Post on 09-Nov-2018
ESCOLA PAULISTA DE POLÍTICA, ECONOMIA E NEGÓCIOS – EPPEN
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO PAULO – UNIFESP
As motivações do imigrante japonês ao buscar o Brasil
(1920-1980)
Discente: Heidy Katharine Motta
Orientadora: Profa. Dra. Ismara Izepe de Souza
Curso: Relações Internacionais
Osasco
2015
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AS MOTIVAÇÕES DO IMIGRANTE JAPONÊS AO BUSCAR O BRASIL
(1920-1980)
Heidy Katharine Motta1
Resumo
O artigo a seguir tem como objetivo central analisar as principais motivações que
levaram os imigrantes japoneses à emigrar para o Brasil, entre 1920 e 1980. Sendo
o artigo resultado dos estudos realizados para pesquisa de iniciação científica
“História Oral de Vida dos Imigrantes Japoneses no Brasil (1920-1980)”.
Primeiramente será feita a análise, através de uma perspectiva histórica, do
processo imigratório japonês no Brasil, enfatizando seu início, desenvolvimento, as
dificuldades enfrentadas pelos imigrantes japoneses das primeiras gerações e
dentre outros aspectos. Em um segundo momento, discorrer-se-á sobre as principais
motivações que levaram esses migrantes à buscar o Brasil como moradia, no
período do pós-guerra, segundo os relatos de história oral de vida colhidos para a
pesquisa anteriormente citada. Por fim, analisaremos, a partir desses relatos, como
foi o processo de adaptação ao novo país, mais especificamente em relação à
cultura, culinária, sociedade e ambiente no geral.
Palavras-Chaves: História Oral, Japão, Brasil, imigração japonesa no Brasil
Abstract
The following article is mainly aimed to analyze the main motivations that led the
Japanese immigrants to migrate to Brazil, between 1920 and 1980. As a result of the
studies for a scientific initiation research named “Oral History of the Japanese
Immigrants in Brazil (1920-1980). First it will be analyzed, by a historical perspective,
the Japanese immigration process in Brazil, focusing on how this began and
1 Discente do terceiro ano do curso de Relações Internacionais da Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP
– Campus Osasco, bem como aluna-pesquisadora do Grupo de Pesquisa “Conflitos Armados, Massacres e Genocídios da Era Contemporânea”, coordenado pelo Prof. Dr. Rodrigo Medina Zagni. Além de bolsista de iniciação científica pelo CNPq – PIBIC – Edital 2014/2015 – com o tema “História Oral de Vida dos Imigrantes Japoneses no Brasil (1920-1980).
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developed throughout the twentieth century, the difficulties faced by the Japanese
immigrants of the earlier generations and among other aspects. In a second step, the
analyze of the main motivations that led these migrants to look to Brazil as new
country to live in the postwar period will be made, according to the testimonials of life
made by the Japanese immigrants for this research. Finally, it will be said about how
it was the process of adaptation in the new country, more specifically about their
relation with the culture, customs, culinary, society and environment in general.
Key Words: Oral History, Japan, Brazil, Japanese immigration in Brazil
PERSPECTIVA HISTÓRICA DO PROCESSO IMIGRATÓRIO
A onda imigratória realizada pelos japoneses no século XX ao Brasil e
a outros países se deve, sumariamente, ao descontrole que sofreu o arquipélago,
entre a explosão demográfica, a falta de empregos e a baixa produtividade. Em
razão disso, a emigração foi colocada pelo Estado japonês como uma opção viável
para se restabelecer o “equilíbrio” ao país. Apesar dos Estados Unidos serem o
destino mais almejado pelos mesmos na época, a partir do momento em que se
entrou em vigor nos EUA a lei de cotas e foi feita a proibição da entrada de
“alienígenas inassimiláveis”: negros e amarelos (Johnson-Reed Act ou Immigration
Act of 1924) (SAKURAI, 2013), o Brasil passou a ser uma opção interresante aos
imigrantes, já que a imagem criada tanto na Europa quanto no Japão era a de que o
país era rico e possuía terras férteis. Sendo em muitas canções esse imaginário
representado, como nos mostra Zuleika Alvim no seguinte trecho:
Algumas máximas foram constantes nessas canções, como a de uma natureza luxuriante e benfazeja, da qual seria possível extrair alimentos à vontade, a dicotomia entre ricos e pobres e, finalmente, a ideia de que seria fácil enriquecer. É evidente que tais canções nada mais eram do que a expressão do modo como viviam os homens e mulheres que as entoavam. É também claro que durante o período emigratório os agenciadores de mão de obra promoveram a multiplicação dessas imagens, mas não foram seus criadores (...) (1998, p. 219).
