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ESTADO LAICO NÃO É ESTADO ATEU
ESCOLA DE DIREITO DO BRASIL - EDB
CURSO AVANÇADO DE DIREITO CONSTITUCIONAL E PROCESSO
CONSTITUCIONAL
LUCIO RAIMUNDO HOFFMANN
ESTADO LAICO NÃO É ESTADO ATEU
São Paulo
2012
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ESCOLA DE DIREITO DO BRASIL - EDB
CURSO AVANÇADO DE DIREITO CONSTITUCIONAL E PROCESSO
CONSTITUCIONAL
LUCIO RAIMUNDO HOFFMANN
ESTADO LAICO NÃO É ESTADO ATEU
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à
Escola de Direito do Brasil – EDB - como requisito
parcial à obtenção do grau de especialista em
Direito Constitucional e Processo Constitucional.
Orientador: José Levi Mello do Amaral
Junior
São Paulo
2012
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO..........................................................................................................................................04
1 O QUE É ESTADO LAICO? DIFERENÇA ENTRE LAICIDADE E LAICISMO.......................07
2. O PREÂMBULO DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DE 1988.................08
3. O ESTADO LAICO BRASILEIRO....................................................................................................14
4. O ENTENDIMENTO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL......................................................22
5. O DESACERTO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL..............................................................23
CONCLUSÃO...........................................................................................................................................29
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.....................................................................................................31
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Introdução
Inicialmente, faz-se necessário destacar que o Estado existe em razão das pessoas e
não as pessoas existem em razão do Estado.
Diante disso, é necessária a compreensão a respeito da formação de um povo ou de
uma civilização. A civilização ocidental está calcada em três pilares, quais sejam: direito
romano; filosofia grega; moral judaico-cristã.
Esses três pilares foram os responsáveis pela formação social e cultural de todo o
ocidente. Os ensinamentos oriundos desses três pilares culminaram na diferenciação dos
povos ocidentais e dos povos orientais.
A moral judaico-cristã, principal pilar e que é abordada no presente trabalho, advêm
dos ensinamentos de Jesus Cristo, externados na Bíblia Sagrada.
O Cristianismo influenciou e doutrinou toda uma civilização, sendo que a Igreja foi
o meio para que os ensinamentos cristãos fossem disseminados para a coletividade. Para
isso, no decorrer dos séculos houve o estreitamento das relações entre a Igreja e o poder
governamental, seja ele através de reis, imperadores ou presidentes.
Em determinadas épocas e em determinados lugares, o representante maior do clero
era o mentor do governante. Todo o ato de governo passava pelo crivo da igreja. A
concordância do clero era essencial para que atos de governo fossem realizados. Fazendo
uma analogia com os dias de hoje, a Igreja funcionava como um controle prévio de
constitucionalidade das leis e dos atos governamentais. Essa situação começou a mudar no
século XVII com o pensamento Iluminista, eclodindo no século XVIII através da Revolução
Francesa.
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Dentre uma das fases da Revolução Francesa, destaca-se em 1790 a criação da
Constituição Civil do Clero, que separou a Igreja do Estado. Pode-se dizer que nesse
momento surgiu o Estado Laico.
A revolução francesa com os seus ideais “Liberté, Egalité, Fraternité”1 influenciou
todo o Ocidente. Com relação à separação entre Estado e Igreja não poderia ter sido
diferente.
A Constituição Brasileira de 1891, conhecida como Constituição da República, que
teve como ideólogos, dentre outros, Benjamin Constant e Rui Barbosa, os quais foram
influenciados pela laicidade francesa e norte-americana, consolidou no ordenamento jurídico
pátrio a separação entre Estado e Igreja. 2
Desde então, o Brasil é considerado um Estado Laico, porém aqui o conceito de
laicidade é deturpado, não sendo compreendido o real significado do instituto.
Hoje, temos no cenário brasileiro a tentativa de desconstrução do cristianismo.
Minorias estão buscando a tutela estatal para isso. O êxito judicial alcançado por elas em
alguns casos está convergindo o Brasil para um Estado ateu, forma de organização pregada
pelo marxismo e comunismo e idolatrada pela esquerda.
Corroborando com esse panorama, temos a imprensa que, além de não compreender
na essência o que é um Estado Laico, corrompe o conceito de laicidade, aproximando essa
do laicismo.
1 Liberdade, Igualdade, Fraternidade. 2 O primeiro dispositivo que separou a igreja do estado é datado de 1890, foi o decreto 119-A de 07/01/1890,
da lavra de Ruy Barbosa e expedido pelo Governo Provisório.
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Desta forma, ferida está a Democracia e o poder soberano do povo brasileiro que,
através dos seus representantes na Assembleia Constituinte, consolidou o Brasil como nação
Cristã.
Assim, o presente trabalho visa discutir o conceito de Estado Laico, bem como a
diferença entre laicidade e laicismo. Aborda-se, inicialmente, a natureza do Preâmbulo
Constitucional, englobando o Poder Constituinte e as discussões em sede de Assembleia
Nacional Constituinte. Após, discute-se o Estado Laico brasileiro segundo os dispositivos
constitucionais e a doutrina. Esta sessão objetiva demonstrar que o Brasil é uma nação cristã
e não ateia. Na parte final do trabalho, relata-se o posicionamento do Supremo Tribunal
Federal a respeito do assunto. Por fim, é feita a discussão sobre o desacerto do STF, com
base no conceito de democracia, soberania popular e a separação de poderes.
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1. O que é Estado Laico? Diferença entre laicidade e laicismo
Estado Laico em sentido estrito3 é composto de duas características: 1ª) Separação
administrativa entre Estado e Igreja; 2ª) Liberdade e proteção de crença;4
A separação administrativa entre Estado e Igreja é aquela que não permite gerência
mútua entre o Estado e qualquer religião. Assim, não existe uma religião oficial e o Estado
não pode interferir na gerência e administração das religiões.
A liberdade e proteção de crença é não obstar o direito à crença ou não crença de seus
habitantes, como também permitir a existência na crença de qualquer valor superior e
garantir o exercício desta crença (fé), protegendo os seus adeptos contra eventuais
discriminações.
A laicidade é a qualidade do laico, diferente do laicismo.
