Uma parcela composta pelo capital variável, representada pela força de trabalho.
Segundo o autor, como o capital fixo não dispõe de capacidade para agregar valor ao
bem, o produto líquido gerado é função da força de trabalho. Conseqüentemente, o
valor acrescido ao produto corresponde ao valor total empregado em termos de
homem-hora, dando origem a mais valia, ou seja, ao valor extraído dos trabalhadores
na forma de lucros líquidos.
Conforme reportado em Marx (op. cit.), a acirrada concorrência leva a uma seleção
natural. Formam-se grandes grupos empresariais e pequenas empresas encerram as
suas atividades dando início a um alastramento do desemprego e, sobretudo, a um
aprofundamento do processo de concentração de renda e de riqueza. A concentração
de capital no longo prazo tanto piora a situação da classe trabalhadora, que engrossa
Capítulo I – Introdução 8
as fileiras dos desempregados, quanto piora a situação dos capitalistas, pela redução
do consumo e, conseqüentemente, do lucro.
Nesta visão, Marx entendia que as contradições do capitalismo seriam o combustível
que alimentaria, no longo prazo, o processo de auto destruição do sistema, dando
origem a uma sociedade socialista.
Já no século XX, a abordagem de desenvolvimento econômico de Keynes, reportado
em Dillard (1989), passa por real repúdio aos fundamentos do leissez faire5. Sua
política econômica é prática e considera a intervenção estatal e o investimento público
como condição fundamental do desenvolvimento. O ponto de partida lógico da teoria de
Keynes é a procura efetiva (desejo maior e possibilidade de comprar). Neste caso, o
pleno emprego depende da procura agregada e o desemprego é o resultado de uma
carência de procura agregada.
Dillard (op.cit), resume as proposições da teoria keynesiana da seguinte forma:
• O rendimento agregado depende do volume do pleno emprego;
• Conforme a propensão a consumir, a quantia do gasto para o consumo depende do
nível do rendimento e, portanto do pleno emprego;
• O pleno emprego depende da procura efetiva agregada, que se compõe de duas
partes: a) gasto para consumo, b) gasto para inversão;
• Em estado de equilíbrio, a procura agregada é igual à oferta agregada. Por
conseguinte, a oferta agregada excede a procura efetiva para o consumo, de
quantia igual à procura efetiva para investimento;
• Em estado de equilíbrio, a oferta agregada é igual à procura agregada, e a procura
agregada é determinada pela propensão a consumir e pelo volume de investimento.
Por conseguinte, o volume de emprego depende:
Capítulo I – Introdução 9
a) da função da oferta agregada,
b) da propensão a consumir, e
c) do volume de investimento;
• Tanto a função da oferta agregada, que depende principalmente das condições
físicas da oferta, como a propensão a consumir, são relativamente estáveis e,
portanto, as flutuações do emprego dependem principalmente do volume do
investimento;
• O volume de investimento depende: a) da eficácia marginal do capital, e, b) da taxa
de juros;
• A eficácia marginal do capital depende: a) das previsões de lucros, e b) do custo de
reposição dos bens de capital;
• A taxa de juros depende: a) da quantidade de dinheiro, e b) do estado de
preferência à liquidez.
Segundo Hugon (op. cit.), a teoria de Keynes, pelo seu conteúdo, abre um novo período
na evolução da ciência econômica.
O diagrama a seguir demonstra uma visão geral do pensamento econômico segundo
Malisia e Feser (1999)
5 - Leissez Faire: Um dos pontos das idéias de Adam Smith, identificado como política liberal. Dada a organização espontânea da economia de uma sociedade, deve imperar a liberdade de fazer e de trocar. Segundo o autor, no liberalismo econômico não deve existir qualquer regulamentação relativa ao processo produtivo e às relações de trabalho. A defesa é pelo direito que cada homem tem de seguir seu interesse pessoal da maneira que melhor lhe convier, desde que obedeça a um mínimo fixado em lei, para garantir a estabilidade social, representada pela defesa da propriedade privada e pela manutenção da ordem pública. Desta forma, o Estado não pode ser intervencionista, abstendo-se de ingerir-se nos negócios privados. Sua atuação, portanto, deve limitar-se aos casos em que a atividade individual se fizer ou tornar impossível ou improfícua, já que o mesmo se caracteriza no pior administrador que se conhece.
Capítulo I – Introdução 10
Definições e conceitos Economia pré-clássica (cerca 1550-1750)
Mercantilismo
Pensamento Fisiocrata
Economia clássica (cerca 1750-1850)
Smith
Ricardo
Mill
Críticas à economia clássica (cerca 1850-1890)
Marx
Socialismo utópico
Marginalismo
Walras
Economia neoclássica (cerca 1890-1950)
Marshall
Economias do bem estar
Keynes
Capítulo I – Introdução 11
Críticas à economia neoclássica (cerca 1890 – presente)
Institucionalistas
Austríacos
Pós-Keynesianos
Economias Radicais
Economia moderna (neoclássica) (cerca 1950 - presente)
Microeconomia
Macroeconomia
Análise econométrica
Desenvolvimento econômico
Ciência econômica regional
Diagrama 1: uma visão geral do pensamento econômico Fonte: Malisia e Feser (1999)
1.3 À última grande transformação e a nova economia
Drucker (2000) observa que a recente transformação - que ainda não se esgotou -
altera o contexto tradicional e define que as atividades centrais de criação de riqueza
não serão mais nem a alocação de capital para usos produtivos, nem a mão-de-obra,
os dois pólos da teoria econômica dos séculos XIX e XX. Hoje, o valor é criado pela
produtividade e pela inovação, que são aplicações do conhecimento ao trabalho. A
produtividade é caracterizada pela aplicação do conhecimento às tarefas já conhecidas,
enquanto que a inovação caracteriza-se pela aplicação do conhecimento nas tarefas
novas e diferentes.
Capítulo I – Introdução 12
Esta conclusão resulta do resgate do debate sobre crescimento econômico que, após
alguns anos no ostracismo, teve os seus alicerces novamente reerguidos na década de
50 por Robert Solow e Trevor Swuan (1956), cujos modelos consistem na visão de que
o mercado é perfeito e que a cada ingresso de nova fatia de capital, dada uma oferta
fixa de mão-de-obra, produz-se um retorno ligeiramente menor que o anterior. Esta
idéia ficou caracterizada como lei dos retornos decrescentes e a teoria como
neoclássica.
Entretanto, somente na década de oitenta, Paul Romer (1986), ao ampliar o conceito de
capital, considerando o conhecimento e a especialização incorporados na força de
trabalho, pode demonstrar que os rendimentos decrescentes poderiam ser substituídos
por rendimentos crescentes, endogeneisando o processo de produção.
Esta nova dinâmica caracteriza o escopo do moderno ambiente econômico, onde o
termo competitividade passa a representar um fator chave para o desenvolvimento auto
sustentado tanto das empresas, quanto das cidades e nações. Esta realidade, pautada
por novos paradigmas, tem se estruturado à luz da evolução de um processo real e
imutável de globalização.
1.4 A competitividade numa perspectiva empresarial
Segundo Prahalad e Ramaswamy (2000), o conceito de competência como fonte de
vantagem competitiva teve origem em estudos sobre diversificação, que começaram a
conceber as organizações como uma série de competências e não mais como uma
carteira de diferentes negócios. Isso levou à identificação de novas oportunidades de
negócio e a formas inovadoras de utilizar estrategicamente, os ativos intelectuais da
empresa.
Ansoff (1990), em sua teoria dirigida para a empresa, identifica o processo sinergístico
como um fator de relevante importância para o aumento da competitividade. A sinergia
entende o autor, diz respeito às características desejadas do ajustamento entre a
Capítulo I – Introdução 13
empresa e os seus novos produtos e mercados. Conceitualmente, sinergia é a medida
de efeitos conjuntos, freqüentemente descritos como o efeito (2 + 2 = 5), o que equivale
dizer que o desempenho combinado é superior à soma de suas partes. Neste conceito,
cada combinação de produtos e mercados faz uma certa contribuição para a
rentabilidade geral da empresa.
Assim, o conceito de sinergia deve ser visualizado ao longo do processo da vantagem
de escala de produção, onde a empresa seleciona, cuidadosamente, os seus produtos
e mercados com vista a otimizar esse efeito, conseguindo, conseqüentemente, uma
maior flexibilidade na escolha de sua postura competitiva.
Os reflexos oriundos da sinergia produto / mercado permitem um maior nível de
competitividade empresarial, tendo em vista a variação nos seguintes indicadores:
• Maior parcela de mercado com redução de preço;
• Pesquisa e desenvolvimento superior aos concorrentes, com menos investimento;
• Maximização do resultado e, conseqüentemente, uma maior capacidade para atrair
capitais para o crescimento da empresa.
Olivieri (1999), apresenta o conceito de sinergia como o termo empregado para
descrever a potência das somas de esforços entre as pessoas, pela participação e
cooperação. Algo que pode significar a soma de duas partes em um total superior à
soma algébrica das partes. Segundo o autor, a sinergia é sempre aumentada em
ambientes em que se procura desenvolver a motivação, pela inovação e criatividade
dos participantes.
Castells (1996), entretanto, faz a seguinte afirmação: “a produtividade e a
competitividade dos agentes, sejam eles de empresa, de regiões, ou de países,
dependem essencialmente da sua capacidade de gerar, tratar e aplicar informações. A
sociedade informacional é também global porque as atividades-chave da produção,
consumo, e distribuição, assim como os seus componentes (capital, trabalho, matérias-
Capítulo I – Introdução 14
primas, gestão, informação, tecnologia, mercados), são organizados em escala
planetária, seja diretamente ou através de redes interconectadas”.
Segundo Ferraz (1997), competitividade é a capacidade da empresa formular e
implementar estratégias concorrenciais, que lhe permitam ampliar ou conservar, de
forma duradoura, uma posição sustentável no mercado.
Conseqüentemente, Slack (1993), desenvolvendo sua análise focada na visão
industrial, considerou que competitividade se dá em função da vantagem em
manufatura, cujos objetivos são apresentados na figura 01 a seguir:
Os cinco objetivos de desempenho da manufatura
Baixo preço, alta margem, ou ambos Baixo tempo de entrega Entrega confiável
Cust
Custo
Velocidade Confiabilidade Qualidade Flexibilidade Aspectos externos
Alta produtividade total Fluxo rápido Operação confiável Processos livres de erros Habilidade de mudar
Aspectos internos
Produtos livres de erro, Novos produtos freqüentes de acordo com as especificações Larga faixa de produtos Ajustes de volume e entrega Figura (01) Os cinco objetivos de desempenho de manufatura Fonte: Slack (1993).
Capítulo I – Introdução 15
Segundo o autor, fazer melhor significa cinco coisas:
• Fazer certo: não cometer erros, fazer produtos que realmente são o que devem ser,
produtos sem erros e sempre de acordo com as especificações de projeto,
caracterizando a vantagem de qualidade da manufatura para a empresa;
• Fazer rápido: fazer com que o intervalo de tempo entre o início do processo de
manufatura e a entrega do produto ao cliente seja menor do que o da concorrência,
o que vai proporcionar uma vantagem de velocidade à empresa;
• Fazer pontualmente: manter a promessa de prazos de entrega. Isso implica estar
apto a estimar datas de entrega com acuidade, definindo a vantagem da
confiabilidade;
• Mudar o que está sendo feito: ser capaz de variar e adaptar a operação seja porque
as necessidades dos clientes são alteradas, seja devido a mudanças no processo
de produção causadas por mudanças no suprimento dos recursos. Isto significa
estar apto para mudar com rapidez, possibilitando a vantagem da flexibilidade;
• Fazer barato: custos mais baixos do que os concorrentes conseguem administrar.
No longo prazo, a única forma de conseguir isso é através da obtenção de recursos
mais baratos e/ou transformando-os mais eficientemente do que os concorrentes,
possibilitando a vantagem de custo.
Todavia, modernamente, o conceito de competitividade tem sido utilizado no contexto
da discussão sobre o processo de desenvolvimento econômico de regiões ou mesmo
pequenos distritos. Uma nova visão, relacionando a empresa ao ambiente sócio-
cultural, vem ocupando um substancial espaço no debate sobre o tema.
Capítulo I – Introdução 16
1.5 A competitividade como fator de desenvolvimento regional
Malecki (1997), verifica que nos últimos dez anos começou a despontar um importante
e vasto material versando sobre a questão da competitividade local e regional,
especialmente em função do reconhecimento de que a política macroeconômica,
agindo dissociada de uma efetiva política microeconômica, perde efeito como
instrumento de indução ao desenvolvimento econômico. Evidente que aquela política
mantém a sua grande relevância, tradicionalmente, no que diz respeito à manutenção
de um ambiente propício à competitividade empresarial (Porter, 2000).
Segundo Porter (1999), a política econômica se preocupa com a criação de riqueza
através do oferecimento de incentivos, do estímulo à poupança e ao investimento e da
minimização governamental. A política social se concentra na educação pública e em
outras necessidades humanas, ajudando os grupos desfavorecidos, protegendo os
cidadãos através de várias formas de regulamentação e, mais recentemente,
preservando o meio ambiente.
Conforme o mesmo autor, modernamente a concepção de prosperidade de um país ou
de uma região, diz respeito a algo não herdado e que tão pouco emana de seus dotes
naturais, de sua força de trabalho, das taxas de juros ou do valor da moeda, como
afirmavam os economistas clássicos. Contrariamente, o aumento da riqueza nacional
ou regional, depende do produto do esforço criativo humano. A competitividade
depende da capacidade de inovação das indústrias locais.
A competitividade é um conceito que pode ser melhor entendido no escopo da
empresa, tendo em vista a inexistência de uma teoria que associe este termo as
questões regional e nacional. Assim, a competitividade resulta da produtividade com
que as empresas, numa determinada localidade, são capazes de utilizar os insumos
para a produção de bens e serviços valiosos.
Capítulo I – Introdução 17
Segundo Porter (op. cit.), o objetivo de um país é proporcionar um padrão de vida
elevado e crescente para os cidadãos, fato este que depende da produtividade com que
o trabalho e o capital atuam.
A produtividade é, portanto, o valor da produção de uma unidade de trabalho ou de
capital, originária da qualidade, características dos produtos e da eficiência com que
são produzidos. Logo, a produtividade é o principal determinante do padrão de vida, no
longo prazo, de um país.
Assim, torna-se fundamental compreender quais são os determinantes da produtividade
e quais são as suas taxas de crescimento, além de como e porque se criam as
habilidades e tecnologias comercialmente viáveis. Isso leva à necessidade de se
analisar setores específicos, assim como os seus segmentos, ao invés do país como
um todo.
Desta forma, pode-se concluir que o aumento da produção é função do aumento da
competitividade de cada unidade econômica e a qualidade e os custos de produção
dependem em grande escala da inovação dos produtos e dos procedimentos de
fabricação.
Conseqüentemente, as regiões precisam criar vantagens competitivas a partir da
absorção de algumas capacitações necessárias para empregar recursos,
freqüentemente combinados, por meio de processos organizacionais, em função de um
objetivo específico (Grant, 1991).
Todavia, sem elevadas taxas de investimentos em capital por trabalhador e em
treinamento, é possível que as empresas não apenas se tornem incapazes de sustentar
as vantagens competitivas, mas também que os trabalhadores menos qualificados
enfrentem problemas de falta de perspectivas e de desigualdades crescentes. (Porter
op.cit.).
Capítulo I – Introdução 18
Segundo Ferraz (op. cit.), modernamente ser competitivo é mais do que considerar uma
visão tradicional de desempenho e eficiência. Segundo o autor, esta é uma visão
estática porque representa uma análise do comportamento passado dos indicadores,
sem elucidar as relações causais que mantêm com a evolução da competitividade.
Para o autor, as capacitações estão em constante mutação. Em cada momento do
tempo, cada empresa detém um dado nível e apresenta um desempenho competitivo.
O grau de capacitação de uma firma em certo momento está determinado pelas
estratégias competitivas. Assim, a competitividade depende da competência
empresarial e das estratégias competitivas.
Conforme Porter (1989), a estratégia competitiva visa estabelecer uma posição lucrativa
e sustentável contra as forças que determinam a concorrência na indústria. A vantagem
competitiva surge, fundamentalmente, do valor que uma organização consegue criar
para seus compradores e que ultrapassa o seu custo de fabricação.
Porter (2000) enfatiza que “A riqueza é criada pela microeconomia. Ela é produzida por
empresas capazes de oferecer produtos e serviços valiosos e vendê-los nos mercados
mundiais”. Segundo o autor, as companhias de sucesso fazem proliferar as vantagens
ao longo da cadeia de valor e num ambiente competitivo.
Em recente pesquisa, Porter e Sters (2001) documentaram os padrões de inovação
utilizados por países membros da Organização para Cooperação e Desenvolvimento
Econômico (OCDE) e por nações emergentes durante os últimos 25 anos, buscando
entender como as condições nacionais explicam as diferenças na produção de
inovação, já que a mesma tornou-se o desafio que define a competitividade no
ambiente globalizado.
As descobertas dos autores revelam a enorme influência do ambiente local no sucesso
das atividades inovadoras e mostram as grandes diferenças entre o progresso relativo
dos países membros da OCDE e dos países emergentes no que se refere à vitalidade
inovadora.
Capítulo I – Introdução 19
Segundo os autores, a localização geográfica é crucial para a inovação e as empresas
precisam expandir suas abordagens de gestão da inovação de acordo com a região, ou
seja, desenvolver e comercializar a inovação de forma mais atraente, tomar medidas
efetivas para garantir o acesso aos pontos fortes do local e aprimorar efetivamente o
ambiente de inovação e comercialização nas áreas em que operam.
A pesquisa contou com uma estrutura capaz de identificar as fontes de capacidade de
inovação que permitem a uma nação, ou mesmo a uma região, inovar globalmente. A
seguinte estrutura inclui três grandes elementos que juntos indicam como a localização
geográfica modela a capacidade de uma empresa inovar em nível global.
Elemento 1.
• Infra-estrutura da inovação pública: Combina os fatores que dão apoio à inovação
em toda a economia de um país ou região. Esses fatores incluem a totalidade dos
recursos humanos e financeiros destinados ao desenvolvimento científico e
tecnológico, as políticas públicas relevantes à atividade inovadora e o nível de
sofisticação tecnológica de sua economia. Elemento 2. • Ambiente para a inovação específica nos clusters 6 : O ambiente para inovação
específica nos clusters segue a estrutura do “diamante”, ilustrado a seguir:
6 – Segundo Porter (1999), Clusters (grupos, agrupamentos ou aglomerados) são concentrações geográficas de empresas de determinado setor de atividade e organizações correlatas, de fornecedores de insumos a instituições de ensino e clientes. No Brasil, pode-se identificar, como exemplo, o cluster dos fabricantes de cristais ao redor de Blumenau (SC).
Capítulo I – Introdução 20
A estrutura do diamante para inovar
(i) Um contexto local que estimula
o investimento e a melhoria sustentável (ii) Competição vigorosa entre concorrentes com sede local
Contexto da estratégia e concorrência entre
empresas
Condições de fornecimento
(insumos)
Condições de
demanda
Empresas relacionadas e
de apoio
*Custo e quantidade * Clientes locais sofisticados do fornecimento (insumos) e exigentes * Demanda local proveniente de segmentos especializados *Qualidade do fornecimento *Presença de fornecedores que podem ser atendidos *Especialização do capazes com sede no local em nível mundial
fornecimento e empresas em áreas relacionadas * Necessidades dos clientes que representam a * Existência de clusters antecipação das necessidades que surgirão em outros locais
Figura (02)
A estrutura do diamante para inovar Fonte: Porter (2001)
Capítulo I – Introdução 21
Elemento 3.
• Qualidade das integrações: O relacionamento entre a infra-estrutura da inovação
geral e os clusters industriais de um país ou região é a reciprocidade. Para os
autores, clusters sólidos alimentam e aproveitam a infra-estrutura da inovação geral.
As diversas organizações e redes formais e informais podem ser a ponte que une as
duas áreas. Um exemplo importante é o sistema de ensino superior de um país, que
faz a ponte entre a tecnologia e as empresas.
Uma análise mais cuidadosa dessas questões expostas, envolvendo os importantes
conceitos de produtividade, competitividade, capacitações e desenvolvimento regional
leva, fundamentalmente, a uma percepção de que países e regiões que se encontram
em um estágio inferior de desenvolvimento, ou mesmo em estágio de
subdesenvolvimento7, não dispõem das competências necessárias exigidas a quem
deseja hospedar um sólido processo de desenvolvimento econômico.
As deficiências encontradas nesses países ou regiões são cristalizadas na ocorrência
de uma precária organização dos setores econômicos e, sobretudo, na inexistência de
uma cultura facilitadora do processo de aprendizado compatível com o moderno
ambiente econômico, cujas implicações acabam por aniquilar a competitividade
doméstica.
Todas as hipóteses precedentes são representativas da direção que esta pesquisa
buscará percorrer, no sentido de entender a evolução dos processos temporais de
organização industrial como elemento vital das estruturas dos modelos de
desenvolvimento econômico formalizados, especialmente, no pós guerra.
7 – Subdesenvolvimento: Segundo Souza (1999), subdesenvolvimento define-se pela insuficiência do crescimento econômico anual, em relação ao crescimento demográfico, por sua intermitência e pela concentração da renda e da riqueza. Nesta condição, as estruturas econômicas permanecem inadequadas à adoção de inovações tecnológicas e ao crescimento econômico sistemático, podendo perdurar formas pré-capitalistas em regiões ou setores.
Capítulo I – Introdução 22
1.6 Hipóteses centrais e objetivo do trabalho Conforme verificado na discussão precedente existe um forte indício de que a dinâmica
social pode ser reproduzida por um processo de transformação em diversos campos da
ciência, o que torna necessário uma certa determinação no que diz respeito a um
grande esforço de adaptação por parte dos vários atores sociais.
Entretanto, uma observação mais geral sobre as economias denominadas periféricas 8 ,
leva a identificação de indicadores perversos e bem característicos, tais como:
Baixo nível de renda per capita;
Altas taxas de desemprego;
Avanço da pobreza; e
Ampliação da desigualdade social.
Todos esses elementos, caracteristicamente, atrofiam os países mais pobres;
entretanto, a “desigualdade social” vem se constituindo num elemento de grande
preocupação, em função do elevado contingente de pessoas que são excluídas do
sistema, cuja evolução acontece em uma escala ascensional.
Publicação do jornal dos economistas em setembro de 1999 mostra um estudo
realizado pela CEPAL em nove países latino-americanos, em que a taxa média de
crescimento anual do Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil que era de 7% caiu para
1,3% entre 1980 e 1992 e se manteve em apenas 2% de 1991 a 1997. No período
posterior não se verifica uma mudança significativa.
O gráfico a seguir, ilustra as taxas de variações do PIB e renda per capita das
economias latino-americas, no período de 1992 a 2000.
Capítulo I – Introdução 23
variação do PIB e renda percapita das economias latino-mericanas
-2
-1
0
1
2
3
4
5
6
92 93 94 95 96 97 98 99 00
PIBRENDA PER CAPITA
3,0
3,5
5,2
1,1
3,7
5,2
2,3
4,1
1,2
1,7
3,4
-0,6
2,0
3,5
0,6
-1,1
2,5
0,4
Gráfico (01) Variações do PIB e renda per capita dos países latino-americanos
Fonte: baseado em dados da CEPAL.
Uma análise concomitante do Departamento de Desenvolvimento Humano do
Programa de Desenvolvimento das Nações Unidas (Pnud), indica que 20% dos mais
ricos do planeta detêm 86% do Produto Interno Bruto (PIB) mundial, enquanto os mais
pobres participam com apenas 1%.
8- denominação cunhada pelos economistas cepalinos para classificar os paises subdesenvolvidos na formulação de sua crítica à teoria das vantagens comparativas do economista inglês David Ricardo, segundo a qual, os países deveriam especializar-se na produção daqueles produtos que tivessem maior vantagem comparativa de custos. Assim os países pobres deveriam se dedicar à produção de produtos de baixo poder tecnológico e os países centrais os produtos de alto poder tecnológico. Segundo os economistas da CEPAL, esta situação caracterizaria a deterioração das relações de troca contra os países subdesenvolvidos.
Capítulo I – Introdução 24
Uma outra publicação, na revista Exame em 1999, indica uma população de pobres no
Brasil da ordem tinha 54 milhões em 1997, o equivalente a 34% dos habitantes do país,
ou seja, quase a população da Itália. Desse montante, 24 milhões viviam abaixo da
linha de indigência (consumo de alimento menor do que a quantidade mínima definida
pela Organização Mundial de Saúde), enquanto que 10% dos mais ricos da população
ficavam com quase a metade de tudo o que é produzido no país.