Segundo Janete Leiko Tanno (2008, p. 65) os primeiros imigrantes
chegaram em 1906, no entanto, adotou-se a data de 18 de junho de 1908 como
“marco do início do processo de imigração desses estrangeiros, com a chegada do
navio Kasato Maru ao Porto de Santos”; inaugurando um movimento que se
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evidenciou até a década de 1970. A pesquisadora Marcia Yumi Takeuchi (2007, p.
15) diz a respeito que:
De fato, a carência de mão de obra para os fazendeiros de café, o „produto-rei‟ da economia brasileira, convenceu o governo paulista da necessidade, a título de experiência, de subvencionar a vinda de trabalhadores nipônicos. Estes poderiam trazer uma vantagem: implementar as relações comerciais entre o Brasil e o Japão (...).
Inicialmente esses imigrantes eram, em sua maioria, camponeses,
pobres e que depositaram no Brasil as suas esperanças por uma vida melhor e o
seu retorno à pátria, depois de trabalhar muito em solo brasileiro e aumentar sua
renda. Porém, com o passar o tempo, já na segunda fase da imigração, o Brasil
passou a receber mais imigrantes japoneses de nível técnico, vindos agora com
maior auxílio quanto ao financiamento das viagens pelo próprio governo japonês
e/ou de empresários, cooperativas organizadas em território brasileiro e
companhias, as quais adquiriam terras brasileiras e as vendiam no Japão para os
interessados em emigrar. Acerca dessa segunda fase da imigração, ainda usando
as palavras da pesquisadora Marcia Yumi Takeuchi:
Além desses jovens da Cooperativa Agrícola de Cotia, entraram no Brasil, nesse mesmo período [1955-1958], graças à iniciativa de Ryota Nagasawa, funcionário técnico do Ministério da Construção do Japão, jovens técnicos para o desenvolvimento industrial (Sangyo Kaihatsu Seinentai). Ao contrário do grupo da Cotia, orientados pela comunidade nipônica, esse grupo recebia orientação do Japão, mais especificamente do Ministério da Construção. Além do treinamento técnico no país de origem, esses jovens recebiam no Brasil um segundo treinamento, exigência para aqueles que desejassem seguir atividade independente em sua especialidade, mas sem perder vínculo com o grupo (2007, p. 91).
e
Por seu lado, o governo japonês via essa nova etapa como uma oportunidade tanto para os técnicos especializados, como para os camponeses empobrecidos. Permitia ao Japão minimizar as pressões sociais enquanto buscava reerguer a economia do país devastada com a Segunda Guerra Mundial. Observamos que Tóquio, assim como na primeira fase da imigração japonesa para o Brasil, considerava a emigração parte da política de Estado: não lhe bastava enviar seus súditos sem qualquer apoio, entregues à própria sorte. As autoridades japonesas vislumbravam que sem infra-estrutura, a adaptação do japonês ao novo meio fracassaria e prejudicaria futuras levas de imigrantes, além de trazer prejuízos para eventuais intercâmbios comerciais a serem estabelecidos entre o Brasil e o Japão (ibidem, p. 92).