Em síntese, a laicidade é a característica dos Estados não confessionais, que
compreendem a separação entre o Estado e a Igreja e garante a proteção de crença e as
liberdades religiosas.5
Já o laicismo tem a primeira característica da laicidade, pois também prega a
separação entre o Estado e a Igreja. Já a segunda característica – liberdades e proteção da
crença - não encontra lugar no laicismo. No laicismo, a religião tem um valor negativo,
existindo intolerância ao cunho religioso das pessoas, independentemente de sua crença. O
laicismo não permite que as pessoas processem a sua fé. Pode-se afirmar que o marxismo, o
comunismo e alguns grupos de novos ateus são exemplos de ideologias que não toleram a
religião e proíbem ou criam discriminações para o exercício da fé.
3 Os teóricos fazem uma distinção entre Estado Laico em sentido amplo e em sentido estrito. 4 Essas características são oriundas da análise do núcleo duro da laicidade. 5 As liberdades religiosas podem ter de três formas, que serão explicadas no decorrer do trabalho.
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2. O Preâmbulo da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988
O preâmbulo de uma constituição é o resumo norteador da Carta Constitucional. Nele
é resumido o conjunto de direitos e valores que compõe o texto constitucional.
Segundo Luis Carlos Martins Alves Junior, o significado de um preâmbulo é:
O Preâmbulo é o conjunto de enunciados formulado pelo legislador
constituinte originário, situado na parte preliminar do texto
constitucional, que veicula a promulgação, a origem, as
justificativas, os objetivos, os valores e os ideais de uma
Constituição, servindo de vetor interpretativo para a compreensão do
significado das suas prescrições normativas e solução dos problemas
de natureza constitucional. 6
.
Num Estado Democrático de Direito, a competência pela elaboração de uma nova
constituição é dos representantes do povo. No caso brasileiro é da Assembleia Nacional
Constituinte. Trata-se do poder originário.
Por ocasião da mudança do regime governamental brasileiro, na década de 80, foi
realizada a pertinente eleição para a composição da Assembleia Nacional Constituinte.
Os constituintes eleitos estavam encarregados de elaborarem a nova Carta brasileira:
Constituição de 1988.
Era um tempo de ruptura e mudanças.
6 ALVES JR., Luís Carlos Martins. O preâmbulo da Constituição brasileira de 1988. Jus Navigandi,
Teresina, ano 13, n. 1649, 6 jan. 2008 . Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/10823>. Acesso
em: 16 dez. 2012.
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O debate sobre a laicidade teve início no processo de criação do Regimento Interno
da Assembleia Nacional Constituinte.7
O constituinte Salatiel de Carvalho solicitou a inclusão, no Regimento Interno, de
um artigo que dispunha “A Bíblia Sagrada deverá ficar sobre a mesa da Assembléia (sic)
Nacional Constituinte, à disposição de quem dela quiser fazer uso”.
Esta emenda foi rejeitada, sob o prisma da laicidade do Estado, pelo então
constituinte Fernando Henrique Cardoso. Neste momento, outro constituinte questionou
sobre a presença do crucifixo no Plenário. Para dar prosseguimento aos trabalhos, Fernando
Henrique colocou em votação a emenda, sendo esta aprovada por unanimidade.
O artigo 46 do Regimento Interno da Assembleia Nacional Constituinte ficou com a
redação segundo o proposto por Salantiel de Carvalho “A Bíblia Sagrada deverá ficar sobre
a mesa da Assembléia (sic) Nacional Constituinte, à disposição de quem dela quiser fazer
uso”.8
Já no processo de elaboração do novo texto constitucional, houve debates sobre o
teor do Preâmbulo da Constituição.
Colhemos da Comissão De Sistematização I – Ata Sucinta - Ata da 32ª Reunião
Extraordinária:
Concedo a palavra à nobre Constituinte Sandra Cavalcanti, que
falará pelo Partido da Frente Liberal.
A Sra. Constituinte Sandra Cavalcanti: –
Sr. Presidente, Srs. Constituintes:
No momento em que a Comissão de Sistematização inicia a fase
decisiva de sua participação na elaboração do novo texto
Constitucional, e é convocada para hoje decidir sobre o preâmbulo
da Constituição, em nome do Partido da Frente Liberal devo declarar
que votaremos um texto de preâmbulo que
7 JOANA ZYLBERSTAJN. O Princípio da Laicidade na Constituição Federal de 1988. 2012. 27 f. Tese
(Doutorado em Direito do Estado) Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2012. 8 Disponível em: < http://www2.camara.leg.br/atividade-
legislativa/legislacao/Constituicoes_Brasileiras/constituicao-cidada/publicacoes/regimento-interno-da-
assembleia-nacional/resolucao-2-1987/view>. Acesso em: 03 dez. 2012.
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Coloque, de fato, o Brasil sob a proteção de Deus, (Palmas) que
decida de forma muito clara que esta Constituição vem para ficar.
(...)
O Sr. Presidente (Afonso Arinos): – Tem a palavra o nobre Líder
Gastone Righi, do Partido Trabalhista Brasileiro.
O Sr. Constituinte Gastone Righi: – Sr.Presidente, Srs. Constituintes:
(...)
Portanto, eu recomendo, na condição de Líder da Bancada do PTB,
que fiquemos com o preâmbulo do Constituinte Aluízio Campos,
que, apesar da palavra "consolidar", que me pareceu muito
imprópria, consegue ser mais sintético, pelo menos mais simples e
objetivo: "os representantes da Nação brasileira livremente eleitos e
reunidos pela vontade soberana do povo em Assembléia Nacional
Constituinte, invocando a proteção de Deus, proclamam que esta
Constituição organiza a República Federativa do Brasil, em Estado
de Direito, para consolidar a liberdade, a fraternidade, a igualdade e
a justiça como postulados de valores supremos de uma sociedade
democrática, pluripartidária e sem preconceitos"
(...)
A proposta de colocar o termo “ sob a proteção de Deus” causou o descontentamento
dos constituintes com ideologia marxista.