Recentemente, em matéria na mesma revista, o Instituto de Pesquisa Econômica
Aplicada (IPEA), baseando-se nos dados do relatório do Programa e Desenvolvimento
das Nações Unidas (Pnud), analisa o paradoxo da miséria no Brasil. Nesta análise o
Ipea indica que a taxa de miséria publicado recentemente situa-se 14,5% da população
contra uma taxa de 17% a 25 anos atrás. Segundo o Instituto, esta queda é muito
pequena diante do amadurecimento social, econômico e político registrado no período.
A base para quantificação estatística desta palavra de significado impreciso veio do
estabelecimento de duas grandes linhas desenvolvidas por estudiosos. A primeira á a
linha de pobreza que define os limites relacionados às pessoas de renda insuficiente
para cobrir os custos mínimos de manutenção da vida humana: alimentação, moradia,
transporte e vestuário, considerando que a saúde e a educação são fornecidas pelo
governo. A segunda á a linha de miséria (ou indigência), que determina quem não
consegue ganhar o bastante para garantir sequer a alimentação, a mais básica das
necessidades.
Segundo esses conceitos, no Brasil, os dados revelam a existência de 53 milhões de
pessoas abaixo da linha de pobreza. Destas, 30 milhões vivem entre a linha da pobreza
e acima da linha da miséria e, finalmente, 23 milhões de pessoas estariam na situação
de miséria ou indigência.
Como pode-se verificar, os indicadores acima indicam o alto grau de exclusão social,
especialmente nos Países as América Latina. Por outro lado, diversas correntes do
pensamento econômico reconhecem o crescente processo de globalização das
Capítulo I – Introdução 25
economias nacionais e consideram que o avanço da pobreza, nesses países, constituí
o grande complicador deste inicio de milênio.
Assim, torna-se fundamentalmente importante entender o funcionamento dessas
estruturas sócio-econômicas e, sobretudo, pensar na possibilidade de novas
formulações relacionadas a organização produtiva, de forma que melhores
contribuições possam surgir no processo de desenvolvimento econômico em
consonância com as várias diferenças econômicas, sociais, culturais e tecnológicas, tão
acentuadas regionalmente.
1.6.1 Hipóteses consideradas
Esse esforço de análise possibilitou a formulação das seguintes hipóteses relacionadas
às origens dos problemas elencados: O
s •Os 20%os mais ricos do p
O sistema de acumulação capitalista tradicional, baseado na organização produtiva
taylorista-fordista, parece não ter contribuído para o desenvolvimento econômico
dessas regiões;
Por outro lado, os elementos fundamentais dos modernos sistemas flexíveis de
organização produtiva, parecem não estar presentes nessas mesmas regiões,
especialmente pela inexistência de uma cultura voltada para o aprendizado
contínuo.
Assim, a partir das considerações relacionadas a essas hipóteses, o trabalho define um
objetivo central que, embora não tenha a pretensão de resolver o problema do
subdesenvolvimento, acredita que pode representar um poderoso instrumento de
auxílio a necessária transformação local.
Capítulo I – Introdução 26
1.6.2 Objetivo do trabalho
À luz desse contexto, o trabalho tem como objetivo central, a proposição de elementos
fundamentais para a construção de uma estratégia de capacitação em regiões
periféricas na busca de desenvolvimento econômico, cujo foco está centrado no
processo de organização de sistemas produtivos em rede de pequenas firmas.
1.7 O escopo teórico da pesquisa Apesar da questão relacionada à geração de riqueza, desenvolvimento econômico e
outras denominações muitas vezes utilizadas, poder contar com diversas linhas de
análise, este trabalho, não desqualificando as outras, ousou escolher um caminho
particular de investigação, partindo dos principais fundamentos associados aos
modelos de crescimento econômico neoclássico (exógeno e endógeno),
representativos do sistema de acumulação capitalista corrente, e a sua passagem para
os modelos alternativos de desenvolvimento local baseados na organização produtiva
flexível.
Complementarmente, o trabalho elegeu o setor econômico agropecuário da Região
Norte Fluminense no Estado do Rio de Janeiro como objeto de análise, porém visto
num contexto mais ampliado das atividades agroindustriais integradas, cuja
denominação, “agribussiness”, é creditada a Davis e Goldberg (1957). Tal escolha
prende-se às características tradicionais históricas, geográficas e culturais de um
grande grupo de regiões de perfil periférico.
Objetivando validar as hipóteses construídas e, fundamentalmente, a proposta
apresentada, este trabalho se estrutura através de uma organização baseada em seis
capítulos, distribuídos como se segue:
s 1
Capítulo I – Introdução 27
1.8 Organização do trabalho Primeiro capítulo: objetivou-se, neste capítulo, uma certa sistematização sobre a
origem e evolução de importantes postulados associados à geração de riqueza, tanto
no contexto nacional como no regional, considerando as mudanças de paradigmas ao
longo do tempo, assim como a inserção de relevantes conceitos como produtividade e
competitividade. Outros fatores emergentes como a moderna visão econômica voltada
para o desenvolvimento regional, além da identificação da importância do ambiente
econômico e da cadeia de valor na obtenção de excedentes de produtividade, são
elementos que incorporam a discussão deste capítulo. Complementarmente, espera-se
estas questões possam contribuir para uma observação sistematizada da realidade
regional e, sobretudo, auxiliar na consolidação do objeto desse trabalho, voltado para o
setor agropecuário da região norte fluminense do Estado do Rio de Janeiro.
Segundo capítulo: O segundo capítulo proporcionará uma discussão sobre os
postulados básicos associados aos modelos de crescimento econômico neoclássico
(exógeno), assim como os seus desdobramentos que culminaram nos atuais postulados
de características endógenas. Esses elementos contribuirão para um melhor
entendimento dos mecanismos intrínsecos aos mesmos modelos, permitindo uma
melhor percepção no processo de avaliação do estágio econômico em que se
encontram as regiões de perfil periféricas, incluso a região de interesse do trabalho.
Terceiro capítulo: Objetiva este capítulo evoluir na pesquisa sobre os modernos
sistemas de organização industrial e as conseqüentes experiências de desenvolvimento
econômico regional. Trata-se da investigação sobre os modernos “Distritos Industriais”,
considerados na literatura como o novo paradigma de organização industrial o qual, no
entanto, oferece algumas dificuldades de importação em sua totalidade. Desenvolve-se
ainda, ao longo da discussão, uma avaliação crítica sobre esses modelos, no que diz
respeito a sua implementação em regiões periféricas, fundamentalmente, em função de
suas características predominantes, ou seja, a ausência de uma cultura associativista e,
sobretudo, um elevado grau de desorganização econômica setorial.
Capítulo I – Introdução 28
Quarto capítulo: Neste capítulo propõe-se uma discussão voltada para analisar o
estágio econômico regional – a região norte fluminense - à luz dos postulados exógeno
e endógeno e, fundamentalmente, à luz do moderno paradigma representado pelos
“Distritos Industriais”, ocasião em que indicar-se-ão as dificuldades de implementação
de alguns postulados em seu estágio específico.
No desdobramento da análise será desenvolvida uma avaliação crítica sobre a
possibilidade de replicação do modelo “distrito industrial” em regiões marginais, como a
região norte fluminense, momento em que se identificará a necessidade de importantes
intervenções de maneira que essas regiões possam construir um ambiente sócio-
cultural mais capacitado para a formação de riqueza, com vista ao aumento e
manutenção das taxas de emprego e renda. Quinto capítulo: Este capítulo define, como proposta de trabalho, a construção de uma
estratégia de capacitação para territórios marginais que buscam o desenvolvimento
local. A identificação do quantitativo da oferta disponível de recursos voltados para
dinamizar economicamente essas regiões e, conseqüentemente, a contabilização de
resultados inconsistentes com esse contexto, fortaleceu o sentimento de que o grande
obstáculo a ser considerado é a ausência de competência demonstrada por essas
regiões para a utilização plena e eficiente desses mecanismos disponíveis em seus
ambientes. Sexto capitulo: Este capítulo trata das considerações finais. O processo evolutivo de
aprendizagem sobre o tema “desenvolvimento econômico”, as formas de organização
industrial, as dificuldades de implementação - em sua totalidade - dos sistemas
importados que guardam uma forte relação com a cultura, história e geografia regional
e, fundamentalmente, a disponibilização de algumas indicações que possam permitir
uma efetiva contribuição no processo de desenvolvimento econômico e social de
regiões mais atrasadas tecnologicamente.
Conclusivamente são apresentas as referências bibliográficas utilizadas neste trabalho.
CAPÍTULO II
UMA REVISÃO DOS MODELOS DE CRESCIMENTO ECONÔMICO NEOCLÁSSICO E ENDÓGENO
2.1 Uma aproximação aos postulados da teoria de crescimento econômico neoclássica
Objetivando contribuir para um melhor entendimento sobre os pilares essenciais do
processo de geração de riqueza, este capítulo desenvolve uma investigação sobre os
pressupostos da teoria neoclássica de crescimento econômico, sua passagem para o
estágio endógeno, assim como, indica as novas leituras do desenvolvimento no
contexto atual.
Evidentemente, não desconsiderando outras importantes abordagens do
desenvolvimento econômico como a da CEPAL, as Etapas do desenvolvimento de
Rostow, a Teoria evolucionaria de Guha, dentre outras, a linha de análise escolhida por
este trabalho prioriza a teoria do crescimento econômico exógeno e endógeno, assim
como, os desdobramentos no campo do desenvolvimento econômico a partir da década
de oitenta.
Capitulo II – Uma revisão dos modelos de crescimento econômico neoclássico e endógeno 30
No pós-guerra, as atenções voltaram-se para a identificação de fórmulas mais eficientes
que pudessem diminuir a pobreza e, conseqüentemente, as desigualdades entre os
países desenvolvidos e os subdesenvolvidos. A economia Keynesiana, de curto prazo,
já esboçava sinais de enfraquecimento, o que possibilitou o surgimento dos modelos
neoclássicos, cujo objetivo era explicar o processo de crescimento econômico. Os
economistas de orientação neoclássica apresentavam uma visão otimista sobre o
processo de produção. Segundo os mesmos, o crescimento econômico se
caracterizava por um processo gradual, cuja origem estaria nos mecanismos
automáticos do mercado perfeito. Essa visão entendia que os salários e os preços eram
flexíveis e as remunerações dos fatores distribuídas eqüitativamente, segundo a
produtividade marginal de cada agente, Solow (1956).
Desta forma, o crescimento econômico era visto como um processo contínuo e
harmonioso em função da acumulação de capital, originada pela alocação plena e
eficiente dos fatores de produção, The economist (1996).
Segundo Paz e Rodrigues (1972), a teoria neoclássica explica o processo de
crescimento econômico através de modelos que apresentam os seguintes principais
postulados:
(i) Um sistema de mercado regido pela concorrência perfeita e a existência de pleno
emprego em todos os mercados;
(ii) Uma condição de economia fechada e sem governo;
(iii) Uma função de produção que apresenta rendimentos constantes a escala e
decrescentes quando se altera apenas um dos fatores;
(iv) Uma economia simplificada que produz um único bem com apenas três fatores
(capital fixo, trabalho e terra);
Capitulo II – Uma revisão dos modelos de crescimento econômico neoclássico e endógeno 31
(v) Uma condição em que os fatores de produção são homogêneos, divisíveis e
imperfeitamente substituíveis entre si.
Na visão de longo prazo o modelo clássico básico de Solow (1956), considerava que a
taxa de crescimento dependia essencialmente da taxa de mudança tecnológica
(variável puramente exógena), isto é, do progresso técnico. Assim, segundo o modelo,
todos os países tenderiam a convergir para a mesma taxa de crescimento e para os
mesmos níveis de renda per capita.
Todavia, um postulado importante da economia neoclássica representado pela taxa de
crescimento dependente diretamente da poupança não se verificou, já que,
posteriormente, ficaram evidenciadas as dificuldades do modelo de crescimento de
Solow-Swan. Na verdade a média de poupança não afetou a média do crescimento e,
na ausência de circunstancias exógenas, a poupança apenas diminuiu a produtividade
marginal do capital, forçando a economia em direção a um estado estacionário.
O diagrama (02) a seguir, sistematiza os principais elementos da teoria neoclássica do
crescimento econômico, segundo Solow (op. cit.)
• Principal proposição
a taxa de crescimento depende essencialmente da
taxa de mudança tecnológica.
• Progresso técnico
é uma variável puramente exógena.
• Função de produção
estruturada a partir do nível técnico;
estoque de capital;
Capitulo II – Uma revisão dos modelos de crescimento econômico neoclássico e endógeno 32
produtividade marginal do capital;
produtividade marginal do trabalho;
taxa de mudança tecnológica (exógena).
• Hipóteses centrais
do modelo
flexibilidade de salários e preços;
mercados concorrenciais;
perfeita informação;
capital maleável;
progresso técnico como elemento exógeno,
formado de modo independente dos parâmetros
do modelo.
• Ambiente sócio econômico
fatores ambientais favoráveis.
econômicos: concentração industrial,
mercado de trabalho especializado,
infra-estrutura real.
não econômicos: aperfeiçoamento das leis,
investimento em capital humano,
mobilidade da mão-de-obra.
• Visão de longo prazo
Capitulo II – Uma revisão dos modelos de crescimento econômico neoclássico e endógeno 33
todos os países tenderiam a convergir para a
mesma taxa de crescimento e para os mesmos
níveis de renda per capita.
• Fluxo Circular (ausência
de inovação tecnológica)
o crescimento demográfico determina o
crescimento econômico.
a produtividade do trabalho e do capital aumentam
com maiores conhecimentos, melhor educação e
saúde dos trabalhadores, uso de processos e
máquinas mais eficientes, elevando o ritmo do
crescimento econômico.
quanto maior o crescimento da taxa do progresso
técnico em relação ao trabalho, tanto maior será
a acumulação de capital e o crescimento
econômico, via aumento da produtividade do
trabalho. Diagrama (02): Os principais elementos da teoria neoclássica do crescimento econômico adaptado de Solow (1956)
Visando uma melhor visualização desses modelos, apresenta-se, a seguir, uma figura
representativa de sua estrutura.
Capitulo II – Uma revisão dos modelos de crescimento econômico neoclássico e endógeno 34
AMBIENTE SOCIOECONÔMICO FATORES AMBIENTAIS
Econômicos: Não econômicos: * Concentração industrial * Aperfeiçoamento das leis
* Mercado de trabalho especializado * Investimento em capital humano
* Infra-estrutura real * Mobilidade de mão-de-obra
Impactos positivos ( +) impactos negativos ( - )
FAVORÁVEL NÃO FAVORÁVEL
SISTEMA ECONÔMICO
EMPREGO POUPANÇA SALÁRIOS INVEST PRODUÇÃO
Figura (03): Visão gráfica dos modelos de crescimento neoclássico Fonte: adaptado de Solow (1956).
Capitulo II – Uma revisão dos modelos de crescimento econômico neoclássico e endógeno 35
2.2 Uma aproximação aos postulados da teoria do crescimento endógeno
Após o estado precedente de preocupação em relação ao tema, por muitos anos, os
economistas teóricos e pesquisadores empíricos negligenciaram o estudo do
crescimento, concentrando suas atenções em outros campos, notadamente, na política
macroeconômica de curto prazo. Porém, somente na década de 80, ressurge o
interesse pelas questões do crescimento econômico, depois de uma real constatação
empírica do elevado estágio de desigualdade entre os países pobres e ricos. A nova
teoria, como elemento ativo do processo de crescimento, passa então a trabalhar com a
afirmativa de que o progresso técnico exerce efeitos expansivos sobre o produto ao
elevar a produtividade dos fatores e a retransmitir esses efeitos entre as unidades
produtivas.
O primeiro estágio da teoria do crescimento endógeno tem sua origem principalmente
em trabalhos de Paul Romer (1984), que amplia o conceito de capital incluindo o capital
humano (conhecimento e especialização incorporada na força de trabalho), com
objetivo de anular a lei dos rendimentos decrescentes. Sendo assim o modelo incorpora
uma visão de longo prazo em que a taxa comum de crescimento do estoque de capital
e do consumo per capita aumenta com o esforço produtivo do resultado de “learning by
doing”.
A função de produção do modelo endógeno, nesse primeiro estágio, apresenta
rendimentos constantes à escala, ou seja, para dobrar a produção necessita-se duplicar
os insumos 9. A tecnologia permanece, conforme na teoria neoclássica básica, como
uma variável temporal e determinada independente das variáveis do modelo.
Entretanto, logo a seguir, esta hipótese foi abandonada permitindo a incorporação da
tecnologia como uma variável endógena ao modelo. Esta variável, por sua vez, passou
a apresentar uma característica de dependência da aplicação do trabalho, do capital
físico e do capital humano. Assim, estava decretado o segundo e atual estágio da nova
Capitulo II – Uma revisão dos modelos de crescimento econômico neoclássico e endógeno 36
teoria do crescimento econômico, que passou a considerar os gastos em pesquisa e
desenvolvimento, realizado pelas firmas, como elementos da função de produção.
9- segundo Souza (1999), verifica-se essa ocorrência na hipótese de concorrência perfeita e na condição em que as empresas produzem um único bem homogêneo com custo mínimo. Neste contexto os preços são dados pelo mercado e os lucros são normais. Neste estágio a produtividade dos fatores de produção, segundo Romer (op. cit.), passa
a gerar rendimentos crescentes a escala e os investimentos beneficiam direta e
indiretamente as outras empresas. Complementarmente, a sociedade precisa investir
em saúde, educação geral e treinamento específico dos trabalhadores, bem como na
produção de novos conhecimentos técnicos, além do capital físico. Os novos
conhecimentos então passam a produzir externalidades positivas que são apropriadas
pelos agentes produtivos, elevando o nível da produção agregada.
A neutralização dos rendimentos decrescentes são determinados pelos investimentos
na ciência básica e aplicada, na descoberta de novos produtos e processos de trabalho,
bem como em educação e saúde da população. Entretanto, é importante a observação
de que em todas as teorias não existe uma discussão mais profunda sobre o papel do
governo. O vínculo entre a política e o crescimento é tênue e indireto.
Desta maneira, a teria do crescimento endógena então surge como uma tentativa de
reação a presente e sombria perspectiva teórica. Entretanto, vale notar que antes de
Romer outros autores trataram esta questão, conforme relatado em Souza (2000).
Segundo o autor, os assuntos tratados temporalmente foram os seguintes:
• Schultz (1961), Investimento em capital humano;
• Arrow (1962), Implicações econômicas do aprender fazendo;
• Nelson e Phelps (1966), Investimento humano, difusão tecnológica e crescimento
econômico;
• Schultz (1967), A taxa de retorno do investimento alocado na educação;
• Nordhaus (1969), Uma teoria econômica da mudança tecnológica.
Capitulo II – Uma revisão dos modelos de crescimento econômico neoclássico e endógeno 37
O diagrama 03 a seguir ilustra os principais elementos concernentes ao modelo de
crescimento econômico endógeno:
1º estágio (Paul Romer, 1986)
• Origem
ao ampliar o conceito de capital para
incluir o capital humano (conhecimento e
a especialização incorporada na força de
trabalho) a lei dos rendimentos decrescentes
poderia deixar de vigorar.
• Consideração do modelo
todos os trabalhadores têm o mesmo nível
de habilidade.
• Visão de longo prazo
a taxa comum de crescimento do estoque
de capital e do consumo per capita
aumenta com o esforço produtivo com
o resultado de “learning by doing”.
• Evolução do modelo
endógena.
Capitulo II – Uma revisão dos modelos de crescimento econômico neoclássico e endógeno 38
• Característica da nova teoria
elemento ativo do processo de crescimento
que exerce efeitos expansivos sobre o
produto ao elevar a produtividade dos
fatores e ao transmitir esses efeitos entre
as unidades produtivas.
• Função de produção
a produção apresenta rendimentos
constantes à escala.
• A tecnologia
é uma variável temporal e determinada
independente das variáveis do modelo.
• 2º estágio da teoria
a tecnologia aparece como um fator
endógeno, dependente da aplicação de
trabalho, capital físico e capital humano.
• Nova função de produção
considera os gastos em pesquisa e
desenvolvimento realizados pela firma.
Capitulo II – Uma revisão dos modelos de crescimento econômico neoclássico e endógeno 39
a produtividade dos fatores de produção geram
rendimentos crescentes a escala.
esses investimentos beneficiam direta e
indiretamente as outras empresas.
• O aumento do produto
per capita
depende da sociedade investir em saúde,
educação geral e treinamento específico
dos trabalhadores,
bem como na produção
de novos conhecimento técnicos,
além do capital físico.
• Os novos conhecimentos
produzem externalidades positivas que
são apropriadas pelos agentes
produtivos, elevando o nível
da produção agregada.
• neutralização dos rendimentos
decrescentes
investimentos crescentes na ciência
básica e aplicada, na descoberta de novos
produtos e processos de trabalho, bem
como em educação e saúde da
Capitulo II – Uma revisão dos modelos de crescimento econômico neoclássico e endógeno 40
população.
• O governo
o vínculo entre a política e o crescimento
é tênue e indireto. As teorias não
formulam um juízo firme a respeito do
papel do governo.
Diagrama (03): Os principais elementos da teoria endógena do crescimento econômico, Romer (1986).
2.3 Outras leituras do processo desenvolvimento econômico no contexto atual
Paralelamente ao processo de evolução das pesquisas sobre crescimento econômico
endógeno, produzido por economistas da corrente ortodoxa, surgiram novas correntes
de interesse sobre o tema. Acredita-se que tal incentivo se deu em virtude do
aprofundamento da desigualdade entre países ricos e pobres. Por exemplo, uma
importante vertente de pensamento econômico, capitaneada por Nelson e Winter e
denominada neo-schumpeteriana, resgata os fundamentos da teoria de Schumpeter
(1912), constituindo-se na nova teoria evolucionária do pensamento econômico. Esta
fundamenta-se pela aplicação da teoria da evolução da espécie, segundo a qual o meio
sócio econômico cultural exerce uma influência direta sobre os indivíduos e as
instituições. Assim, o organismo econômico e social mais bem adaptado ao meio tem
melhores condições de sobrevivência e de transmissão de suas mutações. A teoria se
explica pelo instinto de sobrevivência para ampliar seus espaços e pelas forças
motivadoras das adaptações e do crescimento, que pode ser autônomo ou induzido.
Zawislak (1994), confere que com a sistematização da teoria evolucionária a partir de
Nelson & Winter (1982) e Dosi (1991), os postulados da teoria ortodoxa (equilíbrio,
Capitulo II – Uma revisão dos modelos de crescimento econômico neoclássico e endógeno 41
maximização e racionalidade) são substituídos pelo fator inovação. A nova vertente de
crescimento na opinião desses neo-schumpeterianos passa a consistir dos seguintes
pontos:
(i) O sistema econômico assiste à persistente emergência da inovação, isto é, a
aplicação de novas soluções técnicas em produtos, processos e organizações.
Desta forma a tecnologia é considerada como sendo uma variável parcialmente
endógena às firmas;
(ii) A busca de novas soluções é também endógena e contínua (mutação). Isto
implica, para cada firma, um empecilho para atingir um mesmo e único estado
geral de equilíbrio, pois as oportunidades de pesquisa e as soluções dificilmente
serão as mesmas de uma firma para outra, dadas as diferentes competências e
história (herança genética) de cada um.
(iii) O sistema é assim caracterizado por processos descentralizados de sucessos e
de fracassos (na busca e aplicações de novas soluções) entre as firmas: trata-se
de um conjunto de descobertas úteis e inúteis, de tentativa e erro, de
aprendizados produtivos e improdutivos e várias formas de competição que
acabam por recompensar ou punir agentes heterogêneos (seleção natural).
(iv) O sistema é caracterizado pela interação destes agentes heterogêneos. Disto
resulta uma provável regularidade de evolução do sistema, explicada pelo
conjunto dos comportamentos destes agentes heterogêneos.
Segundo Dosi (1992), o modelo explica a existência de sistemas que exibem uma
dinâmica não linear e múltiplos caminhos dinâmicos.
Freeman (1994), por sua vez, identifica alguns elementos que são representativos dos
maiores avanços da teoria neo-schumpeteriana, os quais são relatados a seguir:
Capitulo II – Uma revisão dos modelos de crescimento econômico neoclássico e endógeno 42
(i) Descoberta de que a maior contribuição para o desempenho econômico veio de
inovações incrementais e não radicais, realizadas por firmas.
(ii) Reconhecimento da importância da produtividade transmitida por descobertas
científicas, fundamentais em firmas originárias de universidades ou institutos de
pesquisas.
(iii) Entendimento sobre o processo de centralização de inovação em firmas bem
sucedidas, em função da interação social por redes envolvendo diversos atores
de inovação.
(iv) Correção da errônea percepção do governo, indústria e academia, de que a
inovação é um processo linear, e promoção bem sucedida do novo entendimento
de que é um processo baseado numa interação sistêmica entre diversos
inovadores.
Outras vertentes de análise ganham relevância no aprofundamento desse processo
amparado, principalmente, no reconhecimento da existência de uma real
heterogeneidade entre os diversos atores econômicos, o que acaba por derivar a
análise do desenvolvimento para a esfera regional, sobretudo, pelo declínio da
economia nacional, cujo foco está na proteção às empresas com maior capacidade
competitiva.