Propagandas sobre o Brasil não faltavam no exterior – terra fértil,
virgem, abundância de alimentos, bom clima, trabalho disponível, entre outras.
Tamanho era o anseio de migrar que muitos japoneses, apesar de doentes e com
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dívidas, faziam de tudo para alterar suas condições de saúde para conseguirem
passarem pelos exames de aprovação médica. Isso pode ser visto claramente nos
relatos que Tatsuzo Ishikawa fez em seu célebre livro “Sobô - Uma Saga da
Imigração Japonesa”, onde descreveu as inúmeras situações em que famílias
humildes japonesas tinham tracoma e/ou outras doenças e tentavam ao máximo se
curar das mesmas para conseguir embarcar.
Cartaz empregado pela “Kaigai Kogyo Kabushiki Kaisha” para propaganda do Brasil no Japão, mostrando os navios e o destino: Brasil. (Foto: Museu da Imigração Japonesa). Disponível em:
<http://www.nippo.com.br/4.imigracao_japonesa/07.php>. Acessado em: 08 Julh. 2015.
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No entando, nem todos os políticos brasileiros ficaram contentes com a
vinda de imigrantes japoneses ao Brasil, “para tanto, a Campanha Eugênica,
capitaneada pela Comissão Central Brasileira de Eugenia, combateu, via grande
imprensa, durante o ano de 1934, a vinda de imigrantes assírios e japoneses,
qualificados como indesejáveis” (TAKEUCHI, p. 52, 2008). Tendo em vista que
muitos desses políticos tinham uma concepção organicista de Estado, ou seja,
acreditavam que este funcionava igualmente ao corpo humano, podendo ficar
doente de acordo com o as impurezas presentes em “seu sangue”, então, pelo viés
xenófobo e racista, o nipônico, bem como o negro, era visto como algo nocivo e a
ser evitado (TAKEUCHI, 2008).
Além das dificuldades enfrentadas no campo político, ainda existiam
aquelas referentes aos preconceitos diários sofridos pelos imigrantes em seus
trabalhos no campo, já que trabalhavam em fazendas nas quais seus patrões não
haviam, apesar de tudo, entendido perfeitamente que não eram seus escravos e
sim, trabalhadores livres. Se para com os escravos o comportamento desumano era
comum, à poucas décadas anteriormente a 1908, para com os imigrantes a situação
se modificou, mas nem tanto, já que:
A visão de um Brasil de vegetação farta e benfazeja, entoado nas canções que exaltavam a emigração, parecia-lhes verdadeira, pelo menos enquanto subiam a serra para alcançar São Paulo, vindo de Santos. (....) Contudo, essa primeira impressão logo sofria sérios abalos. Bastava acertarem os contratos de trabalho com um representante dos fazendeiros que iam até a Hospedaria dos Imigrantes com essa finalidade e partirem para seu destino final (ALVIM, 1998, p. 252).
Tomoo Handa também discorre sobre:
Aqui também nos deparamos com o sofrimentos e fracassos dos imigrantes, desacostumados com o clima, a alimentação, o tipo de vida e o modo de ser dos brasileiros; a verdade, porém, é que os fazendeiros de então pareciam não pensar em como agir para que os empregados pudessem trabalhar em paz; só se interessavam em fazê-los trabalhar com salários baixos, extorquindo-lhes o máximo de rendimento. Isso nos dá a prova de que permaneceu forte nas fazendas a concepção de trabalho herdada dos tempos da escravidão. Mais tarde, inventou-se a expressão “escravo assalariado”; mas, na verdade, não se tinha por outra coisa senão escravo a quem se pagava salário (1980, p. 92).
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Os primeiros imigrantes japoneses do século XX certamente foram os
que mais “sentiram na pele” as dificuldades de adaptação ao novo país, já que
vieram conhecendo pouco ou nada de Língua Portuguesa, para um país que
mantinha hábitos alimentares completamente diferentes dos seus, de infraestrutura
precária no quesito aos transportes, moradia, educação e saúde (HANDA, 1980).