Nesta mesma reunião, o deputado José Genoino apresentou uma emenda para
suprimir a proteção de Deus, nos seguintes termos:
Destaque nº 523/87 – Emenda nº 1p-06.650-6, do Sr. José Genoíno,
"que suprime a expressão sob a proteção de Deus, do Preâmbulo do
Projeto de Constituição". (3ª votação)
A emenda supressiva do Constituinte José Genoíno, que é a de nº
000523/87 é de uma expressão do texto. Dessa maneira, o
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Constituinte José Genoíno, como autor do destaque, tem a palavra
por 5 minutos; e, depois, terão a palavra, para falar contra, os
Constituintes Daso Coimbra e Enoc Vieira, também pelo prazo de 5
minutos, cada um.
O Sr. Constituinte José Genoíno:– Sr. Presidente, Sras. e Srs.
Constituintes:
A nossa emenda, supressiva da expressão "Reunidos sob a proteção
de Deus", em primeiro lugar, ela significa – e quero falar isso com
toda a franqueza de quem fez essa emenda – significa, em primeiro
lugar, um respeito profundo àqueles que estabelecem uma relação de
intimidade intrínseca e entre a divindade e a materialidade.
O ser humano, quando estabelece essa relação, entre a divindade e
as leis, entre a divindade e a ordem material, ele está entrando num
terreno de sua intimidade profunda, e essa intimidade deve ser tão
respeitada que ela não pode ser estabelecida, enquanto um critério, a
ser colocado no preâmbulo de uma Constituição, ou no preâmbulo
de um Regimento Interno.
Em segundo lugar, Sr. Presidente, essa questão envolve conteúdo do
próprio Substitutivo. Em vários momentos, o Substitutivo garante a
liberdade de crença; em vários momentos, o Substitutivo estabelece
os requisitos de um Estado laico. E para ser coerente com esses
pressupostos, o Substitutivo não pode iniciar o preâmbulo da
Constituição com a expressão "que os representantes do povo
brasileiro, reunidos sob a proteção de Deus", porque fere, na frente,
proposições do respeito e da liberdade de crença.
O outro argumento importante, Sr. Presidente, é que essa formulação
apareceu, pela primeira vez, nas Constituições brasileiras, na
Constituição do Império, onde se invocava a Santíssima Trindade;
na Constituição Republicana, exatamente no momento em que a luta
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democrática sobre a separação entre a religião e o Estado teve um
momento importante com a Proclamação da República, a
Constituição de 1891 simplesmente se omite sobre esse ponto; e a
Constituição de 1934, que recupera a formulação "sob a proteção de
Deus".
E para não dizer que está falando aqui um marxista, que está
seguindo algum modelo de alguma Constituição socialista, trouxe,
para a tribuna, as Constituições da Itália, da França, dos Estados
Unidos, de Portugal e da Inglaterra. E essas Constituições, em seus
preâmbulos, não colocam o problema nos termos em que está posto
no preâmbulo da nossa Constituição.
Ao me referir a essas Constituições, Sr. Presidente, estamos aqui
para concluir esse encaminhamento, tocando num problema
importante e, certamente, essa votação vai refletir o nível de
entendimento que teremos na Constituição, porque vamos fazer uma
Constituição com a visão histórico filosófica da modernidade dos
nossos dias, em que há um respeito profundo aos que acreditam, e
esse respeito significa não vulgarizar essa crença, porque colocar no
texto constitucional é uma vulgaridade, colocar no texto
constitucional significa banalizar algo que é muito profundo, para as
pessoas que têm uma relação – como já falei – entre a divindade e
amaterialidade. Por outro lado, significa o respeito, também, àqueles
Constituintes que estão reunidos nesta Assembléia Nacional
Constituinte, que vão promulgar uma Constituição e que, por razões
filosóficas, não têm essa relação da divindade, com relação a Deus.
E na medida em que se diz, que a Constituição será promulgada "sob
a proteção de Deus", está-se estabelecendo uma discriminação sobre
esses Constituintes, porque existem Constituintes que não
estabelecem essa relação.
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Não estamos fazendo uma Constituição para a maioria na questão
filosófica ou ético-moral, porque, senão, está-se impondo uma
Constituição que nessas questões vai ferir o pluralismo, vai ferir a
liberdade de crença, vai ferir a liberdade de religião. Pergunto: há
muitas posições que diferem da religião católica, como ficariam com
o argumento de dizer aqui que a maioria vai colocar no dia em que a
religião católica fosse maioria e impusesse às outras religiões uma
determinada formulação? Não é esse o caminho, o caminho é o que
estabelecemos na Constituição uma formulação que possa garantir a
liberdade de culto, até às últimas conseqüências.
Não vamos falar em liberdade de culto se em seguida eliminamos
essa liberdade de culto; não vamos falar em liberdade de crença se,
em seguida, dizemos que essa crença tem que existir apenas de
acordo com aquilo que acreditamos.
Sr. Presidente, para concluir esse encaminhamento, é com uma visão
aberta ao pluralismo ideológico, filosófico, ético e moral, à
modernidade dos nossos dias, que defendemos a supressão da
expressão "Sob a proteção de Deus". Muito obrigado.
Iniciando a votação, importante é salientar o voto do Constituinte Roberto Freire.
O Sr. Constituinte Roberto Freire: –
Declaração de voto, como marxista, ateu. O Partido, inclusive em
outras oportunidades, votava pela exclusão de qualquer referência a
Deus. Mas quero dizer que o Partido Comunista Brasileiro, na
perspectiva de modernidade que existe no mundo socialista, não quer
desrespeitar um sentimento deísta e religioso do povo brasileiro.
Portanto, voto não!
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O resultado da votação foi:
O Sr. Presidente (Brandão Monteiro): – A Mesa vai proclamar o
resultado: votou SIM 1 Constituinte; votaram NÃO 74 Constituintes.
Total: 75 votos. O destaque foi rejeitado.
Está mantido o texto do preâmbulo "sob a proteção de Deus".9
Aprovada a manutenção da proteção de Deus, o texto final do preâmbulo da
Constituição teve a seguinte redação.
Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembléia
Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático,
destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a
liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade
e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna,
pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e
comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução
pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a
seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO
BRASIL.
No processo que envolveu toda a criação do novo texto constitucional brasileiro,
desde a formatação do regimento interno até a promulgação da constituição, ficou clara a
vontade do constituinte, qual seja: externar que o Brasil é uma nação cristã. Isso pode ser
afirmado em dois momentos.