Desta forma, toma vulto o papel da cooperação como mecanismo de política de
desenvolvimento. Conseqüentemente, o processo de inovação, guia da perspectiva
evolucionária, e o aprendizado se constituem nos fatores mais relevantes deste novo
processo.
Assim, tornam-se relevantes às contribuições sobre a identificação da necessidade do
aprendizado interativo no processo do presente estado de inovação industrial e
institucional (Cooke 1988), assim como, o reconhecimento da importância do
associativismo cooperativo e do aprendizado, representando uma troca entre
Capitulo II – Uma revisão dos modelos de crescimento econômico neoclássico e endógeno 43
interlocutores sociais, diferente das ações isoladas dos heróicos investidores (Freeman,
1994).
Neste processo de evolução, novas contribuições surgem no contexto da discussão
sobre desenvolvimento regional. Malecki (1997), considera que a taxa de criação de
empreendimentos tem um papel fundamental no desenvolvimento local, e que
necessariamente, os atores devem se organizar produtivamente. Um conceito amplo de
empreendimento, para o autor, deve considerar pequenas firmas, inovação e uma
política de desenvolvimento regional e local. Este processo deve ser explorado
considerando tanto a qualidade, quanto a quantidade (Davidson, 1995)
Todavia, conforme Casson (1982), a sobrevivência do empreendimento no longo prazo
depende do processo de inovação de produtos. Assim, a reprodução de práticas
improdutivas normalmente inibe novos negócios, que por sua vez, desaparecem na
esteira do processo de destruição criativa introduzido por Shumpeter (1934).
Uma organização econômica setorial capaz de contribuir para um processo de
mudança encontra-se acordado no modelo de desenvolvimento centrado de
empreendimento de Coffey e Polese (1984, 1985), o qual considera que a formação de
uma nova firma, é fundamental para o pensamento corrente acerca do bem estar local
e regional.
A formação de uma nova firma, entretanto, depende de um meio ambiente favorável
estruturado em rede de empreendedores, firmas correlatas, fornecedores de capital,
meios de informação. Regiões próximas a universidades, normalmente propiciam
importante integração entre empresa e pesquisadores, de maneira que projetos
colaborativos possam ser disponibilizados. A Promoção do desenvolvimento local
possibilita a criação de um meio ambiente para empreendimentos inovativos através da
promoção de instituições, redes e uma cultura técnica.
Capitulo II – Uma revisão dos modelos de crescimento econômico neoclássico e endógeno 44
No modelo de desenvolvimento local de Coffey e Polèse (op. cit.), o conhecimento local
acumulado, os valores locais, as experiências e os recursos são influências
significativas na formação de novas firmas.
Na concepção de Blakely (1994), o empreendimento é à base de um desenvolvimento
econômico local, porque empreendedores respondem às oportunidades incompletas de
mercado que são deixadas por grandes empresas. Conseqüentemente, a formação de
uma pequena empresa é um componente de desenvolvimento local e nacional aceito.
Conseqüentemente, Suarez Vila (1989) afirma que a inovatividade do empreendimento
está na habilidade de alguns novos negócios entenderem melhor o mercado do que
outros o fazem. Evidentemente que não meramente no curto prazo, segundo a cultura
pré-existente em regiões periféricas, mas no longo prazo como preenchedores de
nichos inovativos. As baixas barreiras de entrada em outros setores atraem
empreendedores mais imitativos do que inovativos, atraindo muitos empreendimentos
nessa categoria de imitação, Popovich (1990).
Entretanto, Maskell (1998), referindo-se ao ambiente representativo de uma economia
integrada e globalmente crescente, alerta que as regiões de alto custo, a exemplo dos
pequenos países industrializados em particular, não conseguem sustentar a
competitividade e prosperidade.
Assim, a sobrevivência e prosperidade das firmas passam a depender primariamente
dos fatores dentro da firma, e não de qualquer tamanho de mercados exógenos ou
características industriais.
A figura a seguir objetiva ilustrar os modelos endógenos de característica local
compreendidos na discussão precedente:
Capitulo II – Uma revisão dos modelos de crescimento econômico neoclássico e endógeno 45
SOCIAIS INSTITUCIONAIS
SISTEMA LOCAL Variáveis econômicas
PRODUÇÃO
INVESTIMENTO
SALÁRIOS
POUPANÇA
EMPREGO
ECONÔMICOS
ESTRUTURAS DO
AMBIENTE SÓCIO CULTURAL
INSTITUIÇÕES INOVAÇÕES TECNOLÓGICAS
Figura (04) o ambiente sócio cultural é endógeno
Fonte: adaptado de Romer (1984).
Complementarmente, as discussões sobre a teoria dos distritos industriais parece vir
ocupando um lugar de destaque no que diz respeito ao tema desenvolvimento
Capitulo II – Uma revisão dos modelos de crescimento econômico neoclássico e endógeno 46
econômico, mais modernamente. Um fator motivador pode estar na evolução de parte
da Europa, denominada Arco Alpino (nordeste e noroeste da Itália, Franca, Alemanha e
Suíça), que adquiriu o “status” de macro região com alto poder de competitividade
internacional, apesar de contar com muitas atividades de baixa agregação tecnológica.
Assim, o fato dessa teoria ter possibilitado um grande sucesso, especialmente, em
regiões dispersas com predominância de atividades econômicas oriundas do setor
tradicional 10 , cujas semelhanças são próximas de algumas regiões do Brasil,
especialmente, a região norte fluminense, merece um maior aprofundamento de
analise, o qual desenvolver-se-á no próximo capitulo.
2.3 Uma avaliação dos fundamentos básicos das teorias neoclássica e endógena frente às estruturas econômicas com níveis de crescimento insatisfatórios O processo de avaliação dos postulados das estruturas teóricas neoclássica e
endógena permite um certo aprendizado que, naturalmente, aguça um sentimento
reflexivo em direção às economias ditas periféricas ou de crescimento econômico
insatisfatório. Assim surge uma importante indagação: Essas teorias, efetivamente,
explicam o estágio presente de ausência de desenvolvimento nessas regiões
periféricas?
Visando um melhor entendimento sobre os postulados gerais intrínsecos às teorias
acima e a sua associação ao ambiente periférico, propõem-se a seguir a sistematização
de alguns comentários preliminares sobre a questão:
10- Segundo Souza (1999), setor econômico tradicional e aquele que produz bens de consumo corrente, com baixa intensidade de capital e de tecnologia, geralmente agrícolas e de consumo interno, vendidos ou não no mercado externo.
• As teorias neoclássica e endógena tratam a questão do crescimento no contexto da
nação, não levando em consideração a condição de heterogeneidade entre países,
Capitulo II – Uma revisão dos modelos de crescimento econômico neoclássico e endógeno 47
regiões e organizações. O tratamento do desenvolvimento econômico no contexto
local, com base nos sistemas industriais integrados do norte da Itália, regiões da
Alemanha e França, oriundas dos modelos de distritos industrias talvez possa
responder melhor ao planejamento de uma estrutura industrial nessas regiões.
• A taxa de crescimento, como dependência da taxa de mudança tecnológica, tanto
na visão exógena quanto endógena, no sentido individual, pressupõe um ambiente
sócio cultural favorável composto por fatores econômicos (concentração industrial,
mercado de trabalho especializado, infra-estrutura real) e não econômicos (leis
aperfeiçoadas, investimento em capital humano, mobilidade de mão-de-obra) além
de grandes empresas operando no processo de produção em massa.
Contrariamente, nos espaços econômicos periféricos inexiste um ambiente sócio
cultural nas condições concebidas por estas teorias. Assim, uma proposição de
ajuste estaria na ótica de construção de um novo formato de organização produtiva,
compreendendo redes de pequenas empresas em franco processo de cooperação
solidária, de maneira a permitir um maior grau de competitividade ao ambiente
mesoeconômico.
• Os parâmetros de perfeita flexibilidade de preços de fatores e salários, mercados
concorrenciais, perfeita informação e capital maleável - considerados na teoria
neoclássica – parecem não estar presentes nos espaços econômicos periféricos. Ao
contrário, o que predomina é um processo de concorrência imperfeita pela ação dos
oligopólios, além da imperfeita informação e, sobretudo, uma aguda dificuldade na
contratação de capitais com taxas compatíveis com a taxa de retorno dos
investimentos. Na verdade existe uma forte incidência de pequenas empresas que
operam isoladamente e não costumam dispor de competências básicas gerências,
nem financeiras nem tecnológicas. A proposição de ajuste, assim, deve
fundamentar-se na consolidação das redes de cooperação citada precedentemente.
• A concepção de que a produtividade do trabalho e do capital aumenta com a adição
de maiores conhecimentos, melhor educação e saúde dos trabalhadores e uso de
processos e máquinas mais eficientes não é tão mecânica como a teoria
Capitulo II – Uma revisão dos modelos de crescimento econômico neoclássico e endógeno 48
neoclássica supõe. Assim, permanece a visão de que um novo formato de
organização produtiva pode romper tal estágio de subdesenvolvimento vivenciado
por regiões periféricas.
• A produtividade dos fatores de produção gerando rendimentos crescentes e os
investimentos beneficiando direta e indiretamente as outras empresas, vislumbrados
pela teoria endógena, só poderão se efetivar em função do esforço de cooperação
entre os organismos no contexto local. Conclusivamente, percebe-se que os movimentos mecânicos da teoria neoclássica e,
fundamentalmente, as ações ativas das teorias endógenas do crescimento econômico
exigem um ambiente sócio-cultural, o qual parece não existir em regiões periféricas.
Sendo assim, aflora a percepção de que a inserção de um processo de aprendizado
contínuo é fundamentalmente importante para o planejamento de ações especificas e
regionalizadas que vá de encontro aos diferentes problemas oriundos de cada cultura,
historia, hábitos, religião, etc. Tal percepção, dessa forma, indica a impropriedade
dessas teorias para explicar a ausência de desenvolvimento nessas regiões periféricas,
as quais apresentam uma real característica de heterogeneidade que não são
capturada pelas teorias neoclássica e endógena.
CAPÍTULO III DISTRITOS INDUSTRIAIS COMO PARADIGMA DE ORGANIZAÇÃO INDUSTRIAL -
UMA AVALIAÇÃO CRÍTICA 3.1 Introdução Diferente do contexto verificado no capitulo anterior, algumas regiões da Europa, mais
especificamente, o nordeste da Itália, conhecida como “Terceira Itália”, composta pelas
regiões de Vêneto, Trentino, Friuli-Venezia Giulia, Emilia-Romagna, Toscana, Marche e
parte da Lombardia, juntamente com a macrorregião denominada Arco Alpino,
composta pelo noroeste italiano, Rhone-Alpes na França, Baden-Wurttenberg e Baviera
na Alemanha, Suíça e Áustria, vêm experimentando uma nova dinâmica de
desenvolvimento econômico (Gurisatti 1999). Essas experiências, provenientes de um
processo de industrialização localizada, colocaram os distritos industriais europeus em
evidência, em função de sua competitividade internacional e da alta absorção de mão-
de-obra. Conseqüentemente, essas experiências estão crescentemente ocupando
espaços entre os pesquisadores de políticas industriais do mundo inteiro (Tironi 1999).
Diante desta constatação, diversos autores tem apresentado conceitos bem próximos
para “Distrito Industrial”. Becattini (1994), conceitua “distrito industrial” como uma
entidade sócio-cultural caracterizada pela presença ativa de uma comunidade de
pessoas e de uma população de empresas num determinado espaço geográfico e
histórico. Para o autor, a originalidade de um distrito industrial qualifica-se pela simbiose
entre a atividade produtiva e a vida comunitária, o que gera possibilidades de
cooperação competitiva, potencializando a criação de externalidades positivas.
Externalidade, entendida como um efeito secundário gerado numa atividade qualquer,
Capitulo III – Distritos Industriais como paradigma de Organização Industrial – Uma avaliação critica 50
podendo ser positiva quando desejada, ou negativa, quando indesejada (Humphrey e
Schmitz, 1996).
Em Brusco (1982) e Staber (1999), “distrito industrial” é definido como redes de
pequenas firmas especializadas, localizadas em proximidade fechada e integradas nas
estruturas institucionais locais que apóiam um mix dinâmico de cooperação e
competição.
Numa análise sobre a visão geral do modelo industrial italiano, Storper e Scott (1996)
entendem “distrito industrial” como um lugar onde os produtos são elaborados e postos
em circulação numa condição em que o trabalho é administrado à luz da existência de
uma regulamentação institucional capaz de garantir a estabilidade e sobrevivência do
distrito.
3.2 Estágio inicial dos “Distritos Industriais”
O conceito de “distritos industrias” , como paradigma de organização industrial
localizada, não é totalmente recente. Piore & Sabel (1984), apontam que os distritos
industriais do século dezenove apresentavam três características interdependentes
como fonte de seu dinamismo e de sua vitalidade tecnológica. São as seguintes essas
características:
• Em relação ao mercado; onde podia-se observar uma forte aptidão para produzir
uma ampla variedade de produtos para mercados regionais altamente diferenciados,
cujo perfil era marcado pela exigência de mudanças constantes nos produtos,
derivadas de mudanças nos gostos. Assim, o traço principal era de que o sistema
seria um “escravo” das tendências da moda e, conseqüentemente, “criador” da
moda quando do desenvolvimento de inovações capazes de criar novos gostos.
• Em relação à tecnologia; verificava-se o uso flexível de tecnologia de
produtividade crescente e de larga aplicação. A tecnologia tinha que ser flexível em
sentido amplo e restrito: deveria permitir, simultaneamente, a diversificação de
Capitulo III – Distritos Industriais como paradigma de Organização Industrial – Uma avaliação critica 51
produtos (sem maiores gastos) dentro de uma mesma família de produtos e a
constante expansão da variedade de materiais utilizados e das operações
produtivas, de forma a facilitar a transição de uma linha de produtos para outra.
• Em relação ao aparato institucional; a atuação de instituições regionais que
pudessem garantir um balanceamento entre as necessárias cooperação e
competição seria essencial no sentido de estimular permanentemente a inovação.
As instituições deveriam, então, propiciar um ambiente no qual habilidades e bens
de capital pudessem ser constantemente recombinados, de forma a garantir a
rápida alteração de produtos. Como precondição para isso, as firmas deveriam ser
desencorajadas da competição via redução de salários e preços e incentivadas a
competir em inovação de produtos e processos.
Segundo os autores, as formas de organização que tornavam possível a flexibilidade no
uso dos recursos disponíveis nesses distritos industriais variavam de acordo com as
particularidades de cada indústria, distinguindo-se três tipos de sistema, a saber:
(i) Municipalismo: constituía a forma predominante no caso de pequenas unidades
de produção com poucas exigências de capital. Através do Municipalismo,
pequenas produções dispersas territorialmente eram centradas em uma base
urbana ou coordenadas por ela, adquirindo a forma de associações (ou
corporações) de pequenas oficinas especializadas por fase do processo
produtivo. Entre outras, a indústria de seda em Lyon constituiu um dos exemplos
bem-sucedidos mais famosos desses distritos industriais. No que tange à
operacionalização do sistema, normalmente se tornava imprescindível a
coordenação exercida ou por um “agente intermediário” (como no “putting-out”) –
que fornecia crédito e matérias-primas e assumia a comercialização do produto
final dos subcontratados – ou pela atuação de uma grande empresa que, além
de desenvolver as mesmas tarefas do “agente”, se encarregava também da
montagem dos produtos finais.
Capitulo III – Distritos Industriais como paradigma de Organização Industrial – Uma avaliação critica 52
A figura a seguir, ilustra a sistematização desse processo organizacional.
Associações ou coorporações
Produções dispersas
Produções dispersas
Agente intermediário Grande
empresa
Capital - matériais primas - comercialização
Tarefas idênticas montagem dos produtos finais
Produções dispersas
Produções dispersas
Produções dispersas
Produções dispersas
Produções dispersas
Figura (05): Processo organizacional no sistema denominado Municipalismo Fonte: adaptação Piore & Sabel (1984)
Capitulo III – Distritos Industriais como paradigma de Organização Industrial – Uma avaliação critica 53
(ii) Capitalismo do bem-estar ou paternalismo: Este sistema predominava no
caso de industriais que exigiam um montante de capital não acessível a
pequenos produtores (produção de aço, por exemplo). Apesar da produção
concentrada em grandes plantas, usando máquinas avançadas e empregando
grande número de pessoas, uma observação mais detalhada da forma de
organização do trabalho nessas grandes fábricas mostra que elas se
aproximavam muito mais de uma agregação de pequenas oficinas sob o mesmo
teto, produzindo grande variedade de produtos de forma flexível e mantendo as
habilidades artesanais. Não seria correto, portanto, associá-las às grandes
plantas de produção em massa, forma de organização perfeitamente articulada
que iria caracterizar o século XX.
(iii) Sistema familiar ou “sistema Motte”: Esse sistema é uma forma intermediária
de organização de produtores. Fundado na aliança informal, porém caracterizado
por total confiança entre pequenas e médias empresas especializadas, foi
inspirado na estratégia utilizada por Alfred Motte (industrial têxtil francês) nos
anos 50 do século XIX, para fazer face ao aumento da pressão competitiva
exercida pela grande produção em massa. Tal estratégia, que pressupunha a
lealdade familiar como uma vantagem, consistia na constituição de uma
confederação de firmas pertencentes a vários membros de uma família que, em
conjunto, se dedicavam à produção de tecidos de moda. Ao chegar a
determinada idade, cada membro da família era associado a um técnico de larga
experiência de uma das firmas da família. Aos novos sócios era fornecido o
capital inicial necessário para formar uma nova firma especializada em uma das
fases do processo do qual o grupo ainda estivesse carente. Os laços familiares
na origem dessa rede de empresas dotava-as de grande flexibilidade para
promover os rearranjos necessários para acompanhar as mudanças na moda,
bem como facilitava a formação de um sistema comum de reservas financeiras,
de mercado e de compras.
Capitulo III – Distritos Industriais como paradigma de Organização Industrial – Uma avaliação critica 54
3.3 O estagio atual dos “Distritos Industriais”
Modernamente a literatura sobre “Distritos Industriais”, desenvolvida, inicialmente, por
Piore & Sabel (1984), num trabalho longamente citado sobre a emergência de uma
nova ordem econômica, resgata nas várias experiências empíricas, importantes
características típicas dos velhos distritos industrias do século dezenove.
O exemplo da indústria têxtil do distrito de Prato, na Itália, de baixa concentração
econômica e extremamente pulverizada, teve seu sucesso apoiado nos seguintes
fatores:
a) um movimento de longo prazo de especialização na direção dos segmentos de
moda da industria;
b) uma correspondente reorganização da produção, na qual as grandes plantas
integradas foram sendo substituídas por uma rede cada vez mais ampla de
pequenas empresas especializadas nas diversas fases de produção – uma
versão moderna do “sistema Motte”.
O excelente desempenho da industria de máquinas-ferramentas japonesa deve
integrar, segundo Piore & Sabel (op. cit.), o rol dos exemplos que evidenciam a
viabilidade do modelo de especialização flexível, cujas características são assim
definidas:
a) verticalização por sistema de empresas, onde assume papel relevante a
subcontratação;
b) empresas especializadas em poucos produtos (ou fases do processo produtivo)
e agrupadas em torno de uma empresa líder;
c) capacidade das firmas de se moverem de uma linha de produtos para outra de
forma rápida e sem muitos custos, tendo em vista a sua política de treinar seus
Capitulo III – Distritos Industriais como paradigma de Organização Industrial – Uma avaliação critica 55
empregados de modo a torná-los aptos a exercerem ampla gama de atividades.
Em suma, essas características identificam claramente o “Sistema Motte”.
Outros exemplos de Distritos Industriais incluem as redes têxteis, ladrilhos cerâmicos e
máquinas de ferramentas no norte e centro da Itália (Paniccia 1998), os eletrônicos,
multimídia e aglomerações de produtos culturais na Califórnia (Scott 1996), as regiões
industriais de intensa tecnologia em Baden-Wurttemberg na Alemanha (Sabel et, al.
1989) apud Staber (1999).
Em sua análise sobre as políticas para o desenvolvimento de sistemas de produção
local intensivos em conhecimento, Belussi (1999) sistematiza um mapa sobre a
evolução dos sistemas de produção local italiano, cujas características seguem os
padrões evolucionários, ou seja:
• Uma tendência em direção ao declínio geral da produção, emprego e número de
firmas devido à perda geral da competitividade;
• Um deslocamento parcial das atividades para países de custo de mão-de-obra
reduzido, com vista à redução de custos;
• Uma forte reestruturação interna com mais hierarquização entre as empresas;
• Uma mudança do sistema local em direção a uma nova produção.
O quadro a seguir ilustra o mapa de evolução dos sistemas de produção local italianos,
numa adaptação de Belussi (1999).
Capitulo III – Distritos Industriais como paradigma de Organização Industrial – Uma avaliação critica 56
Declínio da estrutura industrial devido à
perda de competitividade
• Calçado (região de Vigevano);
• Calçado (região de Casarano);
• Roupas (região de Carpi);
• Cutelaria (região de Lumezzane);
• Têxtil (região de Busto Arsizio);
• Têxtil (região de Prato)
Deslocamento parcial das atividades em
direção às áreas de baixo custo de mão-
de-obra
• Calçados (região de Barletta)
• Roupas (região de Benetton System)
• Calçados (região Riviera del Brenta)
• Bio-médica (região de Mirandola)
• Alimentos (região de Langhirano)
• Hosiery (região de Castel Goffredo)
Aumento na descentralização com
expansão do papel das médias e
pequena firmas. Mais hierarquização da
estrutura industrial
• Móveis (região de Pesaro)
• Taning (região de Arzignano)
• Mecânica (região de Citadella)
• Glass (região de Murano)
• Spectacles (região de Cadore)
• Cerâmica (região de Sassuolo)
• Têxtil (região de Biella)
• Seda (região de Como)
• Maquinaria para industria de calçados
(região Vigevano)
• Calçados (região de Montebelluna)
• Maquinaria para embalagem (região de
Bologna)
• Anti-theft alarms (região de Varese)
Diversificação da produção • Móveis (região da Cantù)
• Maquinaria para agricultura (região de
Reggio Emilia)
• Logística (região de Milanese hinterland)
Capitulo III – Distritos Industriais como paradigma de Organização Industrial – Uma avaliação critica 57
Esses modernos Distritos Industriais têm sua origem na esteira do definhamento do
dinamismo do sistema de produção industrial fordista, cujo domínio foi absoluto nas seis
primeiras décadas do século XX (Courlet 1993). Esse sistema, constituído por grandes
empresas, cujos setores foram convertidos a métodos de produção em massa, contava
com um processo de regulamentação segundo os seguintes elementos (Storper 1996):
• Estrutura oligopolista da indústria, cuja atuação verifica-se no mercado de larga
escala e crescentes barreiras de entrada;
• Relações de mercado de trabalho organizadas em diversos lugares por instituições
de barganha coletiva com forte mistura funcional entre trabalhadores de diversos
níveis de capacitação diferenciada.
Sobre o primeiro elemento, relacionado à estrutura oligopolista da indústria, as
dificuldades impostas às pequenas unidades industriais foram vitais para o seu
processo de fragilização e, conseqüentemente, para a ampliação do grau de exclusão
que aprofundou o desemprego de fatores produtivos, contribuindo para a ampliação das
desigualdades sociais nas regiões periféricas. Contraditoriamente, este processo ainda
continua possibilitando benefícios às grandes organizações, as quais detém uma maior
capacidade de postular a sua participação nos diversos programas de competitividade
dispostos, exogenamente, pelo poder central.
Paralelamente, no que diz respeito ao segundo elemento, a concepção é de que a
legislação do bem estar tem o seu regimento baseado no modelo econômico
keynesiano de demanda agregada. Este modelo caracteriza-se pelo postulado básico
de garantia de altos níveis de estabilidade social referenciado no dispêndio do governo
em direção a um volume de investimento compatível com a demanda por trabalho.
Neste ponto, segundo a teoria, o problema de desemprego é sempre contornado.
Em termos regionais, essa concepção foi vista pelos teóricos como um sistema de
relações centro-periferia com tendência a crescer os custos de regiões periféricas
Capitulo III – Distritos Industriais como paradigma de Organização Industrial – Uma avaliação critica 58
subdesenvolvidas, cujo papel principal se concentrava no fornecimento de matérias-
prima ou produtos agrícolas para o centro, a termo de comércio favorável.
Entretanto, mais especificamente, nos anos setenta o sistema fordista entrou em crise
nos Estados Unidos e na Europa, em função das dificuldades apresentadas na
produtividade industrial, exatamente, por razão da importação barata de baixa
qualidade e, conseqüentemente, da dificuldade de manter o crescimento dos salários.
Como conseqüência veio o fechamento de fábricas e a descentralização de filiais para
regiões periféricas de baixo custo.
