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ESCOLA SUPERIOR DE ADVOCACIA (ESA) – OAB/SP
PÓS GRADUAÇÃO LATO SENSU EM DIREITO DO TRABALHO COM LIVRE DOCÊNCIA
PARA ENSINO SUPERIOR
ARTIGO
“A JORNADA DE TRABALHO DO ATLETA DE FUTEBOL PROFISSIONAL À LUZ DA
LEI Nº 9.615/98”.
Nome: Felipe Brunelli Donoso
SÃO PAULO
2008
FELIPE BRUNELI DONOSO
A JORNADA DE TRABALHO DO ATLETA DE FUTEBOL PROFISSIONAL À LUZ DA LEI
Nº 9.615/98.
Artigo Científico apresentado à
Escola Superior de Advocacia (ESA)
– OAB/SP para avaliação.
Especialização: Direito do
Trabalho.
SÃO PAULO
2008
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ........................................................ 01
1. CONCEITO DE ATLETA PROFISSIONAL DE FUTEBOL ..................... 03
2. BREVE EVOLUÇÃO HISTÓRICA LEGISLATIVA ........................... 04
3. O CONTRATO DE TRABALHO DO ATLETA PROFISSIONAL DE FUTEBOL ....... 07
4. VÍNCULOS DO ATLETA PROFISSIONAL DE FUTEBOL ..................... 09
4.1. Vinculo Trabalhista ....................................... 09
4.2. Vinculo Desportivo ........................................ 10
5. A JORNADA DE TRABALHO DO JOGADOR DE FUTEBOL .................... 12
5.1. Intervalo para Descanso ................................... 15
5.2. Direito de Receber Horas Extras ........................... 17
5.3. Descanso Semanal Remunerado ............................... 19
5.4. Concentração .............................................. 19
5.5. Adicional Noturno ......................................... 22
5.6. Legislação Internacional Pertinente ....................... 25
CONCLUSÃO ......................................................... 27
BIBLIOGRAFIA ...................................................... 28
INTRODUÇÃO
O presente estudo visa aclarar alguns aspectos
importantes acerca de um tema que, apesar de constantemente contido
na vida dos brasileiros, apresenta pouca abordagem pela doutrina e
jurisprudência pátria, tratando-se o atleta de futebol de
trabalhador extremamente peculiar em nosso sistema jurídico. Dizemos
contido na vida da população brasileira porquanto o futebol se trata
de esporte definido como “paixão nacional”, estando presente não
somente entre os especialista e Tribunais brasileiros, mas também em
conversas em mesas de bares, em reuniões familiares, enfim, em quase
todos os setores da sociedade.
Antes de adentrar no assunto devemos esclarecer que,
para melhor entendimento dos Direitos Trabalhistas do atleta
profissional de futebol, sobretudo acerca do tema tratado no
presente artigo, os leitores deverão ter em mente que a minoria dos
jogadores recebe os vultosos salários lançados pela imprensa dia
após dia nos jornais e programas desportivos, sendo que a grande
maioria destes profissionais recebe salários ínfimos, que sequer se
prestam à sobrevivência, mantendo-os em estado praticamente de
miséria, aguardando uma oportunidade de “brilhar” na profissão.
Inobstante ser de entendimento unânime, desde que
preenchidos todos os requisitos legais caracterizadores da relação
de emprego, a existência de vínculo empregatício entre o atleta
profissional de futebol e o clube no qual exerce sua função,
originando, em virtude de seu registro junto às entidades de
administração de desporto (CBF, Federações e Ligas), o vínculo
desportivo, as questões atinentes à jornada de trabalho trazem
bastante inquietação, tratando-se o tema de objeto de grande
divergência de entendimento doutrinário e pretoriano.
Os Direitos Trabalhistas dos atletas profissionais de
futebol merecem maior atenção, sendo que o assunto deveria ser
abordado mais constantemente e com maior precisão, ressaltando-se
que o presente estudo buscará o debate do tema à luz da Constituição
da República Federativa do Brasil, da Consolidação das Leis do
Trabalho (CLT) e da Legislação Especial, e.g., Lei Pelé e Lei nº
6.354/76. Não é somente a questão do passe ou dos ditos vínculos dos
atletas que merecem atenção, como a imprensa traz nos noticiários,
tratando o profissional em apreço como se mercadoria fosse. A
Jornada de Trabalho do jogador do futebol deve ser respeitada e
merece maior divulgação.
O atleta de futebol profissional, recebendo ou não
grandes salários, é um trabalhador como outro qualquer, com algumas
peculiaridades decorrentes da atividade que exerce, sendo que
trataremos principalmente dos aspectos decorrentes da Jornada de
Labor, que, conforme legem habemus, quando extrapolada gera direitos
e deveres para as partes integrantes do Contrato de Trabalho.
1. CONCEITO DE ATLETA PROFISSIONAL DE FUTEBOL
Por proêmio, antes de adentrar no assunto objeto do
presente estudo científico, cumpre trazer à baila o conceito do
atleta profissional de futebol, obtido através da inteligência da
Lei Pelé, como sendo aquele que exerce atividade correspondente à
modalidade desportiva futebolística, percebendo remuneração pactuada
em contrato individual de trabalho formal firmado com entidade de
prática desportiva, sendo esta pessoa jurídica de Direito privado.
A principal diferença existente entre o atleta
profissional e o atleta amador é a necessidade de ser firmado
contrato de trabalho com o primeiro, contendo as peculiaridades
ditadas pela legislação pátria atinente à matéria, que serão
explanadas a seguir.