9 Disponível em: <http://www.senado.gov.br/publicacoes/anais/constituinte/9b%20-
%20SISTEMATIZA%C3%87%C3%83O.pdf >. Acesso em: 05 dez. 2012
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1º) Optou-se por disponibilizar uma Bíblia nas reuniões da Assembleia Nacional
Constituinte; 2º) Na Constituição de 88, foi inserido que a nossa Carta foi promulgada sob a
proteção de Deus.
A vontade popular numa democracia é soberana. Não podia ser diferente no processo
de formação da nova constituição. Os constituintes, representantes do povo, declararam
expressamente que o Brasil é uma sociedade Cristã.
3. O Estado Laico brasileiro
A Constituição de 1988 que foi promulgada sob “a proteção de Deus”, trouxe, em
seu bojo, inúmeros dispositivos que levam a crer que o Estado brasileiro é laico, mas em
nenhum momento determina que o Estado é ateu.
Do artigo 5º:10
VI - é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado
o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a
proteção aos locais de culto e a suas liturgias;
VII - é assegurada, nos termos da lei, a prestação de assistência
religiosa nas entidades civis e militares de internação coletiva;
VIII - ninguém será privado de direitos por motivo de crença
religiosa ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar
para eximir-se de obrigação legal a todos imposta e recusar-se a
cumprir prestação alternativa, fixada em lei;
10 BRASIL – Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, de 05 de outubro de 1988.
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O artigo 19, I:
Art. 19. É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos
Municípios:
I - estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-
lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações
de dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de
interesse público;
O artigo 143, §1:
Art. 143. O serviço militar é obrigatório nos termos da lei.
§ 1º - às Forças Armadas compete, na forma da lei, atribuir serviço
alternativo aos que, em tempo de paz, após alistados, alegarem imperativo
de consciência, entendendo-se como tal o decorrente de crença religiosa e
de convicção filosófica ou política, para se eximirem de atividades de
caráter essencialmente militar.
O artigo 150, VI, “b”:
Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é
vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
VI - instituir impostos sobre:
b) templos de qualquer culto;
O artigo 210, §1:
Art. 210. Serão fixados conteúdos mínimos para o ensino fundamental, de
maneira a assegurar formação básica comum e respeito aos valores
culturais e artísticos, nacionais e regionais.
§ 1º - O ensino religioso, de matrícula facultativa, constituirá disciplina dos
horários normais das escolas públicas de ensino fundamental.
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O artigo 226, §2:
Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.
§ 2º - O casamento religioso tem efeito civil, nos termos da lei.
Como já explicado, o Estado Laico é composto de duas características: 1ª) Separação
administrativa entre Estado e a Igreja; 2ª) Liberdade e proteção de crença;
No caso brasileiro, a separação administrativa é em decorrência do artigo 19, I da
CF.
José Afonso da Silva, com maestria explica o sentido dessa separação:
(a) Separação e colaboração. De acordo com o art. 19, I, é vedado à União,
aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios estabelecer cultos
religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o exercício ou
manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou
aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse
público. Pontes de Miranda esclareceu bem o sentido das várias
prescrições nucleadas nos verbos do dispositivo: “estabelecer cultos
religiosos está em sentido amplo: criar religiões ou seitas, ou fazer
igrejas ou quaisquer postos de prática religiosa, ou propaganda.
Subvencionar cultos religiosos está no sentido de concorrer, com
dinheiro ou outros bens da entidade estatal, para que se exerça a
atividade religiosa. Embaraçar o exercício dos cultos religiosos
significa vedar, ou dificultar, limitar ou restringir a prática, psíquica ou
material, de atos religiosos ou manifestações de pensamento
religioso”. Para evitar qualquer forma de embaraços por via tributária,
a Constituição estatui imunidade dos templos de qualquer culto (art.
150, VI, b). Não se admitem também relações de dependência ou de
aliança com qualquer culto, igreja ou seus representantes, mas isso não
impede as relações diplomáticas com o Estado do Vaticano, porque aí
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ocorre relação de direito internacional entre dois Estados soberanos,
não de dependência ou de aliança, que não pode ser feita. 11
Ainda, essa separação diz respeito também à questão tributária (CF, art. 150, VI, b).
O constituinte, ao propor a separação entre Estado e Igreja, não o fez somente para que a
Igreja não interferisse nas relações do Estado. Fez, também, para que o Estado não interfira
na administração das Igrejas, para isso dotou-as de imunidade tributária.
Já a segunda característica do Estado Laico Brasileiro, ou seja, “Liberdade e Proteção
de Crença” diz respeito a: liberdade de crença; não discriminação em virtude de crença;
garantia do exercício da fé; proteção aos locais de culto; direito do cidadão receber a
prestação religiosa mesmo em casos de internato ou internação; dentre outras garantias.
Ademais, pode-se afirmar que o Constituinte teve o intuito de incentivar a população
a buscar algum tipo de prestação religiosa.
Quando foi dada a imunidade tributária para os locais de culto, o legislador originário
incentivou a abertura de templos e similares. O governo, quando quer incentivar determinado
setor da economia, reduz a carga tributária daqueles bens. O caso dos templos é
emblemático. Os templos não pagam nenhum tributo, o que fomentou a abertura de milhares
de igrejas, das mais diversas religiões. Caso o constituinte tivesse o objetivo de transformar
o Brasil em um Estado ateu, razão não existiria para a imunidade tributária dos templos.
Outro ponto que confirma que o Estado Brasileiro não é ateu e sim Cristão se baseia
nos mandamentos divinos bíblicos que foram incorporados ao nosso ordenamento jurídico.
DO DECÁLOGO O NOSSO ORDENAMENTO
JURÍDICO
3º Mandamento - Guardar domingos e
festas de guarda.
Constituição Federal – art. 7, XV –
repouso semanal remunerado,
preferencialmente aos domingos;
4° Mandamento- Honrar pai e mãe12 Constituição Federal - Art. 229. Os pais
têm o dever de assistir, criar e educar os
11 SILVA, José Afonso – Curso de Direito Constitucional Positivo, 31 ed. São Paulo: Malheiros, 2008. p.
251/252 12 O Código Penal considera um agravante o crime cometido contra os ascendentes. -Art. 61 - São
circunstâncias que sempre agravam a pena, quando não constituem ou qualificam o crime.