Esse modelo entrou em crise em conseqüência, sobretudo, de um profundo conflito
capital/trabalho, que modificou as relações de força entre as classes sociais e que foi
acompanhado de uma crise tipo intercapitalista entre os setores hegemônicos do
processo de desenvolvimento, particularmente, entre o setor de base (intensivo em
capital) e o setor produtor de bens de grande consumo (relativamente mais intensivo
em mão-de-obra), especialmente na Itália (Secchi 1974; Graziani 1975 apud Garofoli
1993).
Na luta para combater este cenário indesejável, surgem na Europa as novas estruturas
produtivas ancoradas em territórios, mais especificamente, na França, Itália e
Alemanha, cujo cerne dessa transformação credita-se ao processo de desverticalização
de grandes empresas ocasionado, exatamente, pelo forte conflito capital/trabalho
(Brusco 1982 e Courlet 1993).
Um novo contexto de análise então surge, sob a ótica de territorialidade. Na visão de
Courlet (op. cit.), este conceito representa um espaço localizado de relações funcionais
que se instauram entre o conjunto de empresas e a comunidade de habitantes e que
delimitam um sistema territorial de trocas entre si. Uma definição de comunidade,
segundo Taylor (1982, apud Lorenz, 1996), refere-se a um pequeno e estável grupo de
indivíduos que:
Capitulo III – Distritos Industriais como paradigma de Organização Industrial – Uma avaliação critica 59
(i) detêm crenças e valores em comuns;
(ii) cujas relações são diretas com cada indivíduo e opostas mediadas
pelo Estado ou alguma instituição burocrática;
(iii) cujas relações políticas e econômicas não estão claras;
(iv) praticam reciprocidade.
Segundo Courlet (op. cit.), esta nova dinâmica de sistemas industriais localizados
define-se como uma configuração de empresas concentradas em um espaço de
proximidade em torno de um ou de vários setores industriais, onde as empresas
interagem entre si e com o meio sociocultural de inserção. Essas relações não são
apenas mercantis, mas também informais e geram externalidades produtivas para o
conjunto das empresas. Os elementos que caracterizam esses sistemas são:
• A divisão do trabalho entre empresas iguais e/ou autônomas: o que significa um
processo de produções conjuntas, segundo procedimentos específicos de pacto. O
exemplo da Itália mostra o desenvolvimento tanto dos setores tradicionais no centro-
leste, quanto dos setores avançados nas grandes zonas metropolitanas. O
importante é que verifica-se realmente uma convergência em direção a resultados
satisfatórios.
• A industrialização dispersa: O modelo de industrialização dispersa baseia-se em
iniciativas predominantemente locais e em interações fortes entre a economia e a
sociedade. Becatini (1979 apud Courlet 1993), identifica, no caso da Terceira Itália,
a conjugação particular entre a cidade e o campo na origem da industrialização
dispersa. Esse processo no espaço das comunas apresenta uma antiga e rica
prática de organização social fundamentada na solidariedade familiar e no espírito
de empresa.
• A flexibilidade e as economias de aglomeração: onde a flexibilidade produtiva é
representada pela transformação contínua do processo de produção em função da
reorganização dos elementos que a compõem. A flexibilidade baseia-se na
densidade das relações entre empresas e na pequena dimensão de numerosas
Capitulo III – Distritos Industriais como paradigma de Organização Industrial – Uma avaliação critica 60
pequenas e médias empresas que participam da divisão do trabalho no sistema
industrial localizado. As economias de aglomeração por sua vez, representam a
conseqüência das relações intensas entre as empresas locais; estas ampliam a
divisão do trabalho, permitindo uma especialização produtiva cada vez maior à
introdução de novas tecnologias e uma maior eficácia do sistema local.
• O jogo de mercado e da reciprocidade como mecanismo de regulação local: diferente do sistema de produção em massa, os mecanismos de regulação nos
sistemas industriais localizados de industrialização dispersa baseiam-se,
fundamentalmente, na perfeita combinação entre o mercado e a reciprocidade.
Especialmente na Itália, a intervenção da família na produção é muito freqüente. A
criação de empresas e os negócios são feitos entre membros da mesma família,
entre membros de famílias aliadas ou entre conhecidos de longa data.
A figura a seguir apresenta esquematicamente a origem e evolução desses novos
sistema industriais:
Capitulo III – Distritos Industriais como paradigma de Organização Industrial – Uma avaliação critica 61
Sistema Industrial Fordista
Produção em massa
Competitividade concentrda nas
estruturas especias
Grandes Empresas
Figura (06) Do fordismo ao sistema flexível de produção Fonte: adaptação de Courlet (1993)
Exclusão das pequenas organizações
Crises e mutações em curso
Processo de desverticalização
Sistemas Industriais Localizados
Industrialização territorializada
Estruturas produtivas na Europa Itália, França e
Alemanha
Elementos
Modelo Padrão
Divisão do trabalho entre empresas
Industrialização dispersa
Jogo de mercado e reciprocidade como
mecanismo de regulação local
Flexibilidade e economia de aglomeração
Capitulo III – Distritos Industriais como paradigma de Organização Industrial – Uma avaliação critica 62
Similarmente, Staber (1999) identifica quatro elementos fundamentais e conseqüentes
ressalvas no processo de organização funcional e espacial no interior dos Distritos
Industriais, a saber:
• Especialização flexível: condição onde as firmas do distrito se especializam
horizontalmente em um ou mais produtos e/ou verticalmente numa fase de produção
ao longo da cadeia de valor agregado do processo de produção, tecnicamente
divisível dentro de componentes de produtos e fases de produção. Porém, torna-se
relevante a consideração sobre as restrições de sustentação dos mesmos em
mercados complexos e voláteis, onde o risco é eminente em função do alto custo
devido a grande diferença dos competidores (Harrigam, 1985 apud Staber, op. cit.).
• Cooperação interfirmas: para o autor, estudos mostram que a natureza e padrão
da cooperação interfirmas podem diferir longamente através das indústrias das
regiões porque as habilidades tradicionais e institucionais relevantes à inovação têm
seu grande impacto no nível local. Instituições incluem organizações formais, tais
como facilidades educacionais e centros de transferência de tecnologia. Entretanto
sua presença, de forma isolada, não garante uma cooperação inter-firmas assim
como não garante que a cooperação terá conseqüências inovativas. Desta forma, o
aspecto social das instituições definidas como cognitivas e sistemas de sentido
normativo são as condições que determinam como as relações competitivas são
desempenhadas. Os sistemas de sentido institucional podem ser altamente
específicos de cada lugar porque eles refletem a história e a cultura local.
Conseqüentemente, por serem difíceis de replicar, representam uma fonte de
vantagem de competitividade sustentável (Bellandi, 1996 apud Staber, op. cit.).
• Proximidade geográfica: Para o autor, a discussão sobre proximidade geográfica
deve isolar a visão tradicional de firmas em distritos, cuja concentração define-se
com objetivos claros de redução de custos, acesso à infra-estrutura local,
maquinaria especializada e mão-de-obra especializada. Distrito industrial não deve
ser visto meramente como uma agregação territorial estática de produtores e
atividades. Assim, uma melhor representação para essa forma de organização
Capitulo III – Distritos Industriais como paradigma de Organização Industrial – Uma avaliação critica 63
produtiva diz respeito a um sistema com propriedades emergentes, não
necessariamente linear e uniforme, refletidas em uma relação de poder, status e
reputação.
O distrito está em constante fluxo tendo em vista a fluidez da informação entre os
atores envolvidos. A localização territorial oferece informações externas através de
firmas capacitadas, de modo, a prontamente, ensinar sobre novas tecnologias e
oportunidades de mercado e, conseqüentemente, criar possibilidades para
indivíduos agirem como brokers e diluidores do conhecimento (Garney, 1998 apud
Staber op. cit.).
Finalmente, a dinâmica da interdependência funcional entre firmas especializadas
permite que os atores possam aprender rapidamente em função do intercâmbio da
informação diretamente. Especialmente nos distritos industriais onde a inovação e a
tomada de decisão e risco são críticas, a concentração pode ser vantajosa para
todos as firmas porque é difícil predizer qual firma desenvolverá a inovação líder.
• Envolvimento social: Neste fundamento as empresas estão envolvidas pela forte
cultura local que dá sentido e legitimidade ao conhecimento coletivo e
compartilhamento dos recursos (Dei Ottati, 1994; Harrison, 1992 apud Staber op.
cit.). A proximidade social encoraja a interação cara a cara e a circulação de novas
informações. A integração das firmas na estrutura social local ajuda a atenuar
tendências oportunistas e servem como base para a credibilidade, elemento
necessário para que as firmas possam se engajar em inovações de risco. Quando
esse tipo de envolvimento social é forte, o oportunismo, a incerteza, a dependência
de recursos e as assimetrias de poder são sentidos menos dramaticamente do que
em mercados abertos com firmas em condição de grandes desigualdades para
cooperar, mesmo que isso signifique a perda de algumas se suas autonomias (Uzzi,
1996 apud. Staber op. cit). Entretanto Lorenz (1996), compartilhando Dore (1986); Friedman (1988); Piore (1990);
Piore e Sabel (1984); Raveyre e Saglio (1984); Sabel (1989) e Sengenberger e
Capitulo III – Distritos Industriais como paradigma de Organização Industrial – Uma avaliação critica 64
Loueman (1987), considera o equilíbrio particular entre cooperação e competição como
o fator chave do dinamismo tecnológico nos distritos industriais. Esse conhecimento
iniciado na Terceira Itália hoje se estendeu para a Europa, Estados Unidos e Japão.
Alguns importantes aspectos da cooperação entre produtores nos distritos industriais
são identificados pelo autor como: boas previsões coletivas; treinamento e educação;
pesquisa e desenvolvimento; cuidados médicos e seguro contra desemprego. Segundo
o autor, a produção associada normalmente provém do patrocínio de algumas
instituições locais, tais como: associações de negócios, união de comércio, governo
municipal ou regional.
Segundo Amim e Thritt (1994 apud Staber op. cit.), a literatura indica que os “distritos
industriais” foram pensados como um sistema capaz de: a) estimular a inovação; b)
apoiar a adaptabilidade de negócios e c) facilitar o desenvolvimento regional endógeno
num mercado global crescente.
Para Courault e Romani apud Storper (1996), o “distrito industrial” permite a promoção
da necessária flexibilidade ao processo industrial, devido à coordenação da estrutura
produtiva, além de suas raízes. A reconsideração sobre a possibilidade deste modelo
ser estendido para outros países vem sendo pesquisada desde Courault, Rèrat e Weisz
na França; Romani and Gettio, Brusco, Garofoli, Solinas and Vila na Itália, em trabalhos
de pesquisa envolvendo comparações entre as zonas industrias da França e Itália.
Brusco (1982), entretanto, formaliza a lógica do modelo de descentralização produtiva
identificando o sistema de produção como um todo, integrado por uma miríade de
unidades especializadas e ligadas para o mercado de uma maneira que maximiza
responsabilidades dos sistemas produtivos de acordo com as tendências de mercado.
Assim, a estrutura econômica do distrito repousa sobre uma base social distinta, parte
da qual, está no seu sistema de relações de gerenciamento da mão-de-obra. Nesse
caso as relações de proximidade e de família são importantes no apoio as redes de
intercâmbio as quais constituem a base social da produção. Têm-se então que a força
Capitulo III – Distritos Industriais como paradigma de Organização Industrial – Uma avaliação critica 65
do trabalho desempenha um papel principal. A figura de linha de frente é talvez o
trabalhador independente, o autônomo, considerado pelo autor diferente do artesão
tradicional, pois representa, efetivamente, um empreendedor.
3.4 Críticas aos “Distritos Industriais” Embora possa-se verificar na vasta literatura sobre o tema “Distrito Industrial” um
número expressivo de autores indicando esse sistema como o novo paradigma do
desenvolvimento econômico local, algumas críticas são apresentadas, especialmente,
no que diz respeito, a sua replicabilidade em regiões marginais (à margem do processo
dominante de industrialização). Na pesquisa de Staber (op. cit.), visando uma melhor
sistematização dos conceitos concernentes ao assunto, algumas dessas críticas
surgem claramente.
Por exemplo, Amim (1993) e Harrison (1994) apud Staber (op. cit.), consideram o
modelo de “Distritos Industriais” muito otimista sobre as perspectivas de
desenvolvimento do sistema de produção concentrado localmente em economias
globais.
Murray (1987) e Staber e Sharma (1994 e 1999), apresentam uma visão um tanto
quanto cética sobre a capacidade desses distritos de criar alta capacitação, alto salário
e alto valor de emprego agregado. Os autores têm dúvida sobre a capacidade do
modelo em combinar eficiência econômica com equidade social.
Outrossim, Amim e Robins (1990) questionam sobre a oportunidade de aplicações
desse modelo em países de economia estagnada ou em declínio. Os autores
interrogam se não existem limitações na aplicação.
Conforme Staber (op. cit.), tais discussões sobre o potencial inovativo dos “Distritos
Industriais” são em parte teóricas e estabelecidas em debates sobre o relacionamento
entre globalização e tendências de localização. O próprio autor conclui que o tema
suscita muito mais discurso do que resultado.
Capitulo III – Distritos Industriais como paradigma de Organização Industrial – Uma avaliação critica 66
Numa abordagem céptica sobre o modo de reprodução da Terceira Itália, Hadjimichalis
e Vaiou (1992), concluem que a exatidão de qualquer explicação sobre o
desenvolvimento regional depende de uma análise pormenorizada da articulação entre
os processos concretos de produção e de reprodução nas regiões intermediárias (entre
as regiões centrais e marginais). Segundo o autor, o novo padrão de desenvolvimento
não é completamente novo, pois a pequena produção mercantil e as atividades
informais sempre fizeram parte do modus operandi do capitalismo. Se no passado,
foram sempre associadas ao atraso e à estagnação, o seu restabelecimento traz um
certo dinamismo. O novo padrão de desenvolvimento proporciona no curto prazo certas
oportunidades de acumulação e/ou consumismo, embora muito instáveis e vulneráveis
a condicionantes externos, por isso, a aptidão dessa solução de satisfazer as
necessidades do desenvolvimento regional, bem como o sucesso futuro destas regiões
intermediárias, permanece uma questão em aberto.
Na análise de Cavaco (1995 apud Gerry 1999), nos distritos mais rurais de Portugal, à
exceção de certos casos pontuais, não existe uma rede industrial. O que se observa
são estabelecimentos pequenos com limitada oferta de emprego, baixo volume de
vendas, gestão do tipo familiar, uso de tecnologias pouco evoluídas, dispersos pelo
território, produzindo bens para o mercado local restrito e de fraco poder aquisitivo.
Segundo o autor estas atividades são comuns nos ramos de alimentação e bebidas, e
laboração de produtos minerais metálicos, utilizados pela construção civil.
Gerry (op. cit.) conclui que nestas circunstancias, o futuro da periferia rural parece estar
condenado à perda de sua viabilidade social, em função do envelhecimento e da
desertificação demográfica, da desumanização da paisagem e da gradual substituição
da diversidade cultural pela cultura e valores metropolitanos de denominador mais
baixo.
Bianchi (1992 apud Belussi 1999), lança um forte questionamento sobre a capacidade
do modelo de distrito frente a complexa pressão competitiva emergente da globalização
dos mercados, o que é imediatamente contrariado por Brusco (1993), que afirma haver
Capitulo III – Distritos Industriais como paradigma de Organização Industrial – Uma avaliação critica 67
sustentação da hipótese de estabilidade do modelo entre os economistas italianos,
apesar das críticas.
3.5 A replicabilidade da experiência da Terceira Itália Antes de pensar na importação integral do modelo experimentado pela Terceira Itália é
importante analisar em que condições se consolidou este novo processo de
desenvolvimento local. Conforme Becatini (1979), na origem da industrialização
dispersa da Terceira Itália, há uma conjugação particular entre cidade e campo.
Segundo o recenseamento de 1901, o centro-norte-leste era considerado como uma
grande área homogênea e diferente do resto do País em razão da forte dispersão da
população no campo, no seio de propriedades familiares. No interior dessa grande
área, o desenvolvimento industrial efetua-se após a Segunda guerra mundial.
Essa industrialização dispersa realiza-se em um espaço que é o da Itália das comunas
ricas de uma prática antiga de organização social fundada na solidariedade familiar e
no espírito de empresa. O território é constelado, de forma muita densa, por cidades
médias e pequenas, com funções muito diversas e a curta distância do campo. O autor
considera essa situação um “campo urbanizado”.
Courlet (1993) observa que na terceira Itália a intervenção da família na produção é
muito freqüente. A criação de empresas e os negócios são feitos entre membros da
mesma família, entre membros de famílias aliadas ou entre conhecidos de longa data.
As relações de parentesco são extremadamente densas e estruturantes do ponto de
vista das economias. Assim, conclui-se que essas bases sociais e culturais tradicionais
dão o tom ao processo para os componentes principais dessa experiência que são a
solidariedade e a cooperação na formação das redes empresarias.
A observação de Cooke e Morgam (2000) sobre a região de Emilia-Romagna, a qual os
autores consideram como uma das mais ricas do mundo, é de que não pode ser
creditada ao Estado a condução de tal sucesso. Os autores classificam o Estado
Italiano de fraco, movido por incompetência, corrupção e escândalos.
Capitulo III – Distritos Industriais como paradigma de Organização Industrial – Uma avaliação critica 68
Putnam (1992) e Leonardi (1993) apud Cooke e Morgam (2000), indicam que a
Calábria apesar de ter tido uma condição de intervenção do Estado é uma das regiões
mais pobres da Europa. Ao contrário a região de Emilia-Romagna, que segundo o
censo de 1901 apresentava uma baixa industrialização com 65% de mão-de-obra
atuando na agricultura e 25% atuando na indústria, tem registrado níveis de riqueza tão
alto quanto às localidades mais ricas da Europa, sem que houvesse intervenção do
Estado italiano.
Entretanto, considerando as reais dificuldades de transferência dos quesitos específicos
oriundos da história e cultura italiana, Cocco (1999), discute a viabilidade de
implementação de políticas públicas de desenvolvimento local, em regiões
consideradas periféricas, a partir das experiências da Terceira Itália. Segundo o autor,
existem no modelo características “universais” que efetivamente podem contribuir para
a inclusão econômica dessas regiões, especialmente no caso do Brasil que apresenta
um alto déficit social.
Segundo o autor, são três os elementos gerais associados aos “distritos industriais”,
possíveis de consideração:
(i) a afirmação do território enquanto integrador do processo produtivo e inovativo;
(ii) a afirmação de uma cidadania que se torna imediatamente produtiva;
(iii) a emergência de novas figuras cuja atuação econômica é eminentemente
política.
Na visão do autor, desta forma, adquire-se uma configuração sócio-produtiva na qual
interagem de modo particular as esferas pública e privada, implicando possibilidades
originais de intervenção dos poderes públicos locais na mobilização produtiva do tecido-
territorial e na criação de uma ambiência propícia ao desenvolvimento.
Uma discussão mais ampliada sobre esses elementos, auxilia um melhor entendimento
relacionado à questão da replicabilidade:
Capitulo III – Distritos Industriais como paradigma de Organização Industrial – Uma avaliação critica 69
• Afirmação do território como integrador do processo produtivo e inovativo
Neste contexto subsiste, equilibradamente, a grande empresa, verticalmente integrada,
e uma miríade de pequenas empresas organizadas em redes de cooperação. A
diferença observada é que o local da produção passa a ser o território e não a empresa
em sua individualidade, segundo os padrões do sistema fordista dominante. Segundo
Corò (1999), as fortes relações entre a produção e o território nos distritos industriais
italianos é que define o território como integrador do processo produtivo.
• A afirmação de uma cidadania que se torna imediatamente produtiva
O modelo fordista relaciona-se com o processo de inclusão através da individualidade
do agente. No caso da empresa a inserção diz respeito a sua capacidade competitiva
de manter-se no mercado global, cuja característica é a exigência de uma forte
capacidade financeira, tecnológica, gerencial, etc., excluindo, naturalmente, as
pequenas organizações formais e informais, deficientes desses mesmos recursos. No
caso dos trabalhadores, a cidadania está relacionada ao processo formal do vínculo
empregatício que possibilita aos mesmos trabalhadores os benefícios legais do tipo
FGTS, PIS, Previdência, seguro desemprego, etc.
No modelo de distrito industrial, formalizado no significado público assumido pelas
relações sociais de produção, outras formas de relações de trabalho passam a vigorar,
tais como: o trabalho parcial, a autonomia e mesmo o trabalho informal, porém numa
condição de cidadania pelo processo de inclusão do trabalhador ao sistema produtivo.
Um fator fundamental observado é a eliminação do processo de dependência
excludente verificada no modelo fordista.
Conseqüentemente, com a consolidação do território cumprindo a função de integrador
do processo produtivo, os recursos necessários para a alimentação do sistema
começam a surgir em seu interior como fruto do esforço planejado de organização e
cooperação dos agentes. O resultado esperado é, portanto, a divisão do trabalho entre
as pequenas empresas ao longo das cadeias produtivas, permitindo a criação das
Capitulo III – Distritos Industriais como paradigma de Organização Industrial – Uma avaliação critica 70
condições necessárias à produção e à reprodução de um novo tecido empresarial
dinâmico.
• A emergência de novas figuras cuja atuação econômica é eminentemente “política”
O fato da produção se deslocar do interior das fábricas para o território faz emergir a
figura de um novo tipo de empresário. Nos distritos industriais italianos a figura do
empresário “político” é fundamental. A literatura disponível sobre os distritos industriais
da Terceira Itália destaca a relevância dos brokers no sucesso dos distritos. Brokers,
são os empresários considerados de “primeira linha” que assumem a tarefa de
representar externamente a capacidade produtiva do distrito, identificando as
oportunidades disponíveis e recolhendo as demandas para o posterior atendimento.
3.5.1 Um esforço de reflexão sobre o ambiente das regiões marginais no Brasil
Num esforço de avaliação sobre as possibilidades reais de planejamento desses
elementos para o caso de pequenas regiões urbanas e rurais interioranas do Brasil,
surgem, imediatamente, algumas preocupações indicativas de problemas que podem
inviabilizar qualquer iniciativa relacionada com sistemas produtivos dessa natureza.
O exemplo da configuração do primeiro elemento geral associado ao “Distrito
Industrial”, produção e território, para o caso dessas regiões, efetivamente marginais,
torna-se um fator de preocupação em função da inexistência do que Gurisatti (1999),
chamou de DNA territorial. Segundo o autor, um território que queira hospedar a
experiência de um distrito industrial, deve dispor de alguns elementos básicos tais
como: pequenas propriedades; instituições comunitárias fortes e reconhecidas;
presença de um jogo social orientado para a divisão do trabalho, para a cooperação e
para a participação; abertura internacional; difusão de um capital cognitivo coerente
com a evolução dos mercados, etc.
Capitulo III – Distritos Industriais como paradigma de Organização Industrial – Uma avaliação critica 71
Não é difícil confirmar que tradicionalmente essas regiões não se enquadram segundo
as exigências acima, a não ser por se constituir em pequenas propriedades. Uma
verificação mais cuidadosa das condições estruturais nessas regiões nos remetem a
um elenco de formulações já bastante conhecidas, tais como: (i) pequenas
propriedades; (ii) baixa capacitação dos atores; (iii) elevada restrição financeira; (iv)
elevado atraso tecnológico; (v) dificuldade de articulação administrativa e gerencial; (vi)
incapacidade de integração com os mercados de fatores e de produtos; (vii) alto grau
de dependência econômica.
Desta forma, observa-se nessas regiões grandes dificuldades relacionadas tanto aos
fatores materiais essenciais para o processo produtivo, quanto aos fatores imateriais
que são fundamentais para o mesmo processo. O forte sentimento individualista e o
descrédito desses atores em relação as políticas públicas como elemento de
transformação são pontos marcantes que impõe a continuidade deste estado de atrofia
econômica e social. Nesses ambientes, parece que a cidadania ainda não está
totalmente estabelecida.
Conseqüentemente, no segundo elemento geral do “distrito industrial”, produção e cidadania, que nos distritos italianos precede a produção, no caso das regiões
analisadas, fica materializada a idéia de que os diversos programas governamentais
ativos que disponibilizam grandes quantias de recursos financeiros visando dinamizar a
atividade econômica, acaba não atingindo os resultados esperados em função da
inexistência das condições prévias, no caso a consolidação da cidadania.
A ausência de um tecido sociocultural nos padrões adequados à dinâmica produtiva,
característica do desenvolvimento local identificado na Terceira Itália, materializa-se no
processo de desigualdade social, fruto da exclusão de pequenas empresas e
trabalhadores com um menor nível de capacitação.