Além disso, as relações de trabalho abusivas mantidas nas fazendas obrigaram os
mesmos à fugir. Tal tática de empoderamento e retomada da busca de um presente
e futuro melhores, mesmo apresentando sérios riscos (inclusive fatais, exemplo:
morte dos imigrantes pelos capangas se pegos fugindo), foi praticada não só pelos
primeiros imigrantes japoneses, mas se perpetuou até o momento em que o governo
japonês, empresas ou cooperativas passaram a auxiliá-los de forma mais efetiva em
sua adaptação e viviência no Brasil (SAKURAI; KODAMA, 2008).
Quando começaram as fugas todas as fazendas puseram em funcionamento, de ordinário, severa vigilância noturna. Havia nelas um grupo de trabalhadores, chamados “capangas”, convocados para a vigilância. Formavam assim corpos policiais extra-legais, já que dentro das fazendas o controle estava inteiramente nas mãos dos proprietários. Além disso, nas disputas entre colonos e fazendeiros, o ponto de vista destes sempre lograva ser acolhido como o certo, a menos que aqueles estivessem escudados em razões muito fortes. Havia, é claro, a lei do patronato, mas o recurso a ela se mostrava difícil na ausência de algum intermediário, condição que não estava ao alcance dos colonos japoneses. E quando ocorriam greves, que desafiavam o poder dos capangas, mobilizavam-se soldados da delegacia mais próxima, naturalmente por solicitação dos fazendeiros. A “fuga noturna”, entretanto, não era planejada isoladamente, havendo normalmente a colaboração dos vizinhos para facilitá-la, ainda que se tratasse de apenas uma a família fugitiva. Por vezes, ofereciam-se antecipadamente “banquetes” de despedida, augurando o êxito da evasão. Os fugitivos assumiam a obrigação de, uma vez chegados ao local de destino, enviar aos que ficavam dados informativos sobre as condições ali reinantes. É por esse motivo que, mais tarde, se constituiu um problema para os fazendeiros o fato por estes denunciado de que, “para se retirarem, coletivamente criam casos, ou fogem à noite, ou ainda o fazem iludidos pelas palavras dos outros, e o modo de execução das fugas se torna cada vez mais hábil e acintoso” (HANDA, 1980, p. 56).
Ao conseguir sair das fazendas, os imigrantes buscavam o comércio
para trabalhar e recomeçar. É dessa maneira que passaram a surgir mercearias,
tinturarias e dentre outros tipos de comércio na cidades com donos japoneses,
principalmente na Grande São Paulo (ibidem).
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Foto do acervo pessoal de Tetsuo Shinzato – seu tio, tia e primas(os) ao lado da casa de sapê; interior de São Paulo.
De fato, os japoneses se constituíram em um grupo que apresentou
grande mobilidade, ou seja, migravam constantemente a procura de melhores
condições de vida, educação e trabalho (ALVIM, 1998), sendo que as encontravam
mais facilmente nas cidades do que no campo. Seus conhecimentos em policultura,
plantação de várias espécies de plantas e vegetais em um terreno, fez com que
surgissem os Cinturões Verdes em São Paulo, algo inédito, visto que a região
apresentava caráter tradicionalmente monocultor (SAKURAI, 2008). Isso beneficiou
tanto a colônia nipônica quantos a população de São Paulo, já que multiplicou o
acesso à esses produtos (feiras, comércio, etc.) e diversificou a alimentação
paulista, que teve contato com novas frutas e verduras japonesas.