2. BREVE EVOLUÇÃO HISTÓRICA LEGISLATIVA
A prática de esportes acompanha o ser humano desde os
primórdios da história, tendo iniciado em nosso país na época do
Brasil Colônia, entretanto, sem a existência da figura do atleta
profissional, não havendo, por conseqüência, qualquer legislação que
regulasse a matéria.
Com o advento da República, até os anos precedentes ao
Estado Novo, surgiram no Brasil as principais modalidades
desportivas, dentre elas o basquetebol, o tênis, a esgrima e o
futebol, sendo o último o mais importante em nosso país, tratando-se
de verdadeira paixão da sociedade. No entanto, nesta época somente
foram criados alguns Decretos, no sentido de reforçar a
obrigatoriedade de algumas práticas esportivas nos estabelecimentos
militares de ensino.
O início da década de 30 (trinta) marcou o começo da
existência do profissionalismo no futebol, surgindo diversos
conflitos decorrentes da atividade, sobretudo diante das
participações internacionais, levando o governo do Estado Novo a se
mobilizar em busca de medidas legais capazes de solucionar os
litígios. Neste diapasão, fora criado o Decreto Lei nº 3.199, de
14/04/1941, que, por força de seu artigo 29, criou o Conselho
Nacional de Desportos (CND) e reconheceu, ainda que implicitamente,
a existência de uma prática desportiva profissional (artigo 53, da
norma em apreço). O Decreto Lei retro citado vigorou até 08 de
outubro de 1975, regulamentando a prática esportiva no Brasil, em
conjunto com as deliberações do Conselho Nacional de Desportos, até
o surgimento da Lei 6.354/75, que o revogou.
Uma nova Constituição Federal estava por vir e o
Conselho Nacional de Desportos (CND), ainda que com poderes advindos
do Estado Novo, começou o processo de retirada do autoritarismo
existente no esporte nacional. No ano de 1976 fora promulgada a Lei
nº 6.354, sendo a primeira a conceder maior amplitude às relações de
trabalho do atleta profissional de futebol, estabelecendo a
necessidade da existência de contrato de trabalho escrito, por prazo
determinado, com duração mínima de 03 (três) meses e máxima de 02
(dois) anos, referendando, ainda, a questão do passe dos atletas.
Com a promulgação da Constituição da República
Federativa do Brasil de 1988, as práticas desportivas foram
constitucionalizadas e com a redação do artigo 217, onde o
legislador, utilizando-se do vocabulário correto e de forma
insofismavelmente brilhante, designou e diferenciou corretamente a
prática de esporte informal (amador) da formal (profissional).
Inobstante ter sido a prática esportiva elevada a nível
constitucional em 1988, a tomada de poder do governo Collor somente
desfavoreceu, trazendo diversos prejuízos ao desenvolvimento do
esporte que vinha galgando grande importância com o tempo,
utilizando o desporto somente para seu marketing governamental. Fato
que aclara o retro explanado é que a Lei nº 7.752/1989, denominada
Lei Mendes Thame, que trazia diversos benefícios tributários ao
desporto, foi imediatamente suspensa pelo indigitado governo,
através da promulgação da Lei nº 8.034/1990.
No ano de 1993 os treinadores de futebol obtiveram êxito
em sua luta de classe, que já perdurava há muitos anos, sendo criada
a Lei nº 8.650, de 22/04/1993, regulamentando a profissão. Ainda em
1993 surgiu a Lei nº 8.672, denominada Lei Zico, instituindo normas
gerais ao desporto brasileiro, tratando-se do primeiro passo, ainda
que tímido, para o surgimento de um maior respeito ao atleta
profissional de futebol, dilatando o prazo do contrato de trabalho e
concedendo ao jogador o Direito de receber participação no valor
decorrente da comercialização dos eventos desportivos em que seu
empregador eventualmente participasse.
Em 1995, durante o governo do Presidente Fernando
Henrique Cardoso, quando o melhor jogador de futebol do século
(Edson Arantes do Nascimento – Pelé) fora nomeado ao cargo de
Ministro do Esporte, o Brasil vivenciou seu maior desenvolvimento no
desporto, surgindo inovações legislativas que passaram a regular as
relações profissionais, inclusive trabalhistas, do jogador de
futebol, de maneira mais equânime e responsável.
É sancionada, enfim, no ano de 1998 a Lei nº 9.615,
denominada Lei Pelé, trazendo inovações substanciais para os atletas
profissionais de futebol, libertando-os do regime de semi-escravidão
instituído pelo passe e regulando de maneira mais clara e precisa os
direitos e deveres trabalhistas.
Aparentemente tudo estava caminhando bem, sendo que o
Presidente Fernando Henrique Cardoso, responsável pela criação de
condições para o surgimento da Lei Pelé, fora reeleito, levando a
crer que o progresso continuaria da mesma forma. Ocorre que,
paradoxalmente ao esperado, o Rei Pelé deixou de ocupar o
prestigiado cargo de Ministro do Esporte, passando para a posse de
Rafael Greca, ex-prefeito de Curitiba, que nada tinha a ver com o
atividade, muito menos com o futebol.
Lamentavelmente, em 14 de julho de 2000 fora aprovada a
Lei nº 9.981, desfigurando a Lei Pelé que, ressalte-se, continua
vigorando. As tendências do futebol brasileiro foram alteradas
drasticamente, ocasionando prejuízos até aos Direitos Trabalhistas
alcançados às duras penas pelos atletas profissionais deste
consagrado esporte, focando-se muito mais nos negócios que envolvem
a atividade. O caos passou a tomar conta do esporte nacional, até a
chegada do Ministro Carlos Melles que, de forma a equacionar os
problemas e resolver as questões que incomodavam a todos, criou a
Medida Provisória nº 2.141-3, de 21/06/2001, que vem sendo
consolidada desde então.