Nessas regiões marginais, a informalidade alcança um elevado número de empresas,
que por sua vez, joga um número elevado de trabalhadores a uma condição de baixa
sobrevivência, exatamente, pela negação dos benefícios sociais do modelo fordista
Capitulo III – Distritos Industriais como paradigma de Organização Industrial – Uma avaliação critica 72
dominante. Conseqüentemente, a baixa remuneração inibe um melhor poder de
compras desses trabalhadores, refletindo na saúde econômica das próprias
organizações que estão incorporadas a este círculo.
O enfraquecimento econômico dessas pequenas firmas e, conseqüentemente, dos
trabalhadores localmente, materializa uma condição ideal para a permanência do
processo de dependência financeira desses atores frente aos poderes institucionais.
Uma verificação real é de que essas instituições públicas tem se transformado num
potencial empregador para os trabalhadores de baixa qualificação e dispostos a aceitar
baixos salários, assim como, um especial comprador para o caso de empresas que
aceitam um certo vínculo, que em geral, apresenta uma certa dose de corrupção.
Mantida esta condição, os postulados que se constitui no novo paradigma do
desenvolvimento local (cooperação, competição, inovação, aglomeração, etc.) ficam
totalmente ausentes do ambiente local onde se entrelaça esse relacionamento
empresarial.
Um outro aspecto observado diz respeito à apropriação inadequada dos recursos por
parte dos governos locais nessas regiões, exatamente, por não conseguirem
hierarquizar os reais interesses voltados para o desenvolvimento local. Normalmente,
identifica-se, regionalmente, um forte aparato institucional com a presença física de
algumas autarquias operando de forma isolada, não produzindo os resultados
esperados pela sociedade. O mesmo acontece com a diversidade de programas
ofertados que na verdade permanecem distante das pequenas empresas, provocando
resultados incompatíveis com o esforço inicial. Esses programas acabam por se perder
na esteira do tempo, sem propiciar qualquer transformação efetiva.
Nessas regiões a competição evolui sob as vias do atraso onde a redução de salários e
preços substitui o elemento inovação do ambiente moderno dos “Distritos Industriais”.
Conseqüentemente, o relacionamento familiar de cooperação oriundo dos distritos
inexiste nessas regiões, cuja realidade se aproxima de um relacionamento conflitual,
inclusive em diversas organizações de cunho familiar.
Capitulo III – Distritos Industriais como paradigma de Organização Industrial – Uma avaliação critica 73
Conclusivamente, fica a idéia de que, contrariamente aos espaços dos “Distritos
Industriais” modernos, nas regionais marginais as instituições não conseguem propiciar
um ambiente no qual as habilidades e bens de capital possam ser constantemente
recombinadas, de forma a garantir uma rápida alteração de produtos e processos.
Entretanto, apesar da constatação pessimista, no que diz respeito a organização
produtiva em regiões marginais nos padrões dos distritos industriais italianos, algumas
boas experiências sobre agrupamentos de empresas estão em evolução no Brasil.
Conseqüentemente, o Instituto de Pesquisa Aplicada (IPEA), vêm priorizando a
discussão sobre essa questão e, através do exame de alguns processos, criou a
seguinte tipologia para cacarterizar esses mesmos processos estudados:
Agrupamento Potencial: quando existe no local uma concentração de atividades
produtivas com alguma característica em comum, indicando a existência de tradição
técnica ou produtiva (inclusive artesanal), embora inexista (ou seja incipiente)
organização ou interação entre os agentes daquelas atividades.
Agrupamento Emergente: quando se observa no local a presença de empresas (de
qualquer porte) com característica em comum (por exemplo uma definição setorial
comum) que possibilite o desenvolvimento da interação entre seus agentes, a presença
de instituições como centros de capacitação profissional, de pesquisa tecnológica, etc.,
bem como de atividade incipiente de articulação ou organização dos agentes locais.
Agrupamento maduro: quando há no local concentração de atividades com
característica comum, a existência de uma base tecnológica significativa, e se observa
a existência de relacionamento dos agentes produtivos entre si e com os agentes
institucionais locais caracterizando a geração de externalidades positivas, mais ainda
com a presença de conflitos de interesses e/ou desequilíbrios denotando baixo grau de
coordenação.
Agrupamento Avançado: é um agrupamento maduro com alto nível de coesão e de
organização entre os agentes.
Capitulo III – Distritos Industriais como paradigma de Organização Industrial – Uma avaliação critica 74
Aglomeração (cluster): apresenta características de agrupamento maduro quanto ao
grau de coesão, embora com menor organização, referindo-se porém a uma sub-região
e envolvendo um número maior de localidades ou áreas urbanas, de modo contíguo e
constituindo um espaço econômico pouco diferenciado em termos das atividades
produtivas e fatores de produção presentes.
Pólo Tecnológico: refere-se àqueles locais em que estão reunidos as empresas
intensivas em conhecimento, ou de base tecnológica, bem como universidades e/ou
instituições de pesquisa. Apresenta características de agrupamento maduro, embora as
atividades possam apresentar pouca semelhança, por exemplo em termos setoriais.
Redes de subcontratação: são situações (não necessariamente um local) em que
grande(s) empresa(s) nucleadoras formam em torno de si redes de fornecedores, e
que, embora sem se constituírem em um agrupamento, contam com elevado grau de
organização, hierarquizada pela empresa – núcleo.
Partindo dessa tipologia, estudos do IPEA definem algumas dessas experiências de
industrialização localizada, conforme o quadro a seguir:
Local Caracterização Agentes participantes
Americana
(SP)
Agrupamento maduro
de empresas do setor
têxtil
Empresas de pequeno e médio porte;
sindicatos; faculdades, escola técnica,
SENAI.
Blumenau
(SC)
Redes de
subcontratação no setor
têxtil e vestuário
Empresas; associação comercial;
SENAI; Sebrae; Universidade.
Campinas (SP) Agrupamento
emergente de
empresas de
telecomunicações e de
Empresas; Universidades; Centro de
tecnologia; secretaria de cooperação
internacional do município.
Capitulo III – Distritos Industriais como paradigma de Organização Industrial – Uma avaliação critica 75
informática
Campinas (SP) Pólo tecnológico Empresas; Universidades; Instituto
agronômico; Instituto de tecnologia de
alimentos; centro de tecnologia de
informática; centro de pesquisa e
desenvolvimento.
Colatina (ES) Agrupamento
emergente de
empresas de vestuário
Empresas de pequeno e médio porte;
sindicato; centro de tecnologia; Banco
do Estado do Espírito Santo
(BANDES).
Criciúma (SC) Agrupamento avançado
de empresas de
cerâmica
Empresas de médio e grande porte;
centro de tecnologia; Universidades
SENAI; Federação das Indústrias do
Estado; sindicato; Fundação de Ciência
e Tecnologia.
Espírito Santo
(ES)
Agrupamento maduro
de empresas do setor
de siderurgia e
mineração
Empresas, Centro Capixaba de
Desenvolvimento Metalmecânico,
Centro de pesquisa, Universidade
Federal; Empresas de serviços.
Florianópolis
(SC)
Pólo Tecnológico Empresas de pequeno e médio portes
de software e hardware; Universidade
Federal; Fundação Centros de
Referencia em Tecnologias
Inovadoras; Centro Empresarial,
Condomínio Industrial SENAI;
Federação das Industrias.
Franca (SP) Agrupamento maduro
de empresas coureiro-
calçadistas
Empresas; Escritórios de exportação;
Centro de Tecnologia; SENAI.
Rio de Janeiro
(RJ)
Agrupamento
emergente de
Empresas; núcleo de desenvolvimento
de software, Conselho Nacional de
Capitulo III – Distritos Industriais como paradigma de Organização Industrial – Uma avaliação critica 76
empresas produtoras
de software
Desenvolvimento Científico (CNPq),
Prefeitura; SEBRAE Centro de
processamento de dados; Banco
Nacional de Desenvolvimento
Econômico e Social (BNDES); etc.
CAPÍTULO IV
O PERFIL DA REGIÃO MARGINAL: A EXPERIÊNCIA DO NORTE FLUMINENSE – RJ
4.1 Considerações gerais
Como resultado das avaliações verificadas nos capítulos antecedentes, consolida-se
uma clara visão de que os modelos de crescimento econômico neoclássicos, tanto
exógeno quanto endógeno, dominante no pós-guerra, não conseguiram fazer valer as
suas principais preposições. Por sua vez, o processo de organização industrial fordista
que se consubstanciou como base desses modelos, conseqüentemente, cedeu espaço
a um novo modelo de organização mais flexível que, modernamente, vêm se
constituindo no paradigma das recentes transformações, especialmente, na Terceira
Itália e em parte da Europa, sob a denominação de “Distrito Industrial”.
Conseqüentemente, essa nova configuração produtiva dificilmente alcançaria sucesso
em sua replicabilidade integral em regiões com características equivalentes a região
norte fluminense, tendo em vista as diferenças estabelecidas. Como já verificado
anteriormente, existem dificuldades concretas na importação dos sistemas flexíveis de
produção em função de questões específicas como a história e a cultura oriunda de
cada povo. Porém, lamentavelmente, até mesmo os parâmetros mais gerais desses
sistemas encontrariam dificuldades em sua utilização como políticas publicas, já que
esses ambientes normalmente apresentam graves deficiências.
Assim, a consideração da real possibilidade de replicabilidade dos elementos gerais
associados ao modelo de Distrito Industrial: (i) produção e território; (ii) produção e
cidadania e, (iii) empresário político, identificados por Cocco (op. cit.), com vista à
Capitulo IV – O perfil da região marginal – A experiência do Norte Fluminense - RJ 78
implementação de políticas públicas em direção ao desenvolvimento local, depende de
um ambiente que facilite a elaboração e implementação de estratégias integradoras
desses mesmos elementos.
No caso específico da Região Norte Fluminense, um grande problema aparente parece
ser a falta de vontade política quando a questão em foco é a coletividade e,
contrariamente, observa-se muitas manifestações quando estão em jogo interesses
individualizados. Desta forma, faz-se necessário um esforço mais efetivo de
consolidação do tecido sócio-cultural na região.
Neste contexto, surge um primeiro obstáculo à evolução de qualquer programa de
ordem cooperativa, ficando uma clara visão da necessidade de implementação de
ações no sentido do restabelecimento de um ambiente que possibilite um maior grau de
mobilização dos atores sociais localmente. A justificativa principal segue um importante
balizador do mundo globalizado que é a necessidade do cumprimento eficiente, por
qualquer ator, de todas as fases da cadeia de valor, sob pena de ser “engolido” pela
competição.
Porter (2000), auxilia esse entendimento quando enfatiza que a riqueza é criada pela
microeconomia e que a mesma é produzida por empresas capazes de oferecer
produtos e serviços valiosos e de ampla aceitação nos mercados mundiais. Segundo o
autor, as companhias de sucesso fazem proliferar as vantagens ao longo da cadeia de
valor e num ambiente competitivo, como mostra a figura a seguir:
Capitulo IV – O perfil da região marginal – A experiência do Norte Fluminense - RJ 79
Figura 2 – cadeia de valor – Porter (2000) Figura 2 – além das competências essenciais – Porter 2000
Além das competências essenciais
Atividades de apoio
Infra-estrutura da empresa
(exemplo: financiamento, planejamento, relações com os investidores).
Gestão de recursos humanos (exemplo: recrutamento, treinamento, sistema de remuneração).
Desenvolvimento tecnológico
(exemplo: projetos de produto, testes, projetos de processo, pesquisa de materiais e de mercado).
Compras (exemplo: componentes, máquinas, publicidade e serviços).
Atividades primárias Logística Operações Logística Marketing Serviços Interna (exemplo): externa e vendas pós-venda (exemplo): montagem, (exemplo): (exemplo): (exemplo): armazenamento fabricação de processamento força de instalação, do material componentes, dos pedidos, vendas, apoio ao cliente, que chega, operações de administração promoções, atendimento e compilação dos filiais) dos depósitos, publicidade, resolução de dados, acesso preparação de exposições, queixas, aos clientes) relatórios. apresentação consertos. de propostas. Valor: O que os compradores estão dispostos a pagar
Figura (07) Além das competências essenciais Fonte: Porter (2000)
Capitulo IV – O perfil da região marginal – A experiência do Norte Fluminense - RJ 80
Individualmente as pequenas unidades econômicas que compreendem o ambiente da
região norte fluminense, estão longe da possibilidade de conseguir a eficiência exigida
ao longo da cadeia de valor, com vista à obtenção de competitividade. Outrossim, o
quadro atual parece indicar que dada a forte cultura individualista, as iniciativas
associativistas tendem a avançar muito pouco, o que dificulta a possibilidade de
fortalecimento regional mesmo na hipótese de implementação de políticas públicas
contempladas a partir dos elementos universais dos “Distritos Industriais”.
Objetivando um melhor conhecimento sobre a região, apresenta-se a seguir, um
panorama histórico de forma a permitir uma caracterização mais efetiva, bem como, são
apresentados alguns indicadores econômicos para uma análise posterior.
4.2 Caracterização regional: O Estado do Rio e a região norte fluminense Para uma análise mais aprofundada sobre o Estado do Rio de Janeiro e,
conseqüentemente, sobre a região norte fluminense, torna-se importante uma
visualização panorâmica da Região Sudeste do Brasil. No que diz respeito à análise do
quadro natural pode-se considerar que esta grande região apresenta um efetivo
conjunto de potencialidades para o desenvolvimento tendo em vista a concentração dos
recursos existentes. Entretanto, quanto ao processo histórico-econômico, outros
desdobramentos importantes devem ser considerados.
Segundo Cunha (1975), a relevância do sudeste e a sua importância para o País
definem-se a partir do século XVIII, quando foram descobertas as reservas auríferas de
Minas Gerais. Isso atraiu o povoamento e os interesses maiores da metrópole e a
transferência da capital da colônia para o Rio de Janeiro em 1763, atestando a
importância da região. A atividade de mineração foi a primeira na história econômica
que alargou as possibilidades de formação de mão-de-obra livre, o que contribuiu para
criar um pequeno mercado interno e, mesmo, “setores médios” na população. Estas
transformações, embora lentas e reduzidas, tiveram um papel importante nos
movimentos pré-independência. A pecuária, que sempre seguiu de perto a mineração,
ajudou a ocupação de novas áreas do espaço econômico regional.
Capitulo IV – O perfil da região marginal – A experiência do Norte Fluminense - RJ 81
A mineração possibilitou a fundação de inúmeros centros urbanos em Minas, São Paulo
e o Rio de Janeiro, que se tornou o principal porto e a mais ativa cidade do País.
Entretanto, encerrada a mineração, tecnicamente precária, com o esgotamento das
lavras nos primeiros anos do século XIX, a população teria que voltar-se para as
atividade agropecuárias. Os núcleos mineradores que haviam constituído um pólo de
atração formidável passaram a ser centros irradiadores. Algumas regiões foram
beneficiadas por esse refluxo, como o sul de minas que se torna importante centro
pastoril e de lavoura de fumo, e a baixada campista que teve a partir daí firmada a sua
posição canavieira.
O século XIX iria assistir a chegada de um novo “produto-rei” na economia de “ciclos”
brasileira, dependente da exportação e das flutuações de preços do mercado
internacional: o café. E mais uma vez seria o sudeste a área dinâmica, consolidando
sua vantagem sobre as demais regiões.
Na primeira metade do século XIX o café deixaria de ser um cultivo de “fundo de
quintal”, de abastecimento doméstico, e passaria a ser uma cultura comercial,
especulativa e de exportação. Surgindo no Rio de Janeiro, ele logo ocuparia vastas
áreas de baixada em torno da Baia de Guanabara e nas encostas mais próximas.
Usando a mão-de-obra abundante do escravo, a cultura incorporou novas áreas,
passando da baixada fluminense para o vale do Paraíba. A partir de 1850, à medida
que se tornava difícil à importação de escravos, o grande proprietário cafeeiro absorvia
os negros das decadentes lavouras nordestinas. O café avançava, subindo o vale do
Paraíba na direção de São Paulo, enquanto pelos afluentes da margem esquerda deste
rio penetrava em Minas Gerais, atingindo logo a zona da mata. Do vale do Paraíba,
onde os centros urbanos animavam-se com a nova cultura, desciam caminhos estreitos
e tortuosos pela Serra do Mar, buscando atingir pequenos portos, que conheceram
grande prestigio econômico: Angra dos Reis, Parati, Ubatuba, São Sebastião. Esses
portos entrariam mais tarde em decadência, quando a estrada de ferro passou a
canalizar as exportações exclusivamente para o Rio de Janeiro e Santos.
Os altos preços e o constante aumento da demanda mundial mantinham a produção,
dando origem, no segundo Império, a uma aristocracia rural que substituiu
Capitulo IV – O perfil da região marginal – A experiência do Norte Fluminense - RJ 82
progressivamente a aristocracia açucareira nos negócios do Estado. O Rio de Janeiro,
em 1870, detinha 60% da exportação nacional.
Monocultura, rapidamente esgotante dos solos, o café tornou-se uma agricultura
itinerante, ávida de novas terras, em permanente deslocamento. Assim marchou para o
sul do Espírito Santo, em sua expansão para o norte e, fundamentalmente, causando
uma grande transformação nos planaltos paulistas para posteriormente seguir rumo ao
sul.
Conforme Cunha (op. cit.), a contribuição do café foi extraordinária nas transformações
da economia brasileira, na criação de novas paisagens, na organização do espaço, e
mesmo no estabelecimento de rede urbana. Nenhum outro produto teve um tal caráter
de agente modificador.
Com o declínio da cultura do café, o Estado do Rio de Janeiro redireciona os seus
esforços produtivos para a monocultura da cana, cuja representatividade se mantém
até nos dias atuais.
4.3 O espaço fundiário do Estado do Rio de Janeiro
Uma avaliação mais detalhada sobre o espaço fundiário do Estado do Rio de Janeiro,
através dos quatro últimos censos agropecuários, possibilita algumas conclusões
importantes, especialmente, no que diz respeito às atividades agrícolas. O censo de
1970 identificou 77.428 estabelecimentos agropecuários (11), número que basicamente
se manteve nos dois censos seguintes, ou seja, 76.235 estabelecimentos em 1975 e
77.671 estabelecimentos em 1980. No censo de 1985, entretanto, o número de
estabelecimentos agroindustriais sobe para 91.280, representando um crescimento de
17,52% em um período de cinco anos.
A busca de explicação para esse novo quadro leva a pelo menos dois elementos,
conforme descrição a seguir: (i) um processo vigoroso de desmembramento de terras
Capitulo IV – O perfil da região marginal – A experiência do Norte Fluminense - RJ 83
por motivo de repartição de herança, o que naturalmente cria novos estabelecimentos;
e, (ii) o crescimento ininterrupto do efetivo bovino desde a década de 20.
O último censo agropecuário realizado em 1996, porém, apresenta um quadro
dramático para o setor, especialmente, para o segmento agrícola. O número de
estabelecimentos apresentado nesse censo é da ordem se 53.680, ou seja, 41,19%
menor do que o registrado há dez anos atrás. Esta situação leva, naturalmente, a
verificação de que o esforço governamental implementado na busca de soluções para
os desequilíbrios macroeconômicos na década de oitenta não surtiu efeito, assim como,
o aprofundamento da recessão na segunda metade dos anos oitenta e inicio dos anos
noventa, influenciou de sobremaneira o processo de migração da área rural para a área
urbana, cujo reflexo pode-se verificar presentemente no “inchaço” populacional das
cidades.
Um outro indicador importante capaz de corroborar com esta análise, diz respeito à
área total em hectare utilizada por estes estabelecimentos. No censo de 1970, a área
utilizada pelos estabelecimentos agropecuários representava 3.316.063 (há), caindo
substancialmente para 2.416.305 (há) no censo de 1996, representando uma redução
de 27,13%, cujo maior impacto foi absorvido pelas atividades agrícolas, como se pode
verificar através das variações nas áreas de lavouras permanente 12, temporário 13 e,
sobretudo, pela desocupação de pessoal. 11-Estabelecimentos agropecuários, segundo IBGE, representa todo terreno de área contínua, independente do tamanho e número de parcelas subordinado a um único produtor, no qual se processam atividades como: cultivo do solo, criação de animais, extração vegetal, silvicultura ou reflorestamento. Não se incluem as hortas domésticas. 12- Lavoura permanente, segundo o IBGE, é o plantio de culturas de longa duração que produzem por vários anos, isto é, sem que haja necessidade de novo plantio após a colheita. 13- Lavoura temporária, segundo o IBGE, é o plantio de culturas de curta duração que necessitam, geralmente de novo plantio após a colheita.
Capitulo IV – O perfil da região marginal – A experiência do Norte Fluminense - RJ 84
O censo de 1970 apresentou uma área de lavoura permanente no Estado do Rio
equivalente a 182.258 (há), cuja evolução é representada por um declínio de (8,87%)
no censo de 1975 e (12,62%) no censo de 1980. Assim como a evolução do número de
estabelecimentos agropecuários, o censo de 1985 contabiliza um leve crescimento de
6,10% para 10 anos depois, no censo de 1996, registrar uma queda acentuada de
48,85%, refletindo a análise realizada por ocasião da evolução nos números de
estabelecimentos.
No que diz respeito à área de lavoura temporária, o quadro não é diferente já que as
áreas ocupadas segundo os censos de 1970, 1975, 1980 e 1985, pouco se alteram, a
não ser no censo de 1996 em que os 470.725 (há) utilizados segundo censo de 1985
reduzem-se para 258.483 (há), representando uma redução equivalente a 45,08%.
Chama a atenção, entretanto, a evolução oposta entre o Estado do Rio de Janeiro e o
Brasil no item lavoura temporária, conforme indicada no gráfico a seguir:
Capitulo IV – O perfil da região marginal – A experiência do Norte Fluminense - RJ 85
evolução da área de lavoura temporária (ha)
0,00
5.000,00
10.000,00
15.000,00
20.000,00
25.000,00
30.000,00
35.000,00
40.000,00
1970 1975 1980 1985 1996
censos agropecuários
1000
hec
tare
s
BrasilRJ
Gráfico 2 – evolução da área de lavoura temporária
Fonte: IBGE
Conforme pode-se verificar, a área de lavoura temporária ao longo dos censos de 1970
a 1996, apresenta um crescimento ininterrupto, ou seja, crescimento de 18,65% em
1975; 25,75% em 1980; 14,74% em 1985 e 54,94% em 1996; confirmando a excelente
trajetória competitiva da produção agrícola, especialmente no segmento de grãos do
centro oeste e sul do País.
Segundo pesquisa da conjuntura econômica (2002), houve uma grande transformação
na produção de grãos no Brasil. Para sobreviver aos baixos preços de mercado e
enfrentar o desafio da competitividade, os produtores se modernizaram, encontrando
tecnologias disponíveis, além de se adaptarem as novas práticas de mercado. Segundo
Capitulo IV – O perfil da região marginal – A experiência do Norte Fluminense - RJ 86
o IBGE em dez anos a área plantada de grãos permaneceu a mesma, ou seja, 36
milhões de hectares, enquanto a produção de grãos saltou de 66,8 para 95,8 milhões
de toneladas, crescimento equivalente a 43,4% no período, caracterizando um robusto
aumento de produtividade. Evidente que esse desempenho ficou concentrado, mais
especificamente, no Centro Oeste do País.
Entretanto, quando olhamos esta trajetória e comparamos com a trajetória do Estado do
Rio de Janeiro, fica evidente o declínio acentuado da atividade agrícola, especialmente,
a mais tecnificada, o que corrobora com a preocupação deste trabalho no que diz
respeito à necessidade de revisão das praticas correntes de geração de riqueza.
Finalmente, dois indicadores são fundamentais para explicar a forte migração de
trabalhadores do meio rural para o meio urbano e, conseqüentemente, o
aprofundamento da pobreza no campo. O primeiro, trata-se do quantitativo de pessoal
ocupado que apresenta um leve crescimento ao longo dos censos de 1975 com base
1970; 1980 com base 1975; e 1985 com base 1985, ou seja, +7,20; +8,30 e +6,70%,
sucessivamente. Seguindo a evolução dos indicadores analisados precedentemente, o
censo de 1996 contabiliza uma queda do número de pessoal ocupado equivalente a
45,86%, ou seja, de 321.924 segundo o censo de 1985 para 174.274 segundo o censo
de 1996.
O segundo indicador materializado na relação pessoal ocupado/número de
estabelecimentos ratifica esta visão quando mantém a média de trabalhadores por
estabelecimento. O censo de 1996 indicou uma queda de 41,19% no número de
estabelecimentos e uma queda de 45,86% no quantitativo do pessoal ocupado com
uma relação pessoal ocupado/estabelecimentos bastante próximo, 3,52 e 3,24
sucessivamente. Assim, mantido a relação acima mesmo com o descarte de quase a
metade do pessoal ocupado no campo, fica evidente que o processo migratório foi a
alternativa encontrada por esse exercito de trabalhadores do setor rural.
A tabela a seguir ilustra indicadores econômicos importantes levantados pelos censos
agropecuários do 1970 a 1996.