MOTIVAÇÕES À IMIGRAÇÃO JAPONESA NO PÓS-GUERRA
De acordo com os relatos de vida dos imigrantes japoneses, colhidos
para a pesquisa científica “História Oral dos Imigrantes Japoneses no Brasil (1920-
1980)”, anteriomente citado, as principais motivações que os levaram a emigrar
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foram: de 1933-1935, a visualização de filmes-propaganda em salas de cinema,
retratando o Brasil como um país de terras férteis, com alimento abundante (vegetal
e animal), trabalho e enriquecimento fácil. Como percebe-se no relato da senhora
Keiko Kamimura, que veio com a família e ainda criança para o Brasil, em 14 de
maio de 1934:
“O Brasil surgiu como opção quando minha irmã, a qual tinha de 18 para 20 anos, foi assistir filme, na cidade onde morávamos no Japão. Daí ela viu um filme que mostrava que no Brasil, vinham rolando os ovos da galinha facilmente pelo cafezal, e se tinham muitas galinhas espalhadas pelo campo. Assim, pegava-se os ovos, sem donos, e os levava para casa... tinha-se cachos de bananas na beira da estrada e tudo. Ela pensou: “Nossa, que lugar bom, em que se pode comer banana de graça e à vontade!”. Aí minha vó começou a incentivar, pelo o que me disseram, ela falava: “Vamos embora, vamos embora! Porque aqui o imposto é caro, trabalhamos demais e é difícil! Vamos para o Brasil!”. Então vieram meus pais, eu, minha irmã mais velha, meu irmão, outro irmão que tinha 13 anos e mal tinha saído do primário para o colégio e minha vó, ainda com a minha mãe grávida. Veio todo mundo para cá, não ficando ninguém no Japão. Outra vez passada, fui para o Japão e vi minha casa... fiquei com uma saudade de lá. Eu queria até mostrar as fotografias, mas não tive tempo de separá-las, infelizmente. Foi a minha avó quem mais quis vir para o Brasil, por isso, se ela tivesse falado: “Eu não vou, eu não quero!”, daí acho que ninguém vinha. Mas graças a Deus viemos, porque logo começou a Segunda Guerra, e então eu teria perdido meu pai, meu irmão e minha mãe ficaria viúva...”
A partir da Era Meiji (1867-1902), o Japão começou a industrializar-se,
seguindo os moldes Ocidentais. Com isso, se teve uma grande massa de reserva de
trabalhadores, fundamentais para o processo de acumulação de mais-valia; seriam
os camponeses, agora cada vez com menos espaço e emprego no mundo
industrializado e competitivo. Com o empobrecimento da população camponesa, o
surgimento de conflitos armados mundiais, o aumento do índice de desemprego e a
pressão do elevado crescimento demográfico, a emigração foi colocada em pauta
pelo governo como algo necessário (HANDA, 1980). Por essa razão, umas das
estratégias seguidas foi a da propaganda de outros países no Japão, tais como
Estados Unidos e Brasil.
Já no período de 1954 à 1959, destaca-se o fato de que esses
imigrantes já possuíam parentes ou amigos/conhecidos no Brasil, os quais os
convidaram e/ou indicaram o Brasil como uma alternativa ao Japão. De acordo com
Célia Sakurai e Kaori Kodama (2008, p. 25-26), “a reabertura da corrente imigratória
japonesa começou em 1952, quando foram reatadas as relações diplomáticas entre
o Brasil e Japão”. Sendo assim, os acordos eram sumariamente estabelecidos por
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particulares. As autoras ainda mencionam que, desde 1952 até 1980, segundo o
Ministério dos Negócios Estrangeiros do Japão, entraram no País 46 401 imigrantes.
Tal volume se deu porque, ao término da Segunda Guerra Mundial, o
Japão se encontrava destruído pelo conflito e arrasado socialmente; com falta de
empregos, comida, sistema de saúde, etc. Sendo assim, mais uma vez a migração
foi colocada como opção na busca pela mudança e melhoria de vida dessas
pessoas. Percebe-se que, referente ao período citado, ao mesmo tempo em que os
imigrantes respondiam ter parentes ou amigos no Brasil, também mencionavam que
o Japão estava “ruim” para se viver, ou seja, arrasado pela guerra.