3. O CONTRATO DE TRABALHO DO ATLETA PROFISSIONAL DE
FUTEBOL
O contrato de trabalho do atleta profissional de futebol
é uma espécie de contrato-tipo, tratando-se de um instrumento
padronizado pelo Estado, na medida em que o mesmo se impõe
minuciosamente frente à vontade das partes. Tal interferência do
Estado é cabalmente possível, não obstante a previsão do art. 217,
inciso I, da Constituição da República Federativa do Brasil, uma vez
que age visando a melhoria da condição social do empregado, em
atenção ao disposto no art. 7º, caput, também da Carta Magna.
No que se refere ao tópico em apreço, cumpre ressaltar,
a fim de extirpar eventuais confusões e dúvidas havidas, que não há
mais a necessidade de registro do contrato de trabalho do atleta na
Entidade Nacional da modalidade esportiva para que surta seus
efeitos, sobretudo na esfera trabalhista, sendo certo que indigitado
registro se prestará somente a validar eventual transferência do
jogador, conferindo-lhe “condições de jogo”, inclusive, para atuar
no exterior, se for o caso.
Passamos a explanar algumas das principais
características do contrato em comento:
a) É regido pela legislação trabalhista e sujeito às leis da
previdência social;
b) Conforme já explanado alhures, o contrato de trabalho da
categoria em pauta é necessariamente por prazo determinado, podendo
ser firmado com atleta após o mesmo completar 16 (dezesseis) anos de
idade e com vigência mínima de 03 (três) meses e máxima de 05
(cinco) anos, sendo assegurada a preferência para renovação do pacto
expirado por até mais 02 (dois) anos;
c) Há necessidade obrigatória do instrumento conter Cláusula Penal,
nos casos de descumprimento, rompimento, ou rescisão unilateral. O
valor da multa prevista na Cláusula Penal pode ser livremente
pactuado entre as partes, não podendo, entretanto, ser superior a
100 (cem) vezes o montante da remuneração anual do empregado.
d) Quando o atleta profissional de futebol firma contrato de
trabalho com o clube, além da conseqüente criação do vínculo
trabalhista, é criado também o vínculo desportivo, sendo tal assunto
tratado de maneira mais completa a seguir em tópico próprio.
Nota-se claramente que o atleta profissional de futebol
é um trabalhador como outro qualquer, havendo 02 (duas) diferenças
principais com as demais categorias, quais sejam: a) enquanto o
contrato de trabalho dos trabalhadores comuns é, em geral, por tempo
indeterminado, o pacto dos jogadores de futebol é necessariamente
por tempo determinado, podendo ser firmado por um período mínimo de
03 (três) meses e máximo de 05 (cinco) anos (art. 30, da Lei nº
9.615/1998, com nova redação dada pelas Leis nº 9.981/2000 e
10.672/2003); b) o contrato de trabalho dos atletas profissionais de
futebol contém obrigatoriamente Cláusula Penal.
No que concerne à possibilidade do contrato de trabalho
do atleta profissional, apesar de ser por prazo determinado, chegar
ao período de 05 (cinco) anos, cumpre ressaltar a redação contida na
Lei nº 9.981/2000, que acrescentou o parágrafo único ao art. 30, da
Lei nº 9.615/1998, que preconiza de maneira expressa a não aplicação
do disposto no art. 445, da CLT ao instrumento contratual referente
à espécie de trabalhador em comento.
Art. 30, parágrafo único, da Lei nº 9.615/1998 - Não se
aplica ao contrato de trabalho do atleta profissional o
disposto no art. 445 da Consolidação das Leis do
Trabalho (CLT).
Art. 445, da CLT – O contrato de trabalho por prazo
determinado não poderá ser estipulado por mais de 02
(dois) anos, observada a regra do Art. 451.
Art. 451, da CLT – O contrato de trabalho por prazo
determinado que tácita ou expressamente, for prorrogado
mais de uma vez. passará a vigorar sem determinação de
prazo.
4. VÍNCULOS DO ATLETA PROFISSIONAL DE FUTEBOL
Uma vez firmado o devido contrato de trabalho entre o
empregado (jogador) e o clube (empregador), deflagramos a existência
de 02 (dois) vínculos na relação, sendo um de natureza trabalhista e
o outro, acessório ao primeiro, de natureza desportiva. Diz-se
acessório uma vez que, com o desaparecimento do vínculo trabalhista
o desportivo some conseqüentemente. É o tão conhecido princípio
jurídico em que o acessório segue a sorte do principal.
Posteriormente à assinatura do instrumento de trabalho
entre o atleta profissional e o clube que o contratou, várias outras
situações jurídicas podem ser criadas, como, e.g., a cessão do
jogador de um clube para outro. Entretanto, tais relações possuem
natureza cível e não podem interferir, em hipótese alguma, no
contrato de trabalho do atleta profissional, sobretudo de modo a
criar deveres e diminuir direitos, como condição de facilitar sua
transferência para outro clube.
Em suma, a relação havida entre o empregador e o
empregado gera o vínculo trabalhista, sendo certo que todos os
demais somente podem existir de forma acessória a este, sem
influenciar nos direitos do trabalhador.
4.1. Vínculo Trabalhista
Reitere-se que, o praticante de atividade desportiva
regular passa a poder exercitar seu Direito de contratação
profissional a partir dos 16 (dezesseis) anos de idade, sendo que
seu Contrato de Trabalho não poderá ser superior a 05 (cinco) anos e
nem inferior a 03 (três) meses. Esta é a inteligência do art. 29, da
Lei nº 9.615/98. in verbis:
Art. 29, da Lei nº 9.615/98 – A entidade de prática
desportiva formadora do atleta terá o direito de assinar
com esse, a partir de dezesseis anos de idade, o
primeiro contrato de trabalho profissional, cujo prazo
não poderá ser superior a cinco anos.