Capitulo IV – O perfil da região marginal – A experiência do Norte Fluminense - RJ 87
Censos agropecuários do Estado do Rio de Janeiro
1970
1975
1980
1985
1995/1996 Estabelecimentos 77.428 76.235 77.671 91.280 53.680
Área total (há) 3.316.063 4.446.175 3.181.387 3.264.150 2.416.305
Área de lavoura permanente
182.258 166.081 145.115 153.974 78.758
Área de lavoura temporária
458.206 451.164 456.298 470.725 258.483
Pessoal ocupado
259.841 278.564 301.688 321.924 174.274
Relação pessoal Ocup. Estabelec.
3,35 3,65 3,88 3,52 3,24
Efetivos bovinos
1.207.109 1.658.534 1.745.152 1.788.180 1.813.743
Tabela 1- censos agropecuários do Rio de Janeiro
Fonte: Fundação Instituto de Geografia e Estatística – IBGE.
No período posterior ao último censo, os problemas do setor não foram minorados. Ao
contrário, as atividades essencialmente agrícolas permanecem apresentando um
quadro nada animador. A perda de importância do setor evoluiu nos últimos anos, onde
a área colhida em hectare não perdeu a tendência declinante. Segundo o censo de
1996, a área utilizada em lavoura permanente e temporária era equivalente a 337.241
hectares, passando essa mesma área, no ano de 2000, para 254.051 hectares, ou seja,
uma forte redução de 24,66% em apenas quatro anos.
Uma análise sobre alguns indicadores mais atuais de produção, área e produtividade,
ratifica a perda de importância do setor agrícola no Estado do Rio de Janeiro. O quadro
a seguir mostra uma tendência declinante da área colhida, conforme já analisado, além
Capitulo IV – O perfil da região marginal – A experiência do Norte Fluminense - RJ 88
da redução persistente da produção agrícola em tonelada. O Estado produziu em 2000
o equivalente a 76,37% da produção agrícola de 1992 numa área equivalente a 74,96%
da área em hectare utilizada em 1992. A análise desses indicadores mostra claramente
o desemprego de fatores de produção com impacto na migração e empobrecimento no
campo.
Um outro fator importante indicado neste quadro negativa o discurso relacionado à
diversificação agrícola. Na realidade parece existir de fato a consolidação da
monocultura da cana de açúcar, já que apesar da constatação de redução da área
colhida total e da produção total em tonelada, a cana segue aumentando a sua
participação relativa tanto na área plantada em hectare, quanto na parcela de produção
total em tonelada.
A tabela a seguir ilustra indicadores de produção e área colhida e produtividade obtida
no estado do Rio de Janeiro, no período compreendido de 1992 a 2000, segundo o
IBGE.
Capitulo IV – O perfil da região marginal – A experiência do Norte Fluminense - RJ 89
Produção e área colhida e produtividade obtida
anos Produção Colhida
(t)
Cana deAçúcar
(%)
Área colhida(ha)
Cana deAçúcar
(%)
ProdutividadeObtida (kg/ha)
Cana de Açúcar (kg/ha)
1992
10.247.852 69,01 338.922 51,50 30.236,60 40.517,0
1993
10.090.252 68,23 329.423 50,65 30.630,07 41.261,0
1994
7.903.126 87,19 322.744 51,58 24.487,29 41.390,9
1995
8.113.152
89,92 285.387 56,69 28.428,60 45.092,3
1996
6.754.701 84,53 237.962 57,44 28.385,6 41.771,3
1997
6.789.766 89,15 209.897 65,33 32.348,1 44.140,9
1998
7.658.191 79,80 254.107 52,25 30.137,6 46.023,8
1999
7.682.149 80,64 256.068 53,69 30.000,4 45.062,7
2000
7.826.790 80,87 254.051 56,22 30.807,9 44.315,0
Tabela 2 - Produção e área colhida e produtividade obtida Fonte: IBGE 4.4 A região norte fluminense – características locais
A região norte fluminense, como poderemos constatar mais adiante, apresenta
características próprias de regiões periféricas marginais, facilmente identificadas pelos
seguintes elementos: (i) desorganização produtiva, (ii) ambiente mesoeconômico
inadequado, (iii) baixa renda per capita, (iv) elevado grau de concentração de renda (v)
ausência de cultura técnica e, (vi) elevada cultura individualista, o que dificulta, de
sobremaneira, a organização de um sistema econômico capaz de alcançar um maior
dinamismo competitivo. A sua estrutura composta pelos municípios de Campos dos Goytacazes; Carapebus;
Cardoso Moreira; Conceição de Macabú; Macaé; Quissamã; São Fidélis; São Francisco
Capitulo IV – O perfil da região marginal – A experiência do Norte Fluminense - RJ 90
de Itabapoana e São João da Barra (CIDE, 2001), compreende uma parcela absoluta
importante da população rural o que justifica, plenamente, a necessária intervenção no
sentido da identificação de caminhos que possam amortecer os reflexos da estagnação
econômica e, conseqüentemente, possibilitar uma maior grau inclusão econômica e
social.
A figura a seguir ilustra a população residente, para o Estado e Municípios no ano 2000,
segundo o Centro de Informações e Dados do Rio de Janeiro (CIDE).
Quadro 06: População residente, segundo Estado e municípios em 2000. Total Urbana Rural Estado 14.367.083 13.798.096 568.987
Região N Fluminense 696.988 593.025 103.963
Campos dos Goytacazes 406.511 363.721 42.790
Carapebus 8.651 6.863 1.788
Cardoso Moreira 12.579 8.029 4.550
Conceição de Macabú 18.706 16.483 2.223
Macaé 131.550 125.118 6.432
Quissamã 13.668 7.699 5.969
São Fidélis 36.774 26.515 10.259
São João da Barra (1) 27.503 19.451 8.052
São Francisco Itabapoana 41.046 19.146 21.900
figura 8: População residente, segundo Estado e municípios em 2000. Fonte: CIDE – 2001
Conforme pode-se verificar, a população da Região, composta por 696.988 habitantes,
representa 4,9% da população residente em todo o Estado do Rio de Janeiro.
Entretanto, quando se relaciona a população essencialmente rural, a região aumenta a
Capitulo IV – O perfil da região marginal – A experiência do Norte Fluminense - RJ 91
sua participação para 18,3%, o que talvez possa expressar uma certa relevância da
região no contexto do abastecimento agropecuário para o resto do Estado.
Todavia quando se analisa a formação e a distribuição da riqueza no Estado, a região
evidencía as suas fraquezas. O Produto Interno Bruto a preços de mercado (PIBpm),
em valor absoluto, contabilizado pelo Estado em 1999, somou R$ 140,5 bilhões,
gerando uma renda per capital de R$10.196,49. A Região Norte Fluminense,
entretanto, participou neste total com um PIB da ordem de R$ 3,5 (bilhões), cuja
participação em relação ao Estado representou 2,49%. A renda per capita, por
conseguinte, chegou a R$ 5.175,45, um valor equivalente a 50,75% da renda per capita
do Estado.
O setor agropecuário no conjunto do Estado foi responsável pela geração de um PIB da
ordem de R$ 735,1 milhões, enquanto que o a Região contabilizou um PIB de R$ 169,5
milhões, representando 23,06% da riqueza gerada no setor, o que vêm confirmar a
importância da região no que diz respeito ao abastecimento agrícola para todo o
Estado.
A figura a seguir mostra indicadores importantes como valor monetário da produção,
área colhida em hectare o rendimento médio por hectare da micro região Campos,
compreendida pelos municípios de Campos dos Goytacazes, São João da Barra, São
Francisco do Itabapoana, São Fidélis e Cardoso Moreira, que evidenciam a fraqueza
econômica regional. Através da evolução desses indicadores, pode-se identificar a
existência de problemas como baixa produtividade e a ausência de investimentos que
acabam por denunciar a ineficiência de programas governamentais e recursos
disponibilizados por instituições públicas, cujos objetivos não são materializados.
Capitulo IV – O perfil da região marginal – A experiência do Norte Fluminense - RJ 92
Ano Valor da produção(R$)
% Área colhida (há)
% Rendimento médio (R$/ha)
%
1997
112.938.450,00
-
144.544
-
781,34
-
1998
111. 082.911,00
(1,64)
141.843
(1,86)
783,14
0,23
1999
109.178.753,00
(1,71)
142.480
0,45
766,27
(2,15)
2000
134.230.770,00
22,94
134.632
(5,50)
997,02
30,11
2001
102.295.649,00
(23,79)
134.257
(0,28)
761,94
(23,58)
Tabela 3 – valor da produção, área colhida e rendimento médio na micro região Campos - Fonte: IBGE Os gráficos a seguir evidenciam a evolução real desses indicadores.
evolução do valor da produção da micro região Campos em termos reais (1.000 R$)
0
20000000
40000000
60000000
80000000
100000000
120000000
140000000
1997 1998 1999 2000 2001
anovalor real em (R$)
Gráfico 3- Evolução do valor da produção da micro região Campos, em termos reais, para o período de 1997 a 2001. Fonte: IBGE
Capitulo IV – O perfil da região marginal – A experiência do Norte Fluminense - RJ 93
Valores deflacionados pelo Índice geral de preços – disponibilidade interna (IGP-DI) da Fundação Getúlio Vargas – RJ.
0
50
100
150
indice percentual de variação da produção em termos reais
1997 1998 1999 2000 2001
Gráfico 4 -Índice percentual de variação da produção em termos reais Fonte: IBGE
Valores deflacionados pelo Índice geral de preços – disponibilidade interna (IGP-DI) da Fundação Getúlio Vargas – RJ.
A evolução dos indicadores acima, no período de 1997 a 2001 para a micro região
Campos, parece confirmar as ponderações feitas anteriormente, no que diz respeito às
dificuldades de crescimento apresentadas pela região. Conforme pode-se verificar, o
valor da produção contabilizada em 2001 é menor 12% do que o mesmo valor
verificado em 1997. Efetivamente, esta situação caracteriza subdesenvolvimento já que
a demanda por esses mesmos recursos é crescente. Conseqüentemente, observa-se,
que tanto a área colhida quanto o rendimento médio (R$/ha), também declinam no
Capitulo IV – O perfil da região marginal – A experiência do Norte Fluminense - RJ 94
período. A área colhida em 2001 é menor 7% do que a área colhida em 1997 e o
rendimento médio (R$/ha) em 2001 são menor 2,5% do rendimento médio verificado
em 1997.
Os indicadores analisados possibilitam uma visão importante sobre a região. Entretanto,
como forma de aprofundar o conhecimento sobre a região decidiu-se por pesquisar
empiricamente a região, cujos desdobramentos são dispostos a seguir.
4.5 Uma verificação empírica sobre a competitividade regional Objetivando uma avaliação mais ampla da região, procedeu-se a uma verificação sobre
as condições ambientais para competitividade, através da aplicação de questionários e
entrevistas junto às entidades com algum tipo de relação com o setor econômico de
interesse, cuja metodologia e o resultado são apresentados a seguir:
4.5.1 metodologia da pesquisa
Considerando como hipótese que as condições verificadas na região Norte Fluminense
não se diferenciam positivamente da realidade verificada em regiões periféricas,
entendeu-se ser perfeitamente válida a iniciativa de investigação sobre as causas do
processo de subdesenvolvimento. Em consonância com o objetivo traçado, foi realizada
uma pesquisa junto ás principais entidades vinculadas á atividade agropecuária na
região, tais como: entidades de pesquisa, entidades de extensão, entidades
associativistas e entidades comerciais, que analisaram o estagio de competitividade do
setor dentro do seguinte escopo de avaliação. O setor foi analisado segundo a
concepção de sistema (Sistema Agro-industrial – SAI), representado por um conjunto
de atividades que concorrem para a produção de produtos agroindustriais, desde a
produção de insumos (sementes, adubos, máquinas agrícolas etc.), até a chegada do
produto final ao consumidor, Batalha (1997). A estrutura setorial, assim como, os
fundamentos orientadores da pesquisa estão dispostos a seguir:
Capitulo IV – O perfil da região marginal – A experiência do Norte Fluminense - RJ 95
Estrutura do setor agroindustrial na Região Norte Fluminense
SETOR AGROINDUSTRIAL
SEGMENTOS
PESCA
Sucro Alcooleiro
PECUÁRIA
FRUTICULTURA
OLERÍCULAS
VISÃO DE CADEIA DE PRODUÇÃO
Figura 9: Estrutura agroindustrial da região norte fluminense – RJ Fonte: adaptação de Batalha (1997)
Esta sistematização segue a visão de Batalha (op. cit.), segundo consideração de que
sistemas dessa natureza podem ser vistos pela composição de um conjunto de atores,
conforme elencados a seguir:
Agricultura, pecuária e pesca;
Industrias agroalimentares;
Distribuição agrícola e alimentar;
Capitulo IV – O perfil da região marginal – A experiência do Norte Fluminense - RJ 96
Comércio internacional;
Consumidor;
Indústria e serviços de apoio.
Morvan (1988), por sua vez, enumerou três séries de elementos que estariam
implicitamente ligados a uma visão em termos de cadeia de produção:
• A cadeia de produção é uma sucessão de operações de transformação dissociáveis,
capazes de ser separadas e ligadas entre si por encadeamento técnico;
• A cadeia de produção é também um conjunto de relações comerciais e financeiras
que estabelecem, entre todos os estados de transformação, um fluxo de troca,
situado de montante à jusante, entre fornecedores e clientes;
• A cadeia de produção é um conjunto de ações econômicas que residem à
valorização dos meios de produção e asseguram a articulação das operações.
Complementarmente, os fundamentos orientadores da pesquisa seguem a orientação
de Porter, conforme descrição a seguir:
“A riqueza é criada pela microeconomia. Ela é produzida pelas empresas
capazes de oferecer produtos e serviços valiosos e vendê-los nos mercados
mundiais”, Porter (2000).
“O ambiente microeconômico de um País é um quadro, freqüentemente,
chamado de “diamante” e tem três características particulares” (Porter, op. cit.).
A figura a seguir, apresenta a idéia de produtividade e ambiente microeconômico,
segundo Porter:
Capitulo IV – O perfil da região marginal – A experiência do Norte Fluminense - RJ 97
Característica 1 (condições de fornecimento – insumos) 1. Insumos de altíssima qualidade e crescente 2. Recursos humanos de alta qualidade 3. Infra-estrutura física de qualidade (comunicação, transporte, base científica,
capital e prazos razoáveis)
Característica 2 (condições de demanda) 1. Bons clientes (clientes exigentes) 2. Concorrência entre empresas 3. “Clusters” (agrupamento de empresas relacionadas e de apoio)
Característica 3 (fatores institucionais) 1. Regras corretas e claras 2. Proteção à propriedade intelectual 3. Incentivos para investimento 4. Estrutura fiscal necessária
Figura 10: Produtividade e ambiente microeconômico Fonte: Porter (2000) O processo de entrevista foi planejado com base nas conceituações e parâmetros de
competitividade descritos acima, sob o qual foi formulada uma única pergunta que diz
respeito ao estágio de competitividade atual do setor agroindustrial, conforme a seguir:
• Como está o setor agroindustrial da região norte fluminense, em termos de
competitividade, quando analisado sob o conceito de cadeia de produção e
segundo os parâmetros ideais (características) de Porter?
Capitulo IV – O perfil da região marginal – A experiência do Norte Fluminense - RJ 98
4.5.2 resultado da pesquisa Os dados resultantes dos questionários devolvidos foram ponderados segundo uma
escala de 1 a 4 (excelente, bom, regular e insuficiente), para os segmentos de cana de
açúcar, pecuária, fruticultura, olericultura e pesca. A tabela abaixo sistematiza os
resultados:
Coeficientes indicativos da competitividade regional Segmentos que compõe o setor
Condições de fornecimento
Condições de demanda
Fatores institucionais
Sucroalcooleiro 2,27 2,99 2,04
Pecuária 2,49 3,41 1,74
Fruticultura 2,82 2,32 2,12
Olericultura 1,74 2,24 1,93
Pesca 2,10 2,43 1,89
Tabela 4 – Coeficientes de competitividade regional Analisando mais detalhadamente os indicadores calculados, pode-se verificar que o
segmento sucroalcooleiro apresenta uma estrutura produtiva que permite uma melhor
integração entre o cultivo da cana-de-açúcar e a industria de processamento de açúcar
e álcool, o que representa um melhor processo de agregação de valor. Esta situação
fica caracterizada através dos coeficientes apresentados na pesquisa.
Considerando o grau máximo da escala como parâmetro relativo ideal, no que diz
respeito às condições de fornecimento (insumo de alta qualidade, recursos humanos de
qualidade e infra-estrutura física de qualidade), o setor apresenta uma performance de
aproveitamento de 56,75%, em sua contribuição para o processo de desenvolvimento
local. Na análise sobre as condições de demanda (bons clientes, concorrência entre
Capitulo IV – O perfil da região marginal – A experiência do Norte Fluminense - RJ 99
empresas e formas de agrupamento) o segmento apresenta uma performance de
aproveitamento de 74,75%. O último elemento, que diz respeito aos fatores
institucionais (regras corretas e claras, incentivo ao investimento e estrutura fiscal), o
segmento apresenta uma performance de 51,00%.
O segmento pecuário apresenta uma melhor performance no item condições de
fornecimento 62,25% de aproveitamento, o que pode ser explicado pela existência de
um processo concorrencial mais forte entre os pecuaristas. Nas condições de demanda
o segmento também apresenta uma performance melhor do que o segmento canavieiro
85,25% de aproveitamento, também explicado pela acirrada concorrência entre
diversas marcas de leite o que, conseqüentemente, leva o cliente a ser mais exigente.
No que diz respeito aos fatores institucionais a atividade apresenta um aproveitamento
de 43,50%, o que demonstra que a atividade detém instrumentos institucionais em um
menor nível do que o setor canavieiro, cujas raízes estão intrinsecamente inseridas na
história da região.
O segmento de fruticultura vem sendo indicado a algum tempo como uma alternativa
geradora de renda, tendo em vista a acentuada queda do setor canavieiro. Em função
disso, algumas iniciativas institucionais vêm sendo dirigidas, no sentido de incentivar a
produção de frutas. Recentemente foi implantada, na região, uma indústria de
processamento, cujos resultados ainda não são consistentes. Entretanto, o fato é que
existe um sentimento positivo em relação ao futuro desta atividade, possibilitando os
resultados apresentados na pesquisa. A performance do setor no item condições de
fornecimento atingiu um índice de 70,50% de aproveitamento, configurando-se numa
melhor condição do que a pecuária e a cana. Na verdade existem valiosos esforços no
âmbito da pesquisa, assim como uma eficiente integração com outras entidades
visando ampliar a qualidade dos frutos na região. Estas ações vêm contribuindo para o
bom desenvolvimento da atividade tanto no aumento da produção, quanto na melhoria
da qualidade dos frutos. Entretanto, é na demanda que se concentram os problemas.
Contrariamente às atividades canavieira e pecuária, atualmente não existe uma
integração fazenda / fabrica, o que leva os produtores a escoarem a sua produção na
condição in natura para mercados e fábricas fora da região. Como existe um processo
Capitulo IV – O perfil da região marginal – A experiência do Norte Fluminense - RJ 100
concorrencial dinâmico, apesar da boa qualidade dos frutos, outros fatores dificultam o
poder competitivo da região, implicando na performance de 58,00% de aproveitamento
no item demanda. Na análise do item fatores institucionais, o segmento situa-se em
uma condição superior aos segmentos açucareiro e pecuária, ou seja, 53,00% de
aproveitamento. Este resultado pode ser explicado em função, exatamente, da grande
importância estratégica em que a atividade foi alçada regionalmente. A atividade de
fruticultura conta com um valioso aparado institucional tanto de apoio tecnológico,
oferecido pelas instituições de pesquisa e extensão instaladas na região, quanto de
apoio financeiro disponibilizado pelo programa frutificar do governo do estado, que
oferece recursos para pequenos produtores a uma taxa de juro subsidiada.
A olericultura na região se apresenta como um segmento muito enfraquecido. A sua
performance no item condições de fornecimento é de 43,50% de aproveitamento, o que
equivale ao menor índice entre os segmentos estudados. Este fato pode ser explicado,
talvez, pela inexistência de integração local com os processos produtivos, o que pode
contribuir para o aniquilamento dos preços básicos e, conseqüentemente, para uma
grande desmotivação no que diz respeito ao investimento produtivo. No que concerne
as condições de demanda, a situação não se altera, o segmento apresenta um índice
de aproveitamento de 56,00%, também inferior aos outros segmentos. Neste caso,
observa-se uma performance um pouco melhor em função da existência concorrencial.
Entretanto a ausência de unidades de processamento contribui para pouca dinâmica
tanto no âmbito da oferta, quanto no âmbito da demanda. A análise revela que os itens
que compõem os fatores institucionais seguem a mesma trajetória de importância, com
aproveitamento de 48,25%, o que demonstra o baixo reconhecimento deste segmento
na região.
O segmento pesqueiro apresenta características diferentes, pois trata-se de uma
atividade extrativista. Conforme pode-se muito bem observar, o item condições de
fornecimento apresenta um aproveitamento de 52,50%, enquanto o item condições de
demanda apresenta um aproveitamento de 60,75%. Uma análise relevante para esta
atividade indica que a boa performance na formação da demanda está cristalizada no
grande interesse de acumulação dos distribuidores intermediários que apesar de
Capitulo IV – O perfil da região marginal – A experiência do Norte Fluminense - RJ 101
concorrerem entre si, mantêm um certo cooperativismo exploratório sobre os
pescadores que atuam à luz de total desorganização. Entretanto, em função da
ausência de qualquer planejamento para a atividade de captura do pescado, a oferta
apresenta uma tendência declinante, tanto no que diz respeito à quantidade, quanto na
diversidade de espécies importantes. Finalmente, a apresentação, pelo segmento, de
uma performance no item fatores institucionais de 47,25% de aproveitamento, mostra,
claramente, a inexistência que preocupação com esta atividade que é de extrema
relevância, em função da absorção de um grande quantitativo de mão-de-obra.
Assim, percebe-se que os resultados das análises implementadas acima indicam uma
premente necessidade de mudanças no modelo seguido pela região. Este contexto,
entretanto, de alguma maneira vem aguçando a criatividade de formuladores de
políticas públicas e pesquisadores, já que à luz das abordagens de desenvolvimento
econômico, discutidas anteriormente, não se verifica qualquer possibilidade para a
inclusão de ambientes com o perfil da região norte fluminense.
Conforme verificado, as análises precedentes sobre a competitividade da região norte
fluminense, considerando o modelo de competitividade de Porter, possibilitou uma
considerável visão sobre os elementos: (i) quantidades e qualidades da oferta, (ii)
quantidade e qualidade da demanda e, fundamentalmente, (iii) as características
importantes do ambiente microeconômico.
Os resultados considerados mostram a baixa capacidade competitiva da região numa
contextualização própria do modelo de acumulação capitalista corrente, ou seja,
regulação econômica keynesiana e organização industrial taylorista-fordista. Entretanto,
segundo o paradigma de organização produtiva do tipo “distrito industrial”, cujas
características estão bem mais próximas de regiões periféricas como o foco da análise
presente, observou-se a necessidade do desenvolvimento de uma outra verificação
sobre a região, agora, a luz dos elementos fundamentais dos distritos industriais
modernos.
Capitulo IV – O perfil da região marginal – A experiência do Norte Fluminense - RJ 102
Desta forma, visando melhor entender o ambiente sócio cultural regional
comparativamente a outras regiões que apresentam experiências de sucesso, segundo
os postulados dos distritos industriais, procedeu-se um questionário segmentado para o
setor agropecuário com indicativo dos elementos fundamentais desses distritos, para
comparação dentro de uma escala definida.
4.6 Objetivo e metodologia da pesquisa sobre a existência dos elementos fundamentais dos distritos industriais na região Norte Fluminense
4.6.1 Objetivo e metodologia da pesquisa
A pesquisa apresentou como objetivo central à necessidade de identificar a
inexistência ou a existência e, em que grau, dos elementos fundamentais dos distritos
industriais na região norte fluminense, mais especificamente, no setor agropecuário,
representado pelos segmentos: (i) sucroalcooleiro, (ii) fruticultura, (iii) pecuária, (iv)
olericultura e, (v) pesca.
A metodologia utilizada, por motivo de facilitar o entendimento, definiu-se pela
subdivisão dos elementos fundamentais dos distritos industrias: (i) divisão do trabalho
entre os atores produtivos, (ii) integração entre a sociedade local e a economia, (iii)
flexibilização e economia de aglomeração e, (iv) jogo de mercado e reciprocidade como
mecanismo de regulação local, nos subitens apresentados a seguir:
1. Divisão do trabalho entre os atores produtivos ao longo da cadeia
produtiva:
a. Cooperação para aquisição de insumos e implementos;
b. Cooperação para obtenção de créditos;
c. Cooperação para produção compartilhada;
d. Cooperação para comercialização.
Capitulo IV – O perfil da região marginal – A experiência do Norte Fluminense - RJ 103
2. Integração entre a sociedade local e a economia
a. Individualismo e sentido comunitário;
b. Características sócioculturais (valores e instituições) em simbiose com o
processo de desenvolvimento.