Após o fim da guerra, o Japão precisou reassentar a sua economia e lidar com a alta taxa de desemprego. Dentro desse quadro, a emigração foi aventada como uma saída para a crise. O governo japonês cirou uma infra-estrutura sob o comando do Ministério das Relações Exteriores para arregimentar e selecionar os emigrantes, não só para o Brasil, como para outros países da América Latina (SAKURAI; KODAMA, 2008, p. 26).
Observa-se essa situação nos relatos de Tamie Kitahara, imigrante
japonesa que veio com a família para o Brasil, em 1955:
“Após a Segunda Guerra Mundial, o Japão viveu muitos anos na pobreza, pois como destruíram o país, o povo perdeu tudo. Meus pais, por exemplo, tiveram muitos filhos e foi difícil educá-los nessa época. Também, meu pai tinha um amigo, parente meio longe, que veio para o Brasil antes da Segunda Guerra e que, de vez em quando, falava sobre o Brasil para ele. Foi daí que surgiu a ideia dos meus pais de emigrarem para o Brasil, por causa desse amigo, senão isso nunca iria se passar na cabeça deles. O custo das passagens da nossa viagem ao Brasil ficou como empréstimo realizado pelo governo japonês, só que este não foi pago, porque não foi cobrado e também era difícil conseguir o dinheiro no Brasil para pagá-lo. Além disso, era interessante para o governo japonês a maior emigração de sua população. Era muito raro quem pagasse esse empréstimo, mas sabe-se de que casos assim aconteceram. A quantia exata eu não sei, mas sei que meus pais abandonaram tudo no Japão, não trouxeram muito dinheiro para o Brasil, e lá ainda ficaram meus irmãos e avós. Meus irmãos ficaram porque eram adultos já trabalhavam, e meus avós pois eram idosos e também, não quiseram vir. Meus irmãos se responsabilizaram por cuidar dos meus avós.”
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Gráfico das principais motivações que levaram os japoneses à emigrar ao Brasil, de acordo com os
relatos de vida colhidos.
Já ao período referente à 1960-1972, os motivos da vinda ao Brasil
variam entre os imigrantes entrevistados. Entre eles, o senhor Sasuke Takai
mencionou ter vindo em 1960, ainda criança, com os pais, pois estes tinham
comprado alguns lotes no interior paulista. Já no caso da senhora Ayako Nishida
Baba, vinda em 1961, seu pai emigrou ao Brasil para trabalhar na lavoura porque,
segundo a colaboradora: “... o setor de mineração não estava muito bom no Japão
do pós-guerra, então meu pai quis ir para o Brasil trabalhar...”. Por fim, no caso de
Tsukasa Kaito, este emigrou pois a empresa madeireira (Nortres) na qual trabalhava
tinha unidades pelo Brasil (Bahia e São Paulo, por exemplo, onde ele trabalhou). De
acordo com Célia Sakurai (2008), desde 1952 começaram a chegar mais imigrantes
de nível técnico, como já mencionado acima, porém aqueles que iriam trabalhar nas
lavouras não mais se restringiam à região de São Paulo. Como no caso da senhora
Ayako Baba, que foi com a família para o Paraná, trabalhar num cafezal.
Interessante notar que este cafezal pertencia à um imigrante japonês, já
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estabelecido e muito “famoso” na região, segundo a colaboradora. Percebe-se então
a consolidação do imigrante em terras brasileiras e o auxílio e melhores condições
de trabalho que este poderia dar, na maioria das vezes, ao seus patrícios.