Enquanto não houver contrato de trabalho entre o jogador
e o clube, sendo tal instrumento devidamente registrado nos precisos
termos da norma supra, não há exercício profissional. A contratação
formal, por prazo determinado e com Cláusula Penal pelo
descumprimento é obrigatória. A partir do vínculo de trabalho o
atleta necessitará do vínculo desportivo, para poder atuar
regularmente em competições.
“O vínculo de trabalho nasce com a manifestação de
vontade das partes em contratar, e se resolve pelo
termo, pela rescisão antecipada, com ou sem justo
motivo, pela morte do empregado, aposentadoria ou ainda
pelo encerramento de atividade do clube empregador”.1
Resta mais que claro que o principal vínculo
estabelecido entre o atleta profissional de futebol (empregado) e o
clube (empregador) é o trabalhista, sendo os demais apenas
acessórios ao mesmo.
4.2. Vínculo Desportivo
Conforme já explanado à exaustão, o vínculo desportivo
nasce após e em decorrência do vínculo trabalhista, sendo acessório
a este. Trata-se de exigência criada pela norma administrativa
desportiva, possibilitando que o jogador exerça sua atividade
1 MACHADO, Rubens Aprobatto e outros. Curso de Direito Desportivo Sistêmico, p. 127.
esportiva. Por óbvio, o vínculo desportivo some tão logo o contrato
de trabalho é extinto por qualquer das possibilidades existentes,
seja com ou sem justa causa.
Cria-se vínculo desportivo com o registro do contrato de
trabalho na entidade de administração ou com o registro na ficha de
inscrição, que implica em manifestação de vontade das partes. Apesar
de acessório, o vínculo desportivo apresenta cabal importância na
vida profissional do atleta e necessariamente precisa existir.
Ressalte-se que, os demais vínculos e direitos
suscitados pela imprensa, que tanto fala em “vínculo federativo do
atleta” ou “direitos federativos do atleta” tratam-se, ao nosso ver,
de pura invencionice, não existindo previsão no sistema jurídico
pátrio vigente.
5. A JORNADA DE TRABALHO DO JOGADOR DE FUTEBOL
Com o advento da Lei nº 6.354/76, a jornada de trabalho
do atleta profissional poderia ser organizada livremente pelo
empregador, de forma a servir ao adestramento e à exibição do
jogador, não excedendo, entretanto, o limite de 48 (quarenta e oito)
horas mensais. Estes são os termos do art. 6º, da indigitada norma,
in verbis:
Art. 6º, da Lei nº 6.354/76 – O horário normal de
trabalho será organizado de maneira a bem servir ao
adestramento e à exibição do atleta, não excedendo,
porém, de 48 (quarenta e oito) horas semanais, tempo em
que o empregador poderá exigir que fique o atleta à sua
disposição.
De certo que, com o advento da Constituição da República
Federativa do Brasil de 1988, que, inclusive, elevou a prática
desportiva a nível constitucional, apesar do art. 6º, da Lei nº
6.354/76, continuar em vigor, a jornada de trabalho do atleta, assim
como a dos demais trabalhadores, não mais poderia superar 44
(quarenta e quatro) horas semanais ou 08 (oito) horas diárias,
podendo compensar-se, dadas as peculiaridades da profissão. Assim
preconiza o art. 7º, inciso XIII, da Carta Magna:
Art. 7º, da CF – São direitos dos trabalhadores urbanos
e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua
condição social:
XIII – Duração do trabalho normal não superior a oito
horas diárias e quarenta e quatro semanais, facultada a
compensação de horários e a redução da jornada, mediante
acordo ou convenção coletiva de trabalho.
O supra explanado perdurou de forma praticamente
indiscutível até a chegada da Lei nº 9.615/98, tendo em vista as
disposições contidas nos artigos 93 e 96, abaixo colacionados:
Art. 93, da Lei nº 9.615/98 – O disposto no art. 28, §
2o, desta Lei somente produzirá efeitos jurídicos a
partir de 26 de março de 2001, respeitados os direitos
adquiridos decorrentes dos contratos de trabalho e
vínculos desportivos de atletas profissionais pactuados
com base na legislação anterior.
Art. 96, da Lei nº 9.615/98 – São revogados, a partir da
vigência do disposto no § 2 o do art. 28 desta Lei, os
incisos II e V e os §§ 1o e 3o do art. 3o, os arts. 4o,
6o, 11 e 13, o § 2o do art. 15, o parágrafo único do
art. 16 e os arts. 23 e 26 da Lei no 6.354, de 2 de
setembro de 1976; são revogadas, a partir da data de
publicação desta Lei, as Leis nos 8.672, de 6 de julho
de 1993, e 8.946, de 5 de dezembro de 1994.
A partir de então surgiram 02 (duas) correntes
doutrinárias distintas acerca do assunto em apreço, sendo a primeira
liderada pela Dra. Professora Alice Monteiro de BARROS, que defende
a inaplicabilidade da limitação constitucional de horas semanais
para os atletas profissionais de futebol a partir de 26 de março de
2001, em face dos artigos mencionados alhures e a segunda, a qual se
filia o Dr. Professor Domingos Sávio ZAINAGHI, que pugna pela
necessidade de observância dos limites diário e semanal preconizados
na Constituição da República Federativa do Brasil, afirmando que os
artigos vertentes se revestem de inconstitucionalidade.