3. Flexibilização e economia de aglomeração
a) Capacidade para promover diferenciação no produto;
b) Incentivo e iniciativa para formação de elos complementares da cadeia de
produção.
4. Jogo de mercado e reciprocidade como mecanismo de regulação local
a) concorrência e reciprocidade como mecanismo de local.
Como parâmetro de medida, foi elaborada uma escala compreendendo os seguintes
elementos: (i) grau inexistente; (ii) grau baixo; (iii) grau médio; (iv) grau bom; (v) grau
pleno. A decisão por esses elementos surgiu do resultado de um consenso entre um
grupo de universitários, profissionais do sistema financeiro.
O processo de entrevistas foi realizado junto a pesquisadores de reconhecido
conhecimento técnico-científico, ligados as seguintes instituições: a) PESAGRO, b)
EMATER, c) Ministério da Agricultura, d) UFRRJ, e) UENF e, f) Sindicato Rural, cujos
questionários fundamentaram-se nos postulados básicos dos distritos industriais.
Os fundamentos principais norteadores da pesquisa de forma a auxiliar os
entrevistados foram sistematizados e estão apresentados no tópico seguinte.
Capitulo IV – O perfil da região marginal – A experiência do Norte Fluminense - RJ 104
4.6.2 fundamentos importantes associados aos distritos industriais
Originalmente, segundo Whitaker (1975), o conceito de distrito industrial foi
desenvolvido pelo economista Alfred Marshall. Ainda no inicio do século vinte o autor
construiu a idéia de que as vantagens, ou pelo menos algumas delas, da produção em grande escala poderiam também ser obtidas por uma grande quantidade de empresas
de pequeno porte, concentradas num território dado, especializadas nas suas fases de
produção e recorrendo a um único mercado de trabalho local. Segundo o autor, para
que esse fenômeno do distrito industrial se realize é necessário uma interpenetração
dessa miríade de pequenas empresas com a população residente nesse mesmo
território. Desse modo, os habitantes devem apresentar características sócioculturais
(valores e instituições) em simbiose com um processo de desenvolvimento próprio das
pequenas empresas.
No ressurgimento atual do conceito marshaliano, destaca-se Becattini (1999), onde
ressalta que o novo conceito de distrito industrial traz a noção de adequação perfeita
entre as condições requeridas em vistas a uma certa organização do processo
produtivo e as características sócioculturais, forjadas ao longo dos anos de uma
camada da população.
O autor reafirma a visão dos “experts” italianos (economistas, sociólogos, antropólogos,
geógrafos) de que o estado de espírito que prevalece nos distritos industriais é Neo –
Smilesien, ou seja, baseado no desabrochamento pessoal, apesar de ser movido por
um sentimento intenso de pertencimento a comunidade local.
O mesmo cita a teoria do desenvolvimento de A. O. Hirschman (1958), cuja
consideração é de que o individualismo e o sentido comunitário do desenvolvimento se
fundem harmoniosamente no distrito industrial.
Assim, a possibilidade de eficácia do distrito industrial depende dos processos
produtivos que devem apresentar as seguintes características:
Capitulo IV – O perfil da região marginal – A experiência do Norte Fluminense - RJ 105
Fracionamento em fases e a possibilidade de encaminhar no espaço e no tempo
os frutos dessa produção fracionada (caracterização do processo social da
produção).
Laço que une o sistema local dos pequenos produtores aos mercados externos
de escoamento de seus produtos.
Outros princípios originais dos Distritos Industriais são representados pelos seguintes
elementos:
Coexistência singular de concorrência e de solidariedade entre as empresas do
distrito com vista a reduzir custos de transações no mercado local;
Efervescência inovadora oriunda da base, favorecida pelo “clima industrial”
reinante no distrito;
Grande mobilidade, tanto horizontal quanto vertical dos postos de trabalho;
Cooperação entre os membros do distrito para alcançar os objetivos econômicos
ou melhorar o ambiente geográfico e social do distrito propriamente dito.
Conseqüentemente, Becattini (op. cit.), conceitua Distrito Industrial como um grande
complexo produtivo, onde a coordenação das diferentes fases e o controle da
regularidade ou seu funcionamento não dependem de regras preestabelecidas e de
mecanismo hierárquico (como nas grandes empresas), mas, ao contrario, são
submetidos, ao mesmo tempo, ao jogo automático do mercado e a um sistema de
sanções sociais aplicado pela comunidade.
Uma outra visão creditada a Courlet (1993), associa a nova dinâmica dos sistemas
industriai localizados aos seguintes elementos:
Divisão do trabalho entre empresas iguais e/ou autônomas;
Capitulo IV – O perfil da região marginal – A experiência do Norte Fluminense - RJ 106
Industrialização dispersa – característica de iniciativas predominantemente locas
e em interação forte entre a economia e a sociedade;
Flexibilidade e economia de aglomeração.
Complementarmente, Staber (1999), apresenta os seguintes fundamentos oriundos do
sucesso dos distritos industriais:
Especialização flexível (especialização horizontal em produtos ou vertical em
fase de produção);
Cooperação interfirmas;
Proximidade geográfica;
Envolvimento social (as empresas estão envolvidas pela forte cultura local que
da sentido e legitimidade ao conhecimento coletivo e compartilhamento dos
recursos).
4.6.3 Uma investigação sobre a existência dos elementos dos distritos industriais
no setor agropecuário da região norte fluminense
Objetivando avaliar vestígios da existência dos elementos essenciais intrínsecos aos
distritos industriais, foi desenvolvida uma pesquisa de campo junto a instituições
vinculadas ao setor mencionado, cuja metodologia buscou identificar os elementos
fundamentais dois distritos industriais e, em que grau, através da aplicação de
questionários para o setor agropecuário da região Norte Fluminense, distribuído nos
segmentos sucroalcooleiro, fruticultura, pecuário, olericultura e pesca.
Os elementos importantes na constituição dos distritos industriais selecionados foram
os seguintes:
Capitulo IV – O perfil da região marginal – A experiência do Norte Fluminense - RJ 107
• Divisão do trabalho entre os atores produtivos ao longo da cadeia produtiva;
• Interação entre a economia e a sociedade local;
• Flexibilidade e economia de aglomeração;
• Jogo de mercado e reciprocidade como mecanismo de regulação local.
A avaliação sobre a existência desses elementos na região norte fluminense exigiu o
desenvolvimento de um instrumento que pudesse medir em que grau esses elementos
estariam inseridos na região. Com essa finalidade, reuniu-se um grupo de estudante de
administração, todos funcionários de uma agência bancaria local (gerentes, secretárias,
atendentes e administrativos), com a finalidade de construir uma escala que pudesse
avaliar com maior clareza elementos tão complexos. Segundo os participantes do
debate, a escala que melhor poderia responder ao objetivo deveria ter as seguintes
características: (i) grau inexistente; (ii) grau baixo, (iii) grau médio, (iv) grau bom, (v)
grau pleno.
4.6.4 Resultado da pesquisa
Algumas observações “pinçadas” nesse processo de investigação tem um papel
singular para um bom entendimento sobre a região. Alguns pesquisadores, segundo
suas respostas, parecem querer minimizar qualquer crítica direcionada a sua entidade
pelo insucesso da atividade que depende, de alguma forma, de sua intervenção. Esta
conclusão é fruto da observação sobre algumas respostas tão diferentes em relação a
uma determinada situação em que os dois têm profundos conhecimentos, só que a
manutenção do interesse individual prevalece.
Outra constatação importante diz respeito a forte estrutura social e econômica relativa
ao segmento sucroalcooleiro criada a luz do “boom econômico” do País, hoje
totalmente esfacelada. Este importante segmento econômico da região já contou com
uma imponente cooperativa de crédito ligada diretamente ao Banco Central e apoiada
por uma eficiente equipe técnica que viabilizava os recursos necessários a atividade.
Outras cooperativas para apoiar a atividade de comercialização, compra de insumos e
serviços agrícolas, assim, como para solucionar problemas jurídicos e assistenciais
Capitulo IV – O perfil da região marginal – A experiência do Norte Fluminense - RJ 108
também cumpriram um papel importante, porém algumas não mais existem outras
existem precariamente. Segundo resultados das entrevistas, alguns fatores como (i)
questões administrativas internas, (ii) questões conjunturais, (iii) ausência de unidade
entre os atores, e (iv) quebra de regras estabelecidas, impactando em desconfiança
geral, deram o “tom” para o esfacelamento dessa relevante estrutura.
Observações complementares confirmam o atraso persistente do setor agropecuário na
região, mas que, entretanto, dado o aprofundamento do sofrimento do homem do
campo somado a ausência do poder institucional, algumas alternativas são tentadas
com vista à minimização dos graves problemas apresentados. No segmento pecuário,
por exemplo, já são identificadas algumas ações cooperativas entre propriedades
vizinhas que perceberam as reais dificuldades na solução dos seus problemas
individuais. Ações no sentido de compartilhar a aquisição de resfriadores vêm ajudando
esses atores tanto operacionalmente, quanto ao atendimento a determinações de
âmbito legal. Outras ações bem elementares direcionadas, especialmente, as questões
comerciais e de distribuição são tentadas para evitar grandes prejuízos.
Os resultados, segundo as respostas inseridas na escala proposta, apresentam os
seguintes indicativos:
Quanto ao primeiro elemento (divisão do trabalho entre os atores produtivos ao
longo da cadeia produtiva), os resultados são os seguintes:
a) Em relação ao segmento sucroalcooleiro: 56% por cento dos entrevistados
consideram a inexistência desse elemento, enquanto 28% consideram a
existência num grau baixo, 12% consideram a existência num grau médio e 4%
consideram a existência num grau bom.
b) Em relação segmento fruticultura: 30% por cento dos entrevistados consideram a
inexistência desse elemento, enquanto 40% consideram a existência num grau
baixo, 25% consideram a existência num grau médio, 5% consideraram a
existência num grau bom.
Capitulo IV – O perfil da região marginal – A experiência do Norte Fluminense - RJ 109
c) Em relação ao segmento pecuário: 42% por cento dos entrevistados consideram
a inexistência desse elemento, enquanto 11% consideram a existência num grau
baixo, 42% consideram a existência num grau médio e 5% consideram a
existência num grau bom.
d) Em relação ao segmento olericultura: 50% por cento dos entrevistados
consideram a inexistência desse elemento, enquanto 45% consideram a
existência num grau baixo, 5% consideram a existência num grau médio.
e) Em relação ao segmento pesqueiro: 30% por cento dos entrevistados
consideram a inexistência desse elemento, enquanto 40% consideram a
existência num grau baixo, 30% consideram a existência num grau médio.
Quanto ao segundo elemento (Integração entre a sociedade local e a economia),
os resultados são os seguintes:
a) Em relação ao segmento sucroalcooleiro: 60% por cento dos
entrevistados consideram a existência desse elemento num grau baixo,
enquanto 10% consideram a existência num grau médio e 20%
consideram a existência num grau bom, 10% consideram a existência
num grau pleno.
b) Em relação ao segmento fruticultura: 13% por cento dos entrevistados
consideram a inexistência desse elemento, enquanto 50% consideram a
existência num grau baixo, 25% consideram a existência num grau médio
e 12% consideram a existência num grau bom.
c) Em relação ao segmento pecuário: 13% por cento dos entrevistados
consideram a inexistência desse elemento, enquanto 62% consideram a
existência num grau baixo, 25% consideram a existência num grau médio.
Capitulo IV – O perfil da região marginal – A experiência do Norte Fluminense - RJ 110
d) Em relação ao segmento de olericultura: 13% por cento dos entrevistados
consideram a inexistência desse elemento, enquanto 50% consideram a
existência num grau baixo, 37% consideram a existência num grau médio.
e) Em relação ao segmento pesqueiro: 25% por cento dos entrevistados
consideram a inexistência desse elemento, enquanto 25% consideram a
existência num grau baixo, 50% consideram a existência num grau médio.
Quanto ao terceiro elemento (flexibilização e economia de aglomeração), os
resultados são os seguintes:
a) Em relação ao segmento sucroalcooleiro: 40% por cento dos
entrevistados consideram a inexistência desse elemento, enquanto 50%
consideram a existência num grau baixo e 10% consideram a existência
num grau médio.
b) Em relação ao segmento fruticultura: 13% por cento dos entrevistados
consideram a inexistência desse elemento, enquanto 12% consideram a
existência num grau baixo, 63% consideram a existência num grau médio,
12% consideram a existência com um grau bom.
c) Em relação ao segmento pecuário: 25% por cento dos entrevistados
consideram a inexistência desse elemento, enquanto 38% consideram a
existência num grau baixo, 25% consideram a existência num grau médio
e 12% consideram a existência com um grau bom.
d) Em relação ao segmento olericultura: 13% por cento dos entrevistados
consideram a inexistência desse elemento, enquanto 62% consideram a
existência num grau baixo, 13% consideram a existência num grau médio
e 12% consideram a existência com um grau bom.
Capitulo IV – O perfil da região marginal – A experiência do Norte Fluminense - RJ 111
e) Em relação ao segmento pesqueiro: 75% por cento dos entrevistados
consideram a inexistência desse elemento, enquanto 25% consideram a
existência num grau bom.
Quanto ao quarto elemento (jogo de mercado e reciprocidade como mecanismo
de regulação), os resultados são os seguintes:
a) Em relação ao segmento sucroalcooleiro: 40% por cento dos
entrevistados consideram a existência desse elemento num grau baixo,
enquanto 20% consideram a existência num grau médio, 20% consideram
a existência num grau bom, 20% consideram a existência num grau pleno.
b) Em relação ao segmento fruticultura: 50% por cento dos entrevistados
consideram a existência desse elemento num grau baixo, enquanto 50%
consideram a existência num grau médio.
c) Em relação ao segmento pecuário: 50% por cento dos entrevistados
consideram a existência desse elemento num grau baixo, enquanto 25%
consideram a existência num grau médio, 25% consideram a existência
num grau bom.
d) Em relação ao segmento olericultura: 25% por cento dos entrevistados
consideram a inexistência desse elemento, enquanto 25% consideram a
existência num grau baixo, 25% consideram a existência num grau médio
e 25% consideram a existência com um grau bom.
e) Em relação ao segmento pesqueiro: 50% por cento dos entrevistados
consideram a existência desse elemento num grau baixo, enquanto 50%
consideram a existência num grau médio.
Conclusivamente, por mais dificuldades que esse mecanismo utilizado possa trazer no
que diz respeito à análise sóciocultural da região, a partir da observação das relações
Capitulo IV – O perfil da região marginal – A experiência do Norte Fluminense - RJ 112
verificadas no setor agropecuário, algumas indicações se fazem presentes quando, por
exemplo, consideramos somente os resultados das avaliações inexistentes e grau baixo
dos elementos. Esses resultados estão sintetizados a seguir:
Elementos sucroalcooleiro fruticultura Pecuária olerículas pesca
Elemento (1) 84% 70% 53% 95% 70%
Elemento (2) 60% 63% 75% 63% 50%
Elemento (3) 50% 25% 63% 75% 75%
Elemento (4) 40% 50% 50% 50% 50%
Tabela 5 – Resultados das ponderações
O resultado alcançado da adição das respostas obtidas, considerando inexistência e
existência num grau baixo dos elementos fundamentais dos distritos industriais, na
região Norte Fluminense, representa indicativo importante para a implementação de
políticas públicas, no sentido de capacitar a região para a busca de um estagio mais
avançado do desenvolvimento econômico.
Conforme se pode observar, em relação a primeiro elemento (a nova concepção de
divisão do trabalho), a percepção dos pesquisadores sobre a inexistência ou existência
em grau baixo nos segmentos do setor agropecuário na Região, alcança índices bem
altos, ou seja, 84% no sucroalcooleiro, 70% na fruticultura, 53% na pecuária, 95% na
olericultura e 70% na pesca.
Quanto ao segundo elemento (Integração entre a sociedade local e a economia), a
percepção dos pesquisadores sobre a inexistência ou existência em grau baixo também
se caracteriza por índices altos, tais como: 60% no sucroalcooleiro, 63% na fruticultura,
75% na pecuária, 63% na olericultura e 50% na pesca.
Quanto ao terceiro elemento (Flexibilização e economia de aglomeração), os índices
são os seguintes: 50% no segmento sucroalcooleiro, 25% na fruticultura, 63% na
pecuária, 75% na olericultura e 75% na pesca.
Capitulo IV – O perfil da região marginal – A experiência do Norte Fluminense - RJ 113
Finalmente, o quarto elemento (Jogo de mercado e reciprocidade como mecanismo de
regulação local), apresenta os seguintes índices: 40% no segmento sucroalcooleiro,
50% na fruticultura, 50% na pecuária, 50% na olericultura e 50% na pesca.
Na verdade, esta investigação gerou um sentimento de que é extremamente necessário
o desenvolvimento de uma pesquisa mais aprofundada sobre o ambiente sócio-cultural
na região, de maneira que outros elementos possam surgir para direcionar iniciativas
tanto das organizações públicas, quanto das organizações privadas em direção a um
amplo processo de conhecimento sobre a dinâmica do mundo atual e, sobretudo, sobre
o papel desses atores no contexto sócio-econômico local.
4.7 Uma avaliação das políticas institucionais
Um grande paradoxo está presente na análise das políticas institucionais. Se de um
lado observa-se as restrições precedentes quanto ao crescimento econômico da região,
por outro lado, pode-se identificar inúmeras ações públicas materializadas em
programas de apoio a pequenas e medias empresas no País e, evidentemente, na
região. Aliás, muito bem justificado pela relevância dos números publicados pelo
SEBRAE (2001), onde as mesmas representam no país, 4,5 milhões de
estabelecimentos; 98,5% das empresas existentes; 48% da produção; 95% das
empresas do setor de industria, 99,1% das empresas de comércio; 99% das empresas
de serviço; 60% da oferta de emprego; 42% do pessoal ocupado na indústria; 80,2%
dos empregados no comércio; 63,5% da mão-de-obra do setor de serviço e 21% do
produto Interno Bruto (PIB).
Essas ações, entretanto, têm demonstrado pouca efetividade em termos de
crescimento econômico, especialmente na região norte fluminense, como justificado
nos indicadores vistos anteriormente.
De forma a ratificar as afirmações acima, pode-se identificar no elenco de programas de
cunho Federal e Estadual, alguns importantes para crescimento econômico da região,
Capitulo IV – O perfil da região marginal – A experiência do Norte Fluminense - RJ 114
mas que, notoriamente, não têm conseguido cumprir os seus objetivos reais. A seguir
são relacionados alguns programas da esfera federal:
• Programa de Emprego e Renda (PROGER)
• Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF)
• Programa de Crédito Especial para a Reforma Agrária (PROCERA)
• Programa de Promoção do Emprego e Melhoria da Qualidade de Vida do
Trabalhador (PROTRABALHO)
• Projeto Piloto de Apoio à Reforma Agrária Cédula da Terra
Sobretudo na esfera estadual, pode-se destacar importantes programas cujo objetivo
principal é, exatamente, potencializar a região. Entretanto, assim como, verificado
acima, até o momento, os resultados alcançados não reafirma o cumprimento do
objetivo final desses mesmos programas.
Os principais programas de âmbito estadual para a região são os seguintes:
• Programa moeda verde – FRUTIFICAR
• Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Novo PRONAF)
• Programa de Apoio à Fruticultura (PROFRUTA)
• Programa de Fruticultura (BNDES)
• FINAME Agrícola
• Programa especial de desenvolvimento industrial das Regiões Norte e Noroeste
Fluminense (RIO NORTE / NOROESTE), dentre outros importantes mecanismos.
Ratificando as afirmações precedentes, o fato desses programas, juntamente com
outras ações disponibilizadas, não terem conseguido mudar o perfil regional no
contexto econômico e social, credibiliza a uma necessária intervenção para
incorporação de ações complementares as já existentes, de forma a objetivar uma
efetiva geração de emprego e renda.
Capitulo IV – O perfil da região marginal – A experiência do Norte Fluminense - RJ 115
4.7.1 Uma avaliação sobre o programa FRUTIFICAR
Um exemplo concreto sobre a necessária intervenção em programas já existentes,
pode ser verificado no caso da experiência do programa FRUTIFICAR. Este programa
demonstra um certo equívoco na formulação de sua estratégia principal, cuja
confirmação está ratificada em sua baixa utilização operacional. Na verdade, a sua
filosofia de implementação segue a concepção dominante e responsável pela ampla
parcela de excluídos no país e na região. O seu pilar principal está centrado na
capacidade competitiva do cliente do programa, ou seja, recebe apoio quem detém as
competências necessárias (recursos hídricos de boa qualidade, solo apropriado para o
cultivo, capacidade gerencial, etc.) para pagar os recursos liberados, fato que
verdadeiramente acaba por excluir uma grande parcela de produtores, eliminando
postos de trabalho.
A organização produtiva do programa, tão elogiada por seus responsáveis, segue o
modelo tradicional, ou seja, trata-se de um sistema em rede do tipo “top down” ou
japonesa, onde a empresa mãe constitui-se, hierarquicamente, no topo da pirâmide
exercendo total supremacia sobre um grupo de pequenas organizações totalmente
dependentes. Esse processo caracterizado pela união de todas através de uma
liderança acarreta negação de divergências e impedimento de conflitos, a exemplo da
industria automobilística e das agroindústrias, Casarotto (1999).
Segundo o autor, essa rede coloca as pequenas organizações fornecedoras em uma
condição de elevada dependência em relação às estratégias da empresa mãe, além de
possibilitar pouca ou nenhuma flexibilidade ou poder de influencia desses fornecedores
na rede.
A figura a seguir ilustra um modelo de rede do tipo “top-down” ou japonesa:
Capitulo IV – O perfil da região marginal – A experiência do Norte Fluminense - RJ 116
EMPRESA
MÃE 1ª linha 2a linha Figura (11) modelo de rede do tipo “top-down” ou japonesa Fonte: Casarotto e Pires (1999). Contrariamente, o moderno paradigma de organização industrial do tipo “Distrito
Industrial”, concebe uma rede que elimina, principalmente, essa relação de
dependência das organizações fornecedoras, inserindo o elemento cooperação. Uma
rede de cooperação mais flexível como o exemplo da Terceira Itália, possibilita a
abrangência dos consórcios nos seguintes temas: (i) formação do produto; (ii)
valorização do produto; (iii) valorização da marca; (iv) desenvolvimento de produtos; (v)
comercialização; (vi) exportação; (vii) padrões de qualidade e, (viii) obtenção de crédito.
A figura a seguir ilustra um modelo de rede flexível de empresas do tipo consórcio
italiano específico da Terceira Itália:
empresas figura (12) modelo de rede flexível de pequenas empresas fonte: Casarotto e Pires (1999)
Capitulo IV – O perfil da região marginal – A experiência do Norte Fluminense - RJ 117
4.8 Uma análise final Conclusivamente, observa-se que o processo de subdesenvolvimento em que a região
está inserida representa um paradoxo, tendo em vista a concepção corrente que
relaciona o efeito quantitativo dos recursos disponíveis ao crescimento econômico. Na
verdade, financeiramente, a região está contemplada por diversos programas já
elencados anteriormente, assim como, tecnologicamente, as autarquias, teoricamente,
disponibilizam o suporte necessário ao aumento da competitividade regional.
Entretanto, o cruzamento dos indicadores mostra, claramente, que de fato a utilização
desses recursos não se verifica. Ao contrário, observa-se que o fator individualismo é
mais forte levando atores como universidades, centro de pesquisa e extensão,
instituições financeiras, parque tecnológico e outras instituições fomentadoras do
desenvolvimento a não cumprirem, efetivamente, o papel que a sociedade exige.
Como verificado nas discussões precedentes, a organização produtiva com base em
redes flexíveis de pequenas empresas tem possibilitado um certo crescimento
econômico, especialmente na Europa. Este crescimento é fruto da integração de
pequenas unidades produtivas que se cooperam para constituir as competências
necessárias oriundas das grandes corporações. Como resultado, pequenas empresas
juntas, transformam-se em uma grande organização virtual, possibilitando uma eficiente
trajetória ao longo das etapas da cadeia de valor, descrita a seguir:
• Pesquisa e desenvolvimento
1. Atualização setorial
2. Desenvolvimento de produto
3. Tecnologia de processo
• Logística de aquisição
1. Compras consorciadas
2. Estocagem de materiais
3. Transporte
Capitulo IV – O perfil da região marginal – A experiência do Norte Fluminense - RJ 118
• Produção
1. Produção
2. Administração de custos
3. Flexibilidade
4. Logística de produção
• Tecnologia de gestão
1. Administração de recursos humanos
2. Qualidade
3. Planejamento
4. Gestão financeira
• Logística de distribuição
1. Estocagem de produtos
2. Transporte de produtos
3. Redes de distribuição
• Marketing
1. Atualização setorial
2. Marca
3. Vendas
4. Atendimento a cliente
5. Assistência pós-venda
Assim, de forma resumida, pode-se verificar que a região apresenta-se sob um quadro
em que:
Apesar de expressivos recursos financeiros o acesso ao mesmo é bastante
reduzido;
Capitulo IV – O perfil da região marginal – A experiência do Norte Fluminense - RJ 119
Apesar do elevado conhecimento científico disponível, as organizações operam
de forma rudimentar, onde sequer o processo organizacional básico está
presente;
Instituições de pesquisa e extensão agropecuária mostram-se presentes
fisicamente, mas reduz-se a área plantada, a produtividade agrícola e a
população rural;
Multiplicam-se os orçamentos municipais e o montante de recursos financeiros
do estado alocado nas funções ciência e tecnologia e agricultura e fomento a
produção, enquanto que o resultado é uma constante queda na competitividade
e aprofundamento da pobreza no campo.