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filhos menores, e os filhos maiores têm o
dever de ajudar e amparar os pais na
velhice, carência ou enfermidade.
5° Mandamento - Não matar; Código Penal –Art. 121. Matar alguém:
Pena - reclusão, de seis a vinte anos.
7° Mandamento- Não roubar; Código Penal -Art. 155 - Subtrair, para si
ou para outrem, coisa alheia móvel:
Pena - reclusão, de um a quatro anos, e
multa.
Código Penal Art. 157 - Subtrair coisa
móvel alheia, para si ou para outrem,
mediante grave ameaça ou violência a
pessoa, ou depois de havê-la, por
qualquer meio, reduzido à
impossibilidade de resistência:
Pena - reclusão, de quatro a dez anos, e
multa.
8°Mandamento - Não levantar falso
testemunho;
Código Penal - Art. 138 - Caluniar
alguém, imputando-lhe falsamente fato
definido como crime.
Código Penal - Art. 342. Fazer afirmação
falsa, ou negar ou calar a verdade como
testemunha, perito, contador, tradutor ou
intérprete em processo judicial, ou
administrativo, inquérito policial, ou em
juízo arbitral.
Código de Processo Civil - Art. 415. Ao
início da inquirição, a testemunha
prestará o compromisso de dizer a
verdade do que souber e Ihe for
perguntado.
e) contra ascendente, descendente, irmão ou cônjuge;
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Parágrafo único. O juiz advertirá à
testemunha que incorre em sanção penal
quem faz a afirmação falsa, cala ou oculta
a verdade.
Analisando o comparativo acima, sem fazer nenhum esforço intelectual ou criar
alguma tese, verificamos que dos 10 (dez) mandamentos divinos, 5 (cinco) deles fazem-se
presentes no ordenamento jurídico brasileiro. Assim, como negar que o Brasil é uma nação
cristã? Qual o fundamento para transformar o Brasil numa nação ateísta?
Mesmo o Brasil sendo uma nação cristã, em respeito ao Princípio da Liberdade, a
liberdade religiosa foi garantida em nossa Carta, assim explica José Afonso da Silva.
Ela se inclui entre as liberdades espirituais. Sua exteriorização é forma de
manifestação do pensamento. Mas, sem dúvida, é de conteúdo mais
complexo pelas aplicações que suscita. Ela compreende três formas de
expressão (três liberdades): a) a liberdade de crença; b) a liberdade de
culto; c) e a liberdade de organização religiosa. Todas estão garantidas na
Constituição.
(a)Liberdade Crença: A constituição de 1967/1969 não previa a liberdade
de crença em si, mas apenas a liberdade de consciência e, na mesma
provisão, assegurava aos crentes o exercício dos cultos religiosos (artigo
153 parágrafo 5o). Então, a liberdade de crença era garantida como simples
forma da liberdade de consciência. A Constituição de 1988 voltou à
tradição da Constituição de 1946, declarando inviolável a liberdade de
consciência e de crença (artigo 5o inciso VI) e logo no inciso VIII estatui
que ninguém será privado de seus direitos por motivo de crença religiosa.
Fez bem o constituinte em destacar à liberdade de crença da de consciência.
Ambas são inconfundíveis – di-lo Pontes de Miranda -, pois, o
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“decrescente também tem liberdade de consciência e pode pedir que se
tutele juridicamente tal direito”, assim como a “liberdade de crença
compreende a liberdade de Ter uma crença e a de não ter crença.”
Na liberdade de crença entra a liberdade de escolha da religião, a liberdade
aderir a qualquer seita religiosa, a liberdade (ou o direito) de mudar de
religião, mas também compreende a liberdade de não aderir a religião
alguma, assim como a liberdade de descrença, a liberdade de ser ateu e de
exprimir o agnosticismo. Mas não compreende a liberdade de embaraçar o
livre exercício de qualquer religião, de qualquer crença. Pois aqui também
a liberdade de alguém vai até onde não prejudique a liberdade dos outros.”
(b) Liberdade de culto: a religião não é apenas sentimento sagrado puro.
Não se realiza na simples contemplação do ente sagrado, não é simples
adoração a Deus. Ao contrário, ao lado de um corpo de doutrina, sua
característica básica se exterioriza na prática dos ritos, no culto, com suas
cerimônias, manifestações, reuniões, fidelidades aos hábitos, às tradições,
na forma indica pela religião escolhida. Na síntese de pontes Miranda:
“compreendem-se na liberdade de culto a de orar e de praticar os atos
próprios das manifestações exteriores em casa ou em público, bem como o
recebimento de contribuições para isso. Na síntese de pontes Miranda:
“compreendem-se na liberdade de culto a de orar e de praticar os atos
próprios das manifestações exteriores em casa ou em público, bem como o
recebimento de contribuições para isso.
(...)
A Constituição ampliou essa liberdade e até prevê-lhe uma garantia
específica. Diz, no art. 5º, VI, que é assegurado o livre exercício dos cultos
religiosos e garantida, na forma da lei, proteção aos locais de culto e a suas
liturgias.
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(...)
O dispositivo transcrito compõe-se de duas partes: assegura a liberdade de
exercício dos cultos religiosos, sem condicionamentos, e protege os locais
de culto e suas liturgias, mas aqui, na forma da lei. É evidente que não é a
lei que vai definir os locais do culto e suas liturgias. Isso é parte da
liberdade de exercício dos cultos, que não está sujeita a condicionamento.
É claro que há locais, praças por exemplo, que não são propriamente locais
de culto. Neles se realizam cultos, mais no exercício da liberdade de
reunião do que no da liberdade religiosa. A lei poderá definir melhor esses
locais não típicos de culto, mas necessários ao exercício da liberdade
religiosa. E deverá estabelecer normas de proteção destes e dos locais em
que o culto normalmente se verifica, que são os templos, edificações com
as características próprias da respectiva religião. Aliás, assim o tem a
Constituição, indiretamente, quando estatui a imunidade fiscal sobre
“templos de qualquer culto” (art. 150, VI, b ). Mas a liberdade de culto se
estende à sua prática nos lugares e logradouros públicos, e aí também ele
merece proteção da lei.