“Embora a Constituição de 1988 assegure aos empregados
urbanos e rurais jornada de oito horas, dadas as
peculiaridades que envolvem a função do atleta,
entendemos que as normas a respeito da limitação de
horas semanais, a partir de março de 2001, não mais
serão aplicadas ao profissional do futebol. O tratamento
diferenciado a respeito das relações trabalhistas comuns
se justifica em face da natureza especial dessa
prestação de serviços, que consiste em uma peculiar
distribuição da jornada entre partidas, treinos e
excursões”.2
“Existe sim limitação diária da duração do trabalho do
atleta, a norma constitucional só não se aplica às
relações de trabalho doméstico, pois o parágrafo único
do artigo 7º não estendeu a esses empregados a limitação
do inciso XIII. Portanto, os atletas profissionais te
jornada de trabalho de oito horas diárias e duração
semanal de quarenta e quatro horas, incluindo-se os
treinamentos e os períodos de exibição”.3
Na nossa opinião a tese da corrente doutrinária liderada
pelo Dr. Professor Domingos Sávio ZAINAGHI se apresenta mais precisa
e acertada, afinal, a Carta Magna, em seu artigo 7º, inciso III, foi
cristalina ao impor a limitação da jornada de trabalho em 44
(quarenta e quatro) horas semanais e 08 (oito) horas diárias para
todos os trabalhadores, excetuando-se somente os domésticos, por
força de seu parágrafo único que preconiza o seguinte:
Art. 7º, Parágrafo único – São assegurados à categoria
dos trabalhadores domésticos os direitos previstos nos
2 BARROS, Alice Monteiro de. As Relações de Trabalho no Espetáculo, p. 183. 3 ZAINAGHI, Domingos Sávio. Nova Legislação Desportiva, p. 20.
incisos IV, VI, VIII, XV, XVII, XVIII, XIX, XXI e XXIV,
bem como a sua integração à previdência social.
Seguindo o raciocínio da corrente doutrinária liderada
pela Dra. Professora Alice Monteiro de BARROS, estaríamos admitindo
a necessidade do surgimento de regras específicas para cada tipo de
trabalhador, o que não se mostra sequer constitucional. Ademais, tal
disposição vai contra os Princípios norteadores do Direito do
Trabalho, em especial o da aplicabilidade da norma mais favorável ao
empregado que, com toda a certeza, no que concerne ao assunto ora
debatido, é a inserida no art. 7º, inciso III, da Lei Máxima.
Ressalte-se, ainda, que os atletas profissionais de
futebol não se enquadram na regra esculpida pelo artigo 62, inciso
I, da CLT, excluindo por completo a idéia de dificuldade no controle
da jornada pela incompatibilidade da atividade.
Quanto mais não fosse, jamais podemos perder de vista
que a Constituição Federal de 1988 erigiu os Direitos Sociais a um
patamar expressivo, capaz de vincular a interpretação das normas
hierarquicamente inferiores e até mesmo a interpretação das próprias
normas constitucionais ao crivo da função social, somente alcançada
com indigitada limitação da jornada.
5.1. Intervalo para Descanso
Uma vez que a legislação específica nada fala em relação
aos intervalos para repouso e alimentação, preconizando o artigo 28,
da Lei nº 6.354/76, serem aplicáveis ao atleta profissional de
futebol as norma gerais do Direito do Trabalho, desde que
compatíveis, maior celeuma não perdura, aplicando-se in casu o
disposto no artigo 71, da CLT e seus parágrafos, abaixo colacionado:
Art. 71, da CLT – Em qualquer trabalho contínuo cuja
duração exceda de seis horas, é obrigatória a concessão
de um intervalo para repouso ou alimentação, o qual será
no mínimo, de uma hora e, salvo acordo ou contrato
coletivo em contrário, não poderá exceder de duas horas.
§ 1º Não excedendo de seis horas o trabalho, será,
entretanto, obrigatório um intervalo de quinze minutos
quando a duração ultrapassar quatro horas.
§ 2º Os intervalos de descanso não serão computados na
duração do trabalho.
§ 3º O limite mínimo de uma hora para repouso e refeição
poderá ser reduzido por ato do Ministério do Trabalho,
quando, ouvido o Departamento Nacional de Segurança e
Higiene do Trabalho, se verificar que o estabelecimento
atende integralmente às exigências concernentes à
organização dos refeitórios e quando os respectivos
empregados não estiverem sob regime de trabalho
prorrogado a horas suplementares.
§ 4º Quando o intervalo para repouso e alimentação,
previsto neste artigo, não for concedido pelo
empregador, este ficará obrigado a remunerar o período
correspondente com um acréscimo de no mínimo 50%
(cinqüenta por cento) sobre o valor da remuneração da
hora normal de trabalho.
Resta cristalino que o jogador de futebol faz jus ao
intervalo para alimentação e descanso entre os expedientes de sua
jornada de trabalho, sendo certo que o descumprimento por parte do
clube gera obrigação de adimplir a hora extraordinária com o
acréscimo de, no mínimo, 50% (cinqüenta por cento).
No que concerne ao intervalo interjornada, aplica-se a
regra insculpida no artigo 66, da CLT, que estabelece com clareza
que “entre duas jornadas de trabalho haverá um período mínimo de
onze horas consecutivas de descanso”.
Maior discussão surge no que concerne ao intervalo de 15
(quinze) minutos existente nas partidas de futebol, podendo ser
dirimida com o acertado posicionamento do Dr. Professor Domingos
Sávio ZAINAGHI, que diz o seguinte:
“O § 2º, do art. 71 não tem aplicação neste caso, uma
vez que se trata de intervalo típico de pratica
desportiva, ou seja, serve para que o atleta reponha
suas energias e se reconstitua dentro do próprio jogo.