PROCESSO DE ADAPTAÇÃO AO NOVO PAÍS
A adaptação dos imigrantes ao Brasil foi se tornando mais fácil com o
passar dos anos. Percebe-se que, inicialmente, foi um de trabalho árduo e dificultoso
para os imigrantes, pois, na segunda década do século XX as diferenças de
desenvolvimento socioeconômico entre Brasil e Japão eram gritantes. Com isso, os
japoneses não conseguiam o mesmo conforto que tinham em sua terra natal; tendo,
por exemplo, de dormir com colchões de palha de milho (quando tinham) em chão
de terra batida, fabricar seus próprios móveis, matar seus animais domésticos
destinados ao consumo da família (frango, porco, boi, etc). Além da dificuldade em
questões estruturais, já que o País fornecia um sistema educacional e de saúde
muito precários. Os imigrantes tinham que andar, na maioria das vezes, mais de 7
km para ir às escolas brasileiras, em estradas de terra e muitas de suas escolas
japonesas, das colônias, foram fechadas por ordem do Estado (MORAIS, 2011).
Médicos praticamente não existiam na área rural, somente urbana e eram poucos
aqueles que podíam pagar o tratamento, por isso da proliferação de “curandeiros”
(ALVIM, 1998). No entanto, já na segunda e terceira fase da imigração, os novos
imigrantes japoneses podiam contar com os alicerces levantados por seus patrícios
anteriormente (lojas de produtos alimentícios japoneses, tinturarias e relojoarias com
donos japoneses, dentre outros) e conseguiam melhor se adaptar ao País.
Formaram-se as colônias, onde, baseados no forte princípio de bem estar coletivo,
presente na Cultura Japonesa, o auxílio mútuo foi muito importante para que a
comunidade prosperasse. Com isso, técnicas de plantio e informações sobre o Brasil
do ponto de vista geográfico (solo, clima, vegetação,...) eram disseminadas através
de panfletos e livros (SAKURAI, 2008).
As redes de solidariedade se espalharam em todos os locais onde famílias japonesas se concentraram. Havia um pacto silencioso de amparar aqueles mais necessitados, quer por práticas como a do “envelope”,quer pelo trabalho de pessoas voltadas para esse fim, como os religiosos de diferentes crenças, budistas ou cristãos, ou voluntários que amparavam os órfãos, as mães solteiras, as pessoas sem família. No imaginário dos moradores da cidade de São Paulo
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ouvia-se muito que “não existem mendigos japoneses!” (ibidem, p. 132).
Da coesão grupal dos japoneses em solo brasileiro, formou-se um
canal de comunicação com a sociedade em geral, já que nas gerações seguintes as
crianças tendiam a conhecer e falar tanto a Língua Japonesa quanto Portuguesa.
Além disso, a organização da colônia se materializou em associações, cooperativas
e centros de cultura, os quais promoviam grandes eventos e festivais japoneses. A
importância desses festivais se deve porque eram neles que os brasileiros podiam
ter maior contato e conhecer a Cultura Japonesa, já que passavam a degustar de
sua culinária e entender seus costumes (ibidem, 2008). Não é atoa que atualmente
se tenham grandes festivais de rua em bairros como a Liberdade, em São Paulo.
Dentre eles se destaca o Tanabata Matsuri, realizado em julho e com grande
abrangência de público japonês não-descendente e descendente.