Enfim, cumpre aos poderes públicos não embaraçar o exercício dos cultos
religiosos (art. 19, I) e protegê-los, impedindo que outros o façam.
(c)Liberdade de organização religiosa: essa liberdade diz respeito à
possibilidade de estabelecimento e organização das igrejas e suas relações
com o Estado.
Quanto à relação Estado-Igreja, três sistemas são observados: a confusão,
a união e a separação, cada qual com gradações. Mal nos cabe dar notícias
desses sistemas aqui. Na confusão, o Estado se confunde com determinada
religião, é o Estado teocrático, como o Vaticano e os Estados islâmicos. Na
hipótese da união, verificam-se relações jurídicas entre o Estado e
determinada igreja no concernente à sua organização e funcionamento,
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como, por exemplo, a participação daquele na designação dos ministros
religiosos e sua remuneração. Foi o sistema do Brasil Império.
(...)
A República principiou estabelecendo a liberdade religiosa com a
separação da Igreja do Estado. Isso se deu antes da constitucionalidade do
novo regime, com o Decreto 119-A, de 7 de setembro de 1890, da lavra de
Ruy Barbosa, expedido pelo Governo Provisório".
A Constituição de 1891 consolidou essa separação e os princípios básicos
da liberdade religiosa (arts.11, §2; 72, §§ 3º a7º; 28 e 29). Assim, o Estado
brasileiro se tornou laico, admitindo e respeitando todas as vocações
religiosas.
(...)
Os princípios básicos continuaram nas constituições posteriores até a
vigente. 13
Por todo o exposto, ficou demonstrado que o Estado brasileiro não é ateu e sim um
Estado cristão.
4. O entendimento do Supremo Tribunal Federal
O Supremo Tribunal Federal (STF) teve que enfrentar a questão “sob a proteção de
Deus” inserida no Preâmbulo Constitucional, na Ação Direta de Inconstitucionalidade
2.076-5 - Acre, proposta pelo Partido Social Liberal – PSL 14, por omissão da expressão
“Sob a Proteção de Deus” na Constituição do Estado do Acre.
13 SILVA, José Afonso – Op. Cit. P. 248/251 14 Disponível em: < http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=375324>. Acesso
em: 20 nov. 2012
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Neste julgamento, apesar do objeto da ação direta ter versado sobre a ausência da
expressão supracitada, o STF adentrou no campo da laicidade do Estado.
A Constituição do Acre na época15 não reproduziu o Preâmbulo da Constituição, esse
era o cerne da ADI.
Existem três correntes a respeito da natureza de um preâmbulo, sobre as quais o
Relator Ministro Carlos Velloso, citando Jorge Miranda, discorreu em seu voto.
O preâmbulo, segundo Jorge Miranda, "proclamação mais ou menos
solene, mais ou menos significante, anteposta ao articulado constitucional
não é componente necessário de qualquer Constituição, mas tão somente
um elemento natural de Constituições feitas em momentos de ruptura
histórica ou de grande transformação político-social." (Jorge Miranda,
"Estudos sobre a Constituição", pág. 17). Teria o preâmbulo relevância
jurídica? Jorge Miranda registra três posições da doutrina a respeito do
tema: "a tese da irrelevância jurídica; a tese da plena eficácia, colocando o
preâmbulo em pé de igualdade com quaisquer disposições constitucionais;
entre as duas, a tese da relevância jurídica indireta, não confundindo
preâmbulo e preceitos normativos. Para quem defende a primeira tese, o
preâmbulo não se situa no domínio do Direito, situa-se no domínio da
política; para quem defende a segunda, ele acaba por ser também um
conjunto de normas jurídicas, conquanto sob forma não articulada; para
quem defende a terceira, o preâmbulo participa das características jurídicas
da Constituição, mas resta saber que papel lhe cabe no seu sistema global."
E acrescenta o mestre da Universidade de Lisboa que essa terceira maneira
de ver é a que tem o seu apoio, mas reconhece que o preâmbulo "não cria
direitos ou deveres" e que "não há inconstitucionalidade por violação do
preâmbulo." (Jorge Miranda, ob. cit., págs. 22 e 24).
15 A expressão “sob a proteção de Deus” foi inserida na constituição acreana por força da Emenda
Constitucional nº 19/2000.
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O STF julgou improcedente a ação, utilizando como fundamento a tese da
irrelevância jurídica, a qual aduz que o preâmbulo não está no domínio do Direito e sim no
domínio da política.
Para justificar a escolha da tese acima, o Ministro Relator adentrou no campo da
laicidade do Estado.
“Não se pode afirmar que esse preâmbulo (da Constituição do Acre) está
dispondo de forma contrária aos princípios consagrados na Constituição
Federal. Ao contrário, enfatiza ele, por exemplo, os princípios democrático
e da soberania popular. Só não invoca a proteção de Deus. Essa invocação,
todavia, posta no preâmbulo da Constituição Federal, reflete,
simplesmente, um sentimento deísta e religioso, que não se encontra
inscrito na Constituição, mesmo porque o Estado brasileiro é laico,
consagrando a Constituição a liberdade de consciência e de crença (CF, art.
5º), certo que ninguém será privado de direitos por motivo de crença
religiosa ou de convicção filosófica ou política (CF, art. 5º, VIII). A
Constituição é de todos, não distinguindo entre deístas, agnósticos ou
ateístas” (g.n)
Esse entendimento do STF, a nosso ver, está equivocado, como será explicado no
capítulo abaixo.
5. O desacerto do Supremo Tribunal Federal
Ao escolher a tese da irrelevância jurídica e, por consequência, julgando
improcedente a Adin - 2.076-5, o STF afrontou a Constituição Federal, ofendendo a
Separação dos Poderes e a Soberania Popular.
Como já explicado, a expressão “sob a proteção de Deus” foi inserida no Preâmbulo
por anseio dos constituintes.
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Esse anseio representava a vontade do povo e esta é soberana16, no contrário o regime
não se chamaria democracia.