CAPÍTULO V
ESTRATÉGIA DE CAPACITAÇÃO EM REGIÕES MARGINAIS NA BUSCA DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO
5.1 Introdução Conforme verificado nas discussões precedentes, o sistema de acumulação capitalista
do pós-guerra, tendo em vista as suas rígidas características: (i) grandes empresas; (ii)
grandes infra-estruturas; (iii) grandes cidades e; (iv) grandes investimentos (Gurissatti
1999) e, complementarmente, a concepção do Estado como provedor do bem estar
social contribuíram para o estabelecimento da dualidade centro / periferia, isolando
numerosas regiões e entregando-as a sua própria sorte. Conseqüentemente, pequenas
unidades produtivas e trabalhadores com menor qualificação foram excluídos do
processo, cujo impacto foi o aprofundamento da pobreza e, fundamentalmente, a
ampliação da desigualdade social nessas regiões.
Definitivamente, esse modelo, de certa forma ainda dominante, tem demonstrado que é
inconsistente para provocar um processo de recuperação das economias periféricas,
tendo em vista a elevada predominância de pequenas empresas que apresentam,
quase sempre, grandes dificuldades relacionadas às questões: tecnológica, financeira,
administrativa, logística, P&D, etc.
Esse sistema, entretanto, iniciou um processo de “desmantelamento”, ainda no inicio
dos anos setenta, que possibilitou uma resposta aos seus próprios desequilíbrios, cujos
parâmetros de reestruturação industrial, passaram a contemplar os pequenos
investimentos, a produção personalizada, as pequenas unidades produtivas, enfim, um
novo contexto de flexibilidade.
Capítulo v – Estratégia de capacitação em territórios marginais 121
Desta forma, torna-se pertinente a seguinte indagação. Se este novo paradigma de
organização flexível apresenta características que contemplam as pequenas empresas,
então os problemas de desenvolvimento em regiões periféricas poderão ser
enfrentados mais adequadamente? Responder essa indagação é a grande questão.
Os distritos industriais, modelo representativo do sistema de produção flexível
experimentado por diversas regiões da Europa, têm apresentado resultados
econômicos bastante sólidos. O chamado Arco Alpino - macro região composta pelo
nordeste e noroeste italiano, parte da França, parte da Alemanha, Suíça e Áustria –
apresenta indicadores de renda per capita e emprego num nível superior a União
Européia “a Europa dos 12”, onde impera o sistema de acumulação capitalista
tradicional.
Uma outra indagação poderia se dar no seguinte sentido: “o sistema de produção
flexível dos distritos industriais poderia ser importado para qualquer região com
dificuldade de crescimento? “ A literatura indica que não, já que a base desse sistema
está arraigada na história, na geografia e na cultura dessas regiões. Isso quer dizer que
somente os princípios mais gerais (universais) desse sistema são transferíveis.
Segundo Cocco (1999), existem pelo menos três desses elementos que podem ser
utilizados na elaboração de políticas públicas em países ou regiões com baixo nível de
crescimento como é o caso do Brasil. Esses elementos gerais são: (i) produção e
território, (ii) produção e cidadania e, (iii) empresário político ou coletivo.
Na verdade, esse novo formato de organização produtiva, de alguma maneira, tem
inspirado governantes e formuladores de política econômica no Brasil. Conforme já
verificado no estágio anterior de nossa discussão, existe uma diversidade de programas
de incentivo tecnológico, financeiro, de gestão empresarial, além de outros importantes
instrumentos para concessão de créditos e incubação de negócios, tanto no contexto
nacional, quanto no contexto regional.
Na análise direcionada à região norte fluminense, por exemplo, comprova-se a
existência de todo um aparato institucional disponível com vista ao incremento
Capítulo v – Estratégia de capacitação em territórios marginais 122
econômico, porém os resultados são bastante inconsistentes. Neste momento, surge
um sentimento de que se faz necessário intervir no processo presente na busca do
desenvolvimento econômico regional. Isso quer dizer que todo o esforço institucional
implementado não tem sido suficiente para resgatar o “déficit” social da região.
Neste caso, segundo o processo de aprendizado à luz da história e, sobretudo, em
função das características muito particulares dessas regiões, acredita-se que a
definição de estratégias no sentido de contribuir para uma melhor capacitação desses
ambientes, possa facilitar a formação de um “DNA” regional ou distrital adequado para
hospedar o desenvolvimento econômico, Gurisatti (1999).
Em consonância com esta visão, este trabalho propõe um conjunto de elementos
integrados entre si, cuja finalidade é capacitar espaços territoriais14 “marginais” ,
interessados na organização produtiva equivalente aos modelos dos distritos industriais
modernos.
5.2 Composição da estratégia e suas justificativas Ratificando a necessidade de intervenção no corrente processo de planejamento das
ações econômicas implementadas em regiões marginais, este trabalho buscou na
literatura sobre o tema, os elementos associados às experiências reais que
possibilitaram algum tipo de mudança na estrutura econômica e social de países e
regiões, cujas características guardam algum tipo de semelhança com as regiões
periféricas do Brasil, como é o caso da região norte fluminense.
14 – O conceito de espaços econômicos foram estabelecidos por François Perroux na década de 60. Segundo o autor, espaços econômicos podem ser compreendidos por espaços abstratos constituídos por relações de natureza econômica, como produção; consumo; tributação; investimento; exportação; importação e migração. Perroux estabelece três diferentes conceitos de espaços econômicos: (i) espaço econômico como conteúdo de um plano – espaço de planejamento; (ii) espaço econômico como campo de forças – espaço polarizado e (iii) espaço econômico como conjunto homogêneo – espaço homogêneo.
Capítulo v – Estratégia de capacitação em territórios marginais 123
Para a formulação da estratégia de capacitação da região propõe-se o seguinte roteiro
de planejamento:
1) Identificação da infra-estrutura publica no espaço local
Este elemento diz respeito aos recursos produtivos disponíveis, localmente, e voltados
para apoio ao processo de inovação. Evidentemente tanto o volume quanto a
especificidade desses recursos são identificados segundo a condição de
heterogeneidade existente entre as regiões, o que, verdadeiramente, pode representar
um importante fator de diferenciação para o aumento da competitividade local.
Amparado em Porter (2002), esses recursos infra-estruturais podem ter a seguinte
divisão:
(i) Recursos humanos; representados pela parcela da população total
economicamente mobilizável. Conceitualmente, esta parcela é representada
na faixa etária apta para o exercício de atividades de produção, cujos limites
variam em função do estagio de desenvolvimento da economia e de um
conjunto de definições institucionais estabelecidas pela legislação social e
previdenciária.
(ii) Recursos de capital; compreendem o conjunto das riquezas acumuladas pela
sociedade, destinadas à produção de novas riquezas. Esse conjunto inclui,
além de maquinas, equipamentos, ferramentas e instrumentos de trabalho,
outros subconjuntos que se caracterizam pelo mesmo destino; a infra-
estrutura econômica e social, as construções e edificações, os equipamentos
de transporte e os agrocapitais, como plantéis de tração e reprodução e as
culturas permanentes implantadas.
(iii) Tecnológicos; representados pelo conjunto de habilidades e de conhecimento
que sustentam o processo de produção. Esse conjunto de habilidades e
conhecimento local (saber fazer e como fazer) pode representar um
Capítulo v – Estratégia de capacitação em territórios marginais 124
diferencial competitivo local, pois representa um dos mais expressivos
acervos da herança cultural das regiões.
(iv) Capacidade empresarial; a capacidade empreendedora local representa a
possibilidade de descoberta e de exploração dos recursos naturais, a
mobilização da mão-de-obra disponível e alocação do capital para
empreender os investimentos que sustentarão o processo de
desenvolvimento.
(v) Recursos institucionais; esses recursos são representados pelas políticas
públicas relevantes à atividade inovadora e ao nível de satisfação da
comunidade local. Alguns elementos importantes nesse contexto são: a
capacidade de planejamento econômico local, as políticas de incentivo a
atividade econômica e uma eficiente gestão do orçamento público.
O processo de planejamento para identificação deste primeiro elemento se constitui
num fator relevante, no que diz respeito à capacidade local para produção das
inovações pertinentes a competitividade regional.
2) Criação de uma metodologia de gestão participativa que capacite os atores privados e institucionais para o desenvolvimento local
Comprovadamente recurso não é sinônimo de riqueza. Países e regiões com uma
grande dotação de recursos podem não apresentar um estoque de riqueza compatível.
Um bom exemplo é o Brasil. Assim, conforme se verificou ao longo da discussão
anterior sobre a geração de riqueza, o ambiente deve estar preparado para as
transformações intrínsecas ao processo de crescimento. Até mesmo o mecanicista
modelo neoclássico associou a presença de crescimento econômico a um ambiente
sócio-econômico positivo tanto no contexto econômico, quanto no contexto não
econômico.
Capítulo v – Estratégia de capacitação em territórios marginais 125
A visão de capacitar ambientes periféricos vêm se transformando numa tônica,
especialmente na Europa. No Brasil podem-se identificar algumas ações do Banco do
Nordeste que conhecendo bem a fragilidade das pequenas unidades produtivas, tem
relacionado a liberação de recursos para investimentos produtivos ao processo de
capacitação. Os pólos do nordeste de fruticultura, turismo e outros segmentos
referendam bem esta necessidade.
Ações importantes nesta direção podem também ser creditas a Portugal. Estudos sócio-
economicos sobre a área metropolitana da cidade do Porto definem na matriz de
objetivos gerais de desenvolvimento, além de outros elementos, a valorização do
modelo de produção flexível, enquanto fator de competitividade, e a qualificação do
fator empresarial. Esta combinação representa a necessidade, numa visão ampliada,
de implementação de um programa de capacitação ambiental.
Segundo a avaliação desse trabalho, o desenvolvimento e aplicação de uma
metodologia de capacitação em regiões com perfil marginal, torna possível uma
mudança de comportamento nos indivíduos, de forma que as praticas correntes sobre o
entendimento das relações econômicas e sociais, possam sofrer mudanças em direção
a uma postura mais adequada e própria dos distritos industriais.
É importante que esta metodologia possa entender capacitação como um processo
educativo e construtivo de troca e produção de conhecimentos direcionados para o
trabalho induzindo a prática de cidadania. A mesma metodologia, promovendo a gestão
participativa, estará induzindo ao desenvolvimento local endógeno, integrado e auto-
sustentável.
Na visão de Toffler (1996), capacitar é provocar mudanças compartimentais no mundo
do trabalho, da empresa, da organização e uma nova prática social. Capacitar, ainda, é
potencializar os recursos humanos de um país para obter maior produtividade da
economia, dentro de um mundo que caminha por infovias e onde o conhecimento é
considerado o mais importante fator de produção e de competitividade.
Capítulo v – Estratégia de capacitação em territórios marginais 126
O autor considera, ainda, que capacitar é construir uma nova cidadania, uma nova
relação entre estado e sociedade, onde o assistencialismo e o clientelismo são
substituídos pela formação de empreendedores com crença em si mesmos, capacidade
de autogestão, visão de futuro, consciência da cidadania e espírito de participação e de
co-responsabilidade.
Assim, considerando a dificuldade de regiões marginas na questão do associativismo 15, a construção da metodologia aqui proposta, contribuirá no processo de organização
de firmas e trabalhadores tanto no setor rural, como urbano, orientando no sentido de
provocar um salto qualitativo no desenvolvimento das cooperativas e associações de
pequenos empreendedores, a partir das tensões dialéticas existentes entre a
propriedade familiar e a empresa associativa, as necessidades imediatas e o
planejamento estratégico, o crescimento econômico e a participação social, a utilidade
e a solidariedade, etc.
Espera-se, ainda, que o desenvolvimento e a aplicação dessa metodologia possa vir a
estimular a integração empresarial e alianças estratégicas, de forma a facilitar a
construção e consolidação de complexos econômicos locais, onde as pequenas firmas
possam ser inseridas nos mercados mais exigentes, ocupando seu próprio espaço no
desenvolvimento local.
15- Segundo Rodrigues (1996), em termos sistemáticos, o associativismo assume um papel fundamental nas atuais teorias do desenvolvimento endógeno, considerado em três vertentes distintas de enquadramento: por um lado, a vertente do desenvolvimento local, entendido pela premência da resolução participada dos problemas locais, num espaço de interações e de construção de identidades e de vivências específicas; por outro lado, a vertente da criação de contrapoderes e de policentralidades do debate político social, pela ocupação das zonas periféricas do poder e por uma dialética de interiorização e de pratica democráticas ao nível local; finalmente, a vertente da exclusão social e das marginalidades, não só no que diz respeito aos jovens, mas também naquilo que concerne à terceira idade e às prementes questões do emprego social.
Capítulo v – Estratégia de capacitação em territórios marginais 127
3) Criação de um ambiente de aglomeração do tipo “clusters” para a inovação local.
Este elemento cristaliza a visão de que “A prosperidade nacional é criada, e não
herdada. Ela não nasce dos pendores naturais de uma nação, de sua força de trabalho,
de suas taxas de juros, ou do valor de sua moeda, como insistem em dizer os
economistas clássicos” (Porter 2000).
No que diz respeito a regiões, verifica-se, claramente, que o estoque de trabalhadores
disponível, assim como, os recursos naturais e, sobretudo, em muitos casos, o
aumentado valor das receitas publicas orçamentárias, não garantem qualquer
incremento ao processo de crescimento econômico sustentável. Entretanto, como o
crescimento está associado à capacidade dos setores econômicos em inovar e
modernizar, a iniciativa de criar um ambiente microeconômico competitivo torna-se um
fator de substancial importância.
Desta forma, o ambiente microeconômico adequado para a produção de inovação
setorial localmente, deve incorporar a idéia estabelecida na estrutura do “diamante”
desenvolvida por Porter em 1990 e publicado em A vantagem Competitiva das Nações.
Os pilares desse modelo estão constituídos nos seguintes pontos:
1. Condições de fatores: A busca de um sistema econômico produtivo requer a
existência de insumos de alta qualidade e sua manutenção, além de um satisfatório
estoque de recursos humanos capacitados, segundo as necessidades locais. Os
esforços no desenvolvimento dessas competências são a garantia do atendimento a
esse primeiro pilar do modelo diamante.
2. Condições de demanda: A busca de novos mercados, compostos por clientes
exigentes, constitui-se num fator relevante de motivação da empresa no seu
relacionamento com os clientes. Quanto mais exigente o cliente, mais necessidade
tem a empresa de inovar para manter o seu cliente satisfeito. Portanto, essa nova
Capítulo v – Estratégia de capacitação em territórios marginais 128
condição de busca por clientes mais exigentes, representará um postulado
importante para a modernização de setores econômicos locais.
3. Setores correlatos e de apoio: No processo de planejamento econômico de um setor
industrial, devem ser identificadas as diversas atividades que estão relacionadas,
tanto na condição de industrias e entidades correlatas, como industrias e entidades
de apoio. A presença dessa diversidade de segmentos de negócios consolida uma
vantagem competitiva.
4. Contexto para estratégia da empresa e concorrência: este ponto representa a
necessidade de se criar um ambiente local que encoraja o investimento em
atividade relacionada como inovação. A comunidade empresarial deve estar
mobilizada no sentido de buscar uma maior integração com as instituições públicas
e privadas, de forma a ter em suas mãos a política econômica local. Deve
prevalecer a visão de que a prosperidade econômica não é responsabilidade de um
único protagonista. Ela é determinada por todos os segmentos da sociedade civil, ou
seja, educadores, trabalhadores, profissionais liberais, todos devem fazer parte da
solução. As estratégias individuais devem ser complementadas pelas estratégias de
cunho geral, onde cada homem de negócio deve pegar para si a responsabilidade
de um governante.
Finalmente, espera-se que a gradativa consolidação de agrupamentos em espaços
marginalizados possa fomentar importantes vantagens tais como:
a) Agilidade na tomada de decisões, em função da massa critica de informações
geradas pela concentração de um mesmo ramo de negócio;
b) Realização de compras coletivas de insumos e máquinas e de projetos
conjuntos visando ao mercado externo;
c) Geração de novos empreendimentos que venha fortalecer mais o
aglomerado;
Capítulo v – Estratégia de capacitação em territórios marginais 129
d) Barateamento dos custos dos fornecedores em função da demanda
concentrada por produtos e serviços;
e) Atração de clientes fiéis em razão da maior eficiência das empresas
instaladas no aglomerado;
f) Facilidade de atrair e manter talentos devido ao clima de oportunidades na
região.
4) Estabelecimento de um processo de integração qualitativa
O que se propõe neste ponto é uma verdadeira integração entre os elementos
precedentes, com vista a um estagio de plenitude no que diz respeito a utilização dos
recursos disponibilizados para o fomento do desenvolvimento econômico local. A
criação de qualquer elemento e o seu funcionamento de forma isolada não garante
nenhum incremento econômico sólido. A experiência observada, em função da atuação
das diversas instituições na região norte fluminense, voltada para as atividades de
pesquisa, extensão, planejamento econômico, etc., em conjunto com a diversidade de
outros elementos para o desenvolvimento local corrobora a avaliação de que inexiste
um processo de integração qualitativa.
Assim, os três primeiros elementos (infra-estrutura pública, gestão participativa e
aglomeração) devem estruturar-se de forma que a sua integração possa combinar,
eficientemente, os recursos produtivos para gerar rendimentos crescentes, com
impactos positivos na inclusão de pequenas empresas e trabalhadores.
A ilustração dos elementos que compõem a estratégia de capacitação para regiões de
baixo crescimento econômico pode ser vista na figura a seguir:
Capítulo v – Estratégia de capacitação em territórios marginais 130
Composição dos elementos essenciais para a estratégia de capacitação de ambientes marginais
SISTEMA DE PRODUÇÃO LOCAL
DISTRITO INTEGRADOR
Processo de planejamento para
integração qualitativa
Identificação da infra-estrutura pública no
espaço local
Indução a criação de
“clusters”
Metodologia de gestão participativa para capacitação de
atores locais
Figura 13: Sistema de produção e elementos para estratégia de capacitação do espaço local Fonte: Adaptação da estrutura para inovar de Porter (2001)
CAPÍTULO VI
CONSIDERAÇÕES FINAIS E PROPOSTAS PARA NOVAS PESQUISAS
6.1 Considerações finais
Este trabalho desenvolveu uma observação sistemática da realidade presente em
regiões de perfil periférico e identificou alguns padrões de similaridade cristalizados nos
elementos: (i) baixo índice de crescimento; (ii) baixo nível de renda per capita; (iii) altas
taxas de desemprego; e, (iv) alto grau de desigualdade social.
Conseqüentemente, por hipótese, reconheceu a inexistência de um nível aceitável de
competitividade nos sistemas econômicos dessas regiões, fato este que conduziu a
análise a um processo de verificação geral sobre os modelos de crescimento
econômico (clássico, neoclássico, endógeno e redes de pequenas empresas), de
maneira a poder construir um melhor arcabouço de entendimento sobre os efetivos
fatores responsáveis pela criação de riqueza local.
O processo de verificação geral sobre os postulados teóricos do crescimento
econômico possibilitou um claro entendimento de que a preocupação com a geração de
riqueza não é recente. Entretanto, um sentimento bastante real é que parece estar
longe o fim da luta contra a pobreza e a desigualdade social que, modernamente,
constituem-se nos principais elementos de preocupação no mundo inteiro.
A análise dos postulados de geração de riqueza, neste trabalho, concentrou-se,
especialmente, no pós-guerra, onde se verificou o surgimento da teoria neoclássica do
Capítulo VI – Considerações finais e propostas para novas pesquisas 132
crescimento econômico, cuja visão mecanicista e otimista sobre um certo equilíbrio na
distribuição da riqueza entre países pobres e ricos, não se configurou. Contrariamente,
o que se verificou foi um aprofundamento ainda maior do processo de concentração
econômica.
Observou-se ainda, que durante pelo menos trinta anos a preocupação sobre
desenvolvimento cedeu lugar para a análise macroeconômica de curto prazo,
especialmente, em função do forte apelo do bem estar social intrínseco a Teoria
Keynesiana. Esta teoria, conseqüentemente, se transformou no sustentáculo de
regulação do novo sistema de acumulação capitalista, capitaneado por uma
organização industrial, caracterizada como fordista-taylorista, cujos princípios estavam
centrados na grande produção, na grande empresa e, fundamentalmente, nos grandes
projetos de infra-estrutura.
Este sistema de acumulação capitalista ainda se constituiu como base para o resgate
da discussão sobre desenvolvimento nos anos oitenta, onde Romer e outros
economistas ortodoxos trabalharam o postulado tecnologia numa concepção endógena,
na tentativa de explicar a produção de rendimentos crescentes como conseqüência da
inserção do conhecimento no processo produtivo. Claramente, esta análise sobre o
processo de acumulação priorizou, tão somente, as grandes empresas com pleno
domínio sobre a cadeia de valor (P&D, produção, gestão, marketing, logística, etc.).
Entretanto, apesar de pleno domínio desse sistema de acumulação mundialmente,
verificou-se no final dos anos setenta o surgimento de um novo sistema de organização
produtiva, exatamente, como alternativa ao processo corrente que, dado as suas
características, excluía as pequenas empresas e, conseqüentemente, um exército de
trabalhadores em regiões não centrais.
Esta nova sistemática restruturativa surgiu na forma de rede de pequenas empresas,
distritos industriais, etc., cuja característica principal se baseou na capacidade
associativa dos atores sociais no nível local. Na realidade, trata-se de um modelo que
integra a comunidade local aos sistemas produtivos, configurando um grupo de
Capítulo VI – Considerações finais e propostas para novas pesquisas 133
pequenas empresas associadas, cuja formatação dá vida a uma grande empresa virtual
com pleno domínio sobre a cadeia de valor.
Esse processo, caracterizado como sistema flexível de produção, substitui a lógica de
produção em massa; centralização produtiva e forte divisão do trabalho no interior de
grandes fábricas; para um processo de produção mais especializado e em menores
lotes; divisão do trabalho entre pequenas empresas; tecnologias mais flexíveis e a
definição do distrito como elemento de integração produtiva.
O aprendizado oriundo desse processo de verificação possibilitou um conjunto de
abstrações teóricas as quais permitiram algumas comparações envolvendo situações e
comportamento da realidade local, a região norte fluminense especificamente. Um
postulado particular e importante desta análise foi a identificação da ausência de
competência local, no que diz respeito a absorção dos elementos universais do distrito
industrial (produção e território, produção e cidadania e empresário político), o que
definiu a clara necessidade de intervenção sistêmica.
Conseqüentemente, a contribuição proposta pelo trabalho se definiu na sistematização
de uma estratégia para capacitar esses ambientes marginais, cuja composição dos
elementos essenciais estão assim representados: (i) em uma efetiva identificação da
infra-estrutura pública local, (ii) no desenvolvimento de um processo de gestão
participativa voltado para capacitar atores públicos e privados, (iii) na indução à criação
de aglomerados (clusters), e, fundamentalmente, (iv) no desenvolvimento de um
processo de planejamento de integração qualitativa. Esses elementos integram-se à luz
de um fluxo circular e são totalmente integrados ao sistema de produção visto na ótica
do distrito integrador.
6.2 propostas para novas pesquisas Considerando o contexto sócio-cultural como um fator relevante da análise e definição
do processo de organização produtiva local, percebe-se com este trabalho que existe
uma ampla coluna para a construção de uma metodologia de gestão participativa com
Capítulo VI – Considerações finais e propostas para novas pesquisas 134
perfil de adaptabilidade a regiões marginais. A existência de alguns modelos já
disponíveis não invalida esta proposta, já que cada região carrega suas próprias
características que, necessariamente, devem ser consideradas no ato da elaboração do
modelo.
Complementarmente, fortalece um sentimento real de que o “déficit” social nessas
regiões é muito elevado e precisa ser controlado imediatamente. Desta forma, torna-se
urgente a necessidade de implementação de ações corretivas ao modelo de
desenvolvimento corrente. Assim, uma proposta para novos trabalhos está
materializada na implementação efetiva da estratégia de capacitação local vislumbrada
por este trabalho, objetivando a inclusão de pequenas empresas e trabalhares
marginalizados.
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