Este intervalo assemelha-se ao previsto no art. 72, da
CLT”.4
Aplicando-se, ainda que por analogia, o artigo 71, § 2º,
da CLT, temos que o intervalo de 15 (quinze) minutos entre os
denominados tempos da partida não pode ser deduzido da jornada de
trabalho do atleta, afinal, naquele período o jogador permanece à
disposição do clube, recebendo orientações, inclusive, de seu
superior hierárquico, o técnico da equipe.
5.2. Direito de Receber Horas Extras
Conforme sabemos, horas extras são aquelas que
ultrapassam a jornada padrão fixada por regra jurídica ou mediante
cláusula contratual, sendo, in casu, aquelas que superam 44
(quarenta e quatro) horas semanais ou 08 (oito) horas diárias.
Superados os temas acima, tendo em mente a jornada de
trabalho do atleta profissional de futebol, sendo a mesma fixada em
Lei, devemos seguir a regra exposta na Consolidação das Leis do
Trabalho (CLT), mais precisamente em seu artigo 59, sendo certo que,
havendo acordo de prorrogação entre o atleta e o clube ou contrato
coletivo de trabalho, a duração normal de labor poderá ser estendida
para até mais 02 (duas) horas.
4 ZAINAGHI, Domingos Sávio. Nova Legislação Desportiva, p. 21.
Art. 59, da CLT – A duração normal do trabalho poderá
ser acrescida de horas suplementares, em número não
excedente de duas, mediante acordo escrito entre
empregador e empregado, ou mediante contrato coletivo de
trabalho.
Uma vez extrapolado o horário normal de trabalho do
jogador de futebol, faz jus o mesmo ao recebimento da devida
remuneração, mais um acréscimo de 50% (cinqüenta por cento),
conforme aduz o artigo 7º, inciso XVI, da Constituição da República
Federativa do Brasil c/c com o § 1º do indigitado artigo 59, da CLT,
in verbis:
Art. 7º, da CF – São direitos dos trabalhadores urbanos
e rurais, além de outros que visem a melhoria de sua
condição social:
XVI – remuneração do serviço extraordinário superior, no
mínimo, em cinqüenta por cento à do normal.
Art. 59, § 1º, da CLT – Do acordo ou do contrato
coletivo de trabalho deverá constar, obrigatoriamente, a
importância da remuneração da hora suplementar, que será
pelo menos 50% superior à da hora normal.
Resta mais que óbvia a incidência de horas extras
durante o trabalho normal do atleta profissional de futebol, afinal,
tal modalidade de empregado não se inclui em qualquer dos grupos aos
quais não se aplica o regime em pauta, sendo insofismável a
possibilidade de fixação de horário de trabalho para este
profissional, consistente, basicamente, na realização de treinos e
apresentações para o público, sendo a data e horário dos jogos,
inclusive, conhecida previamente, mediante fixação na tabela dos
campeonatos.
Por fim, consignamos a obrigatoriedade do atleta
profissional de participar de jogos e treinos, diante da redação do
artigo 35, inciso I, da Lei nº 9.981/00, transcrito abaixo:
Art. 35, da Lei nº 9.981/00 – São deveres do atleta
profissional, em especial:
I – participar de jogos, treinos, estágios e outras
sessões preparatórias de competições com a aplicação e
dedicação correspondentes às suas condições psicofísicas
e técnicas.
5.3. Descanso Semanal Remunerado
No que concerne ao descanso semanal remunerado, aplica-
se ao atleta profissional a Lei nº 605/49, por força do disposto no
artigo 28, § 1º, da Lei nº 9.615/98 (abaixo), com algumas ressalvas,
dada a peculiaridade do tema.
Art. 28, § 1o, da Lei nº 9.615/98 – Aplicam-se ao atleta
profissional as normas gerais da legislação trabalhista
e da seguridade social, ressalvadas as peculiaridades
expressas nesta Lei ou integrantes do respectivo
contrato de trabalho.
Ao nosso ver, o atleta profissional de futebol, assim
como os demais trabalhadores, faz jus ao repouso semanal remunerado
de 24 (vinte e quatro) horas, entretanto, sem preferência para os
domingos, afinal, muitos jogos podem se realizar neste dia da
semana. Faz jus, ainda, ao descanso nos feriados civis e religiosos.
Caso o jogador de futebol labore na data de seu descanso semanal
remunerado (DSR) ou na data de um dos feriados retro, será devida a
remuneração pela hora extra efetuada, com adicional no montante de
100% (cem por cento).
5.4. Concentração
A existência ou não de jornada de trabalho
extraordinária, geradora, portanto, do dever de adimplir horas
extras, no período em que o atleta profissional de futebol está na
concentração, talvez seja o assunto de maior turbulência no tema
abordado pelo artigo vertente, sendo tal situação gerada por lacuna
deflagrada na legislação pertinente. Tanto na doutrina quanto na
jurisprudência podemos encontrar opiniões divergentes, ressaltando-
se que estamos próximos da existência de um consenso, ainda que
somente no campo jurisprudencial.
O artigo 7º, da Lei nº 6.354/76, que, saliente-se, não
fora revogado pela Lei Pelé, dispõe o seguinte:
Art. 7º, da Lei nº 6.354/76 – O atleta será obrigado a
concentrar-se, se convier ao empregador, por prazo não
superior a 03 (três) dias por semana, desde que esteja
programada qualquer competição amistosa ou oficial e
ficar à disposição do empregador quando da realização de
competição fora da localidade onde tenha sua sede.