Segundo José Afonso da Silva:
5. Democracia é conceito histórico. Não sendo por si um valor-fim,
mas meio e instrumento de realização de valores essenciais de
convivência humana, que se traduzem basicamente nos direitos
fundamentais do homem, compreende-se que a historicidade destes
a envolva na mesma medida, enriquecendo-lhe o conteúdo a cada
etapa do evolver social, mantido sempre o princípio básico de que
ela revela um regime político em que o poder repousa na vontade do
povo. Sob esse aspecto, a democracia não é um mero conceito
político abstrato e estático, mas é um processo de afirmação do povo
e de garantia dos direitos fundamentais que o povo vai conquistando
no correr da história”.
(...)
11. A essência da democracia não se altera, contudo, pois está no
fato de o poder residir no povo. Democracia, para ser tal, repousa
na vontade popular no que tange à fonte, exercício e objetivo do
poder em oposição aos regimes autocráticos em que o poder emana
do chefe, do caudilho, do ditador. (g.n)
(...)
14. Os valores da democracia são a igualdade e a liberdade; ou, em
palavras mais abrangentes: a democracia é regime de garantia geral
da realização dos direitos fundamentais do Homem, que se
fundamenta em dois princípios primários: a) o da soberania popular,
segundo o qual o povo é a única fonte do poder (o poder emana do
povo); b) a participação do povo no poder, para que este seja efetiva
16 BRASIL – Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, de 05 de outubro de 1988. art. 1º-
Parágrafo único - Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou
diretamente, nos termos desta Constituição.
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expressão da vontade popular. Nos casos em que essa participação é
indireta, surge um princípio secundário: o da representação. 17
Quando o STF decidiu que o Preâmbulo não tem força normativa e que a invocação
“sob a proteção de Deus”, reflete, simplesmente, um sentimento deísta e religioso, que não
se encontra inscrito na Constituição18, o STF ignorou a vontade popular e privilegiou as
correntes ideológicas marxistas que, em sede de Assembleia Nacional Constituinte, restaram
perdedoras.
O Preâmbulo não figura ao acaso na Constituição Federal. Ele foi fruto de debates e
votações na Constituinte e tem sim força normativa.
Segundo Nagib Slaibi Filho:
Embora alguns autores neguem qualquer juridicidade ao preâmbulo,
considerando-o como mera declaração de princípios, entende-se que,
justamente por ser uma declaração de princípios, o preâmbulo deve
ser levado em conta na interpretação das normas constitucionais, eis
que demonstram a verdadeira teleologia e alcance delas. O
preâmbulo é, assim, dispositivo jurídico e não mero enunciado
político.
É inegável o valor jurídico do preâmbulo constitucional, tanto assim
que, mesmo aqueles que lhe negam aplicabilidade, o reconheceram
como fonte de princípios gerais de direito ou como diretriz de
atuação para o Poder Público (Pontes de Miranda) ou mesmo como
norma jurídica. 19
O Procurador da Fazenda, Luiz Carlos Martins Alves Jr., citando Luiz Pinto Ferreira
ensina:
17 SILVA, Jose Afonso da. Poder Constituinte e Poder Popular. 1ª ed. São Paulo: Malheiros, 2002. p. 43/47 18 Disponível em: < http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=375324>. Acesso
em: 20 nov. 2012 19 SLAIBI FILHO, Nagib. Anotações à Constituição de 1988 – Aspectos Fundamentais. 3ª ed. Rio de Janeiro:
Forense, 1992. p. 104
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Luiz Pinto Ferreira (Curso de Direito Constitucional, São Paulo:
Saraiva, 1999, p. 71) informa a raiz latina da expressão preâmbulo
moldada da conexão de dois elementos, o prefixo “pre” (antes,
sobre) e o verbo “ambulare” (passear, andar, caminhar, marchar).
Esse referido autor acolhe a tese de que o Preâmbulo é parte
integrante do texto constitucional e tem o mesmo valor que a
Constituição, estando acima das normas infraconstitucionais, pois
revela a intenção do legislador constituinte originário. 20
Por outro lado, o STF é contraditório. Em alguns julgamentos, o STF se posicionou
no sentido de que o preâmbulo tem força normativa.
6 -Salutar, agora, uma nova releitura do Preâmbulo da Constituição, lapidar
escritura lavrada pelos constituintes originários, capaz de mostrar que a
Emenda Constitucional nº 12/96 - e não a EC nº 21/99 - é a verdadeira raiz
da inconstitucionalidade da CPMF que hoje é cobrada no país, na esteira
de esdrúxula prorrogação.
7 - À luz dos princípios explicitados no Preâmbulo, o intérprete do art. 154,
inc. I, da Constituição chegará facilmente à visão do grau de
incompatibilidade que existe entre o art. 74 do ADCT, introduzido pela EC
nº 12/96, e a Constituição da República como um todo: o povo,
majoritariamente constituído de cidadãos-contribuintes-consumidores, foi
a toda evidência ignorado.21
A escolha feita pela Lei de Biossegurança não significou um desprezo ou
desapreço pelo embrião "in vitro", porém u'a (sic) mais firme disposição
para encurtar caminhos que possam levar à superação do infortúnio alheio.
Isto no âmbito de um ordenamento constitucional que desde o
20 ALVES JR., Luís Carlos Martins. Op. Cit. 21 Recurso Extraordinário n. 370828
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seu preâmbulo qualifica "a liberdade, a segurança, o bem-estar, o
desenvolvimento, a igualdade e a justiça" como valores supremos de uma
sociedade mais que tudo "fraterna"
O princípio fundamental da dignidade da pessoa humana opera por modo
binário, o que propicia a base constitucional para um casal de adultos
recorrer a técnicas de reprodução assistida que incluam a fertilização
artificial ou "in vitro". De uma parte, para aquinhoar o casal com o direito
público subjetivo à "liberdade" (preâmbulo da Constituição e seu art. 5º),
aqui entendida como autonomia de vontade. 22
1. O candidato com visão monocular padece de deficiência que
impede a comparação entre os dois olhos para saber-se qual deles é
o "melhor". 2. A visão univalente -- comprometedora das noções de
profundidade e distância -- implica limitação superior à deficiência
parcial que afete os dois olhos. 3. A reparação ou compensação dos
fatores de desigualdade factual com medidas de superioridade
jurídica constitui política de ação afirmativa que se inscreve nos
quadros da sociedade fraterna que se lê desde o preâmbulo da
Constituição de 1988. 4. Recurso ordinário provido. 23
Quando a decisão judicial supracitada vedou os valores cristãos, ela privilegiou os
valores ateus. Visto que se os ateus, minoria no Brasil, alcançam o seu objetivo de suprimir
qualquer manifestação cristã, tem-se a afirmação da concretização dos ditames ateus na
sociedade brasileira.