Vale ressaltar também o esforço dos imigrantes japoneses em se
integrar, tendo em vista que, percebendo a dificuldade e estranhamento que os
brasileiros expressavam ao pronunciar seus nomes, muitos decidiam “possuir dois
nomes pessoais: um japonês e outro brasileiro” (SAKURAI, 2008). Com isso,
adotavam, por exemplo: “Fátima Sayako Shimizu”, ou “Marcos Eiji Takahashi”. Além
de que, originários de uma cultura que valoriza o trabalho e a educação como bases
para o crescimento pessoal e social, os imigrantes procuraram estudar tanto quanto
podiam, chegando a ser um grupo destacado nas melhores universidades públicas e
federais do País. Em depoimento, um deles diz, após mencionar que felizmente
conseguiu estudar e também proporcionar uma boa educação escolar aos seus
filhos, sendo que hoje todos estão formados em boas universidades e trabalhando:
“Fiz questão de valorizar a educação dos meus filhos, então nós deixávamos de viajar, de reformar a casa, por exemplo, para priorizar o estudo. Não foi o melhor que poderia ser, mas o que pude, eu dei. A cultura japonesa valoriza certamente a Educação e eu sempre achei que esta era a base de qualquer sociedade ou pessoa.” (Tetsuo Shinzato, vindo em 1957 para o Brasil e originário de Okinawa)
Outro aspecto que não pode ser deixado de lado é o da culinária. Os
imigrantes japoneses passaram a incorporar ingredientes brasileiros em sua comida,
tais como o feijão branco e o arroz temperado à moda brasileira. Também o
contrário ocorreu, quando brasileiros começaram a incluir em sua dieta pratos e
modos de preparar a comida típicamente japoneses. A proliferação de restaurantes
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japoneses em São Paulo, por exemplo, em muito auxiliou esse processo. Segundo
Boris Fausto (1998, p. 58-59), “... a comida sempre será lembrada pelos imigrantes
comoum elo com o passado, com personagens queridos mortos – mães, avós, tias,
que preparavam pratos especiais cujo segredo levaram consigo –, com um tempo
sem retorno da infância na casa materna.”.
Foto do acervo pessoal de Tamie Kitahara da época em que cursava o ensino médio em escola
pública brasileira, nos anos 60.
De acordo com Célia Sakurai (2008), após 1970, o número de entradas
de imigrantes japoneses no Brasil caiu significativamente, já que o Japão de então
presenciava um “vertiginoso desenvolvimento econômico e não necessitava mais
exportar mão de obra”. Sendo assim, o movimento contrário surgiu, dos
descendentes indo para o país de origem de seus pais e avós à procura de
melhores empregos e bem estar social, a partir dos anos 1980, seriam os chamados
dekasegis, ou “dekasseguis”.
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CONCLUSÃO
Pode-se concluir que, apesar das dificuldades enfrentadas pelos
imigrantes japoneses no início do século XX, mesmo em 1920 (vinte anos após a
chegada dos primeiros em 1906), ao longo do tempo estes obtiveram êxito em
muitos aspectos de sua busca pela maior integração à sociedade. Atualmente, a
existência de nipo-brasileiros como resultado desse processo e o crescimento do
interesse dos não descendentes pela Cultura Japonesa e sua história no Brasil são
evidentes. Além do mais, foi um grupo que conseguiu, pela prática do auxílio mútuo
e em consequência do investimento feito pelo governo japonês (pagamento de
passagens, treinamento técnico e dentre outros) se estabelecer com êxito. Sua
grande mobilidade em solo brasileiro e constante busca por condições de trabalho
melhores fizeram com que rapidamente, se comparados à outros grupos
imigratórios, pudessem passar de empregados à detentores de pequenos lotes e
estabelecimentos comerciais e, consequentemente, empregadores (SAKURAI,
2008), sem mencionar o alto nível de escolaridade e anos de estudo adquirido em
escolas brasileiras e japonesas.
Percebe-se também que os relatos de história oral de vida dos
imigrantes, colhidos para a realização da pesquisa, além de enriquecer o estudo
acerca do processo imigratório, evidenciou que muito do que foi dito pela
historiografia correspondia com o que os imigrantes vivenciaram, o que pode ser tido
como um bom sinal do ponto de vista da representatividade histórica não-distorcida
que se tem seguido até então. Assim, se faz cada vez mais necessário incluir tais
imigrantes na construção acadêmica dos processos históricos, já que, na realidade,
foram essas pessoas quem passaram por toda a experiência e detém conhecimento
empírico do processo imigratório em questão.
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1) BIBLIOGRAFIA
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