Parte da doutrina, liderada pelo ilustre Dr. Ralph
CÂNDIA, entende serem devidas horas extras no período de
concentração, afirmando, em suma, tratar-se a mesma de horário
natural de trabalho do atleta profissional. Indigitada corrente
doutrinária afirma que, uma vez ultrapassado o limite constitucional
de 44 (quarenta e quatro) horas semanais, restará devido o
adimplemento pelas horas extras laboradas.
No entanto, o entendimento doutrinário dominante, do
qual participam renomados autores como o Professor Dr. Domingos
Sávio ZAINAGHI e o Professor Dr. Sérgio Pinto MARTINS, diverge do
explanado alhures, afirmando não serem devidas horas extras no
período em que o jogador está na concentração, principalmente pelo
fato de que a mesma encontra-se prevista em artigo de Lei próprio
(art. 7º, da Lei nº 6.354/76), tratando-se de uma característica
especial do contrato de trabalho da categoria. Afirmam, ainda, que
durante a concentração o atleta não está participando de jogos ou
treinando (que configura seu labor), mas sim, descansando e se
divertindo com os colegas de trabalho.
Situação de divergência semelhante pode ser encontrada
na jurisprudência pátria, seiva vivificadora do nosso sistema, sendo
que a posição dominante entende que não se computam as horas de
concentração como extras. Vejamos alguns entendimentos:
“HORAS EXTRAS. JOGADOR DE FUTEBOL. PERÍODO DE
CONCENTRAÇÃO.
A concentração é obrigação contratual e legalmente
admitida, não integrando a jornada de trabalho, para
efeito de pagamento de horas extras, desde que não
exceda de 03 (três) dias por semana. Recurso de Revista
a que se nega provimento”.5
“HORAS EXTRAS INDEVIDAS – ATLETA PROFISSIONAL – PERÍODO
DE CONCENTRAÇÃO.
O período de concentração do jogador de futebol não
induz ao pagamento de horas extraordinárias, pois trata-
se de uma característica especial do contrato de
trabalho desse profissional. A Lei nº 6.354/76 admite
essa hipótese, desde que respeitado o limite de três
dias por semana, fora do limite da jornada máxima
semanal”.6
5 TST – 4ª Turma – R.R. nº 405.769-SP – Relator Ministro Antônio José de Barros
Levenhageb – j. 29.03.2000 6 TRT 3ª Região – R.O. nº 2.680 – 4ª Turma – Relatora Juíza Mônica Sette Lopes –
DJMG 27.04.2002 – p. 10
Como consignado, não obstante a jurisprudência atual
esteja quase pacificada sobre o assunto, podemos encontrar no
ementário pátrio entendimentos, ainda que minoritários, no sentido
contrário. Por oportuno, mencione-se:
“HORAS EXTRAS. JOGADOR DE FUTEBOL
É devido ao jogador de futebol por todo o período que
ficou em concentração, sem compensação de horário, à
disposição do empregador.” 7
Nosso entendimento, em que pese a boa lavra das opiniões
contrárias, é no sentido de não serem devidas as horas
extraordinárias ao atleta profissional de futebol no período em que
se encontra na concentração, desde que a mesma não supere o limite
de 03 (três) dias por semana e ocorra na véspera de exibição,
amistosa ou oficial. Tecemos tal assertativa não baseados no simples
fato de que na concentração o jogador de futebol pode se divertir,
ainda que com moderação, e descansar, mas sim, pelo disposto no art.
7º, da Lei nº 6.354/76, sendo que a norma legal é clara ao facultar
ao clube que realize tal exigência de seus empregados. A
concentração trata-se de uma peculiaridade da profissão em apreço
não configurando, de forma alguma, hora de sobreaviso.
Entretanto, oportuno aclarar que, caso a concentração
ultrapasse os 03 (três) dias facultados pela Lei, deverá ser
computada na jornada de trabalho do jogador e, caso configure
horário extraordinário, o atleta deverá ser remunerado com o
acréscimo legal de, no mínimo, 50% (cinqüenta por cento).
7 TRT 9ª Região – R.O. nº 1.079/81 – Ac. 236/82 – Relator Ministro Indalécio Gomes
– J. 18.02.1982
5.5. Adicional Noturno
No que diz respeito ao adicional em tela e redução da
hora noturna, não obstante a existência de opiniões divergentes
sobre o assunto, entendemos serem devidos ao atleta profissional de
futebol. Tal afirmação se funda, novamente, no previsto pelo art.
28, da lei nº 6.354/76 e art. 28, § 1º, da Lei nº 9.615/98, haja
vista que a Legislação específica atinente à matéria é omissa em
relação ao assunto, devendo a lacuna ser preenchida pela Norma
Trabalhista, que deve ser veementemente aplicada.
Com efeito, nos precisos termos do art. 7º, inciso IX,
da Carta Magna, é direito do trabalhador perceber remuneração
noturna maior que a diurna.
Art. 7º, da CF – São direitos dos trabalhadores urbanos
e rurais, além de outros que visem a melhoria de sua
condição social:
XVI – remuneração do trabalho noturno superior à do
diurno.
O art. 73, da CLT, seguindo a mesma linha do texto
constitucional, preconiza que, salvo nos casos de revezamento
semanal ou quinzenal, o que não é o caso, sendo tal situação,
inclusive, incompatível com o labor do atleta profissional de
futebol, a remuneração do trabalho noturno deve ser superior à do
diurno, sofrendo um acréscimo no montante de, pelo menos, 20% (vinte
por cento). Além disso, a hora do trabalho noturno do atleta
profissional de futebol deve ser considerada reduzida, assim como
dos demais trabalhadores, computando-se como de 52 (cinqüenta e
dois) minutos e 30 (trinta) segundos, considerando como labor
noturno aquele executado entre as 22 (vinte e duas) horas de um dia
e as 05 (cinco) horas do seguinte.