Manuel Gonçalves Ferreira Filho afirma que a Constituição não é ateia.
22 Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 3510/DF 23 Recurso Ordinário em Mandado de Segurança n. 26071/DF
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Esta Constituição segue em princípio o modelo de separação, mas a
neutralidade que configura é uma “neutralidade” benevolente,
simpática à religião e às igrejas. É o que decorre das normas adiante
assinaladas:
1) A Constituição não é atéia. Invoca no Preâmbulo o nome de Deus (o
que já fazia a Constituição de 1934), pedindo-lhe proteção.
2) Aceita como absoluta a liberdade de crença (art. 5, VI)
3) Consagra a separação entre Igreja e Estado (art. 19, I)
4) Admite, porém, a “colaboração de interesse público” (art. 19, I, in
fine).
5) Permite a “escusa de consciência”, aceitando que brasileiro se
recuse, por motivos de crença, a cumprir obrigação a todos imposta (art.
5º, VIII), desde que aceite obrigação alternativa. (Caso não o faça, ocorrerá
a perda dos direitos políticos – arts. 5º, VIII, e 15, IV)
6) Assegura a liberdade de culto (art. 5º, VI) (subentendida a limitação
de ordem pública).
7) Garante a “proteção dos locais de culto e das liturgias, mas na forma
da lei”.
8) Favorece as igrejas, assegurando-lhes a imunidade quanto a
impostos incidentes sobre seus templos (art. 150, VI, b). 24
Com o resultado da decisão do STF na Adin - 2.076-5, houve a quebra da Separação
dos Poderes e ficou instituído o governo da ideologia de uma minoria que, por meio de
decisão judicial, impõe a sua vontade para toda uma maioria. Assim, não temos mais
democracia e sim a ditadura da minoria em face da maioria.
24 SANTOS JUNIOR, Aloisio Cristovam dos . A laicidade estatal no direito constitucional brasileiro. Jus
Navigandi (Teresina), v. Ano 12, p. n. 1768, 2008.) Apud - FERREIRA FILHO, Manuel Gonçalves. Religião,
Estado e Direito, Revista Direito Mackenzie, Ano 3, n. 2, p. 89 - Disponível
em: <http://pt.scribd.com/doc/63886451/A-Laicidade-Estatal-No-Direito-Constitucional-Brasileiro>. Acesso
em: 10 nov. 2012
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CONCLUSÃO
Com esse estudo, foram expostos elementos que defendem que o Brasil é uma nação
cristã e não uma nação ateia.
A forma de governo em vigor no Brasil é a democracia, está é caracterizada pela
vontade popular. No caso brasileiro, são eleitos os representantes do povo e a esses cabem a
tarefa de externar a vontade popular.
Na Assembleia Nacional Constituinte que elaborou a Constituição de 1988, os
Constituintes foram claros ao afirmar que essa é uma nação Cristã.
A inserção da expressão “sob a proteção de Deus” no preâmbulo constitucional não
foi um ato ditatorial e sim um ato de democracia. O constituinte José Genoíno apresentou
uma emenda supressora visando à retirada da expressão supracitada. Indo para votação, de
75 votos, apenas 01 constituinte votou a favor da emenda proposta por José Genoíno.
Mesmo sendo o Brasil uma nação crista, com respeito ao Princípio da Liberdade
Religiosa, vários dispositivos foram inseridos na constituição. Dentre eles, o art. 19, I, que
veda à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, estabelecer cultos religiosos
ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus
representantes, relações de dependência ou aliança.
Esse dispositivo é que está causando um debate nacional pela interpretação errônea.
O art. 19, I, remete à laicidade, mas alguns grupos o interpretam remetendo ao laicismo.
Com o presente trabalho, foi apresentado o conceito de Estado Laico e mostrada à
diferença entre laicidade e laicismo.
Foi abordada também a questão da força normativa do preâmbulo constitucional na
visão de alguns doutrinadores e na ótica do Supremo Tribunal Federal.
O STF entende que o preâmbulo não tem força normativa. No nosso entendimento
esse posicionamento do STF é temeroso, uma vez que fere a democracia, a soberania popular
e a separação dos poderes.
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O reflexo disso corresponde às mais diversas ações judiciais propostas no Brasil, as
quais têm como objetivo extirpar a cultura cristã. Citamos como exemplo a ação proposta
pela Liga Brasileira de Lésbicas para a retirada dos crucifixos dos prédios do judiciário
gaúcho.
Acertada seria a decisão do STF que respeitasse a vontade popular e declarasse que
o Brasil é uma nação Cristã, a qual garante a liberdade religiosa nas três modalidades
explicadas no presente trabalho, segundo os ensinamentos de José Afonso da Silva.
Por fim, corrobora com afirmativa que o Brasil não é um Estado ateu, os
ensinamentos de um dos maiores estudiosos de direito constitucional do Brasil. Manuel
Gonçalves Ferreira Filho afirma que a constituição não é ateia.
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Referências Bibliográficas
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em: <http://jus.com.br/revista/texto/10823>. Acesso em: 16 dez. 2012.
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SILVA, Jose Afonso da. Poder Constituinte e Poder Popular. 1ª ed. São Paulo: Malheiros,
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ed. Rio de Janeiro: Forense, 1992. p. 104
SANTOS JUNIOR, Aloisio Cristovam dos. A laicidade estatal no direito constitucional
brasileiro. Jus Navigandi (Teresina), v. Ano 12, p. n. 1768, 2008.) Apud - FERREIRA
FILHO, Manuel Gonçalves. Religião, Estado e Direito, Revista Direito Mackenzie, Ano 3,
n. 2, p. 89 - Disponível em: <http://pt.scribd.com/doc/63886451/A-Laicidade-Estatal-No-
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