Art. 73, da CLT – Salvo nos casos de revezamento semanal
ou quinzenal, o trabalho noturno terá remuneração
superior à do diurno e, para esse efeito, sua
remuneração terá acréscimo de 20% (vinte por cento),
pelo menos, sobre a hora diurna.
§ 1º - A hora do trabalho noturno será computada como de
52 (cinqüenta dois) e 30 (trinta) segundos.
§ 2º - Considera-se noturno, para os efeitos destes
artigos, o trabalho executado entre as 22 (vinte e duas)
horas de um dia e as 5 (cinco) horas do dia seguinte.
§ 3º - O acréscimo a que se referia o presente artigo,
em se tratando de empresas que não mantêm, pela natureza
de atividade, trabalho noturno habitual, será feito
tendo vista os quantitativos pagos por trabalhos diurnos
de natureza semelhante. Em relação às empresas cujo
trabalho noturno decorra da natureza de suas atividades
o aumento será calculado sobre o horário mínimo geral
vigente na região, não sendo devido quando exceder desse
limite, já acrescido da percentagem.
§ 4º - Nos horários mistos, assim entendidos os que
abrangem períodos diurnos e noturnos, aplica-se às horas
de trabalho noturno o disposto neste artigo e seus
parágrafos.
§ 5º - Às prorrogações do trabalho noturno aplica-se o
disposto neste Capítulo.
Entendimento diverso ao suscitado, apresentado por
pequena parte da doutrina, pauta sua opinião na alegação de que o
labor noturno trata-se de uma peculiaridade da atividade, sendo a
norma citada alhures incompatível com a profissão, não tendo
aplicação ao atleta profissional do futebol. Por óbvio que tal
entendimento não merece perdurar, afinal, carece de fundamento
lógico, uma vez que os treinos e jogos podem perfeitamente ocorrer
antes das 22 (vinte e duas) horas, não sendo necessário o labor
noturno que, conforme é de conhecimento comum, é muito mais penoso
que o diurno.
A respeito do assunto, corroborando com nosso
entendimento, cumpre informar que “o TRT, em decisão inédita de
abril de 98, da Seção Especializada em Dissídios Coletivos, concedeu
aos jogadores de futebol piso salarial, adicional noturno de 60%,
das 22 às 5 horas, vale-refeição, auxílio-creche, estabilidade por
acidente de trabalho, seguro-invalidez e data-base em 1º de maio”.8
5.6. Legislação Internacional Pertinente
No que diz respeito à legislação alienígena acerca da
jornada de trabalho do atleta profissional, a espanhola nos parece a
mais adequada e próxima ao nosso sistema, preconizando, no artigo
9º, do Real Decreto nº 1.006, de 26 de junho de 1985, o seguinte:
Artículo 9º, do Real Decreto nº 1.006/85:
1) La jornada del desportista profesional comprenderá la
prestacion efectiva de sus servicios ante el público y
el tiempo en que este bajo las órdenes directas del club
o entidad desportiva a efectos de entrenamiento o
preparación física y técnica para la misma;
2) La duración de la jornada laboral será la fijada en
convenio colectivo o contrato individual, con respecto
en todo caso de los limites vigentes, que podrán
aplicarse en computo anual;
3) No se computarån a efectos de duración máxima de la
jornada los tiempos de concentración prévios a la
celebración de competiciones o actuacionnes desportivas,
en los empleados en los desplazamientos hasta el lugar
8 CARRION, Valentin. Comentários à Consolidação das Leis do Trabalho. p. 420.
de la celebración de las mismas, sin perjuicio de que
através de la negociación colectiva se regule el
tratamiento y duración máxima de tales tiempos.
Conforme pode-se depreender da leitura do artigo supra,
a Lei Espanhola definiu claramente em quais ocasiões o atleta
profissional se encontra a disposição do empregador, prevendo a
possibilidade das partes pactuarem a jornada de trabalho através de
convenção coletiva ou individualmente, estabelecendo vedação ao
cômputo dos períodos de concentração e deslocamento quando o jogo se
realiza fora da sede do clube.
CONCLUSÃO
Com base no estudo realizado podemos concluir, com
firmeza, que o atleta profissional de futebol é um empregado como
outro qualquer, sendo que sua atividade possui algumas
peculiaridades que devem ser analisadas pormenorizadamente. A
legislação desportiva evoluiu muito nos últimos anos, sobretudo no
que se refere aos Direitos Trabalhistas da categoria em comento,
entretanto, a doutrina e a jurisprudência pátria necessitam laborar
com mais afinco, de forma a aprofundar o assunto, em busca,
inclusive, de pacificar os entendimentos.
Resta mais que claro que a jornada de trabalho do atleta
profissional de futebol tem como limite 44 (quarenta e quatro) horas
semanais e 08 (oito) horas diárias, cabendo a todo o excesso o
adimplemento do devido adicional de horas extras, salvo no período
de concentração e de viagens, tendo em vista o tratamento dado pela
legislação especial, não obstante a existência de controvérsias
quanto a este particular.
Outro tópico gerador de opiniões diversas é no que
concerne ao adicional noturno que, conforme nosso entendimento, é
devido ao atleta profissional de futebol, sendo a legislação
específica omissa neste assunto e a lacuna preenchida pelas normas
gerais trabalhistas.
Resta claro que as peculiaridades da profissão devem ser
levadas em consideração, no entanto, a dignidade do trabalhador deve
sempre ser colocada em primeiro lugar, lembrando que os Direitos
Sociais foram erigidos ao nível constitucional e merecem
insofismável respeito.
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